tese saf

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Escola Superior de Educação João de Deus Mestrado em Ciências da Educação na Especialidade em Domínio Cognitivo-Motor Atitudes dos professores do ensino público face à Síndrome Alcoólica Fetal, em função da idade e do tempo de serviço em Educação Especial Neuza Maria Jesus da Costa Lisboa, Julho de 2012

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  • Escola Superior de Educao Joo de Deus

    Mestrado em Cincias da Educao na Especialidade em Domnio Cognitivo-Motor

    Atitudes dos professores do ensino pblico face Sndrome Alcolica Fetal, em funo

    da idade e do tempo de servio em Educao Especial

    Neuza Maria Jesus da Costa

    Lisboa, Julho de 2012

  • ii

  • iii

    Escola Superior de Educao Joo de Deus

    Mestrado em Cincias da Educao na Especialidade em Domnio Cognitivo-Motor

    Atitudes dos professores do ensino pblico face

    Sndrome Alcolica Fetal, em funo da idade e do

    tempo de servio em Educao Especial

    Neuza Maria Jesus da Costa

    Dissertao apresentada Escola Superior de Educao Joo de

    Deus com vista obteno do grau de Mestre em Cincias da

    Educao na Especialidade de Educao Especial: Domnio

    Cognitivo e Motor sob a orientao da

    Professora Cristina Gonalves

    Lisboa, Julho de 2012

  • iv

    Resumo

    A presente investigao tem como tema principal a Sndrome Alcolica Fetal

    (SAF). O lcool ingerido pela mulher grvida espalha-se na corrente sangunea e entra

    em contacto com o feto atravs da troca de nutrientes na placenta. Este ainda no tem

    os rgos preparados para este tipo de aco nem mecanismos de defesa, portanto, a

    quantidade de lcool e a fase da gravidez podem contribuir para o aumento de risco de

    aparecimento da SAF. Esta caracteriza-se pela manifestao de irregularidades

    neonatais singulares de desenvolvimento, intelectuais e corporais associados ao

    consumo de lcool pela me durante a gravidez.

    Vrios autores estudaram este assunto em variadas vertentes, chegando a

    diversificadas concluses. O principal objectivo deste trabalho analisar o conhecimento

    que os professores tm sobre a problemtica da SAF, desde caractersticas fsicas,

    cognitivas e sociais, passando por estratgias de interveno e condies de apoio nas

    escolas a esta situao; analisar as atitudes dos professores do ensino pblico

    relativamente SAF e verificar de que forma as mesmas variam em funo da idade e

    do tempo de servio em Educao Especial.

    Os resultados permitem verificar que o conhecimento dos professores com idade

    igual ou inferior a 30 anos mais alargado quando comparado com o dos professores

    mais velhos. Da mesma forma as atitudes variam em funo da idade e do tempo de

    servio em EE. Os professores mais novos e os que tm experincia na EE revelam

    atitudes mais conscienciosas da problemtica apresentada.

    Conclumos que imperativa a aposta na formao dos profissionais da educao,

    por forma a potenciar as suas estratgias e metodologias com vista a intervir

    objectivamente e com resultados positivos junto dos alunos com SAF.

    Palavras-chave: lcool, Sndrome Alcolica Fetal, atitude, professor, idade e

    tempo de servio.

  • v

    Abstract

    The present investigation has as main subject the Fetal Alcohol Syndrome (FAS).

    The alcohol ingested by the pregnant woman spreads in the bloodstream and it enters in

    contact with the fetus by the exchange of the nutrients in the placenta. The fetus hasnt

    got the organs ready for this kind of action neither defense mechanisms, so the amount

    of alcohol and the stage of pregnancy can increase the risk of appearing FAS. This is

    characterized by the manifestation of singular neonatal irregularities of development,

    intellectual and body associated to the alcohol consumption by the mother during the

    pregnancy.

    Several authors studied this subject in many aspects, coming to diversified

    conclusions. The main objective of this work is to analyse the knowledge that teachers

    have about the problematic of FAS, not only the physical, but also the cognitive and

    social characteristics using the intervention strategies and support conditions in schools.

    Another important aspect is to analyse the teachers attitudes in the public education

    relatively to FAS and to verify how they change according to age and the time in the

    school in Special Education.

    The results verify that the teachers knowledge with 30 years old or less is more

    extended compared with the knowledge of older teachers. The same way the attitudes

    vary in function of the age and the time in school in Special Education. Younger teachers

    and the teachers that have more experience in Special Education show more

    conscientious attitudes of this problematic.

    We can conclude that it is imperative to have excellent educational professionals

    developing their strategies and methologies in order to achieve the best results among

    FAS students.

    Key words: alcohol, Fetal Alcohol Syndrome, attitude, teacher, age, experience.

  • vi

    Dedicatria

    pessoa que me segura pela mo

    s pessoas que simplesmente me vem crescer

    s pessoas que me permitem crescer

    s pessoas que crescem comigo

    s pessoas que me fazem voar mais longe, num tempo sem asas

    A todas as crianas que me indicam o caminho

    queles que edificam a minha vida

    s estrelas da terra

    que outrora partiram

    e agora me iluminam

    e mostram o caminho

  • vii

    Agradecimentos

    Aos meus Pais, ANTNIO e MARIA, pelo apoio incondicional

    Ao amor da minha vida, MANUEL, pelo amor e carinho, pela fora e compreenso, pela

    pacincia e companhia, pela brincadeira e distraco

    Ao meu irmo, CARLOS, pela moderao e incentivo

    Marisa, pela ajuda, afecto e preocupao

    Ana Cristina e Olga, pela amizade, disponibilidade e colaborao

    Ao Doutor Professor Horcio Saraiva, pelo conhecimento que partilha

    Doutora Professora Cristina Gonalves, pela orientao

    Ao Doutor Professor Jorge Castro, pela inspirao e por mostrar que o ideal possvel

    E a todos que de alguma forma colaboraram no desenvolvimento deste trabalho

    Obrigada!

  • viii

    ndice

    Introduo ..........................................................................................................................................1

    Captulo 1 Quadro terico e reviso da litratura ............................................................................4

    1. As atitudes ................................................................................................................................5

    1.1. Formao e desenvolvimento das atitudes ..........................................................................5

    1.2. Funes das atitudes ............................................................................................................5

    1.3. Componentes das atitudes ...................................................................................................6

    1.4. Mudana de atitudes ............................................................................................................6

    1.5. Medida das atitudes .............................................................................................................7

    2. O lcool .....................................................................................................................................8

    2.1. O lcool no organismo ..........................................................................................................8

    2.2. Eliminao do lcool .............................................................................................................9

    2.3. Alcoolemia e taxa de alcoolmia ....................................................................................... 10

    2.4. Efeitos do lcool ................................................................................................................ 11

    2.5. O lcool no contexto social ................................................................................................ 12

    2.5.1. Dependncia do lcool como pecado ..................................................................... 13

    2.5.2. A dependncia do lcool como doena .................................................................. 14

    2.5.3. A dependncia do lcool como comportamento inadaptado ................................ 15

    2.6. Portugal no contexto europeu do consumo de lcool ...................................................... 15

    2.7. Quadro legal portugus no domnio do lcool .................................................................. 16

    2.8. Critrios de diagnstico da dependncia do lcool........................................................... 17

    2.8.1. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders (DSM-IV) .......................... 17

    2.8.2. Classificao Estatstica Internacional de Doenas e Problemas Relacionados

    Sade Dcima Reviso (CID-10) ........................................................................... 18

    2.9. O lcool e o consumo precoce .......................................................................................... 19

    2.10. O lcool e os factores de risco ....................................................................................... 20

    2.10.1. Factores de risco individuais ................................................................................... 20

    2.10.2. Factores de risco scio ambientais ......................................................................... 22

    2.11. Abordagens explicativas das causas da iniciao aditiva do lcool ............................... 23

    2.11.1. Abordagem cognitivo-comportamental ................................................................. 23

    2.11.2. Abordagem biopsicossocial .................................................................................... 23

    2.11.3. Abordagem psicobiolgica ...................................................................................... 24

  • ix

    2.11.4. Teoria da inverso psicolgica ................................................................................ 24

    2.11.5. Modelo de gesto hedonista .................................................................................. 24

    2.11.6. Modelo do sistema de aces ................................................................................. 25

    2.12. Preveno para os efeitos da adio do lcool .............................................................. 25

    2.12.1. Modelos de preveno do comportamento aditivo ............................................... 26

    2.12.1.1. Modelo proscritivo .................................................................................... 27

    2.12.1.2. Modelo sociocultural ................................................................................. 27

    2.12.1.3. Modelo do comportamento interpessoal (MCI)........................................ 27

    2.12.1.4. Modelo scio afectivo................................................................................ 28

    2.12.1.5. Modelo de inoculao ............................................................................... 28

    2.12.1.6. Modelo humanista: educao e valores .................................................... 28

    2.12.1.7. Modelo biopsicossocial .............................................................................. 28

    2.12.1.8. Modelo das alternativas ao consumo de lcool ........................................ 29

    2.12.1.9. Modelo da comunicao-persuaso (MCP) ............................................... 29

    2.13. O papel do professor no cintexto do lcool ................................................................... 30

    3. Alcoolismo feminino .............................................................................................................. 31

    3.1. Diagnstico precoce do consumo de lcool na gravidez ................................................... 31

    3.1.1. Tolerance, Annoyed, Cut down Eyeopener (T-ACE) ............................................... 33

    3.1.2. TWEAK ..................................................................................................................... 34

    3.2. Efeitos do lcool na gravidez ............................................................................................. 34

    3.3. Efeitos do lcool na amamentao ................................................................................... 35

    4. A Sndrome Alcolica Fetal (SAF) ........................................................................................... 36

    4.1. Caractersticas da SAF ........................................................................................................ 37

    4.2. reas afectadas no crebro com SAF ................................................................................ 39

    4.3. Exames mdicos ................................................................................................................ 40

    4.4. Diagnstico da SAF ............................................................................................................ 40

