Susan Bordo - A Feminista Como o Outro

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ANO 8 1º SEMESTRE 2000 10 SUSAN BORDO A f A f A f A f A f eminista como o Outro eminista como o Outro eminista como o Outro eminista como o Outro eminista como o Outro 1 Os termos masculino e feminino só são usados simetricamente no registro formal, como nos documentos legais. Na verdade, a relação entre os dois sexos não se parece muito com aquela entre dois pólos elétricos, porque o homem representa tanto o positivo quanto o neutro, como aparece no uso comum de homem para designar seres humanos de modo geral, enquanto a mulher representa só o negativo, definida por critérios de limitação, sem reciprocidade. Numa discussão abstrata, é irritante ouvir um homem dizer: “você pensa dessa forma porque é mulher”; mas eu sei que minha única saída é responder: “penso assim porque é verdade”, retirando da discussão, portanto, meu eu subjetivo. Estaria fora de cogitação responder: “e você pensa o oposto porque é homem”, já que fica subentendido que o fato de ser homem não é uma peculiaridade (...) Há um tipo humano absoluto, o masculino. A mulher tem ovários, útero; essas peculiaridades a aprisionam em sua subjetividade, circunscrevem-na nos limites de sua própria natureza. Diz-se freqüentemente que ela pensa com suas glândulas. O homem soberbamente ignora o fato de que sua anatomia também inclui glândulas, como os testículos, e o de que eles também secretam hormônios. Ele pensa seu corpo numa conexão direta e normal com o mundo, que ele acredita apreender objetivamente, enquanto se refere ao corpo da mulher como uma prisão, um obstáculo, sobrecarregado por tudo o que lhe é peculiar. (Simone de Beauvoir, The Second Sex, 1949) O feminismo às margens da cultura O feminismo às margens da cultura O feminismo às margens da cultura O feminismo às margens da cultura O feminismo às margens da cultura Como críticas da cultura, as teóricas feministas têm produzido desafios poderosos a concepções dominantes de natureza humana e filiação política, a normas da razão científica, filosófica e moral, a ideais de espiritualidade, a identidades e fronteiras disciplinares prevalentes, a narrativas históricas estabelecidas. Mas com que freqüência vemos 1. Publicado originalmente em inglês como “The Feminist as Other”, em BORDO, 1999, p. 192- 211. Copyright © 1997 The Regents of the University of California. Publicado em português com permissão da editora.

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ANO 81 SEMESTRE 200010SUSANBORDOAf Af Af Af AfeministacomooOutro eministacomooOutro eministacomooOutro eministacomooOutro eministacomooOutro1 11 11Os termos masculino e feminino s so usadossimetricamente no registro formal, como nosdocumentos legais. Na verdade, a relao entre osdois sexos no se parece muito com aquela entredois plos eltricos, porque o homem representatanto o positivo quanto o neutro, como aparece nouso comum de homem para designar sereshumanos de modo geral, enquanto a mulherrepresenta s o negativo, definida por critrios delimitao, sem reciprocidade. Numa discussoabstrata, irritante ouvir um homem dizer: vocpensa dessa forma porque mulher; mas eu seique minha nica sada responder: penso assimporque verdade, retirando da discusso,portanto, meu eu subjetivo. Estaria fora decogitao responder: e voc pensa o oposto porque homem, j que fica subentendido que o fato deser homem no uma peculiaridade (...) H umtipo humano absoluto, o masculino. A mulher temovrios, tero; essas peculiaridades a aprisionamem sua subjetividade, circunscrevem-na noslimites de sua prpria natureza. Diz-sefreqentemente que ela pensa com suas glndulas.O homem soberbamente ignora o fato de que suaanatomia tambm inclui glndulas, como ostestculos, e o de que eles tambm secretamhormnios. Ele pensa seu corpo numa conexodireta e normal com o mundo, que ele acreditaapreender objetivamente, enquanto se refere aocorpo da mulher como uma priso, um obstculo,sobrecarregado por tudo o que lhe peculiar.(Simone de Beauvoir, The Second Sex, 1949)Ofeminismosmargensdacultura Ofeminismosmargensdacultura Ofeminismosmargensdacultura Ofeminismosmargensdacultura OfeminismosmargensdaculturaComocrticasdacultura,astericasfeministastmproduzidodesafiospoderososaconcepesdominantesde natureza humana e filiao poltica, a normas da razocientfica,filosficaemoral,aideaisdeespiritualidade,aidentidades e fronteiras disciplinares prevalentes, a narrativashistricasestabelecidas.Mascomquefreqnciavemos1. Publicado originalmente eminglscomoTheFeministasOther, em BORDO, 1999, p. 192-211.Copyri ght1997TheRegentsoftheUni versi tyofCal i forni a.Publ i cadoemportuguscompermissodaeditora.ESTUDOS FEMINISTAS1/200011tericas feministas citadas ao lado de Foucault, Derrida, Rorty,Taylor,KuhnouFishcomocrticasoureformuladorasdasDisciplinas, das Cincias, da Filosofia, da Cultura? A resposta:raramente.Commaisfreqnciadeparamo-noscomverses da seguinte formulao de Edward Said: Certamenteh novas tendncias da crtica (...) grandes avanos feitosem (...) interpretao humanstica (...) Ns de fato sabemosmaissobreomodocomoasculturasoperamgraasaRaymond Williams, Roland Barthes, Michel Foucault e StuartHall;sabemossobrecomoexaminarumtextonasformassignificativamenteexpandidasealteradasporJacquesDerrida,HaydenWhite,FredricJamesoneStanleyFish;egraas a feministas como Elaine Showalter, Germaine Greer,Helen Cixous, Sandra Gilbert, Susan Gubar e Gayatri Spivak impossvelevitarouignorarasquestesdogneronaproduo e na interpretao da arte.2DevidoaosesforosdeBarthes,Derridaecolegas,sabemos mais sobre cultura e textos. Graas s feministas,somos incapazes de evitar ou ignorar o gnero. No queroenfatizarmuitoaimagemdacontribuiomasculinaeuropia como aquela do conhecimento crescente, tendoasfeministas,aparentemente,apenasdiscursadoeincomodadoatnopoderemmaisserevitadasouignoradas. Eu sei que Said no teve realmente a intenodesugeriressecontrastegritanteeinfeliz.Nemdesejoenfatizar, embora deva apontar, a impreciso da descrioque Said faz de Gayatri Spivak, que se preocupa tanto comquestes de raa e classe quanto com as de gnero. Queroinsistir, entretanto, na importncia da justaposio de Saidquanto ao gnero