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SIMONE BRUN O ESTADO COMO AGENTE REGULADOR DA ATIVIDADE ECONÔMICA MARILIA 2014

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SIMONE BRUN

O ESTADO COMO AGENTE REGULADOR DA ATIVIDADE ECONÔMICA

MARILIA

2014

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SIMONE BRUN

O ESTADO COMO AGENTE REGULADOR DA ATIVIDADE ECONÔMICA

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade de Marília como exigência parcial para a obtenção do grau de Mestre em Direito, sob orientação da Profa. Dra. Maria de Fátima Ribeiro.

MARILIA

2014

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Brun, Simone.

O Estado como gente regulador da atividde econômica/ Simone Brun Marília: UNIMAR, 2014.

111 p.

Dissertação (Mestrado em Direito) -- Curso de Direito da Universidade de Marília, Marília, 2014.

1.Intervenção do Estado 2. Direito Concorrencial 3. Livre Concorrência 4. Livre Iniciativa I. Brun, Simone.

CDD -- 341.378

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SIMONE BRUN

O ESTADO COMO AGENTE REGULADOR DA ATIVIDADE ECONÔMICA

Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado

do Curso de Direito da Universidade de Marília –

UNIMAR, área de concentração Empreendimentos

Econômicos, Desenvolvimento e Mudança Social,

sob a orientação do Profa. Dra. Maria de Fátima

Ribeiro.

Aprovado pela Banca Examinadora em: ____/____/______

_______________________________________________________________

Profa. Dra. Maria de Fátima Ribeiro

_______________________________________________________________

Prof. Dr. Lourival José de Oliveira

_______________________________________________________________

Prof. Dr. Iure Pontes Vieira

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Dedico este trabalho aos meus professores Maria

de Fátima e Lourival que durante minha vida e carreira profissional, sempre me estimularam e realmente me fizeram ser cada vez melhor.

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Ele bem que tentou resistir. Parecia saber que aquela

viagem   à   “Índia”   transformaria   sua   vida   para  

sempre. Apenas não sabia como realmente

aconteceria essa transformação. (grifo nosso)

A.B. Yehoshua

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O ESTADO COMO AGENTE REGULADOR DA ATIVIDADE ECONÔMICA

RESUMO: A ordem econômica está fundada na obtenção do desenvolvimento nacional, garantia estendida a todos, sendo que, para a sua consecução e plenitude devem ser perseguidos e efetivados os princípios fundamentais contidos no art. 170 da Constituição Federal de 1988, que estabelecem a proteção da concorrência leal e da livre iniciativa, dentre outros, e com isso, a promoção da efetiva repressão ao abuso do poder econômico e a garantia da justiça social, como pilares do Estado Democrático de Direito. O objeto desse trabalho foi o estudo da principal característica para a obtenção de um resultado social, qual seja, determinar que o particular não fomente a atividade econômica com fins lucrativos exorbitantes, à revelia dos cidadãos e em prejuízo do consumidor. É importante determinar as formas de intervenção do Estado no domínio econômico para reprimir os abusos e a dominação de mercado e proporcionar condições para o desenvolvimento sustentável e o bem-estar social. Sendo assim, o presente trabalho investigou a manifestação e atuação do Estado na atividade econômica nacional, tendo em vista as previsões constitucionais e as condições estabelecidas em legislações específicas que delimitam a sua atuação, garantindo a aplicabilidade dos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência no desenvolvimento econômico. Neste sentido, concluiu-se que a intervenção estatal na economia é imprescindível e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE, embora necessite de aperfeiçoamentos em sua efetivação, contribui para a consecução dos mesmos princípios. A pesquisa seguiu o método dedutivo e foram obtidos os seguintes resultados: o Conselho Administrativo de Defesa Econômica é o responsável pela proteção das relações econômicas evitando o abuso do poder econômico e protegendo o consumidor nos negócios jurídicos; com o advento da nova Lei 12.529, de 30 de novembro de 2011, que trata da prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica; novos parâmetros abriram-se e o processo administrativo incorporou dinamismo em suas condutas, assim como, criaram-se divisões internas com introito de possibilitar eficiência e agilidade às solicitações de análises e de denúncias realizadas, demonstrando desta forma, o poder do Estado na regulação da atividade econômica nacional. Palavras-chave: atividade econômica. intervenção estatal. livre concorrência.

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STATE AS A REGULATOR OF ECONOMIC ACTIVITY

Abstract: the economic order is founded on obtaining the national development, extended warranty, and, to its achievement and fullness must be pursued and enforced the fundamental principles contained in article 170 of the Federal Constitution of 1988, which establishes the protection of fair competition and free enterprise, among others, and with that, the promotion of effective suppression of abuse of economic power and the guarantee of social justiceas pillars of the democratic State of law. The object of this work was the study of the main feature to obtain a social outcome, namely, determines that the particular fosters economic activity with exorbitant profit, over the heads of the citizens and to the detriment of the consumer. It is important to determine the forms of State intervention in the economic domain to suppress abuses and market domination and provide conditions for sustainable development and social welfare. Thus, the present work investigated the manifestation and activities of the State in national economic activity, considering the constitutional provisions and the conditions laid down in specific laws that circumscribe their activities, ensuring the applicability of the principles of free enterprise and free competition in economic development. In this sense, it was concluded that State intervention in the economy is essential and the Administrative Council of economic defense-CADE, although requires improvements in its implementation, contributes to the achievement of the same principles. The survey followed the deductive method and the following results were obtained: the Administrative Council for economic defense is responsible for the protection of economic relations by avoiding the abuse of economic power and protecting the consumer in legal transactions; with the advent of new law 12,529, November 30, 2011, which deals with the prevention and suppression of violations against the economic order; new parameters opened and the administrative process has incorporated dynamism in their pipelines, as well as, internal divisions were created with introito enabling efficiency and agility analysis requests and complaints made, demonstrating the power of the State in regulating the national economy. Keywords: economic activity. State intervention. free competition.

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LISTA DE SIGLAS

ADIN – Ação Direta de Inconstitucionalidade

CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica

CF/88 – Constituição Federal de 1988.

CPI – Comissão Parlamentar De Inquérito

IMBEL – Indústria de Material Bélico do Brasil

MP – Ministério Público

MPF – Ministério Público Federal

NUCLEP – Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A

SBDC – Sistema Brasileiro De Defesa Do Consumidor

SDE - Secretaria do Direito Econômico

SEAE – Secretaria de Acompanhamento Econômico

STF – Supremo Tribunal Federal

STJ – Superior Tribunal de Justiça

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 10

2 FORMAÇÃO DO ESTADO ECONÔMICO .................................................................... 13 2.1 O HISTÓRICO ECONÔMICO BRASILEIRO ................................................................. 17

2.2 A PARTICIPAÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO ................................. 20

2.2.1 Intervenção e Desenvolvimento ...................................................................................... 21

2.3 FUNDAMENTOS PRINCIPIOLÓGICOS DA ORDEM ECONÔMICA ........................ 26

2.3.1 Soberania Nacional .......................................................................................................... 27

2.3.2 Propriedade privada e função social da propriedade ....................................................... 30

2.3.3 A livre concorrência e a defesa do consumidor ............................................................... 32

2.3.4 A repressão ao abuso do poder econômico e garantia da economia popular. ................. 36

3 A INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO ............................... 41 3.1 A ORDEM ECONÔMICA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA E A INTERVENÇÃO CONCORRENCIAL DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO ...................................... 42

3.2 O CONTROLE DOS ATOS DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO .......................................................................................................................... 52

3.3 A INTERVENÇÃO ESTATAL POR MEIO DA FISCALIZAÇÃO: O SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA ............................................................. 60

4 SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA E A ATUAÇÃO DO CONSELHO ADMINSTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE ....................... 67 4.1 O FUNCIONAMENTO ADMINISTRATIVO PARA GARANTIR A DEFESA DA CONCORRÊNCIA ................................................................................................................... 68

4.1.1 DOS ÓRGÃOS DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA 69

4.1.2 DAS FORMAS DE ATUAÇÃO DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA ................................................................................................................... 74

4.1.3 DOS CONTROLES DE CONDUTA NA EFETIVAÇÃO DA LIVRE CONCORRÊNCIA ................................................................................................................... 76

4.2 REVISÃO ADMINISTRATIVA DAS DECISÕES DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA ............................................................................................ 83

4.3 A JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA ECONÔMICA DE PROTEÇÃO DA CONCORRÊNCIA ................................................................................................................... 84

4.4 A NOVA LEI DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA: PRINCIPAIS ALTERAÇÕES CONCERNENTES AO CADE .............................................. 90

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4.4.1 DAS ATUAÇÕES PARA A EFETIVAÇÃO DO PAPEL E DA COMPOSIÇÃO DO CADE ....................................................................................................................................... 92

5 CONCLUSÕES .................................................................................................................. 103 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 107

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1 INTRODUÇÃO

Este estudo tem com objetivo reconhecer a atuação do Estado na

intervenção da economia brasileira e o seu poder de regulamentação na efetivação dos

processos para garantir o mercado nacional e o consumidor, visto que, faz-se necessário

estabelecer limites às condutas praticadas no mercado, com o intuito de proteger as relações

comerciais e os consumidores.

A economia brasileira é um dos segmentos mais importantes da política e do

desenvolvimento nacional, portanto, é necessária uma boa gestão financeira para a garantia da

aplicabilidade dos princípios fundamentais. Neste sentido, mister se faz, conhecer as

condicionantes para a efetivação do bem comum, sabendo-se que a sua concretização

proporciona a sustentabilidade social. Independentemente da vertente analisada, o aspecto

econômico atinge proporções estratosféricas no cenário mundial e condiciona diretamente os

países e seu desenvolvimento.

O presente trabalho busca a efetivação principiológica que garante a

harmonia entre a livre concorrência, o equilíbrio do poder econômico e a garantia dos direitos

do consumidor, por meio da intervenção e atuação do Estado no cumprimento das bases

diretivas fundamentais e assim, o respeito aos princípios da Ordem Econômica

Constitucional. Precisamente, pretende-se demonstrar como o emprego de normas jurídicas

concorrenciais refletem diretamente na atuação econômica do Estado para proteger a

sociedade, razão pela qual devem ser levados em conta os princípios e regras constitucionais

econômicas, quando da análise jurídica do Conselho Administrativo de Defesa Econômica –

CADE.

Diante disto, a Constituição Federal de 1988, positivou – em diversos títulos

e capítulos – propostas político- jurídicas para orientar e direcionar os poderes constituídos e

as instituições públicas e privadas, na efetivação dos interesses sociais, econômicos e políticos

nacionais. Para tanto, estabeleceu um rol de fundamentos principiológicos que respeitam a

evolução histórica da formação do Estado Democrático de Direito e suas diretrizes

econômicas.

Em virtude da existência de inúmeras disposições constitucionais com

conteúdo econômico, afirma-se haver, na Constituição de 1988,   uma   “Constituição  

Econômica”,   a   qual,   composta   por   normas   programáticas,   tem   uma   finalidade   precípua:   o  

desenvolvimento nacional. Para realizá-lo, o Estado intervêm como agente normativo e

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regulador das atividades econômicas, exercendo as funções de fiscalização, incentivo e

planejamento, conforme os arts. 170 a 174 da Constituição Federal de 1988.

Neste sentido, estabeleceu que, dentre algumas facetas da atuação estatal, a

soberania nacional é o comando limiar da atuação fundamental dos mecanismos políticos e

assim, toda propriedade, pública ou privada, deve atender às necessidades e à função social,

assim como o Estado, em sua atuação, deve priorizar a livre concorrência e a proteção ao

consumidor, proporcionando um ciclo de produção e consumo, fomentadores de capital e

garantidores de empregos.

Para proteger a sustentabilidade do sistema e efetivar as políticas públicas,

foram criadas normas específicas para a repressão ao abuso do poder econômico e a garantia

da economia popular, como base no Estado Democrático. Entretanto, neste diapasão,

estabelecer os limites de intervenção do Estado e a conduta na atuação controladora e

fiscalizatória estatal, são condições sine qua non na efetivação do bem estar público e na

identificação do modus operandi na defesa das relações concorrenciais.

Dentre os princípios constitucionais informadores da Ordem Econômica, o

princípio da livre concorrência é relevante no desenvolvimento desta investigação científica,

pois limita não apenas a atuação interventiva do Estado sobre o domínio econômico, como

também serve de vetor ao exercício das atividades econômicas dos particulares. O princípio

da livre concorrência exerce posição magistral, pois, consiste em um bem jurídico a ser

protegido; caracteriza-se como instrumento de garantia dos valores sociais da livre iniciativa e

do trabalho; e, serve como meio de proteção e promoção do desenvolvimento nacional.

Portanto, criou-se um sistema específico de controle e de defesa da

concorrência, que estabeleceu condutas a serem adotadas nas relações econômicas e

empresariais, assim como, as formas de controle e atuação que proporcionem a efetividade da

livre concorrência. A criação da Lei nº 8.884 de 11 de junho de 1994, foi propulsionadora da

iniciativa das condutas protetivas nas relações consumeristas e comerciais e direcionou a

economia brasileira na organização de medidas para equilibrar a atuação do Estado e da

sociedade diante do mercado, até condições de estruturação foram estabelecidas para as

determinações e revisões administrativas das decisões do Sistema Brasileiro de Defesa da

Concorrência.

Com a evolução dos tempos, fez-se necessário alterar e inovar as

disposições normativas anteriores, pertinentes ao Direito Concorrencial. Neste contorno,

criou-se a Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2.011, para efetivar tais modernizações

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indispensáveis ao atendimento das perspectivas do mercado e da sociedade, assim como os

ditames da livre concorrência, da prevenção ao abuso do poder econômico e da garantia do

equilíbrio nas relações comerciais.

Para se chegar ao objetivo proposto e demonstrar a solidez da ideia, o ponto

de partida é identificar se o modelo estatal escolhido propicia o desenvolvimento econômico à

luz da Constituição Federal de 1988, tendo em vista os princípios constitucionais da Ordem

Econômica. Em seguida, analisar a estrutura do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência

para constatar se a sua organização, estrutura e funcionamento proporcionam garantias aos

consumidores. E, ao final desvendar se as decisões do Conselho Administrativo de Defesa

Econômica, estão em sintonia com os objetivos da República Federativa do Brasil, do

desenvolvimento nacional e da Ordem Econômica.

Para o desfecho deste estudo, o trabalho de pesquisa fundar-se-á em análise

doutrinária e legislativa, sempre tomando em conta a lição de que o intérprete do direito não

apenas constrói, mas reconstrói as normas jurídicas, já que ele é quem atribui sentido aos

textos positivados. Além disso, apontar-se-á sempre que necessário, o posicionamento

brasileiro sobre o tema e eventuais análises circunstanciais.

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2 FORMAÇÃO DO ESTADO ECONÔMICO

No contexto da evolução do Estado, vários são os fatores que interagem na

dinamicidade deste processo, que não deixa de existir com o passar dos tempos e norteia-se

pelo contexto temporal do convívio social, pelas necessidades dos indivíduos e pelas

possibilidades de satisfazê-las, assim como, potencializam novas perspectivas e dentre essas

condicionantes estão, sem dúvidas, as que proporcionaram o vislumbre de uma nova ordem

econômica.

A princípio, notadamente o Estado Liberal não interferia nas questões

econômicas, tendo em vista, o cerne estatal ser político e a economia tratada livremente pelos

diversos segmentos da sociedade, estando à mercê da evolução das condições

sócio- econômicas para provê-las, portanto, mantinha-se afastado desse setor, período que

identificou-se  como  sendo  o  Estado  “da  mão  invisível”,  que  existia, mas não se manifestava.

Segundo Alberto Venâncio Filho “[...]  é  evidente  que  a  posição  que  o  Estado  assumiu  durante  

esse período caracterizou-se  sobremaneira  pela  ausência  do  domínio  econômico.”1

A participação do Estado, direta ou indiretamente, nas relações humanas

data da existência concisa do crescimento da sociedade e, portanto, podemos nos remeter a

períodos medievais e bárbaros, onde os relatos das primeiras conquistas de território

demonstram quão necessária era a regulamentação jurídica na vida privada e nos grupos

sociais, conforme menciona Manoel Jorge   e   Silva   Neto   “[...]   impôs-se a expansão dos

domínios territoriais da comunidade, [...] o período de barbárie, identificado com as primeiras

conquistas  de  território.”2 E com isso, constatou-se a necessidade de legalizar as inter-relações

sociais para garantir o bom convívio e minimizar os abusos ou distorções.

Com a evolução das relações humanas, sentiu-se a indispensabilidade

quanto à imposição coativa de regras de conduta disciplinadoras das ações

intercomplementares dos indivíduos.3

O homem não nasceu para ser e nem tampouco, viver sozinho. Portanto,

buscou agregar ao convívio social, condições de garantia e proteção às suas relações, mas

para que pudesse conviver com outros homens, foi necessário ceder parte de sua liberdade em

1 VENANCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no Domínio Econômico. Rio de Janeiro: Renovar, 1998. p.4. 2 SILVA NETO, Manoel Jorge e. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: LTr, 2001, p.17. 3 SILVA NETO, Manoel Jorge e. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: LTr, 2001, p.17.

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prol dos demais e com isso surgiram os primeiros limites à conduta humana. Necessário se

fez, flexibilizar parte da sua independência original, pois a sua interdependência tornava-se

cada vez mais estreita e fortalecida, tendo em vista que, proporcionalmente sua expectativa de

vida também se alargava e sozinho não poderia efetivar todos os seus interesses. Os seres

humanos foram se aglutinando e constituíram agrupamentos organizados formados por líderes

e liderados que, levava em consideração, a busca pelo bem comum. Assim, organizou-se o

Estado como forma de garantir essa convivência e essa liderança na busca dos objetivos

sociais.

A conduta humana passou a sujeitar-se à incidência normativa ente estatal,

que delimitava o campo de ação e atuação dos particulares e a sua própria. Tendo em vista as

necessidades formais e conjunturais, o Estado, passou a interferir em todas as relações de

contexto público e privado, pois sendo o garantidor da paz e da ordem deveria controlar as

condutas coercitivamente. Neste diapasão, a sociedade acordou com a relação de máxima

intervenção, onde o Estado passou a determinar, atuar e intervir em todos os segmentos.

Conforme Alberto Venâncio Filho4 a Revolução Industrial foi expressiva

para o crescimento da sociedade e consequentemente do Estado e principalmente, para a

institucionalização da Ordem Econômica Internacional, que diretamente afetou os países na

busca pelo desenvolvimento, haja vista, a necessidade de um enquadramento da demanda e da

oferta e nitidamente a necessidade dos países na expansão de suas fronteiras comerciais,

evidenciando-se a necessidade de uma estrutura para prover e garantir a efetividade dos

direitos advindos deste rompimento com antigos padrões.

Neste sentido, é importante observar o momento internacional de busca por

igualdade entre as nações, pois os Estados precisaram definir padrões de atuação e condições

de mercado para garantir seu crescimento e a cooperação internacional, demonstrar uma

relação de dependência mútua entre as Nações na conquista de novas oportunidades e ainda,

manter o reconhecimento de sua soberania.

4 VENANCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no Domínio Econômico. Rio de Janeiro: Renovar,

1998, p. 5.

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Para isso, Roberto Luiz Silva enfatiza alguns critérios que conduziram o

Direito Internacional a influenciar alterações normativas internas que permitiram diretamente

a evolução do Direito Econômico pátrio, como:

� O direito de todo Estado de eleger seu sistema econômico, político, social

e cultural, de acordo com a vontade popular, [...];

� Soberania permanente de todo Estado sobre sua riqueza, recursos

naturais e atividades econômicas [...];

� Proibição do enriquecimento ilícito em caso de nacionalização,

expropriação ou transferência da propriedade de bens estrangeiros;

� Promoção da cooperação internacional em matéria de ciência e

tecnologia [...];

� Adoção de medidas comerciais mais benéficas para os países em

desenvolvimento [...];

� Elaboração gradual de um novo sistema de relações econômicas baseado

no princípio da interdependência entre Estados [...];5

Neste compasso, é importante constatar que este movimento do novo Estado

ainda se encontrava às margens do ideal na garantia das condições de desenvolvimento e para

tanto, foi necessário, conforme Silva Neto6,   uma   transformação   do   “capitalismo   atomista”,  

considerado   como   uma   estrutura   unitária   e   menor   dimensionada,   em   um   “capitalismo   de  

grupo”,  que  representava uma organização de segmentos e setores empresariais privados mais

fortalecidos e determinados na conquista do mercado consumidor, assim como, dos anseios

desenvolvimentistas junto às esferas governamentais.

A partir deste cenário, o Estado tornou-se mais atuante, pois, deveria e

poderia harmonizar seus interesses aos dos grupos de empresários na busca pelo

desenvolvimento, e fez-se necessário, portanto, instrumentalizar estas negociações, estes

direitos e deveres, por meio de Leis que proporcionariam garantias econômicas nacionais. O

Direito Econômico veio dar embasamento legal às possibilidades de se estabelecer uma

limitação da autonomia negocial, que determinaria os propósitos e as vertentes de atuação dos

negócios jurídicos dos cidadãos, com identificação das transgressões à política econômica

nacional, com alicerces governamentais da atuação do particular frente às possibilidades do

5 SILVA, Roberto Luiz. Direito Internacional Público. 4. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2010, p. 2. 6 SILVA NETO, Manoel Jorge E. Direito Constitucional Econômico. São Paulo: LTr, 2001.

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Estado e um afastamento da força obrigatória exclusiva dos contratos, e o Estado poderia

interferir nos pactos contratuais (pacta sunt servanda), caso houvesse constatação de abusos.

Observe-se a seguinte situação: o Estado passou a existir com a

multiplicação dos grupos sociais, que por sua vez, necessitavam de lideranças na busca da

satisfação das necessidades básicas, individuais e coletivas e, portanto para que se chegasse ao

bem comum era indispensável que houvesse uma ordem, um planejamento e uma estrutura

sócio-política e econômica, tendo em vista que essa satisfação teria custos. Os grupos se

organizaram e escolheram seus líderes manifestos que tinham como escopo representar o

povo e proporcionar condições para que houvesse proteção e garantia do convívio social.

Sendo assim, com a instituição dos poderes, o Estado passou a determinar as

condições para o desenvolvimento. Entretanto a sociedade, não satisfeita com os caminhos

trilhados pelos entes, manifestou-se contraditoriamente e consagrou uma democracia liberal

com a valorização dos direitos sociais e econômicos, o fortalecimento da propriedade privada

e da atuação do empresariado nas políticas governamentais. De acordo com Alexandre de

Moraes:

A Revolução Francesa e o prevalecimento das ideias liberais trouxeram o afastamento da intervenção do Estado na Economia, com a consagração das ideias de Adam Smith (1776), em especial: o dever de proteger a sociedade da violência e invasão; dever de proteger cada membro da sociedade da injustiça e da opressão de qualquer outro membro e o dever de praticar e manter determinadas políticas públicas quando necessárias, porém a ninguém interessasse individualmente.7

Houve necessidade de constitucionalizar o Estado Social de Direito, para

transformar os direitos sociais em direito positivo e assim evitar uma desordem social devido

às condições de crescimento que se implantavam na sociedade e o desrespeito às condutas

éticas negociais que, tornaram-se controversas e incoerentes às condutas da sociedade, e que

sofriam, à época pressões políticas sócio- democráticas para proporcionar a ampliação da

participação do Estado, como agente na ordem econômica.

É correto afirmar, que diante destas idas e vindas da participação estatal no

contexto econômico, atualmente o Estado define explicitamente da sua atuação na Ordem

Econômica nacional. A Constituição Federal de 1988 determinou um capítulo especialmente

identificado para concatenar os ideais e as condições de atuação, assim como os princípios

norteadores desta atividade. Para isso, Manoel Gonçalves Ferreira Filho utilizou a seguinte

7 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 808.

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definição   sobre   o   Direito   Econômico   brasileiro,   “compreende, pois, as normas jurídicas

básicas que regulam a economia, disciplinando-a, e especialmente controlam o poder

econômico, limitando-o, com o fito de prevenir-lhe  os  abusos.”8

Além disso, não há que se falar em ordem econômica sem planejamento,

sem as devidas políticas públicas, sem a determinação do campo de atuação normativa e sem

identificação dos elementos fundamentais de delimitação da participação pública e privada no

capital, na iniciativa, nas responsabilidades, como elementos garantidores da economia

descentralizada.

2.1 O HISTÓRICO ECONÔMICO BRASILEIRO

É de fundamental importância conhecer o histórico do cenário brasileiro

econômico para se entender as disposições em que se encontram, atualmente, as ferramentas

constitucionais que permitem a atuação do Estado na atividade econômica nacional, mesmo

porque, a princípio a organização política era exclusiva nas propostas constitucionais e restrita

a algumas necessidades sociais, e as primeiras constituições convergiam especificamente para

os aspectos organizacionais políticos, como a Declaração dos Direitos do Homem e do

Cidadão de 1789; flexibilidade normativa não constitucional, com alguns direitos e garantias

individuais como a liberdade, a segurança individual e a propriedade (mesmo que

precariamente).

A monarquia imperialista de Dom Pedro I, em 1824, determinava as

condições de existência estatal e regulava as ações sociais por meio do Poder Moderador, que

à época restringia a atuação particular na atividade financeira do Estado, pois cultivava o

Estado Máximo como fonte de poder e respaldo para os atos do governo. Sem perspectivas

constitucionais econômicas, a monarquia colhia os frutos de sua dominação exclusiva sobre

os interesses da sociedade e deles se prevalecia. Assim, José Afonso da Silva vaticina:

O Poder Moderador, considerado a chave de toda a organização política, era exercido privativamente pelo Imperador, como chefe supremo da nação e seu primeiro representante, para que incessantemente velasse sobre a manutenção da independência, equilíbrio e harmonia dos demais poderes políticos.9

8 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2006,

p. 350. 9 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 7. ed. São Paulo: RT, 1991, p. 67.

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Com o rompimento do Estado Monárquico os poderes acabaram por se

estruturar na divisão de Montesquieu, em três vertentes, as quais definiriam estratégias para o

fundamentalismo governamental. O legislativo adquiriu força e se estruturou no controle de

constitucionalidade para enfatizar a determinação de seus interesses e do Estado que surgia. O

judiciário criou a Corte Suprema, que fortaleceria a autonomia estatal e o executivo regeria

apenas as condições de convívio social e as probabilidades estruturais e desenvolvimentistas

do governo.

Neste ensejo econômico evolutivo relevante, a Constituição de 1934 nasceu,

com a doravante missão, democrática e expansionista, nunca vista antes, trouxe novos

fundamentos, novas concepções de Estado e com um constitucionalismo social próprio da

abertura política, social e econômica que se preparara para efetivar. A matéria constitucional

foi amplamente abordada e alguns assuntos, outrora preteridos, agora se tornavam efetivos

para a sociedade, como a Ordem Econômica e Social, a família, a educação e a cultura, assim

como as Leis Trabalhistas, a segurança nacional e o funcionalismo público. Conforme

Ferreira Filho:

[...] as Constituições modernas passaram a conter também um complexo de regras auto-aplicáveis e princípios programáticos destinados a dar raízes, nos planos econômico e social, à democracia política.10

Após a Segunda Guerra Mundial tivemos abertura mundial de mercado e o

Brasil galgou amplos espaços para o seu desenvolvimento. Em 1970, vivíamos uma fase de

prosperidade   econômica,   o   chamado   “milagre   brasileiro”,   que   permitiu   a   entrada   de   capital  

estrangeiro na economia nacional e fortaleceu as condições de atuação no mercado externo e

interno, além ampliar as condições para melhorar a competitividade11. Entretanto, para isso

foram necessárias algumas medidas de proteção ao produto nacional e o Estado manifestou-se

como interventor para diagnosticar condutas comerciais e econômicas abusivas ou lesivas à

sociedade.

10 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 32. ed. São Paulo: Saraiva,

2006, p. 357.

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19

Depois disso, o Brasil passou por algumas crises políticas, sociais

econômicas como a crise do petróleo, até finalmente iniciarmos um novo momento com o

nascimento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1.98812. Donde surgiram

novas perspectivas para a sociedade brasileira e o Estado assumiu o papel de provedor do

interesse geral e atendendo à diretiva normativa, passou a atuar como sujeito ativo na ordem

econômica.

