Terra à vista! O litoral brasileiro na mira dos empreendimentos ...

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  • UNIVERSIDADE DE SO PAULO

    FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO

    CRISTINA PEREIRA DE ARAUJO

    Terra vista!

    O litoral brasileiro na mira dos empreendimentos tursticos imobilirios

    So Paulo

    2011

  • CRISTINA PEREIRA DE ARAUJO

    Terra vista!

    O litoral brasileiro na mira dos empreendimentos tursticos imobilirios

    Tese apresentada Faculdade de Arquitetura e

    Urbanismo da Universidade de So Paulo para

    obteno do ttulo de doutor.

    rea de concentrao: Planejamento Urbano e

    Regional.

    Orientadora: Prof. Dr. Heliana Comin Vargas

    So Paulo

    2011

  • AUTORIZO A REPRODUO E DIVULGAO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO,

    POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRNICO, PARA FINS DE ESTUDO E

    PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.

    E-MAIL: [email protected]

    Araujo, Cristina Pereira de A 663t Terra vista! O litoral brasileiro na mira dos empreendimentos

    tursticos imobilirios / Cristina Pereira de Araujo. --So Paulo,

    2011. 368 p. : il.

    Tese (Doutorado - rea de Concentrao: Planejamento

    Urbano e Regional) FAUUSP. Orientadora: Heliana Comin Vargas

    1.Turismo 2.Litoral 3.Hotelaria 4.Investimentos estrangeiros

    5.Investimentos nacionais I.Ttulo

    CDU 338.48

  • Dedico esta tese ao meu irmo Andr,

    responsvel por me fazer enxergar na

    Educao, o nico caminho possvel para

    uma transformao efetiva da sociedade.

  • AGRADECIMENTOS

    Ao longo destes quatro anos de trabalho muitas pessoas me foram caras e com elas

    tive a oportunidade de aprender e compartilhar os caminhos do conhecimento, as

    ansiedades e as descobertas.

    A comear pela Prof. Dr. Heliana Comin Vargas, mais que uma orientadora, uma

    me acadmica que durante toda a pesquisa soube ter o pulso necessrio para

    cobrar o andamento do trabalho, evitando que se dispersasse no mergulho

    prazeroso da leitura e descoberta de novos olhares, mas que tambm soube dar

    alento nos momentos de aflio, durante a busca pelo melhor percurso metodolgico

    que atendesse aos nossos anseios. A Heliana devo a confiana por acreditar neste

    trabalho e encoraj-lo, desde a poca do mestrado, ocasio em que a conheci por

    conta das bancas de qualificao e defesa. Meu muito obrigado pelo carinho,

    profissionalismo e incentivo.

    Aos professores Joo Sette Whitaker Ferreira e Eliane Monetti, meus sinceros

    agradecimentos pelas contribuies valiosas fornecidas durante o exame de

    qualificao, desde referncias bibliogrficas complementares at contatos de

    pessoas inseridas no meio que poderiam ser teis ao andamento do trabalho.

    Uma dessas pessoas a quem agradeo foi o consultor de empreendimentos

    imobilirios e hoteleiros Caio Srgio Calfat, que prontamente me recebeu em seu

    escritrio e me revelou meandros que certamente eu no percorreria sem o seu

    auxlio.

  • Rita de Cssia Ariza da Cruz, Csaba Dak, Sueli Ramos Schiffer, Ermnia Maricato

    (ainda na poca do mestrado) e Roberto Mnaco (na graduao) foram professores

    de extrema relevncia para a sedimentao desta tese e para meu prprio

    amadurecimento profissional e acadmico. Em suas respectivas disciplinas pude

    descobrir um pouco mais sobre o Pas em que vivemos, suas amarras e seus

    avanos. Ao lado da professora Rita, descobri o turismo a partir do vis crtico da

    Geografia, compreendendo-o sob o olhar de Milton Santos e de tantos outros

    estudiosos, apresentados e facilitados pela interpretao atenta e segura da

    Professora.

    A Manoela Rufinoni, amiga de profisso e de vida, agradeo pelo apoio e incentivo

    de sempre, alm da minuciosa reviso final deste trabalho. Aos amigos da SVMA e

    aos amigos do curso de Tecnologia em Gesto Ambiental agradeo pelo apoio e

    troca de conhecimentos; em especial, registro minha gratido ao aluno Anwar pelas

    contribuies bibliogrficas e informacionais tambm.

    Srgio, meu marido, companheiro e gegrafo, tem sido o responsvel por me fazer

    aliar a Arquitetura Geografia. A ele, alm da pacincia, compreenso e troca de

    conhecimentos, devo a confeco de todos os mapas presentes nesta tese, sem os

    quais, certamente, o trabalho estaria incompleto. Srgio e Chico, sem dvida,

    foram os meus companheiros de todas as horas: a eles agradeo pelo amor e afeto

    que me alimentou (e alimenta) e me faz seguir em frente. Por fim, agradeo aos

    meus pais, Francisco e Ivenite, e aos meus irmos, Andr e Fernanda, cujo apoio

    incondicional, exemplo e confiana construdos durante longos anos de convivncia

    me conduziram ao caminho que sigo hoje.

  • RESUMO

    Esta pesquisa tem como objetivo discutir o processo de produo do espao

    litorneo a partir da espacializao e regionalizao dos meios de hospedagem,

    procurando identificar as diferentes tipologias presentes, bem como a sua incidncia

    ao longo dos 275 municpios litorneos, do Amap ao Rio Grande do Sul. So

    estudadas e inventariadas as segundas residncias, as redes hoteleiras nacionais e

    internacionais, os resorts e os empreendimentos tursticos imobilirios, frutos da

    associao entre segundas residncias e resorts. A inteno, alm de verificar a

    espacializao de tais empreendimentos, compreender a participao do capital

    internacional neste processo de produo. Para tanto, parte-se da premissa da

    existncia de circuitos de transferncia de capital para o ambiente construdo e da

    associao de agentes imobilirios locais com o capital estrangeiro que, avalizados

    por polticas pblicas e incentivos fiscais, tm contribudo fortemente para a

    concretizao de investimentos tursticos relacionados hospedagem espalhados

    ao longo da costa. A liberalizao e desregulamentao financeira dos anos 90,

    associadas ao forte papel interventor do Estado expresso, sobretudo, a partir da

    implantao da primeira Poltica Nacional de Turismo, na mesma dcada, perfazem

    o cenrio que ora se apresenta, propiciando uma intensa ocupao do litoral

    brasileiro, uma significativa presena do capital nacional e uma diferenciao de

    incidncia tipolgica dos meios de hospedagem entre as regies brasileiras.

    Palavras-chave: turismo, litoral, hotelaria, investimentos estrangeiros, investimentos

    nacionais.

  • ABSTRACT

    This research aims to discuss the process of coastline geographical distribution and

    regionalization of lodging facilities through the identification of different typologies

    and their incidence along the 275 coastal towns from Amapa to Rio Grande do Sul.

    The focus is on national and international hotel chains, resorts and real estate

    ventures, which is an association between second homes and resorts. The main idea

    is to understand the role of international capital in the production process as well as

    to verify the places where these enterprises are located. Therefore, it is supposed

    that are transfer circuits of capital to built space and it there is an association

    between local real estate agents and the foreign capital helped by public policies and

    taxes incentives that strongly help the concretion of tourist investments in hotels all

    along the coastlines. The financial liberalization and deregulation in the 90s as well

    as the strong intervention of Brazilian State specially after the edition of the first

    Tourism National Policy in the same decade, is the scenario presented here,

    providing an intense occupation of the Brazilian coast, a significant presence of the

    national capital and a focus typological differentiation of types of accommodation

    between the regions.

    Key-words: tourism, coastline, hotels, foreign investments, national investments.

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura Pgina

    Figura 1 Polo Turstico Costa dos Corais - AL 107

    Figura 2 Polo Turstico do Descobrimento - BA 108

    Figura 3 Polo Turstico Chapada Diamantina - BA 108

    Figura 4 Polo Turstico Litoral Sul - BA 109

    Figura 5 Polo Turstico Salvador e Entorno - BA 109

    Figura 6 Polo Costa do Sol - CE 110

    Figura 7 Polo Capixaba do Verde e das guas - ES 110

    Figura 8 Polo So Lus e Entorno - MA 111

    Figura 9 Polo Costa das Piscinas - PB 111

    Figura 10 Polo Costa dos Arrecifes - PE 112

    Figura 11 Polo Costa do Delta - PI 112

    Figura 12 Polo Costa das Dunas - RN 113

    Figura 13 Polo Costa dos Coqueirais - SE 113

    Figura 14 - Destinos indutores do desenvolvimento turstico regional 115

    Figuras 15: Detalhe da fachada do Aimber Eco Resort 227

    Figuras 16: Vista panormica, com detalhe sua locao literalmente beira-mar, em terrenos provavelmente pertencentes Unio. 227

    Figura 17: Vista area do Complexo Beach Park, inaugurado em 1996, foi o precursor dos empreendimentos tursticos imobilirios no litoral de Aquiraz. 230

    Figura 18: Vista area do local onde est o Complexo Aquiraz Rivieira. 231

    Figura 19: Detalhe do master plan do empreendimento. 231

    Figura 20: Detalhe da pgina eletrnica da rede de hotis Dom Pedro Laguna. 232

    Figura 21: Provvel rea adquirida pela BHG, em Jericoacoara. 233

    Figura 22: Orla da Praia de Jericoacoara, com presena discreta de pousadas. 234

    Figura 23: Orla deserta em direo a oeste. 234

    Figura 24: Detalhe da localizao do resort Serhs Natal 238

    Figura 25: ETI Reserva do Paiva 243

    Figura 26: Comercializao do empreendimento Tivoli Ecoresidences Praia do Forte 252

    Figura 27: Comercializao do empreendimento Tivoli Ecoresidences Praia do Forte 252

    Figura 28: Mapa ilustrativo referente implantao e localizao dos equipamentos no Complexo Costa do Saupe. 254

    Figura 29: Vista area do ETI Terra Vista 255

    Figura 30: Detalhe da pgina de comercializao das residncias e terrenos no ETI Portobello Resort & Safari. 259

    Figura 31: Detalhe da pgina de comercializao do Breezes Bzios. 260

    Figura 32: Vista panormica do ETI Jurer Internacional, na praia de Jurer Florianpolis SC. 266

    Figura 33: Vista panormica do ETI Costo do Santinho, na praia do Santinho - Florianpolis. 267

