SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES REGENTES DE … · produto artístico, contribuindo para que ela...

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SENSIBILIZAÇÃO DE PROFESSORES REGENTES DE CLASSE DO

ENSINO FUNDAMENTAL NA ESCOLA ESPECIAL EM BUSCA DE SUA

EXPRESSÃO ARTÍSTICA

Autora: Nilza Regina Martins Boeng1

Orientadora: Tamara da Silveira Valente2

Resumo

Este artigo relata os estudos desenvolvidos no Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, entre os anos de 2010 e 2011, cujo objetivo foi sensibilizar os professores regentes de classe do Ensino Fundamental de uma escola da rede conveniada do Estado do Paraná - na modalidade Educação Especial - a desenvolver uma prática pedagógica com vistas a levá-los a reconhecer os aspectos estéticos e plásticos na produção artística de seus alunos com deficiência intelectual. Os estudos também foram apresentados no GTR - Grupo de Trabalho em Rede, onde dez professores contribuíram através da sua participação nos Fóruns do espaço virtual Moodle. Durante a implementação das ações relativas aos estudos foi oferecida aos professores a oportunidade de realizar leituras e discussões de textos referentes ao assunto estudado, e oficinas de Desenho, Pintura e Recorte e Colagem. Outro objetivo foi o de levar os professores a realizarem as atividades propostas através da sua participação prática – vivência - a fim de incentivar a compreensão da importância das linguagens expressivas da arte, bem como de estimular a sua imaginação criadora e facilitar a sua compreensão e valorização da expressão singular do seu aluno com Deficiência Intelectual. Os resultados do estudo mostram que ambos os objetivos foram atingidos.

Palavras-chave: Educação Especial. Professores regentes de alunos com Deficiência Intelectual. Linguagens Expressivas da Arte. Prática Pedagógica em Artes Visuais. 1Especialista em Educação Especial, graduação em Educação Artística Licenciatura Artes Plásticas

pela Faculdade de Artes do Paraná - FAP, Professora de Educação Especial na Escola Nilza Tartuce

Ensino Fundamental Séries Iniciais na Modalidade Educação Especial.

2 Doutorado em Educação pela Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP. Mestrado em

Educação pela Universidade Estadual do Espírito Santo – UFES. Graduação em Psicologia pela

Universidade Federal do Espírito Santo – UFES. Professora Associado I do Setor de Educação da

Universidade Federal do Paraná – UFPR.

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Introdução

O presente artigo contempla o relato do estudo: Sensibilização de

Professores Regentes de classe do Ensino Fundamental na Escola Especial em

busca da sua Expressão Artística, realizado durante o PDE – Programa de

Desenvolvimento Educacional, promovido pelo Governo do Estado do Paraná e a

SEED – Secretaria de Estado da Educação – 2010/2012. O Plano Integrado de

Formação Continuada dos Professores compreende quatro partes principais: o

projeto de pesquisa, a produção didático-pedagógica, a implementação do projeto

de pesquisa na escola e o trabalho final (artigo).

O projeto de pesquisa partiu da seguinte problematização: Os professores

regentes de classe do Ensino Fundamental na Escola Especial reconhecem os

aspectos “estéticos e plásticos” nos trabalhos de seus alunos? A prática da

expressão artística da criança com Deficiência Intelectual favorece o seu

desenvolvimento, melhorando a sua compreensão da realidade, podendo tornar-se

uma forma de comunicação?

A partir da constatação de que a criança portadora de Deficiência Intelectual

apresenta dificuldades em seu desenvolvimento global, no seu comportamento e

também na sua capacidade de adequação ao meio, e, a partir também da

constatação de que os professores regentes de classe da Escola Especial, locus

deste estudo, apresentavam dificuldades em reconhecer, compreender e, portanto,

valorizar a expressão artística de seus alunos com necessidades educativas

especiais, concebeu-se este estudo com a finalidade de oferecer a esses

professores a participação em atividades artísticas, a fim de levá-los a refletir sobre a

importância da expressão plástica para os seus alunos bem como a compreensão

das sínteses produzidas por eles a partir da sua experiência com a realidade, na

crença de que essas sínteses pudessem favorecer a superação das suas limitações

e dificuldades.

Acredita-se que a linguagem artística é um dos caminhos para que a criança

exteriorize o modo pelo qual ela vê e entende a realidade, construindo sua maneira

particular de ver, entender e modificar essa realidade. Assim, a escola tem a

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importante função de dar à criança oportunidades de viver situações que a levem a

apreciar, experimentar, criar e transformar pela imaginação concretizada num

produto artístico, contribuindo para que ela desenvolva meios de expressar a sua

individualidade, construindo assim a sua autonomia. Igualmente, os profissionais

que atuam nas escolas de Educação Especial necessitam de orientações para

desenvolver em si esse trabalho artístico de forma a possibilitar as vivências

estéticas, o desenvolvimento criativo e a ampliação do seu universo cultural, de

modo a que eles possam identificar tudo isso nos seus alunos que apresentam

déficit intelectual.

Esta proposta foi concebida com o intuito de propor aos professores uma

intervenção pedagógica visando a ampliação dos saberes relacionados à expressão

artística da criança com Deficiência Intelectual, relacionando teoria e prática.

Propôs-se também a oportunidade de eles vivenciarem a “sua” particular expressão

artística levando-os a reconhecer, a valorizar e a explorar a expressão artística de

seus alunos sempre que eles a realizem no cotidiano escolar. Acredita-se que a

partir da experimentação, os professores poderão melhorar a organização de

propostas que visem uma intervenção mais profunda no processo criativo de seus

alunos, propondo-lhes desafios através de adaptações dos materiais plásticos,

flexibilizando as técnicas, a fim de atender às necessidades específicas de cada

aluno. Sabendo que a representação gráfica infantil se desenvolve gradativamente,

acredita-se que o professor possa ser um estimulador da percepção visual, da

expressão, da imaginação criadora e dos processos de cognição do aluno, dentro de

um projeto pedagógico, levando-o a uma ampliação do conhecimento de si e do

mundo.