o que, em sua descrio, preocupatodas as feministas e a interrogao geral da cultura edo texto atribuda aos homens. Essa justaposio consideraque as feministas desenvolvem uma crtica especializada,que no pode ser ignorada talvez, mas cujas implicaesso contidas, limitadas e de impacto geral insuficiente paraconstituir um novo conhecimento sobre o modo como acultura opera. Ou se trabalha com gnero ou se desenvolveuma crtica de amplo escopo escolha uma.Neste ensaio, argumentarei que a caracterizao queSaid faz da crtica feminista no meramente um irritantevestgio de sexismo, mas um poderoso mapa conceitual quemantmosestudosfeministas,independentedoalcancede suas preocupaes, localizados na regio que Simonede Beauvoir chamou de Outro. Beauvoir argumentou quedentrodomundosocialexistemaquelesqueocupamaposionoespecficadoessencial,douniversal,dohumano, e aqueles que so definidos, reduzidos e marcadosporsuadiferena(sexual,racial,religiosa)emrelaonorma. As realizaes dos que so assim definidos comooOutronemsemprepodemsermenosprezadas;2. SAID, 1991, p. xiv-xv.ANO 81 SEMESTRE 200012freqentemente elas so at apreciadas, mas sempre emseulugarespecialeperifrico:olugardesuadiferena.Assim, h histria e histria das mulheres, e a histria dasmulheres diferena da histria militar, por exemplo localizada fora do que considerado histria de fato. Existemas crticas ps-estruturalistas da razo, de interesse geral, eexistem as crticas feministas, de interesse restrito queles quese preocupam com gnero. A justaposio de Said entre osescritores que nos ensinam sobre o modo como a culturaopera e aquelas que tornam impossvel evitar ou ignorarquestes de gnero reconhece os mritos da feminista como Outro.Como aponta Simone de Beauvoir, o gnero no anica forma cultural de Alteridade. Eu tinha um colega nojudeuque,tendodescobertoqueeusoujudia,tornou-seincapaz de ter uma conversa comigo que no girasse emtorno da inteligncia, do sofrimento histrico e do senso dehumor do povo judeu. Em uma ocasio a conversa mudoupara a nossa paixo pelos musicais da Broadway. Por ummomento pensei que daquela vez iria me poupar, mas entoele perguntou: E o que voc achou do Violinista no Telhado?Apostoqueadorou!Cadavezqueautoresnegrossocitadossomenteporsuasvisessobreraasendoamaestriaemtemasgenricosreservadaaoshomensbrancos, imaginados sem raa ou gnero a Alteridadedo negro perpetuada. Nos campi universitrios o espectroda Alteridade dificultou os esforos rumo ao estabelecimentodeumcurrculomulticultural;essesesforos,porm,socontinuamente representados no como uma tentativa detrazer uma abrangncia maior e mais exatido histrica aum currculo eurocntrico, mas como aqueles que colocamideaiseducacionaisgeraisemposiosubordinadasnecessi dadesedemandasparti cul aresdegruposespecficos.A Alteridade tem portanto muitas faces. Na verdade, oinsight de Beauvoir provavelmente o de aplicao maisampla, profunda e duradoura do feminismo contemporneo.E vem dando forma a inmeros discursos crticos sobreraa,colonialismo,anti-semitismoeheterossexismo,porexemplo.Mesmoassim,eironicamente(emboratalvezprevisivelmente),aprofundacontribuiofilosficadeBeauvoirtornou-sevtimadaprpriadinmicaqueeladescreve. A comear, um zologo (em vez de um filsofo) foiescolhido para fazer a traduo para o ingls de O SegundoSexo. O termo filosfico Lexprience vcue experinciavi vi da,umacategori acentral dopensamentofenomenolgicofoitraduzidocomoavidadamulherhoje. Somente os homens fazem filosofia; as mulheres servemmais para escrever, quando muito, sobre os fatos de nossaprpriacondio.EssaconstruodeOSegundoSexoESTUDOS FEMINISTAS1/200013acompanhou todo o processo de marketing editorial dolivro e sua subseqente recepo crtica. A revista Time atintitulou sua resenha com anncio de nascimento: Peso: 2Libras,3 numa tacada brilhante, embora inconsciente, queassociaolivromaterialidadedocorpo,apesadaimanncia que a mulher sobrecarregada por tudo oquelhepeculiar,comodefineBeauvoireopapelnatural da mulher como reprodutora. E assim Beauvoir, amenosnaturaldascriaturas,umamulherfilsofa,eracolocadaemseudevidolugar.Hoje,assumidamente,estamos mais propensos a ver O Segundo Sexo como tendovalor terico e filosfico, mas somente para o feminismo; suai nfl unci acul tural mai sgeral permanecesemreconhecimento. Assim, O Segundo Sexo, lembrado de modogeral como um livro sobre mulheres, confiado o papel doOutrogenderizadoemnossasnarrativassobrehistriafilosfica. A veracidade do insight de Beauvoir se comprovaironicamente na prpria marginalizao da autora.Simone de Beauvoir no foi a ltima feminista a sofrertal marginalizao. A imagem que Said constri da feministacontemporneacomomaisempenhadanacrticadegnero do que na crtica cultural geral, longe de ser anmala, tpica do papel dado ao feminismo em nossas narrativascoletivas de desafio e mudana intelectual. Considere, porexemplo, a concepo de corpo, prpria ao sculo XX, comoalgo socialmente construdo. Tais noes devem muito aofeminismo, no apenas aos escritos acadmicos feministas,masaodesafiomaispblicoaodeterminismoeaoessencialismo biolgicos, cultivado pelo feminismo militantedofi nal dosanos60ei n ci odos70atravsdasdemonstraes,dosmani festos,dassessesdeconscientizao e dos primeiros escritos populares.4 No cen-tro da poltica pessoal estava a concepo de corpo comoalgo profundamente moldado, tanto materialmente quantoemtermosderepresentaes,porideologiasculturaiseprticasdisciplinares.MasFoucaultquemgeralmenterecebe os mritos (talvez com um reconhecimento tardio aMarx) como o pai da poltica do corpo.Astericasfeministastambmtmexaltadoacontribuiofilosficadopaieimaginadonossasmesfeministas numa associao mais primitiva e ingnua como corpo. Linda Zerilli, por exemplo, enquanto dava os mritosaFoucaultporter-nosmostradocomoocorpotemsidodisciplinado historicamente, descreve o feminismo anglo-americanocomomantendoumavisoessencialistadocorpo como um arcaico natural.5 Em minha prpria rese-nhade1980sobreAHistriadaSexualidadedeFoucault(volume 1, 1978), apontei que a noo de Foucault de umpoder que funciona no negativamente, atravs da proibi-o, mas de modo proliferativo, produzindo os corpos e suas3.ANTONOPOULOS,1994,p.99-101.4. Ver BORDO, 1993, particularmen-te p. 15-42.5. ZERILLI, 1991, p. 