Texto 2 a psicologia preventiva_e_da_saúde
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ALGUNS PRESSUPOSTOS TEÓRICOS PARA INTERVENÇÃO EM PSICOLOGIA
PREVENTIVA E DA SAÚDE
Miriam Aparecida Herrera Fernandes1
Elizabeth Arilla Bocchi2
Lea Waidergorn3
Roberto Evangelista4
Sahra Yaroslavsky5
FERNANDES, M. A . H. ; BOCCHI, E. A .; WAIDERGORN, L.; EVANGELISTA, R. ; YAROSLAVSKY, S. Alguns pressupostos teóricos para a intervenção em Psicologia Preventiva e da saúde.
O presente trabalho tem como objetivo fornecer alguns subsídios teóricos para a intervenção do psicólogo em Psicologia Preventiva e da Saúde. Para tanto foram abordados alguns conceitos como a Psico-higiene e Psicologia Institucional de José Bleger, a Teoria da crise e prevenção específica de Ryad Simon, a Psicologia da Saúde de Waldemar Angerami-Camon e Heloísa Benevides Chiattone e a proposta de Gilberto Safra para as intervenções clínicas breves e pontuais. Considera-se, a partir da experiência de atuação clínico-social e docente dos autores, serem estes conceitos fundamentais para a intervenção psicológica na área de Psicologia Preventiva e da Saúde diante das demandas exigidas por uma realidade social e políticas de saúde que cada vez mais demandam ações efetivas frente ao sofrimento e à existência humana.___________________________________________________________________________________
INTRODUÇÃO
A Psicologia Preventiva e da Saúde praticada no Centro Universitário das UniFMU, sofreu
muitas transformações no decorrer de seus 15 anos de atuação. As mudanças envolveram desde a
nomenclatura, as teorias utilizadas para intervenção, os profissionais envolvidos no trabalho, inclusive
1 Mestre pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, Professora de Psicologia Social e Supervisora de Psicologia Preventiva e da Saúde do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas.2 Mestre e Doutora pela UNIFESP, Professora de Sociologia, Psicologia Social e Supervisora de Psicologia Preventiva e da Saúde do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas.3 Mestre pela PUC/SP e Supervisora de Psicologia Preventiva e da Saúde do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas. 4 Mestre e Doutor pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, Professor e Supervisor de Psicologia Preventiva e da Saúde do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas.5. Mestre pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo e Supervisora de Psicologia Preventiva e da Saúde do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas.
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o seu campo de atuação. Embora não seja objeto deste estudo fazer um histórico de tais modificações
podemos adiantar que estas tiveram em seu bojo o contexto institucional e social no qual estivemos e
estamos inseridos e a produção teórica produzida até então. O campo de atuação da Psicologia
Preventiva e da Saúde compreende instituições sociais e de saúde como também a intervenção junto a
grupos sociais nos diversos setores da sociedade. A proposta consiste num determinado tipo de
abordagem psicológica junto à população situada nesse campo. É neste sentido que estamos nos
aproximando do que queremos propor aqui, ou seja, um breve estudo, delineando alguns contornos
teóricos quanto ao tipo de abordagem psicológica seguindo alguns autores que permeiam as nossas
práticas. A Psicologia Preventiva e da Saúde em instituições sociais e de saúde e grupos sociais nos
conduzem a considerar os pressupostos teóricos e propostas de intervenção de alguns autores
fundamentais como Bleger, Simon, Angerami-Camon e Gilberto Safra que irão abordar o trabalho do
psicólogo nas instituições, a teoria da crise e prevenção específica, a psicologia da saúde e intervenções
clínicas breves e pontuais à situação de crise, respectivamente. Entendemos que a abordagem desses
pressupostos teóricos em torno da natureza da intervenção na área da Psicologia Preventiva e da Saúde
possa subsidiar psicólogos, alunos e estagiários quanto a esta área de atuação.
