Teologia Luterana - Peter Berger

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  • 7/30/2019 Teologia Luterana - Peter Berger

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    IGREJA LUTERANA(ISSN 0103-779X)

    CONSELHO EDITORIAL:Acir Raymann, editorElmer N. FlorGerhard GraselVilson Scholz

    DIRETOR GERAL: Hans Horsch

    ASSISTNCIA ADMINISTRATIVA: Cludio Kaminski

    EXPEDIO: Zely S. Steyer

    PROFESSORES:Acir Raymann, Christiano J. Steyer, Elmer N. FlorGerhard Grasel, Hans Horsch, Paulo M. Nerbas, Vilson Scholz, WalterO. Steyer e Norberto E. Heine(CAAPP)

    IGREJA LUTERANA:(ISSN 0103-779X) uma revista semestral de teologiapublicada em Junho e Novembro pela Faculdade de Teologia do SeminrioConcrdia, da Igreja Evanglica Luterana do Brasil (IELB), So Leopoldo, RioGrande do Sul.

    IGREJA LUTERANA est indexada em Bibliografia Bblica Latino-Americana.Os originais dos artigos, publicados ou no, no sero devolvidos.

    Aceita-se permuta com revistas congneres.

    Toda correspondncia deve ser enviada ao seguinte endereo:

    Revista IGREJA LUTERANA

    Seminrio ConcrdiaCaixa Postal, 20293001-970 - So Leopoldo, RS

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    IGREJA LUTERANA

    VOLUME 53 JUNH01994 Nmero 1

    NDICE

    EDITORIAIS

    Nota do editor ....................................................................................... 2

    ARTIGOS

    A Leitura do Tempo: Desafios para a Igreja Brasileira num ContextoSecularizado

    Gerhard Grasel. ..............................................................................3

    Elementos de Comunicao no Aconselhamento Pastoral

    Dieter J. Jagnow........................................................................... 34

    O Domnio da Lngua e a Aptido para Ensinar

    Arnaldo Schler................................................................................ 46

    AUXLIOS HOMILTICOS..................................................................... 62

    DEVOES..........................................................................................133

    LIVROS.................................................................................................141

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    EDITORIAIS

    Nota do editor:

    Ningum vive sem parmetros. Uma sociedade sem parmetros des-

    governa-se tica, social e politicamente. A famlia precisa de parmetros.A Igreja no subsiste sem parmetros. O Santo Ministrio, por definio eprincpio, depende de parmetros revelados na Escritura Sagrada. Espe-Ihar-se neles ter o sucesso que a Escritura promete. E apriorstico quetais parmetros so indelveis porque objetivos, e sinalizados pela normanormans.

    Os artigos deste nmero de Igreja Luterana no se propem a serentendidos como parmetros. So antes reflexes srias - nem por issomenos fraternais - que visam a uma conscincia e sedimentao de umministrio cada vez mais excelente e mais prximo dos parmetros bbli-cos. Em seu artigo sobre "A leitura do tempo: desafios para a Igrejabrasileira num contexto secularizado", o Prof. Gerhard Grasel chama aateno para a preciso que tem a Igreja de conscientizar-se "da importn-cia de no somente ler as Escrituras como tambm ser sensvel snecessidades e dores de seu tempo". Rev. Dieter Jagnow compartilha suapesquisa e experincia na rea da poimnica ao falar sobre "Elementos dacomunicao no Aconselhamento Pastoral". Fundamenta sua exposionos pressupostos de que princpios de comunicao esto presentes noaconselhamento pastoral; o pastor um comunicador; os resultados doprocesso dialgico so sentidos na dinmica do aconselhamento. Por fim,em "O Domnio da Lngua e Aptido para Ensinar", o Dr. Arnaldo Schleraborda o que seja talvez o cerne de manifestos, a maioria silenciosos, naigreja: carncia de linguagem clara e condigna no plpito. Sua anlisequestiona a honestidade profissional do pastor cujo "sermo sofrido peloauditrio em vez de o ser pelo pregador... um dos fatores principais daavitaminose espiritual do cristianismo tpido e engatinhante de muitosfrequentadores de cultos".

    So trs artigos estimulantes e provocativos com nfases diferen-ciadas mas o comum objetivo de enaltecer parmetros e sugerir alternati-

    vas para a Igreja e seu ministrio numa sociedade cultural, tica ereligiosamente plural.

    Uma abenoada leitura e at o Advento, se Deus quiser. - AR

    Correo: em nossa ltima edio (Nov. 1993, p. 153) publicamos que o Dr. Otto A.GoerI foi diretor do Seminrio Concrdia de 1950-1961. Ocorre que a lei brasileira de 1940proibia a estrangeiros a funo de diretor de escolas de qualquer nvel. Visto que o Dr. GoerInasceu no Brasil, ele foi chamado em 1940 para ser diretor do Seminrio, exercendo a funoem 1940-1953,1956-1961 e 1963-1965, totalizando 22 anos. Alm disso Dr. GoerI lecionouno Seminrio por 38 anos, de 1940-1978.

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    ARTIGOS

    A LEITURA DO TEMPO:

    Desafios para a Igreja Brasileiranum Contexto Secularizado

    Gerhard Grasel

    INTRODUO

    Sofri com essa tarefa, e ainda continuo sofrendo, pois tenho muito arepartir com vocs em um espao de tempo to limitado e curto. Tenhoconscincia em parte dos riscos que existem nessa apresentao, poisabordo temas polmicos, complexos que necessitariam de uma fundamen-tao mais slida.*

    O tema provocante e desafiador. Ele mexe com muita coisa sobre

    nossa maneira de ser. Os vrus e grmens que forem espalhados hojedurante esse momento de reflexo visam fortalecer nosso sistema imu-nolgico. A Igreja Crist esteve mais viva quando experimentou o confrontode ideias, quando teve que lutar pela verdade para no perder identidadee a prpria verdade.

    Rev. Prof. Gerhard Grasel, STM, professor de Teologia Prtica na

    Faculdade de Teologia do Seminrio Concrdia desde 1991 e tambm Deo de

    Alunos. Este estudo uma expanso de assunto abordado na aula inauguralproferida no Seminrio no dia Io de maro de 1994.

    * As principais fontes utilizadas para esta reflexo foram: BERGER, Peter(vrias obras), STOTT, John R. W. Between two worlds: the art of preaching in thetwenthieth century; SCHLER, Oswaldo. A leitura do tempo. In: Lar Cristo. Porto

    Alegre, Concrdia, 1974, p. 104-108; GRASEL, Gerhard. "Secularization and

    challenges which confronts contemporary Brazilian Lutheranism". St. Louis, Con-crdia Seminary, 1983. (Dissertao de mestrado no publicada).

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    Essa temtica da leitura do tempo e o confronto do povo de Deus comos novos ventos de ideias que sopram sempre de novo continuar sendoassunto de tenso at o dia da volta do Senhor.

    O texto que tenho diante de mim uma coleta de dados, de fatos e

    informaes. Sinto que faltou tempo para ruminar, mastigar mais vezesesses contedos para chegar a concluses mais definidas e claras.

    Presto nesse momento minha homenagem ao falecido Prof. OswaldoSchuler que foi um dos meus estimuladores nessa caminhada de diagnos-ticar a enfermidade social para melhor poder receitar o remdio do Evan-gelho.

    Em 1973 o saudoso mestre proferiu a aula inaugural do Seminrio

    Concrdia de Porto Alegre, dando, ento, um passo decisivo para que aIELB se conscientizasse da importncia de no somente ler as Escriturasmas tambm ser sensvel s necessidades e dores de seu tempo e assimfazer tambm a leitura de seu tempo.

    Em 1994, por ocasio do 90 Aniversrio da IELB, quando vivemosnum momento decisivo em nossa histria, estamos ensaiando um jeitonovo de ser igreja. Estamos crescendo na compreenso de nosso papel enossas responsabilidades, e estamos experimentando as dores doamadurecimento, da responsabilidade.

    Crescer, amadurecer, assumir responsabilidades di, gera conflitos ecrises, mas esse o saudvel caminho da vida. Assim como o filho sofrecom seu amadurecimento mas sabe que os pais o amam, ns tambmsabemos que no estamos ss. Ele estar conosco ate o fim.

    1. A LEITURA DO TEMPO

    "As cincias sociais obrigam o telogo a dar tratamento teolgico aosproblemas e desafios contemporneos, contextualizando a sabedoria reve-lada, atualizando a temtica de nossos sermes e criando o hbito dodiagnstico espiritual em nossa atividade de "Seelsorger", cura de almas".

    As cincias sociais auxiliam a manter viva e lmpida a nossa viso cristno mundo, ajudando a afastar o perigo de uma falsa identificao comdeterminado momento histrico. Ajuda tambm a escapar do risco etentao de ser cegado por utopias terrestres, que se apresentam comopromessas sedutoras ou de sermos vtimas de falsas idealizaes! fundamental limparmos e polirmos as lentes das quais olhamos o nosso

    sculo e civilizao.

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    O estudante cristo, especialmente o futuro pastor e pregador, precisaconhecer os fatos sociais para fazer a leitura do seu tempo. O pastor dealmas deve ter uma mentalidade agudamente contempornea. Ele no temo direito de alhear-se, confinando-se num campo restrito de interesses. Osparoquianos tm o direito de esperar de seu lder espiritual uma palavra

    segura de orientao e consolo nas situaes mais diferentes.

    Anos de estudo de teologia devem ser vividos num trabalho intelectualsrio e constante para podermos encarar o mundo novo que bate s portas.No podemos desconhecer os principais pressupostos e princpios parainterpretar o contexto social. Precisamos desenvolver o hbito de refletirsobre o mundo e a sociedade dentro de uma tica crist.

    A liderana espiritual nos impe o dever da observao persistente dasmudanas que ocorrem ao nosso redor e em que medida estas mudanaspodem eventualmente obstruir boa veiculao da mensagem evanglica.Exemplo: o fenmeno da urbanizao e industrializao. Precisamosaprender a tambm fazer a exegese dos fenmenos humanos e sociais.No podemos ignorar o fato social das novas relaes sociais, da mis-cigenao, das trocas culturais.

    Est a Igreja atenta para o processo de eroso dos valores ticos,morais e sociais? Est ela acompanhando seus fiis e em especial sua

    juventude, nos meandos e labirintos do mundo urbano? Estamos apare-

    lhando nossos leigos para serem mensageiros da f no meio urbano ouestamos permitindo que sejam vtimas indefesas do fenmeno?

    Essas e outras tantas interrogaes nos fazem pensar nesse fim demilnio. Como vamos proclamar o texto autntico de Deus de modorelevante ao contexto secular de nossos dias?

