TERMO DE APROVAÇÃO DAIANE ANDRADE CANDIDO · vez que meus pés fraquejaram na caminhada e que...

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TERMO DE APROVAÇÃO DAIANE ANDRADE CANDIDO JESSÉ HENRIQUE DE LIMA REMEMÓRIAS: A Trajetória dos Condenados Livro-reportagem sobre presos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e da Penitenciária Central do Estado Trabalho de conclusão de curso aprovado com nota 10,0 como requisito parcial para a obtenção do grau de bacharel em Comunicação Social – Jornalismo pelas Faculdades Integradas do Brasil – Unibrasil, mediante banca examinadora composta por: Prof.(a) Maura Oliveira Martins, orientadora e presidente Prof.(a) Laura Jane Ribeiro Garbini Both, membro Prof.(a) Paulo Camargo, membro Curitiba, 26 de novembro de 2012.

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TERMO DE APROVAÇÃO

DAIANE ANDRADE CANDIDO

JESSÉ HENRIQUE DE LIMA

REMEMÓRIAS: A Trajetória dos Condenados

Livro-reportagem sobre presos da Colônia Penal Agro industrial do Paraná e da

Penitenciária Central do Estado

Trabalho de conclusão de curso aprovado com nota 10,0 como requisito parcial

para a obtenção do grau de bacharel em Comunicação Social – Jornalismo pelas

Faculdades Integradas do Brasil – Unibrasil, mediante banca examinadora composta por:

Prof.(a) Maura Oliveira Martins, orientadora e presidente

Prof.(a) Laura Jane Ribeiro Garbini Both, membro

Prof.(a) Paulo Camargo, membro

Curitiba, 26 de novembro de 2012.

FACULDADES INTEGRADAS DO BRASIL - UNIBRASIL

DAIANE ANDRADE CANDIDO

JESSÉ HENRIQUE DE LIMA

REMEMÓRIAS: A TRAJETÓRIA DOS CONDENADOS

LIVRO-REPORTAGEM SOBRE PRESOS DA COLÔNIA PENAL

AGROINDUSTRIAL DO PARANÁ E DA PENITENCIÁRIA CENTRAL DO

ESTADO

CURITIBA

2012

DAIANE ANDRADE CANDIDO

JESSÉ HENRIQUE DE LIMA

REMEMÓRIAS: A TRAJETÓRIA DOS CONDENADOS

LIVRO-REPORTAGEM SOBRE PRESOS DA COLÔNIA PENAL

AGROINDUSTRIAL DO PARANÁ E DA PENITENCIÁRIA CENTRAL DO

ESTADO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado

à banca de defesa como requisito para

obtenção do título de Bacharel em Jornalismo

junto à Escola de Escola de Comunicação

Social das Faculdades Integradas do Brasil -

UniBrasil.

Orientadora: Professora Maura Oliveira Martins

CURITIBA

2012

Agradecimentos

A Deus que me permitiu chegar até aqui. À minha mãe, Geleide, que

acreditou no meu sonho, nunca me abandonou e que sempre me serviu de

exemplo. Ao meu esposo, Nogueira, que me amparou como uma rocha a cada

vez que meus pés fraquejaram na caminhada e que soube me amar e me dar

carinho nos instantes mais difíceis. À minha filha, Ellen, meu maior tesouro, por

ter compreendido como adulta, apesar de ainda ser criança, os momentos de

ausência, estresse e falta de tempo. Aos meus irmãos, Fábio e Viviane, aos

familiares em geral, aos amigos e colegas de trabalho pela compreensão e

estímulo. E, é claro, ao colega Jesse que, ao meu lado, transpôs as diferenças

em prol de um objetivo maior e comum: este trabalho.

Daiane

Meus agradecimentos à minha mãe, dona Eva, que aos 50 anos de

idade voltou a estudar e me mostrou de onde herdei a determinação, e a meu

pai, Wauracy, que já na casa dos 60, também voltou a estudar junto com ela.

Jessé

À mestre Maura Oliveira Martins, pela dedicação, orientações precisas,

paciência e pelos momentos de euforia compartilhados. Ao professor Felipe

Harmata Marinho, que foi uma inesgotável fonte de boas ideias na primeira

fase deste trabalho. Aos internos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná

(CPAI) e Penitenciária Central do Estado (PCE), pela confiança em nos revelar

a sua história. Ao Departamento de Execução Penal do Paraná (Depen), na

figura do doutor Maurício Kuehne, por abraçar a iniciativa e nos dar subsídios

para a execução desta tarefa. Às colegas de academia Andréa Moraes e

Elisana Fuckner, que nos abriram portas ainda no início desta pesquisa. E a

todos que, de alguma forma, ajudaram na concretização.

Nós

"Liberdade é um princípio não absoluto,

submetido a um outro, muito maior, que

é a dignidade humana, e os seus

limites são os da alteridade, ou seja, o

respeito pelo outro”.

(Felipe Pena)

Resumo

Este trabalho busca compreender como o jornalismo pode expor, por meio de um livro-reportagem, a trajetória de vida de presos internalizados na Colônia Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e na Penitenciária Central do Estado (PCE), construída a partir de suas próprias narrativas e distante de uma visão estereotipada. A fundamentação teórica é realizada a partir da teoria das representações sociais, enquanto a metodologia conta com uma pesquisa de análise de conteúdo dos conteúdos veiculados sobre o assunto na página virtual do jornal Gazeta do Povo, além de dois grupos focais e da pesquisa bibliográfica, que discute conceitos importantes como o que é crime, prisão e liberdade, bem como passeia por entre os aspectos do sistema penitenciário brasileiro e paranaense. Por fim, a presente iniciativa também debate o jornalismo como forma de conhecimento e um meio de comunicação que pode reproduzir estereótipos sociais.

Palavras-chave

Jornalismo, representações sociais, estereótipos e livro-reportagem.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................. 7

2 DELIMITAÇÃO DO TEMA E PROBLEMATIZAÇÃO............ ........... 9

2.1 O QUE SE ENTENDE POR CRIME ............................................... 9

2.1.1 Teoria e prática: como entende o crime no Brasil......................... 12

2.2 O CONCEITO DE PRISÃO ............................................................. 13

2.3 CONCEPÇÕES SOBRE LIBERDADE ............................................ 15

2.4 O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO ................................. 17

2.4.1 Medidas de ressocialização e reincidência criminal ..................... 22

2.4.2 O cenário no Estado do Paraná .................................................... 26

2.4.2.1 Infraestrutura............................................................................... 26

2.4.2.2 Projetos de recuperação dos presos .......................................... 29

2.4.2.3 Complexo penal em Piraquara ................................................... 31

2.4.2.3.1 Colônia Penal Agroindustrial do Paraná – CPAI.................... 31

2.4.2.3.2 Penitenciária Central do Estado – PCE.................................. 32

2.5 O CRIMINOSO E A MÍDIA .............................................................. 33

2.5.1 Os presos no jornal: como os internos da Colônia Penal

Agroindustrial do Paraná e da Penitenciária Central do Estado

são retratados pela imprensa ........................................................ 36

2.5.1.1 Tipo e tamanho do conteúdo ...................................................... 38

2.5.1.2 Detalhamentos sobre as imagens .............................................. 40

2.5.1.3 Detalhamentos sobre o texto ...................................................... 43

2.5.1.4 Temas apresentados................................................................... 48

2.5.1.5 Conclusões da análise de conteúdo ........................................... 51

3 OBJETIVOS........................................ .............................................. 54

3.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................... 54

4 JUSTIFICATIVA ............................................................................... 55

4.1 O CRIMINOSO COMO INSPIRAÇÃO ............................................ 58

5 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................... 61

5.1 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS...................................................... 61

5.2 JORNALISMO LITERÁRIO E O NEW JOURNALISM.................... 64

5.3 LIVRO-REPORTAGEM................................................................... 69

5.4 CONCEITOS DE REPORTAGEM .................................................. 71

5.5 TÉCNICAS DE ENTREVISTA......................................................... 74

5.6 HISTÓRIA ORAL............................................................................. 77

6 METODOLOGIA DE PESQUISA ...................................................... 79

6.1 MÉTODOS UTILIZADOS NA PESQUISA BIBLIOGRÁFICA .......... 79

6.2 PESQUISA DE CAMPO .................................................................. 80

6.2.1 Métodos empregados no desenvolvimento da análise de

conteúdo ........................................................................................ 81

6.2.2 Métodos empregados no desenvolvimento dos grupos focais .... 86

6.2.2.1 Grupo focal da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná ........... 88

6.2.2.2 Grupo focal da Penitenciária Central do Estado.......................... 91

6.2.2.3 Resultados dos grupos focais: CPAI e PCE................................ 93

6.2.2.3.1 Os presos e as representações sociais: estereótipos, mídia e

sociedade ................................................................................. 94

6.2.2.3.2 Relações com a família ............................................................ 97

6.2.2.3.3 Perspectivas sobre a prisão e ressocialização ........................ 99

6.2.2.3.4 Relações com os funcionários .................................................. 101

7 DELINEAMENTO DO PRODUTO .................................................... 103

7.1 FORMATO....................................................................................... 103

7.2 PERSONAGENS............................................................................. 104

7.3 FOCOS NARRATIVOS................................................................... 106

7.4 LINGUAGEM E TÉCNICAS ............................................................ 107

7.5 PÚBLICO-ALVO E VEICULAÇÃO .................................................. 108

7.6 RECURSOS MATERIAIS E ORÇAMENTO.................................... 108

8 CRONOGRAMA DE ATIVIDADES......................... .......................... 110

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................. ................................. 111

10 REFERÊNCIAS................................................................................. 114

10 APÊNDICES ..................................................................................... 130

11 ANEXOS ........................................................................................... 140

7

1 INTRODUÇÃO

O principal objetivo desta pesquisa é produzir um livro-reportagem sobre as

histórias dos presos de duas unidades penais do município de Piraquara, no Paraná:

a Colônia Penal Agroindustrial do Paraná – CPAI e a Penitenciária Central do

Estado – PCE. Por meio de entrevistas, procurar-se-á conhecer os relatos desses

indivíduos e reproduzi-los no produto, utilizando para isso elementos do Jornalismo

Literário e recursos do Novo Jornalismo, também conhecido como New Journalism.

Dessa forma, espera-se encontrar histórias que despertem o interesse da

sociedade pelo assunto e que, de alguma forma, isso contribua para promover

debates sobre o tema.

A escolha para a realização das entrevistas com presos das unidades penais

CPAI e PCE define-se por recomendação do Departamento de Execução Penal do

Paraná - Depen-PR, órgão responsável por administrar as prisões no Estado.

Segundo o departamento, essas instituições são as mais relevantes para atender

aos propósitos da presente pesquisa por dois motivos: primeiro, por disporem de

uma vasta gama de personagens; e, segundo, porque constituem duas formas de

regime distintas: na CPAI, o sistema semiaberto; na PCE, fechado.

Segundo Duarte (2012), a mídia atual é responsável por estimular o caráter

parcial de se perceber as situações, reproduzindo o senso comum e mascarando os

acontecimentos por meio da espetacularização das notícias. Logo, os autores desta

pesquisa acharam oportuno mostrar a realidade dos presos de outro ponto de vista:

o da Comunicação Social.

Assim, na delimitação do tema procura-se trazer à luz nuances da realidade

do sistema prisional no Brasil, no Paraná, e, afinal, na grande Curitiba. O tema é

discutido até a identificação dos problemas de comunicação. Para isso, os

pesquisadores utilizam conceitos de autores e especialistas das mais variadas

áreas, como a Sociologia, a Psicologia, as Ciências Sociais, o Direito Penal e até

mesmo alguns meios de comunicação, em especial o site do jornal Gazeta do Povo,

veículo aceito majoritariamente como o mais importante do Estado do Paraná.

Depois de se definir a plataforma e o veículo de comunicação a ser analisado

pela pesquisa, utiliza-se como metodologia inicial a análise de conteúdo das notícias

que se referem aos presos. A investigação, desenvolvida no site do jornal Gazeta do

Povo, permite identificar quando e como o detento é mencionado, e sob quais

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circunstâncias. Como critério para essa etapa, utiliza-se o recurso de palavras-

chaves que, selecionadas segundo a temática, revelaram as bases para uma

compreensão prática dos pesquisadores em relação ao assunto em foco. Aliás, é

também nesse ponto que os pesquisadores indicam o planejamento para a segunda

abordagem prática da pesquisa, necessária para estreitar o contato dos proponentes

com o universo investigado.

No referencial teórico, os estudos sociológicos são utilizados de modo a

conduzir a discussão para o plano da comunicação. Assim chega-se às concepções

das representações sociais, psicologia social, jornalismo literário, novo jornalismo,

reportagem e entrevista – o caminho para a obtenção dos dados, além da teoria da

História Oral. Tais discussões se fazem pertinentes e essenciais, haja vista que o

suporte teórico para o desenvolvimento do produto está intrinsecamente ligado a tais

teorias.

Por fim, com base em tais conceitos e análises, os pesquisadores pretendem

– como já foi dito – fazer com que a construção do livro-reportagem utilizando, para

tanto, características jornalístico-literárias e recursos do New Journalism, possa

colaborar para enriquecer o número de obras que discorram sobre o tema proposto

e que o mesmo possa ser debatido em diversos tipos diferentes de grupos sociais,

sobretudo no acadêmico.

Isso porque, considerando o fato de que o jornalismo é um dos canais de

influência sobre a sociedade, o que se espera é que o livro-reportagem crie

condições para que o leitor tenha acesso ao ponto de vista dos personagens (os

presos), conhecendo suas experiências e, com isso, refletir sobre o assunto.

9

2 DELIMITAÇÃO DO TEMA E PROBLEMATIZAÇÃO

2.1 O QUE SE ENTENDE POR CRIME

Ao longo da história, o entendimento sobre o que se considera crime sofreu

várias transformações ao redor do mundo. Isso porque, ao passo em que as

sociedades se modificam, o direito também precisa de adaptações que atendam aos

interesses de cada povo, em cada região, conforme seus costumes, em determinado

recorte de tempo, e desse modo transmuta-se.

Segundo Noronha (2001), “a história do direito penal é a história da

humanidade. Ele surge com o homem e o acompanha através dos tempos, isso

porque o crime, qual sombra sinistra, nunca dele se afastou” (p. 20). Também

Urbanski (2010) partilha dessa concepção, e compreende que “o crime é um fato

antigo, tanto quanto o homem. É um fato que preocupa a humanidade. Assim,

através dos tempos, estudos e pesquisas foram realizadas sobre esse fenômeno

social” 1.

Como não se pretende aqui discutir o surgimento do direito penal, e sim a

criminologia em alguns de seus aspectos, a presente pesquisa não se restringe ao

aprofundamento de tal abordagem. Para tanto, tomam-se como ponto de partida as

considerações que defendem esse direito que vem compartilhando a passagem dos

séculos lado a lado com a humanidade.

Analise-se a figura do crime de modo complexo e dicotômico. Embora existam

várias linhas de pensamento acerca do berço da criminalidade, é possível agrupá-

las em dois grandes grupos, quais sejam: os que consideram o próprio indivíduo

como fator dominante para o cometimento de delitos, e as que responsabilizam a

sociedade pela produção desse tipo de agente.

Em relação à primeira concepção, há dois campos de pesquisa, de acordo

com Vergara (2002). Um deles é o que define o sujeito criminoso segundo

predisposições biológicas, como a Frenologia2, por exemplo – já completamente

1 URBANSKI, Rodrigo Barbosa. Criminologia Crítica: Um Suspiro na Modernidade. Web Artigos.

Seção Direito. [S.l.], 2010. Disponível em: http://www.webartigos.com/artigos/criminologia-critica-um-suspiro-na-modernidade/50032/. Acesso em: 08/03/2012. 2 Teoria do início do século XIX, segundo a qual as faculdades e funções da mente humana são

determinadas, basicamente, de acordo com o formato do crânio (O’DONNEL, 1985, apud MICHELETTO, 2000).

10

descartada nos dias atuais –, a má nutrição ou a transmissão genética, entre outras.

O outro é aquele que busca as causas desse tipo de comportamento na psique

humana, considerando uma espécie de desequilíbrio na personalidade do criminoso,

que Freud (apud RODRIGUES, 2012) define como tripartida em ego, superego e id.

Ou seja, teorias construídas segundo o princípio de que o crime é uma característica

inerente à condição do indivíduo, uma passagem na sua vida, fruto de seus conflitos,

anseios e ambições, resultado dos desejos e paixões internos de cada pessoa.

Intrínsecos a ela, portanto.

Tal abordagem assemelha-se às que fundamentam, segundo Foucault

(2009), o julgamento dos instintos, das anomalias, das enfermidades, das

inadaptações, dos efeitos de meio ambiente e hereditariedade, concomitantemente

ao crime. No entanto, o objetivo do autor é ressaltar o enfoque oposto, ou seja, além

de facetas da personalidade, ou efeitos sobre ela, esses seriam os objetos

invocados para “explicar os fatos a serem julgados e determinar até que ponto a

vontade do réu estava envolvida no crime” (p. 22). Foucault entende que “não há

natureza criminosa, mas jogos de força que, segundo a classe a que pertençam os

indivíduos, os conduzirão ao poder ou à prisão” (id, p. 274). Em outras palavras, o

crime seria uma espécie de efeito da civilização, o lado selvagem da sociedade, uma

parte dela, e não uma nuance da alma humana. Uma condição imposta ao indivíduo,

portanto, e que leva à segunda concepção de criminalidade, muito utilizada na

Sociologia para explicar os problemas do mundo.

Outro autor que aborda a intervenção social nas atitudes do sujeito é

Rousseau (1999). Embora não trate diretamente do assunto criminalidade, sua obra

é relevante porque se refere à natureza humana como receptáculo de influências

que a conduzem para atitudes cunhadas na bondade ou maldade. Em outras

palavras, o teórico defende que o homem nasce essencialmente bom, mas se

corrompe na vida em sociedade. Ele foi um dos pensadores que teorizou o que ficou

conhecido por Contrato Social3.

Ora, mesmo contrapostos, esses posicionamentos se interligam por

determinados elementos de significação. E combinam, quando o que se busca

3 Teoria sobre a qual o homem abre mão da sua liberdade (poder) individual em favor de uma

coletividade (o Estado), de modo a superar obstáculos e garantir a própria sobrevivência e bem-estar. Esse soberano seria responsável por criar normas e aplicá-las a todos os membros da sociedade, igualmente, para que todos vivessem livres (sob o rigor da lei), como eram em seu estado de Natureza (ROUSSEAU, 2002).

11

compreender é a relação de contiguidade entre crime e humanidade, como o fez

Silva (2004):

Desde que há homem, há crime; e desde que há crime, há castigo. O castigo é como que uma sombra sinistra que segue o homem em seu caminho pela história. Ele é seu lado sombrio e sinistro, mas que lhe é inafastável. Sinistra sombra, o castigo não é, todavia, estranho ao homem. Pelo contrário, é dele parte constitutiva e, num certo sentido, o constituiu enquanto homem. A história do homem é, em grande parte, a história do castigo (p. 1).

Assim como essas, várias outras teorias sobre a origem da criminalidade no

ser humano foram desenvolvidas por pensadores em diferentes momentos

históricos, inclusive trazendo visões que se classificam na interseção entre as duas

vertentes teóricas. Essas, aliás, são abordagens mais relativistas, que não se

limitam a determinar de onde surge o crime, mas de que forma ele é percebido, o

que as torna essencialmente relevantes, já que contribuem significativamente para

uma compreensão plural do que se pode entender por crime.

Não se pode compreender o crime se abstrairmos a sua efetividade objetiva, concreta e determinada. O pensamento sociológico burguês tem se caracterizado exatamente em seguir o caminho oposto. Nele, o crime aparecerá como um caso particular de uma disfunção genérica, ou de estados anômicos, ou de comportamentos divergentes definidos diretamente no campo da instância ideológica, implicitamente irredutível ou indeterminada (MOTTA; MISSE, 1979, p. 13).

Também Durkheim (2001) admite uma relativização do conceito de crime

quando parte do princípio de que é um Fato Social4. Isso porque um Fato Social,

como o próprio nome diz, carrega-se de aspectos da cultura em que se desenvolve,

ou seja, não obedece a regras rígidas e específicas de compreensão, apesar de se

repetir nas sociedades. O próprio teórico é quem argumenta que “consiste o crime

num ato que ofende certos sentimentos coletivos dotados de energia e nitidez

particulares” (p. 58). Então, seguindo a lógica do estudioso, o crime seria assim

considerado por contrariar as normas de uma coletividade, e não contrariar a

coletividade por ser um crime. Ou, nas palavras de Misse (2010), que “o crime é

definido primeiramente no plano das moralidades que se tornaram hegemônicas e

cuja vitória será inscrita posteriormente nos códigos jurídicos” (p. 22).

4 Para Durkheim (2001), fato social consiste em toda e qualquer forma de indução exercida sobre as

pessoas mediante fatores externos a elas, com existências independentes e comuns a toda a sociedade.

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Portanto, ainda que amplamente discutida no meio acadêmico, a natureza da

criminalidade ainda não teve um consenso encerrado entre os estudiosos.

Mas então o que é crime? Em que se define?

Até mesmo em fontes de consulta enciclopédicas o termo é tratado

tangencialmente. Segundo a pesquisa de Arnaud (1999), o crime consiste na “ação,

omissão, ou mesmo o modo de vida que o direito penal autoriza o juiz a aplicar pena

ao seu autor” (p. 176). Ou seja, um comportamento impróprio classificado como

contrário às normas em determinado local, tempo e cultura, que pode ser punido

mediante entendimento (subjetivo) de um poder judiciário.

O Crime não existe na lei, nem existe nas figuras concretas ou nas ações concretas que serão designadas criminais. A alcunha de criminal a uma pessoa ou ação, afora a da amoral dominante que é, em geral, subsumida na lei, não pode se concretizar unilateralmente na Universalidade do Direito ou na Singularidade da pessoa ou do ato isolados. [...] O acusado é inocente até prova em contrário (MOTTA; MISSE, 1979, p. 49).

Por fim, a significação etimológica também remete à indefinição do termo, já

que – derivada do latim crimen – a palavra significa acusação (Arnaud, 1999). Nesse

sentido, crime seria algo de que se acusa uma pessoa, o que depende, como já foi

dito, do entendimento legal, baseado em variantes diversas sobre o que é tolerado

ou não, permitido ou não, no momento em que se verifica.

2.1.1 Teoria e prática: como se entende o crime no Brasil

No Brasil, não há ainda uma definição legal específica sobre o que se

considera crime, apesar do entendimento corrente de que consista em tudo aquilo

que seja típico, ou seja, próprio do comportamento humano, bom ou ruim, e por isso

previsto em lei; antijurídico, ou contrário às normas vigentes; e culpável, relacionado

ao pressuposto da pena. E como nem mesmo o Código Penal (1940) apresenta

qualquer dispositivo nesse sentido, tal juízo é concebido diferentemente pelas

dezenas de escolas penais (ELEUTÉRIO, 1997). “A ideia de crime funda-se no

problema da transgressão. A transgressão à lei, a transgressão àquilo que a lei e as

normas sociais regulariam no comportamento humano, nos atos humanos” (MOTTA;

MISSE, 1979, p. 15).

13

Tal ausência de conceituação, entretanto, não compromete a ação dos

mecanismos punitivos com relação ao que se julga por crime no país. Pelo contrário,

em agosto de 2012, o universo de presos somava 501.521 pessoas, das quais

93,65% eram homens e apenas 6,35% eram mulheres5. E entre eles havia “3.191

estrangeiros [...], segundo os dados mais recentes do Departamento Penitenciário

Nacional – Depen, do Ministério da Justiça” (MONTENEGRO, 20126). Desse modo,

e com base no levantamento do Censo Demográfico do Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística – IBGE (2010a), que verificou uma população total de

190.755.799 habitantes no Brasil no ano de 2010, é de se notar que o volume total

de brasileiros natos ou naturalizados presos consiste em aproximadamente 0,26%.

2.2 O CONCEITO DE PRISÃO

Como é possível perceber, falar sobre a criminalidade introduz outros

assuntos na discussão que, longe de serem acessórios, integram diretamente o

tema central. Um deles, e talvez o que mais intimamente se ligue à questão do

crime, é o enclausuramento forçado, a prisão em si que, como dito anteriormente,

acomete cerca de meio milhão de pessoas em todo o país.

Além de ser considerada uma das consequências àqueles que incorrem na

ilicitude, a prisão também representa, segundo Foucault (2009), uma “peça

essencial no conjunto das punições” (p. 217). Tal modalidade de castigo que, para

Gaio e Bordignon (2011), tem raízes fixadas em tempos remotos, só foi incorporada

ao sistema judiciário como sanção penal a partir do período compreendido entre o

final do século XVIII e início do século XIX (Foucault, 2009).

Ela se constituiu fora do aparelho judiciário, quando se elaboraram, por todo o corpo social, os processos para repartir os indivíduos, fixá-los e distribuí-los espacialmente, classificá-los, tirar deles o máximo de tempo e o máximo de forças, treinar seus corpos, codificar seu comportamento contínuo, mantê-los numa visibilidade sem lacuna, formar em torno deles um aparelho

5 Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de

Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 6 MONTENEGRO, Manuel Carlos. Órgãos criarão banco de dados sobre estrangeiros presos. Portal

CNJ. Brasília, DF, mar. 2012. Seção Notícias. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/18520:orgaos-criarao-banco-de-dados-sobre-estrangeiros-presos. Acesso em: 11/03/2012.

14

completo de observação, registro e notações, constituir sobre eles um saber que se acumula e se centraliza (id, p. 217).

Portanto, até o advento da prisão-castigo a que se refere Foucault (ibid), estar

preso significava apenas um estado passageiro, uma transição penosa entre a

liberdade e a execução da pena em si que, conforme Gaio e Bordignon (2011),

podia consistir tanto na morte do réu quanto em mutilações corporais ou penas

infamantes7. Tal mudança de sentido, segundo Chiaverini (2009), é característica

própria da Justiça, que se adapta às transformações inerentes à passagem dos

tempos. “A prisão serviu para a contenção e a guarda dos réus a fim de preservá-los

fisicamente até o momento de serem julgados. [...] A prisão era uma espécie de

‘antessala’ de suplícios, pois usava-se a tortura como forma de conseguir a verdade,

sendo na realidade uma extinção física do indivíduo” (Gaio; Bordignon, 2011, p. 3).

Por mais extrema que seja a definição dos autores, ela é útil para reforçar a

ideia de que a prisão não é uma invenção moderna e que já foi objeto de estudo de

vários teóricos. E embora tenha sido admitida como penitência apenas cerca de dois

séculos atrás, ela já existia e acompanhava a humanidade há muito tempo, desde a

antiguidade, ou antes. “A forma geral de uma aparelhagem para tornar os indivíduos

dóceis e úteis, através de um trabalho preciso sobre seu corpo, criou a instituição-

prisão, antes que a lei a definisse como pena por excelência” (Foucault, 2009, p.

217).

Com a mudança, no entanto, a prisão que havia nascido socialmente e com o

objetivo de estender o sofrimento do condenado, teria passado a contar com os

novos contornos da lei, cunhados na tentativa de ressocialização do preso, de

recuperação e de utilização dentro de uma lógica capitalista, finalidade que, segundo

Foucault (id), é comum nas sociedades atuais, principalmente as ocidentais.

As discussões a respeito de penas mais brandas ou mais severas, sobre a condição do apenado não faziam parte das preocupações dos discursos oficiais, só a partir da emergência de um discurso especializado e científico sobre o tema é que a prisão passou a ser construída como tipo ideal de punição aos delitos (Sormanny; Sousa, 2009, p. 7).

É claro que existem outras análises acerca da delimitação do que seria a

prisão e, consequentemente, estar preso. Abordagens mais simbólicas, que se 7 Segundo Moreira Filho (2007), penas infamantes seriam todas aquelas que atingem diretamente a

honra do condenado, como a publicação da condenação ou de fatos relacionados ao julgamento em veículos de comunicação de grande circulação ou audiência, por exemplo.

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referem a um tipo de cerceamento antes psicológico do que físico, praticado

mediante mecanismos de interferência cognitiva, como a televisão, por exemplo

(Férres, 1998). Entretanto, para a presente pesquisa, o conceito de prisão fica

limitado à sua abordagem física e criminológica.

2.3 CONCEPÇÕES SOBRE LIBERDADE

Vários teóricos conceituaram o que acreditavam ser o estado tal de um

indivíduo em que quaisquer formas de amarras físicas, sociais e/ou intelectuais

inexistem, ou existem e não exercem tanta influência, ou existem e não são

percebidas por ele, ou existem por imposição da lei, dentre outras possibilidades.

Para fins desta pesquisa, no entanto, consideram-se algumas que se relacionam,

assim como a discussão anterior, com um entendimento mais pragmático sobre o

que a liberdade representa; voltadas ao aspecto corporal de sua significação,

portanto.

Assim sendo, invocam-se primeiramente as análises de Constant (1985), que

embasou o entendimento legal acerca da liberdade em diversos países:

É para cada um o direito de não se submeter senão às leis, de não poder ser preso, nem detido, nem condenado, nem maltratado. [...] O direito de dizer sua opinião, de escolher seu trabalho e de exercê-lo; de dispor de sua propriedade, até de abusar dela; de ir e vir, sem necessitar de permissão e sem ter que prestar conta de seus motivos ou de seus passos. [...] O direito de reunir-se a outros indivíduos, seja para discutir sobre seus interesses, seja para professar o culto que ele e seus associados preferem. [...] É o direito, para cada um, de influir sobre a administração do governo (p. 1).

Mais do que simplesmente conceituar o termo, o autor pretendia comparar a

compreensão fundamental da liberdade corrente nas civilizações modernas em

relação às mais antigas, como a de Esparta e Roma, por exemplo. Tudo isso com o

objetivo de mostrar que certas instituições empregadas em determinados momentos

históricos nem sempre cabem e são eficientes fora do contexto em que surgiram e

se desenvolveram. Em outras palavras, ele acreditava que o tipo de liberdade

exercido no passado seria inócuo se aplicado nas sociedades contemporâneas.

Antes dele, entretanto, o tema já era abundantemente discutido no campo da

Filosofia e Sociologia, dentre outras áreas do conhecimento humano. E entre os

principais nomes dessa fase está Montesquieu (2000), que analisava as questões da

16

liberdade em sua base de significação política. Assim, o autor concluiu que a

liberdade é o direito de fazer tudo “o que se deve querer fazer e em não ser forçado

a fazer o que não se tem o direito de querer” (p. 166). Sob esse enfoque, também

Férres (1998) entende que a liberdade é relativa, ou mesmo mítica, pelo menos nas

sociedades ocidentais, já que consiste em “poder fazer o que se deseja porque se

deseja o que os outros desejam que se deseje” (p. 16).

