Tecnologias sociais e design participativo v estudo

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1 Cadernos de trabalho Tecnologias Sociais e Design Participativo Versão para estudo Por Henry Benavides-Puerto, Designer Industrial Gestor de Design e Desenvolvimento Sustentável Bolsista CNPq / INCUBA / UNEB Apresentação | O principio que rege o pensamento e ação do design em comunidades que trabalham com aplicação do conceito de tecnologias sociais, é da participação dos integrantes das comunidades e/ou cooperativas na: 1. Definição, objetivos e alcances da tecnologia social mais pertinente aos interesses do grupo; 2. Fundamentação dos pressupostos de cada tecnologia social; 3. Busca por pesquisas correlatas que relacionadas ao objeto da tecnologia social; 4. Construção, discussão e elaboração da aplicação da tecnologia social; 5. Elaboração da fundamentação técnica da tecnologia social; 6. Replicação e compartilhamento da tecnologia social para os pares organizados. Objetivos | Delinear os princípios que serão aplicados no desenvolvimento do trabalho do grupo de design no projeto TECSOL; Nivelar e homogeneizar a conceituação do grupo de design com referência aos assuntos das tecnologias sociais e do design participativo; Repassar métodos de abordagem em trabalho de campo; Construir estratégias de pesquisa e levantamento de dados de acordo com o objeto de trabalho; Definir dinâmicas de trabalho para o melhor desenvolvimento de soluções participativas para as cooperativas; TECNOLOGIAS SOCIAIS 1 | Abordagem do design Este caderno tem como finalidade principal ser um instrumento de nivelamento da equipe de design sustentável quanto ao discurso e a prática a serem montados para abordagem do projeto TECSOL carreado pela Incubadora de Empreendimentos Econômicos Solidários INCUBA – UNEB/UNITRABALHO. Por se tratar de assuntos poucas vezes discutidos dentro das atuais estruturas curriculares das disciplinas do conhecimento discutidas nas universidades, que envolvem as temáticas que tangenciam com a 1 A Tecnologia Social é definida pelo Instituto de Tecnologia Social – ITS como um ‘conjunto de técnicas, metodologias transformadoras, desenvolvidas e/ou aplicadas na interação com a população e apropriadas por ela, que representam soluções para inclusão social e melhoria das condições de vida

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Trabalho sobre design participativo, de Henry Benavides para ser aplicado em processos de design social no Estado de Bahia no Brasil

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Cadernos de trabalho

Tecnologias Sociais e Design Participativo – Versão para estudo

Por Henry Benavides-Puerto,

Designer Industrial Gestor de Design e Desenvolvimento Sustentável Bolsista CNPq / INCUBA / UNEB

Apresentação |

O principio que rege o pensamento e ação do design em comunidades que trabalham com aplicação do conceito de tecnologias sociais, é da participação dos integrantes das comunidades e/ou cooperativas na: 1. Definição, objetivos e alcances da tecnologia social mais pertinente aos interesses do grupo; 2. Fundamentação dos pressupostos de cada tecnologia social; 3. Busca por pesquisas correlatas que relacionadas ao objeto da tecnologia social; 4. Construção, discussão e elaboração da aplicação da tecnologia social; 5. Elaboração da fundamentação técnica da tecnologia social; 6. Replicação e compartilhamento da tecnologia social para os pares organizados.

Objetivos |

� Delinear os princípios que serão aplicados no desenvolvimento do trabalho do grupo de design no

projeto TECSOL; � Nivelar e homogeneizar a conceituação do grupo de design com referência aos assuntos das

tecnologias sociais e do design participativo; � Repassar métodos de abordagem em trabalho de campo; � Construir estratégias de pesquisa e levantamento de dados de acordo com o objeto de trabalho; � Definir dinâmicas de trabalho para o melhor desenvolvimento de soluções participativas para as

cooperativas;

TECNOLOGIAS SOCIAIS1 | Abordagem do design

Este caderno tem como finalidade principal ser um instrumento de nivelamento da equipe de design sustentável quanto ao discurso e a prática a serem montados para abordagem do projeto TECSOL carreado pela Incubadora de Empreendimentos Econômicos Solidários INCUBA – UNEB/UNITRABALHO. Por se tratar de assuntos poucas vezes discutidos dentro das atuais estruturas curriculares das disciplinas do conhecimento discutidas nas universidades, que envolvem as temáticas que tangenciam com a

1 A Tecnologia Social é definida pelo Instituto de Tecnologia Social – ITS como um ‘conjunto de técnicas, metodologias transformadoras, desenvolvidas e/ou aplicadas na interação com a população e apropriadas por ela, que representam soluções para inclusão social e melhoria das condições de vida’

