Semiotica Greimasiana Aplicada - Adenil Alfeu Domingos

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  • 7/24/2019 Semiotica Greimasiana Aplicada - Adenil Alfeu Domingos

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    Semitica Greimasiana aplicada

    Semitica Televisiva*

    Adenil Alfeu DOMINGOS (Unesp/Bauru)Jean Cristtus PORTELA (G - Unesp/Bauru)

    Maria Lcia Vissotto Paiva DINIZ (Unesp/Bauru) - CoordenadoraValdenildo dos SANTOS (PG - Unesp/Assis)

    ABSTRACT: The greimasian semiotics is a safe device to analyse sincretic texts. Thispaper intends to explain the meaning effect and the discoursive organization of thetelevision publicity by the deconstruction of the enunciation, fiduciary contract, thymiccategory and the relations between sincretic semiotics.

    KEY WORDS: Television publicity; enunciation; fiduciary contract; thymic category;sincretic semiotics.

    1. Apresentao

    Os participantes desse grupo de trabalho apresentam alguns resultados de pesquisasque vm realizando com o instrumental semitico greimasiano atravs da aplicaoprtica em textos verbais, no-verbais e sincrticos. A aplicao na publicidadetelevisiva da Folha de S. Paulo, transcrita em anexo, pretende evidenciar acomplexidade da enunciao e do enunciado nos relatos apresentados na seguinteordem: 1. Anatomia da enunciao (Adenil A. Domingos); 2. Exumao do contratofiducirio (Jean C. Portela); 3. Ecografia do tmico (Valdenildo dos Santos) e 4. Suturado sincrtico (Maria Lcia Vissotto P. Diniz. Acreditamos que um exerccio prtico

    como este - no exaustivo - pode demonstrar a operacionalidade do mtodo em outrostipos de discurso e apontar a viso semitica como possvel e, sobretudo, necessria.

    2. Anatomia da enunciao

    O discurso publicitrio, impresso ou flmico, encontra, em sua enunciao, um dosseus mais frteis elementos para um estudo semitico. O princpio de que o contextotambm texto e que a enunciao produz marcas contundentes em seu enunciado,nos mais diferentes tipos de linguagem - verbal ou no-verbal - levou-nos a um estudoanatmico dessa grandeza semitica na publicidade. Para caracterizar seuscomponentes bsicos, descartamos, de imediato, os sujeitos de carne e osso (autor e

    leitor) que no aparecem na enunciao seno como simulacros em enunciadores eenunciatrios. Essas entidades discursivas exercem o papel de produtores ereceptores do enunciado, enquanto grandezas semiticas. Assim, no discursopublicitrio televisado, tanto o enunciador um actante coletivo - logomarca + agnciapublicitria + equipe de filmagem -, quanto o enunciatrio (pblico-alvo), pois essediscurso no tem s por objetivo atingir aos consumidores do produto, como tambm,entre outros, aos crticos e estudiosos de sua linguagem, j que a prpria agncia depropaganda se auto-enuncia ao produzir um enunciado desse tipo.

    Esse enunciador-coletivo exerce, por sua vez, vrios papis actanciais, cognitivos,

    pragmticos e/ou tmicos: informador do saber, focalizador e mostrador da enunciado,manipulador (por seduo, intimidao, provocao ou tentao) do seu enunciatrio.Desse modo, o enunciado produzido torna-se um objeto de uso do enunciador, cujoobjetivo levar seu enunciatrio a crer no que diz. Entre ambos, trama-se, portanto, umcontratado fiducirio, que s ser sancionado positivamente pelo enunciador-judicator

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    se este /crer/ for efetivado pelo enunciatrio.

