STF - ADI - Petição Inicial

22
ESTADO DE PERNAMBUCO Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco Gabinete do Procurador Geral _____________________________________________________________ ___________________ EXMO. SR. MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL O GOVERNADOR DO ESTADO DE PERNAMBUCO, Eduardo Henrique Accioly Campos, assistido pelo Procurador Geral do Estado, Francisco Tadeu Barbosa de Alencar, com fundamento no art. 102, I, “a”, c/c art. 103, V, da Constituição Federal, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência propor a presente AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (com pedido de liminar) ________________________________________________________________________________________ ____________________________ Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451 STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação 1

Transcript of STF - ADI - Petição Inicial

Page 1: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

EXMO. SR. MINISTRO PRESIDENTE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

O GOVERNADOR DO ESTADO DE PERNAMBUCO, Eduardo Henrique

Accioly Campos, assistido pelo Procurador Geral do Estado, Francisco Tadeu Barbosa de Alencar,

com fundamento no art. 102, I, “a”, c/c art. 103, V, da Constituição Federal, vem respeitosamente à

presença de Vossa Excelência propor a presente

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE(com pedido de liminar)

por afronta às normas do art. 149 e do art. 212, § 6º, da Constituição da República

de 1988, em face dos motivos a seguir expostos.

I. DISPOSITIVOS LEGAIS QUESTIONADOS

A presente Ação Direta é intentada contra o dispositivo do art. 15, § 1º, Lei federal

n.º 9.424, de 24 de dezembro de 1996, e da norma do art. 2º da Lei federal n.º 9.766, de 18 de

dezembro de 1998, ambas alteradas pela Lei n.º 10.832, de 29 de dezembro de 2003. Tais

diplomas normativos, cujas cópias integrais são anexadas à inicial, ostentam a seguinte redação:

“Lei n.º 9.424, de 1996

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

1

Page 2: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

Art. 15. O Salário-Educação, previsto no art. 212, § 5º, da Constituição Federal e devido pelas empresas, na forma em que vier a ser disposto em regulamento, é calculado com base na alíquota de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o total de remunerações pagas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, assim definidos no art. 12, inciso I, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

§ 1º O montante da arrecadação do Salário-Educação, após a dedução de 1% (um por cento) em favor do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, calculado sobre o valor por ele arrecadado, será distribuído pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, observada, em 90% (noventa por cento) de seu valor, a arrecadação realizada em cada Estado e no Distrito Federal, em quotas, da seguinte forma:

I - Quota Federal, correspondente a um terço do montante de recursos, que será destinada ao FNDE e aplicada no financiamento de programas e projetos voltados para a universalização do ensino fundamental, de forma a propiciar a redução dos desníveis sócio-educacionais existentes entre Municípios, Estados, Distrito Federal e regiões brasileiras;

II – Quota Estadual e Municipal, correspondente a 2/3 (dois terços) do montante de recursos, que será creditada mensal e automaticamente em favor das Secretarias de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para financiamento de programas, projetos e ações do ensino fundamental.

§ 2º (Vetado)

§ 3º Os alunos regularmente atendidos, na data da edição desta Lei, como beneficiários da aplicação realizada pelas empresas contribuintes, no ensino fundamental dos seus empregados e dependentes, à conta de deduções da contribuição social do Salário-Educação, na forma da legislação em vigor, terão, a partir de 1º de janeiro de 1997, o benefício assegurado, respeitadas as condições em que foi concedido, e vedados novos ingressos nos termos do art. 212, § 5º, da Constituição Federal.

Lei n.º 9.766, de 1998

Art. 2o A Quota Estadual e Municipal do Salário-Educação, de que trata o § 1o e seu inciso II do art. 15 da Lei no 9.424, de 24 de dezembro de 1996, será integralmente redistribuída entre o Estado e seus Municípios de forma proporcional ao número de alunos matriculados no ensino fundamental nas respectivas redes de ensino, conforme apurado pelo censo educacional realizado pelo Ministério da Educação.” (grifou-se)

Conforme se demonstrará, tais dispositivos legais têm sido interpretados de modo

que a distribuição das cotas estaduais, relativas à cobrança do salário-educação, leva em

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

2

Page 3: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

consideração não só o critério constitucional do número de alunos matriculados, mas também o da

origem da fonte de arrecadação, em violação à norma do art. 212, § 6º, da Constituição Federal.

II. PERTINÊNCIA TEMÁTICA

Não obstante esteja o Governador do Estado impugnando ato normativo federal, o

interesse processual na propositura da presente Ação é manifesto, haja vista a repercussão

financeira para todos os Estados da Federação, conforme o Comparativo da Distribuição das Cotas

Estadual e Municipal do Salário-Educação (em anexo).

