Souza; fabiana andrelina de corpo poético linguagem pictórica com inserção de palavras
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL – UFMS
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS - CCHS
DEPARTAMENTO DE ARTE E COMUNICAÇÃO
CURSO DE ARTES VISUAIS
CORPO POÉTICO:
LINGUAGEM PICTÓRICA COM INSERÇÃO DE PALAVRAS
Fabiana Andrelina de Souza
CAMPO GRANDE-MS
2005
FABIANA ANDRELINA DE SOUZA
CORPO POÉTICO:
LINGUAGEM PICTÓRICA COM INSERÇÃO DE PALAVRAS
Relatório apresentado como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em Artes Visuais à Banca Examinadora da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, sob a orientação do Prof. Dr. Richard Perassi Luiz de Sousa
CAMPO GRANDE-MS
2005
“Alguns não reconhecerão a verdade do meu espelho. A eles digo que minha função não é retratar a superfície (para isso existe a fotografia), mas penetrar o interior. Refletir em meu espelho até o coração”. Paul Klee – Pintor
RESUMO
O processo de trabalho aqui relatado foi desenvolvido para estudar e conceber a produção de uma série de pinturas figurativas do corpo humano expressando afetividade; as obras foram produzidas sob inspiração subjetiva. As figuras interagem com provocações escritas, proposta que visa a aquisição de uma linguagem própria com a função de sistematizar o conhecimento. A inserção de palavras na produção plástica é uma proposta poética que partiu de pesquisas sobre poesia visual, no entanto a produção não está inteiramente ligada a essa linguagem devido à expressividade com que foram trabalhadas as imagens. As palavras inseridas têm a intenção de remeter o espectador a uma conclusão pessoal, onde ele possa completar a obra. Houve, de forma organizada, uma pesquisa sobre movimentos e autores que abordaram o mesmo tema, conforme é indicado nas referências teóricas. Foram realizados estudos de interpretação e composição visual, considerando as relações estéticas e os elementos visuais como linha, textura, forma, mancha, volume e cor. As imagens que compõem as pinturas partiram de uma pesquisa, em que essas foram buscadas e selecionadas utilizando um critério de avaliação no qual as buscas eram de imagens lânguidas, fazendo referência à leveza e à atitude ao mesmo tempo. O suporte escolhido para a realização dos trabalhos são recortes de lona, já utilizados anteriormente, porque suas marcas colaboram na expressividade das obras e confrontam a realidade com o trabalho poético. As pinturas foram construídas com o uso de tinta acrílica e giz pastel seco, fixado com verniz spray, sobre desenhos produzidos com o auxílio de reprografias transparentes, ampliadas pelos recursos de um retroprojetor. Sobre o contorno fotográfico dos desenhos a pintura foi realizada com manchas e traços espontâneos e intuitivos, buscando a mesma expressividade que foi previamente observada nas obras de parte dos artistas estudados e, ao mesmo tempo, inserindo registros pessoais e características contemporâneas.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 5 1. CAPÍTULO I – INTEGRANDO A PINTURA E AS PALAVRAS ......................... 8 2. CAPÍTULO II – O PROCESSO DA CRIAÇÃO ................................................ 15 3. CONCLUSÃO ................................................................................................... 20 4. BIBLIOGRAFIA ................................................................................................ 22
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INTRODUÇÃO
Figura 1
Além de aprender o estilo e a forma de ver uma obra de arte é preciso, para
compreender adequadamente essa obra, conhecer seu histórico. A apreciação
estética é condicionada pela cultura vivenciada em cada período, e é tão
diversificada que torna impossível reduzir a arte a qualquer conjunto de preceitos.
No entanto podemos conhecer melhor as obras de arte no contexto de seu tempo e
de suas circunstâncias; desta forma, torna-se viável o trabalho artístico, tanto na sua
elaboração estética quanto na sua fundamentação.
O trabalho proposto apresenta as possibilidades de interação entre palavras
e imagens, expressões da arte que conhecemos através de pesquisas realizadas
antes e durante o seu processo de criação e produção.
