TRABALHO E EDUCAÇÃO NA SOCIEDADE … · ... como as cidades de Francisco Beltrão, ... Segundo o...
Transcript of TRABALHO E EDUCAÇÃO NA SOCIEDADE … · ... como as cidades de Francisco Beltrão, ... Segundo o...
1
TRABALHO E EDUCAÇÃO NA SOCIEDADE
CONTEMPORÂNEA: POSSIBILIDADES DE PESQUISA A
PARTIR DA PENITENCIÁRIA INDUSTRIAL DE
GUARAPUAVA.
Vanessa Elisabete Raue Rodrigues
Universidade do Centro Oeste – UNICENTRO
Carlos Herold Junior
Universidade Estadual do Centro-Oeste – Unicentro.
RESUMO
Tratam-se de resultados preliminares de uma pesquisa desenvolvida em stricto sensu
com título “A relação entre Trabalho e Educação no Sistema Prisional” vinculada à
linha de pesquisa “Políticas Educacionais, História e Organização da Educação” do
curso de Mestrado em Educação da Universidade do Centro Oeste com foco na
Penitenciária Industrial de Guarapuava. Utilizando o método histórico dialético,
lançamos mão de levantamento bibliográfico e documental, além de apontamentos
baseados na experiência profissional de um dos autores na instituição desde 2002.
Verificou-se, portanto, alguns dos apontamentos relacionados a construção histórica da
instituição a partir de 1999, objetivando criar condições para desvelar as conexões entre
a educação e o trabalho. A partir da presente reconstrução histórica, será possível a
continuidade da investigação.
Palavras-chave: Reinserção social, sistema prisional, trabalho, educação,
Guarapuava.
Introdução
O estado do Paraná conta, atualmente, segundo dados da Secretaria de
Justiça, Cidadania e Direitos Humanos (PARANÁ, 2013) com 33 estabelecimentos
penais, sendo três destinados a presas mulheres e 30 a presos homens. Destas
instituições, 12 situam-se na capital do Estado e área metropolitana, ficando o
restante distribuídos nas demais regiões, como as cidades de Francisco Beltrão,
Cruzeiro do Oeste, Ponta Grossa, Londrina, Maringá, Foz do Iguaçu, Cascavel,
Lapa e Guarapuava. De todas, somente uma delas é destinada a tratamento médico :
trata-se do Complexo Médico Penal, antigo Manicômio Penitenciário, que se
encontra em Curitiba. Sete são destinadas ao cumprimento de pena em regime
semiaberto, classificadas como unidades de segurança média. Com exceção à
Unidade Penal de Cruzeiro do Oeste que não consta nos dados, pois foi inaugurada
2
no ano passado, as 24 restantes, conforme dados consolidados de 2008 presentes no
site do Ministério da Justiça (BRASIL, 2013,) são estabelecimentos destinados ao
regime fechado. Sendo considerados e observados como estabelecimentos penais de
segurança máxima.
O Estado possui ainda uma peculiaridade, um pioneirismo que compõe, hoje,
somente seis unidades penais de regime fechado do país: a proposta de
disponibilização do trabalho industrial interno para presos que ainda estão sob o
regime de segurança máxima:, as penitenciárias industriais.
A possibilidade de atividades laborais na prisão visa promover um olhar
diferente em relação à pena em regime fechado. As penitenciárias com
características industriais num espaço de segurança mais rígida mudam o
entendimento que aparece na classificação da Lei de Execuções Penais n° 7.210/84,
a qual indica no seu artigo 91, que o trabalho seja propiciado somente a partir do
regime semiaberto, observando os espaços das Colônias Agrícolas, Industriais ou
similares como instituições de uma pena em progressão, mais amena.
É importante salientar, que o trabalho do preso condenado é previsto,
conforme o artigo 28, como dever social e condição de dignidade humana com
finalidade produtiva e educativa, ficando os procedimentos sujeitos à atividade
laborterápica no período diurno e reclusão noturna.