A PSICO-HIGIENE E A PSICOLOGIA INSTITUCIONAL
Para Bleger (1984), o objetivo do psicólogo no campo institucional é a psico-higiene, isto é,
conseguir uma melhor organização e condições que permitam uma promoção de saúde e bem estar dos
integrantes de uma dada instituição. Para este autor não se busca a saúde psíquica, o que seria um
absurdo, e sim propõe que a ação se dê fundamentalmente sobre o nível psicológico dos fenômenos
humanos, no seu dia a dia, no seu cotidiano, com métodos e técnicas provenientes do campo da
psicologia e da psicologia social. A atuação do psicólogo se dará preferencialmente nos grupos e
pessoas em situações de crise e, para tanto, o autor dispõe de uma teoria sobre o entendimento do
funcionamento grupal. Para ele, tanto o grupo quanto o indivíduo apresentam uma estrutura básica que
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possibilita uma identidade, uma relação adequada com a realidade, um significado e um certo grau de
organização que torna a existência possível. A concepção da estruturação e organização da identidade,
conforme apresentada, supõe um processo interativo de organização da personalidade, individual e
grupal, que envolve o inconsciente com suas forças ambivalentes. Neste processo emergem dois níveis
de Ego, um sincrético e o outro organizado. São duas estruturas paradoxalmente mantidas no indivíduo
ou grupo, uma organizada e a outra caótica. Ao ego organizado atribui a possibilidade de simbolização,
de verbalização, de relação; ao ego sincrético, porém, estaria a atribuição do vínculo, do não verbal, do
aspecto simbiótico da personalidade. Na expressão de Bleger citado por Guirado (1987), haveria num
processo grupal a verbalização ou a relação sobre um “pano de fundo sincrético”. Cabe ao psicólogo,
na intervenção dos conflitos grupais trabalhar os aspectos indiferenciados, não verbais. Assim, nas
palavras de Bleger, o psicólogo é um técnico de explicitar o implícito. Para finalizar, outra idéia deste
autor que nos é importante e que nos serve como dado de análise é quando este nos diz que uma
instituição sadia não é aquela que não tem conflitos, mas sim como a mesma lida com os mesmos e
cabe ao psicólogo ajudá-la nesta tarefa.
A TEORIA DA CRISE E PREVENÇÃO ESPECÍFICA
Simon (1989) irá desenvolver uma teoria da crise e prevenção específica para a intervenção
psicológica no campo da saúde pública. Para ele o essencial na geração da crise é o fato do sujeito se
ver diante de uma situação nova e vitalmente transformadora. Discorda de Caplan que dá ênfase ao
aspecto cognitivo na solução das crises, ou seja, na aprendizagem de mecanismos prévios para a
solução dos problemas. Para Simon, como experiência humana, a vivência da crise é uma experiência
individual, intransferível e original que requer um ato criativo para sua resolução. Este autor irá utilizar
uma classificação etiológica das crises, considerando o fator essencial que lhes deu origem. Nesta
classificação diferenciará as crises por perda ou por aquisição, ou seja, quando houver uma diminuição
ou aumento significativo do espaço no universo pessoal, respectivamente. Entende por “universo
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pessoal” ao conjunto formado pela pessoa (psicossomático), mais a totalidade de objetos externos
( pessoas, bens materiais ou espirituais e situações sócio-culturais). Em ambas as crises ocorre a
angústia frente ao novo e desconhecido, porém, nas crises por perda os sentimentos predominantes são
de depressão e culpa e nas crises decorrentes de aquisição ou ganho os sentimentos que predominam
são insegurança, inferioridade e inadequação. Os objetivos principais de prevenção diante dessas duas
crises são de prevenção passiva nas crises por perda e prevenção ativa nas crises por aquisição. A
prevenção passiva não significa aceitar a situação passivamente ou que nada possa ser feito, mas sim
ajudar o sujeito a aceitar a crise, resignar-se à frustração, lidar com a depressão e a culpa e, decorrido
certo tempo, estimulá-lo a retomar o universo pessoal diminuído significativamente pela situação perda
crítica. Nas crises por aquisição cabe a prevenção ativa, ou seja, ajudar o sujeito a aceitar o ganho ou
mostrar-lhe que pode renunciar ao mesmo quando implicar este implicar em ciladas do narcisismo e da
voracidade. Pode-se depreender que na prevenção passiva a crise já está em andamento, ao passo que
na prevenção ativa a crise ainda está latente, tem possibilidade de ocorrer. Cabe ao psico-higienista
compreender tal etiologia, pois a intervenção possui manejos diferentes como descrito acima. No
entanto, Simon irá dizer que para caracterizar a crise oriunda de aquisição ou perda, mais importante do
que a situação objetiva em si mesma é a significação que a pessoa dá ao fato vivido. Cita como
exemplo o caso de uma mulher que quer ter seu bebê, em que pode sobrevir uma crise por aquisição
( saberá cuidar dele?) e uma crise por perda advinda de uma mulher que já tem muitos filhos e situação
econômica precária, em que poderá experenciar uma situação de diminuição e não de aumento do
universo pessoal. Um programa de prevenção às crises, realizada pelo psicólogo assim denominado
psico-higienista, poderia pertencer ao âmbito da saúde pública, constituindo, assim, uma estratégia de
saúde mental aplicada no momento em que o sofrimento humano é mais agudo.
