Templos modernos: estudo das igrejas projetadas por Dominikus e Gottfried Böhn em SC

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O estudo aqui apresentado coloca em discussão a obra religiosa dos arquitetos ale¬mães Dominikus Böhm (1880-1955) e Gottfried Böhm (1920) - pai e filho, respectivamente - realizada em Santa Catarina. Os arquitetos projetaram cinco templos religiosos no Estado, três dos quais foram construídos. Apesar da importância da análise conjunta dos projetos para a compreensão da evolução tipológica e de adaptação ao entorno físico e cultural, este estudo traz como foco as Igrejas São Paulo Apóstolo (1953-1958), em Blumenau, e São Luiz Gonzaga (1955-1962), em Brusque. O interesse nos edifícios reside em sua qualidade arquitetônica e importância dentro do contexto urbano, no qual se inserem como importan-tes monumentos. A relevância também recai sobre seus autores, que apesar da vasta e brilhante obra produzida, especialmente na Europa, e com ênfase na arquitetura religiosa, são pouco reconhecidos no Brasil. Arquiteto e professor, Dominikus Böhm soma cerca de cinquenta e cinco projetos de cunho r

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2013 - Grupo PETArquitetura e Urbanismo

Universidade Federal de Santa Catarina

Roselane NeckelReitora

Jamil Assreuy FilhoPró-Reitor de Pesquisa e Extensão

Edison da RosaDiretor do Centro Tecnológico

Fernando Westphal Chefe do Departamento de Arquitetura e Urbanismo

Milton Luz da ConceiçãoCoordenador do Curso de Arquitetura e Urbanismo

Grupo PET Arquitetura e Urbanismo

Vera Helena Moro Bins Ely, Dr. Eng.Tutora

Karine DaufenbachOrientadora

Flávia Martini RamosLeodi Antonio Covatti

Bolsistas

1. INTRODUÇÃO....................................................................................................................................................................................................23 1.1. Apresentação..........................................................................................................................................................................................................................................................23 1.2. Objetivos.........................................................................................................................................................................................................................................................................24 1.3. Metodologia............................................................................................................................................................................................................................................................25

2. OS ARQUITETOS: Obras e relações com acontecimentos e correntes estilísticas................................................29 2.1. Dominikus Böhm..................................................................................................................................................................................................................................................29 2.2. Gottfried Böhm...................................................................................................................................................................................................................................................35

3. AS OBRAS NO BRASIL.........................................................................................................................................................................43 3.1. Igreja Matriz São Paulo Apóstolo - Blumenau (SC)..................................................................................................................................43 3.1.1. Apresentação.............................................................................................................................................................................................................................43 3.1.2. A Nova Matriz.......................................................................................................................................................................................................................44 3.1.3. Considerações Gerais................................................................................................................................................................................................48 3.1.4. Detalhes do Projeto..........................................................................................................................................................................................................50 3.1.5. Breve Histórico da Comunidade Católica de Blumenau.......................................................................................58 3.1.6. A Evolução Tipológica da Matriz São Paulo Apóstolo.............................................................................................59 3.1.8. Projeto x Execução................................................................................................................................................................................................................61 3.1.9. Repercussão: A Influência da Igreja São Paulo Apóstolo na construção de templos em Santa Catarina.............................................................................................................................................................................................................62

3.2. Igreja Matriz São Luiz Gonzaga - Brusque (SC)...........................................................................................................................................64 3.2.1. Apresentação.............................................................................................................................................................................................................................64 3.2.2. Histórico...............................................................................................................................................................................................................................................64 3.2.3. A Nova Matriz........................................................................................................................................................................................................................67 3.2.3.1. O Projeto..................................................................................................................................................................................................................72

SUMÁRIOReferência:

RAMOS, Flávia Martini, COVATTI, Leodi Antonio, DAUFENBACH, Karine. Templos Modernos: Estu-do das Igrejas Projetadas por Dominikus e Gottfried Böhm em SC. Florianópolis: PET/ARQ/UFSC, 2013. 151 p.

Catalogação na fonte pela Biblioteca Universitária da Universidade Federal de Santa Catarina

Catalogação na fonte pela Biblioteca Universitária da Universidade Federal de Santa Catarina

R175 t Ramos, Flávia Martini

Templos modernos: estudo das igrejas projetadas por Dominikus e Gottfried Böhm em Santa Catarina / Flávia Martini Ramos, Leodi Antonio Covatti , Karine Daufenbach . - Florianópolis : PET/ARQ/UFSC , 2013.

15 1 p. : il. , plantas. Inclui bibliogra�a.

1. Arquitetura religiosa . I. Covatti, Leodi

Antonio . II. Daufenbach, Karine. III . Título. CDU: 72

T284 Templos modernos: estudo das igrejas projetadas por Dominikus e Gottfried Böhm em Santa Catarina / Flávia Martini Ramos et al. - F lorianó polis : PET/ARQ/UFSC, 2013 151 p. : il., pla ntas.

Inclui bibliogra�a.

1. Arquitetura religiosa. I. Ramos, Flávia Martini.

CDU: 72

6

3.3. A Contribuição de Dominikus Böhm..................................................................................................................................................................................75 3.4. Referências identificadas nas obras brasileiras de Dominikus Böhm............................................................................80 3.5. A Reforma na Liturgia e seu Reflexo na Arquitetura dos Templos.........................................................................................81 3.5.1. Obras Paradigmáticas .............................................................................................................................................................................................83

3.5.2. O Reflexo da Reforma Litúrgica no Brasil ...................................................................................................................................86

4. CONTEXTO..............................................................................................................................................................................................................93 4.1. Movimento Moderno...............................................................................................................................................................................................................................93 4.1.1. Movimento Moderno e a construção de templos - Uma breve leitura sobre as possíveis relações com as obras de Dominikus e Gottfried Böhm.....................................................93 4.2. A influência da obra perretiana em Dominikus e Gottfried Böhm...............................................................................101 4.3. Expressionismo..................................................................................................................................................................................................................................................107 4.3.1. Relação entre o Expressionismo e a Obra de Dominikus e Gottfried Böhm....................113 4.4. Brutalismo....................................................................................................................................................................................................................................................................116 4.4.1. Le Corbusier e o Brutalismo....................................................................................................................................................................................120

4.4.2. A Questão da Paisagem................................................................................................................................................................................................121

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................................................................................127

6. APÊNDICES...........................................................................................................................................................................................................129 6.1. A Igreja de Presidente Getúlio................................................................................................................................................................................................131 6.2. Artigo Publicado no II DOCOMOMO Paraná.........................................................................................................................................139

6.3. Resumo Enviado para o X DOCOMOMO Brasil..................................................................................................................................145

7. REFERÊNCIAS....................................................................................................................................................................................................147

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CAPÍTULO 2 Imagem 1 - Fonte: PEHNT, Wolfgang. La Arquitetura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A., 1975.

Imagem 2 - Fonte: PEHNT, Wolfgang. La Arquitetura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A., 1975.

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CAPÍTULO 3Imagem 1 - Fonte: Arquivo dos Autores.

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Imagem 18 - Fonte: Arquivo dos Autores.

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tolo em Blumenau. Relatório Final da Pesquisa. Florianópolis: UFSC, 2012.

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Acesso em março de 2013).

Imagem 59 - Fonte: http://www.archdaily.com/232766/ad-classics-holy-cross-church-in-chur-switzerland-

-walter-forderer/exterior-30/ (Último Acesso em março de 2013).

Imagem 60 - Fonte: http://archikey.com/building/read/2763/Villa-Savoye/552/ (Último Acesso em março de

2013).

Imagem 61 - Fonte: http://www.panoramio.com/photo/8036103 (Último Acesso em março de 2013).

Imagem 62 - Fonte: http://www.building.co.uk/analysis/le-corbusier%E2%80%99s-fling-with-brick/3046523.

article (Último Acesso em março de 2013).

Imagem 63 - Fonte: http://sigalonenvironment.soup.io/since/74149713?mode=own (Último Acesso em

março de 2013).

Imagem 64 - Fonte: http://www.flickr.com/photos/seier/3228430647/ (Último Acesso em maio de 2013).

Imagem 65 - Fonte: DAUFENBACH, Karine. A Modernidade em Hans Broos. São Paulo: 2011. p. 205.

Imagem 66 - Fonte: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/cultura/conpresp/noticias/?p=5907 (Último Acesso em março de 2013).

CAPÍTULO 5Imagem 1 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 2 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 3 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 4 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 5 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 6 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 7 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 8 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 9 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 10 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 11 - Fonte: Arquivo dos Autores.

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Imagem 12 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 13 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 14 - Fonte: Arquivo dos Autores.

Imagem 15 - Fonte: Arquivo dos Autores.

1. INTRODUÇÃO

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1.1. Apresentação

O estudo aqui apresentado coloca em discussão a obra religiosa dos arquitetos ale-mães Dominikus Böhm (1880-1955) e Gottfried Böhm (1920) - pai e filho, respectivamente - realizada em Santa Catarina. Os arquitetos projetaram cinco templos religiosos no Estado, três dos quais foram construídos. Apesar da importância da análise conjunta dos projetos para a compreensão da evolução tipológica e de adaptação ao entorno físico e cultural, este estudo traz como foco as Igrejas São Paulo Apóstolo (1953-1958), em Blumenau, e São Luiz Gonzaga (1955-1962), em Brusque. O interesse nos edifícios reside em sua qualidade arquitetônica e importância dentro do contexto urbano, no qual se inserem como importan-tes monumentos. A relevância também recai sobre seus autores, que apesar da vasta e brilhante obra produzida, especialmente na Europa, e com ênfase na arquitetura religiosa, são pouco reconhecidos no Brasil. Arquiteto e professor, Dominikus Böhm soma cerca de cinquenta e cinco projetos de cunho religioso, muitos dos quais se tornaram referências para arquitetos de sua geração. Sua obra se destaca especialmente nos anos 1920 e 1930, quando tem lugar as maiores ousadias e experimentações a que se permitiu, flertando com elementos do gótico, do românico e do expressionismo alemão. O mesmo pode ser dito a respeito da obra de Got-tfried, que assim como o pai, pode ser considerado um outsider em relação à arquitetura de seu tempo. Em muitos trabalhos, a exemplo de Dominikus, mistura o espaço moderno e a busca pelo místico, através da combinação de várias referências formais e, principalmente, da ênfase na relação entre luz e matéria e consequente dramatização do espaço. A pesquisa realizada investiga como se dá a adaptação da linguagem arquitetônica de pai e filho em um contexto bastante diverso, referenciando períodos históricos e corren-tes estilísticas que auxiliam na compreensão dos objetos de estudo.

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1.2. Objetivos

1.2.1. Objetivo Geral - Analisar e compreender as duas igrejas em questão, estudando o projeto em si, sua inserção no contexto urbano e social, aspectos formais, estruturais e tipológicos da arquitetura, acabamentos empregados nas obras, bem como a relação destas com ou-tras arquiteturas e referências que possam ter formado e informado a obra de Dominikus e Gottfried Böhm. 1.2.2. Objetivos Específicos

- Analisar e compreender o contexto histórico (segundo pós-guerra) e sócio--geográfico (a topografia e a cultura presentes nas duas cidades catarinenses) nos quais se inserem as duas igrejas; - Analisar e compreender a inserção das igrejas no contexto urbano imediato, ou seja, nas malhas urbanas de Blumenau e Brusque; - Analisar e compreender os espaços arquitetônicos internos configurados pelas Igrejas em questão; - Analisar comparativamente, quando possível, tais exemplos com outras obras do arquiteto, religiosas ou não, bem como com outros templos construídos no século XX, especialmente nos anos 1950 e 1960; - Compreender as influências presentes na obra de pai e filho.

1.3. Metodologia

Os métodos utilizados para levantamento de dados são: a) Revisão bibliográfica - leituras de livros e documentos que se relacionem basica-mente aos seguintes temas: - Contexto histórico do segundo pós-guerra, época dos projetos de Dominikus e Gottfried Böhm no Brasil; - Contexto histórico de formação dos arquitetos (décadas de 1910 e 1920, 1940 e 1950 do século XX), bem como suas influências e motivações; - Exemplares religiosos dos períodos históricos que influenciaram os arquitetos; b) Visita Exploratória - visita às Igrejas projetadas por Dominikus e Gottfried Böhm em Blumenau e Brusque com o objetivo de se estabelecer um primeiro contato com as mesmas. A visita conta com o suporte de levantamentos físicos e fotográficos. Este método possibilita a apreensão da organização espacial do ambiente a ser analisado, bem como de sua inserção no espaço urbano. c) Análise dos projetos - leitura crítica dos planos visando a compreensão da estru-turação formal e espacial dos templos, bem como estabelecer posteriores relações destes com outros projetos e linguagens arquitetônicas.

Obras e relações com acontecimentos e correntes estilísticas.

2. OS ARQUITETOS

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2.1. Dominikus Böhm Com mais de 50 igrejas construídas, Dominikus Böhm é considerado um dos mais importantes nomes da arquitetura religiosa europeia, vanguarda na concepção de espaços sacros. O arquiteto alemão destaca-se ao utilizar o concreto em seu estado aparente e ao reumanizar a planta baixa, ao conceber interiores onde o fiel protagoniza o culto. Sua obra tem espaço majoritariamente na Alemanha, havendo, contudo, projetos no Brasil, Polônia, El Salvador, Países Baixos e Estados Unidos. Nascido em 1880 na cidade de Jettingen, Dominikus é filho de Aloïs Böhm, também de-dicado ao ramo da construção, tradição esta que também passa por Gottfried Böhm (1920), seu filho, e chega aos seus netos na atualidade. Na Alemanha, tal feito contemporaneamente talvez só possa ser comparado com a família de Albert Speer (1905-1981), também arquiteto.1 Mesmo com breve formação acadêmica - restrita ao curso técnico de construção -, Dominikus se dedicou desde cedo à docência, atuando como professor de desenho na mesma escola em que estudou. Em 1919 sua primeira obra religiosa é construída, uma igreja emergencial na cidade de Offenbach. Em 1926 o arquiteto muda-se com a família para Colônia, onde consolida sua carreira que é em grande parte dedicada à construção de edifícios religiosos. A obra de Dominikus se desenvolve de forma mais notável entre os anos 1920 e a Segunda Guerra Mundial, período marcado por grande pluralidade, fato esse observado pela coexistência de diversas correntes estilísticas, como o Movimento Moderno, dentro desse o Expressionismo; linguagens classicizantes e monumentais, bem como pela criação de uma importante instituição de ensino de arquitetura e design, a Bauhaus em Weimar (1919). Esta é uma época de efervescência criativa, em que obras muito díspares, como o

1 Tröster, Christian. Das Glück liegt in der Familie, 2006. Disponível em: http://www.welt.de/print-wams/article86751/Das-Glueck-liegt-in-der-Familie.html (Último Acesso em junho de 2013).

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Pavilhão Alemão na Exposição Mundial de Barcelona, em 1929, de Mies van der Rohe (1886-1969), etéreo e límpido, e a Torre Einstein de Erich Mendelsohn (1887-1953), escul-tural e sinuosa, coexistiam pacificamente.2 Os arquitetos se reinventavam, causando uma mudança de paradigmas na arquitetura. Essa postura é bastante característica da obra de Dominikus, que fez uso de diversos materiais e linguagens, ao reinterpretar a tradição e se desprender do simbolismo sacro na concepção arquitetônica. Ainda assim, sua obra é pouco explorada pelos críticos de arquitetura, o que traz à tona a face parcial da historiografia do Movimento Moderno, que fez uso muitas vezes de seletos ícones com grande semelhança entre si para retratar um período de grande pluralidade. Dominikus não é retratado de forma ampla, embora a diversidade de suas obras e as inovações que trouxe à concepção de espaços sacros, pusessem sim, em xeque, muitos dos conceitos correntes no século XX, assim como o Movimento Moderno havia feito com diversos programas. Utilizou o concreto armado aparente em espaços sacros e como seu contemporâneo Auguste Perret, explorou com maestria as possibilidades do novo material. A maneira como projetava seus templos era muito particular, fazendo uso de um vocabulário formal tradi-cional com elementos do românico e do gótico. Em termos espaciais, suas experimentações permitiram-lhe preceder em meio século as discussões do II Concílio do Vaticano (1962-1965), que previa, por exemplo, a disposição do altar voltado aos fieis, e não de costas a eles. Além disso, pode-se fazer um paralelo entre os escritos do Padre Johannes Van Acken3 através do Movimento Litúrgico, iniciado na Alemanha e Bélgica, que pregava uma “arte centrada em Cristo”,4 visível na obra de Dominikus quando simplifica a planta baixa. Essa

2 Situação que não continua a partir dos anos 1930 até o final da Segunda Guerra Mundial. Voltaremos a esse ponto mais adiante.

3 Padre bastante atuante nos movimentos de renovação da arquitetura de igrejas, autor do livro “Arquitetura Religiosa Cristo-cêntrica” em 1922

4 Pehnt, Wolfgang. La Arquitetura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A., 1975, pg, 150.

simplificação já havia atraído o interesse de arquitetos como Otto Bartning (1883-1959),5 que concebe o altar central, como nos projeto de Sternkirche e da Auferstehun-gskirche (Imagens 1 e 2, respectivamente). Em 1910 o arquiteto começou a fazer parte da récem formada Deutscher Werkbund,6 que contava in-ternamente com duas correntes distintas, uma embebida da vertente clássica, como a do Pavilhão da Exposição de 1914 (Imagem 3), e outra expressionista, com ênfase na obra de Hans Poelzig (1869-1948) (Imagem 4) e versões mais rígidas dessa linguagem, como Heinrich Stoffregen na fábrica de Linóleo Anker (Imagem 5).7

Contudo, Dominikus em sua obra transcende o es-pírito da época e insinua-se vernacular pela reinterpreta-ção da tradição, como também contemporâneo pelo uso inovativo de materiais ordinários, como pedras e tijolos; o arquiteto despe suas obras dos caros mármores e granitos, típicos do tipo arquitetônico sacro. Em suma, valoriza a for-ma e a estrutura, conquistadas muitas vezes com material

5 Pehnt, Wolfgang. La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A., 1975, pg. 151.

6 A Deutscher Werkbund foi uma associação fundada em 1907, tendo por presidente Hermann Muthesius (1861-1927), e que propunha a aproximação entre designers, arquitetos e artesãos e a indústria de produção. Segundo Reyner Banham, foi uma instituição responsável em grande parte pelo progresso alemão no design, tema que teria atraído arqui-tetos de renome como Le Corbusier. Giulio Carlo Argan reitera dizendo que a associação tinha por ideal dar ao artista a posse sobre os aparatos técnicos da indústria, de modo que os utilize como o velho artesão utilizava seus instrumentos. Além disso, segundo Pevsner, a importância de tal pensamento fez-se visível a tal ponto que muitos países se utilizaram do mesmo conceito, também influenciando Walter Gropius na posterior fundação da Bauhaus de Weimar em 1919.

7 Banham, Reyner. Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina. São Paulo: Perspectiva, 1979.

Imagem 1 – Otto Bartning, planta do projeto da Sternkirche, 1921- 1922.

Imagem 2 – Otto Bartning, plan-ta da Auferstehungskirche em Essen-Altstadt de 1929-1930.

Imagem 3 – Walter Gropius e Adolf Meyer, Pavilhão da Werkbund, Colônia, 1914.

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simples. Os anos de 1926 a 1933 foram os mais produtivos da carreira do arquiteto,8 quando obras notáveis foram construídas. Um edifício significativo do período é Igreja St. Engelbert (Figuras 6 e 7), em Colônia, que revoluciona a concepção padrão de templos. A igreja apresenta uma planta circular bastante simples, cuja percepção é enriquecida pelos gran-des arcos parabólicos que configuram aberturas e fechamentos. A torre sineira é despren-dida do volume principal, outra inovação para a época, e seu desenho anguloso e esbelto contrasta com o volume delgado e de desenho orgânico do templo. O material emprega-do na construção do conjunto é o tijolo vermelho, deixado em seu estado natural, o que lhe confere uma coloração característica. Os novos elementos utilizados por Dominikus na concepção de templos foram acom-panhados de reinterpretações de traços historicistas e levaram o arquiteto a uma linguagem

8 Kippenberger, Susanne. Himmel und Höhle. 2005. Disponível em: http://www.tagesspiegel.de/kultur/himmel-und--hoehle/666068.html (Último Acesso em junho de 2013).

próxima à do Expressionismo alemão, a exemplo da Igreja Santo Apolinário em Lindlar-Frie-lingsdorf (Imagem 8) e da Igreja São João Batista em Neu-Ulm (Imagem 9), com elementos góticos, como os arcos ogivais, lajes tripartidas, e a planta retangular em cruz latina. Aqui faz-se um paralelo a Igreja de All Saints, em Herdfordshire, de William Lethaby (1857-1931) (Imagem 10), considerada por Wolfgang Pehnt um espécie de prelúdio do templo expres-sionista.

Além disso, através de experimentações formais e do tratamento rústico do acaba-mento, Böhm insinua sua preferência pelo volume uno e pela grande massa, que exercem uma tendência ao monumental e fazem da obra do arquiteto um marco do expressionismo alemão do século XX. A Igreja Cristo Rei (Imagens 11 e 12) é um exemplo disto: externa-mente, o bloco monolítico do templo é antecedido pela imponente torre sineira, ambos em tijolos vermelhos, enquanto internamente o arquiteto insere imponentes apoios em “V”, com os quais explora a plasticidade do concreto aparente e une forma e estrutura, concebe esta última como maneira de demarcar aberturas e criar um jogo de luzes que exalta a textura do material deixado em sua forma natural, envolvendo o espaço em uma atmosfera dra-

Imagem 10 – William Richard Lethaby. Igreja de All Saints, Herdfordshire, Inglaterra, 1900-1902.