    4.4.1. Critrios de diagnstico da teratogenia do cool ................................................... 42

    4.4.2. Critrios de diagnstico das Desordens do Espectro Alcolico Fetal (DEAF) ......... 43

    4.4.3. O Cdigo de Quatro Dgitos (4-DIGIT Diagnostic Code) .......................................... 46

    4.4.4. Diagnstico diferencial ........................................................................................... 46

    4.5. Tratamento e interveno ................................................................................................. 47

    5. Interveno educativa ........................................................................................................... 48

    5.1. Avaliao da SAF ................................................................................................................ 48

  • x

    5.1.1. Perfil de funcionalidade do aluno com SAF, com referncia CIF ......................... 49

    5.2. O contexto escolar ............................................................................................................. 51

    5.2.1. O bom professor ..................................................................................................... 52

    5.2.2. O professor e as suas atitudes face SAF ............................................................... 55

    5.2.3. Gesto inclusiva das adaptaes curriculares ........................................................ 58

    5.2.4. Projecto TRIUMF ..................................................................................................... 60

    Captulo 2 Metodologia de investigao ..................................................................................... 63

    1. Objectivos .............................................................................................................................. 64

    2. Justificao dos objectivos ..................................................................................................... 64

    3. Hipteses e variveis ............................................................................................................. 64

    4. Instrumentos ......................................................................................................................... 65

    5. Procedimento ....................................................................................................................... 65

    6. Tratamento da informao .................................................................................................... 65

    7. Amostra ................................................................................................................................. 65

    Captulo 3 Apresentao dos resultados ..................................................................................... 63

    1. Caracterizao da amostra .................................................................................................... 67

    2. Caracterizao da atitudes no trabalho com a SAF ............................................................... 71

    3. Caracterizao das atitudes face s caractersticas da SAF ................................................... 74

    4. Caracterizao das atitudes dos professores em funo da idade ....................................... 78

    5. Caracterizao das atitudes dos professores em funo do tempo de servio em EE ......... 84

    Captulo 4 Discusso dos resultados ............................................................................................ 91

    Captulo 5 Concluso .................................................................................................................... 97

    Captulo 6 Referncias bibliogrficas ......................................................................................... 100

    ndice de Tabelas

    Tabela 1 reas afectadas do crebro e respectivas funes. ............................................................ 39

    ndice de Ilustraes

    Ilustrao 1 Caractersticas fsicas da criana com SAF .................................................................... 37

    Ilustrao 2 Crebro normal e crebro de um sujeito com SAF. ....................................................... 39

  • xi

    ndice de Grficos ..............................................................................

    Grfico 1 Distribuio da amostra em funo do gnero. __________________________________ 67

    Grfico 2 Distribuio da amostra em funo da idade. ___________________________________ 67

    Grfico 3 Distribuio da amostra em funo do nvel de ensino . __________________________ 68

    Grfico 4 - Distribuio da amostra pelas disciplinas que lecciona. ___________________________ 68

    Grfico 5 - Distribuio da amostra face s habilitaes acadmicas. ________________________ 69

    Grfico 6 - Distribuio da amostra face ao tempo de servio total. ___________________________ 69

    Grfico 7 - Distribuio da amostra pelo tempo de servio em Educao Especial _____________ 70

    Grfico 8 - Distribuio da amostra face ao meio onde leccionou. ____________________________ 70

    Grfico 9 - No presente ano lectivo est a trabalhar com alunos com SAF? ___________________ 71

    Grfico 10 - J trabalhou anteriormente com alunos com SAF? ______________________________ 71

    Grfico 11 - Nmero de alunos com SAF com os quais j trabalhou. _________________________ 72

    Grfico 12 - Tempo de servio com alunos com SAF. ______________________________________ 72

    Grfico 13 - Distribuio da amostra por formas de participao adoptadas com alunos com SAF.

    ______________________________________________________________________________________ 73

    Grfico 14 - Distribuio da amostra face razo de no trabalhar com alunos com SAF. ______ 73

    Grfico 15 - Distribuio da amostra de acordo com o grau de concordncia sobre ter

    conhecimentos suficientes para lidar com as necessidades educativas dos alunos com SAF. ___ 74

    Grfico 16 - Distribio da amostra de acordo com o grau de concordncia sobre ser capaz de

    remediar dfices de aprendizagem dos alunos com SAF. ___________________________________ 75

    Grfico 17 - Distribuio da amostra de acordo com o grau de concordncia sobre ser capaz de

    controlar o comportamento de alunos com SAF. ___________________________________________ 75

    Grfico 18 - Distribuio da amostra face ao grau de concordncia sobre a afirmao Gosto de ter

    alunos com SAF na minha aula. _________________________________________________________ 76

    Grfico 19 - Distribuio da amostra de acordo com o grau de concordncia sobre a acessibilidade

    dos materiais didcticos especficos. _____________________________________________________ 76

    Grfico 20 - Distribuio da amostra de acordo com o grau de concordncia sobre ter os servios

    adequados disponveis para a apoiar. ____________________________________________________ 77

  • xii

    Grfico 21 - Distribuio da amostra segundo o grau de concordncia sobre se o oramento

    escolar sufuciente para adquirir materiais de apoio. ______________________________________ 77

    Grfico 22 - Distribuio da amostra segundo o grau de concordncia sobre frequentar formao

    complementar acerca da educao de alunos com SAF, no futuro. __________________________ 78

    Grfico 23 Grau de concordncia relativo afirmao A SAF deve-se ao consumo de lcool por

    parte da me durante a gravidez e amamentao, em funo da idade. _____________________ 79

    Grfico 24 Grau de concordncia relativo afirmao O aluno tem dificuldade em completar

    tarefas, em funo da idade. ____________________________________________________________ 79

    Grfico 25 Grau de concordncia reltivo afirmao Um aluno com SAF pode apresentar

    dificuldade na fala e na comunicao, em funo da idade. _________________________________ 80

    Grfico 26 - Grau de concordncia com a afirmao "O desempenho escolar do aluno com SAF

    pobre", em funo da idade. _____________________________________________________________ 80

    Grfico 27 - Grau de concordncia com a afirmao "A SAF pode caracterizar-se ficamente por

    malformaes no corpo, rgos internos e parte dos sentidos e representa risco de morte", em

    funo da idade. _______________________________________________________________________ 81

    Grfico 28 - Grau de concordncia relativo afirmao "os alunos com SAF beneficiaro da

    interaco proporcionada pela incluso numa sala regular", em funo da idade. ______________ 81

    Grfico 29 - Grau de concordncia rlativo afirmao "as alunos sem SAF beneficiaro com a

    integrao dos alunos com SAF nas suas turmas", em funo da idade. ______________________ 82

    Grfico 30 - Grau de concordncia relativo afirmao "os alunos com SAF devem beneficiar de

    uma difernciao pedaggica, ainda que includos no grupo turma", em funo da idade. ______ 83

    Grfico 31 - Grau de concordncia relativo afirmao "os alunos com SAF so socialmente

    aceites pelos seus pares sem SAF", em funo da idade. ___________________________________ 83

    Grfico 32 - Grau de concordncia relativo afirmao "os alunos com SAF so humilhados na

    sala de aula por parte dos colegas sem SAF", em funo da idade. __________________________ 84

    Grfico 33 - Grau de concordncia relativo afirmao A SAF deve-se ao consumo de lcool por

    parte da me durante a gravidez e amamentao, em funo do tempo de servio em EE. ____ 85

    Grfico 34 Grau de concordncia relativo afirmao um aluno com SAF tem dificuldades em

    completar tarefas, em funo do tempo de servio em EE. _________________________________ 85

    Grfico 35 Grau de concordncia reltivo afirmao Um aluno com SAF pode apresentar

    dificuldade na fala e na comunicao, em funo do tempo de servio em EE. _______________ 86

    Grfico 36 - Grau de concordncia com a afirmao "O desempenho escolar do aluno com SAF

    pobre", em funo do tempo de servio em EE. ____________________________________________ 86

  • xiii

    Grfico 37 - Grau de concordncia com a afirmao "A SAF pode caracterizar-se ficamente por

    malformaes no corpo, rgos internos e parte dos sentidos e representa risco de morte", em

    funo do tempo de servio em EE. ______________________________________________________ 87

    Grfico 38 - Grau de concordncia relativo afirmao "os alunos com SAF beneficiaro da

    interaco proporcionada pela incluso numa sala regular", em funo do tempo de servio em

    EE. ___________________________________________________________________________________ 87

    Grfico 39 - Grau de concordncia rlativo afirmao "as alunos sem SAF beneficiaro com a

    integrao dos alunos com SAF nas suas turmas", em funo do tempo de servio em EE._____ 88

    Grfico 40 - Grau de concordncia relativo afirmao "os alunos com SAF devem beneficiar de

    uma difernciao pedaggica, ainda que includos no grupo turma", em funo do tempo de

    servio em EE. _________________________________________________________________________ 89

    Grfico 41 - Grau de concordncia relativo afirmao "os alunos com SAF so socialmente

    aceites pelos seus pares sem SAF", em funo do tempo de servio em EE. _________________ 89

    Grfico 42 - Grau de concordncia relativo afirmao "os alunos com SAF so humilhados na

    sala de aula por parte dos colegas sem SAF", em funo do tempo de servio em EE. _________ 90

  • 1

    Introduo

    Desde sempre, o lcool consumido por homens e mulheres em todo o tipo de

    ocasio, sendo considerado at como estimulante, mas o seu consumo pode causar

    dependncia em sujeitos com predisposio a situaes depressivas ou por factores

    motivacionais individuais para consumir.

    O lcool faz parte da histria da humanidade, sendo a droga mais consumida

    (Rodrigues V. , 2003).

    Estando o consumo do lcool generalizado nas sociedades ocidentais, o mesmo

    potencia tanto nos jovens como nos adultos a adopo de comportamentos de risco, mas

    no primeiro grupo h frequentemente a procura de novas experincias e maior sensao

    de invulnerabilidade, patentes num egocentrismo prprio da juventude.

    O desenvolvimento da dependncia do lcool, entre outras drogas, potenciado

    pelo incio precoce de consumo. Para os indivduos que no encontram apoio e

    orientao no seio familiar ou nos grupos e na escola, muitas vezes vm a rua no como

    espao de companheirismo e socializao mas como espao alternativo de liberdades.

