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392 Grupo de Trabalho: Teorias STORYTELLING E MÍDIA: A NARRAÇÃO DE HISTÓRIAS CONSTRUINDO O PODER POLÍTICO Prof. Dr. Adenil Alfeu Domingos 1 Resumo: Objetiva este artigo dar noções de storytelling como meio de formatar pensamentos, com fins de obter o poder e o lucro. Pretendemos aqui dar algumas características desse tipo de discurso na mídia como fenômeno da pós-modernidade, afeito ao que Zygmunt Bauman chama de era da liquidez. Nela, o concreto e abstrato não se distinguem com nitidez, já que tudo flui e nada é duradouro. O storytelling é um discurso feito de símbolos, quase sem referenciais com a realidade observável de modo pragmático. Ela vive no imaginário de um público-alvo das histórias midiatizadas. A mídia, nesse particular, é a lídima representante desse tipo de discurso. Pretendemos mostrar aqui como esse tipo de narrativa invadiu a política. Palavras-chave: storytelling, política, mídia, poder, management. Introdução Nos países anglo-saxônicos, o storytelling é um espantoso fenômeno que se desenvolve e está invadindo tudo: a mídia, a escola, a igreja, a empresa, a internet e a política e até o próprio desenvolvimento pessoal. São quase 8 milhões de páginas recenseadas pelo Google tratando desse assunto. É o poder de narrar a vida em múltiplas formas que está em jogo político. Trata-se de um grande produto à venda, andando a passos de gigante na sociedade de consumo atual, mas de modo subliminar. 1 Prof. Dr. de Semiótica da Unesp de Bauru, Curso de Comunicação Social – Jornalismo e Design

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Grupo de Trabalho: Teorias

STORYTELLING E MÍDIA:

A NARRAÇÃO DE HISTÓRIAS CONSTRUINDO O PODER POLÍTICO

Prof. Dr. Adenil Alfeu Domingos1

Resumo: Objetiva este artigo dar noções de storytelling como meio de formatar pensamentos, com fins de obter o poder e o lucro. Pretendemos aqui dar algumas características desse tipo de discurso na mídia como fenômeno da pós-modernidade, afeito ao que Zygmunt Bauman chama de era da liquidez. Nela, o concreto e abstrato não se distinguem com nitidez, já que tudo flui e nada é duradouro. O storytelling é um discurso feito de símbolos, quase sem referenciais com a realidade observável de modo pragmático. Ela vive no imaginário de um público-alvo das histórias midiatizadas. A mídia, nesse particular, é a lídima representante desse tipo de discurso. Pretendemos mostrar aqui como esse tipo de narrativa invadiu a política.

Palavras-chave: storytelling, política, mídia, poder, management.

Introdução

Nos países anglo-saxônicos, o storytelling é um espantoso fenômeno que se

desenvolveeestáinvadindotudo:amídia,aescola,aigreja,aempresa,ainternetea

política e até o próprio desenvolvimento pessoal. São quase 8 milhões de páginas

recenseadas pelo Google tratando desse assunto. É o poder de narrar a vida em

múltiplas formas que está em jogo político. Trata-se de um grande produto à venda,

andando a passos de gigante na sociedade de consumo atual, mas de modo

subliminar.

1 Prof. Dr. de Semiótica da Unesp de Bauru, Curso de Comunicação Social – Jornalismo e Design

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Cursos de storytelling começama se espalhar pelomundo, principalmente em

termosdegerenciamentoaprodutosquedisputammercado,comoospolíticosaserem

lançados como candidatos de um partido, assim como qualquer produto de uma

empresa que tem também uma história para ser narrada. Métodos de produção de

storytelling estão sendo oferecidos até em sites na Internet, como é o caso do

[email protected]ãoensinadas

tratam de assuntos diversos, como a vida de grandes empreendedores, ou mesmo

narrativas ficcionaisquepossamservirparaexemplificarumestadodeespíritocapaz

de colocar toda uma empresa em interação comunicativa. O objetivo é tomar uma

atitude pragmática e viva, nas relações de trabalho, acrescido de forte valor não só

intelectual,mastambémficcional.

Uma equipe de criação se reúne, fazendo briefings, como ato realmente

planejadodedarinformaçõeseinstruçõesconcisaseobjetivassobremissãooutarefa

aserexecutadano futuro.Primeiro,háumaconsultadoque jásedisseese tornou,

assim,passado.Essepassadoservecomopontodepartidaparaasnovashistóriasa

seremcriadas,mascomonovasroupagens.Depois,háumaconsultadepúblicoalvoa

ser considerada. Quando esses dados estão evidenciados, colocados à mesa, toda

umaequipedecriadores,redatores,designers,managemants,alémdecontratoscoma

mídia,homepagesnaInternet,blogers,weblog,ourkut,enfimtodaumaredeemativa

interaçãopassaafuncionaremtornodeumobjetivo:venderumdeterminadoproduto

pormeiodeumstorytellingquesejaconvincenteeformadordeumaidéia.