Nesse sentido, a jurisprudência do Supremo Tribunal já se consolidou quanto à

possibilidade Estados-membros impugnarem leis federais, quando haja, dentre outros, repercussão

financeira, o que faz evidenciar a presença do interesse processual. Com efeito:

“1. ADIN. Legitimidade ativa de Governador de Estado e pertinência temática. Presente a necessidade de defesa de interesses do Estado, ante a perspectiva de que a lei impugnada venha a importar em fechamento de um mercado consumidor de produtos fabricados em seu território, com prejuízo à geração de empregos, ao desenvolvimento da economia local e à arrecadação tributária estadual, reconhece-se a legitimidade ativa do Governador do Estado para propositura de ADIn. Posição mais abrangente manifestada pelo Min. Sepúlveda Pertence. (...)”(ADI n.º 2.396 MC/MS, Pleno, Rel. Min. Ellen Gracie, j. 26/09/2001, DJ 14-12-2001)

Em igual sentido, o Supremo decidiu a ADI n.º 3.273/PR, em que reconheceu o

interesse processual do Estado Paraná de questionar lei federal. No trecho a seguir transcrito,

retirado das razões do Min. Sepúlveda Pertence, verifica-se o inequívoco entendimento do STF

sobre a questão:

“Sr. Presidente, acompanho o eminente relator, notando que o Tribunal já reconheceu a legitimação de Governador de Estado para impugnar lei de outro Estado, outra unidade da Federação, que atingia ou poderia atingir a economia

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

3

Page 4: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

do Estado que governava. Refiro-me à ADIn MC 2.396, relatora Ministra Ellen Gracie, de 26 de setembro de 2001: o Governador de Goiás questionava a legitimação de lei proibitiva da industrialização e do transporte de amianto no Mato Grosso, que poderia atingir indústria existente e instalada no Estado de Goiás.”(ADI n.º 3.273 MC/PR, Pleno, Rel. Min. Carlos Britto, j. 16/09/2004)

Destarte, inexiste dúvida quanto à configuração do interesse processual em o

Estado de Pernambuco impugnar os referidos dispositivos legais que estabelecem a sistemática da

distribuição dos valores arrecadados, mediante a instituição do salário-educação.

III. FUNDAMENTOS

A propositura da presente Ação Direta justifica-se em decorrência da interpretação,

adotada pela Fundação Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), no que diz respeito à

sistemática da distribuição dos valores arrecadados, a título de salário-educação, prevista pelo art.

15, § 1º, da Lei federal n.º 9.424, de 1996, e pelo art. 2º da Lei federal n.º 9.766, de 1998. Conforme

tem entendido o FNDE, os valores arrecadados a título de salário-educação têm sido distribuídos

não somente de acordo com o critério constitucional do número de alunos matriculados nas

respectivas redes de ensino, mas também em função da origem da fonte de arrecadação.

Essa interpretação, contudo, viola o art. 212, § 6º, c/c art. 149 da Constituição da

República, que estabelece como critério único e exclusivo para a distribuição dos valores relativos

ao salário-educação o número de alunos matriculados nas escolas. Desse modo, os Estados

economicamente mais desenvolvidos recebem parcela superior aos menos desenvolvidos, a

exemplo dos Estados do Nordeste, região onde o valor da arrecadação dessa contribuição é inferior

devido ao menor número e menor expressão econômica dos contribuintes.

1. Da sistemática federal para distribuição do salário-educação

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

4

Page 5: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

A contribuição social do salário-educação atualmente é regulamentada pelas Leis

federais n.º 9.424, de 1996, n.º 9.766, de 1998, e n.º 11.457, de 2007, além do Decreto federal n.º

6.003, de 2006. Na Lei n.º 9.424, de 1996, como informa o Governador do Rio Grande do Norte, o

critério para distribuição do produto de arrecadação do salário-educação é aquele determinado pelo

art. 15, § 1º, segundo o qual o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) partilhará

90% do montante de acordo com a arrecadação realizada em cada Estado e no Distrito Federal.

A norma do art. 15 da Lei federal n.º 9.424, de 1996, e modificações posteriores,

assim estabeleceu as linhas gerais do salário-educação:

“Art 15. O Salário-Educação, previsto no art. 212, § 5º, da Constituição Federal e devido pelas empresas, na forma em que vier a ser disposto em regulamento, é calculado com base na alíquota de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o total de remunerações pagas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, assim definidos no art. 12, inciso I, da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991.

