Teses para o XV Congresso do PCB

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TESES PARA O XV CONGRESSO DO PCB 03 Janeiro 2014 Classificado em Congressos - XV Congresso A Estratégia e a Tática da Revolução Socialista no Brasil Introdução 1) A meta estratégica do Partido Comunista Brasileiro é a conquista do poder político pela classe trabalhadora e seus aliados fundamentais, organizados no Bloco Revolucionário do Proletariado, cujo objetivo central é a construção da sociedade socialista, período transitório para a emancipação do proletariado na sociedade comunista. A conquista revolucionária do poder político envolve dois aspectos fundamentais: a) a participação dos trabalhadores como sujeito da ação histórica contra o capitalismo e a sociedade burguesa; b) a organização e o fortalecimento dos instrumentos políticos revolucionários capazes de dirigir a disputa pela hegemonia do proletariado na sociedade, fazendo uso das formulações teóricas e políticas que embasam a teoria social desenvolvida por Marx, Engels, Lênin e outros revolucionários. 2) É no terreno concreto da luta de classes que o PCB trabalha para consolidar-se como um dos principais instrumentos revolucionários, desenvolvendo uma plataforma política capaz de construir uma alternativa real de poder para os trabalhadores. Neste processo histórico, o Partido objetiva se tornar um dos aglutinadores da radicalidade da transformação socialista, contribuindo para a unidade de ação de todas as forças do Bloco Revolucionário, como um formulador de uma política de classe, avançada e independente, política esta que dirija as forças anticapitalistas para a revolução socialista. 3) Desde 1992, quando demos início ao processo de reconstrução revolucionária do PCB, logo após a ruptura com setores que queriam liquidar o partido seguindo uma linha abertamente de direita, vimos afirmando a estratégia da Revolução Socialista como o caminho a ser trilhado pela classe trabalhadora e seus aliados fundamentais para a destruição do Estado capitalista e da sociedade burguesa, no rumo do socialismo no Brasil. A estratégia da Revolução Socialista consolidou-se definitivamente entre nós no XIV Congresso, realizado em outubro de 2009. Nossas resoluções políticas e de organização foram aprofundadas nas Conferências de Organização (2008) e de Tática (2011).

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TESES PARA O XV CONGRESSO DO

PCB

03 Janeiro 2014

Classificado em Congressos - XV Congresso

A Estratégia e a Tática da Revolução Socialista no Brasil

Introdução

1) A meta estratégica do Partido Comunista Brasileiro é a conquista do poder político

pela classe trabalhadora e seus aliados fundamentais, organizados no Bloco

Revolucionário do Proletariado, cujo objetivo central é a construção da sociedade

socialista, período transitório para

a emancipação do proletariado na sociedade comunista. A conquista revolucionária do

poder político envolve dois aspectos fundamentais: a) a participação dos trabalhadores

como sujeito da ação histórica contra o capitalismo e a sociedade burguesa; b) a

organização e o fortalecimento dos instrumentos políticos revolucionários capazes de

dirigir a disputa pela hegemonia do proletariado na sociedade, fazendo uso das

formulações teóricas e políticas que embasam a teoria social desenvolvida por Marx,

Engels, Lênin e outros revolucionários.

2) É no terreno concreto da luta de classes que o PCB trabalha para consolidar-se como

um dos principais instrumentos revolucionários, desenvolvendo uma plataforma política

capaz de construir uma alternativa real de poder para os trabalhadores. Neste processo

histórico, o Partido objetiva se tornar um dos aglutinadores da radicalidade da

transformação socialista, contribuindo para a unidade de ação de todas as forças do

Bloco Revolucionário, como um formulador de uma política de classe, avançada e

independente, política esta que dirija as forças anticapitalistas para a revolução

socialista.

3) Desde 1992, quando demos início ao processo de reconstrução revolucionária do

PCB, logo após a ruptura com setores que queriam liquidar o partido seguindo uma

linha abertamente de direita, vimos afirmando a estratégia da Revolução Socialista

como o caminho a ser trilhado pela classe trabalhadora e seus aliados fundamentais para

a destruição do Estado capitalista e da sociedade burguesa, no rumo do socialismo no

Brasil. A estratégia da Revolução Socialista consolidou-se definitivamente entre nós no

XIV Congresso, realizado em outubro de 2009. Nossas resoluções políticas e de

organização foram aprofundadas nas Conferências de Organização (2008) e de Tática

(2011).

4) Se no XIII Congresso (2005) já havíamos rompido com o governo Lula, no XIV

Congresso avançamos para a formulação da necessidade de construção do Bloco

Revolucionário do Proletariado, visando ao aprofundamento das lutas contra o bloco

dominante, formado hoje, fundamentalmente, pela burguesia monopolista, pelo

monopólio capitalista da terra e pelo imperialismo. A orientação central da estratégia do

PCB pode ser assim resumida: “uma vez constatado que o capitalismo no Brasil já

atingiu a etapa monopolista, fica claro que o processo revolucionário brasileiro é de

caráter socialista” (Resoluções do XIII Congresso).

5) No XIV Congresso, consideramos que o Brasil se tornou um país capitalista

completo, ou seja, uma formação social capitalista na qual predominam as relações de

trabalho assalariadas, a propriedade privada burguesa dos meios de produção, as formas

de produção e acumulação ampliada de capitais que completaram seu caminho até a

formação dos oligopólios, formas estas inseparavelmente ligadas ao modelo imperialista

que determina as relações econômicas mundiais. O Brasil desenvolveu um parque

industrial oligopolista, setores de infraestrutura de mineração, energia, armazenagem,

transporte, portos e aeroportos, malhas urbanas, um comércio nacional e internacional,

capitalizou o campo, gerou a estrutura moderna da agricultura, um sistema financeiro

interligado ao mercado mundial e uma malha logística de serviços e ações públicas

necessárias à reprodução das relações burguesas de produção.

6) Trata-se de uma economia capitalista que já atingiu sua completude, ou seja, já

consolidou plenamente seu parque industrial, seu mercado interno, estendeu à produção

agrícola as mais avançadas técnicas de organização e exploração capitalistas, criou e

desenvolveu o capital financeiro. Toda essa estrutura, altamente complexa e

diversificada, está plenamente integrada aos fluxos internacionais de reprodução do

capital. Tal integração ao sistema capitalista mundial verifica-se na reprodução de

práticas imperialistas, que podem ser observadas através da exportação de capitais de

empresas brasileiras pelo mundo afora, tal como Vale do Rio Doce, Santista, Friboi,

Odebrecht, Gerdau, Votorantim, Petrobras, entre outras, fato que não elimina a sua

subordinação aos polos centrais do capitalismo mundial.

7) Próprio do desenvolvimento desigual e combinado desse modo de produção, a

particularidade brasileira absorve e reproduz o capitalismo em toda sua complexidade

atual, mas não elimina a posição de autonomia relativa da economia do país frente ao

imperialismo mundial, pois o caráter da integração reproduz a histórica associação

subordinada da burguesia que se constituiu no país – mesmo que com novos formatos

históricos. É preciso, pois, reconhecer a existência de inúmeras relações de

interdependência entre a estrutura econômica brasileira e o sistema capitalista

internacional, como em certas áreas do comércio exterior e na constituição de diversas

cadeias produtivas. Podemos afirmar, enfim, que a formação social brasileira atual, em

todas as suas dimensões, produz e reproduz a forma própria da sociedade capitalista, na

qual o eixo central da luta de classes passa pelo confronto de interesses entre o

proletariado e a burguesia.