O modelo econômico liberal adotado tem como finalidade básica a

preservação do mercado, pois, a doutrina de seu mais célebre representante, Adam Smith

defende que a plena liberdade de comércio, com a livre regulação da economia se dá por meio

da atuação invisível do Estado, atuando á distância das relações econômicas.

De acordo com o sistema de liberdade natural, o Estado soberano tem somente três deveres a cumprir de grande importância, inteligíveis ao senso comum: primeiro, o dever de proteger a sociedade da violência e da invasão por outras sociedades independentes; segundo, o dever de proteger, na [...] medida do possível, cada membro da sociedade da injustiça e da opressão de qualquer outro membro, ou o dever de estabelecer uma adequada administração da justiça; em terceiro lugar, o dever de erigir e manter certas obras públicas e certas instituições públicas que nunca serão do interesse de qualquer individuo ou de um pequeno número de indivíduos13.

Apoiado nesse posicionamento, o papel designado ao Estado é o de garantir

o direito de propriedade, a autonomia da vontade e as condições para que se operasse um

mercado de concorrência perfeita, que visa estabelecer uma tendência de equilíbrio no

mercado, produzindo a livre atuação de cada indivíduo. Ao Poder Público caberia

simplesmente a garantia dos pilares fundamentais do sistema e a solução, por meio da função

jurisdicional, dos conflitos eventualmente existentes. Entretanto, observou-se que esse modelo

nunca se efetivou porque a sociedade não sobreviveria sem um mínimo de intervenção estatal.

12 Idem. Op cit., p. 31. 13 SMITH, Adam. apud VENANCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no Domínio Econômico. In:.

O Direito Público Econômico no Brasil. Rio de Janeiro: Renovar, 1998, p. 4-5.

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20

2.2 A PARTICIPAÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO

O Estado descentralizado e democrático tem como proposta ampliar a

atuação do particular na economia, permitindo que as suas ações sejam independentes, apenas

reguladas normativamente, inclusive porque, não faria sentido imprimir ao Estado a

possibilidade de determinar as opções da atividade econômica, que tem como fonte a vontade

privada e é garantida pela livre iniciativa, pois equivaleria a retirar da esfera particular, o

domínio de aplicação das liberdades individuais em favor do Estado, como diz Ferreira Filho:

“[...]   ‘o   Estado   exerce   somente   uma   intervenção   indireta   e   global.   Respeita   a  liberdade de decisão dos que demandam e dos que ofertam e a liberdade de formação dos preços. Certamente, o Estado pode influenciar estas liberdades por uma política financeira, monetária ou social, mas a liberdade de disposição dos agentes econômicos, em última análise, não é eliminada. A economia é somente orientada’.   Esta   intervenção   estatal   é   global,   ou   seja,   ‘não   desce   a   pormenores   do  mecanismo econômico. Atua sobre   ‘as   grandes   linhas’   da   atividade   econômica  (condições  da  repartição,  nível  da  demanda  global,  regras  de  concorrência)”.14

O objetivo da atividade econômica e o seu interesse é o lucro, considerado

completamente diferente dos interesses do Estado e dos poderes constituídos, pois os atos

administrativos têm fulcro organizacional, estratégico e de planejamento, que não pactuam

com os interesses comerciais ou empresariais da atividade particular, qual seja, a busca pela

conquista e ampliação de mercado. Mesmo que se avalie a persecução à satisfação das

necessidades da sociedade, ainda assim, não se admite a participação lucrativa do Estado na

economia estatal. Para Ivo Dantas:

[...]  a  ‘omissão’  era  a  palavra  de  ordem  aceita  e  predominante  na  ideologia  político-econômica de então. Função do Estado, em outros termos, era resguardar a liberdade dos indivíduos – frente à qual o Estado aparecia como violentador -, expressa nas Declarações de Direitos e Garantias, [...].15

Diante disso, ficou adstrita sua participação como agente interventor nas

condições de regulamentador das atividades econômicas desenvolvidas, podendo o

intervencionismo suceder, seguindo uma ordem jurídica que preconiza as condições e

permissões da interferência do aparato oficial. A função do Estado identificou-se como a de

garantidor do bem estar social, assegurador da liberdade dos indivíduos e guardião da ordem

14 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. 32. ed. São Paulo: Saraiva,

2006, p. 352. 15 DANTAS, Ivo. Direito Constitucional Econômico. Curitiba: Juruá, 2003, p. 33.

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constitucional e da atividade econômica do particular frente às intromissões abusivas do poder

público.

2.2.1 Intervenção e Desenvolvimento

A intervenção estatal só se opera dentro do sistema capitalista como forma

de autoproteção, tendo em vista as alterações do regime econômico, desta forma, efetivou-se

no ordenamento a delimitação dos valores juridicamente protegidos pelo capitalismo que são:

a propriedade privada, a liberdade de iniciativa econômica e a livre concorrência. A

intervenção é conceituada por Eros Roberto Grau, como:

“Ação que o Estado empreende no e sobre um campo reservado à liberdade de iniciativa do setor privado – enfatizando que tal reserva não é peculiar do regime liberal,  mas  da  essência  do  sistema  capitalista.”16.

O desenvolvimento é, para Lourival Vilanova, um processo de mudança

social integrado por uma série de fatores, mas cuja ênfase recai, em dias de hoje, sobre o

econômico.17 Entretanto, deve-se lembrar que, desenvolvimento econômico envolve muito

mais do que o mero crescimento lucrativo ou progresso econômico, nem tampouco

acumulação de riquezas, mas determinação no envolvimento empreendedor, harmonicamente,

com propósitos identificados, definidos e assemelhados para a conquista equilibrada de

determinado objetivo, com distribuição equitativa de rendas e de responsabilidades.

Deste modo, ciente disto o legislador constitucional de 1988 preocupou-se

em afirmar e confirmar legislativamente o ideário de garantia do desenvolvimento com a

previsão e interação do Estado, de forma a proporcionar planejamento constitucional e

incentivo do Poder Público no estabelecimento de condições para efetivação da ordem

jurídica e o caminho que deve ser seguido pelos governantes ao traçar suas políticas sociais e

econômicas.

16 GRAU, Eros Roberto. Elementos de Direito Econômico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981, p. 63. 17 VILANOVA, Lourival. Proteção Jurisdictional dos Direitos numa sociedade em desenvolvimento.

In: Escritos Jurídicos e Filosóficos, v. 2. São Paulo: Axix Mundi, 2003, p. 487.

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Assim reconhecidos:

Os poderes públicos devem buscar os meios e instrumentos para promover condições de igualdade real e efetiva e não somente contentar-se com a igualdade formal, em respeito a um dos objetivos fundamentais da República: construção de uma sociedade justa. Para adoção desse preceito, deve existir uma política legislativa e administrativa que não pode contentar-se com a pura igualdade legal, adotando normas especiais tendentes a corrigir os efeitos díspares ocasionado pelo tratamento igual aos desiguais, buscando a concretização da igualdade social.18

A atuação interventiva do Estado tem como objetivo a garantia da

adequação da norma limitadora dos abusos econômicos às necessidades desenvolvimentistas

nacionais, tanto no setor público como no setor privado. Embora estabeleça condicionantes na

Ordem Econômica estabelecido no texto constitucional, para que as metas político jurídicas

possam prosperar. Sendo assim Hely Lopes Meirelles, em seu Curso de Direito

Administrativo, escreve:

Para o uso e gozo dos bens e riquezas particulares o Poder Público impõe normas e limites e, quando o interesse público exige, intervém na propriedade privada e na ordem econômica, através de atos de império tendentes a satisfazer as necessidades coletivas e a reprimir a conduta antissocial da iniciativa particular. [...] Na ordem econômica o Estado atua para coibir os excessos da iniciativa privada e evitar que desatenda às suas finalidades, ou para realizar o desenvolvimento nacional e a justiça social, fazendo-o através da repressão ao abuso econômico, do controle dos mercados e do tabelamento de preços.19

A Constituição Federal de 1988 restringiu a abrangência da intervenção do

Estado na economia ao delimitar, em seu art. 170, os contornos da ordem econômica e

financeira, elencando a livre iniciativa como um dos fundamentos e princípios que, pelo

próprio teor do seu significado, confere ao homem a liberdade de fazer suas escolhas e de

exercer a atividade econômica da forma que mais lhe convier. Com isso, limitou a intervenção

do estado ao conceder à iniciativa privada liberdade para exercer qualquer atividade

econômica.

A presença do Estado no domínio econômico fica delimitada e condicionada

aos parâmetros legais que nortearão a sua atuação no domínio econômico. Além disso, o

próprio art. direciona a intervenção estatal a um valor maior, à justiça social, viabilizando

18 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e Legislação Constitucional. 2. ed.

São Paulo: Atlas, 2003, p. 146. 19 DANTAS, IVO. Direito Constitucional Econõmico: Globalização e Constitucionalismo. 1ª ed., 3ª tir.

Curitiba: Juruá, 2003, p. 82 – 83.

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interesses sociais na concretização de seus objetivos, tanto em sua atuação direta quanto na

indireta (fiscalização, incentivo e planejamento).

A Constituição Federal prevê duas formas de intervenção do Estado no

domínio econômico: uma forma, onde ele atua diretamente, embora condicionado aos

pressupostos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, e nos casos de monopólio

estatal devidamente elencado na Lei Maior.

A outra forma de intervenção é quando o Estado atua sobre o domínio

econômico como agente normativo e regulador da atividade econômica, disciplinando,

direcionando e estimulando a iniciativa privada a praticar determinado comportamento a fim

de preservar a livre concorrência, o equilíbrio de mercado, os interesses sociais e econômicos,

e o faz por meio de fiscalização, incentivos ou fomentos.

Muito embora existam várias classificações doutrinárias sobre as formas de

intervenção estatal na atividade econômica, Eros Roberto Grau permite, com mais

abrangência, uma compreensão sobre o assunto ao dividir a intervenção em absorção,

participação, direção e indução. Na primeira, o Estado intervém no domínio econômico, nas

demais sobre o domínio econômico, diante disso:

Quando o faz por absorção, o estado assume o controle de parcela dos meios de produção e/ou troca em determinado setor da atividade econômica em sentido estrito; atua em regime de monopólio; quando o faz por participação, o Estado assume controle de parcela dos meios de produção e/ou troca em determinado setor da atividade econômica em sentido estrito; atua em regime de competição com empresa privadas que permanecem a exercitar suas atividades nesse mesmo setor. Quando o faz por direção, o Estado exerce pressão sobre a economia, estabelecendo mecanismos e normas de comportamento compulsório para os sujeitos da atividade econômica em sentido estrito. (setor privado); quando o faz por indução, o Estado manipula os instrumentos de intervenção em consonância e na conformidade das leis que regem o funcionamento dos mercados [...] trata-se de normas dispositivas.20

Sendo assim, o papel do Estado na economia deve pautar-se pelos princípios

e fundamentos da ordem econômica, tendo em vista que o legislador constituinte optou pela

iniciativa privada e pretendeu diminuir a presença daquele na economia, priorizando a livre

empresa, razão pela qual a intervenção foi limitada e restringida pelo texto constitucional.

Contudo, é nítida a limitação do Estado no domínio econômico privado;

porém, quando este intervir no mercado, deverá ter como objetivo transformar a iniciativa

privada, direcionando-a a uma nova conduta, por meio dos incentivos, da fiscalização e da

20 GRAU, Eros Roberto. A ordem Econômica na Constituição de 1988: Interpretação e crítica. 14. ed. rev. e

atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 147.

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livre concorrência, propondo às empresas uma atuação voltada ao cumprimento da função

social e preocupada com a sua responsabilidade social, como a preservação do meio ambiente,

a governança organizacional, direitos humanos, práticas do trabalho, práticas leais (justas) de

operação, questões do consumidor, envolvimento e desenvolvimento da comunidade.

Através dos mecanismos jurídicos intervencionistas, o Estado se insere no domínio econômico privado buscando produzir resultados macro ou microeconômicos diversos daqueles que adviriam caso a intervenção não houvesse. A intervenção é sempre inovadora, no sentido de que deve procurar a alteração dos parâmetros comportamentais originários ao mercado no qual se intervém (caso contrário, seria supérflua ou incidiria em desvio de função). Esta inovação dá-se tanto na forma promocional como segundo um perfil repressivo. Ademais, o conceito se vincula a uma funcionalização da intervenção estatal na economia, no sentido de que deve ter por fundamento um fim estranho àqueles próprios dos particulares participantes do mercado. (grifo autor)

A partir dos fundamentos expostos, o agente estatal, ao intervir no setor

privado, busca construir um novo cenário empresarial e social, ao ampliar a competitividade

entre as empresas, ao estimular determinados comportamentos responsáveis e éticos, ao lançar

no mercado nova empresa para fomentar a concorrência e com isso, consequentemente,

contribuir para a modernização e desenvolvimento empresarial econômico do país.

A intervenção do Estado na iniciativa privada atinge efetividade, a partir do

momento em que, ao interagir na ordem econômica, proporcione ao setor privado

instrumentos para atraí-lo á mudanças e não apenas a sua utilização em benefício próprio, mas

de toda a coletividade.

Certo é que a empresa desempenha um papel fundamento junto á sociedade,

principalmente na definição de novos valores na produção de riquezas com os bens e serviços

e na lucratividade gerada pelas políticas expansionistas desenvolvidas que geram alterações

dentro da realidade social, econômica e cultural, que vão muito além de cumprir as normas

constitucionais e legais disciplinadas.

Entretanto, muitas empresas não aderiram a estas transformações sociais, e

nem tampouco cumprem com muitos dos dispositivos legais, como é o caso do art. 170 da

Constituição Federal, razão pela qual, o Estado deve intervir no mercado, por meio de

políticas públicas de enfrentamento ao desestímulo empresarial, a fim de combater e

promover o cumprimento dos propósitos constitucionais da ordem econômica

desenvolvimentista e ultrapassar as barreiras existentes na efetivação das Leis. Sabendo-se

que a quebra de paradigmas advém dos processos de mudanças endógenas da vida econômica

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e que alteram o estado de equilíbrio da sociedade para evitar o colapso da economia

capitalista e promover o desenvolvimento.

[...] o estudo do desenvolvimento tende a concentrar-se na caracterização das estruturas, na identificação dos agentes significativos e nas interações entre determinadas categorias de decisões e as estruturas. Estas condicionam o processo de irradiação e a eficácia no espaço e no tempo de decisões, [...] ao mesmo tempo são por elas modificadas.21

Sendo assim, para garantir o desenvolvimento é fundamental identificar as

condições em que se encontra a sociedade, estabelecer as prioridades e o modus operandi do

mercado para concretizar as transformações sociais por meio de políticas públicas,

financiamentos públicos e vantagens fiscais, sendo assim o Estado poderá corrigir eventuais

distorções do mercado e proporcionar efetividade às condutas interpostas na legislação.

[...] o cenário mundial aponta para um crescimento da participação nacional no comércio de mercadorias e serviços, com a globalização de mercados, gerando a necessidade de instituição de políticas [...] que permitam conciliar desenvolvimento econômico com a melhoria das condições básicas para a sociedade. É evidente a dificuldade prática em compatibilizar estes dois objetivos do Estado Democrático, porque os interesses econômicos, na maioria das vezes, caminham frente a uma maior desigualdade social e em algumas situações, registra-se a falta de políticas públicas adequadas, para atender aos ditames constitucionais.22

A ordem brasileira baseia-se pela livre iniciativa, porém a intervenção

estatal faz-se necessária por trazer segurança e estabilidade às relações jurídicas, de modo

que, se o Estado apresentar- se totalmente avesso ás relações econômicas, aconteceriam

abusos pela condição natural do ser humano, abusos esses como a dominação do mercado por

grupos ditadores de regras, formação de monopólios e/ou oligopólios, que, além de gerarem

prejuízos à livre iniciativa, á sociedade e aos seus interesses, acabaria por frear e retroceder o

desenvolvimento econômico nacional ao invés de alavancá-lo.

21 FURTADO, Celso. Teoria e Política do Desenvolvimento Econômico. 4. ed. São Paulo: Nacional, 1971,

p. 104. 22 RIBEIRO, Maria de Fátima. Reflexos da Tributação no desequilíbrio da Livre Concorrência. In:

GRUPENMACHER, Betina Treiger Denise Lucena Cavalcante; RIBEIRO, Maria de Fátima; QUEIROZ, Mary Elbe. Novos Horizontes da Tributação: um diálogo Luso- Brasileiro, Edições Almedina.Cadernos IDEFF Internacional, nº 2, Coimbra, 2012, p. 217-218.

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2.3 FUNDAMENTOS PRINCIPIOLÓGICOS DA ORDEM ECONÔMICA

Os princípios constitucionais econômicos podem ser considerados a base e

estrutura da atividade empresarial, direcionando-a de modo que todo exercício deve ser

empregado de acordo com as diretrizes básicas por eles traçadas. Diante desta afirmativa,

escolhemos alguns princípios que apresentam maior cognição com o tema estudado, com o

objetivo de estabelecer relação direta e eficiente com o propósito almejado. Desta forma,

serão tratados os princípios que apresentam maior relação com desenvolvimento econômico e

social e o equilíbrio concorrencial.

A ordem econômica e financeira traça diretrizes básicas da economia, do

direito e do social, sendo assim, encontramos fundamentos no artigo 170 e incisos I, II, III,

IV, V, parágrafo único e art. 173, parágrafo 1º, I, parágrafo 4º e 5º e 174, da Constituição

Federal de 1988, consequentemente, soberania nacional, propriedade privada e função social

da propriedade, livre concorrência, defesa do consumidor, livre exercício de atividade

econômica, exploração de atividade econômica, repressão ao abuso do poder econômico e

garantia da economia popular, norteiam o desenvolvimento empresarial e garantem

nivelamento isonômico nas relações que envolvam diversos setores na sociedade.

Os princípios mencionados serão analisados sob a ótica constitucionalista do

direito para possibilitar desvelar, no campo econômico e de mercado, as novas atuações da

empresa economicamente responsável diante do desenvolvimento e da concorrência. Sendo

assim, a República Federativa do Brasil, estabelecida como um Estado Democrático de

Direito, elegeu em seu texto constitucional, os princípios fundamentais, que na visão de

Marcelo Caetano comentada, sob a ótica de Alexandre de Moraes, estabelecem a estrutura

principal dos fundamentos como fomento à humanização e ao direcionamento do

empresariado, coordenando a economia com a transparência, a ética, o equilíbrio e a justiça

social nas transações, para proporcionar uma organização com responsabilidade e adequação

social na certeza do desenvolvimento sustentável.

Assim, estabelecendo-se a amplitude da eficácia conceitual principiológica,

encontramos não apenas ideias, mas reconhecimento de um sistema econômico que, baseia-se

em valores contemporâneos sociais e prioridades fundamentais que efetivam parâmetros no

exercício das diretrizes do empreendedorismo. Neste sentindo, esses fundamentos são

imperativos para a segurança jurídica, pois, na medida em que um complementa o outro,

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proporcionam meios para que a atividade econômica seja desempenhada com o objetivo de

reduzir as desigualdades sociais, cumprir a função social e alcançar o resultado do

investimento com qualidade e eficiência.

2.3.1 Soberania Nacional

O legislador constituinte observou as mudanças ocorridas no mundo, logo

após a Segunda Guerra Mundial, no âmbito econômico, assim, colocou o princípio da

soberania nacional dentro do capítulo da ordem econômica e financeira com o fim de

resguardar a iniciativa privada, ou seja, resguardar a empresa, pessoa jurídica de direito

econômico, da dependência e determinismo de outros Estados.

A Constituição trouxe mecanismos jurídicos fundamentais para a iniciativa

privada em parceria com o Estado, nos casos que a Lei permitir, desenvolver e modernizar a

economia do país para dominar técnicas produtivas de alta qualificação, assim as empresas

brasileiras podem deixar de depender de produtos e tecnologias dos Estados mais

desenvolvidos.

Segundo Marcelo Caetano e Alexandre de Moraes a soberania consiste em:

Um poder político supremo e independente, entendendo-se por poder supremo aquele que não está limitado por nenhum outro na ordem interna e por poder independente aquele que, na sociedade internacional, não tem de acatar regras que não sejam voluntariamente aceites e esta em pé de igualdade com os poderes supremos de outros povos.23

É a capacidade de editar suas próprias normas, sua própria ordem jurídica (a começar pela Lei Magna), de tal modo que qualquer regra heterônoma só possa valer nos casos e nos termos admitidos pela própria Constituição. 24

Esta independência de ordem externa não significa um afastamento

econômico desmedido, nem tampouco reserva de mercado, mas a capacidade nacional de

produzir suas novas tecnologias, em todos os setores automobilístico, aeronáutico, de

informática, médico, robótico, dentre outros, com recursos próprios e ciência própria,

desvinculando-se da importação de informações e conhecimentos advindos de outras

realidades, atuando com responsabilidade social e harmonicamente na coexistência de

23 CAETANO, Marcelo. Direito constitucional. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense,1987, p. 169. 24 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 16.

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interesses afins, entretanto unificados e correlacionados pelos mesmos objetivos e, desta

forma, possibilitando a diminuição da dependência outrora existente devido aos esforções

múltiplos internos.

Assim, as empresas brasileiras focadas e direcionadas na observação dos

seus fundamentos principiológicos econômicos, aprimoram e investem em tecnologia

nacional para conseguir fortalecimento funcional na competitividade do mercado global. Para

tanto, o Estado brasileiro organiza, constantemente, sua política interna de incentivos e

investimentos à produção industrial e ao consumo da sociedade. As políticas públicas são

operacionalizadoras em hipóteses e podem concretizar-se à medida que haja um planejamento

governamental e garantia de eficiência das medidas adotadas no desenvolvimento do mercado

interno.

Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins25 comentam a Constituição

Federal, analisando que, ao conceder mecanismos para modernizar a economia do país, não

pretendeu o constituinte, um nacionalismo absoluto, fechado e autossuficiente, ciente é das

necessidades de um bom relacionamento internacional e do apoio externo para desempenhar e

expandir suas atividades econômicas, que mantendo-se positivas e autônomas, garantem a

autodeterminação na condução da política econômica brasileira e mantém a soberania

nacional preservada, apesar de flexibilizada.

Neste sentido, Manoel Jorge e Silva Neto preconiza que:

A globalização da economia é vista como um fenômeno cujas notas mais características são a novidade e a irreversibilidade. Quanto ao primeiro dado a respeito da economia mundial, parece-nos bastante falaciosa a ideia segundo a qual a globalização é tendência recente no altiplano das relações econômicas internacionais. A irreversibilidade, de contraparte, se fará notar ou não, tudo a depender dos fatos econômicos que não podem ser visualizados de um ponto de vista arquimédico, matemático, razão por que é igualmente inverídica a afirmação a respeito de se tratar de fenômeno irreversível.26

Sendo assim, a efetividade do exercício da soberania depende das relações

econômicas, políticas e sociais da contemporaneidade mundial e concentra-se no livre

exercício estatal de sua fonte mais legítima de poder e que proporciona a formação das

relações multinacionais, a formação de blocos econômicos, de tratados internacionais,

viabiliza a liberação e intensificação do comércio, condiciona a expansão e escoamento da

25 BASTOS, Celso Ribeiro; MARTINS, Ives Gandra. Comentários à Constituição do Brasil. v. 7 2.ed. atual.

São Paulo: Saraiva, 2000, p. 22. 26 SILVA NETO, Manoel Jorge e. Direito constitucional econômico. São Paulo: LTr, 2001, p. 90.

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produção a outros Estados, contribuindo com a transnacionalização dos mercados, das

empresas e da economia e estes fenômenos não podem comprometer a autodeterminação da

nação, quando grandes organizações instalarem-se no mercado brasileiro.

[...] a soberania é como um curso de água que escorre obedecendo à Lei da gravidade e, d tempos em tempos, se alarga no remanso de um lago para, em seguida e inesperadamente, retomar a carreira e, mais abaixo, em leito mais amplo e mais profundo, fazer nova parada aparentemente tranquila, mais longa talvez, mas sempre provisória.27

As multinacionais ganharam contornos inimagináveis que ultrapassam as

fronteiras e os interesses nacionais, estão organizadas, apresentam planejamento interno

esquematizado, bem como plano tecnológico, político e econômico, ditam as regras e em

muitos casos transgridem as Leis dos Estados onde se instituem. Daí, a força do princípio da

soberania nacional evitar que seja subtraída do Estado a capacidade de decidir questões

essenciais sobre o sistema econômico, jurídico, social e trabalhista que entender mais

apropriadas ao desenvolvimento de determinada atividade, sem ter que submeter-se á política

interna dessas empresas.

[...] o modo como a globalização foi administrada tirou grande parte da soberania doas países em desenvolvimento e de sua capacidade de tomar decisões em áreas essenciais, que afetam o bem-estar de seus cidadãos. Nesse sentido, ela prejudicou a democracia.28

O processo de globalização gerou algumas situações inevitáveis de natureza

econômica e social e que referendam a participação privada, cada vez mais atuante, diante do

direito estatal, seja na efetivação das políticas públicas ou nos programas de ação que se

instalam na regulação das condições sociais de desenvolvimento e que independem

efetivamente de ações jurídicas e assim, faz-se necessário o estabelecimento de arranjos inter

ou supranacionais, porque, com a globalização surgiu a possiblidade de operacionalização das

transações globais.

27 REALE, Miguel. Teoria do direito e do Estado. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2000, p.137. 28 CAPARROZ, Roberto. Comércio internacional esquematizado. Coord. Pedro Lenza. São Paulo: Saraiva,

2012, p. 46.

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2.3.2 Propriedade privada e função social da propriedade

Existem várias modalidades de propriedade, porém levaremos em

consideração a propriedade empresarial contemporânea, cujos contornos e valores afastam os

interesses individuais e cedem espaço às preocupações com o bem- estar social, entretanto

não a coloca como única e exclusivamente, a serviço do Estado ou da comunidade.

É importante frisar que é na propriedade empresarial que necessariamente se

desenvolve a atividade empresarial, que tem obrigações e encargos a cumprir; não pode lesar

a concorrência, os consumidores, o meio ambiente e deve observar a função social, pois assim

garante a sustentabilidade do empreendimento, da cadeia produtiva e é o meio para incorporar

a responsabilidade social na garantia do desenvolvimento de seus negócios.

O direito de propriedade evidencia a atuação interventiva do Estado que

estabelece limites e condições para o uso, gozo e fruição deste valor, qual seja, o

cumprimento da função social. Considere-se, portanto, a liberdade individual garantida

constitucionalmente e o princípio de uma ordem de propriedade socialmente justa para

garantir equilíbrio e excelência na efetividade deste direito viabilizando assim, melhores

condições de desenvolvimento e utilidade privada, devido ao bom aproveitamento da

propriedade empresarial e sua sustentabilidade.

Portanto, diante desta limitação e da busca por melhor aproveitamento

social da propriedade, é possível constatar que:

[...] não raras vezes, a redefinição de conteúdo ou a imposição de limitação importa quase na supressão de determinada faculdade inerente ao direito de propriedade [...] podem reduzir de forma significativa alguns poderes ou faculdades reconhecidas originariamente ao proprietário, conferindo mesmo nova conformação do instituto [...].29

Inserido este princípio na ordem econômica, ele deixou de ser entendido

apenas como direito individual e, nem tampouco absoluto pelos legisladores e proprietários, e

tornou-se fomento da dignidade humana, conforme os ditames da justiça social, fins

observados nos direitos fundamentais e em textos constitucionais anteriores.

Os conservadores da constituinte, contudo, insistiram para que a propriedade privada figurasse como um dos princípios da ordem econômica, sem perceber que, com isso, estavam relativizando o conceito de propriedade, porque submetendo-o aos ditames

29 MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO, Inocêncio Mártires. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de

direito constitucional. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 535.

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31

da justiça social, de sorte que se pode dizer que ela só é legítima enquanto cumpra uma função dirigida à justiça social.30

Daí porque os regramentos contemporâneos consideram que a empresa se

insere na proteção garantida à propriedade privada, e, por isso deve realizar a correspondente

função social da propriedade. Assim, a propriedade não deixa de pertencer ao seu titular, mas

este deve cumprir a função social dessa propriedade. Estas condicionantes da propriedade

privada evidenciam que a ordem econômica é fundada em concepções da economia de

mercado, com ênfase na iniciativa privada, mas com o conceito voltado à efetivação da justiça

social.