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A PSICOLOGIA DA SAÚDE
A psicologia da Saúde para Angerami-Camon (2000, p.8), “...seria a prática de levar o
indivíduo/paciente à busca do bem-estar físico, mental e social, englobando, assim, a performance de
uma abordagem que teria de incluir a participação de outros profissionais da área.” Compreende que
um paciente acometido de uma determinada patologia, mais do que isso, é um agente de suas
condições vitais, alguém que está trabalhando para a reconstrução de sua saúde, de sua realidade social,
familiar e até mesmo econômica. Esteja este sujeito no hospital, em sua casa, no trabalho, em abrigos,
em instituições diversas ou em qualquer outro campo social.
Para Chiattone (2000) a psicologia no contexto hospitalar constitui-se como estratégia de
atuação da psicologia, mais propriamente da psicologia da saúde. Segundo esta autora, “A atuação
preventiva no contexto hospitalar tem como principal objetivo o oferecimento de ajuda para que os
pacientes possam alcançar o reconhecimento das motivações que estão subjacentes a seus problemas
diante da situação de doença e hospitalização, visando facilitar a resolução desses problemas, da forma
mais adequada e breve possível.” (Chiattone, 2000,p.125). A intervenção psicológica baseia-se na
terapia breve e/ou emergência, de apoio e suporte ao paciente. A psicologia hospitalar desenvolve-se
como um novo paradigma que, reforçando o modelo biopsicossocial e otimizando o trabalho
interdisciplinar, estimula a união ou integração das ciências médicas e sociais, aglutinando estratégias
globais que possibilitem oferecer respostas aos problemas que impliquem em desenvolver uma nova
forma de pensamento em saúde.
INTERVENÇÕES CLÍNICAS BREVES E PONTUAIS
Safra (2003) numa de suas aulas sobre intervenções clínicas breves e pontuais propõe Cinco
passos fundamentais para lidar com uma pessoa que está em crise. Um dos aspectos fundamentais, o
primeiro ponto, é compreender que toda pessoa que se encontra frente a uma crise se encontra tomada
pela mesma, ou seja, não consegue relacionar-se com o problema e sim é tomada pela questão ou
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problema. A pessoa é invadida por sentimentos de aflição e angústia e se encontra num estado de
dispersão de si, o sentido de si mesmo está perdido. Ela é transbordamento, despedaçamento. Há uma
paralisia psíquica, uma vez que não pode relacionar-se com o problema, ela é o problema.
Como Primeiro passo para a intervenção, Safra propõe que possamos ajudar essa pessoa a
olhar o problema, a objetificar o problema, ou seja, quando objetificamos o problema é possível uma
não identificação com o mesmo. Proporcionar à pessoa um espaço em relação ao problema, à
constituição de um ego observador. Para tanto precisamos emprestar nossa capacidade de observar com
nossos olhos a pessoa e seu problema. Num processo empático, identificatório, podemos refletir para
ela a questão ou situação, abrindo-lhe a possibilidade de trabalho, de movimento psíquico. A empatia
pressupõe que possamos nos deixar afetar pelo outro. Assim, psiquicamente a pessoa pode olhar o
problema e existencialmente ela está acompanhada por nós. Segundo o autor, o ser humano só se
organiza, adquire uma função psíquica a partir do encontro com o outro.
