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Segurança do Trabalho: uma cultura prevencionista?

Autoria: Ediane Lago, Sirlei Glasenapp Resumo O trabalho pode gerar vida e saúde ou pode gerar mortes, doenças e danos à integridade física dos trabalhadores. O presente trabalho visa identificar a concepção de segurança do trabalho nas empresas produtoras de móveis de madeira e assemelhados. A população foi composta por empresas fabricantes de móveis da região central do RS, tendo sido selecionada uma amostra de 29, classificadas em micro, pequena e média. O instrumento utilizado para a coleta de dados foi o questionário, além das observações diretas e entrevistas não estruturadas com os funcionários do setor produtivo. Através da análise dos dados, constatou-se que as práticas de segurança do trabalho estão aquém do ideal, visto a falta ou falhas na política de prevenção adotada, resultando na precariedade de utilização de programas preventivos. Da mesma forma, a falta de atitudes prevencionistas resulta no fornecimento de EPIs sem CA, falta de treinamento adequado, ausência de CIPA ou designado. A situação e as dificuldades enfrentadas pelas empresas levam a crer que somente um conjunto articulado de ações, formando um sistema harmônico de estratégias, que envolvam políticas públicas, empresas e trabalhadores, poderá a médio prazo, alterar o atual cenário da segurança do trabalho nas indústrias moveleiras da região central do RS. 1. Introdução

O trabalho faz parte da vida cotidiana do ser humano. É através dele que o homem consegue satisfazer suas necessidades e garantir sua sobrevivência. Contudo, o mundo do trabalho é complexo e cada vez é mais pressionado por uma dinâmica global que exige e criação de novas técnicas, novos sistemas e novas tecnologias de produção. Técnicas estas necessárias para que as empresas se mantenham competitivas e se tornem mais produtivas em um mercado globalizado.

O trabalho pode gerar vida e saúde ou pode gerar mortes, doenças e danos à integridade física dos trabalhadores. Assim, faz-se necessário a implantação de técnicas para o controle e prevenção de acidentes advindos do processo produtivo, através da segurança do trabalho, a qual vem sendo o centro das atenções e preocupações de muitos empresários, governo, sindicatos e trabalhadores.

O grande diferencial para o sucesso é, sem dúvida, o homem. Proteger sua saúde e integridade física, bem como promover seu bem-estar físico e mental é tarefa das organizações, quer sejam públicas ou privadas. Nesse sentido, é indiscutível a necessidade do Administrador conhecer as práticas de segurança no trabalho e compatibilizá-las com o planejamento e organização do processo produtivo, visto os grandes benefícios que esta associação traz para a empresa, destacando-se o aumento da produtividade e da qualidade e a diminuição dos custos do produto final.

A melhoria da segurança do trabalho visa, principalmente, diminuir o custo social com os acidentes de trabalho, valorizar a auto-estima e proporcionar a melhoria contínua da qualidade de vida dos trabalhadores. É um compromisso nacional que exige o exercício da cidadania, pois cabe ao Estado, aos empregadores, aos administradores e aos empregados contribuir para a formação de uma sociedade mais sadia e produtiva.

Conforme o Anuário Brasileiro da Revista Proteção (2002), os acidentes e as doenças do trabalho abrem rombos expressivos nos cofres públicos. Em nível mundial, 4% do somatório do Produto Interno Bruto (PIB) das nações é perdido com o custeio dos mesmos. No Brasil, as

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perdas consomem 2,2% do PIB, o equivalente a R$ 23,6 bilhões, sendo que o Brasil é o 4º país do mundo com mais mortes por acidentes de trabalho.

O Anuário revela que a atividade de fabricação de móveis com predominância de madeira está no ranking dos 50 setores que mais ocorrem acidentes de trabalho, tomando por base os 560 setores da Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE).

As estatísticas médias dos anos 1997, 1998 e 1999 revelam que foram registrados 4.803 acidentes e 15 óbitos, totalizando 1.005,324 dias perdidos e um custo com benefícios de R$ 18.000,220 (RS) nesta atividade.