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reciclagem e o tratamento de resíduos sólidos, é que consideramos necessário estabelecer uma serie de alinhamentos transdisciplinares e particularmente metodológicos, haja vista, que o norte metodológico preliminarmente para o projeto TECSOL foi definido, tendo como base, a abordagem do método de Paulo Freire2 que focaliza a transformação dos indivíduos a partir da sua valorização como sujeitos principais de processos sociais. Em cenários de produtividade, onde o paradigma dominante é estabelecido por relações hierárquicas e impostas de cima para baixo a aplicação de pelo menos 3 (três) caminhos alternativos - (a) do Método Paulo Freire, como eixo central de trabalho; (b) da implantação em coletivos cooperativos das chamadas Tecnologias Sociais TSs; e (c) a aplicação dos princípios do design participativo como mecanismo de criatividade, absorção, recriação, inovação de Tecnologias Sociais e suas aplicações em forma de produtos, e na melhoria das condições de trabalho na relação atividade X posto de trabalho - se apresenta como alternativa viável de transformação social e de humanização das atuais relações de trabalho. De outro lado, o surgimento de coletivos de reciclagem, sob a forma de cooperativas organizadas vem contestar a chamada sociedade de consumo, enquanto subproduto do capitalismo cujos produtos principais são o desperdício, a contaminação, o esgotamento dos recursos naturais e a exploração de seres humanos. Estes coletivos, conscientemente trazem para si a responsabilidade de mostrar alternativas de manejo do lixo e de refugos decorrentes de processos produtivos de duvidosa responsabilidade. Atualmente estes movimentos cooperativos e o uso de determinadas TSs vêm demonstrando no Brasil que são mais do que alternativas de desenvolvimento responsável, estão questionando fortemente o paradigma dominante, a exemplo das cisternas pré-moldadas3 para combate à seca, a multimistura4 e as cooperativas de reciclagem5. Vale aqui o esforço em discernirmos entre três possíveis desdobramentos das TSs: (a) As TSs que são desenvolvidas como alternativas viáveis (inovadoras, de baixo custo e voltadas para

organizações coletivas) às Tecnologias Convencionais (TCs) e cuja representatividade se dá nas empresas recuperadas6 que lidam com insumos e matérias primas convencionais; (b) as TSs que são implementadas em empreendimentos cooperativos, a exemplo dos complexos de reciclagem, que visam desenvolver

2 O Método Paulo Freire desde a visão deste trabalho consiste de 3 etapas fundamentais: (1) Etapa de Investigação: busca conjunta entre incentivador e cooperado das palavras-chave e temas mais significativos da vida do cooperado, dentro de seu universo vocabular e da comunidade onde ele vive. (2) Etapa de Tematização: momento da tomada de consciência do mundo, através da análise dos significados sociais dos temas e palavras-chave. (3)Etapa de Problematização: etapa em que o incentivador desafia e inspira o cooperado a superar a visão mágica e acrítica do mundo, para uma postura conscientizada. 3 As cisternas de placa pré-moldada, que servem de reservatório para acumular a água da chuva e proporcionar abastecimento durante o período de seca (...) o modelo hoje multiplicado nas regiões mais secas do Brasil foi criado há quase 25 anos por um inventivo nordestino que adaptou a técnica de construção de piscinas, que apreendera em São Paulo para criar reservatórios de água no sertão. A construção de cisternas tornou-se políticas publica em torno do programa Fome Zero. As cisternas tornaram-se rapidamente um instrumento de convivência com a seca. Graças ao envolvimento de inúmeras organizações não-governamentais, reunidas em torno da Articulação do semi-árido (ASA) e outras como a Caritas, entidade ligada à igreja, as cisternas hoje beneficiam milhares de pessoas. In: Fundação Banco do Brasil, 2004, pp 67. 4 A multimistura, complemento alimentar largamente utilizado no Brasil no combate a desnutrição (...) tornou-se uma TS a partir do momento em que passou a ser a base do trabalho de varias organizações de assistência, creches populares e principalmente das pastorais. In: Fundação Banco do Brasil, 2004, pp 67. 5 A montagem de cooperativas de catadores de lixo e a estruturação de projetos que se relacionam à implantação dos sistemas de coleta seletiva e à reciclagem de materiais também têm sido objeto de políticas em vários governos municipais e têm ganhado a forma de projeto nacional (por meio do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome) In: Fundação Banco do Brasil, 2004, pp 68 6 Empresas recuperadas são consideradas aquelas que entraram em falência e por tanto descumprem compromissos com os trabalhadores da empresa. Os trabalhadores tomam o controle sobre os meios de produção e as condições de trabalho e iniciam processos embrionários de autogestão. Com base em Novaes H. e Sardá M., Para onde vão as

empresas recuperadas? S/D.

