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------------------._-------------~ POlíTICA INTERNA E PATOLOGIA DA ORGANIZAÇAO TOM BURNS Êste estudo discute a interação dos diversos sistemas so- ciais existentes numa emprêsa, baseados nas condutas dos indivíduos (com as relações pessoais que tais condutas acarretam e os valôres que essas relações concretizam) en- quanto êsses indivíduos agem em busca de diferentes fins com os quais se comprometem, ou com os quais já se en- contram comprometidos, em virtude de sua posição na companhia. Referir-nos-emos a três dêsses sistemas: a organização ope- rativa, o sistema político e a estrutura de carreira. Ne- nhum dêles deve ser entendido, necessàriamente, como subestrutura da totalidade dos sistemas existentes, uma vez que, como veremos, cada qual pode ser manipulado de modo a servir os interêsses dos demais; daí têrmos nós preferido adotar a expressão "organização operativa" (working organization) em lugar de "emprêsa" ou, sim- plesmente, "organização", vocábulos que, na acepção de economistas e sociólogos,implicam um pressuposto de su- premacia e prioridade. A tendência atual, certamente, é a de atribuir maior importância ao estudo da organização operativa e dos efeitos que sôbre ela exercem os outros TOM BURNS - Lente de Sociologia da Universidade de Edimburgo, Escócia, Nota da Redação: Reproduzimos êste artigo com autorização do autor e da Revista Sociologie du Travail, onde foi publicado, em francês, em abril de 1962 (ano IV, n.? 3, págs. 209-229). O original foi escrito em inglês, scb o título Ends and Means in Management InternaI Politics and Organiza'tional Pathology" E' traduzido por Flávio Penteado Sampaio.

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------------------._-------------~POlíTICA INTERNA E PATOLOGIA

DA ORGANIZAÇAOTOM BURNS

Êste estudo discute a interação dos diversos sistemas so-ciais existentes numa emprêsa, baseados nas condutas dosindivíduos (com as relações pessoais que tais condutasacarretam e os valôres que essas relações concretizam) en-quanto êsses indivíduos agem em busca de diferentes finscom os quais se comprometem, ou com os quais já se en-contram comprometidos, em virtude de sua posição nacompanhia.

Referir-nos-emos a três dêsses sistemas: a organização ope-rativa, o sistema político e a estrutura de carreira. Ne-nhum dêles deve ser entendido, necessàriamente, comosubestrutura da totalidade dos sistemas existentes, umavez que, como veremos, cada qual pode ser manipuladode modo a servir os interêsses dos demais; daí têrmos nóspreferido adotar a expressão "organização operativa"(working organization) em lugar de "emprêsa" ou, sim-plesmente, "organização", vocábulos que, na acepção deeconomistas e sociólogos,implicam um pressuposto de su-premacia e prioridade. A tendência atual, certamente, éa de atribuir maior importância ao estudo da organizaçãooperativa e dos efeitos que sôbre ela exercem os outros

TOM BURNS - Lente de Sociologia da Universidade de Edimburgo, Escócia,Nota da Redação: Reproduzimos êste artigo com autorização do autor e daRevista Sociologie du Travail, onde foi publicado, em francês, em abril de1962 (ano IV, n.? 3, págs. 209-229). O original foi escrito em inglês, scb otítulo Ends and Means in Management InternaI Politics and Organiza'tionalPathology" E' traduzido por Flávio Penteado Sampaio.

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sistemas, situação que se reflete no fato de nestes últimosanos ter-se desenvolvido a "Sociologia das Organizações"como ramo distinto das ciências sociais; mas, a história des-tas ciências, especialmente em contextos industriais, estárepleta de impasses, diante dos quais tropeçam os exper-tos em disciplinas psicológicas e sociais.

Essa observação é necessária porque êste estudo se-ocupa-rá, em sua maior parte, da ação do sistema político daemprêsa sôbre sua organização operativa. Portanto, é in-dispensável, primeiro, estabelecer de forma sumária a tesegeral acêrca dos principais aspectos da organização opera-tiva, tese essa já elaborada em estudos anteriores. 1

FUNCIONAMENTO DA ORGANIZAÇÃO OPERATIVA.

O conjunto de pessoas de uma emprêsa - diretores, ge-rentes e empregados - representa a soma dos recursoshumanos que essa emprêsa canaliza para a consecução deseus fins. Êsses recursos e sua utilização sistemática cons-tituem a organização operativa. Em se considerando iso-ladamente os fins da emprêsa, cada indivíduo põe, a ser-viço desta, parte de suas aptidões totais e recebe, em con-trapartida, parte dos rendimentos da emprêsa.

A exploraçijo sistemática dêsses recursos na realização dosfins da emprêsa tem sido tradicionalmente concebida emtêrmos de burocracia. Parece, no entanto, que essa for-mulação é um tanto limitada pelo tempo, como o são ou-tras generalizações do mesmo gênero; seria ela mais apro-priada à segunda fase do desenvolvimento industrial. 2

Quando, certa vez, tentamos elucidar o que se passava comalgumas indústrias eletrônicas, condicionadas a um ritmode evolução comercial e de progresso técnico muito mais

1) TOM EURNS e G. M. STALKER, The Management oi Innovation, Tavis-tock Publications, Londres, 1961, e~pecialmente os capítulcs 5 e 6, pâgs.

77 a 125.

2) TOM BURNS, The Sociology oi Lndustry , em ARGYLE GLASS, MORRIS eWELDFORD, edr., Societv, Londre:, 1962.

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R.A.E.!1! PATOLOGIA DA ORGANIZ.A!ÇÃO 169

rápido que o até então experimentado, tivemos de recorrera dois "tipos ideais" de organização operativa: um, "me-cânico", adequado a circunstâncias relativamente estáveis;outro, "orgânico", próprio para condições instáveis.

Os sistemas "mecânicos" revelam tôdas as característicasatribuídas por Weber à burocracia, numa formulação curio-sa e significativamente semelhante àquela a que, indepen-dentemente, chegou Fayol e que diversos peritos em técni-cas administrativas desenvolveram. Os problemas e tare-fas com que as emprêsas se defrontam são tratados por se-tores especializados. Cada indivíduo executa a tarefa quelhe foi atribuída como se ela fôsse uma atividade distintadas tarefas reais da companhia como um todo; é como sesua tarefa fôsse objeto de um subcontrato. "Alguém decima" tem a responsabilidade de coordenar essa tarefa comas dos outros membros da companhia e de fazer com queela corresponda às necessidades desta última. Os méto-dos técnicos, as obrigações e os podêres associados a cadacargo são precisamente definidos: precisão e demarcaçãosão necessidades primordiais. As interações dentro da or-ganização operativa seguem linhas verticais, isto é, pro-cessam-se entre superiores e subordinados. As rotinas detrabalho para cada tipo de tarefa são reguladas por instru-ções e decisões emitidas pelos superiores. Essa hierarquiade autoridades repousa no pressuposto de que o conheci-mento de tôdas as informações concernentes à situação eao funcionamento da emprêsa, bem como da própria dis-posição que esta dê aos recursos humanos contratados parao seu serviço, compete - ou deveria competir - exclusi-vamente à direção. O sistema administrativo, sob essa for-ma de complexa hierarquia com a qual os organogramasnos familiarizaram, funciona como um sistema de contrô-le unitário: as informações sobem até ao ápice através deum sem-número de filtros; as decisões e as instruções des-cem até à base por intermédio de uma série de amplifi-cadores.

Os sistemas "orgânicos" adaptam-se a condições instáveis,nas quais surgem sem cessar, exigindo solução, problemas

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170 PATOLOGIA DA ORGANIZ~ÇÃO R.A.E.jll~~--------------------------~----------novos e desconhecidos que não podem ser subdivididos edistribuídos a setores especializados da organização hierár-quica. Os trabalhos a realizar não mais implicam méto-dos, responsabilidades e podêres estritamente definidos,tornando-se impossível a demarcação de funções precisa eduradoura. As responsabilidades, as funções, os métodose as competências de cada um precisam ser constantemen-te redefinidos em virtude das interações que se estabele-cem entre uns e outros quando da execução de tarefas co-muns ou da solução de problemas comuns. Tanto essastarefas coletivas como as atribuições individuais devem,assim, ser exercidas, levando-se em conta a situação dacompanhia concebida como um todo. As interações aquise processam não só verticalmente, mas, também, lateral-mente, e as comunicações entre pessoas de escalões hierár-quicos diferentes tendem a parecer mais consultas "late-rais" do que exercício "vertical" de autoridade. Não maispode o dirigente empresário arvorar-se em onisciente.