Assim sendo, a função social da propriedade acaba por voltar-se ao

desenvolvimento social, porque está diretamente relacionada aos valores do trabalho e dos

demais certames sociais, e por consequência envolve a atividade empresarial, sujeita de

direitos, viabilizadora e responsável pela contratação do trabalho humano para a produção de

bens e serviços, com o fim de gerar riquezas e desenvolvimento, tanto quanto de valores

sociais impostos pela Ordem Econômica.

O art. 170, III ao ter a função social da propriedade como um dos princípios da ordem econômica, reforça essa tese, mas a principal importância disso está na sua compreensão como um dos instrumentos destinados á realização da existência digna de todos e da justiça social. Correlacionando essa compreensão com a valorização do trabalho humano (artigo170, caput), a defesa do consumidor (artigo170, V), a defesa do meio ambiente (artigo170, VI), a redução das desigualdades regionais e sociais (artigo170, VII) e a busca do pleno emprego (artigo170, VIII), tem-se configurada a sua direta implicação com a propriedade dos bens de produção, especialmente imputada à empresa pela qual se realiza e efetiva o poder econômico, o poder de dominação empresarial. Disso decorre que tanto vale falar de função social da propriedade dos bens de produção, como de função social da empresa, como função social do poder econômico.31

A função social da empresa é princípio constitucional vinculado à função

social da propriedade, agora empresarial, secundada pela função social do contrato, enquanto

forma constitutiva e de exercício das atividades empresariais. Isto equivale dizer que a

propriedade empresarial e os interesses individuais continuam existindo e de forma

30 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 30. ed. rev. e atual. até a Emenda

Constitucional, n.56, de 20.12.2007. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, p. 812 . 31 Idem. Op.cit., p. 812.

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32

flexibilizada ou relativizada, pois o proprietário se utiliza dela com maior comprometimento,

a fim de equilibrar o sucesso dos negócios e os interesses sociais.

Assim, o princípio constitucional econômico e a propriedade privada,

adquiriram força e funcionalidade na empresa por meio de seus produtos, vez que a dignidade

da pessoa humana e a função social são metas a serem alcançadas em conjunto com o

resultado da produção e o lucro, é o interesse individual dividindo espaço com o social em

busca da harmonia entre o crescimento e o desenvolvimento sócio- econômico nacional.

A referência constitucional à função social como elemento estrutural da definição do direito á propriedade privada e da limitação legal de seu conteúdo demonstra a substituição de uma concepção abstrata de âmbito meramente subjetivo de livre domínio e disposição da propriedade por uma concepção social de propriedade privada, reforçada pela existência de um conjunto de obrigações para com os interesses da coletividade, visando também a finalidade ou utilidade social que cada categoria de bens objeto de domínio deve cumprir.32

A propriedade privada crivada com o cunho da função social determina uma

limitação de forma especial a aplicabilidade do direito á propriedade, pela função social que

predomina, alcança o universo empresarial e negocial, em seu complexo de relações,

redefinidos pelas pautas empresariais e constitucionais nas modernas relações jurídicas,

políticas, sociais e econômicas, com limitações de uso e gozo, deve ser reconhecida com

sujeição a disciplina e perspectiva da responsabilidade social, portanto é a passagem do

Estado proprietário para o Estado solidário, haja vista a proposta preambular constitucional.

2.3.3 A livre concorrência e a defesa do consumidor

Atualmente, diante das novas concepções do direito e em análise às

condições de desenvolvimento, mister se faz compatibilizar e proteger o direito à livre e leal

concorrência e os direitos advindos da relação com o consumidor, haja vista serem preceitos

fundamentais na Constituição.

32 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo:

Atlas, 2002, p. 266.

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33

Em face da atual Constituição, para conciliar o fundamento da livre iniciativa e do princípio da livre concorrência com os da defesa do consumidor e da redução das desigualdades sociais, em conformidade com os ditames da justiça social, pode o Estado, por via legislativa, regular a política de preços de bens e serviços, abusivo que é o poder econômico que visa ao aumento arbitrário dos lucros.33

A livre concorrência pressupõe competição entre as empresas com o

objetivo de conquistar espaço no mercado, disputar a preferência dos consumidores em

relação aos produtos ofertados, angariar clientes, de modo lícito e compatível com o

funcionamento do sistema capitalista, sem abusos e deslealdade dos competidores.

Contemporaneamente, a noção de concorrência entre as empresas apresenta-

se com um diferencial, a responsabilidade social, e a competição entre elas não se resume

apenas a melhores tecnologias, melhor preço e qualidade de produtos, mas sim na capacidade

dos gestores em perceber as mudanças e as necessidades sociais e transformá-las em

oportunidades para gerar riquezas em meio ao viés social competitivo e alcançar a

sustentabilidade empresarial e a garantia das condições de consumo.

A noção tradicional de concorrência pressupõe uma ação desenvolvida por um grande número de competidores, atuando livremente no mercado de um mesmo produto, de maneira que a oferta e a procura provenham de compradores ou de vendedores cuja igualdade de condições os impeçam de influir, de modo permanente ou duradouro, no preço dos bens e serviços.34

As empresas socialmente responsáveis desempenham papel fundamental no

desenvolvimento, tendo em vista sua preocupação e direcionamento voltado ao público

interno e externo, assim como à qualidade de vida e condições de bem estar e

sustentabilidade, à medida que expandem seu campo e visão e atuação empresarial que acaba

por refletir em melhores condições no ambiente empresarial proporcionando maior equilíbrio

e comprometimento com a sociedade quando valoriza a transparência dos negócios, a livre

concorrência e o consumidor no sentido de evitar abusos e arbitrariedades que desestabilizem

o poder econômico e as demais organizações objetivando o fomento sócio- econômico

nacional.

33 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. São Paulo:

Atlas, 2002, p. 285. 34 VAZ, Isabel. Direito econômico da concorrência. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p.27.

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34

As empresas vêm exercendo suas atividades com responsabilidade, além

dos benefícios sociais, econômicos e ambientais, impulsionam a nova forma de competir e

permanecer no mercado atual. Assim, pode-se dizer que as empresas socialmente

responsáveis caminham rumo ao modelo de mercado de concorrência ideal, pois valorizam a

transparência e a limpidez em suas atividades garantindo o mercado e o consumidor de

diversificadas maneiras, que vão desde o cumprimento das normativas protetivas até as

certificações que buscam concretizar modelos mais aprimorados de satisfação dos

colaboradores e dos consumidores, porque identificam e perseguem novos padrões de

qualidade, sustentabilidade, gestão e inserção no mercado competitivo.

Práticas monopolistas, oligopolistas, dumpings, formação de trustes e cartéis

são incompatíveis com os preceitos da livre concorrência, eis que enfraquecem a competição

no mercado, lesam o consumidor por, concentrar a produção, oferecer produtos abaixo do

preço real, ofertar produtos com preços tabelados, dentre outros e, por consequência, os

concorrentes de menor porte e os que não aderem a este sistema sofrem com a concorrência,

eventualmente desleal. Deste modo, para a empresa ser considerada socialmente responsável,

deve evitar estas práticas destrutíveis da concorrência de mercado.

Entretanto, existem empresas que adquirem o monopólio da produção de

determinados bens e serviços pela alta qualidade dos produtos e preços compatíveis, não

utilizando esta vantagem para praticar condutas anticoncorrenciais, mas apenas valendo-se

das garantias constitucionais da liberdade de empreender e estar no mercado para exercer suas

funções, sem que isso caracterize abuso do poder econômico pela existência do monopólio.35

Neste caso, a lealdade da concorrência beneficia o consumidor garantindo-

lhe melhores preços, maior qualidade de mercadorias e melhores condições nas negociações

comerciais.

A busca pela sanidade do mercado de consumo, fundada na proteção do consumidor e na concretização harmônica, antes mesmo da concretização da relação de consumo – em um momento pré- contratual -, estabeleceu o legislador inúmeras condutas, cujo rol é meramente exemplificativo, tidas como práticas abusivas que não devem ser promovidas pelos fornecedores de produtos e serviços.

35 VAZ, Isabel. Direito econômico da concorrência. Rio de Janeiro: Forense, 1993, p. 326.

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35

A ruptura com normas de conduta pode acarretar sanções de cunho administrativo, penal e, principalmente, civil, por meio de imposição do dever de reparação dos danos (materiais e morais) causados aos consumidores, tanto a título individual quanto coletivo. [...]36

Neste caso, a lealdade na concorrência simplesmente demonstra que a

empresa é responsável e tem compromisso ético e social. Ético, na medida em que estabelece

uma reflexão a propósito dos valores individuais e inter-humanos, onde atualmente, a grande

preocupação das maiores organizações é com a sustentabilidade de seus negócios e o respeito

à conduta moral que devem acontecer no mercado; e social porque se preocupa com o bem

estar da comunidade, do público consumidor de seus produtos.

Neste cenário competitivo, grandes, pequenas e médias empresas exercem

suas atividades, convivendo com as falhas do mercado, práticas abusivas que devem ser

sanadas e são protegidas pela legislação federal que determina a obrigação do Estado ou do

órgão administrativo responsável, para no mínimo aproximarem-se da concorrência leal.

A competição entre agentes econômicos em mercados concorrenciais mantém preços em patamares próximos ao custo marginal da produção, reduz ou inibe transferências de renda de consumidores para produtores. A legislação conformadora dos mercados visa, com a disciplina da concorrência, impedir a formação de estruturas dotadas de poder que, atuando em mercado, seja causa de distorção da formação de preços, o que pode ser feito, por exemplo, alterando a oferta, ou praticando atos que ponham em risco a competição. Exige-se dos agentes comportamentos caracterizados por um tipo de conduta específica que servem para promover a justiça social. 37

Deste modo, a competição estimula a produção e beneficia a sociedade,

embora o mercado brasileiro necessite de atenção especial em relação às médias e pequenas

empresas para que as grandes não utilizem seu poder econômico de forma desleal e ilegal,

acabando com a concorrência e, consequentemente com o bom desempenho das atividades

econômicas comerciais diante da ausência da competitividade em alguns casos.

As empresas devem evitar estas ações ilícitas para conseguir obter vantagem

competitiva em relação aos seus concorrentes, com comportamento ético e justo frente a seus

funcionários e aos interesses dos demais colaboradores da empresa, clientes, fornecedores,

consumidores, pois o que manterá uma empresa atuando no mercado nos próximos anos é a

36 FIGUEIREDO, Fabio Vieira; FIGUEIREDO, Simone Diogo Carvalho; ALEXANDRIDIS, Georgios. Mini

Código de Defesa do Consumidor anotado. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p.380. 37 SZTAJN, Rachel. Teoria juridical da empresa: atividade empresarial e mercados. 2. ed. São Paulo: Atlas,

2010, p. 38.

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36

postura responsável que esta adotar frente à sociedade, a ponto de melhorar a sua imagem e a

preferência por seus produtos, sem precisar usar de subterfúgios para alcançar seus objetivos.

Assim, as empresas que valorizam a liberdade de competir e desempenham

suas atividades, preservando a responsabilidade social e sustentabilidade, terão maiores

chances de conquistar a clientela e o favoritismo no mercado, porque concorrer com

responsabilidade é mais que estratégia, é equilíbrio, força e competência, é o diferencial social

almejado pelo ordenamento jurídico brasileiro.

2.3.4 A repressão ao abuso do poder econômico e garantia da economia popular.

É forte a participação do Estado na economia e no controle da concorrência,

e as empresas públicas não gozam de privilégios em relação às privadas. A legislação

nacional também visa reprimir o abuso do poder econômico coibindo a dominação de

mercado e aumento dos lucros e, embora o Estado não atue de forma direta no setor

econômico, salvo nos casos expressos na atual Constituição Federal, na hipótese de abusos ele

intervém para equilibrar as forças produtivas que excedam seus limites restabelecendo, asso

desempenho e a funcionalidade da atividade econômica empresarial. As empresas públicas,

quando desempenham atividade particular, gozam dos mesmos benefícios das privadas.

Todo e qualquer ato nocivo à livre concorrência e que dificulte o

desenvolvimento econômico deve ser reprimido, porém, para cada denúncia de infração, o

órgão julgador (Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE e/ou o Estado em

algumas situações) deverá analisar todas as possibilidades de deferir ou indeferir o pedido

pleiteado ou a acusação feita à empresa concorrente, sem incorrer em erros e exageros, para

não prejudicar o mercado econômico nacional e garantir o desenvolvimento da economia

popular, fomentando inclusive assim, a livre iniciativa.

O abuso de poder econômico se configura quando ocorre doação de bens ou de vantagens a eleitores de forma que essa ação possa desequilibrar a disputa eleitoral e influenciar no resultado das eleições, afetando a legitimidade e normalidade das eleições. Para o TSE, o abuso do poder econômico é a utilização, em benefício eleitoral de candidato, de recursos patrimoniais em excesso.

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37

A perspectiva da tal previsão é a garantia do uso adequado das provisões

econômicas, sem abusos e exorbitâncias para que o mercado não seja direcionado ao bel

proveito de interesses pessoais e que as relações sociais e consumeristas esteja protegidas da

influência que, financeiramente, pode ocorrer em diversos segmentos de mercado.

1. A utilização de recursos patrimoniais em excesso, públicos ou privados, sob poder ou gestão do candidato em seu benefício eleitoral configura o abuso de poder econômico; 2. O significativo valor empregado na campanha eleitoral e a vultosa contratação de veículos e de cabos eleitorais correspondentes à expressiva parcela do eleitorado configuram abuso de poder econômico, sendo inquestionável a potencialidade lesiva da conduta, apta a desequilibrar a disputa entre os candidatos e influir no resultado do pleito.38 (...) (RESPE Nº 191868, REL. MIN. GILSON DIPP, DE 04.08.2011).

5. Na espécie, abusa do poder econômico o candidato que despende recursos patrimoniais, públicos ou privados, dos quais detém o controle ou a gestão em contexto revelador de desbordamento ou excesso no emprego desses recursos em seu favorecimento eleitoral. Nesse contexto, o subsídio de contas de água pelo prefeito-candidato, consignado no v. acórdão regional, o qual se consumou com o favorecimento de 472 famílias do município nos 2 (dois) meses anteriores às eleições, e a suspensão do benefício logo após o pleito configura-se abuso de poder econômico com recursos públicos.39 (...) (RESPE Nº 28581, REL. MIN. FELIX FISCHER, DE 21.08.2008).

Tendo em vista a influência e a potencialidade lesiva que o poder

econômico gera nas relações sociais, encontram-se alguns posicionamentos ministeriais:

1. O abuso de poder econômico concretiza-se com o mau uso de recursos patrimoniais, exorbitando os limites legais, de modo a desequilibrar o pleito em favor dos candidatos beneficiários. (Rel. Min. Arnaldo Versiani, RO 1.472/PE, DJ de 1º. 2.2008; Rel. Min. Ayres Britto, RESPE 28.387, DJ de 20.4.2007); 2. Não se desconsidera que a manutenção de albergues alcança finalidade social e também se alicerça no propósito de auxiliar aqueles que não possuem abrigo. Entretanto, no caso, não se está diante de simples filantropia que, em si, é atividade lícita. Os recorridos, então candidatos, despenderam recursos patrimoniais privados em contexto revelador de excesso cuja finalidade, muito além da filantropia, era o favorecimento eleitoral de ambos (artigo 23, § 5º, e artigo 25 da Lei nº 9.504/97); 3. A análise da potencialidade deve considerar não apenas a aptidão para influenciar a vontade dos próprios beneficiários dos bens e serviços, mas também seu efeito multiplicativo. Tratando-se de pessoas inegavelmente carentes, é evidente o impacto desta ação sobre sua família e seu círculo de convivência.40 (...) (RO Nº 1445, REL. MIN. MARCELO RIBEIRO, DE 06.08.2009).

38 RESPE Nº 191868, REL. MIN. GILSON DIPP, DE 04.08.2011. 39RESPE Nº 28581, REL. MIN. FELIX FISCHER, DE 21.08.2008. 40 RO Nº 1445, REL. MIN. MARCELO RIBEIRO, DE 06.08.2009.

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38

Desta forma, o poder econômico poderá ser exercido licitamente desde que

não conflite com os valores maiores do nosso ordenamento jurídico. Não é admissível o

exercício que seja um entrave ao desenvolvimento social e aos ideais de justiça social.

Deste modo, os órgãos competentes devem estar atentos às transformações

sociais, à gestão empreendedora da empresa acusada a fim de conseguirem visualizar se se

trata ou não de abuso do poder econômico, que gera a concorrência desleal, pois uma decisão

mal analisada pode causar prejuízos ao desenvolvimento socioeconômico do país e

desestimular a entrada de novas empresas responsáveis no mercado brasileiro.

Outro ponto que dever ser analisado antes de qualquer decisão é o

deferimento ou não de fusões e incorporações de empresas, se estas provocariam prejuízos á

concorrência e, com a junção, deteriam quanto por cento da produção, importante averiguar

estas situações para determinar se haveria uma concentração de poder e uma influência direta

na competitividade de mercado. Portanto, cada caso é um caso que deve ser ponderado em

benefício da contenção ao abuso do poder econômico e manutenção da equilibrada garantia da

economia popular.

Registram-se os ensinamentos do ilustre constitucionalista José Afonso da

Silva:

Assim, a liberdade de iniciativa econômica privada, num contexto de uma Constituição preocupada com a realização da justiça social (o fim condiciona os meios),  não  pode  significar  mais  do  que  ‘liberdade  de  desenvolvimento  da  empresa  no quadro estabelecido pelo poder público, e, portanto, possibilidade de gozar das facilidades e necessidade de submeter-se   às   limitações   postas   pelo   mesmo’.   É  legítima, enquanto exercida no interesse da justiça social.41

Observa-se nas lições do referido professor, ainda, a necessidade da atuação

do agente econômico estar em conformidade com os ditames da justiça social, ou seja, quando

exercido em consonância com a sua função social da propriedade, será garantidor da

economia popular de forma equilibrada e justa.

41 SILVA, José Afonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. 36. ed. São Paulo: Malheiros, 2013,

p. 285.

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39

Observe-se que todos os princípios comunicam-se, pois todos identificam-se

com a busca pelo desenvolvimento nacional, assim, nesta lógica, o abuso do poder econômico

gera a concorrência desleal, sendo que, o princípio da livre concorrência, que garante a

competitividade, é um divisor de comportamento, pois estimula as empresas a competir,

angariar clientes, investir em pesquisas e novas tecnologias, meio ambiente, novos produtos,

estimula as forças produtivas a se unirem, protegendo, o consumidor diante de todas as

inter- relações, motivando e garantindo a economia popular, ainda assim, há concentração de

poder econômico, o que leva a condutas anticoncorrenciais, que ultrapassam os limites dos

direitos e se afastam da justiça social.

Portanto, desacreditar na fiscalização da economia do mercado para evitar o

abuso do poder econômico e garantir a economia popular, como contornos do mercado

econômico, é desacreditar no Estado, no governo, nos órgãos administrativos, no crescimento

e desenvolvimento responsável das empresas que buscam aprimorar e enquadrar suas

atividades de acordo com a nova tendência social, ofertando condições dignas de trabalho,

produtos de qualidade, respeitando seu público interno e externo e o meio ambiente.

Assim, diante da repressão ao abuso do poder econômico possibilita da

certeza da livre concorrência e a garantia da economia competitiva de mercado, com isso tem-

se a proteção à economia popular e efetividade dos direitos do consumidor.

A defesa da concorrência, assim como a defesa do consumidor, preocupa-se em evitar que, em função das estruturas de mercado e de assimetrias de informação, a detenção de poder econômico seja usada pelas empresas em prejuízo de consumidores. No entanto, há diferenças significativas na abordagem analítica e nos objetivos de cada um desses dois conjuntos de políticas públicas. A defesa da concorrência tem como foco central preservar o padrão de competição entre as empresas, para que, por esse meio, o mercado atinja níveis mais elevados de eficiência econômica, beneficiando assim os consumidores. Já a defesa do consumidor tem uma ação mais imediata na proteção dos interesses desse agente econômico em uma relação comercial com qualquer empresa.42

Considera-se que o poder econômico, não seja identificado como um mal

para o bem-estar social, já que, a Legislação Antitruste tem como razão final a proteção dos

consumidores. Somente quando o seu exercício é dado através de abusos, acarretando

prejuízos para a sociedade e para a economia popular, é que será aplicado a Legislação

Antitruste. Ademais, o poder econômico não pode mais ser considerado uma anomalia do

mercado e sim, como já dito, um dado estrutural, pois a concorrência perfeita já há muito é 42 ALMEIDA DE, Silvia Fagá e REZENDE, Gustavo Madi. Defesa do consumidor e disciplina antitruste.

In: SCHAPIRO, Mario Gomes. Direito econômico concorrencial. São Paulo: Saraiva 2013, p. 293.

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40

considerada uma utopia e há necessidade imperiosa em proteger o desenvolvimento

econômico e a sustentabilidade nacional.

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41

3 A INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO

A intervenção do Estado possui tamanha relevância para o processo de

desenvolvimento econômico e social das nações, que a intervenção do Estado na atividade

exploratória econômica ocorre na perspectiva da previsão legal e de maneira harmônica para

efetivação da defesa dos interesses da sociedade de modo a regulamentar a projeção do

desenvolvimento econômico nacional.

Neste sentido, a política expansionista brasileira criou e alargou as

condições para o desenvolvimento e muitas novas oportunidades nasceram desta

sistematização desenvolvimentista nacional, como o estabelecimento de melhores condições

de crédito ao consumidor, que, apesar de tornar possível uma grande ampliação do

endividamento familiar, possibilitou uma grande elevação na produção de bens de consumo

duráveis. Por outro lado, estabeleceu facilidades de financiamento á construção residencial e a

aquisição de moradia pelo Sistema Financeiro de Habitação, projetos como “Minha Casa,

minha  vida” e desta forma, injetou novas oportunidades ao setor de construção civil no país.

Diante disso, o fomento ao desenvolvimento empresarial e ao setor

empregatício foi inevitável, o que promoveu um rico abastecimento e satisfação das

necessidades sociais e econômicas, que por vezes, impulsionou e facilitou as exportações, que

superaram metas e projetos devido ao seu crescimento acelerado diante das facilidades e dos

subsídios concedidos.

Assim, as políticas monetária e fiscal expansionistas, mantiveram elevado o

montante de dispêndio público e privado em consumo e em investimento, tendo em vista a

abertura do mercado mundial aos segmentos brasileiros, o Risco Brasil tornou-se cada vez

menos impeditivo aos investimentos das políticas estrangeiras. Sendo assim, Cretella Junior

vaticina:

Razões de natureza técnica e de ordem sócio-econômica justificam de maneira ampla a ingerência do Estado no setor privado. Despindo-se de parte de suas prerrogativas e privilégios, o Estado tem possibilidades maiores de locomover-se, de desenvolver atividades no setor comercial ou industrial, de desburocratizar-se, de subtrair-se de controles rígidos e asfixiantes. Contato mais estreito com a população, afastando conflitos e permitindo que interesses comuns criem raízes idênticas, de outro modo, antagônicas, vai preparando o caminho para o acionarato estatal. O Estado acionista, ao integrar a sociedade de economia mista, desce do pedestal privilegiado em que se encontra e, revestindo-se de traços privatísticos, fica sob o impacto das normas jurídicas do direito mercantil, sujeitando-se aos estatutos das sociedades anônimas comuns. Não se trata do Estado, síntese dos poderes soberanos, mas do Estado, sujeito de direito nas relações jurídico-privadas, o Estado como

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42

centro de imputações de direitos e deveres, o Estado particular; o Estado comerciante, o comerciante estatal, o empresário público.43

Desta forma, a atuação do Estado tem como propósito promover o equilíbrio

e projetar o desenvolvimento e aprimoramento de políticas públicas. Atende com este

movimento a função de impulsionar a industrialização do País para inseri-lo no mercado

internacional, o que exigiu do Estado, muito além do desempenho de suas funções típicas.

Demandou, também, sua atuação direta na ordem econômica, por meio de pessoas jurídicas

criadas especificamente para esse fim.

3.1 A ORDEM ECONÔMICA CONSTITUCIONAL BRASILEIRA E A INTERVENÇÃO

CONCORRENCIAL DO ESTADO NO DOMÍNIO ECONÔMICO

A expressão ordem econômica, incorporada no vocabulário jurídico a partir

da primeira metade do Século XX, é utilizada ora significando a parcela da ordem jurídica do

País, ora o modo de ser de sua economia.

Como, em seu primeiro significado, também é sinônimo de Constituição

Econômica, tem-se que, a expressão ordem econômica que é expressão genérica, da qual são

espécies a Constituição Econômica e Ordem Econômica em sentido estrito. Dessa forma,

neste contexto, a expressão ordem econômica será reservada para o uso em seu sentido estrito,

evitando, assim, confusões semânticas decorrentes de sua polissemia.

Também é importante observar que o fato de ambas as expressões, em

comento, terem sido incorporadas apenas recentemente no vocabulário jurídico, não significa

que, até então, as Constituições não continham regras relacionadas à atividade econômica.

Pelo contrário, mesmo anteriormente ao advento das Constituições escritas, lá se encontravam, em cada sociedade, no bojo de suas ordens jurídicas, como parcela delas, normas institucionalizadoras das suas respectivas ordens econômicas.44

43 CRETELLA JÚNIOR, José. Direito administrativo brasileiro. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 162. 44 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 9. ed. rev. e atual. São Paulo:

Malheiros, 2004, p. 63-64.

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43

As Constituições liberais não dispunham de um vasto conjunto de normas de direito econômico já que ao sistema liberal bastavam disposições constitucionais relativas à garantia da propriedade privada e à liberdade contratual e alguma regulamentação infraconstitucional sobre concorrência, não significando essa situação ausência de Constituição Econômica ou de ordem econômica. 45

O fato de o Brasil ter sido mantido como colônia de Portugal – um Estado

Mercantilista e, portanto, concentrador de poderes e funções - até 1824 e, principalmente, as

características pacifistas com que se caracterizou a declaração da independência - fizeram

com que a organização política e administrativa do Estado brasileiro, recém-criado, fosse

muito semelhante à da sua antiga metrópole. Nesse sentido:

Do ponto de vista da intervenção do Estado no domínio econômico, o panorama do Império revela sempre a ênfase nos problemas de tarifas alfandegárias, que eram, na verdade, os que tinham influência no incipiente sistema econômico da época, e os quais, em todas as situações históricas, têm sempre a primazia como primeira atividade onde o Estado intervém no domínio econômico. Os surtos de desenvolvimento econômico do Império estão ligados à execução de reformas alfandegárias como, por exemplo, a famosa reforma ALVES BRANCO de 1844, que se conjuga logo a seguir com a extinção do tráfico de escravos, tornando disponíveis os capitais neles empregados para novas atividades industriais.46

As Constituições de 1824 e de 1891 refletiram o domínio do liberalismo no

País,  não  havendo  nelas  “espaço  para  um  regramento  constitucional  de  intervenção  do  poder  

público  no  domínio  econômico” 47 em que pese o texto constitucional de 1824 ter abolido as

corporações de ofício. (artigo 179, inciso XXV).

Com a proclamação da República (1891), a presença direta do Estado no

domínio econômico limitou-se, no caso da União, à instituição de bancos emissores e à

criação e manutenção de alfândegas (art. 7º, §1º, incisos I e II). A Constituição de 1891

conferiu competência à União e aos Estados-membros para legislarem sobre viação férrea e

navegação e, no parágrafo único deste mesmo dispositivo, determinou que a navegação de

cabotagem, seria feita por navios nacionais, num lampejo do constituinte na proteção da

economia nacional (art. 13).

45 Idem, Op. cit., p. 63-64. 46 VENÂNCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no domínio econômico. O Direito público

econômico no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1968, p. 25 47 PEREIRA, Tadeu Rabelo. Regime(s) jurídico(s) das empresas estatais que exploram atividade

econômica. Porto Alegre: Síntese, 2001, p. 31.

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44

Sob a sua égide, com a finalidade de proteger o café nos mercados

internacionais, tendo em vista que, na época, era ele o produto que dava sustentação

econômica ao País, acentuou-se gradativamente a intervenção do Estado no domínio

econômico. Condição que, consolidou-se com o passar dos tempos.