    Alm disso, dentro dessa prpria entidade enunciadora-coletiva h um complexosucedneo de manipulaes. Assim, por exemplo, a agncia de publicidade manipulaum actante redator do texto narrativo, que tambm pode ser outra entidade coletiva.Este produz, por sua vez, uma narrativa, figurativizando idias abstratas no processode discursivizao. Assim sendo, essa entidade produtora do discurso, pode criar umnarrador no enunciado, que se torna operador-enunciador da narrativa, j que a

    entidade redatora delegou-lhe o papel de operador-enunciador do enunciado-enunciado, como simples testemunha e/ou enunciador-observador-narrador das aesnarradas (caso do olho-da-cmara). Essa entidade narrada pode ainda ser um actantedo enunciado em um "eu" enunciador-observador-narrador-protagonista, (papel quepode ser desempenhado, ainda pelo antagonista ou adjuvante, por exemplo). Desde oolho-da-cmara, como entidade filtradora da imagem, objeto de uso de umcameraman, at um figurinista, ou um iluminador, etc., da equipe de filmagem, todos setornam elementos de manipulao nessa entidade enunciadora coletiva. Assim, aequipe de filmagem delega ao cameraman(sujeito manipulado pelo diretor defilmagem), o papel de manipulador do olho-da-cmera (grandeza semitica actancial,

    que desempenha os papis de mostrador e focalizador da cena(s), j que , por meiodesse olho-filtro, que os planos e o ngulo de viso da percepo do enunciadochegam ao enunciatrio). que o olho do observador-enunciatrio coloca-se, assim,no lugar do olho-da-cmera no momento da recepo do enunciado, como se umestivesse s costas do outro (Fontanille, 1989:15). Precisamos considerar que oenunciatrio tambm se torna um sujeito ativo de produo de discurso, no ato derecepo, e no um sujeito passivo. Segundo Fontanille, os elementos da enunciaono so entidades colocadas de um lado e do outro do enunciado, mas no mesmolugar em relao a ele, embora de maneira dissimtrica, polmica, j que asignificao reconstruda e reconhecida, no coincide com a significao proposta econstruda pelo enunciador.

    por um processo de embreagem/debreagem, (existncia ou ausncia de marcas doenunciador no enunciado como o ponto de vista, o ngulo de viso, a presena daslogomarcas e do produto anunciado, etc.), pela qual depreendemos como o sujeito daenunciao delega parte do seu fazer cognitivo ao seu observador-enunciatrio.Segundo Fontanille (l989, 17), a debreagem uma ruptura da isotopia que fundamentaas categorias do enunciado e da enunciao, sendo a ruptura entre o aqui e o l, entreo eu e o ele, entre o agora e o ento, que fundamenta a existncia conjunta e separadado espao, do tempo e dos atores do enunciado e das figuras da enunciao. nessabusca das marcas do enunciador no enunciado que podemos falar semioticamente da

    instncia enunciadora como textualmente tramada no enunciado.

    Foi dentro desse prisma que enfocamos o processo de enunciao como o programanarrativo (PN) de base do discurso publicitrio. na relao enunciador/enunciatrioque se encontra o /querer/, o /poder/, o /saber/ e o /dever/ fazer do enunciador sobreseu enunciatrio (dependendo, tambm, do /crer/ ou /no-crer/ por parte deste), paraque o discurso publicitrio possa ser sancionado como um programa narrativocompleto. Basta a quebra do /querer-crer/ por parte da entidade enunciatria para queesse processo se desfaa. O enunciado, em si mesmo, torna-se, assim, o meiointerativo dessas duas entidades da enunciao.

