Sentença Prescrição Virtual

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SENTENÇA. VISTOS. O Ministério Público do Estado de Mato Grosso ofereceu denúncia contra OSMAR MOREIRA DOS SANTOS, qualificado nos autos, atribuindo-lhe a prática, em tese, do crime tipificado no art. 129, §9º, do Código Penal, perpetrado contra a vítima ROSANGELA ALMEIDA FIGUEIREDO (fls. 08/09). Narra a denúncia o seguinte: “No dia 27 de junho de 2008, por volta da 01:00hs, na residência localizada na Rua A6, Quadra 03, Casa 16, Bairro Parque Nova Esperança I, nesta Capital, o denunciado OSMAR MOREIRA DOS SANTOS, ofendeu a integridade física e a saúde de Rosangela Almeida Figueiredo, causando-lhe as lesões corporais descritas no laudo pericial n. 01-02-006566-01/2008 (fls. 18/22). Conforme restou apurado, denunciado e vítima são casados há quinze anos e possuem dois filhos. Na data dos fatos, o denunciado após chegar em casa demasiadamente embriagado, começou a gritar com a vítima, proferindo-lhe palavras de baixo calão, instante em que esta reclamou do horário e mandou OSMAR dormir. Ato contínuo, o denunciado agrediu a vítima com um cinto, somente cessando as agressões no momento em que os filhos entraram no quarto.

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SENTENA.

VISTOS.

O Ministrio Pblico do Estado de Mato Grosso ofereceu denncia contra OSMAR MOREIRA DOS SANTOS, qualificado nos autos, atribuindo-lhe a prtica, em tese, do crime tipificado no art. 129, 9, do Cdigo Penal, perpetrado contra a vtima ROSANGELA ALMEIDA FIGUEIREDO (fls. 08/09).

Narra a denncia o seguinte:

No dia 27 de junho de 2008, por volta da 01:00hs, na residncia localizada na Rua A6, Quadra 03, Casa 16, Bairro Parque Nova Esperana I, nesta Capital, o denunciado OSMAR MOREIRA DOS SANTOS, ofendeu a integridade fsica e a sade de Rosangela Almeida Figueiredo, causando-lhe as leses corporais descritas no laudo pericial n. 01-02-006566-01/2008 (fls. 18/22).Conforme restou apurado, denunciado e vtima so casados h quinze anos e possuem dois filhos.

Na data dos fatos, o denunciado aps chegar em casa demasiadamente embriagado, comeou a gritar com a vtima, proferindo-lhe palavras de baixo calo, instante em que esta reclamou do horrio e mandou OSMAR dormir.

Ato contnuo, o denunciado agrediu a vtima com um cinto, somente cessando as agresses no momento em que os filhos entraram no quarto.

A agresso perpetrada pelo denunciado provocou leses corporais, consistentes em equimose nas regies: torcica direita, tero mdio da perna esquerda e escoriaes na regio geniana direta, teor do laudo pericial, fls. 18/22.

Veja-se, pois, que os fatos acima narrados constituem delitos de violncia domstica, contra a mulher, conforme ditames do art. 5, inciso III, da Lei 11.340/2006.

Diante do exposto, bem como de tudo mais que dos autos constam, encontra-se o denunciado OSMAR MOREIRA DOS SANTOS, incurso no artigo 129, 9 (se a leso for praticada contra cnjuge ou companheiro com quem tenha convivido), do Cdigo Penal, razo pela qual requer a instaurao da competente ao penal, citando-o para se ver processar, devendo ao final ser condenado, com aplicao da pena prevista na legislao penal, respeitados os ditames da Lei 11.340/2006, e intimando, na ocasio oportuna, as pessoas abaixo arroladas.

Boletim de Ocorrncia s fls. 14/15.

Termo de Declaraes da vtima, na Delegacia, s fls. 19/20.

Laudo Pericial n. 01-02-006566-01/2008, s fls. 27/31.

Termo de Qualificao, Vida Pregressa e Interrogatrio do acusado, s fls. 39/40.

Termo de Declaraes da vtima, em aditamento, s fls. 43.

Denncia recebida em 11.02.2009, constante s fls. 57/58.

Defesa Inicial, s fls. 79/81.

Em Audincia de Instruo realizada em 28.03.2011, conforme termo de fls. 87/91, foi ouvida a vtima e interrogado o acusado, conforme mdia digital encartada s fls. 92. Pelo nobre Defensor Pblico, foram apresentadas alegaes finais orais, sendo requerida a desclassificao do delito para o caput do art. 129, do Cdigo Penal, ou, caso no seja o entendimento, que seja aplicada a atenuante da confisso espontnea, e observada a primariedade do acusado, para ao final aplicar substituio de pena.

Em alegaes finais acostadas s fls. 93/101, a Representante Ministerial sustenta estarem comprovadas a autoria e materialidade dos crimes imputados ao acusado, pugnando pela sua condenao nas sanes contidas na pea acusatria.

O RELATRIO.

DECIDO.

