SILÊNCIO DASÁGUAS: MEMÓRIA DOS PESCADORES EA … · logia e Pós-Doutor em Artes Cênicas. ......

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o SILÊNCIO DAS ÁGUAS: MEMÓRIA DOS PESCADORES E A EDUCAÇÃO RIBEIRINHA THE SILENCE DF WATER: MEMDRY AND EDUCATlDN RIVERINE FISHERMEN Resumo Marta Coutinho Caetano Professora do IFPA-PA. Mestranda em Educação UFC [email protected] José Cerardo Vasconcelos Professor Associado 111, do Departamento de Fundamentos da Educação, da Universidade Federal do Ceará. Licenciado em Filosofia, Bacharel em Filo- sofia Política, Especialista em Filosofia Política, Mestre e Doutor em Socio- logia e Pós-Doutor em Artes Cênicas. Tutor do PET Pedagogia UFC Coorde- na a linha de pesquisa de História e Memória da Educação- NHIME e, ao mesmo tempo, é vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Edu- 78 cação Brasileira, da Universidade Federal do Ceará. Edita a Coleção Diálo- gos Intempestivos e a Revista Educação em Debate da FACED/UFC E-mail: [email protected] MSN: [email protected] A história da educação ribeirinha é recontada através da memória de pes- cadores que, em meio aos rios, fauna e flora, no silêncio das águas, sob influências climáticas de grandes ou baixas marés, falam de educação, e através dessas narrativas, reconstroem e ressignificam saberes necessários para ensinar e aprender. Palavras-Chaves: História, Educação, Memória, Pescadores Abstroct The history of education riverside is retold through the memory of fishermen among the rivers, fauna and flora, in quiet waters, under climatic influences of large or low tides, they talk about education, and through these narratives reconstruct and reframe knowledge necessary to teaching and learning. Key-Words: History, Education, Memory, Fishermen V. 2, nO 60, ano 32 - 2010

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o SILÊNCIO DAS ÁGUAS:MEMÓRIA DOS PESCADORES E A EDUCAÇÃO RIBEIRINHA

THE SILENCE DF WATER:MEMDRY AND EDUCATlDN RIVERINE FISHERMEN

Resumo

Marta Coutinho CaetanoProfessora do IFPA-PA. Mestranda em Educação [email protected]

José Cerardo VasconcelosProfessor Associado 111,do Departamento de Fundamentos da Educação, daUniversidade Federal do Ceará. Licenciado em Filosofia, Bacharel em Filo-sofia Política, Especialista em Filosofia Política, Mestre e Doutor em Socio-logia e Pós-Doutor em Artes Cênicas. Tutor do PETPedagogia UFC Coorde-na a linha de pesquisa de História e Memória da Educação- NHIME e, aomesmo tempo, é vice-coordenador do Programa de Pós-Graduação em Edu-

78 cação Brasileira, da Universidade Federal do Ceará. Edita a Coleção Diálo-gos Intempestivos e a Revista Educação em Debate da FACED/UFCE-mail: [email protected]: [email protected]

A história da educação ribeirinha é recontada através da memória de pes-cadores que, em meio aos rios, fauna e flora, no silêncio das águas, sobinfluências climáticas de grandes ou baixas marés, falam de educação, eatravés dessas narrativas, reconstroem e ressignificam saberes necessáriospara ensinar e aprender.Palavras-Chaves: História, Educação, Memória, Pescadores

AbstroctThe history of education riverside is retold through the memory of fishermenamong the rivers, fauna and flora, in quiet waters, under climatic influencesof large or low tides, they talk about education, and through these narrativesreconstruct and reframe knowledge necessary to teaching and learning.Key-Words: History, Education, Memory, Fishermen

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D silêncio dos águos: memório dos pescadores e o educoçõo ribeirinho

Sendo Abaetetuba uma importante região histórica e cultural parao Estado do Pará, além de possuir uma área de forte influência pesqueirae com o número expressivo de moradores ribeirinhos, a educação nasilhas faz-se presente, porém não se conhece como esta é observada, com-preendida e apreendida na ótica dos pescadores.