8) A burguesia brasileira é formada por diversas frações: a industrial, a

bancária/financeira, a comercial, a agrária, o grande empresariado do setor de

transportes, a oligarquia que controla as comunicações no Brasil (toda a rede de TV,

controlada por 8 famílias, e os maiores jornais e rádios do país) e uma facção que

contrata serviços diversos formados pela mercantilização crescente de setores como os

da saúde, educação e outros. Ao mesmo tempo, o capital subordina ao mercado e ao

processo ampliado de acumulação de capitais todos os setores que mantêm,

residualmente, relações não capitalistas. É o que ocorre no campo, onde predomina a

proletarização promovida pela grande produção agrária oligopolista (o chamado

agronegócio) associada à formação de um proletariado precarizado, combinadas ou não

com a pequena propriedade dedicada à agricultura familiar ou com formas coletivas de

trabalho (cooperativas, assentamentos), as quais cada vez mais são forçadas a se

vincular ao mercado e à lógica do capital.

9) Com o crescimento e a consolidação da moderna economia industrial monopolista,

generalizou-se o assalariamento e formou-se um numeroso proletariado, caracterizado

como o conjunto dos trabalhadores que só podem viver mediante a venda de sua força

de trabalho. O núcleo central dos assalariados é o setor operário, formado pelos

trabalhadores produtivos, explorados diretamente pelo capital e que passou por grandes

transformações a partir dos anos 1990. Ao contrário do que se apregoou com o suposto

“fim do trabalho”, o operariado industrial brasileiro cresceu em números absolutos e

desconcentrou-se territorialmente, tendo ainda se fragmentado com a terceirização e a

descentralização das empresas. O operariado industrial é o setor da classe trabalhadora

estrategicamente posicionado no coração da economia capitalista, do ponto de vista da

luta de classes.

10) A urbanização crescente e a criação de uma infraestrutura para o desenvolvimento

da acumulação capitalista geraram camadas urbanas intermediárias que vão desde

setores gerenciais, profissionais assalariados, pequenos e médios comerciantes, técnicos

especializados, professores, pesquisadores, médicos, advogados e outros profissionais.

Parte destas camadas médias passou, nos últimos anos, por uma intensa proletarização,

transformando-se em assalariados do capital. Ao lado destes profissionais

proletarizados, somam-se funcionários públicos nos diferentes setores de ação do

Estado, compondo uma numerosa camada heterogênea, com condições de trabalho e

remuneração diversas, a qual sofreu uma precarização crescente nos últimos governos

neoliberais.

11) O exército industrial de reserva é formado por um subproletariado, ou seja, um

proletariado precarizado, submetido a relações de trabalho cada vez mais precárias e

incertas. Estes trabalhadores estão inseridos nas condições gerais da acumulação de

capitais, como força de trabalho abundante e barata, de diferentes modos: como

operadores da chamada economia informal, como consumidores e agentes da economia

política da criminalidade ou como base de massa e objeto de ação de uma rede de

assistencialismo e de “filantropia” formada pelo chamado terceiro setor. Parte desta

superpopulação relativa mantém vínculos políticos e culturais com o proletariado, uma

vez que se forma constantemente de expropriados, funcionalmente utilizados pelo

capital como forma de manter o valor da força de trabalho em níveis aceitáveis para a

acumulação de capitais.

12) Assim, a estrutura de classes no Brasil apresenta um polo burguês, hegemonizado

pela grande burguesia monopolista, e um polo proletário, composto pela imensa massa

de assalariados urbanos e rurais, constituindo, assim, as duas classes antagônicas da luta

de classes no Brasil. Do lado delas coexistem segmentos ou setores médios que tendem

ao assalariamento, um campesinato heterogeneamente formado pela agricultura

familiar, cooperados, assentados e pequenos proprietários e um proletariado precarizado

imerso em uma superpopulação relativa inserida de maneira precária e brutal nas

condições do mercado capitalista.

O capitalismo contemporâneo: tendências gerais

13) Nos últimos anos, o capitalismo tem vivido processos de crise e expansão cada vez

mais curtos e constantes. Todas as crises econômicas recentes vivenciadas pelo

capitalismo em nível mundial repercutem o mesmo fenômeno analisado por Marx em O

Capital: quanto mais cresce o capital, mais ele produz a crise que é concernente a sua

natureza. As crises do capitalismo contemporâneo, a partir, principalmente de sua

maturidade, com a passagem para a fase monopolista e imperialista no século XIX, são

crises de superacumulação que se combinam com manifestações de superprodução e

queda tendencial da taxa de lucro.

14) Vejamos como Marx desvendou o fenômeno: a) quanto mais cresce a concorrência

entre os capitalistas, menor é a livre concorrência e maior é a tendência ao monopólio;

b) nas condições de uma concorrência entre monopólios, os capitalistas, para aumentar a

produtividade do trabalho, tendem sempre a investir mais em capital constante

(máquinas, instalações, novas matérias primas, etc) e menos em capital variável

(compra da força de trabalho), alterando drasticamente a composição orgânica do

capital em favor do trabalho morto; c) o resultado é a tendência geral à queda na taxa de

lucro, porque o trabalho vivo – única fonte de valor – é substituído por trabalho morto,

que somente transmite às mercadorias a mesma quantidade de valor já incorporada nos

meios de produção. Consequentemente, reduz-se a capacidade das empresas de

reinvestirem seus lucros na produção e explodem as crises.

15) A crise econômica atual, que culminou com a explosão do sistema financeiro

centrado nos Estados Unidos, rapidamente se alastrou pela Europa e impactou o restante

do mundo. Na Europa, os efeitos mais violentos da crise verificam-se nos países mais

fragilizados economicamente: Grécia, Espanha, Portugal, Irlanda, Itália, Chipre, em

decorrência da política desenvolvida pela União Europeia em favor do Euro, a qual

contribuiu ainda mais para a concentração de capital e para o fortalecimento das

corporações monopolistas, favorecendo, acima de tudo, as empresas da Alemanha e da

França e a praça financeira da Inglaterra.

16) As respostas apresentadas pelos governos dos países centrais à bancarrota que se

generalizou após 2008 combinaram elementos de ajuda estatal ao sistema financeiro, de

estatização de bancos e socorro a empresas de grande porte com o reforço ao desmonte

das políticas sociais e o ataque redobrado aos direitos dos trabalhadores. Enormes

somas de dinheiro público foram destinadas às grandes empresas afetadas pela crise e

ao sistema financeiro, ao passo que os trabalhadores voltavam a sofrer com a retirada de

direitos, desemprego em massa, redução de salários e outras medidas que,

sistematicamente, vêm sendo adotadas pelos capitalistas desde o início do desmonte das

políticas de Bem Estar Social, nos anos de 1970/80.

17) A tendência geral do capitalismo atual, em função do acirramento da concorrência

internacional e da expansão das relações capitalistas em praticamente todas as áreas

físicas do planeta, é a de reduzir os mais amplos contingentes populacionais à condição

de força de trabalho plenamente disponível e livre para servir aos interesses e às

necessidades do capital. Formas renovadas de expropriação são criadas para destruir

laços sociais e ordenamentos jurídicos que, ao longo da história de lutas dos

trabalhadores, funcionaram como freios à dominação irrestrita do trabalho pelo capital.

Ao lado de persistir a expropriação sobre pequenos agricultores, tendo em vista

subsistirem grandes massas destes passíveis de se tornarem trabalhadores assalariados

(como na China, Índia, América Latina e África, por exemplo), outras expropriações

seguem conduzindo grande número de trabalhadores à plena disponibilidade para o

mercado de força de trabalho, buscando quebrar a resistência dos trabalhadores à

exploração.

18) Uma das formas de intensificar a extração do valor e que mais incide diretamente

sobre a capacidade de organização e de resistência do proletariado à exploração é a que

promove a fragmentação do espaço produtivo e a separação dos trabalhadores em

inúmeras unidades fabris. Trata-se da expropriação da resistência operária por

proximidade no local de trabalho, decorrente da introdução de novas tecnologias

produtivas e de outros mecanismos que permitem aprofundar a cooperação entre os

trabalhadores dispensando sua reunião física. No interior do processo produtivo, formas

cada vez mais sofisticadas de gerenciamento da produção, associadas à utilização de

tecnologias frequentemente renovadas, impõem aos trabalhadores a submissão à lógica

do capital dentro e fora do espaço produtivo.

