Traducao intersemiotica em grafismos e cantos htamha e steromkwa

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL / JORNALISMO DISCIPLINA - ESTÉTICA EM COMUNICAÇÃO SAMUEL LIMA GOMES DE BARROS E MANOEL MORENO XERENTE TRADUÇÃO INTERSEMIÓTICA EM GRAFISMOS E CANTOS HTÂMHÃ E STÊROMKWA PALMAS – TO 2012

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO TOCANTINS CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL / JORNALISMO

DISCIPLINA - ESTÉTICA EM COMUNICAÇÃO

SAMUEL LIMA GOMES DE BARROS E MANOEL MORENO XERENTE

TRADUÇÃO INTERSEMIÓTICA EM GRAFISMOS E CANTOS HTÂMHÃ E STÊROMKWA

PALMAS – TO 2012

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SAMUEL LIMA GOMES DE BARROS E MANOEL MORENO XERENTE

TRADUÇÃO INTERSEMIÓTICA EM GRAFISMOS E CANTOS HTÂMHÃ E STÊROMKWA

Trabalho apresentado à disciplina de Estética e Comunicação do Curso de Comunicação Social / Jornalismo da Universidade Federal do Tocantins, como requisito parcial de avaliação do 1º bimestre de 2012 Orientadora: Profª MsC. Daniela Soares

PALMAS – TO 2012

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.......................................................................................... 04

2 DEFININDO TERMOS............................................................................. 05

3 GRAFISMO E CANTO............................................................................. 07

5 TRADUÇÃO XERENTE........................................................................... 09

6 CONCLUSÃO............................................................................................ 10

REFERÊNCIAS............................................................................................ 11

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Introdução

O presente trabalho, suscitado na disciplina de Estética e Comunicação do Curso de

Comunicação Social / Jornalismo da Universidade Federal do Tocantins, busca demonstrar

como ocorre a tradução intersemiótica na cultura sígnica do povo xerente, doravante akwẽ, em

relação aos cantos e grafismos referentes à sua própria dualidade, que está presente em quase

todas as instâncias da cosmologia deste povo.

A análise deste trabalho deter-se-á sobre a divisão que ocorre nas corridas de toras, em

que há dois times - Stêromkwa e Htâmhã. Para cada um deles há um grafismo e um canto

determinados, e é neste detalhe que o trabalho se desenvolve, observando como os akwẽ

realizam a tradução de forma espontânea devido à sua própria visão de mundo.

A definição dos termos que compõem ou regem a tradução intersemiótica, assim como

sua definição por meio do referencial teórico permeia a primeira parte do trabalho. A escassez

de material bibliográfico abordando a tradução intersemiótica no campo indígena nos forçou,

beneficamente, a buscar elementos paritários e/ou transversais em outras áreas do

conhecimento, como a Linguistica, Letras, História, Antropologia e Arquitetura. O referencial

teórico baseia-se principalmente em trabalhos recentes, que vão de monografias de conclusão

de curso a teses de doutorado diversas.

A segunda parte do trabalho mostra como os akwẽ representam sonora e graficamente

os dois partidos da corrida de toras. A utilização do triângulo e do zigue-zague representando

os partidos Htâmhã e Stêromkwa, respectivamente é exemplificada com a colaboração do pajé

Antônio Miró (Mirkopte xerente) nos cânticos e de Manoel Moreno Xerente (Waikazapari

xerente) nos grafismos, além de fotografias de cenas onde o grafismo está presente.

A terceira parte do trabalho detém-se em como o akwẽ (aqui na figura do pajé Miró)

traduz tanto o canto quanto o grafismo referente à corrida de toras. A tradução para o

português foi realizada pelo aluno de Comunicação Social Manoel Moreno Xerente, também

autor deste trabalho.

Na conclusão do trabalho evidencia-se que a tradução intersemiótica é algo inerente à

visão de mundo do povo akwẽ, devido principalmente à dualidade de sua visão de mundo.