  • LISTA DE GRFICOS

    Grfico Pgina

    Grfico 1: Volume Global de Investimentos Estrangeiros Diretos, em bilhes de dlares, que circularam no mundo entre os anos de 1982 a 2009. 34

    Grfico 2: Investimentos Estrangeiros Diretos, em bilhes de dlares, nos anos de 2008 e 2009, nas vinte maiores economias do mundo. 35

    Grfico 3: Desembarque de turistas internacionais no mundo 1950 2009 38

    Grfico 4: Percentuais de chegadas por regio, em relao movimentao do turismo receptivo internacional em 1990. 41

    Grfico 5: Percentuais de chegadas por regio, em relao movimentao do turismo receptivo internacional em 1995. 41

    Grfico 6: Percentuais de chegadas por regio, em relao movimentao do turismo receptivo internacional em 2000. 41

    Grfico 7: Percentuais de chegadas por regio, em relao movimentao do turismo receptivo internacional em 2005. 42

    Grfico 8: Percentuais de chegadas por regio, em relao movimentao do turismo receptivo internacional em 2006. 42

    Grfico 9: Percentuais de chegadas por regio, em relao movimentao do turismo receptivo internacional em 2007. 42

    Grfico 10: Percentuais de chegadas por regio, em relao movimentao do turismo receptivo internacional em 2008. 43

    Grfico 11: Ranking dos pases que mais recebem turista no mundo, em milhes de chegadas, para o ano de 2008. 44

    Grfico 12: Participao da economia do turismo no PIB mundial 47

    Grfico 13: Empregos gerados pela economia do turismo. 47

    Grfico 14: Volume total de ingresso de Investimentos Estrangeiros Diretos no Brasil, aplicados de 1950 at 2010. 77

    Grfico 15: Ranking dos dez pases que mais investiram em IED no Brasil para os anos de 2007 a 2009. 78 Grfico 16: Distribuio do IED por atividade econmica no Brasil para os anos de 2007 a 2009. 79

    Grfico 17: Ranking do volume de IED alocado no setor de servios para o ano de 2009. 81

    Grfico 18: Evoluo anual do nmero de transaes desde o incio do plano Real. O ano de 2010 est contabilizado at o terceiro trimestre. 82

    Grfico 19: Transaes envolvendo hotis e restaurantes desde o incio do Plano Real. 84

    Grfico 20: Transaes envolvendo hotis e restaurantes, a partir de 2004, fragmentadas por tipo de transao: domstica (D) ou cross border (CB) em suas classificaes. 85

    Grfico 21: Chegadas de turistas ao Brasil, segundo Continentes 2008 2009. 128

    Grfico 22: Ranking dos pases que mais enviam turistas ao Brasil, segundo pases de residncia permanente 2008 2009. 128

    Grfico 23: Chegadas de turistas ao Brasil, por vias de acesso, segundo Unidades da Federao em 2009, considerando os dez primeiros melhores posicionados. 130

    Grfico 24: Receita cambial turstica do Brasil e dos principais pases receptores de turistas, em bilhes de US$. 131

    Grfico 25: Conta turismo do Brasil 1999 2009. 133

    Grfico 26: Evoluo do PIB brasileiro e mundial (%) 2002 a 2009. 134

    Grfico 27: Viagens domsticas realizadas, em milhes de viagens. Os anos de 2008 e 2009 possuem dados estimados. 135

    Grfico 28: Principal tipo de hospedagem utilizado na viagem domstica. 136

  • Grfico 29: Meio de transporte utilizado na viagem domstica 136

    Grfico 30: Desembarques nacionais em milhes. 137

    Grfico 31: Relao Emissivo/Receptivo, por regio. 138

    Grfico 32: Relao Emissivo/Receptivo, por Unidade de Federao. 139

    Grfico 33: Evoluo da ocupao formal nas ACTs (em milhes). 143

    Grfico 34: Evoluo das ocupaes formais e informais nas ACTs em contraponto s metas estipuladas pelos PNTs 2003-2007 e 2007 2010, (em milhares). 144

    Grfico 35: Ocupaes criadas (empregos formais e informais) no setor de turismo aferidos pela metodologia do IPEA (em milhares). 145

    Grfico 36: Distribuio percentual do nmero de postos de trabalho das ACTs por atividade em 2007. 146

    Grfico 37: Remunerao mdia anual, em R$, paga pelas ACTs, por atividade, em 2007. 146

    Grfico 38: Meios de hospedagem cadastrados no Ministrio do Turismo, segundo as grandes regies. 156

    Grfico 39: Distribuio dos meios de hospedagem cadastrados em 2009, por estado na regio Norte. 158

    Grfico 40: Distribuio dos meios de hospedagem cadastrados em 2009, por estado na regio Centro Oeste. 158

    Grfico 41: Distribuio dos meios de hospedagem cadastrados em 2009, por estado na regio Sudeste. 158 Grfico 42: Distribuio dos meios de hospedagem cadastrados em 2009, por estado na regio Sul. 158

    Grfico 43: Distribuio dos meios de hospedagem cadastrados em 2009, por estado na regio Nordeste. 159

    Grfico 44: Nmero de marcas hoteleiras brasileiras e estrangeiras. 182

    Grfico 45: Nmero de operadoras brasileiras e estrangeiras. 182

    Grfico 46: Presena das redes hoteleiras no litoral brasileiro. 186 Grfico 47: Presena das administradoras de redes hoteleiras no litoral brasileiro, por pas de origem. 188

    Grfico 48: Nmero de resorts inaugurados ao longo da costa brasileira. 195

    Grfico 49: Origem do capital dos resorts implantados no litoral brasileiro, a partir da nacionalidade do proprietrio/rede. 196

    Grfico 50: Resorts implantados no litoral brasileiro sob gesto e/ou propriedade de pas estrangeiro. 198

    Grfico 51: reas dos resorts somadas por pas de origem da rede/proprietrio. 199

    Grfico 52: Histrico da performance dos hotis e resorts no Brasil. 201 Grfico 53: Total de rea empreendida, por origem do capital dos empreendimentos tursticos imobilirios com mais de 1 milho de m. 216

    Grfico 54: Porcentagem de municpios, em relao ao total de municpios litorneos, em que consta a presena de segundas residncias segundo os ndices forte e excepcional, agrupados por Estado litorneo. 275

    Grfico 55: Presena da hotelaria de rede no litoral brasileiro, por origem do investimento. 277

    Grfico 56: Presena dos resorts no litoral brasileiro, por Regio. 279

    Grfico 57: Presena dos resorts no litoral brasileiro, por origem do capital. 279

    Grfico 58: Presena dos ETIs no litoral brasileiro, por Estado litorneo. 280

    Grfico 59: Presena dos ETIs no litoral brasileiro, por origem de capital. 282

    Grfico 60: Presena dos ETIs de capital internacional no litoral brasileiro. 282 Grfico 61: rea ocupada pelos ETIs e resorts ao longo do litoral brasileiro, por origem de capital. 284

    Grfico 62: rea ocupada pelos ETIs e resorts ao longo do litoral brasileiro, por origem de capital e por Regio. 284

  • LISTA DE MAPAS

    Mapa Pgina

    Mapa 1: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Amap 222

    Mapa 2: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Par 224

    Mapa 3: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Maranho 226

    Mapa 4: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Piau 228

    Mapa 5: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Cear 235

    Mapa 6: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado da Rio Grande do Norte 239

    Mapa 7: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Paraba 241

    Mapa 8: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado de Pernambuco 244

    Mapa 9: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado de Alagoas 246

    Mapa 10: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Sergipe 248

    Mapa 11: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado da Bahia 256

    Mapa 12: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Esprito Santo 258

    Mapa 13: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Rio de Janeiro 261

    Mapa 14: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado de So Paulo 263

    Mapa 15: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Paran 265

    Mapa 16: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado de Santa Catarina 269

    Mapa 17: Meios de hospedagem nos municpios litorneos do estado do Rio Grande do Sul 270

    Mapa 18: Incidncia de segundas residncias ao longo do litoral brasileiro em 2010 289

    Mapa 19: Presena das redes hoteleiras ao longo do litoral brasileiro 290

    Mapa 20: Presena dos resorts ao longo do litoral brasileiro 291

    Mapa 21: Presena dos empreendimentos tursticos imobilirios ao longo do litoral brasileiro 292

  • LISTA DE TABELAS

    Tabela pgina

    Tabela 1: Desembarque de turistas internacionais no mundo: 1950 2009. 36

    Tabela 2: Valores da taxa Selic anualizada, entre os anos de 1986 e 2009. 76

    Tabela 3: Quadro de prioridades do Prodetur-NE. 99

    Tabela 4: Chegada de turistas internacionais por destino (em milhes de chegadas). 124

    Tabela 5: Fluxo receptivo internacional. Comparativo de chegada de turistas: Mundo, Amrica do Sul e Brasil 1999 2009. 124

    Tabela 6: Chegada de turistas ao Brasil 1970 2009. 126

    Tabela 7: Comparativo da receita cambial turstica: Mundo, Amrica do Sul e Brasil, em bilhes de US$. 131

    Tabela 8: Matriz Origem/Destino por regio em 2005. 140

    Tabela 9: Relao das ACTs. 142

    Tabela 10: Cadastro dos meios de hospedagem por Unidade da Federao anos 2002 2009 157

    Tabela 11: Total de hotis e flats no Brasil (posio at julho de 2010). 173

    Tabela 12: Redes hoteleiras atuantes no litoral brasileiro, classificadas em ordem crescente por nmero de hotis e resorts. 183

    Tabela 13: Relao dos resorts presentes em municpios litorneos 191

    Tabela 14: Distribuio geogrfica das segundas residncias, por Estado, ao longo da zona costeira brasileira, anos 2000 e 2010. 205

    Tabela 15: Ranking dos municpios litorneos detentores do maior nmero de segundas residncias, em nmeros absolutos. 206

    Tabela 16: Investimento em imveis por no-residentes, 2007. 211

    Tabela 17: Sntese dos empreendimentos tursticos imobilirios lanados nos ltimos quatro anos e os grandes empreendimentos consolidados ao longo da zona costeira. 212

    Tabela 18: Panorama dos empreendimentos tursticos imobilirios lanados nos ltimos quatros anos, acrescidos dos grandes empreendimentos consolidados ao longo da zona costeira brasileira 213

    Tabela 19: Empreendimentos tursticos imobilirios com mais de 1 milho de m, por origem de capital. 216

    Tabela 20: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Amap. 316

    Tabela 21: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Par. 317

    Tabela 22: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado do Par 318

    Tabela 23: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Maranho. 319

    Tabela 24: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado do Maranho 321