Desse modo, o storytelling é uma história criada ou reutilizada, quando já

existente,comofimdepersuadirecriarnovoshábitos.Assim,porexemplo,todosos

componentesdeumaempresasesentemcompromissadoscoma“família”empresarial,

daqual todaumaequipedeagenciadoreseoutrosprofissionais fazemparte.Praticar

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essaatitudehumanananarração, revisitadaoucriadaparaumdeterminadoobjetivo,

essencialmente relacional, encarnada e viva, permite, ao mesmo tempo, criar um

estadodeespíritodemudanças,decompreensãorecíproca,deproduziroinsightpara

sairdohábitoecriaronovo.Alémdisso,anarrativadeexperiênciasdevida,demodo

metafórico ou não, serve para (com)partilhar conhecimentos próprios com outros

membrosdaorganizaçãoempresarial.Essecompartilhamentodesaberesvaiproduzir

umconjuntodehistóriasaserutilizadoemdiferentes reuniõesouapresentações.As

personagens tornam-se suportes vivos de histórias vivas, onde se concretizam e

encarnamidéiasque,mesmoquecomplexas,podemsetornaracessíveisatodospor

meiodeumstorytelling.

Tudo entra em empatia absoluta. A própria empresa se antropomorfiza como

personagemquetambémtemumahistóriaparasercontada,assimcomoosprodutos

queela acabagerandoe oferecendoaopúblico consumidor.Essas idéias, ainda, ao

serem difundidas, em geral, por meio de aparelhos eletrônicos e multimídias,

compartilhandoexperiências, tornam-seportadorasdeuma tonicidadeparticular,mas

adotadasportodososcomponentesdeumaequipeempresarial.Porexemplo,servir-se

deemailparadivulgargrandesexemplosdeempreendedorismoéummeiodesetornar

conhecidoporumaplatéiaincomensurável.

Assim, esse tipo de narrativa está se espalhando nos meios tecnológicos

midiáticos, por se mostrar um meio eficaz de alcançar grandes públicos em pouco

espaçotemporal.Namídia,terumaboahistóriaparacontartornou-seummeioeficaz

de projetar-se e conseguir espaço social de celebridade, mesmo que de modo

olimpiano, passageiro. É desse storytelling, centrado especialmente na política, que

iremostrataraqui.

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1. Storytell ingnaeradal iquidezdeBauman.

A identidade do sujeito na sociedade de consumo está em reciclagem, assegura

Bauman (2001). Ela é ondulante, espumosa, aqüosa. Por isso, ele a denominou de

sociedade da liquidez. O mundo atual está sendo marcado pelo pluralismo das

invenções,pelamultiplicidadedemicro-relatosdevida,oustorytelling,que interatuam

demodoagitadonaformulaçãoantropológica-filosóficadoindividualismopós-moderno.

Anaturezadovínculoqueuneosindivíduosformandooqueratradiçãodenominade

sociedadeéapenasumespaçointerelacionalsemióticomidiático.Fragilidade,ausência

de um equilíbrio e de um centro, mobilidade expansiva ou decrescente, eis as

características dessa nova estrutura que constrói o paradoxo da estabilidade da

liquidez.Assim,Baumantransformaumateoria todaemumstorytellingencarnadana

metáforadolíquido.

Ostorytellingé tambémumfenômenodomarketingnamídia.Omarketingpessoal

ou empresarial tem sido a tônica das publicações na mídia. Narrativas de vida se

tornam célebres por algum espaço de tempo, criando heróis e acontecimentos

meteóricos.Sãonarrativasquesetransformamemobjetoàvendanamídia,ocupando

espaçosmultimidáticos, a serem acompanhadas em diferentes suportesmidiáticos e

imitadas,oumesmorepudiadas.

Viverintensamenteasemoçõesdavidacotidianaparecetervencidoaconcorrência

comaracionalidade.Assim,aliquidezpassouaatuarnoimagináriocoletivotornando-

se uma espécie de passaporte para a sobrevivência de algo ou alguém, no fluir

contínuoeapressadodomundopós-moderno.Maisdoqueomundodigitalmidiático

feitodevirtualidadescomoosecondlyfe,oquesefazénarrarhistóriasparaprovocar

estranhamentos e adquirir poder. Assim, o storytelling midiático está ditando novos

contornos, já que neles ficção e realidade perderam seus limites e tudo virou

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espetáculo. Dinheiro, sexo, amor, poder, consumo, identidade, comunidade, ética,

verdade,realidade,ficção,tudoseliquefaznoespaçomidiáticoondetudoémeteórico.

ParaBauman,aexpressãoquepodesintetizaraerapós-modernaé“Modernidade

líquida”,poisnelatudofluiesuplantaaeraanteriordasolidezdescompromissadacom

orealeaética.Tudoestáemmetamorfose,inclusiveoatodecontarhistórias.Assim,o

aparecimentodostorytellingnamídiatemcomoobjetivoadaptareacomodar,nosmais

diversos suportes tipos de linguagem, uma narrativa qualquer. É inevitável essa

analogiaànossaatualeimediatistasociedade.Oquecontaéarapidezeafacilidade

deengolirumprodutodemercado, jámastigado,poisessesprodutosestãonamídia

paraatingirgrandesplatéias.Veicular idéiaspormeiodehistóriasvivasécriar “mais

doqueoespaçoquelhestocaocupar;espaçoque,afinal,(essespúblicos)preenchem

apenas ‘por um momento’” (BAUMAN, 2001, p. 8). Tudo se derrete, desintegra-se,

enferruja fácil, diz Bauman. Inclusive os discursos das instituições. Só vigora a

ascensãodeumobjetivoindividual,enquantoasinstituiçõestradicionalistasentramem

declínio.Osespaçosdashistóriasseamalgamamnasmídias,noscomputadores,na

telefonia,especialmentenoscelulares,gerandocaosedesterritorializaçãoespacial.