Para o indivíduo a diferença mais importante está na ex-tensão dos laços que o prendem à organização operativa.Os sistemas mecânicos, vale dizer, os "burocráticos", defi-nem as funções do indivíduo, bem como os métodos, res-ponsabilidades e podêres a elas inerentes; em outras pala-vras, traçam linhas demarcatórias. Ao mesmo tempo quedizem a cada um o que fazer e como fazer, também lheapontam o com que não deva ocupar-se, o que não sejade sua conta, o que não lhe compita, o que deva reconhe-cer, de uma vez por tôdas, como sendo de alçada alheia.No sistema orgânico, ao contrário, os apelos à atuação in-dividual não têm fronteiras. Dá-se maior ênfase à neces-sidade de que o indivíduo se sinta amplamente empenhadona execução de qualquer tarefa que surja em seu horizon-te, comprometido que está não apenas com o exercício deuma função específica, mas com o próprio sucesso das ini-ciativas e empreendimentos da companhia, de modo seme-lhante ao que sói acontecer com o médico ou com o cien-tista no desempenho de suas funções profissionais.

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RA.E./ll PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO 171FORMAS PATOLÓGICAS DO SISTEMA MECÂNICO

Quando estivemos estudando a indústria eletrônica daGrã-Bretanha, lidamos com emprêsas fundadas, na maiorparte, há mais de uma geração (durante, portanto, o apo-geu da segunda fase da era industrial) e estruturadas, deinício, com organizações operativas estribadas em princí-pios mecanicistas. Pudemos, então, verificar que, na maio-ria dessas emprêsas, ampliar o comprometimento do indi-víduo com a companhia e adaptar a organização operativaa essa nova situação só era possível parcialmente. Comefeito, a ideologia da burocracia formal parecia tão profun-damente enraizada na mentalidade dos dirigentes, que areação mais comum dêstes a essas novas e insólitas con-dições foi a de redefinir, em têrmos mais precisos e rigo-rosos, as atribuições e as relações de trabalho no contex-to administrativo, consoante as linhas ortodoxas dos orga-nogramas e dos manuais de organização, com o conseqüen-te refôrço da estrutura formal. Nessas companhias os es-forços envidados para fazer o sistema burocrático orto-doxo funcionar - porque êsse era visto como o únicomodo possível de organização e, também, porque a polí-tica de maior comprometimento para com a emprêsa fôrarejeitada como utópica ou nem sequer considerada seria-mente - provocaram o que poderíamos denominar formaspatológicas do sistema mecânico.Descreveremos aqui três dêsses sistemas, que constituemreações à necessidade de encontrar respostas a situaçõesimprevistas e de tomar decisões em circunstâncias novase incertas.1. Numa burocracia administrativa o procedimento nor-malmente prescrito para lidar com qualquer matéria forados limites da responsabilidade funcional de alguém é en-caminhá-la ao ponto do sistema onde todos entendam queaquela responsabilidade se situe, ou, se falhar essa provi-dência, submetê-la à apreciação do superior hierárquico.Quando as condições mudam ràpidamente em comparaçãoao passado, tais episódios tornam-se mais freqüentes; emmuitos casos, o superior imediato outra coisa não faz senão,

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por seu turno, submeter tais questões a superiores de nívelmais elevado. Destarte, grande número de questões de-pendentes de solução e decisão acabam sendo levadas àcúpula administrativa. Não é raro que em tais circunstân-cias se desenvolva um sistema pelo qual grande númerode executivos passam a acreditar, ou a proclamar, que sópodem obter solução para seus problemas mediante con-sultas à autoridade máxima da companhia.

Em algumas emprêsas desenvolve-se, ainda, um sistemaambiguamente composto, por um lado, de uma hierarquiaoficial de poder e responsabilidade e, por outro, de umcomplexo, aberto ou clandestino, de relações pessoais entrea autoridade máxima e algumas dezenas de funcionárioslotados em diferentes posições dentro da escala hierárqui-ca. O dirigente fica, assim, sobrecarregado de serviços, eos outros executivos, cujo prestígio e eficiência dependedo funcionamento da hierarquia formal, se ressentem porestar sendo subestimada a sua autoridade. Eis quandoêsse dirigente descobre por si mesmo, ou ouve de consul-tores, que seria conveniente delegar alguns de seus podê-.res e responsabilidades de decisão. Em conseqüência, re-forma-se o organograma. Mas, inevitàvelmente, à medidaque se reproduz a corrente de problemas novos e desco-nhecidos, essa estratégia provoca contra-ataques por partedos beneficiários do regime anterior, mercê do qual podiamusufruir, dissimuladamente, de uma autoridade extra-oficial.

Os efeitos das disparidades entre os dois sistemas refle-tem-se na eficiência do funcionamento da emprêsa. Oconflito que se estabelece entre os executivos, ao veremseu prestígio e suas perspectivas de progresso dependeremda predominância dêste ou daquele sistema, desvia suaatenção e seus esforços para o âmbito da política interna.Ambos os processos afetam sensivelmente o tempo e asatividades administrativas do dirigente, antes aplicadosnas tarefas próprias de sua posição, sobretudo porque tôdasessas intrigas políticas visam a controlar o acesso das pes-soas ao seu gabinete, tal como aconteceu no conflito polí-

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R.A.E./11 PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO 173

tico do Japão feudal, concentrado em tôrno dos meios ca-pazes de assegurar o contrôle sôbre o Imperador.

2. Outras companhias procuram, à guisa de solução, mul-tiplicar os escalões da hierarquia burocrática. Grande nú-mero de suas dificuldades manifestam-se ligadas a defi-ciências de comunicações, e são enfrentadas, em geral, pelaintrodução de intermediários e intérpretes: engenheiros demétodos, equipes de padronização, engenheiros de revisãode projetos etc ..

Originando essa conhecida estratégia há duas característi-cas igualmente familiares da mentalidade administrativa(managerial thinking) . A primeira consiste na procura desolução de um problema, especialmente o de comunicações,com a contratação de alguém para cuidar dêle. Criam-senovos cargos e, em certos casos, um departamento inteiro,sendo que a sobrevivência dêste ou daqueles passa a de-pender do perpetuamento das dificuldades que os hajammotivado. A segunda, certamente derivada das tradiçõesda administração da produção, é aquela segundo a qual éimpossível dissociar o trabalho do instrumento que o con-dicione; assim, seria inadmissível, por exemplo, que o en-genheiro de programação pudesse estar executando o tra-balho para o qual é pago sem estar, junto à sua bancada,fazendo algo com as mãos; da mesma forma, quanto 0.0

projetista, se êste não estivesse desenhando, junto à suaprancheta, e assim por diante.

É comum, de fato, em muitas emprêsas, perturbar-se adireção ao tomar conhecimento de que esta ou aquela pes-soa esteja circulando pelo recinto de trabalho, ou ao veri-ficar que certos funcionários, quando chamados, não seencontram "a postos". Tais dirigentes recusam-se a serque seus subordinados estejam ocupados em assuntos liga-dos ao seu trabalho quando êstes não estejam, visível efisicamente, "no trabalho". Reagem, por isso, fixando osfuncionários em seus postos e, se admitida a necessidadede melhores comunicações, contratam, como encarregadosdestas, especialistas no assunto.

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174 PATOLOGIA DA ORGANIZAlÇAO R.A.E./ll

3. Um terceiro comportamento patológico foi encontra-do, porém só ocasionalmente, nas emprêsas incluídas noestudo; sua incidência esporádica em certo número deemprêsas foi vista como sintoma de uma enfermidade ca-racterística da administração pública. Êle é, no entanto,de particular interêsse, uma vez que - como seu nomesugere - o "comitê" é um meio tradicional pelo qual osencargos, mais amplos e elevados que os capsulados numpapel funcional isolado, podem caber dentro do sistema eser desempenhados sem sobrecarga das demandas normaisde responsabilidades permanentes de cada um dos funcio-nários e sem expor a risco o equilíbrio de seus comprome-timentos para com a organização.O aparecimento de novos tipos de tarefa, decorrentes deproblemas incomuns, pode parecer, ora um fenômeno tem-porário, ora uma dificuldade que implique responsabilida-des e podêres de tal natureza que ultrapassem a capaci-dade de uma só pessoa ou um só departamento. Ê o casotípico das hierarquias burocráticas, onde a maior partedas considerações estão relacionadas, por via de regra, coma estrutura de carreira proporcionada pela entidade (si-tuação que não se confina ao serviço público civil, nemtampouco às universidades). Com a finalidade de superara dificuldade causada pela aparente necessidade de umnôvo cargo para atender a responsabilidade extra, cria-seum órgão superindividual: um comitê.

