SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

11
1 SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE Anderson Sousa Sá [email protected] RESUMO O presente artigo visa apresentar a problemática decorrente da aplicação da gratuidade no sistema por ônibus em Salvador. As externalidades negativas oriundas da forma em que o sistema de benefícios é utilizado e a aplicação pelos seus beneficiários, faz com que o custo pela passagem dos ônibus seja transferido aos usuários que muitas vezes não têm condições de arcar. Considerando tal meio de locomoção como em público, tal artigo demonstrará um estudo crítico e histórico a respeito dessa problemática. Palavras-chave: Gratuidade, externalidade, bem público, transporte público, beneficiários. JEL: A12; B16; D62; H23; H41 ABSTRACT This article presents the problems arising from the application of gratuity in the system by bus in Salvador. The negative externalities arising from the way the benefit system is used and the application for their beneficiaries, makes the cost for the ticket of bus is transferred to users who often can not afford to pay.

description

O presente artigo visa apresentar a problemática decorrente da aplicação da gratuidade no sistema por ônibus em Salvador.

Transcript of SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

Page 1: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

1

SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR:

ESTUDO DA GRATUIDADE

Anderson Sousa Sá

[email protected]

RESUMO

O presente artigo visa apresentar a problemática decorrente da aplicação da

gratuidade no sistema por ônibus em Salvador. As externalidades negativas

oriundas da forma em que o sistema de benefícios é utilizado e a aplicação pelos

seus beneficiários, faz com que o custo pela passagem dos ônibus seja transferido

aos usuários que muitas vezes não têm condições de arcar. Considerando tal

meio de locomoção como em público, tal artigo demonstrará um estudo crítico e

histórico a respeito dessa problemática.

Palavras-chave: Gratuidade, externalidade, bem público, transporte público,

beneficiários.

JEL: A12; B16; D62; H23; H41

ABSTRACT

This article presents the problems arising from the application of gratuity in the

system by bus in Salvador. The negative externalities arising from the way the

benefit system is used and the application for their beneficiaries, makes the cost

for the ticket of bus is transferred to users who often can not afford to pay.

Page 2: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

2

Considering such means of transport and in public, such article will demonstrate a

critical and historical study about this problem.

Keywords: Gratuity, externalities, public goods, public transport, beneficiaries.

JEL: A12; B16; D62; H23; H41

INTRODUÇÃO

No Brasil, o vale-transporte foi criado em 1985, posteriormente alterada e

disciplinada em 1987. O benefício é uma forma de “subsídio direto” financiado

pelos empregadores, uma vez que o usuário trabalhador sofre desconto de no

máximo 6% em sua remuneração do valor despendido com transporte (art. 4º,

parágrafo único da Lei n.7.418/85).

Como benefício social e como instrumento de garantia do comparecimento

assíduo de um grupo de usuários que assegure o aporte de receita para o

sistema, o vale-transporte tem deixado a desejar. Todavia, como os recursos de

financiamento do vale-transporte provêm de outra fonte que não subsídios

públicos ou tarifas pagas pelos usuários, constituem um auxílio social importante e

uma ajuda financeira considerável para o sistema de transporte público.

No entanto, o custo que o financiamento do vale-transporte gera para o

empresário é repassado para os preços dos produtos, fazendo com que a

população que os adquire participe de uma forma indireta de seu financiamento.

Além disso, a obrigação de custear o benefício leva os agentes econômicos a

buscar formas de se furtar ao seu pagamento. Já nesse contexto, passando ao

“subsídio cruzado”.

Page 3: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

3

Sendo assim, o Sistema de Transporte por Ônibus de Salvador (STCO), possui

muitos setores que precisam ser analisados no tocante à gratuidade integral a

descontos concedidos.

Referente a esse tocante e as externalidades negativas causadas aos indivíduos

(de baixa renda) que subsidiam a gratuidade de estudantes e outros beneficiários

que estão em melhores condições financeiras.

CONTEXTUALIZANDO O SISTEMA DE TRANSPORTE

O Sistema de Transporte Coletivo por Ônibus de Salvador (STCO) tem sua origem

firmada a partir da segunda metade do século XIX, com as “gôndolas” dos Ariani.