Politicamente, Bauman acredita que a liberdade individual só pode ser produto de

trabalho coletivo, embora estejamos rumando para a privatização dos meios de

assegurar essa liberdade.Ostorytelling, porém, tendea suplantar essemedoe criar

pontesmais fáceisdeserem transpostasno relacionamentohumano,poisseuperigo

estápordetrásdosbastidores,ocultosnasideologiasenodetalhedeixadodelado,por

ser inconveniente ao público alvo saber, para não quebrar, de imediato, um contrato

qualquer.Sóoleitorcríticoconseguechegaràsprofundezasdaideologiadostorytelling

depoisdedecodificarocódigoemqueelefoinarrado.

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O storytelling é uma tentativa de humanização desse espaço de interação. Ele

procura preencher o espaço entre o ideal e o real dos planos de cada um e até do

senso coletivo. A narrativa não pode ser um produto estilhaçado, desconexo, mas

apresenta-secoerenteecoeso,comonocasodosnoticiáriosnatelevisão.Oscortesno

real já então idealizado pela câmera que o captou dando-lhe um ponto de vista

ideológiconãoaparecemparaotelespectadordessemesmoespetáculomidiatizadoe

persuasivo.Nostorytellingdeveimperaramodernidadelíquidaesubjetivadasidéias

ocupandoolugardascoisasmateriais,jáqueparaBaumannãohánadamaislevedo

queuma“boaidéiaatiracolo”,ouseja,umaboahistóriaparasecontar.

Os noticiários midiáticos estão procurando transformar a informação

descontextualizadaemecânicadosnoticiáriosclássicosemhistóriasvivas,colocandoo

jornalistacomosimplesmediadordonarrado.Nesseespetáculo informativomoderno,

sãoaspersonagensquesepresentificamnosécransepáginasdejornaloudelivros,

como um palcomidiado, quebrando distanciamentos e vivificando as informações.O

presenterecortadoideologicamentetrazemsiapromessadeumfuturopromissormas,

por isso mesmo, é encarado como deficitário e incompleto. A rapidez dos

acontecimentos que se sucedem de modo alucinante não reserva espaço para o

prazer, para a reflexão. Não se pode perder tempo e isso é crucial na disputa de

conseguirumfuturopromissor.Nessecontexto,odiscursopolíticotornouumbalãode

gásouumbalãodeensaioondecontarhistóriasépresentificaroausenteideal.Eisso

pareceserobastanteparaohomemsobrevivernaeradoespetáculomidiado.

2. Ostorytell ing lactosensu

Temospraticadoaolongodanossahistóriadoistiposdeabordagensnarrativas.

A primeira é chamada de análise imaginária, ou histórias de visão; a segunda são

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histórias chamadas de trampolim, ou seja, os storytelling, usados principalmente no

gerenciamentodeempresas.Estassãomaisafeitasaseremstorytellingqueaquelas.

Isso,porém,não impedequeasprimeiras sejamadaptadaseusadascomomesmo

objetivodasnarrativasdetrampolim.Todaselasfazemapelometáforasemetonímias,

tendo por finalidade elucidar situações e tratar problemáticas complicadas, fazendo

emergirotácito,notadamenteossaberesouexperiênciastácitas.Todososstorytelling

procuramcolocaràluzoqueestavaescondidooudesprovidodesentido.Sãotextos

narrativosqueproduzemefeitosdiretosnosgruposqueaspraticam,demodoindividual

ouatémesmoglobal,nasdinâmicasdemudanças,deinovação,oudeclimarelacional

nas organizações e sociedades em rede. Produtos puros da imaginação, embora

sempre baseadas nas experiências com o real, elas se aproximam da escritura

automáticaoudosonhorevelado.Aquestãocolocadatendeabeneficiarumaespécie

deiluminaçãoemalgoobscuro,comosefosseummergulhoprofundonaproblemática

existencial humana, em que os sentidos não podem perceber e as idéias estão

freqüentementenãoesclarecidas.Nãose tratadedecodificare interpretarumcódigo

lingüístico,mas sim, de encontrar nas suas camadasmais profundas uma “lição” de

vida.

Osstorytelling,ouhistóriasdetrampolim,correspondemaoqueospioneirosdo

storytellingdasempresaspraticam.Trata-sedepartirdeumasituaçãoedeumsentido

jáatribuídoaumaquestãocoletivaetraduzi-lasobumaformaatrativadenarrativa.O

storytellingpermiteabordarumaproblemáticaprecisa,semprojetarumaracionalidade

apriori.Sãoreveladoras,libertáriasesuasvirtudesestãonapesquisadossentidosque

elaspermitemedotrabalhode interpretaçãodosquaiselasfuncionamcomoumpré-

texto.Elasnãosãotransmissíveis taisquais foramproduzidas, jáqueultrapassamas

pessoas que estão implicadas em suas produções. Mas elas podem ser traduzidas,

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transpostas sob todas as formas de comunicação de uma empresa, por exemplo.

Assim,podemospartirdeumafábulaclássicaqualquereaplicá-lametaforicamenteem

uma situação de comunicação dentro da empresa, em que todos se encontram

empaticamente identificados, de um modo ou de outro, com uma personagem da

histórianarradaoumesmocomoseuconteúdo.

