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    CORTEINTERAMERICANADEDIREITOSHUMANOS

    CASOGOMESLUNDEOUTROS(GUERRILHADOARAGUAIA)VS.BRASIL

    SENTENADE24DENOVEMBRODE2010

    (Excees Preliminares, Mrito, Reparaes e Custas)

    No caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia),

    a Corte Interamericana de Direitos Humanos (doravante denominada CorteInteramericana, Corte ou Tribunal), integrada pelos seguintes juzes:

    Diego Garca-Sayn, Presidente;Leonardo A. Franco, Vice-Presidente;Manuel E. Ventura Robles, Juiz;Margarette May Macaulay, Juza;

    Rhadys Abreu Blondet, Juza;Alberto Prez Prez, Juiz;Eduardo Vio Grossi, Juiz, eRoberto de Figueiredo Caldas, Juiz ad hoc;

    presentes, ademais,

    Pablo Saavedra Alessandri, Secretrio, eEmilia Segares Rodrguez, Secretria Adjunta,

    de acordo com os artigos 62.3 e 63.1 da Conveno Americana sobre DireitosHumanos (doravante denominada a Conveno Americana ou a Conveno) e comos artigos 30, 38.6, 59 e 61 do Regulamento da Corte (doravante denominado o

    Regulamento)1, profere a seguinte Sentena.

    1 Conforme o disposto no artigo 79.1 do Regulamento da Corte, que entrou em vigor em 1o de junhode 2010, [o]s casos contenciosos que j houvessem sido submetidos considerao da Corte antes de 1 ode janeiro de 2010 continuaro a tramitar at que neles se profira sentena, conforme o Regulamentoanterior. Desse modo, o Regulamento da Corte, mencionado na presente Sentena, corresponde aoinstrumento aprovado pelo Tribunal no XLIX Perodo Ordinrio de Sesses, realizado de 16 a 25 denovembro de 2000 e reformado parcialmente no LXXXII Perodo Ordinrio de Sesses, realizado de 19 a 31de janeiro de 2009.

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    NDICE

    Captulo Pargrafo

    I. INTRODUODACAUSAEOBJETODACONTROVRSIA 1

    II. PROCEDIMENTOPERANTEACORTE 6

    III.EXCEESPRELIMINARES 10A. Incompetncia temporal do Tribunal 12B. Falta de interesse processual 20C. Falta de esgotamento dos recursos internos 32D. Regra da quarta instncia e falta de esgotamento a respeito

    da Arguio de Descumprimento de Preceito Fundamental 43

    IV. COMPETNCIA 50

    V. PROVA 51A. Prova documental, testemunhal e pericial 52B. Admissibilidade da prova documental 54C. Admissibilidade das declaraes das supostas vtimas,

    e da prova testemunhal e pericial 67

    VI. CONSIDERAESPRVIASSOBREOSFAMILIARESINDICADOSCOMOSUPOSTASVTIMAS 77

    VII.DIREITOAORECONHECIMENTODAPERSONALIDADEJURDICA,VIDA,INTEGRIDADEELIBERDADEPESSOAIS 81

    A. Alegaes das partes 82B. Fatos relacionados aos desaparecimentos forados 85C. O desaparecimento forado como violao mltipla e

    continuada de direitos humanos e os deveres de respeito e garantia 101D. O desaparecimento forado dos integrantes da Guerrilha do Araguaia 112VIII.DIREITOSGARANTIASJUDICIAISEPROTEOJUDICIAL 126A. Alegaes das partes 127B. Fatos relacionados com a Lei de Anistia 134C. Obrigao de investigar e, se for o caso, punir graves

    violaes de direitos humanos no Direito Internacional 137D. Incompatibilidade das anistias relativas a graves violaesde direitos humanos com o Direito Internacional 147

    IX. DIREITOLIBERDADEDEPENSAMENTOEDEEXPRESSO,SGARANTIASJUDICIAISEPROTEOJUDICIAL 183

    A. Alegaes das partes 184B. Fatos relativos ao acesso informao 187C. Direito liberdade de pensamento e de expresso 196D. Aes judiciais e acesso informao 203E. Prazo da Ao Ordinria 219F. Marco normativo 226X. DIREITOINTEGRIDADEPESSOAL 232A. Alegaes das partes 232B.

    Consideraes da Corte 235

    XI. REPARAES 245A. Parte Lesionada 251B. Obrigaes de investigar os fatos, julgar e, se for o caso,

    punir os responsveis, e de determinar o paradeiro das vtimas 253C. Outras medidas de reabilitao, satisfao e garantias de no repetio 264D. Indenizaes, custas e gastos 298XII.PONTOSRESOLUTIVOS 325

    VOTO DO JUIZAD HOC

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    IINTRODUODACAUSAEOBJETODACONTROVRSIA

    1. Em 26 de maro de 2009, em conformidade com o disposto nos artigos 51 e 61da Conveno Americana, a Comisso Interamericana de Direitos Humanos (doravante

    Comisso Interamericana ou Comisso) submeteu Corte uma demanda contra a

    Repblica Federativa do Brasil (doravante o Estado, Brasil ou a Unio), que seoriginou na petio apresentada, em 7 de agosto de 1995, pelo Centro pela Justia e oDireito Internacional (CEJIL) e pela Human Rights Watch/Americas, em nome depessoas desaparecidas no contexto da Guerrilha do Araguaia (doravante tambmdenominada Guerrilha) e seus familiares2. Em 6 de maro de 2001, a Comissoexpediu o Relatrio de Admissibilidade No. 33/013 e, em 31 de outubro de 2008,aprovou o Relatrio de Mrito No. 91/08, nos termos do artigo 50 da Conveno, oqual continha determinadas recomendaes ao Estado4. Esse relatrio foi notificado aoBrasil em 21 de novembro de 2008, sendo-lhe concedido um prazo de dois meses paraque informasse sobre as aes executadas com o propsito de implementar asrecomendaes da Comisso. A despeito de duas prorrogaes concedidas ao Estado,os prazos para que apresentasse informaes sobre o cumprimento dasrecomendaes transcorreram sem que a elas fosse dada uma implementao

    satisfatria. Diante disso, a Comisso decidiu submeter o caso jurisdio da Corte,considerando que representava uma oportunidade importante para consolidar a

    jurisprudncia interamericana sobre as leis de anistia com relao aosdesaparecimentos forados e execuo extrajudicial e a consequente obrigao dosEstados de dar a conhecer a verdade sociedade e investigar, processar e punirgraves violaes de direitos humanos. A Comisso tambm enfatizou o valor histricodo caso e a possibilidade de o Tribunal afirmar a incompatibilidade da Lei de Anistia edas leis sobre sigilo de documentos com a Conveno Americana. A Comisso designoucomo delegados os senhores Felipe Gonzlez, Comissrio, e Santiago A. Canton,Secretrio Executivo; como assessores jurdicos, a senhora Elizabeth Abi-Mershed,Secretria Executiva Adjunta, e os advogados Lilly Ching Soto e Mario Lpez Garelli,especialistas da Secretaria Executiva.

    2. Conforme salientou a Comisso, a demanda se refere alegada responsabilidade [do Estado] pela deteno arbitrria, tortura e desaparecimento

    2 Posteriormente, somaram-se ao caso como peticionrios a Comisso de Familiares de Mortos eDesaparecidos Polticos do Instituto de Estudos da Violncia do Estado, a senhora Angela Harkavy e o GrupoTortura Nunca Mais do Rio de Janeiro.

    3 No Relatrio de Admissibilidade No. 33/01, a Comisso declarou admissvel o caso No. 11.552, comrelao suposta violao dos artigos 4, 8, 12, 13 e 25, em concordncia com o artigo 1.1, todos daConveno Americana, bem como dos artigos I, XXV e XXVI da Declarao Americana dos Direitos e Deveresdo Homem (doravante denominada Declarao Americana) (expediente de anexos demanda, apndice 3,tomo III, folha 2322).

    4 No Relatrio de Mrito No. 91/08, a Comisso concluiu que o Estado era responsvel pelas violaes

    dos direitos humanos estabelecidos nos artigos I, XXV e XXVI da Declarao Americana, bem como dosartigos 4, 5 e 7, em conexo com o artigo 1.1 da Conveno Americana, em detrimento das vtimasdesaparecidas; nos artigos XVII da Declarao Americana e 3, em relao com o artigo 1.1 da ConvenoAmericana, em detrimento das vtimas desaparecidas; nos artigos I da Declarao Americana e 5, emconexo com o artigo 1.1 da Conveno Americana, em detrimento dos familiares dos desaparecidos; noartigo 13, em conexo com o artigo 2 da Conveno Americana, em detrimento dos familiares dosdesaparecidos; nos artigos XVIII da Declarao Americana e 8.1 e 25 da Conveno Americana, em relaocom os artigos 1.1 e 2 da mesma Conveno, em detrimento das vtimas desaparecidas e de seus familiares,em virtude da aplicao da Lei de Anistia, nos artigos XVIII da Declarao Americana e 8.1 e 25, em relaocom o artigo 1.1 da Conveno Americana, em detrimento das vtimas desaparecidas e de seus familiares,em virtude da ineficcia das aes judiciais no penais interpostas no marco do presente caso (expedientede anexos demanda, apndice 3, tomo VII, folha 3655).

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    forado de 70 pessoas, entre membros do Partido Comunista do Brasil [] ecamponeses da regio, [] resultado de operaes do Exrcito brasileiro empreendidasentre 1972 e 1975 com o objetivo de erradicar a Guerrilha do Araguaia, no contexto daditadura militar do Brasil (19641985). A Comisso tambm submeteu o caso Corteporque, em virtude da Lei No. 6.683/79 [], o Estado no realizou uma investigaopenal com a finalidade de julgar e punir as pessoas responsveis pelo desaparecimento

    forado de 70 vtimas e a execuo extrajudicial de Maria Lcia Petit da Silva [];porque os recursos judiciais de natureza civil, com vistas a obter informaes sobre osfatos, no foram efetivos para assegurar aos familiares dos desaparecidos e da pessoaexecutada o acesso a informao sobre a Guerrilha do Araguaia; porque as medidaslegislativas e administrativas adotadas pelo Estado restringiram indevidamente odireito de acesso informao pelos familiares; e porque o desaparecimento dasvtimas, a execuo de Maria Lcia Petit da Silva, a impunidade dos responsveis e afalta de acesso justia, verdade e informao afetaram negativamente aintegridade pessoal dos familiares dos desaparecidos e da pessoa executada. A Comisso solicitou ao Tribunal que declare que o Estado responsvel pela violaodos direitos estabelecidos nos artigos 3 (direito ao reconhecimento da personalidade

    jurdica), 4 (direito vida), 5 (direito integridade pessoal), 7 (direito liberdadepessoal), 8 (garantias judiciais), 13 (liberdade de pensamento e expresso) e 25

    (proteo judicial), da Conveno Americana sobre Direitos Humanos, em conexocom as obrigaes previstas nos artigos 1.1 (obrigao geral de respeito e garantia dosdireitos humanos) e 2 (dever de adotar disposies de direito interno) da mesmaConveno. Finalmente, solicitou Corte que ordene ao Estado a adoo dedeterminadas medidas de reparao.