19) Outras formas de expropriação estão ligadas à retirada dos direitos sociais e

trabalhistas conquistados à custa de um longo processo histórico de lutas operárias.

Diferentes formatos jurídicos foram criados para disciplinar a relação de trabalho em

favor de sua plena utilização pelo capital: subcontratações, terceirizações, formação de

cooperativas de fachada, trabalho “informal”, “voluntariado”, renúncia ao contrato

formal, ou, ainda, a figura do trabalhador “pessoa jurídica”, que, mobilizado pela falácia

do “empreendedorismo”, se converte individualmente numa empresa fictícia para

vender sua força de trabalho, sem os direitos associados legalmente à contratação

tradicional.

20) Tais exemplos de “reestruturação produtiva” e “desregulamentação do mercado de

trabalho”, com vistas à plena “empregabilidade” ou “trabalhabilidade” (para usar termos

recorrentes no jargão burguês contemporâneo) do sujeito obrigado a vender sua força de

trabalho para sobreviver, nada mais são do que formas atualizadas de dominação, com o

duplo sentido de disponibilizar grandes contingentes de pessoas para o trabalho

assalariado e de fazer valer a hegemonia do capital, por meio de um processo alienante

de difusão da ideologia burguesa. Isto porque tais mecanismos de expropriação do

trabalho vêm acompanhados de intensa campanha ideológica voltada a convencer a

todos de que se trata da conquista da liberdade individual perante a opressão do trabalho

(não do proprietário dos meios de produção). Propala-se a ideia, difundida pelo

“empreendedorismo”, de que cada um pode ser “patrão de si mesmo”.

21) As novas condições de exploração, que se impõem tanto pela violência quanto pelo

convencimento, obrigam às mais abjetas sujeições em troca da subsistência do

trabalhador, a começar pela ameaça permanente do desemprego: a requalificação dos

trabalhadores, que devem interiorizar a necessidade de uma autoempregabilidade; a

instauração de formas de “parceria” ocultando relações de exploração, por meio de

cooperativas, contratos temporários, formas de “voluntariado”, etc. Tudo isso é

difundido como se fosse absolutamente novo, como se não fosse da natureza mesma das

relações sociais de produção capitalistas, desde seus primórdios, promover a separação

entre trabalhadores e condições sociais de trabalho, com vistas à permanente criação de

grandes contingentes de “pobres laboriosos” livres, “essa obra de arte da história

moderna”, como dizia Marx.

22) Longe do suposto “fim do trabalho”, tais expropriações demonstram a importância

da força de trabalho no mundo capitalista de hoje. À expropriação capitalista

corresponde, no extremo oposto da mesma relação, a gigantesca concentração de

recursos em mãos dos capitalistas, recursos que precisam ser constantemente

valorizados e aplicados na própria exploração dos trabalhadores. A profunda

transformação da base tecnológica foi extremamente útil não apenas para transferir

capitais de um lado a outro, posto que, isolado, o acúmulo de dinheiro não produz mais-

valor, mas para, simultaneamente, fragmentar o conjunto da classe trabalhadora. A

reestruturação produtiva do capitalismo contemporâneo, portanto, é parte integrante do

processo imperialista, resultante da ação hoje hegemônica do capital financeiro.

23) O capital financeiro, apesar de ter-se amplamente disseminado o mito da existência

de atividades puramente monetárias e especulativas, sem envolvimento algum com a

produção, está completamente envolvido com os processos de extração de mais-valor e

somente pode continuar existindo caso impulsione sem cessar essa extração.

Inicialmente meros depositários ou intermediários dos lucros dos grandes empresários

capitalistas, no processo histórico de formação e desenvolvimento do capital financeiro,

os bancos tornaram-se também proprietários de capital voltado ao investimento na

produção, precisando fazer expandir frequentemente as relações sociais capitalistas.

24) Ao mesmo tempo, há um intenso movimento especulativo, que passa a integrar a

dinâmica da expansão do capital, gerando um capital fictício através da multiplicação de

papéis e títulos sem correspondência real com os capitais respaldados efetivamente no

processo de produção. O descompasso entre o capital fictício e o capital lastreado na

produção direta de valor vem fomentando as recorrentes crises capitalistas da

atualidade. A continuidade das atividades especulativas na fase atual do capitalismo

indica, no entanto, que a base social da acumulação capitalista permanece fundamental,

pois a concentração desses capitais só fez aprofundar a exigência de valorização de tais

massas de recursos sob todas as formas de exploração da força de trabalho.

25) A hegemonia do capital se constrói a partir mesmo das relações de produção e busca

envolver a totalidade social. Ao mercantilizar tudo e todos à sua volta, o capital expande

seus domínios para o conjunto das relações sociais: as expropriações avançam sobre

diversas formas de solidariedade comunitária e cultural, sobre conquistas sociais tais

como a saúde e a educação públicas (direitos sociais que se transformam, cada vez mais,

em produtos e serviços disponíveis no mercado, como quaisquer mercadorias), sobre os

movimentos sociais, que sofrem renovados processos de criminalização, sobre os

direitos políticos, com a redução das conquistas democráticas ao mero jogo eleitoral.

26) Todo esse quadro nos leva a reflexões fundamentais para o avanço da luta contra o

capitalismo: em primeiro lugar, reafirma-se categoricamente a contradição entre capital

e trabalho como a contradição fundamental a exigir a organização da classe trabalhadora

na luta contra o sistema capitalista. A luta central, pois, é entre classes, não entre

nações. Mais do que nunca, coloca-se na ordem do dia a estratégia revolucionária de

luta pelo socialismo. Em segundo lugar, se as mutações sofridas pela classe

trabalhadora no quadro do redimensionamento global do capitalismo contemporâneo

acarretaram alterações muito expressivas no conjunto do proletariado, fazendo com que,

nos dias atuais, ela difira bastante do proletariado industrial identificado como sujeito

revolucionário do Manifesto do Partido Comunista, é ainda esse contingente humano de

trabalhadores que identificamos, por sua posição central no processo de produção de

riquezas, como capacitado a assumir o protagonismo na luta de classes, rumo à

construção do socialismo e da sociedade comunista.

A hegemonia burguesa no Brasil

27) No Brasil, a construção da sociedade burguesa e de seu Estado se insere no processo

tardio de formação do capitalismo e da própria burguesia enquanto classe dominante,

como resultado da herança histórica colonial. Daí que o Estado burguês tenha se

desenvolvido não como fruto de uma revolução burguesa clássica, mas em

consequência de disputas e conflitos gestados e solucionados entre os grupos e classes

dirigentes, sem a participação dos setores proletários. Cabe ressaltar que, ao longo da

história nacional, essas classes dirigentes exerceram o controle do poder político em

decorrência do monopólio dos principais meios de produção. Nesta forma particular de

constituição da hegemonia capitalista, em que pesem as diferentes formas assumidas de

poder político, a característica central foi a predominância dos aspectos repressivos e

coercitivos no exercício da dominação. Prova disso foi o constante recurso aos golpes e

às intervenções armadas da parte da classe dominante, desde a proclamação da

República até a ditadura inaugurada com o golpe militar de 1964, apoiada e financiada

pela burguesia nacional e internacional.

28) O período ditatorial marcou a consolidação do bloco dominante burguês,

hegemonizado pela burguesia monopolista, em aliança com o latifúndio tradicional e o

imperialismo. Este bloco organizou o assalto ao poder de Estado em 1964, colocando

fim ao período de legalidade burguesa anterior e interrompendo o ascenso político das

massas populares verificado desde a década precedente. O golpe explicitou o caráter

marcadamente autocrático da burguesia internamente instalada, através de uma política

própria de governos classicamente bonapartistas, que se utilizam do expediente da força

militar para impor uma ordem social que se adeque aos seus interesses de classe.