    Na tentativa de anunciar o texto de Deus, a Igreja tem que entender ocontexto. Fiel a Deus e preocupada com os seres humanos so suasmetas.

    Vivemos na era da exploso do conhecimento. O ser humano dispede informaes que nunca teve na sua histria. H tambm uma explosode comunicao! A comunicao eletrnica transformou o quadro ouprocesso de influncia. Hoje milhes de pessoas so influenciadas simul-taneamente. As pessoas esto mais expostas a pessoas, e isso tem seusefeitos sobre o viver das pessoas e interessa queles que querem com-preender a criatura necessitada da Palavra de Deus.

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    Charles Pguy escreveu em 1913 que "o mundo tinha visto maioresmudanas nestes ltimos trinta anos do que nos 2000 anos que prece-deram essa poca". E isso foi em 1913. E hoje?

    Como Igreja Evanglica Luterana do Brasil que celebra 90 anos de

    existncia como organizao eclesistica, no podemos ficar insensveise desatentos as caractersticas e necessidades prprias de nosso povobrasileiro. Nosso Brasil uma unio de muitos brasis, onde o secular e omgico se confunde nas cidades e at no campo, onde os cultos afro-brasileiros, o espiritismo, o ocultismo, o pentecostalismo e outros novoscultos esto crescendo de modo visvel e surpreendente, talvez no vazio,no vcuo deixado pelo tecnismo, materialismo, formalismo religioso ou pelasecularizao em si.

    Na revista VEJA de 10/11/93, sob o ttulo Rosrio de Deboches, feitauma anlise do livro do escritor americano Gore Vidal, cujo ttulo ao vivodo calvrio. a stira mais blasfema da histria da literatura. VEJAapresenta trechos desse festival de deboches. Mas o que mais me tocoue feriu na leitura dessas pginas foi a entrevista que o autor d revistapor telefone, onde diz o seguinte sob o ttulo cristianismo:

    Na verdade, eu, ao contrrio de Salman Rushdie, fui bater numcachorro morto, o cristianismo, enquanto o dele ainda estava muitovivo. Os eclesisticos irlandeses me atacaram, e tambm fui acusado

    de vilipndio em Bolonha. Ouvi essas reclamaes, mas no fuicondenado morte como o escritor de Versos Satnicos. A diferenaentre cristos e muulmanos que os adeptos do islamismo acredi-tam em sua religio. Os cristos, no.

    O comentrio agressivo desse escritor machucou-me profundamentecomo cristo. verdade que o adjetivo "cristo" em muitssimos casos no nada mais do que um disfarce para as "patas do lobo". H muito abusofeito em nome do cristianismo. No poucos afirmam a religio crist paratirar proveito de seus produtos e derivados", de seus resultados que lhes

    convm e interessam. No defendemos a religio pio do povo, ou "vodkaespiritual". Alis, muitos fenmenos do secularismo podem ter surgidoporque muita gente tem percebido que as ltimas intenes de "algunsdefensores da religio crist" ou suas instituies no so to crists comoparecem. E no h dvida de que essa religio ideologizada pode ser eainda usada como fator de alienao das pessoas.

    Mas a crtica nos faz pensar sobre nossos tempos. Que tempos soesses? Qual nosso testemunho, nossa mensagem nesse imenso Brasil?Que desafios estamos enfrentando nesse fim de milnio? Estamos

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    preparados para essa luta que no contra tanques e fuzis, mas contra asforcas espirituais do mal Ef 6.12? Vamos dar uma olhada no campo debatalha.

    1.1. A modernidade como a universalizao da heresia

    Conforme Peter Berger, o impacto da modernidade sobre a religio comunente visto como o processo de secularizao. Nesse processo muito enfatizado o esprito de autonomia, o estudo cientfico da natureza,de independncia e de liberdade.

    Para um pensador de outra viso, o homem moderno somente existe"de fide", isto , somente na mente de telogos modernos fortementeinfluenciados pela sociologia. O ser humano sempre e ser o mesmo em

    todos os aspectos. Ser verdade?Bem, j deu para ver nesse incio de conversa, que o tema abre um

    debate interessante. As palavras tm diferentes sentidos para pessoasdiferentes. Homem moderno, moderno, secular, secularizao e muitosoutros termos tm sentidos diferentes para pessoas diferentes. Mas nsqueremos debater os fatos mais concretos e toda fenomenologia possvel,e no tanto discutir termos nesse curto espao de tempo.

    Mas o que que diferencia (se h diferena) tanto o homem tradicional

    do homem moderno e contemporneo? Peter Berger diz que o homem denossos dias tem tantas mais escolhas. Nunca o homem pde escolhertanto.

    O homem da sociedade pr-modema jamais poderia sonhar com asescolhas que o homem moderno tem que encarar: escolha de ocupao,lugar de residncia, companheira(o) para casamento, nmeros de filhos,estilo de lazer, escolhas na aquisio de bens materiais. Estas so esco-lhas importantes do arranjo externo da vida. Mas h outras escolhas quetocam o mundo interior dos indivduos. Escolhas que so chamadas"estilos de vida", escolhas morais e ideolgicas e, por fim, escolhasreligiosas.

    1.2. Situao moderna

    Modernidade uma quase inconcebvel expanso da rea da vidahumana aberta para escolhas. O fator essencial nesse processo de moder-nizao o fator tecnolgico.

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    H na verdade aspectos ou fenmenos no mundo contemporneo queno so to novos como parece, tendo paralelos em perodos anterioresda histria. necessrio conhecer precedentes histricos e reconhecerque nem tudo to novo ou indito em todos os aspectos, mas nopodemos nos equivocar ou iludir com a viso de que nada novo na histria

    e que no h mudanas a serem percebidas.

    A modernidade que ns conhecemos foi causada por fenmenostipicamente europeus, como a economia de mercado capitalista, o estadoburocrtico, a metrpoles pluralista, as configuraes ideolgicas com-plexas produzidas pela Renascena e Reforma. No entanto, a mais impor-tante fora transformadora desde o incio da modernidade hoje atecnologia. Exemplos de impacto: telefone - estilo de tratamento, impes-soalidade, civilidade superficial.

    1.3. Do destino escolha

    O homem pr-moderno vivia em grande parte sob a sombra do destino.A tradio pesava sobre todos os aspectos de sua vida. At seu modo devestir era muito mais determinado pela tradio. Grande parte de suaatividade era governada por prescries claramente definidas e delimi-tadas. No havia tanta ambivalncia na sociedade tradicional.

    No passado evitava-se a gravidez evitando o sexo, apesar de haver

    tcnicas rudimentares de preveno. No entanto, no havia o controlepropriamente dito. A moderna contracepo, pela primeira vez.fez agravidez ou no gravidez uma questo de escolha e uma deciso razoa-velmente confivel para milhes de indivduos. O que antes era destinoagora tornou-se uma escolha.

    Do ponto de vista sociolgico, as sociedades pr-modemas so mar-cadas pelo fato que suas instituies tm um elevado grau de certezasocialmente aceita. Havia prescries impostas e raramente questionadas

    por uma maioria. Cada um sabia o que podia ser e fazer. Sua identidadelhe era prescrita. Conhecia seus limites.

    Em contraste com isso assistimos no mundo ocidental moderno aexpanso de uma fila de alternativas aceitas comparadas aos padrestradicionais: tolerncia de casamento com membros de outros grupos,papis no casamento, tolerncia de relaes sexuais antes e fora docasamento, alm de alternativa sexual defendida com veemncia pelomovimento gay. O homem contemporneo experimenta sua sexualidade

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    como uma arena de escolhas individuais. Mulheres, jovens, crianas,minorias raciais experimentam o fim do controle a que ante muitos estavamsubmentidos.

    O recente desenvolvimento da cirurgia que muda o sexo sugere a

    possibilidade de escolha at mais radical: uma mulher pode agora escolherno somente um papel masculino (profisso) mas um corpo masculino.Repetindo, o que antes era destino agora se torna uma srie de escolhas.O destino transformado em deciso. E essa multiplicidade de escolhas experimentada por todo tipo de pessoas devido aos meios massivos decomunicao. O homem estabeleceu seu prprio limite. ele a medida detodas as coisas?

    1.4. Uma pluralidade de vises de mundo

    A pluralizao que caracteriza a modernidade afeta a conscincia dohomem moderno que est sendo confrontado e desafiado pelas mltiplasopes de possveis modos de pensar sobre o mundo. Ele tem queescolher sua viso do mundo, como se escolhe produtos de consumo nomercado. Cada vez mais cabe a cada indivduo decidir, escolher, optar porseu estilo de vida sexual, seus valores, seus referenciais ticos e final-mente, por sua preferncia religiosa.

    Enquanto os homens pr-modemos podiam agir com uma certa espon-

    taneidade irrefletida, o homem moderno obrigado a refletir e pensarsobre suas escolhas. Isso trouxe consigo uma forte acentuao do ladosubjetivo da existncia humana.

    Ns seres humanos precisamos ter algumas respostas para ns enosso filhos. Numa sociedade com estruturas de plausibilidade estveis ecoerentes, as respostas s novas geraes podem ser dadas com certotom de segurana. Isto , a realidade socialmente definida tem um alto graude objetividade. "O mundo assim, as coisas so assim, e no assado, eno pode ser diferente e no continue a fazer perguntas bobas!" Esse erao clima, o contexto. Pois esse tipo de objetividade est sendo eliminadapela eroso provocada pelas foras da modernizao.

    No entanto, o indivduo precisa de respostas para uma vida mais oumenos ordenada e com sentido, mas se a sociedade no lhe d respostasobjetivas, ele forado a voltar-se para dentro, em direo a sua prpriasubjetividade, para de l conseguir qualquer certeza que possa manusearpara sua existncia. Esse voltar-se para dentro de si a subjetivao queest hoje presente na moderna literatura, arte, e na astronmica prolife-

    rao das modernas psicologias e psicoterapias.

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    Nesse movimento da objetividade do mundo exterior para sua prpriasubjetividade, o mundo exterior torna-se cada vez mais questionvel e seumundo interior mais complexo.

    1.5. Um prometer muito nervoso

    A transio de destino para escolha experimentada numa maneiraambivalente. De um lado uma grande libertao, de outro lado an-siedade, alienao e mesmo terror. Essas sensaes poderiam nos lem-brar pensadores da modernidade como Kierkegaard ou Nietzsche, masessa ambivalncia da libertao e alienao experimentada tambm porpessoas que nunca leram um livro.

    Em muitas de nossas cidades isso flagrante. A modernidade atrai

    pessoas como um m forte com suas promessas de nova liberdade, novaspossibilidades de vida e auto-realizao. Essas promessas, no entanto,raramente so alcanadas, mas ningum pode negar que a modernidade de fato experimentada como libertao dos estreitos limites da tradio,da pobreza, das amarras do cl e tribo.