As histórias são metáforas para desencadear idéias. Interpretar, ajustar,

diversificaraschamadashistóriasde trampoliméummeiode interaçãocomunicativa

muito eficaz, pois é ummeio de vivo deentrar emcontato comummundoqueestá

alémdaspalavras:avidaquenaopodeserdita,massim,vivida.Ostorytellingéum

produto da era do consumismo e do marketing em que tudo vira produto à venda,

principalmente os discursos ditos midiáticos. Não se trata, portanto, de qualquer

narrativa de entretenimento, mas sim, aquela que tem o objetivo de formatar

pensamentos. O storytelling é um meio de veicular significações, mesmo que

complexas, de modo mais simples e envolvente. Reconciliar e criar de indivíduos e

organizaçõesqueusamopoderdanarraçãodehistóriasemtodasassuasformas.

Éumtipodenarrativaondeosentidoestáencarnadoporpersonagens,nascidas

daerupçãodesituaçõesvividas.Seelasnãosãofactuais,massim,ficcionais,elaos

representam demodo antropomórfico e acabam por lhes dar verossimilhança, como

umvetordedireçãoassazcondizentecomarealidadedocotidiano. Pormeiodelas,

podemos fazer conclusões que são próprias da vida cultural e do discurso humano.

Logicamente, que o conto, a notícia, a literatura, enfim todo tipo de narrativa, são

storytellingsesempreestiveramaserviçodessetipodeinteraçãoemquehomemesua

representaçãonodiscursoperdemoslimitesdivisórios.Masostorytelling,strictosensu,

éumprodutoàvenda,formatandoidéiasnoseuconsumidor,comoveremosadiante.

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3. O aparecimento do Storytelling strictu sensu

O novo sentido dado a storytelling se deve a Christian Salmon. Segundo ele, foi a partir de

1990 nos Estados Unidos que esse fenômeno se tornou evidente. Foi o momento decisivo de

narrativas das ciências sociais. Ele coincide com a explosão de Internet e os progressos das novas

técnicas de informação e de comunicação. Mais uma vez, a comunicação entre os indivíduos se

transformava, pois se “o meio é a mensagem” e somos criadores e criaturas, ou seja, “o homem

modela ferramentas que o modelam”, conforme McLuhan (1964). Passávamos, também, do

capitalismo industrial para um liberalismo sem rosto que se tornou nômade e indolor.

Não seria o nosso relato de mundo que ia alterar, mas a nossa percepção dele. As

multinacionais, por exemplo, desenvolveram um itinerário de estratégia de marketing quer

consistia em passar da marca, simples sinal ou nome para avivar a lembrança a respeito de uma

empresa confiável, ao logotipo, agora como uma estilização carregada de significado. Tratava-

se, agora, do trabalho de um designer, criando um símbolo que servia à identificação de uma

empresa, instituição, produto ou marca etc., e que consiste geralmente na estilização de uma letra

ou na combinação de grupo de letras com design característico, fixo e peculiar. Do logotipo à

história da empresa, ou do seu proprietário, ou do produto e da clientela servindo-se do produto

decretou o aparecimento do storytelling.

Aparece, em 2007, o livro de Christian Salmon “ Storytelling, la machine à fabriquer des

histoires, para definir de vez o fenômeno “storytelling”. Trata-se de uma nova arma nas mãos do

managements, e não um simples meio de distração massiva, já que formata de pensamentos e

propõe modos de agir. Elas tornaram-se, graças à mídia, um produto à venda ao grande público

consumidor de exemplos de vida, de meios de projeção social, de se tornar personalidade, de

marketing, entre outros objetivos camuflados sob sua pele. O storytelling aparece em plena era

de consumismo. Nele, os contratos são mais imaginários do que reais e colocam em xeque, pela

fluidez, pelas falácias, pelas inverdades ideologicamente construídas, os limites entre real e

ficcional e a vida como um todo se torna um grande espetáculo. Assistimos, hoje, comovidos e

hiponitizados, a mundialização de determinadas narrativas, em diferentes mídias, com diferentes

suportes em diferentes linguagens, acopladas à ferocidade cínica de narradores que “formatam

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espíritos” e os alienam. Não se trata simplesmente de ficção, nem mesmo de informações

comprovadas. O que está em jogo é construir o poder por meio de uma convincente narrativa.

A mídia da era tecnológica é a lídima representante da criação e veiculação desse espaço

líquido ou virtual. Nela, nada é tão estranho quanto à idéia de algo concreto e eterno. Ao

desterritorializar grandes públicos, ao abrir janelas virtuais no nosso espaço real, por onde entra a

imaginação, a memória e o pensamento, a mídia não é senão um grande storytelling. Ao criar

espaços virtuais de navegação para a mente humana, com acontecimentos duvidosos, mas tidos

como reais, a mídia recorta a vida e monta um novo mundo em seus espetáculos, embora

assegure que tudo está acontecendo em “tempo real”. Assim, ela nos ejeta para um mundo em

que ficção e realidade, ciência e religião, verdade e mentira, entre outras polarizações, fundem-se

e se confundem no espaço virtual. Os espaços virtuais não deixam de ser discursos reais, pois

seus signos (representantes) estão presentes não como simulacros do real, mas como um hiper-

real, (cf. BAUDRILLARD, 1991) , ou seja, um real otimizado ideologicamente. A virtualidade

que se atualiza nos suportes midiáticos jamais deixará de ser um ponto de vista ideologicamente

construído sobre o acontecido e não o acontecimento em si, mesmo que mostrado em tempo real

e tendo o factual como pano de fundo. A lente da câmera de TV, por exemplo, ao nos mostrar um

factual estará sempre sob a intencionalidade de mentes humanas como filtros; não só do

cameraman que capta a imagem, mas de uma equipe de midiadores2, que vão determinar o que

deve ser visto ou não desse mesmo factual pelos seus midiatários.