    Tabela 25: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Piau. 322

    Tabela 26: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado do Piau 323

    Tabela 27: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Cear. 324

  • Tabela 28: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado do Cear 326

    Tabela 29: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Rio Grande do Norte. 328

    Tabela 30: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado do Rio Grande do Norte 330

    Tabela 31: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado da Paraba. 332

    Tabela 32: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado da Paraba 333

    Tabela 33: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado de Pernambuco. 334

    Tabela 34: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado de Pernambuco 335

    Tabela 35: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado de Alagoas. 337

    Tabela 36: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado de Alagoas 339

    Tabela 37: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado de Sergipe. 341

    Tabela 38: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado de Sergipe 342

    Tabela 39: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado da Bahia. 343

    Tabela 40: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado da Bahia 345

    Tabela 41: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Esprito Santo. 349

    Tabela 42: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado do Esprito Santo 351

    Tabela 43: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Rio de Janeiro. 352

    Tabela 44: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado do Rio de Janeiro 354

    Tabela 45: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado de So Paulo. 358

    Tabela 46: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado de So Paulo 360

    Tabela 47: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Paran. 361

    Tabela 48: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado do Paran 362

    Tabela 49: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado de Santa Catarina 363

    Tabela 50: Redes hoteleiras, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios presentes nos municpios litorneos do Estado de Santa Catarina 365

    Tabela 51: Dados de populao e domiclios referentes aos municpios litorneos do Estado do Rio Grande do Sul 367

  • LISTA DE ABREVIATURAS

    ABR Associao Brasileira de Resorts

    ACTs Atividades Caractersticas do Turismo

    ADIT Associao para o Desenvolvimento Imobilirio e Turstico do Nordeste

    BID Banco Interamericano de Desenvolvimento

    BNB Banco do Nordeste do Brasil

    BNDES Banco Nacional do Desenvolvimento

    BNH Banco Nacional da Habitao

    CCJ Comisso de Constituio de Justia e de Cidadania

    CEPAL Comisso Econmica para a Amrica Latina

    CNAE Classificao Nacional de Atividades Econmicas

    CNPJ Cadastro Nacional de Pessoa Jurdica

    CNTur Conselho Nacional de Turismo

    Cofins Contribuio para o Financiamento da Seguridade Social

    CPF Cadastro de Pessoa Fsica

    CVM Comisso de Valores Mobilirios

    Embratur Empresa Brasileira de Turismo

    ETI Empreendimento turstico imobilirio

    FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Servio

    FII Fundos de Investimento Imobilirio

    FINOR Fundo de Investimento do Nordeste

    FIPE Fundao Instituto de Pesquisas Econmicas

    FGV Fundao Getlio Vargas

    FMI Fundo Monetrio Internacional

    FUNGETUR Fundo Geral de Turismo

    G7 Grupo dos 7

    G77 Grupo dos 77

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    ICMS Imposto sobre Circulao de Mercadorias e Prestao de Servios

    IED Investimento Estrangeiro Direto

    INCRA Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria

    Inmetro Instituto Nacional de Metrologia, Normalizao e Qualidade Industrial

    INSS Instituto Nacional de Seguro Social

    IOF Imposto sobre Operaes Financeiras

    IPEA Instituto de Pesquisas Econmicas Aplicadas

    IPTU Imposto Predial e Territorial Urbano

    IRPJ Imposto de Renda Pessoa Jurdica

    ISS Imposto sobre Servios

    MIT Instituto Tecnolgico de Massachusetts

    MP Medida Provisria

    MTur Ministrio do Turismo

    OCDE Organizao para Cooperao e Desenvolvimento Econmico

    OMT Organizao Mundial do Turismo

    ONU Organizao das Naes Unidas

  • OPEP Organizao dos Pases Exportadores de Petrleo

    PAC Plano de Acelerao do Crescimento

    PAEG Plano de Ao Econmica do Governo

    PDITS Plano de Desenvolvimento Integrado do Turismo Sustentvel

    PIB Produto Interno Bruto

    PIS Programa de Integrao Social

    PLANTUR Plano Nacional do Turismo

    PNB Produto Nacional Bruto

    PND Plano Nacional de Desenvolvimento

    PNMT Programa Nacional de Municipalizao do Turismo

    PNT Plano Nacional de Turismo

    PPA Plano Plurianual de Governo

    Proecotur Programa de Desenvolvimento do Ecoturismo na Amaznia

    Prodetur/NE Programa de Desenvolvimento do Turismo no Nordeste

    RAIS Relao Anual de Informaes Sociais

    SBCMH Sistema Brasileiro de Classificao de Meios de Hospedagem

    SFH Sistema Financeiro da Habitao

    Sintur Sindicato dos Investidores em Turismo do Estado do Cear

    SISNATUR Sistema Nacional de Cadastramento, Classificao e Fiscalizao dos Prestadores de Servios Tursticos

    SPU Secretaria do Patrimnio da Unio

    SUDENE Superintendncia do Desenvolvimento do Nordeste

    SUMOC Superintendncia da Moeda e do Crdito

    TC Comisso Trilateral

    UNCTAD Conferncia das Naes Unidas para o Comrcio e o Desenvolvimento

    WIR World Investments Reports

    ZEE Zoneamento Ecolgico Econmico

  • Sumrio

    Introduo ............................................................................................................ 01

    Capitulo 01: O turismo no contexto da reestruturao econmica mundial ......... 10

    1.1. Da indstria fordista indstria turstica ....................................................... 10

    1.2. Novo regime de acumulao e a crise planejada do petrleo ..................... 16

    1.3. Desenvolvimento Sustentvel e Globalizao: similaridade de conceitos 23

    1.4. A indstria turstica no contexto da liberalizao financeira ......................... 31

    Captulo 02: As especificidades de um pas chamado Brasil ............................... 48

    2.1. Uma breve reflexo sobre as nossas razes ................................................. 48

    2.2. A transio para o capitalismo dependente ................................................... 52

    2.3. A poltica de endividar o endividado ........................................................... 59

    2.4 Liberalizao financeira total e irrestrita? ..................................................... 75

    Captulo 03: As polticas pblicas federais de turismo ......................................... 90

    3.1 Da Embratur Poltica Nacional de Turismo .................................................. 90

    3.2 O reflexo das polticas pblicas federais de turismo no aquecimento .......... 123

    da demanda

    3.2.1 Fluxo internacional .......................................................................... 123

    3.2.2. Fluxo domstico ............................................................................. 133

    3.3 Gerao de trabalho e renda ........................................................................ 141

    3.4 Meios de hospedagem ................................................................................. 147

    3.4.1 O Sistema Brasileiro de Classificao de Meios de Hospedagem 160

    Captulo 04: O litoral brasileiro na mira dos investimentos imobilirios e ........... 162

    hoteleiros

    4.1. A atuao do capital financeiro na produo do espao costeiro ............... 162

    4.2. A produo do espao costeiro decorrente da atividade imobiliria e ......... 172

    hoteleira

    4.2.1. As redes hoteleiras ....................................................................... 174

    4.2.2. Os resorts ...................................................................................... 188

  • 4.2.3. As segundas residncias ............................................................... 202

    4.2.4. Os empreendimentos tursticos imobilirios .................................. 209

    4.3. A geografia dos empreendimentos imobilirios e hoteleiros beira-mar 217

    4.3.1. Regio Norte .................................................................................. 221

    4.3.1.1. O Estado do Amap ......................................................... 221

    4.3.1.2. O Estado do Par ............................................................. 223

    4.3.2. Regio Nordeste ............................................................................ 225

    4.3.2.1. O Estado do Maranho .................................................... 225

    4.3.2.2. O Estado do Piau ............................................................ 227

    4.3.2.3. O Estado do Cear ........................................................... 229

    4.3.2.4. O Estado do Rio Grande do Norte ................................... 236

    4.3.2.5. O Estado da Paraba ........................................................ 240

    4.3.2.6. O Estado de Pernambuco ................................................ 242

    4.3.2.7. O Estado de Alagoas ....................................................... 245

    4.3.2.8. O Estado de Sergipe ........................................................ 247

    4.3.2.9. O Estado da Bahia ........................................................... 249

    4.3.3. Regio Sudeste ............................................................................. 257

    4.3.3.1. O Estado do Esprito Santo .............................................. 257

    4.3.3.2. O Estado do Rio de Janeiro ............................................. 257

    4.3.3.3. O Estado de So Paulo .................................................... 262

    4.3.4. Regio Sul ..................................................................................... 264

    4.3.4.1. O Estado do Paran ......................................................... 264

    4.3.4.2. O Estado de Santa Catarina............................................. 264

    4.3.4.3. O Estado do Rio Grande do Sul ...................................... 268

    Consideraes Finais ......................................................................................... 271

    Referncias bibliogrficas .................................................................................. 293

    Apndice ...................................................................................................... 316

  • 1

    INTRODUO

    22 de abril de 1500: esta a data referencial de ocupao e colonizao do Brasil,

    tendo como ponto de partida o litoral brasileiro, onde hoje se encontra o municpio

    de Porto Seguro. Este foi o nosso objeto de estudo na fase de mestrado, cuja

    concluso nos conduziu a uma srie de inquietaes que nos motivaram

    realizao desta tese.

    Certamente, o primeiro fato que nos chamou ateno quando da concluso da

    dissertao foi o padro recorrente de ocupao do territrio brasileiro expresso pela

    falta de planejamento e consequente crescimento desordenado, revelia das

    legislaes urbansticas e ambientais existentes; referimo-nos inclusive, aos grandes

    empreendimentos: o resort Club Med Trancoso encontra-se locado em rea

    preliminarmente destinada a um Parque, funo da fragilidade de seu solo e da

    ocorrncia de espcies endmicas.

    Constatou-se, portanto, que com apenas 95.721 habitantes poca (no ano 2.000),

    Porto Seguro apresentava indcios de desordenamento e falta de planejamento

    territorial semelhana das grandes cidades brasileiras, apesar de dispor de uma

    base cartogrfica na escala 1:100.000 contendo elementos que possibilitariam a

    feitura de um Zoneamento Ecolgico Econmico. Identificava-se naquele territrio

    que abrigava cerca de cem vezes menos populao que So Paulo, por exemplo, os

    mesmos sinais de ocupao de reas de risco e de reas de preservao

    permanente, os mesmos bolses de pobreza e de riqueza.

