TATUAGEM, METÁFORA DA COMPLEXIDADE CORPORAL
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TATUAGEM, METÁFORA DA COMPLEXIDADE CORPORAL
Cresce a discussão em torno do estatuto corporal, sua completude e sua
fragmentação, alternando uma visão naturalista a uma visão construcionista, ou seja, de
intervenção cultural. Mauss já apontava o caráter fundacional do corpo. O
desenvolvimento da visibilidade por meio das novas tecnologias certamente constitui
elemento instigante de tais lutas simbólicas quando propaga a ideia da substituição ou
confusão do corpo com a imagem, apelando para ideias como pós-humano e pós-
orgânico. O corpo está em cena entre próteses e intervenções.
O procedimento “tattoo” que vai se expandindo traz com ele perguntas
concomitantes sobre o nó complexo bio-psico-sociológico que constitui o corpo e
propicia inúmeras divagações. Serão as tatuagens uma afirmação da unidade do corpo?
Serão comunicações de um tipo que passa menos pela palavra e pela racionalidade e
mais pela emoção e pela memória, ou serão espécies de grafites que também não
deixam de ter seu valor na semiose contemporânea? Aliás, a pele pode ser considerada o
primeiro muro ou tela em que imprimimos nossas marcas. A tatuagem parece-me mais
do que afirmar uma identidade impossível, uma forma mais consciente e explícita de
colar de nossos fragmentos e descontinuidades. O tema corporeidade mais que corpo
obriga o pesquisador a reconhecer que este constitui mais que uma resposta, uma
interrogação, sobretudo no momento de instabilidade que vivemos quando o urbano não
é apenas gestão do espaço e ordenação dos indivíduos, mas impregna toda a
corporeidade como bem assinala Patrick Baudry em Violences invisibles: corps urbain
et singularité. A arte instalação é um bom exemplo. Criam-se ambiguidades corporais
que exprimem a relação do corpo consigo mesmo na aventura do espaço. É neste lugar
paradoxal que inscrevemos a tatuagem: o momento de perenidade e descartável marca
individual e coletiva, internalidade e interação, natureza e cultura. Na sua
complexidade, constitui uma metáfora contemporânea do que se perde e do que se
procura.