    Por outro lado, um preo alto pago por essa libertao. O indivduocomea a experimentar-se como um ser solitrio, gerando incertezas devalores e normas para a sua vida, e finalmente acaba incerto e insegurosobre sua prpria identidade. Est condenado liberdade (xodo rural,

    migraes para a cidade). Libertao e alienao so faces opostas damesma moeda da modernidade.

    O fator alienante da modernidade fez surgirem ideologias que queremrestaurar a ordem, o sentido das coisas e a solidariedade. A aprarecemideologias reacionrias, que s olham para o passado (neo-nazismo), e asque s olham para o futuro (marxismo e utopias).

    1.6. O imperativo hertico

    A condio tpica do homem pr-modemo de certeza religiosa, aopasso que a do homem moderno de dvida religiosa. lgico que haviadvida e incertezas no passado, mas a frequncia da incerteza religiosa a caracterstica de nossos tempos modernos.

    A palavra heresia vem do grego hairein = escolher. Heresia original-mente significou o fazer uma escolha diferente. O hertico foi uma pessoaque questionou a autoridade existente, recusou-se a aceitar a tradio notodo, selecionou alguns contedos da tradio e com o escolhido e

    selecionado construiu sua prpria opinio. bvio que sempre houve

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    heresias e desvios, rebeldias e inovaes nas comunidades humanas, masa quantidade de "heresias" coisa desses tempos modernos. Rupturasaconteciam ocasionalmente no mundo pr-moderno, mas a situao mod-erna um mundo de incerteza religiosa.

    Para o homem pr-moderno, heresia uma possiblidade - normal-

    mente remota; para o homem moderno, heresia, toma-se uma necessi-dade. Sim, a modernidade cria uma nova situao na qual selecionar eescolher se torna um imperativo. F passa a ser uma questo de prefern-cia e gosto. Os consumidores tm que escolher, optar, decidir e se definirpor sua preferncia religiosa. Esse fato contm em si toda a crise na qualo pluralismo colocou a religio.

    1.7. Algumas ponderaes conclusivas

    No pode ser pretenso de telogos cristos apresentar um programapara a teologia que sirva de grande sntese que vai convencer todo mundo.Religio, como lembra Peter Berger, no em sua essncia uma atividadeintelectual. Telogos so capazes de esquecer isso de tempo em tempo.

    Telogos so tentados a apresentar seu prprio programa teolgicocomo algo que vai salvar a f ou a igreja nesse tempo novo. Tais pretensesso vs, pois telogos podem ajudar ou atrapalhar, mas no deles quedepende o futuro do cristianismo.

    2. SECULARIZAO COMO PROCESSOHISTRICO DESAFIADOR PARA A IGREJA CRIST

    Como j dissemos, o impacto da modernidade sobre a religio comunente visto em termos de processo de secularizao.

    Secularizao um problema com o qual se defronta cada cristo,desde que ele tem de viver sua f num mundo secular. A secularizao um fenmeno universal, apesar de estar mais diretamente relacionado como mundo ocidental, chamado cristo.

    A palavra secularizao pode ser um comeo de uma grande dis-cusso. De fato a palavra ambgua. O termo secularizao precisa serdefinido cuidadosamente. Sempre bom prestar ateno na hora de definiros termos e usar as palavras, especialmente quando termos e palavrasesto envolvidas com aspectos emocionais e ideolgicos. O termo secu-larizao e secularismo tem sido empregado como um conceito ideolgicoaltamente carregado de conotaes valorativas, positivas ou/e negativas.

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    Em crculos progressistas tm significado a libertao do homem modernoda tutela da religio, ao passo que em crculos tradicionais tm sidocombatido como "descristianizaao", paganizao e equivalentes.

    H os que sugerem que esses termos no deveriam ser usados porserem confusos e ambivalentes. Mas, ns optamos pela tentativa de definir

    secularizaao como um processo histrico irreversvel que est modifi-cando profundamente o comportamento dos seres humanos de nossosdias.

    Mas, afinal, o que secularizaao? A definio mais simples de que um processo histrico pelo qual o mundo "desdivinizado". O socilogoPeter Berger entende a secularizaao como o processo pelo qual setoresda sociedade e da cultura so abstrados dominao das instituies esmbolos religiosos. Secularizaao um processo histrico atravs do qualo mundo se toma consciente de sua consistncia e autonomia; processode libertao atravs do qual o homem, a sociedade e a cultura solibertadas da tutelagem e controle do mito, da metafsica, das instituiesque dependem do sagrado e do religioso. (Cristo secularizado - F. B.Kloppenberg- p. 143).

    No entanto, quando o secularizar um programa, quando secularidade a fonte de uma cosmo-viso, de uma ideologia, estamos diante dosecularismo, uma doutrina de salvao. Secularizaao pode ser entendidacomo algo mais ou menos neutro em si, enquanto que secularismo uma

    falsa ideologia. Secularismo como um parasita ou um germe na secu-larizaao em si neutra.

    Pelo fato de que a cultura ocidental se desenvolveu a partir de razescrists, o processo de secularizaao tem tomado a forma concreta de umadescristianizaao. Nesse conflito o processo de secularizaao pode serilustrado a partir de trs conhecidos contrastes: f e conhecimento, igrejae estado, esse mundo e o mundo porvir (aqum - alm).

    O Evangelho nos lembra que conhecimento e o estado so valorespenltimos e que a esfera terrena em si transitria. O Evangelho evitadesafiar a esfera terrena no seu prprio nvel e no procura exercer podersoberano nessa esfera. Esse era o pensamento dos cristos dos primeirossculos.

    Num segundo momento, no entanto, que vai da patrstica at ostempos modernos, a esfera religiosa predominou ou exerceu poder sobreo secular. Houve tempos em que a religio parecia ter absorvido o secular

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    por completo. A filosofia, por exemplo, podia no mximo ser a "ancillatheologiae". A religio dominou, abafou, sufocou o secular, o terreno,negando-lhe o valor em si.

    A doutrina luterana dos dois reinos deu uma legitimao teolgica

    autonomia do secular. "A Reforma protestante, diz Peter Berger, pode serentendida precisamente como um ressurgimento poderoso daquelasforas secularizantes que foram "contidas" pelo catolicismo. Na compreen-so do Reformador, a Bblia ensinava que a tarefa, o servio de f e amor realizado dentro da realidade profana e secular. A santidade de vida stem sentido dentro do contexto do profano, do tenreno.

    Para alguns a secularizao a marca do diabo, e para outros ela uma bno. H srias controvrsias sobre as foras da secularizao.Mas, no meio desse debate surge uma pergunta: como e quando comeoutudo isso? Qual a explicao para a origem e desenvolvimento desseprocesso?

    2.1. Origem e desenvolvimento desse processo

    Inmeros fatores complexos e multifacetados podem ser levantadosem qualquer anlise mais profunda da ruptura da sntese medieval de graa- natureza, teologia-filosofia, igreja-estado. De diversas maneiras as n-fases seculares na Renascena e Iluminismo desembocaram e se encon-

    traram com a revoluo industrial e o surgimento da cincia moderna paraproduzir o esprito secular que comeou a invadir a atmosfera intelectualdo sculo XIX.

    Emil Brunner entende que essa ideia de um indivduo que fica de psobre sua base prpria, baseada na autonomia da prpria razo, comeoucom a Renascena. Outros dizem que a ruptura do "corpus Christianum"do sculo XVI com a consequente dilacerao da unidade dos cristos, foio fator significante para o crescimento do indiferentismo religioso.

    H tambm os que vem o processo econmico moderno, ou seja, adinmica do capitalismo industrial, como o "portador" primrio da seculari-zao.

    Friedrich Gogarten entendeu a secularizao como "uma consequn-cia necessria e legtima da f crist", fazendo no entanto uma claradistino entre processo histrico e o secularismo. Gogarten afirma queatravs da f o indivduo compreende o mundo como criao, e quesomente a f torna possvel um relacionamento livre com o mundo, sem

    um medo mstico. Na f o mundo visto como coisa, despido de divindade

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    e sujeito interveno do homem. Na f a transcendncia de Deus afirmada radicalmente. Deus no mundo, terra. O desencantamento domundo comea no Antigo Testamento, que postula um Deus que est forado cosmos. Deus radicalmente transcendente, no identificvel comnenhum fenmeno natural ou humano, lahweh era para Israel um Deus

    muito distante, muito diferente das divindades locais ou tribais.

    lahweh era um Deus "mvel", radicalmente transcendente e diferentedos deuses formados das guas conforme as mitologias existentes antese no tempo em que foi escrito o livro de Gnesis. A Bblia apresenta (Gn)o Criador que no confundido com a criao, como o Deus transcendentee o homem num universo inteiramente "demitologizado", que est entreDeus e o mundo.

    Estamos tentando indicar que o "desencantamento do mundo" temrazes que antecedem bastante a Reforma e o Renascimento. Concor-damos com Berger quando diz que a Reforma uma simples reemergenciade foras secularizantes que tinham sido contidas pelo catolicismo romano.

    2.2. Ambiguidade, riscos e oportunidades da secularizao

    Talvez pudssemos resumir muito do que j foi dito sobre a seculari-zao como sendo um desafio para o cristo e uma tentativa para o no-cristo.

    A comunidade crist primitiva era tipicamente um grupo no sagrado.Na carta aos Hebreus enfatizada a verdade de que todos os sacrifcios,todas as tentativas de reconciliao com Deus atravs dos sacrifcios,cultos e ritos so tentativas humanas vazias e sem valor em si, e que Cristocom seu sacrifcio substituiu e completou todos esses sacrifcios parasempre.

    Nos tempos da nova aliana do Novo Testamento, essa realidade ouessa verdade ainda aprofundada. Agora todos os cristos so sacerdotesdo Rei (1 Pe 2.9), e a igreja, o povo de Deus tem a tarefa de agir nasociedade como fermento, que misturado com a massa trabalha dentro etransforma a massa por dentro.

    Alis, os primeiros cristos tinham uma vida muito secular num certosentido, ou muito desacralizada. No tinham templos, altares. Os pagosos chamavam at de atestas, que foi uma das falsas acusaes que osapologetas refutaram.

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    Mas a igreja comeou a se comprometer com os imperadores, reis,estados, culturas, filosofias e teologias. E uma hierarquia absolutista emonoltica foi estruturada, cada vez mais longe e separada do povo. Oestado comeou a ser "cristo" de uma maneira sacral, e estava a o inciodo processo de resacralizaao. E como a igreja se meteu indevidamente

    em aspectos da vida humana que no lhe competia. Ex: cincia, economia,poltica, cultura. Ela detinha o monoplio de tudo com o uso da fora epresso. Que vergonha so as pginas da Inquisio. Quanto dio enverni-zado de "f".