2-3.ANO 81 SEMESTRE 200014materialidades, no era propriamente nova.6 Mas eu tinhaem mente a noo de Marcuse, em One-Dimensional Man,damobilizaoeadministraodalibido.Nemporummomentoconsidereiarelevnciadaextensaliteraturafeministasobreaconstruosocialeamobilizaodasexualidadefeminina,dabelezaedafemininidade,porexemplo, no prprio trabalho de Andrea Dworkin:Padres de beleza descrevem em termos precisoso relacionamento que uma pessoa ter com seu prpriocorpo.El esprescrevemsuamobi l i dade,espontaneidade,postura,porte,osusosqueelapodefazerdeseucorpo.Elesdefinemprecisamenteasdimensesdaliberdadefsica.E,claro,arelaoentreliberdadefsica,desenvolvimentopsicolgico,possibilidades intelectuais e potencial criativo umbilical.Emnossacul turanenhumapartedocorpofemi ni nofoi dei xadai ntacta,i nal terada.Nenhumaspectoouextremidadepoupadodaarte,dador,do aprimoramento (...) Da cabea aos ps, cada traodorostodeumamulher,cadapartedoseucorposujeitaamodificao,alterao.Essaalteraoumprocesso contnuo e repetitivo. vital para a economia,oobjetoprincipaldadiferenciaoentrehomememulher, a realidade fsica e psicolgica mais imediatado ser mulher. Dos onze ou doze anos at a morte, umamulhergastargrandepartedeseutempo,dinheiroeenergiatalhando-se,depilando-se,maquiando-seeperfumando-se.comumeerrneodizerqueostravestis,usandoroupasemaquiagensfemininas,caricaturizamasmulheresemquesetransformariam,masqualquerconhecimentorealdoethosromnticodeixa claro que esses homens penetraram no cerne daexperinciadeserumamulher,umconstrutoromanti-zado.7Isso essencialismo? Uma viso do corpo como umarcaico natural? Ou ser que a crtica de Dworkin ao corpofeminino,tradapelaDworkinenquantocorpofeminino,responsvel por nossa incapacidade de entend-la comoatericasofisticadaqueela?QuandoescreviminharesenhasobreFoucault,estavatrabalhandoemumadissertao que criticava historicamente a dualidade mentemasculina/ corpo feminino. Mesmo assim, como o zologoque traduziu O Segundo Sexo, eu esperava teoria somentede homens. Alm disso e aqui minha incapacidade de iralmdessesdualismosserevelamaissutilmentefuiincapazdereconhecerumateoriaincorporadaquandoela estava me olhando de frente. Pois no trabalho de Dworkin,bem como nos escritos feministas dos anos 60 e 70 de modo6. BORDO,1980,p.194-8.7. DWORKIN, 1974, p. 113-4 (grifoda autora).ESTUDOS FEMINISTAS1/200015geral, raramente a teoria era abstrata e elaborada, adorna-da com jargo do poder e apresentada como um objetode fascinao em si. Ao contrrio, a teoria aparecia enquan-todavaformamatriadoargumento.Trabalhosquemostram tal abstrao e elaborao so levados muito maisa srio do que os outros. Dworkin, para tornar as coisas aindamais difceis para ela mesma, consistentemente se recusoudomar e embelezar seu prprio corpo material, a encenar ocontroleculturaldacarneatravsdedietas,roupasegestos normalizados o que a alinharia mais com a idiade mente disciplinada do que com a de corpo desregrado.MascomoBeauvoirargumenta,independentedomodo como vestimos a ns mesmas ou aos nossos insights,seremosquasesempremapeadasdentrodaregiodoOutro. Assim, quando feministas como Dworkin falam sobre adisciplina do corpo exigida pela arte da femininidade, otrabalho delas lido como tendo implicaes somente paramulheres e para as peculiaridades do corpo feminino. Masquando Foucault fala sobre a disciplina do corpo requeridono treinamento de um soldado, isso lido como um discursoneutroemrelaoaognero,almdeamplamenteaplicvel. claro que o corpo do soldado no uma normamenosgenderi zadadoqueocorpo-como-obj eto-decorativo. Mas esse fato obscurecido porque vemos ocorpodamulhercomosignodaalteridade,enquantoconsideramos o corpo com o mundo. As ironias geradasporessaassimetriasoatordoantes.Ocorpomasculinotorna-se o prprio Corpo (como em Foucault alterou nossacompreensodocorpo)enquantoocorpofemininopermanecemarcadoporsuasdiferenas(comoemOfeminismonosmostrouaopressodafemininidade).Aomesmotempo,entretanto,ocorpomasculinoenquantocorpomasculinodesapareceporcompleto,comsuaespecificidadeconcretasubmergidaporseucolapsonouniversal.8 Assim, enquanto os homens so os tericos cultu-raisdocorpo,apenasasmulherestmcorpo.Enquantoisso, claro, o ausente corpo masculino continua a operarilicitamente como a norma (cientfica, filosfica, mdica) paratodos.Lerelererroneamenteafilosofiafeminista Lerelererroneamenteafilosofiafeminista Lerelererroneamenteafilosofiafeminista Lerelererroneamenteafilosofiafeminista LerelererroneamenteafilosofiafeministaQuando nos voltamos para narrativas culturais sobremoderni dadeeps-moderni dadefi l osfi cas,aguetoi zaodaanl i sefemi ni staai ndamai simpressionante. Da prpria Beauvoir a primeira filsofa adesafiar a noo de que h uma condio humana quetodoscompartilhamscrticasfeministasdacinciamodernaeaoceticismofeministacontemporneoemrelao continuidade e unidade da identidade, as teri-8. Devo essa ltima idia a LeslieHeywood,contribuiofeitaatravs de comunicao pessoal.ANO 81 SEMESTRE 200016cas feministas estiveram na dianteira no desafio presumi-da universalidade, neutralidade e unidade do sujeito mo-derno. O desafio comeou com a exposio especfica dognero, quando as feministas mostraram que o Homem realmenteohomem,emboraencoberto.Eenquantosercorpreo, genderizado, ele no podia mais ser imaginadocomopossuidordeumavisoelevada,desinteressadaeonipotentedarealidade.Assimcomeouumamploquestionamento, em todas as disciplinas, dos paradigmasestabelecidos da verdade e do mtodo, paradigmas essesque impuseram padres de raciocnio filosfico e tico, derigor cientfico, de valores literrios e artsticos, de narrativahistrica etc.Tal questionamento no foi exatamente aquele assaltorazodestruidordecnonespintadopelaspolmicascontemporneas. Com raras excees, o objetivo foi revelaro que os modelos dominantes excluram, mais do que atacaro valor do que eles ofereceram. No entanto, uma espciede ansiedade da castrao cultural continuamente convertequalquer crtica ao pensamento cannico num espectro dasfeministas acadmicas a la Lorena Bobbit, podando comimpetuosidade a razo, a lgica e Shakespeare.9 Para aque-les que sofrem dessa ansiedade homens e mulheres in-cluso parece haver somente duas escolhas: falocentrismoouemasculao.Masparamuitascrticasfeministasdamodernidade(eeumeincluoaqui),destronaroreinoequivale