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2 Definindo termos

A tradução intersemiótica é, grosso modo, a forma como um signo é transmutado

(traduzido) em outro. Diniz (1998) destaca que este tipo de tradução é definida como

“tradução de um determinado sistema de signos para outro sistema semiótico”. Bernardo

Rodrigues Espíndola, por sua vez, ao tratar de adaptações fílmicas, conceitua a tradução

intersemiótica sob a ótica peirceana que se baseia nos conceitos de primeiridade, secundidade

e terceiridade. A partir disso, discorre sobre os processos que envolvem a tradução

intersemiótica:

[...] retomamos alguns pontos comentados acerca das adaptações, que compreendemos como um processo que envolve criação – dimensão estética –, transferência – dimensão transpositiva – e intertextualidade – dimensão contextual. Ao se observar a dimensão estética da adaptação, atenta-se àquilo que é próprio do filme e que confere a ele o status de obra de arte autônoma; atentando-se à dimensão transpositiva, analisam-se os elementos que se transpõem de uma obra para a outra e como se rearranjam ao longo desse processo, numa relação direta entre livro e filme; já a dimensão contextual refere-se aos aspectos transtextuais da adaptação que interferem no modo como livro e filme dialogam com outros textos e com a própria tradição. (ESPÍNDOLA, 2008, p. 9)

Lúcia Santaella no livro “O que é semiótica?”, da série “Primeiros Passo”, da editora

Brasiliense, analisa a semiótica e a semiologia sob as lentes saussureanas e peirceanas e traz a

lume que o crescimento dos meios de comunicação de massa fizeram pressão para que

houvesse uma ciência que explicasse as distintas linguagens veiculadas em diferentes meios, o

que pode-se entender como tradução intersemiótica – enquanto tradução entre signos,

[...] e que desse conta, antes de mais nada, de um instrumental teórico mais apto a desvendar a complexa natureza intersemiótica da arte e da literatura modernas. Contudo, esse instrumental, desde sua origem, a Semiologia tomou de empréstimo à Lingüística. Nessa medida, a teoria semiológica de extração lingüística caracteriza-se pela transferência dos conceitos que presidem à análise da linguagem verbal-articulada para o domínio de todos os outros processos de linguagens não-verbais. (SANTAELLA, 1983, p. 16-17)

Siane Paula de Araújo (2012), assim como a maioria dos autores, volta-se para Peirce

(2008) para definir que o signo é

[...] Qualquer coisa que conduz alguma outra coisa (seu interpretante) a referir-se a um objeto ao qual ela mesma se refere (seu objeto) de modo idêntico,

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transformando-se o interpretante, por sua vez, em signo, e assim sucessivamente ad infinitum[...] (PEIRCE, 2008).

E raciocina que

[...] A partir disso, pode-se pensar a semiose como um processo também ilimitado, resultado das interações cognitivas que ocorrem entre objeto, signo e interpretante, gerando alguns tipos de signos. Assim, existem incessantes possibilidades de leitura das relações sígnicas triádicas de uma obra[...]. (ARAÚJO, 2012, p. 2)

Entendendo assim que a tradução intersemiótica é permeada de diveros

conceitos é que no trabalho de graduação de Débora Barocas, Eliane de Oliveira Serpa Reis,

Jadir dos Ramos Reis, Rosa Adriana de Oliveira Soares Dias e Tatiana Eiras Gil, pela

Universidade Metropolitana de Santos (Unimes), definiu-se que as pinturas corporais

indígenas são grafismos abstratos, porque a representação

[...] é sempre concreta e rica de significados para a cultura indígena. Na representação indígena somente a essência precisa ser mostrado, num desenho de peixe risca-se apenas as espinhas (estrutura principal) e se repetem infinitamente sem que nunca se perca o significado. Vai do micro ao macro, do homem ao espírito, do chão ao cosmo. (p. 10)

Para Rafael José de Menezes Bastos (2007) a música tem papel relevante na

composição intersemiótica indígena. Ele aponta que as músicas são a representação dos

grafismos:

as canções são a tradução sonora, reversível, de motivos pictóricos. Assim, pode-se até dizer que estes seriam a transcrição visual daquelas, que são, portanto, sua partitura, notação musical (diga-se: non mensurata). (BASTOS, 2007)

Assim, tanto música quanto os grafismos indígenas têm suportes teóricos importantes

na literatura voltada para a semiótica. A tradução intersemiótica – segundo o olhar acadêmico

– é para os akwẽ algo natural e automático, conforme veremos no desenvolvimento deste

estudo.

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3 Grafismo e canto

O trabalho consistiu da captação de áudio na aldeia indígena xerente Porteira, no

município de Tocantínia, no dia 21 de abril de 2012. O pajé Antônio Miró (Mirkopte xerente)

cantou os cantos dos partidos Htâmhã e Stêromka da corrida de toras. O estudante Manoel

Moreno Xerente providenciou a transcrição gráfica dos cantos.