    3. Exumao do contrato fiducirio

    O termo fiduciriofoi tomado do vocabulrio do Direito Romano (fiduciarius) e derivado de fiducia, do latim, confiana, segurana, designando uma relao em queh confiana de ambas as partes ou contrato que a estabelea. Vejamos, por etapas, o

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    que o verbete Contrato Fiducirio (GREIMAS, 1984:184) nos diz: "O contrato fiduciriope em jogo um fazer interpretativo de parte do destinador e, em contrapartida, aadeso do destinatrio...". Podemos, desde j, salientar que se o fazer interpretativo,ele pertence ao plano cognitivo; e que se entre o destinadore o destinatriodevehaver uma concordncia, uma adesopor parte do destinatrio, ento, deve ocorreruma sano. Na relao fiduciria, o /saber/ est colocado em segundo plano, j que o/crer/ (modalidade epistmica) que garante o /saber/, ou melhor, a consistncia do/saber/. Claude Zilberberg (1986:39) caracteriza o sujeito fiducirio como aquele que

    est conjunto do /crer/ do destinador, ou seja, do /crer-crer/.

    O Contrato Fiducirio pode ser: 1. Enunciativo ou de veridico- garante as bases doenunciado, instaura a coerncia e a coeso. Implica em um /saber/ que transita entredestinador e destinatrio. Ele pe o destinatrio na condio de sancionador dodestinador. A prova glorificante do destinador justamente levar o destinatrio sano positiva do seu Programa Narrativo (PN); 2. Enuncivo - COURTS &GREIMAS (1984:184) dizem sobre esse tipo de contrato: "... se o contrato fiduciriosanciona um programa narrativo no interior do discurso, falar-se- ento de contratoenuncivo". Na verdade, nesse tipo de contrato, o /saber-fazer/ do destinador - aps ser

    tido como verdadeiro atravs do estabelecimento de um Contrato Fiducirio do tipoEnunciativo - vai ser aplicado na sano de um outro PN qualquer.

    GREIMAS (1983: 229) conceituar em De La Colrea "attente fiduciaire", que,diferentemente do Dicionrio de Semitica, traduzimos "espera fiduciria". Essaespera que Greimas introduz entre o conceitos da teoria semitica, diz respeito a umaespera particular, aquela que, no sujeito de estado, "anterior frustrao", ou seja, um perodo de tenso, que se transformar em distenso, seja a sano eufrica oudisfrica. A espera fiduciria instala uma suspensodo lado do destinatrio, e umacontinuaodo lado do destinador. O sujeito da espera fiduciria " acredita podercontar com o sujeito de fazer para a realizao de suas esperanas e/ou de seusdireitos". H um "/dever-fazer/ atribudo ao sujeito de fazer". Apesar da relao deconfiana estabelecida entre sujeito de estado e o sujeito de fazer, Greimas chamanossa ateno para o fato de no podermos denomin-la um "verdadeiro contrato deconfiana" ou mesmo um "pseudocontrato", mas, sim, um "contrato imaginrio", j que"o sujeito de fazer no est de modo algum engajado" nesse processo. A esperafiduciria apresenta-se, ento, como delrio do sujeito de estado, simulacro produzidopela projeo de suas ansiedades. Ela implica em duas formulaes, a saber: S1querer [S2 (S1 Ov)] e S1 crer [S2 dever (S1 Ov)].

    No Discurso Publicitrio, podemos entender o enunciado como um programa de

    produo, que visa a construo de um objeto de valor (ou simplesmente de um valor),supostamente irresistvel para o Sujeito. Na publicidade aqui analisada, na instnciada enunciao, o contrato feito entre o destinador Folha de So Pauloe o destinatriotelespectadores um contrato de veridico. Ele garante o discurso-enunciado.Obviamente, esse contrato alm de firmado entre duas instncias extralingsticas temcarter virtual, pois, se o fazer persuasivo realizado, o mesmo no podemos dizer dofazer interpretativo, j que o destinatrio-enunciatrio no realiza a sano doprograma do destinador-enunciador. A Folha de So Paulono pode saber a opiniodos telespectadores que assistem ao comercial, a no ser pelo aumento da vendagemdo produto anunciado. A sano, desse modo, no realizada pelo menos

    concretamente, ou melhor, de modo a possibilitar um registro, de forma a inserir-se noenunciado. Um exemplo de fazer interpretativo que pode ser registrado seria umprograma interativo no estilo de "Voc Decide" (programa veculo pela Rede Globo),no qual a interatividade proporciona a realizao da sano.