    De uma certa maneira pode se dizer que o cristianismo verdadeiroseculariza o mundo, pois ele afirma de modo nico e radical a transcendn-cia de Deus, e pe os valores no seu devido lugar.

    No tarefa da igreja controlar sob presso a sociedade. Alis, noh base teolgica no Novo Testamento para afirmar que a igreja tem queter o controle que teve no passado tanto no mundo ocidental como oriental.Nesse sentido, a libertao desse monoplio eclesistico bem vida. Aigreja traz uma mensagem de convite e promessa de Deus e no umaordem que escraviza e aterroriza conscincias.

    2.3. A secularizaoe o problema da plausibilidade

    A moderna sociedade industrial produziu uma espcie de "territrio

    livre" com relao religio. So setores localizados em que o controle, afiscalizao, a presso dos valores ticos e morais ligados religio noexercem mais influncia ou presso. No verdade que em muitascircunstncias a religio pra no porto da fbrica? verdade que areligio continua a ter um potencial de realidade na esfera da famlia e dasrelaes sociais ligadas a ela!

    Com a crescente individualizao da sociedade moderna, tambm areligio passou a ser assunto de preferncia do indivduo ou ncleo familiar.

    Tal tipo de religio no desempenha mais a tarefa clssica de construir ummundo comum no mbito do qual toda a vida social recebe um significadoltimo que obriga a todos. H em consequncia disso tudo uma crescentedicotomia entre vida privada e situaes em outros setores da vida secular:Ex.: poltica, e negcios pblicos desvinculados, divorciados dos valoresda vida familiar ou religiosa particular. Claramente o poder da religio assim restrito, em alguns casos, a no poder ir alm do ncleo familiar. Abase religiosa passa a ser fundamentalmente a famlia, e como a famliamoderna uma instituio notoriamente frgil, isso significa que a religiotambm uma construo muito frgil na vida de muitos.

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    A perda do carter coletivo da religio est alimentando uma situaode pluralismo. Definitivamente assistimos o fim do monoplio das tradiesreligiosas e um pluralismo indito na histria dos seres humanos.

    Durante a maior parte da histria humana, os estabelecimentos re-

    ligiosos existiram como monoplios de legitimao ltima da vida individuale coletiva. As agncias religiosas eram agncias reguladoras do pen-samento e ao. Esse quadro foi modificado profundamente. Hoje asubmisso religio voluntria, e como tal, no segura. A tradio temque ser "vendida", diz Berger. A atividade religiosa vem a ser dominadapela lgica da economia de mercado. Os grupos religiosos tm que seorganizar de forma a conquistar os consumidores. H forte presso paraobter resultados dentro desse mercado competitivo, e isso gera umaracionalizao das estruturas scio religiosas, expressando-se primordial-

    mente no fenmeno da burocracia.As instituies religiosas de repente esto envolvidas em atividades

    de relaes pblicas com a clientela consumidora, lobby com o governo,levantamento de fundos em agncias privadas e governamentais, en-volvimentos multifacetados com a economia secular.

    Como nunca na sua histria as igrejas fizeram relatrios, avaliaramresultados e fizeram uso de mtodos racionais para conseguir seus ob-

    jetivos.

    Essas profundas e radicais transformaes e mudanas ocorridas naigreja tambm chegaram a ser notadas nas escolas de formao deministros e pastores. O perfil do ministro e do lder religioso e suas funesforam influenciados por essa nova realidade. Antes a erudio teolgicaera fundamental para o pastor. Hoje o tipo sociopsicolgico que emerge naliderana das instituies religiosas burocratizadas, naturalmente semel-hante personalidade burocrtica em outros contextos institucionais:ativista, pragmtico, alheio a qualquer reflexo administrativamente irrele-vante, hbil em relaes interpessoais, dinmico e conservador ao mesmotempo. Parecido com o burocrata. Esse perfil do novo pastor descrito porBerger nos faz pensar sobre nossa formao e nfase teolgica. Temosque mudar quando necessrio, mas precisamos de sabedoria para saberqual o caminho certo nesse novo mundo. Tenhamos cautela nesse proc-esso.

    Enquanto as instituies religiosas ocuparam uma posio de mo-noplio na sociedade, seus contedos podiam ser determinados de acordocom qualquer saber teolgico que parecesse plausvel e/ou convincente

    para a liderana religiosa. A situao pluralista, todavia, introduz uma forma

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    nova de influncias mundanas, provavelmente mais poderosa para modi-ficar contedos religiosos do que as antigas formas, como os desejos dereis e poderosos: a dinmica de preferncia do consumidor.

    Resumindo, foi introduzido no contexto religioso o controle do consu-

    midor sobre o produto. Est, portanto, introduzido um princpio de mutabili-dade, de mudana, inimigo visceral do tradicionalismo religioso. Est cadavez mais difcil manter verdades imutveis. Os contedos religiosos tor-nam-se sujeitos moda. A relevncia da religio est cada vez mais naesfera privada. Quando a religio enfatiza aplicaes s grandesinstituies pblicas ela perde seu impacto. Isso importante para asfunes moral e teraputica da religio. Ex.: nfase na famlia! IgrejaCatlica Romana: passado - campanha da fraternidade enfatizava,enfocava primordialmente as questes sociais como reforma agrria,

    justia social, violncia, misria, pobreza e outros; 1994 - "E a famlia comovai?". Nota-se a nfase nas necessidades psicolgicas do indivduo, dafamlia. Busca-se a relevncia. H forte sensibilidade com as necessidadesdo indivduo.

    Ao se enfraquecer a plausibilidade, surge a dvida. O que antes eraconsiderado como realidade evidente em si mesma, ser alcanado agorapor um esforo deliberado, um ato de f. Estamos, segundo algunsanalistas, em plena era de ceticismo. As estruturas de plausibilidadeperdem solidez e no servem mais para confirmar a realidade social. Agora

    sempre h todos os outros" que no confirmam o que outros crem ouaceitam. Torna-se cada vez mais difcil permanecer entre nous na so-ciedade contempornea.

    Tendo sido os contedos religiosos "desobjetivados", tornados sub-jetivos, a religio no se refere mais ao cosmos ou histria, mas Existenz individual ou psicologia. Qualquer certeza deve ser buscada naconscincia subjetiva do indivduo, porque o mundo exterior est dividido,partilhado, no formando mais uma plataforma segura nos momentos dequestionamentos e indagaes. As tradies religiosas perderam seu

    carterde smbolos abrangentes para toda a sociedade.

    Nesse contexto, as instituies religiosas lutam para sobreviver nummeio que questiona e indiferente s suas definies de realidade.

    2.4. A secularizao e o problema da legitimao

    O problema fundamental das instituies religiosas como sobrevivernum meio que j no considera evidentes as suas definies da realidade.

    Diante disso existem duas opes bsicas que se abrem, a saber a

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    O futuro da religio em qualquer lugar que seja , ser modeladodecisivamente pela secularizao, pluralizao e subjetivao.

    3. REFLEXES SOBRE AS CONSEQUNCIASDESSAS MUDANAS NO MBITO DOMINISTRIO PASTORAL CRISTO LUTERANO

    No seu livro Between Two Worlds - The Art of Preaching in theTwentieth Century, John R. W. Stott, um mundialmente conhecido pregadore pensador, diretor do Instituto de Londres para a Cristandade Contem-pornea, apresenta de modo inteligente os principais obstculos pre-gao contempornea.

    Apresentaremos a seguir um resumo, uma sntese desse captulo:

    3.1. O Esprito anti-autoridade

    No h dvida que o sculo XX passou por uma revoluo global,marcada especialmente pelas duas guerras mundiais. No possvelnegar que estamos vivendo numa nova ordem. Todas as autoridadesaceitas - famlia, escola, universidade, Estado, Igreja, Bblia, Papa, Deus -

    esto sendo questionadas. Tudo que tem cheiro ou gosto de "establish-ment", que lembre poder inatacvel est sendo indagado e oposto. Per-guntas inconvenientes e irreverentes so feitas queles que antes se

    julgavam imunes ao criticismo.

    No seria correto reagir a toda rebelio corrente de modo negativo ouconden-la de modo simplista como sendo diablica. Muito dessa con-testao e rebelio de nossos dias uma atitude responsvel, madura ecrist. Esses movimentos de oposio muitas vezes protestam contratodas as formas de desmunizao. So os protestos contra a exploraodo pobre e contra a nova escravido social, contra a escravido ao mercadoconsumidor e mquina, contra a educao manipuladora que desrespeitao processo educacional que permite s crianas desenvolverem seupotencial pessoal prprio.

    Quando a rebelio expressa nesses termos, em vez de se opor aessa rebelio, o cristo at deveria engajar-se mais nesses protestos emfavor da humanizao da criatura feita a imagem de Deus. Podemos e atdevemos s vezes ser mais protestantes no sentido da palavra.

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    Mas quando os advogados da mudana vao em outra direo que aquesto fica complexa. Esses proclamaram que no existem mais quais-quer padres objetivos para a verdade ou bondade. Negam a existnciade qualquer referencial objetivo. Proclama que tudo mutvel, sujeito avariaes.

    Enquanto esse esprito prevalecer, tanto anarquistas como os queprocuram verdadeira liberdade tendem a olhar o plpito como um smbolode autoridade, contra o qual esto se rebelando.

    Igualdade de oportunidades educacionais tem aprimorado, ao menosno Ocidente, as faculdades de crtica das pessoas. Agora cada um tem suaopinio prpria e suas convices prprias. "Quem ele pensa que ?" - opovo pergunta silenciosamente, referindo-se ao pastor e pregador.

    O pblico alvo de nossos sermes ficou bem mais crtico e informado.O pregador no pode se dar ao luxo de ignorar esse fato.

    bem verdade tambm que no poucos pregadores tomaram-seconhecidos pela sua falta de respeito para com as sensibilidades de seusouvintes e anatemizavam todas as opinies e hbitos que os ouvintescultivavam. No poucos pregadores compeliam sua audincia a um mo-mento silencioso massacrante, transformando esse momento numa ver-dadeira hora de tormenta. O culto a Deus foi por no poucos transformado

    em martrio.O povo queria ouvir palavras de encorajamento, de conforto e de

    esperana. Queria ir e voltar com alegria, mas no raras vezes o volumedo tdio desafiou sua pacincia. Mas o que mais incomodava a alguns erao exerccio imprprio da autoridade, e segundo um observador, especial-mente quando o pregador era jovem. Um observador referiu-se a esses

    jovens pregadores como aqueles que "so um pouco mais do que meni-nos", e que assumem uma atitude que arrogante diante das cabeassubmissas da massa.