Contemporaneamente às “gondolas”, o transporte realizado pelas empresas que

começavam a participar do processo de mobilidade urbana na capital baiana, era

feito por tração animal. No entanto, foi apenas no início da Proclamação da

República que começou o processo de modernização dos meios de transporte,

com leis que obrigava a substituição dos bondes de tração animal por bondes

elétricos - “tramways”, com a finalidade de desenvolver esse sistema que muito

crescia. (Macchione Saes, Alexandre. p.225).

No início do século XX, o sistema de transporte no município era controlado,

principalmente, por empresas estrangeiras a Light e a Guinle & Co. (a futura

Companhia Brasileira de Energia Elétrica). “Em comparação com as duas

principais cidades do país, São Paulo e Rio de Janeiro, Salvador estava passando

por um momento de concentração das empresas prestadoras de serviços.”

(Macchione Saes, Alexandre. p.228). No entanto, a prefeitura de Municipal (ainda

denominada Conselho Municipal), passa a administrar e fiscalizar o sistema de

“tramways”, a partir de 1907, com leis sobre tarifas, horários, zonas de atuação

das empresas concessões entre outros.

Page 4: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

4

O cenário econômico durante a Primeira Guerra Mundial, esfriou crescente

desenvolvimento do sistema de transporte em Salvador. No entanto, timidamente,

antes do início da Guerra, começaram a ser utilizado ônibus em Salvador.

(STEPS). Contudo, com término da Guerra, outras perspectivas apontavam uma

possível melhora, como a inauguração da Usina Hidroelétrica de Bananairas, que

influenciou para uma redução dos custos “dos serviços ofertados pelas empresas

controladas pela Companhia Brasileira de Energia Elétrica”. (Macchione Saes,

Alexandre. p.233).

Assim, em meados do século XX, o sistema de bondes elétricos apresentou

decadência, principalmente influenciado pelo péssimo serviço, falta de bondes

além dos atrasos nos horários, acarretando em várias manifestações que

corroboraram para por fim aos bondes elétricos na capital baiana. Isso foi uma

excelente oportunidade para a implementação do sistema por ônibus em Salvador,

que a cada ano foi havendo um crescente desenvolvimento em sua estrutura e leis

que a rege.

Nesse ponto, já com a utilização do ônibus como principal alternativa de transporte

público no município de Salvador, começou a ser constituído o sistema de

gratuidade no Sistema de Transporte por Ônibus em Salvador (STCO),

implementado em 1996, com a utilização do “smart card”, que dava desconto de

meia passagem aos estudantes legalmente beneficiados do sistema. Com isso,

chega-se a questão que será abordada na seção seguinte a respeito da utilização

dos bens públicos sob a ótica da teoria pigouviana a respeito da economia do Bem

Estar.

GRATUIDADE NO TRANSPORTE PÚBLICO

Page 5: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

5

O termo gratuidade segundo o dicionário Aurélio significa “qualidade do que é

gratuito.” Isto é, aquilo que é dado sem valor monetário ou objetivando algo em

troca, ou seja, de graça. No campo dos transportes públicos, esse termo é

aplicável em vários sistemas de transportes, dependendo apenas das condições

legais que cada estado tem atribuído aos beneficiários dos privilégios da

gratuidade:

São reservadas aos Estados as competências que não lhes sejam

vedadas por esta Constituição. (art. 25, CF.)

Em outros termos, cada Estado determinará as leis que irá regir o sistema de

gratuidade nos meios de transporte, independente quer seja ele rodoviário,

ferroviário, aquaviário e aeroviário. Fica também a cargo do poder público criar leis

que atuem na política tarifária dos serviços públicos

Nesse contexto, segundo o laudo da Consultoria Legislativa, a respeito do sistema

de gratuidade brasileiro, é possível afirmar que “existem duas alternativas para

concessão de gratuidade ou descontos na tarifa dos serviços”: o subsídio direto e

subsídio indireto.