Imagem 9 – Dominikus Böhm, Interior da Igreja São João Batista, Neu-Ulm, 1926-1927.

Imagem 8 – Dominikus Böhm, Interior da Igreja Santo Apolinário, Lindlar- Frielingsdorf, 1926-1928.

Imagem 4 – Hans Poelzig, Fábri-ca Química, Luban, 1911.

Imagem 5 – Heinrich Stoffregen, Fábrica de Linóleo Anker, Delmenhorst, 1912.

Imagem 6 – Dominikus Böhm, Maquete da Igreja St. Engelbert, Colônia, 1930-1932.

Imagem 7 – Dominikus Böhm, Interior da Igreja St. Engelbert, Colônia, 1930-1932.

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mática. Esta aliança entre luz e textura é um fator característico da obra de Dominikus que também se verifica em edifícios de seu contemporâneo Hans Poelzig. Um exemplo é o tea-tro que Poelzig projeta em 1920, o Grosse Schauspielhaus, que cria também esta atmosfera dramática a partir de jogos de luzes9 e de um envoltório que se assemelha a uma espécie de caverna, conferindo ares primitivos à edificação. Essa alusão é corrente na concepção de Böhm, motivo que salta aos olhos em várias de suas obras e pode ser vista na obra posterior de seu filho, Gottfried Böhm. Contudo, a eclosão da Segunda Guerra Mundial motiva a mudança de Dominikus e família de Colônia para sua cidade natal, Jettingen. Nesse período, Dominikus perde sua vaga de professor na Escola Técnica de Colônia, e vê o número de obras reduzirem drasticamente, com o fim dos encargos de sua maior provedora, a diocese de Colônia. Além disso, muitos dos trabalhos solicitados não chegam a ser concretizados. O retorno à Colônia, no imediato pós-guerra, se dá para o processo de recuperação das edificações danificadas ao longo do conflito. Mesmo assim, já não se observa grande quantidade de projetos de Dominikus saídos do papel em comparação com o período anterior. Há sim, grande demanda por igrejas emergenciais, com reestruturação das bases da arquitetura religiosa e grande experimentação por parte dos arquitetos. É possível que essa conjuntura desfavorável para o arquiteto tenha influenciado a decisão de vir ao Brasil posteriormente para a execução de projetos no país. Data desta época o início de sua parceria com Gottfried, então recém-formado arquiteto, e que, após 1950 apareceria com frequência nos projetos de Dominikus, sendo a obra deste uma influência visível na obra do filho10. Após a morte de Dominikus, Gottfried

9 Schilling, Christiane. Gott wohnt auch im Beton. 2010. Artigo. Disponível em: http://www.monumente-online.de/10/01/leitartikel/Dominikus_Boehm_Gottfried_Boehm_Architektur.php (Último Acesso em juhno de 2013).

10 Um detalhe curioso é que ambos aparecem retratados nos croquis de Gottfried desta época, este como uma figura alta ao lado do pai, retratado mais baixo e gordo, croqui reproduzido nas páginas deste caderno.

continua o trabalho do escritório do pai, primeiramente envolvido em projetos sacros.11

Um dos projetos realizados então é o da Igreja Matriz São Paulo Apóstolo (1953-1956) em Blumenau, para o qual pai e filho supostamente foram indicados pelo Papa Pio XII.12 Para o início dos trabalhos, Gottfried13 visitou a cidade em 1953, entretanto, este não foi o primeiro trabalho dos arquitetos no Brasil: já em 1937 Dominikus (ainda sem a parceria com o filho) concebe o projeto não executado de uma igreja de pequenas dimensões para uma comunidade alemã em Timbó14, além da igreja Matriz de Presidente Getúlio15 (1953-1954) – ambas as cidades próximas a Blumenau - esta última, a única de todas as obras brasileiras que pode ver completamente realizada. Posteriormente, novos projetos para cidades catarinenses foram encomendados: para Brusque, Blumenau, Joinville e Tubarão, estes dois últimos projetos não executados de Gottfried. Dominikus vem a falecer em 1955, durante a execução das igrejas de Blumenau e Brusque, deixando ao filho a incumbência da finalização das obras.

2.2. Gottfried Böhm

Gottfried Böhm (1920) é um dos mais renomados arquitetos europeus do segundo pós-Guerra e o mais novo dos três filhos de Dominikus Böhm. Assim como o pai, Gottfried

11 Voigt, Wolfgang. Gottfried Böhm. Jovis Verlag GmbH: Berlim, 2006, pg. 234.

12 Matriz de São Paulo Apóstolo: Blumenau, Santa Catarina, Brasil. Blumenau: [s.n], 1963. No mesmo ano de 1953 é concedida a Dominikus Böhm a Medalha de Prata do Vaticano, pelo Papa Pio XII, por suas contribuições na Reforma Litúrgica.

13 Não há registros de visitas de Dominikus Böhm ao Brasil, e as raras fontes de pesquisa não esclarecem o fato. A exceção se faz ao artigo do Pe. Antônio Francisco Bohn, que diz que, pela idade avançada, Dominikus não pode viajar e enviou o filho por oca-sião do projeto de Blumenau. Quanto aos outros projetos, não há confirmação. Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

14 Ver imagem 51 na página 76.

15 Vide texto referente nos Apêndices

Imagem 11 – Dominikus Böhm, Igreja Cristo Rei, Bischofsheim, 1926.

Imagem 12 – Dominikus Böhm, Igreja Cristo Rei, Bischofsheim, 1926.

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não pode ser classificado como representante das correntes estilísticas predominantes em seu tempo e, ao contrário de muitos arquitetos de sua geração, não defendeu com afinco o funcionalismo moderno, uma vez que esse rumava cada vez mais para um insípido forma-lismo estéril, antagônico em relação a sua obra. A exemplo de Dominikus, o arquiteto utiliza um vocabulário formal variado, mistura referenciais, pautado ora pelo viés expressionista da obra do pai, ora pela experimentação plástica de materiais e formas, encontrando no concreto aparente – mas não somente – com sua maleabilidade, seu peso e vigor construtivo, o material adequado à linguagem escultó-

rica que predominará em suas proposições. Em muitos trabalhos, mistura o espaço moderno e a busca pelo místico, enfatiza a relação entre luz e ma-téria e a consequente dramatização do espaço, importante característica do arquiteto, também reconhecida na obra paterna. Nascido em Offenbach, Gottfried forma-se na Academia de Artes Criativas de Munique e Arquitetura na Escola Técnica da mesma cidade em 1945. Nos anos 1940 é dispensado do serviço militar e, terminados os con-flitos da Segunda Guerra Mundial, trabalha na Sociedade de Restauração da cidade de Colônia. Quando visita os Estados Unidos, no começo dos anos 1950, trabalha na Franciscan Cajetan Baumann e viajando pelo país, entra em contato com Mies Van der Rohe (1886-1969) e também de Walter Gropius (1883-1969).16 Até então, Gottfried tivera majoritariamente a obra de seu pai como referência, sendo vísivel a influência deste nas primeiras obras do arquiteto através de pesados volumes e torres imponentes (Ima-gem 13, ver St. Engelbert de Dominikus), que cedem espaço posteriormente à experimentação plástica e à desconstrução do espaço sacro (Imagem 14). Nos anos 1960, apesar de já possuir um grande número de obras construídas na Alemanha, Gottfried torna-se internacionalmente famoso

16 Voigt, Wolfgang. Gottfried Böhm. Jovis Verlag GmbH: Berlim, 2006 pg. 234.

Imagem 13 – Gottfried Böhm, Igreja St. Ursula, Kalscheu-ren, 1952-1956.

Imagem 14 – Gottfried Böhm, St. Mattäus, Düsseldorf--Garath, 1962-1972.

por uma série de projetos em que sua experimentação plástica com o concreto toma nova dimensão. A Igreja St. Gertrude (Imagens 15 e 16) em Colônia é um desses exemplos, e acompanhada pelos seus mais famosos edifícios, a Prefeitura de Gladbach-Bensberg (Ima-gens 17 e 18) e a Igreja Pilgrimare em Neviges (Imagnes 19 e 20), reune características como a ilusão de que o volume interno fora esculpido no concreto e que, banhado então pela luz, dá a impressão de um cenário cavernoso. Nos três exemplos conduz o programa religioso à condição de monumento, objetivando amplificar o caráter sacro da obra.

Imagem 15 – Gottfried Böhm, Igreja St. Gertrude, Colônia, 1960 - 1965.

Imagem 16 – Gottfried Böhm, Igreja St. Gertrude, Colônia, 1960 - 1965. Interior.

Imagem 17 – Gottfried Böhm, Prefeitura de Gladbach-Bensberg, 1962-1976.

Imagem 18 – Gottfried Böhm, Prefeitura de Gladbach-Bensberg, 1962-1976.

Imagem 19 – Gottfried Böhm, Igreja Pilgrimare, Neviges, 1961-1973.

Imagem 20 – Gottfried Böhm, Detalhe do teto da Igreja Pilgrimare, Neviges, 1961-1973.

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se projeto, Gottfried dispõe da maleabilidade do concretro de modo a sobrepor as coberturas e criar, assim, espaços divisórios interna e externamente (Imagem 24). A sensação de leveza é acentuada pelo fechamento inteiramente em vidro e pela sinuosi-dade de tais coberturas, que flutuam imponentes como uma mão protetora sobre o público.19

Contudo, a intensa relação intergeracional é o que mais impressiona na família Böhm, não sendo possível muitas vezes distinguir até que ponto a influênica do pai, Dominikus, pesa em sua obra. Apesar de haver um grande período temporal entre a maturidade arquitetônica de ambos, é visível certa proximidade: enquanto na obra daquele notam-se laivos de expressionismo, alusões góticas e aspiração à monumentalidade típica dos anos 1920, a obra de Gottfried sorve da corrente Brutalista, já dentro das revisões por que passa o Movimento Moderno nos anos 1960, mas nela reencontra a mesma tendência ao vigor da massa construída, a certa monumentalidade e ao expressionismo (no caso alemão) já presente na obra do pai. Na prática, os resultados obtidos são bastante diversos, uma vez que Dominikus enfatiza rein-tepretações historicistas dentro do vocabulário sacro enquanto Gottfried tende a realizar em sua arquitetura uma noção muito mais plástica, um espaço quase moldado, buscando ora mimetizar a paisagem, como em Gladbach-Bensberg, ora uma fluidez e dramaticidade espacial inusual, como em Neviges e Potsdam.

19 Kippenberger, Susanne. Himmel und Höhle, 2005. Disponível em: http://www.tagesspiegel.de/kultur/himmel-und--hoehle/666068.html (Último Acesso em juhno de 2013).

Nos exemplos de Neviges e Gladbach-Bensberg, além dos interiores escultóricos, a relação com o exterior assume grande relevância. Nesta última, a torre esculpida inte-rage com os volumes adjacentes de um edifício em pedra e mimetiza-se na paisagem da cidade, diferentemente de Neviges, a qual emerge da terra com afiados vértices, com pontas desuniformes que levam ao interior diferentes banhos de luz, exaltando a forte dramaticidade da obra. Depois de 1969 o boom da reconstrução que tivera lugar Alemanha ocidental cessa e Gottfried reorienta sua obra para projetos de edificações públicas, construindo es-critórios, lojas, residênciais e conjuntos habitacionais. Leciona em 1963 Urbanismo em Aachen17 e nos anos 1980 nos Estados Unidos, tendo como uma das obras importantes desse período o Museu Diocesano em Paderborn (Imagens 21 e 22) que, diferente-

mente das edificações já citadas, dialoga com o entorno através de um envoltório em traços retilínios, assim como o interior em patamares intensamente banhados por luz que dão a impresão de flutuarem, configurando um dos espaços iluminados mais atraentes da obra de Böhm.18

Em 1986, devido à sua contribuição à ar-quitetura, é laureado com o maior prêmio da categoria, o Prizker. Em 2006, com 86 anos e 4 filhos, 3 deles arquitetos, trabalha somente em projetos selecionados, como o Hans Otto Theater (Imagem 23). Nes-

17 Tröster, Christian. Das Glück liegt in der Familie, 2006. Artigo. Disponível em: http://www.welt.de/print-wams/article86751/Das-Glueck-liegt-in-der-Familie.html (Último Acesso em junho de 2013).

18 VOIGT, Wolfgang (org.).Gottfried Böhm. Frankfurt: Jovis, 2006, pg 209.

Imagem 21 – Gottfried Böhm, Museu Diocesano, Paderborn,1969-1986.

Imagem 22 – Gottfried Böhm, Interior do Museu Diocesano, Paderborn,1969-1986.

Imagem 23 – Gottfried Böhm, Hans Otto Theater, Potsdam, 2006.

Imagem 24 – Gottfried Böhm, Interior do Hans Otto Theater, Pots dam, 2006.

3. AS OBRAS NO BRASIL

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3.1. Igreja Matriz São Paulo Apóstolo - Blumenau (SC)1

3.1.1. Apresentação

Localizada na região central da cidade de Blumenau, a Igreja Matriz de São Paulo Apóstolo (Imagem 1) é um marco arquitetônico e urbano. Projeto encomendado aos arqui-tetos alemães Dominikus e Gottfried Böhm, sua construção se deu a partir de 1953, a fim de substituir a antiga igreja construída entre 1868 e 1876 no mesmo local. Especula-se que a substituição se deu em função das pequenas dimensões do templo, que já não atendia a população católica da cidade. Além disso, há registros de diversos problemas estruturais

e de vedação na antiga edificação, que sofria com vazamento de água e frestas por onde o vento se infiltrava2. Acredita-se que a comunidade local anteviu, na cons-trução de um novo templo, a possibilidade de criar um marco capaz de representar a ideia de crescimento e progresso da cida-de. Isso justifica o fato de a nova edificação se expressar de modo diferente das linhas tradicionais do prédio anterior, atualizan-do seus traços a partir de uma estética mo-derna já amplamente aceita na Europa e que encontrava em Dominikus Böhm um de

1 Os desenhos originais da Igreja Matriz São Paulo Apóstolo reunidos pelos autores pode ser verificado no CD em anexo.

2 Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

Imagem 1 – Igreja Matriz São Paulo Apóstolo.

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seus principais representantes. Arquiteto de grande renome em seu país e reconhecido internacionalmente por sua contribuição na arquitetura religiosa, Dominikus Böhm foi especialmente indicado pelo papa para idealizar o templo3, o que já demonstra a grande importância que a comunidade con-feriu ao novo projeto, pois não faltavam bons nomes locais para o empreendimento. Talvez pela idade avançada, o arquiteto não chegou a visitar o local, deixando a tarefa para o filho, então recém-formado. Este se tornaria, a partir dos aos 1960, outro grande nome da arquitetura alemã e mundial.

3.1.2. A Nova Matriz Segundo o Padre Antonio Francisco Bohn4, o grande “monumento de granito” projetado com linhas simples por pai e filho, de modo a reinter-pretar a tradição sem, entretanto, limitar-se a uma imitação de sua linguagem, gerou divergências e críticas entre a população católica. Segundo o au-tor, “a planta é ousada. É uma construção em estilo moderno, algo novo e diferente. No Brasil, quase somente são conhecidas igrejas em estilos colonial e gótico“5. Apesar das contestações populares, a comissão de obras aprovou o projeto e, em abril de 1953, iniciou-se a construção da Igreja (Imagem 2),

3 Matriz de São Paulo Apóstolo: Blumenau, Santa Catarina, Brasil. Blumenau: [s.n], 1963.

4 Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

5 Idem.

sob responsabilidade do engenheiro Franz Hrozek e direção de Augusto Koester. A pedra fundamental foi lançada em 24 de maio do mesmo ano. À época, a cidade de Blumenau contava menos de 50 mil habitantes, e no entorno da Igreja, ao longo da Rua XV de Novembro, predominavam construções de um pavimen-to e a característica provinciana típica de uma cidade do interior (Imagem 3). Destacavam--se o desenvolvimento econômico da região e a intensa vida cultural da cidade de coloni-zação alemã que mantinha fortes laços culturais com sua origem6. Fundada em 1850 como colônia particular do Dr. Herman Blumenau e elevada a município em 1880, Blumenau tornou-se um dos maiores empreendimentos colonizadores da América do Sul, criando um importante e influente centro industrial no País.7 Boa parte deste crescimento econômico se deve ao fato de a cidade ser polo de importantes indústrias do sul do Brasil, destacando--se principalmente no setor têxtil.

Blumenau e região reúnem exemplos monumentais de templos religiosos, o que se deve, em boa parte, às obras de Simão Gra-mlich, projetista de larga experiência no pro-grama religioso, que também idealizou um projeto para a Nova Matriz de Blumenau. Nascido em 1887 em Baden, na Alemanha, Simão Gramlich veio para o Brasil em 1920, estabelecendo residência no Rio Grande do Sul e posteriormente em Blumenau. Seus pro-jetos, com fortes referências aos estilos româ-nico e gótico, foram inspirados nas catedrais

6 Daufenbach, Karine. A Modernidade em Hans Broos. Tese de Doutoramento. São Paulo: FAUUSP, 2011.

7 Disponível em: http://www.blumenau.sc.gov.br/gxpsites/hgxpp001.aspx?1,1,315,O,P,0,MNU;E;3;2;MNU;, (Último acesso em fevereiro de 2013)

Imagem 2 – População supervisionando a construção da Nova Matriz. Imagem 3 – Rua XV de Novembro no início da construção da

torre da Nova Matriz.

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alemãs e caracterizam-se pela grandiosidade e monumentalidade, o que o aproxima, de certo modo, de Dominikus Böhm. Entretanto, no que diz respeito ao uso da tradição, os dois arquitetos seguem linguagens bastante distintas. As obras de Dominikus exploram a tradição na forma de citações claras e pontuais a exemplo do emprego de arcobotantes em Brusque e da rosácea gótica em Blumenau, mas gerando um espaço sacral fundamentado na tradição de forma bastante difusa. Alguns efeitos arquitetados por Böhm evocam indiretamente os efeitos espaciais das grandes cate-drais góticas, como a grande altura dos templos, a tripartição da nave insinuada através da localização dos pilares, ou ainda os átrios de acesso e as referências à densa volumetria românica. Estes recursos aparecem combinados a elementos modernos e a citações contem-porâneas (como o uso do concreto armado referenciando a obra de Perret, por exemplo), gerando uma concepção totalmente nova em termos arquitetônicos e tipológicos. Gramlich, ao contrário, evoca o espaço sacral tradicional, fazendo uso do repertório clássico do período gótico, a exemplo do emprego das torres laterais que ladeiam a entrada central encimada por um pórtico na Igreja de Gaspar. O arquiteto Simão teve vasta produ-ção e deixou exemplos em diversas cidades catarinenses, como Itajaí, Gaspar (Imagem 4), Azambuja (Brusque), Rio do Sul, entre outros. Entretanto, o projeto realizado para Blumenau, assim como muitos outros, gerou grande polêmica por seu alto custo e de-masiado tempo estipulado de construção, e acabou sendo substituído pelo desenho da Matriz atual.8

8 Bohn. Antônio Francisco. As Igrejas de Simão Gramlich. Blumenau em cadernos, artigos, tomo XLII - n-5/6 - Maio/Junho - 2001 pg 40.

O projeto de Dominikus e Gottfried não perdia em monumentalidade e apresen-tava um orçamento que correspondia a um terço do apresentado por Gramlich9, motivo que influenciou significativamente a opção pela construção de linhas puras e modernas em concreto armado. Ainda assim, o custo da obra era elevado, o que motivou a comunidade a realizar uma série de atividades como almoços (Imagens 5 e 6), festas e feiras visando à arrecadação de fundos que pudessem financiar a grande obra coletiva que se tornou a nova Matriz. Sutilezas dos arquitetos, como a escolha de materiais locais ajudavam a diminuir os custos, entretanto, “há que se destacar o valor do material e dos serviços pres-tados que não foram pagos, como a doação da madeira para os bancos, o transporte de todo o granito vindo de Subida, feito pela Estrada de Ferro Santa Catarina, a terra-planagem e outros serviços feitos pela Prefeitura Municipal, Governo do Estado e firmas

9 Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

Imagens 5 e 6 – Almoço na nave central da Nova Matriz em construção em maio de 1965, para 500 pessoas, com a presença do governador Jorge Lacerda.

Imagem 4 – Simão Gramlich . Igreja Matriz São Pedro Apóstolo, Gaspar (SC).

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blumenauenses”10. Isso demonstra que, desde então, a po-pulação parecia estar ciente do grande monumento que se erigia na cidade, uma vez que as grandes contribuições eram feitas, inclusive, por particulares de outras religiões. Após a visita inicial de Gottfried a Blumenau, outras duas visitas se sucederam: em 1956, quando o arquiteto, acompanhado da esposa, foi supervisionar os trabalhos da construção, e em janeiro de 1958, para participar das solenidades de consagração da nova Matriz11. Neste meio tempo, o órgão presente na antiga Matriz foi reformado e transferido para a nova igreja. Cabe destacar, entretanto, que a inauguração desta se deu ainda com a torre da ma-triz antiga (Imagem 7), possível uma vez que a nova torre, idealizada por Gottfried Böhm e construída entre 1960 e 1963, se constitui em um volume autônomo em relação ao bloco principal. Também o batistério foi inaugurado poste-riormente, em abril de 1958.

