texto complementar I

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TEXTO COMPLEMENTAR I 262

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texto complementar do livro didático da coleção TRAMA & URDUMES volume 02 (PARFOR), modalidade de ensino a distância (EAD) Licenciatura em Artes Visuais, Faculdade de Artes Visuais (FAV), Universidade Federal de Goiás (UFG)

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Professora autora Msc. Manoela dos Anjos Afonso

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Você consegue lembrar algo a respeito do seu primeiro desenho? Eu também não. Mas minha mãe conta que, lá pelos meus três anos de idade, eu fazia uma bola cheia de pernas a qual eu chamava de sol ou de barata. E como era gostoso dese-nhar! Disso eu lembro bem. Você também pode tentar se lembrar, ao olhar uma criança completamente concentrada na produção de rabiscos. É nesse momento que podemos compreender que o desenho faz parte de nossas vidas já há muito tempo. Com cerca de dois anos de idade, a criança já busca identificar seus gestos através dos primeiros traços, basta que coloquemos em suas mãos algo que possa dar visualidade às suas garatujas. Linhas e pontos perambulam dentro e fora do papel na busca da compreensão do seu próprio corpo no mundo. É através dos primeiros gestos-desenhos que a criança experimenta muitas sensações: o gosto do giz de cera, o colorido dos riscos produzidos pela própria mão, ao manipular os materiais, a sensação gelada da tinta espalhada na própria pele. O desenho é capaz de revelar cheiros, velocidades, cores, gostos, pensares. Ele é parte fundamental do nosso aprendizado desde os primeiros anos de vida. Veja como Vitória (Figura 1) explora o uso das tintas: as misturas, o domínio do movimento, a sensação tátil provocada pela pintura com o dedo. São experiências que a levaram a descobertas de possibilidades expressivas através dos movimentos do seu próprio corpo envol-vidos nessa tarefa.

E por que, quando crescemos, deixamos de sentir esse prazer da descoberta do mundo através do desenho? Ou será que os adultos pensam que já conhecem as coisas suficientemente bem? Algumas pessoas até mesmo dizem que não sabem mais desenhar. Ou não o fazem simplesmente porque deixaram de gostar dessa prática e não se sentem estimuladas a realizá-la. É assim que o desenho – uma for-ma tão especial de conhecimento – fica esquecido em algum canto da nossa tênue memória referente à infância. Você já ouviu uma criança de 4 ou 5 anos dizer que não sabe desenhar? É algo raro. Veja como João resolveu a representação do leão que ele viu no zoológico (Figura 2): o menino conseguiu manifestar, tranquila-mente, a imagem do seu leão através do desenho.

Como está o seu desenho? Você já experimentou desenhar as coisas que você vem descobrindo depois de adulto? E se, durante um período de pelo menos 15 dias, você carregasse um pequeno caderno onde pudesse desenhar, cotidianamen-te, algumas coisas importantes ou inusitadas que acontecem com você em casa, na

Desenho Primordial

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faculdade, no supermercado, na fila do banco? Seria um diário de desenhos. Essa prática pode ajudá-lo a compreender melhor como a sua linha funciona, que vi-sualidade ela carrega e quais são os seus possíveis desdobramentos. Vale ressaltar ainda que, ao exercitar o seu desenho, desde já, você estará construindo um supor-te fundamental e insubstituível para suas futuras atividades docentes. Nenhum veículo teórico será capaz de lhe ensinar a desenhar: somente a prática lhe revelará os segredos dessa ação.

Figura 1 – Vitória, 4 anos. tinta guache sobre papel.

Figura 2 – João, 5 anos. Giz de cera sobre papel

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No desenho indicado na Figura 3, Larissa fez o seu autorretrato, passeando no shopping. Observe como os desenhos podem se transformar em preciosos regis-tros sociohistóricos tanto individuais quanto coletivos.

Lembre-se de que a escrita também é uma forma de desenho, afinal, ela é linha e gesto. Perceba como cada pessoa possui, desde a infância, um jeito muito próprio de segurar o lápis e um gesto muito particular ao escrever. É a linha de cada um que pulsa para sempre no próprio corpo desde que nascemos. É preciso respeitar o traço que cada um de nós carrega. Portanto, talvez não exista um desenho certo ou errado: o que existe é o seu desenho e o seu modo particular de operá-lo.

Cada material é capaz de valorizar e destacar particularidades do seu traçado; por isso, é importante que você os experimente diversas vezes. O lápis de cor, por exemplo, pode valorizar o preenchimento de áreas. Já a caneta hidrocor dá desta-que às linhas e evidencia o gesto que as produziu. Com as tintas, você pode criar

Figura 3 – larissa, 7 anos. lápis de cor sobre papel.

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Figura 4 – nicole, 6 anos. lápis de cor sobre papel.

cores a partir de misturas, além de conseguir efeitos chapados ou transparentes através das pinceladas. Quanto mais você explorar as características expressivas de cada material, mais terá domínio sobre os seus efeitos. A partir daí, você poderá inclusive misturá-los ao realizar uma composição mista: utilize lápis de cor junta-mente com tintas, giz de cera com lápis de cor, e assim por diante. Nesse momento de exploração de materiais, você não deve se preocupar com os resultados: viven-cie, intensamente, o processo dessa pesquisa e faça muitos desenhos e pinturas. Faça anotações sobre os efeitos e resultados que mais lhe agradaram. Guarde seus estudos para observá-los sempre que precisar; afinal, eles serão registros impor-tantes para que você prossiga, conscientemente, com a sua pesquisa prática. No desenho indicado pela Figura 5, temos um desenho de Arthur. O traço vigoroso está presente em tudo o que ele produz, seja usando lápis de cor, tintas, hidrocor ou giz de cera. Sua gestualidade intensa e veloz é sempre tão presente que acabou se transformando numa marca pessoal da sua produção visual.

Artistas como Pablo Picasso e Joan Miró, por exemplo, buscaram no desenho da criança mais espontaneidade para suas próprias produções artísticas (Figuras 6, 7, 8) . Fique atento às imagens produzidas pelos artistas que você vai conhecer atra-vés das demais disciplinas desse curso: existe algum traço do desenho infantil nas obras de alguns desses artistas? Pois, afinal, todos nós carregamos nosso desenho primordial, ou seja, aquele que ficou lá no espaço/tempo da nossa infância. Nós só precisamos acordá-lo. Por que não resgatá-lo e extrair dele toda a sua expressividade, transpondo-a para o desenho que você irá exercitar a partir de agora? Certamente, ele agregará valor visual às suas composições. Um desenho de observação, por si só, é apenas mais um desenho. Mas um desenho de observação carregado de expressivi-dade adquire uma especial individualidade. Procure identificar o seu próprio gesto, a sua linha particular. Verifique quais materiais atendem melhor às suas necessidades gráficas e, em seguida, produza muito! Desejo-lhe um ótimo curso.

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Figura 5 – arthur, 7 anos. caneta hidrocor sobre papel.

Figura 6 – lucas, 6 anos. lápis e tinta guache sobre papel

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Figura 7 – marina, 6 anos. lápis de cor sobre papel

Figura 8 – tiago, 6 anos. lápis de cor e tinta guache sobre papel