a degol-lo. Mais precisamente, a questo aqui compartilhar o poder.Seria de fato, como a classicista Martha Nussbaum jquestionou,10 um absoluto assalto razo sugerir que asnoes ocidentais de racionalidade se desenvolveram emtornodaexclusodequalidadesassociadasaofemininoouaosmodosdesaberdesenvolvidospormulheresnosdomnios alocados para elas? Ou ser que a elaborao ea reconstruo da razo desenvolvidas por filsofos homens,desde Aristteles e Hegel a James, Dewey e Whitehead, estfora do domnio das mulheres? Talvez o problema seja queasfilsofasfeministas,diferenadessesreformadoresmasculinosdarazo,tenhaminvocadoumaalteridadefeminina oprimida ou no reconhecida como um caminhopara a crtica e a reconstruo das formas dominantes. Assim,por exemplo, o estudo fenomenolgico de Iris Young sobregravidezsugerequesagravidezpodedisponibilizar(emboranogarantir)umaexperinciadarelaoentremente e corpo, interno e externo, eu e outro, muito diferentedaquela presumida por Descartes, Hobbes, Locke e outrosarquitetos do sujeito modernista.11 O propsito de Young, eissodeveserenfatizado,noglorificaragravidez,masinterrogaromodelomodernista,for-loaenfrentarsuasparticularidadeselimitaes.Deformasemelhante,Sara9. A equatoriana Lorena Bobbit tor-nou-se famosa nos Estados Unidos(eposteriormentefoivistacomoheronadoantiimperialismonoEquador) ao cortar e jogar fora opnis de seu marido, um marinheironorte-americano, alegando tenta-tivadeestupro.Apsumanoiteinteira de intensa busca, policiaisencontraram o rgo desapareci-do num matagal, permitindo queeste fosse re-implantado com su-cesso no marinheiro em cirurgia deemergncia (nota da revisora).10. NUSSBAUM,1994, p. 59-63.11. YOUNG, 1984, p. 45-62.ESTUDOS FEMINISTAS1/200017Ruddick desenvolve a noo de pensamento maternal12noparacelebrarummodogenunaeexclusivamentefemi ni noderaci onal i dade,nemparaassal tarouabandonarconceitostradicionaisderazo,masparadiagnosticar e remediar as insuficincias desses conceitos.Nohcomonegar,entretanto,queofeminismocontribuiu para um ceticismo cultural generalizado sobre oqueserei vi ndi cacomoconheci mentoeverdade,particularmente quando essas noes so impostas comovlidasparatodaaexperinciaehistriahumanas.Estenoolugarparalistarosinsightseosexcessosdesseceticismo,queassumemuitasformaseproduzidopormuitasforas.Claramente,entretanto,foihistoricamenteinevitvelquesculosdefalauniversalizantesobresereshumanosenaturezahumanairiameventualmentesetornarsuspeitos,equenovasperguntasseriamfeitas.Exatamentequemestsendodescrito?Quemnoseencaixa?Queelementosdaexperinciahumanasoenfatizados?Quaissonegligenciados?Comoimpulsodadopelacrticadegnero,osujeitonaverdadejcomeavasuagrandequeda,suafragmentao,emuitos agora acreditam que no se consegue mais juntarseus pedaos.Algumasfilsofasfeministascontemporneas,natradiodeHumeedevriasconcepesorientais,questionam at a unidade e a estabilidade da identidadedoindivduo.Entretanto,diferenadeHumeedasconcepesorientais,concepesfeministasrecentescomplicamaquestodaidentidadepessoalcomumanova compreenso dos elementos diversos e mutveis quecompemnossaidentidadesocial,comonoimportantetrabalhodeMariaLugonessobreosujeitoviajantedomundo:Acreditoqueamaioriadens,defora,porexemplo,datradiodeconstruoouorganizaode vida dominante nos Estados Unidos, somos viajantesdomundoporumaquestodenecessi dadeesobrevivncia.Parece-mequehabitarmaisdeummundoaomesmotempoeviajarentremundosfazpartedenossaexperinciaedenossasituao.PodemosestaraomesmotemponummundoqueestereotipicamentenosconstricomoLatino/a,porexemplo, e num mundo que nos constri como Latino/a.SerestereotipicamenteLatinoesersimplesmenteLatino so formas diferentes e simultneas de construoda pessoa que fazem parte de mundos diferentes (...)Apassagementreserumapessoaeseroutrapessoaoquechamodeviagem.Essapassagempodenoserdesejadaoumesmoconsciente(...)No12.RUDDICK,1989.ANO 81 SEMESTRE 200018umaquestoderepresentao.Noseassumeapostura de outra pessoa, no se finge ser, por exemplo,algumcomumapersonalidadeoucarterdiferente,ou ainda algum que usa o espao ou a linguagem deformadiferente.Oquesepodeser,naverdade,algum com esta personalidade ou carter, ou algumqueusaoespaoeal i nguagemdeummodoespecfico.Nohcomosereferiraumcertoeuessencial oculto. No se experiencia um eu profundo.13Voltarei a me referir a essas idias mais adiante. AgoraapenasqueroassinalaroquantoraroLugoneseoutrasfeministas crticas da identidade e da noo de pessoa seremapresentadascomomomentosori gi nri osdops-modernismo.No,Derridaquemdesconstrioeu;LugonesrepresentaoOutroqueficaforadoeu,adiferenadaLatinaquevivenumaculturaocidental.Equando se descreve o fim do regime do Homem, a mortedo sujeito etc., como conceitos constitutivos de uma virada,uma crise, ou um momento ps-moderno de importnciaculturalgeral,ofeminismoapresentadomesmoporfeministascomoPamelaMcCallummaiscomoumairmzinhaagradecidadoquecomoamequegerouatransformao:Nopodehaverdvi dasdequeoti podeteorizaodosescritoresquedefiniramomovimentops-modernoJacquesDerrida,MichaelFoucault,JeanBaudrillard,Jean-FranoisLyotard,RichardRorty,entreoutrosproduzi umui tosargumentosqueoferecemumdesafiosubstancialaospressupostosdafilosofiaocidentaltradicional(...)porexemplo,odequearazohumanahomogneaeuniversal,noafetadapelasexperinciasespecficasdosujeitodoconhecimento (...) o de que o conhecimento geradoapartirdeumjogolivredaintelignciaequenoimbricado,oumodificadopor,formasdepoderesistemasdedominao.14No que diz respeito relao do feminismo com essesdesafios,McCallumsugerequeasfeministascertamentedeveriam a eles dar seu aval, porque sustentam uma crticas preconcepes masculinas na filosofia; ela ento levantaaquestosobreseasfeministasdeveriamounoseapropriardops-modernismo.Temosaquimaisumrevisionismo cultural da fantasia Ado deu vida a Eva, noqual o questionamento da universalidade e da neutralidadedarazofilosficaprecedeofeminismo,emvezdeserproduzido por ele. McCallum no parece reconhecer queepi steml ogasfemi ni stascomoSandraHardi ngj questionavamospressupostosdafilosofiaocidentalantes13.LUGONES,1987,p.11-12.14. McCALLUM, 1992, p. 431.ESTUDOS FEMINISTAS1/200019dosurgimentodeFilosofiaeoEspelhodaNatureza,deRichard Rorty, ou que numerosas feministas j exploravam