A intenção da pesquisa é reforçada pela tendência atual de realização de
obras mais conceituais, em que há a possibilidade das palavras e suas reflexões
interagirem com expressões visuais conforme pode ser vista no exemplo da obra
“Véu da Alma” (fig.1).
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Pesquisando a arte buscamos entender as grandes mudanças no padrão de
vida da sociedade em determinados períodos. Analisando a cultura aprendemos o
estilo e a forma de ver os acontecimentos numa época precisa. A arte está presente
em todos os momentos da vida humana e da humanidade. As pessoas estão
habituadas a gostar do que já conhecem, sempre há aqueles que resistem a
mudanças. Outros, ávidos de novos conhecimentos, as apóiam.
O conhecimento necessário para saber fazer arte é um motivo importante
para a pesquisa, obtendo-se a capacidade de por em prática uma idéia ou um
sentimento valendo-se da faculdade de dominar a matéria. O produto final torna-se
fruto de obediência e impulso, controle e emoção, em que o caráter técnico evolui
para o fazer artístico, para que cada proposta elaborada fale por si no espaço que
ocupa.
Visto que a necessidade de expressão é natural no ser humano, esse busca
continuamente meios de manifestar suas emoções, idéias e desejos. As expressões
do mundo e do próprio homem despertam, por sua vez, a curiosidade humana e o
desejo de conhecimento. A arte se interpõe nesse processo permitindo ao homem
desenvolver formas de expressão e promovendo obras que instigam a curiosidade e
elaboram o conhecimento. Estudar e exercitar a arte atende à necessidade de
expressão e promove o desenvolvimento do conhecimento artístico em geral.
O estudo e o trabalho aqui apresentados foram desenvolvidos com a
finalidade de produzir obras capazes de apresentar aspectos significativos,
estruturados em montagens expressivas, com a intenção de uma investigação
pictórica e poética, propondo que a verdade de cada espectador seja despertada
através da observação das obras, que se tornarão questões para reflexão.
Tendo em mente que as palavras organizadas de forma elaborada buscam
propagar sentimentos e idéias, é por meio delas a pretensão de despertar a afeição
do ser humano, estimulando a busca da descoberta da verdade de cada um. Afinal
cada pessoa busca a sua verdade que pode ser inspirada pelo mundo subjetivo do
artista.
Para desenvolver essas obras foi utilizado o livro Corpo (1984), escrito pelo
poeta Carlos Drumonnd de Andrade. A leitura serviu de base para reflexões sobre
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as quais foram criadas frases poéticas, ora idealizadas e ora transformadas a partir
de idéias já conhecidas, que foram inseridas nas pinturas realizadas.
A idéia de trabalhar as pinturas com inserção de palavras partiu de uma
pesquisa feita sobre poesia visual. Foi compreendido que esse tipo de arte valoriza o
verbal, mas tem a visualidade como elemento estrutural, sendo uma fusão de
códigos, que pode ser veiculada em vários meios, com várias possibilidades
técnicas e tecnológicas, desde o simples lápis e papel, até a exploração da
tecnologia digital. A opção criativa é pessoal, fica a critério do artista a liberdade
para executar sua proposta, comunicar sua intuição.
A pesquisa sobre poesia visual partiu de leituras realizadas sobre a artista
Bárbara Kruguer (in: CALIRMAN, 1993), seguindo para vários outros artistas.
Trabalhada em lona a proposta é híbrida, com o resultado de uma
pluralidade de linguagens, que utiliza este material de forma precária, sem a
preparação devida como nas telas de pintura, colocando em questão as
propriedades intrínsecas do material que pode mudar suas características com o
tempo, ou incrementar as obras com qualidades estéticas inesperadas.
A representação da figura humana é vestida de si mesmo, sem trajes, sem
artifícios, significando sua verdade. Está exposta, sendo, pura ou impuramente, o
que é.