3.1.3. Considerações Gerais

No terreno elevado localizado no ponto focal da Rua XV de Novembro, na região central da cidade, o volume prismático do edifício se mostra imponente e acolhedor. Pode--se dizer que o templo se torna mais experiência que contemplação, ao envolver o obser-

10 Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

11 Idem.

vador em uma transição de espaços iniciada pela escadaria sob a torre, ao nível da rua, alcançando o grande átrio antecedido pelo batistério e coberto com uma extensão da abóboda do templo, no nível superior. De diversos ângulos, e ao longo do percurso que se faz tanto para contemplar a Igreja, quanto para visitá-la, ela se revela imponente e sublime. Abaixo da torre, que se torna o marco onde tem início o caminho e se divide o mundo pro-fano e agitado do espaço de meditação e introspecção, a longa escadaria se apresenta, permitindo a ascensão ao templo que se revela a cada novo passo. Ao longo do percurso, pode-se vislumbrar rapidamente sobre o corpo da catedral e na porção posterior do volu-me um esguio torreão de 11 metros de altura, encimado por uma cruz de bronze. Entretanto, ao atingir o talude no qual se assenta o grande corpo prismático do templo, depara-se com o volume leve e circular do batistério, localizado no eixo da portada que compõe a fachada. Essa perspectiva, entretanto, não se dá frontalmente, onde o prédio se resumiria a um grande prisma simétrico e imponente cuja entrada é escondida pela pequena constru-ção circular do batistério: ela se dá diagonalmente, de modo a revelar pequenos detalhes do templo que instigam o interesse do espectador, como suas aberturas circulares e seus

diversos vitrais. A vegetação que rodeia o edi-fício é pouco expressiva, dando ao entorno um caráter de praça seca. O material do piso dá continuidade ao da escadaria, constituindo-se de pedras vermelhas cuidadosamente separadas das escuras no processo de produção, o que elevou bastante o custo do mate-rial12. Além disso, a cor das pedras, do piso e do corpo da edificação corres-

12 Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

Imagem 7 – Construção da Nova Matriz atrás da Torre da Antiga Matriz ainda em pé.

Imagem 8 – Vista aérea do conjunto de edifícios que rodeiam a Igreja de São Paulo Apóstolo em Blumenau.

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ponde ao tom predominante na palheta de cores das edificações da cidade, especialmente as mais antigas, estabelecendo uma conexão entre o edifício e a cultura e tradição locais. O telhado de quatro águas do templo possui uma inclinação discreta, dando, no ní-vel do observador, a impressão de que a cobertura se dá por uma laje plana. Os volumes auxiliares que completam o projeto consistem em uma edificação comercial não construída na Rua XV de Novembro, na Casa Paroquial, e em outro volume de comércio, estes locali-zados na face oposta da quadra na qual a Igreja foi implantada. Entre as edificações está um estacionamento, e ao lado do conjunto, o Colégio Bom Jesus, fundado por um padre antes da construção da nova Igreja (Imagem 8).

3.1.4. Detalhes do Projeto

A planta da Igreja é retangular (Imagem 9) e esta condição é reforçada visualmente pelas duas fileiras de esbeltos pilares que sustentam a cobertura e dividem a nave em três. Alinhados desde o átrio, os apoios adentram o volume - conduzindo o fiel ao altar - e suportam a fina cobertura abobadada do templo. Esta, por sua vez, é banhada por intensa luz natural a partir da porção superior das paredes laterais e parece descolar-se do restante do volume, con-ferindo, a partir de uma nova linguagem, a mesma atmosfera mística comum na ar-quitetura religiosa. Internamente, a mesma singeleza do traçado contrasta com uma rica expe-

riência espacial, onde efeitos teatrais de luz e sombra se revelam (Imagem 10). Os 12 metros de altura dos pilotis con-duzem o olhar do observador para a cober-tura, onde os efeitos de luz são explorados aliados às grandes abóbodas de aresta (Ima-gem 11). Além disso, outros pequenos detalhes se inserem ao longo da composição, a exem-plo das duas grandes pias de água benta de granito maciço (Imagem 12), e dos quatro confessionários brancos localizados junto das paredes laterais (Imagem 13). Ao adentrar o templo, o olhar logo alcança o altar banhado por abundante ilumi-nação natural, enriquecendo a planta retan-

Imagem 10 – Vista do interior da Igreja a partir do acesso principal..

Imagem 11 – Detalhe da cobertura do templo: abóbodas de aresta e ilumina-ção lateral rente à cobertura.

Imagem 12 – Pia de água benta. Imagem 13 – Confessionário de mármore.Imagem 9 – Planta Baixa da Igreja São Paulo Apóstolo.

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gular, à princípio tão simples. Esse contraste entre simplicidade de traçado e complexidade espacial reflete o que ocorre na Igreja Notre Dame du Raicy, de Auguste Perret (Imagem 14). A própria configuração geral da Igreja de São Paulo Apóstolo remete à obra de Perret, como a abóboda sustentada por esbeltos pilotis demarcando a grande nave principal, bem como as naves laterais (Imagem 15). Além disso, a noção de riqueza espacial em Raincy se dá a partir das chamadas “paredes-luz” (Imagem 16), que representam, simulta-neamente, fechamentos e aberturas. São elas que conferem a atmosfera espiritual que o ambiente requer e que permitem, a partir de um desenho pouco complexo de planta, uma experiência espacial bastante rica. A iluminação da cobertura presente na porção superior das paredes laterais e nos vitrais junto ao altar em Blumenau também confere efeito seme-lhante ao explorado por Perret.

A experiência do templo de Blumenau se dá a partir da torre sineira, cujo volume precede o corpo principal do templo. Atual símbolo da Diocese de Blumenau, a torre eri-gida dois anos após a inauguração da Igreja é feita em concreto armado e revestida de granito rosa, assim como o muro de arrimo que acompanha o percurso do pedestre desde a rua até a entrada do templo e sustenta o terreno elevado sobre o qual se assenta a Igreja. Desta forma, além de conter o talude, o muro emoldura a perspectiva que se tem da es-cadaria e abriga, em um nicho, a imagem de São Paulo Apóstolo. A torre sineira se localiza alguns níveis abaixo do corpo da Igreja, surgindo sobre a escadaria e se transformando num pórtico de cimo abaulado, que envolve o percurso do observador (Imagem 17). Este pórtico totaliza 45 metros de altura e apresenta um vão de 30 metros de altura, demarca-do por dois apoios laterais. O campanário, situado acima do vão, possui 15 metros de altura e três nichos circulares para os sinos Jesus, Maria e José, que, trazidos de Bo-chum, Alemanha, já estavam presentes na antiga matriz13. Dentro deste volume, logo abaixo dos nichos para os si-nos, está a grande engrenagem que movimenta os quatro mostradores de bronze dos relógios da torre. Embora os mostradores tenham sido substituídos, a engrenagem que os movimenta ainda é a mesma adquirida na Alemanha em 1929, também presente na Antiga Matriz. Coroando o volume da torre, tem-se uma cruz do mesmo granito da estrutura. A imponência das medidas deste elemento tão característico dos templos reforça uma característica marcante da arquitetura de Böhm: a torre nunca é simples adendo ao corpo principal da igreja, mas elemento de igual importância em relação ao templo no que se refere

13 Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

Imagem 17 – Torre formando o pórtico sobre a escadaria que dá acesso ao templo.

Imagem 14 – Auguste Per-ret. Planta Baixa Igreja du Raincy, com destaque para a forma retangular.

Imagem 15 – Auguste Perret. Esquema do interior da Igreja du Raincy, com destaque para a divisão das naves central e laterais a partir da fileira de pilares e da abó-boda que compõe a nave central.

Imagem 16 – Auguste Perret. Interior da Igre-ja du Raincy, com destaque para a entrada abundante de luz natural através das ditas paredes-luz.

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a volume e tratamento: o desenho e a localização cuidadosamente pensa-dos qual a maneira de pórtico que ao longo do percurso do observador se revela como um dos pontos focais de uma das principais vias da cidade, fazem da torre um importante marco urbano. Juntamente com a escadaria, que lhe perpassa (Imagem 18), a torre age com uma preparação para a experiência do espaço. A escadaria de seis metros de largura que atravessa a torre também é de granito maciço. Ela é composta por 44 degraus divididos em quatro lances e conduz ao grande patamar revestido por pedras vermelhas - o que pressupõe um intenso trabalho artesanal de seleção e extração das pedras - no qual se insere a edificação. O primeiro volume que se destaca no patamar é, de fato, o do templo, entretanto, o olhar do observador logo se dirige, obliquamente, ao batistério. O volume circular de 8 metros de altura e 5,60 metros de diâmetro se apoia em pilares de concreto que se estreitam à medida que se aproximam do piso. O fechamento é feito com vitrais quadriculados transparentes, amarelos, verdes e cinzas, conferindo leveza à pequena construção bastante permeável visualmente e banhada de luz natural. A ventilação se dá a partir de duas janelas basculantes dia-metralmente opostas. Três degraus abaixo do nível do patamar de acesso – o

que tem sentido litúrgico, por fazer descer o pagão, e ascender o cristão após o batismo – encontra-se, no centro do volume, a grande pia batismal de mármore maciço. Além da cobertura em casca de concreto originalmente aparente, e atualmente pintado de branco, o batistério está sob a cobertura da própria igreja, que se projeta além do corpo principal do templo à maneira de um átrio (Imagem 19). No eixo da pequena porta do batistério, a cerca de 10 metros, está a grande aber-tura para o templo. Uma porta de madeira maciça, com duas folhas de 2,10x0,80 metros está inserida em uma portada de granito centralizado na fachada frontal, com cerca de

9x6 metros (Imagem 20). Sobre a porta, tem-se três grandes esculturas de madeira maciça, compondo o “Grupo do Calvário”: Jesus Cristo, com 3 metros de altura e Nossa Senhora e São João, com 1,5 metros14 (Imagem 21). O restante do fechamento frontal da edificação consiste em uma parede de vitrais recuada 40 centímetros em relação à portada de grani-to. Os motivos representados no fechamento são uvas e peixes, cuja simbologia é bastante representativa nos edifícios sacros. A partir deste ponto de observação desenvolve-se o interior do templo, que recepciona o visitante com duas grandes pias de água benta, com-postas por uma laje circular de granito maciço de 1,40 metros de diâmetro e 0,30 metro de espessura.

As paredes laterais, por sua vez, contrapõem a leveza e transparência do fecha-mento frontal: feitas do mesmo granito róseo presente na torre, na escadaria de acesso, e

14 Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

Imagem 19 – Átrio formado pelo prolongamento da cobertura do templo, abrigando o batistério.

Imagem 20 – Fechamento frontal visto interiormente a partir do altar. Nota-se a portada de granito rodeada pelos vitrais.

Imagem 21 – O Grupo do Calvário presente acima do acesso principal, na portada de granito.

Imagem 18 – Detalhe da escadaria de acesso e dos apoios do pórtico formado pela torre.

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no grande portal de entrada, elas apresentam impressionantes 11 metros de altura. A 3 me-tros, 16 aberturas circulares com 1,80 metros de diâmetro, substituem os quadros que apre-sentam a via sacra nos templos tradicionais, representando-a em formato de vitrais. Além das estações, as rosáceas laterais ainda apresentam a ressurreição e a vinda do Espírito Santo, totalizando 16 imagens. Somente na porção superior das paredes, correspondente a 1/5 da altura, tem-se o fechamento com vitrais, que permitem a entrada de luz em abun-dância. O efeito criado pelo contraste entre a massividade ao nível do piso, e a leveza no nível superior, suspende visualmente a cobertura e a envolve em uma atmosfera celestial que lembra as antigas catedrais góticas, nas quais a iluminação penetra do alto e também foca o altar. O mesmo ocorre próximo aos fundos da Igreja: as paredes laterais do último quarto de comprimento do edifício, do lado esquerdo do presbitério, são feitas inteiramente de vitrais suportados por arcadas de concreto e banham o altar com luz natural. Ao lado di-reito, a parede é opaca e as mesmas arcadas se repetem delimitando lateralmente a área do coro, entretanto, elas se configuram como marcação vazada, reservando, por exemplo, espaço para o órgão herdado da antiga Matriz. Visualmente, entretanto, a harmonia se mantém, exaltando a intenção do arquiteto de manter a impressão de simetria, apesar da adição do volume lateral à direita. Vale ressaltar que este tipo de fechamento é bastante recorrente na obra de Dominikus Böhm e estrutura arcadas que se sobrepõem, vazadas ou com fechamento de vidro, como neste caso. Além de revisitar a tradição construtiva, o arquiteto consegue, com este recurso, farta iluminação para o interior dos edifícios. Ademais, quando emprega este tipo de fechamento como limite do átrio, este adquire fronteiras va-zadas e visualmente leves, integrando interior e exterior. O altar, localizado na parede oposta da entrada, se coloca como grande ponto de interesse da concepção do espaço. Acima dele, no ponto focal do observador que adentra a Igreja, insere-se na maciça parede uma rosácea gótica com uma abertura central de 8 metros de diâmetro, rodeada por vinte aberturas menores de 0,6 metro, que se tornam pontos de luz colorida. O elemento reproduz a coroa de espinhos usada por Jesus, o que

justifica a escolha de cores dos vitrais: azul, como o fundo celestial, vermelho, representan-do o sangue, e verde, remetendo aos espinhos da coroa15. Cabe salientar que todos os vitrais presentes na igreja, por insistência do arquiteto, foram feitos com vidros do tipo “anti-que” importados da Europa, sob o argumento de harmonizar melhor com as linhas da nova arquitetura16. Os arcos ogivais – em especial na forma de múltiplos arcos como grandes portais de acesso -, a rosácea, assim como as já citadas paredes em arcada, são referências comumente utilizadas nas obras de Dominikus Böhm, a exemplo do projeto da Igreja Ma-triz São Luis Gonzaga, em Brusque. Além disso, o templo incorpora modificações no ritual litúrgico que se refletem no espaço, visando a simplificação da liturgia e a aproximação com o fiel. Tais princípios foram esboçados no Movimento pela Reforma Litúrgica, no qual Dominikus Böhm teve importante participação, antecipando as discussões do II Concílio do Vaticano. Estas podem ser ilustradas pela posição central do altar e pela planta aberta da igreja, sem uma tripartição de fato. Revelam-se ainda, as múltiplas referências das quais os arquitetos faziam uso, combinando elementos tradicionais, comumente ligados à tradição cristã, à modernização litúrgica e ao desenho moderno do templo, com referências a Perret, contemporâneo de Dominikus, e a posturas revolucionárias para a época, a exemplo do uso do concreto aparente. Há ainda que se destacar o já citado altar, para onde toda a atenção converge. Também em mármore branco, o presbitério eleva-se 6 degraus acima do piso do templo, e o altar-mor, 3 degraus acima daquele. Em posição central, ele consiste em uma grande mesa de mármore, com 3 metros de comprimento, 1,5 metros de largura e 0,15 metro de espessura, apoiada sobre oito colunas oitavadas, encerrando as relíquias de três mártires. Há ainda uma grande peça - cujo cimo remete à cobertura dos confessionários - que sus-tenta o tabernáculo de madeira, elaborado pelo próprio Gottfried Böhm17. Nas laterais da

15 Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

16 Idem.

17 Idem.

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elevação do altar, sob o nível do presbitério, estão simetricamente dispostos dois discretos púlpitos do mesmo material da mesa do altar. A harmonia que rege a arquitetura do templo ecoa em seu mobiliário. O desenho e a cor dos 180 bancos de carvalho – capazes de abrigar 3000 pessoas – distribuídos em quatro fileiras, dialogam com os demais materiais e com a arquitetura da Igreja, supondo o desenho do arquiteto. Os quatro confessionários distribuídos em duplas em cada nave lateral, são de mármore branco e apresentam um desenho simples que remete às formas tradicionais da arquitetura de igrejas. A base, de cerca de 2 metros de altura, consiste em um prisma retangular, com uma porta frontal e uma pequena janela lateral, que permite o contato entre o fiel e o padre. A cobertura – uma pirâmide de quatro lados - eleva-se 1 me-tro acima deste. No corpo principal da igreja, as luminárias parecem materializar-se a partir da rosácea, dispondo-se ordenadamente ao longo dos corredores: são duas fileiras no corredor central, uma em cada corredor lateral. Em forma de pequenos globos pendentes, presos por finos cabos de aço que se tornam invisíveis em certos momentos, este elemento, por vezes, parece estar suspenso no espaço harmonizando-se com o todo e constituindo-se em mínima interferência.

3.1.5. Breve Histórico da Comunidade Católica de Blumenau

Desde a colonização, a presença do templo católico era uma forma de efetivar o domínio territorial. No caso de Santa Catarina, grandes contingentes de imigrantes foram trazidos às regiões costeiras a partir do ano de 1748 e, segundo Bohn18, em 1976 a foz do Rio Itajaí – localizado na porção nordeste do Estado - já estava inteiramente povoada com habitantes fiéis à religião católica, consolidando as Cidades de Itajaí e Navegantes. A

18 Bohn, Antonio Francisco, Pe. Diocese de Blumenau, Diocese do Amor. Blumenau: Três de Maio, 2001.

colônia agrícola de Blumenau foi estabelecida na região em 1850 pelo alemão Hermann Bruno Otto Blumenau, e em 1880 foi elevada à categoria de município19. A partir de então, pequenas capelas foram surgindo junto à expansão que se dava ao longo do Rio, integrando-se, inclusive, às casas de alguns fiéis. Destaca-se, neste momen-to, a presença de colonizadores alemães provenientes da Colônia São Pedro de Alcântara, fundada em 1829. A região de Blumenau, entretanto, recebeu, a partir de 1850, imigrantes exclusivamente evangélicos luteranos, uma vez que os primeiros católicos começaram a che-gar em 1854 e se mantiveram em número menor que os luteranos por um longo período. Mesmo assim, a comunidade católica conseguiu se mobilizar e construir uma Capela em 1865. Esta foi substituída em 1870, quando a população católica de Blumenau alcança-va 130 famílias (cerca de 853 pessoas) e já estava em construção um grande templo de alvenaria projetado pelo engenheiro Heinrich Krohberger por ordem do Imperador Dom Pedro II. A partir de 1875 começaram a chegar à Blumenau imigrantes tiroleses, austríacos, poloneses e italianos, aumentando significativamente a população católica da região, cujo principal ponto de encontro passou a ser a Matriz São Paulo Apóstolo.

3.1.6. A Evolução Tipológica da Matriz São Paulo Apóstolo

A primeira Matriz da Paróquia São Paulo Apóstolo (Imagem 22) foi projetada pelo arquiteto Heinrich Krohberger, formado pela Academia Real de Munique e mestre pedreiro de Beyreuth, que residia em Blumenau desde 185820. A construção simétrica e com torre central possuía planta retangular, e aberturas frontais e laterais encimadas por

19 Disponível em: http://www.blumenau.sc.gov.br/gxpsites/hgxpp001.aspx?1,1,315,O,P,0,MNU;E;3;2;MNU; (Último acesso em maio de 2013)

20 Korman, Edith. Blumenau: Arte, Cultura e as Histórias de sua Gente (1850 – 1985). Blumenau: edição da autora, 1994, p. 19.

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arcos ogivais, característicos da arquitetura gótica. Uma espécie de cimalha marca-va a separação do corpo da Igreja com a torre, e um serrilhado, traçado a partir de então, escondia o telhado de duas águas nas fachadas frontal e posterior. Aos olhos do observador, a edificação era um volume único, entre-tanto, em sua face posterior havia um volume auxiliar me-nor e de pé direito mais bai-xo, iluminado abundantemen-

te por quatro aberturas laterais, que abrigava o altar. A imponência da construção era reforçada por sua implantação em um talude elevado, localizado no ponto focal de um eixo de pequenas casas e armazéns de estilo colonial. A rua inicialmente denominada “Wurststrasse”, cuja tradução literal “Rua da Linguiça” alude ao seu traçado sinuoso, mais tarde se consolidou sob o nome de “Rua XV de Novembro” (Imagem 23). O acesso ao edifício se dava por dois lances de escada ladeados por vegetação de pequeno porte. A casa paroquial se localizava à direita da igreja, um tanto distante e próxima à via. Construída com estrutura enxaimel, a edificação era térrea e relativamen-te pequena. Em 1928 os dois sinos presentes no templo tiveram de ser trocados em função de chegada de três novos (denominados Jesus, Maria e José), maiores e mais pesados. Como a pequena torre não tinha condições de suportar o peso dos sinos, algumas modificações

foram feitas. A primeira delas foi o reforço na estrutura da torre, que teve sua altura au-mentada e dividida em quatro nichos (nos quais se inseriram os sinos), além do topo reser-vado ao relógio. O volume adquiriu, então, um formato muito mais esbelto, ressaltando sua verticalidade (Imagem 24). Outra modificação significativa no templo foi a adição de duas capelas laterais junto ao altar, alterando a planta retangular original para o formato em cruz. Menos de 30 anos depois da reforma da Matriz, cuja estrutura começava a ruir e as dimensões não mais comportavam a população católica, optou-se por sua demolição e pela construção de uma nova Igreja no mesmo terreno, embora mais recuada em relação à rua. Para tal, foi necessário arrasar o morro que anteriormente também abrigava o ce-mitério São José, atrás do templo. Assim, em 1952, constituiu-se uma comissão de obras en-carregada da construção da nova Matriz. Sobre a direção de Frei Brás Reuter, a comissão recebeu, em janeiro de 1953, o arquiteto Gottfried Böhm para dar início ao projeto, sendo este atribuído a ambos, e revelando especial ligação com a obra precedente de Dominikus.