    O esprito anti-autoridade alcanou o calor mximo e explodiu nadcada de 60. Charlie Watts do grupo musical Rolling Stones expressouessa atitude perfeitamente quando disse: "Eu sou contra toda forma depensamento organizado. Eu sou contra... religio organizada com a igreja.Eu no vejo como voc pode organizar 10 milhes de mentes para acreditarnuma coisa".

    A dcada de 70 foi a dcada do no racional.

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    3.2. Uma resposta crist

    Nossa atitude diante desse quadro no pode ser o de abandonar atarefa de proclamar o Evangelho e nem o oposto, de um grande dogma-tismo que quando nossas crenas e afirmaes so desafiadas, ns

    simplesmente os repetimos em voz mais alta. (Quando o argumento fraco, grite).

    possvel em vez de tomar atitudes extremadas, manter fidelidade f crist e ao mesmo tempo reconhecer e respeitar o moderno esprito dedvida e negao.

    3.3. A Revoluo Ciberntica

    Ciberntica o estudo dos mecanismos de comunicao, tanto huma-nos como eletrnicos, isto , tanto nos crebros como nos computadores.A revoluo ciberntica refere-se a mudanas radicais na comunicaocomo um resultado do desenvolvimento de equipamento eletrnico com-plexo.

    O sumo-sacerdote da revoluo ciberntica foi o notvel canadenseProfessor Marshall McLuhan. So dele as expresses: aldeia global, o meio a mensagem, comunicao quente e fria.

    McLuhan fez um fantstico resumo da histria da comunicao. Lem-brou que o homem primitivo fazia uso harmonioso de seus cinco sentidos,simultaneamente. Conforme esse gnio da comunicao, essa situaoideal foi modificada por duas invenes. A primeira foi o alfabeto fonticoe a segunda foi a inveno dos tipos mveis no sculo XV por JohannGutenberg. A tipografia, segundo McLuhan, terminou com o tribalismo,quebrou a unidade coletiva da sociedade primitiva. Isolou o ser humano eo transformou num individualista e especialista. Agora ele pode sentar numcanto sozinho, com suas costas para o mundo, lendo um livro. (Aplicao:fazermos teologia de costas para a realidade que nos envolve e desafia).Esse homem perdeu a mgica do aprendizado multi-sensitivo.

    Mas em 1844 uma terceira inveno (telgrafo - Samuel Morse)anunciou o incio da "nova era", a saber, a era eletrnica. Se o alfabeto ea imprensa alienaram os seres humanos um do outro, a tendncia dosmeios eltricos criar uma espcie de interdependncia entre todas asinstituies da sociedade. um processo de "retribalizao". A simultanei-dade da comunicao nos faz participantes presentes e acessveis aqualquer pessoa do mundo.

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    Palavra falada meio frio, isto e, envolve todos os sentidos. Contatointerpessoal fundamental para comunicao: ouvir, ver, tocar, cheirar.Falar um dom humano inconfundvel, um meio verstil de comunicao.

    Um captulo do livro de Christopher Evans The Mighty Micro (1979),

    tem como ttulo:A morte da Palavra Impresa. So de fato os computadoressuperiores aos livros?

    De qualquer forma deveramos dar as boas vindas aos chips quetranscendem ao poder da mente humana, assim como a mquina transcen-deu o poder do msculo humano. Mas preocupante o problema de umapossvel desumanizao, a comunho da igreja local ser extremamenteimportante. Da encontrar-se com uma pessoa, falar e ouvir um ao outrocomo pessoa em vez de olhar para uma tela ser de suma importncia.

    3.4. A Influncia da Televiso

    A rivalidade entre a caixa de TV e o plpito para ser inegvel. NaInglaterra a TV est ligada em mdia de 30 a 35 horas por semana. Umadulto v entre 16 a 18 horas por semana, o que significa que ele fica 8anos de sua vida diante da tela de TV. A

    mdia de horas diante da TV para adultos nos USA de 23,3 horas.As crianas so as mais influenciadas e marcadas, e as mais vulnerveis.So as mais dependentes de TV. A mdia das crianas a maior. Nos Usa

    as crianas da pr-escola constituem a maior audincia da TV. Sua mdiasemanal de 30,4 horas. Aos 17 anos, a mdia das crianas americanastm assistido 15.000 horas de TV, o equivalente a quase dois anos de vida.

    extremamente difcil fazer uma estimativa equilibrada dos efeitossociais da televiso. H benefcios e malefcios.

    Pregadores esto diante de uma gerao condicionada pela TV. Nopodemos mais assumir que as pessoas ou querem ouvir sermes ou queestejam de fato em condies de escutar, ouvir. No fcil conseguir

    ateno numa poca em que as pessoas esto acostumadas a usar ocontrole remoto para desligar. Tudo que desinteressante, lento oumontono no pode competir na era da imagem. A televiso desafia opregador a fazer a apresentao da verdade atraente, atravs davariedade, cor, ilustrao, humor e movimento fluente e rpido.

    O pastor algum envolvido no processo de ensino-aprendizado. Aoestudarmos o bsico dos modelos de comunicao vamos acabar tendoquatro ingredientes fundamentais: Fonte - quem; Mensagem - que;

    Cdigo/Canal - como; Receptor - a quem. Embora a pregao se encaixe

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    No momento em que chegamos ao fim do sculo XX estamos con-scientes de que a eroso da f no Ocidente est em marcha. O relativismotem sido aplicado doutrina e tica, e absolutos desapareceram. Darwinconvenceu a muitos de que a religio uma fase evolucionria, isto , quepassa; Marx, que um fenmeno sociolgico, e Freud, que uma neurose.

    A autoridade bblica foi para muitos minada pelo criticismo bblico. O estudocomparativo da religio tendeu a subestimar o cristianismo como uma dasmuitas religies entre muitas, e tem encorajado o crescimento do sincre-tismo. O existencialismo quebra nossas razes histricas, insistindo quenada importa, mas o encontro e a deciso do momento. Ainda existem asnegaes da teologia secular ou radical, negando essenciais da f. Algunspregadores chegam ao ponto de no meio desse caos repartir suas dvidascom suas congregaes.

    Outros afirmam que a presena crist no mundo no precisa sersomente uma presena de servio mas de silncio. Ou, se tem um papelativo, entendem isso de modo a dar mais importncia ao dilogo do que aproclamao. Transformam o meio em fim.

    Toda igreja parece estar numa situao de crise de identidade, na qualest insegura sobre si mesma e confusa sobre sua mensagem e misso.Michael Green, num dos seus livros escreve: "Durante os ltimos 45 anos...ns temos assistido uma crescente relutncia para aceitar o cristianismotradicional cheio de sangue, completo com uma Bblia inspirada e um Cristo

    encarnado, e uma crescente tendncia para acomodar o cristianismo aoesprito da poca".

    No h nenhuma chance de uma recuperao da pregao sem umaanterior recuperao da convico. Necessitamos ganhar de novo nossaconfiana na verdade, na relevncia e poder do Evangelho, e comear aficar entusiasmados sobre ele novamente. Afinal, o Evangelho ou no a boa nova de Deus? Gore Vidal tem razo ao dizer que os cristos estomortos?

    3.6. a recuperao da moral crist

    Paulo escreve em sua carta aos romanos que " devedor tanto agregos como a brbaros, tanto a sbios como a ignorantes; por isso, quantoest em mim, estou pronto par anunciar o evangelho tambm a vs outros,em Roma. Pois no me envergonho do evangelho, porque poder de Deuspara a salvao de todo aquele que cr, primeiro do judeu e tambm dogrego" (Rm 1.14-16). No momento a atitude da igreja no mundo para com

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    o evangelismo pode ser resumida em termos exatamente contrrios:nenhum entusiasmo, pouco sentido sentido de dever. Como isso poderiaser transformado num "sou devedor, estou pronto, no me envergonho?"

    Uma das coisas que deveriam acontecer que o povo de Deus tivesse

    um bom conhecimento de que crem.

    Em segundo lugar, precisamos reconhecer que perguntas reais eimportantes esto sendo feitas por telogos em nossos dias, que nopodem ser ignoradas.

    Em terceiro lugar, precisamos encorajar os estudiosos cristos a ir paraas fronteiras e se envolver no debate, e ao mesmo tempo manter suaparticipao ativa na comunidade de f. Isso no fcil, mas a solido de

    alguns eruditos cristos tambm no boa soluo. Isolamento umacondio no saudvel e perigosa.

    Em quarto lugar precisamos orar mais e de modo persistente por graado Esprito de verdade. Estudo, preparo e comunho so importantes parao crescimento na compreenso e certeza, mas ultimamente somente Deuspode nos convencer sobre Deus.

    Uma maioria de lderes cristos deveriam parar sua dana ao redordos bezerros de ouro da modernidade, e em vez de perguntar tanto sobre

    o que o homem moderno tem a dizer a Igreja, deveriam comear aperguntar o que a Igreja tem a dizer ao homem moderno. H uma fome porrespostas religiosas em meio s diferentes camadas da sociedade hu-mana. O processo de secularizao por ser dirigido numa direo tal queo vacuum deixado pela decepo do materialismo e tecnicismo sejapreenchido pelo Evangelho. A Igreja precisa assumir uma atitude deautoridade e reassumir sua proclamao de uma mensagem imutvel.

    Falamos de trs obstculos e desafios para o pregador de nossos dias.

    O esprito anti-autoridade faz com que as pessoas no queiram ouvir, adependncia da televiso que os torna incapazes e indolentes, e a atmos-fera contempornea de dvida que paralisa tanto o pregador como oouvinte.

    Qual a nossa reao como escola de teologia?

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    4. O CHAMADO AO ESTUDO

    Se queremos construir pontes para dentro do mundo real, e procurarrelacionar a Palavra de Deus com os principais temas da vida e asprincipais questes da vida, ento temos de levar a srio tanto o texto

    bblico (estudo) e o cenrio contemporneo. Retirar-se do mundo paradentro da Bblia escapismo ou fugir da Bblia para dentro do mundo conformismo, e isso ser fatal para nosso falar, nosso proclamar, nossapregao como tal. Qualquer um desses equvocos impossibilita a cons-truo de pontes, e a no-comunicao inevitvel. Ao contrrio, nstemos a responsabilidade de explorar os territrios nos dois lados, parapodermos discernir as conexes entre os dois lados e estar e condiesde falar a Palavra divina para a situao humana com um certo grau desensibilidade e preciso.

    Tal explorao significa estudo, e o melhor aluno, o melhor professore o melhor pastor ser aquele que permanece aluno durante toda a suavida. Sempre temos muito a aprender. Nunca estamos prontos. E quempra de aprender, em breve haver de parar de ensinar e pregar bem.Quem no mais planta no estudo no mais colher no plpito. A crise deplpito de nossa igreja seria falta de estudo, preparo na leitura do texto econtexto?