§ 1º. O montante da arrecadação do Salário-Educação, após a dedução de 1% (um por cento) em favor do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, calculado sobre o valor por ele arrecadado, será distribuído pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE, observada, em 90% (noventa por cento) de seu valor, a arrecadação realizada em cada Estado e no Distrito Federal, em quotas, da seguinte forma:

I - Quota Federal, correspondente a um terço do montante de recursos, que será destinada ao FNDE e aplicada no financiamento de programas e projetos voltados para a universalização do ensino fundamental, de forma a propiciar a redução dos desníveis sócio-educacionais existentes entre Municípios, Estados, Distrito Federal e regiões brasileiras;

II – Quota Estadual e Municipal, correspondente a 2/3 (dois terços) do montante de recursos, que será creditada mensal e automaticamente em favor das Secretarias de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios para financiamento de programas, projetos e ações do ensino fundamental. (Redação dada pela Lei nº 10.832, de 29.12.2003)

§ 2º (Vetado)

§ 3º Os alunos regularmente atendidos, na data da edição desta Lei, como beneficiários da aplicação realizada pelas empresas contribuintes, no ensino fundamental dos seus empregados e dependentes, à conta de deduções da contribuição social do Salário-Educação, na forma da legislação em vigor, terão, a partir de 1º de janeiro de 1997, o benefício assegurado, respeitadas as

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

5

Page 6: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

condições em que foi concedido, e vedados novos ingressos nos termos do art. 212, § 5º, da Constituição Federal.” (grifou-se)

Por sua vez, a Lei federal n.º 9.766, de 1998, no art. 2º, ratificando tais disposições,

determinou que a cota estadual e municipal será redistribuída entre o Estado e seus Municípios.

Com efeito, eis seu teor do referido dispositivo, com a redação fornecida pela Lei :

“Art. 2º. A Quota Estadual e Municipal do Salário-Educação, de que trata o § 1o e seu inciso II do art. 15 da Lei no 9.424, de 24 de dezembro de 1996, será integralmente redistribuída entre o Estado e seus Municípios de forma proporcional ao número de alunos matriculados no ensino fundamental nas respectivas redes de ensino, conforme apurado pelo censo educacional realizado pelo Ministério da Educação.” (grifou-se)

Infere-se, pois, da disciplina do salário-educação, fixada pela Lei federal n.º 10.832,

de 2003, que até então a sistemática legal definia que os Estados teriam direito à partilha do produto

da arrecadação do salário-educação, na justa proporção do local da ocorrência do fato gerador. Isto

é, os Estados com maior arrecadação teriam direito a maior repasse, porque o número de alunos

matriculados em cada rede de ensino não foi considerado com critério único e exclusivo.

No entanto, com a promulgação da Emenda Constitucional n.º 53, de 19 de

dezembro de 2006, a sistemática para distribuição das cotas estaduais e municipais foi

profundamente alterada pela Constituição, conforme disposição do art. 212, § 6º. A partir de então,

estabeleceu-se de forma mais detalhada o critério para distribuição do salário-educação. Assim,

com a introdução do art. 212, § 6º, na Constituição Federal, esse critério passou a ser única e

exclusivamente o número de alunos matriculados nas respectivas redes de ensino,

determinando-se, por conseqüência, a desconsideração do critério da origem da fonte arrecadadora:

“Art. 212. A União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino.(...)§ 6º As cotas estaduais e municipais da arrecadação da contribuição social do salário-educação serão distribuídas proporcionalmente ao número de

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

6

Page 7: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

alunos matriculados na educação básica nas respectivas redes públicas de ensino.” (grifou-se)

Destarte, a legislação infraconstitucional que estabelece dois critérios para a partilha

do produto da arrecadação do salário-educação (origem da fonte arrecadadora e número de alunos

matriculados) está em manifesto desacordo com a norma constitucional do art. 212, § 6º, introduzida

pela EC n.º 53/06, especialmente ao se considerar a própria natureza dessa contribuição social, no

que tange à sua destinação constitucional específica.

2. Violação à norma do art. 212, § 6º, c/c art. 149 da Constituição Federal

Segundo lição de MARCO AURÉLIO GRECO, as contribuições sujeitam-se a um modelo

de validação finalístico, em que sua constitucionalidade é aferida pelo fim (objetivo) que se pretende

buscar. Diferencia-se, portanto, dos impostos cuja validação é causal. Sendo assim, a validade e a

constitucionalidade da lei instituidora da exação se afirmarão pela finalidade legalmente

estabelecida. Nesse sentido, sentencia o destacado tributarista1: “A lei será constitucional porque a

sua previsão é compatível com a obtenção da finalidade qualificada ou com o evento futuro nela

considerada”.