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técnicas de reaproveitamento de resíduos; e (c) as potenciais TSs que surgem de idéias boas e baratas, mas que não estão associadas a organizações coletivas, e que por enquanto carecem de impacto social. No trabalho que aqui nos ocupa, os desdobramentos (b) e (c) são os que melhor se apresentam como caminhos a serem trilhados dentro do escopo do trabalho. Nosso desafio é desenvolver trabalho parceiro e participativo junto a 8 (oito) empreendimentos cooperativos em funcionamento na área metropolitana de Salvador, que é o caso das cooperativas que pertencem ao complexo de reciclagem, veja quadro 1, abaixo que se alinha com o enunciado (b), e;

Quadro 1. Cooperativas do Complexo

Cooperativa Especialidade de reciclagem Sede

1. CAMAPET Garrafas PET Salvador

2. RECICOOP Papel Salvador / Cidade Mãe

3. ACORES

4. AMIGOS DO PLANETA Papel - Papelão plástico: Pet Lauro de Freitas

5. CANORE Salvador

6. AÇÃO RECICLAR

7. JACA Meta-reciclagem

8. COOPMARC

A estruturação de (6) seis laboratórios dentro das universidades UFRB e UNEB, como entes geradores de idéias para o desenvolvimento de TSs, que posteriormente serão repassadas, em principio às cooperativas do Complexo de Reciclagem e posteriormente a outros coletivos cooperativos que venham a ser incubados dentro da INCUBA, ou com a finalidade de serem reaplicados em outros contextos dentro dos princípios da economia solidaria ES. Veja-se o quadro 2, abaixo, e que reflete o enunciado (c).

Quadro 2. Laboratórios nas Universidades

Universidade Federal do Recôncavo da Bahia UFRB

1. Laboratório de Construção Civil 2. Laboratório de material de Limpeza 3. Laboratório de desenvolvimento de

produtos de refugos da madeira

Universidade do Estado da Bahia UNEB

4. Laboratório de produtos com papel 5. Laboratório de produtos com rochas 6. Laboratório de produtos com resíduos

tecnológicos

Design participativo

Este tipo de manifestação da prática do design envolve a dimensão da inovação social, mais do que a dimensão da inovação tecnológica. É também alternativa política e de descolonização tecnológica. Constitui-se num tipo de design social que envolve por um lado coletivos relativamente organizados –comunidades, associações, cooperativas e designers, pesquisadores e desenvolvedores – por outro lado, envolve representantes de determinados grupos sociais –usuários tipo, sexo, faixa etária, tribo e

designers, pesquisadores e desenvolvedores -, de acordo com os objetivos e público-alvo do projeto.

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Cenários do design participativo

O design participativo nas grandes empresas: Ikea, Siemens, Nokia e Philips costumam desenvolver seus projetos a partir dos fundamentos do design participativos [mais co-design que design participativo]. Robert Blaich, trabalhando para a Philips desenvolveu uma iniciativa de design participativo que envolveu, na década de 80, um perfil preciso de jovens usuários micro systems do mundo da faixa etária de 15-17 anos, participação por amostragem de grupos de jovens de Tóquio, Amsterdã, Cidade do México e São Paulo... e designers industriais e gráficos das filiais nesses países], foram desenvolvidos o produto, o sistema de identidade visual do produto, a marca do produto e a embalagem para o mesmo, fundamentados na cultura pop (skeats) e nas pichações urbanas. A Xerox International (envolvendo clientes que são convidados para participar das reuniões de planejamento de produtos da empresa, junto com executivos, funcionários e designers da própria empresa). Produtos: Identidade visual, produto, embalagem para o mercado mundial.

O design participativo em pequenas empresas: relativamente praticado no Brasil (utiliza recursos financeiros do SEBRAE), existem algumas experiências... Muito pontuais; Distinções |

1. Design participativo no caso das MPEs é de certa forma limitado, por conta dos escassos recursos financeiros, financia-se o projeto, mas não o produto.

2. Não é exatamente participativo, pois não consegue envolver os usuários. Pode envolver direção da empresa e funcionários e alguns usuários-tipo.

O design participativo em comunidades artesanais de varias regiões do Brasil... principalmente do Nordeste... Meu trabalho na Bahia, de mais ou menos 10 anos.. Consiste na definição de sistemas de identidade visual, critica e autocrítica a técnicas artesanais e aos produtos [questão chave para incentivar processos criativos dentro de um grupo].