29) Consolidado este objetivo, o processo de dominação burguesa se completou com a

transição da ditadura ao Estado de Direito burguês. O período de abertura política

serviu, fundamentalmente, para promover a incorporação das massas urbanas e dos

trabalhadores ao ordenamento jurídico-político burguês, de que é expressão significativa

a afirmação de um conjunto de regras democráticas, como a ampliação do direito ao

voto, e de direitos sociais e trabalhistas, sacramentados na Constituição de 1988.

Formou-se, assim, uma sociedade civil-burguesa com um conjunto de instituições

enraizadas e, em parte, legitimadas no corpo da sociedade, tendo se afirmado a

hegemonia liberal burguesa através de um regime formalmente democrático, num

processo que se completa com o estabelecimento de poderoso monopólio capitalista nas

telecomunicações, na informação e na organização da cultura, responsável por

aprimorar e fortalecer a dominação ideológica em favor da burguesia.

30) É certo que este processo de consolidação da ordem burguesa no Brasil não se deu

sem conflitos. Nos estertores da ditadura, travou-se uma luta entre os grupos burgueses

dominantes e o bloco de forças políticas e sociais formado pelos trabalhadores e setores

das camadas médias, à época sob a forte influência do PT e de outros setores de

esquerda, juntamente a inúmeras entidades de massas e movimentos e organizações

políticas que se destacaram na resistência ao regime ditatorial e nas lutas democráticas

do período anterior. Em que pese a eclosão de inúmeras greves e manifestações

populares durante a chamada abertura, o resultado final deste embate, em meio a um

contexto internacional de crise do movimento socialista e de ofensiva neoliberal, foi o

amoldamento à ordem liberal burguesa das instituições forjadas na luta contra a

ditadura.

31) O transformismo operado no interior das principais organizações de esquerda do

período – com destaque para o PT e a CUT – conduziu-as a uma postura de abandono

das propostas radicalizadas de sua origem e de limitação da luta dos trabalhadores aos

marcos impostos pela ordem hegemônica burguesa. Isto representou, na esfera política,

a sanção das principais organizações representativas dos trabalhadores ao poder

instituído, culminando, na década de 1990, com a franca afirmação de uma democracia

reduzida às estratégias ditadas pelo capital. Esta situação se explica em parte pela

burocratização e acomodação das direções partidárias e sindicais e das principais

organizações representativas dos trabalhadores e da juventude (vide CUT e UNE) e, por

outra, pela prática de considerar, como um fim em si mesmo, a participação em espaços

institucionais e no interior do Estado burguês (em cargos nas esferas de governo e do

parlamento).

32) Ao longo dos últimos trinta anos, o espaço político conquistado através das lutas

contra a ditadura transformou-se em formas de apassivamento das massas trabalhadoras

às regras de um jogo eleitoral calcado nos velhos vícios fisiológicos, na corrupção, na

manipulação ideológica, no mercado de votos e no marketing elaborado por grandes

empresas de publicidade, que vendem candidatos como produtos ligados à competência

administrativa e à capacidade de melhor gerenciar a crise produzida pelo capital. Nos

períodos não dedicados às campanhas eleitorais, a participação política restringe-se ao

modelo de cidadania incapaz de abalar as estruturas do sistema, pois voltado à

administração de problemas de maneira não conflituosa, por meio de mecanismos

institucionais, iniciativas legislativas e ações judiciais. O eixo das lutas de massas foi,

assim, deslocado para a representação política e institucional, buscando-se quebrar o

protagonismo dos trabalhadores e estimulando a articulação dos movimentos sociais em

torno de lutas ligadas ao atendimento a demandas específicas (como as de gênero, etnia,

orientação sexual, culturais, etc.) desvinculadas das lutas gerais contra a exploração

capitalista.

33) A ascensão do PT ao poder só fez avançar a proposta de realização de um “pacto

nacional” de submissão consentida do conjunto da sociedade à hegemonia burguesa, por

meio de programas como o Fome Zero e outros, que deveriam mobilizar ONGs,

empresas, instituições religiosas, sindicatos e escolas num mutirão de combate à fome,

instituindo a parceria da “sociedade civil organizada” com o Estado. O apelo ao

tratamento compensatório à fome e à miséria de parte da população integra a estratégia

de construção do consenso em torno do projeto de transformação do Brasil em um país

de capitalismo avançado com “face humana”. A economia política do capital e a

filantropização da questão social encontram sua unidade na manutenção da economia de

mercado capitalista, ou seja, a economia privada deve dar lucros, o Estado arrecadar e,

depois de garantir os prioritários interesses do grande capital, deve chegar, de maneira

focalizada, até pontos da miserabilidade, para amortecer a explosividade da miséria.

34) Esta estratégia ajuda a encobrir, de um lado, o processo avançado de privatização

dos serviços públicos e de transferência da responsabilidade do Estado para a esfera

privada (através de contratos com Organizações Sociais – OSs, por exemplo),

acompanhado da retirada dos direitos sociais. De outro, percebe-se a tentativa de evitar

o acirramento da luta de classes, criando espaços institucionais de participação dos

indivíduos e entidades associativas para o encaminhamento de reivindicações e a

resolução de problemas de forma pragmática, na lógica da colaboração e sem resvalar

para o campo da contestação ao status quo.

35) A combinação eficiente de consenso e coerção garante a reprodução do domínio da

ordem monopolista burguesa. A subordinação dos trabalhadores à ordem institucional

burguesa e aos imperativos do capital e do mercado se processa por um conjunto de

mecanismos de dominação: manipulação ideológica pelos meios de comunicação, ações

permanentes no interior da empresa para a colaboração de classe, promoção da cultura

do individualismo, incentivos materiais como participação nos lucros e resultados e

cooptação pura e simples das lideranças sindicais. Quando esses métodos não

funcionam, as classes dominantes lançam mão da repressão e da violência policial sobre

todos aqueles que se levantam contra essa ordem, promovendo a criminalização dos

movimentos sociais, da pobreza e da militância anticapitalista.

36) Mas é preciso reconhecer a existência de disputas políticas entre distintas frações de

classe no interior do bloco hegemônico burguês. A disputa política institucional

principal no Brasil de hoje se dá entre duas alternativas no campo do capital: uma

representada, fundamentalmente, pela aliança liderada pelo PSDB (que inclui legendas

ultraconservadoras como o DEM) e outra representada pelo bloco de partidos que

sustentam o governo do PT, tendo o PMDB como principal aliado. Esta disputa se faz

dentro dos limites de um grande consenso burguês, que tem por base a manutenção da

macropolítica econômica, a manutenção e aprofundamento da lógica de mercado, o

papel do Estado como garantidor dos interesses do capital monopolista e amortizador da

luta de classes e o abandono de qualquer alternativa, mesmo reformista, que possa

implicar em mudança dos marcos do “novo pacto social”.

37) Em outras palavras, em que pesem algumas diferenças, o bloco liberal burguês

encontra uma unidade estratégica em forças políticas que divergem na tática. PSDB e

PT, como polos dessas alternativas, disputam a confiança das classes dominantes e o

controle da máquina de governo – e, a partir daí, a ocupação de cargos e o manejo do

jogo político tradicional que se perpetua – não como dois projetos essencialmente

antagônicos, mas como forças políticas diferentes de um mesmo projeto, que tem por

base a manutenção das relações capitalistas de produção, a propriedade privada, a

economia de mercado e a integração do capitalismo brasileiro ao sistema imperialista.