Em igual sentido, manifesta-se LEANDRO PAULSEN2:, ao destacar as diferenças

existentes entre as contribuições sociais e as demais espécies tributárias. Com efeito:

“A ‘destinação legal’ ou ‘finalidade’ é, atualmente, critério importantíssimo para identificar determinadas espécies tributárias como as contribuições especiais e empréstimos compulsórios, eis que constitui seu critério de validação constitucional. A competência é atribuída em função das finalidades a serem perseguidas.”

1 Cf. Greco, Marco Aurélio. Contribuições : uma figura "sui generis". São Paulo: Dialética, 2000, p. 124. 2 PAULSEN, Leandro. Direito Tributário (Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da jurisprudência). 6. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, ESMFE, 2004, p. 636.____________________________________________________________________________________________________________________

Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

7

Page 8: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

E conclui o citado tributarista, quando à ilegitimidade da cobrança de contribuição

tributária em que se comprove a destinação diversa daquela para a qual foi criada3:

“(...) os atos normativos, de qualquer nível, que impliquem destinação para finalidade diversa da que justificou a instituição do tributo, ou mesmo os desvios reiterados de recursos não para locupletamento privado mas no suposto interesse da Administração, podem demonstrar a inexistência, em concreto, da atividade que se visa custear ou sua realização em intensidade desproporcional ao custeio, podendo implicar a invalidade total ou parcial da exação.”

Dessa forma, a manutenção da atual sistemática de aplicação da partilha dos

valores de salário-educação, contra a qual se insurge a presente Ação Direta, é inteiramente

inconstitucional, porque acarreta a desnaturação da natureza da contribuição social, ao transformá-

la numa espécie tributária do imposto.

Ao condicionar o repasse constitucional ao local da fonte arrecadadora, a referida

interpretação à legislação conferida termina por desvincular o tributo da sua finalidade –

financiamento da educação, porquanto naturalmente os Estados que mais recolhem (mais

produtivos) terão maior repasse independentemente do número de alunos matriculados. Logo, a

finalidade maior da instituição do salário-educação (financiamento igualitário dos Entes da

Federação à proporção do número de alunos matriculados) se perderá, e os Estados

economicamente mais estruturados receberão proporcionalmente o repasse maior, a exemplo do

Estado de São Paulo.

Indiscutível, portanto, a violação à norma do art. 212, § 6º, c/c art. 149 da

Constituição Federal, que condiciona o repasse constitucional do salário-educação ao número de

alunos matriculados.

IV. DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO

3 PAULSEN, Leandro. Op. cit. p. 636.____________________________________________________________________________________________________________________

Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

8

Page 9: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

A presente ADI tem por objeto que essa Excelsa Corte fixe a interpretação conforme

dos dispositivos questionados, a fim de determinar que o critério para a distribuição do produto de

arrecadação do salário-educação entre os Estados e Distrito Federal seja tão-somente o número de

alunos matriculados nas respectivas redes de ensino, conforme norma do art. 212, § 6º, da

Constituição, independentemente da origem da fonte arrecadadora.

Essa Corte, em outros julgados, já se manifestou sobre a possibilidade de

propositura de ADI com o objetivo de estabelecer-se interpretação conforme. Nesse sentido, vale

transcrever o acórdão a seguir:

“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO - POSSIBILIDADE JURÍDICA. É possível, juridicamente, formular-se, em inicial de ação direta de inconstitucionalidade, pedido de interpretação conforme, ante enfoque diverso que se mostre conflitante com a Carta Federal. Envolvimento, no caso, de reconhecimento de inconstitucionalidade. UNIVERSIDADE - TRANSFERÊNCIA OBRIGATÓRIA DE ALUNO - LEI Nº 9.536/97. A constitucionalidade do artigo 1º da Lei nº 9.536/97, viabilizador da transferência de alunos, pressupõe a observância da natureza jurídica do estabelecimento educacional de origem, a congeneridade das instituições envolvidas - de privada para privada, de pública para pública -, mostrando-se inconstitucional a interpretação que resulte na mesclagem - de privada para pública.” (grifou-se)(ADI n.º 3.324/DF, Pleno, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 16/12/2004, DJ 05-08-2005)

Nesse processo, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade sem

redução de texto do art. 1º da Lei n.º 9.536, de 1997, para assentar a inconstitucionalidade da

interpretação que empreste ao referido dispositivo o alcance de permitir a mudança de instituição

particular para pública, encerrando a cláusula "entre instituições vinculadas a qualquer sistema de

ensino" a observância da natureza privada ou pública daquela de origem, viabilizada a matrícula na

congênere.