4. Storytell ingnapolít ica

2 Cunhamos os termos midiador para caracterizar tanto o sujeito coletivo e complexo que cria o discurso midiático, tais como redatores, fotógrafos, atores, iluminadores, entre outros; e midiatário para caracterizar o sujeito produto de feedbacks, pesquisas de ibop, entre outros, como o público-alvo caracterizado e a ser atingido pelo discurso midiático, em substituição aos clássicos sujeitos da teoria da enunciação, enunciador e enunciatário, que são termos da teoria do discurso francesa. A enunciação seria a manifestação do pensamento através das palavras, utilizada por indivíduos socialmente organizados e concretizadas em um discurso que jamais se repete, sendo, portanto, marcada pela singularidade; ele pode ser substituído por midiação, ou seja, como ato de midiar da própria mídia, em qualquer suporte e em qualquer linguagem midiática; o enunciado, que é a figura da enunciação que representa o ponto de vista construído por um enunciador; ele pode ou não estar de acordo com o que narra; propomos, em se tratando de mídia, que ele pode ser substituído por o midiático, como objeto ou veículo que faz a midiação na interação midiática; o enunciador é o sujeito produtor do enunciado e o enunciatário, o sujeito para quem o enunciado foi produzido. Entendemos ser muito diferente ocupar um espaço discursivo na sociedade em que falamos em geral para um sujeito com o qual compartilhamos conhecimentos e se servir da mídia quando então os horizontes de interação se ampliam a vastidões incalculáveis e a sujeitos jamais imaginados na interação comunicativa.

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Em um ensaio publicado em novembro de 2006, Salmon assegura que faltara a John Kerry

para ser eleito em 2004 de acordo com os estrategistas do Partido dos Democratas, ter uma “boa

história” para contar. Nos dias seguintes às eleições, James Carville, um dos artesões da vitória

Bill Clinton em 1992, declarou que pensava poder eleger qualquer ator de Hollywood na

condição de tivesse uma história a contar: uma história que dissesse às pessoas que o país é e

como o vê. “Uma história é a chave de tudo” confirmaria Stanley Greenberg, especialista em

pesquisas eleitorais. Alguns dias depois, continua Salmon, em uma edição do Meet the press,

James Carville se fez mais explícito ainda : « Dizem os republicanos : ”vamos nos proteger dos

terroristas do Teerã, e dos homossexuais de Hollywood ” Nós dissemos : “Somos pela pureza do

ar, melhores escolas, mais cuidados com a saúde. "Eles contam histórias; nós recitamos litania

". Segundo Evan Cornog, professor de Jornalismo da Universidade da Colômbia " a chave da

liderança americana é, numa grande medida, o storytelling ".

Assim, as histórias começaram a substituir as estatísticas, os estudos dos problemas e os

planos de governo passam pelo marketing, como veremos adiante. O discurso oficial se torna

prenhe de histórias de vida bem sucedidas. Ficção e realidade vão perder seus contornos,

principalmente quando veiculados pela mídia. Bill Clinton sempre acreditou no “poder das

histórias” sobre os espíritos e em seus discursos evocava episódios de velhos filmes de guerra

como se pertencesse a verdadeira história dos Estados-Unidos, nas quais o povo norte-americano

se encontrava. Desse modo, o storytelling político entrou na Casa Branca, na pessoa do

presidente ator, com toda sua corte de consulados, dirigidos por um diretor de cena de Hollywood

e de publicitários e gestores.

Da sociedade de informação do século passado, passamos, então, neste século, à

sociedade da informação como espetáculo, ou seja, como produto de montagens tragicômicas.

Nesse grande palco social, estamos vivendo a crise do espírito crítico. Em cena, há um discurso

político sendo ouvido quase que com o mesmo espírito que se acompanha uma novela na TV.

Nunca as palavras políticas foram tão supérfluas, sem sentido e desacreditadas. O descrédito

nelas levou-as às raias da ficção. Quase todo discurso político não é senão uma teatralização de

um espetáculo montado por uma equipe de marketing.

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Na verdade, o marketing pessoal construindo o político o transformou num títere.

Provocar risos, dizer frivolidades, muitas vezes em discursos montados em que o narrador não

demonstra seu caráter nem vontade própria, agindo como se fosse uma marionete dentro do

espetáculo dirigido por interesses próprios e da classe dominante, parece ser a nova marca da

política moderna. Fazer política passou a ser o mesmo que desempenhar papéis dentro do

espetáculo teatral da vida, principalmente, quando a mídia o presentifica. Não é por acaso que se

criaram TVs câmeras, TVs senados e assim por diante. Nelas deputados dormem enquanto outro

discursa e em meio a escândalos e corrupções, a deputada ensaia uma dança. Até secretárias se

exibem para depois aparecer em revistas como a playboy.