    De acordo com Arago & Sacadura (2002), em Espanha, mais de metade (55,7%)

    dos adultos com mais de 18 anos consomem lcool preferencialmente e um nmero

    elevado de adolescentes do ensino secundrio (34,6%) consomem lcool com

    regularidade. A prevalncia de consumo no Brasil de 82% e nos EUA, relativa aos

    alunos universitrios, de 87%.

    Os factores de risco individuais (genticos, biolgico evolutivos e psicolgicos) so

    de origem cognitiva e moldados pelos estados emocionais como a afectividade, a

    frustrao, a ansiedade, a raiva, a tenso, a depresso, resultantes da interpretao e

    adaptao individual s presses scio ambientais (Rodrigues, 2006).

    A crescente complexidade e diversidade social exige da parte dos professores uma

    preparao profissional mais abrangente e de maior autonomia para fazer face aos

    problemas emergentes como a adio.

    de conhecimento global, desde os tempos primitivos, que o lcool consumido por

    mulheres durante a gravidez produz efeitos prejudiciais no feto, efeitos nocivos

    (embriotoxidade), intervindo de tal forma no desenvolvimento fetal de modo a produzir

    deformaes (teratogenicidade), transformando-se num srio problema de sade pblica.

    Antes de uma gravidez, a histria gentica da me e o seu comportamento

    relativamente ao lcool so factores relevantes a considerar, pois mulheres com

  • 2

    antecedentes familiares de alcoolismo e uma histria individual de excessos,

    normalmente, apresentam maior risco para o feto.

    O alcoolismo na gravidez pode dever-se tambm a condies socioeconmicas

    difceis, ao baixo nvel escolar, desnutrio, doenas infecciosas e uso de outras drogas.

    Para que a mulher grvida no ingira lcool necessrio que alguns factores de

    apoio se mobilizem no decorrer da gravidez, como o apoio familiar, o ambiente

    harmonioso onde esteja inserida, colaborao por parte de quem contacta com a mulher

    diariamente, companhia, so estes requisitos fundamentais para evitar o risco de

    consumo de lcool nesta fase to crucial.

    Segundo Fiorentin & Vargas (2006), na formao profissional dos enfermeiros, os

    quais mantm contacto directo e permanente com as grvidas, tem sido dada pouca

    relevncia ao problema do alcoolismo feminino em idade reprodutora.

    Consequentemente, estes profissionais nem sempre esto preparados para actuar face

    ao exposto.

    O lcool ingerido pela mulher grvida espalha-se na corrente sangunea e entra em

    contacto com o feto atravs da troca de nutrientes na placenta. Enquanto o organismo da

    mulher elimina o lcool duas vezes mais rpido que o feto, este ainda no tem

    mecanismos de defesa nem os rgos preparados para este tipo de aco, portanto, a

    quantidade de lcool e a fase da gravidez podem contribuir para o aumento de risco de

    aparecimento da Sndrome Alcolica Fetal (SAF).

    A SAF caracterizada por atraso no desenvolvimento pr ou ps nascimento, pelo

    perigo que representa ao nvel do sistema nervoso central, complicaes no

    desenvolvimento cognitivo e social, problemas ao nvel da comunicao e da fala, no

    cumprimento de tarefas, na capacidade de ateno e concentrao, entre outras que

    veremos mais frente neste trabalho.

    Esta problemtica actual e emergente e as investigaes j feitas sobre o tema

    so insuficientes para que haja respostas adequadas, atempadas e eficazes no

    diagnstico, avaliao e interveno junto dos indivduos com SAF e das prprias

    grvidas, relativamente permanncia de factores de risco potenciadores da existncia

    destes casos.

    Apesar dos vrios estudos sobre as envolventes da SAF, ainda no possvel

    encontrar unanimidade sobre todas as caractersticas possveis, sobre as melhores

    formas de diagnstico, avaliao e interveno.

  • 3

    Devido dificuldade no diagnstico e s falhas do mesmo ao nvel de todas as

    reas envolventes da criana (famlia, sade, escola), muitas vezes estes indivduos

    vivem muito tempo sem que sejam correctamente diagnosticados.

    Perante a SAF necessrio que os profissionais de educao estejam conscientes

    da sua realidade, identificando as caractersticas, reconhecendo as dificuldades,

    desenvolvendo sistemas de trabalho e interveno diversificados e diferenciados, para

    facultar um processo de ensino e aprendizagem funcional e integrador.

    O professor o elemento crucial para fazer face s necessidades e limitaes

    destes alunos, desde que adoptem as atitudes mais correctas que visem a diferenciao

    pedaggica sem esquecer a incluso. Para que tal acontea imperativa a aposta na

    formao inicial sobre o trabalho a desenvolver perante as necessidades educativas

    especiais.

    Neste sentido, achamos pertinente estudar as atitudes dos professores em relao

    a esta sndrome e analisar de que forma esto conscientes e preparados para lidar com

    esta realidade. Pretendemos perceber se estas atitudes variam em funo da idade e da

    experincia na Educao Especial. Estes factores dependem em grande parte do tipo de

    formao adquirida.

    Este estudo revela-se pertinente porque apresenta ideias cruciais como a

    necessidade de formar mais e melhor todos os profissionais de educao, para que

    sejam capazes de responder s necessidades dos alunos com SAF.

  • 4

    Captulo 1

    Quadro Terico e Reviso da Literatura

  • 5

    1. As atitudes

    1.1. Formao e desenvolvimento das atitudes

    As atitudes expressam a posio individual ou grupal, construda a partir da sua

    histria, referindo-se a experincias subjectivas. Seja qual for o grupo ou subgrupo em

    que o indivduo se insere, ele tem a necessidade intrnseca de interiorizar normas

    culturais a vigentes. em funo dessas normas que o indivduo vai formando as suas

    ideias, sentimentos, gostos, preferncias e modos de actuao num determinado

    momento. Em suma, no processo de socializao, na interaco social, na

    comparao, identificao e diferenciao sociais que cada um vai construindo o seu

    sistema de atitudes.

    Assim, podemos assumir atitudes face a ideias, a situaes, a instituies, a

    objectos materiais e a pessoas. Esta dimenso avaliativa est sempre presente, pois as

    atitudes expressam um posicionamento face a um determinado objecto social traduzido

    atravs de um afecto positivo ou negativo.

    As atitudes no so, portanto, directamente observveis. Inferem-se a partir dos

    comportamentos, ou seja, daquilo que o indivduo faz ou diz. A correspondncia entre

    uma atitude e um comportamento manifesto no se revela simples ou perfeita, uma vez

    que o comportamento produto das atitudes e da situao imediata simultaneamente e

    as atitudes podem ser mltiplas mesmo que relativas mesma situao.

    Geralmente, na infncia as atitudes so moldadas de acordo com as ideias e

    valores dos progenitores ou familiares, como por exemplo, relativamente poltica e

    religio. medida que o desenvolvimento intelectual avana, estas influncias familiares

    vo diminuindo e o adolescente tende a assumir as atitudes em consonncia com os

    seus prprios ideais.

    1.2. Funes das atitudes

    Podemos analisar as atitudes em termos das suas funes, dividindo-as: as

    funes motivacionais englobam a necessidade de expresso de valores (sentido de

    identidade), de defesa (proteco do eu) e de adaptao (relacionadas com a

    gratificao); as funes cognitivas envolvem os padres ou pontos de referncia que

    facilitam a atribuio de sentido ao mundo conceptual interior; as funes sociais aludem

  • 6

    influncia que o posicionamento de terceiros assume na formao das atitudes e a sua

    respectiva funo nos grupos sociais.

    1.3. Componentes das atitudes

    Em qualquer atitude possvel distinguir trs componentes: intelectual ou cognitiva,

    que corresponde ao que sabemos ou acreditamos saber acerca de algo (ideias e

    crenas); emocional ou afectiva, que inclui o que sentimos acerca de algo (sentimentos,

    sistemas de valores); comportamental, que diz respeito ao que estamos dispostos a fazer

    em relao a algo (conjunto de respostas do indivduo face ao objecto social).

    O elemento intelectual tem a ver com aquilo que pensamos, sabemos ou

    acreditamos saber. Se o homem dispusesse apenas de estruturas racionais, este

    elemento bastaria para determinar as suas atitudes. Assim, o comportamento humano

    seria a expresso exacta e directa do seu modo de pensar. Mas, por exemplo, todos

    sabemos que praticar alguma actividade fsica saudvel, mas nem todos a praticam.

    O elemento emocional de carcter afectivo ou valorativo, constitudo pelos

    sentimentos que nutrimos relativamente aos objectos, pessoas, situaes e ideias.

    O elemento comportamental o resultado dos elementos cognitivos e afectivos e

    trata-se daquilo que tencionamos fazer ou dizer, ou seja, da predisposio para reagir e

    actuar em face das pessoas ou das mais diversas coisas.

    No entanto, nem sempre os nossos comportamentos so consonantes com as

    atitudes. Psiclogos sociais falam de dissonncia cognitiva a propsito da existncia

    simultnea de cognies que no se ajustam entre si.

    As atitudes expressas nem sempre resultam da conjugao harmoniosa dos

    factores intelectuais e afectivos. H casos em que o factor emocional dominante. H

    casos em que os actos influenciam as atitudes e no o contrrio. Para reduzir a tenso

    psicolgica, as pessoas tendem a racionalizar ou distorcer a realidade, adoptando uma

    nova atitude em consonncia com o comportamento.

    1.4. Mudana de atitudes

    A mudana de atitudes depende sobretudo de novas informaes relativas ao

    objecto social. O indivduo possui variadas formas de reagir a estas informaes em

  • 7

    funo das atitudes em causa. Se estiver em causa uma situao, uma pessoa ou um

    objecto que faam parte de uma experincia distante do indivduo, sobre os quais haja

    menor informao, mais fcil se desencadear a mudana de atitude relativamente ao

    mesmo. Por outro lado, uma experincia traumtica pode conduzir formao ou

    mudana de atitude.

