Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da...

30
Aula 4 – Família Texto Indicado PRÁTICAS RESTAURATIVAS: O DISPOSITIVO EM AÇÃO Celia Passos 1 Os Círculos, que são momentos de encontro, atualmente vêm sendo recuperados, recriados e legitimados como tecnologia social traduzida para a atualidade. Essa prática, inspirada em tradições ancestrais de povos indígenas, não é tratada ou cultuada aqui como uma panaceia para todos os males e nem é percebida sob uma visão ou um romantismo de uma época remota. É, ao contrário, percebida como um dispositivo, uma fonte de inspiração para um exemplo de ação efetiva como é o caso dos povos indígenas usuários dessa metodologia que, “não desejando a dominação branca ou mesmo a sua piedade” (GLOWCZEWSKI, 2010, p.1), buscaram criar uma forma de enfrentar a violência policial e estrutural a que estiveram expostos ao longo dos anos desde a colonização, passando a exigir um novo olhar diferenciado por parte do grupo hegemônico (colonizadores na América do Norte e, no caso da Austrália e Nova Zelândia, por parte dos ocidentais). Segundo Barbara Glowczewski (2010), os povos das nações indígenas que pareciam “fadados à extinção” e vinham sendo identificados como “museu vivo de uma cultura perdida” conseguem mudar a trajetória, afirmando-se “como sujeitos de sua própria história” em uma luta não concluída pelo reconhecimento de sua cultura e de seus direitos (p.1). A inserção dos Processos Circulares encontra em consonância com o pensamento pós-abissal de Boaventura de Souza Santos. É uma proposta de diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade de formas de conhecimento além do conhecimento científico” (SANTOS, 2007, 1 Este texto é parte dos dois primeiros capítulos da Tese de Doutorado da autora junto ao Programa de Pós- Graduação em Psicologia Social PPGPS UERJ. Tese defendida em 26 de fevereiro de 2015.

Transcript of Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da...

Page 1: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

Aula 4 – Família

Texto Indicado

PRÁTICAS RESTAURATIVAS: O DISPOSITIVO EM AÇÃO

Celia Passos1

Os Círculos, que são momentos de encontro, atualmente vêm sendo

recuperados, recriados e legitimados como tecnologia social traduzida para a

atualidade. Essa prática, inspirada em tradições ancestrais de povos indígenas,

não é tratada ou cultuada aqui como uma panaceia para todos os males e nem

é percebida sob uma visão ou um romantismo de uma época remota. É, ao

contrário, percebida como um dispositivo, uma fonte de inspiração para um

exemplo de ação efetiva como é o caso dos povos indígenas usuários dessa

metodologia que, “não desejando a dominação branca ou mesmo a sua piedade”

(GLOWCZEWSKI, 2010, p.1), buscaram criar uma forma de enfrentar a violência

policial e estrutural a que estiveram expostos ao longo dos anos desde a

colonização, passando a exigir um novo olhar diferenciado por parte do grupo

hegemônico (colonizadores na América do Norte e, no caso da Austrália e Nova

Zelândia, por parte dos ocidentais). Segundo Barbara Glowczewski (2010), os

povos das nações indígenas que pareciam “fadados à extinção” e vinham sendo

identificados como “museu vivo de uma cultura perdida” conseguem mudar a

trajetória, afirmando-se “como sujeitos de sua própria história” em uma luta não

concluída pelo reconhecimento de sua cultura e de seus direitos (p.1).

A inserção dos Processos Circulares encontra em consonância com o

pensamento pós-abissal de Boaventura de Souza Santos. É uma proposta de

diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade

epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

de formas de conhecimento além do conhecimento científico” (SANTOS, 2007,

1 Este texto é parte dos dois primeiros capítulos da Tese de Doutorado da autora junto ao Programa de Pós-

Graduação em Psicologia Social – PPGPS – UERJ. Tese defendida em 26 de fevereiro de 2015.

Page 2: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

p.25) e do reconhecimento de que o pluralismo jurídico tem, em regra, presença

em quase todas as sociedades, ainda que com especificidades de distintos

níveis (ARAÚJO, 2008).

A inspiração e a recriação de tradições centenárias de povos indígenas

e das práticas oriundas dos “traços de singularidades ancestrais” decorrem da

aposta na “articulação com um processo criador” e emancipatório (ROLNIK,

2011, p.86) para a proposta de novos aportes aos processos dialógicos de

grupos familiares e tal proposta, por sua vez, decorre da percepção da

necessidade de novos recursos para abordar tais questões.

Essa é, entretanto, uma proposta que vem somando vários obstáculos,

limitações e inviabilizações pela desqualificação ou invisibilização, cujas raízes

parecem assentadas na monocultura do saber que, segundo Boaventura de

Souza Santos, é uma poderosa forma de produzir a “não-existência”, consistindo

“na transformação da ciência moderna e da alta cultura em critérios únicos de

verdade e de qualidade estética, respectivamente” e, nas circunstâncias desse

estudo, do próprio judiciário enquanto única fonte de acesso ao direito e à

justiça2. Significa dizer que na qualidade de “cânones exclusivos da produção de

conhecimento”, o que a verdade (científica) e a qualidade estética ignoram não

existe sob nenhuma forma de ser relevante (SANTOS, 2002, p: 247).

A metáfora do palimpsesto expressa o novo e o antigo, o ancestral tornado

híbrido. Trata-se de um pergaminho sobre o qual se escreve o novo sem que as

marcas da escrita anterior tenham desaparecido. O palimpsesto aqui expressa

um olhar do Sul por outros olhos e a apropriação dos conhecimentos do Sul

como matriz de novas composições.

A grande maioria dos autores3 que de alguma forma atua na prática da

facilitação de Círculos ou com pesquisas acerca dos Processos Circulares faz

referência a “estar em círculo” como um hábito ancestral de conversar ao redor

do fogo e consideram que tal hábito foi deslocado, posteriormente, para um estar

e dialogar ao redor da mesa. Para eles o hábito dos círculos se estendeu desde

os mais longínquos tempos até os dias de hoje. Todos são categóricos em

2 Afirmativa decorrente das fortes resistências ao uso das práticas que venham a oportunizar, sempre que desejado, um diálogo entre autor de ato violento ou danoso e o receptor desse ato. 3 Patrícia Thalhuber, Susan Thompson, Janiffer Ball, Wayne Caldwel, Kay Pranis, Carolyn Boyes-Watson, Barry Stuart e outros.

Page 3: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

afirmar que estamos aprendendo a nos reunir em círculos para tentar resolver

problemas, prestar apoio e interagir uns com os outros.

Os Processos Circulares datam do final dos anos 70, início da década

de 80 e decorrem do ressurgimento da soberania das tribos nas reservas norte-

americanas, quando vários modelos de círculo se desenvolveram. Isso se deu

porque o processo de pacificação Navajo4 irradiou-se e antecedeu a Justiça

Restaurativa, mas ao mesmo tempo, a teoria da Justiça Restaurativa, por sua

vez, havia influenciado a pensar sobre a justiça no enfoque Navajo. (MAC COLD,

2008, p.29)

Entretanto de que no que se refere ao abuso sexual, tem-se que no ano

de 1986 os Hollow Water First Nations (Ojibwa5) em Manitoba, iniciaram a prática

de Círculos de Cura buscando responder ao incesto e ao abuso sexual. Os

círculos objetivavam sanar as relações esgarçadas, além de buscar abordar

questões inerentes aos arranjos sociais que fomentavam a violência. Essa nação

aborígene, como tantas outras, havia sucumbido a padrões de violência cultural

e de alcoolismo profundos a ponto de “perder a cultura ancestral inteiramente”

(McCOLD, 2008, p. 29). O Círculo, como denominaram, é um modelo criado por

líderes locais, “principalmente mulheres Ojibwa” e “segundo estudo do Native

Counseling Services of Alberta (2001)” essa abordagem vem sendo percebida

como a de melhor resposta em relação “a custo-benefício em matéria de abuso

sexual”. (2008, p.29). Eles se tornaram um “ícone para os aborígenes” por terem

sido pioneiros em desenvolver e iniciar um processo próprio para a cura dos

hábitos de alcoolismo, de uso de drogas e abusos sexuais intrafamiliares e nas

relações próximas, na comunidade.

4 No início do século XIX, os Navajos viveram no que é hoje Novo México, em uma área que estava sob o domínio colonial espanhol. Estavam concentrados na parte superior do Rio Grand Valley. Quando os Estados Unidos venceram a guerra contra o México (em 1848), os Navajos não foram afetados, porém, quando o Exército americano decidiu tomar posse das terras (ao final da Guerra Civil Americana), as tropas americanas, lideradas pelo coronel Kit Carson devastaram a pátria Navajo. Eles foram obrigados a marchar cerca de 450 milhas para um campo de concentração chamado Bosque Redondo – no rio Pecos. Muitos deles morreram na caminhada durante um rigoroso inverno e por doenças. Após quatro anos diante da conclusão de que a iniciativa havia sido equivocada, houve o processo de reintegração e pacificação, com a instituição da Nação Navajo autorizada a retornar e reconstruírem suas vidas, suas culturas e, posteriormente suas próprias normas. 5 Ojibwa é um nome europeu atribuído ao povo das nações indígenas que foi, ao longo dos séculos, se tornando de uso comum. Eles atribuíam a si o nome Anishnabeg (pessoas boas) e Anishnabe quando no singular. (https://www.publicsafety.gc.ca/cnt/rsrcs/pblctns/fr-crcls-hllw-wtr/index-eng.aspx#worldview)

Page 4: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

Na visão dos Ojibwa foi o contato com a colonização e com uma

sociedade cujos hábitos por tão diferentes que chegavam a ser desconcertantes,

“se não totalmente confusos” causou uma alteração no equilíbrio da sua visão

de mundo. Por essa razão a necessidade dos círculos de cura, do alcance do

equilíbrio – ainda que o equilíbrio não seja, aqui, nosso foco ou preocupação.