  • 2

    Em estgios diferentes, infelizmente a histria de planejamento e ordenamento

    territorial brasileiro tem demonstrado a prevalncia de cenrios espontneos de

    ocupao ou, mais claramente, cenrios em acordo com os interesses de uma

    classe dominante que, necessariamente, no atenta a parmetros de regulao

    ambiental e/ou urbanstico os famosos planos diretores de gaveta j alertados

    por Villaa (1999); portanto, no privilgio de Porto Seguro, tampouco de So

    Paulo, as cicatrizes em seu territrio oriundas de tal constatao.

    Em comum a boa parte destas cidades, tambm est o fato de estarem inseridas em

    estados costeiros. A zona costeira brasileira abrange dezessete estados e 76,5% da

    populao brasileira, de acordo com o censo demogrfico do IBGE 2010. Esta

    elevada concentrao demogrfica tem sua explicao no s no padro histrico

    da ocupao colonial, mas tambm em funo dos usos econmicos exclusivos do

    litoral: a explorao dos recursos marinhos, os fluxos intercontinentais de

    mercadorias, a extrao de petrleo em guas profundas e, mais recentemente, o

    turismo.

    E seria justamente a atividade turstica quem cooptaria espaos para seu uso, tanto

    do perfil urbano das 12 capitais litorneas, quanto dos restantes 263 municpios

    lindeiros costa que se apresentam em vrias fases de urbanizao; muitos deles

    ainda possuem populao predominantemente rural.

    Outro dado bastante significativo levantado na dissertao foi a observao da forte

    atuao do Estado, atravs do Prodetur-NE (Programa de Desenvolvimento do

    Turismo no Nordeste) enquanto agente indutor e facilitador de um novo padro de

  • 3

    oferta de meios de hospedagem para fomento atividade turstica. O resort Club

    Med Trancoso, inaugurado em 2002, foi sem dvida um marco para o que se

    almejava na regio: a qualificao da oferta para o turismo receptivo internacional.

    Assim, a instalao do Med Trancoso deu sinal verde para uma reestruturao da

    oferta turstica no eixo Arraial dAjuda Trancoso, litoral sul de Porto Seguro, eleito

    pelo poder pblico municipal e pela iniciativa privada para a recepo deste novo

    perfil de turista. Com efeito, o Quadrado, centro histrico e turstico do distrito de

    Trancoso, onde antes moravam os pescadores, apresenta-se na atualidade repleto

    de pousadas, restaurantes e lojas de grife, objeto de manchetes nas revistas de

    bordo e no guia 4Rodas, como lugar da moda e de gente famosa. Os pescadores?

    Ah, estes foram ocupar os bairros novos, deslocados em direo oeste linha da

    costa, lugares menos privilegiados no tocante vista para o mar e, logicamente,

    obedecendo a um cenrio espontneo de ocupao para no fugir do padro

    recorrente (da falta) de planejamento.

    De forma similar, a ltima dcada tambm revelou mudanas no padro de

    ocupao das zonas costeiras das capitais e suas adjacncias: Salvador, Natal,

    Fortaleza, Macei, Recife, Florianpolis, tm apresentado crescentes investimentos

    em hotelaria de rede, resorts, segundas residncias e empreendimentos mistos,

    associando resorts s segundas residncias. Os empreendimentos so lanados

    nos Sales de Turismo internacionais e em So Paulo. Na contramo, as

    universidades pblicas buscam compreender a nova dinmica de ocupao dessas

    cidades que, da noite para o dia, se veem inseridas nos fluxos internacionais de

    turismo. Um exemplo tpico o bairro de Ponta Negra, na cidade de Natal - RN, que

  • 4

    apresenta altos ndices de apartamentos vendidos a estrangeiros; tal demanda tem

    resultado na necessidade de expanso urbana, j que parte da cidade tornou-se

    alvo de residncia secundria internacional (Fonseca et al.,sem data).

    , portanto, a reproduo deste modelo de ocupao, ou seja, a dinmica de

    apreenso destes territrios pelo turismo e sua associao com os

    empreendimentos imobilirios realidade observada inicialmente em Porto Seguro e

    expansvel aos demais municpios litorneos considerados com potencial turstico ,

    que nos motivou a ingressar no programa de doutorado.

    Isto posto, nosso objetivo abordar a produo do espao litorneo a partir da

    espacializao e regionalizao dos meios de hospedagem, procurando identificar

    as diferentes tipologias presentes, verificando os locais onde ocorre maior incidncia

    de uma em detrimento de outra. Nosso objetivo tambm compreender a origem

    destes investimentos, se nacional ou estrangeiro, se independentes ou atrelados a

    grandes redes hoteleiras internacionais.

    Partimos da premissa da existncia de circuitos de transferncia de capital para o

    ambiente construdo e da produo de agentes imobilirios locais em associao ou

    no com o capital estrangeiro que, lanando mo das polticas pblicas e dos

    incentivos fiscais a seu favor (do capital imobilirio), tm contribudo fortemente para

    a concretizao de investimentos tursticos relacionados hospedagem espalhados

    ao longo da costa. A liberalizao e desregulamentao financeira dos anos 90,

    associadas ao forte papel interventor do Estado expresso, sobretudo, a partir da

  • 5

    Poltica Nacional de Turismo, na mesma dcada, perfazem o cenrio que tem

    incentivado o avano da atividade turstica no Brasil.

    Para tanto, este trabalho tem como objeto de estudo os municpios litorneos que

    compreendem a costa brasileira, desde o estado do Amap, iniciando a pesquisa no

    municpio de Oiapoque, at o estado do Rio Grande do Sul, no municpio de Santa

    Vitria do Palmar. So ao todo, 275 municpios que perfazem nosso objeto de

    anlise, tendo como fontes principais de inventrio as informaes disponibilizadas

    pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE) e pelo Guia 4Rodas, posto

    que ainda no h registro oficial destas informaes por parte de nenhum rgo

    pblico federal.

    A primeira hiptese que levantamos que o grande fluxo de capitais, consequncia

    da liberalizao financeira e mundializao do capital, tem seu rebatimento no

    processo de produo do espao litorneo, atravs de um forte aquecimento dos

    setores de hospedagem, proporcionando uma oferta adiante da demanda.

    Uma segunda hiptese diz respeito disponibilidade na Regio Nordeste de um

    litoral ainda intacto que, se comparado com as demais regies costeiras brasileiras,

    responde pela maior concentrao de investimentos ao longo de sua costa.

    Por fim, nossa hiptese principal que h um real avano do capital internacional

    sobre a produo do espao litorneo, expresso pela implantao das redes

    hoteleiras internacionais, resorts e empreendimentos tursticos imobilirios ao longo

    do litoral, cujo capital estrangeiro. Este processo se assemelharia ao que

  • 6

    vivenciamos no ltimo quartel do sculo passado, quando o parque industrial

    cresceu a reboque do capital internacional, expresso pela vinda das multinacionais

    para c.

    Para test-las, a metodologia envolve o levantamento e a caracterizao dos meios

    de hospedagem, por tipologia, alm do aprofundamento terico das questes

    referentes ao cenrio poltico e econmico mundial e acerca das polticas pblicas

    federais de turismo. Atravs da identificao das principais tipologias de

    hospedagem presentes no litoral brasileiro e que so objetos desta investigao, a

    saber: hotelaria de rede, resorts, segundas residncias e empreendimentos

    tursticos imobilirios, iremos proceder construo de mapas snteses, por Estado

    litorneo, que nos possibilitem localizar trs informaes: (i) a tipologia dos

    empreendimentos; (ii) a localizao dos investimentos ao longo da costa; (iii) a

    origem do capital: nacional, estrangeiro ou associao entre ambos.

    Tal mapeamento nos permitir uma visualizao geral da ocorrncia de

    investimentos e prevalncia de tipologias de hospedagem ao longo dos municpios

    costeiros, possibilitando-nos aferir a intensidade de participao de tais

    empreendimentos na produo do espao litorneo.

    Para atender aos objetivos empreendidos e procurar responder s hipteses

    aventadas, esta tese est estruturada em quatro captulos: (i) o turismo no contexto

    da reestruturao econmica mundial; (ii) as especificidades de um pas chamado

    Brasil; (iii) as polticas pblicas federais de turismo; e (iv) o litoral brasileiro na mira

    dos investimentos imobilirios e hoteleiros.

  • 7

    O primeiro captulo busca contextualizar a indstria turstica no cenrio da recente

    reestruturao econmica mundial que conduziu liberalizao financeira e ao

    avano das redes hoteleiras internacionais pelo mundo. Para tanto, traamos um

    breve histrico acerca dos regimes de acumulao capitalista, tendo como marco

    inicial o fordismo e seu percurso que naturalmente conduziria ao seu esgotamento,

    possibilitando a origem de um novo regime, o de acumulao flexvel, relacionado

    construo ideolgica dos termos globalizao e desenvolvimento sustentvel.

    neste contexto que o turismo desponta com mais veemncia enquanto negcio e

    atividade produtiva, posto que as frias remuneradas, direito dos trabalhadores,

    tambm seriam cooptadas pelo sistema de produo capitalista atravs da oferta do

    merecido descanso em um lugar diferente de sua estadia normal da surgiria um

    vasto leque de opes de destinos, associados ao lazer, onde a indstria turstica

    iria se instalar. Perceberemos que existe uma forte relao entre as taxas de

    crescimento anual do turismo receptivo internacional e os acontecimentos de ordem

    poltica, econmica e social, da a necessidade de contextualizarmos a atividade

    segundo um panorama histrico e socioeconmico.

    As especificidades de um pas chamado Brasil, denominao de nosso segundo

    captulo, busca uma compreenso de como todo este processo de reestruturao

    econmica mundial, que acabou por gerar a abertura dos mercados mundiais,

    rebateu no nosso desenvolvimento poltico e econmico e, consequentemente, no

    desenvolvimento da atividade turstica. Em um rpido percurso pela histria

    brasileira, relacionando a natureza sociolgica do povo brasileiro com traos da

    colonizao ibrica, iremos observar que a passagem para um pas independente e

  • 8

    natural engendramento na geopoltica mundial enquanto nao de Terceiro Mundo,

    trouxe consequncias para o (sub)desenvolvimento do capital nacional. Tal fato

    culminaria no endividamento externo e posterior abertura total e irrestrita do Brasil

    ao processo de liberalizao financeira e, com isso, enxurrada de investimentos

    estrangeiros diretos e a um intenso processo de fuses e aquisies, do qual os

    investimentos imobilirios e hoteleiros tambm tomaram parte.