Esse fato se iniciou por iniciativa dos Estados de São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro, principais produtores do grão e que gerou, como uma de suas consequências, a criação de novas modalidades de pessoas jurídicas de direito público, com características bastante aproximadas das pessoas jurídicas de direito privado.48

A reforma constitucional de 1926, entre outras modificações, trouxe a ampliação das funções da União Federal. Contudo, imperava, no País, o coronelismo, permanecendo o Estado brasileiro em sua posição absenteísta, ante a sua incapacidade de dar solução aos problemas nacionais que, também, refletiam os anseios de reforma social que agitavam a Europa e se agravaram com a Crise de 1929, que fez ruir a economia brasileira lastreada no café. 49

A partir da década de trinta, acentua-se o mecanismo de intervenção do

Estado na atividade privada, na tentativa de reconstruir o País, e fez-se ampla modificação

legislativa, sob a inspiração da Constituição de Weimar e da Constituição do México, que

haviam adotado um título específico para tratar da ordem econômica e social, culminando

com a promulgação da Constituição de 1934. Que seguia os moldes da proposta mundial de

garantia aos direitos humanos em detrimento do autoritarismo estatal.

A Constituição de 1934, seguindo o mesmo norte traçado inicialmente pela

reforma constitucional de 1926 que, outorgou ao Congresso Nacional competência para

legislar sobre matéria relativa ao trabalho e sob franca influência da Constituição do Reich,

trouxe um título especialmente dedicado à ordem econômica e social e colocou como

parâmetros da liberdade econômica no Brasil, os princípios da justiça e as necessidades de

segurança da vida nacional, com vistas à existência digna (art. 115).50

48 VENÂNCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no domínio econômico: o Direito público

econômico no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1968, p. 28-29. 49 VENÂNCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no domínio econômico: O Direito público

econômico no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1968, p. 30. 50 PEREIRA, Tadeu Rabelo. Regime(s) jurídico(s) das empresas estatais que exploram atividade

econômica. Porto Alegre: Síntese, 2001, p. 31-32.

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45

É importante notar que o mesmo texto constitucional, em seu art. 116,

previa a possibilidade da União intervir no domínio econômico por meio de monopólio, desde

que sua atuação tivesse respaldo no atendimento ao interesse público.

No texto constitucional de 1934, priorizava-se o desenvolvimento industrial

e a proteção dos trabalhadores urbanos mediante a intervenção do Estado no domínio

econômico. No entanto, com a explosão dos movimentos revolucionários e a consequente

adoção de um regime de estado de sítio, a partir do Golpe de 1937, que outorgou nova

Constituição ao País, com inspiração na Constituição polonesa de 1934, de um ideal mais

liberal que a anterior, esta intervenção ficava limitada à defesa dos interesses nacionais. 51

Já, a Constituição de 1937 previa a possibilidade da intervenção do Estado

no  domínio  econômico  para  “suprir  deficiências  da  iniciativa  individual  e  coordenar  os fatores

de  produção”,  de  maneira  a  evitar ou resolver conflitos e introduzir no jogo das competições

individuais o pensamento dos interesses da nação, representados pelo Estado (art. 135).

A Carta de 1946, por sua vez, trouxe a ordem econômica fulcrada nos

princípios da justiça social, da liberdade de iniciativa e da valorização do trabalho humano,

que deveriam ser harmonizados entre si (art. 145). Inovou-se ao disciplinar a concorrência e a

consagração do princípio da função social da propriedade (Arts. 147 e 148).

Nessa conjuntura, foram ampliadas as possibilidades do Estado promover

ingerências no domínio econômico, principalmente mediante a sua função planejadora.

Quanto à intervenção estatal no domínio econômico, o texto de 1946 foi mais criterioso do

que os que o antecederam, ao dispor:

Art. 146. A União poderá, mediante lei especial, intervir no domínio econômico e monopolizar determinada indústria ou atividade. A intervenção terá por base o interesse público e por limite os direitos fundamentais assegurados nesta Constituição.

A Constituição de 1967 estabelecia que, a ordem econômica e social do

País, tinha por fim a realização da justiça social, fundamentada nos princípios da liberdade da

iniciativa, valorização do trabalho como condição da dignidade humana, função social da

propriedade, harmonia e solidariedade entre os fatores de produção, desenvolvimento

econômico e repressão ao abuso do poder econômico (art. 157).

51 VENÂNCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no domínio econômico: o Direito público

econômico no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1968, p. 32.

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46

Com a EC nº 01/69, o dispositivo em questão (art. 157) foi renumerado

(art.160) e teve sua redação modificada, sendo que o desenvolvimento nacional foi

transformado em finalidade da ordem econômica e, a expansão das oportunidades de emprego

produtivo, foi incluída entre os seus princípios. Além disso, a expressão fatores de produção

foi substituída por categorias sociais de produção.

Seu § 8º passou, com as modificações trazidas na emenda constitucional, a

constar do art. 163, o qual determinava que, seria possível, a intervenção do poder público no

domínio econômico e o monopólio estatal de determinada indústria ou atividade, mediante a

edição de uma Lei Federal, quando indispensável, por motivo de segurança nacional ou para

organizar setor que não pudesse ser desenvolvido com eficácia no regime de competição e de

liberdade de iniciativa, assegurados os direitos e garantias individuais (princípio da

subsidiariedade).

Entre 1948 e 1968, aumentou consideravelmente a intervenção do Estado no

domínio econômico, sem que, porém, a máquina estatal estivesse aparelhada para atender a

essas novas necessidades e que, com o Ato Institucional nº 2, de 27 de outubro de 1965, o

Presidente da República adquiriu competência para emitir decretos-leis sobre matéria de

segurança nacional (art. 3º). Nesse sentido, é válido afirmar que:

O fortalecimento do sistema de clientela, como o restabelecimento do regime representativo, provocou uma derrocada no sistema do mérito na administração federal, com o rebaixamento do nível de eficiência. Por outro lado, acelera-se o processo de descentralização funcional e de serviços, com a criação de novas autarquias, sociedades de economia mista e empresas públicas, em muitos casos, visando evitar os empecilhos apresentados pela administração centralizada do Estado, e no seio desta, surgem órgãos anômalos, como as campanhas, os serviços especiais, os grupos executivos, etc. [...]52

Tais possibilidades interventivas, contudo, foram restringidas, com a edição

da EC n° 01/69 que, ao ampliar a preocupação estatal com temas como desenvolvimento,

justiça social e valorização do trabalho humano, adotou o planejamento como instrumento de

crescimento econômico.53

52 VENÂNCIO FILHO, Alberto. A intervenção do Estado no domínio econômico: o Direito público

econômico no Brasil. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1968, p. 34-35. 53 LOCATELLI, Liliana. Desenvolvimento na Constituição Federal de 1988. In: BARRAL, Welber (Eds.).

Direito e Desenvolvimento: Análise da ordem jurídica brasileira sob a ótica do desenvolvimento. São Paulo: Editora Singular, 2005.

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47

Direito ao desenvolvimento, na análise da ordem jurídica brasileira, sob a

ótica desse intento, previa, em seu art. 170, a atuação excepcional do Estado brasileiro no

domínio econômico via exploração direta e supletiva de atividade econômica, por meio de

empresas estatais, que seriam regidas pelo mesmo conjunto de normas aplicáveis às empresas

privadas, verbis:

Art. 170. Às empresas privadas compete, preferencialmente, com o estímulo

e o apoio do Estado, organizar e explorar as atividades econômicas:

§1°. Apenas em caráter suplementar da iniciativa privada o Estado

organizará e explorará diretamente as atividades econômicas;

§2°. Na exploração, pelo Estado, da atividade econômica, as empresas

públicas e as sociedades de economia mista reger-se-ão pelas normas

aplicáveis às empresas privadas, inclusive quanto ao Direito do Trabalho e

ao das Obrigações;

§3°. A empresa pública que explorar atividade não monopolizada ficará

sujeita ao mesmo regime tributário aplicável às empresas privadas54.

Segundo Hely Lopes Meirelles55, ao discorrer sobre o mencionado

dispositivo da Carta Constitucional de 1967, esclarecia que, sendo a intervenção do Estado no

domínio econômico de natureza supletiva e nunca substitutiva ou competitiva com a atividade

privada  (princípio  da  subsidiariedade),  não  poderia  o  Estado  “invadir  o  campo  econômico  das  

empresas privadas, salvo para suprir-lhes   deficiências”,   sob   pena   de   afrontar a própria

Constituição. Ressaltava, ainda, que era possível verificar, naquele momento histórico, a

existência, no País, de diversas empresas estatais competindo com as empresas da iniciativa

privada de forma desleal e inconstitucional, em razão da inobservância do caráter supletivo

dado pela Constituição Federal de 1967, a intervenção estatal no domínio econômico:

[...], o que se tem verificado no Brasil, em todos os níveis governamentais federal, estadual e municipal - é a frequente invasão da área da atividade privada por empresas públicas e sociedades de economia mista, que entram em acintosa competição com o empresariado particular, ofertando produtos e serviços já postos no mercado por empresas privadas, idôneas e especializadas, que suprem satisfatoriamente as exigências do consumo e competem lealmente entre elas, dentro da Lei da oferta e da procura. E o pior é que as organizações do Estado muitas vezes obtêm privilegiadamente o contrato, e com dispensa de licitação, numa autêntica concorrência desleal -e inconstitucional -às suas congêneres particulares.

54 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado

Federal: Centro Gráfico. 55 MEIRELLES, Hely Lopes. O Estado e suas empresas. Revista dos tribunais. São Paulo, n. 558. p. 10-12.

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A atual ordem constitucional-econômica brasileira, encontra-se estabelecida

em alicerces de valorização do trabalho humano, de livre iniciativa, da existência digna, da

livre concorrência e da justiça social. Tanto a livre iniciativa como a valorização do trabalho

humano e a dignidade da pessoa humana, são, além de fundamentos da ordem econômica

brasileira, princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito em que se

consubstancia o Brasil e devem observar, também, os objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil, quais sejam o de construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir

o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as

desigualdades sociais e regionais e, por fim, promover o bem de todos e a solidariedade.

Devem, da mesma forma, observar os princípios gerais da atividade

econômica no Brasil, quais sejam, a soberania nacional, a propriedade privada, a função social

da propriedade, a livre concorrência, a defesa do consumidor, a defesa do meio ambiente, a

redução das desigualdades regionais, a busca do pleno emprego, o tratamento diferenciado

para as micro e pequenas empresas, assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade

econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos

em Lei. E, nesse ponto, é igualmente necessário ressaltar que os referidos princípios devem

coexistir harmoniosamente, superando a incoerência aparente de estarem todos unidos em um

único texto normativo. Sendo a principal razão da existência do Estado e, portanto, a

finalidade da sua intervenção no domínio econômico, a satisfação das necessidades da

coletividade - o que se torna, praticamente, impossível, em razão de serem essas demandas

múltiplas e infinitas enquanto os bens disponíveis no mercado o são em número limitado e

finito -, sendo que são de extrema importância para a realização dos princípios da dignidade

da pessoa humana e da justiça social.

Segundo o princípio da dignidade da pessoa humana, o Estado tem dever de

proporcionar aos cidadãos uma existência digna, garantindo-lhes o mínimo necessário, para

uma vida livre em todos os aspectos. Já o princípio da justiça social, é aquele que impõe ao

poder público o dever de promover políticas que ensejem a progressiva modificação da

condição de vida de seus cidadãos, com melhor distribuição de renda, a fim de que todos

tenham condições para satisfazer, pelo menos, as necessidades essenciais, tais como

alimentação, moradia, vestuário, saúde, transporte, cultura e educação, o que implica em uma

atuação significativa do Estado na economia nacional.

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49

A Constituição brasileira evoluiu diante do cenário internacional e

aprimorou-se acerca de suas próprias alterações sociais, econômicas e conjunturais, tornando-

se mais madura e apropriada ao novo contexto globalizado, como a generalidade daquelas que

se seguiram às duas Grandes Guerras. Contém um capítulo sobre a ordem econômica e, em

textos expressos, autoriza a intervenção do Estado no domínio econômico, sem afastar as

garantias e os direitos fundamentais no campo da liberdade de iniciativa e de mercado e da

propriedade privada, consagrando um sistema capitalista limitado e caracterizando o Brasil

como uma economia de mercado. Nesse sentido:

De início cumpre ressaltar a consagração no texto constitucional do sistema capitalista, identificado normalmente pela garantia da propriedade privada, qualificada esta pela necessidade de observância da sua função social (artigo 170, II e III), e da liberdade de iniciativa (artigo 1º, IV e artigo 170, caput), associada à livre concorrência (artigo 170, IV). Trata-se, portanto, de uma economia de mercado, ideia esta reforçada pela clara separação entre os campos da atividade econômica em sentido amplo destinados às iniciativas públicas e privadas. O artigo 173 da Constituição garante aos agentes privados a exploração de atividade econômica em sentido estrito, somente admitindo a participação do Estado nesta área em hipóteses estritamente definidas, ao passo que o artigo 175 estabelece incumbir ao Poder Público, a prestação de serviços públicos, ainda que sob a forma de concessão ou permissão a particulares.56

Além disso, e ao mesmo tempo em que prevê a regulamentação da

economia, a Constituição estabelece seus objetivos e traça princípios, de tal modo a definir a

ideologia do regime político, no tocante ao domínio econômico, em seu art.170. Isso significa

que:

Regra-se sob o título ordem econômica um conjunto de normas de intervenção protetora ou restritiva às atividades econômicas, em consequência de certas finalidades e através de certos meios. Os fins buscados se vinculam à garantia de uma existência digna para todas as pessoas, de acordo com o que se denomina de justiça social. Inclusive, a República Federativa do Brasil tem como fundamentos, entre   outros   “a   dignidade   da   pessoa   humana”   (art.   1º,   III,   da   Constituição)   e   a  construção de uma sociedade justa (art. 3º, I, da mesma Carta). Os meios usados, afora outros princípios dizem respeito com a "valorização do trabalho humano" e a "livre iniciativa". Esta é a compreensão de ordem econômica e seu conteúdo programático.57

56 PEREIRA, Tadeu Rabelo. Regime(s) jurídico(s) das empresas estatais que exploram atividade

econômica. Porto Alegre: Síntese, 2001, p. 37-38. 57 NASCIMENTO, Tupinambá M. C. do. A ordem econômica e financeira e a nova Constituição. Rio de

Janeiro: Aide, 1989, p. 10.

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50

A respeito do tema, destaca-se ainda:

Uma observação genérica sobre a disciplinação jurídica da ordem econômica aponta, para os seguintes fatos. Em primeiro lugar, há uma definição muito clara dos princípios fundamentais que a regem; liberdade de iniciativa, propriedade privada, regime de mercado, etc. Existe, portanto, uma intenção, bastante nítida, de limitar a presença econômica do Estado. A influência das últimas décadas, sobretudo a partir de 1972, conduziu o constituinte a perfilhar, ao menos em tese, os princípios de um sistema que, ideologicamente, poderia definir-se como capitalista, embora a Constituição, ela própria, se encarregue de informá-lo em diversos pontos específicos.58

A aparente contradição existente entre os princípios da ordem econômica,

relacionados no art. 170, Constituição Federal de 1988, assim como entre os fundamentos do

Estado brasileiro, dispostos no seu art. 1° e, entre estes e aqueles, deve ser resolvida com a

harmonização dos conceitos, levando-se em consideração que o Brasil é um País capitalista.

Nesse sentido:

De fato, o constituinte, de modo claro, optou por um ordenamento econômico composto. Significa que a ordem econômica na Carta de 1988 está impregnada de princípios e soluções contraditórias. Ora abre brechas para a hegemonia de um capitalismo neoliberal, ora enfatiza o intervencionismo sistemático, aliado ao dirigismo planificador; ressaltando até elementos socializantes. Nisso tudo revela uma postura híbrida, porque consagra uma espécie de paralelismo de princípios.59

Tal conflito deve ser solucionado, relativamente às normas:

[...]  na   forma  de  “tudo  ou  nada”:  verificada  a  hipótese  nela  descrita,   seguem-se as consequências previstas, podendo ao menos em tese, ser elencadas todas as exceções à sua incidência e, quanto aos princípios, que possuem a dimensão de peso ou importância, que permite ao aplicador a opção por um certo princípio independente de qualquer consideração acerca da validade do outro, também pertinente ao caso concreto.60

Em virtude, disso, possui uma economia de mercado, na qual os valores da

livre iniciativa e da propriedade privada devem ser os prevalentes, a intervenção estatal no

domínio econômico é exceção, somente admitida em casos que impliquem atendimento a

prementes interesses do corpo social.

58 BASTOS, Celso Ribeiro. Comentários à Constituição do Brasil. São Paulo: Saraiva, 1990, v. VII, p. 08. 59 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal anotada. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 1138 e 1139. 60 PEREIRA, Tadeu Rabelo. Regime(s) jurídico(s) das empresas estatais que exploram atividade

econômica. Porto Alegre: Síntese, 2001, p. 43.

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51

Mesmo porque, a Constituição, sem descaracterizar o Estado brasileiro

como um Estado capitalista e a sua proeminente atuação, concede-lhe meios eficazes para

conter a livre iniciativa dentro dos limites compatíveis com o bem coletivo, sem a afastar,

assim como sem retirar do cidadão a garantia da propriedade privada.

A maioria das normas interventivas anteriores às atuais assumia um caráter proibitivo e repressivo, não se pretendendo com elas levar os entes privativos a adotar certos comportamentos ou a efetuar certas prestações positivas conforme o interesse geral definido pelas autoridades, razão pela qual se fala, para caracterizar essa forma de intervenção, que se prolongou - com a exceção do período mercantilista - até ao final da Primeira Guerra Mundial, de um dirigismo econômico negativo, assente em simples atos preventivos e repressivos. 61

O modelo jurídico a que se refere o autor é o liberal e a ideologia a do

individualismo. Porém, conforme destacado acima, o paradigma do capitalismo individual e

liberal não mais atende aos anseios sociais. A inserção de valores humanitários e de

preservação incute o ideário social-democrático, pois busca a participação do povo para a

garantia da excelência no cumprimento dos ditames constitucionais. Essa mudança de

paradigmas vem interferindo nas relações jurídicas entre particulares e entre estes e entes

públicos, principalmente quando se observa que foram desmerecidos os novos ideais de

atendimento ao bem-estar social.

Nesse sentido, o atendimento, no caso das empresas estatais brasileiras, ao

disposto no art. 37, Constituição Federal de 1988 é exigência direta dessa evolução, mesmo

que de forma mitigada, ante a incidência de normas típicas de direito privado sobre estes

entes. Dessa forma:

[...] percebe-se que a enunciação, no texto constitucional, dos princípios que pautam a atividade administrativa não representa que em todas as situações a administração deva observar integralmente aquele rol – o que seria evidentemente impossível – ou mesmo que em qualquer caso algum deles deva necessariamente ser aplicado. Afinal, a sua ponderação poderá indicar a prevalência de uns em detrimento de outros, ou mesmo a inaplicabilidade de qualquer deles a uma determinada hipótese concreta. Posta a questão desde a perspectiva das empresas estatais que exploram atividade econômica, inegável a importância da tantas vezes citada regra constante do art. 173, §1º, da Constituição, no sentido de que o regime jurídico daquelas entidades se equipara ao das empresas privadas, representando a sua sujeição a princípios de direito privado. Dessa forma, e tomando em consideração as referidas características dos princípios, podemos concluir que aqueles consagrados no art. 37 da Constituição terão campo propício para aplicação na disciplina daqueles aspectos

61 MONCADA, Luis S. Cabral de. Direito econômico. 23 ed. Coimbra: Coimbra, 1988, p. 15.

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52

da vida das estatais nos quais o seu regime jurídico se afasta do modelo privado adotado inicialmente. 62

Assim, faz-se necessário traçar um perfil das relações existentes na

economia nacional, como elas se constituem e atuam no mercado, quais, em linhas gerais, as

suas diferenças e qual a proposta política expansionista do Estado nas relações de

desenvolvimento.

3.2 O CONTROLE DOS ATOS DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NO DOMÍNIO

ECONÔMICO

Apesar da Constituição Federal de 1988 ter como princípios da ordem

econômica, a livre iniciativa e a livre concorrência, desde há muito, verifica-se a existência de

diversas empresas estatais desenvolvendo indevida e injustificadamente atividades

econômicas e em desconformidade com a previsão constitucional.

Essa atuação estatal, como exposto anteriormente, configura-se

inconstitucional, haja vista a ausência de norma regulamentadora do dispositivo constitucional

que estabelece os casos em que o Estado, excepcionalmente, poderia imiscuir-se em área por

ele mesmo reservada à iniciativa privada.

Não fosse suficiente a possibilidade de se verificar a inconstitucionalidade

apontada, motivo suficientemente importante para que se busquem meios de controle da

atuação empresária do Estado, dela decorrem consequências verdadeiramente desastrosas para

o desenvolvimento nacional e com isso, a marginalização da atuação do particular em alguns

segmentos.

O Estado, atuando em desacordo com a própria constituição, acaba por promover uma concorrência ilegal com as empresas particulares, colocando no mercado produtos e serviços nele já ofertados de forma eficiente e em quantidade suficiente, ou ainda impedindo, com sua atuação ou mediante a utilização das políticas públicas implantadas pelos governos, a entrada ou mesmo a permanência de novas empresas do setor privado em algumas áreas da atividade econômica nacional, fenômeno identificado pela doutrina ainda na vigência da Constituição de 1967.63

62 BRITTO, Carlos Ayres. A privatização das empresas estatais, à luz da Constituição. Revista trimestral

de direito público. São Paulo, n. 12, 1996, p. 125. 63 MEIRELLES, Hely Lopes. O Estado e suas empresas. Revista dos tribunais. São Paulo, n. 558, p. 12.

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53

É importante dizer que, já em 1986, a questão da concorrência ilegal entre

empresas estatais e privadas preocupava os doutrinadores. Nesse sentido:

Vê-se, hoje, que as deficitárias empresas estatais (públicas e sociedades de economia mista) continuam abrindo espaços no mercado à custa da absorção dos melhores horários de publicidade na TV, ou páginas nos jornais e revistas, da criação de mercados cativos, dos atrasos nos pagamentos de produtos encomendados ou obras contratadas, dos benefícios da impossibilidade de decretação de sua falência, da irresponsabilidade de suas administrações, não sujeitas, em rigor, a qualquer espécie de controle - pois técnico aquele dos Tribunais de Contas, inexistente o do Poder Legislativo, impossível o do Poder Executivo – razão pela qual a perene violação dos princípios constitucionais que regem a disciplina jurídica da concorrência por parte do Governo, torna seu órgão fiscalizador de eficiência reconhecidamente duvidosa, limitada e comprometida. 64

Conforme disposto anteriormente, a criação de empresa estatal, após a

promulgação do atual texto constitucional e ainda na ausência de Lei complementar

regulamentadora da intervenção estatal no domínio econômico, também gerou a concorrência

ilegal entre empresas estatais e privadas.

Nesse ponto, faz-se necessário analisar quais os mecanismos de controle da

atividade das empresas governamentais existentes, principalmente, nos casos em que sua

atuação implique conduta caracterizada como concorrência ilegal em face da iniciativa

privada. A empresa estatal:

[...] representa exatamente a possibilidade de o Estado se apropriar dos métodos de gestão próprios da iniciativa privada para o desempenho de suas funções, o que significa, em termos jurídicos, a utilização de formas, de institutos de direito privado pelo Poder Público.65

Em contrapartida, recaem sobre ela controles que possibilitam tanto a

fiscalização da adequada aplicação dos recursos públicos investidos na atividade como a

verificação da efetiva perseguição do interesse público que justificou sua criação. Esses

controles são classificados como internos e externos. Sendo assim,   “Interno é o controle

exercido por órgãos da própria Administração, isto é, integrantes do aparelho do Poder

Executivo. Externo é  o  efetuado  por  órgãos  alheios  à  Administração”.66

64 MARTINS, Ives Gandra da Silva. Disciplina jurídica da concorrência: Repressão ao abuso de poder

econômico. Revista dos tribunais. São Paulo, n. 612, 1986, p. 39-40. 65 PEREIRA, Tadeu Rabelo. Regime(s) jurídico(s) das empresas estatais que exploram atividade

econômica. Porto Alegre: Síntese, 2001, p. 82. 66 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 6 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:

Malheiros, 1995, p. 109.

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54

No que tange às empresas estatais, deve-se observar que o controle interno é duplo. O primeiro é realizado por seus próprios órgãos e o segundo, controle interno exterior, pelos órgãos da administração direta, na forma dos arts. 19 e 26 do Decreto-lei 200. As empresas estatais, de acordo com os dispositivos em comento, estão sujeitas à supervisão direta do Ministério ao qual são vinculadas, a quem cabe orientá-las, coordená-las e controlá-las, de modo a assegurar a realização dos objetivos básicos para os quais foi a empresa constituída, promovendo a harmonização do seu comportamento com a política e a programação governamentais, promover sua eficiência administrativa e garantir sua autonomia administrativa, financeira e operacional.67

Relativamente ao controle externo das atividades das estatais, este pode se

efetivar a) pelo controle parlamentar direto; b) pelo controle exercido pelo Tribunal de Contas

e c) pelo controle jurisdicional. O Congresso Nacional, diretamente ou por qualquer de suas

casas, é o órgão responsável pelo controle parlamentar direto da atividade das empresas

estatais (art. 49, X, CF). Cabe a ele, Congresso Nacional, sustar os atos normativos do Poder

Executivo que exorbitem do Poder Regulamentar ou dos limites de delegação legislativa (art.

49, V, CF), assim como sustar os contratos eivados de nulidade, a pedido do Tribunal de

Contas (art. 71, §1º, CF). 68

Além disso, poderá, por meio de qualquer de suas casas ou comissões,

convocar Ministro de Estado ou quaisquer titulares de órgãos diretamente subordinados à

Presidência da República para prestarem, pessoalmente, informações sobre assunto

previamente determinado, importando em crime de responsabilidade, a ausência sem

justificação adequada (art. 50, caput, CF).

Ademais, poderá, através das mesas da Câmara dos Deputados e do Senado

Federal, encaminhar pedidos escritos de informação a Ministros de Estado ou a qualquer das

pessoas referidas no caput do art. 50, CF, importando em crime de responsabilidade a recusa,

ou o não atendimento, no prazo de trinta dias, bem como a prestação de informações falsas

(art. 50, §2º, CF).

As comissões permanentes de qualquer das Casas Legislativas, por sua vez

e relativamente às matérias de suas respectivas competências, poderão receber petições,

reclamações, representações ou queixas de qualquer pessoa contra atos ou omissões das

autoridades ou entidades públicas e, ainda, solicitar depoimento de qualquer autoridade ou

cidadão (art. 58, §2º, IV e V, CF).

67 Idem., Op. Cit.,. p. 101. 68 Ibidem., Op. Cit., p. 111.

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O controle parlamentar direto ainda pode ser exercido, para fins de apuração

de fato determinado e por tempo certo, pelas Comissões Parlamentares de inquérito (CPIs)

que, uma vez constituídas por qualquer das Casas ou por ambas, conjuntamente, têm poderes

de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos

das respectivas Casas. Suas conclusões, quando for o caso, poderão ser encaminhadas ao

Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores (art.

58, §3º, CF).

Observe-se que a constituição das CPIs depende do requerimento de um

terço dos membros da Casa ou do Congresso, no caso de se pretender a formação de uma CPI

mista (art. 58, §3º, CF).

De forma mais específica, o Senado Federal exerce esse controle mediante o

uso de sua competência privativa para dispor sobre limites globais e condições para as

operações de crédito externo e interno da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos

Municípios, de suas autarquias e demais entidades controladas pelo Poder Público federal (art.

52, VII, CF).

O controle externo também pode ser exercido pelo Congresso Nacional,

com o auxílio do Tribunal de Contas da União (art. 71, CF), que é integrado por nove

Ministros e tem sede no Distrito Federal, quadro próprio de pessoal e jurisdição em todo

território nacional (art. 73, CF).

Dentre as suas funções, importa para os fins a que se destina esta pesquisa,

principalmente, a de julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por

dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e

sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem

causa e perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público e a de

apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal a qualquer título,

na administração direta e indireta (art. 71, II e III, CF).

Ressalta-se que as disposições constitucionais referentes ao Tribunal de

Contas da União aplicam-se, no que couber aos Tribunais de Contas dos Estados federados,

do Distrito Federal e dos Municípios (art. 75, CF).