Ora, mesmo enfocando aspectos diferentes do que se entende por liberdade

– um se refere à política e o outro, à televisão –, os pensamentos dos dois autores

se encontram. E mais que dialogar, dizem praticamente a mesma coisa, ou seja, que

uma vez inseridos em um grupo, os sujeitos são impelidos a querer aquilo que é

mais conveniente para a coletividade em determinada época, local, conforme os

costumes e demais variantes que podem influenciar na delimitação do que uma

sociedade espera de seus integrantes. Traduzindo, as pessoas não são diretamente

livres, ainda que acreditem no contrário. E mesmo que o tentassem ser,

possivelmente acabariam pressionadas a mudar de atitude ou punidas, já que, como

membros da sociedade, devem viver e agir mediante as regras estabelecidas por

ela.

Em se relacionando liberdade com punição, aliás, a obra de Foucault (2009)

traz uma abordagem interessante e, como se poderá notar a seguir, bastante

pertinente. O autor classifica a liberdade como um direito e um bem, no sentido de

que o corpo – tido como instrumento para o castigo – é colocado em um “sistema de

coação e de privação, de obrigações e de interdições. [...] O castigo passou de uma

arte das sensações insuportáveis para uma economia dos direitos suspensos” (p.

16). Tal constatação se refere aos métodos de tortura e suplícios utilizados até

meados do século XIX como forma de punição aos condenados pela Justiça,

substituídos pelos meios que se instalaram nessa época e que perduram até os dias

atuais – uma troca jurídica, portanto.

Noutras palavras, para Foucault (id), em dado momento histórico, a liberdade

teria se transformado em uma espécie de objeto sobre o qual a Justiça pode lançar

mão para punir atos delinquentes. Por isso, além de ser um direito intrínseco à

condição de indivíduo, a liberdade também poderia ser caracterizada como um bem

jurídico passível de suspensão temporária ou definitiva, conforme as circunstâncias.

Tal entendimento não só é válido como pode ser verificado em momentos

importantes da construção do conceito de liberdade nas sociedades. Na Declaração

17

Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1998), por exemplo, obra contemporânea à

do autor e que fala a diversas nações concomitantemente, é clara a deliberação de

que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São

dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com

espírito de fraternidade” (p. 1). O acordo ainda versa que “todos são iguais perante a

lei e têm direito [...] a igual proteção da lei” (id, p. 2).

Por outro lado, o mesmo documento também determina que ninguém pode

ser preso, detido ou exilado de modo arbitrário, ou seja, sem razão motivadora, e

que mesmo naqueles casos onde o indivíduo incorra em atitude delituosa, ele tem o

direito a um julgamento para decidir sobre sua conduta. Ou seja, o indivíduo pode

sim ter a sua liberdade limitada, mas apenas em casos específicos, analisados

mediante o rigor da Justiça.

Assim sendo, fica claro o caráter ambivalente da concepção defendida por

Foucault (2009), de que a liberdade humana está sujeita à interpretação como direito

e como um bem, conforme o contexto em que é analisada.

Por fim, também a Constituição Federal do Brasil de 1988, em seu artigo 5º,

trata do tema sob abordagem semelhante. No texto, a liberdade, em todas as suas

variações, é determinada como um direito (Incisos II, IV, VI, IX, XIII, XV, XVII e XLI),

mas também um bem jurídico que, conforme as circunstâncias, pode ser retirado de

um indivíduo como forma de punição, caso ele venha a infringir a lei (Incisos XLVI e

LIV).

2.4 O SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO

Em agosto de 2012, o sistema penitenciário brasileiro compunha-se de 2.751

estabelecimentos, entre penitenciárias8 (526), colônias agrícolas ou industriais9 (37),

casas de albergado10 (67), cadeias públicas ou casas de detenção11 (1.838),

8 De acordo com o Departamento de Execução Penal do Paraná (2012i), órgão oficial subordinado ao

governo do estado, penitenciária é um estabelecimento penal de segurança máxima, destinado a presos condenados ao cumprimento da pena em regime fechado.

9 Segundo o Departamento de Execução Penal do Paraná (2012a), as colônias agrícolas ou

industriais são estabelecimentos penais de segurança média, que abrigam condenados para o cumprimento da pena em regime semiaberto.

10

Segundo Santos (2001), albergues penais são instituições que trabalham com a semiliberdade, onde o preso cumpre sua pena em regime aberto, mas pode sair para trabalhar, sem escolta nem vigilância, nos horários fixados, e depois disso retorna à instituição para ali passar a noite.

18

hospitais de custódia ou de tratamento psiquiátrico12 (29) e delegacias13 (254). Toda

essa infraestrutura, distribuída pelos 26 estados do país, mais o Distrito Federal,

concentra um total de 334.454 vagas, quase de 170 mil a menos do que o

necessário para suprir toda a demanda de presos14.

O problema do déficit de vagas no sistema prisional brasileiro não é novidade

e pauta as discussões sobre o tema há vários anos. Isso porque, dentre as

alternativas de punição15 previstas no Código Penal Brasileiro de 1940, as privativas

de liberdade “parecem ser a medida mais lógica e correta a ser tomada contra os

criminosos. Embora normalmente nos sintamos pressionados a negar, a sociedade

contemporânea clama por prisão e pela ação do Estado contra os delinquentes”

(Sormanny; Sousa, 2009, p. 4). Uma espécie de remédio social, portanto, destinado

a sanar o problema da criminalidade.

Pode-se compreender o caráter de obviedade que a prisão-castigo muito cedo assumiu. Desde os primeiros anos do século XIX, ter-se-á ainda consciência de sua novidade; e, entretanto ela surgiu tão ligada, e em profundidade, com o próprio funcionamento da sociedade, que relegou ao esquecimento todas as outras punições que os reformadores do século XVIII haviam imaginado. Pareceu sem alternativa, e levada pelo próprio movimento da história. [...] Ela é detestável solução, de que não se pode abrir mão (Foucault, 2009, p. 218).

Entretanto, essa tendência verificada no Brasil de aprisionar seus condenados

não surge limitada às fronteiras do país. Não é concepção apartada do resto do

globo, independente, única. Pelo contrário, faz parte de uma trama muito mais

complexa, que se funda na utilidade das prisões, nos objetivos que elas têm e no

que se espera do sistema de encarceramento como um todo.

11

As cadeias públicas – também chamadas de casas de detenção – definem, para Santos (2001), os locais de aprisionamento provisório, abrigos passageiros para os presos. 12

Sobre os hospitais de custódia, são estabelecimentos médicos-penais que buscam a readaptação física do preso, mediante vigilância constante e ininterrupta, durante determinado período de tempo dentro do qual o condenado recebe tratamento. Em relação às instituições destinadas ao tratamento psiquiátrico, consistem naquelas que oferecem tratamento mental aos condenados, e que buscam mais o acompanhamento do que necessariamente a cura (id). 13

Para Santos (ibid), as delegacias são repartições públicas nas quais o delegado exerce a sua função e onde, por consequência, os presos acabam abrigados por determinado período de tempo. 14

Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 15

As penas principais são de reclusão, de detenção e de multa.

19

Assim, longe de ser uma escolha banal, segundo Foucault (id), a opção pela

prisão daqueles que descumprem as leis de uma sociedade é uma característica

própria dos grupos ditos civilizados. Para o autor, isso se deve ao duplo caráter da

liberdade que, como já dito anteriormente, se configura, ao mesmo tempo, como um

direito e um bem jurídico, e que não apenas é comum a todos da mesma maneira

como também se liga aos sujeitos por meio da emoção, de sentimentos universais e

constantes. Consequentemente, segundo o teórico, a sua limitação ou perda

acarreta a mesma sensação de dano, custa o mesmo preço simbólico para todos os

integrantes da comunidade; uma pena igualitária, portanto, e justamente por isso,

ainda mais eficiente do que a aplicação de multas, por exemplo.

Foucault (ibid) entende que, como a falta de liberdade tem um custo para o

condenado, certo é pensar que há aí uma faceta jurídico-econômica da pena. É

como uma reparação, pois “retirando tempo do condenado, a prisão parece traduzir

concretamente a ideia de que a infração lesou, mais além da vítima, a sociedade

inteira” (p. 218). Também Rego (2004) partilha dessa compreensão e defende que a

prisão “traz consigo a concepção cristã da penitência, cujo objetivo quase

terapêutico é o de submeter o criminoso a condições precárias de vida como forma

de pagar o mal que fez à sociedade. É preciso sofrer para reparar as faltas

cometidas” 16.

Todavia, além de exigir uma espécie de reparação pelo erro cometido, a

cadeia também carrega, intrinsecamente, outra função igualmente importante. De

acordo com a obra de Foucault (2009), junto com essa relativa reparação

econômica, a prisão também cumpriria a função de transformar o indivíduo, torná-lo

uma pessoa melhor. Por isso, além do aspecto jurídico-econômico, a prisão –

considerada por ele a “mais civilizada das penas” (p. 219) – também se serve de um

caráter técnico-disciplinar, como se fosse, em uma associação bastante simplória,

uma espécie de quartel, ainda que mais estrito, ou escola, porém sem qualquer

compaixão. Nesse sentido, também Sousa (2004a) apurou, mediante pesquisa junto

a funcionários e dirigentes de complexos prisionais, que as cadeias de modo geral

têm essa conotação dupla de punir e educar, de ressocializar o preso. “Funciona

16

REGO, Isabel Pojo do. Sociologia da prisão. Seção Sociedade e Estado. Brasília, DF, v. 19, n.1, jan-jun. 2004. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0102-69922004000100011&script=sci_arttext. Acesso em: 20/03/2012.

20

para punir, afastar do convívio social o infrator e, ao mesmo tempo, recuperar esse

elemento, capacitá-lo pra conviver novamente no seio da sociedade” (p. 4).

Em resumo, essas seriam as vantagens que, reunidas, teriam justificado a

utilidade das prisões desde o momento em que se buscou uma forma mais coerente

de punição em substituição aos suplícios, e que teriam transformado as cadeias na

opção mais sólida e eficaz para se chegar a esse objetivo.

Por outro lado, considere-se também o seguinte: desde a implementação da

Constituição Brasileira de 1988, ficou estabelecido que, no país, a penalização

máxima permitida é o aprisionamento. Ou seja, não se admite, em território nacional,

a execução de penas capitais17, salvo em situações de guerra, nem de caráter

perpétuo18, nem de trabalhos forçados, nem mediante crueldade. Portanto, afora

sentenças mais brandas como a de pagamento de multas ou de prestação de

serviços à comunidade, ou outras em menor escala, como aquelas em que se

permite, já de início, o cumprimento da pena em regime aberto ou semiaberto,

ligadas a crimes igualmente menos graves e/ou contravenções, o acolhimento dos

condenados da Justiça em instituições penais, seja pelo tempo que for, é a única

saída para a penalização de criminosos no Brasil.

No entanto, há outros fatores que influenciam esse cenário. Para Viégas

(2003), entre as principais razões para o aumento dos índices da criminalidade e,

por consequência, do número de apenados, está o crescimento da população

urbana de uma sociedade. Também Resende (2008) partilha dessa concepção,

porém de modo ainda mais direcionado, já que não se refere apenas às regiões

urbanas em geral, mas àquelas no entorno das grandes metrópoles. Ele defende

que “as maiores taxas de criminalidade podem ser vistas nas regiões metropolitanas

dos diferentes estados. Dos 141 municípios com taxa de homicídios maior do que 50

por cem mil habitantes, 54 municípios têm uma população maior que cem mil

habitantes” (p. 216).

Para se ter ideia, a taxa de homicídios na Grande Curitiba, cuja população é

de 3.174.201 habitantes (IBGE, 2010b), foi de 49 mortes para cada 100 mil

habitantes em 2011, índice muito acima do máximo estabelecido pela Organização

17

Segundo Cavalcanti (2010), penas capitais são aquelas que culminam na morte do condenado.

18

De acordo com o artigo 75 do Código Penal, o tempo máximo para o cumprimento das penas privativas de liberdade não pode ser superior a 30 anos, mesmo que os anos de condenação ultrapassem esse período.

21

das Nações Unidas – ONU, que é de 10 assassinatos por 100 mil habitantes

(MARÉS, 2012), e praticamente o mesmo mencionado na obra de Resende (2008),

em trecho já citado. Também Panucci (2004) identifica o fator urbanização entre os

primordiais para o desenvolvimento do crime, em várias de suas concepções:

No Brasil, quando se compara as taxas de homicídios entre estados e municípios, a dimensão de maior impacto é o grau de urbanização. Estados e cidades com maior população rural revelam taxas de homicídio muito inferiores aos locais em que a maioria da população concentra-se na zona urbana. [...] Os fatores muito intensos de déficits sociais são capazes de moldar a personalidade, os valores, de tal modo que é de ser observado se o comportamento do delinquente foi criado pelo próprio meio, pela sociedade desorganizada que se forma em torno das grandes cidades (p. 18-19).

De fato, a população brasileira vem crescendo nas últimas décadas,

principalmente a partir dos anos 40, quando começaram a cair os índices de

mortalidade no país em contrapartida aos níveis de fecundidade, que ficaram mais

acentuados (IBGE, 2011). “Em comparação com o Censo 2000, a população do

Brasil apresentou um crescimento relativo de 12,3%” 19. No mesmo período,

entretanto, os índices relativos à população carcerária foram bem mais significativos:

saltaram de 233 mil presos, em 2000, para 496 mil em 2010 – uma elevação de

113% (Canário, 2011).

Com isso, é possível mesmo admitir que o adensamento urbano também

figure entre os fatores para o surgimento e crescimento da criminalidade no Brasil,

mas ainda há mais que se considerar. Outros estudos apontam que a acentuação no

rigor da lei é, igualmente, um aspecto determinante para o aumento do número de

internos nas cadeias.

Várias explicações podem ser encontradas para se entender o fenômeno do crescimento da população carcerária. Os números mostram que o endurecimento na punição de certos crimes levou mais gente às prisões. [...] Só que o maior rigor das leis não pode ser considerado uma vitória na luta contra o crime (id

20).

19

INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Sinopse do Censo Demográfico 2010 – Primeiros resultados definitivos do Censo 2010: população do Brasil é de 190.755.799 pessoas. Brasília, DF, 2011. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/presidencia/noticias/noticia_visualiza.php?id_noticia=1866&id_pagina=1. Acesso em: 22/03/2012. 20

CANÁRIO, Pedro. População Carcerária dobra em dez anos. Consultor Jurídico. [S.l.], 2011. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2011-jul-23/numero-presos-cresce-indice-criminalidade-brasil. Acesso em: 23/03/2012.

22

Como se pode notar, a explicação para a situação carcerária que se desenha

no Brasil depende de variados fatores, inter e independentes entre si, e que regulam

a concepção de prisão que se tem atualmente no país. Em todo caso, é certo que

uma vez aumentada a criminalidade, também a população carcerária será ampliada,

ainda que em proporções diferentes. E como se tem visto, a infraestrutura do

sistema prisional brasileiro caminha a passos bem mais lentos, razão pela qual o

déficit de vagas nas unidades penais já representa mais de 33% da quantidade total

de presos, segundo análise dos dados acerca da quantidade de internos em relação

às vagas disponíveis.

2.4.1 Medidas de ressocialização e reincidência criminal

Uma vez que a prisão surge socialmente e legalmente como castigo, mas

também como medida corretiva, há de se explorar o caráter de ressocialização das

penas que, segundo Foucault (2009), “fazem parte da armadura institucional da

detenção penal” (p. 220). O autor defende que a disciplina, na figura das leis, surge

como uma forma de disfarçar uma intenção maior que é a do controle sobre o corpo

do condenado que, por sua vez, deve se tornar dócil e útil ao fim da pena, para

então ser reinserido e reaproveitado dentro da lógica capitalista.

Na verdade, a prisão foi criada como uma instituição completa e austera, se transformando em um sinônimo de privação da liberdade, um bem decantado como universal e medido em tempo na sociedade mercantil, e correção individualizada dos detentos que podiam ser libertados antes do prazo. Sua base não está na violência dos guardas ou no despotismo administrativo, mas no fato de exigir-se que a prisão seja útil, desempenhando um papel técnico positivo e realizando transformações no indivíduo. (Sormanny; Sousa, 2009, p. 9).

Ora, certo é que uma das principais finalidades da prisão na modernidade

consiste mesmo na recuperação dos indivíduos e na sua recolocação no meio

social. Tanto é verdade que Capez (2000) trata do tema já dentro da definição do

que se entende legalmente por pena no Brasil, ou seja, de forma completamente

comprometida, deixando cedo os dois conceitos interligados. Para ele, trata-se de

uma “sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, e, execução de uma

sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou

privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao

23

delinquente, promover a sua readaptação social e prevenir novas transgressões pela

intimidação dirigida à coletividade” (p. 313).

Nesse sentido, o autor defende que a ressocialização do preso se faz

presente em duas vertentes teóricas. A relativa, finalista, utilitária ou da prevenção,

que defende o fim prático e imediato de prevenção geral ou especial do crime e na

qual “a pena objetiva a readaptação e a segregação sociais do criminoso como

meios de impedi-lo de voltar a delinquir” (id). E a mista, eclética, intermediária ou

conciliatória, segundo a qual “a pena tem a dupla função de punir [...] e prevenir a

prática do crime, pela reeducação e pela intimidação coletiva” (ibid, p. 313 e 314).

Portanto, o entendimento teórico corrente acerca da recuperação do preso

gira em torno das iniciativas educacionais de reintegração social, cuja função

primordial é colocar o preso em condição de voltar a conviver pacificamente com os

seus semelhantes. Tanto isso é verdade que Alvim (2006) defende que “a forma

através da qual o infrator é punido tem que ser eficaz e a pena deve ser justa, uma

vez que o condenado deve estar recuperado quando sair da prisão, pronto para

reincorporar-se à sociedade e não mais agir em desacordo com a lei” 21. Exemplo

disso, segundo o autor, é o trabalho desenvolvido pela Associação de proteção e

Assistência ao Condenado – Apac. Ele aponta que os presídios administrados pela

instituição não apenas no Brasil, mas também na Argentina e no Peru, conseguem

desenvolver um trabalho de resgate social dos presos, e dessa forma recuperam e

ressocializam os indivíduos, exatamente conforme versam as teorias.

Os presos são tratados de forma diferente, como se fossem pessoas detentoras de direitos e deveres assim como qualquer outra, o que não ocorre nos demais presídios brasileiros [...]. Nos presídios sob a administração da Apac não existem policiais civis nem militares, os internos têm as chaves de todas as portas e portões da unidade – inclusive entrada e saída. No interior da unidade há lanchonete e sorveterias, o dinheiro não é proibido, o uso de roupas normais é permitido. Todas essas mudanças implicam na porcentagem de reincidência: 4,5 por cento, contra 85 por cento de instituições tradicionais (id

22).

Apesar de representar um trabalho importante, no entanto, os métodos

empregados pela instituição no trabalho de recuperação dos presos não vão além

21

ALVIM, Wesley Botelho. A ressocialização do preso brasileiro. Direito na net. [S.l: s.n.], 2006. Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2965/A-ressocializacao-do-preso-brasileiro. Acesso em: 24/03/2012. 22

Idem ao 21.

24

do que a legislação determina, como é possível perceber. O diferencial em relação

às demais instituições penais, na verdade, se dá muito mais pelo respeito ao preso

como ser humano do que pelas atividades desenvolvidas, já que a Apac atua no

sentido de realmente cumprir os preceitos de reintegração dos sujeitos na

sociedade.

Entretanto, para Silva (2003), “a regeneração no sistema penitenciário

nacional, apesar de todas as reformas que praticamente nascem junto com a prisão,

sempre foi uma dissimulação justificada” (p. 33). O autor esclarece que a prisão –

longe de reeducar os criminosos e prepará-los para um retorno à sociedade – acaba

os transformando em sujeitos ainda mais nocivos, seja por conta dos tormentos

físicos pelos quais passam, seja pelas humilhações a que são submetidos, seja pelo

convívio entre os próprios condenados. Com isso, segundo o teórico, as cadeias

estariam muito mais próximas de serem indústrias do crime, que transformam os

presos em sujeitos ainda piores, do que de se tornarem instituições

ressocializadoras. “Hoje os juízes sentenciam, condenam acusado ou acusada a

uma pena. E sem se dar conta, condenam os réus a outra pena muito mais grave.

No despojamento frio do texto do Código, a sentença aparece como uma privação

de liberdade. Na realidade, muitas são cumpridas com requisitos da Casa de

Correção Imperial” (id).

Também Assis (2007) acredita que as penas infligidas aos condenados são

muito maiores do que a simples suspensão do direito de ir e vir:

A partir do momento em que o preso passa à tutela do Estado, ele não perde apenas o seu direito de liberdade, mas também todos os outros direitos fundamentais que não foram atingidos pela sentença, passando a ter um tratamento execrável e a sofrer os mais variados tipos de castigos, que acarretam a degradação de sua personalidade e a perda de sua dignidade, num processo que não oferece quaisquer condições de preparar o seu retorno útil à sociedade (p. 75).

Entre os problemas apontados por Assis (id) como empecilho à recuperação

do preso estão a superlotação, a precariedade estrutural das unidades prisionais, a

insalubridade, a má alimentação, a falta de trabalho e de estudo e o uso de drogas.

Para ele, tais fatores, somados ainda à falta de um esquema verdadeiramente eficaz

de segurança nessas instituições e ao ócio dos detentos, levam “à deflagração de

outro grave problema do sistema carcerário brasileiro: as rebeliões e as fugas de

presos” (p. 76). O autor ainda defende que, embora se caracterizem pela violência,

25

essas reações nada mais são do que reivindicações de direitos e de respeito, uma

forma de chamar a atenção das autoridades para a situação à qual eles estão

subjugados.

Já para Silva (2003), salvo raras exceções, o ideal de ressocialização ainda é

uma realidade bem distante da que se encontra, de fato, nas instituições penais

brasileiras. Um objetivo descrito e discutido, mas que na prática se comporta de

forma oposta. “Na atualidade o modelo ressocializador demonstrou ser ineficaz,

sendo provada a sua falência por meio de investigações empíricas que identificaram

as dificuldades estruturais e os escassos resultados conseguidos pelo sistema

carcerário em relação ao objetivo ressocializador” (p. 39).

Desse modo, segundo os autores, é de se concluir que a efetiva recuperação

do preso não é tarefa fácil de ser alcançada. E justamente por isso é que, segundo

eles, muitos presos acabariam reincidindo na prática criminosa, e vez por outra

retornando às prisões. No entanto, se um dos principais objetivos da pena imposta

ao condenado é o de ressocializá-lo, ou seja, recuperá-lo e reinseri-lo na sociedade,

então o fator reincidência pode ser considerado a prova de que tal sistema não tem

sido eficaz para restaurar esse indivíduo (Assis, 2007). Para se ter ideia, tal é o

tamanho do problema que, “embora não haja números oficiais, calcula-se que, no

Brasil, em média, 90% dos ex-detentos que retornam à sociedade voltam a delinquir,

e [...] acabam retornando à prisão” (p. 77).

Por outro lado, Julião (2010) entende que a reincidência não se funda apenas

nas questões internas, intrínsecas ao sistema penitenciário, “mas também por

fatores externos inerentes ao ambiente social, político, econômico e cultural em que

o apenado vive” 23. Em outras palavras, o autor defende que a reincidência não

define, por si só, o sucesso ou o fracasso das intenções do sistema penal em

relação ao indivíduo. Tal fenômeno, segundo ele, seria resultado de vários

movimentos combinados que se centralizariam na figura do criminoso.

Portanto, a questão da reincidência é um problema que preocupa a sociedade

no sentido de que se constitui não apenas como um agravante da criminalidade

primária, mas também como “a espinha dorsal das chamadas carreiras criminais, ao

23

JULIÃO, Elionaldo Fernandes. O impacto da educação e do trabalho como programas de reinserção social na política de execução penal do Rio de Janeiro. Revista Brasileira de Educação. Rio de Janeiro, v. 15, n. 45, set-dez. 2010. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-24782010000300010&script=sci_arttext. Acesso em: 25/03/2012.

26

redor dos quais o fenômeno da criminalidade adquire uma dimensão estrutural

dentro da sociedade” (MARIÑO, 2002, p. 220).

2.4.2 O cenário no estado do Paraná

Segundo o Departamento de Execução Penal do Paraná (2012f), o sistema

penal paranaense começou a ser formado em 1909, quando surgiram as cadeias

públicas no estado e também quando foi inaugurada a primeira penitenciária da

região, no bairro Ahú, em Curitiba, sob a influência das “ideias correspondentes ao

Período Criminológico em seu momento inicial de Antropologia Criminal” (Lima,

200624). De lá para cá, sempre se ampliando, a estrutura passou por diversas

mudanças e, em 1954, foi unificada por um único órgão administrativo, denominado

primeiramente Departamento de Estabelecimentos Penais do Estado – Depe,

passando a Departamento Penitenciário do Paraná – Depen-PR em 2001 e, por

último, em agosto de 2012, Departamento de Execução Penal do Paraná – Depen-

PR, subordinado à Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e dos Direitos

Humanos – Seju (Depen-PR, 2012f)25.

2.4.2.1 Infraestrutura

Em agosto de 2012, o Depen-PR possui três níveis executivos:

estabelecimentos penais fechados, que podem ser definitivos e/ou provisórios, os

semiabertos e os patronatos penitenciários, que atendem os egressos beneficiados

com a progressão para o regime aberto, aqueles em liberdade condicional, os

sentenciados a trabalhos externos, em liberdade vigiada, prestação de serviços à

comunidade e suspensão condicional da pena (id, 2012d). Trata-se de 260 unidades

penais, que juntas representam 9,45% de toda a estrutura punitiva nacional e que

oferecem 21.311 vagas para 26.230 presos – um déficit de 4.919 vagas, portanto, ou

24

Segundo Lima (2006), essa primeira penitenciária incorporou o ponto de vista das figuras históricas já mencionadas, ou seja, de que representava a tendência hegemônica da época. Essa estrutura possuía, inicialmente, 52 celas individuais e contava com cozinha, horta, alfaiataria, sapataria, tipografia e marcenaria. A autora explica que o trabalho diurno e o estudo noturno eram obrigatórios, até que o preso soubesse ler, escrever e contar. As disciplinas ministradas eram noções de gramática, aritmética, geografia e história do Brasil. 25

Conforme estrutura organizacional atual (Decreto nº 5558/12 – PR) junto aos anexos, na página 148.

27

23,08%26. Entretanto, apesar da falta de vagas, os principais objetivos do conjunto

punitivo consistem na efetiva reinserção dos apenados na sociedade, através do

respeito à pessoa e humanização das prisões, bem como a busca pela excelência

na gestão penal (ibid, 2012b). Talvez por isso é que o governo do Paraná tem

investido no setor e ampliado tais instalações.

Para se ter ideia, no início de março de 2012, um novo prédio do complexo

pertencente à Penitenciária Central do Estado foi inaugurado. A entrega representou

a abertura de 1.156 novas vagas no local e precedeu a inauguração da Penitenciária

Estadual de Cruzeiro do Oeste, em 30 de março, com 720 novas vagas criadas com

o objetivo de diminuir a população carcerária das delegacias da região (GUILLEN;

LOPES, 2012). Essas vagas, somadas às outras, provenientes das inaugurações

realizadas em seguida, no mês de maio – a unidade de regime semiaberto de

Maringá (Colônia Penal Industrial), com 330 novas vagas, e a reforma e ampliação

da Cadeia Pública de Foz do Iguaçu, com a criação de 700 novas vagas –

diminuíram um pouco o déficit verificado no estado na época (Depen-PR, 2012e).

Do mesmo modo, em abril de 2012 foi iniciado o processo de licitação para a

construção de um novo estabelecimento penal no complexo de Piraquara, com

capacidade para 516 presos de 18 a 25 anos de idade. A obra, que segundo o

Depen-PR (id) faz parte do Programa Nacional de Apoio ao Sistema Prisional do

Ministério da Justiça, será viabilizada por meio da parceria entre os governos federal

e estadual. Ao todo, projeta-se a construção, até 2014, de mais 14 estabelecimentos

penais, abrindo 6.348 novas vagas no sistema penitenciário paranaense (ibid27).

Ainda de acordo com o Depen-PR (ibid), as intenções do governo do estado

também incluem, além da unidade destinada a jovens e adultos em Piraquara,

outros cinco estabelecimentos penais que devem ser construídos em Apucarana,

Campo Mourão, Foz do Iguaçu, Londrina e Maringá, com 540 vagas cada, ao

mesmo tempo em que serão ampliados outros oito estabelecimentos penais. No

complexo penitenciário de Piraquara, a meta é criar uma unidade a mais, com 492 26

Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 27

DEPARTAMENTO DE EXECUÇÃO PENAL DO PARANÁ. Governo inaugura novas instalações da PCE e envia Mensagem à Assembleia para criação de Fundos Estaduais. Seção Notícias. Curitiba, PR, [2012]. Disponível em: http://www.depen.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=311&blid=8&tit=Governo-inaugura-novas-instalacoes-da-PCE-e-envia-Mensagem-a-Assembleia-para-criacao-de-Fundos-Estaduais. Acesso em: 28/03/2012.

28

vagas, e outra com 432 vagas. Já em relação às unidades de Foz do Iguaçu,

Maringá, Ponta Grossa e as duas de Londrina, o plano é de expansão e, com isso,

devem ser geradas mais 384 novas vagas em cada unidade, assim como em

Cascavel, que deverá ganhar 288 novas vagas. Entretanto, Lima (2006) enfatiza que

o crescimento na quantidade de instituições penais e, por consequência, do

quantitativo total de vagas, deve ser analisado com cautela.

É necessário ressaltar que esta conclusão pode não representar fielmente a realidade, já que esses estados (assim como os outros da Federação), segundo o DEPEN (2005), possuíam em junho de 2004, além dos presos sob a responsabilidade da administração penitenciária, um outro contingente, isto é, aqueles sob os cuidados das secretarias estaduais de segurança pública (id

28).

Ora, tal fator há mesmo de ser considerado, já que diminui o universo de

vagas disponíveis, mesmo com as novas instalações. Afinal, apesar da inauguração

e dos projetos iminentes, o Depen-PR também recebeu 7.026 presos em 2012, que

estavam sob a guarda da Secretaria de Estado de Segurança Pública desde 2011.

“Com isso, dos mais de 16.000 presos que estavam em cadeias e delegacias de

polícia do Paraná, em janeiro de 2011, hoje restam cerca de 12.000” (Depen-PR,

2012e29).