oconhecimentocomoimbricadoemformasdepoderesistemas de dominao ao mesmo tempo em que Foucaultdesenvolvia suas idias. Na caracterizao de McCallum,osgrandeseabrangentesdesafiostericosculturatmorigem com Rorty e Foucault; o feminismo apenas d seuaval.Acontribuiooriginriadofeminismoconstrudacomo uma crtica mais limitada, que expe o sexismo e omasculinismo das tradies filosficas.Porvezesessaconstruoacarretasrioserrosdeinterpretao do trabalho feminista. Meu prprio livro sobreDescartes, por exemplo, discute a natureza masculina dacincia do sculo XVII somente no ltimo dos seis captulos emenciona as idias de Nancy Chodorow sobre diferena degnero somente duas vezes, uma delas precisamente comafi nal i dadededi sti ngui rmeuusodecategori asdesenvolvimentais do uso feito por ela. Mesmo assim, meulivrolidofreqentemente,tantoporcrticosquantoporsimpatizantes, como uma aplicao de Chodorow. Vale apena citar um trecho da introduo de meu livro, e depoisuma recente caracterizao dele, a fim de destacar os tiposde erro de interpretao aos quais o trabalho feminista estsujeito:Meuusodateoriadedesenvolvimentoestcentrado,nonadi ferenadegnero,masemcategoriasmaisgeraisindividualidade,ansiedadedeseparao,permannciadoobjetonatentativadeexplorarsuarelevnciaparamudanasexistenciaiseepistemolgicasocorridasapartirdadissoluodoorgnicoefinitouniversomaternaldaIdadeMdiaeRenascena.importantenotarqueoselfseparado,conscientedesimesmoedesuaprpriadistinodeummundoexterior,nasceunaeracartesiana.umnasci mentopsi col gi codei nteri ori dade,desubjetividade, de localizao no tempo e no espaogerandonovasansi edadese,tambm,novasestratgi asparamanteroequi l bri onummundototalmentemudadoeestranho.15TheFlighttoObjectivity,ento,tentaenquadrarotrabalho de Descartes e a viso cartesiana do self no contextodeumatransformaoculturalgeral,onascimentodamodernidade.EmrelaosidiasdeChodorowsobrediferenadegnero,indicoemFlightqueconsideroseutrabal hosugesti voepotenci al menteapl i cvel compreensodasmudanasqueocorreramduranteoIluminismo. Mas insisto que tal aplicao histrica ainda temque ser feita, e que certamente no foi tentada nas pginasde meu livro. Ainda assim, eis como meu argumento foi re-15.BORDO,1987,p.6-7.ANO 81 SEMESTRE 200020centementedescritoporMargaretAtherton:TheFlighttoObjectivity faz um forte uso das categorias da teoria feministacontempornea, especialmente as elaboradas por EvelynFox Keller e Nancy Chodorow, para dar destaque teoria deDescartes da forma como [Bordo] acredita que ela afeta asmulheres16.NumoutroestudoAthertonrepeteaidia;oobjetivo de meu argumento, ela insiste, mostrar como osargumentos de Descartes provocaram o declnio no statusdas mulheres.17 No entanto, sugerir que o nascimento damodernidade tem uma importante dimenso de gnero na separao entre o self e o universo maternal da IdadeMdia e da Renascena est longe de equivaler a umargumento a respeito dos efeitos do cartesianismo sobre asmulheres. Ler o texto desse modo , na verdade, v-lo atravsdaperspecti vadadual i dadedegnero.Sobessaperspectiva, o nome Chodorow (cujo trabalho focaliza asdiferenasdedesenvolvimentoentrehomensemulheres,tendo ela sido acusada de essencializar essas diferenas)fica preso imaginao do leitor e simplesmente no larga.O resultado, infelizmente, que a diferena das mulheresficaidentificadacomoumapreocupaodotexto,quepassaaserrotuladocomoumtrabalhosobreaexclusodas mulheres, e no sobre a transformao na concepofilosfica do self e do mundo.A feminista cujo trabalho talvez tenha sofrido mais comessetipodeleituraCarolGilligan.Aprincpio,entreasfeministascontemporneas,Gilliganfoiaparentementeamais reconhecida por seus mritos, alcanando um lugarcentralnocenriointelectual,tendosidoreconhecidaeconsagradaatforadoslimitesdaacademia.Qualqueridentificao de In a Different Voice como um livro sobre adiferenadasmulheresseriaaparentementeculpa(ouobjetivo) do prprio trabalho, como o ttulo j sugere. EssaleituracomumdolivrodeGilligan,noentanto,corretaapenas em parte. Com certeza, o contraste que o livro fazentreosdoismodosderaciocniomoralarticuladoemtermos da diferena de gnero. Assim, segundo Gilligan, aprefernciapeloargumentoabstrato,emdetrimentodasavaliaes de situaes especficas concretas, tem por baseum projeto de interao humana mais prprio aos homensdo que s mulheres. Porque o projeto masculino atomista,oschoquesentreindivduossovistoscomoconvitesaodesastre e devem ser rigorosamente evitados por noesabstratas de pessoa e de direitos, que definem fronteirasclarasemtornodoindivduo,protegendo-ocontraoschoques.Oprojetodasmulheres,emcontrapartida,relacional, como Gilligan prope. O perigo principal aqui (oque perturba o universo, se quiserem) a fratura do vnculo,e o imperativo moral restaurar a conexo humana atravsdeumaavaliaocuidadosadecomorepararcomres-16.ATHERTON,1993a,p.45(grifomeu).17.ATHERTON,1993b,p.20.ESTUDOS FEMINISTAS1/200021ponsabilidadeasfraturasocorridasemsituaesespecfi-cas concretas.O/A leitor/a ter notado que no mencionei a palavracuidado na descrio acima, uma omisso proposital queseesclarecerrapidamente.Porenquantoenfatizoque,enquantoacrticadeGilliganarticuladaemtemosdedi ferenadegnero,seri aumerrograveversuasimplicaescomoenvolvendosomentegnero.Naintroduo de In a Different Voice, ela escreve que o principalobjetivo do livro destacar a diferena entre os dois modosde pensar (...) mais do que representar uma generalizaosobrecadasexo.Elaenfatizaqueaarticulaodaperspectiva das mulheres no um fim em si mesmo, masalgo que propicia o reconhecimento de uma limitao naconcepo da condio humana.18 Porque uma vez queas mulheres se inserem no cenrio, como Seyla Benhabibaponta com astcia,sejacomoobjetosdepesquisacientfico-socialoucomosuj ei tosqueconduzemapesqui sa,osparadi gmasestabel eci dossedesestabi l i zam.Adefiniododomniodoobjetodeumparadigmadepesquisa,suasunidadesdemedida,seusmtodosdeverificao, a suposta neutralidade de sua terminologiaterica,apretensauniversalidadedeseusmodelosemetforas,tudoissoquestionado.19O trabalho de Gilligan tem sido largamente criticadopor outras feministas por essencializar uma construo dadi ferenafemi ni nahi stori camentel ocal i zadaecondicionada por hierarquias de classe e raa. E verdadeque o livro falha no questionamento das