A TEORIA DOS TR~S COMPROMISSOS

Definir dois "tipos ideais" e contrapostos de organizaçãooperativa e sugerir a existência de uma taxionomia de va-riantes e de tipos patológicos é apenas encetar a análise.A questão que imediatamente se interpõe é a seguinte:porque certas emprêsas - a maior parte, aliás, das quejá mencionamos - não mudam sua organização operati-va, de mecânica para orgânica, à medida que o contextotécnico e comercial de suas atividades passa da estabili-dade para a mudança? A resposta parece residir no fatode que os compromissos do indivíduo para com a compa-

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R.A.E./ll PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO 175

nhia não se restringem aos laços que a ela o prendem naqualidade de "recurso" da organização operativa. Êle é,também, membro de um grupo ou seção cujos interêssesespecíficos estão em conflito com os de outros grupos ouseções; e é, ainda, um entre muitos para quem a posiçãoque ocupam, comparativamente à dos outros, constituiobjeto de intensa preocupação, por representar suas pos-sibilidades de acesso a posições mais altas e seguras. Êstesdois. últimos compromissos envolvem o indivíduo em sis-temas de fins e meios que lhe oferecem diferentes modosde atender seus interêsses próprios, no esquema das fun-ções definidas em seu contrato de trabalho, por fôrça decujas cláusulas está êle, de uma forma ou de outra, obri-gado a fazer uso de si mesmo como um recurso a serviçoda emprêsa, desta recebendo, em contraprestação, salárioe outros incentivos.1. Quanto aos compromissos grupais e secionais, o indi-víduo pode preocupar-se - e geralmente se preocupa, defato - com ampliar o contrôle sôbre sua própria situação,aumentando o valor de seu concurso pessoal a favor daemprêsa e buscando alcançar posições onde os "recursos"que êle julga possuir possam ser melhor aproveitados e,conseqüentemente, melhor recompensados. Êle pode preo-cupar-se, também, - e realmente se preocupa - comampliar sua influência pessoal, seja aproximando-se depessoas e equipes que detenham os mesmos recursos e al-mejem fortalecer seu poder de permuta, seja ganhando aconfiança do "homem forte" da companhia. Naturalmen-te, essas associações o envolvem em compromissos maisamplos do que os de natureza contratual. De maneiragenérica, êsses compromissos são ditos "políticos". Os gru-pos de interêsse assim formados se identificam com os de-partamentos ou com os grupos dominantes, e seus líderes"políticos" são os próprios chefes oficiais dêsses departa-mentos. Os movimentos em que êles intervêm nascem dereivindicações, entre si conflitivas, tôdas visando à distri-buiçãodos rendimentos da emprêsa e de seus recursos dis-poníveis (ou "alocação" de capital), à direção das ativida-des alheias (autoridade para sancionar e orientar a ação

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17ô PATOLOGIA DA ORGANIZAiÇÃO R.A.F /11

de outros indivíduos, grupos ou departamentos) e à patro-nagem (poder pessoal de nomear e promover funcionários,de outorgar 'direitos e de conceder privilégios) .

2. Outra espécie de compromisso individual, conquantonão necessàriamente diferente do anterior em seus fins úl-timos, é essencialmente autista, isto é, diz respeito às obri-gações do indivíduo para consigo mesmo, à defesa e à me-lhoria do status de cada um. Efetivamente, o indivíduocostuma atribuir à sua carreira pessoal importância com-parável à prosperidade da emprêsa. Pode ser que entreesta e aquela não haja, a rigor, incompatibilidade e queambas possam ser atendidas paralelamente; surgem, con-tudo, situações em que os interêsses pessoais não coinci-dem com os da emprêsa ou, até mesmo, entram em con-flito aberto com êstes.

Se reconhecermos que a grande maioria, se 'não a totali-dade, dos membros de uma organização operativa têmcompromissos dessa espécie para com êles mesmos, ser--nos-á evidente que as relações e condutas atinentes a êssescompromissos se ajustam de tal modo a outras da mesmaespécie existentes na companhia, que não seria temerárioafirmar a existência, dentro da emprêsa, de outra estru-tura de carreira, de outra organização operativa, de outrosistema político. Êsses três sistemas existem em tôdas asemprêsas, e agem e reagem sôbre os outros; o sistema po-lítico e a estrutura de carreira influenciam, particularmen-te, a constituição e o funcionamento da organização ope-rativa.

Impõem-se-nos, a est'altura, duas ressalvas. O sistema tri-partite de compromissos, a que acabamos de aludir, não énecessàriamente exaustivo, nem equilibrado. Além doscompromissos para com a companhia, para com os grupos"políticos" e para com suas perspectivas de carreira, cadaum dos membros dessa coletividade, que é a emprêsa, estáenvolvido numa multiplicidade de outras relações. Algu-mas resultam de incompatibilidades ou afinidades de ori-gem social ou cultural. Outras são geradas por contatos

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RA.E,Jll PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO 171

humanos motivados pelo desejo de amizade, de confôrtoe de popularidade, ou por outras motivações sociais, diga-mos, respeitabilidade, apreensão, insegurança etc. . Tôdasessas relações de diferentes formas de sociabilidade, umavez que representam valôres sociais, envolvem as partesem compromissos que podem ser descritos como "investi-mentos" 3 do "eu" social num valor social, investimentosêsses que representam possibilidades de recompensas e ris-cos de perdas.Obviamente, há, por assim dizer, variações quantitativas,quanto ao volume investido, na graduação dos comprome-timentos. Ademais, o investimento total de um indivíduoem compromissos de tôda sorte - nos sistemas operati-vo, político, de carreira etc. - pode ser menor que o deseu vizinho; por outro lado, os compromissos autistas po-dem variar em função de compromissos externos, de formacomplementar, tal como Jung de início supôs, ao descre-ver a oposição polar extroversão - irdroversão; nada in-dica que todos os sêres humanos tenham, para investir, omesmo capital "filopsíquico" .Entretanto, êsses compromissos, que chamamos políticos ecarreiristas, influem diretamente, qualquer que seja suaintensidade, sôbre as obrigações do indivíduo para com aorganização operativa e sôbre a maneira de esta utilizá-locomo seu recurso. Atuam, assim, não somente pela impor-tância que assumem como comprometimentos, mas porquesão, como sugerimos, meios de preservar ou de satisfazerinterêsses pessoais alternativos de promoção ou de preser-vação pessoais dentro da sociabilidade cooperativa da or-ganização operativa. Nem as preocupações políticas, nemas de carreira operam abertamente; n'alguns casos, nemmesmo conscientemente. Elas dão origem a complicadasmanobras e contramanobras, tôdas expressas através dedecisões (ou discussões sôbre decisões) relativas à organi-zação e às políticas da companhia. Como os interêsses seto-riais e as preocupações com melhorias não se apresentam

3) H. S. BECKER propôs a analogia de um side-best para explicar a noçâode commitment. Vide seu artigo "Notes on the Concept oi Commit-rnent", American Journal oi Sociology , vcl . 66, págs . 32 a 40.

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178 PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO R.A.E.!!!

abertamente, mas somente nos têrmos da organização ope-rativa, passa aquela organização a ajustar-se, mais do queàs conveniências da emprêsa, às conveniências dos siste-mas político e de carreira. Ora, como a organização ope-rativa visa a planejar e efetivar a exploração sistemáticados recursos, tendo em vista os fins da emprêsa, a influên-cia dêsses dois outros sistemas tende a distorcer o planoe a operação ou a opor-se à sua eficácia. 4 Tal fato, toda-via, não ocorre quando a companhia, reconhecendo a va-lidade dêsses dois sistemas, consegue elaborar uma orga-nização operativa capaz de condicioná-los aos interêssesempresários.