Os projetos governamentais passam, antes de tudo, por empresas de publicidade. Assim,

eles ganham nomes de impacto como “Fome Zero”, “Bolsa Família”. Há ainda nomes que

formam siglas de efeito sonoro como o “PAC”, Programa de Aceleração do Crescimento, como

sendo um pacote de medidas para desonerar a produção e “destravar” o país, como gosta de dizer

o nosso presidente, pródigo em metáforas explicativas. O objetivo do “fome zero” era conquistar

a intimidade e o afeto dos brasileiros, sinal de que estávamos mais diante de uma campanha

publicitária do que propriamente diante de soluções aos problemas de alimentação. Aliás, não se

tinha idéia de onde buscar os recursos, de como definir quem eram os famintos, como cadastrá-

los e como fazer os alimentos chegar às bocas dos necessitados. A esmola deveria reverter-se em

votos na próxima eleição, com certeza. Matava-se, assim, a conseqüência, mas não a causa. A

idéia é que os brasileiros não poderiam resistir a um nome desses, já que “zero” era a expressão

da moda, como em “tolerância zero”, um programa de segurança pública em Nova York. “Fome

zero” tinha sido um achado. O nome tinha de ser usado, mesmo sem pesquisas científicas sobre o

problema e muito menos das estratégias para satisfazê-los. Assim também, o “PAC” poderia vir

a revelar-se vazio ou pífio, mas, essa sigla aparecida no discurso de posse do presidente é um

filho seu que veio para ficar, como o herói que vai solucionar os problemas de desenvolvimento

do país, de modo peremptório. O storytelling foi oficializado e isso bastaria para o homem e sua

equipe idealizadores do mesmo ocuparem um lugar na história dos heróis do país.

A empresa política, portanto, vivifica-se e se apresenta como personalidade

desenvolvendo um papel benéfico dentro da sociedade, dando prazer e satisfazendo as

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necessidades dos usuários do produto à venda. Altera-se, assim, a própria percepção da marca e

do slogan dos partidos, que deixavam de ser simples objeto sígnico nominalizador, para atuar

junto ao público como um objeto modal. Ou seja, não se vende mais o objeto em pauta, mas um

estilo de vida, uma satisfação pessoal. O produto à venda, o próprio político ou até mesmo o

próprio partido como heróis em plena aventura, é apenas um passaporte para atingir outro objeto,

chamado objeto valor (ver GREIMAS e COURTÉS, 1989), ou seja, o prazer e a satisfação

pessoal. O objeto modal, como uma espada mágica, é o objeto necessário para a aquisição de uma

competência para que sujeito possa operar uma transformação principal, ou seja, conseguir o

objeto valor. Ele estaria agora a serviço da satisfação dos instintos mais recônditos do seu

usuário, como, por exemplo, conquistar o parceiro sexual, ou vencer uma batalha contra o seu

rival ou predador, ou até mesmo, provocar a prisão de uma presa para saciar-se a fome de algo.

Esse poder de narratividade de um produto qualquer em ação, bem como seu poder de atração

por satisfazer instintos, por conseguinte, dava ao objeto à venda uma força impactante, e, por

conseguinte, revigorava a sua força de venda. Assim, até o próprio storytelling tornou-se um

produto à venda. Nesse processo, a mídia teve papel fundamental.

Salmon, em seu citado livro sobre Storytelling, reconstitui a genealogia de uma nova

doutrina: "a arte de contar histórias, para formatar pensamentos”. Para ele, foram os políticos

norte-americanos, como Ronald Reagan, ex-cineasta e ator, que se percebeu a importância e o

efeito de conhecer e saber contar boas histórias para distrair o público em questões essenciais. A

idéia começa a expandir-se e atinge todos os setores da sociedade, pois se percebe que narrar

fatos é meio eficaz para emocionar e fazer grandes públicos participarem do narrado, como

sujeitos identificados com as personagens da própria narrativa. Hoje uma boa história3 tornou-se

uma "arma de distração massiva", não somente um meio de formatar nossa relação com a

realidade, mas sim, de fabricar o real, em geral idealizado, ou seja, um hiper-real. Esse hiper-real,

por sua vez, tem o poder de ser seletivo e mostrar apenas o lado positivo ou apenas o lado

3 Só em agosto de 2004, devido ao cinqüentenário do suicídio de Getúlio Vargas, cinco novos livros sobre o ditador foram lançados. Um deles, O dia em que Getúlio matou Allende (2004), de Flávio Tavares, é antes um ensaio com reminiscências sobre os últimos dias de Getúlio e mais sobre Allende, com quem conviveu. O autor sustenta a hipótese de que Allende teria visto no suicídio de Getúlio um modelo, devido ao impacto que teve, por isso imitou-o vinte anos depois, sem obter, no entanto, o mesmo efeito.

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negativo do objeto em pauta, de acordo com a ideologia que se deseja depositar na narrativa feita.

Assim, vamos assistindo ao final do fim da propaganda de mercado.