    A publicidade assume-se como um meio de extrema importncia para influenciar as

    atitudes e comportamentos, uma vez que atravs dela o indivduo recebe mensagens

    persuasivas com vista formao de atitudes e manifestao de comportamentos

    conforme a mensagem que pretendida transmitir. Para que esta situao se verifique

    imperativo que a mensagem se apresente de forma credvel, com prestgio e poder, com

    aspectos em comum com o receptor e de carcter atraente. Por exemplo, nos anncios

    est bem presente a associao de determinado produto a uma personalidade conhecida

    do pblico; nas campanhas polticas existe o hbito de prometer aplicar medidas que

    podero agradar o pblico; outra forma de persuadir consiste no recurso ao factor medo,

    em que o indivduo se sente motivado se a ameaa apresentada nas campanhas for real,

    alertando-o para certas medidas preventivas.

    1.5. Medida das atitudes

    As atitudes podem ser alvo de medio atravs das escalas de atitudes. Estas

    medem a qualidade, o grau de intensidade e a sua direco. importante definir

    indicadores adequados para medir determinada atitude. A escala mais comum a escala

    de Lickert, a qual se fundamenta na ideia de que a atitude depende das crenas sobre o

    objecto e dos valores relacionados com o mesmo. constituda por um conjunto de

    afirmaes relativas ao objecto da atitude; a cada resposta atribudo um nmero que

    indica a direco da atitude do sujeito relativamente a cada afirmao, sendo ela positiva

    ou negativa, e a pontuao total da atitude de cada sujeito obtida atravs do somatrio

    das pontuaes verificadas em cada afirmao; uma escala confivel, simples de

    construir e permite obter informaes sobre o nvel de sentimentos dos sujeitos, os quais

    se deparam com liberdade para responder de acordo com o grau de concordncia.

    O procedimento desta escala o seguinte: para determinado item so reunidas

    diversas informaes apresentadas ao sujeito e este indica se est completamente de

    acordo, moderadamente de acordo, no concorda nem discorda, moderadamente em

    desacordo ou completamente em desacordo. Para cada sujeito feita uma anlise final

  • 8

    reunindo as respostas numa escala de 5 a 1. Para conhecer a maior pontuao possvel

    basta multiplicar o maior nmero utilizado pelo nmero de respostas; e a menor

    pontuao possvel basta multiplicar o menor nmero utilizado pelo nmero de respostas

    desfavorveis. A pontuao individual pode ser comparada pontuao mxima,

    mostrando a atitude relativa ao problema apresentado.

    2) O lcool

    2.1. O lcool no organismo

    O lcool uma substncia lquida, incolor, obtida a partir da fermentao de

    cereais, razes e frutos (como, por exemplo, cerveja e vinho) ou por destilao, ou adio

    de lcool resultante desse processo (como, por exemplo, aguardente, licor, rum, vodka).

    Cientificamente, o lcool tem o nome qumico de etanol e apresenta a forma qumica de

    CH3 CH2 OH. uma droga comercializada e consumida legalmente. Droga, segundo

    Ganeri (2002:9),

    uma substncia medicinal, orgnica ou inorgnica, que usada sozinha ou como

    ingrediente actua no corpo podendo alterar o estado de esprito, a forma de

    compreender, ver e ouvir as coisas, modificar a maneira de sentir e o comportamento.

    Segundo Peters & McMahon (1996), a dependncia corresponde adaptao do

    organismo a um novo equilbrio hemeosttico atingido quando o consumo se prolonga

    por um perodo de tempo necessrio para tal.

    De facto, inicialmente a bebida alcolica pode conduzir desinibio, euforia,

    segurana ilusria e, possivelmente, comportamentos sexuais mais agressivos ou

    desinibidos. O problema est o facto de que, progressivamente, o lcool poder provocar

    sonolncia, relaxamento, viso turva, diminuio da capacidade de reaco,

    descoordenao ao nvel muscular, diminuio da capacidade de raciocnio e de

    interaco social, alteraes de humor, irritabilidade, entre outros.

    Quando um indivduo ingere uma bebida alcolica, este lquido tem uma aco

    rpida e temporria e a absoro processa-se facilmente atravs das mucosas do tubo

    digestivo e do trato respiratrio. O processo de absoro inicia-se na mucosa oral e

    completa-se pela mucosa do estmago e dos intestinos.

  • 9

    Em jejum, o lcool absorvido essencialmente pelo jejuno e duodeno, mas quando

    consumido juntamente com a comida absorvido em grande parte pelo estmago (mais

    de 70% do lcool). Aps uma hora da ingesto, encontrar-se- na corrente sangunea,

    aumentando a taxa de alcoolemia nos 60 a 90 minutos prximos, seguindo-se um

    decrscimo num perodo de 9 a 24horas (Petrantoni & Kruppel, 1991).

    Como o etanol solvel em gua, distribui-se pelos tecidos e secrees de acordo

    com esse teor hdrico. Uma grande parte do etanol (90%) oxida-se enzimaticamente pelo

    citocromo P4502E1, no fgado, o grande purificador que procede sua decomposio a

    uma mdia de 0,1g/litro por hora. Alm da oxidao, o etanol (2 a 10%) pode associar-se

    a outras molculas atravs de variadas enzimas, entre as quais o cido graxo etil ster

    sintetase, produzindo cido graxo etil ester e a glucoronil transferase, originando o etil

    glucorondio.

    Inicialmente, o lcool etlico sofre a aco da enzima ADH (lcool desidrogenase),

    com interferncia do NAD (nicotinamidoadeninadinucleotdio), dando origem ao

    acetaldedo. Neste vai agir a ALDH2 (acetaldedo desidrogenase), com a colaborao do

    NAD e do NADH2 (nicotinamidoadeninadinucleotdio reduzido), transformando-se em

    cido actico que, entrando na corrente sangunea dar origem ao O2 e CO2 nos tecidos

    perifricos.

    2.2. Eliminao do lcool

    Os rgos essencialmente responsveis pela eliminao do lcool etlico so os

    rins e os pulmes e o ar expirado caracteriza-se por um odor particular conferido pelo

    acetaldedo. Pode ainda encontrar-se no suor, no suco intestinal e no leite. Uma vez que

    a absoro digestiva completa, no h vestgios de lcool nas fezes.

    Apenas uma nfima parte ( volta dos 5%) do lcool ingerido eliminado

    directamente atravs da urina, do suor, da saliva e da respirao. A outra grande parte

    passa repentinamente para a corrente sangunea atravs do estmago e do intestino

    delgado sem que ocorra qualquer transformao qumica (Barrias, Mello, & Breda, 2001).

    A eliminao do lcool do organismo decorre atravs de um processo lento. Seno

    vejamos que, em condies normais, um indivduo que ao meio dia tenha uma taxa de

    alcoolemia no sangue (TAS) de 2,0g/litro s conseguir que o lcool seja eliminado

    totalmente do sangue s oito horas do dia seguinte (Goodwin, 2000).

  • 10

    Da mesma forma que impossvel acelerar o processo de eliminao do lcool do

    sangue, os seus efeitos no so passveis de ser eliminados. No entanto, h factores que

    podem retardar o processo, entre os quais definimos os problemas de funcionamento do

    fgado e a conjugao com a ingesto de outras substncias potenciadoras do efeito

    nocivo do lcool (caf, ch, medicamentos, entre outros).

    2.3. Alcoolemia e taxa de alcoolemia

    Alcoolmia a presena de lcool no sangue e a forma habitual de medir a

    intensidade da concentrao alcolica num organismo numa determinada altura em

    gramas de lcool puro por litro de sangue. Esta medida designa-se por Taxa de

    Alcoolmia no Sangue (TAS), a qual sofre interferncia de vrios factores.

    H um conjunto de factores pessoais que interferem na TAS. Normalmente, uma

    pessoa com ndice de Massa Corporal (IMC) maior apresenta menor TAS se comparada

    com outra pessoa cujo IMC seja inferior, quando ingerida a mesma quantidade de

    lcool na mesma situao e de igual forma.

    Por outro lado, a idade e o sexo so mais duas variveis que condicionam

    expressivamente a TAS, uma vez que se caracterizam por diferenas hormonais e

    enzimticas no processo de metabolizao do lcool. Assim, em geral, a capacidade

    metablica que envolve o lcool ser significativamente superior nos adultos quando

    comparada com crianas e adolescentes. De igual forma, os homens detm maior

    capacidade metablica que as mulheres devido sua maior dotao para a defesa

    enzimtica e ainda pela maior quantidade de gua que o organismo masculino contm.

    O estado de fadiga, determinados estados emocionais, alguns medicamentos, as

    mudanas repentinas de temperatura, ser filho de pais alcolicos ou sofrer de certas

    doenas aumenta a sensibilidade ao lcool.

    Em suma, a mesma pessoa que ingira a mesma quantidade de lcool em situaes

    e condies psicofisiolgicas diferentes pode apresentar TAS diferentes. De igual forma,

    a mesma bebida com a mesma quantidade de lcool ingerida por pessoas diferentes

    pode originar TAS diferentes.

    A TAS igualmente condicionada pelas diferentes formas de absoro que o

    organismo faz do lcool, se ingerido em jejum ou s refeies, num curto espao de

    tempo ou em grandes intervalos temporais. Quando a ingesto feita em jejum, a sua

    absoro acelerada e aumenta o valor da taxa em cerca de 1/3. Por outro lado, o

  • 11

    estmago cheio apenas atrasa o processo de absoro no alterando em nada os seus

    efeitos. A ingesto de forma rpida aumenta a taxa em comparao com a ingesto da

    mesma quantidade da mesma bebida dividida em grandes intervalos de tempo.

    Visto que o processo de metabolizao do lcool substancialmente distinto se

    nocturno ou diurno, tambm o momento do dia em que a bebida ingerida pode alterar a

    TAS.

    A bebida possui caractersticas prprias capazes de provocar diferenas na TAS:

    quantidade, maior ou menor teor alcolico, aquecida ou gaseificada. Com as duas ltimas

    caractersticas a absoro acelera-se.

    2.4. Efeitos do lcool

    O lcool em excesso pode causar acidez no estmago, vmitos, diarreia, sede, dor

    de cabea, desidratao, perda de equilbrio e vertigens e baixa de temperatura corporal.

    Uma vez que bloqueia o funcionamento do sistema nervoso central, o lcool um

    desinibidor e depressor. Aparentemente estimula o organismo, mas na realidade essa

    estimulao fruto da depresso de mecanismos de controlo de inibio do crebro.