Porém, estes dados não representam o retrato fiel da realidade, devido à exclusão de mais de 60% dos 70 milhões de trabalhadores que representam a população economicamente ativa e o drible, por meio de sub-registros ou falhas de notificação, nas estatísticas da Previdência Social que servem de base para as informações oficiais do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).

Este trabalho de pesquisa justifica-se pela existência de muitas informações empíricas sobre o panorama da segurança do trabalho na região central do Rio Grande do Sul e por não existir dados oficiais, tampouco informações científicas, seja por parte dos órgãos competentes, seja por parte de entidades e profissionais, que comprovem a realidade das práticas de segurança do trabalho nas indústrias fabricantes de móveis de madeira e assemelhados (MDF, compensado e aglomerado).

Neste sentido, a pesquisa pretende verificar a situação da segurança do trabalho, qual sua relação com o planejamento e organização e visão dos empresários nas empresas produtoras de móveis de madeira da região central do Rio Grande do Sul, visto ser um ramo da indústria responsável por um grande número de empregos e, cientificamente, carecer de atenção na região central.

2. Referencial Teórico

A abordagem Comportamental que surgiu nos anos 60 e 70 e, conforme Slack et al (1997), alegava que os trabalhos projetados com base puramente na divisão do trabalho, administração científica ou princípios ergonômicos, alienavam as pessoas no trabalho. Alguns autores defendiam a idéia de que era necessário uma abordagem de projeto de trabalho que levasse em conta a necessidade das pessoas tirar algo positivo de seus trabalhos, como a auto-estima e o desenvolvimento pessoal, pois seria mais compensador e motivador no sentido de incentivar as pessoas a contribuir com seus talentos e habilidades. Desta forma, dois importantes objetivos seriam atingidos: proporcionar trabalhos que tivessem uma qualidade de vida intrinsecamente maior e atingir melhor desempenho para a operação, tanto em termos de qualidade como de produtividade, em função dos níveis de motivação.

Segundo esta abordagem, a forma de obtenção desses objetivos inclui o revezamento, alargamento e enriquecimento do trabalho. Por revezamento entende-se mover os indivíduos periodicamente entre diferentes conjuntos de tarefas para proporcionar alguma variedade em suas atividades, aumentando, assim, a flexibilidade de habilidades e reduzindo a monotonia. O alargamento do trabalho envolve a alocação de um número maior de tarefas para indivíduos, sendo estas do mesmo tipo do trabalho original, permitindo que as atividades se repitam com menor freqüência, tornando o trabalho menos monótono. Por sua vez, o enriquecimento do trabalho também aumenta o número de tarefas, porém estas tarefas extras envolvem maior tomada de decisões, maior autonomia e maior controle do setor de trabalho, reduzindo a repetição no trabalho, aumentando a autonomia e as oportunidades de desenvolvimento pessoal.

O empowerment é uma extensão da característica do trabalho de autonomia, proeminente na abordagem comportamental do projeto de trabalho. Todavia, é usualmente considerado como

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sendo mais do que autonomia. Considerando que autonomia significa dar ao pessoal a habilidade de mudar como eles fazem seu trabalho, empowerment significa dar ao pessoal a autoridade para fazer mudanças no trabalho em si e na forma como ele é desempenhado. Isto pode ser incorporado em diferentes graus: envolvimento de sugestão, envolvimento do trabalho e alto envolvimento.

Para Slack et al (1997), envolvimento de sugestões dá poder ao pessoal de contribuir com suas sugestões de como a operação pode ser melhorada. O envolvimento do trabalho dá poder ao pessoal de retroprojetar seus trabalhos e o alto envolvimento inclui todo o pessoal na direção estratégica e desempenho de toda a organização. 2.1. Segurança do Trabalho

Para Zocchio (2002), a segurança do trabalho é uma forma abrangente de prevenção, que une dois pontos de convergência das ações e medidas preventivas: os acidentes do trabalho e as doenças ocupacionais. O autor explica que quando se pensa em prevenir acidentes do trabalho, deve-se ter em mente também a prevenção de doenças ocupacionais, dois males com alguns pontos comuns que preocupam igualmente por seus aspectos humanitário, social e econômico. Assim, segurança do trabalho é um conjunto de medidas e ações aplicadas para prevenir acidentes e doenças ocupacionais nas atividades das empresas ou estabelecimentos. Tais medidas e ações são de caráter técnico, educacional, médico, psicológico e motivacional, incluindo também medidas administrativas favoráveis.