Para esses povos nativos nada sucede de maneira independente e

isolada. Todos as “pessoas são conectadas umas às outras, no futuro e no

passado” (The four Circles of Hollow Water, 1997, p.iii, tradução minha6) ,

sempre foi e será assim. Eles entendem que para compreender o que se passa

na nação Hollow Water as pessoas devem compreender as diferentes

dimensões do ser: o físico, mental, espiritual e emocional, bem como a cultura e

o contexto desta. A cosmovisão desses povos indígenas é um ponto de profunda

divergência com os ocidentais. Na visão deles, tudo demonstra a fragilidade

humana e ausência de supremacia em relação aos demais seres viventes, pois

enquanto o urso hiberna, o homem tem de enfrentar o frio e caçar para

sobreviver, não tem mobilidade, marchando no frio enquanto os gansos

hibernam (op.cit.5). Nesse sentido, na percepção deles, o homem é apenas mais

uma espécie em um mundo povoado por tantos outros seres (persons) e tanto

os seres humanos quanto os animais (human-persons e animal-persons),

experimentam a vida não somente entre si, mas também entre outros seres

viventes e também os Guardiões ou Espíritos e creem que o relacionamento com

o mundo espiritual e com os espíritos é essencial. O valor central desses nativos

é o p´madazwin que significa vida no sentido pleno: saúde, longevidade, bem

estar para si e para a família. Para eles o objetivo de vida é a boa vida, que para

ser alcançada pressupõe o p´madazwin. E o alcance dessa plenitude decorre,

segundo eles, do bom comportamento, e as consequências de um mau

comportamento são a doença ou a morte.

Para eles, o sexo é “reconhecido e integrado ao desenvolvimento

saudável de suas crianças”, entretanto, certos atos (como o incesto e o uso da

6 Trata-se de um Compendium com citações de vários autores, havendo trechos sem autoria definida. Todas as vezes em que houver necessidade de menção à origem da citação e não houver indicação de autoria, será utilizado o nome do documento ou op.cit. para evitar repetição do nome do documento. Nos trechos em que há autoria, faremos a referência.

Page 5: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

força) são consistentemente vistos como inaceitáveis e os que insistiam em

praticá-los, deparavam-se com sansões céleres e duras. (HERMAN, 1992, P.7)

As concepções correntes dos Ojibwa em relação à sexualidade não ficam

adstritas à percepção das pessoas sobre seus corpos ou seus órgãos genitais,

mas também quem elegem e de qual forma decidem compartilhar seus desejos

e suas sensações sexuais.

A frase "como uma pessoa se sente sobre o seu corpo” nos oferece

pistas para a natureza difusa da sexualidade humana. Como somos seres

físicos, também nós somos seres sexuais; nossa sexualidade está na nossa

fisicalidade e é expressa através do meio físico do corpo. Na expressão sexual

a pessoa expande sua intimidade (...) sensações são reveladas (...) Se a

expressão sexual ocorre em um contexto saudável e positivo a experiência é

extremamente gratificante. Bons sentimentos sobre o corpo são reforçados (...)

Essa intimidade e troca de sentimentos com um parceiro pode melhorar muito a

autoestima. (...) Por outro lado, a expressão sexual sem o consentimento pleno

e consciência, por meio da força ou o incesto causam danos autoestima.

Sentimentos de confusão, ansiedade, culpa, isolamento e dependência que

podem ter algum grau cultural de normalidade, especialmente para os

adolescentes, são intensificados para as vítimas e vitimizadores. (op.cit. 21)

A experiência sexual é considerada por esses povos saudável quando

plenamente consentida e consciente. Quando ao contrário, se decorrente de

força ou incesto, entendem que é prejudicial e que causa danos à autoestima. O

incesto não foi comprovado como uma prática usual e os mais velhos são os

responsáveis em instruir os mais jovens e o fazem indiretamente, por meio das

fábulas e lendas tradicionais e essa forma não é tida por casual, aleatória ou

descuidada.

As práticas tidas por não saudáveis são as decorrentes de coação e

dentre estas estão o estupro e o incesto e, como a maioria dos delitos familiares

(sexuais) envolve a figura do padrasto, isso acaba fazendo com que haja uma

referência cultural a essa figura e episódios. Nos casos de estupro ou incesto,

como há suporte no âmbito comunitário, não é raro que a situação seja

desvelada. Nessas circunstâncias se estabelece o processo circular e são feitos

círculos para a vítima (apoio) e para o ofensor (cura).

Page 6: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

Diz-se que os Círculos são como uma árvore cujas raízes são antigas e

seus ramos modernos, uma árvore cujas raízes encontram-se assentadas em

tradições antigas. As culturas antigas usaram “processos semelhantes aos

círculos para participar do trabalho comunitário” e acredita-se que “o Círculo é

uma forma usual de discutir questões importantes para a comunidade” (BALL,

CALDWELL PRANIS, 2010, p.32). Aparentemente essa forma foi utilizada por

muitos ao redor do mundo todo. O Processo Circular e os Círculos que elegemos

para dialogar são aqueles que “trata[m] mais diretamente de vários povos da

América do Norte”, dos nativos, as “Primeiras Nações” que ainda seguem

utilizando os Círculos que “integram os ensinamentos básicos do Círculo no seu

modo de viver” (p.32).

John Forester, ao prefaciar Doing Democracy With Circles (Fazendo

Democracia por meio dos Círculos), afirma que os Processos Circulares se

constituem de ideias tradicionais apresentadas ou articuladas de maneiras

inovadoras, que permitem experimentar novas abordagens e técnicas, aparente

e enganosamente simples. Afirma ainda que os Círculos não são percebidos

como uma panaceia técnica e nem como portadores de soluções rápidas ou

dotadas de alguma magia que elimine os problemas, mas sim como uma

tecnologia social, um processo ritual que fornece mais um caminho do que uma

técnica e que estimula a escuta e também os modos de perceber, (BALL,

CALDWELL e PRANIS. 2010) de afetar, de promover a polifonia e de deixar-se

ser afetado. Busca o que e o modo de se fazer junto e não para ou por alguém.

Defendem os autores do campo de estudos de círculos que as

cerimônias de abertura e de encerramento são utilizadas nos Círculos

para marcar esse espaço como um lugar sagrado no qual os

participantes estejam presentes com eles mesmos e uns com os

outros de uma maneira diferente de outros encontros ou grupos

comuns. A marcação clara do início e fim de um círculo é muito

importante porque o círculo convida os participantes a deixar cair

as máscaras e proteções comuns que eles possam usar para

criar distância de seu eu verdadeiro (core self) e o eu verdadeiro

dos outros. (PRANIS, 2011, p.16)7

Para estes a abertura tem a função de corte entre o estar no cotidiano e

o momento de partilha no Círculo e induz a um comportamento diferente dentro

Page 7: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

do Círculo, ou seja, induz a uma propensão ao maior esforço para o

estabelecimento do diálogo, maior disponibilidade para escutar e se fazer

escutado. As aberturas e os fechamentos são importantes também para ajudar

aos

participantes a se centrarem, a colocarem-se como

completamente presentes no espaço, a reconhecer a

interconectividade, a liberar distrações que não estejam

relacionadas, e a estarem atentos aos valores do eu verdadeiro.

O fechamento reconhece os esforços do círculo. Afirma a

interconectividade dos presentes. Gera o sentido de esperança

para o futuro e prepara os participantes para retornarem ao

espaço comum de suas vidas. As aberturas e os fechamentos

são projetados para se adequar à natureza do grupo em

particular (BOYES-WATSON e PRANIS, 2011, p. 38).

As cerimônias (rituais) de abertura e de encerramento são consideradas,

portanto, como marcos de momentos em que cada participante se sente

convidado, autorizado ou até mesmo seguro para “baixar a guarda”, retirar

máscaras e filtros utilizados para se colocar no mundo e se relacionar com os

demais e a voltar a atenção para o espaço cotidiano após o Círculo.