O design participativo em comunidades da agricultura familiar, voltado para associações de produtores de itens alimentares e seus derivados, vindos da agricultura e da pecuária, a exemplo das culturas da cana de açúcar (cachaça, açúcar, açúcar mascavo, rapadura, melaço), da mandioca (farinha, beiju, sequilhos), da apicultura (mel, própolis, mix), dos laticínios (leite, queijos, iogurte, doce de leite). Equipes interdisciplinares de designers, pesquisadores e desenvolvedores e membros de associações de produtores desenvolvem projetos de identidade visual, desenvolvimento de sistemas de embalagens, desenvolvimento e melhoramento de produtos e estratégias de comercialização (radial7).

O design participativo em empreendimentos cooperativos de reciclagem. Atual experiência que acontece na Bahia sob a minha orientação, grupo de design sustentável. .. ações de design participativo,

7 Comercialização radial: estratégia de expansão (colonização) de mercados de mercados locais –imediatos, mercadinhos do local- para mercados crescentes -povoado, município, capital, estado, regional, pais-

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plano de trabalho e acontecimento das oficinas de criatividade com inteira participação dos membros das cooperativas: identidade visual, desenvolvimento ou reaplicação de TECNOLOGIAS SOCIAIS, como sendo o caminho de geração de novos produtos.

O papel do design junto aos empreendimentos cooperativos

O design enquanto disciplina do conhecimento voltado para a geração de soluções que humanizem a interação de produtos e objetos para com seus usuários / beneficiários, os indivíduos que se servirão desses produtos e também os indivíduos que participam do processo de fabricação se encontra no cerne da questão que discutiremos adiante. Qual o tipo de ação de design que deverá auxiliar os empreendimentos cooperativos objeto deste projeto? Qual a postura que deverá ser assumida pela equipe de design e quais os objetivos almejados por essa equipe? O design como profissão, surge nos países que lideraram a revolução industrial na Europa de finais do século 18, surge para auxiliar a nascente indústria fundamentada no paradigma metal-mecânico8, onde as maquinas e equipamentos precisavam de adequações que facilitassem seu uso pelas pessoas que iriam lidar com estes. Estas primeiras adequações faziam referência a tamanhos, temperatura, uso, proporções, peso, e mais tarde a necessidades de comunicação, conforto e adaptabilidade dessas máquinas com relação a seres humanos, posteriormente à redução de custos e aumento das vendas. Quer dizer, o design industrial nasce para servir à industria, para atender às necessidades das industrias de adequar tecnologias de produtos e vender mais aos indivíduos que iriam se servir destes. Mais tarde, com a evolução da própria disciplina, é possível construir outras pontes de ação do design, falaremos melhor de pontes alternativas de ação: Nasce o design alternativo, na década de 60, é evidenciado no livro de Victor Papanek, onde o autor nos mostra a possibilidade de outro agir do design: ´Diseñar para el mundo real´ é o texto que mostra que é possível solucionar necessidades humanas realmente ‘sentidas’ utilizando metodologias e técnicas do design industrial e sobretudo utilizando Tecnologias Alternativas que questionam o uso das tecnologias tradicionais, utilizadas pelas industrias, valoriza-se o conhecimento local, os materiais e técnicas do contexto. Perceba-se que há uma inversão quanto ao uso da acepção solução de necessidades: na indústria o design industrial contribui para a solução de necessidades da indústria, já na proposta de Papanek, o design alternativo ou do mundo real contribui para dar solução a necessidades dos indivíduos, ao invés das necessidades das indústrias. À época, falava-se em alternativas em contraposição ao processo de consolidação e ao mesmo tempo de degradação dos processos sócio-econômico-ambientais deflagrados pelas tecnologias convencionais TCs. Assim na década de 60 o movimento das tecnologias alternativas ou das tecnologias socialmente apropriadas busca pela humanização da tecnologia e pela minimização do espírito ganancioso dos investidores internacionais, esse movimento evoluiu no Brasil e no mundo hoje para as chamadas Tecnologias Sociais. Este histórico se encontra de forma detalhada no artigo ‘Sobre o marco analítico-

conceitual da tecnologia social’9 De forma similar, o design que inicialmente foi denominado alternativo adquiriu conotações como design social e design participativo. Trata-se do tipo de design que questiona a si próprio, seus mecanismos, fins e significados e por decorrência seu agir e princípios metodológicos. O individuo passa a ser o centro das