38) Por trás destas expressões políticas, formou-se um bloco de classe burguês que,

mesmo com disputas entre as frações que o compõem, mantém a hegemonia

conservadora sobre a sociedade brasileira: a burguesia monopolista, a nova burguesia

monopolista agrária, a pequena burguesia e o capital financeiro (nacional e

internacional), este último exercendo papel preponderante na condução da lógica de

reprodução do capitalismo em sua atual fase de internacionalização. Junte-se à

composição deste bloco, uma fração oriunda do proletariado que, recrutada nas

burocracias partidárias e sindicais, passou por um processo de transformismo em seu

posicionamento de classe e age politicamente no sentido de cooptar o conjunto do

proletariado, garantindo o apoio desta classe ao governo e ao projeto político-

econômico por este encarnado, afastando-se cada vez mais de suas origens de classe.

39) O posicionamento do governo atual na dinâmica da luta de classes deve ser

entendido pelo caráter do programa e da ação política objetiva que reproduz, não pela

origem de classe de seus membros. Neste sentido, tal governo é o principal

representante de uma política que propõe a conciliação e a harmonização entre o capital

e o trabalho, nos marcos de uma política “republicana” que supostamente atenderia aos

interesses de “toda” a sociedade, proposições próprias do ideário liberal, portanto

burguês, em sua fase histórica de explícito recuo conservador. A lógica política é a da

conciliação de classe, do interesse da “nação” acima dos interesses de classes, da

harmonização dos conflitos e, principalmente, da crença que o desenvolvimento da

economia capitalista resolve as desigualdades sociais através do “ciclo virtuoso” da

produção, emprego, consumo, e que aos mais miseráveis, o Estado deve contemplar

com políticas compensatórias. Explicitando seu conteúdo ideológico, afirmamos: trata-

se de um projeto burguês.

40) Essa fração do proletariado que aderiu ao projeto burguês se transformou em

principal “gestora” do capitalismo brasileiro na última década. Assim, ocupando cargos

em todos os níveis do governo federal – inclusive como integrantes dos conselhos de

administração de grandes empresas estatais e como representantes de fundos de pensão

– os principais quadros políticos do PT e da CUT passaram à defesa do projeto burguês,

cuja lógica financeira orienta o posicionamento econômico do governo. Só podemos

concluir que o governo e seu projeto de pacto alinharam-se aos interesses do capital

monopolista, na cidade e no campo, e ajudaram a consolidar e legitimar a hegemonia

burguesa liberal, compondo assim o bloco conservador e a aliança com a burguesia

monopolista (que inclui o agronegócio e a burguesia bancária) e o imperialismo.

A Estratégia Socialista da Revolução Brasileira

41) Afirmamos que a Revolução Brasileira é uma Revolução Socialista, considerando

que o Brasil é uma formação social capitalista desenvolvida e monopolista, que a

burguesia monopolista nacional/internacional constituiu-se em classe hegemônica e

dominante; que o Estado brasileiro é um Estado burguês e que o processo político da

luta de classes no ciclo recente produziu um bloco liberal burguês hegemônico e

dominante, formado pela aliança entre a grande burguesia monopolista, o monopólio

capitalista da terra, o imperialismo e um setor político da pequena burguesia política

que, através de burocracias partidárias e sindicais e o controle de mecanismos de

governo, buscam cooptar o proletariado e neutralizar suas ações; considerando ainda

que um bloco proletário procura resistir na direção de uma contra-hegemonia que

aponta para uma meta de superação do capitalismo e da necessidade de uma sociedade

socialista.

42) Sob todos os aspectos, a hegemonia burguesa consolidou-se plenamente no Brasil.

A economia capitalista desenvolveu-se até o estágio monopolista, tendo se constituído

uma sociedade civil-burguesa e um “Estado de Direito”. O capitalismo brasileiro é parte

do processo de acumulação mundial e parte constitutiva do sistema de poder

imperialista no mundo, e as classes dominantes brasileiras estão associadas

umbilicalmente ao capital internacional. A burguesia não disputa sua hegemonia contra

nenhum setor pré-capitalista; pelo contrário, a luta burguesa se volta contra a

possibilidade de uma revolução proletária. As “tarefas em atraso”, como a reforma

agrária, não são mais tarefas em atraso, mas tarefas deixadas para trás e que não serão

realizadas nos limites de uma sociedade capitalista. As contradições objetivas que estão

na base das demandas imediatas das massas trabalhadoras não se devem ao baixo

desenvolvimento de forças produtivas capitalistas, mas exatamente pelo próprio

desenvolvimento e natureza de uma sociedade hegemonizada pelo capital.

43) Portanto, as tarefas colocadas ao conjunto dos trabalhadores e, em especial, da

classe operária, núcleo estratégico e central do sujeito revolucionário, o proletariado,

não podem se realizar nos limites de uma sociedade capitalista. O grau de

desenvolvimento das forças produtivas materiais, no Brasil e no mundo, já se coloca em

contradição com a atual forma capitalista das relações sociais de produção, que

ameaçam a produção social e a própria existência das condições que permitem a vida

humana no planeta. A transição para o socialismo e para a formação de um Estado

Proletário que garanta a existência de novas formas de propriedade e de relações sociais

representa o único meio de libertar os trabalhadores das mazelas que hoje os afligem,

contribuindo para livrar o mundo do desastre socioambiental que a ordem capitalista

mundial impõe.

44) Toda a experiência histórica dos trabalhadores demonstrou que qualquer forma de

pacto com a burguesia é uma miragem que confunde os trabalhadores, desorienta a luta

de classes e apaga o horizonte socialista. Seja a clássica socialdemocracia, que, após a

Segunda Guerra Mundial, garantiu, sob pressão da luta organizada dos trabalhadores,

direitos e políticas públicas, mas que se domesticou diante do capital; seja a atual versão

do social-liberalismo ou “socialdemocracia tardia”, adoradora do mercado, que passou a

gerir o neoliberalismo adotando medidas assistencialistas, ao mesmo tempo em que são

aplicadas com mão de ferro as políticas mais regressivas do grande capital, conforme

pudemos verificar nos últimos 30 anos. Esses pactos não nos levarão a conquistas

parciais que cumulativamente poderiam desembocar em uma sociedade justa e

igualitária. Pelo contrário, fortalecerão ainda mais o capital e seu sistema de poder

mundial. Toda experiência histórica e presente nos comprova que o capital e a

propriedade privada capitalista, ao se perpetuarem, concentram riquezas, acumulam

desigualdades e geram periodicamente as crises que terão que ser pagas pelos

trabalhadores para salvar o lucro dos grandes capitalistas.

45) A definição da etapa socialista da Revolução Brasileira não implica ausência de

mediações políticas na luta concreta para enfrentamento das conjunturas que se

apresentam na dinâmica da luta de classes imediata. No entanto, a estratégia socialista

determina o caráter da luta imediata, ou seja, a estratégia subordina a tática e não o

inverso, como formulam equivocadamente algumas organizações políticas e sociais. A

estratégia socialista não nega as lutas imediatas, mas não aceita a forma atual de

sociabilidade como capaz de dar soluções estruturais e duradouras a estas questões, pois

os problemas vividos pelas massas são manifestações da contradição entre a forma

capitalista de organização da sociedade e as necessidades da produção e reprodução da

vida em um novo patamar.

46) Entendemos que os campos institucional e eleitoral são importantes espaços a serem

ocupados pelos comunistas na luta de classes, mas sabemos das suas crescentes

limitações e precisamos determinar com clareza como ocupá-los. Nossas ações táticas e

nossa política de alianças devem ser moldadas pela necessidade de superação

revolucionária do capitalismo e pela construção da sociedade socialista. Tal construção

dependerá de uma ação permanente dos comunistas e revolucionários para intensificar a

luta política e ideológica na sociedade atual e fazer avançar o projeto contra-

hegemônico do proletariado. Este projeto será construído no calor da luta de classes, em

meio aos embates sociais e ao processo de confrontação política e ideológica frente ao

capitalismo e à sociedade burguesa.