Em 1999 inaugura-se a primeira penitenciária industrial do país instalada no
município de Guarapuava, tendo no planejamento do Governo do Estado o intuito,
segundo Garani (2011, p.26), da interiorização das unidades penais, fazendo com
que o preso ficasse mais próximo de sua família ou local de origem e da
ressocialização por meio do trabalho, profissionalização e educação, melhorando as
condições para sua reintegração à sociedade.
A inauguração dessa instituição e seu apelo reformador pautado no trabalho
forma o campo empírico e institucional de uma pesquisa em curso no Programa de
Pós-graduação em Educação da UNICENTRO. Se neste texto apresentamos
resultados parciais relativos à construção histórica da instituição e os debates por
ela gerados na região de Guarapuava, a intenção maior dos estudos é analisar como
se relacionam as categorias trabalho e educação no sistema prisional. Acreditamos
na importância dessa temática, por ela poder fornecer subsídios interessantes sobre
o lugar do trabalho na educação da atualidade, sem perder de vista que esse lugar é
permeado pelas diferentes perspectivas classistas que se tensionam no cenário
3
político, econômico e educacional. Nesse sentido, enxergamos que o sistema
prisional é um locus muito privilegiado para focalizarmos problemas sociais
oriundos de uma sociedade excludente que vê na educação a possibilidade de
contornar limites estruturais que se manifestam, obviamente, nos índices de
violência, crime etc., bem como na fragilidade do sistema prisional e seu problemas
estruturais que levam segundo SILVA (2009) a reforçar o sentido inverso do
propósito de recuperação.1
Os dados obtidos no desenvolvimento deste levantamento histórico são, em
parte, resultantes de uma pesquisa bibliográfica e documental, especificamente,
jornais locais e revistas, bem como relatos de experiência. É necessário esclarecer
que a que a Instituição Penal citada é o local de atuação de uma dos autores desde
2002, tendo nela exercido as funções de pedagoga da referida instituição e
pedagoga do centro de educação de ensino, atualmente instalado dentro da
instituição penal para atender a demanda de jovens e adultos que ainda não
concluíram o ensino fundamental e o ensino médio.
Para apresentarmos, então, os primeiros resultados da pesquisa que hoje está
em andamento, este texto foi dividido em dois momentos: o primeiro apresentará o
processo histórico inicial da Penitenciária Industrial de Guarapuava, antes mesmo
de sua construção, observando o posicionamento da comunidade local e os
encaminhamentos do Governo do Estado diante da possibilidade da construção de
uma penitenciária no interior. E o segundo momento, que seguirá após a
inauguração da Unidade Prisional, delineando o percurso tomado na proposta de
tratamento penal, observando a ênfase dada ora à educação ora ao traba lho, e a
trajetória desta proposta tendo por base as mudanças de administração do Governo
do Estado.
A Primeira Penitenciária Industrial do Estado: antes da inauguração...
A construção da penitenciária em Guarapuava encontrava-se no mesmo
projeto de uma outra penitenciária em Piraquara, na região de Curitiba. Em 1990, o
governador Álvaro Dias, com aval do Ministro da Justiça, Jarbas Passarinho,
anuncia o início das negociações de aproximadamente 6 bilhões de cruzeiros para a
1 Sobre propósito inverso o autor observa que a prisão, hoje, disposta, leva a degradação do ser humano
através dos problemas inerentes à própria à natureza do cárcece, como aspectos de isolamento da
sociedade extramuros e à convivência forçada no meio delinquente.
4
construção das duas penitenciárias citadas. Todavia, devido às fortes pressões
contrárias da Câmara dos Vereadores do Município e da Cooperativa Agrária, as
negociações não avançaram neste período.