Até o final de 2013, presos de 29 carceragens administradas pela Secretaria da Segurança Pública devem ser transferidos para o Sistema Penitenciário Estadual. Com a medida, a responsabilidade pela guarda dos detentos fica a cargo da Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos. A previsão do governo é que até o mês de junho, cerca de 2,5 mil detentos deixem as delegacias e distritos. A prioridade será a transferência das mulheres. Aproximadamente 660 presas que estão em delegacias na região de Curitiba e no interior serão levadas para uma unidade feminina no Complexo Penitenciário de Piraquara (GUILLEN; LOPES, 2012

30).

28

LIMA, Regina Campos. Um panorama sobre o Sistema Penitenciário Paranaense. Revista Sociológica Jurídica. [S.l.], n. 3, jul-dez. 2006. Disponível em: http://www.sociologiajuridica.net.br/numero-3/179-um-panorama-sobre-o-sistema-penitenciario-paranaense-. Acesso em: 28/03/2012. 29

DEPARTAMENTO DE EXECUÇÃO PENAL DO PARANÁ. Governo inaugura novas instalações da PCE e envia Mensagem à Assembleia para criação de Fundos Estaduais. Seção Notícias. Curitiba, PR, [2012]. Disponível em: http://www.depen.pr.gov.br/modules/noticias/article.php?storyid=311&blid=8&tit=Governo-inaugura-novas-instalacoes-da-PCE-e-envia-Mensagem-a-Assembleia-para-criacao-de-Fundos-Estaduais. Acesso em: 28/03/2012. 30

GUILLEN, Fabio; LOPES, Elisa. Oito mil presos devem ser transferidos de delegacias para penitenciárias. Gazeta do Povo. Curitiba, PR, 3m mar. 2012. Caderno Vida e Cidadania. Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?tl=1&id=1239352&tit=Nova-

29

Portanto, é possível constatar, como o fez Lima (2006), que tais ampliações

não resultam, necessariamente, numa contenção ou diminuição nos índices

relacionados à população carcerária, muito menos na resolução definitiva do

problema da superpopulação carcerária no estado, ainda que se configure como “um

dos mais graves problemas diagnosticados pelo Depen nacional” (id31). Todavia,

como já observado, é de se compreender que o Paraná tem buscado diminuir os

problemas relacionados à falta de vagas nas suas instituições penais, raiz das

superlotações que contribuem para outras dificuldades, como a disseminação de

doenças, violência e rebeliões, entre outras coisas.

2.4.2.2 Projetos de recuperação dos presos

Entre os projetos de recuperação e reinserção dos presos no convívio social

desenvolvidos pelo sistema penal paranaense está o Oficinarte, no qual os presos

se expressam através de criações artísticas de modo significativo, “demonstrando o

pensamento, a sensibilidade, a imaginação, a percepção e a intuição, visando a

aprimorar o desenvolvimento de suas capacidades criativas” (Depen-PR, 2012g32).

Nesse sentido, segundo a iniciativa, a arte é tratada como instrumento para que os

presos possam interpretar o mundo e transformar as experiências vividas em

criações originais – um projeto plástico de ressocialização dos condenados, cujas

obras estão incluídas no Museu Virtual da instituição33. Porém, o trabalho limita-se

apenas aos presos atendidos no Complexo Médico Penal, localizado em Piraquara,

na região metropolitana de Curitiba.

Em relação ao investimento no trabalho dos presos, o Depen-PR (2012j)

aponta a existência de 466 canteiros, sendo 359 próprios e 107 de empresas. E

penitenciaria-de-Cruzeiro-do-Oeste-vai-aliviar-delegacias-da-regiao-Noroeste. Acesso em: 31/03/2012. 31

LIMA, Regina Campos. Um panorama sobre o Sistema Penitenciário Paranaense. Revista Sociológica Jurídica. [S.l.], n. 3, jul-dez. 2006. Disponível em: http://www.sociologiajuridica.net.br/numero-3/179-um-panorama-sobre-o-sistema-penitenciario-paranaense-. Acesso em: 28/03/2012. 32

DEPARTAMENTO DE EXECUÇÃO PENAL DO PARANÁ. Oficinarte. Curitiba, PR, [2012]. Disponível em: http://www.oficinarte.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=2. Acesso em: 28/03/2012. 33

É possível acessar as obras do museu no link: http://www.oficinarte.pr.gov.br/oficinarte/modules/galeria/listaEventos.php.

30

neles, atuam 2.987 presos – 1.597 nos canteiros próprios e 1.390 nos canteiros das

empresas. Assim, segundo a instituição, o percentual de internos que trabalham de

alguma forma chega a 20,92%. Já o desenvolvimento educacional dos presos é

tarefa proveniente de um convênio entre a Secretaria de Justiça, Cidadania e

Direitos Humanos – Seju, gestora do Depen-PR, e a Secretaria de Estado da

Educação – Seed, para a escolarização dos internos a nível fundamental e médio.

Segundo o Depen-PR (2012c), em 2010, o atendimento às unidades penais chegou

a abranger 25% da população carcerária. Além disso, desde 1993 também são

oferecidos cinco cursos de qualificação profissional aos encarcerados, cujo objetivo

é preparar os alunos para a reinclusão no mundo do trabalho depois do

cumprimento da pena, e abrangem as áreas de prótese dentária, eletricista

instalador predial de baixa tensão, auxiliar de serviços de panificação, hidráulica e

pintura (id, 2012h).

Há ainda outros processos que auxiliam o desenvolvimento do preso de modo

paralelo, como os relacionados à educação religiosa, acompanhamento psicológico

e acompanhamento jurídico. Ainda assim, segundo Lima (2006), enquanto algumas

unidades penais aparentam realmente se preocupar com a aplicação de tais

programas, prioritariamente as instaladas no interior do estado, outras,

especificamente as de Piraquara, ignoram a aparelhagem disponível para o

crescimento intelectual do preso.

Nem mesmo o trabalho que é tão valorizado no discurso do tratamento penal é ofertado de modo satisfatório no sistema penitenciário paranaense. [...] Mesmo naquelas que fogem a esse escopo, o que se observa é o oferecimento de atividades que, em geral, não possibilitam o desenvolvimento de capacidades profissionais ou que podem, posteriormente, quando o sentenciado se encontrar em liberdade, habilitá-lo para o mercado de trabalho. Situação parecida é a dos cursos profissionalizantes que, quando oferecidos, tendem igualmente a se voltar para áreas que dificilmente habilitarão o condenado a competir no mercado de trabalho (id

34).

Isso tudo, segundo a autora, serve para demonstrar que o sistema penal

paranaense opera em duas esferas – a teórica e a prática – que não se

34

LIMA, Regina Campos. Um panorama sobre o Sistema Penitenciário Paranaense. Revista Sociológica Jurídica. [S.l.], n. 3, jul-dez. 2006. Disponível em: http://www.sociologiajuridica.net.br/numero-3/179-um-panorama-sobre-o-sistema-penitenciario-paranaense-. Acesso em: 28/03/2012.

31

correspondem adequadamente. E tal condição coloca toda a infraestrutura em sério

risco de falência, situação semelhante à do complexo nacional.

2.4.2.3 Complexo penal em Piraquara

A cidade de Piraquara, na Grande Curitiba, concentra sete estabelecimentos

penais, quais sejam: o Centro de Triagem, a Colônia Penal Agroindustrial do Paraná

(CPAI), a delegacia de Polícia Civil, a Penitenciária Central do Estado (PCE), as

Penitenciárias Estaduais de Piraquara (PEPs) I e II e a Penitenciária Feminina do

Paraná. Juntas, essas unidades concentram 6.278 vagas para um total de 6.389

presos, um déficit de 111 vagas, ou 1,77%, índice bastante inferior do que o

registrado a nível estadual, que é de 23,08%35.

Em agosto de 2012, o complexo penal instalado em Piraquara representa

29,46% de todas as vagas disponíveis no estado. Entretanto, apesar de relevantes,

apenas uma das sete unidades apresenta condições de funcionamento

consideradas regulares – o centro de triagem. Quanto às demais, segundo

levantamento divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, por meio do

sistema Geopresídios (2012), a delegacia figura na categoria ‘ruim’, enquanto as

quatro penitenciárias e a colônia pesam na classificação ‘péssimo’36. Para fins desta

pesquisa, entretanto, por recomendação da Escola de Educação em Direitos

Humanos do Depen-PR, conforme consta na Justificativa desta pesquisa, serão

estudadas a CPAI e a PCE, simultaneamente.

2.4.2.3.1 Colônia Penal Agroindustrial do Paraná

Inaugurada no ano de 1941, consiste em um estabelecimento penal de

segurança média, voltado a condenados masculinos em cumprimento de regime

punitivo semiaberto (Depen-PR, 2012a). Com área total construída de mais de 22

mil metros quadrados, a estrutura abriga 1.453 presos, distribuídos em 1.395 vagas,

35

Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 36

Idem ao 35.

32

e registrou, entre agosto de 2011 e agosto de 2012, um total de 132 fugas37. Além

disso, inclui uma escola de alfabetização e profissionalização dos detentos e parque

industrial com cinco mil metros quadrados, que abrigam três empresas.

De acordo com o Depen-PR (id), a Paraná Esporte utiliza a mão de obra dos

internos para a fabricação de bolas de futebol de campo e de salão, além de redes

esportivas e bonés, dentro do projeto Pintando a Liberdade. O programa surgiu de

uma iniciativa do Ministério do Esporte e Turismo com o objetivo de promover as

atividades esportivas dos menores carentes. Já a Auto Capas e Capotas Felipe

produz capotas para vários tipos de pick-ups nacionais e importadas, além de redes

para caçambas, capas para carros e marítimas e sacos de areia para carrocerias,

enquanto a Flexi Office Store trabalha com a industrialização e pintura de

aglomerados de fibra de madeira em peças para móveis de escritório.

2.4.2.3.2 Penitenciária Central do Estado

Destinada a presos masculinos condenados a penas de cumprimento em

regime fechado, configura-se como estabelecimento de segurança máxima (ibid,

2012i) e concentra uma população carcerária de 1.432 pessoas distribuídas entre

1.480 vagas38.

Segundo Lima (2006), a unidade foi inaugurada no ano de 1954, tendo sido a

terceira unidade penal construída no Paraná, e funciona em uma estrutura com 25

mil metros quadrados, dentro da qual há 11 galerias, duas cozinhas, dois refeitórios,

sete pátios, 63 quartos para visita íntima, nove salas de aula, uma biblioteca, quatro

salas para atendimento técnico, uma enfermaria, um consultório médico e um

odontológico. Entretanto, tais dados não contemplam as melhorias verificadas com a

inauguração da nova ala, em março de 2012. De acordo com o sistema

Geopresídios (CNJ, 2012), não houve registros de fugas na unidade no período

compreendido entre agosto de 2011 e agosto de 201239.

37

Informações colhidas em 06/08/2012 no banco de dados Geopresídios, do Conselho Nacional de Justiça. O levantamento, atualizado diariamente, pode ser consultado acessando o endereço http://www.cnj.jus.br/geo-cnj-presidios/?w=1280&h=800&pular=false. 38

Idem ao 37. 39

Idem ao 37.

33

Por fim, depois de explicitados os meandros do sistema penal brasileiro,

paranaense e de Piraquara, com destaque aos locais que serão de fato trabalhados,

faz-se necessário compreender de que forma os presos – objetos centrais desta

pesquisa – são abordados e construídos no relato midiático.

2.5 O CRIMINOSO E A MÍDIA

A construção social da imagem do sujeito criminoso, longe de ser um

processo simples, depende de diversos fatores, nem sempre coerentes. Partindo do

princípio de que o crime consiste em tudo aquilo considerado ilegal dentro de uma

sociedade, o infrator é, cedo, resumido como marginal, bandido, deslocado, o que

não traduz com justiça a complexidade da personalidade e nem mesmo os atos ou

motivações desses sujeitos. E mesmo antes de serem definitivamente condenados,

via de regra esses indivíduos acabam julgados, execrados e até punidos pelos

diversos atores das sociedades, dentre os quais a mídia se destaca com excelência.

Desde o momento em que se abandonaram os suplícios físicos, segundo

Foucault (2009), teve início um período que ainda não se encerrou e que inclui a

inversão de objetos e a transmutação de valores para o exercício da punição. “É a

própria condenação que marcará o delinquente com sinal negativo ou unívoco:

publicidade, portanto, dos debates e da sentença” (p. 15). Tal premissa, como se

tem visto, não apenas permanece presente como parece servir de justificação para

um movimento constante, apesar de ilógico, de etiquetar os indivíduos segundo o

que se cogita que ele tenha feito já no momento do surgimento da suspeita.

Entretanto, se ninguém pode ser considerado culpado até uma condenação

final e definitiva, como determina a Constituição Federal de 1988, então rotular os

sujeitos como criminosos ou bandidos, muitas vezes até mesmo antes de serem

capturados, é no mínimo injusto, para não dizer ilegal.

Nesse confronto se destacam não apenas o sistema de Justiça criminal (polícia, promotores, juízes, agentes da execução da pena, assistentes sociais e psicólogos responsáveis pelos laudos criminológicos), mas membros da sociedade (vizinhos, conhecidos, colegas, ex-empregadores e futuros empregadores), políticos, imprensa e, também, os cientistas sociais profissionais que elaboram teorias científicas sobre a ocorrência do comportamento criminoso (MAGALHÃES, 2006, p. 76).

34

Para Duarte (2012), o sistema penal se estrutura sobre uma lógica

maniqueísta entre o bem e o mal, ou seja, admite apenas dois lados de uma coisa

jurídica: a parte certa e a errada. Segundo o autor, essa forma de tratar os

acontecimentos, dentro do que se entende por senso comum penal acaba por limitar

a análise dos fatos, prejudicando a busca das reais causas dos problemas.

Essa forma simplificada de pensar nasce da intolerância ou do desconhecimento da verdade do outro, é entender as coisas sem perceber o motivo, mas sim apenas numa relação de causa e efeito, mas o problema do maniqueísmo não é a existência de forças antitéticas, mas sim a defesa de que um é o bem e o outro o mal e por isso este deve ser destruído por aquele (id

40).

De acordo com o autor, é nessa perspectiva que a mídia atua, já que

enquanto formadora de opinião é também responsável por estimular esse caráter

parcial de se perceber as situações segundo o Direito Penal. Ele acredita que a

mídia, na figura da imprensa, traz intrinsecamente a característica de ser

contundente ao tratar determinados temas, tomando partido, e com isso molda a

opinião do público segundo a sua visão crítica e tendenciosa da coisa, banalizando e

estigmatizando o indivíduo.

A mídia tem criminalizado a exclusão social através do Direito Penal, seu poder é extremamente arbitrário e os danos causados às pessoas em razão da veiculação por pretensa prática de crime – via de regra ainda em fase de investigação – jamais poderão ser reparados, haja vista que o desmentido nunca terá a força do mentido. A mídia condena antes e durante o processo criminal, sendo completamente irrelevante o resultado do mesmo (GUIMARÃES apud Duarte, 2012

41).

Não é preciso ir longe para encontrar exemplos dessa realidade que, embora

não esteja necessariamente presente em todos os veículos, deixa claro que o

jornalismo tem ignorado alguns princípios importantes, como a correta apuração, o

respeito à presunção de inocência – um dos fundamentos da atividade jornalística,

segundo o Código de Ética da profissão (FENAJ, 2007) –, e o tratamento da notícia

como produto ou simples preenchimento de conteúdo em papel. Na busca pelo furo

40

DUARTE, Frederico de Sousa Almeida. A influência da mídia na esteriotipação dos criminosos. Web Artigos. [S.l.], 2012. Seção Direito. Disponível em: http://www.webartigos.com/artigos/a-influencia-da-midia-na-esteriotipacao-dos-criminosos/83938/. Acesso em: 25/03/2012. 41

Idem ao 40.

35

de reportagem42, muitos profissionais incorrem numa prática ainda mais perigosa

que os supostos criminosos aos quais se refere: a espetacularização dos fatos como

chamariz para vender a notícia.

Para Magri (2010), “a dramatização dos fatos de uma notícia é um dos

recursos utilizados pelo jornalismo popular para vender informação. [...] Os

telejornais populares sensacionalistas transformados em produtos de consumo

reforçam o caráter perecível da notícia. Na busca por novos produtos, esse gênero

pode contribuir para o acúmulo de imagens e estabelecer o espetáculo” (p. 64).

Paralelamente, Marcondes Filho (2002) defende que o mais preocupante é

que “hoje em dia as pessoas não questionam se o que o jornal está mostrando é

verdadeiro ou não. Mais importante que isso, o espetáculo-telejornal tem que ser

instigante, tem que fixar audiência” (p. 85). Sob essa perspectiva, segundo o autor, o

jornalista cada vez mais estaria se afastando da busca pela apuração da realidade

para fazê-la entrar no mundo da representação. “Nesse aspecto entende-se mais

claramente porque a TV, e principalmente ela, é procurada com ansiedade e

vontade pelas pessoas: só ela – e de forma forte, convincente e tecnicamente bem

resolvida – reconstrói sem conflitos o mundo, que as imagens das nossas janelas

teimam em refutar” (id, p. 110).

Ainda segundo Marcondes Filho (ibid), tal problema se funda já na fase de

produção da notícia. Por tratar-se de atividade muito complexa, envolver muitas

pessoas – apesar do movimento contrário, de redução das redações – e exigir uma

velocidade muito grande na construção do produto final, o autor defende que é

comum que os fatos não sejam apurados corretamente, isto é, não sejam de fato

verificados por falta de tempo hábil.

A máquina informativa tem processos que são detonados por jornalistas - associados aos seus próprios vícios (clichês) e visões de mundo parciais e preconceituosas -, produz, ela mesma, a desinformação através de diversos procedimentos de intoxicação com informação e, além disso, dá margem a processos livres, incontroláveis, inadministráveis de mistificação e desinformação (ibid, p. 113).

Portanto, independentemente da qualidade de investigação com que as

notícias são construídas, elas recorrentemente ganham rápido um valor de verdade,

ao menos por determinado período de tempo. E quando o tema é crime, nesse

42

Para Alvarenga (2011), furo de reportagem se refere à circunstância em que a informação é publicada em um veículo antes de todos os demais.

36

ínterim é comum que os suspeitos sejam cedo demais tratados como culpados,

mesmo antes de serem investigados pelos órgãos competentes.

Assim, há de se constatar que existe na imprensa uma predisposição para

escolher apenas um ponto de vista, um lado, na maioria das vezes com base em

fontes oficiais, como se poderá ver adiante, em detrimento das outras perspectivas

do mesmo fato. “Na tentativa de manter a pauta atualizada além da repetição as

reportagens se excedem tanto na ótica dramática quanto na técnica, e as matérias

se tornam parecidas” (Magri, 2010). Consequentemente, os consumidores da

informação, seja ela impressa, de áudio, vídeo ou eletrônica, acabariam limitados a

conhecer uma gama muito pequena de discursos, principalmente porque, segundo a

autora, os veículos cada vez mais se pautam uns pelos outros. E, uma vez os fatos

sendo regidos por uma única (ou poucas) linha(s) de raciocínio, eles podem carregar

consigo os aspectos da opinião do jornalista que os reproduziu, ainda que tragam –

talvez apenas como forma de justificação moral – um discurso modulado do que

seria o outro lado, que nem sempre o é, e sob a prerrogativa do respeito ao

interesse público.

Por isso é que, quando se trata de crimes, as notícias – desde as manchetes

– assumem um caráter muito mais impactante do que os temas gerais, por exemplo,

o que acaba produzindo efeitos substanciais em relação à opinião do público. E

apesar de o compromisso fundamental do jornalista, segundo o Código de Ética da

profissão (FENAJ, 2007), ser com a verdade no relato dos fatos, que por sua vez

deve pautar o trabalho da imprensa na precisa apuração dos acontecimentos e na

sua correta divulgação, o que se constata de fato é um relaxamento no cumprimento

dessa premissa. Nesse sentido, pensando na forma como a mídia divulga os casos

de crimes e os possíveis suspeitos desses atos é que se decidiu pelo

desenvolvimento desta pesquisa.

2.5.1 Os presos no jornal: como os internos da Colônia Penal Agroindustrial do

Paraná e da Penitenciária Central do Estado são retratados pela imprensa

Partindo do fato de que o acesso aos presos das duas unidades em questão

é restrito basicamente aos familiares e advogados dos internos, bem como aos

funcionários do sistema prisional, salvo raras exceções, condição que impede o

contato entre os internos e a sociedade, é de se constatar que a opinião formulada

37

junto à sociedade em relação a esse grupo de pessoas passa por um tipo bem

específico de mediação – neste caso, a imprensa. Portanto, fez-se necessário o

desenvolvimento de uma pesquisa prática em relação às reportagens veiculadas

sobre o assunto, de modo a compreender melhor o cenário que se desenha em

torno do tema.

O formato escolhido para abordar essa realidade foi a análise dos

conteúdos43 produzidos pelo jornal Gazeta do Povo – selecionado tanto por se tratar

de um veículo tradicional no estado quanto por representar, segundo Quadros,

Quadros e Massip (2009), o impresso de maior circulação no Paraná44. Assim, a

investigação foi desenvolvida junto à página virtual da empresa por meio da

utilização das palavras-chave ‘bandido colônia penal agroindustrial Piraquara’ (e

colônia penal agrícola Piraquara), ‘bandido penitenciária central Piraquara’, ‘preso

colônia penal agroindustrial Piraquara’ (e colônia penal agrícola Piraquara), e ‘preso

penitenciária central Piraquara’45.

Os resultados da pesquisa mostraram que o acervo de materiais sobre o tema

na página virtual do veículo, é composto por conteúdos produzidos e publicados

entre os anos de 2006 e 2012. Durante as buscas, verificou-se também que, exceto

no caso das combinações dos termos ‘bandido colônia penal agroindustrial

Piraquara’, que não obteve resultados, e ‘preso colônia penal agroindustrial

Piraquara’, que acusou apenas uma correspondência, em todas as outras cinco

abordagens o volume de textos localizados não equivaliam à quantidade real

disponível para leitura.

Assim, dos 698 conteúdos46 que a página acusava existir sobre o tema,

apenas 239 estavam de fato acessíveis ao público, ou seja, eram passíveis de

consulta – o que corresponde a pouco mais de 34% do volume inicial.

Consequentemente, a pesquisa considerou apenas o quantitativo de textos válidos e

verificáveis.

43

Os detalhamentos do processo podem ser verificados no tópico ‘Metodologia de Pesquisa’, a partir da página 79. 44

Segundo a Associação Nacional de Jornais (2012), a média de circulação do jornal verificada entre os anos de 2010 e 2011 ultrapassa os 43.500 exemplares vendidos diariamente. 45

Idem ao 43. 46

Resultado proveniente da soma dos quantitativos obtidos em todas as buscas combinadas.

38

Contudo, em meio às produções comprovadamente disponíveis para

consulta, 43 foram descartadas por representarem duplicações, ou seja, conteúdos

repetidos, e outras 16 acabaram rejeitadas por conta de tratarem de temas

totalmente alheios à pesquisa. Sendo assim, a análise foi aplicada tendo como base

um volume total composto por 180 textos.

Acima de tudo, o contato com as produções jornalísticas foi essencial para

consolidar os objetivos desta pesquisa por permitir uma compreensão mais precisa

acerca do tema deste trabalho e sobre como ele é tratado pela mídia. Afinal, se “a

identificação das falhas pode ser um meio viável de não repeti-las” (ROSA;

TEIXEIRA, 2010, p. 21), então considerar os materiais já produzidos sobre o assunto

seria, de todo modo, etapa obrigatória e primordial para uma fundamentação

coerente da presente investigação.

A pesquisa foi desenvolvida por intermédio da leitura flutuante47, que

viabilizou a identificação de categorias de análise como: tipo; tamanho; presença de

imagens e eventuais detalhamentos; modo de referência do criminoso no texto;

tipificação da principal fonte do texto; apresentação dos criminosos e eventuais

detalhamentos; temas principal e secundário da mensagem. Os dados levantados

foram fixados em um formulário de codificação, cujos resultados podem ser

verificados nos tópicos a seguir.

2.5.1.1 Tipo e tamanho de conteúdo

Os textos foram divididos nas modalidades entrevista, nota e reportagem com

o objetivo de revelar os formatos empregados pelos jornalistas na construção dos

conteúdos relacionados ao tema. Desse modo, as entrevistas compreendem o

formato pergunta-resposta, enquanto as notas e reportagens consistem nas

composições textuais em forma de redação, mais ou menos aprofundadas em

relação ao assunto.

Para diferenciar esses dois últimos tipos, adotou-se como critério a presença

de citações diretas, ou seja, pequenos trechos inseridos entre aspas, que

representam a transcrição da fala das fontes e, por isso, pressupõem maior

apuração através do contato direto com os entrevistados. Por isso, nesta pesquisa

47

Os detalhamentos do processo podem ser verificados no tópico ‘Metodologia de Pesquisa’, a partir da página 79.

39

foram consideradas reportagens os textos em que há ao menos uma citação direta,

enquanto as notas são representadas pelos textos nos quais esse recurso não

aparece.

Assim, dos 180 textos analisados, a grande maioria era composta por

reportagens (108), seguida pelo volume de notas (70) e pelas entrevistas (2). E uma

vez observado o critério de diferenciação entre as modalidades, o que se pode

perceber é que a maior parte das produções jornalísticas analisadas foi

desenvolvida em um formato que permite o tratamento mais apurado da informação,

com a consulta direta das fontes relacionadas ao assunto em questão.

MODALIDADES DE CONTEÚDO

Figura 1 – gráfico demonstrativo das modalidades de conteúdo

Tabela 1 – MODALIDADES DE CONTEÚDO

Entrevista

2 1,1% Nota

70 38,9%

Reportagem

108 60,0%

Já em relação ao tamanho dos textos, foram tratados como pequenos os

conteúdos compostos por até cinco parágrafos, médios os materiais com até 10

parágrafos e grandes os que tinham a partir de 11 parágrafos. Tal classificação foi

aplicada igualmente tanto nas duas modalidades de redação quanto nas entrevistas

encontradas.

Segundo esses critérios, portanto, verificou-se que há uma divisão

tecnicamente equilibrada dos conteúdos, já que os textos médios somaram 65

ocorrências, os grandes 62 e os pequenos 53. Em todo caso, o tamanho médio

acabou sendo o mais recorrente entre os conteúdos analisados, com 36,2% das

ocorrências.

40

TAMANHO DO CONTEÚDO

Figura 2 – gráfico demonstrativo dos tamanhos dos conteúdos

Tabela 2 – TAMANHO DO CONTEÚDO

Pequeno

53 29,4% Médio

65 36,2%

Grande

62 34,4%

2.5.1.2 Detalhamento sobre as imagens

Dentre os 180 conteúdos analisados, constatou-se que em 108 casos não

havia qualquer imagem para situar o leitor quanto aos acontecimentos e

personagens tratados no texto. Entretanto, como não se pode excluir a possibilidade

de tal condição ser proveniente da linha editorial do veículo48 em relação ao

tratamento dos conteúdos policiais49, passou-se a uma análise mais detalhada

acerca dos demais 72 casos, nos quais as ilustrações apareciam de algum modo

associadas ao texto.

PRESENÇA DE IMAGENS

Figura 3 – gráfico demonstrativo da presença de imagens junto aos textos

48

Características que norteiam o posicionamento dos veículos de comunicação. 49

O jornal Gazeta do Povo não possui uma editoria específica para os conteúdos policiais, de modo que as reportagens sobre esse assunto são geralmente incluídas no caderno Vida e Cidadania.

41

Tabela 3 – PRESENÇA DE IMAGENS

Sim

72 40,0% Não

108 60,0%

Do mesmo modo, na busca por uma análise criteriosa em relação à presença

de imagens junto aos conteúdos escritos, verificou-se primeiramente o modo como

essas imagens apareciam. De todas as produções compostas com a ajuda de

ilustrações, o que se observou foi que a maioria apresentava delas apenas uma

unidade (51), enquanto alguns poucos casos traziam duas (18) e outros mais raros

ainda somavam três (3) – número máximo de imagens verificado nos conteúdos

analisados.

QUANTIDADE DE IMAGENS

Figura 4 – gráfico demonstrativo das quantidades de imagens presentes junto aos textos

Tabela 4 – QUANTIDADE DE IMAGENS

Uma

51 28,3% Duas

18 10,0%

Três

3 1,7% Conteúdos sem imagens

108 60,0%

Na sequência, tendo em vista a necessidade de universalizar a abordagem

em relação aos casos em que havia imagens junto aos conteúdos escritos, optou-se

pelo aprofundamento da análise das ilustrações, mas apenas em se tratando da

principal em cada texto, descartando as secundárias por não serem recursos

presentes em todos os casos e por se apresentarem, em sua maioria,

complementarmente à primeira. Nessa linha, verificou-se que a fotografia foi o

formato utilizado em praticamente todos os casos, com 69 ocorrências, concorrendo

com apenas dois vídeos e um desenho. Paralelamente, como além de quantificar

também é importante observar o que as imagens revelam, optou-se pelo

desenvolvimento de uma análise relacionada aos elementos exibidos. Com isso, o

42

que se observou nas imagens localizadas junto aos conteúdos da pesquisa foi a

incidência de 14 temas imagéticos diferentes.

A classificação dos assuntos nas imagens também foi feita através de leitura

flutuante, ou seja, enfatizando os principais assuntos dos conteúdos e quantificando-

os numérica e estatisticamente. O resultado demonstrou que o tópico mais incidente

foi o que apontava para os casos em que o criminoso aparece como figura central

na imagem, característica presente em 18 conteúdos, contra oito materiais cujas

imagens retratavam vítimas.

TEMA DAS IMAGENS

Figura 5 – gráfico demonstrativo dos temas predominantes nas imagens

43

Tabela 5 – TEMAS DAS IMAGENS

Ações da polícia/Apreensões/Prisões

5 2,8% Ações da Justiça

2 1,1%

Criminosos/Ex-detentos/Presos

18 10,0% Documentos

2 1,1%

Especialistas

1 0,6% Familiares de presos

1 0,6%

Fugas

3 1,7% Insegurança/Medo

5 2,8%

Instituições penais/Instituições prisionais

7 3,9% Policiais

7 3,9%

Rebeliões

7 3,9% Simulações/Encenações

3 1,7%

Superlotação

3 1,7% Vítimas

8 4,4%

Conteúdos sem imagens

108 60,0%

2.5.1.3 Detalhamentos sobre o texto

Com relação ao texto em si, buscou-se detectar indícios acerca do

posicionamento do jornalista sobre o tema. Para tanto, a análise foi feita por

intermédio da leitura flutuante50 dos textos na íntegra, de modo que a combinação

do título com a estrutura do conteúdo permitisse uma observação mais completa.

Como consequência, algumas categorias de palavras acabaram surgindo e foram

inseridas no formulário de codificação de modo a contribuir para a identificação de

tais características.