    Em primeiro lugar so afectados os centros superiores (o que se repercute na fala,

    pensamento, cognio e juzo) e posteriormente deprimem os centros inferiores

    (afectando a respirao, os reflexos e, em casos de intoxicao aguda, provocando

    coma) (S/autor, 2008).

    Quando o sujeito se sente desinibido, com sensao de segurana em si prprio,

    pode adoptar comportamentos perigosos para a sociedade, como por exemplo, acidentes

    de viao, violncia, desorganizao familiar, alterao de conduta, entre outros; e para

    si prprio no que respeita a doenas.

    Atravs do lcool operam-se interferncias na fluidez das membranas cerebrais,

    tais como o aumento da serotonina e aumenta o efeito sobre a aco de alguns

    receptores dependentes.

    Geralmente, quando a dosagem srica atinge 0,05% provoca perda de ligao

    entre a capacidade de julgar e a de controlar os impulsos. Entre 0,1 e 0,2% j provoca

    depresso nas funes motoras e condiciona a expresso das emoes.

  • 12

    O aparelho gastrointestinal pode ser amplamente afectado em termos de gastrite,

    pancreatite, dificuldade de absoro intestinal de algumas substncias importantes ao

    organismo, cancro da boca, esfago, estmago, intestino e clon.

    As enzimas hepticas podem subir em funo da ingesto alcolica, pois cerca de

    90% deste metabolizado atravs do fgado.

    Em suma, relativamente a um consumo crnico, a nvel fsico, os rgos vitais

    sero prejudicados a longo prazo: degradao e atrofia do crebro, cancro, debilidade do

    sistema imunitrio e do pncreas, anemia, lceras, cirrose heptica, entre outros. Ao

    nvel psicolgico e neurolgico poder verificar-se a insnia, irritabilidade, psicose, mania

    da perseguio, entre outros.

    2.5. O lcool no contexto social

    Os primatas j dominavam o processo de fermentao das frutas. Mais tarde,

    seguindo-se revoluo neoltica, verifica-se nas diferentes culturas um avano

    sistemtico na produo das matrias-primas e tecnolgico no processo de fermentao

    das mesmas.

    O consumo de lcool est presente desde muito cedo na histria da humanidade.

    H registos de trs mil anos antes de Cristo que fazem aluso a este tema; ou peas

    encontradas da mesma altura que indicam que as mulheres em fase de amamentao

    eram induzidas a beber cerveja; na Babilnia, o rei amparava os que bebiam lcool; os

    egpcios adoravam deuses como forma de agradecimento pela ddiva da cevada, pois

    possuam destilarias h muito tempo; os gregos ofereciam bebidas alcolicas a deuses e

    soldados; os romanos reconheciam a Baco, deus do vinho, a graa do vinho divino e

    contriburam em muito para a regulao da produo de vinho e respectiva difuso pela

    Europa.

    Ao nvel religioso existiu desde sempre um papel importantssimo para o vinho: na

    bblia, por exemplo, encontram-se muitas referncias ao lcool, entre outras religies,

    excepo de religies como o Islamismo que probe o seu consumo.

    A partir do sculo XII, foram os cristos mediterrnicos que comandaram o

    desenvolvimento industrial da produo. Depois de esta tcnica estar bem desenvolvida,

    no sculo XIV, que ter sido implantada pelo resto da Europa

  • 13

    Durante a Idade Mdia, esta substncia esteve associada ao bem-estar e sade,

    mais conhecida por vitae. A partir do sculo XVI adoptada a terminologia de lcool, com

    origem na palavra grega alkuhl.

    A bebida alcolica revelou-se um produto extremamente importante na altura das

    colnias, em que era utilizada nas trocas entre colonizadores e colonos e os

    comerciantes recolhiam lucros avultados com o negcio.

    No sculo XX, aquando da revoluo industrial expandiu-se este mercado,

    aumentou o consumo e, consequentemente, os problemas a este relacionados. desta

    situao que decorrem as leis de proibio nos Estados Unidos, nos anos vinte, e as

    campanhas de preveno nos anos sessenta, nos pases mais desenvolvidos.

    Historicamente, a dependncia do lcool comeou por ser considerada um

    pecado, passando mais tarde a ser encarada como uma doena. Posteriormente tem

    sido tentada a abertura para um novo enfoque que interprete esta situao como uma

    inadaptao comportamental (Gonalves, 2008: 15, referindo Thombs, 1994).

    2.5.1. A dependncia do lcool como pecado

    A dependncia encarada como um pecado traduz a negao em aceitar alguns

    cdigos ticos e morais de conduta. O indivduo que dependesse do consumo de lcool

    s o faria porque atravs das suas capacidades de livre arbtrio assim decidira, criando

    sofrimento a si prprio, aos outros e sociedade em geral, pelo que deveria ser

    responsabilizado. De acordo com este pensamento, o alcolatra no devia ser auxiliado

    ou tratado, pelo contrrio, deveria ser punido atravs de sanes legais, por forma a

    corrigir o comportamento e prevenir o futuro. A recada era interpretada como a maior

    prova de que a dependncia um pecado, de forma que se revelava necessrio corrigir o

    deslize.

    Como a dependncia era vista como produto de mau comportamento, o qual

    deveria ser punido e corrigido, era desnecessria a investigao sobre a natureza do

    problemas e respectiva procura de solues.

    A sociedade actual reflecte um declnio moral e os actuais mtodos relativos

    dependncia evidenciam-se inadequados e ineficazes do ponto de vista dos defensores

    do modelo tpico de adio como pecado, pelo que bradam pelo regresso da famlia e

    dos valores tradicionais para minimizar o problema.

  • 14

    2.5.2. A dependncia do lcool como doena

    Do ponto de vista da dependncia do lcool como doena, o consumo excessivo

    estar dependente de uma doena cuja origem no estar ainda inteiramente percebida,

    que levar ao uso compulsivo da substncia alcolica. Alguns adeptos deste

    entendimento defendem que a base deste processo gentica, logo, se no houver

    predisposio gentica a dependncia no evoluir independentemente da quantidade

    ingerida.

    Nesta lgica, o doente no ter qualquer responsabilidade no acto de consumir

    excessivamente, uma vez que perde o controlo sobre si mesmo, causa da dita doena.

    Assim, a lgica desta perspectiva a de que os indivduos precisam de ajuda social,

    cuidados mdicos e tratamentos especializados. Este apoio baseia-se objectivamente em

    controlar as doenas causadas pela dependncia e educar o doente sobre as mesmas e

    respectiva recuperao.

    Na sociedade contempornea esta doena definida distintamente por diferentes

    grupos. H quem veja o campo da medicina com o intuito de chamar utentes para os

    seus servios; no que diz respeito aos agentes ligados directa ou indirectamente ao

    comrcio das bebidas alcolicas, estes defendem a perspectiva de doena identificando

    o problema nos indivduos e no no lcool, para que sociedade e governo imponham

    restries ou entraves indstria desta substncia; por outro lado, o grupo composto

    pelos indivduos em recuperao e respectiva famlia opta por esta perspectiva como

    forma de minimizar o seu grau de culpa e vergonha, como meio de ser mais respeitado

    em detrimento da rotulao de sofrer de problemas morais.

    Nesta perspectiva podemos identificar algumas vantagens: deixa de haver um

    julgamento moral e os indivduos so ajudados, cuidados e tratados, h um enfoque de

    grande dimenso em direccionar os indivduos para o interesse pelo trabalho como forma

    necessria de se manterem livres da dependncia e assim, a sociedade est mais

    preparada e disponvel para desenvolver recursos com vista a auxiliar os doentes do que

    se fossem encarados como detentores de uma fraqueza moral.

  • 15

    2.5.3. A dependncia do lcool como comportamento inadaptado

    O entendimento de que a dependncia do lcool aprendida conduz ideia de que

    esta se justifica por uma desordem comportamental que est claramente sobre o controlo

    do contexto ambiental, familiar, social e composies cognitivas. Assim, nesta

    perspectiva, o indivduo fruto de determinadas condies de aprendizagem disruptiva;

    esta situao de dependncia no resultado de uma opo deliberada livremente e sim

    de um conjunto de contextos envolventes de aco que provocam comportamentos

    destrutivos.

    Nesta abordagem comportamentalista, o tratamento passa por proporcionar ao

    indivduo novos processos de aprendizagem com o objectivo de desenvolver nele

    competncias eficazes na preveno da iniciao ou da recada. O recurso a tratamento

    mdico pode ser feito mas s em ltimo recurso e como medida complementar, pois o

    fundamento da interveno meramente comportamental.

    O aumento da procura desta interveno poder conduzir as cincias do

    comportamento ao investimento na descoberta e implementao de novas metodologias

    de abordagem a este fenmeno.

    2.6. Portugal no contexto europeu do consumo de lcool

    Portugal um dos pases em que o consumo de bebidas alcolicas mais elevado.

    Em 1994, comparando os pases da Unio Europeia em termos de consumo

    semanal de lcool, a Itlia surgia no topo com maior prevalncia do lcool no grupo etrio

    dos 11 aos 15 anos. Portugal assegurava o 4 lugar, mas no ano seguinte passou para 3

    lugar respeitante ao conjunto da populao consumidora, com um consumo de 11 litros, e

    relativo ao consumo mdio de vinho, com 58,4 litros ao ano por pessoa (Arago &

    Sacadura, 2002).

    Em 1997, Portugal passou para a liderana ao nvel europeu e mundial para o

    consumo de lcool com 11,3 litros e para o consumo de vinho com 61 litros. Apesar que,

    em 2000, a Produo Industrial do Comrcio atribuu o terceiro lugar a Portugal,

    antecedido da Romnia e do Luxemburgo.

    Os resultados do Inqurito Nacional de Sade realizado em 1998/99 revelaram que

    em Portugal o consumo era maior no sexo masculino e na faixa etria entre os 35 e os 44

    anos (Dias, Vieira, & Neto, 2003). Comparando com os dados do mesmo estudo

  • 16

    efectuado trs anos antes, houve uma diminuio em todas as regies do pas,

    exceptuando a regio do Alentejo, e nos dois gneros. Houve ainda a reduo de

    bebidas vitcolas e aumento no consumo de cerveja, passando esta bebida a ser a mais

    consumida no nosso pas, com 63,5 litros per capita ao ano (Matias, 2007).