    H um frescor e vitalidade em cada sermo que brota do estudo srio.

    Sem estudo nossos olhos ficam embassiados, nosso flego enfraquecido."A vida do pregador precisa ser uma vida de grande acumulao", disseum bispo. Precisamos aprender a estudar por causa da verdade.

    Billy Graham disse que se tivesse que comear seu ministrio desdeo princpio, ele estudaria trs mais do que estudou. Assumiria menoscompromissos. "Eu preguei demais", disse ele, "e estudei de menos".

    relevante o que disseram os apstolos em Atos 6.4: "ns nosconsagraremos orao e ao ministrio da Palavra". Os apstolos tinhamconscincia da importncia do estudo da Palavra.

    Algum disse: "Se eu tivesse somente trs anos para servir ao Senhor,eu gastaria dois deles no estudo e preparo".

    O estudo das Escrituras uma das maiores responsabilidades quetemos, pois o pastor cristo basicamente chamado para o ministrio daPalavra.

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    Frequentemente nossa pregao soa remota, distante da realidadesocial em que vivemos, no tocada pelas suas agonias, imaculada em seusideais irrelevantes. A via vox evangelii precisa ser falada de corao acorao e de vida para vida. A estrada da pregao do quarto de estudoao plpito passa pela rua barulhenta, pelas casas e hospitais, fazendas e

    fbricas, nibus, metros, cinemas, salas de teatro, bancas de jornais.

    Um pregador em primeiro lugar um ser humano, "em casa" entreseres humanos, e depois um estudioso erudito, "em casa" numa biblioteca.Quem sabe no plpito precisa conhecer o mundo da vida real no presentee o mundo do passado acontece nos livros.

    O estudo do mundo moderno comea com pessoas. E a mais rpidamaneira de conseguir compreender um pouco mais o cenrio humano

    fechar nossa boca (coisa no muito fcil para pregadores compulsivos) eabrir nossos olhos e ouvidos.

    Como pastores precisamos fazer perguntas s pessoas e deix-lasfalar. Precisamos saber mais sobre a Bblia do que eles, mas elesprovavelmente sabem mais sobre o mundo real do que ns sabemos.

    Assim, deveramos encoraj-los a falar sobre seu lar e vida familiar, seutrabalho, seus medos, suas habilidades e seus hobbies. Ns tambmprecisamos penetrar alm do que fazem e chegar no que pensam.

    importante para ns ouvirmos os representantes das diferentesgeraes e ouvir as diferentes culturas, especialmente das geraes maisnovas. Um ouvir humilde indispensvel para a pregao relevante. Issotambm faz com que a pregao seja um empreendimento cooperativo,em que nosso conhecimento da Bblia e o conhecimento que os outros temdo mundo combina para construir pontes.

    indispensvel, alm do ouvir cuidadoso, que ns leiamos um jornaldirio, ou semanal, tenhamos algum contato com a TV, leiamos recensesdos principais livros seculares, para conhecer o contedo dos livros queformam a opinio da maioria, que mais influenciam o pensamento, vejamosalguns filmes (Ex.: Mudana de Hbito I e II), peas de teatro, pois nadaespelha mais a sociedade contempornea com fidelidade do que o palco,a tela e os livros.

    verdade que o desejo por popularidade nocivo, e muitos de ns dosculo XX so fariseus que amam "o louvor dos homens mais do que olouvor de Deus" (Jo 10.43).

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    H muitos espritos desse sculo que so maus, e como disse umpastor ingls, "se voc casa com o esprito de sua prpria gerao, vocser uma viva na prxima". um alerta para a no identificao cega comcerto momento histrico. No entanto isso no quer dizer que no podemosestudar as tendncias contemporneas. No podemos cooperar com o

    esprito da poca, muito menos casar com ela, mas antes precisamos teruma compreenso dessa poca com uma viso para confront-la com arelevante Palavra de Deus.

    Grupos de leitura e informaes

    Que tipo de estudo poder nos ajudar na compreenso de nossomundo moderno? Stott sugere a criao de grupos de leitura e de troca deinformaes sobre temas. a ideia de uma dzia de bacharis e pessoal

    profissional, mdicos, advogados, professores, arquitetos, etc, e se reunirmensalmente para um encontro de uma noite, repartindo nossas reaesa livros previamente indicados. Essas discusses depois nos levaram aver

    a resposta crist para isso. Ex - Jacques Ellul - Violncia e o Sentidoda Cidade. Estudo de ideologias rivais ao cristianismo, o Alcoro, tentandoentender o apelo contemporneo ao misticismo oriental, e outros ismos.Tambm outros autores, nas mais diferentes reas do conhecimento dascincias humanas, (lista de livros que so best-sellers) podem ser lidos.Tambm oportuno o dilogo sobre filmes famosos e seus temas relevan-

    tes no viver de nossos dias. Ex.: Guerra nas Estrelas, Contatos de TerceiroGrau. De quem a vida afinal (eutansia), Kraemer v. Kraemer, Mudanade Hbito.

    A experincia dos grupos de leitura e discusses, poder aumentarnossa compreenso do mundo moderno, mas mais do que isso, estimularnossa compaixo pelos seres humanos em seu estado de perdio edesespero, e confirmar nossa f e clarificar nosso sentido de missocrist. John Stott fez essa experincia e deu resultado em seu ministrio.

    Outro tipo de grupo com o qual o pastor pode se reunir o grupo deinformaes, para ter dados e subsdios sobre alguns temas sobre os quaisno dispe de muita informao. Ex.: trabalho e desemprego, relaesindustriais, a nova ordem econmica mundial.

    E muito bom estabelecer contatos com pessoas especializadas sobredeterminado assunto, e se possvel ouvir opinies diferentes e contrriassobre o mesmo tema. Ex: conselhos, informaes sobre trabalho e de-semprego: contatos com pessoas de fbricas, sindicatos, patres, pessoas

    desempregadas. Contatos diretos permitem ver o desemprego no como

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    um problema estatstico, mas como um problema pessoal, humano. Con-tato vivo, direto com desempregados ajuda a ter empatia com o que sentea dor, o choque, a rejeio, a ferida, a humilhao e o senso de impotncia,que so causados pelo desemprego. Pode haver cooperao entre leigose clero na elaborao de mensagens e sermes.

    No correta a viso de que os leigos levantam questes e nspastores respondemos. Ns tambm temos que fazer nossas perguntaspara eles responderem. Mas que quando pastores e leigos perguntamum para o outro, ns da perspectiva bblica e eles da perspectivacontempornea, podemos juntos discernir que respostas devem ser dadasse a Palavra para ser contextualizada no mundo.

    Nada melhor para restaurar a sade e vitalidade para a Igreja ou para

    conduzir seus membros para a maturidade em Cristo do que a recu-perao, ou restabelecimento da pregao autntica, bblica e contem-pornea, fiel a Deus e fiel ao compromisso com o ser humano.

    A tarefa da pregao hoje extremamente exigente, requer muitocuidado e ateno, na medida em que procuramos construir entre a Palavrae o mundo, entre a revelao divina e a experincia humana, e relacionarum ao outro com integridade e relevncia.

    CONCLUSO

    A melhor maneira para expressarmos a tenso que abordamos nesseestudo est no conhecido exemplo do pndulo. As palavras de Jesus"Vinde a mim!" seguidas de Seu "Ide por todo o mundo" so um pnduloem movimento.

    A afirmativa de Congar de que "a pregao de um Deus sem o mundo

    teve como resultado um mundo sem Deus" nos deve fazer refletir.Albert Einstein humildemente confessou uma vez que a cincia no

    sabe, e nunca poder saber, o que de fato a matria. Segundo essegrande cientista, a cincia somente poderia se preocupar com o como amatria se composta.

    claro que a cincia no responde todas as questes da vida. L.Wittgestein afirma que "mesmo quando tivermos possivelmente respon-dido todas as possveis questes cientficas, ns vamos perceber que

    nossos problemas vitais ainda no foram tocados".

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    por outro lado, a Igreja precisa fornecer ao mundo cientistas que vema realidade da vida humana ou os fenmenos do mundo com os olhos daf precisamos de cientistas e eruditos que operam com pressuposiescrists e testemunham ao mundo que ser cristo no significa um negar-sea usar a razo e a cincia. Relembramos que foi a tica do cristianismo

    que possibilitou o surgimento da cincia como a temos hoje em nossomundo ocidental.

    Alm de todo conhecimento cientfico, h muita coisa da vida humanaque vai alm de seu controle e conhecimento. A vida humana est envoltaem mistrio, e sem o mistrio maior ele no entra paz.

    A mensagem da Bblia no um mito, um produto humano para tentardar respostas, um objetivo e sentido a vida do ser humano, mas a

    revelao do grande mistrio - Cristo, que entrou no sculo, no mundo parasalv-lo. Cristo a secularizao de Deus. Deus est entre os homens nasruas, nas festas. A encarnao de Deus a verdadeira secularizao.Cristo revela os mistrios de Deus aos seres humanos. E todas as criaturasde todas as raas so convidadas a participar nesse amor misterioso.Cristo para todos nosso lema.

    Certamente todos ns sentimos que a atmosfera cultural de nossotempo est se tornando secular ou neutra, e isso criou um desafio novo esaudvel para a igreja crist. Sobreviver espiritualmente nessas "novas

    guas" no to fcil. necessrio saber pessoalmente como "nadar". Af precisa ter razes profundas e ser pessoal nesse contexto.

    Helmuth Thielicke comenta que a igreja, por ter sua tarefa no (mundo)saeculum, o saeculum tambm tem algo a dizer aos mensageiros de Deus.Pode ser o que eles tem a dizer um protesto, mas quem ouve esseprotesto corretamente aprende a compreender-se a si mesmo e seu modode ser melhor, e com isso capacitado a ser testemunha com novo poder.

    Definitivamente terminou a iluso de uma igreja crist em casa nessacultura "crist contempornea". A igreja crist tem que reconhecer de que uma minoria que no est "em casa" na cultura humana e por outro ladono tem outro lugar do que a cultura humana para desenvolver seutrabalho, sua misso, sua tarefa, e viver sua f. Cristos so cidados dedois mundos, e sua tarefa justamente nesse mundo que os rejeita, indiferente e hostil. sua misso ser sal, luz e fermento em meio as vidasdas criaturas humanas secularizados desses novo tempos.

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    O cristo a nica pessoa que pode dedicar, com a motivao correia,todo seu trabalho para o bem-estar dos outros, pois na f ele recebeu muito.O cristo pode dar porque ele recebeu. Ele pode ser o humanista porexcelncia. Sua motivao no egosta mas divina, porque Deus habitanele. Sua vida tem um objetivo, alvo, sentido e esperana real. Essa f

    somente se realiza, concretiza quando ela encontra expresso concreta nomeio desta vida terrena. tarefa dos cristos nesse mundo: humanizar acincia, a tcnica, que deixada a si mesmas, levam destruio.