3.1.7. Projeto x Execução

Apesar da visita de Gottfried Böhm a Blume-nau, e das visitas sucessivas deste também a Brusque, ocorreram algumas discrepâncias entre projeto e exe-cução. Uma delas corresponde ao tratamento do ter-reno no nível da rua (Imagem 25). Para a face frontal do templo o arquiteto previu uma grande esplanada, acima de um volume contíguo à torre destinado a co-mércios. Este volume se caracterizava por sua hori-

Imagem 24 – Igreja Reformada.Imagem 23 – Rua XV de Novembro, Blumenau. Ao fundo, a primeira Matriz deBlumenau, 1876.

Imagem 22 – Heinrich Krohberger, Pri-meira Matriz de Blumenau, 1876.

Imagem 25 – Foto da maquete da Igreja Matriz São Paulo Apóstolo.

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zontalidade, reforçada por duas grandes lajes de concreto (no nível intermediário e na cobertura) e janelas em fita. Isso conferia certo alargamento do terreno e também certa ampliação de visão para a igreja.

Além disso, percebe-se que o volume da torre foi levemente simplificado: originalmente ela abrigava cinco nichos para sinos (Imagem 26), o que foi reduzido para três (Imagem 27). Apesar de tais modificações, o valor arquitetônico e a monumentalidade da edificação não foram prejudicados.

A mais sutil das mudanças ocorridas, mas talvez a que mais tenha alterado o sentido estético idealizado pelos arquite-tos, é a pintura branca dos elementos de concreto original-mente aparente. Estas superfícies foram idealizadas pelo arquiteto como forma de expressão, expondo as marcas de sua feitura, a cor do concreto, bem como sua textura rugosa e aspecto rude. Entretanto, o mesmo valor expressivo reco-nhecido na pedra não foi contemplado no concreto, que foi, então, recoberto por uma camada de pintura branca.

3.1.8. Repercussão: A Influência da Igreja São Paulo Apóstolo na cons-

trução de templos em Santa Catarina

Apesar da resistência inicial da população blumenauense em relação ao novo es-tilo da construção, que assumiu diversas influências tanto europeias – o que se destaca na concepção do templo enquadrado nos moldes do Movimento da Reforma Litúrgica, e com

forte influência perretiana -, quanto locais – ao incorporar materiais da região -, a influência de sua arquitetura sobre outros exemplares no Estado é notável. Exemplo disso é a Igreja de Nossa Senhora da Conceição (Imagem 28), em Rio dos Cedros: o templo consiste, assim como a Igreja São Paulo Apóstolo, em um prisma retangular, cuja cobertura compõe-se de uma sequência de pequenos arcos apoiados sobre pilares visíveis desde o exterior. A mesma marcação externa dos apoios pode ser verificada na Igreja Nossa Senhora de Lourdes (Imagem 29), em Santa Maria/Benedito Novo, que também apresenta elementos em concreto aparente e separa a torre sineira do massivo volume principal.

Imagem 26 – Desenho original da torre elaborado por Got-tfried Böhm.

Imagem 27 – A torre como foi construída,com algumas modificações.

Imagem 28 – Igreja Nossa Senhora da Conceição, Rio dos Ce-dros.

Imagem 29 – Igreja Nossa Senhora de Lourdes, Santa Maria/Benedito Novo.

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3.2. Igreja Matriz São Luiz Gonzaga - Brusque (SC) 21

3.2.1. Apresentação

Localizada no centro da cidade catarinense de Brusque, o volume monumental da Igreja Matriz São Luis Gonzaga (1955-1962) é o terceiro projeto construído pela parceria entre os arquitetos Dominikus Böhm e Gottfried Böhm no Brasil. Já incumbidos, em 1953, de projetar a Igreja Matriz São Paulo Apóstolo na vizinha Blumenau, os arquitetos são nova-mente chamados a realizar outra grande obra no Vale do Itajaí.22

3.2.2. Histórico

Hoje com pouco mais de 100 mil habitantes e economia baseada no setor têxtil, me-tal mecânica e serviços23, Brusque ilustra um exemplo de colonização que tomou espaço no Vale do Itajaí no decorrer do século XIX: um processo iniciado por imigrantes alemães24 e sucedido por diversas nacionalidades até chegar aos poloneses, momento no qual a cida-

21 Os desenhos originais da Igreja Matriz São Luiz Gonzaga reunidos pelos autores pode ser verificado no CD em anexo.

22 No capítulo “Biografia” são enumeradas demais obras significativas dos arquitetos. Aceita-se aqui a ideia de que, assim como no projeto de Blumenau, a Igreja de Brusque guarda estreitas relações com a obra de Dominikus Böhm - o que é revelado pelas próprias obras, como pretende-se demonstrar -; por isso sua obra será enfatizada, e não a de Gottfried, que estava iniciando sua carreira na época.

23 Disponível em http://www.ibge.gov.br/cidadesat/painel/painel.php?codmun=420290 (Último acesso em junho de 2013).

24 Cabral, Oswaldo Rodrigues. Brusque: Subsídios para a História de uma Colônia nos Tempos do Império. 1958.

de começou a lograr êxito industrial na área de têxteis com nomes como Renaux, Buettner e Schlösser.25 Segundo o IBGE, a escassez de meios de comunicação e as distâncias que sepa-ravam as famílias dos primeiros imigrantes no ano de 1861 não arrefeceram os ânimos dos colonos, que ergueram quatro templos católicos e um evangélico na região. A primeira Igreja Matriz São Luis Gonzaga (Imagem 30), com características neogó-ticas, data de 1877 e se encontrava no local ocupado hoje pela Nova Matriz. Em 1949, a necessidade de mais espaço fez com que se avaliasse a situação e, apesar de já efetuadas pequenas alterações no corpo da igreja existente - como duas ampliações nas laterais da torre (Imagem 31) - o Padre Luiz Gonzaga optou pela concepção de um novo projeto, com vistas à comemoração do centenário da cidade de Brusque em 1960.26

25 Renaux, Maria Luiza. Colonização e Indústria no Vale do Itajaí: o Modelo Catarinense de Desenvolvimento. s.l. : Instituto Carl Hoepcke, 2010.

26 Koch, Eloy Dorvalino. Catolicismo em Brusque: Recrdação do Centenário. s.l. : Sociedade Amigos de Brusque.

Imagem 30 – Igreja Matriz São Luis Gonzaga, primeiro projeto, 1877. Imagem 31 – Igreja Matriz São Luis Gonzaga, projeto ampliação (volu-mes ao lado da torre),1949.

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Em função disto, formou-se uma comissão para avaliar possíveis projetos, dentre os quais se destacava a proposta do arquiteto alemão Simão Gramlich (1887-1968). Bastante conhecido por suas contribuições a diversas cidades do estado como Azambuja, Gaspar, Itajaí, Rio do Sul, Jaraguá do Sul e São Bento do Sul, o arquiteto foi requisitado em tal circunstância.27 Contudo, apesar de sua obra ser admirada e muito solicitada, a comissão responsável escolheu para execução o projeto elaborado por Dominikus e Gottfried Böhm, também responsáveis pelo desenho da Igreja Matriz de Blumenau, então em construção. Segundo o livro “Catolicismo em Brusque: Recordação do Centenário”, não houve justifica-tiva para esta mudança.28

A escolha do projeto é curiosa, uma vez que Brusque era então uma cidade muito pe-quena, com cerca de 32 mil habitantes em 1950.29 Apesar disso, as autoridades da cidade se identificaram mais com um projeto ousado e monumen-tal, de autoria de dois arqui-tetos alemães, que seguiam uma linha arquitetônica extre-mamente moderna se com-parada à obra de Gramlich, tomando como exemplos as igrejas das cidades vizinhas Itajaí e Rio do Sul (Imagens 32 e 33, respectivamente). Em Blumenau, o elevado

27 Koch, Eloy Dorvalino. Catolicismo em Brusque: Recrdação do Centenário. s.l. : Sociedade Amigos de Brusque.

28 Idem.

29 Segundo contato direto com o IBGE-SC.

custo dos projetos de Gramlich30 foi um dos motivos de recusa, sendo então escolhidos os arquitetos Dominikus e Gottfried. No caso de Brusque a justificativa não é clara. Com relação ao sítio de implantação, o exemplo brusquense, assim como em Blumenau, está inserido em área de topografia elevada, ressaltando a Igreja como um importante mar-co visual na cidade, que encontra paralelo na torre da igreja luterana (Imagem 34).

3.2.3. A Nova Matriz

Nos percursos ao longo da área central de Brusque, é difícil deixar de perceber a grandiosidade do templo católico dedicado a São Luis Gonzaga. Suas linhas emergem no horizonte visíveis de diversos pontos da cidade, elevando o olhar dos transeuntes à gran-de cobertura em concreto aparente. Esta estrutura, por sua vez, é sustentada por duas tor-res esbeltas que comportam os sinos e ladeiam uma longa escadaria de acesso ao templo. Os traços fortes da edificação deixam clara a intenção dos arquitetos Dominikus e Gottfried Böhm de conceber um monumento sacro uma vez que, aliado à topografia local, o volume remete à monumentalidade verificada em grande parte dos projetos dos arquitetos. Exter-namente, verifica-se a ideia de um corpo único, com volumetria clara e bem marcada na paisagem local.

30 Bohn. Antônio Francisco. A Igrejas de Simão Gramlich. Blumenau em cadernos, tomo XLII - n-5/6 - Maio/Junho - 2001 pg 40.

Imagem 32 – Simão Gramlich, Igreja Matriz do Santís- simo Sacramento, Itajaí, 1940-1955.

Imagem 33 – Simão Gramlich, Catedral São João Batista, Rio do Sul, 1949-1957.

Imagem 34 – Foto panorâmica com destaque às torres das igre-jas católica (esquerda) e luterana (direita).

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Apesar de ser a expressão da nova concepção de templos, reflexo de uma profunda mudança de paradigmas na Igreja Católica, o edifício evoca opiniões bastante divergen-tes. Uma das maiores críticas ao templo se deve pela austeridade dos materiais utilizados, que não evocam tão claramente a sensação de acolhimento por vezes presente nos tem-plos tradicionais. Além disso, as cores utilizadas dialogam com tons tipicamente nórdicos, em detrimento das cores tidas como mais aprazíveis das regiões tropicais.31 O tipo de pedra utilizado, em tom acinzentado, é proveniente de uma pedreira local e foi questionado pois na ocasião da construção houve a sugestão de importar pedras de Blumenau, em tons ro-sáceos, recusada pelo arquiteto por não condizer com o preceito de ofertar a Deus os dons naturais da cidade.32 Assim como em muitas obras de Dominikus e Gottfried, a aliança entre materiais simples como pedras e tijolos com o concreto armado, especialmente em seu estado apa-rente, é largamente explorada no templo em questão. Conforme dito, os anos 1920 e 1930 aproximaram o nome de Dominikus com o expressionismo alemão. Posteriormente, essa linguagem continuou a acompanhar a obra do arquiteto, o que pode ser percebido a partir de inúmeras características recorrentes, a exemplo da aliança entre materiais rústicos e a luz, exaltando uma forte dramaticidade. Assim como o pai, Gottfried também sorve da fonte expressionista, contudo, este adentrará em experimentações formais mais intensas em suas obras dos anos 1960, quanto também se verifica uma aproximação do arquiteto com a corrente brutalista da arquitetura.33 Embora a Igreja São Luis Gonzaga não represente um dos exemplos mais ousados na obra de Dominikus e Gottfried, revela-se a forte autoria pa-terna devido à congruência às suas obras precedentes, mesmo apesar de seu falecimento antes da finalização do edifício. A ausência de ornamentos tanto no exterior quanto no interior é mais um fator que

31 Koch, Eloy Dorvalino. Catolicismo em Brusque: Recordação do Centenário. s.l. : Sociedade Amigos de Brusque.

32 Koch, Eloy Dorvalino. Catolicismo em Brusque: Recordação do Centenário. s.l. : Sociedade Amigos de Brusque.

33 No capítulo “Biografia” são expostas algumas obras do arquiteto que flertam com o brutalismo.

chama a atenção quando se compara a obra a outros exemplares de edificações religiosas da região, a começar pelos projetos gramlichianos. As linhas claras do volume principal alia-das ao mobiliário em traçados simples compõem um espaço que poderia ser classificado como moderno. Os poucos elementos decorativos existentes no altar-mor foram inseridos posteriormente, uma vez que, originalmente, os efeitos de luz e sombra, a exploração da textura dos materiais e a monumentalidade do espaço eram suficientemente responsáveis pela configuração espacial do templo. A posição central do edifício aliada à localização em terreno elevado exaltam o ca-ráter monumental da edificação e fazem dela um ponto importante na cidade. Na Imagem 35 pode-se observar a cobertura do templo, que para uma cidade majoritariamente for-mada por edifícios de pequeno porte na década de 1950, tem um forte impacto. A grande escala do templo também pode ser verificada na Imagem 36, onde se exalta os grandes arcobotantes utilizados nas fachadas laterais do edifício.

Imagem 35 – Vista do telhado da Igreja Matriz São Luis Gonza-ga, em construção. Década de 1950.

Imagem 36 – Vista dos arcobotantes da Igreja Matriz São Luis Gonzaga, em construção. Década de 1950.

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Polêmicas à parte, a Igreja São Luis Gonzaga – bem como a Igreja Matriz de Blumenau (Imagens 37 e 38) - é um marco da arquitetura moderna no Estado. As seme-lhanças entre os projetos religiosos para Brusque e Blu-menau se dá externamente pela volumetria prismática dos edifícios e pela configuração da torre em arco. En-tretanto, no que diz respeito à articulação do volume da torre com o restante do edifício, Brusque se revela um exemplo particular na obra de Dominikus e Gottfried: di-ferentemente de muitos dos exemplares nos quais a torre se impõe como monumento descolado do volume princi-pal, como em Blumenau, em Brusque ela se conecta ao volume principal, sustentando a cobertura e estendendo o átrio para a escadaria de acesso ao edifício, o que, aliado ao tratamento em vitrais da fachada principal,

faz uma sutil transição entre o espaço exterior e o interior. A edificação também faz referência a trabalhos de Domi-nikus e Gottfried na Europa (Ima-gens 39 e 40, respectivamente), tanto no que diz respeito ao tratamento volumétrico, quando aos efeitos espaciais verificados nos interiores. Os portais rode-ados por vitrais utilizados tanto em Blumenau, como em Brus-

que, assim como os arcobotantes presentes da Igreja de São Luis Gonzaga, são comuns às obras dos arquitetos e consistem em releituras historicistas de elementos do estilo gótico. Além disso, a qualidade arquitetônica da Igreja Matriz São Luis Gonzaga não reside somente na sua concepção como arquitetura, mas como monumento e ponto nodal impor-tante no centro da cidade, a partir de sua relação com a malha urbana adjacente (Imagem 41 e 42). Na imagem 41 observa-se a interferência clara da implantação do templo na ci-dade, a partir da liberação de um eixo visual no alinhamento da edificação. Nesta época começaram a ser construídos os primeiros edifícios em altura da cidade, o que, entretanto, não prejudicou a monumentalidade da edificação religiosa. Já na Imagem 42, a dominação da quadra torna clara a importância do volume na malha viária, bem como da massa ver-de adjacente.

Imagem 37 – Dominikus e Gottfried Böhm, Igreja Matriz São Luis Gonzaga, Brusque, 1955-1962. Croqui.

Imagem 38 – Dominikus e Gottfried Böhm, Igreja Matriz São Paulo Após-tolo, Blumenau, 1953-1958. Croqui.

Imagem 39 – Gottfried Böhm, Interior da Igreja St. Konrad, Neuss, 1953-1959.

Imagem 40 – Gottfried Böhm, Igreja St. Albert, Saarbrücken, 1951-1953.

Imagem 41 – Vista da Igreja Matriz São Luis Gonzaga (em construção) perante a avenida adjacente.

Imagem 42 – Vista da Igreja Matriz São Luis Gonza-ga na malha urbana.

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3.2.3.1. O Projeto

Espacialmente, o templo dispõe sua planta retangular e uma área de apoio lateral (Imagens 43 e 44) no alinhamento leste/oeste. O volume prismático com cobertura abo-badada e nave dividida com pilares esbeltos faz alusão à tripartição da nave principal e demonstra a simplicidade do projeto. Este quesito foi bastante propagado pelo Movimento da Reforma Litúrgica, que pedia pela simplificação nos rituais e na organização dos es-paços, maior proximidade e participação do público (que não é mais tão somente o fiel-

-observador), com todos os espaços visíveis e, ao invés de várias naves, espaços centrais com naves laterais reduzidas. Há ainda um volume anexo ao prisma retangu-lar do corpo da Igreja. Ele compreende os espaços de apoio às atividades litúrgicas, como depósitos, ba-nheiro, escada de acesso ao órgão, além uma saída independente. Por se tratar de um espaço secundário, o tratamento atual do interior deste volume não segue as mesmas características de tratamento do interior do templo. A iluminação se dá por grandes aberturas fron-tais e traseiras cobertas com vitrais e pequenas janelas pivotantes laterais. Além disso, há ainda que se des-tacar a disposição de aberturas superiores, que aqui se inserem como clerestórios, além dos alongamentos das abóbadas, as quais funcionam como espécies de prateleiras de luz. A edificação está imersa na massa vegetal ad-

jacente, com sua verticalidade conferin-do imponência ao projeto, característica bem explorada pelos arquitetos. (Imagem 45). Apesar da concepção volumétrica simples, o edifício ganha ares de corpo complexo e engenhoso, típico de uma catedral gótica, ao lançar para fora do prédio parte de sua estrutura à maneira de exoesqueleto. Os grandes arcobotan-tes acompanham todo o comprimento da igreja, sustentando as paredes e a cober-tura abobadada (Imagem 46). Em uma análise mais detalhada vê-se claramente o traço gótico presente no desenho das linhas gerais da igreja, assim como a grande torre debruçando-se pela escadaria em pedra. A união desses elementos com o revestimento em pedras cinzentas cria uma atmosfera num primeiro momento fria e distante, o que é acentuado pela escala monumental. A grande torre sineira apresenta quatro sinos e é unida ao volume principal, funcionando como um portal que diferencia o universo mundano e o eclesiástico. Nas obras de Dominikus é co-mum a existência do grande átrio e da escadaria que o precede, ambos tendo como ponto final a nave em grande altura, que se eleva muito acima do horizonte. As pedras originárias das redondezas revestem o templo e remetem a algo primitivo, dosando características tradicionais, locais e inovadoras. Um detalhe observado na visita feita ao edifício é que ao se subir as escadas vê-se uma pequena capela lateral coberta por vegetação que é utilizada por fieis para a disposição de velas. Este pequeno volume não consta no projeto original, mas não interfere na apreensão do templo como um todo. No acesso é bastante visível a textura da pedra sendo banhada pela luz solar, o que acentua a beleza natural do material. Este efeito é primordial na arquitetura de Domini-

Imagem 43 – Planta esquemática indicando as principais medidas.

Imagem 44 – Corte esquemático indicando as principais medidas.

Imagem 45 – Entrada principal. Imagem 46 – Detalhe: Arcobotantes.

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e os pilares que acompanham os arcobotantes atri-buem certo ritmo às grandes e altas paredes laterais em pedra. Assim como em Blumenau, o batistério é frontal e somente diferencia-se do primeiro exemplo ao fundir-se no corpo principal. A obra se destaca pelo arrojo com que os arquitetos conduzem a concepção. Desde a planta extremamente simples, até as reinterpretações da tradição católica, a versatilidade é amparada por um vocabulário estético amplo e livre de amarras. Como um dos arquitetos mais influentes no programa religioso europeu do século XX, Dominikus mantém nessa obra o padrão que é visto em muitos de seus edifícios, a despeito das críticas estilísticas, manten-do-se fiel à linha seguida na Europa. Já Gottfried, aqui ainda sob forte influência paterna, receberá maior visibilidade nos anos 1960, quando se dedica a experimentações ousadas envolvendo a desconstrução do espaço sacro. Desta maneira o arquiteto desliga-se bruscamente do vocabulário dito tradicional, sem deixar, contudo, conceitos geradores da arquitetura do pai, como a dramaticidade gótica e a cor-pulência volumétrica do românico.

3.3. A Contribuição de Dominikus Böhm

Considerado um dos maiores nomes da arquitetura religiosa do século XX, Dominikus Böhm foi autor de exemplos paradigmáticos, que representaram uma verdadeira revolução

kus e Gottfried e os arquitetos se valem dele para criar uma atmosfera dramática em suas obras.34 O interior é sobriamente decorado e sem acabamentos aplicados aos fechamen-tos, feitos em pedras locais e concreto armado deixado aparente35, o que alude certamente à obra de Auguste Perret (1874-1954). Entretanto, a relação com o mestre francês não se dá somente a partir do material, mas também pela referência às catedrais góticas. Na Igreja Notre-Dame-du-Raincy (1923-1924), de Perret, vêem-se as mesmas linhas geratrizes simples presentes em Brusque e o concreto utilizado com tal perspicácia que dão à igreja uma sole-nidade ímpar. Ainda anexa à referência perretiana tem-se os abundantes fechamentos em vitrais (Imagem 47), ora fixados em aço, ora realizando o fechamento dos cobogós (Imagem 48), que acompanham boa parte do comprimento da igreja. Nas paredes adjacentes ao altar, o pano de vitrais se estende até o chão, iluminando esta região do templo com maior intensidade. Estão representados nos vitrais símbolos do cristianismo, como o peixe, a uva,

a cruz e o ramo de trigo. O altar-mor é protegido por um baldaquino abobadado que é rica-mente iluminado (Imagem 49). O mesmo tratamento das paredes do altar é utilizado na fachada frontal (Imagem 50), também coberta de vitrais ao longo de todo o pé-direito. Entretanto, há uma diferença significativa no nível de iluminação percebido pelo observador: a fachada principal está protegida pela extensão da cobertura, que alcança o átrio e a escadaria de acesso. Isto confere à região um sombreamento maior, mesmo nas horas de insolação direta, quando incide maior quantidade de luz no altar, a par-tir do qual os arquitetos definem a hierarquia espacial dentro do templo. As capelas laterais, por sua vez, são demarcadas externamente por saliências

34 No capítulo “Biografia” especula-se mais profundamente sobre o uso da luz nas demais obras do arquiteto.

35 Segundo Koch, para o concreto armado poder-se-iam aplicar as mesmas decisões tomadas para a igreja de Blu-menau, pintura clara (não branca), de partes que não fossem em pedra. Atualmente se verifica que não foram aplicadas tais medidas, ficando o concreto armado aparente.