possibilidades degeneralizaodosachadosdaautora,baseadosnumaamostra limitada e muito homognea. Os limites da amostrapoderiam ter sido tomados, como aponta Jane Martin, comoumachamadaparapesquisasposterioresdentrodeumespao maior de aplicabilidade para a hiptese da autora;em vez disso, Gilligan foi acusada de racismo e elitismo, ealegou-se sem argumento ou demonstrao que a talvoz diferente era unicamente branca e de classe mdia.20Pode-se argumentar que a questo aqui no era exatamentedesafiar os achados de Gilligan, mas expor e refutar (e nosomente em relao ao trabalho de Gilligan, claro) o deslizeinconscientedasexperinciasespecficasdasfeministasbrancas para a fala universalizante sobre os modos de saberdas mulheres. Mas independente da justia que possam vira fazer em relao s generalizaes empricas de Gilliganouaovisbrancodapesquisafeminista,essascrticasperdem de vista uma dimenso importante do trabalho dela.Oquetaiscrticasignoramousoheursticodaalteridade de gnero que Gilligan faz para pr em xeque as18. GILLIGAN,1982,p.2.19.BENHABIB,1992,p.178.20. MARTIN, 1994, p. 652.ANO 81 SEMESTRE 200022pretensesuniversalistasdasnormasdominanteseparaprever alternativas. Em relao a esse objetivo, se a diferenadegneropropostaderivadabiologiaoudepapissoci al menteconstru dos,ouai ndaseel arefl eteadequadamente situaes de todas as mulheres ou s deuma construo de gnero especfica a determinada classeou etnia, nada disso assunto chave. O que a diferena degnero aqui permite (tanto quanto diferenas tnicas e outrasdiferenasculturais)aaberturadeumcaminhoemdireo crtica cultural. Em relao a esse potencial, nosurpreendentequeal gumasteri casfemi ni stasimportantes, incluindo Benhabib, tenham usado os insightsde Gilligan para se alinhar a uma crtica ao individualismopossessivoprprioaoliberalismo,noodeumselfdesimpedidoeautnomo,prpriaaoprojetoontolgicoidentificado por Gilligan como dominante (no diferente).EssasaplicaesculturaisdotrabalhodeGilliganpodem ser bem conhecidas pelas filsofas feministas. Masquando um artigo recente na Chronicle of Higher Educationanalisouotrabalhoacadmicodefendendomodelosdepessoa e Estado21 mais relacionais e menos dominados pornoesdedireito,nemaprpriaGilligan,nemCarolePateman, Susan Moller Okin, Virginia Held, Iris Young, NancyFraser,Druci l l aCornel l ouSeyl aBenhabi bforammencionadas. Essa escamoteao da crtica cultural geral,implcita no trabalho de Gilligan e explcita no trabalho demuitastericaspolticasfeministas,aparecetambmemmuitoslivrosdidticosdefilosofia.Umaediode1994,revisada,dePhilosophy:ContemporaryPerspectivesonPerennialIssues,22porexemplo,trazumaseointituladaEstadoeSoci edade.Ateori apol ti cafemi ni starepresentada aqui por um texto de Alison Jaggar, FilosofiasPolticasdaLiberaodas Mulheres(grifoacrescentado).Estado e Sociedade poderia ter includo, alm da muitovaliosa contribuio de Jaggar, uma das muitas excelentescrticas feministas do liberalismo poltico. Mas a seo no foiconcebidaparadarespaoaumaperspectivafeministadegovernooudeteoriapoltica.Aapresentaoeaargumentaosobrecategori aspol ti casgerai sdemocracia, libertarismo, socialismo e liberalismo soreservadasanlise,(presumidamente)neutraemrelao ao gnero, feita por quatro (homens) no-feministas;opapeldafilsofafeministasomenterepresentaradiferena da situao das mulheres.Otrabal hodeGi l l i gantemsi dopubl i camenteassociado,naverdade,precisamentetaldiferena,achamada tica do cuidado o que no causa surpresa.Atcertopontoessaassociaotemsidofacilitadapelaprpria Gilligan. Ela tenta deixar claro que no est propon-doqueasmulheressejamanjosdamoral,enquantoos21. Point of View: Clinton and thePromise of Communitarianism.TheChroni cl eofHi gherEducation,2dedezembrode1992, p. A52.22.KLEMKEetalli,1994.ESTUDOS FEMINISTAS1/200023homens no se preocupam com ajudar os outros; o que elaargumenta (como eu j comentei aqui), ao contrrio, quemulheresehomenstmmaneirasdiferentesdeentenderajuda, baseados em suas diferentes concepes daquiloque constitui o perigo. Mas os esforos de Gilligan no sentidode evitar a promoo de uma nova verso da imagem damulher-anjo-de-cuidado,prpriaaosculoXIX,foramprejudicadosporsuainfelizescolhadotermoticadocuidadoparadescreveroimperativomoralfeminino.Asugesto de que os homens no cuidam tanto quanto asmulheres imediatamente (e incorretamente) evocada. Almdisso, as conexes bvias e importantes a serem feitas coma crtica ao modelo liberal clssico de pessoa tornaram-seobscuras. Infelizmente, a tica do cuidado logo se tornou acategoria atravs da qual o trabalho de Gilligan foi definidosocialmente,reduzindoopotencialtransformadordadi ferenadasmul heresnoocomumdequeprecisamos de mais mulheres a fim de oferecer mais calor eproteo ao local de trabalho. (Por esse motivo nunca uso otermo cuidado quando leciono sobre Gilligan.)Aculpa,entretanto,nointeiramentedeGilligan,como espero estar ajudando a esclarecer neste artigo. Numaculturaforjadapelasdualidadesdegnero,humapoderosa inclinao leitura do trabalho feminista comose ele reforasse essas dualidades. Assim, por exemplo, oconceitodepensamentomaternal,deSaraRuddickapesardeeladestacarclaraeintensamentequeestdescrevendo um ideal sugerido por um tipo especfico deprticamaternal oupaternal (portanto,noumacontradio em termos, dizer que um homem desenvolve opensamento maternal) continuamente lido como seessencializasse uma perspectiva nitidamente feminina. Maissutilmente, e de forma mais penetrante, como defendo nesteartigo, a teoria feminista nada contra correntes poderosascada vez que assume o manto da crtica cultural geral, emlugardeapenasdefenderumainclusomaiorouumarepresentao melhor das mulheres e de suas diferenas.Quemfalapelafilosofia? Quemfalapelafilosofia? Quemfalapelafilosofia? Quemfalapelafilosofia? Quemfalapelafilosofia?Em Fire with Fire, Naomi Wolf argumenta que em anosrecentes ocorreu um violento generomoto (genderquake),soterrando o patriarcado num eclipse cada vez mais pro-fundo.23 No despertar desse abalo, ela argumenta que, paraas mulheres, este o momento de parar de reclamar e co-mear a exercitar nossos msculos recm desenvolvidos. Naspalavras da propaganda da Nike (Just do it) que ela oferececomosmbolodoquechamadefeminismodopoder(power feminism), as mulheres