Na maioria das três ou quatro dezenas de emprêsas a quea pesquisa nos levou a maior e mais importante divisãopolítica incide entre as equipes de produção e as equipesde vendas, refletindo a tensão existente entre as conside-rações de ordem estritamente técnica, de um lado, e asde ordem comercial, de outro, que afetam a indústria demodo geral. Para as duas partes interessadas, porém, osproblemas são, em muitos aspectos, bastante claros e con-cretos, pois que se relacionam às contribuições de cadauma delas para o sucesso da emprêsa. Cada grupo atribuia si êsse sucesso e,bem por isso, considera-se no direitode participar mais ativamente do contrôle dos recursos glo-bais da organização e de intervir nas decisões que afetemsua estrutura e seu funcionamento.

o CASO DE UMA INDÚSTRIA AUTOMOBILíSTICA

Numa das maiores indústrias automobilísticas da Ingla-terra, essa divisão de interêsses e valôres estava explici-tamente reconhecida, determinando, em larga escala, a es-trutura geral da organização operativa e os procedimentosusuais em seu funcionamento. O organograma básico dacompanhia comportava duas grandes divisões: a de Pro-dução e a Comercial. A Divisão de Produção compreen-dia duas seções: Projetos e Fabricação'. E a Divisão Co-

4) TOM BURNS e G. M. STALKER, op, cit., caps. 7, 8 e 9.

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R.Ã.E./ll PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO 179

mereial, por seu turno, abrangia: Vendas, Finanças e Mer-cadologia. Êsses diversos setores ramificavam-se seguindolinhas tradicionais, fàcilmente previsíveis .

Organogramas em tão amplo sistema podiam ser julgadosessenciais; mas, na realidade, "ninguém se preocupava comsubmeter-se rigidamente a êles". "Nós não olhamos muitopara o organograma, nem para o manual de organização"- dizia um dos diretores entrevistados - "exceto quandose trata de modificá-los." Os gerentes davam mais impor-tância a outros instrumentos, tais como o programa detrabalho, estabelecido para um ano de exercício, que es-pecificava as decisões a tomar, com base na política daemprêsa, e os planos a pôr em prática durante êsse perío-do. Tal programa fôra elaborado no decurso de uma sériede reuniões com número de participantes cada vez maior,à medida que os planos iam sendo elaborados, até o diaem que se fêz propícia uma assembléia geral a que com-pareceram todos os interessados. Dessas reuniões resul-tara um programa impresso, com datas fixas para conclusãode cada tarefa. Era de hábito, também, promover, demaneira dinâmica e atraente, "apresentações" do planomediante, por exemplo, uma preleção bem estudada, se-guida de debates e ilustrada por vistosos gráficos e por pro-jeções de diapositivos coloridos .

Êsses gerentes devotavam, por isso, acentuada predileçãopor procedimentos "organicistas" que lhes permitissem for-mular propostas e fazer com que fôssem aceitas por todoo pessoal. Entretanto, a antiga e enraizada divisão entreas equipes de produção e as equipes de vendas servia comolinha demarcatória das áreas de opiniões e considerações .Favorecia êsse estado de coisas a convicção, talvez delibe-rada e defensiva, de que as idéias e iniciativas deveriampromanar de funcionários dinâmicos, com idade não su-perior a 40 anos, para em seguida serem filtradas, orde-nadas e postas em prática sob a supervisão de superioreshierárquicos mais experimentados _ Isso tendia a encora-jar o espírito de competição das seções administrativasintermediárias (middJe menegement sections ), espírito

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180::..... P_A_T_O_L_O_G_,I_A_D_A_,_O_R_G_A_N_I_Z_A_<Ç_Ã_O ~R.A.E./ II

de competição êsse ordinàriamente dirigido contra a seção,a divisão ou o departamento vizinhos, e fautor do forta-lecimento das maiores facções políticas, que eram, comojá vimos, as equipes de vendas e as de produção.

Assim, essa política de aprovação unânime, conquanto vá-lida para o sistema de direção, estaria provàvelmente esti-mulando os compromissos secionais e aguçando as diferen-ças fundamentais entre Produção e Vendas. Para superarêsse inconveniente a direção resolveu criar dois mecanis-mos diferentes: um departamento chamado "Equipe deProduto" (Product Staif) , para atuar como instrumentode coordenação entre Produção e Vendas, e a "Comissãode Produto" (Product Meeting), para atuar como coorde-nadora dos dois lados.

a. O papel da Equipe de Produto era interpretar, segun-do os interêsses da Produção, as modificações e melhora-mentos de modelos, reclamados sobretudo pelas Vendas, e,segundo os interêsses destas, os projetos apresentados pelaProdução. A ela competia resolver os problemas que por-ventura surgissem de quaisquer discrepâncias entre aquê-les setores, bem como, eventualmente, confeccionar os de-senhos industriais.

Era constituída, bàsicamente, por engenheiros. Sua prin-cipal tarefa, no entanto, era conciliar os pontos de vistados dois principais setores do Departamento de Vendas(Mercado Nacional e Exportação), o que lhe proporcio-nava ativa influência sôbre a Divisão Comercial. O De-partamento de Vendas, por sua vez, considerando a ideolo-gia mercadológica dominante entre seus homens, tentava,por todos os meios, infiltrá-la na Equipe de Produto. Estaapresentava projetos de novos modelos e realizava gastoscom desenhos, plantas e pormenores de manufatura, que,se finalmente fôssem aprovados pela Divisão Comercial naComissão de Produto, seriam encaminhados à Produção.

b. A especificação de um nôvo produto ou alguma alte-ração considerável em produto já existente constituíammatéria a ser discutida e decidida pela Comissão de Pro-

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R.A.E.!11 PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO 181

duto, com a participação do Departamento de Finanças,do Departamento de Vendas, da Equipe de Produto e dosengenheiros interessados, sempre sob a presidência de umdiretor da companhia. A Comissão de Produto era comoque a última instância para a tomada de decisões finaisconcernentes aos modelos, em tôdas as suas fases de pro-dução: desenho, estilo, acabamento etc .. O processo com-pleto, desde a criação até a manufatura do produto, dura-va de três a quatro anos.

Embora tendo sua sede, por motivos estratégicos, na Divi-são Comercial, a Equipe de Produto reportava-se ao Co-mitê de Política (Policy Committee). Era, por isso, con-siderada, formalmente, como parte do mecanismo internode mediação e arbitragem, composto pela Equipe de Pro-duto, pela Comissão de Produto, por êsse Comitê de Políti-ca e pelo Conselho (Board). Graças a êsse mecanismolograva a emprêsa valer-se do conflito político segundo osinterêsses da organização operativa. Fazia-o aberta e cons-cientemente, reconhecendo a existência de uma divisão nãosó política, como funcional, e conjeturando meios que lhepermitissem conciliar ou julgar as opiniões divergentes.

O Conselho muito pouco fazia como junta de decisão. Di-zia-se que o Comitê de Política, onde todos os diretores ealguns gerentes atuavam sob a autoridade de um presi-dente, agia muito como árbitro entre Vendas e Produção.As atribuições do presidente faziam lembrar as de um juizde apelação. Sua especial aptidão - que os diretores en-trevistados, aliás, só especificaram depois de a terem com-parado ao "maná" que lhes aguçava o "faro" e a "intuiçãocriativa" ("Êle sempre nos apresenta o ponto nevrálgicoda questão!" ... ) - resumia-se, simplesmente, na facul-dade de "assumir riscos" e "reconsiderar decisões" (sic).Os diretores executivos avocavam, também, o papel de ár-bitros, individualmente, e o de côrte de apelação, quandoem conjunto. A Equipe de Produto era considerada capazde aplainar quaisquer divergências entre os setores do De-partamento de Vendas (Mercado Nacional e Exportação).Tinha, ademais, especial influência nas negociações com

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R.A.E.!l i------------------------------------------182 PATOLOGIA DA ORGANIZAÇAO

o Departamento de Finanças sôbre a fixação de preçosestabelecida pela Divisão de Produção e pelo Departamen-to de Vendas.