Imagem 47 – Vitrais do batisté-rio.

Imagem 48 – Cobogós presentes na parede frontal e próximo ao altar.

Imagem 49 – Vista do altar-mor. Imagem 50 – Vista da entrada principal a partir do interior.

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na forma de conceber templos, influenciando arquitetos e obras no mundo inteiro. Böhm tam-bém foi um importante condutor do Movimento pela Reforma Litúrgica no início do século na Alemanha, adiantando em cerca de cinquenta anos alguns pontos colocados no II Concílio Vaticano, de 1962, como a localização do altar junto aos fieis36. Dominikus tornou-se, pou-co tempo depois de construída sua primeira igreja, no final dos anos 1910, autoridade na construção religiosa, com muitas obras construídas no final dos anos 1920. Este fato também justifica seu reconhecimento no Brasil, e sua suposta indicação pelo papa para os projetos brasileiros cujos desenhos não se limitam aos da Matriz de Blumenau: já em 1937 Domi-nikus concebe o projeto não executado de uma igreja de pequenas dimensões para uma comunidade alemã em Timbó (Imagem 51); posteriormente, projeta a igreja Matriz de Pre-sidente Getúlio37 (1953-1954), a única de todas as obras brasileiras que pode ver comple-tamente realizada (Imagem 52); seguem-se, então os projetos da Matriz de Blumenau e de

36 Voigt, Wolfgang; Flagge, Ingeborg (org.). Dominikus Böhm (1880-1955). Tübingen, Berlin: Ernst Wasmuth Verlage, 2005, p. 7

37 Mais informações sobre a Igreja de Presidente Getúlio podem ser encontradas nos Apêndices deste caderno.

Brusque, estes três últimos executados e realizados em parceria com Gottfried Böhm, além de dois projetos posteriores não executados para as cidades de Tubarão (Imagem 53) e Joinville (Imagem 54), de autoria somente de Gottfried. Todos os planos realizados pelos arquitetos no Brasil destinaram-se a cidades catarinenses. Não há relatos explicando como e por que Dominikus foi contatado para elaborar os projetos no Brasil, questionamento que surge especialmente quando pensamos em cidades tão pequenas como Timbó e Presidente Getúlio. Também não há esclarecimentos a respeito das circunstâncias de elaboração e execução dos projetos. O que se pode sugerir, entre-tanto, é que os projetos tenham representado oportunidades de trabalho para o arquiteto, especialmente no caso da cidade de Timbó, cujo plano foi concebido no contexto de uma Europa que se preparava para a guerra. Projetos particulares escasseavam, especialmente para arquitetos como Dominikus, cuja visão estética desvinculava-se da linha cultural estipula-

Imagem 51 – Dominikus Böhm, Igreja para Timbó (SC), 1937. Projeto. Imagem 52 – Dominikus Böhm, Igreja Matriz de Presidente Ge-túlio (SC), 1954. Desenho do autor. (SC), 1937.

Imagem 53 – Gottfried Böhm, Igreja para Tubarão (SC), 1957. Projeto.

Imagem 54 – Gottfried Böhm, Igreja pra Joinville (SC), 1958. Projeto.

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da pelo Nazismo. Esta afirmação é sustentada pelo fato de o arquiteto ter produzido, no período em questão, grande número de projetos que não foram construídos. O mesmo ocorre no pós-guerra, quando o mercado da construção civil ainda não havia se recuperado totalmente, e os programas se restringiam a construções emergenciais, como igrejas e abrigos, em cujos projetos destacam-se os nomes de Rudolf Schwarz e Otto Bartning. Neste sentido, as obras no Brasil também representaram alternativa de trabalho para Böhm no imediato pós-guerra. Através de sua obra, Dominikus dá início a uma importante tradição familiar dentro da construção religiosa – que já tinha no pai um construtor ligado ao mercado – e que hoje se encontra na terceira geração, destacando-se, naturalmente, a obra de Gottfried, que atingirá o auge produtivo e grande notoriedade nas décadas de 1960 e 1970.

Arquiteto e pro-fessor, Dominikus Böhm soma cerca de cinquenta e cinco projetos em sua obra religiosa, dentre os quais se destacam Chris-tkönig Kirche (1926), em Bischofsheim (Imagem 55) e St. Josef Kirche (1929-1931) em Hinden-burg (Imagem 56), que serviram de inspiração a muitos arquitetos de sua geração. Sua obra se destaca especialmente nos anos 1920 e 1930,

onde tem lugar as maiores ousadias e experimentações a que se permitiu, flertando com os elementos do espaço gótico, a opulência do românico, e o expressionismo. Em algumas circunstâncias seus projetos corporificam o Stadtkrone expressionista – coroamento da cida-de, edifício que nasce arraigado ao solo e cuja força interna reverbera pela atmosfera (ver, a propósito, desenhos expressionistas de Bruno Taut, Hans Scharoun, irmãos Luckhardt), fundado no mito do cristal. Entretanto, justamente por permitir a presença de elementos da arquitetura tradicional de templos – como tetos abobadados, arcos ogivais – seu trabalho não recebe equivalente tratamento à obra daqueles ou de Erich Mendelsohn, por exem-plo. Antes de se locomover por ruidosas novidades, a postura de Böhm era muito mais silenciosa, baseada num amplo conhecimento do trabalho de seus predecessores e das tradições arquitetônicas - que diferenciava entre o bom e o ruim, não entre o novo e o velho – e permitia manter vivas certas tradições que julgava válidas e coerentes para o presente. Sua obra dos anos 1920 e 1930 difere substancialmente do modernismo “heroico” que nos acostumamos a vislumbrar nos livros de história. Vale lembrar, porém, que a arquitetura que realizava representava a maioria dentro do cenário arquitetônico da época, muito mais do que os críticos e historiadores gostariam de admitir. Sua obra inclui-se junto a nomes como Hans Poelzig, Paul Bonatz e Fritz Höger, os quais solicitavam grandes avanços técnicos e ousadias formais em suas obras, sem se descuidar, porém, de soluções mais tradicionais ou do uso de certas convenções arquitetônicas. Ainda assim, sua obra é essencialmente trans-gressora, usando a tradição a favor de uma linguagem totalmente nova e reformulada, no limite entre o moderno e o tradicional.

Imagem 55 – Dominikus Böhm, Christkönig Kirche, Bischofsheim, 1926.

Imagem 56 – Dominikus Böhm, St. Josef Kirche, Hindenburg, 1929-1931.

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3.4. Referências identificadas nas obras brasileiras de Dominikus Böhm

Sutilmente o templo familiariza o espectador com a nova arquitetura apresentada, envolvendo-o com uma harmonia de linhas, formas e materiais. Despreza os adornos da arquitetura tradicional e incorpora uma diversidade sutil de materiais, mantendo-os ao na-tural, o que enriquece a obra sem clamar por adições aleatórias de elementos figurativos e gratuitos. Assim, Dominikus e Gottfried tiram partido da expressão do concreto aparente e da pedra, dando destaque à estrutura de pilares e abóbodas em concreto armado, além de valorizarem as texturas aliando-as à iluminação natural. Isso os aproxima da corrente brutalista – uma manifestação arquitetônica dentro do Movimento Moderno -, que à época se desenvolvia em diversos países com características próprias, inclusive no Brasil. Além disso, outra clara influência tanto no projeto de Blumenau, como em muitos outros projetos de Dominikus, é de Auguste Perret. Isso se verifica especialmente na concep-ção do interior: no caso da Igreja de São Paulo Apóstolo, a aproximação se dá através da concepção da igreja basilical, dos pilares pontuais demarcando a nave principal, em alusão à nave tripartida, e as lajes levemente abobadadas, concebida originalmente em concreto aparente - revelando forte correspondência com Notre-Dame du Raincy. Vale ressaltar que Dominikus já utiliza o concreto aparente em seus projetos desde a década de 1920, bem antes, portanto, deste material ganhar importância dentro da construção religiosa, e da arquitetura em geral, principalmente a partir dos anos 1960.

3.5. A Reforma na Liturgia e seu Reflexo na Arquitetura dos Templos

Pode-se dizer que uma nova concepção de templos começou a ser esboçada na década de 1920, quando traços historicistas passaram a ser negados e substituídos por linguagens mais atualizadas. Embora mudanças significativas tenham ocorrido na pintura e na arquitetura já na virada do século XIX para o século XX, foi somente a partir de 1920 que o conceito de arte sacra passou a ser questionado na Europa.38 Aproveitando-se dos questionamentos trazidos pelo Movimento Moderno, a liturgia católica foi adaptada, abrin-do caminho para um imenso campo de experimentação na arquitetura das igrejas39. Neste momento, países como Bélgica, Alemanha e França encabeçaram um movimento para tor-nar os ritos católicos mais compreensíveis e permitir maior participação dos fiéis.40 A reformulação dos parâmetros que fundamentam a concepção de edifícios religio-sos foi reconhecida e difundida pela própria Igreja Católica no II Concílio Vaticano, entre 1952 e 1965. Nesse encontro de bispos e especialistas do mundo inteiro, a Igreja procurou assumir uma atitude de abertura em conformidade com o mundo moderno. Nela estava inclusa a liberdade de expressão em formas contemporâneas, a proposta de se resgatar a nobre simplicidade da liturgia dos primeiros tempos do cristianismo. Acreditava-se que, assim, o templo seria a expressão do seu próprio tempo, o que aproximaria o fiel e o deixa-ria menos intimidado e mais participativo. Até então, as missas se faziam num clima arcaico,

38 Ruf, Sep. German Church Architecture of the 20th century. Munique, 1964.

39 Embora esta mudança espacial e arquitetônica seja perceptível tanto nas igrejas católicas (com nomes impor-tantes como Rudolf Schwarz e Dominikus Böhm) quanto nas evangélicas (principalmente com o arquiteto Otto Bartning), trataremos somente das primeiras, pela aproximação que permitem com as obras aqui estudadas.

40 Derntl, Maria Fernanda. Disponível em: http://www.revistaau.com.br/arquitetura-urbanismo/151/maria-fernanda--derntl-escreve-sobre-a-evolucao-dos-projetos-de-33677-1.asp (Último acesso: abril de 2014)

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centralizado no clero e herdado da Idade Média. O II Concílio Vaticano também admitiu que as missas fossem realizadas na língua vernácula de cada país em lugar do latim, e que o sacerdote passasse a presidir a celebração de frente para a assembleia. Entretanto, espacialmente não se impuseram regras precisas,41 o que contribuiu para estimular um clima de experimentação. Arquitetos alemães como Rudolf Schwarz e Dominikus Böhm foram pio-neiros em procurar manifestar um novo entendimento da liturgia em termos arquitetônicos. Parte disso é o ímpeto de remover cada indivíduo de seu isolamento, tornando o divino mais acessível dentro do templo. Este encontro se dá com base na sagrada comunhão, representada pela refeição em que Deus comunica sua presença. Assim, o ritmo do culto passa a ser entendido como o de um jantar, no qual o centro é a mesa, ou o altar, e onde nenhum espaço interdito é permitido entre a mesa e a congregação – ou entre Deus e o fiel -, sendo a abertura do espaço para o altar, a expressão sensível do gesto daquele que chama para a refeição. É a esta nova concepção que se submete o novo programa religioso. Entretanto, além de espaço para abrigar o culto, realizado em grandes grupos, a Igreja também deve abrigar a meditação, que surge após as celebrações e envolve indivíduos sozinhos ou em pequenos grupos. A nova teologia prega que, neste momento, deve se formar no fiel a sensação de vazio interior, nos quais os efeitos de cor, material e proporção são de importância inquestionável ao evocar a quietude e a paz, elevando os pensamentos do indivíduo e concentrando seus sentidos em Deus, representado no altar42. Isso explica, por exemplo, a importância dada à iluminação desta região.

41 Derntl, Maria Fernanda. Disponível em: http://www.revistaau.com.br/arquitetura-urbanismo/151/maria-fernanda--derntl-escreve-sobre-a-evolucao-dos-projetos-de-33677-1.asp (Último acesso: abril de 2014)

42 Ruf, Sep. German Church Architecture of the 20th century. Munique, 1964.

3.5.1. Obras Paradigmáticas

Inúmeras obras foram surgindo ao longo desta reestruturação da Igreja Católica, marcando as diversas fases pelas quais ela passou. Um dos primeiros experimentos consis-tentemente realizado, abandonando formas de historicização na arquitetura sacra é a Igre-ja de Corpus Christi (Imagens 57 e 58) em Aachen, projetada por Rudolf Schwarz.43 Nela, o arquiteto rompe com a carga retórica herdada do passado e anula separações espaciais, procurando aproximar os fiéis do foco da celebração. No entanto, a congregação ainda é ordenada no esquema tradicional de procissão, e o púlpito é elevado em referência à

tradicional nave longitudinal, relaciona-da com ideia de um itinerário interior. A construção é feita em concreto armado, com tijolos e gesso como fechamento e acabamento, ressaltando o emprego de materiais novos. Entretanto, seu severo racionalismo pode, por vezes, evocar mais uma fábrica do que uma igreja44, argumento utilizado pelos críticos desta nova arquitetura de templos, que acu-sam a transformação do espaço sagra-do em mero espaço de reuniões, despi-do de qualquer conexão com o divino.

Outra construção que merece destaque

43 Ruf, Sep. German Church Architecture of the 20th century. Munique, 1964.

44 Derntl, Maria Fernanda. Disponível em: http://www.revistaau.com.br/arquitetura-urbanismo/151/maria-fernanda--derntl-escreve-sobre-a-evolucao-dos-projetos-de-33677-1.asp (Último acesso: abril de 2014)

Imagem 57 – Rudolf Shwarz, Igreja de Corpus Christi, Aachen, 1928-1930.

Imagem 58 – Rudolf Shwarz, Igreja de Corpus Christi, Aachen, 1928-1930. Interior.

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neste contexto é a Igreja de Holy Cross Osnabrück/Schinkel, projetada por Dominikus Böhm em 1932 (Imagens 59 e 60), na qual também se verifica o esquema da ordem processional, e onde se destaca o emprego de tijolos, material pouco utilizado em templos até então, deixado aparente tanto interna, quanto externamente. Como exemplo de uma das primeiras experiências de uma construção com disposi-ção concêntrica desenvolvida em torno do púlpito tem-se a Igreja Star (Imagem 61), projeto não executado de Otto Bartning em 1922. Apesar disso, o templo é considerado o respon-sável por inaugurar a renovação arquitetônica da Igreja Protestante.

Entretanto, um dos exemplos mais representativos do abandono da historicização, aliado ao respeito pela tradição é a Kaiser-Wilhelm-Gedächtniskirche, projeto de Egon Eiermann em Berlim na década de 1950 (Imagens 62 e 63). O arquiteto preservou a ruína neorro-mânica da torre da antiga igreja, bombardeada durante a Segunda Grande Guerra, e projetou um volume octogonal de estrutura metálica e fechamentos duplos tipo “colmeia”

em argamassa e vidro que, através da simplicidade do desenho e da pureza geométrica do volume contrasta com o desenho rebuscado da ruína. Cabe ainda destacar a importância de outro exemplo tardio na configuração de novos espaços sa-crais: a Capela de peregrinação de Notre-Dame-du--Haut (1950-1955), em Ronchamp, na França. Projetada por Le Corbusier, a obra ajudou a alterar a história da arquitetura e contribuiu para introduzir no desenho de igrejas a exploração de formas livres e escultóricas. A expressividade da obra alcança sua clara tradução na cobertura de concreto armado, cuja plasticidade foi explorada com maestria. Entretanto, os diversos trata-mentos das fachadas evitam monotonia e repetição45 e também contribuem para o efeito monumental do templo ao valer-se de diversos tamanhos de aberturas ou do engrossamento de uma das paredes, por exemplo. Destaca-se ainda a sensibilidade da obra em relação à paisagem. Segundo William Curtis46, “o tapete de grama que desce até o pé da colina agora se torna a ‘nave’ de uma igreja criada na natureza”, afirmação que exalta a força da arquitetura que, mesmo mo-numental e com uma entrada sutil, está integrada ao entorno. O volume maciço da torre e as superfícies onduladas nas paredes e na cobertura reverberam as pressões impostas pela paisagem no entorno. Além disso, através dos jogos de luzes o arquiteto desconstrói a noção sólida que se tem do lado de fora e torna as superfícies planares e finas por dentro, enriquecendo a experiência espacial conforme o percurso do observador.

45 Montaner, Josep Maria. Depois do Movimento Moderno: Arquitetura da Segunda Metade do Século XX. Bar-celona: Ed. Gustavo Gili, 2001.

46 Curtis, Wiliiam. A Arquitetura Moderna desde 1900. Porto Alegre: Bookman, 2008.

Imagem 59 – Dominikus Böhm, Igreja de Holy Cross Osnabrück/Schinkel, 1932.

Imagem 60 – Dominikus Böhm, Igreja de Holy Cross Osnabrück/Schinkel, 1932.

Imagem 61 – Otto Bartning, Sternkirche, 1922. Projeto.

Imagem 62 – Egon Eiermann, Kaiser--Wilhelm-Gedächtniskirche, Berlim, 1956-1963.

Imagem 63 – Egon Eiermann, Kaiser-Wilhelm-Gedächtniskirche, Berlim, 1956-1963.

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Curtis coloca ainda que o movimento do observador é um dos conceitos centrais na obra. As reflexões de Le Corbusier neste sentido levaram ao estabelecimento de pólos se-parados e em diferentes direções para o altar, a cruz e a estátua da Virgem, numa disposi-ção avançada em termos da liturgia.47 Assim, a obra, que apresenta mais a individualização do que a produção em série, participa não só da revolução da liturgia, como dá vazão à liberdade criativa na arquitetura, fazendo com que Le Corbusier renuncie ao modernismo ortodoxo (e, assim, a parte de sua própria obra pregressa), a uma arquitetura fria e, sobre-tudo, ao dogma da verdade construtiva.48

3.5.2. O Reflexo da Reforma Litúrgica no Brasil

No Brasil, seguindo o exemplo europeu, um grupo de arquitetos e artistas passou a defender espaços litúrgicos de caráter atuali-zado, acolhedor e, principalmente, participa-tivo. A libertação em relação às convenções quanto ao aspecto dos edifícios religiosos no Brasil manifestou-se especialmente no proje-to de Oscar Niemeyer para a igreja de São Francisco de Assis, na Pampulha (Imagem 64). A importância desta obra para a arquitetura posterior no que diz respeito à liberdade for-mal que engendra é tal que leva o crítico de

47 Derntl, Maria Fernanda. Disponível em: http://www.revistaau.com.br/arquitetura-urbanismo/151/maria-fernanda--derntl-escreve-sobre-a-evolucao-dos-projetos-de-33677-1.asp (Último acesso: abril de 2014)

48 Daufenbach, Karine. A Modernidade em Hans Broos. Tese de Doutoramento. São Paulo: FAUUSP, 2011.

arquitetura Josep Maria Montaner a questionar se Ronchamp seria possível sem a Igreja da Pampulha49. Além do efeito inovador das abóbadas de concreto armado e dos painéis de azulejos que recobrem toda a fachada posterior, a disposição do interior antecipou algumas das determinações litúrgicas depois reconhecidas pelo Concílio Vaticano II: a nave é única, sem capelas laterais, e o altar está destacado da parede do fundo. Um dos gran-des legados desta construção foi a exploração dos efeitos plásticos do concreto armado como um dos principais recursos para expressar dramaticidade e simbolismo em construções religiosas. A exemplo da Igreja da Pampulha, alguns dos episódios mais notáveis na arquitetura de igrejas no Brasil vieram das pesquisas de arquitetos que recorreram a uma visão mo-derna para propor espaços integrados, capazes, assim, de promover maior aproximação entre fiéis e presbitério. O projeto de João Filgueiras Lima, Lelé, para a igreja Ascenção do Senhor no conjunto do Centro Administrativo da Bahia, em Salvador (Imagens 65 e 66), é um exemplo dos anos 1970. Já no fim dos anos 1980, a capela de São Pedro Apóstolo

49 Montaner, Josep Maria. Depois do Movimento Moderno: Arquitetura da Segunda Metade do Século XX. Bar-celona: Ed. Gustavo Gili, 2001.

Imagem 64 – Oscar Niemeyer, igreja de São Francisco de Assis, Pampulha, Belo Horizonte, 1943. Imagem 65 – João Filgueiras Lima, Igreja Ascenção do Senhor, Sal-

vador, 1975.Imagem 66 – João Filgueiras Lima, Interior da Igreja As-cenção do Senhor, Salvador, 1975.