precisam parar de se lamen-tar e simplemente agir!Mas Wolf est enganada se acredita que a habilida-23. WOLF, 1993, p. 11.ANO 81 SEMESTRE 200024de das mulheres para simplesmente agir (just do it) umaevidncia de que o patriarcado esteja eclipsado. A filosofiafeminista um caso em questo, um caso particularmentepoderoso e problemtico. Como crticas da cultura ocidental,as filsofas feministas tm simplesmente agido j h algumtempo.Mesmoassi m,comovenhoargumentando,continuamossendooOutronaautodefiniodenossadisciplina, na histria intelectual em geral, e at nas narrativassobreasmudanasquensmesmastemosprovocado.AssinalaressaAlteridadenosignificalamentaromodocomo as feministas foram vitimadas por sua marginalizaonas narrativas culturais, nem fazer das feministas as heronasdeumahistriaculturalrevisada,femininizada.Hojeemdia a crtica feminista freqentemente apresentada nessestermos pela mdia popular e por feministas do poder comoWolf, Roiphe e Sommers. Mas a imagem da crtica feministacomo feminismo vtima pressupe, como Freud pressupsao fazer sua famosa pergunta, que se as mulheres queremalgo,issospodeestarrelacionadoaseusexo,elasspodem querer enquanto o Outro. Isso tem sido especialmentefrustrante para algumas de ns que fomos atradas filosofiafemi ni stapreci samenteporqueestaforneceumaperspectiva vantajosa para anlise e avaliao da cultura,e tambm para a participao em sua transformao.Dadoesseobj eti vo,i mperati voresi sti rmosguetoizao da perspectiva feminista em conferncias,em coletneas, no currculo e insistirmos para que a filosofiafeminista seja lida como crtica cultural. Mais precisamente,precisamosinsistirparaqueateoriadognerosejalidapara a crtica cultural que ela oferece. Isso no fcil. Exigevigilncia,precisamenteporquenossalutanotratadaincluso (medida liberal de poder feminino, assumido porWolf, Sommers e outras) mas do significado cultural dessaincluso. Para esclarecer essa distino, deixe-me dar umexemplo.UnsanosatrsparticipeideumaconferncianacionalintituladaAsResponsabilidadesdosFilsofos.Sendoanicafilsofafeministademeupequenogrupo,falei longamente sobre a histria da filosofia e sobre o quoinadequadoeraqualquercompreensodafilosofiatradicionalocidentalquenoconsiderasseoracismoeosexismopresentesemmuitasconcepesfilosficasdanaturezaedarazohumanas.Fazertalexame,enfatizei,nosignificadescartartodasastradiesfilosficasocidentais; significa, isto sim, trazer o estudo da filosofia dasalturasatemporaisparaodomniodoscorposdossereshumanoshistricos.Depois,nasessoplenria,minhaparticipao foi descrita simplesmente como uma sugestodequeprecisamosnospreocuparmaiscomcontratarmulheres e minorias.O mais importante aqui no no ter sido escutada,ESTUDOS FEMINISTAS1/200025mas o fato de que o que foi ouvido tenha sido convertidode crtica cultural para uma simples defesa dos direitos doOutro. Construdos como defesa dos direitos do Outro, meuscomentrios no mais representam uma transgresso aosmtodos filosficos ou s identidades dos homens em meugrupo. Eles poderiam continuar a exaltar (e ensinar) o Homemda Razo como o sujeito sem corpo da histria da filosofiae deixar tranqilamente s mulheres e s minorias, que elesempregariam, a tarefa de tratar de gnero e raa. Assimos insights da filosofia feminista so mantidos em seu lugar,deondenopossaminterferirnaverdadeirafilosofia.Asvozes da diferena tm permisso de falar, mas a barcasegue seu rumo. Assim, por exemplo, torna-se perfeitamentepossvel para um filsofo falar sobre Gilligan em uma seoespecial sobre mulheres e moralidade de uma disciplina,enquantoel emesmoconti nua,i nconsci enteeinadvertidamente,organizandodiscussesemtornodeestudos de caso altamente abstratos e descontextualizados.Nocasodecrticasmaisps-modernas,fezumaenormediferenafilosficaofatodeosintelectuaiscontemporneos terem comumente aprendido suas liesdos pais ps-estruturalistas, mais do que das mes feministas.A alegoria de Freud da horda primitiva, que mata o patriarcasparanostalgicamenteinstitucionalizarereproduzirascondies de seu reino, pertinente quando se quer pensarsobre isso. Os pais do ps-modernismo so, afinal, tambmosfilhosdoHomemIluminista,osherdeirostantodeseusprivilgiosquantodesuascegueiras.Elesdevemestaransiosos para provar sua prpria masculinidade atravs darebelio contra as regras. Mas ser que eles conhecem ummodo diferente de ser?Assim,enquantooHomemtemsidooficialmentedeclarado morto, tal como um Freddy Kruger ele continuaaparecendodesurpresanaElmStreet(enaacademia).Suas pretenses e fantasias a transcendncia do corpo,o esforo rumo separao em relao natureza e aodomnio sobre ela, a ambio de criar um discurso autoritriocientficooufilosfico,tudoistotendosidoamplamentecriticadopelateoriafeministatmsidosimplesmenterecicladas. O moderno, Cartesiano, apagamento do corpo(the view from nowhere)24 foi trocado, como eu argumentoemUnbearableWeight,porsuaversops-moderna,Derrideana (o sonho de estar em toda parte). O velho modeloda mente do homem como o pice da criao divina foisubsti tu doporseuequi val enteps-estrutural i sta:alinguagemhumanacomoltimoarquitetoerbitrodarealidade. O vigia analtico do argumento tem sido suplan-tado pelo mestre da teoria autoritria. E velhas formas dedominar e excluir os outros atravs do jargo profissional e24.Aperspectivadelugarne-nhum.ANO 81 SEMESTRE 200026doobscurantismoforamsubstitudaspornovasformasdeelitismo discursivo.Vemos,ento,areproduoi nconsci entedospecados dos pais (filosficos) pelos filhos ps-estruturalistasquenoestomuitomaisdispostosdoqueseuspaisarealmente ouvir a voz da diferena das mulheres (ou dequalquer outro ser humano). Como Jane Flax colocou:Apesar da retrica do ler como uma mulher oudodeslocarofalocentrismo,osps-modernosnoestocientesdanaturezaprofundamentegenderizadade suas prprias formas de contar e interpretar a histriaocidentaleasestratgiasqueelesopemsgrandesnarrativas dessa histria. Os ps-modernistas ainda hon-ramoHomemcomonicoautoreprincipalpersona-gemdessashistrias,mesmoqueesseHomemestejamorrendo,seutemposeesgotando.Elesrecontamahistriacontemporneadoocidentedentroeatravsdas histrias das trs mortes a do Homem, a de (sua)Histria e a da (sua) Metafsica. O que quer que as