    A igreja crist tambm o veculo, o canal de Deus para questionar eresponder ao ser humano secular em seus dilemas expressos nos produtosculturais, como arte e filosofia. Ela a comunidade de testemunho queproclama o Kerygma de Deus e a comunidade do amor que brota do Deusque amor.

    O indivduo cristo - seu amor, sua mensagem - esse o fator crucialno ataque da igreja sobre o mundo. E nessa misso a congregaodesempenha papel muito importante.

    Nada mais relevante para a necessidade humana do que a verdadefalada em amor. E para realizar essa misso a igreja precisa frequente-mente desobstruir o caminho tirando os obstculos das incompreensveis,falsa interpretao, preconceitos, caricaturizaes, para depois poder pro-clamar a mensagem libertadora. Como nos primeiros tempos, os cristos

    precisam "sempre estar preparados para responder a todo aquele que lhepedir razo de sua esperana". (1 Pe 3.15)

    Como cristos individualmente e como um grupo em comunho, nstemos que falar, confessar, testemunhar, viver e ensinar a verdade escri-turstica, e como tal s vezes rejeitar, discordar, refutar e condenar aquelesensinamentos, doutrinas, ideologias e pressuposies que so contrrias Palavra de Deus. Tambm temos que nos opor ao dogmatismo expressopor alguns humanistas seculares ou ateus. Precisamos estar firmes eseguros ao afirmarmos claramente nossas convices, interpretaes,pressuposies e "vises de mundo". No podemos perder nossa identi-dade nessa nossa cultura pluralista, relativista e secular.

    O profeta Micaas modelo e referencial para ns hoje. Falemos o queDeus nos falou em amor.

    Cada poca, porm, em ltima anlise, uma poca de incredulidade. verdade que acontecem intensificaes de dificuldades e novas formasde descrenas, mas ultimamente cada gerao est ofendida com o prprioEvangelho em si. Assim, onde a verdadeira igreja est presente, ali sempre

    h escndalo simplesmente porque os homens esto com medo da ver-

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    Elementos de comunicao

    no aconselhamento pastoral

    Dieter J. Jagnow

    Este estudo1 pretende explorar o processo de aconselhamento pas-toral como um processo de comunicao interpessoal baseado em trspressuposies. Primeiro, que princpios de comunicao esto neces-

    sariamente presentes no aconselhamento pastoral e determinam suanatureza como um processo comunicativo.2 Como resultado, aqui en-tendido que o aconselhamento pastoral lucra quando se submete aprincpios que governam uma comunicao interpessoal eficaz. No quea comunicao seja o objetivo final em aconselhamento, mas sim um meiopara se alcanar outros objetivos, basicamente a eficcia do pastor noprocesso de aconselhamento.

    A segunda pressuposio que o conselheiro pastoral um comuni-cador. Tambm nesta rea do ministrio ele mensageiro e canal de Deus.

    O pastor no pode ser mensageiro de Deus sem ser um comunicador. Serum comunicador no uma atividade ministerial no sentido de que foideterminada por Deus. Contudo, o ministrio possui uma faceta comuni-cativa que intrnseca natureza do processo. Como o pastor no podeNO comunicar, seu ministrio necessariamente caracterizado e reali-zado atravs de contnuos atos de comunicao.

    A terceira pressuposio que a comunicao do pastor pode sereficaz ou ineficaz, e que os resultados positivos ou negativos so neces-sariamente sentidos no processo de aconselhamento. Existe uma re-

    lao direta entre comunicao eficaz e aconselhamento eficaz.

    O Rev. Dieter J. Jagnow atualmente atua como pastor na Parquia Evanglica

    Luterana de Giru, RS, filiada IELB. Este artigo uma sntese da dissertao de

    Mestrado (Master of Sacred Theology - STM), rea Teologia Prtica, defendida

    pelo Rev. Dieter perante a Faculdade de Teologia do Concrdia Seminary, Saint

    Louis, USA, em outubro de 1992.

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    Em suma, este artigo pretende mostrar que o aconselhamento pastoral um processo de comunicao, que este processo pode ser mais oumenos eficaz devido a certas barreiras, e que existem maneiras do pastorampliar sua capacidade comunicativa e, consequentemente, sua eficciano aconselhamento.3

    O Aconselhamento Pastoral comoum Relacionamento Comunicativo

    Um sentido bsico de "comunicao" tornar alguma coisa comum"com algum. Este sentido, de um lado, tem um aspecto de "passar adianteuma informao"; de outro lado, possui aspectos naturalmente conectados:interao, dilogo, relacionamento, intercmbio. Estes aspectos revelamque comunicao no um evento do tipo causa e efeito, de uma sdireo, ou uma entidade esttica fixada no tempo e no espao.4 Aocontrrio, um processo espiral. Comunicao, no sentido mais puro dotermo, no pode existir sem este intercmbio. H. J. C. Pieterse afirma que"sem fazer parte da vida e do mundo dos participantes do processo nopode existir comunicao".5

    Quando o pastor e o aconselhando iniciam um processo de aconse-lhamento, eles entram em comunicao e comeam a trocar mensagense significados. Este processo de troca determina o surgimento de umrelacionamento. Desta forma, o processo de comunicao entre ambos um vnculo para a criao de um relacionamento. Como afiirna Ferder,comunicao quem basicamente sustenta relacionamentos.6

    O aconselhamento pastoral fundamentalmente uma interao inter-pessoal, um relacionar-se entre o pastor e o aconselhando.7 Este re-lacionamento a fora emocional e espiritual que entra em operao porcausa do comportamento comunicativo de ambos. Durante todo o processode aconselhamento existe um intercmbio de sentimentos, emoes eideias, o que se traduz numa significativa comunicao verbal e no-verbal.

    Uma comunicao no-relacional no aconselhamento pastoral seriano apenas impessoal mas tambm contra a natureza da comunho crist.

    A bem da verdade, sem um relacionamento que oferece uma gama deelementos construtivos pode existir pouco ou nenhum sucesso no acon-selhamento. Por isso, em qualquer tipo de comunicao interativa oprocesso est intimamente atado ao relacionamento entre o pastor e oaconselhando.8

    Cada relacionamento em aconselhamento pastoral criado para al-gum propsito funcional. Uma funo satisfazer necessidades interpes-soais de amor, senso de pertencer, segurana, e auto-estima. Uma outrafuno a criao de um ambiente para "auto-aprendizado". Por exemplo,

    em seu relacionamento com o pastor o aconselhando pode aprender a

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    Dialogo, em aconselhamento pastoral, nao e uma mera conversasimptica ou social. Dilogo uma conversa intencional, estudada, dirigida.Conselheiro e aconselhando so "um" lidando com o problema que pre-ocupa a ambos. Cada um faz sua prpria contribuio no empreendimento. um esforo e processo cooperativo. De um lado, o aconselhando

    aquele que melhor conhece sobre o seu problema e est subjetivamenteenvolvido nele. De outro lado, o pastor participa como algum que possuialgum nvel de habilidade, experincia e treinamento. Seu envolvimento noproblema objetivo, permitindo-lhe que veja e diga o que o aconselhandono pode ver e dizer. No dilogo, o pastor escuta atentamente, introduzinformao til, faz perguntas pertinentes, estimula o pensamento doaconselhando, e usa todo recurso disponvel a fim de assisti-lo em suacaminhada para chegar a uma melhor compreenso de seu problema esuas possveis solues. Em outras palavras, a funo dialgica do

    pastor ser um facilitador do processo, e no a fonte de todas as soluese respostas.

    De outro lado, o dilogo no pode ser um meio que o pastor utiliza parapersuadir o aconselhando a aceitar suas ideias, conceitos e solues.Persuaso algo que pertence esfera do Esprito Santo. A tarefa dopastor fazer todo o esforo para ver o processo de dilogo como umimportante caminho para que se chegue a um consenso com o "ponto devista" de Deus. Underwood comenta que o objetivo final do dilogo pastoral ajudar o aconselhando a ver a sua vida de acordo com a luz de Deus.

    O dilogo o melhor canal de transmisso de informao e significadono aconselhamento pastoral. Por exemplo, quando o pastor realiza umdiagnstico do problema do aconselhando, ele precisa de informao, porexemplo, sobre as origens, ramificaes e consequncias do problema.

    Bem conduzido, o dilogo sempre promove o processo de aconse-lhamento de alguma maneira, tanto provando a sua natureza comunicativa,como enriquecendo o relacionamento entre o pastor e o aconselhando,desenvolvendo maneiras para se chegara respostas e solues.

    Aconselhamento Pastoral como Proclamao ComunicativaComo j foi visto, um dos sentidos de comunicao compartilhar,

    tomar alguma coisa comum com algum, passar adiante uma mensagem.No aconselhamento pastoral este aspecto tambm est claramente pre-sente atravs da comunicao ou proclamao da Palavra de Deus ou doEvangelho.

    a proclamao da Palavra de Deus que fundamentalmente esta-belece a distino bsica entre aconselhamento pastoral e aconse-lhamento secular. Enquanto o conceito de fora divina atravs da Palavra

    usualmente est fora deste, ele define e marca a singularidade daquele.

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    No aconselhamento pastoral, o feedback providencia pistas e suprecom informaes sobre o efeito do processo de comunicao entre o pastore o aconselhando. Por exemplo, o propsito pode ser de testar a compreen-so do aconselhando acerca da mensagem que recebeu do pastor. Emcaso de resposta positiva, o pastor sabe que no apenas est comuni-

    cando, mas comunicando de uma maneira que aceita pelo aconselhando.De outro lado, se o aconselhando envia como retorno sinais que no estentendendo a mensagem, ele na verdade est enviando uma advertncia:corrija ou melhore a sua comunicao. Por causa do ambiente interpessoaldo aconselhamento , o pastor e o aconselhando tm a oportunidade nicade fazer e refazer suas mensagens at que o sentido se torne o mais claropossvel, ou at que haja uma comunicao satisfatria.17 Assim, de umpropsito informativo, o feedback tem um objetivo informativo.

    Dada a importncia do feedback no aconselhamento, o pastor precisaestar consciente de que, a fim de captar as pistas enviadas pelo aconse-lhando, ele precisa estar totalmente envolvido no processo de comuni-cao. Ateno e concentrao so fundamentais. A perda de pistasimportantes pode reduzir a eficcia do pastor como comunicador e, espe-cialmente, como conselheiro.

    Ouvir

    Ouvir uma parte indispensvel como processo de comunicaointerpessoal. Chartier sugere que "ouvir provavelmente a mais importante

    atividade de comunicao".18

    Os seres humanos gastam mais temporecebendo mensagens do que produzindo. Quando a arte de ouvir perdida, a arte da comunicao tambm se perde.