A primeira delas trata da forma como os presos da Colônia Penal

Agroindustrial do Paraná e da Penitenciária Central do Estado são nomeados no

texto. A leitura flutuante permitiu a identificação de oito modos diferentes

empregados pelos jornalistas para cumprir essa função, reunidos aqui em grupos

por semelhança de significados, quais sejam: acusados/suspeitos; bandidos;

condenados/detentos/ex-detentos/presos; conforme o crime; criminosos;

foragidos/fugitivos; indivíduos/sujeitos; ou não eram referidos diretamente.

Os resultados mostraram que, dentre as classificações levantadas, aquela

que indicava o tratamento do preso pela sua condição (condenado/detento/ex-

detento/preso) foi a mais recorrente entre os conteúdos analisados, concentrando

46,1% dos casos (83 incidências), seguida pela que apontava os casos em que os

internos não eram referidos diretamente nos textos, que somaram 16,1% (29

incidências). 50

Os detalhamentos do processo podem ser verificados no tópico ‘Metodologia de Pesquisa’, a partir da página 79.

44

REFERÊNCIA AOS PRESOS

Figura 6 – gráfico demonstrativo dos modos de referência aos presos nas mensagens

Tabela 6 – REFERÊNCIA AOS PRESOS

Acusado/Suspeito

27 15,0% Bandido

8 4,4%

Condenado/Detento/Ex-detento/Preso

83 46,1% Conforme o crime (ladrão, sequestrador, etc)

8 4,4%

Criminoso

2 1,1% Foragido/Fugitivo

19 10,6%

Indivíduo/Sujeito

4 2,2% Não é referido diretamente

29 16,1%

Igualmente útil, a análise também considerou a presença dos presos no

desenvolvimento dos textos, bem como a forma como eles acabam referidos. Nesse

sentido, dos 180 conteúdos verificados, a maioria (108) não traz qualquer

informação sobre a sua identidade, quantitativo que representa a maioria dos casos,

com 60% das incidências.

É claro que não se pode descartar a possibilidade de que a não identificação

desses indivíduos seja fruto de um tratamento mais cuidadoso em relação à sua

imagem, bem como uma forma de proteção contra eventuais processos por danos

morais e materiais, entre outros, mas, se assim fosse, seria incoerente o fato de que

em 67 dos 180 conteúdos analisados (37,2% dos casos) a divulgação da identidade

real dos detentos foi verificada. E considerando que a legislação vigente no país

45

permite a publicidade do andamento de processos judiciais51, salvo nos casos

específicos em que se concede o benefício do segredo de Justiça52, o que, por sua

vez, representa exceção à regra, é de se constatar que a divulgação ou não dos

nomes dos presos é detalhe determinado por cada veículo de comunicação,

sobretudo pelos responsáveis diretos pela elaboração das reportagens, ou seja, os

repórteres e editores.

PRESENÇA DO PRESO

Figura 7 – gráfico demonstrativo da presença dos presos nas mensagens

Tabela 7 – PRESENÇA DO PRESO

Sim

72 40,0% Não

108 60,0%

Assim sendo, em se tratando das produções em que há a identificação

desses personagens, que representam 40% dos conteúdos, foram observados

aspectos como a nominação, idade e tipo de crime.

Nesse sentido, verificou-se que os casos em que os presos aparecem em

meio ao desdobramento do conteúdo com nomes reais somam 67 incidências,

contra cinco em que eles são apresentados com nomes fictícios – números que,

apesar de parecerem positivos, representam a parte minoritária de um cenário

composto também pelos 108 outros textos em que os internos são referidos apenas

pela sua condição de condenado, detento ou ex-detento, ou seja, sem qualquer

referência à sua identidade ou individualidade.

51

Segundo a Constituição Federal do Brasil (1988), a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem (Art. 5º, inciso LX). 52

Conforme Dall’Agnol (apud CHUERI; FERREIRA; GOMES JUNIOR, 2008), “a regra é que os procedimentos administrativos e processos judiciais sejam públicos, a absoluta exceção é a tramitação sob a égide do segredo de justiça. A finalidade da publicidade é clara: a-) permitir a fiscalização quanto à distribuição da Justiça; b-) garantia ao julgador perante à comunidade de que o mesmo agiu com imparcialidade” (p. 3).

46

IDENTIFICAÇÃO DOS PRESOS

Figura 8 – gráfico demonstrativo da identificação dos presos nas mensagens

Tabela 8 – IDENTIFICAÇÃO DOS PRESOS

Com nomes verdadeiros

67 37,2% Com nomes fictícios

5 2,8%

O preso não aparece como personagem, apenas como referencial para o tema

108 60,0%

Do mesmo modo, a indicação de detalhes como a idade dos presos

acompanha a análise anterior em relação à sua identificação no texto, ou seja, pode

ser verificada apenas nos casos em que o interno é nominado, seja com seu nome

verdadeiro, seja com nomes fictícios. Assim, o volume de conteúdos em que esse

recurso aparece representa 26,7% dos casos.

PRESENÇA DA IDADE DOS PRESOS

Figura 9 – gráfico demonstrativo da presença da idade dos presos

Tabela 9 – PRESENÇA DA IDADE DOS PRESOS

Sim

48 26,7% Não

24 13,3%

O preso não aparece como personagem, apenas como referencial para o tema

108 60,0%

Em relação à divulgação do crime cometido pelo preso, é um recurso

presente na grande maioria dos casos em que o interno é identificado de algum

modo, somando 66 incidências – número que representa 36,7% dos textos. Na

47

direção oposta, apenas seis conteúdos não revelaram o motivo pelo qual o detento

chegou a essa condição, volume que se traduz em 3,3% do total.

PRESENÇA DOS TIPOS DE CRIMES COMETIDOS

Figura 10 – gráfico demonstrativo da presença dos tipos de crimes

Tabela 10 – PRESENÇA DOS TIPOS DE CRIMES

Sim

66 36,7% Não

6 3,3%

O preso não aparece como personagem, apenas como referencial para o tema

108 60,0%

Por fim, a escolha dos entrevistados dos textos também foi critério analisado

durante a realização da pesquisa. Tal investigação revelou que, dentre os 180

conteúdos verificados, 157 traziam como vozes predominantes das mensagens as

fontes oficiais – aqui entendidas como profissionais que representam determinados

órgãos governamentais –, oito apresentavam vítimas, sete referiam-se aos presos,

cinco reproduziam a opinião de especialistas, dois traziam familiares de presos e

outros dois a apuração de representantes da imprensa. Por isso é que, como foi

possível constatar, a maior parte dos textos trazia um tom mais oficial, pouco plural e

sem o debate de ideias.

TIPOS DE FONTES

Figura 11 – gráfico demonstrativo dos tipos de fontes nos textos

48

Tabela 11 – TIPOS DE FONTES NOS TEXTOS

Criminoso/Preso/Ex-detento

6 3,3% Especialista

5 2,8%

Familiares de presos

2 1,1% Fonte Oficial

157 87,2%

Imprensa

2 1,1% Vítima

8 4,4%

2.5.1.4 Temas apresentados

Os 23 assuntos que integraram o formulário foram selecionados, como já dito,

por meio de leitura flutuante, de modo que os principais assuntos abordados

compuseram duas listas diferentes, voltadas ao tema principal e secundário das

mensagens. A análise duplicada serviu para dar mais eficiência à investigação, já

que são raros os casos em que um texto jornalístico apresenta e desenvolve apenas

um assunto.

Assim, sobre os temas principais, os resultados mostraram a maioria dos

conteúdos trazia o crime como assunto mais recorrente, ou predominante, com 30

casos, ou 16,7%, seguido das fugas dos presos dos estabelecimentos penais, que

somaram 24 ocorrências – número que representa 13,3% dos conteúdos verificados

durante a pesquisa.

Tabela 12 – TEMAS PRINCIPAIS

Agentes penitenciários

4 2,2% Assistência médica aos criminosos/presos

1 0,6%

Ataques/Brigas/Confrontos

10 5,6% Condicional/Indultos

6 3,3%

Crimes

30 16,7% Criminosos/Presos

6 3,3%

Facções/Gangues/Quadrilhas

8 4,4% Fugas

24 13,3%

Histórias de criminosos/Histórias de organizações criminosas

4 2,2% Histórico institucional

2 1,1%

Instalações penais/Instalações prisionais

5 2,8% Investimentos/Reformas

8 4,4%

Insegurança/Medo/Violência

4 2,2% Julgamentos/Decisões da Justiça

6 3,3%

Legislação/Normas

1 0,6% Polícia/Ações dos policiais

16 8,9%

Programas educacionais e profissionalizantes

6 3,3% Rebeliões

14 7,8%

Redução de pena/Progressão

3 1,7% Ressocialização

1 0,6%

Reincidência criminal

0 0,0% Transferências

9 5,0%

Superlotação/Falta de vagas

12 6,7%

49

TEMAS PRINCIPAIS

Figura 12 – gráfico demonstrativo dos temas principais das mensagens

Já com relação aos temas secundários, os resultados mostraram um

movimento oposto aos obtidos na análise dos temas principais. Nessa etapa da

50

investigação, verificou-se que o tema fuga de presos foi o mais repetido, seguido de

conteúdos que abordavam diretamente a incidência de crimes.

TEMAS SECUNDÁRIOS

Figura 13 – gráfico demonstrativo dos temas secundários das mensagens

51

Tabela 13 – TEMAS SECUNDÁRIOS

Agentes penitenciários

4 2,2% Assistência médica aos criminosos/presos

0 0,0%

Ataques/Brigas/Confrontos

7 3,9% Condicional/Indultos

6 3,3%

Crimes

22 12,2% Criminosos/Presos

6 3,3%

Facções/Gangues/Quadrilhas

5 2,8% Fugas

37 20,6%

Histórias de criminosos/Histórias de organizações criminosas

1 0,6% Histórico institucional

1 0,6%

Instalações penais/Instalações prisionais

6 3,3% Investimentos/Reformas

6 3,3%

Insegurança/Medo/Violência

4 2,2% Julgamentos/Decisões da Justiça

1 0,6%

Legislação/Normas

0 0,0% Polícia/Ações dos policiais

14 7,8%

Programas educacionais e profissionalizantes

3 1,7% Rebeliões

18 10,0%

Redução de pena/Progressão

3 1,7% Ressocialização

10 5,6%

Reincidência criminal

11 6,1% Transferências

9 5,0%

Superlotação/Falta de vagas

6 3,3%

2.5.1.5 Conclusões da análise de conteúdo

Dentre todos os aspectos observados na análise de conteúdo, os que mais

chamam a atenção são justamente os últimos investigados. Assim, a repetição de

determinados temas nas produções jornalísticas demonstra que os presos se tornam

notícia quando o assunto é negativo, ou seja, quando estão relacionados ao

cometimento de crimes ou, mais ainda, quando fogem ou se rebelam. É claro que

não se pode negar o fato de que determinados crimes, fugas e rebeliões são temas

tratados cotidianamente pelo jornalismo, até por conta do interesse público e social,

entretanto tal condição aponta também para uma possível falha comunicacional, já

que – como pessoas – os presos são personagens muito mais complexos que seus

atos em determinado período de tempo e circunstâncias. Aliás, essa característica

parece estar passando despercebida entre os produtores da informação, tanto que

em nenhum dos 180 textos analisados havia detalhes sobre a história dos presos,

nem mesmo pistas da trajetória que os levaram ao crime. Consequentemente, esse

tipo de prática pode contribuir para a construção de uma imagem redutora sobre o

preso.

Ainda sobre o texto, verificou-se que, na maioria dos casos, os presos são

tratados pela sua condição de interno, ou seja, com palavras como detento, ex-

52

detento e similares, o que demonstra uma preocupação dos jornalistas em não

rotular esses personagens com termos pejorativos. Entretanto, tal característica

também aponta para outro aspecto importante, que é o fato de que poucas vezes o

preso é referido pelo próprio nome. O risco de os conteúdos tratarem do preso com

tamanho distanciamento é que isso pode contribuir para uma espécie de

homogeneização da classe carcerária, generalizando os integrantes desse grupo e

relegando-os a uma massa definida por determinados termos (preso, detento, etc), o

que consequentemente distancia a perspectiva de uma abordagem individual desses

sujeitos.

Na prisão não há uma apropriação do espaço, ninguém se projeta nele. A população reclusa, heterogênea, de múltiplas origens e de renovação intensa, é percebida como uma unidade distinta – o estigma tem aqui uma inscrição espacial: quem está preso, é delinquente – mas não se percebe necessariamente desse modo. Trata-se de uma identidade negativa, imposta do exterior (CUNHA, 1994, p. 4)

Também a presença maciça de fontes oficiais como vozes predominantes nos

textos (157) imprime, como já foi dito, opiniões muito limitadas em relação ao

assunto, já que não permite o desenvolvimento de uma discussão plural, construída

pela inserção de tipos diferentes de entrevistados. Como exemplo, é possível

destacar a pequena quantidade de materiais em que os presos ganham espaço

como fontes (7), ou a escassez de entrevistas com especialistas sobre o assunto (5)

– condição que pode também comprometer o desenvolvimento do assunto no

âmbito jornalístico (percentuais ou quantitativos). Porém, o fato de a maioria dos

conteúdos não considerar a visão do preso sobre o assunto é uma espécie de

contradição, já que ele é uma das figuras centrais em boa parte dos textos

analisados. Aliás, sobre os casos em que os presos são nomeados e têm as idades

e crimes revelados, o fato de essa identificação vir acompanhada de uma

contextualização pouco favorável acaba contribuindo para reforçar os preconceitos

correntes em relação ao criminoso.

Outro ponto importante para a pesquisa foi a análise das imagens. Percebeu-

se que esse recurso não foi muito utilizado pelos jornalistas, tendo em vista que está

presente em menos da metade dos conteúdos verificados. Entretanto, nos casos em

que as imagens estavam presentes, elas geralmente transmitiam uma ideia negativa

em relação ao preso, retratando-o como um agente nocivo à sociedade, já que

53

revelavam momentos de capturas (ou recapturas) realizadas pela polícia e rebeliões,

dentre outras cenas igualmente impactantes.

Assim, a conclusão a que se chega é que a produção midiática gira em torno

de uma construção demasiadamente rasa da imagem do preso, relegando a ele

aspectos que podem não traduzir, de fato, o sujeito por trás do crime. Entretanto,

como também a “participação do jornalismo na construção da realidade, feita por

meio de imagens, palavras, depoimentos, da ideologia dos profissionais e do

agendamento dos assuntos veiculados, não deve ser desprezada” (ROSA;

TEIXEIRA, 2010, p. 32), há de se supor que a imprensa como um todo carece de um

olhar mais cuidadoso para com esse tipo de personagem.

Nesse sentido, e considerando, portanto, a necessidade de pensar em uma

modalidade jornalística que permita a construção de um relato mais plural do que os

costumeiramente divulgados nos jornais, Pessa (2009) defende que o livro-

reportagem “é o veículo de comunicação impressa não-periódico que apresenta

reportagens em grau de amplitude superior ao tratamento costumeiro nos meios de

comunicação jornalística periódicos. Por grau de amplitude superior, se entende

maior ênfase ao tratamento do tema em foco nos aspectos extensivo e intensivo” (p.

2).

Entretanto, o conceito livro-reportagem será oportunamente discutido adiante

nesta pesquisa.

Por ora, chega-se à questão:

Como um livro-reportagem pode servir de suporte para dar elementos para a

representação das histórias de vida de presos da Colônia Penal Agroindustrial do

Paraná e da Penitenciária Central do Estado, ambas localizadas em Piraquara, na

Grande Curitiba?

54

3 OBJETIVOS

Construir relatos escritos sobre a história de vida dos condenados da Colônia

Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e da Penitenciária Central do Estado (PCE), a

partir do ponto de vista dos próprios presos.

3.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Analisar a forma como o jornalismo se refere aos criminosos nas reportagens, de

modo a verificar se existem ou não estereótipos disseminados acerca do tema;

Pesquisar as representações sociais em que os presos se enquadram;

Produzir um livro-reportagem, experimentando, para tanto, as técnicas do

jornalismo literário53, combinadas com entrevistas, levantamento e interpretação

de dados, pesquisas documentais e de campo;

Incentivar a discussão sobre o tema, ao dar voz ao sujeito internalizado nas

instituições penais selecionadas, construindo o produto levando em conta as

experiências das fontes consultadas.

53

Para Pena (2006), o Jornalismo Literário reside na potencialização dos recursos do jornalismo, na transposição de limites dos acontecimentos cotidianos, nas amplas visões da realidade propostas, Segundo o autor, tal categoria exerce plenamente a cidadania, de modo que rompe as correntes burocráticas do lide, evita os definidores e, principalmente, garante perenidade e profundidade aos relatos.

55

4 JUSTIFICATIVA

A forma como a mídia brasileira, em especial a paranaense da capital, divulga

os casos de crimes e como trata os possíveis suspeitos nas matérias jornalísticas

foram elementos fundamentais para iniciar esta pesquisa. Entretanto, antes de falar

sobre esse assunto, faz-se necessário o esclarecimento de alguns pontos.

A escolha pela criminalidade, ou o criminoso, como foco desta pesquisa

funda-se majoritariamente na ideia de que o crime, independentemente das suas

causas, é uma característica própria das sociedades e, justamente por isso, é

impossível de ser eliminada (Durkheim, 2001). Isso porque, segundo vários estudos,

entre eles o de Misse (2010), a concepção do que se entende por crime varia de

acordo com o local onde ele é verificado, o período histórico, entre outros fatores

igualmente relevantes.

Assim, como já definiu Silva (2004), em qualquer local, em qualquer tempo,

onde houver homens vivendo em comunidade, lá haverá também aquele que

infringirá as regras, implícita ou explicitamente estabelecidas. Afinal, como defende

Misse (2010), “o crime é definido primeiramente no plano das moralidades que se

tornaram hegemônicas e cuja vitória será inscrita posteriormente nos códigos

jurídicos” (p. 22). Portanto, tão importante quanto falar dos movimentos sociais, das

tendências e dos fenômenos que todos os dias surgem nas sociedades, é essencial

abordar a criminalidade como mais um aspecto dos grupamentos humanos.

Outro fator importante e que justifica esta pesquisa é que a população

carcerária tem aumentado muito nos últimos anos – mais até que a população

brasileira, em percentuais. Pois enquanto o Instituto Brasileiro de Geografia e

Estatística – IBGE (2011) aponta um crescimento demográfico de 12,3% entre 2000

e 2010, no mesmo período a quantidade de presos no sistema penitenciário

brasileiro aumentou 113%, segundo Canário (2011) – o que denota um fenômeno

social que exige um tratamento direcionado.

Entretanto, o que se percebe nos veículos de comunicação de Curitiba54 é,

pelo contrário, uma generalização de conceitos, abordagens verticalizadas que

muitas vezes seguem um caminho construído apenas a partir do ponto de vista do

jornalista que as escreve, ou do veículo que as publica. E ainda que, segundo

54

Conforme pode ser verificado nos resultados da análise de conteúdo, no subtópico ‘Os presos no jornal: como os internos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e da Penitenciária Central do Estado são retratados pela imprensa’, a partir da página 36.

56

Jackobson (2008), qualquer comunicação seja impossível sem determinada parcela

de possibilidades preconcebidas ou de representações pré-fabricadas, o tema é

complexo demais para ser tratado de modo superficial. Por isso, Resende (2002)

defende que, ainda que o leitor aceite o conteúdo do jornal como palavra utilizada

para representar a realidade, não há como negar que essa realidade seja apenas

uma das possíveis, diante das ficções que também nela se perfazem. Assim, é de se

concluir que o assunto inspira investigação e, por isso, torna-se adequado

desenvolvê-la no ambiente acadêmico.

Para tanto, o uso de ferramentas técnicas e oficiais, junto com os livros e

artigos, cunham maior confiabilidade às pesquisas. Por isso, são abundantes as

consultas ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, ao Departamento

de Execução Penal Paraná – Depen-PR e ao sistema Geopresídios, do Conselho

Nacional de Justiça – CNJ.

No caso do IBGE, os dados são relevantes porque representam o cenário

nacional nos vários temas trabalhados, de modo compilado e garantido. O instituto

realiza levantamentos nacionais, mediante pesquisa junto à população, e com isso

apresenta os aspectos abordados do cenário brasileiro com total fidelidade.

Em relação ao Depen-PR, é órgão fundamental porque se configura como o

setor responsável por gerir as unidades penais do estado do Paraná, o que o torna

indispensável à presente pesquisa, seja na coleta de dados, seja nas orientações e

até autorizações para desenvolver tal trabalho, uma vez que será necessário um

contato direto com os presos.

E sobre o Geopresídios (CNJ), trata-se de um banco de dados oficial,

gerenciado pelo Conselho Nacional de Justiça, denominado como uma radiografia

do sistema carcerário e que abrange todo o sistema punitivo nacional, com dados

detalhados e atualizados diariamente. Desse modo, é uma fonte de consulta que

não possui data de publicação, uma vez que é republicada todos os dias, mas se

configura como peça fundamental, pois reúne em si uma gama considerável de

informações indispensáveis a esta pesquisa.

Também é relevante esclarecer os motivos que levaram à escolha da Colônia

Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e da Penitenciária Central do Estado (PCE)

como cenários para a pesquisa. Tais locais foram indicados pelo Depen-PR, que

gere as unidades penais do estado, primeiramente em contato informal e depois,

57

mediante resposta à solicitação encaminhada por escrito55. Isso em virtude do

ambiente encontrado em ambos os locais para a abordagem do tema, seja por conta

da infraestrutura, pela diversidade de presos, sobretudo por conta da relevância

social do trabalho, uma vez que as instituições trabalham com regimes diferentes: na

CPAI é o semiaberto e na PCE é o fechado. Assim, acredita-se, o contato com os

dois universos, distintos entre si, permitirá o desenvolvimento de um trabalho mais

denso e abrangente.

Por fim, a opção por assentar o resultado da pesquisa em um livro-

reportagem, construído sobre as bases da linguagem jornalístico-literária, surgiu

pela proposta de mostrar as informações de modo diferente do adotado pelo

jornalismo convencional. Isso porque, segundo Pessa (2009), o livro-reportagem

configura-se como o veículo de comunicação “que apresenta reportagens em grau

de amplitude superior ao tratamento costumeiro nos meios de comunicação

jornalísticos periódicos” (p. 2). Ou seja, para o autor, o livro construído nesses

moldes permite uma maior ênfase ao tratamento dos temas em foco, nos aspectos

extensivo e intensivo. Ou ainda como define Pereira (2007):

O livro-reportagem, como o próprio nome designa, é uma reportagem publicada na forma de livro. A diferença primordial entre esse tipo de matéria e as feitas para serem veiculadas por jornais, TVs e emissoras de rádio é que o jornalista pode ser sujeito da notícia e não, apenas, um indivíduo que "descreve" a notícia. Isso quer dizer que ele tem compromisso com o leitor e com a verdade. Mas com a sua verdade que é definida a partir das ideologias que o interpelam, e não com a verdade definida pelos conceitos – extremamente subjetivos – da imparcialidade, da isenção e da objetividade que "dominam" o jornalismo diário (p. 1.195).

Assim, ao permitir que o leitor leia e releia as histórias – característica própria

das publicações impressas –, e que as possa consultar mesmo depois de muito

tempo – aspecto inerente à condição de livro, cuja vida útil é bem maior que a de um

jornal, por exemplo –, pretende-se abrir um veio comunicativo dentro do qual as

pessoas possam lançar um olhar diferenciado sobre o tema.

Afinal, [...] esse tipo de discurso jornalístico é um discurso da resistência. E isso por dois motivos. Um deles seria a resistência ao poder do discurso da objetividade jornalística. O outro seria a resistência aos poderes que produzem, e mantém, assim, as desigualdades sociais. Resistências que possibilitam ao jornalista manifestar sua ideologia e, ao mesmo tempo,

55

A solicitação consta junto aos apêndices, nas páginas 131 e 132, e as respostas estão nos anexos, nas páginas 143, 144 e 145.

58

cumprir suas funções sociais: informar e levar a sociedade a pensar sobre seus problemas e, por decorrência, provocar deslocamentos (id, p. 1.197).

E mesmo considerando as limitações impostas pela cultura, língua, pré e pós-

conceitos dos escritores, a ideia é chegar o mais próximo possível do que seria

contar a versão da história dos presos sob a sua própria lógica, afastando-se dos

discursos maniqueístas comumente veiculados, a fim de que as impressões sobre

os personagens sejam assimiladas pelo leitor, qualquer que seja ele.

4.1 O CRIMINOSO COMO INSPIRAÇÃO

Várias obras já foram desenvolvidas sobre o tema em foco. Trabalhos que

retratam as facetas do ambiente prisional e/ou os movimentos da criminalidade,

entre outros aspectos passíveis de observação. Exemplo disso é o

videodocumentário Cantinho Feliz (2010), produzido pelas estudantes Daiane

Pereira da Rosa e Graziele Francini Teixeira como Trabalho de Conclusão de Curso.

A obra retrata o cotidiano das internas da Penitenciária Feminina de Piraquara que

têm filhos na creche da instituição – crianças que, por não terem com quem ficar,

acabam privadas da liberdade, tal como suas mães. Construída a partir da visão das

detentas sobre si mesmas, a produção foge aos estereótipos a que normalmente

essas mulheres acabam submetidas, seja pela imprensa, seja pela sociedade em si.

Na mesma linha, o videodocumentário O Prisioneiro da Grade de Ferro –

Autorretratos (SACRAMENTO, 2003) é interessante por ter sido produzido pelos

próprios internos do presídio do Carandiru. Desse modo, traz à luz a visão dos

presos sobre o sistema penitenciário brasileiro, sobretudo as falhas no processo de

ressocialização. Além de apresentar os detentos e as condições de vida no cárcere,

a obra também expõe o cotidiano no interior da instituição, que foi desativada em

2002.

O livro-reportagem Estação Carandiru (VARELLA, 1999) traz um relato sobre

as experiências do autor, que também é médico, durante o longo período em que

esteve inserido no ambiente prisional trabalhando voluntariamente junto aos presos.

Além de descrever detalhadamente a maioria dos espaços da insituição penal, a

obra também explica o vocabulário dos internos, expõe o cotidiano da unidade e

apresenta breves perfis de alguns dos presos que se tornaram personagens no

volume. Vale lembrar que, por ser de autoria de um médico, a obra não exige

59

necessariamente a aplicação de certas técnicas e formatos próprios da linguagem

jornalística, como a citação ou indicação das fontes em todas as falas, por exemplo.

Como consequência, também o filme Carandiru (BABENCO, 2002), inspirado no

livro, segue praticamente o mesmo enredo.

O assunto foi tema também de um dos programas Profissão Repórter, da

Rede Globo, sob o título ‘Depois de 20 dias em liberdade, ex-interno da Fundação

Casa é preso’, veiculado no dia 13 de dezembro de 2011. E de reportagens da

revista Veja publicadas na edição do dia 5 de agosto de 2011, cujo foco era a prisão

de Itaí, em São Paulo, que abriga condenados de 89 nacionalidades.

Também relevante, o filme Salve Geral (REZENDE, 2009) aborda os

acontecimentos envolvendo a facção criminosa Primeiro Comando da Capital em

São Paulo. Inspirada em fatos reais, a obra expõe aspectos como a rotina dentro e

fora do ambiente prisional e discute a participação das mulheres no crime

organizado, construindo as personagens e a narrativa de modo diferente da ideia

comumente veiculada sobre o tema que, por sua vez, costuma ser calcada em

noções demasiadamente rasas sobre o bem e o mal, moral e amoral, ou seja, em

um maniqueísmo próprio de produções pouco aprofundadas.

Outro trabalho interessante é o livro A Sangue Frio, de Truman Capote (2003).

Trata-de se uma obra de suma importância pelas soluções em relação à construção

da narrativa quanto pela forma de abordagem junto aos presos que serviram de

fontes para este trabalho. O volume relata o assassinato de uma família inteira na

cidade de Holcomb, nos Estados Unidos, incluindo detalhes como o planejamento

do crime, o impacto junto à população local e a execução dos condenados pelo feito.

Por fim, o videodocumentário Ônibus 174 (PADILHA, 2002) também tem

relação com o tema explorado neste trabalho. A obra narra a história da vida do

sequestrador do ônibus que deu nome à produção, mas pela voz das pessoas que

conheceram o criminoso, de modo paralelo à descrição e reconstituição do delito.

Como é possível perceber, muito já se produziu sobre o tema em foco, talvez

com o objetivo de melhor reproduzir esse tipo de ambiente e representar esses

indivíduos – motivo esse que também inspirou o presente trabalho – de modo que

seria extremamente difícil reunir e listar aqui todo o material disponível sobre o

assunto. Entretanto, basta observar os principais aspectos de obras importantes e

recorrentemente consultadas sobre a matéria, como as indicadas acima, para notar

que as histórias de vida dos presos e a sua representação por meio dos próprios

60

relatos é, ainda hoje, uma saída pouco utilizada para expor a trajetória desses

agentes sociais.

Sendo assim, fica claro que o livro-reportagem – fruto desta pesquisa – não é

uma iniciativa completamente inédita, já que precedida por outros materiais e

estudos assemelhados, ao menos parcialmente. Por isso, compreende-se que o

referido produto poderá contribuir para tornar ainda mais fiel o entendimento que se

tem de um assunto que, apesar de tão presente, é ainda tratado de modo muito

superficial, trazendo à luz detalhes desconhecidos ou ignorados pela grande mídia.

61

5 REFERENCIAL TEÓRICO

5.1 REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

Ao estudar categorias cujas definições científicas em si são demasiadamente

complexas e pouco esclarecedoras, como os conceitos de crime e liberdade, por

exemplo– termos que envolvem o indivíduo que vive em sociedade –, procurou-se

aliar a psicologia social às Ciências da Comunicação, de modo a analisar os efeitos

do comportamento humano pelo viés da teoria das representações sociais, criada

por Serge Moscovici em 1961, na França, e que se tornou o assunto da publicação

de seu estudo La Psychanalyse: Sonimage et son public.

As representações sociais, como define Sêga (2000), apresentam-se como

uma "maneira de interpretar e pensar a realidade cotidiana, uma forma de

conhecimento da atividade mental desenvolvido pelos indivíduos e pelos grupos

para fixar suas posições em relação a situações, eventos, objetos e comunicações

que lhes concernem" (p. 190).

Dessa forma, conforme Moscovici (1994), o indivíduo foi, e em grande medida

ainda é, a única possibilidade de referência para noções como atitude, atribuição,

esquemas e assim por diante. Ou é, em outros termos, segundo Xavier (2003), "a

representação, [...] uma reflexão cognitiva, vinculada tão somente à experiência

individual da consciência no seu 'despertar' para o mundo, ou seja, o momento em

que a consciência se torna 'sujeito cognoscente'; aqui, a subjetividade individual é a

'fonte', por assim dizer, da representação" (p. 20).