47) Na perspectiva do socialismo, é preciso pensar a construção da hegemonia

proletária como a formação de um modo de produção alternativo sob controle dos

trabalhadores, o que significa dizer que ela se assenta no mundo da produção, não

ficando restrita à sua dimensão política e cultural. O conceito de Bloco Histórico nos

remete à compreensão da sociedade como unidade orgânica entre a estrutura econômica

e a superestrutura, cimentada por uma determinada ideologia, na qual ocupam papel

fundamental os intelectuais, artistas e organizadores da cultura. Os trabalhadores, em

sua luta contra a ordem do capital, devem apresentar-se como classe capaz de contrapor

à atual sociedade desde formas de produção social da vida anticapitalistas, base para

novas relações sociais de produção, até formas políticas de participação popular que

correspondam à profunda socialização da produção e da vida social.

48) Contra o bloco histórico capitalista, portanto, devemos atuar visando à construção

do Bloco Revolucionário do Proletariado, ou seja: o conjunto de ações e transformações

econômicas, políticas, jurídicas e formas de consciência que apontem para a superação

do capitalismo e para a construção da sociedade socialista no rumo do comunismo. Isto

exige a formação de um bloco de classes e setores sociais e suas representações político-

organizativas, que, nas lutas concretas – específicas ou gerais – contra a ordem do

capital, vá se constituindo como um poderoso instrumento de luta e de organização dos

trabalhadores, com uma ação que extrapole o campo dos interesses econômicos para se

apresentar como o contraponto unitário de forças à hegemonia burguesa. A construção

do bloco contra-hegemônico, portanto, pressupõe a articulação das dimensões

econômicas e políticas na conformação da proposta emancipadora, capacitando o

proletariado ao exercício do poder político e da direção cultural de toda a sociedade.

49) O PCB reafirma que esta transformação histórica não se dará através de um projeto

reformista, mas por uma ruptura radical, na qual desempenha papel central a questão do

poder, ou seja, a destruição do poder e da dominação política burguesa e a construção

de um novo Estado do proletariado da cidade e do campo, comprometido com a

construção histórica da capacidade dos trabalhadores em chegar ao autogoverno e,

portanto, à superação do Estado. Isto implica que nossa política de alianças deve se

materializar no campo proletário e popular. A aliança de classes capaz de formar o

Bloco Revolucionário do Proletariado deve ser fundamentalmente estruturada entre os

trabalhadores urbanos e rurais, os setores médios proletarizados e as massas de

proletários precarizados que compõem a superpopulação relativa.

50) A força deste bloco está diretamente ligada à capacidade de a classe trabalhadora

entrar em cena com independência e autonomia histórica, mas depende, da mesma

forma, da iniciativa de vanguardas que resistam à acomodação e mantenham-se em luta

contra a ofensiva crescente e criminalizadora do capital monopolista e seus aliados da

pequena burguesia. A fragmentação atual do bloco popular expressa a fragmentação da

própria classe trabalhadora, em virtude centralmente das determinações atuais da

dominação capitalista, mas também como resultado da inflexão política das vanguardas

que a hegemonizaram neste ciclo que se encerra. A unidade do bloco proletário deve ser

buscada fundamentalmente na capacidade de organização e luta dos trabalhadores

contra a hegemonia liberal burguesa.

51) Este bloco é, portanto, um projeto político a ser construído. Os elementos dispersos

e fragmentados não se constituem enquanto classe, nem econômica nem politicamente.

Apresentam-se como indivíduos em disputa no mercado de trabalho, espaço no qual seu

adversário imediato às vezes é outro proletário e não a burguesia. A fusão de classe

exige que estes setores sociais se coloquem em luta e sejam capazes de ver, para além

das expressões fenomênicas, as causas comuns de seus problemas e a solução, como

consequência direta de sua ação independente e constituição, enquanto classe portadora

de um projeto histórico próprio: o socialismo. Nossa política de alianças deve ser firme

e ampla: ao mesmo tempo em que não há alianças estratégicas com a burguesia e seus

aliados, todo aquele que na luta concreta se colocar em movimento contra a ordem do

capital, se contrapondo aos interesses do bloco liberal burguês, é um aliado em nossa

luta.

52) Mas é preciso não confundir a necessidade de unidade dos trabalhadores e sua fusão

em classe social com a unidade das forças políticas que representam ou dizem

representar os trabalhadores. Enquanto militantes da classe trabalhadora em suas lutas

imediatas e concretas, devemos apresentar o ponto de vista do proletariado, apontando

as causas dos problemas imediatos e relacionando-as com a lógica do capital,

defendendo uma alternativa socialista. É de se esperar que, no acirrar das lutas sociais –

sobretudo com o agravamento da crise do capitalismo e a rendição do governo de

plantão às receitas do capital para combater seus efeitos – setores hoje hegemonizados

pelas organizações reformistas e burocráticas possam vir a se deslocar para o bloco

proletário, passando à condição de aliados quando se contrapuserem, na prática, às

iniciativas e políticas antipopulares do bloco burguês liberal e de seu governo.

53) O PCB precisa aprofundar a sua organização interna e dar um enorme salto

qualitativo no seu trabalho de inserção no interior dos movimentos dos trabalhadores, da

juventude e das lutas populares, para poder assumir como perspectiva futura um

importante protagonismo na direção do bloco contra-hegemônico. Não se trata de

fazermos a autoproclamação do Partido como organização revolucionária da classe, mas

de nos apresentarmos como uma vanguarda que, no interior de um bloco amplo de

forças políticas e sociais, seja capaz de jogar todas as energias na direção da construção

do projeto revolucionário e na contraposição às saídas reformistas, “nacional

desenvolvimentistas”, “democrático-populares” ou outras, que não levem às últimas

consequências a ruptura com a ordem capitalista. Todavia, tal objetivo somente será

alcançado se, na condição de parte integrante do proletariado e respaldado pelas

condições objetivas, soubermos agir no sentido de conquistar o reconhecimento e o

apoio das massas ao nosso Partido e ao projeto revolucionário.

54) O Partido será capaz de participar da direção da classe trabalhadora se penetrar nas

organizações nas quais a massa trabalhadora se agrupa, realizando nelas e através delas

uma sistemática mobilização de energias segundo um programa de lutas anticapitalistas

e anti-imperialistas. Lênin deixava claro não existir uma única forma de luta capaz de

conduzir à vitória do socialismo, que pudesse ser copiada pelos movimentos

revolucionários em todo o mundo, “na base de regras táticas de luta estereotipadas,

mecanicamente niveladas e idênticas”. Tampouco basta a ação isolada da vanguarda ou

um trabalho voltado apenas à agitação e à propaganda, pois somente através da própria

experiência política das massas será possível desenvolver formas de abordagem da

revolução proletária, ou seja, formas de luta eficazes na mobilização popular e no

enfrentamento às classes dominantes.

As Mediações Táticas da Revolução Socialista

55) Assim como expresso no Manifesto do Partido Comunista de Marx e Engels,

devemos reafirmar que os comunistas do PCB não lutam para criar um partido à parte

do proletariado, mas devem apresentar, no conjunto da luta dos trabalhadores, ali onde

ela se expressar, os interesses gerais da classe. Esta representação se associa à

necessária compreensão da sociedade capitalista e suas determinações mais profundas,

assim como se articula à dimensão internacional da luta e do horizonte socialista e

comunista de nossa proposta. A tarefa central dos militantes do PCB é a construção do

nosso Partido em bases de fato revolucionárias, sem o que não será possível agir no

interior da luta de classes com uma perspectiva política que vá além das reivindicações

e necessidades imediatas. Da mesma forma, a organização do PCB só tem sentido se for

ao mesmo tempo organização de um setor da classe trabalhadora profunda e

organicamente ligado às lutas reais do proletariado.

