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QUINTA CÂMARA CÍVEL Apelação Cível nº 0147927-60.2003.8.19.0001 RELATOR: DES. HENRIQUE CARLOS DE ANDRADE FIGUEIRA ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. COMPETÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. FUNCIONÁRIO COMISSIONADO. LESÃO POR ESFORÇO REPETITIVO. Ação indenizatória dos danos sofridos por ocupante de cargo em comissão devido a lesão por esforço repetitivo adquirida em razão das péssimas condições de trabalho. A inexistência de relação de emprego entre as partes tendo em vista a natureza jurídico-administrativa do vínculo entre as partes afasta a competência da Justiça do Trabalho. Orientação jurisprudencial do Supremo Tribunal de Justiça. Rejeita-se a preliminar de cerceamento do direito de defesa porque desnecessária a prova pericial médica para demonstrar lesão de esforço repetitivo considerando que a Autora adoeceu com apenas dois meses de atividade tempo insuficiente para se instalar a moléstia cuja característica está na repetitividade. Muito embora a atividade jornalística pressuponha o uso de mídia digital, carecem os autos de prova (e a perícia médica não demonstraria) quanto à utilização desmedida do teclado do computador no exercício das funções desempenhadas pela Autora a configurar o excesso de trabalho e as más condições alegadas. Se o comportamento do Réu não consubstancia ato ilícito, impossível responsabilizá-lo pelos danos que a Autora sofreu. Recurso desprovido. A C Ó R D Ã O

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  • QUINTA CMARA CVEL

    Apelao Cvel n 0147927-60.2003.8.19.0001

    RELATOR: DES. HENRIQUE CARLOS DE ANDRADE FIGUEIRA

    ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL.

    COMPETNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO

    ESTADO. FUNCIONRIO COMISSIONADO. LESO

    POR ESFORO REPETITIVO.

    Ao indenizatria dos danos sofridos por ocupante de cargo

    em comisso devido a leso por esforo repetitivo adquirida

    em razo das pssimas condies de trabalho.

    A inexistncia de relao de emprego entre as partes tendo

    em vista a natureza jurdico-administrativa do vnculo entre

    as partes afasta a competncia da Justia do Trabalho.

    Orientao jurisprudencial do Supremo Tribunal de Justia.

    Rejeita-se a preliminar de cerceamento do direito de defesa

    porque desnecessria a prova pericial mdica para

    demonstrar leso de esforo repetitivo considerando que a

    Autora adoeceu com apenas dois meses de atividade tempo

    insuficiente para se instalar a molstia cuja caracterstica est

    na repetitividade.

    Muito embora a atividade jornalstica pressuponha o uso de

    mdia digital, carecem os autos de prova (e a percia mdica

    no demonstraria) quanto utilizao desmedida do teclado

    do computador no exerccio das funes desempenhadas pela

    Autora a configurar o excesso de trabalho e as ms condies

    alegadas.

    Se o comportamento do Ru no consubstancia ato ilcito,

    impossvel responsabiliz-lo pelos danos que a Autora

    sofreu.

    Recurso desprovido.

    A C R D O

  • Vistos, relatados e discutidos estes autos da Apelao Cvel n 0147927-

    60.2003.8.19.0001, originrios da 7 Vara de Fazenda Pblica da Comarca da

    Capital, em que figuram como Apelante SNIA MARIA MOREIRA e

    Apelado ESTADO DO RIO DE JANEIRO,

    A C O R D A M os Desembargadores da Quinta Cmara Cvel do

    Tribunal de Justia do Estado do Rio de Janeiro, por unanimidade de votos, em

    negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator.

    SONIA MARIA MOREIRA move ao indenizatria contra ESTADO DO

    RIO DE JANEIRO porque em maio de 2002 foi contratada pela Assembleia

    Legislativa do Estado do Rio de Janeiro para ocupar cargo em comisso no

    Departamento de Comunicao Social, e trs meses depois, em julho de 2002,

    comeou a sentir fortes dores no brao advindas da leso por esforo repetitivo.

    Cumpriu regularmente suas tarefas at junho de 2003, quando a doena se

    agravou e precisou entrar de licena mdica, sendo exonerada em 17.7.03. O

    comportamento descuidado do Ru com a preveno sade da Autora causou

    danos materiais e morais, cuja reparao postula.

    Na contestao (pasta 71) o Ru suscita preliminares de impossibilidade

    jurdica do pedido, ilegitimidade ativa e inpcia da inicial. Aos ocupantes de

    cargo em comisso aplica-se o regime geral da previdncia social, certo que o

    pedido de pagamento de benefcio por invalidez permanente deve ser deduzido

    contra o INSS a implicar no deslocamento da competncia para Justia Federal.

    Afirma a falta de prova do dano e do nexo de causalidade.

    A sentena de fls. 166/167 (pasta 192) julgou improcedente o pedido.

    Apelao da Autora (pasta 192) pela anulao da sentena e declnio da

    competncia em favor da Justia Trabalhista. Suscita preliminar de cerceamento

    de defesa porque proferida a sentena antes de concluda a prova pericial mdica.

    Pede sejam acolhidas as preliminares e no mrito a reforma da sentena a fim de

    julgar procedente o pedido.

    Contrarrazes a fls. 194/198 (pasta 222) pela confirmao da sentena.