Em 1991, a possibilidade é colocada novamente em pauta pelos meios de
comunicação, conforme o Jornal Esquema Oeste deste ano. Contrariedades entre
partidos políticos permeavam as discussões da construção de uma penitenciária no
município. Naquele período, o deputado Élio Dalla Vecchia afirmava, conforme
entrevista no jornal citado, que o deputado estadual Cezar Silvestri, do PDT, tinha
auxiliado o município a livrar-se da penitenciária. Ainda nesta direção, afirmou
que, ao receber do Governador Sr. Roberto Requião, do Secretário de Justiça e
Cidadania do Paraná, Sr. Goyá Campos, e do Secretário do Planejamento e
Coordenação Geral, Sr. Carlos Artur Krüger, a correspondência com a solicitação
de apoio à construção de uma penitenciária no município, ficou indignado e enviou
um telex manifestando, segundo a reportagem do jornal, “o posicionamento
contrário da comunidade guarapuavana, pelo desagravo em confrontá-la com
problemas que lhe é estranha aos seus costumes e a suas vidas” (ESTECHE, 1991,
p.01).
No projeto, sua construção estava destinada à localização das margens da PR
170 na Chapada do Jordão, entre a cidade de Guarapuava e o distrito de Entre Rios,
num terreno de 6.000 metros quadrados e teria a capacidade de 494 presos, com um
custo avaliado entre R$ 4,5 milhões à R$ 5 milhões.
Segundo o Jornal Tribuna de maio de 1995, esse projeto mobilizou a opinião
pública contra sua implantação, pois a experiência com a Cadeia Pública do
município, que se localizava no centro da cidade, era particularmente depreciadora,
com muitas fugas, rebeliões e, inclusive, curtos sequestros de moradores dos
arredores da instituição prisional, quando em fugas, presos se escondiam da polícia
nas residências. Além disso, para a comunidade guarapuavana, a construção de uma
penitenciária faria com que muitos familiares de presos de municípios vizinhos
viessem morar próximo ao ente querido, causando supostamente um migração
criminal fazendo com que o preso, quando solto, não voltasse para seu local de
origem.
A localização prevista para a construção da penitenciária também era motivo
de polêmica pela diretoria da Cooperativa Agrária, pois o terreno ficava no caminho
que levava à empresa e esta reivindicava a obstrução da obra, justificando as
5
possíveis fugas de presos que fragilizariam a segurança do distrito Entre Rios, local
da Cooperativa.
No dia 29 de maio de 1995, no SESC local, convidados pelo Centro de
Direitos Humanos de Guarapuava, foram reunidas autoridades e lideranças
comunitárias para discutirem o projeto de implantação de uma penitenciária no
município, embora esta já estivesse prevista e aprovada no Orçamento do Estado,
com uma estimativa de início da construção naquele ano e término no prazo dos três
anos seguintes. Esta reunião aconteceu somente quando o prefeito da época, Sr.
Cesar Franco, desengavetou o projeto pedindo tempo para o Governo do Estado
com objetivo de consulta pública junto à população.
Nesse período, a característica da Penitenciária de Guarapuava estava
delineada com espaço laborterápico, mas não incluída nos programas de prisões
fábrica. Este programa era uma proposta de adaptação de prisões para o trabalho
industrial, idealizada pelo governador Jaime Lerner, o qual apresentava problemas
graves de implementação devido à escassez de espaço físico das instituições penais
do Paraná.
Desta reunião, as discussões levaram ao entendimento de que a penitenciária
somente seria possível se a gestão fosse repensada pelo Governo do Estado. A
administração, portanto, deveria ser diferente das outras penitenciárias que
apresentavam sérios problemas com a ociosidade dos presos. Deveria, segundo as
lideranças, ser uma penitenciária de recursos próprios onde os presos pudessem ter
atividades que sustentassem as famílias com um programa melhor elaborado.
Considerando a reorganização do projeto de construção e do próprio
atendimento proposto na futura inst ituição penal, atendendo também a proposta do
programa prisões fábrica, o Governo do Estado e o a Prefeitura de Guarapuava
destinaram outro espaço para a desapropriação e possível construção de uma
Penitenciária em formato industrial, sendo uma concordância com a Câmara dos
Vereadores que ela fosse construída no Centro de Desenvolvimento Industrial do
Município, o bairro CDI, o qual fica próximo a BR 277, na saída primária do
município e junto à pequenas fábricas de Guarapuava.