    No treinamento do pastor existe uma grande nfase em falar - pregar,ensinar-, e no em ouvir. A atividade ministerial de fato requer muito enviode mensagens. Por esta razo, ouvir normalmente uma atividade difcilpara o pastor.

    Ouvir um ingrediente fundamental para uma comunicao eficaz noaconselhamento porque a principal maneira do pastor receber infor-mao sobre o aconselhando e seu problema. Quando o pastor estescutando ele tambm est aprendendo.

    Uma outra razo para o ouvir mostrar ao aconselhando que opastor est realmente interessado nele e em seu problema. Esta atitudeajuda o aconselhando a se sentir compreendido, a expressar-se maislivremente, a criar coragem para falar sobre o seu problema.

    Ouvir, no aconselhamento pastoral, muito mais do que o processofsico de escutar. Ouvir o "processo emocional no qual uma pessoa

    integra habilidades fsicas, emocionais e intelectuais numa busca ativa e

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    8Veja Charles H. Kraft, Communicatng the Gospel God's Way (Pasadena, CA. Wlliam

    Carey Library, 1979, p.126). Veja tambm Wlliam F. Fore, Television and Culture: TheShaping of Faith,Values, and Culture (Minneapolis: Augsburg Publishing House, 1987), p.39.Fore tambm corretamente afirma que impossvel entender comunicao sem relaciona-mento. Isto seria como "tentar entender um ser humano atravs de uma autpsia, a vida estfaltando".

    9 Richard P. Vaughan,An Introduction to Religious Counseling: A Christian HumanisticApproch (Englewood Cliffs, NJ: Prentice-Hall, Inc., 1969), p.13.

    10Wlliam G. Hulme, Pastoral Care & Counseling: Using the Unique Resources of the

    Christian Tradition (Minneapolis: Augsburg Publishing House, 1981), p.92.11 Kenneth Erickson, The Power of Communication: For Richer Interpersonal Relation-

    ship (Saint Louis: Concrdia Publishing House, 1986), p.15.12

    Ralph L. Underwood, Empathy and Confrontation in Pastoral Care (Philadelphia:Fortress Press, 1985), p.42-43.

    13 Howard Stone, The Word of God and Pastoral Care (Nashville: Abingdom Press,1988), p. 123.

    14 Richard P. Vaughan, Basic Skills for Christian Counselors (New York: Paulist Press,1987), p.82-83. Ver tambm Marcus D. Bryant, The Art of Christian Care (Saint Louis: TheBethany Press, 1979), p. 31-34.

    15James D. Hamilton, The Ministry of Pastoral Counseling (Grand Rapids: Baker Book

    House, 1975), p.63.16

    Wlliam G. Hulme, Christian Caregiving: Insights from the Book of Job (Saint Louis:Concrdia Publishing House, 1992), p.103.

    17James Engel, Contemporary Christian Communication: Its Theory and Practice

    (Nashville: Thomas Nelson, 1979), p.41, diz: "A instantaneidade do feedback torna a comu-nicao interpessoal altamente eficiente no sentido que tanto o emissor como o receptorpodem continuar tentando at que um contato eficaz feito".

    18Myron R. Chartier, Preaching as Communication: An Interpersonal Perspective

    (Nashville: Abingdon, 1981), p.48.19

    Chartier, Preaching as Communication: An Interpersonal Perspective, p.5120

    James D. Hamilton, The Ministry of Pastoral Counseling (Grand Rapids: Baker BookHouse, 1975), p.129.

    21 Maiores detalhes podem ser obtidos em, por exemplo, Chartier, Preaching as

    Communication: An Interpersonal Perspective, p.55-59; Joseph A. DeVito, The Elements ofPublic Speaking (New York: Harper & Row, Publishers, 1981), p.31-34; Carl. H. Weaver,Human Listening: Process and Behavior(Indianapolis: The Bobbs-Merrill Company, Inc.,1972), p. 82-106. 22

    22Charles H. Kraft, Communication Theory for Christian Wittoness (Nashville: Abingdon

    Press, 1983, p.209.

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    Por causa dos debates recentes, j no se pode recomendar algumasdoses de gramtica a um pregador sem esclarecer que evidentemente possvel comunicar-se mesmo que no se haja lido nenhuma gramtica.Basta dizer as coisas de maneira tal que o interlocutor nos entenda. Nossoscomentrios visam a esclarecer que o orador sacro precisa da gramtica

    porque no deve limitar-se a comunicar de qualquer maneira, com todasas falhas da classe inculta e todos os incultismos da classe culta. Tambmlinguisticamente o orador sacro deve ser asseado.

    Questo de ordem moral

    O bispo responsvel no s pelo que quis dizer, mas ainda pelo quedisse. No o escusam aqui as boas intenes, nem as melhores. Epreocupar-se ou no com a possibilidade de pensar uma coisa e dizer outra questo de ordem moral. No exagerou quem disse que a inteireza doesprito comea por se caracterizar no escrpulo da linguagem. Nem s ouso de palavras obscenas acusa desintegridade moral. Assinala-a tambmo desmazelo que veste o pensamento com trapos de farroupilha, e, maisainda, o desinteresse por linguagem clara, precisa. Se dizemos com razoque profissionalmente desonesto o sapateiro que deixa de consertar osapato a capricho, com quanta mais razo chamaremos desonesto a quemno se apura quando no exerccio de funes cujas responsabilidadesultrapassam infinitamente a chinela do sapateiro.

    A ausncia do escrpulo de evitar o termo que atraioa o pensamento coisa muito sria em ofcio que," com mudar um ponto, ou uma vrgula,da heresia pode fazer f: e da f pode fazer heresia", como diz Vieira.Citemos, para ilustrar a afirmao, um caso em que a deglutio indevidada vrgula faz da f heresia" no cntico da milcia celeste. (Claro que o valorbblico da ilustrao apenas a do valor da traduo portuguesa do Gloriain excelsis que usamos aqui.) Em Lucas 2.14:" Glria a Deus nas maioresalturas, e paz na terra entre os homens, a quem ele quer bem." Qualquercurso mal aproveitado de portugus capacita a entender que a doutrina dagraa universal pede vrgula depois da palavra "homens". Comer estavrgula ortodoxa transformar a orao que lhe segue de explicativa em

    restritiva. Vrgula, orao explicativa, afirmao da graa universal;omisso da vrgula, orao restritiva, negao da graa universal.

    Repetimo-nos: a questo de ordem moral. S a mais acabadadesconscincia pode deixar de preocupar-se com ela, consider-laquesto de lana caprina e ridicularizar os que lhe emprestam importncia.Externar ideias boas em linguagem obscura leviandade;externar ideiasms em linguagem clara crime.E sabemos que a grande distncia entrea leviandade contnua, no combatida, e o crime, perigosa iluso. Uma convizinha da outra.

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    Tambm visava estimular a reflexo retrospectiva, recordando o tempoquando eram escravos no Egito e no podiam usar seu tempo para seubenefcio, mas em benefcio de um povo que os oprimia e escravizara.

    O descanso visava estimular o povo eleito a reconhecer sua relao

    nica com Jav, e a querer ser um exemplo como povo de nico Deusverdadeiro: infelizmente no foram o modelo desejado.

    "Guarda o dia do sbado, para o santificar". Deus mesmo separado,reserva um dia para ter comunho especial com Seu povo. A observnciadesse dia foi rigorosa nos seus mnimos detalhes.

    Hoje no temos a necessidade de guardar esse dia especfico, a saber,o sbado. No temos uma proibio especial referente a qualquerdia comona antiga aliana, mas o princpio do mandamento continua de p. Deusquer comunicao com os Seus.

    Lutero resumiu esse ensinamento em suas palavras registradas noCatecismo, quando disse:" devemos temer e amar a Deus e no desprezara pregao e Sua Palavra, mas consider-la santa, gostar de ouvir eaprend-la."

    IV - Reflexo Homiltica

    Os Dez Mandamentos eram e continuam sendo uma expresso resu-mida da santa vontade de Deus como tambm orientaes prticas paraum viver bem na sociedade. E Deus queria e quer que os seus vivam bem.(Dt 10.13), tanto espiritual como emocionalmente.

    A inteno, o propsito de Deus com o descanso sbio e salutar.Uma pausa na luta semanal e uma oportunidade para refletir sobre osentido e a qualidade da vida so de proveito para qualquer ser humano,especialmente nesses tempos modernos com a realidade social cada vezmais complexa e esse novo mundo tecnolgico criando novas e impre-visveis dificuldades a cada dia.

    Para o cristo a observncia do "sbado" ou dia de descanso no algo que ele tem que que fazer mas antes uma atividade que ele quer e

    busca experimentar, pois seu encontro com o Pai e com Sua Palavra querefrigera a alma. O momento do culto e da comunho crista dominical umtempo especial para refletir sobre sua relao com Deus. tempo deidentificar e pensar sobre suas inadequabilidades (confisso) e receber aPalavra do perdo (absolvio). tempo de louvar, agradecer, relembraros grandes feitos de Deus por ns e sermos convidados a trazermosnossas ofertas de gratido, e toda nossa vida como resposta viva eagradvel a Ele que se doou por ns por amor.

    IGREJA LUTERANA -NMERO-1-1994 67

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    Trabalho e descanso, no entanto, formam um todo. No podem seseparados. Tudo que dito sobre o dia de descanso no dito em funjJdo culto e tempo, mas dito em funo dos dias de trabalho. Isso quedizer que o dia do descanso da atividade profissional existe para q^acontea um abastecimento na palavra que por sua vez haver de molda-de maneira natural e espontnea todos os demais dias da semana, gdescansar no "Svhabat" - (sbado na antiga aliana e em qualquer dia oydomingo na nova aliana) est em funo de todo viver. Sem esse objetivoem foco, existe o perigo de transformar o dia do descanso numa meraobservncia de um ritual dominical (ou em outro dia), pensando ter sa%feito a expectativa de Deus com respeito a esse mandamento.

    Tanto Israel como ns hoje precisamos ser exortados sempre de novosobre o perigo desse dia ser secularizado ou esvaziado. O prprio Deusest interessado nesse encontro com sua criatura. Ele quer que nesse dijo povo reunido sob Seu nome celebre com alegria a Vida que Ele nosoferece em Cristo. Alis, o mesmo Deus que ordenou ao homem o trabalhe o que lhe ordena e convida para o descanso, para o lazer e para ameditao.

    O iro culto no ser para o filho de Deus um "sentar-se na igreja comise fosse um cinema e aguardar o espetculo", mas um participar naadorao dirigida ao Senhor do universo. Nesse tomar