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(Imagem 67), em Campos do Jordão, projetada por Paulo Mendes da Rocha, apresentou um dos temas mais presentes nos edifícios religiosos recentes: a incorporação da natureza como pano de fundo da celebração. Em concordância com as interpreta-ções do II Concílio Vaticano, também outros arquitetos recorreram às plantas centraliza-das para enfatizar a ideia da comunidade reunida como sujeito da celebração. Embora o presbitério possa estar elevado por alguns degraus para que seja visível por todos, não se admite que pareça um palco, ligado à ideia de uma plateia contemplativa. O mais importante pólo, o altar, tem o valor simbóli-co da mesa em torno do qual a comunidade se reúne para celebrar a eucaristia. Esses focos litúrgicos são tratados como âmbitos diferenciados e específicos, mas ainda assim contribuindo para compor uma unidade espa-cial. A fonte batismal configura ainda um outro pólo, que deve estar, se possível, próximo da entrada, para marcar a idéia de iniciação cristã. Também existe um esforço para traduzir na arquitetura as propostas de abertura para o diálogo inter-religioso e a aculturação, isto é, a adaptação a tradições culturais de grupos específicos. Isso tem levado, especialmente no Brasil, a soluções arquitetônicas inspiradas em motivos locais, com a incorporação, inclusive, de materiais tradicionais nas regiões de implantação dos novos templos, a exemplo da aplicação de pedras e azulejos.

Imagem 67 – Paulo Mendes da Rocha, Capela de São Pedro Após tolo, Campos do Jordão, 1988.

4. CONTEXTO

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4.1. Movimento Moderno

4.1.1. Movimento Moderno e a construção de templos - Uma breve leitura sobre as possíveis relações com as obras de Dominikus e

Gottfried Böhm

O Movimento Moderno, de um modo geral, tem sua descrição envolta em uma redoma positivista na qual seus críticos fazem crer em um traço histórico unívoco e límpido. Segundo Argan1, sob o termo modernismo resumem-se as correntes artísticas que se pro-põem a interpretar, apoiar e acompanhar o esforço progressista, econômico-tecnológico da civilização industrial. Ainda, tem-se como tendências geradoras desse panorama a busca por uma linguagem ou um estilo internacional, bem como a renúncia à invocação de mode-los clássicos ou históricos. A Revolução Industrial trouxe novos processos que viabilizaram a produção em larga escala, bem como processos que facilitaram a construção civil, barateando-a e agilizando-a. Muitos avanços puderam ser alcançados através da serialização e padronização dentro dos conceitos tayloristas e fordistas, além do desenvolvimento do método científico, cerne do racionalismo. Segundo Leonardo Benevolo, devido a esses e outros fatores, o volume do comércio internacional triplica em menos de 35 anos.2 Ainda, acompanhando os avanços tecnológicos, siderurgia, campo magnético, dínamo, etc., como também telefone, lâmpada elétrica, motor a explosão e aviões, a arquitetura tendia naturalmente a internacionalizar--se, pois os pilares da globalização já haviam sido forjados.

1 Argan, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo: Companhia das Letras.1992, pg. 185.

2 Benevolo, Leonardo. História da arquitetura moderna. São Paulo: Editora Perspectiva S.A.,1998.

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Com a passagem do século XIX para o XX o modernismo arquitetônico, como define Argan, combatia o ecletismo dos “estilos históricos”, arraigados no caráter representativo, reflexo da autoridade do Estado.3 Declarou-se guerra ao vocabulário figurativo tradicional e tentou-se estabelecer uma linguística capaz de elaborar algo novo, condizente com o espírito de uma sociedade ativa e moderna.4 No período pós Primeira Guerra Mundial, muitos dos parâmetros projetuais, bem como técnicas construtivas modernas tardaram a ser compreendidas e/ou aplicados de forma massiva e, mesmo quando, com ênfase mais apli-cada ao urbanismo e construções de cunho utilitário, em que a questão do projeto urbano era prioritária.5 O Movimento Moderno como expressão de liberdade foi desde o começo um mo-vimento plural. Suas influências e raízes denotavam essa característica, interpretações de elementos vernaculares de outras culturas, passando pelas arquiteturas da era da máquina, como o avião, o transatlântico e o automóvel, muitos foram os fatores que transformaram em expressão plástica as intenções de parte de arquitetos ditos vanguarda do século XX. Esse novo modo de pensar arquitetura já estava encubado no Art Nouveau, em sua equi-valente alemã, no JugendsStil (1896), na Deutscher Werkbund (1907) e na Bauhaus (1919). Ele foi ricamente difundido em solo alemão, haja vista a qualidade e diversidade dos pro-jetos do período, bem como da influência dos arquitetos provindos do país. Através de Mies van der Rohe (1886-1969), Walter Gropius (1883-1969), Peter Behrens (1868-1940), a nova arquitetura alemã virou referência para os arquitetos, assim como as obras de Frank Lloyd Wright (1869-1959), de Adolf Loos (1870-1933) e de Eri-ch Mendelsohn (1887-1953) e a Arquitetura de Le Corbusier (1887-1965). Hans Poelzig (1869-1948) e Bruno Taut (1880-1938) levaram para o campo arquitetônico as formulações expressionistas que eram vistas até então somente no campo pictórico, um manifesto na

3 Argan, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo: Companhia das Letras.1992, pg.187.

4 Idem, ibidem.

5 Idem, ibidem.

época de crise que passavam arte e sociedade. Contudo, o apogeu de regimes totalitários nos anos 1930 e 1940 fez, em um curto período de tempo, ressurgir estilos classicizantes, enges-sados perante os olhos do nascente Movimento Moderno. Diferentemente da diversidade deste, os movimentos totalitários em franca afirmação, especificamente na Alemanha e antiga União Soviética, deixariam claras suas intenções ao se utilizar do vocabulário clássico para ratificar sua força e grandiloquência como meio de legitimar seus governos. Através dessas reinterpretações de formas do passado construiram monumentos, palácios e instituições, tendo na figura do arqui-teto Albert Speer (1905-1981) o maior expoente no caso alemão. A estética dos pavilhões dos países supracitados (Imagens 1, 2 e 3) na Expo-sição de 1937 em Paris só realça a austeridade de suas posições políticas. Período muito conturbado, os anos de 1930 e 1940 significaram para muitos arquitetos uma fase obscura, em que uns se exilaram, ou-tros tiveram suas obras banidas e alguns convi-veram com uma demanda limitada. Aqui atenta--se ao fato de que no programa religioso, tema desse caderno, conceitos novos, modernizantes,6

6 Aqui não confundir com o purismo de formas que mais tarde viria a se tornar o chavão modernista, mas sim para

Imagem 1 – Exposição de 1937, Paris, França.

Imagem 2 – Detalhe do Pavilhão Alemão.

Imagem 3 – Detalhe do Pavilhão Soviético.

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Contudo, a pouca ên-fase dos arquitetos modernos nesse pro-grama - pois voltavam--se significativamente para áreas como ha-bitação e planejamen-to de cidades - talvez explique por que ele ficou “temporariamente esquecido”, ou melhor, não recebeu maiores esforços. Em compensação, os arquitetos que a ele se dedicaram operaram verdadeiras revoluções espaciais e formais, juntando o novo a tradições clássicas ou vernaculares - como Domini-kus Böhm - ou tentando reformulá-lo a partir de bases totalmente no-vas, como Rudolf Schwarz (1897-1961) (Imagens 8 e 9) e Otto Bartning (1883-1959) (Imagens 10 e 11). Dominikus Böhm e seu filho, Gottfried Böhm (1920) se destacam justamente nessa questão. Através de releituras de linguagens pregressas trouxeram uma arquitetura com novos ares, mas que ainda representaria no ideário popular a legibilidade sacra, que muito faltava a alguns tem-plos modernos. É sob o viés gótico que a arquitetura do pai, Dominikus, expressar-se-ia com mais ênfase (Imagens 12, 13, 14 e 15), e, aliado ao concreto armado, através de abóbadas e pilares esbeltos e elementos simples e sem ornamentação, traria novos rumos para o programa, um apelo mais emocional que visual, um contraste com a opulência de muitos exemplares contemporâneos seus. Sem dúvidas, em muitos de seus edi-fícios, a colocação inusitada dos arcos, a iluminação natural assimétrica e as proporções mo-

tem espaço mais enfaticamente nas obras de Le Cobusier, Antoni Gaudí (1852-1926), Au-guste Perret (1874-1954) bem como de Dominikus Böhm (1880-1955) (Imagens 4, 5, 6 e 7, respectivamente).7

a nova concepção do espaço sacro, desvinculado das linguagens correntes; atenta-se também para o estilo ímpar da obra de Gaudí na Espanha que, como coloca William J. R. Curtis é o estilo nacional, catalão, que torna clara a tentativa por parte do arquiteto de recuperar a antiga língua e cultura.

7 É importante evitar anacronismos, comparações superficiais ao analisar tais obras, pois cada uma representa os esforços particulares dos arquitetos em situações diversas de seus países, não sendo função desse trabalho uma aborda-gem ampla a respeito.

Imagem 8 – Rudolf Schwarz, Igreja de Corpus Christi, Alemanha, 1930.

Imagem 9 – Rudolf Schwarz, Igreja Rainha Maria, Alemanha, 1952-1959.

Imagem 10 – Otto Bartning, Auferstehungskirche, Alemanha 1929-1930 (reconstruída após a Segunda Guerra Mundial).

Imagem 11 – Otto Bartining, Sternkirche, 1921-1922. Projeto.

Imagem 4 – Le Corbusier, Capela Notre--Dame-du-Haut, França, 1950-1955.

Imagem 5 – Dominikus Böhm, Igreja St. Engelbert, Alemanha, 1930-1932.

Imagem 6 – Antoni Gaudí, Igreja da Sa-grada Família, Espanha, 1883-atualidade.

Imagem 7 – Auguste Perret, Igreja Notre--Dame du Raincy, França. 1923-1924.

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simples e espaço único e com arcos ogivais saindo do próprio piso. Em muitos exemplares da dita arquitetura sacra expressionista, alguns dos elementos tradicionais reduziram-se10 ou desapareceram, como o presbitério, o cruzeiro (Imagem 18) e a abside (Imagem 19). O termo expressionista pode ser utilizado na avaliação de algumas obras do período em questão e certamente carrega também em seu significado o conceito de uma força sub-jetiva que traduzir-se-ia através de uma estética formal impetuosa e de materiais simples dos quais os arquitetos usam em detrimento dos caros mármores, como o concreto armado, tijolos e pedras sem acabamento ou reboco simples.

A pluralidade de Böhm traz uma liberdade formal (Imagens 20 a 27) na concepção de templos que, paralelamente ao Movimento Moderno, vai atingir um nível de inovação jamais visto. Seu filho, Gottfried, contudo, é de um tempo em que as experimentações da geração precedente já haviam transformado o modo de se fazer arquitetura. Nos anos 1960, em que se dá sua maturidade profissional, parte de sua arquitetura revive o apreço pelo expressionismo, e o arquiteto aceitará igualmente grande diversidade de linguagens em sua obra, além de aproximar-se da corrente Brutalista. Sem deixar de dialogar com as

10 Aqui também no sentido de simplificação.

numentais criam o efeito sensual e emocional que o arquiteto sempre buscou.8

São algumas dessas característi-cas que também fazem de Domi-nikus um expoente do Expressio-nismo alemão. Elementos afins são encontrados naquela que é con-siderada um dos prelúdios do ex-pressionismo, a Igreja de All Saints de William Richard Lethaby9 (1857-1931) (Imagens 16 e 17), de planta

8 Pehnt, Wolfgang. La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A. 1975, pg 154.

9 Pevsner, Nikolaus apud Pehnt, Wolfgang, La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A. 1975.

Imagem 16 – William Richard Lethaby, Igreja All Saints, Inglaterra, 1900-1902.

Imagem 17 – William Richard Lethaby, Igreja All Saints, Inglaterra, 1900-1902. Interior.

Imagem 18 – Exemplo de cruzeiro. Imagem 19 – Exemplo de abside.

Imagem 12 – Domnikus Bohm, Igreja Cristo Rei, Alemanha, 1926.

Imagem 13 – Domnikus Bohm, Igreja Cristo Rei, Alemanha, 1926. Interior.

Imagem 14 – Dominikus Böhm, Igreja São João Batista, Alema-nha, 1921-1926.

Imagem 15 – Dominikus Böhm, Igreja São João Batista, Alema-nha, 1921-1926. Interior.

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obras paternas, suas obras entram em uma relação muito mais plástica através do concreto armado.11

11 Mais informações no capítulo 2 - Os Arquitetos.

4.2. A influência da obra perretiana em Dominikus e Gottfried Böhm

Auguste Perret (1874-1954), arquiteto francês, juntamente com seus irmãos, Gustave e Claude, deram grande contribuição para a arquitetura do concreto armado no século XIX. Seus projetos são emblemáticos mais pela aceitação estética do material em ambientes não industriais que pela revolução de conceitos estruturais12. Suas construções destacam-se por sua franqueza de partido, um senso prático afirmado e ornamentação colocada de forma

12 Banham, Reyner.Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina. São Paulo: Perspectiva, 1979, pg. 71.

Imagem 23 – Dominikus Böhm, Igreja São José, Polô-nia, 1929. Interior.

Imagem 22 – Dominikus Böhm, Igreja São José, Polônia, 1929.

Imagem 24 – Dominikus Böhm, Igreja Santa Maria , Alema-nha, 1951–1953.

Imagem 25 – Dominikus Böhm, Igreja São Paulo, Alemanha, 1923-1924.

Imagem 26 – Dominikus Böhm, Igreja Santa Elisabeth, Alemanha, 1928-1932.

Imagem 27 – Dominikus Böhm, Igreja Santa Elisabeth, Alemanha, 1928-1932. Interior.

Imagem 20 – Dominikus Böhm, Igreja Santo Apoli-nário, Alemanha, 1926-1927.

Imagem 21 – Dominikus Böhm, Igreja Santo Apoli-nário, Alemanha, 1926-1927. Interior.

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hábil,13 ou seja, de forma que essa servisse de aporte à ar-quitetura, emoldurando-a.

O arquiteto, como grande entusiasta do concreto armado, diferencia-se de grande parte de sua geração no uso do material, que quando o utilizam, é sempre recoberto de modo a torná-lo um elemento invisível, algo que deveria ser escondido.14 Uma de suas obras emblemáticas é o edifício 25 Bis (Imagem 28), um imóvel de 8 pavimentos com terra-ço, antecipação do terraço jardim,15 totalmente em concreto - veja-se que estamos em 1903, e esse material era majo-ritariamente utilizado para indústrias, embora suas qualida-des, notadamente o preço e método construtivo simples - de forma que vigas e colunas ficam aparentes ao olhar,16 uma nudez considerada impudica para a época.17 Além disso, o jardim exigido pelo plano urbanístico de Paris é locado de forma inusitada na frente do edifício pelo recuo da fachada, ao invés de atrás, o que apresenta a qualidade de como também Le Corbusier contornava dificuldades18 com certos aspectos do plano de ocupação da cidade. Um dos ápices contudo, da obra do arquiteto, foi a

Igreja Notre-Dame du Raincy (Imagem 29) uma elaborada e influente realização do racio-

13 Champigneulle, Bernard. Perret. Paris: Arts et Métiers Graphiques. 1959, pg. 15.

14 Idem.

15 Pevsner, Nikolaus. Os pioneiros do desenho moderno. 2002.Martins Fontes. São Paulo, pg. 180.

16 Diga-se os volumes das vigas e pilares, pois o concreto armado da cobertura é revestido por telhas.

17 Pevsner, Nikolaus. Os pioneiros do desenho moderno. 2002.Martins Fontes. São Paulo, pg. 180.

18 Banham, Reyner. Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina. São Paulo: Perspectiva., 1979, pg. 71.

nalismo de Choisy19 em termos de concreto armado. Um belíssimo exemplo de como con-dições externas, diga-se majoritariamente econômicas, culminaram em um espaço que em nada perde para as catedrais góticas, sendo as obras de Perret consideradas o “Gothique du béton”, o Gótico do Concreto, em tradução livre. Ainda para ilustrar alguns dos projetos mais famosos do arquiteto, ao comparar as imagens 30 e 31 pode-se verificar o contraste na ornamentação das edificações que tinham espaço e preferência no século XIX em Paris, como exemplo a famosa Ópera Garnier que, comparada com o Teatro Champs-Elysées20 de Perret, causa certa estranheza. A primeira

19 Segundo Reyner Banham, Auguste Choisy (1841-1909) e Julien Guadet (1834-1908) tiveram seu ensinamentos considerados como influências nas arquiteturas de Perret e Tony Garnier. Além disso, esses dois últimos são tidos como sucessores diretos dos conceitos arquitetônicos dos primeiros. Choisy colocava que “a essência da nova arquitetura foi sem-pre a construção [...] o edifício erguir-se-ia logicamente dos meios técnicos a seu dispor”, pensamento racionalista, e para Guadet, a composição era o tema perene. Banham, Reyner. Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina. 1979. Editora Perspectiva S.A., São Paulo, pg. 40.

20 Paralelo colocado por Champigneulle, Bernard. Perret. 1959, no capítulo sobre o teatro.

Imagem 29 – Auguste Perret, Igreja Notre-Dame du Raincy, Paris, 1923-1924.

Imagem 30 – Charles Garnier, Opera Palais Garnier, Paris, 1861-1875. Imagem 31 – Auguste Perret, Teatro Champs-Élysées, Paris, 1911-1913.

Imagem 28 – Auguste Perret - Imóvel 25 Bis, Paris, 1902-1903.

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não apresenta espaço que não tenha sido decorado por relevos dourados,21 enquanto no segundo exemplo a ornamentação é contida, tornando vísivel a pureza de linhas e o equi-líbrio de proporções, que dá a impressão de dignidade magistral.22

Juntamente com Perret, Tony Garnier (1869-1948) se insurge contra o ecletismo de sua época e recorre a dois princípios complementares da tradição remota: o classicismo, através da geometria e clareza, e a coerência estrutural, através do concreto armado, que possuía as características de continuidade estática e adaptabilidade, um sistema de cons-trução que se torna muito utilizado pelos arquitetos franceses.23 Os fatores que culminaram nesse tipo de ação estão fortemente ligados à Revolução Industrial, onde os processos foram sistematizados e materiais como o ferro e o concreto puderam se disseminar amplamente. Através disso foi possível pouco tempo depois na Ale-manha, e também na Áustria, Suíça e Escandinávia, através de experiências particulares, realizações tão completas que foi possível constituir-se um estilo universalmente aceito na nossa época24. Experiências essas que na Alemanha tiveram parte no Expressionismo e em uma das maiores associações da indústria do seu tempo, levando em conta o período Pré--Primeira Guerra, a Deutscher Werkbund. Nesse ponto já se pode começar a fazer certa relação entre a obra de Auguste Perret e Dominikus Böhm. Enquanto Perret estava ligado conceitualmente à ordem dos es-tilos clássicos, até a uma certa austeridade formal, Dominikus faz uso de uma linguagem ligada à cultura vernacular gótica e românica. Ambos, contudo, tiram proveito das caracte-rísticas do concreto - então novo material - para suas obras. Com o foco na iluminação, os arquitetos concebem espaços que são imersos em luz. Isso se tornaria parte importante da ementa expressionista, assim como sua relação com a textura dos materiais. Essas caracte-

21 Champigneulle, Bernard. Perret. Paris: Arts et Métiers Graphiques. 1959, pg. 15.

22 Idem, pg.. 25.

23 BENEVOLO, Leonardo. História da arquitetura moderna. São Paulo: Editora Perspectiva S.A.,1998, pg 325.

24 Pevsner, Nikolaus. Os pioneiros do desenho moderno. São Paulo: Martins Fontes, 2002, pg 179.

rísticas em específico tomam vulto e se tor-nam um dos fatores para que muitas obras, notadamente de igrejas, ganhem um status antes somente conseguido pela opulência de materiais como o mármore e o ouro. O que se vê é o desenvolvimento de uma dramaticidade que envolve o observador, um ambiente que é criado para refletir o sagrado em sua forma mais simples. Nas imagens 32, 33 e 34, respec-tivamente, são expostos os interiores da Igreja Notre-Dame du Raincy de Perret e das Igrejas Matriz São Paulo Apóstolo e São Luis Gonzaga, de Dominikus e Got-tfried Böhm, ambas objetos de estudo des-sa pesquisa. Nas três pode-se perceber que o tratamento é extremamente simples, e a riqueza reside na disposição dos pe-quenos elementos multicoloridos, sejam eles vitrais ou cobogós, que filtram a luz e geram uma atmosfera celestial. Dominikus e Gottfried vão mais longe ao apropriarem--se de elementos góticos chamados cle-restórios - aberturas superiores ao longo da nave -, criando a ilusão de leveza na cobertura abobadada. Além disso, os ar-quitetos reinterpretam uma noção espacial

Imagem 32 – Auguste Perret. Interior da Igreja Notre-Dame du Raincy, Paris, 1923-1924.

Imagem 33 – Dominikus e Gottfried Böhm. Interior da Igreja Matriz São Paulo Apóstolo, Blumenau, 1953-1956.

Imagem 34 – Dominikus e Gottfried Böhm. Interior da Igreja Matriz São Luis Gonzaga, Brusque, 1955-1962.