Para Moscovici (1994), no entanto, a sociedade precisa agir com cautela ao

tentar fazer relações entre o indivíduo e a sociedade. “Devemos estar atentos à

maneira como colocamos o problema indivíduo-sociedade, pois, sem nos darmos

conta, corremos o risco de o transformarmos não apenas em um problema difícil,

mas principalmente em um problema que se revele impossível de ser tratado no

plano científico” (p. 7).

Assim, entende-se que, ao analisar a situação dos presos, é importante

estabelecer parâmetros científicos que não fiquem tão tangenciais, a fim de garantir

a mínima coesão entre o indivíduo, o objeto, e a representação social projetada.

Pois, conforme Vilas Boas (2002), "o indivíduo não é um ser único cuja psique pode

62

ser separada como fenômeno individual. O indivíduo é também um ser social e

coletivo" (p. 125).

Segundo Bacelar (2004), "Moscovici acabou por demonstrar que as

representações não derivam de uma única sociedade, ultrapassando-a, como

insistiu Durkheim, mas das diversas sociedades que existem no interior da

sociedade maior, e, portanto, não podem ultrapassá-la" (p. 184).

Moscovici (1994) afirma que a representação social é uma modalidade

particular do conhecimento, abrangendo a comunicação entre os indivíduos, e assim

ela integra os grupos sociais com base na relação cotidiana. “As representações

sociais são fruto não apenas de concepções históricas, mas do aqui e agora; são

construções que situam o indivíduo, dando-lhe identidade social” (LESCURA,

201256). Assim, o autor entende que as representações sociais fazem parte de um

conjunto de conhecimentos nos quais o indivíduo acha-se capaz de entender a

realidade social que ele integra. “Spink (1995) acrescenta ainda que as

representações sociais podem ser entendidas como uma espécie de saber prático,

porque se inserem, nesse sentido, nas correntes que estudam o conhecimento do

senso comum” (LESCURA, 201257). Portanto, pode-se considerar a teoria das

representações sociais como a mais conveniente para sustentar os argumentos

desta pesquisa, seja pela contextualização do corpo social, seja pelo entendimento

de que existem as mais variadas nuances ao analisar o indivíduo.

Na preocupação em discutir as relações entre indivíduo e sociedade, e como

elas se constroem, Guareschi e Jovchelovitch (1994) consideram que parte da teoria

das representações sociais busca recuperar a conexão problemática de "uma

sociedade sem sujeitos ou sujeitos sem uma história social" (p. 63). Segundo os

autores, "é através da ação de sujeitos sociais agindo no espaço que é comum a

todos, que a esfera pública58 aparece como o lugar em que uma comunidade pode

desenvolver e sustentar saberes sobre si própria - ou seja, representações sociais"

(id, p. 71). 56

LESCURA, Carolina et al (Org.). Representações sociais sobre as relações de parentesco: estudo de caso em um grupo empresarial familiar. Revista de Administração Contemporânea. Curitiba, PR, v. 16, n. 1, jan-fev. 2012. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1415-65552012000100007&script=sci_arttext. Acesso em: 20/05/2012. 57

Idem ao 56. 58

Guareschi e Jovchelovitch (1994) interpretam esfera pública, parafraseando Habermas, como um espaço em que os cidadãos se encontram e falam uns com os outros de forma que garanta acesso a todos os envolvidos.

63

Para Guareschi e Jovchelovitch (1994), "a teoria das representações sociais

se constrói sobre uma teoria de símbolos" (p. 71), e assim "o símbolo59 se constrói

apenas como máscara de estruturas sociais desiguais" (id, p. 64), em que a teoria

das representações mostraria que "o ser humano desenvolve uma identidade, cria

símbolos e se abre para a diversidade de um mundo de Outros" (ibid, p. 65). Sem o

propósito de desviar o foco das teorias empregadas, mas com o objetivo de elucidar

eventuais ambiguidades relacionadas à definição do termo 'identidade', considerou-

se o conceito de Elichirigoity (2008), que defende que "é preciso ver a identidade de

uma coisa não como algo solitariamente isolado de todas as outras categorias, mas

como uma variável contrastante de todas as outras que poderiam, sob condições

diferentes, preencher a mesma posição na existência” (p. 183).

Na concepção de Guareschi e Jovchelovitch (1994), "o social geralmente tem

sido as condições concretas da vida, que envolvem desde relações sociais de

produção até mecanismos institucionais de várias ordens" (p. 66). Portanto, segundo

Peterson (2012), há muitos contextos "nos quais uma pessoa é diferente da norma

(raça, gênero, religião, identidade sexual, características físicas, etc.). Porém, como

explica Landowski, o que está em jogo não é a diferença. Ou seja, é a atribuição de

características (ou marcas) semânticas à diferença que produz alteridade60" (p. 16).

Pode-se relacionar a teoria das representações sociais à comunicação social,

área pela qual se pretende desenvolver o livro-reportagem com os relatos dos

presos, na forma com que Guareschi e Jovchelovitch (1994) veem a interação do

indivíduo com a esfera pública e a forma como este a transcende. Segundo os

autores, a imortalidade do indivíduo "envolve sua capacidade para produzir, manter

e transformar uma história que permanece nos artefatos e narrativas humanas" (p.

68). Nesse sentido, os autores propõem que a relação de um indivíduo num mundo

comum a todos os seres humanos "depende do esforço de uns em direção aos

outros, de um processo de ação e discurso que contenha tanto as diferenças como

as similaridades entre pessoas - isto é, diálogo" (id, p. 68). Aí, portanto, aplica-se e

justifica-se o uso do livro-reportagem, no qual, conforme Pereira (2007), “o jornalista

59

Para Malanga (2004), de um modo geral, o termo símbolo é entendido como um signo ou um grupo de signos que adquiriram uma amplitude e uma quantidade de significados muito acima do padrão normal.

60

Para Peterson (2012), a alteridade implica em um processo cognitivo e, por vezes ideológico, que se manifesta dentro do sujeito e, consequentemente, dentro da sociedade.

64

pode expressar toda sua subjetividade, ou – usando um termo da Análise do

Discurso de linha francesa (doravante AD) – sua(s) ideologia(s)” (p. 1.195).

Daí, a fim de evitar repetir os estereótipos – que Diniz (1997) afirma tratar-se

“de uma opinião pronta, uma ideia ou expressão muito utilizada, desgastada,

banalizada, um lugar-comum ou clichê" (p. 137) –, do jornalismo convencional –

prática na qual, de acordo com Pena (2006), "os repórteres sempre procuram os

personagens que já estão legitimados neste círculo vicioso” (p. 8), e muitas vezes,

como define Silva (2008), de forma subjetiva, "pode-se observar esses estereótipos

presentes na literatura, na música, nos jornais, ou seja, nos mais variados meios de

comunicação de massa" (p. 4) -, procurou-se mostrar a individualidade dos presos

com base na concepção social, dentro de uma psicologia sociológica, com Moscovici

e a teoria das representações sociais, como forma mais conveniente de embasar

cientificamente esta pesquisa.

5.2 JORNALISMO LITERÁRIO E O NEW JOURNALISM

Ao estabelecer a forma de escrita a ser adotada para compor os relatos dos

presos na presente pesquisa, optou-se por utilizar o jornalismo literário porque,

segundo Pena (2006), a modalidade é uma forma de "potencializar os recursos do

jornalismo, ultrapassar os limites dos acontecimentos cotidianos, proporcionar visões

amplas da realidade, exercer plenamente a cidadania, e romper as correntes

burocráticas do lide" (p. 6). O autor defende que do jornalismo literário derivaram

vários subgêneros como o romance-reportagem, a biografia, o New Journalism

americano, o jornalismo gonzo e a ficção jornalística, de modo que “tais subgêneros

foram se estabelecendo ao longo do século XX e, embora diferentes, têm

características comuns que podem dar subsídios para uma conceituação ampla do

jornalismo literário” (id).

Na concepção de Pena (ibid), o gênero "atraiu uma série de talentos que

ousaram ultrapassar os limites da redação" (p. 10). Dentre os profissionais que

ganharam notoriedade ao usarem recursos literários nos textos ou por compor livros-

reportagem, pode-se citar Gay Talese, Tom Wolfe, Joseph Mitchell, John Hersey, o

romancista Truman Capote (que foi considerado o precursor do Novo Jornalismo

com a obra A Sangue Frio), Janet Malcolm, Hunter Thompson, Jon Krakauer,

Ryszard Kapuscinski, Joan Didion, Joseph Roth, Gabriel García Márquez; no Brasil,

65

Fernando Morais, Zuenir Ventura, Joel Silveira, Ruy Castro, Nelson Motta, Eduardo

Galeano, Washington Novaes, Ignácio de Loyola Brandão, Caco Barcelos, Eliane

Brum e outros mais. De forma que "Balzac, Victor Hugo, Stendhal e outros [...]

escritores podem [...] ser considerados como os precursores do jornalismo literário,

se classificarmos como tal um gênero que se caracteriza pela publicação de

literatura nas páginas de jornais" (ibid, p. 6).

Conforme Lima (2004), o jornalista americano Tom Wolfe foi um dos porta-

vozes do New Journalism e praticou "uma literatura da realidade" (p. 180). Segundo

o autor, haveria um embrião do que se poderia chamar de "reprodução do cotidiano

social" (id). A partir de então e seguido do que fizera o escritor Daniel Defoe, no

denominado realismo social, os romancistas passaram a conquistar o "seu lugar ao

sol como gênero literário de prestígio [...] os romancistas do realismo social

realizavam, na visão de Wolfe, um verdadeiro trabalho de captação do real, como se

fossem repórteres do seu tempo" (ibid, p. 181). Portanto, o autor defende que "é de

se compreender que o romance do realismo social da época exercia um papel de

reprodução do real algo à semelhança do que faria a reportagem mais tarde" (ibid, p.

182).

Wolfe (apud Martins, 2009) é quem explica que, “ao começar os anos

sessenta, um novo e curioso conceito, vivo bastante para inflamar os egos, havia

começado a invadir os confins da esfera profissional da reportagem. Esse

descobrimento, a princípio modesto e humilde, poderíamos dizer, consistia em tornar

possível um jornalismo que [...] pudesse ser lido igual a um conto” (p. 1). Segundo

Lima (2004), "é de fato a vertente do realismo social o que irá impulsionar

sobremaneira o jornalismo literário" (p. 184). Para o autor, "a chance que o

jornalismo poderia ter para se igualar, em qualidade narrativa, à literatura, seria

aperfeiçoando meios sem, porém, jamais perder sua especificidade" (id, p. 191). Isto

é, teria de sofisticar seu "instrumental de expressão, de um lado, elevar seu

potencial de captação do real, de outro” (ibid, p. 192).

Para Kramer (2007), "o narrador em Jornalismo Literário tem uma

personalidade, é uma pessoa complexa, profunda, franca, irônica, oblíqua, confusa,

judicativa e até autoirônica – qualidades que os acadêmicos e repórteres do dia a

dia evitam com veemência como se tais posturas fossem antiprofissionais e não-

66

objetivas"61. Wolfe (2005) afirma que existem pontos cruciais que tornam o New

Journalism importante. Primeiro, porque existem "recursos específicos, todos

realistas, subjacentes à qualidade de envolvimento emocional dos mais potentes

textos em prosa, sejam eles ficção ou não ficção” (p. 7). E o segundo ponto,

conforme o autor, seria o fato de que “o realismo não é meramente outra postura ou

atitude literária” (id). Dessa forma, abrindo mais a discussão, Pena (2006) ressalta

que “o jornalista literário não ignora o que aprendeu no jornalismo diário. Nem joga

suas técnicas narrativas no lixo” (p. 7). Com isso, "os profissionais que passaram a

produzir nessa corrente - que Tom Wolfe se recusava a chamar de movimento -

abririam uma porta de possibilidades vastas, primeiro em publicações periódicas e

depois no livro-reportagem" (Lima, 2004, p. 192).

A preocupação do jornalismo literário, conforme Pena (2006), “é

contextualizar a informação da forma mais abrangente possível, o que seria muito

mais difícil no exíguo espaço de um jornal" (p. 7). Mas, para isso, segundo o autor,

"é preciso mastigar as informações, relacioná-las com outros fatos, compará-las com

diferentes abordagens e, novamente, localizá-las em um espaço temporal de longa

duração” (id).

Vilas Boas (2003) explica que "em O reino e o poder: uma história do New

York Times, Gay Talese, um dos expoentes do New Journalism nos anos 1960, nos

lembra de que o modo distante com que os jornalistas em geral observam o mundo

lhes rouba aquela experiência mais profunda que brota do envolvimento" (p. 14).

Para o autor, "transmitir uma compreensão - ainda que abreviada e efêmera – sobre

alguém é delicado. Não basta embaralhar fatos biográficos ou aspear frases do

personagem" (id). Dessa forma, na concepção de Lima (2004), "o New Journalism

resgataria [...] a tradição do jornalismo literário e conduzi-lo-ia a uma cirurgia plástica

renovadora sem precedentes" (p. 192).

Por outro lado, no que tange o jornalismo convencional, defende Henn (1996),

as relações com o meio ambiente andam ‘numa via de mão dupla’. "O meio se força

sobre o sistema jornalístico, e o jornalismo, por sua vez, interfere no meio. [...] e

reduz essa complexidade à relação de inputs e outputs, os primeiros classificados

como os acontecimentos que entram no sistema e, os segundos, traduzidos nas

61

KRAMER, Mark. Regras Rompíveis do Jornalismo Literário. Tradução de Fred Linardi. Preparação e revisão de Sérgio Vilas Boas. Jaraguá, SP, 2007. Disponível em: http://www.textovivo.com.br/seminario/nota07.htm. Acesso em: 24/05/2012.

67

notícias que o sistema transmite". Dessa forma, segundo o autor, "o funcionamento

de um jornal como sistema congrega elementos necessários à sua caracterização

como tal" (p. 65).

O sistema jornalístico absorve o indeterminismo do meio ambiente, desenvolvendo-o de forma narrativa e hierarquizada. Mas também impõe certos acasos que alteram a vida no ecossistema. Nessa parte também se trata dos códigos que entram em jogo na definição do que é noticiável e, consequentemente, na seleção dos acontecimentos através da pauta. (id, p. 16)

Segundo o autor, "o que diferencia de fato o jornalismo de outras atividades é

o desempenho da tarefa informativa e orientativa" (ibid, p. 65). Assim, é de se notar

a importância do jornalismo convencional e o papel social que representa, e, de

forma equivalente, o jornalismo literário e suas vertentes também têm igual

importância - e não deixa de ser criticado.

O New Journalism não pode ser considerado unanimidade no meio jornalístico e na comunidade acadêmica, tendo sido questionado por quem nele enxerga uma deturpação do fazer jornalístico pela ficção literária. Porém, é inegável sua contribuição para o aprimoramento da reportagem e do olhar jornalístico sobre a realidade, tanto que seus frutos e ecos não se renderam à América do Norte nem cessaram no momento histórico de ebulição da contracultura. No Brasil, um exemplo claramente influenciado

pela tendência norte-americana foi a revista Realidade62

, cujo período "de ouro" situado entre 1966 e 1968 (Pessa, 2009, p. 5-6).

Dessa forma, o jornalismo literário, com seus subgêneros, entre eles o Novo

Jornalismo, não deixou de lado as prerrogativas do jornalismo convencional.

Conforme Pena (2006), “os velhos e bons princípios da redação continuam

extremamente importantes, como, por exemplo, a apuração rigorosa, a observação

atenta, a abordagem ética e a capacidade de se expressar claramente, entre outras

coisas” (id, p. 7).

‘Novo jornalismo’ foi a expressão que acabou pegando. Não era nenhum 'movimento'. Não havia manifestos, clubes, salões, nenhuma panelinha; nem mesmo um bar onde se reunissem os fiéis, visto que não era nenhuma fé, nenhum credo. Na época, meados dos anos 60, o que aconteceu foi que, de repente, sabia-se que havia uma espécie de excitação artística no jornalismo, e isso em si já era uma novidade (Wolfe, 2005, p. 40-41).

62

Conforme Faro (1999), "o entendimento do código proposto pelo New Journalism é fundamental para que se compreenda toda a abrangência de sua proposta editorial. A narrativa da grande reportagem no jornalismo brasileiro surgia alterada e inovadora com a revista da Editora Abril" (p. 55).

68

Assim, "Tom Wolfe [...] explica que o Novo Jornalismo não quer abafar

ninguém. Quer mostrar que faz reportagem também – mas não só. Ele acredita que

esse formato tradicional de contar histórias pode perseguir formas mais imaginativas

do que o aborrecido tom bege dos relatórios. Pode ser mais subjetivo. Pode ter valor

estético" (Santos, 2005, p. 238-239).

A matéria de Capote, contando a vida e a morte de dois vagabundos que estouraram as cabeças de uma rica família rural em Kansas, foi publicada em capítulos na The New Yorker, no outono de 1965, e saiu em forma de livro em fevereiro de 66. Foi uma sensação - e um baque terrível para todos os que esperavam que o maldito Novo Jornalismo ou Parajornalismo se esgotasse como uma moda. Afinal, ali estava não um jornalista obscuro, nem algum escritor freelance, mas um romancista de longa data... cuja carreira estava meio parada... e, de repente, de um só golpe, com aquela virada para a maldita forma nova de jornalismo, não só ressuscitava sua reputação, mas a elevaria mais alto que nunca antes... e, em troca, tornava-se uma celebridade da mais incrível magnitude. Pessoas de todo tipo leram A Sangue Frio, pessoas de todos os níveis de gosto. Todo mundo foi absorvido por aquilo. O próprio Capote não chama seu livro de jornalismo; longe disso; dizia que tinha inventado um novo gênero literário, 'o romance de não ficção'. Porém, seu sucesso atribuiu uma força esmagadora àquilo que logo viria a ser chamado de Novo Jornalismo (Wolfe, 2005, p. 45-46).

Faro (1999) – ao analisar a obra A Sangue Frio, de Truman Capote, e

referindo-se à importância que o noticiário policial teve na construção dos códigos do

New Journalism –, cita, em seu artigo, a declaração de Marcos Faerman63: "o Novo

Jornalismo tira as histórias policiais de um território de ingenuidade e pequenas

charadas em que elas são confinadas ao longo de todo o século XX" (p. 54). Aí,

ainda parafraseando Faerman, Faro (id) aponta que "se o crime é também a história

de angústias e horrores, como a sombra de um patíbulo avistado das galerias de um

presídio, é em umas poucas obras escritas com as técnicas da reportagem literária

que sua verdade terrível vai ser resgatada" (p. 54).

Pena (2006) sugere que, ao escolher um tema, o jornalista "deve pensar em

como sua abordagem pode contribuir para a formação do cidadão, para o bem

comum, para a solidariedade". (p. 8). Nessa linha, o autor defende que o profissional

deve escapar das armadilhas do jornalismo convencional e do lide, ou seja, ele

acredita que "é preciso [...] fugir dessa fórmula e aplicar técnicas literárias de

construção narrativa” (id). Afinal, para ele, além de evitar os definidores primários,

63

Conforme Faro (1999),a declaração foi retirada da seguinte referência: "Da arte dos belos crimes. Revista Shalon, ano 29, nº 303, janeiro/fevereiro/março de 1995".

69

"eles são os famosos entrevistados de plantão, aqueles sujeitos que ocupam algum

cargo público ou função específica e sempre aparecem na imprensa" (ibid).

Conforme Pessa (2011) é necessário ressaltar que nem todo jornalismo sobre

literatura ou publicado em livro pode ser considerado Jornalismo Literário.

"Jornalismo com toques de ficção ou ficção com recursos de jornalismo também são

formato diferentes, que não se encaixam no conceito" (p. 6).

Para Souza e Luíndia (2010), “quando se fala em Jornalismo Literário, a

definição é uníssona, pois a chamada Literatura não-ficcional nos permite um

casamento entre um e outro, uma junção quase simbiótica entre a forma de fazer

jornalística e a forma de expressar literária”. (p. 3). E é com esses conceitos que a

presente pesquisa pretende, com o uso de uma de suas formas, o livro-reportagem,

escrever os relatos dos presos. Pois, conforme Heller (2005), "se concordarmos com

a ideia de que o livro, enquanto suporte, pode ser perecível, mas não as ideias que

ele contém, estamos começando a nos aproximar de uma ideia que pode ajudar a

esclarecer a diferença entre o texto que contém um fato histórico, como o

jornalístico, e o literário, que potencialmente cria enredos a partir dele" (p. 17).

Assim, também, decidiu-se compor o livro-reportagem e adotar como

subgênero o New Journalism. Dessa forma, e como os relatos dos presos não serão

muito extensos a ponto de serem considerados biografias, considerar-se-á o texto

apresentado no livro como mais próximo ao que Vilas Boas (2003) denomina de

perfil e, embora não o seja totalmente, usar-se-á elementos desse tipo de texto no

produto, já que, segundo o autor, "os perfis cumprem um papel importante que é

exatamente gerar empatias. Empatia é a preocupação com a experiência do outro, a

tendência a tentar sentir o que sentiria se estivesse nas mesmas situações e

circunstâncias experimentadas pelo personagem" (p. 14).

Portanto, para Vilas Boas (id), perfilar alguém "significa compartilhar as

alegrias e tristezas de seu semelhante, imaginar situações do ponto de vista do

interlocutor” (p. 14). Segundo o autor, seria a empatia o elemento essencial

necessário para viabilizar o autoconhecimento de quem escreve e de quem lê.

5.3 LIVRO-REPORTAGEM

Tal como define Vilas Boas (2002), o livro-reportagem se constitui numa das

modalidades do jornalismo capazes de ajudar os leitores a compreender o passado,

70

visto que "cobre amplas faixas de tempo, interage com várias áreas do

conhecimento (a História e a Sociologia incluídas) e possui mecanismos sofisticados

de captação da realidade distante e imediata e de estruturação e redação de texto"

(p. 20). Segundo o autor, o livro-reportagem é uma prática jornalística e literária que

tem enfoque humano pela via da escrita impressa, embora possua elementos

jornalísticos, como o compromisso com os fatos (passado) e com a clareza

(acessibilidade).

Como se considera o texto pretendido para o livro-reportagem como mais

próximo ao que Vilas Boas (2003) denomina perfil, aplicar-se-á na pesquisa outro

conceito que vai ao encontro desse último, ou seja, a definição de Sodré e Ferrari

(1986) para o termo, na qual, em jornalismo, perfil definiria o material focado na

pessoa – seja ela uma celebridade ou um tipo popular, mas sempre o focalizado é

protagonista de uma história: sua própria vida. "Diante desse herói (ou anti-herói) o

repórter tem, geralmente, dois tipos de comportamento: ou mantém-se distante,

deixando que o focalizado se pronuncie, ou compartilha com ele um determinado

momento e passa ao leitor essa experiência" (id, p. 14). Segundo Vilas Boas (2003),

no Brasil, alguns repórteres se notabilizaram ao escreverem perfis, caso de Luiz

Fernando Mercadante, Carlos Azevedo, Oriana Fallaci, e Roberto Freire.

Mas, para se contar a história de modo que a narrativa traduza o

conhecimento objetivo e subjetivo do mundo, é necessário antecipar, de acordo com

Motta (2007), que "o reconhecimento das personagens e de sua dinâmica funcional

ocorre concomitantemente com a identificação dos episódios, porque as

personagens são atores que realizam coisas (funções) na progressão da história" (p.

7). Para Lima (2004), "o livro-reportagem [...] cobre os vazios deixados pela

imprensa, e amplia, para o leitor, a compreensão da realidade" (p. 61). A realidade

essencial do livro-reportagem "é determinada a partir das características e dos

princípios que regem o jornalismo como um todo" (id, p. 11).

Segundo o autor, existem 13 tipos diferentes de classificação de livros-

reportagem64. Dentre eles, escolheu-se, como o mais próximo para atender os

objetivos desta pesquisa, o tipo livro-reportagem-perfil, que, conforme Lima (ibid) se

64

Conforme a classificação de Lima (2004), as variedades são: livro-reportagem-perfil, livro-reportagem-depoimento, livro-reportagem-retrato, livro-reportagem-ciência livro-reportagem-ambiente, livro-reportagem-história, livro-reportagem-nova consciência, livro-reportagem-instantâneo, livro-reportagem-atualidade, livro-reportagem-antologia, livro-reportagem-denúncia, livro-reportagem-ensaio, livro-reportagem-viagem.

71

define em uma "obra que procura evidenciar o lado humano de uma personalidade

pública ou de uma personagem anônima que, por algum motivo, torna-se de

interesse" (p. 51-52). Segundo o autor, "uma variante desta modalidade é o livro-

reportagem-biografia – quando um jornalista, na qualidade de ghost writer ou não,

centra suas baterias mais em torno da vida, do passado, da carreira da pessoa em

foco, normalmente dando menos destaque ao presente" (ibid, p. 52).

De acordo com o que noticia Morais (2004), no Observatório da Imprensa, foi

das redações da revista Realidade e do Jornal da Tarde que saíram jornalistas para

confeccionar livros-reportagem. Como aponta a autora, Fernando Morais, por

exemplo, escreveu na década de 1970 o detalhado relato sobre Cuba denominado A

Ilha (reeditado recentemente com a inserção de algumas atualizações feitas pelo

próprio autor) e outros nomes como Ruy Castro e Zuenir Ventura, que alcançaram

igual reconhecimento produzindo livros como Chega de Saudade e 1968 – o ano

que não terminou.

O livro-reportagem serve a distintas finalidades que se desdobram dos objetivos básicos de informar, orientar e explicar, enveredando pelos diversos gêneros jornalísticos existentes: jornalismo informativo arredondado (aprofundamento apenas extensivo), jornalismo interpretativo (aprofundamentos extensivo e intensivo), jornalismo opinativo (postura unilateral para defender um conjunto de princípios), jornalismo investigativo (tom de denúncia) e jornalismo diversional (voltado para o lazer) (Pessa, 2009, p. 2).

Para Pessa (id), portanto, o livro-reportagem deve sua existência à

reportagem, unidade que o formata conforme é desenvolvida. Reportagem "é uma

extensão da notícia e, por excelência, a forma-narrativa do veiculo impresso" (Sodré

apud ibid, p. 1). Segundo o autor, se a notícia é o relato de um fato de interesse

jornalístico, a reportagem é a narrativa que aborda as origens, implicações e

desdobramentos do fato, e também apresenta os personagens envolvidos nele,

tornando-os mais complexos.

5.4 CONCEITOS DE REPORTAGEM

Para Lima (2004), "a reportagem é um dos gêneros jornalísticos e estes são

entendidos por Juan Gargurevich como 'formas que busca o jornalista para se

expressar'. Portanto, a reportagem, como gênero, pressupõe o exame o estilo com

72

que o jornalista articula sua mensagem" (p. 24). Segundo Kindermann (2003), "Sua

constituição como gênero, contudo, não é clara, de modo que as definições

constantes nos manuais jornalísticos acadêmicos e de redação e estilo variam

bastante, principalmente quanto às suas especificidades estruturais e funcionais" (p.

11). E, embora os teóricos acadêmicos que tratam do gênero jornalístico não o

estabeleçam explicitamente, “pode ser caracterizada em duas linhas gerais: (a)

como uma notícia ampliada e (b) como um gênero autônomo” (id, p. 38).

Em relação às características, "Muniz Sodré e Maria Helena Ferrari apontam

a 'predominância da forma narrativa', a 'humanização do relato', o 'texto de natureza

impressionista' e a 'objetividade dos fatos narrados'" (Lima, 2004, p. 24). Portanto,

conforme o autor, a reportagem é entendida "como a ampliação da notícia [...], o

livro-reportagem é o veículo de comunicação impressa não-periódico que apresenta

reportagens em grau de amplitude superior ao tratamento costumeiro nos meios de

comunicação jornalística periódicos" (id, p. 26).

Citando Bahia, Kindermann (2003) defende que “o salto da notícia para a

reportagem se dá no momento em que é preciso ir além da notificação – em que a

notícia deixa de ser sinônimo de nota – e se situa no detalhamento, no

questionamento de causa e efeito, na interpretação e no impacto, adquirindo uma

nova dimensão narrativa e ética” (p.039).

Toda reportagem, segundo Lage (2003), “pressupõe investigação e

interpretação" (p. 136). Para o qual no jornalismo investigativo, de acordo com o

autor, é definido como "forma extremada de reportagem, pois se trata de dedicar

tempo e esforço ao levantamento de um tema pela qual o repórter, em geral, se

apaixona" (id, p. 138). Assim, o jornalismo interpretativo "consiste, grosso modo, em

um tipo de informação em que se evidenciam consequências ou implicações dos

dados [...] e objetiva oferecer ao leitor fatos que permitem estabelecer conclusões –

sem fechar essas conclusões" (ibid, p. 136).

Para Pessa (2009), ela visa a atender a necessidade de ampliar os fatos para

uma dimensão contextual e colocar para o receptor uma compreensão de maior

alcance, “objetivo melhor atingido na prática da grande-reportagem, que possibilita

um mergulho de fôlego nos fatos e em seu contexto e oferece ao seu autor uma

dose ponderável de liberdade para superar os padrões e fórmulas convencionais do

tratamento da notícia” (p. 1).

73

O desdobramento das clássicas perguntas a que a notícia pretende responder (que, o que, como, quando, onde, por que) constituirá de pleno direito uma narrativa, não mais regida pelo imaginário, como na literatura de ficção, mas pela realidade factual do dia-a-dia, pelos pontos rítmicos do cotidiano que, discursivamente trabalhados, tornam-se reportagem. Esta é uma extensão da notícia e, por excelência, a forma-narrativa do veículo impresso (embora a entrevista, sobretudo o perfil, possa também, às vezes, assumir uma forma narrativa). A reportagem constitui, assim, basicamente, um dos gêneros jornalísticos (Sodré e Ferrari, 1986, p. 2-3).

Segundo Sodré e Ferrari (id), as principais características de uma reportagem

são a predominância da forma narrativa; a humanização do relato; o texto de

natureza impressionista e; a objetividade dos fatos narrados. "Conforme o assunto

ou o objeto em torno do qual gira a reportagem, algumas dessas características

poderão aparecer com maior destaque. Mas será sempre necessário que a narrativa

(ainda que de forma variada) esteja presente numa reportagem. Ou não será

reportagem" (ibid, p. 5-6).