    3. Em 18 de julho de 2009, o Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, aComisso de Familiares de Mortos e Desaparecidos Polticos do Instituto de Estudos daViolncia do Estado e o Centro pela Justia e o Direito Internacional (doravantedenominados representantes) apresentaram seu escrito de solicitaes, argumentose provas (doravante denominado escrito de solicitaes e argumentos), nos termosdo artigo 24 do Regulamento. Nesse escrito, solicitaram ao Tribunal que declare, [e]m

    relao ao desaparecimento forado das [supostas] vtimas [] e total impunidadereferente aos fatos, a responsabilidade internacional do Estado brasileiro pela violaodos artigos 3, 4, 5, 7, 8 e 25 da Conveno, todos em conexo com os artigos 1.1 e 2do mesmo instrumento, bem como dos artigos 1, 2, 6 e 8 da ConvenoInteramericana para Prevenir e Punir a Tortura (doravante denominada ConvenoInteramericana contra a Tortura); dos artigos 8 e 25, em conexo com os artigos 1.1e 2 da Conveno Americana; dos artigos 1, 6 e 8 da Conveno Interamericanacontra a Tortura pela falta de investigao e da devida diligncia nos procedimentos dembito interno; dos artigos 1.1, 2, 13, 8 e 25 da Conveno pelas restries indevidasao direito de acesso informao; dos artigos 1.1, 8, 13 e 25 da Conveno pelaviolao do direito verdade; e do artigo 5 da Conveno pela violao da integridadepessoal dos familiares das supostas vtimas desaparecidas. Solicitaram, porconseguinte, Corte que ordene diversas medidas de reparao. Os familiares de 48

    supostas vtimas, mediante poderes de representao outorgados em diversas datas,designaram como seus representantes legais as organizaes j mencionadas, as quaisso representadas, por sua vez, pelas senhoras Ceclia Maria Bouas Coimbra,Elizabeth Silveira e Silva e Victoria Lavnia Grabois Olmpio (Grupo Tortura NuncaMais); Crimia Alice Schmidt de Almeida (Comisso de Familiares de Mortos eDesaparecidos Polticos do Instituto de Estudos da Violncia do Estado); VivianaKrsticevic, Beatriz Affonso, Helena Rocha e pelo senhor Michael Camilleri (CEJIL).

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    4. Em 31 de outubro de 2009, o Estado apresentou um escrito no qual interpstrs excees preliminares, contestou a demanda e formulou observaes sobre oescrito de solicitaes e argumentos (doravante denominado contestao dademanda). O Estado solicitou ao Tribunal que considere fundamentadas as exceespreliminares e, por conseguinte: a) reconhea a incompetncia ratione temporis paraexaminar as supostas violaes ocorridas antes do reconhecimento da jurisdio

    contenciosa da Corte pelo Brasil; b) declare-se incompetente, em virtude da falta deesgotamento dos recursos internos; e c) arquive de imediato o presente caso, ante amanifesta falta de interesse processual dos representantes. Subsidiariamente, quantoao mrito, o Brasil solicitou ao Tribunal que reconhea todas as aes empreendidasno mbito interno e julgue improcedentes os pedidos [da Comisso e dosrepresentantes], uma vez que est sendo construda no pas uma soluo, compatvelcom suas particularidades, para a consolidao definitiva da reconciliao nacional. OEstado designou o senhor Hildebrando Tadeu Nascimento Valadares como agente e assenhoras Mrcia Maria Adorno Cavalcanti Ramos, Camila Serrano Giunchetti, CristinaTimponi Cambiaghi e Bartira Meira Ramos Nagado, bem como os senhores SrgioRamos de Matos Brito e Bruno Correia Cardoso, como agentes assistentes.

    5. Em conformidade com o artigo 38.4 do Regulamento, em 11 e 15 de janeiro de2010, a Comisso e os representantes apresentaram, respectivamente, suas alegaess excees preliminares opostas pelo Estado.

    IIPROCEDIMENTOPERANTEACORTE

    6. A demanda da Comisso foi notificada ao Estado e aos representantes em 18 demaio de 20095. Durante o processo perante este Tribunal, alm da apresentao dosescritos principais (supra pars. 1 a 5), entre outros remetidos pelas partes, medianteresoluo de 30 de maro de 2010, o Presidente da Corte (doravante denominado oPresidente) ordenou o recebimento, por meio de declaraes rendidas perante um

    agente dotado de f pblica (doravante denominadas affidvits), dos depoimentos epareceres de: a) 26 supostas vtimas, uma delas oferecida pela Comisso, outraproposta conjuntamente pela Comisso e pelos representantes e as demais oferecidasunicamente pelos representantes; b) quatro testemunhas, duas propostas pelosrepresentantes e duas pelo Estado, e c) cinco peritos, um proposto pela Comisso, doispelos representantes e dois pelo Estado6, a respeito dos quais as partes tiveram aoportunidade de apresentar observaes. O Presidente tambm convocou a Comisso,os representantes e o Estado para uma audincia pblica para ouvir os depoimentosde: a) trs supostas vtimas, uma oferecida pela Comisso e pelos representantes eduas propostas pelos representantes; b) quatro testemunhas, uma oferecidaconjuntamente pela Comisso e pelos representantes, uma oferecida pelosrepresentantes e outras duas pelo Estado; c) os pareceres de dois peritos, um

    5 Anteriormente a esse fato, em 13 de maio de 2009, informou-se ao Estado que ele podia designarum Juiz ad hocpara o presente caso. A Comisso apresentou um escrito intitulado Posio da ComissoInteramericana de Direitos Humanos sobre a figura do Juiz ad hoc. Em 12 de junho de 2009, o Brasildesignou, como Juiz ad hoc, o senhor Roberto de Figueiredo Caldas, que, em 24 de junho de 2009, aceitou ocargo.

    6 Cf.Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia) versus Brasil. Convocatria de AudinciaPblica. Resoluo do Presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos de 30 de maro de 2010,Ponto Resolutivo Primeiro.

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    proposto pela Comisso e outro pelo Estado, bem como: d) as alegaes finais oraisdas partes sobre as excees preliminares e os eventuais mrito, reparaes e custas7.

    7. A audincia pblica foi realizada em 20 e 21 de maio de 2010, durante oLXXXVII Perodo Ordinrio de Sesses da Corte, realizado na sede do Tribunal8.

    8. Por outro lado, o Tribunal recebeu oito escritos, na qualidade de amicus curiae,das seguintes pessoas e instituies9: a) Open Society Justice Initiative,Commonwealth Human Rights Initiative, Open Democracy Advice Centre e South

    African History Initiative, com relao ao direito verdade e ao acesso informao 10;b) Grupo de Pesquisa de Direitos Humanos na Amaznia, relacionado com a Lei deAnistia11;c) Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Rio de Janeiro, sobre, interalia, os efeitos de uma eventual sentena da Corte Interamericana e a deciso emitidana Arguio de Descumprimento de Preceito Fundamental No. 153(doravante tambmdenominada Arguio de Descumprimento)12; d) Grupo de Ensino, Pesquisa eExtenso Democracia e Justia de Transio da Universidade Federal de Uberlndiasobre, inter alia, a extenso da Lei de Anistia e a importncia do presente caso para agarantia do direito memria e verdade13; e) Jos Carlos Moreira da Silva Filho,

    7 Cf.Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia).Convocatria de Audincia Pblica, supranota 6, Ponto Resolutivo Quarto.

    8 A esta audincia compareceram: a) pela Comisso Interamericana: Felipe Gonzlez, Comissrio;Santiago A. Cantn, Secretrio Executivo; Catalina Botero, Relatora Especial para a Liberdade de Expresso;e Lilly Ching Soto, Leonardo Hidaka e Alejandra Negrete, assessores legais; b) pelos representantes: VivianaKrsticevic, Beatriz Affonso e Helena Rocha, do CEJIL; e Victria Lavnia Grabois Olmpio, do Grupo TorturaNunca Mais do Rio de Janeiro; e c) pelo Estado: Hildebrando Tadeu Nascimento Valadares, Embaixador doBrasil na Costa Rica; Glucia Silveira Gauch, Carlos Eduardo da Cunha Oliveira, Camilla Serrano Giunchetti,Mauricio Candeloro, Rodrigo Wanderley Lima e Francisco Samuel Barzotto, do Ministrio das RelaesExteriores; Cristina Timponi Cambiaghi e Bartira Meira Ramos Nagado, da Secretaria Especial dos DireitosHumanos da Presidncia da Repblica; Srgio Ramos de Matos Brito e Ana Claudia de Sousa Freitas, daAdvocacia-Geral da Unio; Mauro Almeida Noleto, do Ministrio da Justia; Paulo Massi Dallari, da Casa Civil;Clia Cristina Whitaker, da Secretaria Especial de Direitos Humanos do Municpio de So Paulo; BrunoCorreia Cardoso, do Ministrio da Defesa; Gerson Menandro, do Exrcito; Miguel Alejandro Gutirrez Pizarro,

    da Embaixada do Brasil na Costa Rica e Manoel Lauro Volkmer de Castilho, magistrado. Antes da realizaodessa audincia, em 6 de maio de 2010, o Brasil solicitou, inter alia, o adiamento da audincia pblica docaso para o perodo de sesses seguinte do Tribunal e, ao mesmo tempo, a diviso da audincia em duas, demaneira que se realizasse uma audincia pblica de excees preliminares e outra, se fosse o caso, noperodo de sesses seguinte, sobre o mrito do caso. Subsidiariamente, no caso de que no se admitisseesse pedido, o Estado solicitou que a audincia pblica, convocada para 20 e 21 de maio de 2010, fossesomente de excees preliminares. Aps considerar as observaes da Comisso e dos representantes, aCorte no admitiu a solicitao do Estado (expediente de mrito, tomo VI, folhas 2709 e 2710).

    9 O Tribunal recebeu outros escritos que foram apresentados fora de prazo, ou que no tinhamutilidade ou no apresentavam relao com o objeto do presente caso, motivos pelos quais no soadmitidos nem mencionados na presente Sentena.

    10 O escrito original foi recebido na Secretaria da Corte em 7 de junho de 2010 assinado por JamesA. Goldston e Darian K. Pavli da Open Society Justice Initiative; Maja Daruwala da Commonwealth HumanRights Initiative; Alison Tilley da Open Democracy Advice Centre, e Catherine Kennedy do South African

    History Archive. As cpias do referido escrito em ingls e espanhol foram recebidas em 3 e 4 de junho de2010, respectivamente, ao passo que a verso em portugus foi recebida em 12 de julho de 2010.

    11 O escrito e seus anexos foram recebidos na Secretaria da Corte em 4 de junho de 2010. O escritoest assinado por Slvia Maria da Silveira Loureiro e Jamilly Izabela de Brito Silva.

    12 O escrito original e seus anexos foram recebidos na Secretaria da Corte em 10 de junho de 2010. Oescrito est assinado por Guilherme Peres de Oliveira, Ronaldo Cramer e Wadih Damous. Uma cpia desseescrito foi recebida em 4 de junho de 2010.

    13 O escrito original e seu anexo foram recebidos na Secretaria da Corte em 4 de junho de 2010 e estassinado pelos pesquisadores Adriano Soares Loes, Ailime Silva Ferreira, Alexandre Garrido da Silva, Anna

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    Rodrigo Lentz, Gabriela Mezzanotti, Fernanda Frizzo Bragato, Jnia Maria LopesSaldanha, Luciana Arajo de Paula, Gustavo Oliveira Vieira, Ana Carolina Seffrin,Leonardo Subtil, Castor Bartolom Ruiz, Andr Luiz Olivier da Silva, Sheila Stolz daSilveira, Ceclia Pires, Slon Eduardo Annes Viola, o Grupo de Pesquisa Direito Memria e Verdade e Justia de Transio(Pontifcia Universidade Catlica do RioGrande do Sul), o Ncleo de Pesquisa e Extenso da Universidade Federal do Rio

    Grande, o Movimento Nacional de Educao em Direitos Humanos e Acesso, Cidadaniae Direitos Humanos, o Grupo de Pesquisa Delmas-Marty: Internacionalizao doDireito e Emergncia de um Direito Mundial, o Grupo de Pesquisa Fundamentaotica dos Direitos Humanos, a Ctedra UNESCO/UNISINOS Direitos Humanos eViolncia, Governo e Governana, o Curso de Graduao em Direito e o Ncleo deDireitos Humanos, todos vinculados Universidade do Vale do Rio dos Sinos, sobre,inter alia, as eventuais consequncias desse processo na justia de transio noBrasil14; f) Justia Global, com respeito incompatibilidade da Lei de Anistia brasileiracom a Conveno Americana15; g) Equipe do Ncleo de Direitos Humanos doDepartamento de Direito da Pontifcia Universidade Catlica do Rio de Janeiro, sobre odireito de acesso informao em poder do Estado16, e h) Associao Juzes para aDemocracia, sobre o direito memria e verdade, com relao Lei de Anistia17.