No terreno de 35.000 m2 era prevista a construção de 7.177,42 m
2, sendo
1.800m2 destinados à indústria instalada para produção, e o restante dividido em
dois refeitórios, cinco pátios de convivência, 12 quartos de visita íntima, um
berçário e um fraldário para a visita dos filhos, um consultório médico, um
6
consultório odontológico, três salas de aula, seis salas de atendimento técnico, uma
lavanderia, uma biblioteca, uma cozinha, cinco canteiros de trabalho alternativo à
fábrica, 120 cubículo divididos em cinco galerias, espaços dest inados a abrigar e
proporcionar trabalho à 240 presos. A construção teria 80% dos custos
implementados provenientes de convênios com o Ministério da Justiça e 20% do
Governo do Estado, ficando a remodelagem do desenho arquitetônico industrial a
ser desenvolvido pelo Instituto Jaime Lerner, considerando as Diretrizes Básicas de
Arquitetura Penal da época.
A arquitetura apresentada no projeto se identificava com padrões antigos nas
suas galerias. Demonstravam um desenho característico de técnicas penitenciárias
ausburnianas do período de 1816 que, segundo Foucault (2012), eram compostas
com celas dispostas em duas linhas separadas por um corredor central. Mas o
enquadramento total do prédio disposto como uma arena demonstrava uma proposta
híbrida no espaço penal, embora observando a necessidade do enclausuramento
noturno, considerava o trabalho e educação com locais muitos bem definidos para
movimentação, o que identificava um projeto inovador no penitenciarismo.
Em maio de 1998, a construção da Penitenciária estava completa. Contudo
em janeiro de 1999 a instituição penal permanecia vazia, aguardando a definição da
fábrica que seria instalada para trabalho dos apenados. Nesta época, no Jornal
Diário do Povo (SANTOS, 1999) o novo Secretário de Justiça e Cidadania, Sr. José
Tavares, afirmava que a penitenciária diminuiria a quantidade de presos das cadeias
da região do município. Ela não seria, no entanto, destinada a qualquer preso, os
transferidos precisam ser pessoas com bom comportamento e que concordassem em
trabalhar.
Entremeio às pressões e discussões locais que colocavam em pauta os
benefícios e problemas de uma penitenciária no município, no Brasil a discussão no
campo jurídico se referia ao surgimento das propostas privatizantes do sistema
penal.
Segundo Garani (2011, p. 22) esta proposta surgiu no âmbito do Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça que, em
1992, propõe, formalmente, a adoção das prisões privadas no país como uma forma
de resolver os graves problemas de fuga, rebeliões e crimes contra os direitos
humanos. Esta proposta vinha dos resultados obtidos pelos considerados modernos
modelos dos estabelecimentos penais dos EUA, França, Austrália e Inglaterra e de
7
recomendações constantes no documento de 1981, referente à Convenção contra
Tortura e outros Tratos ou Penas dos Povos, e de 1990, que trata das Regras
Mínimas para o Tratamento de Presos, além da resolução da Organização das
Nações Unidas n° 24 que versa sobre a educação, capacitação e consciência
públicas na esfera da prevenção de delito.
Ainda conforme o Garani (2011, p.22) A privatização foi contestada pela
Ordem dos Advogados do Brasil, justificando que a execução da pena não poderia
ser transferida as empresas privadas, sendo função única e intransferível do Estado,
segundo a Constituição Federal. Diante destes apontamentos, a proposta é
arquivada em consenso com o Ministério e Conselho Federais.
Apesar das divergências federais e municipais, mas com uma breve abertura
do município de Guarapuava ao solicitar através das lideranças comunitárias, uma
nova proposta de gestão, o Estado do Paraná, segundo o Jornal Diário de
Guarapuava (SANTOS, 1999), sem qualquer justificativa, desconsidera a seleção
dos funcionários públicos feita anteriormente, e leva à frente a proposta apresentada
pelo Conselho Penitenciário junto ao governo federal, transformando a primeira
penitenciária industrial do país em primeira penitenciária industrial com serviços
terceirizados do país.