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56

Constituição de 1967, ao contrário da atual, não continha previsão expressa nesse sentido, possibilitando o surgimento de controvérsia sobre o assunto que somente teve fim com o advento da L. nº 6.223/75 que, em seu art. 7º, estabeleceu a submissão   das   “entidades   públicas   com   personalidade   jurídica   de   direito   privado,  cujo capital pertença, exclusiva ou majoritariamente, à União, ao Estado, ao Distrito Federal ao Município ou a qualquer  entidade  da  respectiva  administração  indireta”  à  ação do respectivo Tribunal de Contas.69

O controle jurisdicional, por sua vez, se dá quando o Poder Judiciário, a

requerimento do interessado, controla a legitimidade dos comportamentos da Administração

Pública in concreto. Esse controle poderá ser provocado com a propositura de ações menos

específicas, tais como ação indenizatória e ações cautelares em geral. Mas a própria

Constituição prevê medidas que têm como fim especial o de enfrentar atos ou omissões de

autoridades públicas que são o mandado de segurança, a ação popular e a ação direta de

inconstitucionalidade.

A utilização da Ação Popular se justifica pelo disposto no art. 5º, inc.

LXXIII, da Constituição Federal, que estabelece que qualquer cidadão é parte legítima para

propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que

o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e

cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da

sucumbência.

Cumpre mencionar que o art. 1º, da Lei nº 4.717 de 29 de junho de 1965, foi

recepcionado pelo atual texto constitucional, por sua total compatibilidade com ele e

estabelecendo interpretação legal para a expressão constitucional entidades, de que o Estado

participe e que deve corresponder às sociedades de economia mista, empresas públicas e

empresas incorporadas ao patrimônio da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos

Municípios, como prevê este instituto da Ação Popular.

Talvez seja essa a única providência judicial realmente temida pelos

administradores, em razão de prever, em caso de sua procedência, a condenação do

responsável pela prática do ato impugnado e dos que dele se beneficiarem ao pagamento de

perdas e danos (art. 11).70

69 PEREIRA, Tadeu Rabelo. Regime(s) jurídico(s) das empresas estatais que exploram atividade

econômica. Porto Alegre: Síntese, 2001, p. 135. 70 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 6. ed. rev. atual. e ampl.

São Paulo: Malheiros, 1995, p. 119.

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Relativamente ao Mandado de Segurança como forma de controle das atividades das empresas estatais, é de se ressaltar que a sujeição desses entes ao regime jurídico privado, inclusive quanto aos seus direitos e obrigações civis, comerciais e trabalhistas, nos termos do art. 173, §1º, CF, diminui consideravelmente a possibilidade da prática de atos passíveis de serem objeto do writ.71

Nesse ponto, é de se questionar a isenção do Conselho Administrativo de

Defesa Econômica (CADE) para o julgamento dos casos em que o controle das atividades

empresárias estatais relativamente ao exercício do poder econômico que possuem, tendo em

vista que, apesar de constituir-se em uma autarquia especial na qual os conselheiros têm

mandato não coincidente com o do Presidente da República, sua autonomia em relação ao

Poder Executivo é bastante questionável.

Apesar de as empresas estatais, por determinação constitucional, receberem

tratamento o mais assemelhado possível com o que é dado às empresas privadas, como já

exposto, os conselheiros do CADE, assim como o seu presidente, são nomeados pelo

Presidente da República após prévia aprovação do Senado Federal (art. 4º, L. nº 8.884 de 11

de junho de 1994). Além disso, as decisões do conselho não recebem a proteção da coisa

julgada, podendo ser levadas à discussão novamente, perante o Poder Judiciário. Tais fatores

colocam a autonomia e a imparcialidade do órgão administrativo em questão, levando-o ao

descrédito perante a iniciativa privada.

Para fins de se evitar ingerências de cunho político no CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica), principal órgão nacional de repressão ao abuso do

poder econômico visando o não cumprimento de suas funções, recomenda-se a reforma do

sistema de defesa da concorrência pátria no sentido de dotar o órgão em questão de autonomia

plena e, simultaneamente, de poderes para o julgamento das questões atinentes à infração da

ordem econômica de forma monopolizada, ou seja, sem que haja a possibilidade de exame da

matéria pelo Poder Judiciário.

Assim, ficariam solucionadas tais questões, por um órgão judicante

especializado na matéria, o que, além de repercutir favoravelmente junto aos agentes

econômicos, aumentando o grau de confiabilidade e estabilidade do mercado, facilitaria e

baratearia os custos dos investimentos nos mais diversos setores da economia nacional.

71 PEREIRA, Tadeu Rabelo. Regime(s) jurídico(s) das empresas estatais que exploram atividade

econômica. Porto Alegre: Síntese, 2001, p. 143.

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Outra consequência benéfica da adoção dessa sugestão seria a de diminuir o

número de processos que chega ao Poder Judiciário, outro problema relevante no cenário

brasileiro que também tem sérias repercussões econômicas e sociais, mas que, por não ser

objeto desta pesquisa, e por ensejar a realização de outro trabalho tão ou mais extenso quanto

esse, toma-se apenas por referência.

O tema da concorrência ilegal entre empresas estatais e iniciativa privada

tem sido objeto de diversas discussões no CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica), por exemplo, sendo mesmo alarmante a quantidade de casos em que a Petrobrás

e suas subsidiárias têm sido investigadas ou representadas; ora sob a acusação de formação de

cartel72, ora de prejudicar a livre concorrência, por criar dificuldade ao funcionamento e

desenvolvimento da empresa representante, mediante a venda de mercadorias abaixo do preço

de custo73, dentre outras condutas anticoncorrenciais.74

No entanto, além dos casos acima mencionados, de patente abuso do poder

econômico exercido pelas empresas governamentais, também é configurador da hipótese de

concorrência ilegal o fato de a atividade empresária estatal ser desenvolvida ou continuar

sendo desenvolvida – em competição com a iniciativa privada, sem que estejam presentes os

requisitos constitucionais, o que impede que outros agentes econômicos adentrem no mercado

ou nele permaneçam, colocando em risco a livre concorrência, a livre iniciativa, a economia

de mercado e, por fim, o desenvolvimento nacional.

Quanto aos mecanismos jurídicos para fazer cumprir o disposto no art. 173,

CF, parece ser um consenso, entre os doutrinadores, que a privatização das empresas estatais

que não atendam aos seus requisitos seja a melhor saída.

Nesse sentido:

Sem dúvida que uma das formas de retirar o Estado do lugar onde não mais lhe cabe, em razão de uma mudança constitucional, é a privatização. Tenha-se presente que a privatização não é um mero mecanismo de obtenção de receitas, ou de combate à ineficiência do Estado em setores onde sua atuação foi predatória; trata-se de uma imposição constitucional, já que os limites de intervenção do Estado na ordem econômica estão traçados na Lei Maior. Urge que se corrija a anomalia do gigantismo do Estado e este é o objetivo primordial da privatização: devolver à iniciativa privada um espaço que, em situação de normalidade, lhe compete, retornando o Estado aos limites constitucionalmente aceitos. a fim de que possa exercer mais adequada e eficientemente as suas funções essenciais e precípuas. Se as

72 Averiguação Preliminar nº 08012.006844/2000-45. 73 Processo Administrativo nº 08000.020939/1996-17. 74 Averiguações Preliminares nºs 08012.004258/2000-02, 08012.009542/1998-99, 08012.005906/2000-0,

08012.005757/1998-11 e os Processos Administrativos nºs: 08000.19459/1996-96, 08000.004451/1993-8, 0047/1992.

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empresas estatais estão fora dos pressupostos constitucionalmente fixados devem ser privatizadas, ainda que seu desempenho seja eficiente e rentável. Afinal não é o lucro o que está em jogo, mas uma restrição constitucional traçada para a atuação estatal interventiva. O desrespeito a estes limites é a negação do próprio Estado de Direito. Pode-se afirmar que, na atual conjuntura. a privatização é uma medição da aplicação da nossa Constituição. O intruso envolvimento do Estado em setores estranhos às suas atividades gera seu próprio imobilismo burocracia cria privilégios e distorções econômicas difíceis de serem corrigidas a curto prazo75.

Nesse caso, ela se dará pela transferência da titularidade de ações, ou seja,

do controle acionário, à iniciativa privada, mediante a sua venda na bolsa de valores ou fora

dela.76 Um típico caso de concorrência ilegal entre empresa estatal e empresa privada é o da

atuação concorrencial e ao mesmo tempo deficitária do Estado no domínio econômico.

Quando   o   “Estado   atua   deficitariamente   no   domínio   do   mercado,   está

competindo deslealmente com os agentes privados, substituindo-os, pois: prejudica os que já

atuam no mercado e impede a entrada de novos empreendedores privados”.77

Nesse sentido é que se pode afirmar que, na atual conjuntura e apesar de o

Estado brasileiro já ter realizado profundas modificações no modo pelo qual atua no domínio

econômico, diminuindo sobremaneira os níveis de intervenção concorrencial, existem

diversos exemplos de empresas estatais em atividade, dentre as quais a IMBEL –INDÚSTRIA

DE MATERIAL BÉLICO DO BRASIL, que acabam por competir de forma desleal com os

agentes privados na medida em que impedem a entrada de novos atores no cenário nacional.

Por outro lado, existem também aquelas que, como a NUCLEP- NUCLEBRÁS

EQUIPAMENTOS PESADOS S.A, prejudicara a atividade do setor privado, ao ocuparem no

mercado espaço que não lhe é reservado constitucionalmente.

Diante destas situações lesivas ao patrimônio público, é dever do Estado

atuar como agente interventor das atividades econômicas e comerciais, na medida em que,

passa a regularizar tais incidentes concorrenciais diminuindo, assim, a perpetuidade de

práticas abusivas e desleais.

75 GROTTl, Dinorá Adelaide Musetti. Intervenção do Estado na economia. Revista Trimestral de Direito

Público. São Paulo, n. 14, 1986, p. 60. 76 MUKAI. Toshio. Perfil constitucional das empresas estatais - privatização - terceirização. Revista dos

Tribunais - Cadernos de direito constitucional e ciência política. São Paulo, n. 03, p. 225. 77 REDI, Maria Fernanda de Medeiros. Sociedades de economia mista e lucratividade – Instituto de resseguros

do Brasil – IRB: Um exemplo real. Revista trimestral de direito público. São Paulo, n. 33, 2002, p. 194.

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3.3 A INTERVENÇÃO ESTATAL POR MEIO DA FISCALIZAÇÃO: O SISTEMA

BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA

A intervenção do estado no setor econômico pode ser entendida como uma

interferência deste no setor privado, pois não há razão falarmos de intervenção do estado em

setores nos quais ele possua monopólio.

A intervenção do Estado o capacitou a regular a economia, permitindo a inauguração da fase do dirigismo econômico, em que o Poder Público produz uma estratégia sistemática de forma a participar efetivamente dos fatos econômicos. 78.

O foco deste trabalho refere-se ao poder fiscalizador interventivo do Estado

na economia e seus respectivos instrumentos. Entretanto, é necessário fazer uma abordagem

inicial no que concerne a este poder de intervenção do Estado na economia e nas diretrizes

empresariais. Assim, para Celso Antônio Bandeira de Mello:

[...] A intervenção do Estado pode ocorrer sob três aspectos: o primeiro ocorre mediante o exercício do poder de polícia, de forma fiscalizadora e regulamentadora; por segundo o estado intervém quando atua diretamente na realização de atividades econômicas, sendo que neste caso, somente será permitido com fundamento na segurança nacional ou por relevante interesse público; por último, considera também como intervenção a atuação do estado mediante incentivos à iniciativa privada. 79

Eros Roberto Grau 80 também classifica a intervenção sob três formas, mas

com enfoque distinto, considera: a) intervenção por absorção ou participação, b) intervenção

por direção e c) intervenção por indução. Sendo que estas formas podem ser sistematizadas

conforme duas formas de atuação do Estado, seja intervenção no domínio econômico ou

intervenção sobre o domínio econômico.

A intervenção no domínio econômico ocorre quando o estado desenvolve

atividades como sujeito econômico, participando diretamente das atividades econômicas,

sejam públicas ou privadas. Este tipo de intervenção poderá ocorrer por absorção ou por

participação, a primeira se identifica como aquela em que o estado assume a exclusividade de

78 FERREIRA, Sérgio de Andréa. Direito Administrativo Didático. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 258

apud CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 17 ed. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007, p. 780.

79 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 20 ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 749.

80 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 8 ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 126.

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exercer determinada atividade sob a forma de monopólio, já a segunda refere-se à

participação do Estado na economia de forma concorrente ao setor privado.

A intervenção sobre o domínio econômico o estado é responsável por

regular e normatizar as atividades econômicas. Grau81 esclarece que a intervenção sobre o

domínio econômico pode ocorrer de duas formas: por direção ou por indução. A intervenção

por direção consiste na elaboração de normas obrigatórias de comportamento e respectivas

sanções em face de seu descumprimento. Enquanto na intervenção por indução o Estado não

atua mediante normas impositivas, mas pelo contrário, elabora regras facultativas que

estimulam ou desestimulam determinados comportamentos, os quais o Estado considera como

importantes para economia do país.

Neste sentido, o Estado diante de seu papel normatizando e regulando as

condutas, deve criar disposições legais visando que, as atividades econômicas se desenvolvam

de forma satisfatória, atendendo aos princípios do art. 170 da Constituição Federal82, tendo em

vista a perseguição da justiça social.

Destaca-se a partir daqui a função fiscalizatória do Estado no exercício de

sua atividade normativa e regulatória da economia. O caráter fiscalizador do Estado consiste

em observar se os agentes econômicos estão atuando conforme os preceitos normativos. Para

Eros Roberto Grau83 fiscalizar  “significa  prover  a  eficácia  das  normas  produzidas  e  medidas  

encetadas, pelo Estado, no sentido de regular a atividade econômica”.

O  caráter  fiscalizatório  “implica  a  verificação  dos  setores  econômicos  para  o  

fim de serem evitadas formas abusivas de comportamentos de alguns particulares, causando

gravames a setores menos favorecidos, como consumidores, os hipossuficientes etc”  84.

Importante ressaltar que para a efetivação da fiscalização no setor

econômico é necessário e indispensável à existência de normas e regulamentos que

disciplinam as atividades econômicas, bem como a intervenção do Estado na iniciativa

privada. De acordo com José Afonso da Silva85:

81 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 8 ed. São Paulo: Malheiros, 2003,

p. 128. 82 BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado

Federal: Centro Gráfico. 83 GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 8 ed. São Paulo: Malheiros, 2003,

p. 128. 84 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 17 ed. Rio de Janeiro: Lúmen

Júris, 2007, p. 784. 85 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 25 ed. São Paulo: Malheiros, 2005,

p. 808.

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A fiscalização, como toda fiscalização, pressupõe poder de regulamentação, pois ela visa precisamente controlar o cumprimento das determinações daquele e, sendo o caso, apurar responsabilidades e aplicar penalidades cabíveis. Não fora assim o poder de fiscalização não teria objeto.

A normatização e regulamentação desta fiscalização são de responsabilidade

do Estado, seja no âmbito federal, estadual e municipal, tendo em vista a competência ser

concorrente, conforme art. 24, inciso I da Constituição Federal.

Na ocorrência de violações e desvios das condutas dos particulares à ordem

econômica, o Estado, através dos seus órgãos deve possuir condições e mecanismos para atuar

em defesa da sociedade, encontrando e corrigindo as distorções do sistema, identificado como

Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência.

Neste sentido, a este Sistema compete verificar e coibir o abuso do poder

econômico, a concorrência desleal, a formação de cartéis e quaisquer outras formas

prejudiciais ao bom andamento do mercado.

Interessante salientar que a construção deste sistema de intervenção, em

especial no seu aspecto fiscalizatório é um processo longo e contínuo. A primeira Lei

antitruste foi o Act for the Prevetion and Supression of Combinations Formed in Restraint of

Trade, de 1889, do Canadá: em face da existência de inúmeras barreiras alfandegárias criadas

a partir de 1879 ocasionou na supressão da concorrência externa, sendo assim necessária a

adoção de medidas antitrustes. Porém, a Lei que exerceu maior influência aos ordenamentos

antitrustes pelo mundo foi a Lei americana de 1890, conhecida como Sherman Act.

No caso do Brasil pode-se mencionar como marco inicial a Constituição de

1934 que inseriu pela primeira vez um capítulo destinado à Ordem Econômica e Social.

Constata-se também, que a atividade empresarial do Estado começa a despontar,

principalmente através da monopolização estatal de algumas atividades consideradas como

essenciais ao interesse público.

Foi à luz da Constituição de 1934, sob o governo de Vargas, conhecido

como Estado Novo que houve a consagração do modelo de concentração regulatória, o Estado

como interventor da Economia, sendo que, ao mesmo tempo em que promoveu concentração

regulatória, normatizou diversos setores de atividades econômicas, por exemplo, o setor

minerário. Entretanto, ressalta-se que a Constituição limitava a tratar da monopolização de

atividades do Estado, da proteção a economia popular, pouco importando a repressão ao

abuso econômico e o direito concorrencial, fato que somente viria sofrer alteração com a

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Constituição de 1946. A Constituição de 1937, imposta ao país por Vargas determinava em

seu art. 135:

A intervenção do Estado no domínio econômico só se legitima para suprir as deficiências da iniciativa individual e coordenar os fatores da produção, de maneira a evitar ou resolver os seus conflitos e introduzir no jogo das competições individuais o pensamento dos interesses da Nação, representados pelo Estado. A intervenção no domínio econômico poderá ser mediata e imediata, revestindo a forma do controle, do estimulo ou da gestão direta. 86

Neste fundamento, foram postas em execução várias políticas

intervencionistas relevantes ao interesse nacional, criou-se a política de preços e

abastecimentos destinada a reprimir os atos contrários à economia popular; o código das

águas a fim de regular o aproveitamento dos recursos hídricos; e ainda, a edição do primeiro

texto normativo referente à preservação da liberdade de concorrência (Decreto-lei n. 869, de

18 de novembro de 1938)87.

No que se refere a este Decreto, embrião do direito concorrencial no Brasil

codificou diversas condutas contrárias à livre concorrência, o que certamente foi um grande

avanço. Por outro lado, esta Lei não trouxe em seu bojo a criação de um órgão responsável

pela sua fiscalização e aplicação, que certamente enfraqueceu e até mesmo anulou a sua

efetivação prática.

Tão-somente em 1945, com a edição da chamada Lei Malaia (Decreto-lei n.

7.666, de 22 de junho) foi criado a Comissão Administrativa de Defesa Econômica, a CADE,

com a competência para julgar empresas acusadas de práticas lesivas à economia, exercer o

controle sobre as incorporações, fusões ou transformações de empresas, além de ser

responsável por fiscalizar a execução dos serviços públicos concedidos pelo Estado.

Infelizmente este órgão, teve curta duração, suas atividades perduraram por menos de um ano,

tendo em vista o fim do governo Vargas.

A Constituição de 1946, apesar de constar garantias sociais, é marcada por

forte influência dos princípios do liberalismo econômico e político, apresentando-se de forma

totalmente contrária aos ideais intervencionistas, o que é possível constatar pela leitura do art.

146   do   texto   constitucional:   “A   União   poderá,   mediante   Lei especial, intervir no domínio

86 BRASIL, Constituição Federal (1937). Artigo 135. Disponível em:

<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao37.html>. Acesso em: 08 dezembro de. 2013. 87 BRASIL. Decreto-lei nº 869 de 18 de Novembro de 1938. Define os crimes contra a economia popular, sua

guarda e seu emprego. Rio de Janeiro, 18 nov. 1938.

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econômico e monopolizar determinada indústria ou atividade. A intervenção terá por base o

interesse  público  e  por  limite  os  direitos  fundamentais  assegurados  nesta  Constituição”  88.

Por outro lado, o texto constitucional de 1946 estabeleceu grande avanço ao

controle e a fiscalização da economia, estipulando que a Lei reprimirá os abusos do poder

econômico, entretanto esta Lei não fora editada, impossibilitando assim, o enfrentamento e a

punição aos casos de abuso de poder econômico.

Art. 148. A Lei reprimirá toda e qualquer forma de abuso do poder econômico, inclusive as uniões ou agrupamentos de empresas individuais ou sociais, seja qual for a sua natureza, que tenham por fim dominar os mercados nacionais, eliminar a concorrência e aumentar arbitrariamente os lucros.89

Com a volta de Vargas ao governo, em 1951, com ele retomou-se o caráter

intervencionista econômico, o nacionalismo e as políticas voltadas para industrialização.

Interessante destacar neste período, a instituição da Lei de Defesa da Economia Popular, a Lei

n. 1.521, de 26 de dezembro de 1951, a qual descrevia como crime ou contravenção certas

práticas comerciais.

Após o suicídio de Vargas, Kubitschek assumiu, mantendo a política de

crescimento econômico com apoio estatal, desenvolvendo um modelo econômico

desenvolvimentista de substituição das importações. Na área concorrencial não teve grandes

avanços, não normatizando a função fiscalizadora da atuação interventora do Estado.

Somente no governo de João Goulart, ainda sob a vigência do Texto de

1946, com fundamento no art. 148, já citada acima, fora editada a Lei necessária ao combate

do abuso do poder econômico, a Lei n. 4.137, de 10 de setembro de 1962, sendo que a mesma

vigorou até 1994, revogada pela Lei n. 8.884, de 11 de junho de 1994.

No que tange esta Lei, menciona-se como fator negativo a estipulação

taxativa de quais seriam as formas de abuso do poder econômico, contrariando a Constituição

vigente que determinada que a Lei devesse reprimir toda e qualquer forma de abuso ao poder

econômico.

88 BRASIL. Constituição (1946) Constituição dos Estados Unidos do Brasil. Rio de Janeiro, 1946.

Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao46.htm>. Acesso em 24 out. 2012.

89 Idem., Op. cit.

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65

A Lei 4.137, de 10 de setembro de 1962, considerava como abuso do poder

econômico: dominar os mercados nacionais ou eliminar total ou parcialmente a, concorrência;

elevar sem justa causa os preços, no caso de monopólio natural ou de fato, com o objetivo de

aumentar arbitrariamente os lucros sem aumentar a produção; provocar condições

monopolísticas ou exercer especulação abusiva com o fim de promover a elevação temporária

de preços; formar grupo econômico, por agregação de empresas, em detrimento da livre

deliberação dos compradores ou dos vendedores; exercer concorrência desleal.

A referida Lei, recriou Conselho Administrativo de Defesa Econômica –

CADE, órgão vinculado à Presidência do Conselho de Ministros, com a incumbência de

apurar e reprimir os abusos do poder econômico.

O CADE, no modelo da Lei n. 4.137, tinha função semi-jurisdicional, e, apesar do nome   “conselho”,   nunca   teve   função   opinativa.   Era   um   tribunal   administrativo   e  suas competências envolviam poderes de investigação sobre práticas restritivas do comércio, podendo exigir que as empresas lhe apresentassem livros e documentos contábeis e que seus dirigentes lhe prestassem esclarecimentos. Além disso, detinha prerrogativas de impor sanções àqueles que descumprissem os preceitos legais 90.

O regime militar que teve início a partir de 1964 é marcado pela

manutenção do caráter interventivo na economia, principalmente referente à atuação do

Estado como empresário. A Constituição de 1967, seguindo doutrina ditatorial previu nos

arts. 156 a 166 várias formas para o exercício do controle do Estado sobre a economia,

mantendo em vigor a Lei n. 4.137, de 10 de setembro de 1962.

Considera-se que, devido à política de substituição de importações, adotado

por quase todos os governos brasileiros pós 1934, tendo o Estado assumido a função de

empresário e a de buscar o fortalecimento da economia e das empresas nacionais, pouco se

importou com mecanismos de repressão a práticas anticoncorrenciais.

Por fim, ressalta-se a Constituição vigente, que dispôs de maneira diferente

no que se refere ao aspecto concorrencial, deixando de reprimir toda e qualquer forma de

abuso econômico para limitar-se a repressão ao abuso do poder econômico que vise à

dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros.

Além de expressar de forma clara as funções que o Estado desenvolverá a fim de regular e

normatizar a atividade econômica.

90 AGUILLAR, Fernando Herren. Direito Econômico: do direito nacional ao direito supranacional. 2 ed.

São Paulo: Atlas, 2009, p. 157.

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Seguindo os delineamentos da Constituição Federal de 1988, fora editado

em 11 de junho de 1994, a Lei n. 8.884, em substituição ao texto antitruste de 1962 (Lei n.

4.137, de 10 de setembro), além da Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, que trata da

tutela penal concorrencial e do art. 195 da Lei n. 9.279, de 14 de maio de 1996, referente ao

crime de concorrência desleal e atualmente seguem novos dispositivos concorrenciais na Lei

12.529, de 30 de novembro de 2.011 que dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações

contra a ordem econômica.

Conclui-se   que   “o   direito   concorrencial   no   Brasil   somente   veio a se

fortalecer com a mudança de perfil regulatório, na década de 1990, que passou a privilegiar a

competição   como   instrumento   de   controle   de   preços   e   qualidade   de   bens   e   serviços”.91

Adiciona-se a estes fatores à estabilização da moeda, o incremento da política de

privatizações, da abertura da economia e a globalização, os quais se tornaram essencial a

existência de uma nova política de defesa da concorrência.

91 AGUILLAR, Fernando Herren. Direito Econômico: do direito nacional ao direito supranacional. 2 ed.

São Paulo: Atlas, 2009, p. 259.

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4 SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA E A ATUAÇÃO DO CONSELHO ADMINSTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA - CADE

O Brasil reestrutura-se diante das novas definições globais de convivência

concorrencial e, portanto, tornou-se imperativo, para a garantia do comércio e dos

consumidores, que as relações negociais estivessem amparadas e protegidas por Lei e pela

legalidade das condutas comerciais.

Neste contexto a evolução normativa nacional fez-se como medida sine qua

non para a efetividade da concorrência leal e prosperidade empresarial. Sendo assim:

O Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC) é responsável pela promoção de uma economia competitiva, por meio da prevenção e da repressão de ações que possam limitar ou prejudicar a livre concorrência no Brasil, sendo sua atuação orientada pela Lei nº 8.884, de 11 de junho de 1994. 92

A política pública de proteção da ordem econômica, na esfera da defesa da

concorrência, é realizada, no âmbito administrativo, pelo denominado Sistema Brasileiro de

Defesa da Concorrência, que é composto pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica

(CADE), pela Secretaria de Direito Econômico (SDE) e pela Secretaria de Acompanhamento

Econômico (SEAE). Sendo, a estes órgãos distribuídas as atribuições de julgar, aplicar,

fiscalizar e supervisionar as políticas públicas de proteção à ordem econômica, na esfera da

defesa da concorrência.

Como verificar-se-á, a atuação do Sistema Brasileiro de Defesa da

Concorrência poderá ser feito de duas maneiras: a) pelo controle de conduta b) pelo controle

de estrutura, sendo que o controle de conduta cuida da repressão do abuso do poder

econômico, sancionando condutas anticoncorrênciais, enquanto o controle de estrutura visa a

prevenção, ao evitar que a concentração empresarial econômica gere o aumento de poder

econômico, que facilite da prática futura condutas desleais.

Carece de sentido sob qual forma de controle seria o mais importante. Caso

a atividade do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência restringisse indefinidamente a

repressão das condutas, a conformação de estruturas de mercados não competitivas

aumentaria a frequência de infrações à ordem econômica, frustrando parcial ou totalmente a

92 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC) Disponível em::

<http://www.mj.gov.br/sde/data/Pages/MJ29715BC8ITEMIDCEF35B5AB2E84F6A8CA8858B129BB4EFPTBRIE.htm>. Acesso em 13 out. 2012.

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atuação do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Por outro lado, negligenciar a

repressão às condutas equivaleria a abandonar a própria razão ao deserdo controle de

estrutura, que é coibir o abuso do poder econômico.

4.1 O FUNCIONAMENTO ADMINISTRATIVO PARA GARANTIR A DEFESA DA

CONCORRÊNCIA

O fluir do tempo demonstrara, no entanto, que a ausência de uma entidade

regulatória do mercado, não seria salutar, na medida em que diversas seriam as situações onde

os mecanismos livres do mercado não teriam as condições de corrigir as falhas surgidas.

Destarte, incorrendo na circunstância onde a competição entre os agentes econômicos tornara-

se desequilibrada em razão de expedientes externos ao livre jogo das forças do mercado, então

caberia ao Estado agir, regulando as atividades econômicas. Isto significa que a livre

concorrência, per se, não se garantiria; o mecanismo de concorrência seria frágil e como tal

assegurá-lo seria uma função estatal.