Cardella (1999) define segurança como uma variável de estado dos sistemas vivos, organizações, comunidade e sociedade, sendo abrangente e holística. Quanto maior a segurança, menor a probabilidade de ocorrência de danos ao homem, ao meio ambiente e ao patrimônio. Sua natureza multifacetada envolve fenômenos físicos, biológicos, psicológicos, culturais e sociais. Portanto, a segurança requer uma abordagem holística dentro das organizações, pois o todo está nas partes e as partes estão no todo.

Para a administração da produção são consideradas as diversas ações. Assim, a segurança do trabalho vem ao encontro da atual abordagem prática do projeto de trabalho, a qual preconiza a produtividade e a qualidade através da valorização, em todos os aspectos, das pessoas envolvidas no processo produtivo.

Cardella (1999) afirma que a redução dos acidentes é um dos mais fortes desafios à inteligência do homem. Muito trabalho físico e mental e grandes somas de recursos têm sido aplicados em prevenção, mas os acidentes continuam ocorrendo, desafiando todos esses esforços. Aparentemente, o homem dispõe de recursos mais do que suficientes para evitá-los, pois o progresso científico e tecnológico criou métodos e dispositivos sofisticados em vários campos da atuação humana, inclusive na prevenção de acidentes. Entretanto, o objetivo principal não tem sido atingido satisfatoriamente e assiste-se a perdas de vidas e de integridade física de trabalhadores. Um aspecto notável é que quase a totalidade das causas dos acidentes tem sido atribuída a fatores humanos, ou seja, ao próprio homem.

O autor explica que o fator humano, o qual pode ser observado, registrado, filmado e quantificado, é o comportamento, ou seja, o conjunto de ações que o homem desempenha na interação com o mundo. E é no âmbito dessa interação que ocorrem os acidentes e são geradas as condições para ocorrência. O comportamento é o fator humano mais visível, imediato e superficial, sendo orientado para diversos fatores, entre eles a própria visão que o homem tem do mundo.

Conforme Cardella (1999), o homem vê a realidade através de paradigmas, ou seja, o que é padrão, conjunto de idéias e valores. O paradigma dominante na atualidade é racionalista,

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mecanicista e reducionista. O pensamento racional privilegia a razão, sendo linear, concentrado e analítico.

Para a visão mecanicista o homem é visto como peça de engrenagem substituível por outra equivalente. Sistemas vivos como o homem, as organizações e ecossistemas são abordados e tratados como máquina nas quais as relações de causa-efeito são todas do tipo determinístico. A visão reducionista trata a segurança e a qualidade como algo não inerente aos sistemas e atividades. Analisa os fatores de forma fragmentada, levando a conclusões que não produzem ações eficazes.

A visão subjetiva, intuitiva, filosófica não apresenta maior eficácia. Ao contrário, afirma Cardella (1999), é mais prejudicial, pois nela reside uma das maiores causas do fracasso da luta contra os acidentes, visto que o homem cria condições altamente perigosas ao introduzir avanços tecnológicos (elevadas velocidades, temperaturas, pressões) e, no controle dos riscos, utiliza, consciente ou inconscientemente, instrumentos subjetivos, como “torcer para dar certo” e explicações do tipo “foi fatalidade”, “deu azar” para a ocorrência dos acidentes.

Conforme expõe Cardella (1999), a partir do século XIX teve início um movimento de mudança cultural que aponta deficiências no modelo cartesiano-newtoniano e propõe um novo, denominado paradigma holístico, visão holística ou abordagem sistêmica. Defende a idéia de inter-relação e interdependência entre os vários fenômenos oriundos da relação da organização com o meio ambiente, quais sejam: físicos, biológicos, psicológicos, culturais e sociais. Nesta abordagem holística, o acidente é visto como um fenômeno de natureza multifacetada e multicausal, resultante de interações complexas entre vários fatores.