Conseqüência fortuita, embora importante, da existênciadêsse mecanismo era que o pessoal de vendas e tôda aequipe da Divisão Comercial consideravam de importân-cia vital situar seus escritórios perto dos outros e até nomesmo edifício. É bem de ver que os contatos entre Ven-das e Produção eram freqüentes e importantes; todavia,a maior parte dêles versava sôbre questões relativamentefáceis de resolver pelos processos rotineiros, nada impe-dindo que Vendas se localizasse noutro sítio. O que tor-nava "vital" a necessidade de sua presença próxima eraa sua própria intenção de, mediante êsse artifício, conse-guir participar mais diretamente das constantes decisõessôbre modelos e desenhos de carros, volume de vendas econtrôle de qualidade. Tais decisões eram resultados dereuniões e debates de que tomavam parte vários setorese departamentos. Mais importante, talvez, era a necessi-dade de estar presente no centro nervoso do sistema polí-tico para poder recorrer, como os outros, ao mecanismo deapelação e arbitragem, que demandava a intervenção dopresidente e dos diretores.

Havia o sentimento compreensível de que, quanto maispróximos todos pudessem estar do centro visível e físicodo poder, tanto menor seria o risco de os outros deturpa-rem as "decisões certas" e tanto maior a oportunidade deas "más decisões" serem retificadas através de entendi-mentos diretos de cada chefe interessado com o presidenteou com os diretores. Era sabido que o presidente manti-nha freqüente contato com cêrca de trinta pessoas, a des-peito de que "nem tôdas tivessem a mesma facilidade deacesso". Assim, o direito de "conchavar" (lobby) o presi-dente e o de controlar para êsse fim o acesso ao seu es-critório estavam, outrossim, implícitos no sistema de ape-lação e arbitragem, e eram zelosamente disputados porambos os lados.

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RA.E./ll PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO 183

o que aqui foi por nós examinado é uma solução pura-mente "estrutural" para o problema de como reduzir asobstruções e os efeitos perturbadores que o conflito políti-co causa à organização operativa, solução essa que não su-prime nem restringe o conflito, nem tampouco neutralizaseus efeitos, mas que o incorpora na própria organizaçãooperativa. Três aspectos adicionais dessa estrutura contri-buem para fortalecer a organização. Ao considerá-los des-cobriremos um ponto fraco (que estudaremos adiante) doconceito global de fortalecimento do sistema político comvistas aos fins da organização operativa: o sistema todoé precàriamente fundamentado na competição interna, etodos os seus membros estão preocupados como as conclu-sões e veredictos dos superiores.

1 . A primeira consideração é fundamental para as duasoutras e, até mesmo, para todo o sistema. Simplificandomuito, poderíamos afirmar que o sistema é concebido paraadicionar os compromissos do indivíduo com os interêssespolíticos secionais àqueles que o ligam à organização ope-rativa . (Convém salientar que êsse adicionamento fôraobtido pelo reconhecimento da existência real dessa divi-são política e mediante a reforma, segundo êsse princípio,dos esquemas da organização.) A defesa dos interêssespolíticos tem por propósito, como já dissemos, reforçar ovalor das capacidades do grupo secional de interêsses aoqual o indivíduo pertença, e "dar mais voz" a êste, comomembro do grupo, sôbre os recursos e vantagens da com-panhia. No caso que acabamos de ver o fato de o presi-dente e o Conselho reconhecerem abertamente êsses inte-rêsses, valendo-se dêles para julgar e decidir, tornava prà-ticamente impossível que as duas ordens de compromissose mantivessem ocultamente em conflito, e que as deci-sões e julgamentos explícitos fôssem, em conseqüênciadisso, influenciados por considerações políticas implícitas.

2. O segundo aspecto resulta diretamente da situaçãocriada pelas considerações políticas, normalmente latentes,agora como parte manifesta do mecanismo através do qualse coletam informações e se tomam decisões. Problemas

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184 PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO R.A.E./1!~~----------------------~---------práticos de decisão raramente requerem processo lógicocomplicado. A principal dificuldade está em assegurar quetodos os aspectos (comerciais, técnicos, humanos etc.)que possam influir significativamente na escolha dos pro-cedimentos sejam discutidos e entrem na formulação dasdecisões, deixando-se de lado, obviamente, as considera-ções irrelevantes. Por outro lado, mais importante do quea competência técnica para resolver problemas é a capa-cidade de "reconhecer que um problema existe", uma vezconhecidos os dados necessários e suficientes (como umaquestão de exame). Isso equivale a perceber as discrepân-cias entre o resultado esperado e o resultado provávelde uma decisão, ou seja, entre o uso habitual e o uso pos-sível dos recursos. I

O refôrço das obrigações para com a companhia pelo maiorcomprometimento com interêsses mais limitados tem porefeito, de um lado, estimular a manifestação aberta, nasdiscussões de decisão, de tôdas as considerações favoráveistanto aos fins da emprêsa quanto aos interêsses grupais,e, de outro, desencorajar as manobras ocultas. A ameaçade rivais políticos faz-se sentir abertamente na discussãoe na elaboração da decisão nos debates e nos pronuncia-mentos decisórios; ela garante a eficácia dêsse intercâm-bio como meio de defesa dos interêsses da organização.

Pressupõe-se aqui que as decisões adotadas numa assem-bléia legislativa que reconheça a existência de partidos po-líticos serão, por certo, melhor fundamentadas, mais sá-bias e mais efetivamente executadas do que outras quevenham a. ser tomadas, para aquêle mesmo sistema social,num conselho legislativo em que as divisões de interêssespolíticos sejam ignoradas ou tratadas como se não exis-tissem e, por conseguinte, relegadas à esfera incontrolávelda intriga, onde sua verbalização geralmente produz dis-torções.~

5) Para uma análise pormenorizada das conseqüências de os interêsses po-líticos e os de carreira serem ccnsiderados como inexistentes no estudo" na elaboração das decisões, mesmo em setores onde a maioria <iasconsiderações são de caráter técnico, C. P. SNOW (Science and Govern-ment, Osdord University Press, 1961) apresenta a história "interna" da

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R.A.E./ll PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO 185

Claro está, porém, não nos estamos ocupando com proces-sos legislativos de Estados soberanos, e qualquer analogiaforçada poderia levar-nos a equívocos. Uma emprêsa, bemcomo quase tôdas as organizações econômicas, sociais e p0-líticas da sociedade moderna, que existam para planejar eagir dentro de um quadro de normas prescritas por outraspessoas e pelo complexo social, é, na verdade, uma hierar-quia de cargos e podêres, mais ou menos claramente defi-nidos e atribuídos a cada indivíduo pelos superiores. To-davia, essa hierarquia deve repousar sôbre a convicção, porparte de todos, de que ela é justa e legítima. Pode serque os superiores nem sempre acertem em tudo quantofazem, mas devem ser considerados como "tendo o direi-to de fazê-lo" .No passado, salvo em raros casos de comprovada e desas-trosa incapacidade ou nos programas de alguns grupos po-líticos anarquistas ou anarco-sindicalistas, jamais foi pôstoem dúvida o direito dos superiores a seus cargos e podêres.Mas, atualmente, com a instabilidade fundamental que ca-racteriza as relações da produção e do mercado, e com aaceleração do progresso técnico, a legitimidade da pirâmi-de hierárquica na burocracia administrativa vem sendo de-safiada pelo largo volume de tarefas e problemas novosque as emprêsas se vêem forçadas a enfrentar. Essa amea-ça é particularmente sensível nas indústrias de bens deconsumo duráveis, como automóveis, e naqueles que se ba-seiam em técnicas novas, como a eletrônica. Tarefas eproblemas novos e desconhecidos criam situações tais que,para enfrentá-las, torna-se necessário apelar para informa-ções e intervenções muitas vêzes incompatíveis com ospressupostos da hierarquia tradicional.

Já estivemos tentando registrar os princípios dos sistemas"orgânicos" apropriados a tais circunstâncias, a fim deconfrontá-los com o sistema burocrático tradicional, de-senvolvido para operar em condições relativamente está-

formulação da política do govêrno britânico no tocante às pesquisas sê-bre o radar, realizadas ncs idos de 1930, e à estratégia de bombardeioadotada durante a Segunda Guerra Mundiai.