Dentre os tipos de reportagem indicadas por Sodré e Ferrari (ibid), a

reportagem-conto particulariza a ação, escolhendo um personagem para ilustrar o

tema que pretende desenvolver; a reportagem-crônica se detém mais em situações

fortuitas e flagrantes do cotidiano, conduzindo a narrativa de forma impressionista,

por meio de um narrador colocado em posição observadora ou reflexiva, de caráter

mais circunstancial e ambiental; e o livro-reportagem é uma compilação de textos já

publicados em jornais ou trabalho feito para livro, mas concebido a partir de textos

jornalísticos. Dessas variantes, pretende-se, a priori, mesclar os dois tipos iniciais de

reportagem, no formato de livro-reportagem, usando, ainda, elementos do Novo

Jornalismo, haja vista que, bem como definem os autores, na reportagem pode-se:

Omitir um elemento que, como nas histórias policiais, só seja revelado no final. Nesses casos, o real é engendrado para produzir determinado efeito, mas a partir de dados fornecidos pelo próprio real; essa forma ficcional atende ao tema e sua problemática. Ainda assim, uma diferença se impõe entre literatura e jornalismo: na primeira, predomina o imaginário; no segundo, deve predominar a realidade dos fatos narrados. Além da verossimilhança, portanto, a reportagem não pode esquecer seu compromisso com a verdade - que poderíamos chamar de autenticidade do fato (ibid, p. 13-14).

Contudo, como afirma Faro (1999), "talvez seja [...] da própria natureza do

processo de comunicação e, portanto, de qualquer narrativa, essa impossibilidade

de apreensão da realidade global” (p. 20). Assim, conforme o autor, a reportagem,

na sua pretensão globalizadora, "estaria permanentemente condicionada a ser uma

74

atividade vinculada à análise sociológica e à estética literária, já que estas, pela

liberdade de especulação que as caracterizam, respectivamente como ciência e

como arte, oferecem ao repórter os elementos que o referencial informativo

convencional não tem" (id, p. 20). Ainda seguindo as ideias de Faro (ibid), o exemplo

concreto vem do elenco de 'regras' adotado pelo New Journalism, que, segundo ele,

é a 'escola' que mais se aproxima da compreensão da amplitude da reportagem e

uma codificação daquilo que a própria necessidade gerou no jornalismo.

5.5 TÉCNICAS DE ENTREVISTA

De acordo com Lage (2003), numa entrevista, a estrela é o entrevistado. No

caso desta pesquisa, o preso será a estrela e, sendo assim, procurar-se-á adotar as

melhores formas de uso desse recurso tão utilizado na temática jornalístico.

Segundo Boni e Quaresma (2005), a entrevista é "definida por Haguette

(1997) como um processo de interação social entre duas pessoas na qual uma

delas, o entrevistador, tem por objetivo a obtenção de informações por parte do

outro, o entrevistado” (p. 72). Para os autores, é por meio dela que os pesquisadores

buscam obter informações, ou seja, coletar dados objetivos e subjetivos. “Os dados

objetivos podem ser obtidos também através de fontes secundárias tais como:

censos, estatísticas, etc. Já os dados subjetivos só poderão ser obtidos através da

entrevista, pois que, eles se relacionam com os valores, às atitudes e às opiniões

dos sujeitos entrevistados” (id, p. 72).

Lage (2003) aponta que "a entrevista é o processo clássico de apuração de

informações em jornalismo. É uma expansão da consulta às fontes, objetivando,

geralmente, a coleta de interpretações e a reconstituição de fatos" (p. 73). Conforme

Boni e Quaresma (2005), para se obter uma narrativa natural muitas vezes não é

interessante fazer uma pergunta direta, mas sim fazer com que o pesquisado

relembre parte de sua vida. Para tanto o pesquisador pode muito bem ir suscitando

a memória do pesquisado (Bourdieu apud ibid, p. 72).

As pessoas (...) têm duas possibilidades de expor uma ideia ou narrar uma história e, em geral, tendem a optar sistematicamente por uma delas: ou são holísticos (consideram o todo e daí partem para analisar algum ponto) ou detalhistas, que agem analiticamente item por item. No primeiro caso, pode-se ter um relato muito geral ou interpretativo; no segundo, uma sequência tediosa de detalhes insignificantes. O problema pode ser

75

contornado, até certo ponto, por intervenções de correção de rumo, em que se pede ao detalhista uma abordagem mais geral ou ao generalista que especifique algum aspecto (Lage, 2003, p. 81).

Dessa forma, como afirma Lage (id), é engano imaginar que a preparação

prévia de um questionário viabiliza uma boa entrevista porque segundo o autor ela

depende muito da maneira como é conduzida.

Segundo Boni e Quaresma (2005), as formas de entrevistas mais utilizadas

em Ciências Sociais são a entrevista estruturada65, a semiestruturada66, a aberta67,

a entrevista com grupos focais68, a história de vida e também a entrevista projetiva69,

e a entrevista aberta. E dentre esses tipos, o mais interessante para a presente

pesquisa é a técnica de entrevista semiestruturada, na qual o entrevistador fica

atento para dirigir, no momento que achar oportuno, "a discussão para o assunto

que o interessa fazendo perguntas adicionais para elucidar questões que não

ficaram claras ou ajudar a recompor o contexto da entrevista, caso o informante

tenha 'fugido' ao tema ou tenha dificuldades com ele" (id, p. 75).

Além dessas formas de entrevista, os autores definem ainda a história de vida

como uma entrevista em profundidade, na qual o pesquisador constantemente

interage com o informante. "Sua principal função é retratar as experiências

vivenciadas por pessoas, grupos ou organizações" (ibid, p. 73). Segundo os

estudiosos, existem dois tipos diferentes de histórias de vida: a completa, "que

retrata todo o conjunto da experiência vivida; e a tópica, que focaliza uma etapa ou

um determinado setor da experiência em questão (Minayo, 1993)" (p. 73).

65

Para Boni e Quaresma (2005), as entrevistas estruturadas são elaboradas mediante questionário totalmente estruturado, ou seja, é aquela onde as perguntas são previamente formuladas e tem-se o cuidado de não fugir a elas. 66

As entrevistas semiestruturadas combinam perguntas abertas e fechadas, onde o informante tem a possibilidade de discorrer sobre o tema proposto. O pesquisador deve seguir um conjunto de questões previamente definidas, mas ele o faz em um contexto muito semelhante ao de uma conversa informal (id). 67

Segundo Boni e Quaresma (ibid), a entrevista aberta é utilizada quando o pesquisador deseja obter o maior número possível de informações sobre determinado tema, segundo a visão do entrevistado, e também para obter um maior detalhamento do assunto em questão. Ela é utilizada geralmente “na descrição de casos individuais, na compreensão de especificidades culturais para determinados grupos e para comparabilidade de diversos casos (Minayo, 1993)” (p. 74). 68

As entrevistas com grupos focais é uma técnica de coleta de dados cujo objetivo principal é estimular os participantes a discutir sobre um assunto de interesse comum, ela se apresenta como um debate aberto sobre um tema (Boni; Quaresma, 2005). 69

A entrevista projetiva é aquela centrada em técnicas visuais, isto é, a utilização de recursos visuais onde o entrevistador pode mostrar: cartões, fotos, filmes, etc ao informante (id).

76

A HV tem como ponto principal permitir que o informante retome sua vivência de forma retrospectiva. Muitas vezes durante a entrevista acontece a liberação de pensamentos reprimidos que chegam ao entrevistador em tom de confidência. Esses relatos fornecem um material extremamente rico para análise. Neles se encontram o reflexo da dimensão coletiva a partir da visão individual (Boni; Quaresma, 2005, p. 73).

Conforme Vilas Boas (2003), "um personagem desconhecido, por mais

iluminador que seja, simplesmente não existe para o jornalismo convencional.

Exceção para os grotescos, os pitorescos, os vitimados ou os loucos de pedra" (p.

24). E o autor também cita a chamada história de vida:

Uma expressão mais abrangente e aberta, nascida do contexto das pesquisas qualitativas em Ciências Sociais (Sociologia, Antropologia, História, Psicologia): Histórias de vida. Essa modalidade dá atenção total ou parcial às narrativas sobre as vidas de indivíduos ou de grupos sociais, visando a humanizar um tema, um fato ou uma situação contemporânea. Na sua versão mais abreviada, a história de vida examina episódios específicos da trajetória do protagonista (id, p. 17-18).

Segundo Bourdieu (apud Boni; Quaresma, 2005), "os pesquisados mais

carentes geralmente aproveitam essa situação para se fazer ouvir, levar para os

outros sua experiência e muitas vezes é até uma ocasião para eles se explicarem,

isto é, construírem seu próprio ponto de vista sobre eles mesmos e sobre o mundo”

(p. 77). Desse modo, segundo Lage (2003), no jornalismo impresso "podem-se

substituir palavras e expressões, desde que não estejam entre aspas, mantendo o

sentido da fala do entrevistado" (p. 84).

Os autores também citam a observação de Bordieu quanto à transcrição da

entrevista que é parte integrante da metodologia do trabalho de pesquisa. "Uma

transcrição de entrevista não é só aquele ato mecânico de passar para o papel o

discurso gravado do informante, pois, de alguma forma o pesquisador tem que

apresentar os silêncios, os gestos, os risos, a entonação de voz do informante

durante a entrevista" (Bourdieu apud Boni; Quaresma, 2005, p. 78). Para Lage

(2003), "relutância inesperada cortando o fluxo de uma exposição, silêncios,

denominações vagas, particularmente quando coincidem com desvios de olhar e

certos movimentos das mãos, indicam que se tangenciam questões sensíveis, por

algum motivo" (p. 80).

77

Assim, Boni e Quaresma (2005) entendem que "esses ‘sentimentos’, que não

passam pela fita do gravador, são muito importantes na hora da análise, eles

mostram muita coisa do informante. O pesquisador tem o dever de ser fiel, ter

fidelidade quando transcrever tudo o que o pesquisado falou e sentiu durante a

entrevista” (p. 78). Para os autores, "o pesquisador não pode esquecer que cada um

dos pesquisados faz parte de uma singularidade, cada um deles têm uma história de

vida diferente, têm uma existência singular" (id, p. 77). E, ainda segundo os

estudiosos, "durante todo o processo da pesquisa o pesquisador terá que ler nas

entrelinhas, ou seja, ele tem que ser capaz de reconhecer as estruturas invisíveis

que organizam o discurso do entrevistado" (ibid).

Com o objetivo de colocar em prática os conceitos referenciados

anteriormente, pretende-se – portanto – aplicar as teorias estudadas no livro-

reportagem, aliadas a várias outras técnicas de desenvolvimento nesse sentido.

Inclusive ao que Lage (2003), define como entrevista em profundidade, na qual "o

objetivo [...] não é um tema particular ou um acontecimento específico, mas a figura

do entrevistado, a representação de mundo que ele constrói, uma atividade que

desenvolve ou um viés de sua maneira de ser, geralmente relacionada com outros

aspectos de sua vida" (id). Segundo o autor, ao usar esse ponto de vista, "procura-

se construir uma novela ou um ensaio sobre o personagem, a partir de seus próprios

depoimentos ou e impressões" (ibid).

Por fim, Vilas Boas (2003), sugere algumas opções, caso a entrevista não

saia como se espera. Elas consistem em saídas úteis caso a entrevista, ao seu final,

resulte demasiadamente dispersiva: ou o entrevistador desiste da matéria, ou tenta

marcar um novo encontro, ou aproveita o material obtido e tenta produzir algo

proveitoso assim mesmo.

5.6 HISTÓRIA ORAL

Dentre as estratégias de entrevista, procurou-se utilizar a teoria da História

Oral porque, conforme Alberti (2007), "diante do tema e das questões que o

pesquisador se coloca, é possível estudar as versões que os entrevistados fornecem

acerca do objeto de análise" (p.30). Segundo a autora, "empregar a metodologia de

história oral é dirigir o foco de interesse não para aquilo que os documentos escritos

podem dizer sobre a trajetória [...], e sim para as versões que aqueles que

78

participaram de, ou testemunharam, tal trajetória podem fornecer sobre o assunto"

(id). Para Alberti, isso já pressupõe que o estudo de tais versões seja relevante para

o objetivo da pesquisa.

A moderna História Oral surgiu na década de 1940, após a segunda Guerra Mundial, com os sociólogos da Escola de Chicago, e a partir de então várias tendências se delinearam: a primeira constituída por entrevistas com elites políticas (a história de cima). Depois, com Paul Thompson, a história dos excluídos, (a história de baixo) A Voz do Passado. Embora a segunda tenha surgido para contrabalançar a influência da primeira, ambas podem e devem estabelecer relações e interações na valorização dos diferentes e heterogêneos depoimentos, assim como na sistematização de novas áreas temáticas (ROSA, 2007, p.2).

Contudo, como afirma Alberti (2007), "fazer história oral não é simplesmente

sair com um gravador em punho, algumas perguntas na cabeça, entrevistar aqueles

que cruzam nosso caminho dispostos a falar um pouco sobre suas vidas" (p.30).

Além disso, também existe apuração. "Empregar a História Oral significa voltar a

atenção para as versões dos entrevistados, isso não quer dizer que se possa

prescindir de consultar as fontes já existentes sobre o tema escolhido” (id, p. 5).

Conforme Ferreira (2002), "a história oral, um instrumento privilegiado para

recuperar memórias e resgatar experiências de histórias vividas" (p. 326), e também

"o uso da História Oral, bem como das narrativas que dela se originam, estimulam a

escrita de uma história que não é uma representação exata do que existiu, mas que

se esforça em propor uma inteligibilidade" (SILVEIRA, 2007, p. 41).

Conforme Alberti (2007), urna pesquisa de História Oral segue critérios

qualitativos, e não quantitativos; assim, "convém selecionar os entrevistados entre

aqueles que participaram, viveram, presenciaram ou se inteiraram de ocorrências ou

situações ligadas ao tema e que possam fornecer depoimentos significativos" (p.31-

32). Portanto, como afirma Ferreira (2002), a História Oral é capaz de apresentar

relatos que, se não eliminam a subjetividade, possuem instrumentos para controlá-

la.

79

6 METODOLOGIA DE PESQUISA

O simples fato de se falar no desenvolvimento de um produto jornalístico –

neste caso, um livro-reportagem – já acarreta certos procedimentos inerentes à

prática da comunicação social. Como exemplo específico é possível apontar a

necessidade de métodos e técnicas para o levantamento das informações, bem

como as formas de apuração dos dados coletados, de modo a garantir que eles

reflitam com fidelidade ao menos parte da realidade retratada.

Partindo desse princípio, o presente estudo se funda em dois formatos

metodológicos distintos, a saber: a pesquisa bibliográfica, com a seleção de autores

e obras úteis à construção da base teórica que norteiam a presente discussão; e a

pesquisa de campo, realizada através da análise de reportagens jornalísticas e do

desenvolvimento da técnica de grupo focal.

6.1 MÉTODOS UTILIZADOS NA PESQUISA BIBLIOGRÁFICA

Baseada nos conceito de Estudos Exploratórios defendido por Triviños (2007)

e Fonseca (2006) 70, essa fase foi composta da escolha das teorias que ajudaram na

construção do assunto em foco, de modo a orientar o entendimento sobre o que é

crime, prisão, e liberdade, assim como sobre o funcionamento do sistema penal

brasileiro e paranaense e a forma como se estruturam as instituições punitivas em

Piraquara, na Grande Curitiba, entre outros assuntos. Nessa etapa, pensadores

como Foucault (2009), Rousseau (1999), Durkheim (2001), Constant (1985) e

Montesquieu (2000) foram fundamentais, assim como Noronha (2001), Urbanski

(2010), Misse (2010), Silva (2004), Gaio e Bordignon (2011) e Sormanny e Sousa

(2009) e tantos outros.

Também figuraram entre os alicerces desta pesquisa as informações

disponibilizadas pelo Departamento de Execução Penal do Paraná – Depen-PR, em

sua página na internet; além do sistema Geopresídios (CNJ), ferramenta vinculada

ao Conselho Nacional de Justiça, e dos dados levantados pelo Censo do Instituto

Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE.

70

Para os autores, esse tipo de estudo é preliminar e consiste no aprofundamento do pesquisador em determinado assunto, buscando antecedentes e conhecimentos para, em seguida, planejar a parte prática da pesquisa.

80

Outras contribuições importantes foram relativas à teoria das representações

sociais, com autores como Moscovici (1994) e Guareschi e Jovchelovitch (1994). E

de Vilas Boas (2002 e 2003) e Pessa (2009), quanto aos esclarecimentos sobre o

conceito de livro-reportagem, bem como de Pena (2006), Henn (1996), Alberti

(2007), Wolfe (2005) e Lima (2004), em relação à construção das abordagens

literárias no texto jornalístico. Por fim, também foram importantes as discussões

promovidas por Sodré e Ferrari (1986) acerca dos conceitos de reportagem, assim

como as de Lage (2003) e Boni e Quaresma (2005), sobre as técnicas de entrevista.

E esses são apenas alguns dos vários estudiosos cujas pesquisas serviram de base

para a compreensão teórica do tema em foco.

6.2 PESQUISAS DE CAMPO

Além da discussão das teorias, também se faz necessária a abordagem

prática do assunto central deste estudo através de pesquisa de campo. Tal

modalidade define-se, segundo Carnevalli e Miguel (2001), como a fase realizada

depois do estudo bibliográfico, necessária para que o pesquisador tenha um bom

conhecimento sobre o assunto, já que “é nesta etapa que ele vai definir os objetivos

da pesquisa, as hipóteses, definir qual é o meio de coleta de dados, tamanho da

amostra e como os dados serão tabulados e analisados” (p. 1). Fuzzi (2010) entende

que essa modalidade de conhecimento consiste na observação dos fatos e

fenômenos como ocorrem no real, na coleta de dados e, finalmente, na análise e

interpretação desses dados, “com base numa fundamentação teórica consistente,

objetivando compreender e explicar o problema pesquisado” 71.

Assim, com o objetivo de fortalecer o trabalho, foram adotadas duas formas

diferentes de pesquisa de campo: a análise de conteúdo, de modo a oferecer as

bases para a compreensão de como a mídia trata do tema em foco72, e o grupo focal

com os presos, voltado à viabilização de um estreitamento no com a realidade

investigada, com vistas ao entendimento mais fiel sobre as representações sociais

71

FUZZI, Ludmila Pena. O que é a Pesquisa de Campo? Taubaté, SP, 2010. Metodologia científica. Disponível em: http://profludfuzzimetodologia.blogspot.com.br/2010/03/o-que-e-pesquisa-de-campo.html. Acesso em: 29/04/2012. 72

Ver resultado no subtópico ‘Os presos no jornal: como os internos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e da Penitenciária Central do Estado são retratados pela imprensa local’, a partir da página 36.

81

dos presos e também à seleção das fontes consultadas para o desenvolvimento do

produto.

6.2.1 Métodos empregados no desenvolvimento da análise de conteúdo

Para entender como os presos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e

da Penitenciária Central do Estado aparecem retratados na mídia, optou-se pelo

desenvolvimento de uma pesquisa baseada na análise de conteúdo73 das

reportagens veiculadas nas edições online do jornal Gazeta do Povo74 entre os anos

de 2006 e 2012. Os textos foram selecionados mediante busca combinada por meio

da utilização das palavras-chave: ‘bandido colônia penal agroindustrial Piraquara’ (e

colônia penal agrícola Piraquara), ‘bandido penitenciária central Piraquara’, ‘preso

colônia penal agroindustrial Piraquara’ (e colônia penal agrícola Piraquara), e ‘preso

penitenciária central Piraquara’.

Em relação à modalidade de investigação, a abordagem escolhida foi a

análise de conteúdo por constituir, segundo Triviños (2007), um tipo de pesquisa

viável quando o objeto que se pretende estudar são as comunicações, já que

enfatiza o teor das mensagens veiculadas. Também Sousa (2004b) acredita que

esse é um dos métodos mais eficientes dentre os que permitem trabalhar questões

ligadas à mídia, muito em virtude de já ter surgido em meio às comunicações75, mas

também porque “permite a obtenção de dados [...] que emprestam rigor à pesquisa”

(p. 401).

Bardin (1979) define o termo como “um conjunto de técnicas de análise das

comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de

descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que

permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de

produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens” (p. 42). Já Moraes

(1999) entende que a importância da análise de conteúdo reside na abrangência da

73

Os resultados da análise de conteúdo foram apresentados dentro tópico ‘Delimitação do Tema e Problematização’, a partir da página 9, porque os dados obtidos contribuíram para embasar a discussão sobre como os presos das unidades em questão são retratados pela imprensa local. 74

www.gazetadopovo.com.br. 75

Segundo o autor, essa técnica nasceu nos Estados Unidos no início do século XX, como um método quantitativo para analisar o conteúdo de jornais, como por exemplo, a percentagem de notícias de política, desportos, entre outras, em relação à totalidade do veículo.

82

sua abordagem, uma vez que se ela se constitui como uma metodologia usada para

interpretar o conteúdo de toda classe de documentos e textos. Aliás, o autor defende

que, ao conduzir a descrições sistemáticas, qualitativas e/ou quantitativas, a análise

de conteúdo “ajuda a reinterpretar as mensagens e a atingir uma compreensão de

seus significados num nível que vai além de uma leitura comum”76.

A característica híbrida da análise de conteúdo – pode ser vista como um método que reúne elementos quantitativos e qualitativos – coloca-a num gueto metodológico de onde ela sai reforçada e não enfraquecida. [...] Ou seja, não existe método de pesquisa perfeito, mas todo aquele que é bem construído e bem conduzido tem mais chances de responder às hipóteses propostas em estudos científicos do que outros (Herscovitz, 2005, p. 3).

Bardin (1979) divide o método em três etapas: a pré-análise, que consiste na

organização da pesquisa com a formulação dos objetivos gerais, a construção das

hipóteses e a determinação do campo de investigação; a descrição analítica, que

compreende procedimentos como a codificação, a classificação e a categorização

dos materiais; e a interpretação referencial, que remete à obtenção dos resultados e

à reflexão sobre o que eles significam, segundo o objetivo defendido (Triviños,

2007).

Entretanto, Herscovitz (2005) chama a atenção para um detalhe essencial ao

desenvolvimento da análise de conteúdo: a escolha do tema. Segundo a autora, é

imprescindível que o pesquisador defina aquilo que pretende buscar antes mesmo

de iniciar a pesquisa, já que entender a unidade do método (ou unidade de

amostragem) é fundamental para dar o direcionamento correto à investigação.

Nesse sentido, Moraes (1999) apresenta as categorias de objetivos da análise

de conteúdo. São elas: Quem fala? – busca investigar o emissor da mensagem com

relação às suas características como um todo, entendendo a mensagem como a

representação do próprio emissor; Para dizer o quê? – voltada às características da

mensagem propriamente dita, seu valor informativo, palavras, argumentos e ideias;

A quem? – estudo de recepção, voltado às características do público; Como? – a

forma como a comunicação se processa; Com que finalidade? – refere-se aos

objetivos da mensagem, explícitos e implícitos, e aos objetivos que o emissor busca

76

MORAES, Roque. Análise de Conteúdo. Revista Educação. Porto Alegre, RS, v. 22, n. 37, 1999, p. 7-32. Disponível em: http://cliente.argo.com.br/~mgos/analise_de_conteudo_moraes.html. Acesso em: 29/04/2012.

83

ao transmitir a mensagem; e Com que resultados? – relacionada aos resultados

efetivos da comunicação.

Uma vez que o foco desta pesquisa está em avaliar a forma como o jornal

Gazeta do Povo tem abordado os criminosos em suas reportagens, tomando como

base o recorte temporal indicado, opta-se pela categoria Como? – voltada à

compreensão acerca das características de construção da mensagem. “Quando os

objetivos da análise de conteúdo direcionam ao ‘como?’, o pesquisador estará

voltado à forma como a comunicação se processa, seus códigos, seu estilo, a

estrutura da linguagem e outras características do meio pelo qual a mensagem é

transmitida” (id77).

Para Herscovitz (2005), a análise de conteúdo da mídia é uma ferramenta

muito útil quando se busca entender um pouco mais sobre o tráfego comunicacional

e estabelecer parâmetros implícitos sobre a lógica organizacional por trás das

mensagens. Nessa linha, a autora defende que os pesquisadores precisam agir

como investigadores em busca de “pistas que desvendem os significados aparentes

e/ou implícitos dos signos e das narrativas jornalísticas, expondo tendências,

conflitos, interesses, ambiguidades ou ideologias presentes nos materiais” (p. 5).

Assim, a análise de conteúdo aplicada neste trabalho busca identificar as

representações sociais transmitidas através do jornalismo em relação ao tema

discutido. Com isso, a ideia é descobrir o que a mídia diz sobre o assunto e como os

personagens desse meio acabam retratados, de modo a revelar se o

posicionamento das reportagens é favorável ou contrário aos casos tratados, ou

ainda se adotam uma quase neutralidade, ao se inclinarem apenas parcialmente à

qualquer uma das duas direções.

O jornal Gazeta do Povo foi escolhido como cenário para a investigação por

se configurar como um veículo tradicional no estado, já que fundado em 1919

(Gazeta do Povo, 2009), assim como por representar, segundo apontamento de

Quadros, Quadros e Massip (2009), o impresso de maior circulação no Paraná. Tal

condição é confirmada pela Associação Nacional de Jornais (2012), com base na

média de circulação verificada entre os anos de 2010 e 2011, que ultrapassa os

43.500 exemplares vendidos diariamente.

77

MORAES, Roque. Análise de Conteúdo. Revista Educação. Porto Alegre, RS, v. 22, n. 37, 1999, p. 7-32. Disponível em: http://cliente.argo.com.br/~mgos/analise_de_conteudo_moraes.html. Acesso em: 29/04/2012.

84

Com relação à página na internet, um levantamento divulgado em janeiro de

2012 pelo próprio veículo apontou que o site concentra 1,9 milhão de visitantes

únicos por mês, responsáveis por cinco milhões de acessos realizados no mesmo

espaço de tempo78, além dos leitores nas plataformas tablet e eventos (Gazeta do

Povo, 2012). Isso demonstra que também a versão digital do veículo é bastante

abrangente. Entretanto, o fato de a página virtual trazer praticamente os mesmos

conteúdos presentes nas edições impressas – facilitando desse modo o acesso – foi

o fator de maior relevância para a decisão de lançar mão de tal recurso.

Vale lembrar também que, como já dito, o interesse é na investigação sobre

como os criminosos são abordados pela mídia, condição que independe da

plataforma em que a notícia é veiculada. Por consequência, quaisquer outras

características visuais ou de estrutura próprias de uma ou outra mídia não

interessaram à referida análise, e justamente por isso foram ignoradas.

Sobre a pesquisa, ela foi realizada segundo a temática, e não o tempo.

Assim, o período apontado refere-se à faixa temporal entre as datas de publicação

da primeira e última notícias localizadas através da busca combinada. Ou seja, a

quantidade de matérias analisadas neste estudo reflete o volume total de materiais

encontrados. Portanto, trata-se de uma abordagem não aleatória, já que trabalha

mediante a seleção de alguns fatores da pesquisa (Sousa, 2004b), e também

porque aborda uma população menor, condição apontada por Herscovitz (2005),

referindo-se a “algumas edições específicas de publicações que tratam da cobertura

de um tema registrado em período também específico” (p. 8).

Além disso, a pesquisa foi desenvolvida mediante a utilização de palavras-

chave porque esse é um recurso disponível na internet que permite a localização de

determinados termos essenciais à pesquisa de modo cruzado. Segundo o catálogo

online Rede Sirius (2012), vinculado à Universidade do Rio de Janeiro, “a busca por

palavras-chave permite pesquisar registros bibliográficos que contenham uma ou

mais palavras-chave nos campos indexados para pesquisa” 79. Por consequência, tal

ferramenta facilita a obtenção de resultados satisfatórios em um recorte de tempo

78

Em termos de internet, visitantes únicos referem-se aos acessos não duplicados (contados apenas uma vez para cada computador conectado) de determinado site, durante um período específico. Já a contagem geral de acessos está ligada à quantidade de vezes em que uma página foi aberta, independentemente de tal ação ter sido proveniente de um mesmo computador ou de vários. 79

REDE SIRIUS. Ajuda catálogo on-line. Rio de Janeiro: UERJ, [2012]. Disponível em: http://www.rsirius.uerj.br/ajuda_rs.php?titulo_link=Ajuda%20Cat%C3%A1logo%20On-Line. Acesso em: 07/05/2012.

85

muito menor que aquele necessário para desenvolver o mesmo trabalho utilizando

as edições impressas.

Nesse sentido, as palavras-chave utilizadas foram selecionadas de modo a

refletir os núcleos de conteúdo mais úteis a presente investigação, já que compostas

pela combinação dos nomes dos locais onde a pesquisa será desenvolvida com os

termos que definem a condição do aprisionado nesses locais, além da palavra que,

segundo Misse (2010), também é utilizada para retratar os agentes criminosos na

mídia, produzida “pela interpelação da polícia, da moralidade pública e das leis

penais” (p. 17).

O rótulo “bandido” é de tal modo reificado no indivíduo que restam poucos espaços para negociar, manipular ou abandonar a identidade pública estigmatizada (Misse, 2010, p. 23). O significado de “bandido”, embora remeta a “integrante de um bando”, ganhou autonomia individualizante, passou a ser aplicada ao agente cuja sujeição criminal já está em curso ou que se considera consolidada. (p. 28).

Vale ressaltar que, ao se referir à Colônia Penal Agroindustrial do Paraná,

utilizou-se também o nome Colônia Penal Agrícola em virtude da mudança de

nomenclatura ocorrida em setembro de 201180. E sobre os termos que se referem à

Penitenciária Central do Estado, esses tiveram a palavra ‘estado’ suprimida para

evitar resultados alheios à pesquisa. Do mesmo modo, outras combinações mais

simplificadas – todavia, mais abrangentes – foram desconsideradas porque gerariam

resultados demasiadamente amplos, pouco úteis ao desenvolvimento deste

trabalho.

Por fim, a ferramenta escolhida para a fixação da análise foi um formulário de

codificação81 criado no site Google Docs. O recurso foi utilizado por dois motivos:

porque oferece hospedagem online, ou seja, é uma plataforma segura no que se

refere ao armazenamento de dados; e porque disponibiliza cálculos matemáticos

acerca dos dados apurados, já com a inclusão dos gráficos e tabelas sobre os

resultados.

80

Conforme anexo na página 149. 81

Ver detalhamentos junto aos apêndices, da página 134 à 138.

86

E em relação aos tópicos abordados no documento, esses surgiram mediante

a realização de leitura flutuante82, que permitiu a localização dos aspectos e

enfoques explorados durante a análise.

6.2.2 Métodos empregados no desenvolvimento dos grupos focais

Além da análise de conteúdo já realizada, também se percebeu a

necessidade de um contato mais estreito com o tema em foco, isto é, da inserção na

realidade dos presos. Para isso, optou-se pelo desenvolvimento de grupos focais

com os internos das duas instituições indicadas para a presente pesquisa: a Colônia

Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e na Penitenciária Central do Estado (PCE),

respectivamente.