Cerimônia, segundo Joseph Bruchac, aborígene de uma das tribos

canadenses, é definida no dicionário

como um ato ou uma série de atos formais realizados de modo

solene conforme estabelecido nos procedimentos rituais ou

tribais. Embora isso seja certamente verdadeiro, pode-se dizer

também que (...) cerimônia é a própria vida. Tom Porter, um

ancião mohawk, disse-me que uma das razões para termos

tantas cerimônias é que os seres humanos esquecem

facilmente. (...) A cerimônia nos lembra, por intermédio da

música, da história, da dança e da indumentária e por meio de

comportamentos e sacrifícios rituais, que estamos em uníssono

com tudo o que nos cerca. Estar em equilíbrio conosco mesmos

e com o mundo ao redor é a forma correta e natural de ser. Por

intermédio da cerimônia, podemos tanto reconhecer quanto

restabelecer esse equilíbrio. (BRUCHAC, 2009, p.38)

Essas concepções e práticas, essas formas de perceber e de pensar, no

dizer de Bruchac (2009), são tão distanciadas do mundo ocidental que causam

estranheza e pode-se complementar afirmando que aguçam um senso crítico da

classe ou grupo hegemônico. A eventual exaltação ao Círculo como algo puro e

Page 8: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

mágico nos causa igualmente estranheza. O tema será melhor comentado no

terceiro capítulo, quando nosso olhar curioso levará às torções, análises,

inclusive de implicação e a uma leitura crítica.

A instalação que compõe o Centro do Círculo, também referido como

peça central, é criada para proporcionar um ponto comum para todos focarem,

o qual funciona como um apoio para cada participante ao fornecer

um ponto focal visual para o encontro no Círculo. A

peça central pode simbolizar muitas coisas, mas o

equilíbrio e a igualdade, em particular, são valores

importantes a serem reforçados no processo

circular. Eles nos lembram que, no círculo, viemos

juntos, como iguais e nos encontramos no meio, às

vezes partindo de polos opostos (THALHUBER et

THOMPSON, 2007, p. 42).

Em regra não são usadas mesas entre os participantes, ficando o Centro

do Círculo (peça central) sobre o chão, ao centro do espaço que se forma entre

as cadeiras dispostas em Círculo e por essa razão diz-se que no Círculo todos

estão equidistantes e frente a frente. O Centro do Círculo é constituído,

tipicamente de um

tecido ou uma esteira, nele pode ser incluído itens que representem os valores

do “eu” verdadeiro, os princípios fundamentais do processo, ou a visão

compartilhada do grupo. (...) frequentemente enfatizam a inclusão ao

incorporarem símbolos de membros individuais do círculo, bem como culturas

que estejam representadas no círculo (...) deve representar uma sensação de

calor humano, hospitalidade e inclusão (...) “enfatizar os valores que dão reforço

ao processo”. (BOYES-WATSON e PRANIS, 2011, p. 39)

Não raras vezes pode ficar a cargo do próprio grupo a responsabilidade

de trazer os elementos para o Centro do Círculo, sendo o grupo também autor

do modo como se organizam e se articulam seja entre si os elementos humanos

e não-humanos que se articulam no Círculo – já introduzindo aspectos da Teoria

Ator-rede, visto que este termo não é da literatura sobre círculos.

São sete os pressupostos centrais dos Processos Circulares, segundo

Carolyn Boyes-Watson e Kay Pranis. Primeiro (2011): “Cada um tem um eu que

é bom, sábio, poderoso e sempre presente”. Esse pressuposto diz respeito à

existência de um eu verdadeiro e sábio que habitaria cada ser humano, cuja

Page 9: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

natureza seria sábia, gentil, justa boa e poderosa. As ações não se confundem

com a pessoa. Há uma diferença entre ser e fazer (ser abusador, por exemplo,

ou praticar um abuso, trazendo-se para o tema do estudo), por isso atos e

pessoas são coisas distintas. O segundo: o mundo está profundamente

interconectado. Sendo o humano parte do universo, por princípio não haveria

como negar que tudo no mundo está profundamente interconectado, humanos e

não humanos, visíveis ou não. Em decorrência dessa crença, é certo que o

impacto das ações de cada um, de alguma forma afeta o todo. Na linguagem dos

nativos canadenses e americanos, todos estamos “relacionados” e, na dos

povos nativos africanos, a expressão que sintetiza essa ideia é “ubuntu – Eu sou

porque você é”. “Portanto, não há como desconsiderar qualquer ser, mesmo os

infratores, agressores e autores de atos danosos a terceiros. Como parte desse

universo interconectado, não há como lançá-los fora” (2011, p. 23). O terceiro

parte da crença de que todos os seres humanos desejam profundamente estar

em bons relacionamentos. Tem relação direta com a interconexão, tendo o

respeito como base e necessidade de todos, assim como o amor. O quarto é o

de que os seres humanos têm um dom que é único e valioso e isso faz com que

cada um seja importante pelo dom que tem. Para os ensinamentos dos povos

indígenas, cada criança nasce com quatro dons advindos da Mãe Terra

(Pachamama), sendo da responsabilidade dos adultos reconhecer esses dons,

únicos, e auxiliar os jovens a cultivá-los. A criança indígena deve crescer usar

os seus quatro dons para auxiliar os outros. A diversidade é percebida com uma

força, sendo a interdependência essencial para a sobrevivência. Pelo quinto

pressuposto, as mudanças não dependem de nenhum talento adicional, tudo o

que é necessário para câmbios positivos já está disponível é uma questão de

pensar pelo positivo e não pelo déficit. A criatividade humana somada ao

comprometimento humano são valiosos tesouros e fonte de esperança. O sexto

pressuposto é o de que somos holísticos, ou seja, as mentes, os corpos, as

emoções e os espíritos estão presentes em tudo o que fazemos, sendo

igualmente importantes. E, por fim, o sétimo traz a ideia de que precisamos de

práticas que construam hábitos de vida alinhados com o nosso verdadeiro eu e

com os valores que prezamos. (BOYES-WATSON e PRANIS, 2011, p.22 a 28).

Page 10: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

Para essas autoras, uma vez que “os pressupostos centrais” encontram

“ressonância” nos participantes, estes reconhecerão o círculo como uma

“ferramenta extremamente útil para sua prática educacional”.

O círculo tem uma sistemática, uma forma padrão de funcionamento que

descreveremos a seguir. Com este relato pretende-se deixar claros seus

processos, que não necessariamente serão utilizados no trabalho de campo

analisado nesta tese. No entanto, foi a experiência com a prática desse modo

que suscitou a necessidade de mudanças que vieram e virão a seguir.

Em regra os Processos Circulares envolvem três momentos distintos:

uma etapa preparatória, um encontro (o Círculo propriamente dito) e, quando há

a necessidade de acompanhamento da execução do Acordo (quando se logra

um acordo e dele resultam obrigações a serem cumpridas) há o que se vem

denominando como Pós-Círculo.

Na etapa preparatória é verificada a pertinência da instalação de um

Círculo para estabelecer o diálogo sobre uma determinada situação. Para tanto

há uma avaliação prévia quanto à adequação da metodologia que passa pela

análise do histórico da violência e das questões relacionadas à segurança de

todos; averiguação da existência de tempo suficiente para a instalação e

desenvolvimento do processo, em especial o momento do Círculo, já que o

tempo não é, em regra, rígida e previamente fixado, mas tão somente estimado;

constatação do desejo de participar (ou não) tanto por parte do autor do ato

ofensivo quanto por parte da vítima, assim como das redes direta ou

indiretamente envolvidas; existência de clareza quanto a motivação do Círculo e

seus propósitos; disponibilidade de facilitadores capacitados para manter o

Círculo (incluindo o conforto quanto ao tema ensejador do Círculo) e, o que é

mais sensível, avaliação quanto às condições necessárias para garantir a

segurança física e emocional dos envolvidos e o modo de impedir a revitimização

da vítima e agressões a quaisquer participantes, inclusive ao ofensor, caso todos

concordem em participar.

Avaliadas as circunstâncias, as motivações, finalidades e objetivos a serem

alcançados e definida a pertinência da instauração do Círculo é pensada a

preparação do Círculo enquanto processo: logística (a data, local, o que será

colocado no centro do círculo, o que será utilizado como bastão de fala e,

também, quem será o facilitador ou a equipe de facilitação).

Page 11: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

Cerimônias, escolha do facilitador, em que se avalia a disponibilidade, a

capacidade, a possibilidade de trabalhar o tema, em seguida avalia-se e define-

se os participantes, considerando a motivação e a finalidade da participação e

as contribuições possíveis de quem participa (quem, por que e para que

participa) e é feito o planejamento do encontro: as cerimônias de abertura e de

encerramento, os recursos para cada etapa - perguntas úteis para cada etapa

do Círculo, perguntas necessárias para a abordagem do tema principal e a

estimativa das paradas (intervalos).

Após a etapa preparatória na qual se estruturam equipe, espaço e

participantes e tudo o mais necessário, ocorre a segunda etapa que é a do

Círculo, momento do encontro de todos aqueles que se colocaram disponíveis

para participar, seja porque foram identificados como pessoa que conhece o

assunto a ser tratado, seja alguém que mantém boas relações com todos os

participantes diretamente afetados e/ou interessados nas questões a serem

tratadas no Círculo. A definição acerca da participação no Círculo é tomada de

forma conjunta, considerando o conforto de todos, tanto a pessoa contra quem

o ato foi praticado, pessoa que sofreu diretamente o dano, quanto o autor do ato

danoso, que são as pessoas mais diretamente envolvidas.