    No interior do enunciado vrios contratos so rompidos e estabelecidos. Poderamos

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    falar sobre eles - o que efetivamente no nossa inteno, j que trabalhamossomente a Enunciao. O que nos interessa aqui, no entanto, mais o movimento, atenso entre a ruptura e o estabelecimento dos contratos do que as suas implicaesno discurso-enunciado. Esse quadro de transio, de "re-assentamento" traado porZILBERBERG (1986:39) quando da definio de "sujeito ttico", sujeito que estconjunto (ou no) do objeto-valor, habitando uma temporalidade diversa do sujeitofiducirio, o qual afirma o valor do valor. O conflito entre o sujeito ttico e o sujeitofiducirio travado quando h um descompasso entre o possuir o objeto-valor e oprprio valor. Assim, possvel possuir e no desejar, ou ainda desejar e no possuir.Esse permanente devir - fluxo/refluxo - que no pode ser interrompido ou satisfeito,amalgama sujeito e objeto, enunciador e enunciatrio, produtor e produto, e, em nossocaso, o enunciado publicitrio e o telespectador.

    4. Ecografia do tmico

    Segundo Greimas (1979: 462-3), a categoria tmica motivada pelo sentido da palavratimia (cf. grego thyms, "disposio afetiva fundamental") e "serve para articular osemantismo diretamente ligado percepo que o homem tem de seu prprio corpo",

    articulando-se como eufrica (grande prazer) ou disfrica (grande dor), tendo a aforia(estado de inconscincia) como termo neutro e a foria (estado de conscincia) comoelemento complexo. Greimas chama a categoria tmica de "primitiva", proprioceptiva,verificadora da sensao e reao do destinatrio, como ser vivo que, integrado numcontexto, se transforma num sistema de atraes e repulses, diante de determinadamensagem. Quando o telespectador sente-se atrado pelo anncio televisivo, seuestado de euforia pela sensao de prazer, com o enunciado. Todavia, a sua no-atrao pode conduzi-lo repulso, situao de disforia, no assinando aquelecontrato apelativo com os destinadores do texto. Assim, o jogo euforia/disforia assume,no apenas valores descritivos, mas tambm axiolgicos, pela firmao do contrato deaceitao da mensagem por esses enunciatrios. Uma ecografia do tmico importante, portanto, no s sob o prisma de sua aplicao sobre o descritivo, mastambm para explicar as tenses vividas pelos sujeitos em relao ao objeto, porqueessa timia revela, sob o processo modal, as paixes dos sujeitos que, sem refletirdireito, acabam atendendo o apelo dos profissionais do "marketing", comprando umaidia que nem sempre verdadeira, nem to sincera assim.

    Claude Zilberberg em Essai sur les modalits tensives(1981), partindo do pressupostoque o sema varia entre os estados de tenso e relaxamento, elabora o quadradosemitico das modalidades tensivas: /tenso/ /relaxamento/ (termos contrrios)/distenso/ /intenso/ (como termos contraditrios). por meio deste quadrado que

    Zilberberg procura melhor explicitar o sentido. A categoria /tenso/ vs. /relaxamento/ apresentada como oposio matriz, instalando-se o processo de descontinuidade nacontinuidade sistmica do sema, verificando-se, assim, a unidade smica e, ao mesmotempo, seu esvaziamento, podendo-se enxergar sua forma em oposio suasubstncia, posto que as modalidades tensivas funcionariam como modalizadoras dascategorias semnticas, estando sob toda unidade de sentido. Greimas, por sua vez,atribui esse papel categoria tmica em termos de estruturas fundamentais, sendo,portanto, reveladora no mais apenas da positividade em oposio negatividade,mas tambm da maior ou menor tenso e relaxamento do sujeito diante da cena queassiste.