    No terceiro captulo, tratamos de entender o papel do Estado enquanto agente

    dinamizador dos investimentos tursticos atravs da consecuo de polticas

    pblicas federais. Iniciamos o trajeto com a criao da Embratur, em 1966 e

    finalizamos o percurso das polticas pblicas com a recente promulgao do Decreto

    n 7.381/2010 que regulamenta a Poltica Nacional de Turismo. Nestes 44 anos

    iremos perceber que houve avanos significativos na forma do Estado tratar e

    estruturar a matria, o que refletiu no aquecimento da demanda internacional e

    nacional -, bem como na criao de postos de trabalho relacionados atividade

    turstica. Finalizamos o captulo versando sobre a evoluo dos meios de

    hospedagem no Brasil que culmina com a sua regulamentao e cadastro, atravs

    da Poltica Nacional de Turismo, o que marca um esforo indito por parte do Estado

    no sentido de sistematizar a oferta, alm de auxiliar na elaborao de metas e

    macroprogramas para a dinamizao do turismo no Pas.

    Por fim, o quarto captulo trata especificamente do objeto desta pesquisa: o litoral

    brasileiro. A atuao do capital financeiro na produo do espao costeiro constitui a

    base de nossa investigao e traz definies importantes, tais como: o circuito

    secundrio de capital, os ciclos imobilirios relacionados imagem quente do lugar,

  • 9

    a hipermobilidade do capital e a mquina do crescimento urbano, temas que iro

    nortear o nosso percurso ao longo deste captulo.

    Na sequncia, passamos a discorrer sobre as diferentes tipologias incidentes no

    espao costeiro, buscando sua caracterizao e quantificao: redes hoteleiras,

    resorts, segundas residncias e empreendimentos tursticos imobilirios. Feito o

    entendimento da diferenciao entre as tipologias apresentadas, prosseguimos no

    que denominamos a geografia dos empreendimentos imobilirios e hoteleiros

    beira-mar. Inventariamos, ento, por Estado e Municpio costeiro, a incidncia das

    tipologias objeto de nosso estudo, informando a natureza e a origem do

    investimento. No caso de resorts e empreendimentos tursticos imobilirios,

    buscamos informar tambm a rea do empreendimento, por entender que se trata

    de grandes extenses de terra alocadas por um nico investimento.

    Ao concluir a tese, esperamos gerar um panorama dos investimentos imobilirios e

    hoteleiros ao longo da costa, o que nos possibilitar compreender a natureza de tais

    investimentos, se nacional ou internacional, e sua incidncia, ou seja, a

    predominncia de residncias secundrias, redes hoteleiras, resorts e

    empreendimentos tursticos imobilirios por Regio/Estado/Municpio. Esperamos

    assim, poder contribuir com a sistematizao e elucidao da origem dos

    investimentos de um agente de produo que tem concorrido de forma relevante na

    ocupao dos espaos litorneos: os meios de hospedagem.

  • 10

    CAPTULO 1

    O TURISMO NO CONTEXTO DA REESTRUTURAO ECONMICA MUNDIAL

    Neste captulo introdutrio busca-se compreender o nosso objeto de pesquisa, qual

    seja o turismo enquanto atividade produtiva e que tem no espao o seu principal

    objeto de consumo. Para tanto, traaremos um breve percurso histrico de sua

    evoluo dentro do regime de acumulao capitalista, onde ganha importncia

    medida que suas divisas representam substanciais indicadores de gerao de

    riqueza, sobretudo a partir dos anos 70, quando a atividade turstica passaria a

    ganhar status de uma indstria limpa frente crescente onda ambiental que

    condenaria as atividades poluidoras. Contudo, no espao que a atividade turstica

    se concretiza e nele que encontraremos as principais consequncias decorrentes

    de tal atividade, o que ser discutido ao longo desta tese.

    1.1 Da indstria fordista indstria turstica

    O ano de 1914 seria simblico para marcar o incio do fordismo, ocasio em que

    Henry Ford introduziria a jornada de trabalho de oito horas dirias e remunerao de

    cinco dlares para os trabalhadores da linha de montagem de carros no Estado de

    Michigan, nos Estados Unidos. Com base nos princpios de administrao cientfica

    publicados por F. W. Taylor em 19111, aliado percepo de que produo em

    massa significaria consumo em massa, Ford contribuiria para o incio de uma nova

    1 Um influente tratado que descrevia como a produtividade do trabalho podia ser radicalmente aumentada atravs da decomposio de cada processo de trabalho em movimentos componentes e da organizao de tarefas de trabalho fragmentadas segundo padres rigorosos de tempo e estudo do movimento. (Harvey, 2003:121)

  • 11

    fase de acumulao capitalista2, popularmente conhecida como fordismo3,

    fortemente associada produo em srie.

    O fordismo, ento, inauguraria um novo regime de acumulao capitalista, ou seja,

    uma nova diviso do trabalho no cho de fbrica, lastreada no trabalho em srie, o

    que afetaria a forma de produo e reproduo do trabalhador: o processo de

    produo estaria agora fragmentado entre gerncia, concepo, controle e

    execuo, cabendo grande massa de trabalhadores a ltima fase deste processo,

    a de execuo, que, diferentemente do modo de produo artesanal ou

    manufatureiro, no requeria nenhuma habilidade para a execuo da tarefa.

    Smith (1988:160) ressalta que Marx em O Capital pormenoriza a diviso do

    trabalho no sistema capitalista e, segundo a anlise do autor, so trs as escalas

    desta diviso: geral, particular e especfica. A primeira corresponderia separao

    entre atividades principais, ou seja, entre o campo e a indstria; j a escala

    particular, relaciona-se s subdivises entre os diferentes setores do campo e da

    indstria, e a terceira, seria a diviso especfica do trabalho que ocorre no cho de

    2 Sweezy, citado em Nobre (2000:10), define o capitalismo como um sistema de relaes poltico-econmicas

    cujo principal objetivo a acumulao de capital, sendo esse o principal agente no processo contnuo de reproduo de riqueza. (...) O capitalismo surge como sistema econmico mundial no final do sculo XV com o ressurgimento do comrcio na Europa. Marx seria quem se debruaria exaustivamente sobre a natureza do capital, afirmando que diferentemente dos conceitos de dinheiro ou riqueza, o capital visa a acumulao do lucro ou mais-valia, atravs da frmula D M D, onde D o dinheiro, M a mercadoria e D = D + D, ou seja, o valor inicial mais lucro. 3 O sistema de produo capitalista pode ser periodizado em trs estgios de formao: mercantilista, que vai de

    1500 at o surgimento da Revoluo Industrial na Inglaterra, cuja acumulao advm das atividades comerciais, conquista e expanses territoriais; competitivo, que compreende o perodo de 1800 a 1890, em que se introduz a mais-valia como fonte principal de acumulao e consolida a industrializao; e monopolista, a partir de 1890, caracterizado pela ao de empresas, em formato de monoplios que agem no mercado eliminando a concorrncia (Nobre, 2000). O fordismo, cujo termo teria sido cunhado pelo filsofo comunista Antonio Gramsci, na dcada de 1930, j corresponderia terceira fase de acumulao capitalista onde prevalece a relao centro-periferia, sendo esta ltima objeto de expanso do consumo dos produtos gerados no centro (pases que comandam a economia global), bem como lcus de fornecimento de matria-prima mais barata.

  • 12

    fbrica, decorrente de ajustes necessrios ao processo de produo, com atuao

    praticamente inexistente em escala espacial.

    Vale notar que nesta primeira fase do fordismo, a diviso de trabalho ocorreu

    apenas nas linhas de montagem fordista, ou seja, na diviso especfica do trabalho

    tal como sinaliza Smith. Somente depois, com a efetiva entrada da ao do Estado

    impelindo novo modo de regulamentao que a diviso se expandiria de forma

    global, caracterizando, portanto, um novo regime de acumulao e consequente

    expanso para as escalas particular e geral. Tal processo significaria, ainda,

    interveno nas atividades do campo, como o aumento das reas de

    produo/comercializao de matrias-primas por todo o globo.

    Ainda nesta primeira fase de diviso especfica do trabalho, Henry Ford tentaria

    introduzir um novo modo de regulamentao em suas fbricas que desse tom ao

    novo modelo de trabalho. Assim, sua meta seria disciplinar o novo homem:

    assistentes sociais eram enviadas s casas dos trabalhadores da linha de

    montagem com intuito de ensin-los a ter uma vida regrada (sem consumo de

    lcool, por exemplo, pois afinal, como manter o ritmo de concentrao para um

    movimento sincopado ditado pela esteira se o sujeito amanhecesse sob o efeito de

    uma bebedeira?) e, sobretudo, aprender a gastar bem consumir os produtos

    produzidos nas linhas de montagem.

    Ford acreditava sobremaneira no poder corporativo da regulamentao da economia

    e tentava, at a malfadada crise de 1929, manter os nveis de produo e consumo.

    Procurava, inclusive, aumentar o salrio de seus trabalhadores, em geral imigrantes,

  • 13

    uma vez que havia resistncia, por parte da classe trabalhadora americana, em

    aceitar um sistema de produo pautado em um trabalho puramente mecanizado.

    A crise de 1929, caracterizada pelo subconsumo de produtos e superacumulao de

    capital, s foi resolvida mediante interveno estatal. O New Deal, de Franklin

    Roosevelt (presidente dos Estados Unidos), lanado em 1930, marcava uma forte

    interveno do Estado. A partir de ento, o Estado passaria a ser o principal

    instrumento de sustentao do sistema, atravs da implementao do Estado do

    Bem Estar Social, o Welfare State. Desta forma, o que Ford tentou fazer sozinho na

    primeira fase do fordismo, agora contaria com a interveno macia do Estado: a

    diviso do trabalho sairia do cho de fbrica e assumiria um carter geral.

    nessa fase que o regime de acumulao fordista ganha flego, pois passa a

    contar com a sustentao do Estado que introduz instrumentos de regulamentao

    que permitem a expanso desta nova forma de acumulao do capital: num primeiro

    momento, planejando a economia a fim de sair do colapso e num segundo

    momento, planejando e organizando a sociedade, via o que Rebelo Jnior (2002:5)

    apontaria como soluo definitiva para a superao da crise de ento. Segundo o

    autor, a vitria em uma nova grande guerra (Segunda Guerra Mundial), contra o

    nazismo e o militarismo japons implicaria uma nova rediviso de poder e

    consequente sobrevida ao capital, resultando em nova diviso internacional do

    trabalho.