O encontro é inspirado na Roda de Medicina Xamã em que há igual

tratamento ao físico, ao mental, ao emocional e ao espiritual. No Círculo, sob

essa inspiração, o tempo dividido em quatro partes iguais para tratar questões

diferentes: no primeiro momento ocorre o que autores do campo denominam

como reunião, quando se pretende estabelecer o conhecimento ou

reconhecimento mútuo; no segundo o foco é voltado para a construção de

entendimento e geração de confiança; no terceiro os esforços convergem para

a abordagem do tema que ensejou o Círculo e no quarto se dá o

desenvolvimento de planos. Em regra, a essa altura já se consolidou o que os

nativos denominam como senso de unidade. Cabe a nós descobrir quais são os

sentidos que queremos dar e a que, temáticas que serão discutidas nos terceiro

e quarto capítulos.

Há uma estrutura nos Processos Circulares que pressupõe a existência

de elementos essenciais e estruturais do Círculo sem os quais, segundo Kay

Pranis, não se considera ou não se pode falar em Círculo. Além do formato

geométrico de organização das pessoas, os Círculos utilizam cinco elementos

Page 12: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

considerados estruturais, que lhes são inerentes e o integram e cujas bases

estão nos ensinamentos e valores ancestrais, ressurgidos na província de

Yukon, no Canadá: as cerimônias de abertura e encerramento, os norteadores

(orientações ou regras), o bastão de fala, o facilitador e a decisão por consenso.

As cerimônias de abertura e fechamento (rituais) são dedicadas à criação de um

espaço físico e temporal qualitativamente diferenciado. A cerimônia de abertura

tem a finalidade de preparar as pessoas para ocupar um outro lugar,

influenciando na qualidade da presença, e a cerimônia de encerramento para o

retorno às atividades cotidianas. Os norteadores de conduta servem para

estabelecer regras claras e compartilhadas de como atuar e se comportar no

Círculo. O bastão de fala, também é referido como talking piece ou objeto da

palavra, é uma peça que passa de pessoa para pessoa ao longo do círculo

sempre adotando um sentido unidirecional, é utilizado para agilizar a circulação

da fala através de rodadas ou passadas do bastão de fala, indica de quem é a

vez de falar e possibilita ouvir sem interrupção, passar a vez ou ofertar silencio.

Qualquer coisa pode ser utilizada para essa finalidade, desde um pedaço de

madeira, uma pedra, um cristal, um brinquedo ou algo manejável ao qual possa

ser atribuído um sentido ou que possa servir como um ponto focal para reflexão

quando conectado ao tema. O facilitador (keeper - guardião) é uma pessoa que

se capacita e desenvolve habilidades para conduzir o Círculo, exercendo a

função de “guardião do espaço” compartilhando com os demais a

responsabilidade pelo processo e quanto aos seus resultados. A decisão por

consenso significa que nos Círculos as deliberações não são alcançadas pelo

critério da maioria, mas por uma tentativa de atender a todos, nas suas principais

necessidades e o consenso ocorrerá quando todos puderem se comprometer

com a decisão e seu cumprimento. (THALHUBER; THOMPSON, 2007)8

As cerimônias de abertura e de encerramento do processo, o centro do

círculo, o bastão de fala (objeto de fala) em sentido unidirecional, que é utilizado

para agilizar a circulação da fala através de rodadas ou passadas do bastão de

fala, o estabelecimento de valores norteadores para o grupo e a serem

compartilhados pelo grupo e, até certo ponto também as perguntas que

8 THALHUBER, Patrícia B.V.M; THOMPSON, Susan. Building a Home for the Heart – Using value in Value-Centered Circles. Living Justice Press, 2007.

Page 13: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

funcionam como disparadoras da conversa e das reflexões pelo grupo são

elementos que constituem essas práticas.

O bastão de fala (talking piece), também referido como objeto da palavra

ou ainda peça de fala, é um dispositivo utilizado para fazer circular a fala entre

os participantes do Círculo, o qual de certo modo regula – ou tenta regular, na

medida em que se negocia seu uso – o fluxo de diálogo. O bastão de fala

é passado de pessoa para pessoa em volta do perímetro do

círculo. Somente a pessoa segurando o objeto da palavra pode

falar (...) sem interrupção e permite aos ouvintes se focarem em

escutar, sem se distrair pensando numa resposta ao que está

falando. (...) permite a expressão completa de emoções, reflexão

atenciosa, e um ritmo sem pressa (...) é um equalizador

poderoso. Permite que cada participante tenha igual

oportunidade de falar e carrega o pressuposto de que cada

participante tem alguma coisa importante para oferecer ao

grupo. À medida que passa fisicamente de mão em mão (...) tece

um fio de conexão entre os membros do círculo (...) reduz o

controle do facilitador e, consequentemente, compartilha o

controle do processo com todos os participantes. (...) Quanto

mais significado o objeto da palavra tiver (de forma consistente

com os valores do círculo), mais poderoso será para gerar

respeito pelo processo e alinhamento com seu eu verdadeiro

(BOYES-WATSON e PRANIS, 2011, p. 39).

Os autores do campo afirmam, ainda, que a forma de organizar o

diálogo, fazer circular as falas privilegia a polifonia, já que “todos são

considerados importantes, dotados de dons e com contribuições a oferecer”, o

que depende em muito do facilitador e da forma como o Círculo é instaurado.

O facilitador ou guardião (keeper) é percebido pelos autores do campo

(BOYES-WATSON e PRANIS, 2011) como a pessoa que cuida do Círculo e que

é parte do grupo tanto quanto os demais, porém, facilita as rodadas e articula

perguntas norteadoras do Processo Circular. É responsável por ações que

antecedem o momento do encontro (Círculo), tal como a seleção do bastão de

fala, como também garantir o “conforto e acolhimento dos participantes” e é ele

que provê “os materiais a serem utilizados no Círculo”.

É importante marcar que isso pode não ser tão simples assim e parece

que em parte dependerá do quão implicado o facilitador esteja e o quão

complexo seja o tema que motivou o Círculo, sem desconsiderar o grau de

conflitualidade entre os presentes.

Page 14: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

O facilitador pode atuar solo ou em dupla

Frequentemente os Círculos têm dois guardiões que trabalham em conjunto.

Durante o Círculo, guardiões servem para facilitar o fluxo de diálogo. Eles não

controlam nem dirigir o diálogo: eles "mantê-lo". (...) geralmente ajustam os

pensamentos durante a rodada de abertura com um conjunto de perguntas que

podem orientar a partilha, embora sempre incentivem os participantes a não se

sentirem vinculados pelo que eles sugerem. Muitas vezes, problemas surgem,

coisas que aconteceram na vida dos participantes ou emoções que vêm à tona

- que os obrigam a alterar os seus planos, fazendo alterações para as rodadas

seguintes. (THALHUBER et THOMPSON, 2007, p. 42)

O Círculo entendido como um espaço intencional é formatado para

permitir que os participantes possam se apresentar consoante o que os autores

entendem como o eu verdadeiro9, adotando atitudes fundadas nos valores que

prezam e que os influenciam em seus modos de ser e de estar no grupo,

oferecendo o melhor de si, bem como para que sejam estimulados a dar o melhor

de si durante o período em que estão no Círculo, percebendo o que os une

enquanto grupo (interconectividade), mesmo quando as diferenças existentes

sejam muito marcantes. Há também o estímulo ao reconhecimento da existência

e o “acesso” aos “dons” de cada um, evocando a sabedoria individual e a

coletiva. É um espaço que estimula cada um a se engajar nos diferentes

“aspectos da experiência humana – mental, física, emocional e espiritual”, na

construção de significados e, ainda, a “praticar comportamentos baseados nos

valores mesmo quando isso possa parecer arriscado (BOYES-WATSON e

PRANIS, 2011, p. 35).

Na perspectiva desses autores, este procedimento é estruturado de

modo a criar um espaço seguro e no qual haja liberdade apoiada na

confidencialidade negociada entre todos, de modo que todos possam se sentir

encorajados a falar o que entendem por (sua) verdade, baixar a guarda ou, em

outras palavras, deixar cair as máscaras, as defesas e estar presente no que

consideram a sua mais plena humanidade e encorajados a revelar os desejos

9 Adotamos a descrição dos Processos Circulares, mantendo a coerência narrativa a partir dos povos indígenas e das apropriações feitas pelos autores do campo. No quarto capítulo retomaremos esse tema a partir dos autores cujas perspectivas teóricas sustentam esse trabalho: o pensamento de Boaventura de Souza Santos, a Teoria Ator-rede, a análise institucional e, em alguns recortes, Baruch Spinoza.

Page 15: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

mais profundos, admitir erros e medos, assim como agir de acordo com os

valores ofertados individualmente ao círculos e assumidos como valores do

grupo (coletivo constituído), já que o espaço é organizado de modo a que todos

sejam respeitados e que todos se sintam em iguais condições para (ou igual

oportunidade de) narrar suas histórias e se sentir importante. O Círculo deve

propiciar um espaço apto para que “os aspectos emocionais/espirituais da

experiência humana” sejam acolhidos. (PRANIS, 2010, p. 25)

A forma como os autores do campo descrevem o funcionamento de um

Círculo com o objetivo de gerar soluções para questões conflituosas, um Círculo

denominado Círculo de Construção de Paz, faz crer que ao escolher o Círculo

como uma via de encontrar formas de solucionar conflitos, fora do âmbito do

judiciário, estimula-se maior participação e pode motivar um esforço maior em

prol de objetivos comuns daquele coletivo instituído, o que parece ampliar a

vontade de se colocar mais – de maior participação, o que, contudo, não se dá

a priori e de forma determinante.