Objetivando o direcionamento da lealdade de mercado e o cumprimento da

função social da propriedade nas relações empresariais, fundamental seria estabelecer

condições criteriosas na salvaguarda dos direitos concorrenciais. Em outros termos,

imprescindível a intervenção administrativa estatal na economia, para adequar os

comportamentos dos sujeitos econômicos de maneira a prestigiar a liberdade econômica e

também realizar os fins constitucionais consagrados à ordem econômica.

Assim, notada a relevância da regularização das condutas e a intervenção

indireta na atividade econômica identificada por meios administrativos e extrajudiciais,

apenas de enquadramento, de orientação e de limitação da atividade empresarial, em que, o

Estado fiscalizador, operaria para conter os atos abusivos e lesivos à sociedade podendo

efetivar a fundamentação principiológica pré-existente.

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69

4.1.1 DOS ÓRGÃOS DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA

Tendo em vista, a necessidade da atuação dos órgãos governamentais e da

complexidade pertinente à administração e fiscalização das atividades empresariais na defesa

da livre concorrência e dos direitos do consumidor, o Sistema Brasileiro de Defesa da

Concorrência desmembrara as suas atividades em diversas linhas de atuação que seguiram o

ideário de descentralização para a atuação mais democrática. Sendo assim, o Conselho

Administrativo de Defesa Econômica (CADE), o órgão judicante com jurisdição em todo

território nacional, criado pela Lei 4.137 em 10/09/196293, consta como órgão de destaque,

dentre outras, a função de decidir sobre a existência de infração a ordem econômica e aplicar

a penalidade prevista em Lei; decidir os processos instaurados pela Secretaria de Direito

Econômico; decidir o recurso de ofício do Secretário da Secretaria de Direito Econômico;

ordenar providências que conduzam à cessação de infração à ordem econômica; aprovar os

termos do compromisso de cessação de prática e do compromisso de desempenho; apreciar

em grau de recurso as medidas preventivas adotadas pela Secretaria de Direito Econômico

requerer a execução de suas decisões ao Poder Judiciário entre outras.

Fora transformado em Autarquia Federal pela Lei 8.884, de 11 de junho de

1994, possibilitando-lhe maior autonomia na função básica de prevenir e reprimir práticas

anticoncorrenciais. Vale ressaltar, que o CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica) pertencia ao Poder Executivo, portanto, não possuindo nenhum poder

jurisdicional, pois este era privativo do Poder Judiciário, conforme art. 92 Constituição

Federal. Sua área de atuação alcançava todo o território nacional, do maior Estado ao menor

município. Suas decisões possuiam uma natureza administrativa e estando sujeitas à revisão

administrativa e judicial, por força dos incisos XXXV e LV do art. 5º da Constituição Federal.

O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) fora composto

por 7 (sete) conselheiros escolhidos, sendo que, para ser conselheiro seriam necessários os

seguintes requisitos: ser cidadão com mais de 35 (trinta e cinco anos), de notório saber

jurídico ou econômico e reputação ilibada, seria nomeado pelo Presidente da República,

depois de aprovado pelo Senado Federal para o mandato de 2 (dois) anos, permitida uma

recondução.

93 BRASIL. Lei nº 4.137 de 10 de setembro de 1962. Regula a repressão ao abuso do poder econômico.

Disponível em: <http://www81.dataprev.gov.br/SISLEX/paginas/42/1962/4137.html>. Acesso em: 22/10/2012.

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70

As atribuições do presidente do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica) seriam entre outras: representar a Autarquia em juízo e fora dele; presidir e votar,

inclusive de qualidade, as reuniões do plenário; cumprir e fazer cumprir as decisões; assinar

os compromissos de cessação de infração de ordem econômica e os compromissos de

desempenho; determinar à Procuradoria as providências judiciais para a execução das

decisões do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).

No que dizia respeito ao poder do voto de qualidade, que teria direito o

presidente da Autarquia, existia uma polêmica, mas tal fato fora confirmado à legalidade após

suscitada pelo STJ em recurso Especial de nº 966. 930, tendo como relatora a Ministra Eliana

Calmon.

A perda do mandato de Conselheiro do CADE (Conselho Administrativo de

Defesa Econômica) somente aconteceria em razão de decisão do Senado Federal por

provocação do Presidente da República ou em razão de condenação penal irrecorrível por

crime doloso ou de processo disciplinar de conformidade com o que prevê a Lei nº 8.112, de

11 de dezembro de 1990 e a Lei 8.429, de 2 de junho de 1992, ou por infringência de

quaisquer das vedações previstas no art. 6º da Lei 8.884/94. Também perderia o mandato se

faltasse 3 (três) reuniões ordinárias consecutivas ou 20 (vinte) intercaladas, ressalvados os

afastamentos temporários autorizados pelo Conselho. Ressalta-se que o mandato seria uma

garantia do Conselheiro visando coibir as incursões políticas e administrativas perniciosas ao

seu desempenho.

O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) é um órgão de

Estado e não de Governo, por isso, no exercício da função pode contrariar o governo que não

lhe traria consequências. A ele competia a defesa da política de Estado que eram consagradas

pela Constituição Federal e não de Governo que muitas vezes seriam definidas através de

partido político. Ademais, a concorrência seria um bem, com um valor da perspectiva pública

da sociedade e não de um governo, por isso a política é de Estado. Sobre o tema, o

STF (Supremo Tribunal Federal) pelo voto do Ministro Nélson Jobim, em julgamento da

ADIN 1.949-RS, afirmara que não existia em relação aos seus conselheiros a exoneração

imotivada. Neste contexto, a Procuradoria do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica) possuía uma Procuradoria própria com as seguintes atribuições: prestar assessoria

jurídica ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e defendê-lo em juízo;

promover a execução judicial de suas decisões e julgados; requerer com autorização do

plenário medidas judiciais visando à cessação de infrações da ordem econômica; promover

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acordos judiciais nos processos relativos a infrações contra a ordem econômica mediante

autorização do plenário ouvido o Representante do Ministério Público Federal; emitir parecer

nos processos do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e zelar pelo

cumprimento da Lei 8.884/9494.

O fato de a coletividade ser titular dos bens jurídicos protegidos pela Lei

8.884/94 autorizava, nos termos do art. 12 a atuação do MPF (Ministério Público Federal) nos

processos sujeitos a apreciação do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica),

tanto os referentes as infrações contra a ordem econômica, quanto os concernentes aos atos de

concentração.

A intervenção do Ministério Público Federal (MPF) era obrigatória, tanto na

defesa de interesses coletivos quanto o  “custos  legis”.  Para  intervenção  do  MPF  seguiam-se as

regras do art. 84 do CPC (CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL) e art. 18, II, h da Lei

Complementar 75/83.

Em comentário a Lei 8.884/94, a doutrina entendia que o MPF (Ministério

Público Federal) deveria ter vista após a manifestação de todas as partes obrigatórias,

inclusive a Procuradoria do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), e ainda

poderia o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), provocar o MPF

(Ministério Público Federal) para promover anexecução de seus julgados ou de compromisso

de cessação, bem como adoção de medidas judiciais no exercício da atribuição estabelecida

no art. 6º , b, XIV, LC 75/93 e art. 12 parágrafo único, da referida Lei.

A diferença era que a Procuradoria do CADE (Conselho Administrativo de

Defesa Econômica) somente poderia adotar medidas aprovadas pelo seu conselho e o MPF

(Ministério Público Federal) possuindo a autonomia até para questionar as próprias medidas

que fossem adotadas pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), consoante

as Garantias Constitucionais.

Na Secretaria do Direito Econômico (SDE) que era o órgão da estrutura do

Ministério da Justiça e fazia parte do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, fora

dirigida por um Secretário indicado pelo Ministro da Justiça entre brasileiros de notório saber

jurídico ou econômico e de reputação ilibada. Competia à mesma, zelar pelo cumprimento da

Lei supramencionada podendo, no exercício de suas funções, que iriam desde praticar os atos 94 BRASIL. Lei nº 8.884 de 11 de junho de 1994. Transforma o Conselho Administrativo de Defesa Econômica

(CADE) em Autarquia, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica e dá outras providencias. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l8884.htmL>. Acesso em: 11/10/2012.

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preventivos, os repressivos, os instrutórios, os educativos, até os atos investigativos.

Exercitava a sua função preventiva, quando para evitar a ocorrência de infração à ordem

econômica monitora práticas de mercado e atividades comerciais de pessoas físicas ou

jurídicas que detinham a posição dominante no mercado relevante de bens ou serviços e

adotavam as medidas preventivas que conduziam à cessação destas práticas que constituíam

infração à ordem econômica fixando o prazo de cumprimento e valor de multa diária por

descumprimento. O desempenho de sua função repressiva ocorreria quando realizada as

averiguações preliminares para instauração de processo administrativo para apuração e a

repressão de infração à ordem econômica.

A Secretaria de Direito Econômico também possuía uma função educativa

que consistia na elaboração de estudos e pesquisas objetivando orientar a política de

preservação às infrações da ordem econômica, além da instrução ao público sobre diversas

formas de infração e os modos de sua prevenção e repressão. Seria de sua responsabilidade a

atividade de instruir os processos a serem julgados pelo CADE (Conselho Administrativo de

Defesa Econômica) referente às infrações ou atos de contratos previstos em Lei, tendo em

vista a sua função instrutória. Por último e, não menos importante, a Secretaria desempenhava

a função investigativa, que ocorreria mediante à atribuição de realizar as diligencias e de

produzir provas afetas ao seu interesse. Salientando que este poder era limitado e pautado pela

observância das garantias fundamentais asseguradas na Constituição Federal. No entanto, em

seu art. 35, a referida Lei, “in  fine” concebia poderes investigatórios que conflitavam com os

direitos constitucionais, o que fora reparado pelo art. 35-A, da mesma Lei, observando que os

devidos procedimentos deveriam seguir o rito próprio e não o do CPC (Código De Processo

Civil), e seriam usados no que coubessem, de forma subsidiária. Neste sentido, manifestara-se

o STJ (Supremo Tribunal de Justiça) em sede de Embargos de Declaração. Competia ainda a

SDE (Secretaria do Direito Econômico) formular os pareceres não-vinculativos sobre os atos

e contratos que seriam julgados pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica),

nos termos legais.

A Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE) pertencia ao

Ministério da Fazenda, competindo-lhe a formulação de pareceres técnicos, não vinculativos

sob os aspectos econômicos envolvidos nos processos administrativos que seriam julgados

pelo CADE, bem como a realização de diligências e a produção de provas de seu interesse. A

Lei nº 9.021, de 30 de março de 1995, atribuíra responsabilidade também, para apurar conduta

sobre aumento injustificado ou preços abusivos podendo tomar as medidas previstas no art. 20

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da Lei, pois tratara da implementação do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica) e das devidas providências. A SEAE (Secretaria de Acompanhamento

Econômico) procedia, então, a uma análise dos custos e dos benefícios dos atos de

concentração, sugerindo a aprovação daqueles que gerassem os efeitos líquidos não-negativos

para o bem-estar econômico e a reprovação ou a adoção de medidas corretivas em relação

àqueles que gerassem os efeitos líquidos negativos. A SEAE (Secretaria de Acompanhamento

Econômico) trabalhara no sentido de identificar as falhas em estruturas regulatórias vigentes

em diversos setores - falhas essas que induziam a um desempenho menos eficiente - e

promoviam a desregulamentação e, quando fosse o caso, a re-regulamentação. Por meio do Decreto nº 6.764, de 10 de fevereiro de 2009, as suas competências recentemente foram

alteradas, em virtude de reestruturação a que fora submetido todo o Ministério da Fazenda.

Sendo as principais: I - delinear, coordenar e executar as ações do Ministério, no tocante à

gestão das políticas de regulação de mercados, de concorrência e de defesa da ordem

econômica, de forma a promover a eficiência, o bem-estar do consumidor e o

desenvolvimento econômico; II - assegurar a defesa da ordem econômica, em articulação com

os demais órgãos do Governo encarregados de garantir a defesa da concorrência: a) atuando

no controle de estruturas de mercado, emitindo pareceres econômicos relativos a atos de

concentração no contexto da Lei n° 8.884, de 11 de junho de 1994; b) procedendo as análises

econômicas de práticas ou condutas limitadoras da concorrência, instruindo procedimentos no

contexto da Lei nº 8.884, de 1994; e c) realizando, em face de indícios de infração da ordem

econômica, investigações de atos ou condutas limitadores da concorrência no contexto da Lei

nº 9.021, de 30 de março de 1995, e da Lei nº 10.149, de 21 de dezembro de 2000.

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4.1.2 DAS FORMAS DE ATUAÇÃO DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA

CONCORRÊNCIA

O poder interventivo do Estado é ancorado em dois princípios que

complementam-se e harmonizam-se: o princípio da livre iniciativa e o princípio da livre

concorrência.

O agente econômico é livre para empreender o que bem entender [sic], desde que não prejudique a liberdade, de outros agentes econômicos, de concorrer. Em sentido inverso, para que haja liberdade de concorrer é preciso que não se utilize em termos absolutos a liberdade de empreender, o que somente pode ser obtido mediante restrições a esta última. 95

No exercício deste poder interventivo, a atuação do sistema brasileiro de

defesa da concorrência poderia ser feita de duas maneiras: a) pelo controle de conduta b) pelo

controle de estrutura. A Lei 8.884, de 11 de junho de 1994, adotara um sistema misto,

exercendo tanto o controle de conduta, quanto o de estrutura, o 1q (primeiro) previsto no art.

20 e 21 e o 2q (segundo) expresso no art. 54, da referida Lei96.

O controle de conduta correspondia a definição de regras de comportamento

adequado para os participantes do mercado. Esse controle condenaria o comportamento

abusivo, inibindo, proibindo e sancionando certos tipos indesejáveis de condutas dos agentes

econômicos, tais como: a formação de cartel; a venda casada; o preço predatório, entre outros.

O Controle de Estrutura monitorava a configuração dos mercados por meio

de controle de atos e contratos de operações de fusão, incorporação, aquisição, joint ventures,

dentre outros que geravam uma concentração econômica. Desse modo, os atos e contratos,

que levavam a concentração econômica passavam a ser controlados ou até vetados pelos

órgãos responsáveis pela defesa da concorrência. Ex: Colgate-Kolinos; AmBev e Nestlé -

Garoto.

95 AGUILLAR, Fernando Herren. Direito Econômico: do direito nacional ao direito supranacional.

2 ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 258. 96 BRASIL. Lei nº 8.884 de 11 de junho de 1994. Transforma o Conselho Administrativo de Defesa

Econômica (Cade) em Autarquia, dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a ordem econômica e dá outras providencias. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/l8884.htmL>. Acesso em: 11/10/2012.

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Nos primeiros 10 (dez) anos de aplicação da Lei, o Sistema Brasileiro de

Defesa da Concorrência priorizava o controle de estrutura, como resultado, consolidara em

um marco teórico e prático para a análise de estrutura e difundira-se em uma cultura de

respeito acerca da importância de preservar a concorrência mesmo em mercados

estruturalmente concentrados. Por outro lado, nada fora feito para controlar o sistema de

condutas que durante algum tempo ficava relegado a um segundo plano. Nos últimos anos,

porém, houvera um fortalecimento do mesmo, principalmente no combate a repressão as

condutas anticoncorrênciais decorrentes de cartéis. O desafio constituía, portanto em dosar

corretamente o controle de estrutura e de conduta, uma vez que um complementava o outro.

Apoiado em critérios técnicos, autônomos e fundamentados, o SBDC

(Sistema Brasileiro De Defesa Do Consumidor) protegeria os interesses da sociedade em

aprovar ou impedir, por exemplo, um negócio que aumentasse a concentração num mercado

em que deveria prevalecer a concorrência. Assim, cumpriam-se as três etapas que

sustentavam um órgão dessa natureza: o controle de concentrações econômicas, a análise de

condutas anticompetitivas e a promoção de defesa do livre mercado.

A sociedade não poderia mais ficar refém das teses e verdades monopolistas

de grandes grupos empresariais ou políticos desgostosos, interferências indevidas ou atitudes

desse tipo. A função dos órgãos de defesa da concorrência era defender o consumidor, acima

de qualquer interesse. Portanto, é essencial que o Estado esteja bem equipado para ser

eficiente no combate às condutas anticoncorrenciais e no controle de fusões, pois, graças a

esta maturidade tornara-se o guardião dos consumidores face aos prejuízos sociais

econômicos de operações mal conduzidas.

A maioria das legislações antitruste no mundo fundamentam-se no Sherman

Act, de 1890. A tradição democrática americana alimentava a aversão a quaisquer grupos que

parecessem ter posição dominante no mercado. Com a globalização dos mercados e a

revolução tecnológica, novos conceitos surgiram em lugar dos tradicionais graus de

concentração ou domínio de mercado, surgiriam conceitos mais sofisticados como a

elasticidade de substituição e contestabilidade. Numa economia de mercado, quem julga os

preços é o consumidor, e o único instrumento eficaz a respeito é a concorrência.

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4.1.3 DOS CONTROLES DE CONDUTA NA EFETIVAÇÃO DA LIVRE

CONCORRÊNCIA

Existiam alguns tipos de controle abarcados na efetivação do Sistema

Brasileiro de Defesa Concorrencial, dentre eles, o controle de conduta, que era voltado à

repressão do abuso do poder econômico, punindo-se as condutas anticoncorrenciais. Segundo

o magistério de Elizabeth de Farina: as Leis antitrustes poderiam enfrentar as consequenciais

do poder de monopólio de duas maneiras:

1- aproximando a estrutura de mercado às características competitivas de

forma a aumentar a probabilidade de emergência de condutas e

desempenho desejados, mais ou menos automaticamente;

2- inibindo ou proibindo certos tipos indesejáveis de conduta das firmas -

sendo que, havia uma tendência para que esta segunda modalidade de ação

prevalecesse, o que se teria refletido inclusive na denominação das Leis,

atribuindo-se um papel secundário para as ações antitruste.

No controle de conduta poderiam ser considerados os 2 (dois) tipos de

critérios para configuração de uma conduta anticoncorrencial: primeiro em face da intenção

do agente na realização da conduta e, por segundo nas consequências causadas pela conduta.

A Constituição Federal de 1988 ao tratar do assunto da repressão ao

domínio econômico estipula no § 4º do art. 173   que   “a   Lei reprimirá o abuso do poder

econômico que vise à dominação de mercados, à eliminação da concorrência e o aumento

arbitrário   dos   lucros”. Assim, percebe-se a preocupação constitucional com a intenção do

agente.

No entanto, a Lei 8.884/94 adotara as duas formas de repressão, admitindo a

punição tanto da intenção do agente, como pelos efeitos causados pela conduta do agente, ou

seja, adotara a postura de ampla repressão.

Para tanto o art. 20 da Lei supracitada estabelece que: constituem infração

da ordem econômica, independentemente de culpa, os atos sob qualquer forma manifestados,

que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, ainda que não sejam

alcançados: I - limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre

iniciativa; II - dominar mercado relevante de bens ou serviços; III - aumentar arbitrariamente

os lucros; IV - exercer de forma abusiva posição dominante.

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77

José  Inácio  Gonzaga  Franceschini  “entendia que o art. 20 da Lei n. 8.884/94

era inconstitucional, porque no regime constitucional atual, é indispensável ao

reconhecimento do abuso do poder econômico não só a tipicidade fática como também a

existência   de   dolo”.97 Por outro lado, a maioria da doutrina entendia ser plenamente

constitucional, tendo em vista ao atendimento ao princípio maior da liberdade de concorrência

adotado pela Constituição, importando em dizer, que somente o princípio da livre iniciativa

poderia impor restrições a Lei ordinária de repreender o abuso do poder econômico. O STF

(Supremo Tribunal Federal) também entendia pela constitucionalidade em cautelar (ADI

1094-8-DF).

O outro ponto merecedor de destaque, referia-se às alterações quanto às

definições de condutas anticoncorrenciais, se comparado a Lei n. 4.137, de 10 de setembro de

1962. A Lei antiga   definia   as   condutas   que   eram   consideradas   como   “abuso   do   poder  

econômico”,  enquanto  a  Lei citada referia-se a “infração  da  ordem  econômica”,  colocando  o  

exercício abusivo de posição dominante como apenas um tipo de infração econômica, sendo

que este não poderia ser   confundido   com  “abuso  do  poder   econômico”. Assim, entendia-se

que configurava o abuso do poder econômico quando ocorresse o cometimento de qualquer

uma das infrações disciplinadas pelo art. 20 da Lei n. 8.884/94.

O outro, era o controle de estrutura que, resumia-se na somatização do

controle de conduta e na prevenção de infrações à ordem econômica, conforme o art. 54 da

Lei n. 8.884/94 que definia como deveria ser feito o controle dos atos que limitassem ou

prejudicassem a livre concorrência, com resultado previsível de dominação de mercados

relevantes de bens e serviços. O controle de estrutura monitorava e agia controlando os

contratos, dando ao mercado oportunidade de expansão com globalização, ou seja, com a livre

concorrência. As formas de concentração eram: fusão, incorporação e constituição de

sociedade para exercer o controle de empresas ou grupos.

A razão e o objetivo do controle de estrutura era garantir a prevenção, e

efetuar um trabalho que não privilegiasse a formação de certos domínios tendenciosos à

monopolização, ou, melhor dizendo, evitar o abuso de poder de mercado. Ruy Santa Cruz

(Conselheiro do CADE) relatara que “O controle preventivo é feito em cima de pontos

elementares numa relação  entre  preço  e  lucratividade”.

97 FRANCESCHINI, José Inácio Gonzaga. Introdução ao Direito da Concorrência. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 38-39 apud AGUILLAR, Fernando Herren. Direito Econômico: do direito nacional ao direito supranacional. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 263.

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A teoria econômica é formada por estrutura, conduta e desempenho, o que

por si só justifica a intervenção preventiva, aliás, o grande motivo e razão de ser da ação

antitruste. Pedro Dutra, diz que:

A experiência demonstra que tamanha soma de poder certamente resultará em abuso do poder econômico ou desestimulará o ingresso de novos concorrentes. Prejuízo este que leva fatalmente ao desaparecimento da concorrência, caracterizando as relações sociais como subordinadas à opressão econômica.98

A base constitucional para o controle de estrutura é o art. 170, inciso IV da

Constituição Federal, que não deixa dúvidas ao prever a livre concorrência, declarando que a

mesma nada mais é do que um princípio geral da atividade econômica. Para reforçar ainda

temos o art. 173, § 4º, da Constituição Federal de 1988, que coíbe os atos que visem à

dominação de mercado e a eliminação da concorrência. Sendo assim, quando tivermos a

proteção da concorrência, estaremos na verdade protegendo toda a sociedade, submetendo

sempre o interesse privado ao interesse público.

Os atos submetidos ao controle de estrutura eram fiscalizados, isto posto, os

legisladores preocupavam-se em dar uma conotação genérica e ampla ao art. 54 da Lei

8.884/94, o qual se enquadrava facilmente a qualquer realidade econômica, que se

apresentasse como limitadora da livre concorrência, ou dominação de mercados. (bens e

serviços). Este controle se apresentava como uma ação preventiva sobre qualquer ato, desde

que fosse capaz de promover as distorções nos mercados e de afetar a livre formação dos

preços.

Os atos de concentração econômica são segundo Isabel Vaz, os que

acontecem quando dois ou mais agentes econômicos juntam os seus patrimônios, podendo até

unificar sua direção, com o intuito de racionalizar o emprego dos fatores de produção, de

reduzir custos e aumentar a produtividade. O ato de concentração se caracteriza por mudanças

duradouras na estrutura das empresas envolvidas e assim atuem partindo do mesmo ponto de

vista econômico em todas as operações por elas realizadas. Estas concentrações poderiam

ocorrer na forma horizontal, vertical e também conglomerado. Na forma Horizontal: vários

agentes no mesmo mercado que atuam de forma direta com a concorrência;

na forma Vertical: quando os agentes se apresentam em níveis diferentes de uma mesma

indústria; e Conglomerado: agentes (empresas) que atuavam sob o comando de um único

98 DUTRA, Pedro. Conversando com o CADE. São Paulo: Singular. 2009, p. 275.

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centro decisório, mesmo não tendo relação entre si. Atos de concentração mais comuns: eram

a incorporação e a fusão.

Na Cooperação Empresarial através de estudos realizados observava-se a

caracterização na uniformidade de certos comportamentos ou pela realização de determinadas

atividades em conjunto, sem interferência na autonomia de cada empresa nos aspectos que

não estavam envolvidos no acordo. Esta cooperação empresarial poderia ocorrer de várias

formas, tais como: as associações; as joint ventures (que poderia ser um consórcio ou então

uma nova sociedade). Os acordos poderiam ser bi ou plurilaterais, sempre levando em conta

os aspectos importantes para uma concorrência sadia. Entretanto, em relação ao

enquadramento de que questões deveriam ser submetidas ao artigo 58, haviam aqueles que

achavam que deveria ser restringidas apenas aqueles atos que decorressem de concentração

econômica, mas se analisarmos mais profundamente esta visão restritiva era posta de lado.

Qualquer ato que pudesse limitar ou de qualquer forma prejudicar a livre

concorrência, ou resultar na dominação de mercados relevantes de bens e serviços99, logo,

teríamos a apreciação do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) para todos

os atos de cooperação empresarial, inclusive aqueles que restringissem a concorrência, fossem

eles plurilaterais, societários ou contratuais. Desta forma, a possibilidade de cartéis estaria

aqui também exposta a este controle. Estariam sujeitos a apreciação do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) tudo que se apresentasse em dois critérios: um de

natureza genérica, aqueles atos que restringissem ou prejudicassem a livre concorrência,

previstos no caput do art. 54 e outro de natureza objetiva, que se correlacionasse com os atos

que visassem qualquer forma de concentração econômica estipulados no § 3º do art. 54.

Haviam várias formas de resolução destas situações, pois nem sempre um ato, apesar de

possuir natureza de concentração econômica era visto pelo CADE (Conselho Administrativo

de Defesa Econômica) de maneira homogênea. Se o ato em questão não estivesse dentro dos

parâmetros legais do § 3º do art. 54, o CADE nem mesmo o apreciaria, julgava-se extinto sem

apreciação do mérito. Poderia acontecer também de um ato nem limitar e nem prejudicar a

concorrência, mas mesmo assim, deveria ser apreciado, porque apresentava um dos requisitos

legais do mesmo artigo. Neste caso, o ato era aprovado sem restrições. Tais restrições

poderiam envolver 2 (duas) soluções, tais como: as estruturais e as comportamentais:

99 DUTRA, Pedro. Conversando com o CADE. São Paulo: Singular. 2009, p. 278.

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� As estruturais, quando o CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica) adotava um posicionamento de impor uma ou várias

condições de mudanças na própria estrutura da empresa ou do grupo

empresarial.

� As comportamentais, quando estabelecessem os compromissos

específicos a serem cumpridos. O mais importante era que ambas as

soluções tinham o objetivo de resguardar a concorrência e evitar o

exercício abusivo de poder econômico.

Observava-se que a teoria internacional sobre a concorrência dependeria de

maneira geral das soluções estruturais que eram mais eficientes, pois dispensavam uma

fiscalização futura por parte do órgão de defesa da concorrência. Entretanto, como cada caso é

diferente e demandaria as providências específicas não seria possível estabelecer uma regra

geral para a matéria.

Nesse estudo salientou-se a importância da Tutela da Concorrência,

justamente porque a mesma não é um fim em si mesmo, ela é um meio de se alcançar os

objetivos fundamentais da ordem econômica, daí a preocupação com o controle dos atos e a

autorização para a aprovação do art. 54 da Lei 8.884, de 11 de junho de 1994. Sendo que a

autorização tinha algumas condições, tais como:

- O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) deveria

examinar se correlacionava o objetivo do agente econômico, verificava se

o ato visava realmente aumentar a produtividade, melhorar a qualidade de

bens e ou serviços;

- O ato teria obrigatoriamente que beneficiar não apenas os agentes

econômicos envolvidos, mas também os consumidores. Sem a

comprovação de que benefícios seriam distribuídos equitativamente entre

os participantes do ato e os consumidores, a concretização não aconteceria.

- O ato não poderia implicar na eliminação da concorrência de parte

substancial de mercado relevante de bens e serviços;

- O ato deveria observar o princípio da proporcionalidade, ou seja, os limites

realmente necessários para se atingir os objetivos visados.

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Porém, nem sempre seriam necessários os 4 (quatro) itens citados acima

para tal autorização, o cumprimento de 3 (três) já seria visto com relevância pelo CADE

(Conselho Administrativo de Defesa Econômica), já que o objetivo principal neste processo

todo seria a economia nacional e o bem comum.