    9. Em 21 de junho de 2010, a Comisso e o Estado enviaram suas alegaes finaisescritas, ao passo que os representantes o fizeram horas depois de vencido o prazo,sem receber objees, sendo, portanto, admitidas pelo Tribunal. Esses escritos foramtransmitidos s partes para que realizassem as observaes que julgassem pertinentessobre determinados documentos a eles anexados. As partes se manifestaram sobreesses documentos e os representantes, alm disso, remeteram documentos adicionais

    IIIEXCEESPRELIMINARES

    10. Em sua contestao demanda, o Estado interps trs excees preliminares:a) incompetncia do Tribunal em virtude do tempo para examinar determinados fatos;

    Paula Santos de Souza, Bruna Arantes Vieira, Brbara de Almeida Andrade Braga, Caroline Milagre Pereira,Carolina Nogueira Teixeira de Menezes, Ana Clara Neves da Silveira, rika Cristina Camilo Camin, Felipe MartinsVitorino, Flvia Ferreira Jac de Menezes, Gssika Sampaio da Fonseca, Jssica da Silva Rehder, Jos CarlosCunha Muniz Filho, Jlia Palmeira Macedo, Lara Caroline Miranda, Marcela Marques Maciel, Marco Tlio deCastro Caliman, Marcos Augusto Freitas Ribeiro, Mariana Rezende Guimares, Maristela Medina Faria, MarliaFreitas Lima, Mayara Bastos Mundin, Michelle Gonalves, Monique Saito, Pablo Cardoso de Andrade, PaulaAlmeida Faria, Pblio Dezopa Parreira, Pedro do Prado Mller, Rafael Moment Castro, Raphael Siqueira Neves,Rgis Cardoso Andrade, Renata Cardoso Fernandes, Roberta Camineiro Baggio, Samara Mariana de Castro,Sara Mirando Magno Freixo, Tlio Csar Rossetti e Vagner Bruno Caparelli Carqui.

    14 O escrito foi recebido na Secretaria da Corte em 7 de junho de 2010 e est assinado por Jos CarlosMoreira da Silva Filho, Fernanda Frizzo Bragato e Rodrigo Lentz. Uma cpia do referido escrito foi recebidaem 4 de junho de 2010.

    15 O escrito e seu anexo foram recebidos na Secretaria da Corte em 5 de junho de 2010. O escritoest assinado por Andressa Caldas, Sandra Carvalho, Luciana Garcia, Renata Lira, Tamara Melo e FernandoDelgado. Uma cpia do referido escrito foi recebida em 7 de junho de 2010.

    16 O escrito e seus anexos foram recebidos na Secretaria da Corte em 7 de junho de 2010. O escritoest assinado por Marcia Nina Bernardes, Natlia Frickmann, Teresa Labrunie, Paula DAngelo, NatliaDamazio e Maria Fernanda Marques. Uma cpia do referido escrito foi recebida em 4 de junho de 2010.

    17 O escrito e seus anexos foram recebidos na Secretaria da Corte em 7 de junho de 2010. O escritoest assinado por Lus Fernando Camargo de Barros Vidal e Kenarik Boujikian Felippe.

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    b) a falta de esgotamento dos recursos internos, e c) a falta de interesse processual daComisso e dos representantes. Posteriormente, durante a audincia pblica, o Estadoacrescentou como exceo preliminar a regra da quarta instncia com relao a umfato que qualificou como superveniente (infra pars. 44 e 47).

    11. Embora a Conveno Americana e o Regulamento no desenvolvam o conceitode exceo preliminar, a Corte afirmou reiteradamente, em sua jurisprudncia,quepor esse meio se questiona a admissibilidade de uma demanda ou a competncia doTribunal para conhecer de determinado caso ou de algum de seus aspectos, em razoda pessoa, da matria, do tempo ou do lugar18. A Corte salientou que uma exceopreliminar tem por finalidade obter uma deciso que previna ou impea a anlise domrito do aspecto questionado ou do caso em seu conjunto. Por esse motivo, oquestionamento deve atender s caractersticas jurdicas essenciais, em contedo efinalidade, que lhe confiram o carter de exceo preliminar. Os questionamentosque no se revistam dessa natureza, como, por exemplo, os que se referem ao mritode um caso, podem ser formulados mediante outros atos processuais admitidos naConveno Americana ou no Regulamento, mas no sob a figura de uma exceopreliminar19.

    A. Incompetncia temporal do Tribunal

    1.Alegaes das partes

    12. O Estado alegou a incompetncia da Corte Interamericana para examinarsupostas violaes que teriam ocorrido antes do reconhecimento da competnciacontenciosa do Tribunal. Esse reconhecimento foi realizado sob reserva dereciprocidade e para fatos posteriores a 10 de dezembro de 1998. No obstante, oBrasil reconheceu a jurisprudncia da Corte, no sentido de que pode conhecer dasviolaes continuadas ou permanentes, mesmo quando iniciem antes doreconhecimento da competncia contenciosa do Tribunal, desde que se estendam almdesse reconhecimento, mas enfatizou que inequvoca a falta de competncia da

    Corte para conhecer das detenes arbitrrias, atos de tortura e execuesextrajudiciais ocorridas antes de 10 de dezembro de 1998.

    13. A Comisso afirmou que, em virtude das datas de ratificao da ConvenoAmericana e do reconhecimento da competncia contenciosa do Tribunal por parte doEstado, a demanda se refere unicamente s violaes dos direitos previstos naConveno Americana que persistem depois desse reconhecimento de competncia,em razo da natureza continuada do desaparecimento forado ou que so posterioresa esse reconhecimento. Desse modo, afirmou que a Corte tem competncia paraconhecer das violaes apresentadas na demanda.

    18 Cf. Caso Las Palmeras versus Colmbia. Excees Preliminares. Sentena de 4 de fevereiro de2000. Srie C No. 67, par. 34; Caso Garibaldi versus Brasil. Excees Preliminares, Mrito, Reparaes eCustas. Sentena de 23 de setembro de 2009. Srie C No. 203, par. 17, e Caso Manuel Cepeda Vargas versusColmbia. Excees Preliminares, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 26 de maio de 2010. Srie C No.

    213, par. 35. No mesmo sentido, cf. artigo 79 do Regulamento da Corte Internacional de Justia. Disponvelem: http://www.icj-cij.org/homepage/sp/icjrules.php; ltimo acesso em 20 de novembro de 2010.

    19 Cf. Caso Castaeda Gutman versus Mxico. Excees Preliminares, Mrito, Reparaes e Custas.Sentena de 6 de agosto de 2008. Srie C No. 184, par. 39; Caso Garibaldi, supra nota 18, par. 17, e CasoManuel Cepeda Vargas, supra nota 18, par. 35.

    http://www.icj-cij.org/homepage/sp/icjrules.phphttp://www.icj-cij.org/homepage/sp/icjrules.php
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    14. Os representantes alegaram que as violaes denunciadas no presente caso sereferem aos desaparecimentos forados das supostas vtimas; impunidade quedecorre da falta de investigao, julgamento e punio dos responsveis por essesatos; bem como ineficcia das medidas adotadas para respeitar, proteger e garantiro direito verdade e informao. Destacaram que a possvel data do incio dosdesaparecimentos no restringe nem limita a competncia ratione temporis do

    Tribunal, uma vez que se trata de uma violao de carter permanente e continuado.Alm disso, as alegadas violaes relacionadas com os direitos informao, verdade e justia persistem posteriormente ratificao da Conveno Americana eao reconhecimento da jurisdio da Corte por parte do Estado. Por esse motivo, osrepresentantes solicitaram ao Tribunal que indefira essa exceo preliminar.Salientaram, no entanto, que uma das pessoas desaparecidas foi identificada em 1996e que, por conseguinte, a Corte carece de competncia para pronunciar-se a respeitode seu desaparecimento forado.

    2. Consideraes da Corte

    15. A fim de determinar se tem ou no competncia para conhecer de um caso oude um de seus aspectos, de acordo com o artigo 62.1 da Conveno Americana 20, a

    Corte deve levar em considerao a data de reconhecimento da competncia por partedo Estado, os termos em que se deu esse reconhecimento e o princpio deirretroatividade, disposto no artigo 28 da Conveno de Viena sobre o Direito dosTratados de 196921.

    16. O Brasil reconheceu a competncia contenciosa da Corte Interamericana em 10de dezembro de 1998 e, em sua declarao, indicou que o Tribunal teria competnciapara os fatos posteriores a esse reconhecimento22. Com base no anteriormenteexposto e no princpio de irretroatividade, a Corte no pode exercer sua competnciacontenciosa para aplicar a Conveno e declarar uma violao de suas normas quandoos fatos alegados ou a conduta do Estado, que pudesse implicar sua responsabilidadeinternacional, sejam anteriores a esse reconhecimento da competncia23. Por esse

    motivo, fica excluda da competncia do Tribunal a alegada execuo extrajudicial dasenhora Maria Lcia Petit da Silva, cujos restos mortais foram identificados em 1996,

    20 O artigo 62.1 da Conveno estabelece:Todo Estado Parte pode, no momento do depsito do seu instrumento de ratificao desta Conveno ou deadeso a ela, ou em qualquer momento posterior, declarar que reconhece como obrigatria, de pleno direitoe sem conveno especial, a competncia da Corte em todos os casos relativos interpretao ou aplicaodesta Conveno.

    21 Essa norma estabelece que: [a]s disposies [de um tratado] no obrigam uma parte em relao aum ato ou fato anterior ou a uma situao que deixou de existir antes da entrada em vigor do tratado, emrelao a essa parte.

    22 O reconhecimento de competncia feito pelo Brasil em 10 de dezembro de 1998 salienta que [o]Governo da Repblica Federativa do Brasil declara que reconhece, por tempo indeterminado, como obrigatria

    e de pleno direito, a competncia da Corte Interamericana de Direitos Humanos, em todos os casosrelacionados com a interpretao ou aplicao da Conveno Americana [sobre] Direitos Humanos, emconformidade com o artigo 62 dessa mesma Conveno, sob reserva de reciprocidade e para fatos posterioresa esta declarao". Cf. Informao geral sobre o Tratado: Conveno Americana sobre Direitos Humanos.Brasil, reconhecimento de competncia. Disponvel em http://www.oas.org/juridico/spanish/firmas/b-32.html; ltimo acesso em 18 de novembro de 2010.

    23 Cf. Caso das Irms Serrano Cruz versus El Salvador. Excees Preliminares. Sentena de 23 denovembro de 2004. Srie C No. 118, par. 66; Caso Heliodoro Portugal versus Panam. ExceesPreliminares, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 12 de agosto de 2008. Srie C No. 186, par. 24, eCaso Garibaldi supra nota 18, par. 20.

    http://www.oas.org/juridico/spanish/firmas/b-32.htmlhttp://www.oas.org/juridico/spanish/firmas/b-32.htmlhttp://www.oas.org/juridico/spanish/firmas/b-32.htmlhttp://www.oas.org/juridico/spanish/firmas/b-32.html
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    ou seja, dois anos antes de o Brasil reconhecer a competncia contenciosa da Corte,bem como qualquer outro fato anterior a esse reconhecimento.