56) Uma vez que o domínio do bloco conservador construiu uma hegemonia que se

expressa em todos os níveis da sociedade (na aceitação da economia capitalista de

mercado; no limite das políticas sociais não mais percebidas como direitos

conquistados; na privatização dos serviços e desmonte das políticas públicas, etc.)

torna-se necessário um intenso trabalho de informação, de formação política e de ação

cultural, no sentido de desvelar os reais fundamentos da ordem do capital, apostando no

desenvolvimento de valores calcados na solidariedade de classe, que resgatem a história

das lutas e da resistência dos trabalhadores e das massas por seus objetivos, com

autonomia e independência. De igual modo, o caráter integrado do capitalismo

brasileiro à ordem internacional do capital imperialista implica numa interdependência

da luta contra-hegemônica. Este aspecto leva à tática de aprofundar os laços de

solidariedade internacional diferenciando aquelas forças que atuam na perspectiva

anticapitalista e anti-imperialista e, ainda mais sólida e profundamente, àquelas forças

socialistas e comunistas.

57) A construção do poder proletário/popular não se resume à mera negação

institucional ou qualquer tipo de paralelismo autonomista, mas ocupa ativamente todos

os poros da institucionalidade atual, guiada por um projeto histórico de negação da

ordem capitalista, portanto, partindo da afirmação revolucionária segundo a qual os

meios necessários à vida não podem ser apropriados privadamente, que nenhum ser

humano pode se apropriar de outro para transformá-lo em mercadoria, que os bens de

primeira necessidade e os serviços necessários à produção e reprodução social da vida

são patrimônio de toda a humanidade e não podem ser apropriados privadamente. É

necessário ir construindo, a partir de agora, a partir da velha ordem, um duplo poder,

uma ordem institucional e política própria dos trabalhadores, fundada e fundante de uma

nova cultura proletária e popular, capaz de dar unidade ao bloco proletário e colocá-lo

em movimento na luta contra a ordem burguesa.

58) O tema do Poder Popular apontado pelas resoluções do XIV Congresso do PCB

ganhou, na conjuntura atual, uma nova dimensão, uma vez que se tornou uma palavra

de ordem que encontrou grande repercussão no movimento de massas e entre várias

organizações de nosso campo de ação política. Ao afirmar a necessidade de construir

um Poder Popular, o PCB chama a atenção para um processo político que não pode ser

confundido com instâncias e organizações de massa ou articulações políticas entre os

partidos de esquerda, isto é, não é um mero elemento de ação tática. Este processo se

desdobra em pelo menos quatro momentos fundamentais, que articulam o plano tático e

o estratégico:

1. A luta pelo Poder Popular se expressa nas ações independentes da classe

trabalhadora em seus embates contra as manifestações mais evidentes da ordem

do capital, os quais ganham a forma mais expressa de mobilizações, greves e

movimentos que colocam em marcha os diferentes segmentos do proletariado e

da classe trabalhadora em geral. Neste aspecto afirmamos que o Poder Popular

existe já em germe na construção da autonomia e da independência de classe

destes movimentos que se chocam com o bloco conservador e sua política em

defesa da ordem burguesa, através das organizações próprias da vida cotidiana,

da organização e da resistência da classe trabalhadora (movimentos sociais,

sindicatos, organizações e partidos de esquerda, fóruns de luta pela saúde,

educação, moradia, transporte, etc.), ainda que, neste momento, atuem de forma

fragmentada e sem a unidade política necessária.

2. Essas lutas e os enfrentamentos tendem a se intensificar e, diante da reação

esperada do poder burguês, caminhar no sentido da necessária unidade

programática em torno de eixos comuns de luta que unifiquem as demandas

setoriais apresentadas de forma fragmentada em uma pauta cada vez mais

precisa de bandeiras e reivindicações, sob as quais o movimento de massas

define sua independência em relação aos governos da ordem e ao bloco

dominante, dando forma ao campo popular e de esquerda.

3. A culminância das lutas de massas e das resistências desenvolvidas aponta para

o aprofundamento da autonomia do campo popular expressa nas bandeiras de

luta, na pauta das demandas apresentadas e em formas organizativas capazes de

se configurar como força política contraposta ao bloco dominante e como

alternativa de poder,formulando um programa político de transformações

necessárias de caráter anticapitalista. Neste momento, o Poder Popular

encontrará as formas organizativas necessárias que não podem ser antecipadas

(Conselhos, Assembleias Populares, Comitês, etc.).

4. No quadro de uma situação revolucionária ou pré-revolucionária, esta

construção política pode e deve assumir a forma de uma dualidade de poderes

que prepare as condições para os enfrentamentos decisivos contra as classes

dominantes e seu Estado – a ditadura da burguesia –, combinando formas diretas

de luta que possibilitem aconstituição de uma real alternativa de poder dos

trabalhadores. Neste momento, o Poder Popular assume toda sua potencialidade

como germe de um novo Estado sustentado pelas massas populares e pela classe

trabalhadora, na perspectiva da transformação radical da sociedade. Plenamente

desenvolvido em seu potencial, o Poder Popular se converte em germe de um

Estado Proletário – a Ditadura do Proletariado – que conduzirá a transição

socialista visando erradicar a propriedade privada, as classes e, portanto, o

próprio Estado através da livre associação dos produtores.

59) A construção do Poder Popular, portanto, pressupõe a criação de novas formas de

associação e sociabilidade proletária através das manifestações de resistência da classe

trabalhadora, dotando-as de dimensão política, pela compreensão das raízes e

determinações de cada problema particular e ao relacioná-los com a totalidade da ordem

capitalista a ser negada. É preciso dotar as ações políticas de uma dimensão organizativa

e disciplinada, culturalmente solidificada, e somar na construção de um grande

movimento político de massas que tenha por objetivo a implantação do socialismo no

Brasil. Por tudo isso, torna-se prioritária a ação da militância comunista nos espaços

onde seja possível fazer avançar a organização dos trabalhadores e da juventude na luta

por seus interesses e necessidades, contribuindo efetivamente para a formação e

aprofundamento da consciência de classe contra a dominação imposta pelo capital. Para

isto, é preciso estar colado com as massas, participando ativamente dos embates diários

da classe trabalhadora, seja por dentro dos sindicatos, no interior das empresas e das

escolas, nos bairros, por meio dos movimentos sociais e comunitários, nas lutas

políticas gerais, etc.

60) Cabe aos militantes comunistas a intervenção organizada nestes espaços,

promovendo sempre a denúncia da ação do capital em todas as esferas da sociedade e da

vida e apontando para a solução radical dos problemas vividos pelos trabalhadores. Será

preciso desenvolver uma solidariedade ativa entre as categorias e setores sociais,

fomentar interesses comuns e a necessidade de uma nova forma de organização da

produção social da vida para além do mercado e da lógica do capital. Onde os limites da

institucionalidade liberal burguesa impedirem a plena realização da humanidade, é

necessário criar experiências inovadoras de ação. Trata-se de tomar uma atitude ativa

diante dos diversos problemas concretos que surgirem e radicalizar soluções, tomando

para o poder proletário e popular a tarefa de enfrentar estes problemas, não no sentido

de substituir as políticas públicas e o dever do Estado, mas de denunciar sua omissão

criminosa e construir outra institucionalidade.

61) As classes sociais que hoje disputam a política brasileira excluíram a questão

proletária da pauta, maquiando uma posição pequeno-burguesa rebaixada como sendo a

representante dos trabalhadores. Nossa tarefa é garantir que o projeto proletário e

socialista entre novamente no debate, como expressão dos interesses reais, imediatos e

históricos das classes trabalhadoras sob seu protagonismo direto. O desfecho da

estratégia da Revolução Socialista, na qual se insere a proposta de construção do Poder

Popular, não pode ser definido de antemão, mas é nosso dever e responsabilidade nos

preparar para os diversos cenários que podem se apresentar. Assim, devemos estar

preparados para defender a alternativa socialista contra a violência da reação burguesa e

seus aliados, desenvolvendo a autodefesa e o direito de rebelião.