Considerando que a escola em que foi desenvolvido este estudo tem como

tarefa auxiliar seu aluno predominantemente no desenvolvimento intelectual,

buscou-se instrumentalizar o professor a fim de levá-lo a valorizar a expressão

artística do seu aluno favorecendo e estimulando o seu aprendizado (levando-o a se

relacionar mais profunda e criativamente com as pessoas e os desafios do ambiente

que o cerca). Acredita-se que a criança que tem acesso ao fazer artístico está tendo

oportunidades de desenvolver habilidades reveladoras da sua estrutura intelectiva

ou cognitiva assim como também de seus sentimentos e seus valores e igualmente

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que o processo de criação desenvolve novas formas de significação, concretiza a

correlação entre produção artística e a vivência da realidade da criança.

Em síntese, esta proposta proporcionou a participação dos professores em

aulas expositivas com apresentação de textos que foram lidos e discutidos, vivência

em atividades práticas através de três oficinas onde foram desenvolvidas as

linguagens plásticas Desenho, Pintura e Recorte/Colagem. Foi sugerido também

que os professores aplicassem uma das técnicas vivenciadas por eles nas oficinas,

com seus alunos em sala de aula, com posterior relato dessa experiência, das

dificuldades surgidas bem como das soluções encontradas.

A avaliação da proposta foi realizada através dos relatos dos professores

durante a execução das atividades práticas, e sobre os aspectos deste estudo que

puderam enriquecer a sua prática pedagógica. Foi aplicado também um questionário

semi-estruturado no qual os participantes puderam colocar suas opiniões e

considerações bem como algumas sugestões. Uma exposição dos trabalhos

produzidos ao longo da implementação da proposta foi organizada, momento em

que todos puderam ver os trabalhos e tecer comentários a respeito da sua produção

e dos efeitos do conjunto das atividades propostas sobre cada um dos professores.

Para realizar esta intervenção se fez necessário teorizar sobre alguns

aspectos que a fundamentaram. Basicamente foram buscados elementos teóricos a

respeito dos seguintes itens: a deficiência intelectual, o direito à Educação, o ensino

da Arte, que serão expostos na sequência.

1 A Deficiência Intelectual

Considerando-se o processo de desenvolvimento de uma criança, a

Deficiência Intelectual caracteriza-se por registrar um funcionamento intelectual geral

significativamente abaixo da média, concomitante com limitações associadas a duas

ou mais áreas da conduta adaptativa ou da capacidade do indivíduo em responder

de forma adequada às demandas da sociedade, nos seguintes aspectos:

comunicação, aspectos pessoais e habilidades sociais, desempenho na família e na

comunidade, sua independência na locomoção, entre outros (SATO, 2004, p.104).

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Como a criança portadora de deficiência intelectual tem suas funções intelectuais

comprometidas, ela pode ter dificuldades em seu desenvolvimento assim como no

seu comportamento, caracterizando transtorno desse desenvolvimento

principalmente no aspecto da adequação ao contexto a que pertence e igualmente

nas esferas da comunicação, e também do cuidado consigo mesma, dos talentos

sociais, da interação com a família, da saúde, do relacionamento com os outros, da

segurança, do desempenho acadêmico, do lazer e do campo profissional

(http://www.infoescola.com/psicologia/deficienciamental/29.03.2011/20h02min).

2 Direito à Educação

A preocupação em atender as pessoas com deficiências vem desde a época

do Império, onde foram criadas algumas instituições que existem até os dias de hoje,

e no decorrer dos anos, outras mais foram surgindo, sempre com a intenção de

oferecer atendimento educacional especializado para as crianças com Deficiência

Intelectual. Uma das primeiras instituições foi a Associação de Pais e Amigos dos

Excepcionais – APAE – em 1954. A partir daí surgiram leis garantindo o atendimento

educacional das pessoas com essas deficiências: Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional – LDBEN – Lei 4024/61, LDBEN – Lei 5692/71. Criado em 1993

pelo Ministério da Educação o Centro Nacional de Educação Especial – CENESP –

responsável pela gerência da Educação Especial no Brasil. Mas ainda assim as

políticas públicas não contemplavam o acesso universal a essa educação especial.

Na Constituição Federal de 1988, um dos objetivos fundamentais é o de

“promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade, e

quaisquer outras formas de discriminação”. Nesta Constituição, o Artigo 208 garante

como dever do Estado, a oferta do atendimento educacional especializado,

preferencialmente na rede regular de ensino. Em 1990 o ECA – Estatuto da Criança

e do Adolescente vem reforçar os dispositivos legais mencionados, determinando

que “os pais ou responsáveis devem matricular seus filhos na rede regular de

ensino”. Em 1994, a Declaração de Salamanca vem estimular, e porque não dizer

“cobrar”, a criação de novas políticas públicas de educação inclusiva. Em 1996 foi

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organizada a nova LDBEN – Lei 9394/96 de acordo com a Constituição Brasileira,

que trouxe algumas inovações tanto para a educação em geral como para a

educação especial. No capitulo específico contempla-se a inclusão escolar de

alunos com necessidades educacionais especiais, desde a educação infantil.

A educação das pessoas que apresentam necessidades educativas

especiais se fundamenta nos princípios de “preservação da dignidade humana,

busca da identidade e o exercício da cidadania”. A dignidade humana não permite

que se faça nenhum tipo de discriminação, sendo que todos têm direitos de

igualdade de oportunidades e esses direitos devem ser respeitados. Esse respeito

se traduz pela valorização de cada indivíduo em sua singularidade, nas

características que o constituem (DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS,

parecer 17/2001, p. 09,10).

3 O Ensino da Arte para pessoas com Deficiência Intelectual

Ao longo da história do ser humano, muitas leis foram criadas para garantir o

direito à educação para todos, incluindo-se aí as pessoas com necessidades

educacionais especiais. No Brasil, a preocupação em atender as pessoas com

deficiências vem desde o império, onde foram criadas algumas instituições que

existem até os dias de hoje. Essas leis têm sido aprimoradas no decorrer dos anos,

sempre buscando melhorar a qualidade desse atendimento (DIRETRIZES

CURRICULARES NACIONAIS, parecer 17/0001, p.09,10). Assim como assegurar o

direito à educação essas leis também asseguram o direito ao Ensino de Arte, em

suas diversas linguagens artísticas. A importância da Arte na formação do indivíduo

está ligada à “função indispensável que a arte ocupa na vida das pessoas e na

sociedade desde os primórdios da civilização o que a torna um dos fatores

essenciais de humanização” (FERRAZ &FUSARI, 1991, p16).