    17. Ao contrrio, em sua jurisprudncia constante, este Tribunal estabeleceu que osatos de carter contnuo ou permanente perduram durante todo o tempo em que o fatocontinua, mantendo-se sua falta de conformidade com a obrigao internacional24. Em

    concordncia com o exposto, a Corte recorda que o carter contnuo ou permanente dodesaparecimento forado de pessoas foi reconhecido de maneira reiterada pelo DireitoInternacional dos Direitos Humanos25, no qual o ato de desaparecimento e suaexecuo se iniciam com a privao da liberdade da pessoa e a subsequente falta deinformao sobre seu destino, e permanecem at quando no se conhea o paradeiroda pessoa desaparecida e os fatos no tenham sido esclarecidos. A Corte, portanto, competente para analisar os alegados desaparecimentos forados das supostas vtimasa partir do reconhecimento de sua competncia contenciosa efetuado pelo Brasil.

    18. Alm disso, o Tribunal pode examinar e se pronunciar sobre as demais violaesalegadas, que se fundamentam em fatos que ocorreram ou persistiram a partir de 10de dezembro de 1998. Ante o exposto, a Corte tem competncia para analisar ossupostos fatos e omisses do Estado, ocorridos depois da referida data, relacionados

    com a falta de investigao, julgamento e sano das pessoas responsveis, inter alia,pelos alegados desaparecimentos forados e execuo extrajudicial; a alegada falta deefetividade dos recursos judiciais de carter civil a fim de obter informao sobre osfatos; as supostas restries ao direito de acesso informao, e o alegado sofrimentodos familiares.

    19. Com base nas consideraes precedentes, o Tribunal considera parcialmentefundada a exceo preliminar.

    B. Falta de interesse processual

    1. Alegaes das partes

    20. O Brasil alegou que a Comisso reconheceu e valorizou as medidas dereparao adotadas pelo Estado com relao ao presente caso, mas que esse rgoafirmou, de modo genrico, que outras medidas deviam ser implementadas. A critriodo Estado, em virtude do exguo lapso de tempo transcorrido entre a apresentao doRelatrio Parcial de Cumprimento de Recomendaes [com respeito ao Relatrio deMrito No. 91/08] e o envio do caso Corte (trs dias), a avaliao pela [Comisso] documprimento das medidas de reparao e de no repetio por ela recomendadas []restou prejudicada. Por outro lado, dada a informao contida no referido relatrioestatal, o Brasil considerou que o envio do caso Corte foi inoportuno e ressalt[ou] aausncia de interesse processual a ensejar o exame de mrito do [presente] caso.

    24 Cf. Caso Blake versus Guatemala. Excees Preliminares. Sentena de 2 de julho de 1996. Srie C

    No. 27, pars. 39 e 40; Caso Radilla Pacheco versus Mxico. Excees Preliminares, Mrito, Reparaes eCustas. Sentena de 23 de novembro de 2009. Srie C No. 209, par. 23, e Caso Ibsen Crdenas e IbsenPea versus Bolvia. Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 1o de setembro de 2010. Srie C No. 217,par. 21.No mesmo sentido, artigo 14.2 do Projeto de Artigos sobre Responsabilidade do Estado por FatosInternacionalmente Ilcitos. Cf. Resoluo da Assembleia Geral das Naes Unidas No. 56/83 , de 12 dedezembro de 2001, Anexo, U.N. Doc. A/56/49(Vol. I)/Corr. 4.

    25 Caso Velsquez Rodrguez versus Honduras. Mrito. Sentena de 29 de julho de 1988. Srie C No.4, par. 155; Caso Chitay Nech e outros versus Guatemala. Excees Preliminares, Mrito, Reparaes eCustas. Sentena de 25 de maio de 2010. Srie C No. 212, pars. 81 e 87, e Caso Ibsen Crdenas e IbsenPea, supra nota 24, pars. 59 e 60.

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    21. Em particular, o Estado destacou as medidas de reparao que adotou nopresente caso, manifestando, inter alia, que: a) promulgou a Lei No. 9.140/95,mediante a qual promoveu o reconhecimento oficial de sua responsabilidade pelasmortes e pelos desaparecimentos ocorridos durante o perodo do regime militar epagou indenizaes aos familiares de 59 supostas vtimas; b) publicou, em agosto de

    2007, o livro Direito Memria e Verdade Comisso Especial sobre Mortos eDesaparecidos Polticos, no qual estabeleceu a verso oficial sobre as violaes dedireitos humanos cometidas por agentes estatais, reforando o reconhecimentopblico da responsabilidade do Estado; c) realizou diversos atos de naturezasimblica e educativa, que promoveram o resgate da memria e da verdade dos fatosocorridos durante o [] regime militar; d) enviou ao Congresso Nacional o Projeto deLei No. 5.228/09 sobre o acesso informao pblica; e) impulsionou o projeto

    Memrias Reveladas, relacionado com diversas iniciativas sobre o arquivamento e adivulgao de documentos relativos ao regime militar, e f) promoveu uma campanhapara a entrega de documentos que possam ajudar na localizao dos desaparecidos.Adicionalmente, foram realizadas diversas iniciativas sobre a busca dos restos mortaise identificao dos desaparecidos da Guerrilha, entre outras, expedies regio doAraguaia. Com base no anteriormente exposto, o Estado concluiu que a falta de

    interesse processual dos peticionrios consequncia do fato de que as medidas jadotadas [pelo Estado], somadas s que esto em implementao, atend[em] aintegralidade de [seus] pedidos.

    22. A Comisso salientou que a alegao do Estado no tem a natureza de umaexceo preliminar e solicitou Corte que a recusasse. O Brasil disps inicialmente deum prazo de dois meses para apresentar relatrio sobre o cumprimento dasrecomendaes do Relatrio de Mrito No. 91/08. Esse prazo foi prorrogado em duasocasies e, finalmente, esgotou-se em 22 de maro de 2009. No entanto, em 24 demaro de 2009, o Estado apresentou um relatrio parcial e solicitou uma novaprorrogao de seis meses para apresentar informao adicional. Ao analisar asinformaes apresentadas pelo Brasil, a Comisso concluiu que no refletiam a

    adoo de medidas concretas e suficientes, nem de um compromisso expresso emrelao ao cumprimento das recomendaes. Por conseguinte, considerou esgotado oprocedimento previsto nos artigos 48 a 50 da Conveno e decidiu submeter o caso

    jurisdio da Corte. Por outro lado, expressou que no h disposio que regulamenteo exame das respostas estatais s recomendaes formuladas no Relatrio de Mrito eque tampouco h previso de um prazo mnimo para examinar as informaesapresentadas pelo Estado em relao ao cumprimento de suas recomendaes.

    23. A Comisso declarou, ademais, que apesar dos esforos do Estado paraimplementar medidas de reparao no mbito interno, as recomendaes contidas noRelatrio de Mrito No. 91/08 e nas solicitaes da demanda ainda no foramcumpridas totalmente, entre outras, aquelas medidas para: a) assegurar que a Lei deAnistia No. 6.683/79 no continue a ser um obstculo para a persecuo penal das

    graves violaes de direitos humanos que constituam crimes contra a humanidade; b)determinar, por meio da jurisdio de direito comum, a responsabilidade penal pelosdesaparecimentos forados das [supostas] vtimas; e c) sistematizar e publicar todosos documentos referentes s operaes militares contra a Guerrilha do Araguaia. Porconseguinte, a Comisso solicitou Corte que indefira esta exceo preliminar.

    24. Os representantes afirmaram a autonomia da Comisso para avaliar ocumprimento das recomendaes de seus relatrios e para decidir sobre o envio docaso Corte. As razes para esse envio no podem ser objeto de uma exceo

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    preliminar e o Brasil no alegou um erro da Comisso que pudesse prejudicar seudireito de defesa. Por outro lado, o Estado pretende aplicar ao presente caso uma dascondies da ao do direito interno, que define o interesse processual como anecessidade demonstrada pela parte no sentido de obter a prestao jurisdicional paragarantir a efetividade de seu direito [e] para evitar a perpetuao do dano sofrido. OEstado pretende que no se analise o mrito do caso, sob o argumento de que o

    eventual resultado da sentena da Corte j estaria sendo alcanado por meio dasaes implementadas no mbito interno. Os representantes declararam que asalegaes estatais no dizem respeito competncia da Corte ou admissibilidade docaso, mas s medidas de reparao solicitadas pela Comisso e pelos representantes.Portanto, os argumentos do Brasil se referem a um questionamento estreitamentevinculado ao exame da eficcia dessas medidas e, por conseguinte, no constituemuma exceo preliminar.

    25. Outrossim, os representantes manifestaram que as medidas adotadas peloBrasil so insuficientes ou, inclusive, uma delas contrria aos interesses dos familiares.De acordo com os representantes, subsistem controvrsias importantes entre os fatosdenunciados [] e aqueles reconhecidos pelo Estado [, as quais] se estendem aosdireitos [debatidos] e eficcia das medidas adotadas pelo Estado com a finalidade de

    fazer justia, [propiciar o acesso ] verdade, prevenir violaes futuras e indenizar osfamiliares das [supostas] vtimas desaparecidas no presente caso.

    2. Consideraes da Corte

    26. A Corte observa que, sob o mesmo conceito de falta de interesse processual, oEstado referiu-se, na realidade, a duas questes diferentes: a) uma relacionada com aatuao da Comisso Interamericana a respeito do relatrio estatal de resposta aoRelatrio de Mrito No. 91/08, e b) outra relacionada com as medidas de reparaoadotadas pelo Brasil, as quais, alegadamente, atendem s pretenses da Comisso edos representantes.

    27.

    A respeito da deciso da Comisso Interamericana de submeter um caso jurisdio do Tribunal, este sustentou, reiteradamente, que a avaliao que faz aComisso sobre a convenincia ou no do envio de um caso Corte uma atribuioque lhe prpria e autnoma e, por conseguinte, os motivos que determinaram esseenvio no podem ser objeto de uma exceo preliminar. No entanto, o que, sim, podeser objeto de uma exceo preliminar a omisso ou violao de todas ou de algumadas etapas processuais indicadas nos artigos 50 e 51 da Conveno, de maneira quese provoque um desequilbrio processual26 ou um erro grave que afete o direito dedefesa de alguma das partes no caso perante a Corte 27. A parte que afirma a

    26 Cf. Caso dos 19 Comerciantes versus Colmbia. Exceo Preliminar. Sentena de 12 de junho de2002. Srie C No. 93, par. 31.

    27 Cf. Caso dos Trabalhadores Demitidos do Congresso (Aguado Alfaro e outros) versus Peru. ExceesPreliminares, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 24 de novembro de 2006. Srie C No. 158, par. 66;Caso Escher e outros versus Brasil. Excees Preliminares, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 6 de

    julho de 2009. Srie C No. 200, par. 22, e Caso Manuel Cepeda Vargas, supra nota 18, par. 31.

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    existncia de um erro grave deve demonstr-lo28, motivo por que no suficiente umaqueixa ou discrepncia de critrios com relao atuao da Comisso29.

    28. O Tribunal considera importante mencionar que, embora o artigo 44 doRegulamento da Comisso se refere apresentao de um caso Corte, no hdisposio alguma, na Conveno ou nos Regulamentos da Corte ou da Comisso, que

    regulamente de maneira expressa a anlise ou avaliao que deva realizar esta ltimasobre a resposta do Estado a suas recomendaes. Tampouco se estabelece um tempomnimo, a partir do momento em que o Estado responde s recomendaesformuladas no relatrio do artigo 50 da Conveno, para que a Comisso decida levaro caso ao conhecimento da Corte30.