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186 PATOLOGIA DA ORGANIZAÇÃO R.A.r./ll

veis. Na emprêsa que analisamos é possível descortinarcertos traços de estrutura orgânica; mas,aestrutura oficialera burocrática, em que pêse ao fato de tal configuraçãoser, na prática, pouco rígida.3. O terceiro aspecto, corolário da incorporação das di-visões políticas na organização operativa, é o relativo àênfase que se dava na emprêsa sob análise ao papel deárbitro e conselheiro exercido pela alta administração,contrabalançada pela abdicação da iniciativa a favor dosgerentes de menos de 40 anos. Individual e coletivamen-te, o status dos veteranos na hierarquia era-lhes assegu-rado pelo seu papel de juízes, individualmente, e de côrtede apelação, quando coletivamente considerados, e pelaposição senatorial que assumiam diante das contendas li-tigiosas e divergências políticas dos gerentes de nível in-ferior.Em suma, uma organização administrativa singularmentepoderosa havia sido criada, principalmente porque a com-panhia constatara a existência de substancial conflito po-lítico entre suas metades e reconstruíra seu sistema admi-nistrativo levando em conta essa divisão. Êsse sistemaé, até-certo ponto, perigoso. Demonstrá-Io-emos a seguir,analisando o exemplo de outra organização, que enfrentousituação semelhante, com o desenvolvimento de uma es-trutura que favorecia uma rivalidade departamental per-manente na organização operativa.

o CASO DA BBC

A situação que vamos invocar para ilustrar a forma de-generada do sistema que descrevemos acima é a de umagrande emprêsa pública da qual fizemos um breve estudo.Qualquer tentativa no sentido de não identificá-la resul-taria inútil e nos obrigaria ao uso de emaranhadas perí-frases: a "British Broadcasting Corporation" (BBC) é,sem dúvida, uma organização singular.Ao reorganizar a emprêsa depois da Guerra, o então dire-tor-geral adotou a competição interna como princípio car-

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dial da estrutura, em virtude do nôvo programa de servi-ços. Os três serviços de que passou a constituir-se sua pro-gramação (Rome, Light e T'hird y deveriam competir unscom os outros por maior índice de audiência.Por estarem, assim, imbuídos de um sadio espírito de riva-lidade, era de esperar que os três serviços passassem a en-vidar seus melhores esforços na garantia de altos padrõesde qualidade, esmerando-se na criação de inovações emseus programas. O número de ouvintes, destarte, deveriaaumentar pr~porcionalmente, assim como sua satisfação.Doutro lado, a reorganização estipulava que, muito em-bora os programas pudessem atender a todos os tipos deinterêsse, cada um dêles deveria ser destinado a um públi-C'O específico, distinto dos demais pelo seu nível culturale pelo grau de interêsse persistente. Ademais, todos osprogramas deveriam usar as mesmas orquestras, os mes-mos estúdios e os mesmos departamentos de montagem(debates, música, rádio-teatro, jornal, documentários etc.).

Circunscrita, dêsse modo, a "saudável rivalidade" entre osprogramas, ficava reduzida a competição à disputa dosnomes de maior cartaz e dos eventos que causassem maiorimpacto no público. A êsse propósito, certa vez, alguémde lá nos falou: "Essa competição 'não tem dentes'. . . Oapresentador do programa vem e anuncia: 'Teremos hojeo prazer de apresentar-lhes Toscanini. Esperamos que osprezados ouvintes tenham uma hora de grande deleitemusical.' E é só!"

Entretanto, a competição estava integrada na organizaçãode outras maneiras, e aí ela possuía "dentes". Os servi-ços de radiodifusão estavam a cargo de duas divisões: "Ali-mentação" (Supply) e Produção (Output). A Alimen-tação compreendida aquelas três cadeias a que recém fi-zemos referência (Rome, Light e Third), responsáveispela criação e apresentação de determinados programas.A Produção compunha-se de diretores de programa, en-carregados de elaborar os programas das três cadeias comos materiais fornecidos pela Alimentação .. Os diretores deprograma e os chefes de departamento da Alimentação

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pertenciam ao mesmo grau hierárquico. "A Alimentação_ diziam - não trabalha sob a autoridade da Produção.Nós todos trabalhamos sob a autoridade do diretor-geral. "Contudo, a estrutura havia sido montada para promover"saudável rivalidade" entre os departamentos da Alimen-tação para assegurarem-se dos horários e posições maisfavoráveis nos programas compostos pela Produção. Comodisse um dos diretores de programa: "Os homens da Pro-dução temos a responsabilidade editorial de um redator--chefe por tudo o que se passa nos canais de irradiação. De-cidimos sôbre o que deve ser apresentado ou mudado."Para exercer essa função editorial a Produção dispunha deuma sanção: decidia sôbre tôdas as despesas do programa.Bem por isso, a função da Produção passou a ser consi-derada superior à da Alimentação, a despeito da igualda-de de categoria entre os dois departamentos, apesar da su-bordinação ao mesmo diretor e sem prejuízo do princípiode que cada desacôrdo devesse ser resolvido por mútuoentendimento ou por arbitragem do diretor, "porque fazerprogramas é trabalho editorial, condicionado ao poder deautorizar despesas e de decidir sôbre o que deva ser ofe-recido ao público" . . .De fato, a superioridade de uma divisão sôbre outra eraefeito direto do estabelecimento de uma situação de poder.A concorrência entre os departamentos da Alimentaçãopelos horários de transmissão e pelas verbas estendeu-se,inevitàvelmente, para muito além da apresentação de seusprogramas. A fim de defender os interêsses de seu depar-tamento ou fazer aceitar suas produções, os chefes de de-partamento da Alimentação, segundo palavras de um in-formante, bajulavam, "conchavavam" e até mesmo amea-çavam, em certas ocasiões,os diretores de programa. Assim,a relação de dependência acabou por expressar-se clara-mente, em têrmos de conduta, desenvolvendo-se a tal pon-to que os programadores da Produção chegaram a susten-tar estar sempre nesse setor, e não na Alimentação, a fontedas idéias novas e brilhantes, máxime das que estavamfadadas a obter maior sucesso. Afirmavam, outrossim, queos produtores da Alimentação tinham a tendência de viver

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do prestígio de alguns programas bem sucedidos e eramincapazes de imaginar algo de nôvo. Haviam ficado com-prometidos - diziam - com alguns autores e atores, sen-do-lhes difícil romper êsses vínculos; procuravam, por isso,"bolar" apenas variantes dos mesmos programas anterio-res. "As idéias que consideram revolucionárias" - troça-vam os programadores - "provêm de suas cogitações sô-bre o conjunto das transmissões de cada canal."

Durante o período de mais de 12 anos em que o sistemavigiu a tentativa de fortalecer a organização operativapela incorporação da política de conflito (rivalidade in-terdepartamental) falhou - ou melhor, esgotou seus efei-tos benéficos e criou uma situação diferente da que seusidealizadores haviam previsto. A relação de compra e ven--da, estabelecida entre a Alimentação e a Produção -aquela como vendedora, esta como compradora - termi-nou por transformar sua igualdade teórica em subordina-ção. O monopólio de consumo desfrutado pela Produçãocomo único comprador das produções da Alimentação per-mitiu àquele exercer efetivo contrôle não somente sôbrea escolha dos programas, mas sôbre a própria criação dês-tes últimos.

Além dessas mudanças latentes de estrutura houve outrasconseqüências. A "rivalidade salutar", que deveria moti-var bàsicamente as relações entre os departamentos da Ali-mentação, ficou sufocada pelas tentativas de manipular asdecisões favoráveis por meio de táticas que em nada con-tribuíam para facilitar a seleção dos melhores programase para promover condições nas quais os produtores se sen-tissem estimulados a inventar e desenvolver as melhoresidéias programáticas. A tarefa do pessoal da Alimentaçãoconverteu-se, através dos anos, numa luta diplomática en-tre unidades dependentes para atrair a atenção e o bene-plácito da autoridade maior.Ocorreram, aparentemente, duas espécies de conseqüênciasúltimas dessa derradeira fase. Em alguns casos, e até certoponto, os contendores haviam visto a batalha competitivatal como ela era: uma pista de corridas, artificialmente ur-

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190 PATOLOGIA DA ORGANIZAÇAO R.A.E.lll

dida e destinada a mantê-los ativos e fixos. Uma vez queas pessoas envolvidas em tal situação falavam livrementesôbre a estrutura do sistema competitivo e seus objetivos,bem como sôbre a ilegitimidade das táticas por vêzes pre-dominantes, a odiosidade de suas posições, particularmen-te perante os ouvintes e juízes, que eram formalmente seusiguais em categoria, tornou-se insuportável. Com efeito,êles deixaram de competir; ao mesmo tempo, as tensõesimpostas pela situação tornaram-se opressivas em vez deestimulantes, e a suspeita de injustiças e de manobras ilí-citas foi além de todos os limites toleráveis. A inseguran-ça pessoal assim gerada, desviou a preocupação das pes-soas pela melhor qualidade de seus serviços para um esta-do de intranqüilidade em que cada indivíduo desejavãdescobrir o que os outros pensavam dêle e do seu traba-lho. Êsses foram os dois tipos de reação encontrados nocaso em estudo.