4 A Arte na evolução do homem

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O homem sempre produziu utensílios que o possibilitaram a dominar e

transformar o meio natural. Os estudos antropológicos nos mostram que o homem

não criou apenas objetos para se servir deles, mas também para expressar sua

visão do momento histórico em que viveu. Essas criações constituem as obras de

arte que também contam a história do homem ao longo dos séculos, seus

sentimentos diante da vida, sua religiosidade e sua evolução (PROENÇA, 1991,

P6/7). A Arte é uma das primeiras manifestações de que se tem conhecimento, que

atesta como linguagem essa relação homem/mundo. O conhecimento do meio é

básico para a sobrevivência e representá-lo faz parte do processo pelo qual o ser

humano amplia seu saber (BUORO, 1998, p. 19/20). Ao desenhar nas paredes das

cavernas e fabricar cestas, cerâmicas e utensílios de pedra, o homem primitivo era

impulsionado pelas mesmas questões de sobrevivência que motivaram o homem do

Renascimento ou do século XX. A Arte aparece no mundo humano como uma forma

de organização, como um modo de transformar a experiência vivida em objeto de

conhecimento que se desvela por meio de sentimentos, percepções e imaginação

(BUORO, 1998. P. 24).

5 A Arte Infantil e o Desenvolvimento Psicológico

Ostrower (1978, p. 74) afirma que, nas crianças, a expressão artística

equivale a um experimento direto que ocorre na área do sensível, o “fazer” não se

coloca num plano diferente de qualquer outra experiência de vida, apenas é feito

com materiais que, muitas vezes o professor não reconhece como artísticos. Para

esta autora, quando a criança se expressa, ela está exteriorizando o seu nível de

desenvolvimento intelectual, emocional e perceptivo, ou seja, ela está “mostrando”

por meio do tema trabalhado, que é universal, e por meio da forma, que é sua,

particular, o modo como ela entende e se relaciona com o seu mundo. Ao se

expressar plasticamente, ela está se valendo de uma linguagem, de um sistema de

representação para comunicar uma realidade própria, construída a partir de sua

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vivência, a partir da qual ela pode reestruturar e modificar-se (OSTROWER, 1978,

p.17).

Deste modo, a participação da criança com necessidades educativas

especiais em atividades de expressão plástica torna-se essencial para que ela possa

expressar com toda a plenitude e intensidade suas vivências e sua compreensão de

mundo, superando as suas limitações que podem vir a se tornar barreiras para essa

comunicação.

Segundo Lowenfeld (1976, p.18) é através da expressão artística que a

criança expressa em primeiro lugar “o que está pensando” e isso reflete como ela

“vê o mundo”. Cada criança absorve essas coisas de um jeito muito particular, pois

aí entra o nível de percepção, a relação que ela tem com a sua realidade e por isso

as produções artísticas são tão diferentes de uma criança para outra. Cada uma

representa a “sua” maneira de como compreende e do que “lembra”, pois até para

nós, adultos, muitas coisas são esquecidas, por não terem importância. Muitas

vezes também a criança se utiliza da arte como “apoio”, quando vivencia situações

desagradáveis, que a afetam no nível inconsciente, e que acaba expressando em

seus desenhos. A produção artística também reflete a personalidade da criança,

uma vez que em se tratando de uma criança livre, flexível e desinibida, seus

trabalhos serão também livres, flexíveis e desinibidos. Porém se a criança for tensa,

inibida e insegura poderá mostrar essas mesmas características em seus desenhos

(LOWENFELD, 1976, p. 18).

Para Piaget (1978) o fator biológico, ou seja, o crescimento orgânico e a

maturação do sistema nervoso, o exercício e a experiência adquirida na ação com

os objetos, as interações sociais e o fator de equilibração das ações são

responsáveis pelo desenvolvimento do intelecto infantil e representam um papel

importante no processo de desenvolvimento infantil. Em seu livro Psicologia e

Epistemologia (1978, p. 54-55) ele explica que o desenvolvimento individual é

função de atividades múltiplas de exercício de experiência e de ação. Na sua

concepção, o desenvolvimento cognitivo é formado por quatro estádios ou períodos:

o sensório-motor (do nascimento aos dois anos), o pré-operacional (2 a 7 anos), o

estádio das operações concretas (7 a 12 anos) e o estádio das operações formais (a

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partir dos 12 anos). Cada período define um momento específico do

desenvolvimento da criança e do adolescente, ao longo do qual são construídas as

estruturas cognitivas. À medida que vão aparecendo as mudanças qualitativas

pressupõe-se um novo estádio que se inicia a partir das construções dos estádios

anteriores. É importante notar que, quanto às idades citadas, pode haver uma

variação em função das diferenças individuais e do meio ambiente, servindo elas

apenas como referência (PIAGET, 1978, p. 54-55).

Para Piaget (apud Valente, 2001) no estádio das funções simbólicas (2 a 7

anos), a criança começa a representar os objetos com imagens e com palavras. Ao

ser solicitada a se expressar, seja por gestos ou por desenhos, a criança se torna

sujeito de uma “perturbação” cognitiva à qual reage de forma a restituir o “equilíbrio”

da estrutura assimilativa. Essa reação põe em curso o processo de acomodação,

que criará novos esquemas ou coordenará os já existentes, a fim de realizar o que

lhe foi solicitado. Piaget chamou essas diferenciações de aprendizagem “senso

estrito".

A aprendizagem senso estrito caracteriza-se por ser o resultado da

experiência lógico-matemática, e se desenvolve no tempo. A aprendizagem resulta

da abstração dos aspectos físicos que constituem um objeto (massa, peso, volume,

forma, tamanho) e da abstração das ações mentais executadas pela criança sobre o

objeto. Assim, Valente (2001) acredita que o ato de desenhar deriva de

aprendizagem senso estrito, pois as garatujas iniciais (rabiscos curvilíneos, rabiscos

retilíneos) resultam de uma regulação no ritmo e na direção do traço aplicado pela

criança. Com esse novo esquema espacial a criança começa a produzir desenhos,

sendo que o ato de desenhar e a expressão gráfica realizada pela criança refletem o

seu universo simbólico. Ao desenhar, ela está predominantemente trabalhando com

imagens e menos com conceitos. A criança grafa as relações entre os elementos

constitutivos das formas bi e tridimensionais, mas depende da imagem que gerou

essas formas (VALENTE, 2001, p. 38/43).