    O Ministrio Pblico se manifestou nos autos.

  • o relatrio.

    Rejeita-se a preliminar de incompetncia absoluta suscitada pela Apelante,

    pois nos termos do artigo 114, VI, da Constituio Federal a competncia da

    Justia do Trabalho para decidir lide de pretenso indenizatria deriva de relao

    de trabalho, inexistente na hiptese dos autos.

    Isto porque a Apelante no era servidora do Apelado, pois ocupava cargo

    em comisso na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, e relao a

    jurdico-administrativa estabelecida entre as partes no possui natureza trabalhista

    nem justifica o deslocamento da competncia para a Justia Trabalhista.

    Nesse sentido se firmou a jurisprudncia do E. Supremo Tribunal Federal

    como se observa no julgamento da Rcl n 5954/PA, Relator o Ministro DIAS

    TOFFOLI:

    RECLAMAO - ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL

    CIVIL - DISSDIO ENTRE SERVIDORES E O PODER

    PBLICO - ADI N 3.395-MC/DF - CABIMENTO DA

    RECLAMAO - INCOMPETNCIA DA JUSTIA DO

    TRABALHO. 1. A reclamao meio hbil para conservar a

    autoridade do Supremo Tribunal Federal e a eficcia de suas

    decises. No se reveste de carter primrio ou se transforma

    em sucedneo recursal quando utilizada para confrontar

    decises de juzos e tribunais que afrontam o contedo do

    acrdo do STF na ADI n 3.395-MC/DF. 2. Compete Justia

    comum pronunciar-se sobre a existncia, a validade e a eficcia

    das relaes entre servidores e o poder pblico fundadas em

    vnculo jurdico-administrativo. irrelevante a argumentao

    de que o contrato temporrio ou precrio, ainda que haja sido

    extrapolado seu prazo inicial, bem assim se o liame decorre de

    ocupao de cargo comissionado ou funo gratificada. 3. No

    descaracteriza a competncia da Justia comum, em tais

    dissdios, o fato de se requerer verbas rescisrias, FGTS e

    outros encargos de natureza smile, dada a prevalncia da

    questo de fundo, que diz respeito prpria natureza da relao

    jurdico-administrativa, posto que desvirtuada ou submetida a

    vcios de origem, como fraude, simulao ou ausncia de

  • concurso pblico. Nesse ltimo caso, ultrapassa o limite da

    competncia do STF a investigao sobre o contedo dessa

    causa de pedir especfica. 4. Parte das aes trabalhistas,

    vinculadas reclamao, j transitaram em julgado, o que

    implica o no conhecimento do incidente quanto a esses feitos.

    5. Reclamao conhecida parcialmente e, nessa parte, julgada

    procedente.

    A inexistncia de causa afeta ao vnculo trabalhista exclui este feito da

    rbita do artigo 114, VI, da Constituio Federal e autoriza o julgamento na

    Justia Estadual.

    Rejeita-se o alegado cerceamento do direito de defesa. Apesar de deferida e

    no concluda, a prova pericial mdica se mostra desnecessria, como bem

    esclareceu a sentena.

    Se a Apelante ingressou nos quadros da Assembleia Legislativa do Estado

    do Rio de Janeiro em maio de 2002 de todo impossvel que em dois meses de

    atividade laborativa tenha desenvolvido leso no membro superior esquerdo por

    esforo repetitivo, cuja natureza pressupe a prtica de reiterados movimentos do

    mesmo grupamento esqueltico-muscular durante longo perodo. No transcorreu

    tempo razovel para a Apelante adquirir a molstia.

    Muito embora a atividade jornalstica pressuponha o uso de mdia digital,

    carecem os autos de prova (e a percia mdica jamais serviria para comprovar)

    quanto utilizao desmedida do teclado do computador no exerccio das funes

    desempenhadas pela Apelante a configurar o excesso de trabalho e as ms

    condies alegadas pela funcionria.

    O documento de fls. 29 (pastas 38) registra que o Departamento de

    Comunicao Social da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro

    contava com vrios funcionrios, ao contrrio do que sustenta a Apelante. E ficar

    seis horas em p na posse de novos Deputados ou sofrer gastrite medicamentosa

    como afirma na inicial so fatos desinfluentes para o desenvolvimento da leso na

    articulao do brao.

    O grau de responsabilidade inerente s funes de coordenao e chefia

    impe ao funcionrio que as exerce dedicao diferenciada em relao atividade

    desempenhada pelos seus subordinados, motivo por que o alegado excesso de

    labor no convence como tese a comprovar as pssimas condies de trabalho ou

    o tratamento desrespeito alegados pela Apelante.

  • Para caracterizar o dever de indenizar indispensvel a prtica de ato

    ilcito pelo Ru, e na hiptese dos autos o Apelado em nada contribuiu para a

    leso por esforo repetitivo que sofre a Apelante dada a impossibilidade de se

    instalar em curto espao de tempo. A inexistncia do nexo causal desautoriza o

    acolhimento da pretenso.

    Nestes termos, nega-se provimento ao recurso.

    Rio de Janeiro, 4 de fevereiro de 2014.

    Desembargador Henrique Carlos de Andrade Figueira

    Relator

    2014-02-04T14:20:05-0200GAB. DES HENRIQUE CARLOS DE ANDRADE FIGUEIRA