Boyes-Watson e Pranis (2011) defendem que quanto mais as pessoas

praticam os comportamentos adotados no círculo, mais elas fortalecem hábitos

e, por decorrência, os comportamentos do Círculo se fazem presentes em outras

circunstâncias de suas vidas. Neste aspecto, há que se perguntar se é realmente

uma prática educacional ou se é algo que vai se tornando um modo de ser e de

agir; a partir dos afetos que produzem, criam um repertório, um plano de

consistência e, em decorrência, modos de fazer, de ser e de agir. Essas

reflexões e as que se seguem, acerca das perguntas, serão retomadas no quarto

capítulo com o suporte de alguns autores e pensadas e torcidas sob as

perspectivas da Teoria Ator-rede, entremeadas também pela Análise

Institucional.

Os facilitadores preparam perguntas a serem colocadas para os

participantes do Círculo. Os círculos usam perguntas ou temas norteadores no

início de muitas rodadas para estimular a conversa sobre o principal interesse

do círculo. Cada membro do círculo tem uma oportunidade de responder à

pergunta ou tema norteador de cada rodada. O preparo cuidadoso das perguntas

é importante para facilitar a discussão que vai além das respostas superficiais

(BOYES-WAHTSON e PRANIS, 2011, p.40).

Page 16: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

Também são parte essencial da estrutura do Círculo as diretrizes ou

norteadores construídos pelo grupo em conjunto. Os participantes em um círculo

têm o papel central na concepção de seu próprio espaço, criando as diretrizes

para sua discussão. As diretrizes articulam os acordos entre os participantes

sobre como eles se conduzirão no diálogo do círculo. O objetivo das diretrizes é

descrever os comportamentos que os participantes sentem que farão com que o

espaço seja um lugar seguro para que eles falem suas verdades. As diretrizes

não são limites rígidos, mas são lembretes de reforço das expectativas de

comportamento de todos dentro do círculo. Elas não são impostas aos

participantes, mas adotadas por consenso do círculo. (PRANIS, 2010, p.15)

Os Círculos são apropriados como uma das formas de efetuar a Justiça

Restaurativa, com a finalidade de restaurar relações, reparar danos e efetivar o

sentimento de justiça. Mas nem todos os Círculos são utilizados no âmbito da

Justiça Restaurativa, tema que será melhor aprofundado no segundo capítulo.

A literatura sobre círculos faz uma gradação entre os diferentes tipos de

círculos existentes, que adquirem diferentes nuances na forma de condução pelo

facilitador e os conteúdos tratados e, por decorrência em todo o fluxo de seu

desenvolvimento. Em uma ponta à esquerda ou à direita, eles estabelecem os

Círculos que envolvem situações de alta/maior conflitualidade e, portanto, visam

encontrar soluções para problemas complexos. Na outra extremidade, situam os

que não envolvem situações de conflitos e que envolvem uma relação de

amizade e cooperação entre os participantes. Nessa gradação há um momento

em que se pode distinguir (e dividir) os Círculos entre os que estão no âmbito da

Justiça Restaurativa e os que estão em dois grandes grupos fora deste. Em

âmbito da JR estão todos os Círculos, havendo aqueles que envolvem situações

de conflitos e, fora destes, todos os demais grupos dos outros que servem de

dispositivo para inúmeras outras situações. Em síntese: somente quando

envolvem situações de conflitos em regra decorrentes de danos pessoais ou

materiais e ofensas a serem esclarecidas e reparadas, independentemente do

nível de conflitualidade (maior ou menor), é que os autores situam os Processos

Circulares no âmbito da Justiça Restaurativa e afirmam que eles se constituem

em um dos meios ou formas metodológicas de alcançar os objetivos de restaurar

a relação rompida pela prática de um ato danoso (PRANIS, STUART e WEDGE

2003, ZEHR 2008, PRANIS 2010, RIESTENBERG 2012, et al). Embora a

Page 17: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

intenção, neste momento, não seja a de problematizar essa prática social, é

interessante registrar e pontuar a recusa de uma “fórmula infalível” capaz de

gerar tais efeitos incondicionalmente. Esta apropriação, como ocorre em outros

dispositivos voltados para os trabalhos com grupos, nem sempre vai promover a

polifonia ou conseguir uma construção conjunta, e essa é uma questão que será

analisada nos dois últimos capítulos com maior aprofundamento.

Kay Pranis (2011) define o círculo de resolução de conflitos como “um

processo de diálogo que trabalha intencionalmente na criação de um espaço

seguro para discutir problemas muito difíceis ou dolorosos, a fim de melhorar os

relacionamentos e resolver diferenças” (p.11). Segundo ela, em regra o círculo

busca “encontrar soluções” adequadas a cada um dos participantes. O processo

funda-se na crença de que cada um dos participantes tem algo a oferecer e todos

têm “igual valor e dignidade”. No Círculo todos têm igual oportunidade de colocar

suas ideias e opiniões. O pressuposto é o de que “cada participante tem dons a

oferecer na busca para encontrar uma boa solução para o problema” (PRANIS,

2010, p. 11).

Além do Círculo de Resolução de Conflitos – com o objetivo de

compreender e pacificar as relações –, os autores nominam, no âmbito da

Justiça Restaurativa, outros tipos distintos de Círculos, tais como: Círculos de

Apoio ou suporte – voltados tanto para a vítima de ato danoso quanto para o

ofensor; Restaurativo – para ressarcir danos ou restaurar as relações; de

Reintegração – para o acolhimento de jovens após o cumprimento de medida

socioeducativa (internação) e para apoio a adultos quando do retorno ao seu

contexto social após o cumprimento de pena de encarceramento em sistema

prisional; de Sentença – para a definição da sanção pela comunidade e posterior

incorporação na sentença judicial (tipo de Círculo ainda não aplicado no Brasil).

Entre aqueles cuja instalação não é motivada por conflitos estão:

Círculos de Conversa (Diálogo) – para estreitar a convivência em grupo; de

Celebração – visando o compartilhamento de alegrias, conquistas e de ocasiões

especiais; de Entendimento – como o objetivo de gerar melhor (e uniforme)

compreensão de determinadas questões que afetam ou dizem respeito a um

grupo (empresa, família); de Cura – tanto para apoio à superação de traumas

(acidentes ou catástrofes) quanto para auxiliar na organização de redes

familiares e de pessoas próximas em situações de doenças; de Construção do

Page 18: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

senso de Comunidade – com o fito de construir maior interação, quando há

temas de interesse de uma coletividade; de Tomada de Decisão – quando da

necessidade de negociação coletiva para o alcance de decisões consensuadas,

afastando-se do processo decisório pautado na maioria, visto que, em regra, há

a necessidade do comprometimento e do apoio de todos aqueles que de alguma

forma são alcançados pelos efeitos ou pelas ações decorrentes ou inerentes à

decisão.

Para os autores centrais do campo (PRANIS, STUART e WEDGE 2003,

ZEHR 2008, PRANIS 2010, RIESTENBERG 2012, BOYES-WATSON, PRANIS

2010, et al), o Círculo é compreendido como um lugar (espaço/tempo

diferenciado) “forte ou suficiente para conter” raiva, frustração, dor, sofrimento,

tristeza, alegria, euforia, contentamento, verdades e paradoxos, conflitos e

divergências, visões de mundo diferentes e mesmo o silêncio. (PRANIS, 2010,

p.21)

Os autores do campo (BOYES-WATSON, PRANIS 2010, PRANIS 2010,

SCHIRCH, 2004 et all) nos dizem que o Círculo é um lugar de se contar histórias.

As narrativas pessoais são compreendidas como fontes de sabedoria e de ideias

para quem as conta e também para os outros. Nos Círculos parte-se da premissa

de que compartilhando as “histórias individuais nós abrimos espaço para outros

se conectarem conosco, encontrarem bases comuns, e nos conhecer mais” e

contar “nossas histórias é um processo de autorreflexão” (PRANIS, 2010, p. 56).

O Processo Circular também é definido como “um processo estruturado

para organizar a comunicação em grupo, a construção de relacionamentos,

tomada de decisões e resolução de conflitos de forma eficiente” (BOYES-

WATSON e PRANIS 2011, p.35). Para Boyes-Watson e Pranis, o Círculo é um

processo que “cria um espaço à parte de nossos modos de estarmos juntos”,

onde é nutrida a filosofia de “relacionamento e de interconectividade” que pode

se constituir em um norteador para “todas as circunstâncias” da vida, seja

“dentro” ou “fora” do Círculo.

Esse processo, segundo Kay

é pré-concebido para discutir como a conversa acontecerá antes

de discutir os assuntos difíceis. (...) o círculo trabalha os valores

e diretrizes antes de falar sobre as diferenças ou conflitos. (...)