A construção da memória local poderá transmitir a configuraçãoem elemento essencial dentro do que chamamos de identidade, ou iden-tidades, sejam elas individuais ou coletivas cuja busca é uma das ativida-des fundamentais do indivíduo nas sociedades de hoje, para registrar seusconhecimentos sócios históricos sobre a região, e seus saberes, em formade documentos escritos.

Qualquer trabalho que venha a ter como tema o universo dos se-res humanos que vivem da pesca se alimenta de expectativas lite-rárias, dada a proximidade com o caráter mítico e fantástico que oambiente, até mesmo por tradição literária, suscita em expectadoresdistantes. No campo da oral idade, mas fecundo ainda se imaginaser o mundo das águas, principalmente para aqueles que, de fato,encontram-se ligados a ele (Fo.NSECA, artigos núcleo de Pesca eAquicultura /MEC-SETEC). 7~

Na citação acima, percebe-se a relevância em estudar as narrativasde pescadores, uma vez que estes se encontram em convívio diário, como ambiente natureza, e apresentam a labuta diária e constante, de quemretira das águas o sustento necessário a sua sobrevivência.

O presente artigo se propõe a apresentar projeto de pesquisas sobreo processo educativo em uma das ilhas de Abaetetuba e, ao mesmo tem-po, revisitar a genealogia que funda esse movimento. Para essa análiseutilizaremos a memória de pescadores. Memórias de pescadores? Elaspoderão traduzir o conceito humanista de educação, transfigurar, tradu-zir saberes, e ensinamentos, e ao analisar as narrativas de pescadores.Pretendemos entender como a história educacional foi implantada nasilhas e se foi significativa pra quem ali reside, e quais saberes estão pre-sentes no contexto amazônico ribeirinho. Ressaltando, nesse caso, a fun-ção social do pescador também como educador.

o modo de lembrar é individual tanto quanto social: o grupo trans-mite, retém e reforça as lembranças, maso recordador, ao trabalhá-Ias, vai paulatinamente individualizando a memória comunitáriae, no que lembra e no como lembra, faz com que fique o quesignifique (8051, 1994, p.13).

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No ato de rememorar, o pescador seleciona suas experiências epassa a narrar não apenas suas vivências, mas os saberes resultantes desempre novos processos educativos adquiridos ao longo da vida. O quede significativo aprendeu. Como aprendeu, como transmitiu conheci-mentos e, ao mesmo tempo, que de fato de fato a educação para ele.

Baseados nesses pressupostos, formulam-se as questões que ori-entarão a pesquisa, quando e por que surgiu o ensino nas comunidadesribeirinhas, e se o ensino teve modificações ao longo do tempo, verifi-cando como o conhecimento. local e empírico esteve presente na edu-cação, como o pescador interpreta o conceito de educação, a escolaproporcionou algum tipo de conhecimento ao pescador, diferente doque ele apreendeu com a vivência na localidade, que saberes ele utilizapara ensinar a pesca para seus descententes. Nesse sentido, o objetivogeral, torna-se-a a construção de um acervo sobre a história da educa-ção ribeirinha, reconstruído na memória do pescador. E ao delimitar osmais específicos temos: verificar e registrar quais os tipos de pesca sãoutilizadas pelos pescadores, assim como a produção das artes de pesca,se são produzidas com elementos regionais ou adquiridas por outrasfontes. Demonstrar a com através do registro da memória a riqueza cul-tural de elementos amazônicos, relacionando a educação ribeirinha nopassado e presente. Observar e registrar como o pescador fala dasvivencias de seu tempo, e se ele utiliza algum tipo de lenda para expli-car fenômenos, ou justificar acontecimentos locais, relacionados ou nãocom a atividade de pesca. Transformar em acervo as memórias analisa-das e transcritas, e na tese.