Às grandes marcas tornam-se os novos grandes heróis das suas próprias histórias e aos

produtos à venda são atribuídos poderes de satisfação, que antes eram procurados nas drogas. A

literatura de ficção que tratava de heróis, espaços e tempos construídos por um sujeito em estado

de tensão lírica, perde espaço para a narrativa praticada em tempo real e veiculada pela mídia. A

imagem do produto iconicamente colocada diante do expectador e não mais propriamente de um

leitor de letras concentra o seu poder no conteúdo que provoque estranhamento e não mais na

tessitura da linguagem verbal, como arte da poiesis. Por isso, a explosão dos livros reportagens,

dos romances-reportagens, do memorialismo, do new-biografismo (ver LEJEUNE (1975), livros

de auto-ajuda, entre outros, que se tornaram rapidamente livros de grande vendagem.

Depois dos anos 90 do século passado, as narrativas com avatares passaram a ocupar

grande parte da mídia. São histórias de grandes empresas e de grandes dirigentes; de estratégias

de gerência e de conhecimento empresarial; de vidas íntimas de prostitutas ou de grandes

personalidades políticas envolvidas em escândalos; são exemplos de religiosos, de esportistas de

cientistas; ou mesmo de certos produtos à venda nas prateleiras de supermercados que passam a

ser o passaporte para uma vida paradisíaca; ou aconselhamentos como solução de problemas e

satisfação de necessidades; ou de personalidades que submergem da pobreza para o estrelado; ou

mesmo biografismos ou livros reportagens como exemplo de vida ou de vilania; ou do

enriquecimento rápido de heróis argutos e destemidos, enfim, de uma infinidade de histórias que

são de repente veiculadas nos grandes canais midiáticos.

As grandes empresas descobriram que a tomada de uma decisão exige estratégias,

criatividade, inovação, execução, clientela com inteligência múltipla, design, marketing e uma

boa história para convencer4. As empresas que não possuem uma definição clara e simples de

4 É interessante conhecer as metáforas do oceano azul e vermelho, criadas por Renée Mauborgne co-autora do livro Blue Ocean Strategy (in MAUBORGNE, R. disponível no site www.hsm.com.br/editorias/estrategia). No livro há a metáfora dos oceanos vermelhos que representam todas as indústrias existentes hoje e a amplitude de seus mercados. Neles, o tamanho de um mercado é definido e aceito, e as competitivas regras do jogo são conhecidas. As empresas que atuam dentro desses oceanos tentam se sobressair sobre a concorrência para abocanhar uma maior fatia do mercado. À medida que a área desse mercado fica povoada de competidores, as chances de lucro e crescimento diminuem, os produtos viram commodities ou segmentos, e a voraz concorrência deixa o oceano “ensangüentado”. Oceanos azuis, por sua vez, representam todas as indústrias não existentes hoje e seu desconhecido mercado intocado pela concorrência. Em oceanos azuis, a demanda é criada, em vez de ser obtida através de lutas.

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suas estratégias estão condicionadas a pertencer à categoria de companhias que falham na

execução de suas estratégias e nunca pertencer às empresas de ponta. O storytelling vendo sendo

visto como um modo não só de gerir empresas, mas também, mentes e corações, capazes nãos só

de garantir a eficácia das estratégias, manipular consumidores, conquistá-los e fidelizá-los, tanto

os executivos como os funcionários para mantê-los motivados.

A gestão de negócios deve entender qual será no futuro próximo, os arquétipos de

interação dos sujeitos componentes da empresa. Se o executivo não sabe quais os elementos que

compõem uma definição de estratégia, eles são incapazes de desenvolver uma. Só com uma clara

definição de objetivos, pode levar o executivo o que eles precisam criar. Depois disso, a

implementação torna-se mais simples, pois a essência da estratégia pode ser facilmente

internalizada por todos na organização por meio do storytelling.

O storytelling tem uma ligação muito intensa com o marketing eleitoral norte-americano.

Após ser eleito presidente dos Estados Unidos, o ex-salva vidas durante sete anos e após ter salvo

77 pessoas, conforme suas próprias declarações, sem que nenhuma lhe houvesse agradecido,

Ronald Reagan torna-se ator de cinema em Hollywood. Esse background vai ser fundamental na

disseminação do ato de contar histórias para ganhar o poder. Ao tornar-se membro do Partido

Republicano foi eleito governador da Califórnia de 1966 a 1974, quando reprimiu manifestações

estudantis contrárias à Guerra do Vietnã. Em 1980 consegue ser eleito à presidência dos Estados

Unidos, por dois mandatos, de 1981 a 1989, além de eleger seu vice George Busch como seu

sucessor que ficou no governo de 1989 a 1993.

Em nome do poder, os Estados Unidos invadem o Iraque no Março de 2003, já que a Casa

Branca cria uma realidade que subverte as verdadeiras intenções dessa invasão. Os

Departamentos do Pentágono, desejando não repetir os erros da primeira guerra de Golfo em

Há uma ampla oportunidade para crescimento, que por sua vez é tanto lucrativo quanto rápido. Nesses oceanos, a concorrência é irrelevante porque as regras do jogo encontram-se stand-by, aguardando serem definidas. Criar “oceanos azuis” é criar marcas. A criação de “oceanos azuis” vai muito além de contribuir para o fortalecimento da empresa e seu crescimento lucrativo. O movimento estratégico exerce um efeito positivo e vigoroso no estabelecimento de uma marca com reputação na mente dos compradores. Num mundo onde a relação com o real oscila majoritariamente entre a tele-realidade e as cadeias info, a ficção parece se tornar uma norma subjacente, uma necessidade, uma escapatória. Hoje, um romance ou uma série telenovela funcionam, sobretudo, se ela for tomada como "verdadeira. Assim também, um discurso político toca apenas se aparece como uma história de um herói antes que como litania (Graal de todas as comunicações políticas).