  • 14

    O esforo de ps-guerra para a reconstruo das cidades, com base nas ideias de

    Keynes4, permitiu a expanso do fordismo alm-fronteiras americanas, garantindo

    novos mercados para seus produtos, bem como novas fontes de matrias-primas.

    De 1945 at a primeira crise do petrleo, em 1973, corresponde ao perodo de

    maturao do fordismo enquanto regime de acumulao e modo de

    regulamentao; a trade: Estado, Capital Corporativo e Sindicatos, garantiriam a

    manuteno do sistema por todo um perodo de maturidade do fordismo.

    Neste trio, coube ao Estado o controle dos ciclos econmicos atravs de polticas

    fiscais e monetrias, bem como o investimento em infraestrutura rodoviria,

    educao, sade e habitao, de forma a garantir pleno crescimento da indstria

    fordista e consumo de massa. Mudana tecnolgica, investimentos em capital fixo e

    melhoria da capacidade administrativa com vistas padronizao do produto, foi o

    papel assumido pelo Capital Corporativo. J aos Sindicatos, coube o papel indutor

    da massa de trabalhadores ao modo de produo em srie, em troca de acordos

    salariais, manuteno de emprego e conquista de direitos dos trabalhadores.

    O acordo de Bretton Woods, firmado em 1944, estabelecia a nova ordem mundial: o

    dlar seria transformado em moeda de referncia internacional, sendo garantidas,

    em tratado internacional, a conversibilidade dlar-ouro e a paridade entre ambos

    35 dlares a ona (Rebelo Junior, 2002:117). Estava firmado o cenrio que daria

    hegemonia aos Estados Unidos, alm de status de lder da economia mundial. Com

    4 Jonh Maynard Keynes (1883-1946) contribuiu para a formao do FMI e do Banco Mundial, tendo

    escrito em 1936 a Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda. Acreditava que um Estado forte, regulador da economia e promotor do desenvolvimento econmico, por meio de polticas fiscais, monetrias, investimento e endividamento pblico, pudesse estabelecer as bases institucionais da reconstruo dos pases destrudos pela guerra alm de, claro, garantir a supremacia americana (Nobre, 2000:23).

  • 15

    efeito, a internacionalizao do fordismo significou, de um lado a abertura de

    mercado, sobretudo o europeu, para o excedente de produo americana formando

    mercados de massa globais, e de outro, a oferta de insumos, matrias-primas mais

    baratas, sendo negociveis em todas as partes do globo inseridas no bloco

    capitalista.

    assim que, no esteio da internacionalizao do fordismo, surgiriam outras

    atividades: bancos, seguros, hotis, aeroportos e, consequentemente, a atividade

    turstica, uma vez que a viabilidade de fluxos via rodoviarizao e transporte areo,

    conjugado necessidade de deslocamento por conta dos negcios, agora

    internacionais, certamente propiciaria o desenvolvimento de atividades relacionadas

    hospitalidade e servios nas localidades receptoras.

    neste ponto, portanto, que a atividade turstica entrar de forma macia no circuito

    da economia, sobrepujando o perodo do auge do fordismo. Contudo, no

    entraremos neste assunto no momento, pois ainda h a necessidade de se verificar

    as consequncias da expanso do movimento fordista que conduziriam terceira

    grande crise do capital5 e sua suposta salvao: o desenvolvimento sustentvel, que

    ter na atividade turstica um de seus pilares.

    5 Para Rebelo Jnior (2002), a primeira crise corresponde ao perodo de transio entre o capitalismo competitivo

    e o monopolista, e marca a primeira Grande Depresso ocorrida entre os anos de 1873-1893, caracterizada pela finalizao do primeiro ciclo da revoluo industrial, aparecimento de novas tcnicas e de novas potncias mundiais que iriam disputar o comando da economia global at ento nas mos da Inglaterra. Essa crise atingiu seu pice na Primeira Guerra Mundial (1914 1918), aps a qual se assiste a uma nova redistribuio de poder e mudana nas relaes entre pases centrais e perifricos. A segunda, ora abordada, compreendeu os anos de 1929 1941, contou com a interveno do Estado americano, alm de sua supremacia enquanto potncia econmica sacramentada pela sua vitria na Segunda Guerra Mundial (1938 1945). Finalmente, a terceira, inicia-se a partir de 1971, e a sada encontrada seria o alcance do desenvolvimento sustentvel.

  • 16

    1.2 Novo regime de acumulao e a crise planejada do petrleo

    As crises so inerentes ao sistema de produo capitalista. Segundo Harvey

    (2003:170), o argumento marxista conduz teoria de superacumulao do capital,

    como fato inerente ao sistema e algumas so as sadas possveis para a superao

    da crise: a desvalorizao de mercadorias, o controle macroeconmico e a absoro

    da superacumulao.

    A primeira consiste na liquidao de estoques excedentes de bens (como por

    exemplo, a queima do caf brasileiro na dcada de 30, durante a crise de 29),

    estagnao da produo e inflao; de forma controlada, atravs de polticas

    deflacionrias, essa alternativa se constitui num mecanismo importante para conter

    a superacumulao. A segunda consiste em decises econmicas e polticas que

    estabeleam sistemas de regulao eficientes. A terceira, por sua vez, ocorre

    atravs de deslocamentos temporais e espaciais, sobre os quais nos deteremos a

    seguir.

    Disponibilidade de crdito e formao de capital fictcio , para Harvey, a estratgia

    mais duradoura para conter a superacumulao, atravs de deslocamentos

    temporais e espaciais. Capital fictcio, segundo Harvey (2003:171):

    definido como capital que tem valor monetrio nominal e existncia como papel, mas que, num dado momento do tempo, no tem lastro em termos de atividade produtiva real ou de ativos fsicos. O capital fictcio convertido em capital real na medida em que so feitos investimentos que levem a um aumento apropriado em ativos teis (por exemplo, instalaes e equipamentos que possam ter emprego lucrativo) ou mercadorias teis (bens e servios que possam ser vendidos com lucro).

    O emprstimo de dinheiro por meio dos organismos financeiros internacionais

    Fundo Monetrio Internacional (FMI) e Banco Mundial , uma estratgia utilizada

  • 17

    pelos pases de capitalismo avanado para conter a superacumulao em suas

    economias atravs do financiamento de infraestruturas na Amrica Latina, por

    exemplo.

    Rebelo Jnior (2002) ressalta que, se nas duas grandes crises anteriores os

    principais pases capitalistas possuam controle da matria-prima por estas se

    localizarem nos pases sob seu julgo colonial, ao trmino da Segunda Guerra, este

    poder no era mais to explcito, uma vez que vrios pases, outrora colnias,

    tornaram-se independentes. Para este autor, o grande impasse instaurado seria

    como redividir o mundo novamente a fim de se manter o controle das matrias-

    primas; este impasse ficaria explcito com a grande crise de 1971.

    O perodo ps-guerra de expanso fordista continha a superacumulao atravs do

    deslocamento espacial e temporal, seja no prprio territrio estadunidense, com a

    expanso de excedentes de capital e trabalho para o sul e para o oeste, seja na

    reconstruo da Europa ocidental e Japo, atravs de investimentos estrangeiros

    diretos.

    Assim, o ps-guerra representaria uma nova rediviso do capital e do poder,

    alterando as relaes centro-periferia6, com a seguinte estrutura:

    6 Wallerstein, citado por Nobre (2000:14) identifica trs grupos de estados-naes, de acordo com as

    suas posies no processo global de produo e acumulao capitalistas: os pases centrais, os pases semi perifricos e os pases perifricos. Aos pases centrais caberia o comando e organizao da economia em nvel global; aos pases semi perifricos, a organizao e expanso da produo e, por fim, os perifricos possuiriam pouca importncia poltica neste cenrio. Importante salientar que esta diviso no esttica e varia geopoliticamente em funo do estgio de desenvolvimento de cada pas no processo de acumulao capitalista. Rebelo (2002), por sua vez, simplifica o processo em apenas dois blocos: pases centrais e perifricos.

  • 18

    No centro os Estados Unidos, com a maior concentrao de riqueza e poder. Em torno um grupo de potncias imperialistas secundrias: Alemanha, Japo, Gr-Bretanha, Frana, Holanda. Em seguida uma srie de pases capitalistas desenvolvidos, mas menos poderosos: pases escandinavos, Blgica, Sua, ustria, Itlia, Grcia, Espanha, Portugal, Canad, Austrlia. Depois os que podem ser chamados de subimperialistas: Mxico, Brasil, Israel, Arbia Saudita, Ir (antes da Revoluo de 1979), ndia. Por fim, a grande maioria dos pases subdesenvolvidos da sia, frica e Amrica Latina (Rebelo Jnior, 2002:81).

    Contudo, a internacionalizao do fordismo levaria a Europa ocidental e o Japo a

    competirem comercialmente com os Estados Unidos, ameaando sua hegemonia.

    Rebelo Jnior cita que justamente neste perodo ps-guerra at o incio da terceira

    grande crise no incio dos anos setenta, o ritmo de acumulao nestes pases teria

    sido maior que qualquer outro perodo anterior.

    Com efeito, o esforo de reconstruo da Europa e do Japo ps-Segunda Guerra

    se deu atravs de um macio deslocamento de investimento de capitais de

    empresas americanas alm-fronteiras: seriam os tentculos das multinacionais

    americanas na Europa e no Japo que propiciariam, por sua vez, a formao de um

    mercado de eurodlares.

    Desta forma, a liberalizao do comrcio internacional inverteria o jogo: a produo

    em territrio europeu e japons geraria concorrncia aos produtos americanos e

    acabaria por acirrar a competio entre eles. Por outro lado, tais potncias tinham

    como inimigo comum o Terceiro Mundo que, aps a segunda grande guerra, surgia

    pleiteando melhores participaes nas relaes internacionais de comrcio, uma vez

    que eram os detentores das matrias-primas.

    Romper unilateralmente o acordo de Bretton Woods e endividar o endividado teria

    sido a estratgia adotada pelo governo americano para garantir sua supremacia

  • 19

    diante de novos atores em busca do poder; de um lado, japoneses e europeus, de

    outro, o Terceiro Mundo em peso, que ento formava o Grupo dos 77 (G77): aqueles

    que defendiam a posio dos pases pobres junto Conferncia das Naes Unidas

    para o Comrcio e o Desenvolvimento (UNCTAD). Vejamos a ordem dos

    acontecimentos luz de Rebelo Jnior (2002).