Em setembro de 1999, segundo o Jornal Diário de Guarapuava (SANTOS,
1999) é assinado o contrato de terceirização dos serviços na Penitenciária Industrial
de Guarapuava com a empresa Humanitas Administração Prisional. Neste mesmo
dia também foi firmado o protocolo de parceria com a empresa Azulbrás do
município de Arapongas, uma fábrica de estofados que ficara responsável pelo
trabalho dos presos no barracão industrial da instituição penal, destinado
exclusivamente para este fim.
Em outubro de 1999, depois de entrevistas feitas com uma equipe
multidisciplinar composta pelos profissionais de psicologia, assistência social,
chefia de segurança e direção, os primeiros noventa presos são transferidos da
Cadeia Pública do município para a penitenciária. Somente em novembro do
mesmo ano, dezoito meses depois da conclusão de sua construção, a primeira
penitenciária industrial do estado é inaugurada, com a presença do Governador
Jaime Lerner e do Secretário de Justiça e Cidadania, Sr. José Tavares.
8
Conceito de tratamento penal
Pensada e construída depois de muitos percalços, a penitenciária com serviços
terceirizados inicia suas atividades de tratamento penal. O trabalho laboral dos presos
como parte do programa de atendimento destinou-se a finalização da produção de
móveis, especificamente sofás.
Segundo o Jornal de Guarapuava (SANTOS, 1999), no início das atividades a
penitenciária representava um espaço de trabalho com cento e cinquenta profissionais
da empresa terceirizada Humanitas atuando no atendimento dos apenados, cinco
profissionais na empresa Azulbrás para suporte e fiscalização de produção e cento e
vinte presos na produção de estofados com a garantia de remição de pena, pois segundo
a Lei de Execuções Penais no seu artigo 126 a cada três dias trabalhados, um dia deve
ser diminuído no tempo a ser cumprido pelo preso.
Visão parcial da Fábrica de Sofás Azulbrás no pavilhão Penitenciária Industrial de Guarapuava
Fonte: Revista Veja, ed. 1623 de 10/11/1999
Além do trabalho na fábrica, o andamento da penitenciária também dependia do
trabalho dos presos. Os canteiros laborais proporcionavam trabalho na lavanderia,
cozinha, panificadora, limpeza na ala de segurança e demais espaços de atendimento,
limpeza e distribuição dos tênis para as atividades de recreação.
Junto aos primeiros presos, também vieram os primeiros professores do Centro
de Educação à Distância – CEEBJA num atendimento semipresencial, até então da
Primeira Fase do Ensino Fundamental correspondente ao processo de alfabetização e
Fase sequencial. Estes se preparavam para atender uma demanda pequena de presos que
não estariam trabalhando.
9
Em janeiro de 2000, conforme o Jornal Diário de Guarapuava (SANTOS, 2000)
é criada a Vara de Execuções Penais e Corregedoria dos Presídios da comarca de
Guarapuava com uma jurisdição de 16 comarcas do interior do Estado, contemplado os
municípios de Cândido de Abreu, Cantagalo, Irati, Iretama, Mallet, Manoel Ribas,
Palmital, Pinhão, Pitanga, Prudentópolis, Rebouças, Reserva do Iguaçu, São João do
Triunfo, São Mateus do Sul, União da Vitória e Guarapuava. Estes municípios além de
serem atendidos pela Vara de Execuções Penais do município consequentemente
representavam grande parte das demandas da Penitenciária de Guarapuava,
considerando a proximidade no cumprimento de pena.
É interessante ressaltar ainda que, até 1995, só havia duas Varas de Execuções
Penais para todo o Estado do Paraná e no ano de 2000, além de Guarapuava foram
criadas mais duas varas de comarcas de Londrina e Maringá, totalizando somente cinco
para todo o Estado.