    2.7. Quadro legal portugus no domnio do lcool

    Sendo Portugal um dos pases que apresenta maior nmero de consumidores de

    bebidas alcolicas, este problema conduziu, em 1997, formao da Comisso de

    Combate ao Alcoolismo.

    Quando a Organizao Mundial de Sade (OMS) Europa convidou Portugal a

    integrar o Collaborative Study on Community Response to Alcohol releted problems,

    surgiu a primeira investigao sobre o assunto, a qual conduziu produo de legislao

    sobre o mesmo (Mello, Barrias, & Breda, 2001).

    De acordo com a mesma fonte, o Plano de Aco Contra o Alcoolismo surgiu em

    Portugal como primeira legislao estruturada que abrange o consumo, venda e

    interveno nos problemas ligados ao lcool. Este tem por base a proposta de uma

    comisso interministerial criada pela Resoluo do Conselho de Ministros n40/1999 de

    8/5, a qual adoptou como referncia o 1 Plano Europeu sobre o lcool de 1992/1999 e o

    Plano aprovado posteriormente em Florena, em 1999, pela 49 Assembleia Regional da

    OMS Europa, para o perodo de 2000/2005.

    O Plano de Aco Contra o Alcoolismo foi aprovado pela Resoluo do Conselho

    de Ministros n166/2000 de 29 de Novembro e abrange vrias vertentes de interveno,

    entre as quais a promoo e educao para a sade, a regulamentao e fiscalizao de

    combate ao consumo inconveniente ou em excesso do lcool e a vertente clnica e de

    investigao.

    O Decreto-Lei n 9/2002 de 24 de Janeiro estabelece num dos seus artigos a

    proibio de venda de bebidas alcolicas e colocao disposio em estabelecimentos

    pblicos ou abertos ao pblico, a indivduos menores de 16 anos, a quem se aparente

    embriagado ou portador de alguma anomalia psquica; igualmente proibida a venda ou

    disponibilizao de bebidas alcolicas em mquinas automticas e estabelecimentos de

    sade, em estabelecimentos de ensino e em servios da administrao central e local;

    por outro lado, estas indicaes devem estar expostas em qualquer estabelecimento ou

    local de venda ou acesso das mesmas.

  • 17

    2.8. Critrios de diagnstico da dependncia do lcool

    Existem determinados critrios que auxiliam os profissionais competentes no

    diagnstico da dependncia alcolica, os quais so apresentados de seguida, com

    base em Cruz (2008).

    2.8.1. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, da American

    Psychiatric Association (DSM-IV)

    A dependncia um padro mal adaptativo do uso do lcool provocando um

    prejuzo significativo ou sofrimento, manifestado por trs ou mais dos seguintes critrios,

    ocorrendo a qualquer momento no mesmo perodo de 12 meses:

    Tolerncia definida por qualquer um dos seguintes aspectos:

    1) Necessidade de substncia em quantidades progressivamente maiores;

    2) Acentuada reduo do efeito com a ingesto das mesmas quantidades de

    substncia;

    Abstinncia

    1) Abstinncia substncia;

    2) Uso para aliviar ou impedir sintomas de abstinncia;

    A mesma substncia frequentemente consumida em quantidade ou por um

    perodo maior do que o pretendido;

    Existe um desejo persistente ou esforos mal sucedidos no sentido de reduzir ou

    controlar o uso da substncia;

    Muito tempo despendido em actividades necessrias obteno da substncia;

    Importantes actividades sociais, ocupacionais ou recreativas so abandonadas ou

    reduzidas em funo do uso da substncia;

    O uso da substncia continua apesar da conscincia de ter um problema fsico ou

    psicolgico persistente ou recorrente que tende a ser causado ou exacerbado pela

    substncia.

  • 18

    2.8.2. Classificao Estatstica Internacional de Doenas e Problemas

    Relacionados Sade Dcima Reviso (CID-10)

    O diagnstico indicador de envolvimento alcolico definido com recurso a critrios

    e directrizes diagnsticas de intoxicao aguda, uso nocivo e sndrome de dependncia.

    A intoxicao aguda uma condio transitria em que a ingesto de lcool

    resulta em perturbaes ao nvel de conscincia, cognio, percepo, afecto ou

    comportamento. Estes sintomas diminuem de intensidade com o tempo e cessam se no

    se verificar consumo posterior (Fabbri, 2002).

    O uso nocivo designa-se como sendo um padro de consumo causador de danos

    para a sade.

    A sndrome de dependncia , de acordo com o mesmo autor (Fabbri, 2002), um

    conjunto de fenmenos fisiolgicos, comportamentais e cognitivos, em que o consumo

    do lcool se impe de tal forma importante em detrimento de outros comportamentos que

    antes eram mais relevantes.

    De seguida apresentamos os critrios da CID-10:

    1) Forte desejo ou senso de compulso para consumir a substncia;

    2) Dificuldade em controlar o comportamento de consumir a substncia, em

    termos de incio, trmino e nveis de consumo;

    3) Estado de abstinncia fisiolgico, quando o uso da substncia cessou ou foi

    reduzida, como evidenciado por sndrome de abstinncia caracterstica para

    a substncia, ou o uso da mesma substncia com a inteno de aliviar ou

    evitar sintomas de abstinncia;

    4) Evidncia de tolerncia, de tal forma que doses crescentes da substncia

    psicoactiva so requeridas para alcanar efeitos originalmente produzidos

    por doses mais baixas;

    5) Abandono progressivo de prazeres e interesses alternativos em favor do uso

    da substncia psicoactiva, aumento da quantidade de tempo necessria

    para obter ou ingerir a substncia ou para se recuperar dos efeitos;

    6) Persistncia no uso da substncia, a despeito de evidncia clara de

    consequncias manifestamente nocivas, tais como: dano no fgado, por

    consumo excessivo de bebidas alcolicas, estados de humor depressivos

    consequentes a perodos de consumo excessivo da substncia, ou

    comprometimento do funcionamento cognitivo, relacionado droga. Nesse

  • 19

    caso, deve-se fazer esforo para determinar se o consumidor estava

    realmente consciente da natureza e extenso do dano.

    2.9. O lcool e o consumo precoce

    Os dados do Ministre de L'ducation National de L'Enseignement Supreur et de

    la Recherch (MENESR, 2006) indicam que na Unio Europeia, por volta dos 12 anos j

    70% dos rapazes e 63% das raparigas vivenciaram experincias com o lcool. Os

    respectivos valores sofrem uma evoluo no sentido de atingir os 90% aos 16 anos.

    Em Portugal, num estudo registado no concelho de Matosinhos e referido por

    Arago & Sacadura (2002) conclui-se que, entre 1994 e 1996, a idade mdia de iniciao

    ao consumo ronda os 13,1 anos; por outro lado, entre jovens ao nvel do 3ciclo e

    secundrio 47% j consumira lcool. Dos factores que favorecem o consumo destaca-se

    o grupo de amigos (39,6%) e o seio familiar (25,6%). Entre os jovens no incio do ensino

    secundrio, 79,1% j tinham consumido lcool pelo menos uma vez na vida e o sexo

    masculino assume uma prevalncia mais elevada ao longo da vida (80,2%).

    Os dados do inqurito do European School Surverey Project Alcohol and Drugs

    (ESPAD) obtidos em 1999 e publicados pelo Instituto Portugus da Droga e da

    Toxicodependncia indicam que 3% dos jovens inquiridos confessam ter episdios de

    embriaguez 20 vezes ou mais ao longo da vida enquanto 4% revelam que estes

    episdios se repetiram trs ou mais vezes nos ltimos trinta dias.

    Relativamente idade mdia de iniciao ao consumo de bebidas alcolicas como

    a cerveja, o vinho e bebidas espirituosas, constata-se no mesmo inqurito que se situa na

    faixa dos 13 anos.

    Visto que a formao do crebro humano s acaba por volta dos 21 anos de idade,

    a exposio ao lcool antes desse processo terminado pode conduzir a alteraes

    irreversveis que interfiram no desenvolvimento intelectual e na predisposio a

    desenvolver dependncia (Tapert, Ph.D., Caldwell, & Burke). Esta situao demasiado

    preocupante tendo em considerao todos os dados anteriormente apresentados.

    O ser humano dotado de um mecanismo cerebral designado como sistema de

    recompensa, o qual formado por circuitos neurais que integram estruturas especficas

    do crebro, sendo estas comandadas por neurotransmissores como a dopamina. A

    funo deste sistema o reconhecimento de estmulos prazerosos para o indivduo,

    provocando a sensao de prazer e armazenando essa memria no crebro. O

  • 20

    desenvolvimento deste sistema decorre de forma natural desde o nascimento idade

    adulta e, quando o processo no est acabado, estmulos externos podem condicionar a

    forma como o mesmo ir formar-se. Assim, quando a criana ou adolescente, em fase de

    desenvolvimento do crebro, faz ingesto de lcool, a substncia chega ao sistema

    nervoso central (SNC), actua no sistema de recompensa referido anteriormente e

    provoca alteraes no seu funcionamento, tornando-o mais sensvel a situaes

    prazerosas.

    Quanto mais lcool o jovem consumir, mais alteraes ocorrem na produo de

    neurotransmissores, nas conexes neurais e na sensibilizao do sistema. Chegando

    idade adulta, tendo o crebro sido formado com a necessidade de receber a substncia

    qumica que o lcool, poder precisar mais tarde de estmulos muito maiores, quando

    comparado com outros indivduos, para ser capaz de sentir prazer, o que conduzir

    tristeza, desmotivao e desinteresse.

    Assim sendo, um indivduo que entra em contacto com o lcool apenas na idade

    adulta v o risco de dependncia muito mais reduzido, uma vez que a formao do

    crebro j se efectuou e o sistema de recompensa no est to sensibilizado. Em

    contrapartida, uma criana ou adolescente em contacto com o lcool aumenta

    consideravelmente o risco de desenvolver dependncia da substncia.