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associada a Perret - a nave tripartida por longilíneos pilares e realçada pelas abóbadas, mas que mantem a noção de espaço uno, daí a proximidade evidente com o projeto de Blumenau. A simplicidade da planta, apenas tripartida por pilares esbeltos, também chama a atenção como uma interpretação moderna do culto.25

Gottfried Böhm, de uma geração familiarizada com o concreto armado, se permite experimentações ainda mais ousadas com o material. Nas imagens 35 e 36 podemos ver a desconstrução da noção espacial e arquitetônica do modelo tradicional de igreja de que o arquiteto tira partido, somente conseguida através da plasticidade inerente ao material. Anos mais tarde essa relação entre arquitetura e concreto viria a fazer parte do programa

brutalista26, amplamente difundido no Brasil, mas com características outras. É imprescindível portanto, salientar a im-portância das obras de arquitetos como Auguste Perret e Tony Garnier, que in-fluenciaram toda uma geração pois, se-gundo Reyner Banham,27 esses dois clas-sicistas de transição estiveram entre as figuras mais influentes na formação da geração que produziu “mais do que foi pioneira na” arquitetura moderna, e que através de releituras, assim como Domi-nikus Böhm fez, puderam disseminar o

uso de um dos materiais mais versáteis já criados pelo homem, o concreto. E, a despeito

25 Maiores informações a respeito podem ser encontradas no Capítulo 4, “As Obras no Brasil”, Subtítulo 4.1.9. “A Reforma na Liturgia e seu Reflexo na Arquitetura dos Templos”.

26 Conferir neste mesmo capítulo, Subtítulo 3.4. Brutalismo.

27 Banham, Reyner. Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina. São Paulo: Perspectiva., 1979, pg. 67

dos esforços de Hennebique,28 foi através das obras de Perret que o concreto se tornou esteticamente aceitável,29 ao menos ao olhos da geração mais nova.30

Além disso, vale ressaltar a inovação que esse material permitiu nos espaços sacros, que de nenhuma forma caracteriza perda de qualidade estética, pelo contrário. A família Böhm e Auguste Perret se dedicaram, através de suas obras, a demonstrar a possibilidade de conceber espaços sacros de uma nobreza ímpar a partir de materiais simples e sem ornamentação, em que a materialidade e o espaço são protagonistas.

4.3. Expressionismo

Nas artes visuais, em geral, o expressionismo origina-se em oposição ao termo im-pressionismo, sendo uma corrente que define-se pela interpretação da arte do interior para o exterior.31

O termo, já aplicado a outras formas de arte entre os anos de 1910, consolida-se no âmbito da arquitetura após a Primeira Guerra Mundial.32 Bruno Zevi reitera tal afir-mação indicando que a verdadeira constituição linguística ocorre com tal ênfase em me-ados dos anos 1920, tendo como protagonistas Hans Poelzig (1869-1936), Otto Bartning (1883-1959), Fritz Höger (1877-1949) e sobretudo Erich Mendelsohn (1887-1953). Além

28 Os melhoramentos de François Hennebique permitiram-no lançar a primeira ponte em concreto armado do mun-do, de um vão de 32 metros, em 1894, em Viggens, Suíça; CHAMPIGNEULLE, Bernard. Perret. Arts et Métiers Graphiques. Paris. França, 1959, pg. 16.

29 Segundo Pevsner, Nikolaus. Origens da Arquitetura Moderna e do Design. São Paulo. Martins Fontes. 2001, pg.150, a França já conduziu o mundo à apreciação estética do ferro através de Labrouste e Viollet-le-Duc, e agora estava a fazer o mesmo com o concreto.

30 Banham, Reyner. Teoria e Projeto na Primeira Era da Máquina. São Paulo: Perspectiva., 1979, pg. 69.

31 Argan, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo: Companhia da Letras,1992, pg. 227.

32 Pehnt, Wolfgang. La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A. 1975, pg 9.

Imagem 35 – Gottfried Böhm, Igreja Pilgrimare, Neviges, 1961-1973.

Imagem 36 – Gottfried Böhm, Igreja Christi Auferstehung, Alemanha, 1963-1970.

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disso a linguagem expressionista conta com a contribuição incomparável de Bruno Taut (1880 -1938) e Henry Van de Velde (1863-1957). Zevi vai mais longe ao afirmar ainda que o movimento atingiu a totalidade dos arquitetos alemães,33 dentre eles, Dominikus Böhm (1880-1955) e, mais tardiamente, já na retomada que se faz dele no pós-Segunda Guerra, Gottfried Böhm (1920). Apesar do alcance europeu que obteve, o Expressionismo pode ser considerado tipicamente alemão e, segundo Giulio Carlo Argan, tem no país seu berço, pois já possuía em suas artes e literatura fatores que viriam posteriormente a definí-lo. É tido muitas vezes como uma possível alternativa ao racionalismo,34 foi além de uma linguagem arquitetônica, constituindo-se como um modo de pensar de uma época, o que trouxe muitos questionamentos sobre sua aplicabilidade. Segundo Sigfried Giedion, o expressionismo “não poderia exercer influência alguma sobre a arquitetura, que por ser uma arte aplicada, estava condicionada por fatores tangíveis como utilidade, materiais, métodos construtivos e considerações econômicas”.35 Parte disso se deve ao fato de acreditar-se, em tal contexto, que a arquitetura tinha por função prover o homem de meios concretos para viver em equilíbrio com o mundo exterior. Essa perspectiva racionalista acomete muitos arquitetos do anos 1920, o que Argan relaciona com a necessidade prática de reconstru-ção do pós-guerra, além da influência de teorias tayloristas e fordistas sobre a produção em série, ou seja, eficiência, produtividade, racionalização da produção, serialização dos componentes, algo que a linguagem expressionista, dentro do seu ideário singular, intuitivo e autoral, inviabilizaria. “O racionalismo arquitetônico alemão foi consequência e conclusão

33 Vale lembrar o viés expressionista das obras iniciais de Walter Gropius (1883-1969) e Mies van Der Rohe (1886-1969), para citar os exemplos mais conhecidos, além da conhecida “fase expressionista” da Bauhaus em seus primeiros anos.

34 Borsi e König, apud, Pehnt, Wolfgang. La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A. 1975, pg 11.

35 Sigfried Giedion, apud, Pehnt, Wolfgang. La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A. 1975, pg 8.

das tendências expressionistas ou, como inclina a acreditar Zevi, ‘uma volta à ordem’, um retorno ao sistema rígido, quase uma involução ou uma reação após o impetuoso, desorde-nado, mas fortemente vital protesto expressionista.”36

Apesar disso, embora haja esse movimento em direção ao racionalismo, tal estética expressionista permanece visível na obra de muitos arquitetos como Hans Poelzig, Erich Mendelsohn e Hans Scharoun (1893-1972), que perdurou também na arquitetura deste dos anos 1950 e 1960, e evidentemente na obra de Dominikus Böhm. Para ilustrar melhor esse panorama são apresentados alguns projetos emblemáticos (imagens 37 a 46), nos quais a estética expressionista se mostrou de forma incisiva, em que

os arquitetos chegaram a resultados ímpares, demonstrando a diversidade que não cabe à uma simples definição estilística. Ainda, a proximidade com o futurismo pela aceitação sem inibição de tecnologia moderna, da aceitação da vida urbana, são motivos aplicáveis de certa forma na análisa de ambas as arquiteturas.37 O que é claro na maioria é que a

36 Argan, Giulio Carlo. A arte moderna na Europa: de Hogarth a Picasso. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, pg.506.

37 Pehnt, Wolfgang. La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A. 1975, pg 7.

Imagem 37 – Hans Poelzig, Grosse Schaus-pielhaus, Berlim, 1918-1919.

Imagem 38 – Hans Poel-zig, Grosse Schauspie-lhaus, Berlim, 1918-1919.

Imagem 39 – Otto Bartning, Sternkirche, 1921-1922. Projeto.

Imagem 40 – Otto Bartning, Projeto Sternkirche, 1921-1922. Interior.

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tipologia tanto interna quanto externa é de uma liberdade formal conflitante com obras con-temporâneas, como por exemplo a Fábrica Fagus de 1911 (Imagem 47) de Walter Gropius (1883 -1969) e Adolf Meyer (1881-1929), mais alinhada a preceitos da arquitetura “racio-nalista”, enquanto aquelas de uma expressão arquitetônica particular. Essa diversidade foi em parte resultado da exposição de 1914 da Deustcher Werk-bund, em que houve uma cisão conceitual em dois ramos, um que se propunha a aceitação

coletiva da forma normativa, e outro que propunha o “desejo de forma”, expressivo e afir-mado individulamente.38 Desta divisão, Van de Velde e Taut manifestavam o desejo por uma livre expressão em seus edifícios, enquanto Peter Behrens (1868-1940) e Gropius tendiam a uma modalidade normativa, a clássica.39

Muitos dos preceitos expressionistas desdobrar-se-iam no pós Primeira-Guerra, pos-sivelmente num espelhamento aos movimentos artísticos russos que, além de reformas nas artes, propunham uma revolução na sociedade40. É nesse contexto que nasce o November-gruppe, grupo alemão de pesquisa e experimentação da construção civil, que além de reu-nir profissionais da área civil numa aliança para a consturção, servia de pressão para que o governo direcionasse atenção ao urbanismo voltado às pessoas que vivem nas cidades, mais que aos especuladores.41 Um dos arquitetos-chefe do grupo foi Taut, que logo viria a encabeçar o rigoroso racionalismo alemão.42

Após a Segunda Guerra Mundial é visível a mudança de paradigmas na arquitetu-ra, o mundo tornara seus olhos novamente à Arquitetura Moderna, a qual goza de grande aceitação por parte dos arquitetos e multiplica-se a uma velocidade vertiginosa através dos grandes edifícios de escritórios e das grandes superfícies vítreas. Contudo, é importante evitar simplificações. O Expressionismo, um movimento interno à Arquitetura Moderna, este-ve presente, entre idas e vindas, sob os nomes de muitos arquitetos, ressaltando-se a ênfase nos trabalhos de Mendelsohn e Scharoun. Aumentando o foco sobre o solo alemão, Zevi sublinha que o Expressionismo teve momentos de desfortuna crítica: Entre 1925 e 1933, os racionalistas procuraram obliterar a arte que documentava o desespero e as esperanças do pós-guerra; de 1933 até o segundo conflito mundial, os

38 Frampton, Kenneth. História crítica da arquitetura moderna. São Paulo: Martins Fontes, 1997.

39 Idem.

40 Argan, Giulio Carlo. Arte Moderna. São Paulo: Companhia das Letras.1992, pg. 246.

41 Idem, ibidem.

42 Idem, ibidem.

Imagem 47 – Walter Gropius e Adolf Meyer,Fábrica Fagus, Alemanha, 1911-1913.

Imagem 41 – Erich Mendelsohn ,Torre Einstein, Potsdam. 1919-1923.

Imagem 42 – Fritz Höger, Chilehaus, Ham-burgo, 1923-1924.

Imagem 43 – Hans Luckhardt, Projeto para uma sala de concerto e festival, 1920.

Imagem 44 – Domi-nikus Böhm, Christkö-

nigskirche, Mainz--Bischofsheim, 1926.

Imagem 46 – Dominikus Böhm, St. Engelbert, Colonia-Riehl, 1930.

Imagem 45 – Bruno Taut, Pavilhão de Cristal, Colônia, 1914.

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nazistas apagaram seus rastros na moldura de uma campanha criminosa contra as “dege-nerações” artísticas; e finalmente, após a última guerra, não houve meios de recuperar o expressionismo, indicador de todas as culpas nacionais, e a Alemanha lançou-se à aventura neo-racionalista adaptada à ideologia do milagre econômico. 43

Ainda assim, na obra de Scharoun e também de Dominikus Böhm o expressionismo permaneceu, de fato, uma retomada de valores formais expressionistas, como contraposição à insipidez do chamado Estilo Internacional. Além disso, é interessante frisar que nos anos 1950/1960 convivem linguagens tão opostas como a Filarmônica de Berlim de Scharoun (Imagem 48) - uma das últimas obras que ainda encontra solo fértil na temática expressio-nista do período e alia aspectos racionalistas sem a perda da essênsia expressionista - e a Neue Nationalgalerie de Mies van der Rohe (Imagem 49), construídas, inclusive, próximas

uma da outra. Segundo declarações de grupos expressio-

nistas, ”o Expressionismo desaparece e reapa-rece na vida de todos os arquitetos, passan-do pelas experimentações de Mendelsohn, Gaudí, Le Corbusier, além também de Mies, Gropius e Wright” 44 , não classificando suas obras, mas sim afirmando que a influência dessa linguague, seja por contraponto ou apropriação, foi um dos combustíveis para diversas tendências, incluindo as que aflora-ram nos últimos anos, como o Brutalismo e a

43 Zevi, Bruno. Arquitetura e Judaísmo: Mendelsohn. São Paulo: Perspectiva.2002, pg. 235.

44 Ungers, Oswald Matthias apud Zevi, Bruno. Arquitetura e Judaísmo: Mendelsohn. São Paulo: Perspectiva.2002, pg. 232.

arquitetura dita “espontânea”,45 (Imagens 50 a 53) tendo-se encontrado diversos paralelos nas formas expressionistas de 1918-1923 com a arquitetura dos anos 1950 em diante.46

4.3.1. Relação entre o Expressionismo e a Obra de Dominikus e Gottfried Böhm

É comum relacionar as obras de Do-minikus e Gottfried Böhm com a experiência expressionista alemã, entretanto, essa lingua-gem não abarca a totalidade de ferramen-tas arquitetônicas vistas no desenvolvimento das arquiteturas de pai e filho. Enquanto o primeiro distingue-se pela reinterpretação do vocabulário ora românico, ora gótico, o segundo lança seus esforços ao caráter es-cultural através da plasticidade do concreto numa linguagem mais difusa, que não toma os elementos tão claramente, mas tampouco nos permite falar apenas na retomada do Expressionismo. Nas imagens 50 e 51 podemos observar dois exemplos que retratam o viés ex-pressionista de Dominikus e Gottfried, respectivamente, porém através de características distintas. No primeiro caso uma grande massa construída sob um volume uno, sua relação monumental com o entorno, a fuga da escala humana, como parte de uma interpretação do vocabulário românico - lembrando que para muitos arquitetos a volta ao medievalismo,

45 Ungers apud Zevi, Bruno. Arquitetura e Judaísmo: Mendelsohn. São Paulo: Perspectiva.2002, pg.233.

46 Colins apud Zevi, Bruno. Arquitetura e Judaísmo: Mendelsohn. São Paulo: Perspectiva.2002, pg.226.

Imagem 50 – Dominikus Böhm, St Joseph, Zabrze, 929-1931. Imagem 51 – Gottfried Böhm, Igreja de Neviges, Neviges, 1963-1968.

Imagem 48 – Hans Scharoun, Filarmônica de Berlim, Berlim, 1956-1963.

Imagem 49 – Mies van der Rohe, Neue Natio- nalgalerie, Berlim, 1965-1968.

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como afirma Bruno Zevi, constitui-se uma forma para se fugir do classicismo. Já no segundo caso, o interior extremamente plástico da Igreja de Neviges, que extrai do caráter moldá-

vel do concreto condições de luz e textura únicas e que aproximam a obra (Imagem 52), do projeto de Wassili Luckhardt, para um cinema em 1920 (Imagem 53). Certa características da arquitetura, uso de certos elementos concretos que determi-nam a forma a custa de todos os outros. Esta pertubação da harmonia, que aparece como fator de alienação deliberada, como resultado de um dogmatismo ou de um impulso irresis-tível para a expressividade, se encontra não somente em obras de arquitetos expressionis-tas como também ainda com que conteúdo diferente em algumas obras de por exemplo, Charles Rennie Mackintosh ou Frank Lloyd Wright e inclusive nos construtivistas russos.47

Além disso, outro elemento que contribui para a descrição das obras de Dominikus e Gottfried Böhm como expressionistas é a reinterpretação do gótico. Vale aqui ressaltar que no período pré-Primeira Guerra houve um grande número de estudos sobre a arte gótica,

47 Pehnt, Wolfgang. La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A. 1975, pg 8.

o barroco e o extremo oriente,48 o que de certa forma explica na obra do primeiro o retorno a tais referências. Essa reinterpretação era amparada pelo fato de, no século XIX, a arquitetura gótica ter sido associada firmemente com a arquitetura religiosa,49 intensificada ainda pelos temas preferidos do perí-odo 1910-1923, o Volkshaus (centro comunitário), a Stadtkrone (Coroa da cidade, peça central do nú-cleo urbano) e o edíficio sacro.50 Por referência ao gótico aqui se entenda a frequência de utilização dos elementos góticos vistos nas obras dos arqui-tetos como a rosácea (Imagem 54), o arco ogival (imagem 55), a alusão à nave tripartida (Imagem 56) e a relação estrutura-fechamentos, bem como a utilização de arcobotantes (Imagem 57). O impulso expressionista moveu Dominikus, bem como muitos arquitetos do século XX e suas experimentações ainda ecoam em muitas das obras contemporâneas como as do seu filho, Gottfried. O ideal do expressionismo consistia em transmitir através da arquitetura sensações visuais aliadas à surpresa do espectador. Desta forma, tem-se uma arquitetura alternativa ao racionalis-mo, às ortogonalidades das fachadas lisas e rebocadas e, a partir de uma aproximação

48 Pehnt, Wolfgang. La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A. 1975, pg 9.

49 Idem, pg 150.

50 Idem, pg 8.

Imagem 54 – Dominikus Bohm, Igreja Christkönig, Hamminkeln-Ringenberg.

Imagem 55 – Dominikus Bohm, St. Apollinaris, Frielingsdorf.

Imagem 56 – Dominikus e Got-tfried Böhm, Igreja Matriz São Luis Gonzaga, Blumenau, 1953-1962

Imagem 57 – Dominikus e Gottfried Böhm, Igreja Matriz São Paulo Apóstolo, Blumenau, 1953-1961.

Imagem 52 – Igreja de Neviges, Gottfried Böhm, Neviges, 1963-1968.

Imagem 53 – Projeto para cinema, Wassili Luckhardt, 1920.

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experimental dos materiais, exalta-se um caráter abertamente pictórico em detrimento da racionalidade de uma tela.51 O Expressionismo traz em si conceitos muito amplos e difusos, como ao da obra de arte total, que configura-se pela união de todas as artes na arquite-tura, e também, aqui uma interpretação expressionista, como referindo-se ao entorno total que incide simultaneamente sobre os vários sentidos do homem. A arquitetura expressionista apela à visão, ao tato, ao sentido sinestésico, desperta associações heterogêneas tanto no tempo como no espaço.52

A ideia de uma arquitetura que não está no espaço, mas se estende ao infinito e não pode ser circunscrita pelos contornos de um edifício singular, liga-se imediatamente com a da arquitetura vista como expressão, não mais do indivíduo singular, mas do éthos popular, do ideal coletivo. 53

4.4. Brutalismo O Segundo Pós-Guerra, momento no qual se inserem as obras aqui tratadas, é ca-racterizado por uma grande pluralidade de estilos arquitetônicos. Apesar das tentativas da Arquitetura Moderna em estabelecer-se como um estilo uno - a exemplo dos Congressos Internacionais de Arquitetura Moderna (CIAM’s), em que o Movimento mostrava-se em bloco –, sua principal característica revela-se a diversidade. As interrupções representadas pela Segunda Guerra Mundial geraram dúvidas a respeito da definição do Movimento que, restringido pela escassez de projetos, ocultou a variedade de linguagens presente desde o entre-guerras. Entretanto, no pós-guerra o campo arquitetônico recebe maior li-

51 Pehnt, Wolfgang.La Arquitectura Expresionista. Barcelona: Editorial Gustavo Gili S.A. 1975, pg 11.

52 Idem, pg 19.

53 Argan, Giulio Carlo. A arte moderna na Europa. São Paulo: Companhia das Letras, 2010, pg. 510.

berdade projetual e oportunidades para, enfim, concretizar as transformações idealizadas desde o entre-guerras, dando espaço à experimentação e caracterizando o período com uma grande diversidade de estilos54. É estabelecido, desta forma, um cenário arquitetônico bastante diverso, onde convivem arquiteturas de cunho historicista, a chamada corrente “neoexpressionista”, a arquitetura orgânica de Hans Scharoun, e o dito “Estilo Internacional”, por exemplo. Entre as expressivas manifestações que tenderam à renovação do Movimento Moderno, destaca-se o Brutalismo, que encontra particular expressão na obra de Got-tfried Böhm. A corrente brutalista encontra espaço a partir do desmantelamento dos postulados modernos e como contraposição à repetição quase dogmática de alguns de seus princípios formais. Isso se deu em função das mudanças e reflexões causadas pela guerra, que pedia pela adaptação dos projetos às novas condições culturais, políticas e sociais. Caracteriza-da pela exploração dos materiais ao natural, como tijolos, pedras e o concreto deixado aparente, pela exploração de superfícies limpas, pela ênfase na afirmação da estrutura, e pela exposição das funções do edifício na volumetria externa, como a marcação dos volu-mes de circulação vertical e das áreas de serviço, a arquitetura brutalista concebeu objetos pensados como autossuficientes, volumes pesadamente corrugados, mas de simplicidade prismática, que se situaram agressivamente em seu entorno. Pode-se dizer que o brutalismo, motivado pela coragem e pelo espírito revolucionário, enfrentou o revivalismo nostálgico e consistiu na contraposição da plasticidade sobre as estéreis caixas de vidro do “Estilo Internacional”55. A arquitetura etérea era então contraposta com uma arquitetura quase agressiva, cuja noção de massa e volume fechados e de superfícies rugosas exprimiam histórias particulares e irrepetíveis, específicas de cada local e técnica construtiva. Na Alemanha algumas experimentações brutalistas estão estritamente ligadas ao

54 Zein. Ruth Verde. Brutalismo, sobre sua definição (ou, de como um rótulo superficial é, por isso mesmo, adequado). Disponível em: http://vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/07.084/243 (Último acesso em maio de 2013)..