É um impulso humano que nos leva a representar o próprio corpo. Desde os
povos mais primitivos e distantes no tempo já havia o desejo e a necessidade de
expressão das formas humanas, onde o homem ainda não entendia essa
necessidade inconsciente. Portanto, parte-se da hipótese de que o desejo subjetivo
de representar o corpo humano é universal.
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CAPÍTULO I - INTEGRANDO A PINTURA E AS PALAVRAS
O papel principal da arte contemporânea é instigar a reflexão. O exercício
mental é importante para desenvolver idéias e tornar viável a linguagem poética.
A proposta contemporânea trabalha o conceito e a palavra nas artes visuais.
Precisa haver disponibilidade do artista para conjugar as linguagens e os meios
pelos quais possa expressar sua arte, conjugando idéias e percepções.
Por meio da escrita, da reflexão crítica sobre suas obras, o artista
desenvolve questões, e para que isso seja possível, há de ser também um
pesquisador.
Essa idéia pode ser confirmada no texto de Derdyk (1990:62) a seguir:
A estética contemporânea é operante, possui um faro especulativo, buscando descrições estruturais da obra. A arte contemporânea é cada vez mais reflexão de seu próprio fazer, exprimindo, de maneira mais evidente, o seu projeto formativo e poético. A consciência do fazer é um convite à pesquisa e à investigação da linguagem.
As obras de arte levam-nos à reflexão, a uma busca de entendimento de
vários conceitos como amor, paixão, sociedade, sexo, existência. A partir da
reflexão, o artista pode exteriorizar sentimentos, de maneira mais sóbria ou de forma
expressivamente violenta, por meio de gestos, movimentos e cores. Não nos
referimos à violência de caráter abusivo, que chegaria a constranger, embora
também possa ser colocado nesse nível. Mas o que é indicado aqui diz respeito à
energia e vivacidade causada pelo ímpeto ligado às paixões, a expressão da
verdade subjetiva, que não está interessada em se explicar, mas em despertar
sensações que instigam a subjetividade do espectador, tornando-o partícipe da obra.
O artista está na fronteira entre a realidade e a imaginação, que estão
constantemente em conflito, e ele tem como objetivo saber como o mundo real e
convencional pode ser inserido na arte. Em meio a esse conflito, o artista não repete
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o que está no mundo, a obra de arte revela outra realidade, a subjetiva, o mundo da
reflexão, onde o delírio pessoal é permitido.
Antes de criar é importante compreender os gêneros já existentes, o que
permite identificar variações. No que diz respeito às figuras, a forma de representá-
las nesta proposta visual segue a linha figurativa, ou neofigurativa, que tem como
um de seus representantes Edvard Munch com obras como “Nu junto à cadeira de
vime” (fig.2), que mostra o emprego sensível da cor e a qualidade da pintura. A
atmosfera é criada pela cabeça do modelo, timidamente voltada para baixo, e pelo
contraste entre as cores frias que descrevem o contorno de seu corpo com as cores
quentes do lençol do fundo. (NOVA CULTURAL, 1982: 39)
Figura 2
Temos também o exemplo de Anselm Kiefer que em sua pintura, paisagens
e pessoas aparecem num mundo expressionista de angústia e solidão, com figuras
tão significativas quanto à textura das camadas de tinta que ele usa, como na obra
“Cahia Crispinella” (fig.3). A forte expressividade pode se manifestar em obras muito
diferentes, estabelecendo, inclusive, uma ponte entre as linguagens abstratas e
figurativas. Outros dois importantes artistas que trabalhavam com intensa
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expressividade e que vale citar são: Van Gogh e Pollock, que também compuseram
texturas com a aplicação das tintas de forma expressivamente notável.
Figura 3
A decisão de trabalhar o nu foi um desafio, necessitou que se conhecesse e
exercitasse a construção da figura humana com harmonia anatômica e, de acordo
com as nossas intenções, com o cuidado para não torná-lo vulgar. Ainda que a
beleza e sensualidade do nu, por muitas vezes, seja confundida com o vulgar, elas
são a própria essência da arte.