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1991, especial atenção prestada à sua estratégia de comunicações. Não por acaso, mas sim para

abrigar uma plêiade de jornalistas, foi dada grande atenção à arquitetura da sala de imprensa na

sede de forças dos Estados Unidos em Catar, junto ao golfo Pérsico, na Península Arábica, parte

da Arábia Saudita, rico em petróleo: por um milhão de dólares, um hangar de armazenamento foi

transformado em um estúdio de televisão ultramoderno telas de plasma e todos os equipamentos

eletrônicos mais modernos, para produzir vídeos, mapas geográficos, gráficos, infográficos e

diagramas dos combates, a serem exibidos em tempo real. Um cenário no qual o orador de

exército dos Estados Unidos, General Tommy Franks, dirigia-se aos jornalistas custava 200.000

dólares e foi produzido por um desenhista que trabalhava para Disney, Metrô Goldwyn Mayer e

o programa de televisão Good Morning America. Já em 2001 a Casa Branca tinha encarregado

Franks de criar os designs de fundo de palco dos discursos presidenciais – o que não surpreendeu

àqueles que estavam já conscientes dos laços entre o Pentágono e Hollywood.

Tudo era cuidadosamente planejado nos discurso de Busch, para que ele fosse visto como

um grande herói nacional. Assim, por exemplo, no dia 15 de Agosto de 2002, Bush faz um solene

discurso tratando da segurança nacional. O cenário tem como pano de fundo o Monte Rushmore

conde estão esculpidos os rostos de George Washington, Thomas Jefferson, Theodore Roosevelt

e Abraham Lincoln. Durante o seu discurso as câmeras foram colocadas em um ângulo que

permitiu que Bush fosse filmado de perfil e seu rosto fora sobreposto aos dos seus predecessores.

Outros discursos, como o de Ronald Reagan no seu discurso como candidato, em 1980, à

presidência dos Estados Unidos, teve como pano de fundo a Estátua da Liberdade. O povo devia

entender que o que estava em volta da cabeça do orador foi tão importante como a própria

cabeça. (cf. Frank Rich, The Greatest Story Ever Sold, Penguin Books, New York, 2007).

Salmon acredita que somos todos atores de histórias e desse modo criamos nosso realidade. A

sociedade em rede, em geral, desde os colunistas de jornal e bloggers, vale-se da frase “reality-

based community” (comunidade baseada na realidade). Essa frase é do colunista do New York

Times, Ron Suskind (ver SUSKIND, 2004) que ao investigar a comunicação na Casa Branca, em

2002, ouviu de um conselheiro do presidente que ao atuarmos, criamos a nossa própria realidade.

Assim, os líderes da superpotência do mundo não se afastavam somente de real política,

como um princípio darwiniano da lei natural de que “só o mais forte sobrevive”, que é

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maquiavélica. Essa ideologia desfaz a idéia de irmandade e auxílio aos mais pobres e mais pobres

para uma política altruísta. Ao criar o “realismo ideal” o discurso cria sua própria realidade,

onde se submete à idéia fenomênica do “parecer do ser” em detrimento do ser em si, e os ideais

de aparência, impuseram uma política como real quando ela é apenas ficção discursiva

ConsideraçõesFinais.

As entidades do discurso narrativo são personagens de uma enunciação. São

eles sujeitos-personagens de uma cadeia narrativa, que produzem tanto o discurso

narrador e como discurso interpretativo, de modo antropomórfico e, portanto,

idealizado.Nãopodesesentir,nesse instante,umsujeitodeterminadoemsimesmo,

masuma imagem ideologicamenteconstruídapelonarrador. Cabe,então,avaliar se

estaraquieemqualqueroutrolugar,comosujeitosflexíveisesolúveis,éumabenesse

daglobalizaçãoouoanúnciodeumanovabarbárie.

A antiga arte de contar histórias tornou-se uma fonte de recursos para o

gerenciamentodeempresas,paraomarketingpolíticooupessoaleseadaptouàmídia

e à prática nas empresas. Steve Denning do Banco Mundiale e Dave Snowden do

InstitutodeGerenciamentodaIBMderamconhecimentoaograndepúblicoométodode

Storytelling, no que tange a desafios importantes das empresas. Essa abordagem é

reconhecidacomoumpotentemeiodeavaliaçãodosvalorescorrentesdaculturade

uma organização, e como uma alavanca eficaz para fazê-la evoluir. Com efeito, a

condução de importantes mudanças, a fusão de sociedades, a identificação e a

constituiçãodecomunidadesdeinteresseedepráticas,acomunicaçãointerculturalem

organizações globais, são circunstâncias nas quais praticar o storytelling é

particularmenteinteressante.

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LEJEUNE (1975) Philippe, Le pacte autobiographique, Paris, Seuil, 1975.

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ecriture.com/contrefeux/Les-nouvelles-fictions-du-capital.html. pesquisa feita em 02 abril de

2008

SUSKIND R. (2004) “Without a Doubt: Faith, Certainty and the Presidency of George W Bush”,

in The New York Times, 17 October 2004.