8 Ver historia do design industrial no texto Desenho Industrial de John Heskett, 1980, publicado pela editora da Universidade de Brasília UnB. 9 Artigo da publicação Tecnologia social: uma estratégia para o desenvolvimento. Fundação Banco do Brasil, Rio de Janeiro: 2004

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atenções, não como referência (de gosto, dimensões e percepções), mas como sujeito de uma ação coletiva que se preocupa com quem gera, quem fabrica, quem usa e quem se beneficia da ação. Os envolvidos do design participativo (sejam estes naturais, potenciais ou futuros) são convidados para que junto com designers, pesquisadores e desenvolvedores atuem ativa e sinergicamente durante um processo de inovação que conduza a uma nova tecnologia ou a um novo produto. Estes envolvidos participam da totalidade das etapas do processo de inovação: desde a exploração inicial e a definição do problema, bem como na focalização das idéias para a solução e durante o desenvolvimento dessas idéias indo ate a avaliação das idéias propostas. Ainda para o caso das cooperativas, que aqui nos ocupa, o papel dos envolvidos entende-se até as fases seguintes de prototipagem e produção pioneira.

A ação do design participativo

Como mencionado o design participativo envolve desde o inicio do processo todos os integrantes de cooperativas comprometidos com as atividades do empreendimento na série de atividades que deverão ser alcançadas pelo grupo. Cada indivíduo independente do grau de instrução, do seu posicionamento dentro da estrutura administrativa e operacional das cooperativas, pode e deve contribuir com idéias e ações o trabalho de design participativo que se inicia. Assim, deverão ser potencializadas todas as possíveis formas de comunicação que os cooperados possam ter: comunicação oral, escrita, através de desenhos, gestual, teatral e outras. A equipe de design sustentável deverá, para tanto, se preparar para a codificação / decodificação de todas as mensagens construídas nas atividades do grupo junto aos grupos de cooperados. Para que todo isto ocorra, serão geradas dinâmicas de grupo realmente proativas – propiciar um clima de descontração,

camaradagem e fraternidade - de forma a permitir, no calor das discussões, o surgimento de novas e boas idéias com referência a assuntos de desenvolvimento e produção de soluções tecnológicas que possibilitem a sobrevivência digna do empreendimento cooperativo. O percurso da ação

Poder-se-ia dizer aqui que o percurso da ação do design participativo é de fato a metodologia de desenvolvimento de um processo ou de um produto. Fazemos distinção para três visões que elencamos a seguir, que podem compor processos de desenvolvimento baseados na democrática participativa10: - Busca por nova uma nova tecnologia social

- Reaplicação de uma tecnologia social existente

- Desenvolvimento participativo de um novo produto

Estes são os caminhos alternativos que poderão ser seguidos num processo de design participativo para o momentum do projeto TECSOL, note-se que a noção pesquisa permeia os três caminhos.

A Busca por nova uma nova tecnologia social, pressupõe alinhamento com os objetivos de cada empreendimento. Parte-se do questionamento do que realmente de novo na área pode ser feito e que até agora não foi feito. O que significa ponderar o desafio de desenvolver inovações dentro do empreendimento, para isto é necessário o desenvolvimento de mecanismos que facilitem ao interior do

10 O design participativo está baseado no principio democrático da democracia participativa. Existem dois tipos de democracias. La democracia representativa, que é utilizada na maioria dos países, consiste na eleição de alguém que represente os pontos de vista do eleitor. Esse representante não necessariamente representa esses pontos de vista. O segundo tipo é a democracia participativa que significa que pessoas que se sentem afetadas pelas decisões de outros, então se envolve e reage, individual ou coletivamente.

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empreendimento ações de inovação. Inovar nesse pressuposto significa a capacidade que os cooperados têm de fazer buscas técnicas, prospecção de informações e articulação com instituições tecnológicas; de forma similar inovar desde o posto de vista das tecnologias sociais, significa a busca por caminhos simples e baratos de se chegar numa solução técnica que permita que uma cooperativa se beneficie dos resultados e que ao mesmo tempo, esses resultados possam ser socializados a outras cooperativas ou comunidades que assim precisarem da solução. Salientamos aqui, que o desenvolvimento de uma nova tecnologia social necessariamente envolve outros tipos de profissionais, além dos designers e da própria experiência dos cooperados. A Reaplicação de uma tecnologia social existente significa que a possibilidade que uma comunidade tem de repassar o conhecimento técnico coletivo construído para outra comunidade que precisa desse conhecimento. Nessa hipótese, uma nova TS para ser repassada precisa de sistematização e posterior manualização desse conhecimento, que deve ser registrado e documentado, De forma a ser entendido por quem vai REAPLICAR a TS11. Neste aspecto valida-se a importância da participação de um amplo grupo de pesquisadores que contribuam para a decodificação e reaplicação da TS. . O Desenvolvimento participativo de um novo produto envolve a aplicação12 de uma tecnologia social na fabricação de determinado bem de produção. A questão que interessa neste documento em particular é como a partir dos dois tipos de visões descritos imediatamente acima, podem ser realizados desenvolvimentos de novos produtos com a particularidade de contarem com os princípios de um desenvolvimento participativo, quer dizer fruto de esforços coletivos. Valida-se aqui o fato que é possível a partir de uma TS exista a derivação de várias aplicações ou produtos.