O corpo humano é fonte de quase todas as inspirações. A nudez é sempre
inquietante, instigadora e bela, isso é facilmente notado na obra “Útero” (fig. 4). Por
isso, o artista encontra no corpo nu uma profunda ligação com a pureza do ser. É a
sensualidade que move a criação visual em todos os sentidos. Por isso a nudez nos
toca tanto e tão profundamente.
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Figura 4
Para obter um conhecimento mais detalhado em relação à figura humana,
foram realizadas pesquisas nos livros “O Desenho da figura humana” (DERDYK,
1990), e “O desejo na academia“ (PESSANHA, MEICHES, OLIVEIRA, 1991).
Pudemos estudar as representações visuais da figura humana através do tempo
histórico, desde as construções realizadas pelos primitivos, passando pelo
academismo e chegando até a época atual. Obtivemos informações a respeito das
mudanças de estilo e entendemos que essas transformações estão ligadas com a
percepção que o homem adquire através de descobertas de novas técnicas,
materiais e experiências.
A proposta de trabalhar as imagens com as palavras, conforme foi dito
anteriormente, baseou-se nas produções da artista norte-americana Bárbara Kruger
que, como diz Calirman (1993), mesmo não se considerando uma artista de
vanguarda no contexto da poesia visual, propaga seu trabalho usando linguagens
vanguardistas.
Kruger executa obras daquele tipo de “obra aberta”, descrita pelo teórico
italiano Umberto Eco – uma obra que só pode ser finalizada pelo espectador. A idéia
da obra aberta é ilustrada em sua forma pelo que Eco chama de ‘trabalhos em
movimento’, ele cita a música aleatória de Stockhausen, Berio e Pousseur, os
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móbiles de Calder e o livre de Mallarmé. O que estas obras têm em comum é a
decisão do artista de deixar o arranjo de alguns de seus componentes para o público
ou para a casualidade, dando-lhes, assim, não uma ordem única e definitiva, porém
uma multiplicidade de possíveis ordens (CALIRMAN, 1993:16, 18).
O trabalho de Kruger caracteriza-se pelo uso de fotografias muito ampliadas
às quais acrescenta frases combinando imagem e texto num conjunto irreverente e
agressivo que é apresentado em cartazes de rua (figuras 5 e 6) ou em camisetas,
caixas de fósforo e pôsteres, nos quais o espectador é um participante ativo na
criação do significado. No entanto, sua obra não é “aberta” somente pelo fato de ser
concluída pelo espectador. Sua “abertura” também pode ser atribuída à
possibilidade de se fazer diferentes leituras de sua obra.
De acordo Cláudia Calirman (1993), Kruger não aproxima as palavras das
idéias como simples legenda, ela traz indagações que levam o espectador a refletir,
criando uma ambivalência no significado das frases. O espectador é quem deve
decidir onde ficar.
As palavras inseridas em propostas pictóricas, ou qualquer outra linguagem
artística, emprestam sua voz à consciência. A importância desta expressão estética
aumenta à medida que, cada vez mais, os artistas utilizam o signo verbal em suas
criações, reunindo palavras e imagens carregadas de sentidos, que formam um
único corpo poético.
Figura 5 Figura 6
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O trabalho pessoal que apresentamos também possui sua abertura, porque
tanto as figuras como as palavras inseridas estão ali para despertar sentimentos
próprios do expectador. Esse fruirá a obra de acordo com suas verdades íntimas,
considerando que o resultado dessa vivência servirá de conclusão para sua
apreciação da obra.
Lopes (2004) cita Jenny Holzer, como outro exemplo no campo dessa arte,
porque produz séries de trabalhos nos quais utiliza a linguagem verbal como objeto
de reflexão. Sua série “Sobrevivência” (1983) traz frases como “proteja-me do que
eu quero” e “Homens não protegem mais você”. Tornar públicas questões do meio
intelectual foi seu objetivo. Sem deixar de se preocupar com os aspectos
sociopolíticos, sua mensagem fica mais intimista e meditativa. Mostrar as
contradições da cultura ocidental, propor uma crítica à sociedade com uma
linguagem acessível que busca sensibilizar o público, caracteriza a arte de Jenny
Holzer.