Valente (2001), apoiada em Piaget (1978) e Luquet (1978) diz que após a

fase das garatujas o desenho espontâneo da criança apresenta, numa linha

evolutiva, características como a incapacidade sintética; sendo que a criança

desenha dessa maneira porque não dispõe ainda dos meios representativos

referentes ao espaço; o realismo intelectual, que surge aproximadamente aos quatro

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anos e leva a criança a desenhar tudo o que está ali, sendo que ela desenha tudo o

que sabe sobre o objeto e não somente o que vê do objeto; e o realismo visual, que

aparece em torno dos oito/nove anos e mostra a preocupação da criança com as

perspectivas, as proporções e as medidas ou distâncias levando ao

desenvolvimento da atividade perceptiva propriamente dita, ou seja, a atividade que

vai enquadrar as imagens. Esta autora entende o desenho como a representação

gráfica de uma ideia, pensamento ou sentimento que a criança procura expressar.

Entendido como expressão gráfica ele se insere no campo da linguagem, a

linguagem expressiva que expressa significados mediante imagens (VALENTE,

2001, p.123-126).

Os estudos que respaldam este trabalho mostram que é através da linguagem

artística que a criança exterioriza o modo pelo qual ela vê e entende a realidade, e,

uma vez que a criança com Deficiência Intelectual apresenta dificuldades em seu

desenvolvimento global, em seu comportamento e em sua capacidade de

adequação, entende-se que a sua participação em atividades artísticas pode

favorecer a expressão plástica das sínteses que ela produz a partir de sua

experiência com a realidade. Assim, conclui-se que a criança que tem acesso ao

fazer artístico está tendo oportunidades de desenvolver habilidades reveladoras da

sua estrutura intelectiva ou cognitiva, como também de seus sentimentos e valores

(LOWENFELD, 1977, p. 18). Também se considera que à escola cabe a importante

função de dar à criança oportunidades de viver situações que a levem a apreciar,

experimentar, criar e transformar, pela imaginação concretizada num produto

artístico, contribuindo para que ela desenvolva meios de expressar a sua

individualidade, construindo a sua autonomia (VALENTE 1991). Por isso, sentiu-se a

necessidade de oferecer aos professores vivências em busca da sua expressão

artística, levando-os a refletirem sobre a expressão artística de seus alunos.

6 Procedimentos

6.1 A implementação na escola

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Após os trabalhos de pesquisa bibliográfica e de elaboração do Projeto de

Intervenção Pedagógica do PDE realizados durante o segundo semestre de 2010, e

a construção da produção Didático Pedagógica, neste caso Unidade Didática,

elaborada no primeiro semestre de 2011, o presente estudo foi apresentado aos

Professores, Equipe Pedagógica e a Direção da uma escola conveniada à

Secretaria de Estado da Educação do Paraná. No segundo semestre de 2011

procedeu-se a Implementação dessa produção, cujo percurso passa-se a relatar.

O primeiro encontro para a implementação do projeto na escola iniciou-se

com a apresentação das atividades a serem desenvolvidas e a leitura do texto “Os

primórdios da Auto-Expressão” (Viktor Lowenfeld - Desenvolvimento da Capacidade

Criadora, Editora Mestre Jou, 1977), que trata, em síntese, do início da expressão

artística na criança que, segundo se pensa se dá no momento em que ela rabisca

num pedaço de papel, mas que, na realidade, principia quando os seus sentidos

estabelecem o primeiro contato com o ambiente, fazendo-a reagir a essas

experiências sensoriais. O rabisco produzido pela criança, a partir dos dezoito

meses de idade, é um importante passo para o seu desenvolvimento, pois é o início

da expressão que a conduzirá não só ao desenho e à pintura, mas também à

palavra escrita. Segundo o autor, essas garatujas podem ser a causa de a criança

pequena desenvolver atitudes que permanecerão nela, dependendo da forma como

forem vistas e aceitas pelos adultos, pois elas representam a primeira forma da

expressão artística da criança. Ao final da leitura foi iniciado um debate em que os

participantes se manifestaram relatando fatos vividos na escola e no meio familiar, a

respeito da compreensão dos “rabiscos” realizados pelas crianças e o quanto pode

ser prejudicial a crítica e a desvalorização dos trabalhos feitos pelos alunos. Alguns

professores também contribuíram com impressões pessoais, ilustrando de forma rica

a atividade.

No segundo encontro a primeira atividade realizada chamada desenho cego

foi feita a partir da sugestão aos professores de traçarem linhas aleatórias em todo o

papel e, após observarem o resultado dos riscos, tentarem identificar formas

figurativas nos traços que se formaram, colorindo-as com lápis de cor. A segunda

atividade foi a de representar através do desenho uma experiência que

considerassem importantes para cada um. Na terceira atividade, foi solicitado que

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representassem através do desenho, o rosto de uma pessoa querida que

posteriormente seria retomado quando da finalização dos trabalhos. Após a

atividade foram tecidos comentários a respeito do que fizeram e de como eles se

sentiram realizando-as, bem como sobre as dificuldades sentidas, a interpretação de

seus desenhos, e a vivência em geral.

Iniciou-se o terceiro encontro com a leitura do texto “Crescimento e

Maturidade”, de Fayga Ostrower (Criatividade e Processos de Criação, Editora

Vozes, 1978) que trata basicamente sobre a criatividade que se manifesta

espontaneamente no fazer da criança, estando ela presente no brincar, no sonhar,

no associar, no simbolizar, no fingir a realidade, que para ela nada mais é do que

viver. A criança cresce e o que muda para ela são as áreas de experiências e de

controle sobre o seu mundo infantil, surgindo, assim, na expressão visual a

representação dessas experiências sensoriais e motoras; pontos, traços, círculos,

espirais, em que a criança procura estabelecer para si mesma o domínio sobre

certos movimentos físicos junto ao domínio do meio físico e social. Depois, ela

procura controlar a mão, o lápis, o papel, muitas vezes cantando, exclamando,

dialogando com o desenho para completar o sentido da ação. Após a leitura desse

texto os professores fizeram comentários, perguntas e contribuições vinculando-as

às situações e relatos de sua experiência com seus alunos tanto como às produções

de seus alunos em sala de aula. Nesse momento, foi possível perceber o quando

essas atividades estavam contribuindo para desenvolver nos docentes uma melhor

compreensão a respeito da produção artística de seus alunos. Em seguida, partiu-se

para a oficina de Pintura, iniciada com comentários sobre o papel das cores em

nossa vida e as sensações que elas nos causam, enquanto eles experimentavam as

possibilidades expressivas das cores primárias na formação das cores secundárias.