Os grafismos, que podem ser conferidos abaixo, representam as metades principais

na simbologia xerente da corrida de toras.

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A mesma representação pode ser conferida na pintura indígena corporal, presente

durante as festividades em que há corrida de toras – à esquerda pintura Htâmhã e à direita a

Stêromkwa:

No canto indígena a representação é a seguinte:

Clã Htamhã (triângulo) Kahã tô Wanõrte kané hã te te (2x) Rom pse te za Wanẽnĩ Wanẽnĩ Clã Steronkwa (zigue-zague) Kahã za to Kruite za to Kbure WaiKruite ĩn za to Wanẽnĩ Kruite (áudio captado por Samuel Lima Gomes de Barros em 21/abr/12, disponível em DVD e no Youtube, no endereço https://youtu.be/HGMZAmbjXXI)

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4 Tradução xerente

A tradução intersemiótica se dá de forma natural entre os xerente visto que uma coisa

é intrínseca à outra e tem importância dentro do sistema patrilinear deste povo indígena. Na

tradução dos cantos clânicos da corrida da tora grande, o pajé Miró faz a cantoria final e que

representam (ambos os cantos) a simbologia gráfica do triângulo e também das listas em

zigue-zague. Conforme a cosmologia, remetem à sucuri (zigue-zague) e ao jabuti, segundo

informa Valci Xerente (2001).

TRADUÇÃO DOS CANTOS Clã Htamhã (triângulo) Kahã tô Wanõrte kané hã te te (2x) Rom pse te za Wanẽnĩ Wanẽnĩ Tradução: Agora esse vai ficar irritado Então agora todos vamos embora vamos embora então! vamos deixar! vamos deixar! Clã Steronkwa (zigue-zague) Kahã za to Kruite za to Kbure WaiKruite ĩn za to Wanẽnĩ Kruite Tradução Esse agora é o nosso. É assim... é o nosso Isso é coisa boa! Coisas boas virão, então vamos!

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5 Conclusão

Partindo-se do conceito de que a tradução intersemiótica é a mudança de um signo

para o outro, o povo akwẽ o realiza de modo muito particular e natural. A visualização do

signo gráfico remete, conforme constatado no levantamento, ao canto correspondente.

Existem outras modalidade de tradução intesemiótica que podem ser abordados em

trabalhos posteriores – como a tradução entre o canto, a dança e o próprio grafismo. Também

pode ser alvo de estudo a nomeação dos nomes indígenas e suas significação gráfica, assim

como as representações clânicas que referem-se aos rituais de nomeação, casamento e outras

instâncias próprias do povo akwẽ.

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6 Referências

DINIZ. Thaís Flores Nogueira, Tradução intersemiótica: do texto para a tela in Cadernos

de Tradução / Universidade Federal de Santa Catarina. Centro de Comunicação e Expressão.

G.T. Tradução. — n° 3 (1998) Florianópolis: G.T. Tradução, 1996. V.; 21 cm. pp 313-338.

Fonte: <http://www.thais-flores.pro.br/artigos/PDF/trad%20inter%20texto%20tela.pdf>.

Acesso em 08 de outubro de 2012.

ARAÚJO, Siane Paula de. Tradução intersemiótica e dança. Semeiosis: semiótica e

transdisciplinaridade em revista. Disponível em: <http://www.semeiosis.com.br/u/57>.

Acesso em 08/novembro/2012.

PEIRCE, Charles Sanders. Semiótica. 4ª Ed. São Paulo: Perspectiva, 2008.

BAROCAS, Débora; SERPA REIS, Eliane de Oliveira; RAMOS REIS, Jadir dos; DIAS,

Rosa Adriana de Oliveira Soares; e GIL, Tatiana Eiras. O grafismo pintura corporal

indígena. Revista Científica de Educação a Distância, Vol.3 – Número 5 – DEZ. 2011.

Universidade Metropolitana de Santos (Unimes).

BASTOS, Rafael José de Menezes, Música nas sociedades indígenas das terras baixas da

américa do sul: estado da arte. MANA 13 (2): pp. 293-316, 2007, Fonte:

<www.scielo.br/pdf/mana/v13n2/01.pdf>. Acesso em 07/nov/2012

XERENTE, Valci Sinã. Nomes próprios do povo akwẽ-xerente. Projeto Extra-escolar.

Goiânia, 2011.