    A partir de 1968, os Estados Unidos rompiam unilateralmente a paridade dlar-ouro,

    fabricando muito mais moeda do que tinham em lastro. O objetivo era ter o dlar

    barato para facilitar as exportaes e, portanto, competir diretamente com os

    produtos europeus e japoneses (qualquer semelhana com a estratgia atual ps-

    crise do subprime americano deflagrada em 2008, no mera coincidncia: so

    consequncias da superacumulao de capital e queda na taxa de lucro...). Por

    outro lado, os preos das matrias-primas despencaram, pois eram cotadas em

    dlar por conta do Bretton Woods. E a sua desvalorizao quebrava o poder dos

    cartis, do G77, ou seja, das naes supridoras de matrias-primas que pleiteavam

    melhores preos.

    Oficialmente, em agosto de 1971 ocorreria a ruptura unilateral do acordo de Bretton

    Woods. Imediatamente antes, o governo Nixon (EUA) criava a Comisso de

    Comrcio Internacional e Poltica de Investimentos, que ficou conhecida como

    Comisso Williams, uma vez que quem a presidia era Albert L. Williams, da IBM.

    O relatrio desta comisso foi publicado em julho de 1971, um ms antes de

    deflagrar a quebra do sistema dlar-ouro, e seu diagnstico apontava para a

    preocupante concorrncia entre Estados Unidos de um lado, e Japo e Europa de

  • 20

    outro, com suas fbricas novas e mo de obra barata. Outro fator de destaque era o

    crescimento de manufaturados em pases em desenvolvimento como o Brasil, com

    fora de trabalho ainda mais barata e lucros ainda maiores. Sua concluso

    assinalava o declnio da indstria de transformao americana em detrimento dos

    demais pases capitalistas.

    Como resultado, recomendava:

    Concentrar os esforos da poltica econmica nos dois setores onde os Estados Unidos ainda possuam vantagem comparativa na produo e no comrcio mundial: produtos manufaturados de alta tecnologia (principalmente os bens de capital, armas e computadores) e agricultura (com nfase nos cereais e sementes oleaginosas como a soja). (...) A implementao das recomendaes dependeria de uma agressiva poltica de exportaes que deveria ter como base a lgica do livre comrcio. E este seria alcanado via a quebra do sistema que impedia a desvalorizao do dlar. (...) Desvalorizando o dlar, as mercadorias estadunidenses entrariam no mercado com preos competitivos, o que tenderia a reverter a queda da taxa de lucros da economia. Essa poltica com pequenos ajustes chegaria at os dias de hoje (Rebelo Jnior, 2002:121). Grifo nosso.

    Tratava-se da concepo da to propalada globalizao que, obviamente, lanou

    mo de fortes instrumentos ideolgicos para alcanar a dimenso desejada: todas

    as naes do globo.

    Tal recomendao constataria o que Harvey interpretou como sendo uma das

    principais causas que conduziria crise do fordismo: a exausto de alternativas para

    lidar com o problema de superacumulao. De fato, a rigidez do sistema fordista,

    caracterizado pela produo em massa e em srie, somado ao esgotamento de

    consumidores internos sempre para os mesmos produtos e concorrncia com

    pases da Europa e o Japo, que os fabricavam mais baratos, levariam exausto

    deste sistema de produo.

  • 21

    Por outro lado, em fins da dcada de 60, a crise energtica havia chegado, sinaliza

    Rebelo Jnior. Os pases produtores de petrleo, vinculados Organizao dos

    Pases Exportadores de Petrleo (OPEP) que desde sua fundao em 1960,

    lutavam por relaes comerciais mais justas e retorno de capital investido,

    pressionavam agora pela assinatura do acordo de Teer. Cabe ressaltar que tais

    pases, Arbia Saudita, Ir, Iraque, Kuwait e Venezuela detinham, juntos, 90% das

    reservas mundiais e 85% das exportaes.

    Assinado em fevereiro de 1971, o acordo previa dois aumentos anuais,

    considerando-se inflao e demanda do petrleo proveniente do golfo rabe

    (Rebelo, 2002:125). O que a OPEP no sabia que esta elevao de preos,

    cotados em dlar, era desejada pelos Estados Unidos e fazia parte das estratgias

    preconizadas pela Comisso Williams.

    Ocorre que, em agosto daquele ano, o acordo de Bretton Woods seria rompido

    unilateralmente, levando por terra o acordo de Teer, desvalorizando e quebrando o

    cartel da OPEP. Porm, detentora de 90% das reservas mundiais (e a economia

    global movida a petrleo), a OPEP continuou pressionando por novos acordos em

    substituio ao de Teer, sem validade por conta da poltica estadunidense de

    salvao do dlar.

    Segundo Rebelo (2002:126), novos acordos foram assinados em 1972 e 1973, com

    vistas a proteger os preos do petrleo da OPEP contra as variaes cambiais do

    dlar. Neste ponto, os Estados Unidos tiveram que ceder, pelo menos no que diz

    respeito aos pases rabes.

  • 22

    O ano de 1973 , portanto, um marco da primeira grande crise do petrleo e, por

    conseguinte, da crise do sistema fordista, sinalizada pelo aumento dos preos do

    petrleo pela OPEP e embargo das exportaes para o Ocidente durante a guerra

    rabe-israelense, a guerra do Yon Kippur. Antes da crise, o preo do petrleo bruto

    era de US$ 3,01 o barril, pulando para US$ 11,65, em janeiro de 1974, ao passo que

    o Produto Nacional Bruto (PNB) dos EUA caia 2% e do Japo, 3%, para aquele ano.

    (Harvey, 2003:136; Rebelo Jnior, 2000:153).

    Com a crise chegaria a recesso, o desemprego e a queda de consumo, o que

    permitiria a realizao de novos investimentos sob novo patamar tecnolgico, dando

    origem a um novo padro de acumulao do capital, o que Harvey (2003)

    denominaria como acumulao flexvel e Castells (2008), como o incio da era

    informacional.

    Por outro lado, a sbita alta do preo da energia, segundo a viso dos Estados

    Unidos e aliados, teria sido fruto de uma atitude unilateral por parte do cartel da

    OPEP em reao derrota da causa rabe na guerra do Yon Kippur, contra Israel.

    Em represlia,

    Os saldos comerciais obtidos pelos pases da OPEP ficaram proibidos de serem usados para compras de mercadorias e de aes de empresas na Europa e nos Estados Unidos. Os petrodlares tiveram ento que ser depositados em grandes quantias nos bancos internacionais. E essas quantias ociosas nos bancos permitiram que os banqueiros inundassem o mundo com emprstimos. A crise da dvida externa seria uma crise real para o Terceiro Mundo (Rebelo Jnior, 2002:158).

    Wilderode (2000:186) acrescenta que o desaparecimento de uma ancoragem

    internacional de moedas e consequente mudanas no mercado de cmbio, via

    ruptura do Acordo de Bretton Woods, deflagrada em 1971, conduziu

  • 23

    transformao de moedas em ativos financeiros e, em ltima anlise, em

    instrumento para financiamento da dvida pblica americana atravs da economia

    do endividamento.

    O mercado de petrodlares, somado criao de euromercados e parasos fiscais,

    por conta da internacionalizao dos bancos comerciais, como intermedirios de

    um processo caracterizado cada vez mais pelo crdito (Wilderode, 2000: 288),

    conduzir segunda parte do plano da Comisso Williams: a poltica de endividar o

    endividado, que ser tratada no captulo seguinte, pois acarretar consequncias

    importantes para a trajetria histrica e econmica brasileira.

    1.3 Desenvolvimento Sustentvel e Globalizao: similaridade de

    conceitos

    Se a ofensiva econmica de Nixon tinha alcanado xito, via reestruturao

    econmica, vista nos tpicos anteriores, ainda fazia parte de sua estratgia atacar

    mais duas frentes: a religiosa e a ecolgica.

    Rebelo Jnior (2002:131) nos conta que em 1968, Nixon pediria pessoalmente ao

    ento governador de Nova Iorque, Nelson A. Rockefeller, a elaborao de um

    relatrio sobre a Amrica Latina que ficou conhecido como Relatrio Rockefeller.

    Este relatrio serviria de subsdio para os planos de Nixon para a regio e suas

    concluses apontavam para um crescente avano das foras militares e da Igreja

    Catlica Romana em direo a um nacionalismo intenso e, por conseguinte, a um

    antiamericanismo.

  • 24

    Diante dos fatos, os Estados Unidos iniciariam uma ofensiva pentecostal na Amrica

    Latina, pregando que a salvao estaria no Cu e no na Terra; o objetivo bvio era

    a alienao da populao e a conteno dos avanos nacionalistas que, no caso,

    eram taxados de comunistas.

    J a ofensiva ecolgica teria sido muito mais sutil, lanando mo de artigos sobre a

    degradao do meio ambiente (Revista Life, em 1969 e revista Time, em 1970) de

    um lado, e organizando as Conferncias Ambientais de outro. Vejamos o papel das

    Conferncias enquanto indutoras de um novo processo de acumulao de capital

    a liberalizao financeira, sob a roupagem do Desenvolvimento Sustentvel.

    O Clube de Roma foi criado em abril de 1968, dois meses antes da OPEP lanar seu

    manifesto a favor de ajuste de preos do petrleo. Formado por representantes de

    empresas (Chase Manhattan, Exxon, Rockefeller, Bilderberg Group composto por

    lderes da Europa Ocidental e pelo Prncipe Bernard, da Holanda) o Clube de Roma

    surgia para repensar o mundo do ponto de vista dos pases industrializados. A

    reunio de sua fundao foi realizada na propriedade da famlia Rockefeller, em

    Bellagio, Itlia.

    Teria como finalidade, entre outras, a de chamar a ateno do pblico do mundo

    inteiro, para aquele novo modelo de entender, no caso, o novo modelo se refere

    interdependncia econmica, poltica, natural e social que formaria o sistema global.

    (Rebelo Jnior, 2002:104).

  • 25

    Foi convidado o Prof. Jay Forrester do Instituto Tecnolgico de Massachussets (MIT)

    para se debruar sobre o que o Clube considerava ser o Dilema da Humanidade.

    Forrester lanou o relatrio intitulado Os limites do Crescimento naquele mesmo

    ano, alertando para o crescimento demogrfico e escassez alimentar na virada do

    sculo XX. Este relatrio foi financiado pela Volkswagen Foundation e, dois anos

    mais tarde, a Rockefeller Brother Fund passaria ao financiamento de um modelo

    mais amplo e com maior profundidade para os Estados Unidos.