Na BBC, como, aliás, em qualquer outra parte, muitos in-dícios denotam que a emulação interdepartamental podeservir aos interêsses da organização operativa. Tambémé verdade, porém, que aproveitar as oposições políticas embenefício da organização operativa é um empreendimentoarriscado e de conseqüências dificilmente previsíveis; ade-mais, um sucesso inicial nessa tarefa não garante um be-nefício permanente.

Os três sistemas que aqui temos postulado (organizaçãooperativa, política interna e estrutura de carreira) podemser considerados, sob o ponto de vista do indivíduo, comodiferentes formas de comprometimento com objetivos di-versos; êstes compromissos individuais, por seu turno, sãoencarados, aos olhos dos outros membros da emprêa, comorecursos à sua disposição. Ao distinguir essas três espé-cies de comprometimentos, recursos ou sistemas, nós astemos tratado como se elas se opusessem umas às outras.De fato, isso freqüentemente acontece. Mas, como vimosno caso do sistema de comprometimentos que chamamospolítico, pode haver arranjos pelos quais o sistema políticoreforce a organização operativa, bem como, em contra par-

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tida, pode a organização operativa ser forçada a acomo-dar-se aos reclamos do sistema político. Igualmente, con-quanto seja bem nítida a diferença entre a estrutura decarreira e a organização operativa quando os fins de umdêsses sistemas são incompatíveis com os do outro, não háregra pela qual devam necessàriamente estar em conflito.

o SERVIÇO PÚBLICO CIVIL BRIT ÂNFCO

Na Grã-Bretanha o exemplo mais claro e conhecido de con-junção efetiva da organização operativa com a estruturade carreira é, provàvelmente, o da alta administração pú-blica civil. O sistema está baseado no princípio da igual-dade das oportunidades, determinada, antes de tudo, pelaexigência de concurso público para ingresso no quadro bu-rocrático, de onde saem os altos funcionários. 6 Três prin-cípios normativos inspiram seu funcionamento, todos tendopor finalidade identificar os interêsses do indivíduo peloseu progresso na carreira com os interêsses do departamen-to, mediante apuração da qualidade de seu desempenho,ou, pelo menos, afastar a possibilidade de conflito entreêsses interêsses.1. Em primeiro lugar, deve existir, em cada departamen-to governamental, clara equivalência entre o nível hierár-quico e o trabalho realizado. Se, em algum caso, a inob-servância dêsse pressuposto fôr denunciada por algum in-teressado ou por um chefe administrativo ou auditor, aquestão pode ser negociada entre os representantes do de-partamento (na qualidade de empregadores) e os do pes-soal (como empregados) .Assim (contrariando, talvez, a opinião popular), a impor-tância, o prestígio, a posição e, finalmente, o título e a re-muneração correspondentes aos cargos constituem matériaa ser discutida e ajustada de acôrdo com o parecer depessoas outras, que não o indivíduo diretamente interessa-

6) H. E. DALE. The Higher Service, Oxiord University Press, 1941.

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do, nem tampouco superiores imediatos, e segundo critériosconsiderados legítimos pela administração pública.

2. Em segundo lugar, questões de promoção devem sertratadas por uma divisão (EstaoJishment) do departamen-to, que, para tanto, toma por base as informações forneci-das, a respeito, por todos aquêles que hajam sido superio-res do interessado durante sua carreira pregressa. Garan-tias adicionais de imparcialidade na nomeação a qualquercargo são asseguradas por um conselho (Board) que en-trevista e seleciona os candidatos considerados aptos poraquela divisão. Assim, salvo raras exceções, o sucesso nacarreira de um indivíduo depende do registro de sua con-duta e desempenho no trabalho, condizente, aos olhos doscolegas, com os interêsses do departamento, tais como sãodefinidos, de maneira bastante explícita, e geralmenteaceitos.3. Em terceiro lugar, o servidor civil pode ser removidopara qualquer cargo (exceto os de natureza técnica ou cien-tífica) de sua categoria ou nível hierárquico dentro de seudepartamento ou, até mesmo, transferido para outro de-partamento, pràticamente sem se levar em conta a expe-riência especializada adquirida até então ou a ausência daexperiência desejável para o exercício das novas funções.Isso, todavia, não se recomenda, porquanto seria difícil queo funcionário assim designado conquistasse a simpatia dogrupo e assumisse comprometimentos particularistas capa-zes de vinculá-lo, politicamente, a um setor ou divisão.Como é óbvio, o sistema não funciona perfeitamente.Ainda que assim fôsse, haveria o que nêle criticar. Mas, aadministração pública parece evitar, por consentimentogeral, muitos dos males do carreirismo encontrados nomundo industrial e comercial. Não nos é lícito concluir,daí, que os traços característicos da administração públicadecorram, exclusivamente, de um engenhoso mecanismode carreira. O rigoroso, embora não-escrito, código deética que regula as atitudes do alto funcionário inglês emseu trabalho e em suas relações com os colegas, com oshomens públicos e com o grande público em geral é, pelo

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menos, de igual importância. Mesmo assim, contudo, areforma do serviço público civil britânico, realizada háum século, visou, principalmente, à implantação de regula-mentos capazes de assegurar que o provimento de cargospúblicos não se subordinasse ao nepotismo e à política deodiosos privilégios, mas dependesse, tão-somente, das qua-lidades pessoais dos candidatos.

AS CARREIRAS NAS GRANDES EMPRESAS

Grandes emprêsas têm adotado, nos dois ou três últimosdecênios, muitas práticas do serviço público britânico, naexpectativa de colhêr os mesmos benefícios. Duas recen-tes mudanças nas circunstâncias externas são parcialmen-te responsáveis por êsse fato.1. A reforma educacional do pós-guerra difundiu a no-ção de que as crianças e os jovens mais inteligentes e maiscapazes são naturalmente encaminhados para as escolassecundárias e que os melhores dentre êsses seguem paraas escolas técnicas e universidades. Destarte, os talentosadministrativos passaram a ser procurados entre os que játivessem obtido graduação tecnológica ou universitária;êstes constituíam, para as emprêsas, um bem definido, em-bora muito restrito, universo de recrutamento.2. Nesse mesmo período modificou-se muito a situaçãoindustrial. O complexo econômico mostrou-se mais dinâ-mico do que antes da Guerra. Tornou-se instável o equilí-brio entre a produção e o consumo, concomitantemente àaceleração do progresso técnico a que já aludimos alhures.Êsses três fatôres contribuíram para aumentar a demandade administradores, especialistas e tecnólogos, quer em nú-meros absolutos, quem em proporção ao número de tra-balhadores .A competição entre os empregados no recrutamento dêssepessoal de alto nível obrigou-os a elevar as ofertas salariaisiniciais; mas, como um investimento assim feito só depoisde alguns anos surte efeitos compensadores, era imperiososelecionar realmente os melhores ... e conservá-los. Con-

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quanto nunca as emprêsas particulares tenham procuradoselecionar seus homens mediante concursos públicos tãorigorosos quanto devam ser os instaurados para o serviçopúblico, muitas das técnicas de seleção usadas na SegundaGuerra Mundial já foram adotadas no setor privado paraescolha de candidatos a treinamento a cargos de chefia.As carreiras assim iniciadas incorporaram-se, sõlidamente,na estrutura das emprêsas. Estas, por sua vez, no intentode atrair candidatos capazes, passaram a anunciar e a pro-meter mais carreiras do que cargos. 7