O acusado responde perante este Juzo pelo crime de leso corporal, praticado, em tese, contra a vtima Rosangela Almeida Figueiredo, sua companheira, em razo de discusso ocorrida, tendo como motivo o fato do acusado se encontrar embriagado, vindo o mesmo a desferir golpes de cinto na vtima, os quais cessaram apenas com a interveno dos filhos.

Insta salientar que, inobstante no tenha ocorrido citao pessoal do acusado, no h que falar em nulidade, mormente quando resta demonstrado que o ru, assistindo por defensor pblico nomeado, compareceu ao interrogatrio, e, assim procedendo, tomou conhecimento da existncia da ao penal. Ademais, os autos tramitaram regularmente, no havendo nenhuma irregularidade ou nulidade que impea a prolao da sentena.

Pois bem.

A materialidade est patenteada no Boletim de Ocorrncia, encartado s fls. 14/15, e no Laudo de Exame de Corpo de Delito n. 01-02-006566-01/2008, s fls. 27/31, o qual aponta a ocorrncia de leses consistentes em equimose nas regies: torcica direita, tero mdio da pena esquerda e escoriaes na regio geniana direita.

A autoria, de igual modo, ressai induvidosa do conjunto probatrio, sendo inclusive que o prprio acusado Kleiton em juzo, confessa a prtica delitiva, conforme trecho transcrito, contido na mdi digital supramencionada:

(21:50) Magistrada: So verdadeiros esses fatos senhor?(21:52) Acusado: Foi. (21:53) Magistrada: O senhor realmente agrediu-a com um cinto?(21:55) Acusado: Eu cheguei bbado e nem vi, a ela que mostrou no outro dia tambm.(23:17) Magistrada: O senhor tem algo mais a dizer em sua defesa?(23:21) Acusado: O que eu tenho a dizer, que eu estou arrependido n...no quero mais fazer isso n (...)

Assim, como j relatado alhures, as provas produzidas demonstram de forma indubitvel que o acusado praticou os atos tpicos descritos artigo 129, 9, do Cdigo Penal.

DA PRESCRIO

Conforme narrado nos autos, o fato ocorreu em 27.06.2008, sendo a denncia recebida em 11.02.2009.

certo que o delito pelo qual o denunciado est sendo acusado prev pena em abstrato de 03 (trs) meses a 03 (trs) anos de deteno.

Todavia, analisando-se o caso concreto, tem-se que no h nos autos qualquer possibilidade de fixao da pena alm do mnimo na fase do artigo 59 do Cdigo Penal, uma vez que o acusado primrio, no possui antecedentes. As circunstancias do crime, a conduta da vtima e tampouco a conduta social do ru, a personalidade e os motivos no devero ser utilizados em desfavor do acusado, uma vez que nada h nos autos que merea ser considerado nesta fase.

Por ltimo, no h qualquer agravante ou causa de aumento a serem consideradas, e tampouco foram pedidas pelo Ministrio Pblico, e, alm disso, h de ser reconhecida atenuante da confisso espontnea, posto que, foi feita em juzo, motivo pelo qual, no se justifica cominao de pena alm do mnimo.

Embora a prescrio antes da sentena seja calculada conforme o mximo da pena prevista em abstrato para o tipo penal, tem-se que, conforme j mencionado acima, a analise das condies concretas do caso conduzem ao reconhecimento de aplicao da pena em concreto no mnimo cominado para o delito em questo, que de 03 (trs) meses.

Conforme entendimento amplamente fomentado pela doutrina, analisando-se a situao individual de cada caso, abandona-se o calculo com base no mximo da pena prevista in abstrato para calcular a prescrio com base que seria aplicado no caso concreto. Essa medida antes de tudo visa no s ao reconhecimento, mas antes obedincia aos princpios que norteiam no s o processo, mas igualmente da tratamento mais digno ao ser humano.

A razovel durao do processo , antes de tudo, consectrio lgico do devido processo legal e pode e deve ser aplicado em prol do ru. Lembre-se ainda, que tambm o princpio da economia processual recomenda que a mquina processual seja no s iniciada, mas se desenvolva desde que seu resultado possa ser efetivo.

Veja-se que, tendo os autos chegado nesta fase processual, possvel ter a certeza da pena a ser aplicada e da sua inutilidade, uma vez que, com o trnsito em julgado da sentena, o passo a se seguir, necessariamente, ser o reconhecimento da prescrio.

Como sabido, uma das condies da ao o interesse de agir, que desdobra-se no interesse/necessidade e no interesse/utilidade de agir. falta de uma destas, foroso reconhecer a ausncia do interesse/utilidade, e por consequncia a perda do interesse de agir do autor, ainda que esta perda tenha se dado subsequentemente ao ajuizamento da ao.

Assim, no h razo plausvel para a continuidade do processo, devendo ser reconhecida a prescrio antecipada, em razo da economia processual e tambm em razo de que efetivamente no h mais interesse de agir do Estado uma vez que a pena que supostamente for aplicada no ter condies de ser efetivada, uma vez que estar frustrada pela prescrio.