    29. O Tribunal observa que a Comisso Interamericana submeteu o presente casoao conhecimento da Corte dois dias depois de ter o Brasil apresentado seu relatrioparcial a respeito das recomendaes adotadas por aquele rgo, em seu Relatrio deMrito No. 91/08, aps duas prorrogaes concedidas ao Estado, a ltima delasesgotada em 22 de maro de 2009. A Corte tambm observa que o Estado remeteuseu relatrio parcial Comisso com dois dias de atraso, em 24 de maro de 200931.Isto , embora esgotado o prazo por ela concedido, a Comisso esperou que o Estado

    informasse se havia ou no adotado medidas especficas com o objetivo de cumprir asrecomendaes antes de decidir se era conveniente levar o caso ao conhecimento daCorte.

    30. A segurana jurdica exige que os Estados saibam a que se ater noprocedimento perante o Sistema Interamericano de Direitos Humanos32. Porconseguinte, se a Comisso concede um prazo ao Estado para que cumpra asrecomendaes do relatrio, deve esperar que este lhe remeta a resposta no prazofixado e avali-la com o objeto de decidir se submeter o caso ao conhecimento daCorte a alternativa mais favorvel tutela dos direitos contemplados na Conveno 33ou se, ao contrrio, as medidas adotadas pelo Estado para cumprir as recomendaesda Comisso constituem uma contribuio positiva para o andamento do processo e

    para o cumprimento das obrigaes estabelecidas na Conveno Americana

    34

    . Nopresente caso, no se evidencia um erro ou a inobservncia das normas convencionaisou regulamentares que regem o envio do caso pela Comisso a esta Corte, mas uma

    28 Cf. Caso dos Trabalhadores Demitidos do Congresso (Aguado Alfaro e outros), supra nota 27, par.66; Caso Escher e outros, supra nota 27, par. 23, e Caso Manuel Cepeda Vargas, supra nota 18, par. 31.

    29 Cf. Caso do Povo Saramaka versus Suriname. Excees Preliminares, Mrito, Reparaes e Custas .Sentena de 28 de novembro de 2007. Srie C No. 172, par. 32; Caso Escher e outros, supra nota 27, par.23, e Caso Manuel Cepeda Vargas, supra nota 18, par. 31.

    30 Cf. Caso dos 19 Comerciantes. Exceo Preliminar, supra nota 26, par. 32.

    31 Cf. Contestao da Demanda (expediente de mrito, tomo II, folha 552).

    32 Cf. Caso Cayara. Excees Preliminares. Sentena de 3 de fevereiro de 1993. Srie C No. 14, par.38, e Caso dos 19 Comerciantes, Exceo Preliminar, supra nota 26, par. 35.

    33 Cf. Certas Atribuies da Comisso Interamericana de Direitos Humanos (artigos 41, 42, 44, 46, 47,50 e 51 da Conveno Americana sobre Direitos Humanos). Opinio Consultiva OC-13/93, de 16 de julho de1993. Srie A No. 13, par. 54; Caso do Povo Saramaka, supra nota 29, par. 39, e Caso Bayarri versus

    Argentina. Exceo Preliminar, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 30 de outubro de 2008. Srie CNo. 187, par. 20.

    34 Cf. Caso dos 19 Comerciantes. Exceo Preliminar, supra nota 26, par. 35.

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    mera discrepncia de critrios relativamente a essa ao. Com base no exposto, oTribunal considera que a alegao do Estado no constitui uma exceo preliminar.

    31. Por outro lado, quanto alegada falta de interesse processual da Comisso edos representantes, em virtude das diversas iniciativas adotadas pelo Brasil no mbitointerno, seguindo sua jurisprudncia35, este Tribunal recorda que a responsabilidade

    internacional do Estado se origina imediatamente aps ter sido cometido um ato ilcitosegundo o Direito Internacional, e que a disposio de reparar esse ato no planointerno no impede a Comisso ou Corte de conhecer um caso. Isto , emconformidade com o prembulo da Conveno Americana, a proteo internacional denatureza convencional coadjuvante ou complementar da que oferece o direitointerno dos Estados americanos. Consequentemente, quando se alega que o Estadono cumpriu totalmente a obrigao de reparar alguma violao dos direitosreconhecidos na Conveno Americana, cabe a este Tribunal exercer sua competnciasobre o suposto ato ilcito, desde que se cumpram determinados requisitos processuaisconvencionais, bem como, eventualmente, declarar as violaes que sejam pertinentese ordenar as reparaes cabveis, em conformidade com o artigo 63.1 da Conveno.O Tribunal considera, portanto, que as aes que o Estado afirma que adotou parareparar as supostas violaes cometidas no presente caso, ou evitar sua repetio,

    podem ser relevantes para a anlise da Corte sobre o mrito do caso e,eventualmente, para as possveis reparaes que se ordenem, mas no tm efeitosobre o exerccio da competncia da Corte para dele conhecer. Com base no expostoacima, o Tribunal desestima a exceo preliminar do Estado.

    C. Falta de esgotamento dos recursos internos

    1. Alegaes das partes

    32. O Estado afirmou que a Comisso deixou de avaliar adequadamente [as]questes [referentes ao esgotamento dos recursos internos], enquanto o caso estevesob [seu conhecimento] e, depois, quando tomou a deciso de encaminh-lo []

    Corte. Recordou que a regra de esgotamento dos recursos internos impede que umademanda internacional seja interposta antes que a suposta vtima tenha esgotadotodos os recursos internos previstos, e colocados sua disposio, no ordenamento

    jurdico interno do Estado supostamente responsvel. A proteo exercida pelos rgosinternacionais tem carter subsidirio e o propsito de uma instncia internacional no revisar ou reformar a sentena interna, mas constatar se a referida sentena est emconformidade com as normas internacionais. Tendo em vista as obrigaes do Estadode oferecer proteo e recursos judiciais eficazes, estabelecidas nos artigos 8 e 25 daConveno, cabe s vtimas utilizar todos os recursos internos disponveis antes derecorrer ao Sistema Interamericano. Por esse motivo, a Corte no pode ignorar essanorma, uma vez que, do contrrio, retiraria a confiana no funcionamento correto do[S]istema, [] colocando em risco sua credibilidade e existncia.

    33. O Estado salientou, ademais, que os representantes no haviam esgotado osseguintes recursos internos: a) a Arguio de Descumprimento de PreceitoFundamental No. 153, mediante a qual se solicitou que a anistia concedida pela Lei deAnistia No. 6.683/79 no se estenda aos crimes comuns praticados pelos agentes de

    35 Cf.Caso dos Irmos Gmez Paquiyauri versus Peru. Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 8 dejulho de 2004. Srie C No. 110, par. 75; Caso Bayarri, supra nota 33, par. 19, e Caso Da Costa Cadoganversus Barbados. Excees Preliminares, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 24 de setembro de2009. Srie C No. 204, par. 30.

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    represso contra os opositores polticos; b) a Ao Ordinria No. 82.00.024682-5,mediante a qual se solicitou a determinao do paradeiro dos desaparecidos, alocalizao dos restos mortais, o esclarecimento das circunstncias da morte e aentrega do relatrio oficial sobre as operaes militares contra a Guerrilha doAraguaia;c)a Ao Civil Pblica No. 2001.39.01.000810-5, interposta pelo MinistrioPblico Federal para obter do Estado todos os documentos existentes sobre aes

    militares das Foras Armadas contra a Guerrilha; d) a ao privada subsidiria para apersecuo penal dos crimes de ao pblica, e e) as iniciativas referentes solicitaode indenizaes, como a Ao Ordinria Civil de Indenizao e a solicitao dereparao pecuniria, no mbito da Lei No. 9.140/95, da Comisso Especial sobreMortos e Desaparecidos Polticos, e da Comisso de Anistia, de acordo com a Lei No.10.559/02, entre outras medidas de reparao.

    34. Particularmente, quanto Ao Ordinria No. 82.00.024682-5, o Brasilinformou que, em 8 de fevereiro de 2008, foi emitida uma deciso definitiva a esserespeito, cujo cumprimento j foi iniciado. Em 10 de julho de 2009, data em que seesgotou o prazo estabelecido para que o Estado cumprisse a deciso, a Advocacia-Geral da Unio entregou toda a documentao disponvel no mbito da Unio, acercadas operaes militares, especialmente no que se refere aos enfrentamentos armados,

    captura e deteno de civis, reconhecimento de corpos, identificao das vtimas,averiguaes de peritos, destino dos restos mortais encontrados e informaes detransferncia de civis, vivos ou mortos, para quaisquer reas, ocorridas no perodo.Este juzo, ademais, convocou testemunhas para prestar depoimentos e entregardocumentos que tivessem em seu poder relacionados Guerrilha do Araguaia. Poroutro lado, o Estado manifestou que a Ao Civil Pblica interposta pelo MinistrioPblico Federal em 25 de agosto de 2001 36 foi julgada procedente em 19 de dezembrode 2005. No entanto, em virtude dos recursos interpostos pela Unio contra essasentena, ela no tem ainda carter definitivo.

    35. A Comisso alegou que a questo do no esgotamento dos recursos internos foidevidamente analisada no Relatrio de Admissibilidade No. 33/01, de 6 de maro de

    2001. Afirmou que trs dos quatro eixos de argumentaodo Estado, os relacionadoscom a Arguio de Descumprimento de Preceito Fundamental No. 153, a Ao CivilPblica e as consideraes especficas sobre medidas de reparao adotadas, soposteriores data em que expediu o citado Relatrio. Adicionalmente, com respeito Ao Ordinria, a Comisso manifestou expressamente no Relatrio de Admissibilidadeque esta ao levava anos sem uma deciso definitiva e que essa demora no podiaser considerada razovel. Por essa razo, a Comisso aplicou a exceo prevista noartigo 46.2.c da Conveno e declarou a petio admissvel.Ademais,salientouque oEstado no alegou em sua contestao demanda que a deciso de admissibilidadeadotada estivesse baseada em informao errnea ou que fosse fruto de um processoem que as partes tivessem restringida a igualdade de armas ou seu direito de defesa.Aduziu, tambm, que, em princpio, o contedo das decises de admissibilidadeadotadas de acordo com a Conveno e o Regulamento da Comisso no deveria ser

    objeto de um novo exame substancial. Ante o exposto, a Comisso solicitou Corteque desestime por ser infundada esta exceo preliminar.

    36. Os representantes indicaram que a Comisso j realizou um exame deadmissibilidade no caso, razo pela qual a Corte deve remeter-se a este exame. Combase nos princpios de segurana jurdica e da certeza processual, uma vezdeterminada a admissibilidade do caso, aplica-se o princpio da precluso, exceto em

    36 O artigo 129, inciso III, da Constituio Federal, estabelece que a Ao Civil Pblica uma formade ao coletiva para a defesa de interesses difusos e coletivos.

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    situaes extraordinrias em que haja um erro grave que viole o direito de defesa daspartes. No presente caso, o Estado no identificou nenhum erro grave noprocedimento perante a Comisso, nem demonstrou prejuzo algum a seu direito dedefesa. Durante os seis anos de transcurso da etapa de admissibilidade do caso, oEstado teve amplas oportunidades de contestar todas as alegaes dos representantese as inquietudes da Comisso, motivo por que no h fundamento para reexaminar a

    deciso da Comisso no Relatrio de Admissibilidade. Alm disso, o Estado deveapresentar a exceo sobre a falta de esgotamento dos recursos internos antes dopronunciamento da Comisso sobre a admissibilidade do caso. Antes da emisso doRelatrio de Admissibilidade No. 33/01, o Estado somente argumentou a falta deesgotamento de dois recursos internos: a) a Ao Ordinria a respeito da qual,segundo o Brasil, no se deveria aplicar a exceo de demora injustificada, e b) a aode habeas data, que no teria sido interposta. No entanto, na tramitao perante aCorte, o Estado reiterou os argumentos relativos Ao Ordinria mencionada eacrescentou outras aes judiciais, tais quais a Arguio de Descumprimento No. 153,a Ao Civil Pblica e outras medidas que foram ou poderiam ter sido adotadas a fimde atender s medidas de reparao solicitadas. Para os representantes, o Estado noalegou a falta de esgotamento dos recursos mencionados no momento processualoportuno, motivo pelo qual esta exceo preliminar deve ser considerada

    extempornea e no deve ser admitida pelo Tribunal.