    Estes estados passionais podem ser vistos no enunciado, nos vrios programas deuso que convergem ao programa narrativo de base. Contudo, sob o ngulo dos atoresdiscursivos e mesmo no nvel dos enunciatrios do discurso, so relativizados, poruma questo de valores. No primeiro take, o depsito para o depositante, em princpio, ositivo. Ao ser informado elo actante-su eito "caixa" ue o Banco est " uebra-

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    no-quebra" e encorajado a retirar tudo que tem, num processo de manipulaointimidatria, passa por um estado de tenso aumentada, diminuindo,conseqentemente, o relaxamento. No segundo take, o assalto, para o actante-sujeito-coletivo ladro, , em princpio, eufrico. Esta euforia, registrada no modo como entramna agncia bancria, na nsia do dinheiro, passa a uma situao disfrica pela no-conjuno com o seu objeto de busca. Entre um estado e outro, temos a frustraocomo reveladora de elementos passionais. O terceiro takemostra a metamorfose doactante-sujeito "caixa", que passa a trabalhar no jornal, devido a sua supostasinceridade para com o depositante, para com os ladres, para com ostelespectadores. a figura do ator discursivo que sintetiza e procura representar atodos que tm sede de justia, diante das falcatruas e o alto nvel de corrupo emalgumas instituies. O seu programa narrativo de base comea num processo demanipulao por intimidao, em relao ao cliente, demonstrando uma "sinceridade"questionvel, porque a caixa foi insincera com sua instituio.

    Portanto, ao utiliz-la como sujeito-operador do programa narrativo da Folha de SoPaulo, a Agncia Almap, sujeito delegado-manipulado pelo destinadorFolha, queprocura, no nvel do parecer, resgatar a honestidade corroda no s na esfera de

    algumas instituies financeiras, mas nos mais variados setores pblicos. Esse , noentanto, o efeito de sentido que provoca nos destinatrios de sua mensagem,seduzidos pelo suspense, entre uma cena e outra, pelos movimentos dos atores, adinmica e a plstica do enunciado televisivo que passam, igualmente, de um estadode tenso a um estado de relaxamento e, na oscilao entre um estado e outro,devem-crer que a mensagem veiculada verdadeira, numa prazerosa euforia que nodeixa ver o "falso", entre o sere oparecer, forjado pelo "segredo" existente entre o sere o no-parecere levado pela "mentira" camuflada entre oparecere o no-ser.Dizemos que, o destinador Folha de So Paulobusca, assim, no importando amaneira utilizada para chegar ao seu objetivo, uma forma de angariar mais leitores e

    assinantes, como objetos modalizadores do conseqente lucro. Seu programanarrativo, todavia, termina virtualizado, at que os destinatrios de seu discursoassinem esse contrato fiducirio, sancionando a Folha, num processo de identificao,com uma assinatura, momento em que tambm estariam realizando seu prprioprograma narrativo em busca da justia.

    5. Sutura do Sincrtico

    O sujeito da enunciao recobre de intencionalidade o enunciado. Como a enunciao responsvel pela produo da semiose, o ato de significar encontra as coeres dasubstncia da expresso, que obrigam a fazer uso de procedimentos de textualizao

    tridimensional do texto sincrtico. Como a publicidade televisiva elaborada paraatender o pblico alvo, cada detalhe devidamente estudado e escolhido paraproduzir este e no aqueleefeito de sentido.