Na proporção em que são realizadas pesquisas e experiências práticas, o
artista vai tornando-se uma sensibilidade inteiramente subjetiva. De acordo com
Fernand Léger (1989:41), a imitação cria uma inquietude nas pessoas, a arte
consiste em inventar, não em copiar. Essa convicção é confirmada com sua
referência ao artista Cézane que cita: “Depois de ver os grandes mestres, é preciso
se apressar a sair deles e verificar em si os instintos, as sensações que residem em
nós”, (apud LEGER, 1989: 23).
Tendo em mente essas palavras, procuramos alcançar uma linguagem
própria com obras trabalhada de maneira intuitiva. Demonstrando à tendência de um
instinto em que a força e o vigor ficam claramente expressos nas obras como pode
ser observado em “Um Apaixonado” (fig. 7).
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Figura 7
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CAPÍTULO II - O PROCESSO DA CRIAÇÃO
Primeiro surgem o sentimento e a idéia e, conseqüentemente, surge a
necessidade de expressão do que foi sentido e pensado. O artista consciente sabe
que não pode haver um processo de criação sem as técnicas e as linguagens,
porque essas determinam as formas e os argumentos de expressão, encadeando
sentimentos e idéias, a força expressiva das formas visuais e das palavras configura
o texto artístico. Nos textos pictóricos o uso das palavras expressa potencializa as
idéias.
Expressar verbalmente dá a oportunidade de percebermos com maior
profundidade a importância do que fazemos. A necessidade de saber expressar o
que se deseja exige trabalho e reflexão sobre as linguagens específicas, para torná-
las únicas e pessoais, dando oportunidade à linguagem de transitar livremente entre
o subjetivo e o objetivo.
É igualmente relevante saber ver e ler para avaliar o que se faz, entender a
substância do que se diz, não apenas o significado vulgar da palavra, mas o seu
sentido mais refinado. Nesse momento entra a analogia, para verificar alguns pontos
de semelhança com os trabalhos de outros artistas, que puderam ser comparados
ao que estava sendo desenvolvido, reconhecendo-se as bases da linguagem visual
para a definição da investigação teórica.
Durante a evolução do processo, a busca de informações foi contínua e o
trabalho em desenvolvimento foi passando por transformações progressivas, em que
os resultados estéticos sofrerarm alguns avanços significativos.
O que despertou a necessidade de inserir palavras nas obras foi o desejo de
verbalizar sentimentos e pensamentos. A evolução dessa idéia trouxe à tona outra
necessidade, a de saber utilizar as palavras de modo a não formar frases piegas e
diretas, mas formar frases que, ao mesmo tempo, traduzem sentimentos e que
abrem possibilidades de várias interpretações, onde o espectador, como partícipe da
obra, poderá interpretá-la de acordo com a sua vivência.
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O início da idéia de trabalhar a proposta visual, que resultou na elaboração
deste trabalho aqui apresentado ocorreu durante uma pesquisa teórica. As idéias
imaginadas, que promoveram a realização das obras, foram figuras humanas
traçadas e pintadas de maneira expressiva, juntamente com palavras inseridas nas
composições.
A artista plástica Priscila Paula Pessoa tem um trabalho semelhante ao
desenvolvido nesta pesquisa, como pode ser verificado em uma das obras da série
“Calíopes” (fig.8), diferindo-se, entretanto, na proposta poética, no suporte e nos
recursos para obtenção da figura.
Figura 8
Para trabalhar as obras, foram eleitas as tintas acrílicas, porque acreditamos
na sua contribuição para a expressividade das mesmas e, também, por ser de
rápida secagem e por deixar as marcas dos pincéis registradas, da maneira como
foram executados os seus movimentos.
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Em seguida, foi pensado qual seria o suporte escolhido e, de imediato, veio
à mente recortes de lonas (encerados), que seriam utilizados com suas marcas,
manchas e remendos, para também contribuírem na expressividade das obras.