    37. De forma subsidiria, os representantes salientaram a ineficcia dos recursosinternos aludidos pelo Estado. Quanto Ao Ordinria, alegaram que, passados 27anos de seu incio e em que pese a deciso final, ela no produziu os efeitosesperados, no constituindo, portanto[, um] recurso eficaz para o esclarecimento dosfatos denunciados. Indicaram que o recurso adequado para remediar as violaesalegadas era o recurso penal. No entanto, e apesar de tratar-se de um caso dedesaparecimentos forados, em virtude da Lei de Anistia, o Estado no iniciou umainvestigao destinada a esclarecer os fatos, identificar os responsveis e garantir a

    justia, o que no foi negado pelo Estado. A interpretao vigente sobre a Lei deAnistia teve um efeito direto na omisso do Ministrio Pblico em relao aos fatos do

    presente caso e inibiu os familiares de apresentar queixa a fim de iniciar oprocedimento destinado a instaurar a ao penal correspondente. Finalmente, osrepresentantes salientaram que, ao contrrio do que determina a jurisprudncia doTribunal, o Brasil indicou outros recursos, mas no demonstrou disponibilidade oueficcia para remediar as violaes alegadas no presente caso, como, por exemplo, aArguio de Descumprimento ou a Ao Civil Pblica, que foram iniciadasposteriormente emisso do Relatrio de Admissibilidade.

    2. Consideraes da Corte

    38. Este Tribunal vem sustentando de maneira consistente que uma objeo aoexerccio de jurisdio da Corte, baseada na suposta falta de esgotamento dosrecursos internos, deve ser apresentada no momento processual oportuno37, ou seja,

    na etapa de admissibilidade do procedimento perante a Comisso38. A esse respeito, o

    37 Cf. Caso Velsquez Rodrguez versus Honduras. Excees Preliminares. Sentena de 26 de junho de1987. Srie C No.1, par. 88; Caso Da Costa Cadogan, supra nota 35, par. 18, e Caso Usn Ramrez versusVenezuela. Exceo Preliminar, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 20 de novembro de 2009. Srie CNo. 207, par. 19.

    38 Cf. Caso Herrera Ulloa versus Costa Rica. Excees Preliminares, Reparaes e Custas. Sentena de2 de julho de 2004. Srie C No. 107, par. 81; Caso Apitz Barbera e outros (Corte Primera de lo Contencioso

    Administrativo) versus Venezuela. Exceo Preliminar, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 5 deagosto de 2008. Srie C No. 182, par. 24, e Caso Bayarri, supra nota 33, par. 16.

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    Tribunal reitera que a interpretao que conferiu ao artigo 46.1.a da Conveno, pormais de 20 anos, est em conformidade com o Direito Internacional39 e que, conformesua jurisprudncia40 e a jurisprudncia internacional41, no tarefa da Corte nem daComisso identificar ex officio quais so os recursos internos a serem esgotados, masque cabe ao Estado a indicao oportuna dos recursos internos que devem seresgotados e de sua efetividade.

    39. O Tribunal observa do expediente do caso perante a Comisso Interamericanaque esta solicitou ao Estado que indicasse, de acordo com o artigo 34 de seuRegulamento ento vigente, os elementos de juzo que lhe permitissem verificar sehaviam sido esgotados os recursos da jurisdio interna. Em resposta a esse pedido, oBrasil informou que: a) no se havia esgotado a Ao Ordinria, que se encontrava emetapa de conhecimento do processo, e b) existia a possibilidade para os familiares deinterpor um habeas data para obter documentos e informao de rgos pblicos.Esses so os nicos questionamentos do Estado vinculados a excees preliminaresapresentados oportunamente.

    40. Ao contrrio, as alegaes relativas Arguio de Descumprimento, Ao CivilPblica, possibilidade de interposio de uma ao penal subsidiria e s diversas

    iniciativas de reparao, foram expostas pelo Brasil, pela primeira vez, como parte deuma exceo preliminar por falta de esgotamento dos recursos internos em suacontestao demanda, aproximadamente nove anos e oito meses depois de adotadaa deciso de admissibilidade por parte da Comisso Interamericana, ou seja, demaneira extempornea. Por esta razo, no corresponde admitir estes argumentos.

    41. Com relao s duas alegaes de falta de esgotamento apresentadasoportunamente (supra par. 39), a Corte observa que, no procedimento perante si, oEstado no alegou a falta de interposio de um habeas data, motivo por que oTribunal considera que houve desistncia a esse respeito e no far nenhumaconsiderao adicional.

    42.

    Com base no exposto acima, o Tribunal analisar unicamente a alegao doEstado referente falta de esgotamento dos recursos internos a respeito da AoOrdinria. No momento em que a Comisso emitiu o Relatrio No. 33/01, em 6 demaro de 2001, passados mais de 19 anos do incio dessa ao, no havia umadeciso definitiva do mrito no mbito interno. Por esse motivo, a Comisso concluiuque o atraso do processo no podia ser considerado razovel. A Comisso, porconseguinte, entendeu que no se podia exigir o requisito do esgotamento dosrecursos internos e aplicou ao caso o artigo 46.2.c da Conveno. A Corte observa queno se deduz do expediente a alegada anlise inadequada por parte da Comisso arespeito desta exceo. De igual maneira, durante a tramitao do caso perante aCorte, o Estado teve a oportunidade de apresentar seus argumentos de defesa quantoa todos os aspectos da demanda, apesar do que, no demonstrou prejuzo a seu

    39 Cf. Caso Revern Trujillo versus Venezuela. Exceo Preliminar, Mrito, Reparaes e Custas.Sentena de 30 de junho de 2009. Srie C No. 197, par. 22, e Caso Usn Ramrez, supra nota 37, par. 22.

    40 Cf. Caso Velsquez Rodrguez. Excees Preliminares, supra nota 37, par. 88; Caso Revern Trujillo,supra nota 39, par. 23, e Caso Usn Ramrez, supra nota 37, par. 22.

    41 Cf. E.C.H.R., Deweer v. Belgium, Application No. 6903/75, Judgment of 27 February 1980, para.26; E.C.H.R., Foti and others v. Italy, Applications Nos. 7604/76; 7719/76; 7781/77, and 7913/77,Judgment of 10 de dicember 1982, para. 48, e E.C.H.R., De Jong, Baljet and van den Brink v. theNetherlands, Applications Nos. 8805/79; 8806/79, and 9242/81, Judgment of 22 May 1984, para. 36.

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    45. Com relao Arguio de Descumprimento No. 153, os representantessalientaram que: a) esse recurso no estava regulamentado quando o presente casofoi submetido Comisso; b) a legitimao ativa para sua interposio limitada eno inclui os familiares ou seus representantes; c) o Partido Comunista do Brasil, que oEstado afirmou que poderia ter interposto essa ao, no o representante legal dos

    familiares e, por conseguinte, no poderia interpor essa ao em seu nome, e d) essaao no constitui um recurso adequado para remediar os desaparecimentos forados.Por esse motivo, concluram que absurdo exigir o esgotamento do recursomencionado. Por outro lado, os representantes alegaram que a deciso do SupremoTribunal Federal, ao estender a anistia aos agentes da represso que cometeramcrimes contra a humanidade, impede objetivamente a busca de justia e o acesso verdade que as vtimas perseguem. Ao ser este ponto objeto do litgio do presentecaso, no se sustenta a alegao de quarta instncia apresentada pelo Estado. Emboraos representantes tenham coincidido no que diz respeito ao carter subsidirio da

    jurisdio internacional, consideraram que a anlise do conjunto dos elementos queconstituiriam violaes continuadas aos direitos das vtimas e de seus familiares essencial para a determinao da responsabilidade internacional do Estado.

    2. Consideraes da Corte

    46. O Tribunal observa que, com base na Arguio de Descumprimento No. 153, oEstado apresentou duas excees preliminares, uma relativa falta de esgotamentodos recursos internos e outra relacionada com a frmula da quarta instncia. Quanto primeira dessas alegaes, a Corte j estabeleceu que o Estado no apresentou essaexceo no momento processual oportuno e desestimou esse argumento ( supra par.40). Embora a extemporaneidade dessa alegao seja o fundamento de sua recusa, aCorte Interamericana considera conveniente prestar os seguintes esclarecimentos. Emprimeiro lugar, evidente que a Arguio de Descumprimento no um recurso quese possa considerar disponvel, no somente porque no estava regulamentada nomomento da interposio da denncia perante a Comisso, mas tambm porque os

    particulares, como os familiares das supostas vtimas, no esto legitimados parautiliz-lo, dado que os nicos legitimados para interpor essa ao so determinadosfuncionrios e instituies do Estado e coletivos sociais43. Alm disso, o objeto dareferida ao evitar ou reparar uma possvel leso a uma norma fundamental, que,no caso perante o Supremo Tribunal Federal, se expressava em uma determinadainterpretao constitucional. Disso se deduz claramente que tampouco constitua umrecurso adequado para reparar as violaes alegadas, isto , para esclarecer os fatos,estabelecer as responsabilidades individuais deles decorrentes e determinar oparadeiro das supostas vtimas desaparecidas.

    47. Por outra parte, o Tribunal observa que a alegao sobre a quarta instncia foiinterposta pelo Estado na audincia pblica do presente caso, posteriormente apresentao do escrito de contestao demanda. Embora o artigo 38.1 do

    Regulamento estabelea que o momento processual para a interposio de exceespreliminares o da apresentao do escrito de contestao da demanda, a Corteconsidera que a sentena do Supremo Tribunal Federal, de 29 de abril de 2010,

    43 O artigo 103 da Constituio Federal dispe que podem interpor essa ao:I. o Presidente da Repblica; II. a Mesa do Senado Federal; III. a Mesa da Cmara dos Deputados;

    IV. a Mesa das Assemblias Legislativas ou da Cmara Legislativa do Distrito Federal; V. o Governador deEstado ou do Distrito Federal; VI. o Procurador-Geral da Repblica; VII. o Conselho Federal da Ordem dosAdvogados do Brasil; VIII. partido poltico com representao no Congresso Nacional; IX. confederaosindical ou entidade de classe de mbito nacional.

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    constitui um fato superveniente (infra par. 58) e, por esse motivo, cabe a este Tribunalpronunciar-se sobre essa alegao estatal. A Comisso e os representantes das vtimastiveram a oportunidade de apresentar suas alegaes com respeito a esta exceopreliminar tanto na audincia pblica como nas alegaes finais escritas, motivo porque lhes foi garantido o direito de defesa.

    48. A demanda apresentada pela Comisso Interamericana no pretende revisar asentena do Supremo Tribunal Federal, deciso que nem sequer havia sido emitidaquando aquele rgo apresentou sua demanda perante a Corte Interamericana, masque se estabelea se o Estado violou determinadas obrigaes internacionais dispostasem diversos preceitos da Conveno Americana, em prejuzo das supostas vtimas,inclusive, inter alia, o direito de no ser submetido a um desaparecimento foradodecorrente dos artigos 3, 4, 5 e 7 da Conveno Americana, o direito proteo

    judicial e s garantias judiciais relativos ao esclarecimento dos fatos e determinaodas responsabilidades individuais por esses mesmos fatos, decorrentes dos artigos 8 e25 da Conveno Americana.