    Diante de um texto apresentado na forma teatral, o instrumental analtico deve assumiro espetculo encenado. Os dois takes iniciais realizam no tempo convencional o fazersomtico (Greimas & Courts, 1984:145-6), colocado os atores figurativos agindo nadimenso pragmtica (atitude corporal programada) e comunicativa (o corpo humanoenquanto suscetvel de significar por gestos, atitudes, expresses faciais). O take3 misto (filme mudo + narrador + logotipo), pois ali o fazer somtico da jornalista (cena

    muda) ao fazer comunicativo (voz do narrador).Todos os elementos da sincretizao so formas significantes. A entonao (Greimas& Courts, 1984:145), tambm denominada gestualidade oral, pode ser reconhecida,no plano da expresso (curva ascendente/descendente), e representar sentido,articulando-se em categorias smicas (aprovao/recusa). Do mesmo modo, os gestos

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    e expresses faciais, ou gestualidade visual (Greimas & Courts, 1984:209), sofenmenos paralingsticos, que auxiliam a comunicao intersubjetiva, capazes deenunciar categorias abstratas que articulam o universo semntico coextensivo a umacultura.

    A proxmica (Greimas & Courts, 1984:359-60) um projeto da teoria semitica quevisa analisar a disposio dos sujeitos e dos objetos no espao e o uso que os sujeitosfazem dele para a significao. Em semiticas artificiais, como a publicidade televisiva,

    a proxmica deve ser tratada, juntamente com a linguagem gestual, espacial esonoplastia, como componente da semitica discursiva que a espacializao.

    A segmentao espacial-actorial permite distinguir trs momentos: take1, em que ocliente orientado pela caixa do banco a sacar se dinheiro; take2, em que o ladro logrado e take3, em que surgem na tela a caixa do banco travestida em jornalista e avoz do narrador, catalisadora do sentido pretendido. Embora apresentem algunsaspectos comuns, os takes1 e 2 contrastam pelas oposies: no nvel verbal,depsito/assalto, linguagem elegante/ vulgar da caixa, verbos e expresses no tempopresente/passado e, no no-verbal: cliente/ladro, escolha de atores: homem bem

    apessoado/vulgar. No procedimento da caixa, temos: o olhar confiante/desconfiado,voz normal/alterada, entonao ascendente/ descendente, ritmo acelerado/pausado,gesto de apoio (entrega o boleto ao cliente)/gesto de desprezo (devia com o dedo orevlver), rudos normais/fortes, silncio/tumulto, figurantes em estado normal/pnico.Assim, no tratamento conferido pela caixa, observa-se que ela premia o cliente e lograo ladro, o que conduz s oposies: informao/ironia, persuaso/dissuaso, fatoresque agem no sentido de agradar a moral ingnua ou senso comum do espectador.

    Da mesma forma, os takes1 e 2 opem-se ao 3, contrastando: agnciabancria/redao do jornal, caixa do banco/jornalista, que trabalha em p/sentada,atrs de um balco/frente ao computador, atende clientes/troca idias com colegas,numa relao de subservincia, indicando contrao/descontrao,dependncia/independncia, em que a caixa est nervosa/calma, utiliza gestosrpidos/ausncia de gestos, o corpo em movimento/s o movimento do olhar. Nos doistakesiniciais, o banco falido contrasta com o jornal promissor do take3, o que conduz oposio temtica: insegurana/segurana. A oposio banco/jornal evidenciatrabalho desgastante/edificante, pois, no banco, a caixa deve mentir, no deve serautntica, enquanto no jornal, seu trabalho edificante e pode ser autntica.

    O narrador do take3, que fala em nome da Folha de S. Paulo, assume tambm o papelde observador, estratgia que faz o espectador identificar-se com ele. Ao captar o

    sentido pretendido do texto flmico (interpretar a ao da caixa como demonstrao desinceridade), esse narrador-observador realiza a persuaso-manipulao doespectador.

    Nos dois takesiniciais, as atitudes da caixa aparentam a ruptura dos padresestabelecidos socialmente: ela rompe o contrato com o banco para premiar o cliente epunir o ladro. Esse estranhamento provoca a espera no espectador que ser satisfeitoao v-la logo a seguir, trabalhando no jornal. Portanto o pretendido pela publicidade fazer o espectador passar da ansiedade satisfao. O que aparenta ser uma ruptura("a sinceridade acima de tudo" dessa jovem), na realidade, a manuteno dos

    valores pr-estabelecidos se considerarmos o tratamento dado ao cliente e ao ladro.Por isso, o esquema pretendido : camuflado :: ruptura : manuteno sinaliza, no atransparncia do texto publicitrio, mas o simulacro que manipula o espectador.