O trabalho expressivo tem relação com o real, mas não é puramente
mimético, porque não produz a sensação de estarmos vendo algo natural. Sobre as
figuras naturais, a arte aparece como expressão dos sentimentos, o que importa são
as emoções e a visão interior desta artista reveladas nos gestos registrados e nas
cores escolhidas, como pode ser visto na obra “Auto-retrato” (fig. 9).
Figura 9
As pesquisas desenvolvidas trouxeram o conhecimento de que a arte tem
ampla abertura para possibilitar leituras, e que o artista pode intervir como agente
configurador, através de meios mecânicos e eletrônicos de reprodução. Desta forma,
as reproduções das imagens escolhidas foram conseguidas com a utilização de
reprografias transparentes ampliadas pelos recursos de um retroprojetor.
Foram feitas realizações de exercícios estruturados para garantir uma boa
formação de base (croquis, esboços), permitindo um trabalho que parte de uma
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expressão pessoal, enfatizando a sensibilidade e as qualidades que a pintura busca
expressar, com a utilização dos recursos das relações entre claro e escuro, linha,
mancha e sugestão de volumes.
Os traços dos desenhos não ficaram presos às imagens selecionadas, que
serviram apenas de base para a delimitação anatômica do corpo. Além do uso das
tintas acrílicas, as imagens foram trabalhadas com giz pastel seco de maneira
espontânea e intuitiva, caracterizando uma técnica mista.
Após traçar cada uma das figuras a execução das obras foram feitas sobre o
chão, devido ao tamanho e às características dos suportes. A lona sem chassi exigiu
esse trabalho no solo, que permitiu também a movimentação do corpo ao redor das
obras e a expressão de gestos que puderam acompanhar as ações das figuras.
Assim, o trabalho foi realizado de maneira semelhante ao artista Pollock que
explicou sua maneira de trabalhar da seguinte forma: “Fico mais à vontade para
trabalhar no chão. Sinto-me mais perto da pintura, dela fazendo parte de certo
modo, porque posso passear em roda, trabalhar dos quatro lados e entrar
literalmente dentro” (apud MONTEIRO, 1981: 269).
A pintura, portanto, foi realizada com tinta acrílica e redesenhada com giz
pastel seco, que foi fixado com verniz spray por cima da pintura. O estudo teórico foi
essencial para observar e conhecer as misturas (matização) e os contrastes no uso
das cores, obtendo-se os efeitos desejados na aplicação prática. Em uma obra
expressiva as cores não precisam necessariamente corresponder à realidade.
O livro Corpo (1984), escrito pelo poeta Carlos Drumonnd de Andrade, foi
lido para reafirmar como deveria ser elaborada as frases poéticas, servindo de base
para formar novas frases, algumas destas foram idealizadas, e outras transformadas
para atender as propostas estabelecidas no desenvolvimento destes trabalhos.
Algumas das imagens foram selecionadas antes de sabermos das frases
que seriam compostas juntamente com as pinturas. As frases foram sendo criadas
ou escolhidas de acordo com as relações que estabelecemos com a pintura
elaborada. Mas houve também obras em que as imagens foram escolhidas para
compor uma obra cuja frase já estava determinada.
Os trabalhos foram produzidos sob inspiração da emotividade e da
sensualidade. As emoções são transmitidas através de gestos apaixonados,
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carregados e intensos. A emoção, o vigor e a sensibilidade manifestam-se em
atitudes impulsivas tornando a expressão um fator diferencial.
As superfícies das obras são carregadas de energia expressa pelas massas
de tintas e suas cores. As linhas manifestam a tensão dos gestos e por
conseqüência das emoções. Do ponto de vista formal, a linha e a mancha se
complementam expressando o caráter passional da obra.
A figura humana faz referência à leveza e a força ao mesmo tempo,
representa os desejos e os conflitos, como suas possibilidades de interpretação. A
intenção foi provocar confissões pessoais, revelando sentimentos ocultos, perdidos
na memória da vida.