Partindo dos resultados obtidos com a análise de conteúdo, portanto, o

desenvolvimento da técnica de grupo focal foi importante por três motivos: ajudou os

pesquisadores a compreenderem, na prática, as representações sociais dos internos

do sistema penal de Piraquara; permitiu testar as formas de abordagem aos presos

e alguns dos temas centrais a serem trabalhados no produto; e auxiliou na

identificação dos internos que se tornaram personagens no livro-reportagem.

Segundo Zimmermann e Martins (2008), os grupos focais fazem parte de uma

técnica qualitativa que “integra, discute, avalia o tema proposto, sendo flexível e

dinâmico, pois, na primeira etapa dos trabalhos são realizadas atividades de

descontração, cujo comportamento pode envolver o grupo durante a reunião” (p.

12.117). As autoras defendem que esse tipo de método, além de estar cada vez

mais presente nas abordagens qualitativas em pesquisa social, também é

interessante por criar um ambiente mais livre para os entrevistados, levando a uma

participação mais efetiva. É delas a definição de que “grupo focal é uma das

principais técnicas de investigação, que se apropriou da dinâmica de grupo,

permitindo a um pequeno número de participantes ser guiado por um moderador

qualificado, procurando alcançar níveis crescentes de compreensão e

aprofundamento de um tema em estudo” (id).

82

Para Bardin (1979), a leitura flutuante integra a etapa da pré-análise da pesquisa e é um dos primeiros contatos com os documentos, que viabiliza o surgimento das hipóteses e noções centrais para o trabalho ao transformar a repetição de determinados temas em índices para o registro dos dados.

87

Desse modo, a adoção desse método buscou produzir um debate entre os

presos, de modo a criar condições mais confortáveis para o contato entre os

pesquisadores e os pesquisados, mas acima de tudo identificar – por meio da

exposição das representações sociais que os entrevistados possuem de suas

próprias trajetórias de vida – os relatos que de fato vieram a integrar o produto final.

Entretanto, tendo em vista a amplitude do universo pesquisado (quantidade de

presos nas duas instituições), fez-se necessária uma espécie de triagem.

Assim, a primeira seleção consistiu na indicação administrativa dos

participantes que integrariam o grupo em cada uma das duas unidades prisionais em

que a pesquisa foi desenvolvida. O número de selecionados para os encontros ficou

preliminarmente estabelecido em 12 pessoas, com base em Chiesa e Ciampone

(apud ASCHIDAMINI; SAUPE, 2004), cujos estudos indicam que o ideal é que o

número de participantes oscile entre seis e 12 pessoas. Nesse sentido, optou-se

pela quantidade máxima estabelecida tendo em vista o alcance da maior variedade

possível de entrevistados.

Sobre os critérios de seleção administrativa dos participantes em cada uma

das unidades, esses seguiram o seguinte roteiro: possibilidade de o interno

participar da pesquisa, vontade do interno em integrar a iniciativa e a natureza do

crime cometido.

O respeito à possibilidade de o preso participar da pesquisa fundou-se em

determinações restritas à administração de cada unidade em relação à

disponibilidade do interno para integrar a iniciativa, considerando as hipóteses em

que o detento fica impedido de manter qualquer contato com o público externo à

unidade (por conta de seu comportamento, por questões de doença, etc), ou quando

o contato entre os presos oferece riscos à segurança dos próprios internos (nos

casos de conflitos internos), entre outras coisas.

Em relação à vontade do interno, ela foi imprescindível porque a ideia sempre

foi obter relatos espontâneos e detalhados, condição alcançada quando o indivíduo

se sente à vontade em participar de uma iniciativa, qualquer que seja ela. “A decisão

de participar de um grupo focal deve ser individual e livre de qualquer coação, daí a

importância de uma cuidadosa seleção das pessoas a serem convidadas, bem como

a necessidade de clareza quanto à explicitação do projeto e dos cuidados éticos

incluídos no processo e informados aos selecionados” (ASCHIDAMINI; SAUPE,

2004, p. 10).

88

Sobre a natureza do delito cometido pelos participantes, ela foi fator

importante por emprestar maior diversidade à pesquisa, já que por meio de

diferentes modalidades de crimes, as chances de encontrar perfis e históricos

variados eram maiores. Entretanto, a gravidade dos delitos dos presos não foi

detalhe preponderante, já que o principal foco da pesquisa era na história de vida de

cada entrevistado e no encadeamento de acontecimentos que o levou à prisão, e

não na intensidade da falta cometida por ele.

Os encontros foram registrados através de anotações e da gravação das

conversas em áudio, de modo a garantir um melhor aproveitamento dos dados

colhidos. “O gravador possui a vantagem de evitar perdas de informação, minimizar

distorções, facilitar a condução da entrevista, permitindo fazer anotações sobre

aspectos não verbalizados” (ibid, p. 77). O uso de câmeras de vídeo durante a

realização dos grupos focais foi descartado por recomendação da administração das

unidades, sob a justificativa de que os presos ficariam inibidos na presença do

equipamento.

6.2.2.1 Grupo focal da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná

O encontro com os presos da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI)

foi realizado no dia 2 de agosto de 2012, em duas etapas diferentes: manhã e tarde.

Tal divisão, segundo a direção da unidade, foi necessária por conta dos problemas

inerentes a conflitos entre os próprios internos, considerando o fato de que

determinados crimes relegam ao seu autor um isolamento ainda maior, mesmo em

meio à comunidade carcerária. Tal separação, portanto, foi determinada para evitar

retaliações entre os detentos.

A sala onde as reuniões foram realizadas fica nas dependências da unidade e

é usualmente destinada às atividades do setor de Psicologia. O local foi indicado

pela administração da CPAI por conta da proximidade com a direção de disciplina,

de modo a preservar a segurança dos pesquisadores, mas também por dispor do

espaço físico necessário para acomodar todos os participantes e oferecer um

ambiente mais silencioso, importante para que todos se fizessem entender com

facilidade. Para garantir mais privacidade aos participantes durante o encontro, e por

89

se tratar de internos do regime semiaberto83, nenhum agente penitenciário ou

autoridade policial ficou presente no interior da sala, não havendo, do mesmo modo,

um monitoramento ostensivo do evento, mesmo fora das dependências do

ambiente.

O contato com os presos selecionados para participar do grupo focal foi único

e durou cerca de duas horas em cada etapa.

Refletindo sobre o tempo de duração das sessões em grupo focal os autores pesquisados, Westphal, Bogus e Faria (1996), Debus (1997), Dall’agnol e Trench (1999), Iervolino e Pelicione (2001) e Meier e Kudlowiez (2003) sugerem de uma a duas horas para que o cansaço dos participantes e as condições desconfortáveis não venham a interferir nos objetivos da discussão em prejuízo dos resultados (ibid, p. 12).

Participaram da primeira reunião, realizada pela manhã, um total de nove

presos. À tarde, o encontro contou com a presença de três internos. Junto dos

pesquisadores, os 12 convidados ficaram dispostos em círculo, de modo que podiam

se olhar uns aos outros confortavelmente e, com isso, ficar mais à vontade para

integrar da conversa.

A disposição dos assentos em círculo foi adotada por Ressel, Gualda e Gonzales (2002, p.6) salientando que em cada encontro o moderador e o observador mudavam de lugar, evitando sentarem-se um ao lado do outro para não dar idéia de centralização. Para os autores “o arranjo dos assentos é importante, devendo promover a participação de todos, a interação face a face [...] com distâncias iguais entre todos, e dentro do mesmo campo de visão” (ibid).

Os presos reunidos durante as duas etapas do desenvolvimento do grupo

focal na unidade se identificaram com seus nomes reais, informação comprovada

posteriormente junto à direção da CPAI. Para conferir mais tranquilidade aos

internos e criar um ambiente em que eles pudessem expressar suas opiniões, em

momento algum os pesquisadores fizeram questionamentos sobre os crimes

cometidos ou a motivação para tais feitos, o que não impediu que alguns deles

falassem superficialmente sobre o assunto.

Para fins desta pesquisa, entretanto, e tendo em vista a abrangência

acadêmica que a presente investigação pode atingir, os participantes dos encontros

83

Regime de pena em que o detento fica condicionado a um estado de semiliberdade, sendo-lhe permitido sair da unidade sem acompanhamento policial em ocasiões específicas, como finais de semana, feriados e para participar de cursos de qualificação, por exemplo.

90

serão aqui apresentados apenas pelo primeiro nome, idade, cidade e estado de

origem. O motivo para tal preocupação funda-se no fato de que esse primeiro

contato foi realizado a título de apresentação da proposta e interação inicial entre

pesquisadores e pesquisados, sem intenção de qualquer tipo de exposição neste

momento. Ademais, a proposta deste trabalho é trazer à luz as histórias de vida dos

detentos, o que independe da forma com que os entrevistados são identificados.

Nesse sentido, participaram do primeiro encontro:

1) Celso, 26 anos, Curitiba/PR;

2) Edison, 41 anos, São Paulo/SP;

3) Edson, 40 anos, Assis Chateaubriand/PR;

4) Edson, 42 anos, São Paulo/SP;

5) Jamir, 38 anos, Ilópolis/RS;

6) Luiz, 34 anos, Bandeirantes/PR;

7) Paulo, 46 anos, Londrina/PR;

8) Pedro, 55 anos, Ibaiti/PR;

9) Wilson, 33 anos, Curitiba/PR.

Integraram o segundo encontro:

1) Antônio, 36 anos, Palmas/MG;

2) Elvis, 41 anos, Nova Esperança/PR;

3) Valdecir, 32 anos, Araucária/PR.

Durante as duas reuniões, os pesquisadores buscaram perfis diferenciados

de modo que os presos selecionados representassem um cenário intenso e

diversificado. Todavia, é de se considerar que, de algum modo, esses internos

também apresentavam semelhanças entre si, já que partilham de uma mesma

realidade, refletida na condição de privação parcial de liberdade em que se

encontram.

A definição dos membros que farão parte do grupo focal é considerada tarefa relevante, uma vez que implica na capacidade de contribuição com os objetivos da pesquisa. A amostra é intencional e os critérios (sexo, idade, escolaridade, diferenças culturais, estado civil e outros) podem variar, devendo, todavia, ter pelo menos um traço comum importante para o estudo

91

proposto (WESTPHAL, BOGUS e FARIA apud Aschidamini e Saupe, 2004, p. 10).

Em relação aos pesquisadores, ambos se posicionaram em meio aos presos,

de modo a promover uma melhor integração no ambiente, e trabalharam de modo

diferenciado durante o encontro, complementando-se no desenvolvimento da

pesquisa. Segundo Aschidamini e Saupe (id), tal divisão é importante para garantir

um melhor rendimento desse tipo de evento, já que delega de tarefas específicas

aos organizadores da reunião. “O moderador é um facilitador do debate (...) e deve

(...) cultivar a empatia, [ter] aptidão para escutar, entusiasmo para conduzir o grupo

às discussões e controle do grupo focal. Cabe a ele (...) proporcionar ambiente

adequado para que diferentes percepções e pontos de vista venham à tona” (p. 12),

enquanto “o observador deve cultivar a atenção, auxiliar o moderador na condução

do grupo, tomar nota das principais impressões verbais e não verbais, estar atento à

aparelhagem audiovisual” (id). Assim, mesmo sendo o primeiro contato prático com

o ambiente da pesquisa, os encontros transcorreram de modo descontraído e

agradável e resultaram em conversas bastantes produtivas.

6.2.2.2 Grupo focal da Penitenciária Central do Estado

O encontro com os presos da Penitenciária Central do Estado (PCE) foi

realizado no dia 10 de agosto de 2012, no período da tarde. A sala onde a reunião

foi realizada fica nas dependências da unidade e é usualmente destinada às

atividades de ensino dos internos, sendo dividida por uma grade de ferro na

proporção de 1/3 do espaço para o professor ou visitante, e 2/3 para os alunos

(presos).

Assim como verificado na CPAI, o local utilizado foi indicado pela

administração da instituição por conta do espaço físico necessário para acomodar

todos os participantes e também por oferecer um ambiente mais tranquilo e

silencioso, além de já ser conhecido e frequentado pelos pesquisados. Para garantir

mais privacidade aos participantes durante o encontro, nenhum agente penitenciário

ou autoridade policial ficou presente no interior do recinto. Entretanto, o encontro foi

integralmente monitorado pelo lado de fora, do corredor do pavilhão.

O contato com os presos selecionados para participar do grupo focal durou

cerca de duas horas. O tempo foi suficiente para que o objetivo da proposta fosse

92

cumprido. Em respeito às normas internas da penitenciária e por questão de

segurança, os presos selecionados e os pesquisadores mantiveram contato apenas

através da grade, de modo que não foi possível aplicar a técnica da disposição dos

assentos em círculo, como realizado na CPAI.

Participaram da reunião um total de 12 presos, conforme solicitado à

administração da unidade segundo os critérios metodológicos já expostos84. Assim

como nos encontros anteriores, os presos da PCE se identificaram com seus nomes

reais e completos, informação comprovada posteriormente junto à direção da

instituição, quando também os pesquisadores tiveram acesso aos dados do

prontuário criminal dos entrevistados. Mesmo sem serem questionados sobre seus

delitos, alguns internos falaram sobre o assunto, ainda que de modo raso.

Seguindo o padrão utilizado para apresentar os presos da CPAI – a outra

unidade prisional pesquisada para esta iniciativa – os participantes do grupo focal na

PCE serão aqui identificados apenas pelo primeiro nome, idade, cidade e estado de

origem. São eles:

1) Acir, 42 anos, São Paulo/SP;

2) Adriano, 29 anos, Doutor Camargo/PR;

3) Celso, 37 anos, Salto do Lontra/PR;

4) Elias, 36 anos, Guarapuava/PR;

5) Gilberto, 54 anos, Coronel Vivida/PR;

6) Glacil, 67 anos, Guarapuava/PR;

7) José, 56 anos, Roncador/PR;

8) José, 53 anos, Rio Negro/PR;

9) Marcelo, 39 anos, Curitiba/PR;

10) Mário, 47 anos, Curitiba/PR;

11) Rivail, 31 anos, Cascavel/PR;

12) Tiago, 26 anos, Curitiba/PR.

Apesar do ambiente pouco acolhedor e de certa resistência por parte dos

presos nos momentos iniciais da abordagem, o encontro transcorreu de forma

84

Os detalhamentos do processo podem ser verificados no tópico ‘Metodologia de Pesquisa’, a partir da página 79.

93

tranquila e resultou em uma importante etapa desta pesquisa, cujas conclusões

estão expostas a seguir.

6.2.2.3 Resultados dos grupos focais: CPAI e PCE

Os dois encontros realizados com os presos da Colônia Penal Agroindustrial

do Paraná (CPAI) e a reunião com os internos da Penitenciária Central do Estado

(PCE) começaram do mesmo modo: com a apresentação dos pesquisadores e dos

pesquisados e com uma breve explanação sobre a natureza do trabalho a ser

desenvolvido junto à unidade, esclarecendo algumas dúvidas a esse respeito. Os

organizadores de ambos os eventos procuraram ressaltar que a intenção da

pesquisa não seria promover julgamentos acerca dos crimes cometidos pelos

convidados, mas apresentá-los à sociedade por meio do relato de suas histórias de

vida – característica que, como se viu na análise de conteúdo, não é explorada pelos

veículos de comunicação.

O primeiro grupo da CPAI foi recebido antes que os pesquisadores tivessem

acesso ao prontuário criminal, no qual constam os registros dos delitos cometidos,

ao contrário do que ocorreu com o segundo grupo da unidade, cuja reunião

transcorreu após a consulta aos crimes dos convidados. Primando pelo melhor

aproveitamento do evento, entretanto, esse detalhe não foi revelado durante a

conversa.

Na PCE, por sua vez, a consulta aos referidos dados foi realizada somente

após a reunião, do mesmo modo como ocorreu com os primeiros entrevistados da

CPAI, menos por falta de interesse do que pelo melhor aproveitamento do tempo,

principalmente por conta da rotina e horário de reclusão dos presos em suas celas,

por volta das 16 horas. Em todo caso, o conhecimento ou não de tais detalhes não

viria a afetar significativamente o desenvolvimento do método, conforme se pode

verificar quando da realização do segundo encontro com os internos da CPAI,

quando o acesso prévio aos dados do prontuário criminal se mostrou irrelevante.

Em ambas as unidades, os presos se mostraram reservados no início do

encontro, mas aos poucos se integraram à ideia de tal modo que, após alguns

minutos, praticamente todos os convidados já estavam inseridos na conversa e

interagiam entre si e com os pesquisadores. Um a um, todos tiveram a oportunidade

de expor suas opiniões e sentimentos e de discutir assuntos como as suas

94

representações sociais na mídia e junto às pessoas livres, entre outras coisas. As

primeiras perguntas foram sobre a infância e a vida em família – temas comuns a

todos e que, abordados na abertura dos grupos, ajudaram a criar um ambiente

acolhedor para que os convidados estivessem à vontade no momento em que os

assuntos mais relevantes à pesquisa fossem trabalhados, conforme descrito a

seguir.

6.2.2.3.1 Os presos e as representações sociais: estereótipos, mídia e sociedade

Segundo a maioria dos entrevistados, o grande problema de se estar preso,

além da própria privação da liberdade e dos efeitos que tal condição acarreta, é a

imagem que se faz de uma pessoa a partir do momento em que ela é acusada de

um crime. Isso porque, para eles, ainda que o detento cumpra integralmente a sua

pena dentro dos parâmetros legais e administrativos, ela jamais se extinguirá na sua

totalidade por conta de uma espécie de marca, segundo a qual a reintrodução desse

tipo de agente no convívio social jamais passaria despercebida.

Uma vez eu liguei daqui para pedir o favor de uma pessoa para pegar o meu relógio para consertar [...]. Aí eu peguei o telefone [da loja], liguei para a menina e disse: oi, eu sou aqui da colônia aqui, não posso sair, minha portaria é uma vez em cada mês e tal. Tá. Liguei uma, liguei duas e a guria não me atendeu. Aí quando eu saí, cheguei lá me informando [...]. Aí eu falei: eu liguei pra você das outras vezes... e sabe, foi quando ela lembrou que eu era da colônia. Ela estava me atendendo normal, mas quando lembrou ficou assim [paralisada]. Eu falei: calma, tudo bem [...]. Mas deu pra perceber que teve uma alteração nela. Momentânea, mas teve (Edson, 42 anos, CPAI

85).

Tal problema, segundo eles, deve-se ao fato de que as pessoas livres não

conhecem suficientemente a realidade dos detentos, de modo que acabam

construindo uma ideia estereotipada sobre o assunto, conforme o relato de Celso, de

26 anos (CPAI). Durante o desenvolvimento do grupo focal ele relembrou a ocasião

em que foi a uma agência bancária para solicitar a regularização de seu Cadastro de

Pessoa Física (CPF). Com a demora nos atendimentos, e considerando a

preocupação com o horário de retorno para a unidade, ele dirigiu-se a uma das

atendentes e pediu prioridade por conta de sua condição.

85

Todas as falas foram retiradas dos grupos focais realizados na Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e na Penitenciária Central do Estado.

95

Ela disse: ah, sim, tudo bem. E nisso um cara ali do lado escutou. Aí ele: puxa, você é preso mesmo, cara? Nossa! Ele ficou abismado [risos]. Aí perguntou: mas como é... você está lá na penitenciária mesmo? E eu disse: sim. E ele: mas e o Beira-mar também vai sair que nem você assim? [...] Me deu vontade de falar assim: pô, meu, vai cuidar da sua vida [...]. Ele estava querendo dizer ali que eu era bandido [risos], mas eu também sou um ser humano, né? [...] Aí falei com a mulher e dali a pouco ele foi lá em uma cadeira, deu uma puxada na outra cadeira e colocou o celular meio virado para o meu lado. Aí eu pensei: esse cara tá de arte, quer tirar foto minha [...]. Já fiquei louco. Aí só dei uma levantada e olhei para a cara dele assim. Ele disfarçou e ficou olhando para o outro lado [...]. Queria tirar foto para quê? Só para mostrar: olha, esse cara aqui é preso (idem).

Também na visão de Wilson (33 anos, CPAI) a representação social do preso

é um grande obstáculo, uma vez que leva as pessoas a fazerem “má imagem” dos

internos, antes mesmo de qualquer oportunidade de contato mais aprofundado, o

que geralmente resulta em medo e provoca as mais variadas reações.

Eu fazia um curso de computação [...] e queria continuar na escola para fazer administração também [...]. Só que ligaram daqui e disseram que eu era preso, aí quando eu terminei as aulas não pude renovar minha matrícula [...]. Perguntei se era porque eu sou preso e me disseram que sim, que era esse o motivo. [...] Já ontem, na autoescola, [...] eu cheguei atrasado. [...]. E quando isso acontece o professor sempre chama a atenção [...]. Pensei assim: nossa, hoje é eu. Cheguei lá e nada. O professor sabe que eu sou preso porque eu contei [...]. Aí, quando ele viu que era eu ele disse: oh, faça o favor, pode se sentar [risos] (idem)

86.

Para Adriano (29 anos, PCE), a situação é mais dramática. Segundo ele, os

presos são invariavelmente considerados verdadeiros “monstros aos olhos das

pessoas”, que julgam o indivíduo sem conhecê-lo. E isso, segundo Wilson (33 anos,

CPAI), deve-se muito ao problema das drogas. “A sociedade fica revoltada [...]

porque na loucura se cometem crimes que deixam até os próprios presos

abismados. [...] Daí você chega e quer fazer um curso aqui ou ali, mas como é

preso, já te olham assim: não, esse daí não vale nada”. Nessa linha, Gilberto (54

anos, PCE) é mais enfático. “Nós somos o tomate podre da caixa, então jogaram a

gente aqui [...]. Mas sempre tem uma saída, porque mesmo um tomate podre, se

você tira a sementinha, seca e planta outra vez, nasce um tomate novo”. Ou seja,

por maior que seja o medo ou a repulsa da sociedade para com o preso, eles

alimentam um desejo verdadeiro de serem aceitos sem preconceitos quando

libertados, embora reconheçam que isso raramente acontece.

86

Todas as falas foram retiradas dos grupos focais realizados na Colônia Penal Agroindustrial do Paraná e na Penitenciária Central do Estado.

96

Sobre os motivos apontados pelos entrevistados para essa realidade, a

influência exercida pelos veículos de comunicação de massa é um dos que obtêm

mais destaque nos discursos. Programas populares como os televisivos 190,

apresentado por Roberto Aciolli, e Brasil Urgente, conduzido por Luiz Carlos Datena,

ou impressos como o jornal Tribuna do Paraná, estão entre as produções que,

segundo os internos, prejudicam muito a reinserção do preso no convívio social.

Tem jornalista que é carniceiro mesmo, que já começa a falar da gente chamando de bandido, sem nem saber direito o que está acontecendo [...]. Em todo o tempo que eu estou preso só teve um jornalista que disse pra

mim: fale a sua versão que eu publico. Ele trabalhava na Gazeta do Povo, e depois, quando eu li o que ele escreveu, vi que ele cumpriu com a palavra. Mas isso é um entre tantos. A maioria não quer nem saber (Celso, 26 anos, CPAI).

Para tanto, os internos esclareceram que se mantêm informados por meio da

televisão (CPAI e PCE), do rádio e de alguns jornais (CPAI) a que têm acesso, além

dos familiares, o que lhes permite discutir assuntos amplamente difundidos como a

obrigatoriedade do diploma para o exercício do jornalismo, por exemplo, afora os

temas próprios do ambiente prisional, como a chacina que vitimou o ambientalista

Jorge Roberto Carvalho Grando, em abril de 2011, os acusados pelo feito e os

desdobramentos do fato. Tais equipamentos, quando existem, ficam alojados junto

às acomodações dos detentos, seja no cubículo onde passam a noite, seja no

ambiente de trabalho (nos casos daqueles que exercem atividades diárias dentro

das unidades). Em relação aos presos da CPAI, inclusive, o contato com a

informação também é verificado nos momentos em que eles saem para participar de

cursos de qualificação e profissionalização ou quando trabalham fora.

Em relação ao modo como são construídos em obras da literatura e do

cinema, os entrevistados se dividiram em dois grupos de opiniões: parte defendeu

que as produções nada têm de real, sendo demasiadamente fantasiosas, enquanto

alguns concordaram que os trabalhos reproduzem o ambiente, as condições e os

movimentos inerentes à realidade dos presos, mas apenas parcialmente. Nesse

sentido, os pesquisadores citaram algumas referências utilizadas nesta pesquisa,

como o livro Estação Carandiru (VARELLA, 2009) e o filme subsequente, Carandiru

(Babenco, 2002), por exemplo, entre outros que serviram de base para uma

discussão que acabou por revelar a forma como os internos enxergam a própria

condição e o modo como gostariam de ser retratados. “Quem quiser saber como é

97

viver num xadrez87 não precisa ir longe nem ver filme. É só colocar a cama no

banheiro de casa, trancar a porta e quebrar a chave. É essa a sensação, o resto é

imaginação” (Edson, 40 anos, CPAI). Já para Celso, de 37 anos (PCE), esse tipo de

obra é importante justamente por se aproximar da realidade encontrada na cadeia.

“Agora que estamos no pavilhão novo até que ficou bom, está tudo mais limpinho,

mas antes era uma sujeira danada [...]. A gente vivia feito bicho no xis88”, o que,

segundo ele, assemelha-se à ideia transmitida no filme de Babenco (2002).

6.2.2.3.2 Relações com a família

Boa parte dos internos pesquisados tanto na CPAI quanto na PCE declararam

ter crescido sob bases familiares sólidas e bastante ortodoxas, com pai, mãe,

irmãos, etc. Durante o desenvolvimento do grupo focal, Valdecir (32 anos, CPAI)

declarou abertamente que nunca recebeu má influência ou exemplos ruins em casa.

“Quis entrar no crime pra ver qual era, pra conhecer o outro lado mesmo (...). E

assim que nem eu, tem um monte aqui dentro”. Já dentre os casos de presos que

afirmaram pertencer a estruturas familiares comprometidas está Adriano (29 anos,

PCE). “Fui criado pela minha mãe com muita dificuldade e sei que dei muito

desgosto pra ela (...). Quero sair daqui pra poder reparar os meus erros e arrancar

muitos sorrisos do rosto sofrido dela”. Por isso, em sondagem bastante superficial, é

possível avaliar que cerca de metade dos entrevistados declarou pertencer a

famílias tradicionais, sem notícia de outras situações semelhantes.

Durante a reunião também se descobriu que a quantidade de detentos

casados e não casados é equilibrada, e praticamente todos têm filhos. Também

ficou evidente que a maioria dos consultados mantém relação constante e estreita

com a família, mesmo nos casos de longas condenações. Tal situação pode ser

verificada tanto com presos oriundos da capital e região metropolitana quanto entre

aqueles vindos de outras regiões do estado e do país, cuja esposa e filhos, por

exemplo, passaram a residir nas adjacências da unidade, facilitando desse modo o

convívio.

87

A palavra é uma das muitas que designam as celas onde os presos ficam reclusos. 88

Idem ao 87.

98

O contato desses detentos com os familiares é realizado por meio de visitas

às unidades89, geralmente permitidas aos finais de semana, e através de cartas que,

no entanto, nem sempre chegam. Algumas delas, segundo eles, são censuradas e

descartadas pelo setor de triagem de cada unidade. Na CPAI há ainda a

possibilidade de utilização de telefone, mas apenas para a realização de chamadas

– nunca para o recebimento – das 7h30 às 8h, das 11h às 13h, e das 16h às 17h, de

segunda a sexta-feira, e das 7h30 às 17h aos sábados e domingos. Saídas fora dos

períodos determinados pela Vara de Execuções Penais são consentidas apenas em

casos comprovadamente urgentes, mediante análise da administração da unidade e

sob escolta policial.

Ainda sobre a colônia, o órgão oferece também outra opção de interação: as

portarias de saída temporária90. Elas permitem aos presos obter pequenos períodos

de liberdade diferenciada de acordo com a pena que cumprem e do local onde

residem, com prazo mínimo de 45 (quarenta e cinco) dias de intervalo entre uma e

outra.

A presença de detentos naturais de cidades distantes de Piraquara ou de

outros estados brasileiros nas unidades pesquisadas verifica-se tanto por conta do

local da captura quanto em virtude de transferências – seja em decorrência da

necessidade de um local adequado ao cumprimento da pena, por iniciativa dos

setores competentes ou a pedido do próprio preso. Nesses casos, o contato com os

familiares acaba tornando-se mais esporádico pelo fato de o deslocamento semanal

ser inviável, e em se tratando dos internos da CPAI, também pela falta de recursos

para o transporte dos apenados da unidade até suas residências.

Outro fator que prejudica o contato dos detentos com a família, segundo

Gilberto (54 anos, PCE), é a revista. Para ele, o procedimento é por demais

humilhante, principalmente para as mulheres, motivo pelo qual há algum tempo ele

89

As normas para visitação e acesso às unidades obedecem a dispositivos específicos estabelecidos por meio da Portaria nº 244/10 do Departamento de Execução Penal do Paraná, em anexo da página 150 a 163. 90

Segundo a Secretaria de Estado da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Paraná, as Portarias estão fundamentadas na lei de Execução Penal (7.210/84) e permitem ao juiz da Vara de Execuções Penais, em determinadas épocas, editar uma portaria que disciplina os critérios para concessão do benefício da saída temporária e as condições impostas aos apenados, como o retorno ao estabelecimento prisional no dia e hora determinados. O benefício só pode ser concedido aos presos em regime semiaberto e visa a ressocialização de presos por meio do convívio familiar e da atribuição de mecanismos de recompensas e de aferição do senso de responsabilidade e disciplina do interno, tendo prazo não superior a sete dias e podendo ser renovado por mais quatro vezes durante o ano.

99

pediu que as suas visitas cessassem. “É uma situação difícil demais, não quero isso

pra elas”. Questionado sobre a reação dos familiares com relação à sua prisão,

vários anos atrás, ele defende que fez tudo para deixá-los em boas condições

financeiras e que, por isso, existe compreensão. “Eles estão lá e numa boa. O único

problema é que eu fiquei aqui”. Já para Elvis (41 anos, CPAI), a notícia da prisão

junto à família foi mais difícil.

Eu morava sozinho e não tinha para quem ligar. Não queria matar meus pais de susto (...). Então falei com o meu cunhado. Depois ele avisou meu pai, que contou à minha mãe, que chegou a passar mal quando recebeu a notícia. Ela sofre dos nervos e precisou ser levada ao hospital. (...) No começo meu pai disse que nem queria saber, mas depois, quando ele viu que o negócio era mais sério, mandou eu ficar tranquilo que se fosse preciso a família gastaria pra me tirar daqui.