Quando é possível, o círculo também trabalha a construção de

Page 19: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

relacionamentos antes de discutir os assuntos difíceis. (BOYES-

WATSON e PRANIS 2011, p.35)

De certa forma o Processo Circular difere de outros sistemas não

adversariais de resolução de conflitos (ADRS – Alternative Disput Resolution

Systems)10 por ser concebido dentro de uma proposta de atuação participativa

em que o facilitador integra o grupo como parte ativa e não como alguém de

quem é esperada uma certa imparcialidade, conceito caro à mediação de

conflitos, que não se manifestam e nem opinam, em relação ao conflito e às

partes (mediandos) com os quais trabalha. Aqueles que vêm utilizando essa

forma dialógica e atuam como facilitadores dos Processos Circulares afirmam

que o exercício das atividades de facilitação não é baseado na autoridade sobre

o grupo. Os facilitadores buscam não ter uma forma diretiva de atuar. Afirmam,

ainda, que o Círculo (reunião, encontro) não é pautado na coerção. Neste

sentido, arriscamos apostar, sob a inspiração de Peter Pál Pelbart (2008), na

coesão que faz ruir sua identidade centrada e isolada, mas que mantém a

dessimetria, não se tratando de mais do mesmo, de uma totalidade que se

constitua em uma individualidade ampliada. (p. 36). Nele, segundo Kay Pranis,

Barry Stuart, e outros autores11, o facilitador do diálogo não estabelece controle

sobre as pessoas, sobre o processo e nem tão pouco sobre a decisão, caso haja

a necessidade de tomar alguma, ficando a cargo do grupo a construção coletiva

e a responsabilidade sobre os resultados alcançados. Nas dinâmicas grupais

neste formato, as perguntas são fundamentais, assim como para as articulações

de um coletivo na perspectiva da Teoria Ator-rede, ponte ou elo entre essa

prática social e a Teoria Ator-rede que será mais aprofundado no terceiro

capítulo.

Para Boyes-Watson e Pranis (2011) e a totalidade dos autores centrais

do campo, o formato geométrico circular permite um campo visual livre, sem

obstáculos, onde todos estejam equidistantes do Centro para que adotem uma

10 Os métodos não adversariais de resolução de conflitos englobam a negociação assistida, a mediação, a conciliação. Voltados para a área penal, são utilizadas em vários países (Américas, Europa, Nova Zelândia e Austrália) a Mediação Vítima-Ofensor e Conferências de Grupo Familiar, Círculos Restaurativos, estes últimos também organizados em formato circular, porem com procedimentos distintos. 11 Há muitos profissionais além dos citados: Carolyn Boys-Watson, Janiffer Ball, Wayne Caldwell, Patrícia Thalhuber, Susan Thompson, utilizando os Processos Circulares para diálogo e são coincidentes nessa percepção.

Page 20: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

postura colaborativa, se comprometam uns com os outros frente a frente. Pranis

e Boyes-Watson (2011) defendem que essa disposição favorece o foco na

preocupação comum ao grupo, sem criar, a sensação de oposição, a existência

de lados. É uma forma geométrica utilizada também para enfatizar a

horizontalidade, a igualdade e a conectividade e, como resultado, segundo as

autoras, há, em regra, maior comprometimento do daquele coletivo e maior

transparência, vez que, para elas, a linguagem corporal fica acessível a todos.

(BOYES-WATSON e PRANIS, 2011, p. 38) No que se refere à igualdade, é de

se esclarecer desde logo que a essa igualdade a que as autoras se referem não

é outra que não a da oportunidade de fala sem interrupção ou em outras

palavras, a da oportunidade da circulação da fala e de informações, o que

somente ocorre se e quando o círculo é conduzido de modo a que se instaure a

polifonia. A conectividade será comentada no quarto capítulo, à luz da Teoria

Ator-rede.

As Conferências de Grupos Familiares têm origem nas tradições dos

povos Maoris da Nova Zelândia e tornaram-se o modelo de Justiça Juvenil do

país desde os finais da década de 80. Após convocar uma comissão para se

debruçar sobre (e estudar) o problema das condutas dos jovens na Nova

Zelândia, o governo estabeleceu que uma ampla gama de temas relacionados

com a que definiam como delinquência juvenil seria enfrentada pelas

denominadas Conferências de Grupo Familiar (Family Group Conference) ao

invés de ser tratado e decidido no âmbito do Tribunal.

Para os Maoris, povo nativo da Nova Zelândia, o conhecimento inicia-se

com o que eles denominam whakapapa, ou seja, a partir dos deuses, heróis,

ancestrais - no entre – o início de tudo e a geração atual. É comum que os Maoris

conheçam seus pais e a sua ascendência, desde a criação. Na cosmovisão

maori o planeta é a mãe terra, o pai é o céu; há a concepção de que fazem parte

do mundo, tudo está integrado e são parte do todo não estando acima ou abaixo

da criação. Este foi um povo marginalizado, dominado e excluído das estruturas

e instituições do Estado, mas que não ficaram nessa condição. As marchas,

ocupações de terra, protestos e outras demandas foram conquistando o

reconhecimento e exigindo a preservação de sua condição. (WALKER, 1997).

Mobilizaram-se na recuperação de sua tradição de reunir a família e a

comunidade para identificar e lidar com os problemas que afetam a todos. As

Page 21: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

lutas por reafirmação dos direitos e tradições culturais dos povos Maoris

culminaram na edição do Children, Young People and Their Family Act 1989 (Ato

1989, Crianças, Jovens e suas Famílias)12.

As Conferências de Grupos Familiares são alicerçadas na crença de

que a falta de um indivíduo reflete as falhas da família e da comunidade. Na

tradição Maori a família e a comunidade devem estar diretamente envolvidas na

questão da responsabilização pelo ato ofensivo praticado por seus jovens. Este

pensamento e a forma de abordar a delinquência juvenil foram ganhando

reconhecimento enquanto metodologia restaurativa e, gradualmente, passaram

a integrar o Sistema de Justiça Juvenil na Nova Zelândia (MCRAE; ZEHR,

2004)13. Atualmente essa prática já está presente na maior parte das tribos

indígenas estendendo-se por toda a Nova Zelândia. Posteriormente, tornou-se

prática social dialógica, também, na Austrália e em inúmeros outros países. Isso

ocorreu em resposta à reação das mães dos jovens Maoris que reclamavam do

tratamento dispensado aos seus filhos pela polícia, já que entendiam por tradição

Maori que a família e a comunidade devem estar diretamente envolvidas nas

questões da responsabilização de seus jovens por práticas de atos danosos e

ofensivos.

As Conferências de Grupo Familiar são, portanto, os encontros formais

para a tomada de decisão em conjunto sobre eventos que, mormente, envolvem

violência ou ofensas graves e dos quais participam: o ofensor e sua família

estendida (whãnau), a vítima e seus suportes, um representante da polícia e

outras pessoas. Antes do encontro o Coordenador conversa com o autor do ato

danoso e sua família sobre o processo e sobre quem poderá participar,

contribuindo de alguma forma para o encaminhamento das questões. O mesmo

ocorrendo em relação à pessoa a quem o ato foi dirigido e sua família, com vistas

a identificar a disponibilidade para participar, a forma dessa participação, se

presencialmente, se por meio de tecnologia (videoconferência, canal de voz), por

carta, quem atuará como suporte e quais as suas expectativas em relação ao

ressarcimento. Somente após a cuidadosa etapa preparatória que inclui não só

o trabalho direcionado ao ofensor e sua família e a vítima e seus suportes, a

12 Ato regulador da proteção da criança, do jovem e das famílias maoris editado em 1989. 13 MCRAE, A.; ZEHR, H. The little Book of Family Group conferences - New Zealand style. Good Books, USA, 2004

Page 22: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

eleição de advogados que cuidam especialmente da justiça juvenil, defensores

leigos com a função de assessorar e garantir que o processo está

adequadamente estruturado, respeitando traços culturais dos envolvidos,

servidores sociais é que se passará à segunda etapa, que é a da reunião.

Conduzir de forma a garantir propostas, decisões, planos de ação que

efetivamente atendam ao receptor do ato (vítima), sempre observando os

princípios norteadores das Conferências pautados nos v|alores de participação

respeitosa, reparação e reintegração.

Havendo disponibilidade para a participação, é função do coordenador

cuidar da infraestrutura, do encaminhamento dos convites, notificando todos os

participantes acerca dos cuidados necessários ao bom desenvolvimento da

reunião. Coletar dados sobre pessoas indiretamente vinculadas ao episódio

indisponíveis para participar e adotar as medidas para que haja clareza e

inteligibilidade nos temas e no processo como um todo, garantindo o diálogo

intercultural se for o caso.

O encontro é conduzido pelo coordenador, alguém capacitado para ocupar essa

função e que integra, em regra, o sistema de Justiça Juvenil. Eventualmente

algum membro da comunidade poderá exercer as atribuições de organizar o

processo e de atuar como facilitador do encontro. Mas em regra, o Coordenador

é alguém do serviço social com a função de dirigir a reunião e os trabalhos de

forma imparcial e equilibrada. O objetivo é propiciar o apoio considerado

necessário ao ofensor para que assuma as suas responsabilidades e promova

mudanças em seu comportamento. Também está voltado ao apoio às famílias

para que possam assumir um papel significativo nesse processo que visa

atender às necessidades das vítimas. (MAC RAE e ZEHR, 2004, p. 12).