Abordagem metodológica

A utilização do Método de Paulo Freire que focaliza a transformação dos indivíduos a partir da sua valorização como sujeitos principais de processos sociais. No chamado design industrial formal, o centro das atenções desloca seu foco do usuário para a tecnologia, seu processo e o resultado comercial. Ao contrario o método do design participativo foca suas atenções nos beneficiários finais da ação de design: seres humanos.

11 Considera-se relevante fazer distinção entre REAPLICAR e REPLICAR uma TS: As tecnologias convencionais, aquelas que são usadas pelas indústrias capitalistas, são antes de tudo mercadorias passiveis de serem vendidas, alugadas ou licenciadas. A abordagem das TSs é totalmente diferente, estas são consideradas bens sociais, portanto passíveis de serem repassadas sem ônus para os beneficiários. Trata-se de soluções que têm a capacidade de serem adequadas a outros contextos que não aquele de origem. São por tanto REAPLICAVEIS, podem ser modificadas e adequadas ás novas condições de uso. 12 De fora a compreendermos de forma adequada este conceito re aplicação tecnológica vale aqui salientar que um produto tangível se constitui na APLICAÇÃO de uma determinada tecnologia, assim, por exemplo na inovação tecnológica convencional temos o caso da tecnologia laser, que consiste na síntese de um raio com determinada freqüência de onda: o raio laser. Por outro lado, temos como APLICAÇÕES dessa tecnologia diversos produtos: Bisturi a laser, usado na medicina, ou o leitor de código de barras de um supermercado ou ainda o sistema de alinhamento de trilhos utilizado atualmente nos projetos de metro no mundo afora.

Questão da vez: Podemos considerar que o

empreendimento CAMAPET trabalha com uma TS?,

se positivo que tecnologia é essa, existe

documentação, há manualização1 dessa

tecnologia, ou deveremos pesquisar mais?

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As necessidades coletivas devem ter como respostas soluções também coletivas. Desenvolver um sistema de identidade visual, um produto ou uma embalagem a partir dos pressupostos do design participativo significa montar uma abordagem metodológica diferenciada que considere: o que um grupo social específico quer? O que realmente precisa? De que forma? E porque precisa de uma solução? A abordagem envolve fatores que visam o real conhecimento do coletivo, sua realidade, suas capacidades e potencialidades. O papel do grupo de design é o de catalisadores totalmente abertos a todo tipo de colocações por parte dos indivíduos que iniciam um processo de busca de soluções. As sessões coletivas de trabalho se baseiam em processos de comunicação e escuta, livres e abertos, onde as pessoas nem sempre dizem o que querem. Nem sempre agem como esperamos. Nem sempre fazem o que dizem e Nem sempre querem dizer o que dizem, para isto é fundamental trabalhar a empatia com os grupos de cooperados e aprendermos a olhar para as pessoas e apreendermos a enxergar desde suas perspectivas e fundamentalmente olhar para todos. As sessões de trabalho no geral demandam de algum tempo para produzirem os primeiros resultados. As sessões dinâmicas do trabalho são fundamentais para ‘envolver’ a todos... . Cada indivíduo independente do grau de instrução, do seu posicionamento dentro da estrutura administrativa e operacional das

cooperativas, pode e deve contribuir com idéias e ações o trabalho de design participativo que se

inicia. Assim, deverão ser potencializadas todas as possíveis formas de comunicação que os

cooperados possam ter: comunicação oral, escrita, através de desenhos, gestual, teatral e outras.

A sistematização dos resultados parciais e dos resultados finais é realizada pelo grupo dinamizador. Quando afirmamos que o papel do grupo de design é do ser agente catalisador, nos referimos á capacidade de analise, síntese e sistematização que deve-se ter de forma a aproveitar todas as idéias apresentadas e discutidas nas sessões, vem como canalizar elementos chaves que conduzam às soluções almejadas. As soluções que nascem do processo participativo têm a característica do consenso democrático e por tanto serão justificadas, defendidas, apropriadas e multiplicadas pelos protagonistas do processo que as gerou, por tanto terão validade social.