    O modelo a ser desenvolvido para o Clube de Roma um modelo perfeitamente adequado para a ideia da espaonave Terra (...). Um modelo que parte da posio de domnio das grandes empresas capitalistas sobre o mundo. (...) um modelo conservador que visa a manuteno do status quo (Rebelo Jnior, 2002:105)

    No entanto, Rebelo Jnior (2002:137) alerta que a mensagem do relatrio nada mais

    era do que uma resposta aos pases do Terceiro Mundo, no sentido de tentar

    neutraliz-los, quando da chamada para a Conferncia sobre o Meio Humano, a ser

    realizada em Estocolmo, no ano de 1972.

    A Conferncia de Estocolmo, realizada pela Organizao das Naes Unidas (ONU)

    teve como mote relativizar os ndices alarmantes preconizados pelo relatrio do MIT:

    era necessrio corrigir os mecanismos de crescimento, inclusive demogrfico. Na

    ocasio, a poluio foi apontada como a grande causa da crise ambiental.

    Para Rebelo Jnior (2002:140), os resultados desta conferncia registraram uma

    vitria para os pases de Terceiro Mundo, uma vez que o enfoque econmico

    referente estabilidade de preos e lucros sobre as matrias-primas foi incorporado

    ao debate que, inicialmente, pretendia discutir problemas relacionados somente

    contaminao ambiental.

  • 26

    Ora, o discurso americano referia-se incluso de fatores ecolgicos dos

    programas de desenvolvimento como regras do Banco Mundial para a liberao de

    emprstimos. Tal iniciativa devia-se ao fato de se tentar neutralizar a Venezuela

    enquanto exportadora de petrleo, uma vez que limpar sua matriz custaria caro e,

    portanto, no seria mais um problema de concorrncia e de presso ao cartel

    petrolfero americano.

    Outro ponto polmico que atualmente vem sendo bastante estudado diz respeito

    posio encabeada pelo Brasil na Conferncia, permitindo que as indstrias

    poluidoras do mundo civilizado viessem para c.

    No entanto, luz do raciocnio desenvolvido por Rebelo Jnior, percebe-se que tal

    transferncia se deu em funo da troca de reas de alto custo de produo

    (Estados Unidos, Japo e Europa Ocidental) por reas de baixo custo de produo,

    e no em funo da poluio. Como j vimos, incomodava aos Estados Unidos esta

    transferncia de reas de produo, pois ameaava sua hegemonia e gerava

    concorrncia para a sua indstria. o discurso da causa ambiental em plena

    formao e em prol dos interesses dos pases desenvolvidos.

    Se a fundao do Clube de Roma resultado da presso frente atuao da OPEP

    no que diz respeito a uma redefinio da ordem mundial ou, em outras palavras, de

    nova repartio da mais-valia, a criao da Comisso Trilateral (TC), em julho de

    1973, a consolidao deste desejo de redefinio da ordem. Examinemos melhor.

  • 27

    Para Rebelo Jnior (2002:145), a Comisso Trilateral fruto de uma discusso

    mais ampla sobre os problemas do mundo capitalista. Isso a partir da viso dos

    Bancos e Monoplios Multinacionais (os Cartis e os Trustes). Criada s vsperas

    da primeira crise do petrleo, contava com representantes de grandes corporaes

    multinacionais, como o Bank of America, Coca-Cola, Mitsubishi, IBM, Ford, Fiat,

    Banque de Paris, entre outros.

    Politicamente, sua fora estaria representada pela eleio dos presidentes

    americanos Jimmy Carter, George Bush e Bill Clinton; todos estes, membros da

    Comisso. Igualmente importante era a presena de Maurice Strong, secretrio-

    geral da Conferncia das Naes Unidas sobre o Meio Ambiente e

    Desenvolvimento, que ficou conhecida como ECO92.

    A TC seria a responsvel por viabilizar a criao do G7 (Grupo dos Sete) abarcando

    Estados Unidos, Gr-Bretanha, Frana, Alemanha, Japo, Itlia e Canad. Estes

    pases, atravs de seus grandes bancos e trustes internacionais, se uniriam contra

    um inimigo comum: o Terceiro Mundo que queria se desenvolver, comprometendo

    ento, o lucro e domnio exercido pelo grande capital privado. Era a repartio da

    mais-valia que estava em jogo.

    Para se ter uma ideia da potncia econmica que representava o G7, em 1985, o

    PNB do Japo e dos Estados Unidos giravam em torno de 30% do PNB mundial. Se

    somados aos PNB da Inglaterra, Alemanha Ocidental, Frana e Itlia, este nmero

    saltaria para 45%. Era, portanto, o Poder da Trade Japo, Europa e Estados

    Unidos, que estava em jogo.

  • 28

    Oficialmente criada em 1960, a Organizao para Cooperao e Desenvolvimento

    Econmico (OCDE) tinha como objetivo maior, a estabilizao da economia mundial

    da poca frente aos processos de descolonizao, por conta das independncias

    garantidas com o fim da Segunda Guerra. A Comisso Trilateral, por meio do G7,

    tentaria redefinir os problemas mundiais sob a tica dos pases do Terceiro Mundo e

    a seu favor (do G7), logicamente.

    Para que este mundo se mantenha deve-se manter os pases subdesenvolvidos na posio de subordinao em que se encontram. Qualquer outra alternativa colocaria em xeque o poder poltico do processo mundial da produo de mercadorias. O processo de propriedade, produo e apropriao. O desenvolvimento observado em alguns pases subdesenvolvidos seria permitido enquanto no interferisse nos lucros e no domnio exercido pelo grande capital privado (Rebelo Jnior, 2002: 151).

    Evitar uma concorrncia sem quartel teria sido a nica soluo encontrada pela

    OCDE em funo do impasse instaurado. Ento:

    Para evitar a concorrncia sem quartel, recomenda que os mercados mundiais sejam abertos. Deste modo sugere que os chamados pases em desenvolvimento abandonem os ultrapassados modelos estatizantes em prol da eficincia da iniciativa privada. Tambm, entre outros itens, recomenda que os investidores estrangeiros sejam aceitos como cidados de direito pleno, para estabelecerem sistemas completos de negcios, e no linhas de montagem ou redes de distribuio (Rebelo Jnior, 2002:152). (grifo nosso)

    E continua:

    Para as empresas da Trade, recomenda que participem ativamente nas trs regies (Japo, Estados Unidos e Europa), e mais uma regio em desenvolvimento. Mas quanto a esta ltima, especifica que devem atuar onde j existem laos tradicionais. Desse modo teramos: Amrica Latina e Estados Unidos, Sudoeste da sia e Japo, e frica e Europa (Rebelo Jnior, 2002:152).

    Em resumo: o mundo passava novamente por uma rediviso, mas sem a

    necessidade de uma guerra mundial (uma vez que o poderio militar americano se

    sobrepujava aos demais do mundo capitalista). A globalizao abriria os mercados

    e o desenvolvimento sustentvel garantiria os recursos mundiais, por meio da

    interdependncia e cooperao por parte do Terceiro Mundo em prol dos grandes

    trustes e cartis. Agora era s uma questo de difuso da nova ideologia.

  • 29

    A difuso da crise ambiental se daria por meio das escolas formulativas as

    Conferncias, tendo como piv Maurice Strong e Ignacy Sachs; e atravs das

    escolas operativas, que se encarregariam de disseminar tais ideias pelos quatro

    cantos do mundo, atravs de livros, propaganda, redes de ensino, organizaes no

    governamentais etc. Sob o ponto de vista econmico, a economia funcionaria como

    um sistema aberto dentro de um sistema maior, representado pelo meio ambiente:

    a viso sistmica da espaonave Terra.

    Neste sentido, o conceito de eco desenvolvimento elaborado por Maurice Strong

    seria anos mais tarde rebatizado para Desenvolvimento Sustentvel e lanado no

    relatrio Nosso Futuro Comum, em 1987, como parte dos preparatrios para a

    ECO 92. Segundo sua definio clssica, desenvolvimento sustentvel aquele

    que atende s necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as

    geraes futuras atenderem s suas prprias necessidades (CNMAD, 1991:46). Da

    repercusso do conceito, segue-se ECO92 e assinatura da Agenda 21, a

    chamada agenda para a ao, que efetivaria o conceito.

    No toa que um ano depois do grande evento ambiental a ECO 92, tambm

    denominada encontro da Cpula da Terra seria lanado por Ignacy Sachs (1993)

    um livro que relatava este encontro e seus resultados. Tratava-se da ofensiva da

    escola operativa a fim de divulgar aos quatro cantos do mundo, sob a roupagem dos

    termos desenvolvimento sustentvel e globalizao, a necessidade de

    cooperao, a ideia de aldeia global e de salvao do Planeta Terra, mediante as

    duas premissas iniciais. Afinal, no simptico aos olhos da populao mundial

  • 30

    dizer que, na verdade, o que se pretende manter o Terceiro Mundo sob julgo da

    Trade e com isso, manter o controle das matrias-primas.

    Com efeito, at os dias de hoje, este vis ecolgico s teve efeito para os pases do

    Sul e do Leste. Para o Norte, afirma Rebelo Jnior (2002:193), continua

    valendo as polticas protecionistas e at o fortalecimento das reas de comrcio com

    moedas prprias.

    A recusa dos Estados Unidos em assinar o Protocolo de Quioto em 2001, que

    estabelecia ndices para a emisso de gases na atmosfera, prova que o meio

    ambiente fica somente no plano do discurso. A Conferncia de Copenhague (COP

    15) sobre as mudanas climticas, ocorrida em dezembro de 2009, tambm

    demonstra claramente o embate e resistncia por partes dos pases da Trade em

    aceitar a reduo de emisso de poluentes em seus pases, pois isso implica custos

    e o que se almeja, so lucros.

    Por outro lado, este mesmo discurso que dar origem ao surgimento de uma forte

    economia no plano mundial: o turismo. A partir dos anos 70, a atividade turstica

    entrar em cena como politicamente correta, uma vez que no polui, e passar a

    ser disseminada e incentivada como uma indstria limpa e sem chamins (Araujo,

    2004). Trata-se de dar impulso a mais uma forma de se acumular capital, agora sob

    a tica da liberalizao financeira.

  • 31

    1.4 A indstria turstica no contexto da liberalizao financeira

    O abandono de Bretton Woods em 1971 foi o primeiro passo rumo formao de

    um mercado financeiro mundializado. O segundo teria sido o abandono do estado

    keynesiano e da poltica do bem-estar social, iniciado pelos governos de Margareth

    Thatcher, em 1979, no Reino Unido; Ronald Reagan, em 1980, nos Estados Unidos;

    e Helmut Kohl, em 1982, na Alemanha (Nobre, 200