Nessa etapa é solicitado aos participantes que sentem aonde se sintam

confortáveis, mas dentro da configuração para a Conferência do Grupo Familiar,

o que passa por organizar as pessoas próximas ao Coordenador e aos seus

suportes, ocupando lugares do lado esquerdo e direito deste.

A reunião desenvolve-se segundo as seguintes etapas: a Abertura pode

ser iniciada com uma oração, canção ou poema, caso seja considerado

adequado aos envolvidos, passando-se as apresentações pessoais e uma

apresentação geral do encontro e o foco das atividades. A segunda é a etapa do

Compartilhamento de informações, que tem foco no comportamento do ofensor,

Page 23: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

na qual é lido o resumo dos fatos pelo policial presente, sendo que neste resumo

devem constar todas as acusações que recaem sobre o ofensor (as quais já

devem ter sido previamente assumidas como verdadeiras por este); em seguida

é perguntado ao ofensor se compreende as acusações que lhes são feitas. O

autor do ato danoso pode expressar suas motivações e após ouvir a experiência

vivenciada pela vítima e os impactos do ato sobre ela, poderá dizer como se

sente após ouvi-la e o que compreendeu de sua fala. Este pode ser o momento

em que se estabelece o diálogo entre vítima e ofensor, objetivo primeiro das

Conferências de Grupo Familiar. Quando a conversa flui, pode ser solicitado à

família do ofensor e a ele um resumo do que ouviram, pode ser aberta a fala aos

defensores leigos e advogados juvenis, que sabem que estão no contexto não

para interferir (função litigiosa), mas para apoiar o jovem autor do ato danoso, se

tem alguma informação ou se gostariam de acrescentar algo. O Coordenador

sumariza o que foi falado e abre espaço para que falem sobre o que ouviram,

estendendo aos suportes a oportunidade de oferecer contribuições, após o que

é iniciada a terceira etapa: Caucus e deliberações para uma conversa realizada

em reunião privada em que o ofensor, juntamente com a sua família, avalia os

recursos e os suportes necessários para identificar as bases para a elaboração

do plano a ser proposto. Após esse momento pode ser feito um intervalo em que

é oferecido um lanche (opcional). Durante esse intervalo a vítima e seus suportes

esclarecem ao coordenador suas expectativas e desejos para que sejam

incluídos no plano de trabalho a ser elaborado. Em seguida, reinicia-se com a

quarta etapa que é a do Acordo, momento em que são feitas as sugestões pela

família do autor do ato ofensivo, sendo este estimulado a apresentar as

propostas e em que a vítima propõe ajustes. Outras contribuições dos demais

presentes são incorporadas e é avaliada a exequibilidade do plano. Concluindo-

se pela viabilidade do plano, como e por quem será monitorado, feitas as

negociações finais, são redigidos os termos do acordo, incluindo-se no plano de

trabalho as questões, a reparação, a prevenção e o monitoramento. Na hipótese

de a vítima não estar presente (participação por carta) é avisado que ela será

consultada sobre o atendimento de suas necessidades. A quinta e última etapa

é a do encerramento que poderá incluir uma fala ou uma oração, caso

considerem apropriado (MAC RAE e ZEHR, 2004; MAXWELL, MORRIS E

HAYES, 2008).

Page 24: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

Observa-se que na Austrália a incorporação das Conferências de Grupo

Familiar, enquanto prática social dialógica, não incluiu a reunião privada

(cáucus), realizada para as deliberações familiares e processo de tomada de

decisão pelo ofensor e seus suportes sobre o que oferecer à vítima. No sistema

australiano tudo é realizado em plenária, ou seja, todos estão presentes durante

todo o tempo do encontro, diferentemente do sistema neozelandês quanto à

incorporação dessa prática.

A Mediação Vítima-Ofensor, cuja origem remonta ao sistema judiciário

canadense do ano 1974, tendo sido incorporada pelo sistema americano poucos

anos depois (1977), atualmente encontra-se presente na maior parte dos países

do mundo. Por ter sido sistematicamente usada para responder de forma

restaurativa a comportamentos delituosos, não havendo clara distinção entre a

Mediação Vítima-Ofensor e a Justiça Restaurativa.

Há mais de um modelo de mediação que se distingue consoante à

motivação e à finalidade. Em todas as formas e estilos, especialmente quando

se trata de tema afeto à matéria penal, tende a ocorrer estigmas emanados do

Poder Judiciário, desclassificações derivadas dos demais operadores de direito

que “podem levar a mecanismos perigosos de exclusão” (CARAM, 2002, p.1)

que não deveriam ocorrer no judiciário e nem na mediação, já que o mediador,

na qualidade de terceiro de atitude neutra/imparcial a trabalhar com os

envolvidos no episódio não abre juízos qualificadores. Essa

imparcialidade/neutralidade não é, entretanto, algo que se possa aceitar a priori

e é objeto de algumas considerações no terceiro capítulo desta tese.

Tanto na Mediação Vítima-Ofensor, quanto nos Processos Circulares e

nas Conferências de Grupos Familiares, há um processo voluntário que somente

se faz viável quando presentes os três pressupostos supracitados: a

voluntariedade, admissão da autoria do ato danoso e autonomia da vontade. É

um convite ao qual cabe recusa e, por pressupor que o autor do ato assuma a

responsabilidade de tê-lo praticado, deve obrigatoriamente ser um processo

isento de toda e qualquer tipo de coação, com ampla liberdade para os

envolvidos participarem ou não, estarem e permanecerem (CARAM et al p:

44;45).

Em semelhança à Conferência de Grupo Familiar o encontro presencial

é criteriosamente preparado em etapas desenvolvidas de forma individualizada,

Page 25: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

em que os participantes na circunstância de dano ou conflito existindo ou não

violência, se encontram, na presença de um mediador que conduzirá a reunião

para: compreender a situação de modo mais amplo e abrangente (precedentes

e as consequências), buscar encontrar soluções para os problemas ocasionados

pelo ato danoso de modo a atender as necessidades da vítima no sentido da

obtenção da reparação do dano, tanto quanto possível, bem como as do ofensor,

pela compreensão de suas razões e necessidades, considerando também a

participação da comunidade com suas questões que, em regra, envolvem

preocupações com o fato presente, com suas repercussões futuras e, ainda,

apoio aos que possam necessitar.

A mediação Vitima-Ofensor é um processo formal, porém flexível, com

uma dinâmica estruturada (CARAM et al p: 47-49). O processo de mediação

inicia-se com a fala do Mediador sobre o motivo do encontro e apresentação, de

forma geral, da situação danosa motivadora da mediação. Na sequência é dada

a oportunidade tanto para a vítima quanto para o ofensor contarem suas

percepções sobre a questão (suas histórias). A vítima é estimulada a falar sobre

os impactos do fato em sua vida e são buscadas formas de reparação do dano,

buscando-se, também, encontrar alguma forma ou modo de apoiar o ofensor

para que possa alcançar os objetivos de reparação e superação do problema.

Diferentemente dos outros dois aportes metodológicos supracitados, a Mediação

Vítima-Ofensor não se utiliza do formato circular para a organização das pessoas

no encontro e nem tem origem em tradições sapienciais de povos indígenas

como aquelas.

O mediador assume a condução do processo visando: compreender a

situação de modo mais amplo e abrangente (os precedentes e as

consequências); buscar auxiliar as pessoas na resolução dos problemas

decorrentes do ato danoso e atender as necessidades de todos os envolvidos.

A participação voluntária e a aceitação do convite à Mediação Vítima-

Ofensor pressupõem não só a liberdade para estar, permanecer, mas também a

de se expressar, silenciar se assim entender, acordar ou não, se e quando

desejado independentemente de histórico de violência.

Há características específicas na Mediação Vítima-Ofensor que se

iniciam na etapa preparatória e podem ir além da etapa do acordo que por vezes

é acompanhada. Na etapa preparatória quando é feita a pré-seleção dos casos

Page 26: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

há criterioso cuidado visando a segurança de todos os envolvidos; o potencial

de resolutividade do conflito; os riscos de (re)vitimizações e frustrações por

ambos os lados; a observância dos princípios da assunção da responsabilidade

pela prática do ato por parte do ofensor, a voluntariedade de todos, a livre

vontade de participar, a informalidade, interdisciplinaridade, princípios essenciais

ao estabelecimento da mediação nesse âmbito.

A mediação como meio de efetivação da Justiça Restaurativa deve

considerar as características intrínsecas de cada contexto fático e a

singularidade de cada caso. O processo é constituído de cinco etapas

(NORDENSTHAL, 2005), sendo imprescindível a realização de uma reunião

individual presencial na etapa preparatória posterior à triagem, entendida como

a verificação da adequabilidade à metodologia e a possibilidade de se instaurar

a Mediação Vítima-Ofensor. Segundo Umbreit (2001), essa reunião preparatória

presencial deve ser realizada com a vítima e com o ofensor em separado para a

observância de suas expectativas e perspectivas em relação ao ato danoso, bem

como a clareza quanto às vantagens e às desvantagens da autocomposição no

contexto penal.