62) O principal desafio do PCB é construir as pontes táticas que nos permitam criar as

condições de desenvolver nosso projeto estratégico pelo socialismo no Brasil. Enquanto

parte das forças políticas que atuam no cenário brasileiro, inclusive do campo de

esquerda, cada vez mais jogam suas fichas na pauta do processo eleitoral, o PCB afirma

ser essencial que os próximos períodos sejam marcados por intensas mobilizações,

resistências, lutas e árduas tarefas de organização e formação política, capazes de lançar

as bases de um projeto de Poder Popular para o Brasil.

63) O PCB deve incentivar a elaboração de um calendário nacional de lutas centrado na

resistência dos trabalhadores à ofensiva do capital em função da crise, tendo como

lemanenhum direito a menos, avançar nas conquistas, a defesa do emprego e do poder

de compra dos salários, a luta pela redução da jornada de trabalho sem redução salarial,

pela manutenção e ampliação das verbas para educação e saúde, pela garantia da

moradia e contra a especulação imobiliária, pela melhoria e expansão dos transportes de

massa em contraponto aos benefícios dados ao uso do automóvel individual, visando

atrair para a luta os trabalhadores e os setores mais necessitados da população, além de

combater qualquer forma de subsídio para o capital, o uso do FGTS em benefício das

empresas e a manutenção de cerca de metade do Orçamento para pagamento dos

serviços da dívida pública.

64) Apontamos ainda para a necessidade de constituição de uma frente política de

caráter permanente, organizada em torno de um programa capaz de dar unidade às lutas

anticapitalistas e de oposição às manifestações do imperialismo no Brasil e no mundo.

Tal articulação, a que denominamos Frente Anticapitalista e Anti-imperialista, não pode

ser confundida com uma frente eleitoral. A vitória eleitoral e as possibilidades de

governabilidade de forças de esquerda somente ocorrerão se estiver fincada sobre um

forte movimento de massas. Portanto, o projeto de constituição da Frente Anticapitalista

e Anti-imperialista depende da formação de um amplo movimento de caráter

permanente, estruturado por partidos políticos, organizações de massa e movimentos

populares reunidos em torno do programa contra-hegemônico, no qual esteja prevista a

ruptura com o capitalismo.

65) Para a conformação desta Frente, devemos priorizar o diálogo com as forças

políticas e sociais que têm se posicionado, nas inúmeras frentes de luta, em franca

oposição ao Estado burguês e sua opressão de classe, mesmo aquelas que hoje ainda se

mantêm reticentes a abraçar a ideia de um movimento com caráter anticapitalista.

Algumas dessas forças se opõem à ideia pelo entendimento de que ainda há “tarefas

nacionais” a cumprir no Brasil, e que estaríamos (nós, do PCB) nos adiantando ao

processo histórico, propondo a luta anticapitalista como central. Estes grupos partem do

princípio de que é preciso, primeiro, desenvolver a luta antilatifúndio e antimonopólio e

que, portanto, o atual estágio da luta de classes no Brasil demandaria um movimento

primordialmente anti-imperialista. Trata-se, de fato, de uma concepção “etapista”

disfarçada.

66) Entendemos que as lutas populares no Brasil contra a exploração, contra o poder do

latifúndio ou contra os monopólios são, no essencial, lutas anticapitalistas, pois o capital

exerce seu domínio em todas as esferas da vida social. Qualquer “tarefa nacional” ou

“popular-democrática” a ser cumprida será uma tarefa anticapitalista. Todo e qualquer

movimento popular encontra do outro lado da trincheira a organização do capital,

tentando obstaculizar as conquistas por parte dos trabalhadores. As lutas sociais e a

resistência dos trabalhadores na defesa de seus direitos mais imediatos, como o salário,

as condições de trabalho, a aposentadoria, a assistência, os direitos previdenciários,

assim como a luta pela qualidade de vida e pelo direito a uma educação pública de

qualidade, ao atendimento de saúde, à moradia digna, à mobilidade urbana e/ou

deslocamento nas zonas rurais, ao acesso à informação, aos bens culturais e ao lazer se

chocam hoje com a lógica privatista e de mercado, que vê todos estes bens e serviços

como mercadorias a ser adquiridas prioritariamente no mercado privado, gerando lucros

enormes para as grandes corporações e, secundária e supletivamente, pelo Estado, na

forma de políticas públicas.

67) Não contrapomos a luta anticapitalista à luta contra o imperialismo. No caso do

Brasil, as duas lutas se unem no mesmo processo de enfrentamento à ordem imposta

pelo grande capital e pela burguesia. Pois sabemos que o desenvolvimento do

capitalismo brasileiro está, de forma profunda e incontornável, associado ao capitalismo

internacional, sendo impossível separar onde começa e onde acaba o capital “nacional”

e aquele ligado à internacionalização das grandes empresas transnacionais. O

desenvolvimento dos monopólios e oligopólios, das fusões, da concentração e

centralização dos principais meios de produção nas mãos de grandes corporações

monopolistas, nos setores industrial, bancário e comercial, torna impossível separar o

capital de origem brasileira ou estrangeira, assim como o chamado capital produtivo do

especulativo, já que, nesta fase, o capital financeiro funde seus investimentos tanto na

produção direta como no chamado capital portador de juros e flui de um campo para

outro de acordo com as necessidades e interesses da acumulação privada, sendo avesso

a qualquer tipo de planejamento e controle. Por isso a luta anticapitalista hoje é,

necessariamente, uma luta anti-imperialista.

68) A afirmação do caráter anti-imperialista não advém de nenhuma afirmação de um

capitalismo nacional em contraposição à dominação estrangeira de potências

desenvolvidas, o que poderia nos levar a reapresentar um elemento essencial da

estratégia das etapas ou do desenho mais geral de uma estratégia nacional-democrática

ou democrático-popular. O caráter anti-imperialista da frente proposta, pelo contrário,

parte da constatação do caráter internacional do capitalismo monopolista e daí seu

caráter imperialista, de forma que as lutas anticapitalistas que se desenvolvem no Brasil,

na América Latina e no mundo se chocam necessariamente com a ordem

capitalista/imperialista mundial, o que aumenta a necessidade de articulação política

ativa e da solidariedade internacionalista.

69) Devemos buscar o trabalho político conjunto com grupamentos políticos que,

mesmo não se situando no campo socialista, somam forças na denúncia e no

enfrentamento às ações do imperialismo, como nos casos das agressões militares diretas

ou do suporte a grupos mercenários por parte dos EUA e da OTAN à Líbia, Iraque,

Síria e outros países, assim como, por outro lado, no apoio a governos como os da

Venezuela e da Bolívia, por seu caráter anti-imperialista. Devemos, enfim, atuar, junto a

todas as forças políticas e organizações sociais que de alguma forma se contraponham

ao poder do capital, com vistas à formação da Frente Anticapitalista e Anti-imperialista,

que não necessariamente terá este nome, mas que tenha, em essência, o caráter de um

amplo movimento político permanente de lutas, voltado a enfrentar os ditames do

capital e da ordem burguesa em nosso país, preparando o caminho para a disputa pelo

poder e a construção da sociedade socialista.

70) A hegemonia burguesa só pode se impor e se prolongar no Brasil pela divisão das

forças anticapitalistas e anti-imperialistas. Urge um salto de qualidade na busca pela

unidade de ação dos movimentos populares, das forças de esquerda e entidades

representativas dos trabalhadores, no interior e para além do mundo sindical

corporativo, sem hegemonismos ou práticas excludentes, com a promoção de iniciativas

conjuntas de resistência e de confrontação que sejam os passos necessários para a

constituição de um bloco proletário capaz de contrapor à hegemonia conservadora uma

real alternativa de poder popular e socialista em nosso país.