A segunda atividade sugerida foi a de que eles pensassem em três objetos,

desenhando-os e pintando-os. Em seguida foram apresentados diversos

autorretratos realizados por artistas em diferentes épocas e estilos, para observação

e comentários. Após isso, os professores foram orientados a retomar o desenho do

rosto da pessoa escolhida, feito no encontro anterior, para proceder à pintura desse

rosto. Nesse momento muitos participantes falaram da dificuldade em aplicar as

cores, em produzir a mistura dos tons, dos sombreados, deixando escapar a

frustração que sentiram diante dessas dificuldades.

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No quarto encontro foi feita a leitura do texto “Resumo dos Períodos do

Desenvolvimento” (A Psicologia do Desenvolvimento de Jean Piaget, John H.

Flavell, Pioneira Editora, 1975), e após procedeu-se aos comentários e reflexões

sobre o conteúdo do texto momento em que foi possível perceber que a maioria dos

presentes estava bem familiarizada com o assunto, uma vez que sua prática

pedagógica se baseia na concepção piagetiana. Seguiu-se então à prática com a

técnica Recorte e Colagem, a qual foi muito bem recebida e realizada por todos os

participantes. Também nesse dia, os professores receberam orientações para a

aplicação de uma oficina em sala de aula a ser realizada com seus alunos (tarefa),

composta dos seguintes itens:

1. Escolher uma das técnicas desenvolvidas nesta implementação;

2. Aplicar com seus alunos em sala de aula;

3. Descrever os seguintes aspectos:

Receptividade dos alunos;

Problemas/dificuldades surgidas;

Procedimentos aplicados para resolver esses problemas;

Parecer geral sobre a aplicação desta atividade (comentários);

Guardar os trabalhos para posterior exposição;

Entregar por escrito no próximo encontro.

No quinto encontro os professores falaram sobre a realização da tarefa

aplicada em sala de aula com seus alunos, a sua aceitação, os problemas surgidos,

e como foram solucionados, entregaram também um relato escrito sobre a atividade

desenvolvida. Nesse encontro eles expuseram os trabalhos produzidos pelos

alunos e teceram alguns comentários.

No sexto encontro foi apresentado aos professores um questionário semi-

estruturado, instrumento que abordava aspectos relativos à vivência durante a

aplicação da Implementação bem como as observações sobre o Material Didático

apresentado. Este assunto gerou muitos comentários e os professores deram suas

contribuições enriquecendo o momento levando a perceber que este trabalho foi

muito importante e bem aproveitado por todos.

No sétimo encontro montou-se a exposição dos trabalhos organizada e

montada pelos professores, momento este enriquecido com as impressões dos

participantes.

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No oitavo encontro fez-se a apresentação com slides de todo o trajeto

percorrido para este estudo, desde a escolha do tema, a seleção dos autores, a

elaboração e aplicação do Projeto e a Implementação, seguido de uma

confraternização.

6.2 A apresentação no ambiente virtual GTR

O Projeto de Intervenção e a Produção Didático Pedagógica também foram

apresentados no ambiente virtual GTR – Grupo de Trabalho em Rede, previsto nos

períodos de desenvolvimento do PDE, onde foram analisados e discutidos por meio

de debates nos Fóruns através da plataforma Moodle. Percebeu-se que os

participantes receberam e compreenderam bem os estudos e reconheceram que

estavam pertinentes aos resultados que se esperava obter.

6.3 Resultados

6.3.1 Relativo ao quarto encontro seguem os dados referentes às oficinas

ofertadas pelos professores como tarefa aos alunos:

a. Cinco professores optaram por realizar uma tarefa tendo a Garatuja como

atividade principal. Dois professores optaram por trabalhar com a técnica de Pintura

a guache, e a atividade de Desenho foi escolhida por um professor. Uma das

professoras inovou ao sugerir aos alunos trabalharem com música e fantoche (a

inovação deve-se ao fato de a música não ter sido pensada como recurso para as

atividades).

b. Comentários a respeito das oficinas desenvolvidas com os alunos em sala

de aula.

b.1 “O trabalho foi realizado utilizando num primeiro momento linhas retas e

num segundo momento linhas curvas, utilizando giz de cera preto. As crianças

gostaram da atividade, mas a dificuldade na utilização do espaço da folha surgiu e

ficavam o tempo todo perguntando: _ “É para fazer na folha toda?”. No momento da

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linha reta fizeram muitos rabiscos (colocavam o giz na folha e o movimentavam de

um lado para o outro sem parar). Já nas linhas curvas tiveram mais dificuldade, mas

mesmo assim realizaram - uns fizeram bolas “. (GARATUJA).

b.2 “Escolhi esta técnica porque achei que seria mais adequada aos meus

alunos, pois a maioria ainda não saiu dessa etapa (garatuja), somente alguns estão

começando a simbolizar seus pensamentos e dar forma aos seus desenhos. Eles

gostaram bastante, alguns estavam bastante desinteressados, mas participaram.

Com esses resistentes, cheguei, peguei na mão deles e orientei como deveria ser

feito (antes fiz no quadro negro), pois mostrei onde poderíamos sinalizar para ver o

que estava desenhado, alguns pintaram, outros não, depois disseram o que parecia

ser: _Gostei bastante e pretendo fazer mais vezes.” (GARATUJA)

b.3 “O trabalho foi desenvolvido a partir de uma música (a cobrinha).

Usaram fantoches para encenarem as ações da personagem e também observaram

características da mesma. Em seguida representaram-na através do traçado de

linhas. Foi um trabalho envolvente onde todos participaram e criaram livremente.