Por fim, a respeito do tema, oportuno colacionar manifestao do Exmo. Dr. Allan Sidney Do Souza, Promotor de Justia atuante nesta Vara Especializada, exarada no bojo da Ao Penal n. 19039-93.2008.811.0042 (Cd. 130954), que em situao anloga, assim dispe:

MM. Juza: Verifico no caso em apreo a ocorrncia da prescrio quanto ao crime de LESO CORPORAL. Com efeito, entre a data do recebimento da denncia e a data hodierna, j transcorreram mais de 02 (dois) anos e 02 (dois) meses. Assim, mesmo que admitamos que uma condenao fosse acima do mnimo legal, por exemplo 04 ou 06 meses, ou mesmo, o triplo da pena mnima (09 meses), mesmo assim j estaria prescrito, visto que, como citado acima j se passaram mais de 04 anos da data do recebimento da denncia at a presente data, sem que houvesse qualquer termo, seja suspensivo, seja interruptivo, do prazo prescricional que fluiu tranquilamente. Sobre a prescrio virtual recorro-me ao Magistrio de Guilherme de Souza Nucci, inclusive exemplificando sobre o crime de leso corporal leve - assim, por uma questo prtica no haveria razo para esperar o final do processo, com trnsito em julgado da pena inferior a 01 ano, para ento declarar extinta a punibilidade pela prescrio. Desta feita, o Ministrio Pblico REQUER, com fulcro no art. 107, inciso IV c.c. art. 109, VI, ambos do Cdigo Penal, seja Declarada Extinta a punibilidade do acusado LEANDRO BATISTA DE OLIVEIRA, ante o reconhecimento da prescrio virtual, que alis, nos termos do art. 61 do CPP, deve ser reconhecida a qualquer momento, ARQUIVANDO-SE os autos com as anotaes estilares.

Retornando-se ao caso em concreto, verifica-se que a pena a ser aplicada ao acusado seria a mnima, ou seja, de 03 (trs) meses de deteno.

Nos termos do art. 109, VI do Cdigo Penal, alterado pela Lei n. 12.234/2010, a prescrio da pretenso punitiva do Estado para os crimes cuja pena mxima no excede a 01 (um) ano, passou a ocorrer em 03 (trs) anos.

Ocorre que, muito embora a Lei n. 12.234/2010 tenha alterado o prazo prescricional, observa-se que no se aplica ao caso vertente, por ser o fato anterior a publicao da mesma e ainda por ser a lei posterior prejudicial ao indiciado.

Assim, sendo a redao anterior mais benfica ao indiciado no presente caso, o prazo prescricional ocorreu em 02 (dois) anos, pela redao anterior do artigo.

No caso vertente, da data do recebimento da denncia, 11.02.2009, at a presente data, j decorreram mais de 02 (dois) anos, sem que nesse perodo ocorresse qualquer caso de interrupo da prescrio.

De tal modo, se decorrido tal interregno, a pretenso punitiva do Estado se extinguiu, no podendo mais ser infligida qualquer pena. Assim, reconhecem os Tribunais:

Exsurgindo lapso temporal entre o recebimento da denncia e o provimento condenatrio superior ao previsto em lei, isto tendo em conta a pena concretizada, impe-se seja pronunciada a prescrio punitiva do Estado - Art. 110, 1, do CP. (STF - RT 727/419).

DIREITO PENAL - PRESCRIO DA PRETENSO PUNITIVA PELA PENA EM CONCRETO - CAUSA EXTINTIVA DA PUNIBILIDADE - RECONHECIMENTO - Extinto o direito de punir do Estado pela supervenincia da prescrio da pretenso punitiva. (TJSP, Apelao Criminal com Reviso - Acrdo n. 858007350000000 - Rel. Des. Willian Campos - 4 Cmara de Direito Criminal - j. de 06-01-2009).

Ressalta-se, por derradeiro, que a prescrio matria de ordem pblica e dever ser reconhecida a qualquer tempo.

Destarte, por todo o exposto, RECONHEO a incidncia da PRESCRIO DA PRETENSO PUNITIVA, EM PERSPECTIVA, para o crime apurado neste processo e por consequncia JULGO EXTINTA A PUNIBILIDADE do acusado OSMAR MOREIRA DOS SANTOS, em relao ao delito constante no art. 129, 9, do Cdigo Penal, com fundamento no artigo 107, inciso IV, 109,VI (anterior Lei n. 12.234/2010), ambos do Cdigo Penal, e art. 61 do Cdigo de Processo Penal, bem como, DETERMINO O ARQUIVAMENTO dos presentes autos.

PUBLIQUE-SE e INTIMEM-SE.

PROCEDAM-SE as anotaes e comunicaes constantes no item 7.16.1 da Consolidao das Normas Gerais da Corregedoria Geral da Justia, aps ARQUIVEM-SE os autos com as baixas de estilo.

s providncias.

CUMPRA-SE.