Ao mediador cabe avaliar se todos estão aptos a iniciar a mediação e se

há receios quanto à abordagem de algum ponto importante para a solução das

questões na perspectiva dos envolvidos (UMBREIT, 2001, p.41). A abertura de

uma mediação ocorre em reuniões individuais preparatórias visando os ajustes

para realização da reunião conjunta que somente ocorre quando há consenso.

Os autores do campo (UMBREIT, 2001; NORDENSTHAL, 2005) consideram

importante a clareza quanto à diferenciação da figura do mediador e do juiz;

quanto à informalidade e a oralidade; a dinâmica da mediação e a existência de

igual oportunidade de fala, de escuta e da formulação de perguntas. Também no

que se refere à possibilidade da manifestação de participantes

(acompanhantes), desde que não seja retire o foco ou restrinja o contato direto

entre vítima e ofensor. Também é importante haver clareza sobre a igual

oportunidade do diálogo acerca de formas de resolver as questões e da

reparação dos danos. O mesmo em relação à redação do acordo, quando

possível atender a todos os envolvidos e desde que não haja qualquer tipo de

coerção exercida por qualquer um dos presentes. Outro cuidado é quanto à

confidencialidade durante todo o curso da Mediação e a decorrente

Page 27: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

impossibilidade do uso das informações para a construção de prova processual,

ainda que seja em esfera cível, na hipótese de não haver acordo ao final da

mediação. Há o esclarecimento quanto à possibilidade de realização de reuniões

individuais (caucus). É ressaltada também a possibilidade e a importância da

presença dos advogados com a função de auxiliar seus clientes no alcance de

soluções de ganhos mútuos. Por fim, há o estímulo a uma escuta atenta, sem

interrupções, em linguagem não adversarial, com vistas a soluções satisfatórias

(UMBREIT 2001, NORDENSTHAL 2005, AZEVEDO 2007, et al).

Em reunião individual define-se a ordem das falas, sendo usual a vítima

iniciar o seu relato ou escolher se quer falar primeiro. Este poder atribuído à

vítima é parte do processo de recuperação de sua percepção (e sensação) de

autodeterminação e da sua sensação de recuperação dessa autodeterminação

perdida com o ato violento. A fala da vítima será regulada por perguntas

formuladas pelo mediador, que versarão sobre o fato e suas consequências, o

mesmo ocorrendo com o ofensor. Cada qual terá, portanto, igual oportunidade

de se colocar e de falar sobre o os fatos a partir de seu ponto de vista. Em

seguida, na segunda etapa, todos têm a oportunidade de falar acerca do que

compreenderam e dos impactos da escuta. O mediador vai resumindo e

redefinindo o problema conforme o desenvolvimento dos trabalhos e as

conclusões alcançadas, criando uma agenda de trabalho que atenda aos

objetivos da vítima e do ofensor, que versam em regra sobre temas a serem

tratados e a ordem de prioridade, distribuição do tempo para cada tema etc.

(2005, 88-92). A terceira etapa é a da elaboração de propostas para o conflito,

que deve ser da autoria dos mediandos. Para Nordenstahl (2005, p.92-94), o

mediador pode auxiliar com propostas de solução ao problema desde que atue

com imparcialidade. A quarta etapa corresponde à identificação dos pontos

fundamentais para constar do acordo, quando alcançadas soluções que

atendem satisfatoriamente a todos. E, por fim, a quinta e última etapa, é a que

Nordenstahl (2005, p. 97-98) denomina como etapa de “seguimento e controle”

e que se dá após o término da mediação, visando a garantia do cumprimento do

que foi acordado.

Os autores do campo reconhecem a possibilidade de uma variação na

forma de conduzir ou instalar a mediação Vítima-Ofensor. Identificam como

possibilidade a instalação/realização de painéis nos quais os ofensores escutam

Page 28: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

vítimas de crimes, que não são necessariamente aquelas ligadas aos crimes que

eles cometeram, podem ser pessoas desconhecidas, porém vítimas de atos

semelhantes àqueles praticados por eles. Estas vítimas descrevem a dor e o

sofrimento experimentados em razão do crime. Essa prática tem o propósito de

despertar a empatia dos ofensores pelas próprias vítimas e conscientizar sobre

os desdobramentos do que fizeram (VAN WORMER, 2009). Essa proposta tem

por principal objetivo oferecer espaço para que a vítima possa obter informações

(respostas as suas questões), dissolver estereótipos (embaçar os lugares de

vítima e de ofensor), expressar sentimentos e obter o ressarcimento dos danos.

Em relação aos ofensores, produz o deslocamento do lugar de ofensor à lei e ao

Estado, conferindo um espaço para se colocar, compreender as repercussões

do ato e responsabilizar-se pelos danos a que deu causa (ZEHR, 2008).

Page 29: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Sara (2012) Por uma ecologia de justiças: Um estudo rural e Urbano da Pluralidade Moçambicana. In Kied, Helena Maria; Coelho, João Paulo Borges; Souto, Amélia Neves de; e Araújo, Sara (org): A Dinâmica do Pluralismo Jurídico em Moçambique. Maputo: Centro de Estudos Sociais Aquino de Bragança (CESAB). AZEVEDO, André Gomma de Azevedo (org.). Estudos em arbitragem,

mediação e negociação. Brasília: Brasília Jurídica, 2002.

BALL, Jannifer. CAWDWELL, Wayne e PRANIS, Kay Doing Democracy With

Circles. Engaging Communities in Public Planning. Living Justice Press. 2010.

BOYES-WATSON, Carolyn e PRANIS, Kay. Heart of Hope. Center of Restorative

Justice. USA. 2010

CARAM, Maria Elena; EILBAUM, Diana Teresa & RISOLÍA, Matilde.

“Mediación: Diseño de una práctica.” Buenos Aires: Librería Histórica, 2006.

(Colección Coleção Visión Campartida).

DALY, Kathleen (2006) ‘Restorative Justice and Sexual Assault: An Archival Study of Court and Conference Cases’, British Journal of Criminology, 46, 2, 18-20 e 26-28

GARCEZ, José Maria Rossani (2003). Negociação. ADRS. Mediação.

Conciliação e Arbitragem. 2ª ed. Revista e ampliada. Rio de Janeiro: Lúmen

Juris.

GLOWCZEWSKI, Barbara e HENRI, Rosita. (2011) Between Spectacle and

Politics: Indigenous Singularities, de Barbara, do livro The Challenge of

Indigenous Peoples: Spectacle or Politics? organizado por Barbara Glowczewski

e Rosita Henry. The Bardwell Press, Oxford, UK, 2011.

GLOWCZEWSKI, Barbara. ABÉLÈS, Marc (2010) Aborigènes : anthropologie d’une exigence de justice. VACARME Número 51. Versão eletrônica. Acesso em 30 de março de 2013. http://www.vacarme.org/article1891.html HERMAN, Judith. Trauma and Recovery. Basic Books Harper Collins. NY. [Judith Herman´s ideias are examines in details in The Victim Circle in this Compendium http://jus.com.br/artigos/11854/vitimizacao-e-processo-penal#ixzz3RBXTeCcg MacRAE, A. & Zehr, H. (2004). The Little Book of Family Group Conferences: New Zealand Style. Intercourse, PA: Good Books. McCOLD, Paul. (2008) The recent history of restorative justice. Mediation, circles, and conferencing In, Dennis Sullivan and Larry Tifft editors, "Handbook of

Page 30: Texto Indicado - crianca.mppr.mp.br · diálogo intercultural, tendo como “premissa a ideia da diversidade epistemológica do mundo, o reconhecimento da existência de uma pluralidade

Restorative Justice" A Global Perspective. London and New York: Routledge. Taylor & Francis Group

NORDENSTAHL, Ulf Christian Eiras. Mediación penal: de la práctica a la teoria. 1. ed. Buenos Aires: Librería Histórica, 2005.

UMBREIT, Mark S. The Handbook of Victim Offender Mediation: An Essential

Guide to Practice and Research, São Francisco, CA: Ed. Jossey Bass, 2001.

Recomenda-se ainda a visita ao sítio http://www.restorativejustice.org

VAN NESS; STRONG, 1997. Van Ness, D. and Strong K. H. (1997) (2010). Restoring Justice, Cincinnati, OH: Anderson Publishing Company. VAN WORMER, K. Restorative Justice as Social Justice for Victims of Gendered Violence: a Standpoint Feminist Perspective. Soc. Work, v. 54, n. 2, 2009. WALKER, Ranginui. Identidade e antropologia Maori na Nova Zelândia. Mana, Rio de Janeiro, v.3 n. 1, 1997. Disponivel em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-93131997000100007&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 2 de fevereiro de 2015. VAN WORMER, K. Restorative Justice as Social Justice for Victims of Gendered Violence: a Standpoint Feminist Perspective. Soc. Work, v. 54, n. 2, 2009. ZEHR, Howard. Trocando as lentes: um novo foco sobre o crime e a justiça. Tradução por Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008.