O que se pode perceber é que nenhum dos internos entrevistados

demonstrou indiferença em relação à família. De modo geral, bem ou mal

estruturada, essa instituição parece representar uma espécie de alicerce sobre o

qual eles depositam as esperanças para seguir adiante e para enfrentar a rotina de

restrições dentro das unidades. E junto da qual fazem planos para uma nova vida

após o término da pena.

6.2.2.3.3 Perspectivas sobre a prisão e ressocialização

Antes de serem presos pela primeira vez, muitos dos entrevistados não se

imaginavam nessa condição e não sabiam ao certo como funcionava uma

penitenciária, mesmo aqueles que tinham familiares próximos internalizados em

instituições penais, como o caso de Edson, 42 anos (CPAI). Apenas Gilberto (54

anos, PCE) admitiu abertamente que já havia pensado nessa possibilidade. “Quando

eu entrei na vida do crime eu sabia que poderia vir parar aqui. Foi uma opção [...].

Hoje eu me arrependo, mas eu tinha consciência do que estava fazendo e só queria

deixar minha família bem. Eu consegui, mas pra mim foi ruim porque eu fiquei aqui”.

Sobre o ambiente prisional, eles são categóricos em algumas queixas como,

por exemplo, em relação às avaliações psicológicas – realizadas a pedido do juiz

quando da análise de algum pedido de progressão de pena. “Eles fazem quatro ou

cinco perguntas pra gente. Será que só sabendo o nome, o crime, o tipo de contato

com a família, o total da pena e como a gente se sente em relação ao que fizemos, e

100

isso em menos de 10 minutos, é suficiente para alguém decidir a vida do outro? Eu

acho que não”, reclama Adriano (29 anos, PCE). “Eles deviam acompanhar a gente

mês a mês, analisar mesmo, se aprofundar em cada caso, e não chamar um ou

outro só quando o juiz manda”. Nessa linha também Elvis (41 anos, CPAI) é

taxativo. “Eu não tive qualquer acompanhamento durante o meu tempo de cadeia. E

no caso do meu crime isso deveria ser essencial”, explica. “Mas conheço meus

direitos e, assim que sair daqui e voltar pra minha cidade, vou atrás do Ministério

Público expor a situação e pedir um tratamento adequado; do contrário, vou

processar o estado”.

Outros aspectos negativos apresentados pelos entrevistados são a

alimentação e a falta de apoio para uma efetiva reinserção social.

A gente aqui ganha uma comida tão ruim que nem o cachorro come, o estudo é precário e não tem nem professor nem material, e não tem vaga pra todo mundo se ocupar. Então o Estado não profissionaliza, não dá estudo, não dá nada e quer que o preso saia ressocializado. Um cidadão de bem, perfeito. Isso é a coisa mais difícil que existe no sistema. É só pra quem quer realmente sair da vida do crime. Por isso é que eu acho que se essa juventude aí não tiver estudo, religião e trabalho, um apoio, vai sair, ficar um ou dois anos fora e depois voltar pra cá (Edson, 42 anos, CPAI).

Como consequência, tal situação acarretaria no inchaço das prisões e na

“profissionalização” do crime, como argumenta Celso (37 anos, PCE). “Não adianta

jogar um cara 10, 15 ou 20 anos numa penitenciária e não dar nenhuma condição

pra ele melhorar. Porque invés de ele se recuperar, vai é sair daqui ainda mais

escolado do que antes”. Já Wilson (33 anos, CPAI) é mais otimista e admite que a

situação das unidades vem melhorando com o passar do tempo. “Antes nem

oportunidade de curso tinha. Hoje até que tem. Não pra todo mundo, mas tem”. Por

isso, ele ressalta que a ressocialização de fato é uma questão de escolha. “O cara

vem pra cá sabendo um tanto, só que no meio dos outros aprende todo o resto. Aí

vai dele escolher qual futuro quer pra si: se continuar no crime ou voltar pra

sociedade”. Para sustentar seu argumento, Wilson relata o exemplo de um ex-

detento da CPAI que, em tendo encontrado uma oportunidade, mudou de vida.

O Robson era um traficante e tava aqui de bobeira, aí apareceu uma oportunidade de um curso de corte e costura. Ele foi... mais pra se ocupar, né? Não com o objetivo se se tornar um costureiro. Mas foi. Daí quando, uns dois meses atrás, cantou a liberdade, ele foi pra rua, só que como a mente dele tinha mudado, nem foi atrás de fornecedor pra arrumar droga

101

pra vender. Por quê? Porque lá dentro do curso ele conseguiu parcerias pra ajudarem ele a melhorar de vida. Agora ele tá com duas máquinas de costura, abriu um site, fez uma marca, tá fazendo uns rótulos muito bonitos, umas roupas, e agora é dono de firma.

Em termos gerais, os encontros mostraram aos pesquisadores que os presos

consultados, quase que em sua totalidade, não estão satisfeitos com as condições

de vida proporcionadas no sistema penitenciário, embora alguns deles admitam que

o panorama tenha sofrido importantes e significativas alterações com o decurso dos

anos e das administrações e, com isso, melhorado em alguma medida. Contudo, é

unânime o desejo de reconhecimento e de respeito quando eles, de algum modo

buscam novas alternativas de renda que não por meio do crime.

6.2.2.3.4 Relações com os funcionários

Durante os encontros os internos expuseram a delicada relação que existe

entre eles e os agentes penitenciários. Como no caso de Elvis, que se queixou das

revistas sofridas na prisão. “Eles mandam a gente tirar toda a roupa pra olhar se não

tem nada escondido no corpo da gente. É o que a gente aqui chama de peladão. Só

que além de constrangedor, isso é muito desumano. Humilha qualquer um” (Elvis,

41 anos, CPAI). Isso porque, segundo Celso (26 anos, CPAI), o sistema

penitenciário carece de servidores mais preparados que, além de entenderem

melhor a realidade carcerária, também consigam compreender o que rege a

legislação acerca dos direitos dos presos. “Ainda bem que, devagarinho, as coisas

estão mudando. Hoje ainda tem desses que maltratam a gente, mas quem manda

mesmo, os chefes, por exemplo, já são mais esclarecidos, não pensam em deixar os

caras mofando na cadeia. Querem dar oportunidade. Querem ajudar a gente a sair

daqui” (Wilson, 33 anos, CPAI).

Eu já estou percorrendo as penitenciárias há 14 anos e posso dizer. O problema dos funcionários que não têm estudo e nem expectativa de melhora na profissão é o seguinte: a polícia prende, a Justiça condena e os agentes são contratados pra cuidarem da nossa integridade física. Pra quê? Quando o juiz quiser falar com qualquer um de nós, a gente tem que estar com saúde e bem fisicamente pra se apresentar diante dele. Aí quando terminar a nossa pena, ele vai nos devolver à nossa família. E o trabalho dos agentes é cuidar pra que a gente seja bem alimentado, bem cuidado, e pra gente não se matar um ao outro. Só que justamente por isso esses carcereiros se sentem no direito de julgar, condenar e castigar cada preso.

102

E ainda fala ‘você é ladrão, rapaz. Cala a boca’. Ou seja, além de tudo isso ele ainda quer ser um torturador de cadeia (Edson, 40 anos, CPAI).

Mais do que uma rotina diária que se inicia por volta das seis horas da manhã

e vai até o final da tarde, todos os detentos obedecem a normas rígidas de conduta

interna, como define Wilson (33 anos, CPAI). “Nós temos as regras da cadeia, mas

também temos a nossa ética”. Como exemplo, na PCE – dos dois, o regime mais

delicado e complexo, por ser fechado – onde os internos, para garantir o bom uma

espécie de padrão de funcionamento, além de não encararem os visitantes sem a

sua permissão ou dos agentes penitenciários, caminham cabisbaixos com as mãos

atrás do corpo e, quando na presença de alguém externo à unidade, principalmente

mulheres, viram-se para a parede. “Aqui é sim senhor, não senhor, chefe, doutor e

assim por diante”, lembra Gilberto (54 anos, PCE).

Seja na PCE ou na CPAI, o que os pesquisadores puderam concluir foi que,

dentro das unidades (em regime fechado ou semiaberto), os educandos enfrentam

as mesmas condições inerentes à privação de liberdade, o que faz com ele eles

desenvolvam uma espécie de identidade coletiva. Durante as reuniões, cada vez

que algum deles se pronunciava, procurava sempre o olhar do outro, como se para

ratificar a informação revelada sobre aquela realidade compartilhada. Em todos os

momentos, os entrevistados deram mostras de que se sentem parte de um grupo e

que estão unidos pela própria causa e para defenderem seus ideais. Sejam eles

quais forem. Por isso é que, mais do que nunca, o jornalismo pode ser uma

ferramenta útil para redirecionar o olhar das pessoas e ajuda-las a reformular as

representações com a experiência proporcionada por meio do produto sugerido –

um livro-reportagem.

103

7 DELINEAMENTO DO PRODUTO

Para que fosse possível se chegar à elaboração do produto final desta

pesquisa, o livro-reportagem intitulado "Rememórias: a trajetória dos condenados",

foi preciso adotar algumas escolhas como as citadas em cada tópico a seguir.

Assim, procura-se demonstrar a viabilidade do produto, que fala sobre a história de

presos, usando, para tanto, recursos do jornalismo literário.

7.1 FORMATO

O formato escolhido para a concretização deste trabalho foi o livro-

reportagem, por permitir, como já foi dito, a construção de um relato mais amplo do

que aqueles trazidos pelas reportagens cotidianamente publicadas nos veículos de

comunicação periódicos. Assim, o nome do produto "Rememórias: a trajetória dos

condenados" foi definido com base na proposta dos pesquisadores em divulgar o

relato de vida dos presos a partir do ponto de vista dos próprios entrevistados, de

forma que estes, de fato, evocassem as lembranças de toda a trajetória percorrida

por eles até o momento da prisão e, como em alguns casos, para além dela.

O livro tem 253 páginas, possui fonte Geórgia, tamanho 10, na maior parte

dos textos, exceto quando são usados efeitos para simular a reprodução de bilhetes

ou documentos oficiais, em que é empregado a fonte Arial, tamanho 8. Notas de

rodapé utilizaram fonte Arial, tamanho 6. Em outros momentos, no decorrer da

história, usou-se negrito e itálico. O negrito foi utilizado para dar destaque a

determinados subtítulos, divisão de capítulos, e parágrafos, de forma que ficassem

mais visíveis as informações em que ouve o desejo do efeito. Já as partes em itálico

serviram para sinalizar a troca de interlocutor durante as histórias, ou reproduzir

gritos, pensamentos, expressões estrangeiras e citações.

A foto da capa foi tirada pelos próprios autores desta pesquisa e do livro e a

arte foi desenvolvida pela gráfica UP, com base nas orientações prévias dos

pesquisadores. As dimensões do livro seguiram o tamanho que é uma espécie de

padrão utilizado por editoras, o A5 (14,8 cm X 21 cm), por todas as conveniências

que o formato já comumente consumido pela maioria dos leitores proporciona. O

papel utilizado na capa foi o couchê fosco 230g.

104

Em relação às páginas do livro, o material empregado foi papel off white

pólen, com gramaturas de 70g/m², com o objetivo de não provocar cansaço à leitura

– mesma razão pela qual os autores também inseriram uma galeria interna com

fotografias das unidades penais visitadas: primeiro as da Colônia Penal

Agroindustrial do Paraná (CPAI), depois as da Penitenciária Central do Estado

(PCE), ambas localizadas em Piraquara, Paraná. Em todo caso, as imagens

representam, junto ao produto, apenas ilustrações adicionais, de finalidade

complementar, não essenciais ao livro.

Além da capa, os pesquisadores escolheram colocar duas orelhas no livro,

extensões da capa, a primeira, no início, com um breve resumo do que há no livro-

reportagem, e outra, no final, com descrição de quem são os autores.

7.2 PERSONAGENS

Para que fosse possível aos pesquisadores a utilização das técnicas do

jornalismo literário no livro-reportagem elaborado com base nas entrevistas que, por

sua vez, contaram com os recursos inerentes ao método da História Oral, foi

necessário, antes, obter a maior quantidade possível de informação acerca de cada

uma das fontes em potencial. Por isso, o primeiro contato com os presos foi

viabilizado pela realização de três reuniões, ou grupos focais, conforme consta no

tópico Metodologia de Pesquisa91 deste trabalho. A seguir, os pesquisadores

selecionaram os personagens que iriam compor o produto e procederam às

entrevistas individuais.

Para o início das entrevistas, optou-se pelo desenvolvimento de grupos focais

com os internos das duas instituições: PCE e CPAI, cuja participação foi voluntária,

determinada pelo próprio preso – condição imprescindível para se obter mais

qualidade no relato, conforme sustentam Aschidamini e Saupe (2004). O grupo

focal, que faz parte de uma técnica qualitativa conforme define Zimmermann e

Martins (2008), foi importante por três motivos, como já dito: ajudou a entender, na

prática, as representações sociais dos internos do sistema penal de Piraquara;

permitiu testar formas de abordagem em relação aos presos; e auxiliou na escolha

das histórias contadas no livro-reportagem. Depois de se realizar as entrevistas com

os grupos focais, os pesquisadores selecionaram quatro presos de regimes distintos: 91

A partir da página 79.

105

dois do fechado e dois do semiaberto, cuja participação, por parte dos presos, em

integrar a composição do livro-reportagem, foi espontânea.

Com critérios de escolha, os pesquisadores apuraram a natureza do delito

cometido pelos participantes, de forma a tornar as narrativas do livro-reportagem

mais diversificadas, de modo híbrido: parte por conveniência, ou seja, baseada na

viabilidade ou disponibilidade, conforme já esclarecido no tópico Metodologia de

Pesquisa92, e parte por intenção, isto é, “quando o pesquisador faz a seleção por

juízo particular, como conhecimento do tema ou representatividade subjetiva", como

defende Duarte (2005, p. 69).

Dessa forma, os pesquisadores, com conhecimento prévio sobre a temática

abordada, selecionaram aqueles personagens que mais se destacaram entre os

entrevistados.

Escolher essas "unidades qualitativas" entre os integrantes de urna determinada categoria de pessoas requer um conhecimento prévio do objeto de estudo. É preciso conhecer o tema, o papel dos grupos que dele participaram ou que o testemunharam e as pessoas que, nesses grupos, se destacaram, para identificar aqueles que, em princípio, seriam mais representativos em função da questão que se pretende investigar - os atores e/ou testemunhas que, por sua biografia e por sua participação no tema estudado, justifiquem o investimento que os transformará em entrevistados no decorrer da pesquisa (Alberti 2005, p. 34-35).

Portanto, depois da seleção, que acabou deixando de lado outros

participantes com mesmo potencial – não aproveitados em função do tempo

necessário para a conclusão desta pesquisa – os quatro personagens, que tiveram

as histórias escritas foram entrevistados, respectivamente, na ordem apresentada no

livro: Doutor, Cody, Padre e Carlos. Seus nomes foram mantidos sob sigilo,

utilizando-se, em vez disso, pseudônimos indicados pelos próprios presos. Tal

recurso foi empregado para evitar possíveis complicações e/ou a exposição

desnecessária dos detentos, agentes penitenciários e demais pessoas envolvidas no

relato, bem como as próprias vítimas, afinal, o que mais importava era a qualidade

do relato narrado e as histórias em si. Igualmente, o fato de não serem identificados

também trouxe, de certo modo, mais garantias com relação à fidelidade dos

personagens acerca dos fatos narrados.

92

A partir da página 79.

106

7.3 FOCOS NARRATIVOS

A história dos personagens foi construída a partir de tipos específicos de foco

narrativo, conforme a natureza de cada relato. Na história do Doutor, por exemplo,

foi utilizada a linguagem em primeira pessoa, e o narrador se colocou na maior parte

da história como protagonista da narrativa e simultaneamente ouvinte e narrador

intruso, ou seja, uma forma híbrida de composição: o protagonista é onisciente, o

ouvinte faz perguntas para este interlocutor, em algumas intercalações, usando

discurso direto, e o narrador intruso surge poucas vezes como uma "voz

questionadora" para a versão do protagonista e com efeito em itálico.

Na história do personagem Cody, optou-se por utilizar a linguagem em

terceira pessoa, como um narrador observador, que não participa da história e é

onisciente, a fim de que o recurso diminuísse a atribuição de valores morais à

história, haja vista que envolve um tema polêmico na sociedade: pedofilia. E também

porque a ideia era construir o relato a partir da ótica do próprio personagem, ou seja,

do ponto de vista de terceira pessoa defendido por Wolfe (2005) como uma das

marcas do Novo Jornalismo.

Em vez de chegar como um locutor descrevendo a grande parada, mudava o mais depressa possível para dentro das órbitas oculares das pessoas da história, por assim dizer. Muitas vezes, mudava o ponto de vista no meio de um parágrafo, até 3 no meio de uma frase. (…) Eu sempre mudava de um ponto de vista para outro, às vezes de maneira abrupta, em muitos artigos que escrevi em 1963, 1964 e 1965. Um crítico chegou a me chamar de camaleão (WOLFE, 2005, p.34-35).

Para o personagem Padre, preferiu-se escolher uma forma híbrida de

narração: assim como no caso de Cody, usa-se terceira pessoa para se distanciar

de norteamentos morais para a história, e há a participação dos pesquisadores

como observadores e interlocutores durante a narrativa, apontando impressões

sobre o personagem. A diferença, no entanto, está no fato de que o próprio

narrador-observador não é onisciente e a narrativa é dividida em duas versões,

relatadas pelo personagem como explicações para o fato de ter sido preso.

A narrativa do personagem Carlos é construída com base nas impressões dos

pesquisadores sobre o personagem, narrado em primeira pessoa, como um

narrador-personagem, que participa da história para se construir a narrativa.

107

Para escrever os textos de cada um dos quatro personagens, os

pesquisadores dividiram as histórias, cada um escolheu dois presos para narrar a

história, contudo, como o objetivo era explorar ao máximo os recursos do jornalismo

literário, os autores escreveram as quatro histórias com formas de estilo, linguagem

e interlocutores diferentes. Na primeira, do personagem Doutor, a narrativa se dá em

primeira pessoa, com o autor se colocando no lugar do preso, como se fosse o

próprio. Em alguns momentos, surge na narrativa a figura de um ou dois

interlocutores que, por sua vez, podem ser interpretados de diferentes formas,

dependendo da subjetividade do leitor. Doutor está preso há 26 anos e a liquidação

da pena está prevista para ser encerrada em 2020. Na segunda história, de Cody, a

narrativa é feita em terceira pessoa e vai aos poucos aprofundando o leitor num

tema que é polêmico na sociedade. A proposta foi não aplicar sentidos morais à

história, colocando o caso no ponto de vista do próprio protagonista, que está

recluso ao sistema penitenciário desde o final de 2009. Sua pena é de oito anos, 10

meses e 20 dias. Na terceira narrativa, do preso Padre, devido às incongruências e

divagações do personagem, além do escapismo constante dele sobre as versões

que foram dadas ao seu crime nos meios de comunicação, optou-se por criar uma

narrativa com duas versões diferentes de um mesmo personagem. Ou seja, o leitor

decide com qual quer ficar, caso queira escolher alguma. Padre foi acusado de

cometer um crime hediondo e tem pena prevista de 29 anos de reclusão, dos quais

já cumpriu 19 – associando-se, assim, à ideia do leitor investigador prevista no

jornalismo literário, no qual produz-se o texto que será completado pela experiência

do próprio leitor. Na quarta e última, do personagem Carlos, o texto apresenta

linguagem em primeira pessoa, mas, diferente da história do Doutor, um dos

pesquisadores narra o relato a partir do próprio ponto de vista, mas usando

informações do relato do preso. Recolhido à cadeia pela primeira vez em 1991, ele

ficou foragido e cometeu novos crimes ao longo de sua condenação inicial, de modo

que, mesmo em outubro de 2012, e em decorrência dos novos julgamentos, ele

ainda deve 11 anos de pena à Justiça.

A escolha da foto de capa se deu porque a imagem escolhida, com fundo

branco, foge dos estereótipos que se tem quando o assunto envolve presos,

geralmente se usa temas escuros ou nebulosos, mas, ainda assim, é uma foto

dramática. Além das histórias, em meio ao livro, a galeria de fotos inserida pelos

108

pesquisadores ajuda o leitor a ter uma referência mais detalhada sobre o universo

prisional.

7.4 LINGUAGEM E TÉCNICAS

Quanto à linguagem, os pesquisadores optaram por utilizar o jornalismo

literário por permitir uma maior complexidade dos personagens e de suas falas ao

longo do texto, com a descrição de detalhes, expressões e comportamentos. Dentro

das várias possibilidades desse formato de texto, os pesquisadores se utilizaram das

técnicas oferecidas pelo New Journalism, já que o objetivo dos pesquisadores era

potencializar os recursos inerentes ao jornalismo e, com isso, reconstruir de modo

criativo os relatos dos presos, transformando-os em algo próximo do que se entende

por um perfil jornalístico93, sem pretensão de condená-lo ou redimi-lo.

7.5 PÚBLICO-ALVO E VEICULAÇÃO

Em relação ao público-alvo pretendido, ele é composto por pessoas que não

pertencem ao ambiente prisional e nem têm contato com esse tipo de realidade, mas

que se interessam pelo tema. Entretanto, tendo em vista a amplitude dessa

definição, opta-se pela veiculação entre estudantes e professores universitários do

setor de ciências humanas, já que a academia é um lugar propício para esse tipo de

discussão, contribuindo para a formação de futuros profissionais. Entretanto, a

definição do público-alvo não irá restringir a veiculação entre pessoas de outros

universos diferentes dos propostos pelos pesquisadores.

Para que o público-alvo seja atingido, o objetivo é que o livro-reportagem seja

veiculado entre os estudantes e professores universitários em eventos acadêmicos

que incluam, por exemplo, feiras e exposições de livros. Para tanto, os

pesquisadores pretendem contatar as coordenações de centros universitários de

modo a viabilizar esse tipo de parceria.

Depois de pronto, o livro-reportagem também será inscrito em concursos

acadêmicos e demais eventos que possam ajudar na divulgação de iniciativas do

93

Segundo Vilas Boas (2003), trata-se de uma modalidade de texto em que o autor retrata apenas parte da vida do entrevistado, de modo a criar uma espécie de empatia do público em relação ao perfilado.

109

tipo. O produto poderá ser disponibilizado para os órgãos governamentais ligados ao

tema, como as instituições penais visitadas e a Secretaria da Justiça, Cidadania e

dos Direitos Humanos - SEJU, para que sirva de fonte para outros estudos. Nesse

sentido, também este relatório monográfico será ofertado para incluir os arquivos

digitais da guia de trabalhos acadêmicos Monografias, no site do Departamento

Penitenciário do Paraná – Depen-PR (www.depen.pr.gov.br).

7.6 RECURSOS MATERIAIS E ORÇAMENTO

Os equipamentos necessários à captação dos dados nas entrevistas

(gravadores de voz, câmera filmadora e câmera fotográfica) pertencem aos

pesquisadores, o que reduz os custos de produção. Mas para a concretização do

livro-reportagem foram necessários recursos financeiros para a logística até as

unidades, que, em combustível, chegou a R$ 160; diagramação: R$ 700; e

impressão de cinco cópias do livro: R$ 100,00. Contudo, os pesquisadores

pretendem obter recursos provenientes de leis de incentivo como, por exemplo, a Lei

Rouanet, que estabelece políticas públicas voltadas à cultura nacional como o

Programa Nacional de Apoio à Cultura (Pronac), que financia projetos do gênero,

para imprimir e distribuir mais tiragens do produto, e também não se descarta a

possibilidade do patrocínio de empresas privadas ou de se conseguir o interesse de

alguma editora que queira publicá-lo.

110

8 CRONOGRAMA DE ATIVIDADES

Descrição da Atividade Mês (relativo ao último ano do curso)

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

Revisão da bibliografia X X X

Elaboração do relatório

monográfico X X X

Banca de qualificação X

Desenvolvimento do grupo

focal/mapeamento de fontes X X

Entrevistas X X

Edição e verificação dos dados X X

Elaboração do livro-reportagem X X

Diagramação X

Revisão e impressão X

Apresentação do produto/banca

final X X

111

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho de conclusão de curso teve como principal objetivo construir,

por meio de um livro-reportagem, relatos escritos sobre a história de vida dos

condenados da Colônia Penal Agroindustrial do Paraná (CPAI) e da Penitenciária

Central do Estado (PCE), a partir do ponto de vista dos próprios presos. Desse

modo, esta explanação teórica buscou analisar vários conceitos importantes

relacionados ao tema, como o de crime, prisão e liberdade, além das representações

sociais acerca desse gênero social, entre outros. Assim, foi possível aos

pesquisadores avaliarem, de forma prática, a relação entre detento e sociedade e,

por consequência, os aspectos comunicacionais relativos à interseção das duas

esferas.

Com vistas à resolução do problema proposto, os pesquisadores buscaram

resgatar e reproduzir jornalisticamente as histórias de vida dos indivíduos

internalizados nas duas instituições penais, contrapondo o modo como eles acabam

retratados pela mídia e, principalmente, fugindo aos estereótipos correntes. Para

tanto, fez-se necessária a aplicação de estudos que sustentassem tal resultado.

Primeiramente foram identificadas as representações sociais dos presos na mídia a

partir de uma análise de conteúdo das reportagens veiculadas na página virtual do

jornal Gazeta do Povo. A isso, somaram-se os esforços na realização de três grupos

focais (dois na CPAI e um na PCE) com 24 detentos – tudo para que se pudesse

compreender a forma como essas pessoas são vistas pela imprensa, pela sociedade

e por elas mesmas.

Para alcançar o escopo, este estudo contou com alguns questionamentos

dispostos como metas específicas e secundárias. Nessa linha, refletindo sobre a

produção jornalística acerca do tema, e isso com base nas publicações do veículo

de comunicação selecionado, percebeu-se que ela é definida, ao menos em parte,

pelas escolhas dos profissionais da área em relação às fontes, entrevistados,

tratamentos, dados e enfoques. Tais preferências – apesar de aparentemente

simples – são decisivas, já que acabam por influenciar a ideia que se têm desse

ambiente social e seus atores; neste caso, em específico, os presos. Isso porque, ao

passo que os fatos têm a capacidade potencial de transformar as representações

sociais que uma pessoa tem do mundo, o jornalismo, por seu lado, trabalha com

ferramentas capazes de direcionar compreensões e, com isso, de reformular as

112

representações como um todo através da vivência canalizada pela produção da

mídia.

Além disso, também foi possível verificar que há um modo muito parcial de se

definir essa classe de indivíduos na mídia; aspecto refletido durante as entrevistas,

quando se constatou que os internos não apenas reconhecem como reproduzem o

discurso que, segundo Misse (2010), é bastante presente na rotulação dos

criminosos como um todo: “bandido”. Entretanto, conquanto não escapem a essa

espécie de julgamento moral, também ficou claro que esses sujeitos identificam em

si plenas condições para o retorno à vida em sociedade e que desejam ser

reintegrados a esse meio, mas de modo respeitoso, recebendo no processo o

mesmo tratamento dispensado às pessoas comuns, ou seja, não presas; sobretudo

sem preconceitos.

Em relação ao referencial teórico, este trabalho fundou-se prioritariamente na

proposição das representações sociais, uma vez que tal estudo permite

compreender as relações sociais intrínsecas à sociedade e, consequentemente, aos

detentos. Desse modo, observou-se que a realidade fora dos muros da cadeia

traduz, para os presos, um profundo ideal de vida, conquanto sua readmissão nesse

mundo seja, por vezes, temida por boa parte deles. Nesse sentido, outra vez a

comunicação desempenha papel fundamental, uma vez que produz, tanto nos

presidiários como na sociedade, por meio de produtos jornalísticos, um efeito que

pode reforçar os estereótipos a cerca da cadeia e seus internos.

Sobre o produto jornalístico que melhor contemplasse os aspectos da

presente discussão, os pesquisadores optaram por um formato que se apresentasse

na forma de uma ferramenta útil para expor tal problema social às pessoas externas

a essa realidade. Por isso é que, ao final deste trabalho, conclui-se que é possível

dar fruto a um livro-reportagem que, munido das técnicas do jornalismo literário

combinadas com o levantamento, interpretação de dados, pesquisas documentais e

de campo, e contando ainda com o esforço em descontruir os estereótipos comuns

aos presos, revele com fidelidade a trajetória da vida dos condenados da CPAI e

PCE, por meio de suas narrativas pessoais.

Por fim, com base nessas conclusões, fica registrado neste trabalho que há

outras vertentes e possibilidades referentes à visualização e tratamento do tema,

que se apresentam como um convite – ou desafio – para que outras investigações

113

sejam conduzidas de modo a enriquecer o desenvolvimento responsável da

sociedade.

114

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APÊNDICES

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Roteiro de Perguntas para o desenvolvimento do Grupo focal

1. Vocês se lembram da infância de vocês? Como foi? Aonde cresceram?

2. Quem aqui é casado?

3. Alguém aqui tem filhos?

4. Qual é o nível do contato que vocês têm com a família?

5. Como a família de vocês encara o crime que vocês cometeram e fato de

estarem presos? Isso incomoda?

6. Qual o maior sonho de vocês?

7. Há quanto tempo estão aqui?

8. Já tinham se imaginado presos algum dia na vida?

9. Como vocês imaginavam que era a vida de uma pessoa presa?

10. Depois de presos, essa visão mudou? Por quê?

11. Como vocês se definiriam hoje?

12. Já pensaram em como as pessoas lá fora veem vocês aqui dentro?

13. Para vocês, isso que elas pensam corresponde à verdade? Por quê?

14. Como vocês acham que a mídia fala de vocês?

15. Já leram o livro ou viram o filme Estação Carandiru? Se sim, o que acharam

(corresponde à verdade ou não)?

16. Vocês pensaram ou refletiram sobre a própria história de vocês? Fariam

alguma coisa diferente?

17. Vocês se sentiriam à vontade para falar sobre as suas vidas antes de virem

para cá? Tipo contar como era, um pouquinho da história de vocês, o que

vocês mudariam... Enfim. Gostariam de participar de um trabalho como esse?

18. Qual foi o momento mais importante da vida de vocês (Contar um momento

marcante da vida das entrevistadoras para quebrar o gelo)

19. Como a família de vocês encara o crime que vocês cometeram e fato de

estarem presos? Isso incomoda?

20. Vocês acham que o fato de terem sido presos foi justo ou injusto? Por quê?

21. Vocês acham que a história de vocês pode contribuir com a de outras

pessoas? De que forma?

22. Como é o relacionamento entre vocês (presos)?

23. Como é o relacionamento entre vocês (presos) e os agentes/funcionários?

24. Vocês já têm planos para quando saírem da prisão? Quais são eles?

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ANEXOS

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