Procedimentos e instrumentos de trabalho com comunidades e cooperativas

1. Conhecimento dos sujeitos de trabalho. Significa envolvimento de trabalho com as pessoas, não somente técnico, mas das historias de vida e da própria comunidade. Conhecer as pessoas pelo seu nome, manifestar interesse pelos indivíduos abre comportas que facilitarão o processo e a interação;

2. Conhecimento das ambiências dos coletivos. Quer dizer, ver e observar as redondezas do local, os espaços de convivência e os espaços de trabalho, seus instrumentos, equipamentos e ferramentas, além da matéria-prima, analisar as condições de trabalho e procurar olhar aspectos que as pessoas na sua rotina não conseguem enxergar;

3. Conhecimento das particularidades: (1) administrativo-organizacionais; (2) tecnologias sociais utilizadas; (3) produtos finais fabricados ou processados, e (4) conhecer as projeções de futuro de cada empreendimento que permitam obter subsídios de trabalho para a equipe de design sustentável.

4. Aplicação de diagnostico tecnológico e de design. Refere-se ao instrumento de trabalho adaptado para conhecer preliminarmente a realidade do coletivo visitado. Permite a coleta de informações básicas e gerais sobre o coletivo e permite estabelecer pontos comuns com outros coletivos, e ao mesmo tempo municiar as ações de planejamento pontual para interações futuras entre o grupo de design sustentável e esses coletivos;

5. Plano de trabalho. Trata-se do planejamento de ações concretas dentro do coletivo na linha do tempo. Define o que vai ser feito? por quem vai ser feito? quais os resultados esperados?

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6. Oficinas de criatividade. É o mecanismo de troca entre o grupo de design sustentável e o coletivo, que têm como objetivo a inovação. Trata-se de sessões de trabalho que tem objetivos claros e contam com estratégias que levam a alcançar esses objetivos. Dois pressupostos básicos: (a) A geração de soluções é coletiva, (b) todos os componentes do coletivo participam do processo.

Espaços físicos de trabalho em ações de design participativo: Condicionantes

1. Espaços cotidianos dos cooperados ou dos artesãos... os próprios locais de produção 2. Criar ambientes de trabalhos propícios e aconchegantes; 3. As 4, 5 ou 6 paredes do local devem ser “louças” de trabalho [cobrir de papel todos os cantos da sala...

muitas canetas piloto, muita fita adesiva, muitos post its, muitos lápis de cores... muita matéria prima para brincar, para construir e desconstruir... essa infra-estrutura simples, junto com muita conversa NADA técnica ... conduz à inovação. O PENSAR E O FAZER juntos novamente

4. Os resultados são visitados e revisitados... criticados e sobretudo auto-criticados. 5. Depois os testes para fazer mais vezes... não em larga escala... mas vezes só isso... porque existem

espaços de comercialização alternativos: comercio justo, economia solidaria, troca entre comunidades criativas (Ezio Manzini13)... existem obviamente as preocupações ambientais.

6. Depois das TSs desenvolvidas os produtos desenvolvidos são necessários para fixação do aprendizado do coletivo os registros: documental, fotográfico, iconográfico, bidimensional, tridimensional... todos

dominam o conhecimento gerado... todos por tanto potencialmente são multiplicadores desse

conhecimento... 7. Os resultados se registram em bancos de dados que estão a disposição de outras comunidades ou

cooperativas... a tecnologia é então socializada... e a mesma poderá ser reaplicada... não replicada.

As etapas da ação do design participativo nas sessões de trabalho coletivo

A. Colocação do (s) desafio (s). A coordenação da equipe de design sustentável inicia o processo, abrindo os trabalhos, explanando os princípios metodológicos e o modus operandi das sessões. Na abertura coloca-se amplamente o que todos no espaço deverão estar trabalhando durante um determinado período de tempo;

B. Discussão preliminar. Provocação da equipe de design e re-ação dos cooperados. Aberta a discussão indução para que o coletivo se expresse. Oportuniza o uso de várias dinâmicas facilitam a participação do coletivo;

C. Concentração ou convergência: afunilamento do desafio. Com o desafio devidamente discutido as idéias e colocações são sistematizadas em frases curtas ou palavras-chave. O desafio que foi colocado de forma abrangente tende à convergência, desta forma se assegura que o foco de interesse não seja desviado ou sofra alterações ao longo do processo;