TRANSPORTE COLETIVO COMO BEM PÚBLICO

Os bens públicos não possuem exclusividade nem rivalidade, isto é, não se pode

excluir do seu consumo um indivíduo em particular, e seu uso por determinada

pessoa não reduz a quantidade disponível do mesmo bem para os demais

membros da sociedade. Em outros termos, o transporte por ônibus em salvador é

aberta a todos (que possam arcar com a passagem) e não rival, desde que a

utilização por um indivíduo não reduzirá a quantidade disponível para os demais

Page 6: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

6

(pelo menos, me determinado espaço de tempo, por exemplo, em situações de

superlotação, por que nesse caso será considerado rival).

Desde que o transporte público é algo também fundamental para o dinamismo da

economia numa sociedade, tem-se a necessidade de intervenção do poder público

para administrar e disponibilizar meios que o façam fluir, no caso de Salvador, o

principal meio é o ônibus. Sendo assim, verifica-se a existência de bens de mérito

ou sociais, que são os bens de consumo individual cuja utilização dá origem a

benefícios superiores àqueles gozados pelo consumidor. Isto é,

Bem cujo consumo satisfaz às necessidades consideradas socialmente prioritárias, cabendo ao poder público a sua definição, estímulo, fomento e provisão. (Ministério da Saúde, 2006, p. 19)

ECONOMIA DO BEM ESTAR

O entendimento a respeito da teoria do bem estar de Arth Pigou compete em

tornar o Estado como principal financiador de políticas sociais para o bem comum,

pois sob a ótica da externalidade negativa (no caso deste artigo) patrocinada pelo

uso da gratuidade do transporte por ônibus, a medida em que o custo pra

aplicação desse benefício advém, segundo o relatório de consultoria da Câmara

Legislativa, por meio de subsídio cruzado, isto é:

(...) Para o custeio da gratuidade ou de desconto na tarifa dos transportes é a do subsídio cruzado, interno ao próprio sistema, que consiste em incluir o custo dos usuários não pagantes na composição da tarifa. (Consultoria Legislativa, 2007, p.5)

Ou seja, o impacto para custear o uso do benefício para uns, fica a cargo dos

usuários do transporte por ônibus que não se enquadram no contexto dos

beneficiários, isto é, o ônus do benefício vai ser rateado pelo conjunto dos

Page 7: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

7

usuários pagantes que, no mais das vezes, são tão carentes quanto os

beneficiários.

Contudo, vale ressaltar que, de acordo com a teoria pigouviana, a questão dos

subsídios (financiamento por parte do governo) serve para provocar

externalidades positivas. No entanto, no caso desse artigo estar tratando como

externalidade negativa a questão dos subsídios cruzados, pelo motivo de que,

quem arca com os custos é a própria sociedade que muitas vezes não possui

condições para tal, ou seja, há redução de bem-estar, pois há elevação no preço

da passagem de ônibus. (MONTORO FILHO, 1992, 221)

Para isso, segue um pequeno exemplo, supondo que em Salvador residem um

total de 100 habitantes, desses a grande maioria, isto é 90, corresponde a

indivíduos que não estão inclusos no perfil para ser beneficiário de gratuidade nem

desconto na passagem dos ônibus. Dos 90, 81, possui está possuem emprego e 9

não possui. Sendo assim, que arcará com a passagem dos 10 que são

beneficiários, são os 90, que contém 9 indivíduos que não tem condições de arcar

com o custo de uma única passagem (na condição ceteris paribus) deverá

contribui para “subsidiar” a outrem, que poderá ter condições de pagar uma ou

mais passagens de ônibus (casos, de estudantes que possuem renda

consideravelmente boa para poder arcar com os cursos de transporte, ou idosos

que possuem elevada renda, entre outros casos). Porque,

Na verdade, o desconto é coberto pelos que pagam a passagem em dinheiro do Vale Transporte e do Bilhete Avulso. Esses são os verdadeiros financiadores da Meia Passagem Estudantil e de todo tipo de gratuidade concedida no transporte coletivo. (STEPS)

Graficamente, deverá ficar semelhante ao gráfico 1, num mercado de concorrência

perfeita, em que o custo marginal privado, mantendo os benefícios de gratuidade,

sem atentar quem está financiando (se tem condições financeiras):

Page 8: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

8

Gráfico 1: Externalidades Negativas (custos externos)

Para os indivíduos em que o custo para compra da passagem pesará mais no

orçamento familiar (Q) o custo social (C*) será maior do que o custo privado.