Neste ano, os professores retomam as atividades escolares, com uma ampliação
no atendimento. Inicia-se as aulas com o Primeiro e Segundo Segmento do Ensino
Fundamental e Ensino Médio. Este atendimento caracterizou-se por uma forma de
extensão na escolarização da Educação de Jovens e Adultos, chamado de PAC, Posto
Avançado do CEEBJA. Os PACs eram comuns em lugares mais afastados, onde não
havia escolas próximas para alunos desta modalidade. Para o CEEBJA Guarapuava era
a primeira experiência com homens presos.
Em 2002, com o fim do contrato com a empresa Azulbrás, a empresa não renova
suas intenções e retira seu maquinário do pavilhão da instituição penal. Neste mesmo
ano, duas empresas iniciam contrato com a Secretaria de Estado de Justiça e Cidadania,
utilizando a mão de obra de apenados dentro da Penitenciária Industrial de Guarapuava.
A empresa Fujiwara de calçados de Segurança, com sede em Apucarana, que utilizaria
parte do pavilhão industrial e a empresa local Estilo Palitos que embalava palitos de
sorvetes e uso médico e que utilizaria parte de um anexo do refeitório dos presos que
estava ocioso.
No início de 2003, com a posse do Governador Roberto Requião, a proposta de
Terceirização começa a ser debatida. Sendo enfático nas suas afirmações, o atual
governador afirmava não se conformar com o alto custo da privatização da penitenciária
e ainda indicava o aumento de 50% de presos no estabelecimento.
Em agosto deste mesmo ano, conforme o Jornal Diário de Guarapuava
(GODOY, 2003), a Juíza da Vara de Execuções Penais de Guarapuava, Sr.a Christine
10
Kampmann Binttencourt, começa um embate junto ao Governo do Estado e do
Secretário de Justiça e Cidadania, Sr. Aldo Parzianelo, objetivando manter o número de
presos conforme a lotação da penitenciária industrial e garantir que o projeto industrial e
de terceirização não fosse alterado. Assina ainda uma portaria que garantia a remição a
cada dezoito horas de estudos no ensino formal presenciais o preso aluno teria um dia
de pena remida. Isto proporcionava ao preso que estudava e trabalhava menos dias de
pena cumprida e menos tempo ocioso dentro das celas.
Neste período a Juíza da Vara de Execuções Penais teria algumas vitórias junto
ao governo do estado, convencendo o Governador de que o modelo não poderia ser
quebrado e que os índices mereciam consideração. Segundo o próprio governador “em
homenagem ao idealismo” da juíza, ele aguardaria mais estudos à respeito e ainda
acolheria a proposta de construção de uma Unidade Prisional que ficaria em anexo ao
sistema de regime fechado com a mesma administração industrial proposta pela co-irmã
penal.
Em 2004, as entrevistas feitas pela equipe de avaliação da PIG nas cadeias
públicas tinham algumas questões diferentes a serem observadas: o crime ou o tempo de
pena continuava a não ser ter nenhuma discriminação, continuava o fato de não poder
fumar, beber, usar drogas ou jogar cartas, mas a partir de então teria que ter interesse no
trabalho e nos estudos, pois as vagas eram disponibilizadas para todos.
Em julho de 2006, com o fim das prorrogações de contrato da empresa
terceirizada e justificando o fato da empresa descumprir com os contratos firmados
anteriormente relacionados à manutenção de equipamento de segurança e fornecimento
de materiais, o governo do estado retoma a administração das penitenciárias que
mantinham a cogestão, assumindo também a penitenciária de Guarapuava a qual
mantinha índices altos de atendimentos e baixos em reincidência, ressaltando nenhuma
rebelião ou fuga desde sua inauguração.
Os anos seguintes 2008, 2009 e 2010, teve seus reflexos frente ao atendimento
do Estado, com falta de alguns profissionais como Técnicos em Pedagogia. Contudo, o
ecos dos anos anteriores permaneceram na ação dos profissionais que assumiram as
atividades e daqueles que puderam continuar atuando seja como Processo Seletivo
Simplificado e, mais tarde, alguns que passaram pelo concurso público. A filosofia não
se perdeu e muito do que se inovava era parte da semente que fora plantada.