    2.10. O lcool e os factores de risco

    A designao de factores de risco refere-se ao conjunto de causas responsveis

    pela iniciao ao consumo do lcool, substncia central deste trabalho entre outras

    possveis, mas tem vindo a ser substituda por outros termos como factores de

    vulnerabilidade, factores de susceptibilidade, predictores ou indicadores de risco.

    Os factores de risco determinam o risco e a proteco, ambos presentes na

    sociedade, escola, famlia e indivduo.

    2.10.1. Factores de risco individuais

    As marcas determinantes da adolescncia, um perodo do desenvolvimento

    humano que comea cronologicamente entre o fim da infncia e o incio da puberdade e

    finda com o comeo da juventude, resumem-se a alteraes fsicas, psicolgicas,

  • 21

    cognitivas, sociais e culturais. Esta fase crucial na construo e formao da

    personalidade, com reflexos na imagem de si mesmo, na credibilidade perante os outros

    e nas experincias vivenciadas. De igual forma se revela um perodo frgil na vida do

    indivduo no sentido em que fica exposto a todos os factores circundantes que

    futuramente iro influenciar positiva ou negativamente todos os seus comportamentos.

    Quanto maiores forem os factores de risco maior a probabilidade do adolescente

    se envolver em problemas comportamentais.

    Em contrapartida, h que considerar os factores de proteco: actividades em

    famlia, religiosas, desportivas ou culturais podem abrir o caminho para que os

    adolescentes se tornem mais resilientes e com maior capacidade para resistir e enfrentar

    as influncias adversas (Reininger, 2003).

    Garmezy concebe a resilincia como a capacidade de recuperar o padro de

    funcionamento aps experienciar uma situao adversa, sem que, no entanto, deixe de

    ser atingido por ela. Esta concepo est associada ideia de que a pessoa resiliente,

    mesmo vivendo uma situao de ameaa ao seu bem-estar, pode perder as foras mas

    recuperar-se de novo (Silva, 2007).

    A dependncia um problema do ser, isto , devemos analisar as causas nas

    necessidades de gerar uma iluso de bem-estar em que se entra nela por aco do

    lcool.

    As pesquisas apontam que indivduos com parentes em primeiro grau portadores

    de alcoolismo esto trs a quatro vezes mais propensas a desenvolver alcoolismo; em

    geral, aqueles que possuam alteraes ligadas ao alcoolismo e com historial familiar com

    as mesmas alteraes tm ndices superiores de consumo alcolico; no caso de gmeos,

    os monozigticos mostram ndice maior de predisposio para o alcoolismo quando

    comparados com os dizigticos; indivduos cujos pais biolgicos no tenham quaisquer

    problemas de alcoolismo e sejam criados por outras pessoas com esses transtornos, no

    apresentam risco aumentado de entrar no alcoolismo; em contrapartida, indivduos cujos

    pais sofram de perturbaes do alcoolismo, mesmo que sejam criados por figuras

    parentais isentas desses problemas, continuam em risco de desenvolver perturbaes

    relacionadas com o lcool.

  • 22

    2.10.2. Factores de risco scio ambientais

    Estes factores referem-se a estruturas de organizao e funcionamento colectivos,

    tais como a famlia, o grupo de pares ou o pequeno e grande grupo de amigos, as

    actividades escolares, os contextos comunitrios na ocupao dos tempos livres, o

    contexto social e econmico, a publicidade, os meios de comunicao, o contexto jurdico

    e normativo (Rodrigues, 2006).

    A famlia um importante suporte na formao do ser, mas na actualidade

    deparamo-nos com uma crise profunda desta instituio insubstituvel, em termos de

    valores e orientao, em que todos se demitem das suas responsabilidades na educao

    e crescimento do ser. Quando um ambiente familiar se caracteriza por discusses

    constantes, dificuldades econmicas, desemprego, divrcio, ausncia de dilogo entre

    pais e filhos, violncia, permissividade ou inflexibilidade, o ser muito facilmente

    conduzido para o consumo do lcool. Por outro lado, se no seio familiar houver a

    capacidade e o discernimento de resolver os conflitos e qualquer problema atravs da

    comunicao, colaborao e respeito, o indivduo em desenvolvimento vai adquirir

    competncias sociais e de gesto das relaes que o munem para que futuramente

    resolva os prprios problemas, baseado nos mesmos pressupostos.

    Logo a seguir famlia, o par ou o grupo servem de modelo para o prprio

    comportamento e desempenham um papel fundamental no desenvolvimento e equilbrio

    emocional e adaptativo. Sendo assim, experincias negativas dentro do grupo como a

    excluso, rejeio, frustrao e desiluso, nesta fase sensvel que a adolescncia pode

    traduzir-se na vulnerabilidade perante perigos como o lcool e na imaturidade de

    enfrentar as adversidades.

    Na cidade, devido sua organizao habitacional dirigida para a massificao, os

    indivduos crescem sem identidade e sem saber ser. um espao propcio a estados

    disruptivos como a solido, falta de laos afectivos, ausncia de personalidade, entre

    outros.

    A sociedade actual abafa a construo do ser antes direccionado para as relaes

    responsveis e com respeito, apresentando uma imperatividade exacerbada de

    competio, individualismo e materialismo, cultivando o isolamento.

    A moda e a publicidade so formas de conduzir o indivduo numa busca incessante

    pela afirmao e imposio aos outros, definindo os estilos de vida, inferiorizando o ser

    atravs da nfase dada ao parecer.

  • 23

    2.11. Abordagens explicativas das causas da iniciao aditiva do lcool

    A Psicologia partilha seis modelos tericos para facultar uma compreenso

    psicopatolgica do processo de iniciao da adio, os quais sero sinteticamente

    abordados de seguida.

    2.11.1. Abordagem cognitivo-comportamental

    Esta teoria tem como base a aprendizagem e o estudo do processamento da

    informao no crebro em que os domnios comportamental, cognitivo e emocional so

    condicionados.

    Pavlov desenvolveu o princpio do condicionamento correspondente, atravs do

    qual um estmulo cria uma resposta, logo um estmulo condicionado induz a uma

    resposta condicionada.

    Skinner produziu o conceito de condicionamento respondente instrumental,

    fundamentado pela ideia de que os comportamentos so reforados pelas respectivas

    consequncias. Neste processo existe o reforo negativo, atravs do qual a repetio do

    comportamento inibida, e com resultado oposto o reforo positivo, que induz repetio

    do acto.

    Bandura elaborou a teoria da aprendizagem social, cuja base a antecipao, ou

    seja, antes da execuo do comportamento h um raciocnio que, de acordo com a

    conscincia do indivduo, permite que a execuo no decorra de forma mecnica. A

    adaptao do indivduo a estmulos efectua-se ou no atravs dos processos de

    conscincia emergentes da sociedade.

    As teorias cognitivas indicam que a relao entre o comportamento e o crebro

    gera determinada informao que tratada e armazenada para ser reutilizada sempre

    que necessrio.

    2.11.2. Abordagem biopsicossocial

    Nesta perspectiva, a adio o reflexo dos problemas do indivduo, tais como o

    desemprego, divrcio, stress, cansao, isolamento, entre outros. Embora o lcool faa

    no lembrar dos problemas acabar tambm por minimizar a auto-estima. Na lgica

  • 24

    desta abordagem, os agentes responsveis pela adio so os erros da sociedade, o

    egosmo e o individualismo.

    Os factores de proteco contra a adio so o desenvolvimento de aces sociais

    favorveis auto-estima, ao autocontrolo, por aco de factores de personalidade,

    cognitivos, sociais e culturais.

    2.11.3. Abordagem psicobiolgica

    Quando as sensaes no so estimuladas, o indivduo vai procurar substncias ou

    comportamentos que sejam capazes de ampliar essa actividade neurobiolgica. Ou seja,

    a estimulao cortical conduz necessidade de sensaes.

    2.11.4. Teoria da inverso psicolgica

    Michael Apter fundou a teoria baseada na ideia de pares de estados psicolgicos

    opostos que determinam a interpretao que o indivduo d sua vida. Por exemplo, se

    um indivduo se encontrar num contexto de estimulao e estiver receptivo procura de

    activao ficar eufrico, por outro lado, se estiver num estado desfavorvel de

    evitamento da activao acabar por se tornar ansioso (Richard & Senon, 2005). A

    adio pode surgir a partir dos estados de activao.

    2.11.5. Modelo de gesto hedonista

    Esta doutrina, desenvolvida por Iain Brown, obedece ao princpio do prazer. Neste

    sentido, a adio um fenmeno ligado a motivaes, expectativas e valores definidos

    pela prpria aprendizagem social cognitiva. Em determinadas circunstncias, a gesto

    entre os estados psicolgicos e os nveis de activao aprendida durante a infncia pode

    originar necessidades secundrias artificiais, a adio.

    A adio inicia-se com a fase da descoberta, podendo seguidamente evoluir e

    prolongar-se atravs de fortes condicionamentos como hbitos, rotinas e distores

    cognitivas. Nesta lgica sempre possvel a recuperao atravs de uma nova

  • 25

    distribuio de actividades. No entanto, devido diminuio do estado de vigilncia,

    haver o risco da recada, sendo necessrio ento um controlo permanente.

    2.11.6. Modelo do sistema de aces

    Neste modelo, proposto por Eric Loonis, as tarefas da vida quotidiana, as aces,

    assumem duas funes distintas: adaptar-se s vivncias reais e adaptar-se a si prprio.

    Neste pressuposto, a adio tem duas faces: adies da vida quotidiana e adies

    patolgicas (Richard & Senon, 2005). Na primeira face temos um conjunto de aces

    equilibrado com pouco investimento, uma diversidade de aces disponveis e enorme

    facilidade de substituio. Na face oposta temos as actividades compulsivas com um

    forte investimento na adio, falta de diversidade de aces e dificuldade na substituio

    das mesmas.

    O sistema de aces dos contextos pessoais, sociais e culturais so herana do

    sistema de aces formado no perodo da infncia.

    A forma frgil como o indivduo possa desenvolver o seu sistema de aces ou a

    sua desorganizao, conduzi-lo- a condies cerebrais que determinam o sofrimento

    intrnseco como os estados depressivos, reduo da auto-estima e aumento da

    necessidade de segurana.