    49. Em numerosas ocasies, a Corte Interamericana afirmou que o esclarecimentoquanto violao ou no, pelo Estado, de suas obrigaes internacionais, em virtude

    da atuao de seus rgos judiciais, pode levar este Tribunal a examinar osrespectivos processos internos, inclusive, eventualmente, as decises de tribunaissuperiores, para estabelecer sua compatibilidade com a Conveno Americana44, o queinclui, eventualmente, as decises de tribunais superiores. No presente caso, no sesolicita Corte Interamericana a realizao de um exame da Lei de Anistia com relao Constituio Nacional do Estado, questo de direito interno que no lhe compete eque foi matria do pronunciamento judicial na Arguio de Descumprimento No. 153(infra par. 136), mas que este Tribunal realize um controle de convencionalidade, ouseja, a anlise da alegada incompatibilidade daquela lei com as obrigaesinternacionais do Brasil contidas na Conveno Americana. Consequentemente, asalegaes referentes a essa exceo so questes relacionadas diretamente com omrito da controvrsia, que podem ser examinadas por este Tribunal luz da

    Conveno Americana, sem contrariar a regra da quarta instncia. O Tribunal,portanto, desestima esta exceo preliminar.

    IVCOMPETNCIA

    50. A Corte Interamericana competente, nos termos do artigo 62.3 da Conveno,para conhecer do presente caso, em razo de ser o Brasil Estado Parte da ConvenoAmericana desde 25 de setembro de 1992 e de ter reconhecido a competnciacontenciosa da Corte em 10 de dezembro de 1998.

    VPROVA

    44 Cf.Caso dos Meninos de Rua (Villagrn Morales e outros) versus Guatemala. Mrito. Sentena de19 de novembro de 1999. Srie C No. 63, par. 222; Caso Escher e outros, supra nota 27, par. 44, e Caso DaCosta Cadogan, supra nota 35, par. 12.

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    51. Com base no estabelecido nos artigos 46, 47 e 50 do Regulamento, bem comoem sua jurisprudncia a respeito da prova e sua apreciao45, a Corte examinar eavaliar os elementos probatrios documentais remetidos pelas partes em diversasoportunidades processuais, bem como as declaraes das supostas vtimas, ostestemunhos e os pareceres periciais rendidos perante agente dotado de f pblica ena audincia pblica perante a Corte. Para isso, o Tribunal se ater aos princpios da

    crtica s, dentro do marco normativo correspondente46

    .

    A. Prova documental, testemunhal e pericial

    52. O Tribunal recebeu as declaraes rendidas perante agente dotado de f pblicapelas supostas vtimas, testemunhas e peritos, especificados neste pargrafo, sobre ostemas a seguir mencionados. O contedo dessas declaraes esto includos nocaptulo correspondente:

    1) Diva Soares Santana, suposta vtima, proposta pela ComissoInteramericana. Declarou sobre: a) os alegados esforos dos familiares dosdesaparecidos para obter justia, verdade e reparao, bem como paraconhecer o paradeiro dos desaparecidos, entre eles sua irm, Dinaelza Santana

    Coqueiro, e seu cunhado, Vandick Reidner Pereira Coqueiro, e b) o impactoalegadamente sofrido por ela e sua famlia, em virtude dos fatos do caso;

    2) Victoria Lavnia Grabois Olmpio, suposta vtima, proposta pela Comisso epelos representantes. Declarou sobre: a) sua relao familiar com seu pai,Maurcio Grabois, seu irmo, Andr Grabois, e seu esposo e pai de seu filho,Gilberto Olmpio; b) a forma como teve conhecimento dos alegadosdesaparecimentos forados dessas pessoas; c) o impacto dessesdesaparecimentos em sua vida e na de sua famlia; d) as supostas gestes eaes pessoais e familiares para conhecer a verdade sobre o ocorrido, obter

    justia e localizar os restos mortais de seus entes queridos, bem como osobstculos enfrentados, e e) as alegadas consequncias materiais e imateriais

    dos desaparecimentos e da falta de verdade e justia para ela e sua famlia;3)Aldo Creder Corra; 4) Clovis Petit de Oliveira; 5) Dilma Santana Miranda; 6)Dinor Santana Rodrigues; 7) Dirceneide Soares Santana; 8) Elena GibertiniCastiglia; 9) Elza da Conceio Oliveira; 10) Helenalda Resende de SouzaNazareth; 11) Igor Grabois Olmpio; 12) Joo Carlos Schmidt de Almeida; 13)

    Jos Dalmo Ribeiro Ribas; 14)Junilia Soares Santana; 15) Lorena Moroni GiroBarroso; 16) Luza Gurjo Farias; 17) Luiza Monteiro Teixeira; 18) Maria Elianade Castro Pinheiro; 19) Maria Leonor Pereira Marques; 20) Maristella Nurchis;21) Rosa Olmpio; 22) Rosana de Moura Momente; 23) Snia Maria Haas; 24)Terezinha Souza Amorim; 25) Valria Costa Couto, e 26) Viriato AugustoOliveira47, supostas vtimas, propostas pelos representantes. Declararam sobre

    45

    Cf. Caso da Panel Blanca (Paniagua Morales e outros) versus Guatemala. Reparaes e Custas.Sentena de 25 de maio de 2001. Srie C No. 76, par. 50; Caso Rosendo Cant e outra versus Mxico,Exceo Preliminar, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 31 de agosto de 2010. Serie C No. 216, par.27, e Caso Ibsen Crdenas e Ibsen Pea, supra nota 24, par. 39.

    46 Cf. Caso da Panel Blanca (Paniagua Morales e outros) versus Guatemala. Mrito. Sentena de 8 demaro de 1998. Srie C No. 37, par. 76; CasoRosendo Cant e outra,supra nota 45, par. 27, e Caso IbsenCrdenas e Ibsen Pea, supra nota 24, par. 39.

    47 Cf. Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia) versus Brasil.Reconsiderao. Resoluoda Corte Interamericana de Direitos Humanos de 19 de maio de 2010, Considerandos 23 a 29 e PontoResolutivo Primeiro.

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    os aspectos referentes a: a) sua relao familiar com as supostas vtimasdesaparecidas; b) a maneira como tomaram conhecimento dos alegadosdesaparecimentos forados; c) as aes pessoais e gestes dos familiares paraconhecer a verdade sobre o ocorrido e localizar os restos mortais de seus entesqueridos; d) o contexto poltico vivido depois dos desaparecimentos; e) aatuao das autoridades pblicas, assim como outros obstculos na busca por

    justia; f) as consequncias materiais e imateriais dos desaparecimentos e dafalta de verdade e justia em sua vida pessoal e familiar, e g) as indenizaesrecebidas;

    27) Danilo Carneiro, testemunha proposta pelos representantes. Declarousobre: a) as supostas atividades dos militantes polticos na referida regio, e b)o padro de represso que teria sido imposto pelo Estado durante o regimemilitar e, em particular, o modus operandi das alegadas detenes e dastorturas perpetradas por agentes estatais e seus colaboradores contra osopositores polticos e seus supostos colaboradores na regio;

    28) Edmundo Teobaldo Mller Neto, testemunha proposta pelo Estado. Declarousobre as alegadas atividades do Grupo de Trabalho Tocantins, institudo pelo

    Decreto No. 567/MD, com o objetivo de localizar, recolher e identificar oscorpos dos guerrilheiros e militares mortos no episdio conhecido comoGuerrilha do Araguaia;

    29)Jaime Antunes da Silva48, testemunha proposta pelo Estado. Declarou sobrea alegada implementao do Centro de Referncia das Lutas Polticas no Brasil(1964-1985) - Memrias Reveladas, referente recuperao e disponibilizaodos arquivos dos rgos de segurana do regime de exceo;

    30) Flavia Piovesan49, professora de Direito Constitucional e Direitos Humanos,perita proposta pela Comisso. Apresentou laudo pericial sobre: a) a Lei No.11.111 e os Decretos No. 2.134/97, No. 4.553/02 e No. 5.584/05, com relao

    aos direitos fundamentais estabelecidos na Constituio Federal de 1988, e b)as consequncias dessas normas para o cumprimento da sentena definitivaproferida no mbito da Ao Ordinria No. 82.00.24682-5, com o objetivo deque examine a possibilidade concreta de execuo da referida sentena;

    31) Damin Miguel Loreti Urba, advogado especialista em liberdade deexpresso e leis de sigilo, perito proposto pela Comisso. Apresentou laudopericial sobre a Lei No. 11.111 e os Decretos No. 2.134/97, No. 4.553/02 e No.5.584/05, e as garantias constitucionais fundamentais relativas liberdade deexpresso e ao acesso informao;

    32) Paulo Csar Endo, psiclogo e professor, perito proposto pelosrepresentantes. Apresentou laudo pericial sobre: a) os efeitos nos familiares

    dos alegados desaparecimentos forados e da falta de justia e verdade sobre oocorrido; b) as caractersticas que deve ter um programa adequado de ateno

    48 Cf. Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia). Reconsiderao, supra nota 47,Considerandos 12 a 16 e Ponto Resolutivo Primeiro.

    49 Cf. Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia). Reconsiderao, supra nota 47,Vistos 4 e 7.

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    psicolgica a esses danos, e c) outras medidas que o Estado deva adotar parareparar as supostas violaes cometidas;

    33) Hlio Bicudo, ex-Promotor do Ministrio Pblico do Estado de So Paulo eespecialista em direito internacional dos direitos humanos, perito proposto pelosrepresentantes. Apresentou laudo pericial sobre como a interpretao dada aos

    crimes conexos previstos na Lei No. 6.683/79 constituiu um suposto obstculopara a persecuo penal e punio dos autores das graves violaes dosdireitos humanos cometidas durante o regime militar brasileiro;

    34) Estevo Chaves de Rezende Martins50, professor, ex-Secretrio Legislativodo Ministrio da Justia e ex-Consultor Geral Legislativo do Senado Federal,perito proposto pelo Estado. Requereu-se um parecer pericial sobre aexperincia histrica brasileira luz do conceito de justia de transio, e

    35) Alcides Martins, Subprocurador Geral da Repblica, perito proposto peloEstado. Apresentou uma anlise tcnico-jurdica sobre a Lei de Anistia.

    53. Quanto prova rendida em audincia pblica, a Corte ouviu as declaraes daspessoas a seguir relacionadas:

    1) Laura Petit da Silva, suposta vtima, proposta pela Comisso e pelosrepresentantes. Declarou sobre: a) a identificao de sua irm, Maria Lcia Petitda Silva; b) o impacto que teve em sua vida e na de sua famlia a alegadaexecuo de sua irm e o suposto desaparecimento de seus irmos, Lcio eJaime Petit da Silva, e c) os esforos e obstculos que teria enfrentado paraobter verdade e justia;

    2) Crimia Alice Schmidt de Almeida e 3) Elizabeth Silveira e Silva, supostasvtimas, propostas pelos representantes. Declararam sobre os aspectosreferentes a: a) sua relao familiar com a suposta vtima desaparecida; b) a

    maneira como tiveram conhecimento do alegado desaparecimento forado; c)as aes pessoais e gestes dos familiares para conhecer a verdade sobre oocorrido e localizar os restos mortais de seus entes queridos; d) o contextopoltico vivido durante o regime militar no Brasil; e) a atuao das autoridadespblicas, bem como outros obstculos na busca por justia; f) as consequnciasmateriais e imateriais dos desaparecimentos e da falta de verdade e justia emsua vida pessoal e familiar, e g) as indenizaes recebidas;

    4) Marlon Alberto Weichert, testemunha proposta pela Comisso e pelosrepresentantes. Declarou sobre: a) o alcance e a interpretao conferidos Leide Anistia brasileira; b) os demais obstculos alegadamente utilizados no direitobrasileiro para impedir a investigao, julgamento e punio de gravesviolaes de direitos humanos, e c) os obstculos e as restries supostamente

    indevidas ao direito de acesso a informao no Brasil;

    5) Belisrio dos Santos51, testemunha proposta pelos representantes. Declarou

    50 Cf. Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia). Reconsiderao, supra nota 47,Considerandos 4 a 11 e Ponto Resolutivo Primeiro.