Inevitàvelmente, o sistema de carreira assumiu grande im-portância. As grandes emprêsas enfrentam a necessidadede dar mais atenção às nomeações e às promoções. Apreocupação com alcançar bom êxito na carreira aumentaà proporção da importância dêsse sucesso. Em conse-qüência, são intensamente cultivados o estilo e os modospelos quais o indivíduo procura ser promovido; dispu-tam-se àvidamente os cargos favoritos e as tarefas que maisatraiam a atenção dos superiores; investigam-se os melho-res caminhos para os postos mais elevados. E tais mano-bras são mais freqüentemente empregadas na conduta doscompetidores. 8

A maioria das emprêsas têm tomado providências paracontrolar o sistema de carreiras; quando menos, elas têmprocurado melhorar as oportunidades de sucesso condicio-nando-as à qualidade do desempenho e a outras qualifica-ções geralmente reconhecidas como merecedoras de pro-moção por mérito. Os cursos de formação de administra-dores de emprêsas indicam e esclarecem a natureza e onível das tarefas de direção, especificando e desenvolvendoas técnicas e as qualidades pessoais indispensáveis ao diri-gente. Seminários (reuniões de discussão) favorecem sua

7) Vide à guisa de ilustração, o sem número de anúncios de página intei-ra, publicados nas grandes revistas e dirigidos a estudantes universitá-rios, à procura de administradores e técnicos.

8) As dificuldades enfrentadas pelos pretendentes a cargos executivos fo-ram ressaltadas por W. H. 'WHITE (The Ortanization MlIn) e por RltrNP..ARD BENDIX (Work and Autbority in lndustry, Wiley, Nova Iorque,1956). SU3.S dramáticas possibilidades foram amplamente exploradas pelaflorescente escola publiciútária do executivo suite depois de 1950.

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integração no mundo dos gerentes e dão às atividades diá-rias sentido social, econômico, político, intelectual e, àsvêzes, até religioso; nelas são apresentados personagens re-presentativos de administradores bem sucedidos que, di-rigindo-se a diretores, gerentes e chefes, tecem considera-ções gerais sôbre a diversidade dos interêsses da emprêsa,sôbre sua preocupação com o bem-estar de todos os super-visores, sôbre suas perspectivas para o futuro e sôbre o queela espera de seus administradores. Algumas companhiassubmetem seus gerentes com qualidades promissoras a umestágio, por curto prazo, em estabelecimentos afastados, afim de testar suas aptidões, ampliar sua experiência e dis-tinguir habilidades próprias de um departamento, baseadasem técnicas ou conhecimentos especializados que demons-trem sua segurança na manipulação de recursos. Existem,ainda, os programas de aperfeiçoamento dos dirigentes, queabrem caminho ao progresso para jovens e promissores ge-rentes, a curto e médio prazos, colocando-os em posiçõesonde possam explorar ao máximo sua potencialidade e en-viando-os aos melhores cursos ministrados por associaçõesde classe ou por escolas de nível universitário.A essa altura as exigências da organização já estão visivel-mente colocadas em têrmos de exigências de um sistemade carreira. Naturalmente, a emprêsa faz tudo isso na es-perança de resultados substanciais, sob a forma de dirigen-tes superiores melhor selecionados, mais experimentados emelhor informados. Porém, ao gerente individualmenteconsiderado, seja êle o realizador do programa ou a vítimaperdedora de tôdas essas disputas, parecerá que o sistemacompetitivo de carreiras se tornou não apenas a preocupa-ção mais importante na emprêsa, mas também um jôgoardiloso, manejado, com anuência da diretoria, por um oudois indivíduos poderosos, que anula a realidade do siste-ma cooperativo de administração. A liderança, entretanto,entendida como a capacidade de conduzir pessoas, promo-vendo colaboração e lealdade em relação aos interêsses daemprêsa, tem sido insistentemente enaltecida como ele-mento essencial do talento administrativo.

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o curso seguido por êsse desenvolvimento não foi traçadopor nenhum desígnio oculto ou sinistro. De modo natural(senão inevitável), tem havido um desvio na linha de ajus-tamento a situações novas, em direção a políticas que vi-sam a preservar a imagem que a alta administração temde si mesma, procurando reforçar sua autoridade numaépoca de inovações, de idéias novas e de novos homens, edissimulando a aparência de ousadas reformas, pretensa-mente levadas a efeito para fazer face àquelas situaçõesnovas, muito embora, na verdade, os altos dirigentes con-servem os mesmos princípios do sistema tradicional, dêlesfamiliar, que os levou ao pináculo hierárquico da emprêsa.Muitas das mudanças estruturais a que inúmeras organiza-ções têm sido submetidas decorrem, justamente, das in-fluências dêsse estado de coisas.

A atenção dada ao sistema de carreira tem sua origem nasmudanças ocorridas no potencial do mercado de trabalhoformado pelos dirigentes. Mas, a posição central que agrande emprêsa dedica, entre seus problemas de organi-zação, à seleção, à admissão, à promoção e ao planejamen-to de carreira tem favorecido a idéia de que (como de-clarou um velho gerente): "organizar significa conseguiros homens mais capazes e treiná-los devidamente". Issodemanda, de um lado, que os cargos de alto nível sejamocupados ou tenham sido criados por pessoas cujas quali-dades não possam ser igualadas por seus sucessores, a nãoser que sejam escolhidos e formados, com o maior empe-nho, durante anos a fio. Implica, por outro lado, que a dire-ção haja cumprido, pela obtenção de um "homem capaz",sua dúplice tarefa de. elaborar e aprimorar o modêlo estru-tural da emprêsa, e de diligenciar para que aos administra-dores sejam asseguradas condições sob as quais êles possamdecidir e agir com eficiência. A falta de cumprimento dessatarefa significa não ter sido possível encontrar "homenscapazes" disponíveis.

Na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos e, talvez, alhurestem prevalecido, entre os grupos de direção "burocratiza-dos", um conjunto de crenças - ou, pelo menos, um sis-

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tema de comunicação - que os apresenta inquietos, cí-nicos e até mesmo participantes compulsórios da "corridade ratos", uma competição pelo sucesso profissional quedeve ser levada a efeito independentemente da lealdadepessoal, dos códigos de ética convencionais e das obriga-ções contratuais, sempre que êsses vínculos de comprome-timento se oponham aos interêsses carreiristas. Pode serque a consciência se tranqüilize quando o indivíduo pro-cura justificar-se perante si mesmo, alegando ter sido víti-ma de coação, como que numa síndrome de "A Morte doCaixeiro-Viajante". Porém, ver a "corrida de ratos" cornouma inovação contemporânea seria adotar uma perspecti-va histórica demasiado restrita.

A coexistência de ética profissional com o progresso pessoalterá sido, provàvelmente, mais fácil de sustentar quandoas normas que dirigiam as carreiras nas classes médias -tal como o descrevem romancistas e publicistas - decor-riam do protótipo do profissional liberal e do "homem feitopor si mesmo"; mas, não há nenhuma razão para suporque o sucesso, em sua acepção material, haja sido menosvalorizado pelas gerações anteriores. Mudanças na ideo-logia patronal, do "rude individualismo" ao "viver bemcom as pessoas", podem não ter acarretado nenhuma alte-ração substancial no equilíbrio individual entre o devota-mento aos interêsses da comunidade e a dedicação aos in-terêsses pessoais.

A relativa importância das classes médias cresceu com odesenvolvimento das emprêsas e com o progresso tecno-lógico. Ao mesmo tempo, e por isso mesmo, as carreirasda classe média foram incorporadas nas grandes indústrias,nos serviços governamentais e nas entidades parestatais.Assim sendo, as condições sob as quais os carreiristas pro-grediam estão mudadas. No entanto, com o crescimentodo tamanho e da complexidade técnica das organizaçõesoperativas a manter um avanço constante sôbre a compe-tência dos organizadores e sôbre seus conhecimentos téc-nicos, ainda parece possível, à maioria dos indivíduos, con-trabalançar o crescimento dos vínculos em relação ao tra-

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198 PATOLOGIA DA ORGANIZA<ÇÃO R.A.E./ll~------------------------~---------balho, graças aos complexos sistemas vigentes, estabele-cendo-se uma coligação dos superiores hierárquicos com ossubalternos, a fim de manter um equilíbrio estável entreos compromissos com a organização operativa e os vínculosque liguem o indivíduo aos seus próprios interêsses.