Dentre os vários aspectos levados em conta para o controle dos atos estava

a disposição sobre a não observância do prazo para apresentação do ato, em que seria punida

com a multa pecuniária em valores variáveis. Isto vinha sendo utilizado pelo Banco Central

que não fazia parte do grupo participante do sistema nacional econômico e que deveria se

reportar às diretrizes normativas do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica),

visto que, se assim o fosse, o órgão estaria impondo ao Sistema Financeiro Nacional uma

lógica diferente daquela projetada em coerência com os parâmetros dispostos em Lei própria

n. 4.595, de 31 de dezembro de 1964. Entretanto, o CADE (Conselho Administrativo de

Defesa Econômica), defendia que fazia parte sim, uma vez observada que não havia razão

para excluir o Sistema Financeiro Nacional, nem tampouco isenção ou imunidade

concorrencial. Tais disposições contraditórias, resultaram numa situação de insegurança

jurídica, afinal segundo o presidente do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica), Grandino Rodas, o administrador, relatara que estaria sujeito em potencial e em

última análise, ao julgamento do mesmo fato por 2 (dois) órgãos diferentes, independentes e

que poderiam, eventualmente, proferir decisões contraditórias. Numa tentativa de pôr fim a

este conflito, a Advocacia Geral da União – AGU, emitiu um parecer em 2001, concluindo

que o Banco Central seria competente para analisar e aprovar os atos de concentração

envolvendo as instituições financeiras.

O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) afastara a força

vinculante do parecer, declarando que seria uma violação do seu dever de zelar pela

observância da Lei 8.884/94, uma verdadeira renúncia ilegal de sua autonomia e competência

para aplicá-la. Foram muitos os pareceres, mas tudo indicou que o CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) analisaria os atos de concentração no setor financeiro

com o auxílio do Banco Central, que faria a instrução do processo e ficaria com os casos

envolvendo o risco sistêmico. Ou seja, apenas nos atos de concentração econômica, em que

houvesse risco dos correntistas sacarem o dinheiro da instituição com receio eventual da não

aprovação do ato, sendo que o julgamento ficaria restrito ao Banco Central. Nos demais casos,

o Banco Central faria a análise dos impactos do ato de concentração econômica no mercado

financeiro e o remeteria ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) para

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julgamento final. O fato consumado dependeria do momento em que seria feita a informação

do ato, visto que este poderia ser efetuado antes do ato ou posteriormente.

Concretizaram duas situações, sendo elas: uma de prevenção efetiva ou de

uma mera homologação, no caso da medida cautelar, seria processado em autos apartados,

que seriam apensados ao principal. Seguiriam o trâmite processual e excepcionalmente, a

medida cautelar poderia ser deferida sem a manifestação das empresas participantes do Ato de

Concentração, verificar-se-ia a demora decorrente, podendo tornar-se total ou parcialmente

ineficaz a concessão da medida. A revogação ou revisão da medida cautelar sempre seria

possível, por iniciativa do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) ou por

provocação do interessado, quando verificassem a alteração nos requisitos que ensejariam a

sua concessão ou celebração. Quando envolvia o acordo de preservação de reversibilidade da

operação, a Resolução n. 45 tentava atenuar os efeitos negativos do controle posterior. Fora

um mecanismo eficaz que visava garantir as condições de reversibilidade de operações que

ainda estavam sob a análise do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, prevenia as

alterações irreversíveis ou de difícil reparação, até o julgamento do mérito do Ato de

Concentração, evitando-se o risco de tornar ineficaz o resultado final do procedimento. As

cláusulas dos acordos eram flexíveis, o que minimizava o engessamento das empresas, as

obrigações eram delineadas de forma mais apropriada e o cumprimento dessas era facilitado,

por terem sido concluídas ou assumidas e não meramente impostas. Estes acordos poderiam

ser celebrados por iniciativa do Relator ou a requerimento das partes envolvidas no Ato de

Concentração, até a decisão que concederia ou negaria a medida cautelar. Quando o CADE

(Conselho Administrativo de Defesa Econômica) examinava determinadas operações, poderia

prejudicar a concorrência, na operação que se enquadravam nas condições estipuladas no § 1º

do art. 54 da Lei, onde se ganhava relevo o compromisso desempenho, cuja previsão também

seria legal e estava expressa no art. 58 da Lei mencionada. A questão do desempenho, não

deveria ser vista como uma alternativa à desaprovação de um ato, e sim o estabelecimento de

prazos para assegurar o seu cumprimento e que o CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica) realmente estaria convencido de que as metas seriam alcançadas. Havia, portanto,

uma grande diferença entre o compromisso de desempenho e o compromisso de cessação. No

caso do desempenho, teria o controle de estrutura, e quanto à cessação, o controle de conduta.

O compromisso de desempenho deveria ser composto por metas qualitativas ou quantitativas

em prazos pré-definidos, cujo cumprimento seria acompanhado de perto pela Secretaria de

Direito Econômico. O descumprimento injustificado do compromisso de desempenho

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implicaria na revogação da aprovação do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica), na forma do art. 55 da Lei mencionada, e a abertura de processo administrativo

para adoção das medidas cabíveis.

4.2 REVISÃO ADMINISTRATIVA DAS DECISÕES DO SISTEMA BRASILEIRO DE

DEFESA DA CONCORRÊNCIA

Compete ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), como

autarquia, garantir, promover e proteger a livre concorrência efetivando as suas condições de

autonomia e independência diante das pressões políticas e econômicas, tanto do setor público

como do privado. Por sua vez, exercitar as políticas de Estado e não de Governo, sendo do

que esta última busca resultados de curto prazo, conjunturais e fins privados em detrimento da

livre concorrência, pois tem-se reflexos na formação do PIB (Produto Interno Bruto) e na

arrecadação dos tributos. Por ser matéria constitucional que envolve os Direitos do

Consumidor e diretamente afetam o desenvolvimento nacional e a economia de mercado, a

competência sobre a matéria recai diretamente no STF (Supremo Tribunal Federal). Por conta

disso, das decisões do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), não caberia a

revisão do Poder Executivo e por discricionariedade e dever da própria autarquia, a

necessidade em rever os seus atos, somente caberá administrativamente ao próprio Poder

Executivo Federal, com o objetivo da manutenção do seu poder decisória e expurgo das

injunções político-econômicas.

O STJ (Supremo Tribunal de Justiça) tem sido chamado a posicionar-se

sobre o CADE em relação às questões de cunho infraconstitucional, vez que, pode discutir o

mérito das decisões administrativas, mas não a previsão legal, que é clara e concisa no tocante

à sua jurisdição, assim como a do tribunal competente, tendo se manifestado no sentido de

reconhecer a autonomia e independência da autarquia e por sua vez extinguindo processo sem

julgamento de mérito. Entretanto, mesmo havendo entendimento de que não cabe recurso

hierárquico das decisões do CADE, o art. 5º, LV da Constituição Federal de 1988 prevê o

direito à ampla defesa e ao contraditório, portanto, na esfera administrativa, as decisões do

CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) podem ser objeto dos seguintes

recursos:

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a) Recurso voluntário- é interposto ao Plenário do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica), com efeito meramente devolutivo

para o caso de aplicação de medida preventiva por seu Conselheiro;

b) Recurso de embargos de declaração- poderá ser interposto aos acórdãos

das decisões proferidas pelo Plenário do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica), indicando-se o ponto obscuro,

contraditório ou omisso, cuja declaração se imponha. Este por sua vez

interrompe o prazo para interposição da Reapreciação e suspende a

execução do julgado.

Ainda na esfera administrativa existe a possibilidade da revisão das decisões

pelo instrumento da reapreciação, que permite o questionamento da decisão com a qual se

discorda, por, quando o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) negar a

aprovação ao ato ou contrato, ou o aprovar sob condições, ou quando entender haver infração

à ordem econômica, desde que haja fato ou documento novo para um pronunciamento tanto

mais favorável. Contudo, o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) poderá

indeferir liminarmente, sob confirmação do Plenário, quando o requerimento estiver fora do

prazo, quando não haja satisfação dos requisitos legais fundamentais da resolução pertinente

ou quando for manifestamente improcedente a pretensão. A regra geral é de que o pedido de

reapreciação não suspenda a decisão, exceto quando houver.

O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) poderia receber

recurso voluntário quando houvesse concessão de medida preventiva pela SDE – Secretaria

de Direito Econômico – pois a regra era que não caberia recurso ao superior hierárquico das

decisões do Secretário da SDE (Secretaria do Direito Econômico).

4.3 A JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA ECONÔMICA DE PROTEÇÃO DA

CONCORRÊNCIA

A autonomia dos poderes que convivem harmonicamente é notória, dada a

sua competência funcional e jurisdicional, e em prol desta harmonia é que a possibilidade do

Judiciário atuar corroborando na efetivação das decisões do CADE (Conselho Administrativo

de Defesa Econômica), é reconhecidamente fundamental para a concretização dos

mandamentos constitucionais da Ordem Econômica nacional.

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O objetivo principal é o fortalecimento jurisdicional das decisões de

natureza administrativa, abarcadas pela autarquia que, com a judicialização tornam-se

obrigações oriundas de sentença judiciais, portanto, facilmente executáveis e não

exclusivamente atos administrativos. Jamais desmerecendo toda a relevância e dinamismo dos

procedimentos administrativos, que muito agilizam as atividades empresariais e as suas

nuances.

EMENTA: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVOS REGIMENTAIS NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PRETENSÃO DE OBSTAR INSCRIÇÃO EM DÍVIDA ATIVA DE MULTA IMPOSTA PELO CONSELHO ADMINISTRATIVO DE DEFESA ECONÔMICA – CADE. ATO DE CONCENTRAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO APOIADO EM EXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA N. 7 DO STJ.AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 211 DO STJ. INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. AGRAVOS REGIMENTAIS NÃO PROVIDOS. (AgRg no AREsp 97044/DF 2011/0295257-7. Min. Rel. Benedito Gonçalves. T1 – primeira turma. 17/12/2013)100

Neste cenário, o princípio geral da atividade econômica consagra a livre

concorrência e atribui-lhe o caráter de juridicidade, pois, as questões que envolvem a

promoção e proteção da concorrência são novos valores jurídicos que se encontram

concretizados e efetivados na via jurisdicional, como patrimônio público.

O Estado Democrático e Social de Direito judicializou as políticas públicas

econômicas, devido às metas e conjecturas governamentais, portanto o Judiciário passou a

interventor, fiscalizador e implementador dessas políticas de promoção e proteção da

concorrência e do consumidor, mesmo sendo elas da alçada, inicialmente, do Poder

Executivo; no caso do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, entretanto, nada impede

que o Poder Judiciário exerça certo controle judicial em determinadas hipóteses, quando

houver necessidade de implementação de sentenças efetivas.

100 AgRg no AREsp 97044/DF 2011/0295257-7. Min. Rel. Benedito Gonçalves. T1 – primeira turma. 17/12/2013. Acesso em 07/03/2014.

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Diante dessas propostas encontramos algumas hipóteses que justificam a

atuação do Poder Judiciário em consonância com o Poder Executivo. Observa-se:

1ª. Hipótese – fundamentação constitucional do controle judicial sobre as

decisões do SBDC (Sistema Brasileiro de Defesa do Consumidor):

Consiste na aplicação do princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional,

segunda o qual em todas as situações é garantido o direito à ampla defesa e ao contraditório,

pois que nenhuma ameaça ou lesão a direito deve escapar à apreciação do judiciário.

2ª. Hipótese – o controle formal das decisões do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica):

Evidencia que toda decisão deve passar por uma apreciação formal, legal e

efetiva do Poder Judiciário. Exclui a verificação do mérito e analisa exclusivamente os

procedimentos legais do processo administrativo, enaltecendo os princípios constitucionais da

ampla defesa, devido processo legal e contraditório.

3ª. Hipótese – o controle material das decisões do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica):

Este controle determina a avaliação de toda a matéria alegada com aspectos

jurídicos e econômicos envolvidos e é considerado mais amplo do que o controle formal.

Aspectos positivos:

a) O ato administrativo é vinculado e, portanto merece exame do

judiciário. É inconstitucional a limitação jurisdicional das decisões do

CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica);

b) Tem por objetivo o princípio do segurança jurídica – fortalecimento da

autarquia com referências legais e jurisprudenciais

c) Controle e promoção da defesa da concorrência.

Aspectos negativos:

Exercício do poder discricionário do CADE (Conselho Administrativo de

Defesa Econômica):

a) O judiciário não tem competência para julgar o conteúdo material do

Direito à Concorrência, que envolve grande complexidade econômica;

b) O enfraquecimento das decisões do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) que ficam à mercê da análise do judiciário, instabilidade na segurança jurídica;

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c) A inefetividade das decisões do CADE tendo em vista o caráter

protelatório do litígio judicial.

Constata-se assim, que neste diapasão o CADE (Conselho Administrativo

de Defesa Econômica) possui a seguinte consistência funcional:

Natureza jurídica: administrativa – autarquia federal.

Vinculação: Ministério da Justiça.

Competência: Poder Executivo.

Poderes: repressão às infrações contra a ordem econômica, controle dos atos

nos processos administrativos.

Natureza do ato: a regra geral é ato vinculado devido ao preenchimento de

requisitos conforme arts. 58, 5, a exceção é a discricionariedade dos arts. 24, 53, da Lei

Antitruste.

Objetivo: proteger o interesse da coletividade.

Composição: 7 Conselheiros.

4ª. Hipótese – controle judicial do ato administrativo vinculado:

Pressupõe que todos os atos administrativos sejam passíveis de controle

tendo em vista a vinculação normativa, que pressupõe controle judicial pleno, inclusive

modificando o inteiro teor das decisões do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica), para apurar, julgar e afastar a configuração de infrações à ordem econômica.

5ª. Hipótese – controle judicial do ato administrativo discricionário:

Garante que o Poder Judiciário não pode invadir o núcleo da conveniência e

da oportunidade administrativas, sob pena de violação ao princípio da separação dos poderes.

Não afasta a possibilidade de controle jurisdicional limitado dos atos discricionários, que os

limites dos contornos da discricionariedade para evitar que o administrador resvale em

comportamentos arbitrários. Com isso, o judiciário efetiva a postura ativa do Estado Social e

Democrático de Direito.

As decisões do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica):

Apesar do Poder Judiciário não possuir conhecimento técnico sobre as

questões econômicas que envolvem o direito de concorrência, não se justifica o seu

afastamento do controle jurisdicional, sendo que o julgador pode, a qualquer momento,

solicitar auxílio técnico, determinar diligências e busca de informações. Observe-se que,

alguns dos Conselheiros do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) não

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possuem conhecimento jurídico, entretanto a cooperação e os diversos segmentos dentro do

sistema permitem elucidar as eventuais dúvidas.

Segurança Jurídica proveniente das decisões do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) e o judiciário:

Existe segura atuação jurídica no campo econômico, pois, as decisões são

refletidas e motivadas pela atuação técnica administrativa preexistente, além de estarem

sujeitas aos recursos pertinentes e à revisão dos atos administrativos. Não há espaços para a

arbitrariedade, tendo em vista a multidisciplinariedade da autarquia e a interdisciplinariedade

do direito.

O posicionamento importante para o desenvolvimento e fortalecimento do

cenário jurídico-econômico, pois assegura à parte a possibilidade de discutir judicialmente as

referidas decisões. Contribui, portanto para o próprio fortalecimento institucional do CADE

(Conselho Administrativo de Defesa Econômica), administrando-lhe credibilidade diante da

diversidade de apreciações.

6ª. Hipótese – o controle judicial das decisões do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) e a sua inefetividade:

O maior objetivo é retardar as decisões do CADE (Conselho Administrativo

de Defesa Econômica), portanto, o agente econômico buscará a manifestação do Poder

Judiciário desde que lhe seja conveniente, para retardar os efeitos das decisões ora proferidas,

devido, justamente à morosidade do judiciário e a possibilidade da procrastinação dos efeitos.

Dificuldade: conferir efetividade às decisões do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) em prazo razoável e que garanta uma intervenção útil

do Estado sobre o domínio econômico. Uso do art. 170, V (efetividade e fortalecimento das

decisões do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), endurecimento,

sensatez e critério do judiciário na concessão de liminares que visem suspender os efeitos das

decisões do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).

Efeitos: pode importar em graves consequências econômicas e jurídicas,

cujos efeitos atingem a sociedade, o mercado, a livre concorrência e a proteção ao

consumidor.

Aspectos: auto-executoriedade das decisões, baseia-se na presunção de

legalidade, da validade, da legalidade e da veracidade; donde o judiciário deve prestigiar e

levar em conta os posicionamentos adotados pelo CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica).

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Permissividades: imposição de multas ou obrigações de fazer ou não fazer,

constituindo título executivo extrajudicial – (arts. 60, 65 e 66).

Diante das condições e situações apresentadas o que ocorre entre o poder

judiciário e a Lei 8.884/94, até então a base das condições realizadas nestas propostas:

Competência: exclusiva do CADE para julgamento das infrações contra a

ordem econômica, conforme arts. 23, 24 e 54. Quanto à cessação de práticas a competência é

comum entre o CADE e o Poder Judiciário (art.25 e 29).

Efeitos: aos prejudicados fica garantido o direito à indenização por perdas e

danos decorrentes de práticas que constituam infração contra a ordem econômica.

Procedimentos: simultaneidade do processo Administrativo e do Judicial.

Sujeitos: coletividade, pessoas físicas e jurídicas.

O art. 170 da Constituição de 1988, consubstancia-se na repressão ao abuso

do poder econômico consistente em medidas estatais que positivam impedimentos à formação

ilegal de cartéis ou a práticas comerciais abusivas – defesa de interesses transindividuais.

7ª. Hipótese – controle judicial preventivo diante da Lei n. 8.884/94:

Neste caso não há decisão do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica) a ser efetivada pelo Poder Judiciário tendo em vista que ainda não houve

submissão do ato à apreciação do Conselho.

Pode ocorrer quando:

a) O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) pode solicitar

medida preventiva para garantir o cumprimento de determinação

administrativa envolvendo atos de concentração econômica;

b) O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) pleitear

judicialmente a reversibilidade da operação;

c) Em caso de omissão do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica) para adotar medidas de suspensão dos atos, em contrariedade

a determinação de medida cautelar, ou ainda, contrariedades praticadas

diante do acordo de preservação de reversibilidade da operação.

8ª. Hipótese – controle judicial dos atos normativos do Legislativo e do

poder privado econômico acontece uma privatização da esfera pública e uma publicização da

esfera privada: O equilíbrio entre os interesses do Estado e do particular em composição –

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conveniência e oportunidade. CADE CONDENA 12 POSTOS DE LONDRINA POR

CARTEL.101

Neste giro, está evidente que o entrosamento nas atuações do CADE com a

atividade jurisdicional, seja ela fiscalizadora, interventiva e/ou punitiva, transformam as

operações e decisões administrativas em medidas protetivas e coercitivas de uma relação

consumerista saudável e leal, guardando com isso, a livre concorrência, o bem estar social e o

equilíbrio de mercado.

Diante do exposto, a nova Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011,

inovou e acondicionou, no ordenamento jurídico a perspectiva da intervenção judicial, como

medida garantidora de providências judicialmente determinadas e elencou as condições para

sua efetivação.

4.4 A NOVA LEI DO SISTEMA BRASILEIRO DE DEFESA DA CONCORRÊNCIA:

PRINCIPAIS ALTERAÇÕES CONCERNENTES AO CADE

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica mantêm-se como uma

autarquia federal que tem como objetivo a proteção da livre concorrência, um dos princípios

constitucionais que norteiam a ordem econômica brasileira. Essa entidade detém uma atuação

em três vertentes: preventiva, repressiva e educativa. A nova Lei antitruste brasileira visa

conferir maior efetividade e celeridade as decisões administrativas dessa autarquia alterando

101 A Decisão saiu seis anos após a Operação Medusa III e estabelecimentos terão de pagar R$ 9,3 milhões em

multas. Doze postos de gasolina da região metropolitana de Londrina foram condenados pela prática de cartel na revenda de combustíveis. No julgamento do caso, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aplicou às empresas multas que somam aproximadamente R$ 9,3 milhões. O pagamento imposto aos administradores dos postos em decorrência da conduta anticompetitiva totaliza cerca de R$ 1,7 milhão. [...] a investigação do cartel teve início em 2007, como resultado da operação policial de busca e apreensão Medusa III, que contou também com a participação de técnicos do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC).  Os  principais  elementos  comprobatórios  reunidos  aos  autos,  segundo  o  Cade,  são  “interrogatórios de envolvidos na conduta, termos de declarações concedidas por pessoas não indiciadas que noticiaram o ilícito, transcrições de interceptações telefônicas judicialmente autorizadas e evidências econômicas de alinhamento   de   preço”.   Para   a   conselheira relatora do caso, [...], as provas apontam inequivocamente a existência de cartel, em voto, ela indica que os preços cobrados dos consumidores eram acertados de maneira minuciosa, abrangendo ajustes na terceira casa decimal, e o momento da mudança dos valores era discutido previamente. [...] ela explicou que esta foi a última instância administrativa do processo. Portanto, os postos não podem recorrer, a não ser judicialmente. A conselheira destacou que a investigação policial usou de interceptação telefônica, que foi fundamental para concluir que. Além da uniformização dos preços, os donos de  postos  de  gasolina  também  visitavam  e  faziam  ameaças  a  outros  postos.  “  trata-se, portanto, de um acordo consideravelmente institucionalizado, não havendo outra racionalidade de seus membros se não o intuito único   de   prejudicar   a   livre   concorrência”,   concluiu. FOLHA DE LONDRINA. CADE CONDENA 12 POSTOS DE LONDRINA POR CARTEL. Folha Economia, 24/10/13, Londrina/Pr. p.1

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substancialmente a sua estrutura, uma vez que une a Secretaria de Desenvolvimento

Econômico ao CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e cria a

Superintendência Geral, institui ainda o Departamento de Estudos Econômicos, bem como

altera as infrações e penalidades às práticas de abuso do poder econômico. Este estudo não

exaure todas as modificações advindas da nova legislação, apenas confronta, em alguns

aspectos, notadamente relevantes a Lei 8884/94 frente aos novos ditames trazidos pela Lei

12.529/2011.

Sendo a livre concorrência é um dos princípios que norteia a ordem

econômica brasileira, elencada no art. 170, IV, da Constituição Federal de 1988, o Brasil

acabou por adotar um regime de mercado regido pelo princípio acima citado, o qual tem como

objetivo garantir aos agentes econômicos a oportunidade de competição no mercado de forma

justa, livre de práticas abusivas do poder econômico. Dessa forma, observa-se que a livre

concorrência é fator determinante, uma vez que incentiva as empresas a buscarem sempre

aperfeiçoarem-se em modernas tecnologias, tentando reduzir os custos, bem como aumentar a

produtividade e a qualidade de sua produção, corroborando ainda na diversificação do

mercado com lançamento de produtos novos e assim promovendo o desenvolvimento

nacional.

O Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC), é

operacionalizado por vários segmentos internos, nos quais estão inseridos: o Conselho

Administrativo de Defesa Econômica (CADE), a Secretaria de Direito Econômico (SDE) e a

Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE). A Lei anterior, nos arts. 3º e 13,

respectivamente, vinculava o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e a

SDE ao Ministério da Justiça, ao passo que no art. 38 ligava a SEAE ao Ministério da

Fazenda, o que foi mantido pela nova Lei, unindo, contudo, a SDE (Secretaria de Direito

Econômico) e o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) em uma só entidade.

A SEAE, por sua vez, somente atuará com a advocacia da concorrência e as decisões

administrativas adotadas no âmbito do SBDC continuam sendo passíveis de revisão judicial,

tendo em vista a possibilidade de sua judicialização, como também prevê a nova Lei. .

Consoante, à nova Lei n. 12.529, de 30 de novembro de 2011, que entrou

em vigor à partir de 29 de maio de 2012, frente à Lei 8884, de 11 de junho de 1994,

concretizaram-se modificações necessárias e imprescindíveis na composição dessa autarquia e

providenciaram-se outras alterações importantes que envolvem o Conselho Administrativo de

Defesa Econômica, seu dinamismo e sua plenitude de obrigações, levando-se em

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consideração a evolução das relações sociais e de consumo, assim como a necessidade de

descentralização e compartilhamento de funções relativas às análises e procedimentos para

garantia da livre e leal concorrência.

4.4.1 DAS ATUAÇÕES PARA A EFETIVAÇÃO DO PAPEL E DA COMPOSIÇÃO DO

CADE

O papel preventivo dessa autarquia corresponde basicamente, como ensina

Petter102: “à  análise  dos  atos  de  concentração, ou seja, às análises das fusões, incorporações e

associações de qualquer espécie entre agentes econômicos”. Isto estava previsto no art. 54, da

Lei 8.884/94, e foi mantido como base jurídica fundamental na nova legislação.

Segundo a Lei 12.529/2011, não são todos os atos de concentração que

necessariamente precisarão passar pelo crivo do CADE, mas nos termos do art. 88, incisos I e

II, dessa, cumulativamente: só serão analisados aqueles atos em que uma das empresas tenha

faturamento bruto anual ou volume total no País, no ano anterior à operação, equivalente ou

superior a R$ 400 milhões e a outra o equivalente ou superior a R$ 30 milhões. Tais atos de

concentração não são ilícitos concorrenciais, mas são verdadeiros negócios jurídicos privados

entre empresas103. Outra novidade trazida é que essa análise sobre os atos de concentração

obrigatoriamente, a partir de 29 de maio de 2012, fora prévia a consumação do negócio

jurídico, e não depois, como acontece atualmente. Nesse sentido, restou revogado o art. 54 da

Lei anterior, ora citado, que permitia a apresentação a posteriori dos atos de concentração.

O aspecto repressivo do CADE diz respeito à análise das condutas infratoras

da ordem econômica, as quais estavam previstas nos arts. 20 e seguintes da Lei 8.884/94. Ao

passo que na nova Lei as infrações a ordem econômica passam a ser tratadas a partir do art.

31, elencando no art. 36, um rol em torno de dezenove infrações, como por exemplo, limitar,

falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa, dominar

102 PETTER, Lafayete Josué. Direito econômico. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2011, p. 461. 103 BRASIL. Lei nº 12.529, de 30 de novembro de 2011. Estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da

Concorrência; dispõe sobre a prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica; altera a Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, o Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e a Lei no 7.347, de 24 de julho de 1985; revoga dispositivos da Lei no 8.884, de 11 de junho de 1994, e a Lei no 9.781, de 19 de janeiro de 1999; e dá outras providências. Diário Oficial da União. 30 de novembro de 2011. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm>. Acesso em 01 de junho de 2012.

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mercado relevante de bens ou serviços, aumentar arbitrariamente os lucros, exercer de forma

abusiva posição dominante dentre outras, entretanto não abordado no presente trabalho.

Com efeito, a nova Lei ainda agrava consideravelmente as penas aos agentes

responsáveis pela prática de infração da ordem econômica, como se segue:

Art. 37. A prática de infração da ordem econômica sujeita os responsáveis

às seguintes penas:

I - no caso de empresa, multa de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte

por cento) do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou

conglomerado obtido, no último exercício anterior à instauração do processo

administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração,

a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua

estimação;

II - no caso das demais pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou

privado, bem como quaisquer associações de entidades ou pessoas

constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, com ou sem

personalidade jurídica, que não exerçam atividade empresarial, não sendo

possível utilizar-se o critério do valor do faturamento bruto, a multa será

entre R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) e R$ 2.000.000.000,00 (dois

bilhões de reais);

III - no caso de administrador, direta ou indiretamente responsável pela

infração cometida, quando comprovada a sua culpa ou dolo, multa de 1%

(um por cento) a 20% (vinte por cento) daquela aplicada à empresa, no caso

previsto no inciso I do caput deste art., ou às pessoas jurídicas ou entidades,

nos casos previstos no inciso II do caput deste artigo.

§ 1o Em caso de reincidência, as multas cominadas serão aplicadas em

dobro104.

Pontua-se em relação aos valores acima relatados, que eles poderão ser

atualizados, por indicação do Tribunal, por meio de portaria conjunta do Ministério da

Fazenda e Ministério da Justiça, atrativo não contemplado até então, onde não havia previsão

de atuação conjunta entre competências distintas. Dado a estas situações é que tem-se

104 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. São Paulo: Saraiva, 2011.