Teve também um momento de exercício cooperativo quando um aluno fez

rapidamente o seu trabalho e correu para ajudar o coleguinha que não conseguia”.

(GARATUJA+MÚSICA E FANTOCHE).

b.4 Esta professora não relatou o desenvolvimento da técnica aplicada, mas

percebeu-se nas produções dos alunos, que eles atribuíram significado às garatujas,

identificando-as como “papai, bola, mamãe, água, Maria” (GARATUJA).

b.5 “Primeira atividade: Desenhar linhas para descobrir desenhos (formas).

Todas as crianças participaram com interesse, alguns com muita dificuldade

(GARATUJA). Segunda atividade: Desenhar um rosto e pintar com tinta guache.

Tiveram dificuldade para utilizar o espaço total da folha na hora de pintar – muita

dificuldade. Mas gostaram de utilizar tintas e criar novas cores”. (PINTURA).

b.6 “Os alunos a princípio ficaram bastante empolgados ao realizar a

atividade, principalmente quando expliquei que iríamos utilizar pintura com tinta.

Num primeiro momento quando expliquei que era para desenhar um rosto de uma

pessoa que eles gostassem, disseram que não sabiam desenhar. Depois de

conversar e ver algumas figuras em livros e revistas começaram a desenhar

(DESENHO). Alguns não tiveram dificuldades, foram bem criativos, outros ficaram

observando os seus colegas para depois fazer. Uma das dificuldades encontradas

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foi no momento de pintar, pois não conseguiram manter o mesmo desenho,

alterando alguns detalhes (PINTURA). Entretanto, de forma geral todos gostaram

das atividades, pois ficaram livres para desenhar e pintar usando a criatividade e

imaginação, proporcionando um momento rico e prazeroso”.

6.3.2 Relativo ao sexto encontro, seguem os dados vindos do questionário

referente à Implementação do Material Didático:

A primeira pergunta foi: “Você achou os textos sugeridos para estudo coerentes

com os objetivos do projeto?” e obteve-se dos dez professores respostas

afirmativas.

Referente à segunda pergunta, que foi desdobrada: Com relação à participação

nas oficinas, você percebeu alguma mudança na sua concepção quanto às

possibilidades expressivas de seus alunos? “Quais?”, obteve-se que dez

professores perceberam que houve mudança na concepção deles acerca das

possibilidades expressivas de seus alunos. Um professor sentiu necessidade de

mais análise nos conteúdos de desenho; dois professores perceberam a importância

do desenho para o desenvolvimento dos alunos; um professor percebeu a

importância de traçar objetivos de acordo com o que cada aluno sabe e desenvolver

meios que o ajudem a acompanhar o grupo; dois professores perceberam a

preocupação demasiada com o registro “perfeito” e a participação na oficina os fez

refletir acerca da importância da linguagem artística para o desenvolvimento de

outras capacidades no aluno, como a imaginação e criatividade; um professor citou

ter encontrado várias sugestões ricas para tornar o trabalho artístico mais

significativo aos seus alunos; e um professor não respondeu à pergunta, pois na

resposta referiu-se aos alunos ao invés de a si mesmo.

A terceira pergunta foi Com qual linguagem expressiva das artes plásticas

realizadas você mais de identificou?, quatro professores responderam que se

identificaram mais com a técnica da Pintura; três professores se identificaram mais

com a técnica da Garatuja e o Desenho foi citado por quatro professores. Um

professor citou a Garatuja e o Desenho,

A pergunta quatro foi Você sentiu alguma dificuldade ao realizar as oficinas?,

ao que responderam afirmativamente quatro professores e negativamente seis

professores.

17

À quinta pergunta Com relação à Tarefa, você achou importante realiza-la

com seus alunos?, obtiveram-se dez respostas afirmativas.

A sexta questão foi expressa nos seguintes termos Solicito a gentileza de

comentar a sua participação na Implementação deste Projeto. Relativa a essa

solicitação um professor citou que se sentiu feliz ao realizar as tarefas com o grupo e

que aprendeu novas técnicas; dois professores comentaram que foi muito bom

participar, porém o tempo foi pouco e não foi possível aprofundar-se mais; um

professor comentou que foi um momento rico, questionador e reflexivo; um professor

comentou que realizava todas as atividades aproveitando ao máximo, pois gostou

muito desses momentos; um professor referiu-se à importância do tema

desenvolvido e citou que todos têm uma veia artística e que se tem que explorá-la

ao máximo; um professor referiu-se aos textos estudados, achando-os bem

sugestivo, de fácil compreensão e que as oficinas foram riquíssimas e o encorajaram

a explorar mais o trabalho artístico em sala, a ter um olhar diferenciado e a conduzir

de forma prazerosa as atividades artísticas junto aos seus alunos; dois professores

comentaram a importância do fazer artístico para melhorar a sua prática pedagógica

e desenvolver melhor a expressão artística de seus alunos e finalmente um

professor comentou a importância de incentivar os alunos a desenharem, a

manifestarem suas ideias através do desenho.

Todos os professores manifestaram apoio e satisfação por terem participado

dessa implementação, agradeceram e parabenizaram a professora que a propôs.

7 Considerações Finais

A partir da leitura dos textos que deram a base teórica ao estudo que

fundamentou a pratica pedagógica objeto do trabalho com os professores, e os

relatos feitos pelos professores após a sua participação nas oficinas oferecidas

serão trazidas algumas análises pertinentes ao trabalho desenvolvido.

Foi possível constatar que ao vivenciarem as oficinas de Desenho

(Garatujas), Pintura e Recorte e Colagem, os professores desenvolveram a sua

sensibilidade, estimularam a sua imaginação criadora, favorecendo o conhecimento

18

de conceitos referentes ao saber artístico, assim como a utilização dos materiais

oferecidos, o que os levou a olhar de forma diferenciada a expressão artística de

seus alunos, concordando com Lowenfeld (1977, p. 17/18), para quem o exercício

da expressão artística desenvolve a criatividade, aprimora as formas de percepção

do indivíduo, possibilita a superação de dificuldades e limitações, ampliando sua

compreensão a respeito de si mesmo e de sua interação com o mundo em que vive.