Esse mesmo efeito é o que se pretende nesta ADI. De fato, a interpretação dos

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

9

Page 10: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

dispositivos do art. 15, § 1º, da Lei federal n.º 9.424, de 1996, e do art. 2º da Lei federal n.º 9.766, de

1998, tem conduzido à distribuição do salário-educação com base no critério do número de alunos

matriculados nas respectivas redes de ensino e, também, do montante arrecadado, a título de

salário-educação, dentro de cada Estado da Federação, o que indiretamente viola o art. 212, § 6º, da

Constituição.

Assim, duas são as interpretações existentes para os dispositivos legais elencados à

luz do Texto Constitucional, na hipótese em exame:

Norma 1.

A distribuição proporcional de todas as cotas estaduais observe o número de alunos matriculados na educação básica nas respectivas redes públicas de ensino, de sorte que as cotas estaduais e municipais cabíveis, a título de salário-educação, sejam integralmente distribuídas, observando tão-somente a proporcionalidade do número de alunos matriculados, de forma linear.

Norma 2.Redistribuição entre o Estado e seus Municípios dos arrecadados a título de salário-educação, de sorte que a distribuição do produto da arrecadação ocorre com base no percentual de participação de arrecadação por cada unidade da Federação.

Ora, como visto no Item III, a interpretação geradora da Norma 2 implique o

desvirtuamento da finalidade constitucionalmente estabelecida para o salário-educação, violando

frontalmente o critério único e exclusivo que a Constituição, no art. 212, § 6º, estabeleceu: número

de alunos matriculados na rede de ensino.

V. PEDIDO DE LIMINAR

Ao longo da argumentação desenvolvida, ficou inequivocamente demonstrada a

presença do fumus boni iuris. É patente a violação à norma do art. 212, § 6º, da Constituição

Federal, em virtude da interpretação (Norma 2) que se tem atribuído aos dispositivos do art. 15, § 1º,

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

10

Page 11: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

da Lei federal n.º 9.424, de 1996, e pelo art. 2º da Lei federal n.º 9.766, de 1998. A relevância dos

fundamentos jurídicos, portanto, autoriza a concessão da medida liminar, no presente caso, a fim de

proceder-se à interpretação conforme (Norma 1) das regras estabelecidas para distribuição dos

valores arrecadados a título de salário-educação, preservando-se a higidez da Constituição.

Quanto ao periculum in mora, deve ser a privação de recursos dos Estados

desfavorecidos, como é o caso de Pernambuco que, somente em 2008, teve uma perda superior a

R$ 149 milhões e, em 2009, a perda de repasse desses recursos federais é estimado em torno de

R$ 182 milhões.

Logo, a não suspensão, liminarmente, da interpretação ora questionada (Norma 2)

trará relevantes prejuízos à autonomia dos Estados afetados, tornando o provimento final a ser

proferido por essa Corte praticamente ineficaz.

VI. REQUERIMENTO

Pelo exposto, o ESTADO DE PERNAMBUCO requer:

a) Caso V. Exa. Julgue necessário, requer a intimação do Presidente do

Senado Federal, do Presidente da Câmara dos Deputados e/ou do

Presidente da República, para prestar as informações necessárias, no

prazo legal de 30 (trinta) dias;

b) A citação do Advogado-Geral da União, para, se entender cabível, defender

a norma impugnada;

c) A intimação do Procurador-Geral da República para, segundo se espera,

opinar favoravelmente à pretensão aqui deduzida;

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

11

Page 12: STF - ADI - Petição Inicial

ESTADO DE PERNAMBUCOProcuradoria Geral do Estado de Pernambuco

Gabinete do Procurador Geral________________________________________________________________________________

d) Por fim, que seja julga totalmente procedente a presente Ação Direta de

Inconstitucionalidade para, procedendo à interpretação conforme,

determinar que as cotas estaduais e municipais cabíveis, a título de salário-

educação, sejam integralmente distribuídas, observando tão-somente a

proporcionalidade do número de alunos matriculados, de forma linear

(Norma 1).

Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (um mil reais).

Termos em que pede deferimento.Recife, 9 de julho de 2009.

EDUARDO HENRIQUE ACCIOLY CAMPOSGovernador do Estado de Pernambuco

FRANCISCO TADEU BARBOSA DE ALENCAR

Procurador Geral do Estado

____________________________________________________________________________________________________________________Rua do Sol, 143, 1º andar, Santo Antônio, Recife/PE - Fone (81) 3181-8451

STF – ADI – Petição Inicial – Salário-educação

12