Um destes ecos repercutiu em 2009 com a instalação do Centro Estadual de
Educação Básica para Jovens e Adultos Nova Visão, um instituição escolar de ensino
11
formal, proposta em 2005 por profissionais que atuavam na Unidade Prisional e que
ansiavam por um atendimento próprio para sistema penitenciária, com um Projeto
Político Pedagógico elaborado especificamente para os alunos que estavam reclusos.
Junto a implementação da escola, a Vara de Execuções Penais assina uma nova
portaria referente à remição pelo tempo de estudo, incluindo a produção na escola como
fator importante e solicitando que junto às fichas de remição também sejam enviadas as
notas obtidas pelos alunos presos.
Em 2011, junto ao novo Governador Beto Richa, também assumem novas
propostas gerais de atendimento, agora não mais destinadas somente ao trabalho, mas à
educação. Neste ano, a presidenta Dilma Roussef assina a lei 12433 que promove a
alteração da Lei de Execuções Penais nos seus artigos 126 à 129, que dispõe sobre a
remição de parte do tempo de execução de pena por estudo ou por trabalho. No
documento, o preso poderá remir um dia de pena à cada doze horas estudadas no ensino
escolar ou curso profissionalizante. E se trabalhar poderá remir um dia à cada três dias
trabalhados. Sendo os dois compatíveis em relação ao período de trabalho e estudo, será
possível utilizar as duas atividades para remição de pena. Em suma, como já acontecia
no município de Guarapuava desde 2003, trabalho e estudo proporcionam a remição de
pena.
Propostas no ano de 2012 sinalizaram para a prioridade da educação com o
lançamento do Projeto Remição pela leitura, onde a cada livro lido e resenhado ou
resumido o preso teria um dia mensal remidos e com a implementação do Projeto já
executado extramuros Paraná Alfabetizado.
Em agosto, segundo o Jornal Diário de Guarapuava (ESSERT, 2012) a
Penitenciária Industrial, mantendo seu perfil pioneiro, junto ao Centro de Regime
Semiaberto, em parceria com a Universidade do Centro Oeste, inauguram as instalações
do curso de ensino superior de licenciatura em Arte Educação na modalidade à distância
junto ao projeto da Universidade Aberta do Brasil, atendendo 20 presos, sendo 10 no
regime fechado e 10 no regime semiaberto.
Ainda neste ano, o governo federal também determinou o prazo para envio dos
Planos Estaduais de Educação em Prisões com objetivo de concluir suas Diretrizes até
2014.
Neste ano de 2013, estudos estão sendo feitos e os CEEBJAs de sistema
prisional estão enviando propostas ao alterações e adaptações das propostas curriculares
para melhor atendimento no sistema prisional.
12
Considerações Finais
No contexto histórico da Penitenciária Industrial de Guarapuava desde antes da
elaboração do seu projeto até a atualidade foi possível identificar as mudanças de
conceito de pena e de direcionamento nas prioridades no tratamento penal. Além das
mudanças aqui não mencionadas relacionadas à aplicação de pena, o cumprimento desta
teve seus pilares fundamentados inicialmente no trabalho e disciplina, posteriormente na
categoria disciplina, trabalho e educação, sendo essa última a que tem mais ênfase hoje.