Após a vivência nas oficinas, cada professor escolheu uma delas para aplicar

aos seus alunos em sala de aula. Em seus relatos pode-se observar que os

resultados foram mesclados de momentos prazerosos e de momentos em que os

alunos apresentaram dificuldades, que, em alguns casos, os professores puderam

de certa forma sanar, como se pode ver nos relatos e análises a seguir, sempre

lembrando que o nível dos alunos comporta limitações devido à deficiência

intelectual.

A Professora A propôs que a atividade fosse desenvolvida em dois

momentos, o da Garatuja livre e o da Garatuja com orientação. No primeiro

momento, os alunos apenas traçaram linhas retas, com muitos rabiscos,

movimentando o marcador (giz de cera) de um lado para o outro sem parar,

aleatoriamente. No segundo momento, a partir de orientações nesse sentido,

traçaram linhas curvas, e aí apareceram dificuldades das crianças tanto no traçado

quanto na utilização do espaço do papel. Esse modo de trabalhar da criança é

caracterizado por Ostrower (1978) que diz que a criança age impulsivamente,

espontaneamente para ver o que acontece, acrescentando que, aquilo que significa

uma experiência audaciosa para os adultos, para a criança é apenas o vivenciar

natural da situação, não sendo mais ousada do que muitas outras experiências

realizadas por ela. Na expressão visual surgem inicialmente experiências sensório-

motoras, pontos, traços, círculos, espirais em que a criança procura estabelecer

para si o domínio sobre certos movimentos físicos junto com uma medida de

domínio sobre o meio ambiente. (OSTROWER, 1978, p. 127, 128).

A Professora B escolheu a técnica da Garatuja porque achou que seria mais

adequada ao nível do desenvolvimento cognitivo de seus alunos, que estão apenas

começando a simbolizar seus pensamentos e a dar formas aos seus desenhos. A

princípio, os alunos mostraram-se desinteressados, participando somente após a

professora pegar em suas mãos e iniciar os traçados. Alguns deles identificaram

19

algumas formas e as coloriram, comentando que gostaram do que fizeram. A esse

respeito, Ostrower (1978, p. 129) diz que a criança passa para a figuração simbólica,

ou seja, que ela começa a simbolizar objetos e situações que ela própria identifica, e

que, na figuração simbólica se inicia o pensamento abstrato da criança

acompanhado de certa atividade conceitual. Também, segundo essa autora, as

alterações que ocorrem na expressividade infantil correspondem a fases de

crescimento físico e psíquico da criança.

A professora C trabalhou as Garatujas com seus alunos pequenos, e inovou

incluindo uma música e fantoches para estimular a compreensão sobre as linhas

curvas. O relato da professora informa que as crianças participaram de forma muito

prazerosa, sendo que um aluno que terminou antes foi, espontaneamente, ajudar

um coleguinha que não estava conseguindo fazer. Para Lowenfeld (1977, p. 119),

não há nas crianças pequenas a intenção de retratar o meio no qual vivem, e, desse

modo, traçar as garatujas não é mais do que um motivo de extremo prazer para a

criança, sendo muito importante que a escola lhe proveja a oportunidade de

garatujar.

A professora D trabalhou as Garatujas, porém não relatou o desenvolvimento

da atividade, mas, pela observação dos trabalhos, foi possível perceber que os

alunos atribuíram significados às formas resultantes das garatujas, identificando-as

como “papai, bola, mamãe, água, Maria”. Esta atribuição de nomes às garatujas é

de grande significado, pois indica uma transformação no pensamento da criança,

que passa a nomear as formas nas quais reconhece semelhanças com objetos do

seu entorno social, conforme Ostrower (1978, p. 129). Antes deste estágio, ela

estava satisfeita com os movimentos, mas, a partir de então, passa a ligar as formas

figurativas aos objetos do mundo a sua volta. O método ou a forma como desenha

faz das garatujas um importante meio de comunicação (LOWENFELD, 1977, p. 123,

125). Acredita-se que, nesse sentido, é desejável que a escola, de um modo geral, e

o professor especificamente de crianças com deficiência intelectual dê tempo à

criança para que ela possa desenhar garatujas, pois, as garatujas vão se tornando

muito mais diferenciadas, acompanhadas, às vezes de uma descrição verbal,

introduzindo a criança ao mundo das formas e das palavras, que é fundamental para

o desenvolvimento dessas crianças.

20

A professora E aplicou primeiramente a técnica da Garatuja, orientando

posteriormente que os alunos tentassem identificar formas a partir das garatujas

(desenho-cego), atividade da qual os alunos participaram com interesse, mesmo

tendo alguns que apresentaram certa dificuldade. Após, ela lhes pediu para

desenharem o rosto de uma pessoa que eles gostassem e sobre esse desenho lhes

foi solicitado aplicar a técnica de Pintura. Apesar de apresentarem muita dificuldade,

os alunos gostaram de usar tintas e descobrir novas cores, confirmando a idéia de

Lowenfeld (1977, p. 21) para quem a criança expressa os seus pensamentos,

sentimentos e interesses nos seus desenhos e nas suas pinturas, e mostra o

conhecimento do seu meio nas suas expressões criadoras.

A professora F aplicou a técnica de Desenho solicitando que os alunos

desenhassem o rosto de uma pessoa querida. O relato da professora informa que

eles sentiram dificuldade, dizendo não saber desenhar rostos. A professora então

mostrou imagens de rostos em revistas e retratos pintados por alguns artistas, o que

motivou muito aos alunos, sendo que alguns não tiveram dificuldades ao desenhar

enquanto outros observaram os desenhos dos colegas, antes de desenharem os

seus. No momento de pintar, alguns não conseguiram manter o desenho, alterando

alguns detalhes, mas o resultado foi muito bom, inclusive porque os alunos ficaram

livres para pintar, usando a sua criatividade e imaginação. A professora relata que

foi um momento rico e prazeroso em que a criatividade infantil pode ser estimulada,

sendo que “o modo como se visa à incentivação do potencial infantil, reflete-se nos

objetivos e nos comportamentos desejáveis estabelecidos para a criança.”

(OSTROWER, 1978, p. 129). ´

Observou-se que a técnica da garatuja foi bem utilizada por todos os

professores no momento da implementação, e acredita-se que os alunos ao

realizarem rabiscos curvilíneos e rabiscos retilíneos, espontaneamente ou sob a

orientação dos professores, tiveram que fazer uma regulação no ritmo e na direção

do traço aplicado por eles, que, ao produzir tais desenhos, tiveram que criar um

novo esquema espacial, constituindo o ato de desenhar uma aprendizagem senso

estrito (VALENTE, 2001, p.38-43).