    51 Cf. Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia). Reconsiderao, supra nota 47,Considerandos 18 e 22 e Ponto Resolutivo Segundo.

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    sobre: a) os supostos obstculos jurdicos e legais encontrados no litgio decasos de presos polticos, concernentes a fatos ocorridos durante o regimemilitar brasileiro; b) as obstrues alegadamente encontradas pela ComissoEspecial para ter acesso aos documentos oficiais em poder do Estado e nabusca e entrega dos restos mortais das supostas vtimas desaparecidas; c) o

    julgamento de processos e o pagamento de indenizaes pela Comisso

    Especial, e d) as atividades do Comit de Superviso do Grupo de TrabalhoTocantins;

    6) Jos Gregori, testemunha proposta pelo Estado. Declarou sobre aimportncia e as atividades da Comisso Especial sobre Mortos e DesaparecidosPolticos, e o contexto histrico da Lei No. 9.140/95;

    7)Jos Paulo Sepvelda Pertence, testemunha proposta pelo Estado. Declarousobre: a) o contexto histrico de elaborao e promulgao da Lei de Anistia, eb) sua alegada contribuio para o processo de reconciliao nacional pocade sua promulgao;

    8) Rodrigo Uprimny, professor, especialista em justia de transio, perito

    proposto pela Comisso. Apresentou percia sobre: a) o eventual impacto, nasociedade brasileira atual, causado pelo desconhecimento da verdade histricade seu passado e das graves violaes de direitos humanos ocorridas durante oregime militar, e b) as possveis consequncias do anteriormente exposto, e

    9) Gilson Langaro Dipp, Ministro do Superior Tribunal de Justia, ex-CorregedorNacional de Justia, perito proposto pelo Estado. Apresentou percia sobre aArguio de Descumprimento de Preceito Fundamental, luz do ordenamento

    jurdico brasileiro.

    B. Admissibilidade da prova documental

    54.

    No presente caso, como em outros

    52

    , o Tribunal admite o valor probatrio dosdocumentos enviados pelas partes na devida oportunidade processual, que no foramcontrovertidos ou objetados, nem cuja autenticidade tenha sido colocada em dvida.

    55. Com relao aos artigos ou textos acadmicos, a Corte j mencionou,anteriormente, que se trata de obras escritas, que contm declaraes ou afirmaesde seus autores para divulgao pblica. Nesse sentido, a valorao de seu contedono se encontra sujeita s formalidades exigidas para as provas testemunhais. Noobstante, seu valor probatrio depender de que corroborem ou se refiram a aspectosrelacionados com o caso concreto53.

    56. Quanto s notas de imprensa, este Tribunal considerou que podero serapreciadas quando renam fatos pblicos e notrios ou declaraes de funcionrios

    do Estado ou quando corroborem aspectos relacionados com o caso54. O Tribunal

    52 Cf. Caso Velsquez Rodrguez. Mrito, supra nota 25, par. 140; CasoRosendo Cant e outra,supranota 45, par. 31, e Caso Ibsen Crdenas e Ibsen Pea, supra nota 24, par. 42.

    53 Cf. Caso Radilla Pacheco, supra nota 24, par. 72; Caso Fernndez Ortega e outro versus Mxico.Exceo Preliminar, Mrito, Reparaes e Custas. Sentena de 30 de agosto de 2010. Srie C No. 215, par.33, e CasoRosendo Cant e outra,supra nota 45, par. 34.

    54 Cf. Caso Velsquez Rodrguez. Mrito, supra nota 25, par. 146; CasoRosendo Cant e outra,supranota 45, par. 35, e Caso Ibsen Crdenas e Ibsen Pea, supra nota 24, par. 43.

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    decide admitir os documentos que se encontrem completos ou que, pelo menos,possibilitem constatar a fonte e data de publicao e os valorar luz do conjunto doacervo probatrio, das observaes do Estado e das regras da crtica s.

    57. De igual modo, a Corte incorpora ao acervo probatrio as decises e outrosdocumentos que considera teis para a resoluo deste caso, em aplicao do artigo

    47.1 do Regulamento.

    58. Posteriormente contestao da demanda, em 6 de maio de 2010, o Estadoinformou ao Tribunal que, em 29 de abril de 2010, o Supremo Tribunal Federaldecidiu pela improcedncia da Arguio de Descumprimento de Preceito FundamentalNo. 153 e confirmou, por sete votos contra dois, a validade interna da Lei de Anistia.O Brasil indicou que essa deciso constitui um fato novo superveniente, nos termosdo artigo 46.3 do Regulamento aplicvel que altera substancialmente o rumo dainstruo processual at ento realizada e solicitou que fossem anexados como provaos votos de quatro ministros do Supremo Tribunal Federal, aportados pelo Estado.

    59. A Corte considera que a deciso do Supremo Tribunal Federal do Estado, queafirma a constitucionalidade da Lei de Anistia, est ligada aos fatos do presente caso.

    O Tribunal, por conseguinte, admite como prova de fatos supervenientes osdocumentos aportados pelo Estado, nos termos do artigo 46.3 do Regulamento, econsiderar, no que sejam pertinentes, as informaes ali indicadas.

    60. Por outro lado, a Corte admite, excepcionalmente, os documentos enviadospelas partes em diversas oportunidades processuais, por julg-los pertinentes e teispara a determinao dos fatos e suas eventuais consequncias jurdicas, sem prejuzodas consideraes a seguir formuladas.

    61. A Comisso Interamericana apresentou, com suas alegaes finais,documentos enviados pelo perito Uprimny, relativos percia por ele apresentada aeste Tribunal. O Estado observou que no h uma disposio normativa a respeito da

    possibilidade de complementao de uma percia apresentada em audincia pblica.Ademais, alegou que esses documentos no se referem a fatos relevantes para oprocesso, nem se relacionam com nenhum evento de fora maior, impedimento graveou fatos supervenientes, motivos pelos quais os documentos aportados soextemporneos e inadmissveis.

    62. A Corte recorda que os documentos relativos ao parecer do perito Uprimnyforam anexados em atendimento a um pedido do Tribunal, no decorrer da audinciapblica, e, por esse motivo, os incorpora ao acervo do presente caso nos termos doartigo 47 do Regulamento. A Corte levar em considerao as observaes do Estado,dentro do conjunto do acervo probatrio, em aplicao das regras da crtica s.

    63. O Brasil anexou a suas alegaes finais escritas a opinio de uma pessoa sobreo parecer do perito Uprimny, alm de material de imprensa que, segundo o Estado,contrastaria com a opinio do perito. Os representantes alegaram que a pessoa queelaborou essa resposta, alm de no ser um perito convocado pelo Tribunal, no teveseu parecer apresentado oportunamente como prova na contestao do Estado etampouco se alegou fora maior, impedimento grave ou fatos supervenientes para aapresentao dessa prova. Trata-se, por conseguinte, de prova apresentada de forma

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    inoportuna e extempornea. Com relao ao material de imprensa anexado,salientaram que no tem relao direta com o caso e no foi citado nessa opinio.

    64. A Corte observa que a apresentao desses documentos no est prevista nasnormas regulamentares, nem foi justificada em alguma das situaes que,excepcionalmente, permitem a apresentao extempornea de provas, nem foi

    solicitada pelo Tribunal. Com base no anteriormente exposto, no admitir osdocumentos que alegadamente responderiam percia do senhor Uprimny.

    65. Os representantes anexaram a suas alegaes finais comprovantes de gastosrelacionados com o presente caso e um complemento da percia do senhor Bicudo.Com relao a este ltimo documento, o Estado considerou extempornea einadmissvel essa apresentao.

    66. A Corte observa que a apresentao de uma percia complementar no estprevista nas normas regulamentares, no foi justificada em nenhuma das situaesque, excepcionalmente, permitem a apresentao extempornea de provas, nem foisolicitada pelo Tribunal. Isto posto, no admitir os documentos relativos perciacomplementar mencionada. Por outro lado, quanto aos comprovantes de gastos

    enviados pelos representantes, o Tribunal s considerar os documentos enviadoscom as alegaes finais escritas que se refiram s custas e gastos ocorridos porocasio do procedimento perante esta Corte com posterioridade ao escrito desolicitaes e argumentos.

    C. Admissibilidade das declaraes das supostas vtimas e da provatestemunhal e pericial

    67. Quanto s declaraes das supostas vtimas e das testemunhas, bem como aospareceres apresentados na audincia pblica e mediante declaraes juramentadas, aCorte os considera pertinentes apenas na medida em que se ajustem ao objetodefinido pelo Presidente do Tribunal, na resoluo em que se ordenou receb-los55, e

    em conjunto com os demais elementos do acervo probatrio, levando em conta asobservaes formuladas pelas partes56.

    68. Com relao s declaraes das supostas vtimas, o Estado formulouesclarecimentos e opinies sobre alguns dos pontos abordados nos depoimentos dassenhoras Victria Lavnia Grabois Olmpio e Diva Soares Santana.

    69. Conforme a jurisprudncia deste Tribunal, as declaraes prestadas pelassupostas vtimas no podem ser valoradas isoladamente, mas como parte do conjuntodas provas do processo, uma vez que so teis na medida em que podemproporcionar mais informaes sobre as supostas violaes e suas consequncias57. ACorte registra que as observaes do Estado se referem a certos aspectos do

    55 Cf. Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia). Convocatria de Audincia Pblica, supranota 6, e Caso Gomes Lund e outros (Guerrilha do Araguaia). Reconsiderao, supra nota 47,Considerandos 4 a 11.

    56 Cf. Caso Loayza Tamayo versus Peru. Mrito. Sentena de 17 de setembro de 1997. Srie C No. 33,par. 43; CasoRosendo Cant e outra,supra nota 45, par. 50, e Caso Ibsen Crdenas e Ibsen Pea, supranota 24, par. 47.

    57 Cf. Caso da Panel Blanca (Paniagua Morales e outros). Reparaes e Custas, supra nota 45, par.70; CasoRosendo Cant e outra,supra nota 45, par. 52, e Caso Ibsen Crdenas e Ibsen Pea, supra nota24, par. 48.

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    contedo de ambas as declaraes mas que no impugnam sua admissibilidade. Anteo exposto, o Tribunal admite essas declaraes, sem prejuzo de que seu valorprobatrio seja considerado luz dos critrios mencionados (supra par. 67) e dasregras da crtica s.

    70. Ademais, a Comisso Interamericana, os representantes e o Estadoapresentaram observaes sobre algumas declaraes testemunhais. A Comisso e osrepresentantes se manifestaram sobre alguns aspectos do contedo do depoimentodo senhor Antunes da Silva. Alm disso, os representantes acrescentaram que atestemunha extrapolou o objeto definido na resoluo [do Presidente], que incluasomente as atividades relativas ao projeto Memrias Reveladas, quando se referius normas internas e experincia comparada. Em suas alegaes finais, o Estadorespondeu a essas observaes, sustentando, inter alia, que o registro, no affidvit,de uma pequena anlise comparativa dos acervos de outros pases fruto dosresultados obtidos atravs do contato estreito que a testemunha vem mantendo comrepresentantes e tcnicos das diversas instituies de arquivo na Amrica Latina.OBrasil salientou, ademais, que no ficou completamente claro o significado d