Embora tenha sempre no discurso a chamada ressocialização, ainda assim, necessitamos
de estudos mais aprofundados para entender o motivo pelo qual estas mudanças foram
se delineando. A abordagem não tem como objetivo defender uma ou outra categoria
proposta para reinserção social, nem mesmo justificar se a privatização ou o
atendimento público tem subsídios para cumprir com este objetivo. Temos como intuito
identificar como foram construídos estes conceitos no decorrer do seu período de
funcionamento e analisar, numa pesquisa posterior, quais políticas públicas delineavam
estas questões para compreender o processo prático de busca de reinserção social dos
apenados por meio do trabalho. Para nós essa ênfase na questão educacional no e pelo
trabalho mostra-se uma problemática de grande riqueza não apenas para a discussão
específica que ocorre sobre o sistema prisional, mas, sobretudo, dimensiona mais um
importante uso que é feito do trabalho na produção da “educação” daqueles que, a
priori, materializam em suas trajetórias os limites formativos existentes em uma
sociedade baseada na apropriação privada da riqueza socialmente produzida.
Referências
ALMEIDA, Delise Guarienti. Diário de Guarapuava. Governador Jaime Lerner cria
nova Vara de Execuções Penais. Ano II. ed. 0279. 08 e 09 de jan. 2000. p. 03
BRASIL, Ministério da Justiça. Dados Cadastrais de Instituição Penal. Disponível
em:http://www.brasil.gov.br/linhadotempo/html/tema/lista_epocas?tema=Hist%C3%B3
ria%20do%20Brasil. Acesso em 09 jul. 2013.
________, Lei de Execuções Penais n.° 7.210 de 11 de julho de 1984. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm. Acesso em 10 jan. 2013.
________, Lei 12.433 de 11 de junho de 2011. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/lei/l12433.htm. Acesso em
10 jan. 2013.
13
ESSERT, Harald. Unidades Penais de Guarapuava oferecem curso superior. Diário de
Guarapuava. ano XIII edição 3404. 01 de ago. 2012. p.12
ESTECHE, Paulo. Construção da Penitenciária mobiliza opinião pública. Jornal Tribuna de
Guarapuava. Guarapuava. ano I . ed. 0034. 29 abr à 05 de maio. 1995. p. 11
_______________. Comunidade é a favor da Penitenciária. Jornal Tribuna de Guarapuava.
ano I . ed. 0035. 06 à 12 de maio. 1995. p. 11
FARAH, Julio Leonel. Justiça garante que penitenciária não saí. Jornal Esquema d’ Oeste
Guarapuava. ano XXII . ed. 1068. 17 à 23 de agost. 1991. p. 01
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão; tradução de Raquel
Ramalhete. 40.ed. Petropolis, RJ: Vozes, 2012.
GARANI, João Peixoto. Privatização de prisões no Brasil. In: Revista Jus Navigandi.
Teresina, ano 16, n. 2989. 7 set. 2011. Disponível em:
<http://jus.com.br/revista/texto/19945/privatizacao-de-prisoes-no-brasil>. Acesso em: 1
jul. 2013.
GODOY, Manoel Alexandre de Jesus. Penitenciária Industrial não terá aumento no
número de detentos. Ano IV. ed. 1164. 02 à 03 de ago. 2003. p.18
PARANÁ. Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos. Estabelecimentos
penais. Disponível em:
<http://www.depen.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=133> Acesso
em: 9 jul. 2013.
SANTOS, Cláudio Augusto dos. Atraso no funcionamento de Penitenciária. Jornal
Diário do Povo. ano I . ed. 0033. 06 de jan. 1999. p. 05.
__________________________. Penitenciária do Povo começa a receber detentos.
Jornal Diário do Povo. ano I . ed. 0235. 30 à 31 out. 1999. p. 08.
__________________________. Inauguração da Penitenciária em Guarapuava é
destaque nacional. Jornal Diário do Povo ano I . ed. 0243. 13 à 14 nov. 1999. p. 10.
___________________________. Governo assina terceirização da Penitenciária
Industrial de Guarapuava. Jornal Diário de Guarapuava. ano I. ed.0197. 03 de set.
1999. p. 11.
SILVA, Haroldo Caetano da. Ensaio sobre a pena de prisão. Curitiba: Juruá, 2009.
VERANO, Rachel. Abaixo, uma penitenciária. In: Revista Veja. São Paulo, Editora
Abril, edição 1623, 10 de novembro de 1999, ano 32,nº 45. P. 135.
.