D. Chuva de idéias. todos os participantes opinam a equipe registra. Colocado o assunto, a palavra é franqueada para todo o coletivo. Incluem-se aqui pesquisadores, grupo de design sustentável e

13 Ezio Manzini. Pesquisador do Instituto Politécnico de Milão. Especialista em design sustentável. Autor de Design para a inovação social e sustentabilidade: Comunidades criativas, organizações colaborativas e novas redes projetuais, série Caderno do Grupo de Altos Estudos do PEP/UFRJ, Rio de janeiro, RJ, 2008

O designer participativo não projeta... provoca, desafia,

questiona, é advogado do diabo... anima, incentiva,

reconhece, da bronca, constrói coletivamente... esta sempre

presente... faz trabalho braçal... e não abandona... nem

mesmo quando os projetos acabam...

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possíveis desenvolvedores, sendo que estes três últimos contribuem de forma a ‘inquietar’ ainda mais o coletivo;

E. Convergência de idéias14 – divergência de idéias | Avaliação I. A prática da discussão possibilita que o assunto discutido derive para diversos caminhos de saída ou procura de soluções. Nos processos de sistematização haverão resultados de idéias convergentes e de idéias divergentes. Uma nova ponderação das mesmas é necessária para percorrer os melhores caminhos. Essa ponderação criteriosa é a Avaliação I;

F. Busca de referências tecnológicas | Busca em bancos de dados: os cooperados devem participar das buscas junto com a equipe de design. Espera-se que no futuro os coletivos se apropriem do processo de busca. Salientamos aqui a importância de treinamentos e nivelamentos de conhecimentos no manejo de sistemas de buscas pela internet, que em paralelo contribui para a inclusão digital de coletivos de trabalhadores;

G. Revisão de idéias convergentes à luz de referências tecnológicas: Debate | Avaliação II. ; Novo ciclo de discussão fundamentado nas possibilidades tecnológicas coletadas. As conclusões constituem a Avaliação II;

H. Filtragem das idéias com maior viabilidade dentro das possibilidades do empreendimento. Fechamento quanto às tarefas de desenvolvimento concreto que deverão ser iniciadas ponderadas com a capacidade produtiva do empreendimento, matérias-primas e recursos técnicos;

I. Detalhamento e amadurecimento. Ciclo de definições J. Construção pioneira. Construção de modelos em escala K. Testes e revisão | Avaliação III. Construção em escala real e submissão a testes. L. Prototipagem. Realização de ajustes de acordo com resultados dos testes realizados M. Registro da tecnologia – reaplicação ou melhoramento. Manualização dos resultados e registros

[escrito, bidimensional, fotográfico, audiovisual] N. Socialização da tecnologia ou da aplicação tecnológica. Disponibilização dos resultados em Bancos

de dados de instituições tecnológicas e em redes de tecnologias sociais. Divulgação em mídias jornalísticas.

VISIBILIZA-SE UM PROMISSORIO CAMPO DE TRABALHO PARA OS DESIGNERS!!!! Questionamento da formação de designers nos países tecnologicamente dependentes.... Vale aqui lembrar a velha discussão de década de 90 no mundo que se referenciou no “pensar globalmente e agir

localmente”... dentro da premissa do avanço do neoliberalismo no mundo e fundamentalmente no continente latino-americano. Onde tecnologias pós-industriais e seus resultados foram simplesmente ‘empurrados’ para as diversas economias retardatárias. A globalização criou o véu de democratização e ‘igualação’ do mundo, perfeito álibi para a nascente transferência de plantas produtivas dos países industrializados (que resultavam caras por conta de custos da mão-de-obra e por conta da logística de

distribuição) para países menos desenvolvidos e com grandes exércitos de reserva de baixo custo. O design latino-americano e suas escolas seguiram essa lógica colonizadora e continuaram a desenhar e a desenvolver um ensino voltado para o mundo globalizado, um mundo onde os players do mercado já foram definidos. Daí a dificuldade de um produto daqui vingar no mercado mundial. Recentemente conheci o caso de uma escola de design chilena localizada numa região indígena onde a formação de designers esta fundamentada na resolução dos problemas locais. Este fato confirma que há de fato alternativas de formação e ação reais. ...Então vamos ao trabalho!

14 Benavides-Puerto Henry, Design e Inovação Tecnológica, FIEB, Salvador, BA, 1999. Ver capitulo 2: A respeito dos conceitos: design, Invenção Inovação.

Efeito multiplicador... [outro ponto chave...]

... não devemos dar o peixe, mas ensinar a pescar e a limpar e a

cozinhar e a comer o peixe... finalmente a lavar o prato!!!... assim o

processos e seus resultados facilitam a sua socialização.