No que diz respeito à criatividade, os professores passaram a considerá-la

importante para o processo de aprendizagem dos seus alunos. Concordando com

Ostrower para quem

21

A criatividade infantil é uma semente que contém em si tudo o que o adulto vai realizar. Interessam-nos as comparações com o mundo infantil para podermos enfocar mais claramente o início dos processos criativos e também o seu desenvolvimento sob determinadas circunstâncias culturais, mas, enquanto fenômeno expressivo, a criação tem implicações diferentes para a criança e o adulto. Nas crianças, o criar - que está em todo o seu viver e agir – é uma tomada de contato com o mundo, em que a criança muda principalmente a si mesma. Ainda que ela afete o ambiente, ela não o faz intencionalmente; pois tudo o que a criança faz, o faz em função da necessidade de seu próprio crescimento, da busca de ela se realizar. (OSTROWER, 1978, p. 130).

8. Conclusão

Esse estudo parte da observação do cotidiano na escola de Educação

Especial, em que foi detectada a dificuldade de comunicação e expressão das

crianças com Deficiência Intelectual pelos meios comuns (linguagem oral, facial,

corporal e gráfica), e da dificuldade dos professores em reconhecer os aspectos

estéticos e plásticos nos trabalhos de seus alunos. Assim, a fim de contribuir para

que essas dificuldades fossem eliminadas ou pelo menos diminuídas foi elaborado

um projeto de implementação cujos objetivos foram o de sensibilizar os professores

regentes de classe do Ensino Fundamental de uma escola da rede conveniada do

Estado do Paraná - na modalidade Educação Especial - a desenvolver uma prática

pedagógica com vistas a levá-los a reconhecer os aspectos estéticos e plásticos na

produção artística de seus alunos com deficiência intelectual, e o de levar esses

professores a realizarem as atividades propostas através da sua participação prática

nas atividades a fim de incentivar a compreensão da importância das linguagens

expressivas da arte, bem como de estimular a sua imaginação criadora e facilitar a

sua compreensão e valorização da expressão singular do seu aluno com Deficiência

Intelectual.

Durante a implementação das ações relativas aos estudos foi oferecida aos

professores a oportunidade de realizar leituras e discussões de textos referentes ao

22

assunto estudado, e oficinas de Desenho, Pintura e Recorte e Colagem. Após a

aplicação das atividades previstas e a participação intensa dos professores durante

a implementação do projeto na escola, concluiu-se que a dificuldade desses

professores em reconhecer os aspectos estéticos e plásticos nos trabalhos

realizados pelos seus alunos foi em grande parte superada.

Segundo Lowenfeld (1977, p. 21), a criança que tem acesso ao fazer artístico

tem oportunidade de desenvolver habilidades reveladoras da sua estrutura

intelectiva ou cognitiva, assim como também de seus sentimentos e seus valores.

Uma criança expressa os seus pensamentos, sentimentos e interesses nos seus

desenhos e nas suas pinturas, e mostra o conhecimento do seu meio nas suas

expressões criadoras.

Os dados coletados a partir das respostas dadas aos questionários bem como

a participação nas vivências dos professores nas oficinas de artes visuais propostas

lhes possibilitou reconhecer a importância da expressão artística para o

desenvolvimento cognitivo dos seus alunos. Igualmente, os relatos dos professores

participantes permitiram constatar que houve mudanças na sua concepção a

respeito da expressão artística do seu aluno, bem como da valorização por parte

desses professores quanto a essa forma de expressão. Percebeu-se também o

quanto eles se sentiram felizes por terem tido a oportunidade de vivenciar novas

técnicas embora tenham lamentando o fato de o tempo ser curto, o que

impossibilitou um aprofundamento maior. A participação dos professores nas

oficinas, e a consequente vivência em atividades semelhantes àquelas que eles

propõem aos seus alunos, e a leitura e discussão dos textos apresentados lhes

proporcionou uma reflexão acerca da sua prática pedagógica e, também, os

sensibilizou a ter um olhar diferenciado para a expressão artística de seus alunos,

atingindo, assim, os objetivos deste estudo.

As contribuições a partir da leitura, análise e debates realizados pelos

professores participantes do GTR – Grupo de Trabalho em Rede, e todo o interesse

e empenho demonstrado por eles, quanto à realização das tarefas dentro dos prazos

determinados deixou claro o quanto é importante a busca de conhecimento a

respeito da Expressão Artística da Criança, a fim de contribuir com um fazer

pedagógico diferenciado. Os professores participantes do GTR tiveram a

oportunidade de utilizar os conhecimentos adquiridos assim como desenvolver uma

23

prática que os possibilitou compreender e valorizar o trabalho artístico de seus

alunos, favorecendo a evolução e a superação das dificuldades e limitações

apresentadas pelos alunos.

Referências

BUORO, Anamélia Bueno. O olhar em construção. Uma experiência de ensino e aprendizagem da arte na escola. 3ª Ed. São Paulo: Cortêz, 1998.

FUSARI, Maria F. de Rezende e. FERRAZ, Maria Heloísa C. de T., Arte na Educação Escolar. São Paulo: Cortez, 2001

LOWENFELD, Viktor. A criança e sua arte. São Paulo: Mestre Jou, 1977.

____. Desenvolvimento da Capacidade Criadora. São Paulo: Mestre Jou, 1977.

MEC. Diretrizes Curriculares Nacionais, parecer 17/2001.

OSTROWER, Fayga. Universos da arte. Rio de Janeiro/RJ: Campus, 1983.

____. Criatividade e Processos de Criação. Petrópolis: Vozes, 1978.

PIAGET, Jean. A formação do símbolo na criança. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1978. PROENÇA, Graça. História da Arte. São Paulo: Editora Ática, 1991.

VALENTE, Tamara da Silveira. Desenho Figurativo: Uma representação possível

do espaço. Campinas, SP: 2001.

Fonte: http://www.infoescola.com/psicologia/deficiencia-mental/acessado em

29.03.2011/20h02min).