mu-lherestenhamfeitodurantetodoessetempo(jsetor-nandopassado)estdoladodeforapordefinioedeacordocomasconvenesnarrativasdeles(...)Essaausnciaoudesaparecimentodasmulherescon-cretas e das relaes de gnero sugere a possibilidadede o ps-modernismo no ser apenas ou simplesmenteopostoaofalocentrismo,masseumaisrecenteartif-cio.25Asfeministascontemporneasnoestoimunessreciclagens do falocentrismo. Muitas de ns podemos que-rerprovarnossamasculinidadetambm;a,sobretudo,que o poder acadmico reside (e claro, no s o acad-mico). Ignorando, rejeitando ou denunciando geraes in-teiras de trabalho feminista ambicioso e criativo (enquantopermanecem notavelmente tolerantes aos erros e omissesdos filsofos masculinos),26 algumas feministas tm sido cm-plices do desaparecimento das mulheres que Flax comen-ta.27 Outras feministas, em resposta, participam de seus pr-prios desaparecimentos. Percebendo que a crtica culturalgeral mui toarri scada,temendoacusaesdeessencialismo, racismo, destruio do cnone e desprezoao homem-branco, tentamos nos proteger mantendo-nospequenas, protegidas e especficas (ou simplesmente evi-tando falar muito sobre qualquer coisa).Paraalgumasfeministas,tambm,parecequequalqueridentificaocomasdiferenashistricasdasmulheres equivalente identificao com a condio de26.Paraumadiscussoperspi-cazdessadiscrepnciaentrenosso tratamento cordial de teori-as de homens e nosso tratamentopunitivo s de mulheres, ver MARTIN,1994, p. 651.27.Ver,porexemplo,NUSSBAUM,1994,assimcomoosmuitosataquesquedesqualificamoessencialismo feminista (ver MARTIN,1994,paraumaexcel entediscusso crtica desses ataques).Num contexto mais popular, Wolfdiscorrecomxtasesobreodramadacapturadopodereda autoridade masculinos pelasmulheres, para ela representadapel oemprego,emannci ospublicitrios,deobjetosflicosemergi ndo(...)devi ri l hasfemininas (WOLF, 1993, p. 29). Masaomesmotempoemqueelacelebra o desabrochar cultural dofalo feminino, no v problema emdispensarvriasdcadasdeescritos feministas mesmo semprestar ateno de fato a qualquerque seja.25. FLAX, 1990, p. 214-6.ESTUDOS FEMINISTAS1/200027vtima,desprovidadepoder.28Paraoutras,entretanto,asdiferenas das experincias das mulheres, tanto as raciaise tnicas quanto as de gnero, permanecem como umarica fonte a partir da qual elas podem elaborar uma crticaculturalefilosficaeimaginaralternativasindisponveisousilenciadas nas histrias que os homens contaram sobre suasexperincias. Considere-se, por exemplo, duas abordagensdistintasparaadesconstruoculturaldosujeito,umarepresentada por Derrida, a outra por Lugones. A posio deDerrida abstrata e impessoal. Eu no seleciono, ele escre-veu. As interpretaes se auto-selecionam. Aqui, enquantorenunciaaoCartesianismo,Derridaperpetuasuaficocontroladora de que uma pessoa pode negar os acidentesda biografia individual e falar com uma voz puramente filo-sfica.Na crtica de Maria Lugones, ao contrrio, os aspectospessoai s(ecul turai s)dai denti dadepermanecempl enamentepresentes,ai ndaqueauni dadeeapermannci adosel fsej amdesafi adas.ComoaautobiografiadeMinnieBrucePratt,quefalasobreseucontnuomovimentodeidentidadesdepele,sangue,corao,aabordagemdeLugonesestvividamentefundamentadanaexperinciapessoal,freqentementevisceral. Isso enfatiza a multiplicidade social concreta, maisdo que o abstrato desaparecimento do sujeito. O self estfraturado porque nossa experincia social requer isso de nsmaisdealgunsdoquedeoutros.Aexperinciadaunidade da identidade no mais do que o privilgio deestar vontade em meio cultura dominante, de sentir-seintegradoaela.Apesardisso,oselffraturado,foradoaaprender a ser mutante em mundos estrangeiros, por umaquesto de necessidade e sobrevivncia, pode ensinar li-es importantes sobre como ser um sujeito nos moldes brin-calhes, flexveis e no imperialistas.Meu objetivo aqui no insistir que cada filsofo adoteum estilo mais pessoal ou anedtico; o que quero insistir nofato de que h uma questo filosfica em jogo na diferenaentreDerridaeLugones,duasvisesrivaisdamortedosujeito e que refletem diferentes sujeitos da histria com osquais cada um deles se identifica. Essa questo apagadana medida em que s Derrida visto como algum que falaem nome da filosofia e da cultura, enquanto Lugones considerada uma representante da voz da Outra Latina. Seosfilhosrebeldestivessemrealmenteescutadoasvozesfeministas se tivessem sido capazes de reconhecer a teoriafeminista como representando no apenas a voz diferenteda Alteridade, mas a autoridade dos modos de ser e saberhi stori camentedi ssemi nados,senocul tural mentedominantesporsisstalveztivessemchegadoauma28.Paraumadiscussodaambi val nci afemi ni staemrelao diferena feminina,vermeuFemi ni sm,Postmodernism,andGenderSkepticism.In:BORDO,1993.ANO 81 SEMESTRE 200028compreenso mais profunda do falocentrismo e dos modossutis que ele tem de se reproduzir. Se eles tivessem olhadopara uma histria humana maior do que a deles prprios,talvez tivessem tomado o cuidado de no extrapolar a mortedesuasprpriastradiesfilosficasatodasasculturas.Dentrodessastradies,oself,ohomem,oautor,asubjetividade tomaram formas muito especficas, s custasdasexperinciasexcludas.Essasformaspodemdefatoagora estar assentadas sobre um terreno menos elevado emais acidentado do que o anterior. Entretanto, outras formasde ser e saber foram viabilizadas e continuam disponveis,esperando para serem trazidas da regio do Outro e se uni-rem a elas nos terrenos centrais de nossa cultura.Refernciasbibliogrficas Refernciasbibliogrficas Refernciasbibliogrficas Refernciasbibliogrficas RefernciasbibliogrficasANTONOPOULOS,Ana(1994).SimonedeBeauvoirandtheDifference of Translation. Institut Simone de Beauvoir Bulletin, v.14.ATHERTON,Margaret(1993a).APANewsletteronFeminismandPhilosophy, v. 92, n. 2 (outono).____ (1993b). Cartesian Reason and Gendered Reason. In: LouiseAntonyeCarlotteWitt(eds.).AMindofOnesOwn.Boulder:Westview.BENHABIB, Seyla (1992). The Situated Self: Gender, Community, andPostmodernisminContemporaryEthics.NewYork:Routledge.BORDO, Susan (1980). Organized Sex. Cross Currents, v. 30, n 3.____(1987).TheFlighttoObjectivity:EssaysonCartesianismandCulture. New York: SUNY Press, , p. 6-7.____(1993).UnbearableWeight.Berkeley:UniversityofCaliforniaPress.____ (1999). 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