55 Idem.

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neoexpressionismo, cujo ápice se dá nos anos 1950, auge da arquitetura alemã pós-guerra. Esta aproximação se dá pela liberdade formal a que se propõem e pelas características materiais e de espaços “moldáveis” que assumiram no país. Inserida no contexto de diver-sidade característica do período que vai do Segundo pós-guerra até os anos 1970, este viés da arquitetura alemã tem em Gottfried Böhm, Walter Förderer e Oswald Mathias Un-gers seus principais nomes. Em suas obras é frequente a noção brutalista de “fundar um lu-gar e não tão somente uma arquitetura”, que diferencia o conjunto arquitetônico do entorno, transformando-o em “um mundo à parte, que se basta em si mesmo, uma nova organização diversa do mundo externo, mas ao mesmo tempo em constante contato com ele”.56 Além disso, a visão crítica e emocional da arquitetura, características tanto do expressionismo, como do brutalismo, e a exploração da plasticidade dos materiais empregados na obra, não só a partir de sua forma, mas de suas texturas exaltadas pelos jogos de luz, também são responsáveis pela importância das obras do período em questão. A Pfarrkirche Christi Auferstehung (1963-1970) (Imagem 58) de Gottfried Böhm é um bom exemplo da exploração do concreto e dos tijolos à vista de uma maneira que

transita entre o neoexpressionismo e o bru-talismo. Enfatizando a experimentação das formas permitidas pelos materias, a Igreja se constitui a partir de uma sobreposição de volumes que, quando banhados por luz, criam novos desenhos na fachada, tornando-a dinâmica e permanentemente mutável. Além disso, o ritmo aparentemen-te regular que evolui dos desníveis de ti-jolo à vista para os desníveis de concreto armado na cobertura são coroados pelo

56 Daufenbach, Karine. A Modernidade em Hans Broos. Tese de Doutoramento. São Paulo: FAUUSP, 2011.

movimento fluido da torre que sobe em espiral, expressão da flexibilidade do material em-pregado. A igreja de Gottfried é bastante massiva, entretanto, Förderer concebe uma obra ainda mais sólida e sóbria. Embora Walter Förderer, na Holy Cross Church (1966-1969) (Imagem 59) restrinja a composição ao concreto, seus efeitos são igualmente impressio-nantes. A tonalidade escura do material deixado aparente em contato com a neve que o rodeia conferem ao edifício uma austeridade quase inibidora. Entretanto, as aberturas e interpenetrações volumétricas em contato com a iluminação dão vida à obra, exaltando a textura das formas de madeira que a moldaram. Nas duas obras citadas a luz é mais um elemento compositivo que enriquece a experiência espacial e valoriza os diversos aspectos materiais explorados pelos arquitetos. Apesar de tais características da corrente alemã, o brutalismo teve alcance interna-cional e se manifestou de modo diverso em cada país onde se desenvolveu. No Brasil, é notável a tentativa de aliar avanços tecnológicos com a exploração plástica da estrutura, afirmando uma dimensão mais social e menos paradigmática da arquitetura no período em questão. O brutalismo se desenvolve no país tratando o edifício enquanto uma imagem unificada, clara e memorável, e explorando estrutura e materiais. Essa renovação no campo da arquitetura no Brasil se deu a partir de meados dos anos 1950, quando se deixou de seguir à risca o projeto moderno, nos moldes da Escola Carioca, para dar maior valor à noção da estrutura como definidora da expressão plástica do edifício. Encontrando em Vila-nova Artigas seu principal representante, passou a se desenvolver no país uma arquitetura politicamente engajada, que ansiava em ser a expressão da realidade técnica e tecnológi-ca nacional. Lina Bo Bardi, Joaquim Guedes, Carlos Millan e Paulo Mendes da Rocha, são alguns dos expoentes que se utilizaram de uma nova linguagem com edifícios em monobloco, ge-ralmente horizontalizados e massivos, com hierarquia evidente entre volumes, e cuja estrutu-ra frequentemente de concreto armado expressava um desenho trabalhado analogamente às forças estáticas suportadas. Assim, as obras passaram a valorizar os questionamentos

Imagem 59 – Walter Förderer, Holy Cross Church, Suíça, 1966-1969.

Imagem 58 – Gottfried Böhm, Pfarrkirche Christi Auferstehung, Colônia, 1963-1970.

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políticos, exaltando-se espaços de uso coletivo otimizados pela tecnologia e isentos de qualquer elemento decorativo ou supérfluo.

4.4.1. Le Corbusier e o Brutalismo

A menção a Le Corbusier precisa ser esclarecida quando se fala em Brutalismo. Para tal, é necessário que se admita que o arquiteto não se prendeu a um movimento para elaborar a sua arquitetura, mas se permitiu experimentar, e seus traços, em diversas fases, aproximam-se e distanciam-se de certas correntes arquitetônicas. A arquitetura idealizada por Le Corbusier em cinco princípios básicos, que influenciou significativamente o Movimen-to Moderno teve espaço principalmente no entre-guerras, e foi amplamente explorada pela Escola Carioca no Brasil. Exemplo desta fase é a Villa Savoye (1928) (Imagem 60), volume purista suspenso por pilotis, com aberturas regulares ao longo de toda a extensão da fachada, apresentando um pátio interno e um terraço jardim.

Diversas obras se seguiram a essa e o traço ou-trora absoluto e purista – que já demonstrava os caminhos posteriores de sua obra, a exemplo das casas de fins de semana nos arredores de Paris concebidas no final dos anos 1920 com materiais e técnicas tradicionais, como tijolo e abóbodas, além do concreto aparente – se trans-

formou a fim de dar maior expressividade às obras. Exemplo disso é a Capela de Notre--Dame-du-Haut (Imagem 61) em Ronchamp (1950-1955), onde o arquiteto se despe dos preceitos estritamente funcionalistas e se permite uma maior experimentação formal, variando aberturas, espessura de paredes e, especialmente, o formato da cobertura, onde se revela a plasticidade do concreto. Há ainda que se destacar a Maisons Jaoul (1951-1954) (Imagem 62) em que o arquiteto emprega não só concreto armado, mas materiais tradicionais em seu estado natural, como os tijolos preenchendo a estrutura de concreto aparente em formato de abóbodas. Da mesma forma, o Convento de La Tourette (1953) (Imagem 63) reúne diversas características brutalistas. As marcações das celas conferem ritmo às fachadas do volume massivo e pris-mático. Além disso, o arquiteto hierarquiza visivelmente os volumes que compõem o comple-xo, e faz a marcação dos elementos de circulação vertical, além de valorizar a textura do concreto aparente também nos espaços internos com um jogo de luzes.

4.4.2. A Questão da Paisagem

O Brutalismo se valeu de vários quesitos que extrapolam a mera escolha de materiais componentes da obra. Além do uso já citado da luz, enfatiza-se o uso da topografia como um aliado, especialmente no caso da vertente europeia. Constituindo-se, simultaneamente, como arquitetura e paisagem, a exploração da configuração natural do terreno deu espaço às construções em terraço, a exemplo da Prefeitura de Bergisch Gladbach-Bensberg (Ima-gens 64 e 65) de Gottfried Böhm. Construído de forma escalonada, o edifício de concreto

Imagem 61 – Le Corbusier, Capela de Notre-Dame-du-Haut, Ronchamp, 1950-1955.

Imagem 62 – Le Corbusier, Maisons Jaoul, Neuilly, 1951-1954.

Imagem 63 – Le Corbusier, Convento de La Touret-te, Eveux-sur-l’Arbresle, 1953.

Imagem 60 – Le Corbusier, Villa Savoye, Poissy, 1928.

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armado reproduz a topografia em sua forma e sua torre faz referência às cober-turas das edificações vizinhas, em uma re-leitura pouco literal do entorno, mas que ainda assim faz com que a inserção da obra seja harmônica no contexto.

Obviamente, a integração com a paisagem não foi o único modo de explorá-la. Nas Igrejas de Blumenau e Brusque o arquiteto faz uso da topografia justamente para diferenciar-se das construções do entorno, reforçando sua monumentalidade, bem como os efeitos visuais que o percurso ascendente do observador provoca. Ao contrário da vertente europeia e a exemplo da obra miesiana, o Brutalismo Pau-lista preza pela solução genérica, que antes de revelar o caráter funcional dos espaços que abriga, os oculta em soluções geralmente cerradas, embora permeáveis, num envoltório genérico; visualmente alheios ao entorno, mas pragmaticamente abertos. Assim, o Brutalis-mo Paulista não pretende se confundir com a paisagem, mas quer ele mesmo, através da solução projetual única e à maneira da Unidade de Habitação de Corbusier, ser edifício--cidade que se basta em si. Outro exemplo bastante notável neste sentido é a Casa do Arquiteto Hans Broos (Imagem 66), em São Paulo. Percebe-se que a noção da arquitetura como fato isolado é prioridade na obra que, autônoma e em aparente desvio e ruptura com o meio que o cerca, não é insensível a ele, mas renuncia ao fato de confundir-se fisicamente com a pai-

sagem, embora estabeleça uma relação bastante orgânica com ela. Desta forma, percebe-se que, assim como o Movimento Moder-no, o brutalismo não foi uma corrente unívoca e composta por preceitos rígidos. Pode-se dizer que ele consistiu mais em uma postura projetual que em um resultado formal: embora identifique-se diferenças no que diz respeito ao tratamento do entorno da obra, por exemplo, tanto o bru-talismo europeu, quanto o paulista lidaram com a exploração inovadora dos materiais, com os jogos de luzes que valorizam as texturas e com um programa que incorpora espaços coletivos, questionando a gratuidade de postulados formais como definidores do pensamento arquitetônico.

Imagem 64 – Gottfried Böhm, Prefeitura de Bergisch Gladbach--Bensberg, 1963-1969.

Imagem 65 – Gottfried Böhm, Prefeitura de Bergisch Gladbach--Bensberg, 1963-1969. Imagem 66 – Hans Broos, Casa do arquiteto, São Paulo, 1971-

1978.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

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A formação de Dominikus e Gottfried transpassa o conturbado período histórico doentre-guerras e adentra a modernidade com características ímpares, exaltando-se uma grande liberdade formal e forte tendência expressionista. Após a análise apresentada, pode-se dizer que a característica mais marcante da obra de pai e filho, neste sentido, é a pluralidade de lingua-gens da qual se valem para produzir objetos arquitetônicos únicos, incapazes de serem rotulados. É notório que as igrejas apresentadas não se tratam dos melhores ou mais férteis exemplos da obra de Dominikus ou Gottfried, mas fica claro que elas congregam uma série de referências visíveis e recorrentes em toda a obra dos arquitetos, como sua postura de conciliar o tradicional ou antigo, ao novo e revolucionário. Esta arquitetura mais contida representada nos projetos brasileiros dos arquitetos pode ser vista como uma forma de adaptação ao contexto das cidades nas quais se inseriram. Desta forma, os templos projetados por pai e filho em Santa Catarina alçam-se à condição de monumentos modernos e religiosos ao apresentar tanto qualidade arquite-tônica, quanto importância dentro do contexto urbano. Isto exalta a necessidade de re-conhecimento dos arquitetos, aclamados na Europa, porém pouco reconhecidos no Brasil. Cabe exaltar que a presente pesquisa permitiu um amadurecimento do olhar crítico dos bolsistas sobre a arquitetura, tanto através das discussões que abordavam um contexto histórico amplo e complexo, até as visitas às obras, nas quais foi possível direcionar o olhar e perceber as sutilezas de acabamentos e efeitos espaciais que até então passavam desa-percebidos. Isto sinaliza o comprometimento e constante orientação da Professora Doutora Karine Daufenbach, a qual agradecemos pela paciência e compromisso. Agradecemos ain-da ao Grupo PET Arquitetura e Urbanismo da UFSC, pelo suporte e compreensão, também sempre presente e parte desse processo de um ano e meio de trabalho.

Flávia Martini Ramos e Leodi Antônio Covatti

6. APÊNDICES

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6.1. A Igreja de Presidente Getúlio

Primeiro projeto de Dominikus Böhm no Brasil, também feito em parceria com o filho, a Igreja Católica de Presidente Getúlio (Imagem 1) é a obra menos conhecida do arquiteto no país. As informações a seu respeito são incertas: não se sabe se houve alguma visita à cidade por parte dos arquitetos antes de conceber o plano.1 Entretanto, a conformação físi-ca e social da região, de topografia acidentada e colonização alemã e italiana, aproximam o projeto dos demais realizados pelos dois arquitetos para o sul do país.

A cidade de Presidente Getúlio é menor e menos densificada que as demais cidades brasileiras nas quais Dominikus trabalhou posteriormente. Localizado no início de um aclive, em uma região um tanto deslocada da centralidade da cidade - parte em vir-tude da relevância que a Igreja Protestante ali assume -, à frente de um cemitério e nas proximidades de uma maternidade e da re-sidência das freiras, o templo de Dominikus Böhm é imponente, apresenta proporções marcantes, certa rusticidade feitio artesanal. Tanto a composição do volume, quanto os materiais empregados, a tecnologia cons-trutiva e os acabamentos prezam pela sim-

1 Acredita-se, porém, que pela idade avançada do arquiteto na época e pelo projeto ser de pequeno porte, Do-minikus não teria se deslocado da Alemanha para cá nesta ocasião. Esta hipótese surge tendo em vista que para o projeto de Blumenau e Brusque, obras muito mais grandiosas - em termos de tamanho e relevância - executadas simultaneamente, o arquiteto não chegou a visitar o local dos projetos.

Imagem 1 - Dominikus e Gottfried Böhm, Igreja Matriz de Presidente Getúlio, Presidente Getúlio, 1951.

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plicidade: os volumes são meramente justapostos e construídos a partir de madeira, alvena-ria de pedra e taipa com fechamento em terra. Três lances da escadaria feita em pedra vermelha, com aproximadamente 4 metros de largura, antecedem o corpo simples da igreja, mas cuja volumetria e monumentalidade se sobressaem na paisagem. Um volume retangular assentado em um talude com o mesmo revestimento da escadaria, perfaz o átrio de acesso, justaposto a uma torre lateral e a um volume anexo para a sacristia. A torre avança em relação ao corpo da edificação, cuja co-bertura se prolonga até atingir o plano da torre. Esta é acessada a partir de uma escadaria de dois lances localizada no exterior da igreja. Segundo os cortes originais (Imagem 2), o arquiteto havia deixado o primeiro lance externo, e o segundo interno à torre. O que se ve-rifica atualmente, entretanto, é o lance superior também externo ao volume, construído em

madeira, em oposição ao inferior feito em alvenaria (Imagem 3). De qualquer maneira, fica evidente que tal modificação foi realizada originalmente. Três grandes pilotis de madeira com impressionantes 15 metros de altura constituídos por uma única peça, sem emendas, que sustentam a cobertura da edi-ficação, possuem formato cônico, com aproximadamente 2 metros de diâmetro na base, assentados sobre uma pequena camada de concreto. Na extremidade supe-rior, suportam uma viga também

de madeira, que corre ao longo de todo o átrio de acesso. Ainda no exterior, destacam-se as três grandes aberturas da facha-da principal (Imagem 4). Conferindo le-veza à volumetria externa e banhando o interior com intensa luz, as aberturas hoje apresentam vitrais que retratam an-jos nas laterais, e a figura de Jesus ao centro. As fotos mais antigas, entretan-to, apresentam as aberturas com vidros translúcidos sem qualquer tipo de dese-nho, o que torna questionável a presen-ça de tais motivos. Além disso, as figuras aqui empregadas destoam dos demais vitrais, que em-pregam tipos geométricos (Imagem 5) que remetem a círculos, cruzes, além de peixes e flores, tradicionais sím-bolos do cristianismo. Pedras vermelhas de recorte irregular compõem o piso e enfatizam ao mesmo tempo a rusticidade da construção, e a sutileza do arquiteto, que dá continuida-de ao revestimento no interior, integrando os espaços internos e externos ao propor pequenas transições entre os mesmos. Abaixo das aberturas principais, e ao lado da porta de entrada, no exterior da edificação, localiza--se a pia de água benta (Imagem 6), confeccionada com a mesma pedra presente no piso.

Imagem 4 - Vista interna das aberturas na fachada principal. Imagem 5 - Exemplo de vitral com motivos geométricos.

Imagem 2 - Dominikus e Gottfried Böhm, Igreja Matriz de Presiden-te Getúlio, Presidente Getúlio, 1951. Desenho do arquiteto.

Imagem 3 - Dominikus e Gottfried Böhm, Igreja Matriz de Presidente Getúlio, Pre-sidente Getúlio, 1951. Detalhe da escada externa. Imagem 6 - Pia de água benta.

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centro, rodeado por diversos símbolos do cristianismo, como a bíblia, o cálice, a uva, etc. Tanto este vitral, quando os vitrais localizados abaixo do volume suspenso por ape-nas dois grandes pilares de pedra, e as duas grandes aberturas próximas à parede pos-terior do altar podem ser visualizados na fachada lateral direita da igreja. A foto atual (Imagem 11), comparada ao desenho original (Imagem 12) realizado pelo arquiteto revela a quase total fidelidade da obra com o projeto. A maior distinção observada é a presença de um corpo intermediário, disposto em quase toda a fachada lateral, que corresponde ao segundo pavimento ocupado por salas de aula, uma mudança posterior ao proejto, e que confere mais peso visual esta fachada. Além disso, os sinos originalmente deixados visíveis hoje estão protegidos por um fechamento de madeira que permite ventilação permanente. Outra adição significativa foi feita à esquerda do volume principal. O arquiteto previu ali o espaço da sacristia. Entretanto, recentemente foi adicionado um volume com banhei-ros (Imagem 13). Cabe destacar que as adições realizadas posteriormente são mimetiza-

Ao se ingressar no templo (Imagem 7), este se revela um espaço retangular extre-mamente simples. Percebe-se claramente seu zoneamento: um nicho na parede abriga um confessionário feito em madeira, e a nave única logo conduz ao altar, banhado por luz. Esta é transmitida através de vitrais localizados na lateral do altar. O motivo pelo qual esta foi posicionada em tal lugar é revelado por uma tímida abertura em formato de arco que abriga o coral da Igreja. Ao lado deste encontra-se a sacristia, cujo volume é bastante marcante na volumetria externa, mas não se revela a partir do interior. À direi-ta, o pé-direito duplo é reduzido para dar espaço à área auxiliar, composta de salas de aula em seu andar superior. Abaixo, tem-se um espaço diferenciado, que funciona quase como uma bipartição da nave, e é banhado por luz ao longo de toda a sua extensão.

A planta exposta a seguir (Imagem 8) torna legível a área da sacristia, à esquerda, e a área recém citada à direita. A saliência presente na frente do volume corresponde à área da torre. No térreo da igreja, esta área é coberta por uma abóboda (Imagem 9) da qual pendem os mecanismos de acionamento dos sinos. Em sua face lateral, a base da torre apresenta um exuberante vitral (Imagem 10) representando o espírito santo ao

Imagem 8 - Planta Baixa da Igreja de Presidente Ge-túlio. Desenho do arquiteto.

Imagem 9 - Detalhe da abóboda que cobre o térreo no volume da torre. Imagem 10 - Vitral presente no volume da torre.

Imagem 7 - Vista geral do interior da Igreja.

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das ao volume através de revestimento rugoso e irregular semelhante ao existente. A imagem também revela a dife-rença de piso: enquanto à frente da igreja tem--se as pequenas pedras vermelhas, em suas la-terais o piso é feito com grandes pedras cinzas.

A cobertura é feita com tesouras de madeira, cujos desenhos são expostos a seguir (Imagens 14 e 15). Além disso, a técnica constru-tiva utilizada na vedação também pode ser verificada nos desenhos originais do arquiteto, explicitando o ripamento que dá suporte à taipa. Há ainda algumas pequenas modificações como a disposição do ora-tório, que está invertido segundo o projeto; um detalhe em cerâmica na torre que não consta no projeto, sendo que essa intervenção cobre duas aberturas que há no volume, provavelmente para ventilação; na imagem da fachada não é representado o entablamento. Outro fator a se considerar é a pintura do interior da igreja. Mesmo não havendo explicitamente a indicação, pode-se perceber pelas outras obras do arquiteto que as cores são em tons sóbrios e muitas vezes asso-

ciadas ao material em seus estado natural, vide São Luis Gonzaga e São Paulo Apóstolo. O exemplar de Presidente Getúlio é internamente em duas cores, e as mesmas não apre-sentam coerência com o exterior, em branco e marrom. Acredita-se que a ausência de acompanhamento da obra por parte do arquiteto

Imagem 13 - Adição de volume lateral ao corpo principal da igreja.

Imagem 14 - Corte transversal. Desenho de DominikusBöhm.

Imagem 15 - Corte longitudinal. Desenho de DominikusBöhm.

justifique as modificações então expostas, que foram realizadas durante a construção. Entre-tanto, essas diferenças não prejudicam a compreensão da obra como um todo, que revela o viés mais sutil de Dominikus, ao se valer de volumes prismáticos, puros, combinados a técnicas e materiais tradicionais, que revelam a capacidade do arquiteto de se adequar a contextos simples, sem perder as características de sua obra.2

2 Os desenhos originais da Igreja Matriz de Presidente Getúlio reunidos pelos autores pode ser verificado no CD em anexo.

Imagem 11 - Fachada atual da Igreja. Imagem 12 - Desenho original da fachada da Igreja.

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6.2. Artigo Publicado no II DOCOMOMO Paraná1

1 A versão digital do Artigo está disponível no CD em anexo.

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6.3. Resumo Enviado para o X DOCOMOMO Brasil1

1 A versão digital do Resumo está disponível no CD em anexo.

7. REFERÊNCIAS

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CAPÍTULO 2

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