Percebe-se a relevância das informações organizada, para subsídiopedagógico interdisciplinar, para os cursos do IFPA Abaetetuba, além defavorecer que estes registros sejam catalogados em forma de documentosescritos, arquivados para consulta pública em biblioteca na instituição.Contudo, além de favorecer aos educandos maior conhecimento sobre asatividades pesqueiras nativas e maior conhecimento sobre a realidadelocal.

Desenvolvi mento

A pesquisa será fundamentada em autores que retratam a memóriacomo construção social, assim como fonte de história da realidade, oconceito de cultura e folclore estará descrito e analisado, desde que pre-

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sente nas memórias, ou acontecimentos locais que represente as lendasno contexto regional amazônico. Além disso, a observação da naturezacomo instrumento de educação deverá ser analisada, desde que estejapresente nas memórias, a história de educação, será analisada através docontexto de aprendizagem, fazendo referenciais com a história da educa-ção na Amazônia.

O conceito de educação será analisado a partir dos sujeitos efetivosque utilizam a educação no sentido real, uma educação ancorada nasexperiências de vida de cada indivíduo, em que 'os modos de vida inspi-ram maneiras de pensar e os modos de pensar criam maneiras de viver eestas são significativa para sua sobrevivência, assim como os conheci-mentos escolares passa a fazer parte dessas experiências e se estes sabe-res formais significam de fato algo para sobrevivência dos pescadores.

Os pressupostos servirão para descrever a forma de análise das fon-tes orais transubstanciadas em memórias, uma vez que o discurso de co-munidades ribeirinhas, deve levar em conta a opção desses moradoresem residirem nas ilhas, mesmo com todas as transformações sociais ocor-ridas no município no decorrer dos tempos, e os motivos que os fazemviver na localidade e se tem interesse de saírem de seu espaço.

O modo de vida dos pescadores poderá trazer a pesquisa riquezano contexto educacional, uma vez que será analisado como a utilizampara aprender, conhecer e ensinar, nesse sentido o método de analise deeducação, que, será o de Paulo Freire, apenas como concepção de reali-dade para aprender, urna vez que se utilizam da educação para si, toda-via vale lembrar que a forma de ensinar, não é apenas para libertar, maspara demonstrar como se ensina ou ensinou, no contexto ribeirinho, res-peitando as individualidades e cultura local, e se alguns daqueles pesca-dores optaram por viver na local idade como seus antepassados. Porém,estes questionamentos e/ou possíveis afirmativas só poderão ser confir-mados, quando a pesquisa for concretizada.

E ao falar em aprender, serão considerados os diversos saberes, poisestes sujeitos estão inseridos num contexto letrado, se considerarmos quealguns podem ou não saber ler e escrever, porém podem deter habilida-des em suas atividades pesqueiras que transcendem o conhecimento aca-dêrnico. E muitos poderão traduzi-Ias com sapiência através de suas nar-rativas. Nesse sentido, a concepção de educação também será analisa-da, dentro do contexto de letramento .

. Assim como a linguagem da pesca, que muito de seus termos serãoexplicados por um glossário que situará o leitor, no imaginário amazôni-

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co, e maior conhecimento sobre as artes de pescas locais, e de que formaelas são trabalhadas.

Ressalta-se que o objeto de estudo é registrar a concepção de edu-cação que o pescador tem e como a história desta se faz presente, a partirdo que ele vive, não de analisar apenas sobre uma visão de estado, massim de vários segmentos sociais, a história transcrita pela memória, poisao falar de comunidades ribeirinhas, lidamos com sujeitos históricos eparticipantes de cultura.

Logo, a pesquisa será trabalhada num enfoque histórico, regional ecultural, transcritos pela análise da oralidade e de fontes históricas locais.A partir da observação da realidade local, e seu registro, alguns profissio-nais poderão propor atividades que valorizem o conhecimento local, atra-vés da práxis, como fonte de cultura e dinamização do saber, a partir doconhecimento local, como nos mostra a concepção de Freire : " ... Apre-senta como tarefa do educador a busca da unidade na diversidade, arti-culando saber, vivência, escola e comunidade, tendo a cotidianeidadeum papel fundamental e o local ou regional como ponto de partida ... )(OLIVEIRA, 2003, p. 136).