Contudo, os demais indivíduos que possuem condições de arcar com o custo

integral da passagem, Q, (já embutido o acréscimo destinado a gratuidade),

verifica-se uma externalidade positiva, quanto ao percentual subsidiado pelo

governo e a diferença a ser paga, conforme gráfico 2:

Gráfico 2: Externalidades Positivas – Correção mediante subsídios

Page 9: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

9

Destacando que são beneficiários de valor integral: crianças até cinco anos,

deficiente com acuidade visual nula bilateral, deficientes físicos com dificuldade de

locomoção, idosos acima de sessenta e cinco anos, policial militar fardado

(máximo de 2 por ônibus); e nos casos especiais: carteiros, policiais civis, oficiais

de justiça (estatual e federal), auditores fiscais do trabalho, comissários mirins,

agentes de trânsito e fiscais de trânsito. Quanto aos que possuem desconto, são:

alunos matriculados em Instituições públicas ou particulares de ensino

fundamental, médio, superior, cursos de mestrado e doutorado, cadastradas junto

ao SalvadorCARD, que estejam frequentando, regularmente as aulas e que

possuam idade mínima de cinco anos completos. (SETPS).

CONCLUSÃO

Esse artigo buscou apresentar uma análise referente ao sistema de benefício de

gratuidade no Sistema de Transporte por Ônibus em Salvador, buscando analisar

como a forma de atuação pública, quanto a aplicação de subsídios, podem tanto

provocar externalidades positivas e negativas.

A medida em que o poder público municipal opta pelo subsídio cruzado, isso fará

com que parte do custo seja transferido aos usuários de ônibus que pagam o valor

integral, não havendo preocupação para os indivíduos que não possuem

condições esse dispêndio.

Por outro lado, essa política de subsídio, para aquelas pessoas que possuem

renda suficiente para custear sua viagem, provocará um benefício social imenso,

numericamente maior até ao demonstrado anteriormente, quanto aos que não

podem pagar ou pagam com imensa dificuldade devido custo para eles.

Page 10: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

10

Com isso, é importante abranger o estudo sob a ótica de que a metodologia de

aplicação de subsídio pelo governo deveria ser revisada, à medida que, não

prejudique que mais precisa de ajudas governamentais.

REFERÊNCIAS

CARRERA-FERNANDEZ, José. Curso básico de microeconomia. Salvador: EDUFBA, 2009

COASE, Ronald H. (1960). Tradução por Francisco Kümmel F. Alves e Renato Vieira Caovilla. Ensaio O Problema do Custo Social. Journal of Law and Economics. nº 3, p 1-44, Outubro de 1960. ______. Disponível em: <http://www.pucpr.br/arquivosUpload/5371894291314711916.pdf>. Acesso em 15 de novembro de 2014. Macchione Saes, Alexandre. Modernização e concentração do transporte urbano em Salvador (1849-1930). Revista Brasileira de História. São Paulo, v. 27, nº 54, p. 219-238 – 2007. MONTORO FILHO, André Franco; PINHO, Diva Benevides; VASCONCELLOS, Marco Antonio Sandoval de. Manual de economia. 2. ed. São Paulo, SP: Saraiva, 1992. 507 p. ISBN 8502006460 (broch.) PIGOU, Arthur C. (1932), The Economics of Welfare. London: Macmillan and Co. [ed. orig.: 1920]. Disponível em: <http://www.econlib.org/library/NPDBooks/Pigou/p gEW.html>. Acesso em 14 de dezembro de 2014. SAMPAIO, Consuelo Novais. 50 anos de urbanização: Salvador da Bahia no Século XIX . Rio de Janeiro, RJ: 2005. 294 p. ISBN 8589309118 (enc.) SETEPS. Gratuidades. Disponível em:<http://www.setps.com.br/gratuidades/#>. Acesso em 14 de dezembro 2014.

Page 11: SISTEMA DE TRANSPORTE COLETIVO POR ÔNIBUS EM SALVADOR: ESTUDO DA GRATUIDADE

11