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CONCLUSÃO
Estudar sobre a história da arte e da representação, bem como, comparar
obras artísticas e pesquisar sobre poesia, corpo e poesia visual foram
procedimentos muito importantes para a elaboração consciente da série de pinturas
produzidas de acordo com os procedimentos aqui relatados.
O esforço poético aliado ao conhecimento teórico resultou no
desenvolvimento de uma prática rica em conhecimentos extraídos, também, do
campo do fazer, além de facilitar o processo de elaboração e produção das obras
realizadas.
O processo de elaboração e construção do trabalho prático e deste relatório
validou as vantagens de se compreender teoricamente as atividades artísticas no
decorrer da história da humanidade. Isso define a importância da pesquisa para
quem deseja adquirir cada vez mais conhecimento dentro de seu campo de atuação.
Foi confirmado, ainda, que, além do processo teórico e técnico, a pesquisa
poética e o envolvimento afetivo com a produção é fundamental para todos os
trabalhos artísticos, mais especialmente, para os trabalhos que se pretendem
expressivos e passionais, como as obras barrocas, românticas e expressionistas. No
que tange à subjetividade, aos sentimentos e as emoções, compreendemos que os
elementos subjetivos necessitam de elementos objetivos que tenham capacidade de
expressá-los e comunicá-los e isso justifica a pesquisa poética que transforma a
técnica em linguagem expressiva.
Decorre dessa percepção a nossa satisfação diante dos trabalhos
realizados, nos quais as composições com imagens e textos expressam forte carga
poético-expresssiva. Tendo em vista que o desenvolvimento de um trabalho
expressivo requer a capacidade de tornar perceptível a emoção por meio de gestos
e cores. O expectador além de perceber deve também ser estimulado a participar e
compartilhar desse estado emocional. De acordo com nossa percepção os trabalhos
aqui relatados alcançaram os resultados pretendidos com relação a sua
expressividade e passionalidade.
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A decisão de trabalhar a figura humana pintada não foi uma escolha
repentina, o corpo humano nu sempre foi um tema presente e natural na nossa visão
de mundo, que o enxerga de maneira inquietante, instigadora e, ao mesmo tempo,
pura. Ao inserir palavras poéticas na obra pictórica foi atendida, também, a
necessidade de se reforçar o tom poético, que já fazia parte da temática das obras.
Acreditamos que essas palavras instigam o expectador a pensar e sentir, além do
que foi pensado e sentido por nós durante a produção e composição das frases. O
todo da composição propõe as obras abertas às vivências e interpretações do
público.
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BIBLIOGRAFIA
ANDRADE, Carlos Drummond de. Corpo. Rio de Janeiro: Record. 1984. CALIRMAN, Claudia. “Bárbara Kruguer - Estratégias dos anos 80”. Revista MAC. N.2, p.16-23. dez. 1993. CANTELE, Bruna Renata. Arte etc. e tal... Vol. 4. São Paulo: IBEP. 1995. DERDYK, Edith. O Desenho da Figura Humana. São Paulo: Scipione Ltda. 1990. LÉGER, Fernand. Funções da Pintura. São Paulo: Nobel. 1989. LOPES, Sabrina. “Inquietação pós-feminista e poesia visual contemporânea”. Política Democrática – Revista de Política e Cultura – Fundação Astrojildo Pereira. Brasília, Ano III. n. 8, p. 167-175. maio 2004. MONTEIRO, Jacy. Dicionário da pintura moderna. São Paulo: Hemus, 1981. CULTURAL, Nova. Os Grandes Artistas. São Paulo: Nova Cultural. 1982. KLEE, Paul. Diários. São Paulo: Martins Fontes. 1990. PESSANHA, José Américo Motta. MEICHES, Mauro. OLIVEIRA, Maria Alice Millet de. O Desejo na Academia. São Paulo: Pinacoteca. 1991. SOUSA, Richard Perassi Luiz de. Roteiro didático da arte na produção do conhecimento. Campo Grande: UFMS. 2005. Sites: http://www.artnet.com/ag/fineartthumbnails.asp?aid=9454. Acessado em 07.11.2005.