82 Ao falar na educação na concepção de pescadores, é importantelembrar do conhecimento e de suas práticas, este apresenta-se como edu-cador, uma vez que transcender a condição de formador de conhecimen-to e passa a utilizar da experiência para ensinar,neste sentido destaca-seGadotti (1993, p.18), que fala da ligação da teoria e prática como funda-mentais para pensar filosofia, história e sociologia da educação, comopensamento vivo, tendo o gosto pela teoria pura. Mostrando, que todoeducador, ao interroga-se estar filosofando.

O foco da pesquisa é sobre a memória da educação que foiconstruída ao longo da história e como esta é ressignificada pelos pesca-dores, e se ela auxiliou no conhecimento da atividade pesqueira, ou vice-versa. E como o registro poderá servir de base histórica para pesquisa eensino.

É necessário fazer uma consideração sobre educação, quando sepropõe a reestruração a experiência extra-curricular, há valorização docontexto dos indivíduos e a realidade existente, seja através da história ouda cultura.

Os dados referentes às fontes históricas e sócio-culturais e regio-nais, serão analisados através de entrevistas gravadas, transcritas, e anali-sadas, sendo inseridos no conceito de educação brasileira, e sua diversi-

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o silêncio das águas: memória dos pescadores e a educaçõo ribeirinha

dade, assim como menciona ARANHA (2006, p. 28) Uma das funçõesprincipais do historiador da educação é compreender esta lógica, demúltiplas identidades, por meio da qual se definem memórias e tradi-ções.

Após levantamento bibliográfico inicial sobre o histórico da educa-ção no Pará, Abaetetuba, analisar o contexto em que surgiu a educaçãoribeirinha fazendo a relação com o estado o País, Estado e região dasilhas, no município. Baseado nessas informações fazer o levantamentodo histórico da cidade, e de seu ensino.

Além disso, observa in loco, o conhecimento dos ribeirinhos sobrea pesca e se seus conhecimentos foram utilizados por esta. Os dadoshistóricos servirão para situa a gênese da educação ribeirinha, e quanto apesca as narrativas serão analisadas sobre o conhecimento empírico ecultural da atividade.

Far-se-á obtenção de dados de instituições governamentais e nãogovernamentais (organizações ribeirinhas), como: IBGE; MEC ( SEDUC-secretaria do estado de educação); AMIA (Associação dos Moradores dasIlhas de Abaetetuba), MORIVA (Movimento dos Ribeirinhos (as) das Ilhase Várzeas de Abaetetuba), Colônia dos Pescadores Z14 de Abaetetuba, 83EMATER (empresas de extensão rural). Analisando seus respectivos histó-ricos e sua relação com a história e memória educacional.

Haverá entrevista com membros e funcionário de associações ecolônias, para coleta de dados, para observação e registro da atividadepesqueira nas ilhas. Estas entrevistas poderão ser gravadas, para práticaeducacional e/ou fotografadas.

Conclusão

Observando que a pesca é uma atividade extrativa e que varia aodecorrer do ano, é necessário analisá-Ia com caráter humanístico, de-monstrando que o conhecimento pode ser construído com a troca deexperiências, uma vez que esta atividade já faz parte da história culturalde Abaetetuba.

Ao analisarmos a história da educação, através das memórias dospescadores, ela será demonstrada como elemento significativo, para for-mação ou não de sujeitos, e como esta se faz presente nas ilhas, e de queforma ela toma importância na comunidade pesqueira.

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Referências Bibliográficas

Morto Coutinho Caetono / José Gerardo Vasconcelos

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SitesConsultados:pesca.iff.edu.br/nucleos/nordeste-OJ/ArtigoFonseca.pdf/at. ../file

Enviado para publicação: 30.04.2010Aceito para publicação: 20.10.2010

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