Como Segundo passo, Safra afirma que, ao se sentir vista e compreendida a pessoa se põe a
discorrer sobre o problema, conta sobre, como aconteceu...Tal ação tem implicado o início do
movimento psíquico, ela não está mais paralisada pelo problema.
Como Terceiro passo, precisamos auxiliar a pessoa a de fato discorrer sobre o problema e o
que se percebe são rupturas e impasses na fala que demandam a presença do outro, nossa presença. O
que significa efetivamente conversar, ou seja, repetir-lhe um processo de reflexão, dar uma opinião,
pensar junto sobre a questão ou fazer uma questão. Tal intervenção leva a pessoa a continuar o
movimento psíquico.
Se os passos anteriores correspondem ao que já acontece em nosso cotidiano, o Quarto passo
requer um ato intencional e que consiste em sintetizar, o que é muito importante. Do ponto de vista
psíquico favorecemos a integração quando falamos, pois quando falamos o fazemos para além da nossa
intenção. Quando falamos trazemos facetas que não esperávamos falar e que nos passam
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despercebidas. A síntese devolve os aspectos e possíveis resoluções presentes no discurso e que a
pessoa não havia percebido. Depois da síntese a pessoa já se sente melhor, de posse de si mesma.
Cabe ao Quinto passo, abrir o sentido. Safra refere que o ser humano nasce e morre em tudo,
o que faz a vida e a morte presente em cada gesto da pessoa. O ser humano é um ser que precisa de
futuro por conta dessa característica, precisa projetar-se para o futuro, estabelecer a esperança. Num
“até amanhã”, o ser humano inicia e finda e se coloca em abertura de um porvir sempre, num estado de
esperança. Na crise a pessoa está estancada no tempo, um atendimento só finda mediante a perspectiva
de uma projeção para o futuro, um projeto para o amanhã. Este amanhã pode ser a vivência do
sofrimento, viver essa experiência, pois não podemos tirar o sofrimento, mas já não mais uma pessoa
sofrida. É abrir o sentido, a possibilidade de estar em caminho.
Cumprimos, então, com este último autor o que pretendíamos com este estudo, ou seja, trazer
alguns princípios norteadores da intervenção em Psicologia Preventiva e da Saúde.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A realidade social e as políticas de saúde em que vivemos exigem cada vez mais do psicólogo
ações efetivas e de alcance social. Neste sentido, consideramos que no decorrer dos anos de atuação
profissional clínico-social e docente nos demandaram a responsabilidade de pontuar algumas, como
realizamos neste artigo, idéias importantes para o exercício profissional do psicólogo nos desafios que
sempre serão colocados frente ao existir humano.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANGERAMI-CAMON, V.A . O Ressignificado da Prática Clínica e suas Implicações na Realidade da
Saúde. IN: ANGERAMI-CAMON, V.A . (org) – Psicologia da Saúde: um novo significado para a
prática clínica. São Paulo: Pioneira, 2000.
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BLEGER, J. Psico-higiene e psicologia institucional. Trad. de Emilia de Oliveira Diehl. Porto Alegre:
Artes Médicas, 1984.
CHIATTONE, H.B.de C. A significação da Psicologia no Contexto Hospitalar. IN: ANGERAMI-
CAMON, V.A . (org) – Psicologia da Saúde: um novo significado para a prática clínica. São Paulo:
Pioneira, 2000.
GUIRADO, M. Psicologia Institucional. São Paulo: EPU, 1987.
SAFRA, G. Intervenções clínicas breves e pontuais. Ministrada em 21/11/2003 na graduação em
Psicologia Clínica da USP. Série: A Visão Clínica de Gilberto Safra. São Paulo: Edições Sobornost,
2006.
SIMON, R. Teoria da Crise e Prevenção Específica. São Paulo: EPU, 1989.
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