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evidenciado a cooperação mútuo entre poderes distintos na efetivação das decisões do CADE

(Conselho Administrativo de Defesa Econômica).

Como pontifica Petter105 neste caso, “o CADE (Conselho Administrativo de

Defesa Econômica) tem o papel de reprimir as práticas lesivas aos valores protegidos pela

Lei: tais como cartéis, vendas casadas, preços predatórios, acordos de exclusividade, dentre

outras”.

A análise doutrinária demonstra que, o papel educativo do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) consiste em difundir a cultura da livre e justa

concorrência, porque traduz a melhoria nas condições de comércio e de consumo, devido à

Lei da oferta e da procura. A previsão do art. 7º, XVIII, da Lei anterior, demonstrava o caráter

pedagógico da autarquia, condição relevante que foi reproduzida na nova Lei em seu art. 9º,

XVIII, como uma das competências do Plenário do Tribunal, qual seja a de instruir o público

sobre as formas de infração da ordem econômica, condicionando preventivamente o

comportamento social.

Para Eros Roberto Grau, em sua   obra   intitulada   “A   ordem   econômica   na

Constituição  de  1988”, analisando a Lei 8.884/94, afirmou que as regras dessa Lei:

Conferem concreção aos princípios da liberdade de iniciativa, da livre concorrência, da função social da propriedade, da defesa dos consumidores e da repressão ao abuso do poder econômico, tudo em coerência com a ideologia constitucional adotada pela Constituição de 1988.106

Observa-se, que a nova Lei não desentoa de tais princípios, pelo contrário,

visando à maior efetividade deles é que intentou-se promover as alterações dessa legislação.

O CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) tem como objetivo, por meio de

suas decisões, implantar os princípios elencados na Constituição Federal 1988, como os

norteadores da Ordem Econômica brasileira, o que por sua vez, torna-se exemplo para os

demais órgãos e autoridades vinculadas a essa autarquia federal, que devem perseguir os

mesmo objetivos.

105 PETTER, Lafayete Josué. Direito econômico. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2011, p. 461. 106 GRAU, Eros Roberto. A ordem Econõmica na Constituição de 1988: Interpretação e crítica. 14. ed. rev.e

atual. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 213.

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Para a concretização desta função educativa:

“É essencial a parceria com instituições, tais como universidades, institutos de pesquisa, associações, órgãos do governo. O CADE desenvolve esse papel através da realização de seminários, cursos, palestras, da edição da Revista de Direito Econômico, do Relatório Anual  e  de  cartilhas”.107

A composição do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica)

fora sensivelmente alterada pela Lei 12.529/2011, pois a Lei anterior tratava apenas da

competência do Conselho e do Plenário. Ocorre que com o advento da nova Lei, a estrutura

do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) foi modernizada e

descentralizada em novos vetores, e é composta pelos seguintes órgãos: Tribunal

Administrativo da Defesa Econômica, Superintendência-Geral e Departamento de Estudos

Econômicos.

O Tribunal Administrativo da Defesa Econômica equivale ao que a Lei

8.884/94 denominava de Plenário do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica), uma vez que é o órgão judicante (administrativo), composto por um presidente e

seis conselheiros, nos termos do art. 6º, da nova Lei. Os membros do Tribunal serão cidadãos

com mais de 30 (trinta) anos de idade, de notório saber jurídico ou econômico e reputação

ilibada. São também indicados pelo Presidente da República, que após sabatinados e

aprovados pelo Senado Federal, são nomeados ao cargo e empossados em suas funções.

Ocorrera alteração no texto da Lei quanto ao período do mandato, que antes

era de 02 (dois) anos, permitida uma recondução e transformou-se em mandato de 04 (quatro)

anos, não coincidentes, seguindo o mesmo modelo das agências reguladoras, vedada a

recondução. Nota-se, contudo, que o lapso temporal no cargo continua o mesmo, quatro anos.

Não houve modificação no que diz respeito à dedicação exclusiva dos

cargos de Presidente e Conselheiro do CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica), mantém-se essa regra, bem como a impossibilidade de acúmulo de cargos

públicos, exceto os permitidos no art. 37, XVI da Constituição Federal de 1988. Seguem as

mesmas normas da Lei 8.884/94, nos casos de renúncia, morte ou perda de mandato tanto

para o Presidente, caso em que assumirá o cargo, o Conselheiro mais antigo ou o mais idoso

até que haja a nova nomeação, como nas situações enunciadas, sendo que, proceder-se-á nova

nomeação para completar o mandato do substituído.

107 PETTER, Lafayete Josué. Direito econômico. 5. ed. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2011, p. 228.

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As hipóteses de perda dos mandatos do Presidente e do Conselheiro também

não sofreram qualquer modificação, assim como as vedações a esses atribuídas. Contudo, no

art. 8º, da Lei 12.529/2011, acrescentou-se o seguinte rol de vedações: i) por um período de

120 (cento e vinte) dias, contados da data em que deixar o cargo, o Presidente e Conselheiros

não poderão representar qualquer pessoa, física ou jurídica, ou interesse perante o SBDC

(Sistema Brasileiro de Defesa do Consumidor), salvo a defesa de direito próprio, sob pena de

incorrer na prática de advocacia administrativa (art. 321, CP), período no qual receberão a

mesma remuneração do cargo em que ocupavam; ii) a qualquer tempo, é também vedado a

esses utilizar informações privilegiadas obtidas em decorrência do cargo exercido. Tais

vedações também seguiram as normas das agências reguladoras. Certo é que as autarquias

devem seguir as condições preestabelecidas pela legislação vigente e enquadrar-se sempre que

necessário nos moldes criados pelo Estado.

A novidade é a criação da Superintendência-Geral, que é um órgão novo na

estrutura do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), composto por um 01

(um) Superintendente-Geral e 02 (dois) Superintendentes-Adjuntos, de dedicação exclusiva e

impossibilidade de acúmulo de cargos públicos, salvo os permitidos constitucionalmente. O

Superintendente-Geral será igualmente nomeado pelo Presidente da República, após a

aprovação pelo Senado Federal e deverá ter mais de 30 (trinta) anos de idade, notório saber

jurídico ou econômico e reputação ilibada. Exercerá o mandato de 02 (dois) anos, permitida a

recondução para um único período subsequente.

As mesmas normas de impedimento, perda de mandato, substituições

elencadas acima para o Presidente e Conselheiros do CADE (Conselho Administrativo de

Defesa Econômica) são aplicadas ao Superintendente-Geral, assim como as vedações,

inclusive no que diz respeito à indisponibilidade de 120 (cento e vinte) dias, que deverá ser

observada após o término do mandato, mantida ainda, a devida remuneração por esse período.

Os Superintendentes-Adjuntos, nova figura criada pela disposição normativa, por sua vez,

serão indicados à conveniência do Superintendente-Geral, que o fará no uso efetivo de suas

atribuições.

Em linhas gerais, a superintendência investigará e instruirá processos

administrativos e atos de concentração, ao passo que o tribunal fará o julgamento de ambos. O

introito destes institutos é a garantia da celeridade na prática dos atos de instrução das análises

e transparência dos atos processuais.

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Como melhor elucida o artigo formulado pelos sócios da Truil e Chequer

Advogados em 2.011, a Superintendência-Geral concentrará a maioria das funções que

anteriormente faziam parte da competência da SEAE (Secretaria de Acompanhamento

Econômico) e da SDE (Secretaria do Direito Econômico), com amplos poderes para

monitorar, investigar, processar e decidir sobre imposição de multas. Entre as diversas

medidas que a Superintendência-Geral está autorizada a adotar, as mais relevantes são:

(i) monitorar práticas comerciais e solicitar informações a empresas, a fim

de evitar condutas anticompetitivas;

(ii) instaurar inquéritos administrativos averiguar possível adoção de

práticas anticompetitivas;

(iii) arquivar inquéritos administrativos em caso de ausência de provas que

os sustentem;

(iv) analisar e proferir decisões em processos administrativos relacionados a

práticas anticompetitivas;

(v) analisar e proferir decisões em atos de concentração;

(vi) sugerir a assinatura de acordos entre as partes e o CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica);

(vii) adotar medidas preliminares, a fim de cessar práticas anticompetitivas;

(viii) adotar medidas judiciais para dar eficácia às decisões do CADE

(Conselho Administrativo de Defesa Econômica).

A Superintendência-Geral herdará alguns dos poderes de investigação antes

pertencentes à SDE nos termos da Lei nº 8.884/1994, tais como: (i) solicitar mandados de

busca e apreensão junto ao Poder Judiciário; (ii) exigir documentos de terceiros e de entidades

governamentais; (iii) solicitar informações de empresas e indivíduos, e (iv) representar o

CADE na assinatura de acordos de leniência108.

108 TRUIL e CHEQUER, Advogados. A nova lei antitruste brasileira. Disponível em:

< http://www.mayerbrown.com/public_docs/The_New_Antitrust_Law-Portuguese.pdf> Acesso em: 14 maio 2012.

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O art. 15 da Lei 12.529/2011 manteve em funcionamento junto ao CADE a

Procuradoria Federal Especializada. A nomeação do Procurador-Chefe segue a mesma regra

para o Presidente e membros do Tribunal, bem como para o Superintendente-Geral, inclusive

quanto à idade mínima de 30 (trinta) anos. Observa-se que a Lei 8884/94 elencava que o

Procurador-Chefe deveria ser indicado pelo Ministro de Estado da Justiça e nomeado pelo

Presidente após a sabatina do Senado. A Lei nova apenas versa da nomeação do Presidente da

República para o mandato de dois anos, permitida sua recondução para um único período.

O Departamento de Estudos Econômicos é um novo órgão junto ao CADE

(Conselho Administrativo de Defesa Econômica) incumbido de elaborar estudos e pareceres

econômicos, de ofício ou solicitados pelo Plenário, Presidente, Conselheiro-Relator ou

Superintendente-Geral e visa zelar pelo rigor e atualização técnica e científica das decisões

tendo em vista, a necessidade de aprimoramento e fundamentação que os pareceres e estudos

necessitam para implementar maior credibilidade aos atos do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) e minimizar os riscos de equívocos, conforme elenca o

art. 17, da Lei 12.529/2011, .

O departamento deve ser dirigido por um Economista-Chefe, nomeado de

forma conjunta pelo Superintendente-Geral e Pelo Presidente do Tribunal, dentre brasileiros

de ilibada reputação e notório conhecimento econômico. Observa-se que aqui, não tem a regra

da idade mínima dos 30 (trinta) anos de idade. Tal Economista-Chefe pode participar, sem

direito a voto, das reuniões do Tribunal. E a esse, também são aplicadas as mesmas normas de

impedimentos dos Conselheiros do Tribunal, exceto quanto ao comparecimento às sessões.

Aplicam-se ao Procurador-Chefe as mesmas normas de impedimento

aplicáveis aos Conselheiros do Tribunal, exceto quanto ao comparecimento às sessões. Ele

também poderá participar, assim como o Economista-Chefe das reuniões do Tribunal, porém,

sem direito a voto, prestando assistência e esclarecimentos, quando requisitado pelos

Conselheiros. A função principal da Procuradoria Federal será representar o CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) perante o Poder Judiciário, nos casos em que houver

necessidade de judicialização das decisões efetivadas pelo Conselho.

O papel do Ministério Público Federal (MPF) perante o CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) é também designado no art. 20 da nova Lei, contudo, é

importante notar que retirou-se do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) a

possibilidade de requisição ao MPF para que esse promova a execução dos seus julgados ou

do compromisso de cessão. Analisa-se, assim, que a atuação do representante do MPF no

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CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) foi reduzida aos processos de

conduta, como os cartéis, e excluída nos processos de fusão, atribuição direcionada a outro

segmento dentro do Conselho, pelo simples fato de garantir uma boa prestação jurisdicional

aos casos em voga.

No entendimento do Subprocurador Geral da República Antonio Fonseca, o

CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) tem procurado atender às demandas

dos agentes de menor porte, os quais, geralmente, se veem ameaçados em processos de

exames de   fusões.   “Graças   à   atuação   ministerial   concentrada   e   no   interior   do   CADE

(Conselho Administrativo de Defesa Econômica), grupos econômicos dominantes têm

assumido compromissos de desempenho, que afastam as supostas ameaças”109

Como visto, o novo CADE (Conselho Administrativo de Defesa

Econômica) é composto pelo Tribunal Administrativo da Defesa Econômica,

Superintendência-Geral e Departamento de Estudos Econômicos e conta com o apoio

judicante do Procurador Federal, bem como o controle do Ministério Público cujas

competências são elencadas em detalhes pela Lei, equipe esta que promove a agilidade, o

dinamismo e a concretude das atividades e serviços prestados pelo Conselho..

O Conselho Administrativo de Defesa Econômica continuará atuando no

seu papel repressivo nas infrações cometidas contra a ordem econômica, e para tanto houve

uma alteração sensível no rol de infrações na Lei nova, como nas penalidades em que as

empresas, pessoas físicas ou pessoas jurídicas, de direito público ou privado e os seus

administradores podem ser penalizados, caso incorram em práticas indevidas e efetive-se a

despersonalização da pessoa jurídica.

Essa autarquia ainda continuará atuando no seu papel educativo e

preventivo, entretanto, algumas alterações como, a apreciação prévia pelo CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica)dos atos de concentração, foram de grande relevância,

uma vez, que o órgão pode tomar as devidas providências caso o negócio jurídico entre as

empresas se mostrem prejudicial à sociedade e aos ditames da livre concorrência, levando-se

em consideração o princípio fundamental da função social da propriedade.

109 FONSECA, Antonio. MPF divulga nota explicativa sobre a nova lei do CADE.

Disponível em: < http://noticias.pgr.mpf.gov.br/noticias/noticias-do-site/copy_of_consumidor-e-ordem-economica/mpf-divulga-nota-explicativa-sobre-a-nova-lei-do-cade>. Acesso em: 05 de maio 2013.

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Na visão geral, promover-se-á por meio da nova legislação, a integração da

Secretaria de Desenvolvimento Econômico com o CADE (Conselho Administrativo de

Defesa Econômica) com o objetivo de conferir maior celeridade e eficiência nas decisões

dessa autarquia, garantido assim, a aplicabilidade dos princípios constitucionais da Ordem

Econômica e promovendo um ajuste de condutas e posturas concorrenciais, que proporcionam

legitimidade às transações comerciais.

Ocorre, contudo que, apesar da avaliação geral do governo ser positiva em

relação à Lei 12.529/2011, muitos têm chamado da Lei do Super CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica), visto que os julgamentos dos processos serão mais

rápidos – ela não alterou o ponto mais sensível em relação a essa entidade, qual seja, os

julgamentos dessa autarquia serem eminentemente administrativos e passíveis de revisão

judicial. Diante destas gigantescas alterações, fez-se necessário criar um quadro comparativo

para que, a compreensão e visualização destas modificações tornassem-se mais contundentes

e perspicazes.

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QUADRO COMPARATIVO

LEI 8.884/94 LEI 12.529/2011

CADE TODAS AS ATRIBUIÇÕES SOBRE A INFRAÇÃO À ORDEM ECONÔMICA E SEUS COMPROMISSOS

MANTEVE-SE COMO A AUTARQUIA FEDERAL COM CARÁTER ADMINISTRATIVO VINCULADO AO PODER EXECUTIVO E MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E UNIU-SE A SDE E O CADE

PROCURADORIA NÃO POSSUI AUTONÔMIA E ATUA APENAS NO ASPECTO JURÍDICO DO CADE

MESMA FUNÇÃO DE REPRESENTACAO JUNTO AO JUDICIÁRIO

MPF E O CADE TEM ATUAÇÃO OBRIGATÓRIA NO PROCESSO DE CONDUTA E FUSÃO E O MPF POSSUI AUTONÔMIA PARA QUESTIONAR O CADE

NÃO PODE MAIS SER REQUISITADO PARA A EXECUÇÃO JUDICIAL OU COMPRIMISSOS E CESSÃO, APENAS ATUA EM PROCESSOS DE CONDUTA, TAIS COMO OS CARTÉIS.

Fonte: pela pós graduanda

Além disso, o CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica)

conquistou novos departamentos que possibilitam a descentralização nas análises e maior grau

de apreciação dos pedidos, pois passarão por diferentes crivos e com isso, a chance de um

equívoco ou de uma irregularidade acontecer reduz-se significativamente. Frente às

penalidades e infrações, também ocorreram alterações referentes às pessoas físicas e jurídicas

e sua responsabilidade nos atos anticoncorrenciais, entretanto, manteve-se a possiblidade de

alteração das decisões administrativas, por determinação judicial, tendo em vista o bem estar

social e o equilíbrio econômico nacional.

Em linhas gerais, portanto, as perspectivas da atuação do CADE (Conselho

Administrativo de Defesa Econômica) circundam as seguintes propostas: (i) analisar

preventivamente atos de concentração empresarial, como fusões e incorporações de empresas

(controle de estruturas); (ii) punir agentes econômicos que atentem contra a ordem

econômica, praticando atos como cartéis ou preços predatórios (repressão de condutas); e (iii)

difundir a concorrência pelo País (advocacia da concorrência), e todas elas direcionadas à

sociedade, efetivadas por meio de políticas públicas e de atuação administrativa estatal.

É importante ressaltar que, essa Lei tem aplicação em todo território

nacional, sem prejuízo de tratados e convenções internacionais de que o Brasil seja signatário,

garantidas as práticas cometidas no País, ou que nele produzam seus efeitos, sendo assim, em

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razão do efeito da globalização da economia e da quantidade de empresas estrangeiras que

tem atuação no cenário nacional, as relações empresariais permanecem protegidas e a empresa

estrangeira, independente da sua nacionalidade e ou do local onde estiver sediada, poderá ser

responsabilizada por infrações praticadas em território brasileiro, ou cujos efeitos sejam

produzidos aqui.

Existem posicionamentos diversos diante das figuras do Direito

Concorrencial, do intervencionismo do Estado e da Lei Antitruste, levando-se em

consideração que pontos positivos e negativos sempre serão facetas dos direitos e obrigações

no Estado, certo isto que, não existe modelo de concorrência perfeita, também não existem

seres humanos perfeitos, mas a busca é pelo protótipo concorrencial mais próximo da verdade

e da realidade possível, e neste contexto o função estatal é determinar a limitação das

condutas que possam, de alguma maneira, violar direito social e afasta-las do negócio

jurídico, para assim viabilizar a concretização do princípios criados pela Constituição Federal

e aproximar, toda e qualquer atividade, dos parâmetros éticos e morais que vigoram no seio da

sociedade.

É impossível prever os resultados de uma determinada concentração

empresarial. Nem tampouco, as próprias empresas sabem o que vai acontecer com o mercado,

pode ser que a decisão delas mostre-se acertada, e as suas relações acarretem a diminuição de

custos e o aumento da eficiência. Porém, pode ser que não produza os efeitos esperados,

porque as empresas bem relacionadas não encontram dificuldades para usar a regulação

antitruste em seu favor e que tem um quinhão de responsabilidade nas políticas públicas, haja

vista a necessidade da intervenção estatal.

Conclui-se assim, que a reestruturação dessa autarquia, que visa reprimir as

práticas abusivas do poder econômico e salvaguardar o consumidor, trouxe um modelo mais

adequado e especializado para garantir transparência às relações atuais, possibilitando um

ambiente concorrencial mais dinâmico e seguro, com nível maior de apreciação, análise e

aperfeiçoamento funcional, que promove a expedição de decisões mais concretamente

estáveis e justas, tendo em vista as necessidades da sociedade e, sempre direcionadas à

realidade atual dos empreendimentos. O Brasil tem a oportunidade de conferir maior

efetividade às decisões do CADE (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) com a

nova Lei, mas nada, ainda, foi substancialmente alterado. Isso prova que ainda há muito que

fazer e que a implantação efetiva das alterações trazidas à baila evidenciem-se nas atividades

diárias do Conselho.

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5 CONCLUSÕES

O Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência é uma garantia básica á

proteção das relações sociais, econômicas e consumeristas, porque fortalece o ordenamento

jurídico e impõe um nível estatal de responsabilidade e segurança nas relações empresariais,

que desencadeiam todo o ciclo de produção, consumo e investimentos que o mercado pode

proporcionar. Com isso, tornou-se uma necessidade fundamental da atualidade e vem sendo

aprimorado, enquadrando-se nos preceitos da economia capitalista, para, assim, não ser

apenas mais uma legislação sem efetividade, sem doutrina concreta e usada apenas para

camuflar os verdadeiros interesses da atividade empresarial, mas, tornar-se um instrumento de

garantia nas relações econômicas que garantem a sustentabilidade financeira nacional.

A atividade empresarial conjugada com a intervenção do Estado frente ao

domínio econômico, objetivam equilibrar, inovar e conferir maior estabilidade às transações

comerciais, além de direcionar as empresas a uma nova postura e privilegiar aquelas que já

tenham atitudes responsáveis, e ainda coíbe o abuso do poder econômico, garantindo a livre e

justa concorrência. Nesse diapasão, o estudo e o desenvolvimento do Direito de Concorrência

fortalece suas bases legislativas, direcionando o aplicador e intérprete a atender aos fins de

prevenção e repreensão ao abuso do poder econômico em detrimento da coletividade, como

também delimitando o âmbito de incidência da norma administrativa, resguardando empresas

e grupos econômicos que se mantem dentro dos limites legais.

A livre iniciativa, preconizada nos princípios gerais da atividade econômica,

sustentados na Ordem Econômica e Financeira constitucional, está condicionada aos

fundamentos e fins econômicos e também aos direitos democráticos, como a valorização do

trabalho, a dignidade da pessoa humana, a igualdade e a justiça social, para que seja possível

concretizar os anseios econômicos instituídos em harmonia com os interesses da sociedade,

portanto, a liberdade empresarial e a disponibilidade de direitos somente se legitima quando

pautados nos ditames da justiça e bem-estar coletivo.

Os princípios constitucionais deram roupagem nova às relações

empresariais, na medida em que tornaram as atividades mais transparentes e voltadas a

garantir o direito de concorrência e competividade no mercado, capaz de equilibrar as

relações negociais com os interesses sociais, jurídicos e econômicos, numa perspectiva

desenvolvimentista, mais realista e adequada aos imperativos da justiça social. Tal situação

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evidencia-se na fundamentação legal, constitucional e infraconstitucional, apresentada para

cada um dos princípios da ordem econômica e financeira.

Os princípios constitucionais que efetivaram a mudança de paradigmas nas

relações econômicas hipersuficientes foram o da livre concorrência, da defesa do consumidor

e da repressão ao abuso do poder econômico, vez que ampliaram o controle dos atos de

comércio e os tornaram mais flexíveis ás políticas pública de crescimento, desenvolvimento e

sustentabilidade econômica, impondo a estas atividades uma conduta social mais

comprometida, equilibrada e justa com o consumidor e a sociedade em geral, imperativos na

tendência da nova ordem mercadológica.

Neste contexto, o Estado fincou a demarcação da sua atuação e regrou as

condutas para ampliar a possibilidade de efetiva implementação dos princípios que norteiam a

atividade econômica empresarial brasileira, não no sentido de restringir a liberdade de atuação

comercial, ou coibir atitudes macroeconômicas, mas estabelecendo padrões de sobrevivência

empreendedora no mercado altamente competitivo, o que implica em possibilidades de

melhores fusões e incorporações empresariais, onde descarta-se o abuso econômico, a

formação de cartéis, o paralelismo de preços, a violação aos direitos de consumo e a redução

do bem-estar social o que enseja a transferência de renda do consumidor para o produtor.

O crescimento é fator essencial ao desenvolvimento econômico e é por meio

deste que se alcança o desenvolvimento sustentável que visa à melhoria da qualidade de vida

das pessoas, uma distribuição de rendas mais equânime e garante a redução das

desigualdades, portanto, a intervenção estatal é indispensável, pois a sua manifestação permite

uma criação legislativa democrática, uma fiscalização eficiente e atuante e um planejamento

adequado para a conquista de uma economia salutar aos cidadãos.

A criação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE,

proporcionou a preservação da estrutura de mercado para favorecer a concorrência, porque

controla as condutas anticompetitivas e promove a cultura concorrencial, assim sendo, garante

a pluralidade de interesses, estabelecidos em normas infraconstitucionais, pois o mercado só

existe para atender os interesses do consumidor que é o destinatário econômico final das

normas concorrenciais.

A mudança social que se espera do setor empresarial é justamente o

aprimoramento e aplicabilidade da legislação existente para desenvolver as condutas que já se

realizam, porém de forma diferenciada no que tange à preocupação exclusiva com a

lucratividade e o domínio de mercado, aumentando-se a produtividade e a geração de

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empregos, a garantia da livre e ampla concorrência, com a expansão e não restrição da

competitividade leal.

Neste cenário, nota-se a crescente atuação do Estado na defesa dos

interesses sociais e econômicos para concretizar esforços e conscientizar o empresário de sua

responsabilidade com a sociedade civil a fim de gerar valor sustentável a todas as partes

interessadas no negócio. A defesa da livre concorrência se dá pela prevenção e repressão ao

abuso do poder de mercado; isto é, ao uso perverso desse poder em proveito de um e em

detrimento dos demais, concorrentes e consumidores.

É inquestionável que a intervenção econômica estatal se instrumentaliza

mediante a expedição de normas jurídicas das mais diversas naturezas. Ou seja, para que os

objetivos traçados constitucionalmente sejam concretamente garantidos e efetivados, é

imprescindível que o Estado fixe as políticas públicas e as Leis específicas necessárias ao

desenvolvimento e que isto seja implementado pela via analítica e do conhecimento jurídico.

Neste cenário, a judicialização da política pública de proteção da

concorrência foi um marco jurídico crítico para o aprimoramento e atualização necessária,

que, diante da evolução das relações empresariais, fez-se frente às novidades trazidas pela Lei

nº 12.529/2011, muito embora, sem grandes novas performances do CADE – Conselho

Administrativo de Defesa Econômica, mas com definições de atuações e efetivações de seus

papeis, quais sejam, a defesa da relação de consumo, garantindo-se a livre concorrência com a

coibição do abuso do poder econômico, na garantia do efetivo equilíbrio das relações

concorrenciais.

Assim, a nova Lei confirma que deve ser proibida a excessiva concentração

de empresas e punidas suas condutas anticompetitivas, tais como acordo entre concorrentes,

fixação de preços, manipulação de licitações públicas, etc. A lógica da concorrência é

simples: prevenido e reprimido o abuso do poder de mercado, conquista mercado a empresa

que ofertar o melhor preço, qualidade e volume de produto ou serviço, beneficiando o

consumidor e premiando o melhor investimento em capital financeiro e humano. A soma das

vantagens intentadas em Lei, incrementam o desenvolvimento do país e a concorrência, assim

como a defesa efetiva pelo Estado, é um dos fatores decisivos da resiliência exibida por outras

economias globalizadas.

O modelo estatal, tem se mostrado efetivo na concretização do

desenvolvimento nacional, haja vista, suas atuações comprovarem as expectativas

constitucionais, ladeadas pela efetivação dos princípios básico da existência do Estado

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brasileiro e de sua atividade econômica. Os ditames da Ordem Econômica são veementemente

perseguidos, quando o assunto é desenvolvimento nacional e, para tanto a legislação antitruste

também precisou evoluir para acompanhar as necessidades e os moldes sociais.

A estrutura, organização e funcionamento criados com a Lei nº 12.529/11,

trouxe a baila importantes inovações e modernizou o Sistema Brasileiro de Defesa da

Concorrência, pois dinamizou as análises e pareceres, por meio de uma atuação mais

específica e comprometida com os objetivos do CADE. Alicerçando as decisões com

realidade do mercado atual, com a justiça social e repugnando as violações aos direitos do

consumidor por meio de abusos do poder econômico e condutas não competitivas e

anticoncorrenciais.

Deste modo, em uma abordagem geral, a defesa da concorrência, a proteção

aos princípios da Ordem Econômica e o desenvolvimento tem sido atingidos pelo CADE e

com a judicialização de suas decisões, tem se visto um fortalecimento deste Sistema, mas é

preciso cientificar que o sucesso de sua criação, implica uma atuação conjunta do Estado com

o empresariado para assim, atender aos anseios da sociedade necessita de condições para

garantir seus direitos de consumo e as proteger as condutas responsáveis socialmente, na

efetividade do desenvolvimento sustentável, pactuando e aproximando-se dos ideais

constitucionais de justiça e segurança, tendo em vista um cenário comercial tão competitivo,

globalizado e excludente.

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