    RESUMO: A semitica greimasiana um dispositivo seguro para a anlise de textossincrticos. Este trabalho pretende explicitar o efeito de sentido e a organizao

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    discursiva de uma publicidade televisiva, atravs da desconstruo da enunciao, docontrato fiducirio, das categorias tmicas e das relaes entre as linguagenssincrticas.

    PALAVRAS-CHAVE: Publicidade televisiva; enunciao; contrato fiducirio; categoriatmica; linguagens sincrticas.

    ANEXO

    TRANCRIO DO COMERCIAL DE TVFOLHA DE S. PAULO- Srie "Sinceridade acima de tudo"Agncia: ALMAP. Direo: Fernando Meirelles

    1. Take 1

    (Silncio e tranqilidade numa agncia bancria. Um cliente (homem de 50 anos,aproximadamente) chega (demonstrando confiana e calma) diante da moa quetrabalha como caixa - jovem, esperta, gestos rpidos)

    Cliente: Por favor (++) quero fazer um depsito,Caixa: DEPSITO " (++) NESTEBANCO " (++) meu senhor (+) isto aqui est quebra no quebra.

    Cliente: Todo meu dinheiro est aqui.

    Caixa: Nesse banco" (+) saca logo que desse fim de semana no passa.

    2. Take 2

    (Um pontap na porta giratria provoca um barulho seco. Um grupo de homens

    invadem a agncia aos berros...)Ladres: BAIXANDO (+) Isso um ASSALTO (Confuso de vozes. Uma clientemulher focalizada gritando assustada). PRO CHO (+) TODO MUNDO PROCHO (Gritos...confuso geral...)

    Ladro: PASSA O DINHEIRO PA:SSU:DINHE:IRO: (um dos ladres,aparentando mais de quarenta anos, ar ameaador, apontando uma arma nacabea da moa do caixa).

    Caixa: DINHEIRO ( , ) NESTE BANCO ( , ) Chegou tarde ( , ) Os donos j

    raparam o dinheiro (++) (e com o dedo indicador desvia a arma do ladro) faztem:po.

    3. Take 3

    (A caixa do banco, numa tomada mais prxima e em meia tela, est frente a ummonitor numa redao de jornal, ao mesmo que tempo em que surge a voz donarrador...)

    Narrador:Algumas pessoas so TO sinceras(+) que s existe UM trabalho paraelas(++) escrever na Folha de S. Paulo(++).

    O logotipo da Folha aparece no vdeo: "Folha de S. Paulo no d pra no ler" e,ao mesmo tempo:

    Narrador: Folha (++) sinceridade acima de tudo.

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    (Transcrio conforme Marcushi, L.Anlise da conversao. So Paulo: tica, 1986.)

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    BARROS, D. L. P. Teoria do Discurso. So Paulo: Atual, 1988.

    GREIMAS, A. J. & COURTS, J. Dicionrio de Semitica. So Paulo: Cultrix, 1984.

    GREIMAS, Algirdas Julien. Du sens II. Paris: Editions du Seuil, 1983.

    FONTANILLE, Jacques. Les espaces subjectifs. Paris: Hachette, 1990.

    ZILBERBERG, C. Reconhecimento do universo fiducirio. InCruzeiro Semitico, n4, Lisboa, 1986. p. 31-45.

    *DINIZ, M. L. V. P. et alii "Semitica greimasiana aplicada publicidade televisiva" InEstudos Lingsticos, vol. 29, GEL - Grupos de Estudos Lingsticos do Estado deSo Paulo, ISSN 1413-0939 (p.174-181) USC/Bauru, 2000.