    2.12. Preveno para os efeitos da adio do lcool

    A preveno corresponde a um conjunto de estratgias que se conectam em

    programas com o objectivo de impedir a evoluo de comportamentos considerados pela

    sociedade como perturbadores ou de risco (Gonalves, 2008, fazendo aluso a Richard &

    Senon).

    Na sociedade actual, a preveno j no se confina ao conjunto de variantes a

    evitar, engloba sim o trabalho conjunto de uma equipa multidisciplinar no sentido de

    envolver uma variedade de saberes na procura das melhores solues. A famlia, o

    consumidor, o psiclogo, o professor, o mdico, so todos agentes de extrema

    responsabilidade em direco preveno de comportamentos a evitar e promoo da

    sade estimulando todas as potencialidades biolgicas, psicolgicas e sociais do

    indivduo consumidor.

  • 26

    De acordo com a mesma referncia (Gonalves, 2008), a OMS codificou as

    estratgias de preveno em trs nveis: a preveno primria, secundria e terciria.

    A preveno primria refere-se populao na sua totalidade e estava inicialmente

    pensada como forma de impedir o incio de uma patologia que conduzisse a um

    comportamento de risco, atravs de vacinao e informao. Actualmente engloba o

    problema de forma mais abrangente, promovendo atitudes activas a favor da sade,

    prevenindo a evoluo de um consumo espordico para o consumo exagerado e, de

    forma mais alargada, prevenir as consequncias desse exagero atravs da aplicao de

    polticas de reduo de riscos.

    A preveno secundria pretendia simplesmente impor aos consumidores que se

    abstivessem antes de entrar na dependncia. Hoje em dia, pauta a sua ateno para os

    grupos em risco e tenta operacionalizar objectivos com apoio das equipas de preveno,

    equipas de bairro e grupos de acolhimento, entre outros. Visa ainda o fornecimento de

    informao aos indivduos em risco para que compreendam melhor o seu problema e

    conheam formas de evitar complicaes do mesmo.

    A preveno terciria tem como desgnio a preveno de recadas dos indivduos

    que j estejam socialmente reintegrados, adoptando medidas de apoio social, econmico

    e domicilirio, entre outros. Neste pressuposto recorre-se a um clculo do risco

    envolvendo o grau de exposio, a vulnerabilidade em aspectos genticos e psicolgicos,

    e as propriedades farmacolgicas do produto (quantidade ingerida, durao e modos de

    consumo). Por exemplo, quanto maior o grau de exposio menor vulnerabilidade ser

    necessria para que o risco se mantenha num grau elevado.

    A preveno organizada e baseada nestes trs agentes resulta na diminuio do

    risco, visto que age sobre as propriedades farmacolgicas da substncia, manipula a

    exposio ao produto e actua sobre a vulnerabilidade.

    2.12.1. Modelos de preveno do comportamento aditivo no domnio do

    lcool

    O objectivo deste conjunto de mtodos, tcnicas, agentes e teorias produzir

    impacto na interveno preventiva atravs do fornecimento ao indivduo de competncias

    para a aco, de forma a desenvolver atitudes mais desfavorveis perante a substncia

    aditiva que o lcool. O objectivo especfico ideal a atingir seria a diminuio do

    consumo at eliminao total da dependncia.

  • 27

    2.12.1.1. Modelo proscritivo

    Este modelo dedica-se principalmente preveno do lcool, adoptando

    estratgias de interveno focadas no provimento de informao sobre esta substncia e

    respectivos efeitos nocivos, completando esta educao com uma fundamentao tico-

    moral, pois o consumo do lcool moralmente condenado.

    2.12.1.2. Modelo sociocultural

    O foco deste modelo a aco do lcool. A fonte do problema deixa de se centrar

    no indivduo e passa para a sociedade, ou seja, o problema do lcool no mais do que

    o impacto negativo de aspectos sociais e culturais especficos.

    Seguindo este pressuposto, necessrio estipular a distino entre bebida

    socialmente aceitvel e socialmente inaceitvel, a partir da qual se parte para a

    estruturao social de normas que ditam conceitos como bebida excessiva e moderada,

    procedida da adopo de comportamentos de responsabilidade relativos bebida e

    alteraes atitudinais perante o lcool.

    2.12.1.3. Modelo de comportamento interpessoal (MCI)

    Este modelo preconiza fortemente o impacto das vrias influncias sociais e

    ambientais na iniciao ao consumo de lcool, tais como a presso do grupo de pares,

    amigos e a vulnerabilidade do indivduo a essa presso. Assim, a preveno assenta na

    combinao de abordagens focadas no desenvolvimento de competncias sociais

    especficas e gerais, orientadas para a aprendizagem de competncias de funcionamento

    interpessoal adequadas, recorrendo a tcnicas que combatam e alterem os

    comportamentos inadequados. Neste sentido, se as competncias podem ser aprendidas

    podem igualmente ser ensinadas aos indivduos que no as possuam (Stacy et al., 2005).

    De acordo com este modelo, h um conjunto de variantes a contemplar na

    interveno para a preveno: facultar informao sobre o lcool, preconizar aces que

    impliquem tomadas de deciso, tcnicas para reduzir a ansiedade, treinar as

    competncias sociais, reforar a auto-imagem e apresentar tcnicas de resistncia

    presso social para consumir lcool.

  • 28

    2.12.1.4. Modelo scio afectivo

    As influncias socioculturais, os processos interpessoais e as caractersticas

    individuais so factores que este modelo considera capazes de contribuir para a

    ocorrncia de qualquer predisposio scia afectiva para recorrer ao lcool.

    Dependendo da origem positiva ou negativa desta predisposio, revelar-se- um

    conjunto de atitudes e comportamentos mais ou menos favorvel ao lcool.

    2.12.1.5. Modelo de inoculao

    As estratgias preventivas deste modelo baseiam-se nas dimenses psicolgica,

    social e cognitiva, em que objectiva por assegurar condies de tornar as atitudes mais

    resistentes a exposies apelativas, potenciar os indivduos com maior resistncia a

    influncias sociais e munir cada indivduo de capacidades, conhecimentos e atitudes

    crticas para que se torne capaz de contrariar as invocaes psicolgicas e sociais para o

    consumo do lcool.

    2.12.1.6. Modelo humanista: educao e valores

    A abordagem humanista de preveno estrutura-se em trs dimenses distintas

    mas interligadas: transmisso de informao, postulando a compreenso profunda do

    lcool e respectivo consumo, sem esquecer uma avaliao das consequncias para si

    mesmo e para a sociedade; aquisio de competncias de tomada de deciso, tomando

    conscincia das diferentes fases inerentes tomada de deciso e permitindo que a

    informao oriente o indivduo na sua deciso; clarificao de valores, direccionando

    consciencializao da importncia dos mesmo, da sua organizao, da diferena de

    valores defendidos pelos outros e compreenso de que entre valores e comportamento

    existe uma discrepncia.

    2.12.1.7. Modelo biopsicossocial

    Este modelo defende que entre o lcool e a dependncia do mesmo existe um

    vasto conjunto de influncias biolgicas, variveis inerentes ao desenvolvimento

  • 29

    psicolgico do indivduo, determinantes interpessoais, variveis comunitrias e factores

    sociais.

    A abordagem a este fenmeno , de acordo com este ideal, fortemente estruturada

    e complexa porque envolve uma multidisciplinaridade de cincias e conhecimentos e

    interage com sistemas de sade, educao, trabalho, segurana e sociais. Esta

    interactividade imperativa no trabalho dirigido para o desenvolvimento psicolgico,

    ambiente interpessoal e interaco social, no esquecendo a relevncia das restantes

    influncias.

    2.12.1.8. Modelo das alternativas ao consumo de lcool

    Se forem apresentadas alternativas ao consumo do lcool, o mais provvel que o

    indivduo no v recorrer a esta substncia excessivamente.

    Sakara e Sussman (2003: 462) indicam que esta abordagem preventiva pressupe

    que o consumo de lcool satisfaz determinadas necessidades sociais ou psicolgicas e

    de vivenciar novos estados de conscincia; constitui um meio do indivduo se sentir

    melhor; apesar da sensao de sentir-se melhor o lcool provoca efeitos fisiolgicos,

    psicolgicos e cognitivos nocivos; o indivduo s abandonar o consumo de lcool se

    encontrar algo melhor; ao envolver o indivduo em actividades alternativas (actividades

    desportivas, culturais, polticas, sociais, religiosas, de distraco e lazer, de aventuras e

    camaradagem) este satisfar as suas necessidades e diminuir a tendncia para recorrer

    ao lcool.

    2.12.1.9. Modelo da comunicao-persuaso (MCP)

    Este modelo tenta analisar de que forma as componentes da comunicao (varivel

    independente) influenciam o comportamento (varivel dependente). Neste sentido, a

    mensagem ser eficaz e conduzir mudana de atitude de acordo com a forma como

    apresentada ao indivduo ou grupo. Depois da apresentao da mensagem, o indivduo

    precisa prestar ateno ao contedo e compreend-lo. No entanto, para que se verifique

    uma mudana de atitude sero necessrias mais trs etapas, entre elas, a adeso ao

    contedo, a reteno do mesmo e o novo comportamento concretizado.

  • 30

    2.13. O papel do professor no contexto do lcool

    Na sociedade actual, os professores so encarados como profissionais

    empenhados na defesa do profissionalismo docente. Este passa a ser a mgica com a

    qual se resolver todos os problemas sociais (famlia, valores, conflitos e adio). Para

    que tal suceda os professores necessitam de novos direitos e oportunidades de deciso

    sobre o que mais conveniente para os alunos como actores na construo do palco que

    a sociedade (Sousa, 2000; Correia & Matos, 2001).

    Os programas educativos a colocar em prtica pelos professores tm como suporte

    normativo e operativo as orientaes curriculares e os manuais escolares. Os suportes

    legais e materiais devem facilitar o desenvolvimento de todos os actos educativos,

    incluindo o consumo de lcool. Estes instrumentos de aco devero permitir que o

    professor se sinta realizado e conquiste o patamar do bom professor, eficaz e

    profissional.

    O professor actual necessita ser dotado de um conjunto de conhecimento