2.2 O Setor Moveleiro

Conforme as informações colhidas pela Associação Brasileira da Indústria do Mobiliário (Abimóvel, 2000 apud VENZKE 2002) as indústrias de móveis, no Brasil, caracterizam-se pela reunião de diversos processos de produção, envolvendo diferentes matérias-primas e uma diversidade de produtos finais, e podem ser segmentadas em função dos materiais com que os móveis são confeccionados (madeira, metal e outros), bem como com os usos a que se destinam.

Segundo Coutinho (1999 apud VENZKE 2002), o setor moveleiro brasileiro se caracteriza pela predominância de pequenas e médias empresas que atuam em um mercado muito segmentado, é intensivo em mão-de-obra e apresenta baixo valor adicionado em comparação com outros setores de características semelhantes.

Gorini (1998 apud VENZKE 2002) aponta que a tecnologia utilizada nesse setor é muito difundida e acessível, favorecendo a estreita cooperação entre as indústrias de móveis e de máquinas. Como o processo produtivo não é contínuo, a modernização, muitas vezes, pode ocorrer apenas em determinadas etapas da produção. Em algumas fábricas, portanto, é possível que máquinas modernas coexistam com máquinas obsoletas.

Além da tecnologia, os demais fatores de competitividade da indústria de móveis relacionam-se com novas matérias-primas, design, especialização da produção, estratégias comerciais e de distribuições, entre outros. As inovações referem-se, principalmente, ao produto, através do aprimoramento do design e da utilização de novos materiais. A qualidade do produto final é avaliada segundo as variáveis: material, design e durabilidade.

O setor moveleiro brasileiro é constituído por aproximadamente 13.500 micro, pequenas e médias empresas, que empregam cerca de 185 mil pessoas. Destas, cerca de 10 mil são microempresas (até 15 empregados), 3 mil pequenas empresas (de 16 até 150 empregados) e 500 empresas de porte médio (acima de 150 empregados). A Abimóvel estima, no entanto, que, entre empresas formais e informais, existam atualmente no país mais de 50 mil unidades produtoras de

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móveis. São empresas familiares tradicionais e, na grande maioria, de capital inteiramente nacional.

As unidades industriais de móveis localizam-se, em sua maioria, na região centro-sul do Brasil, respondendo por cerca de 88% da produção nacional e 70% da mão-de-obra empregada pelo setor. Em alguns estados estão implantados pólos moveleiros consolidados e tradicionais, como, por exemplo, os de Bento Gonçalves (Rio Grande do Sul), São Bento do Sul (Santa Catarina), Arapongas (Paraná), Mirassol, Votuporanga e São Paulo (São Paulo), Ubá (Minas Gerais) e Linhares (Espírito Santo).

Além desses tradicionais pólos, existem alguns outros menores, em regiões próximas a eles, onde dezenas e centenas de pequenas empresas estão constituídas, sem que essas regiões sejam caracterizadas formalmente como “pólos moveleiros”. No caso do Rio Grande do Sul, destacam-se as seguintes cidades: Caxias do Sul, Restinga Seca, Santa Maria, Erechim, Lagoa Vermelha, Passo Fundo, Canela, Flores da Cunha e Gramado, segundo o estudo de Venzke (2002).

O Rio Grande do Sul tem grande destaque no cenário moveleiro do Brasil, representando 20% da produção nacional e 31,1% do total das exportações de móveis, com faturamento bruto de R$ 1,65 bilhão, no ano de 2000. Com 3.200 empresas, o setor gera em torno de 33 mil empregos diretos e é responsável por 2% do PIB estadual, segundo a Movergs (2001 apud VENZKE 2002).

O maior pólo moveleiro do Rio Grande do Sul situa-se em Bento Gonçalves, com destaque na produção de móveis populares, de madeira maciça e de aglomerados e MDF, destinados predominantemente ao mercado interno. Venzke (2002) destaca no setor moveleiro gaúcho a existência de entidades representativas das empresas, com grande participação na organização de eventos e difusão de novas tecnologias, que são o Sindicato das Indústrias da Construção e do Mobiliário de Bento Gonçalves – SINDMÓVEIS e a Associação das Indústrias de Móveis do Estado do Rio Grande do Sul – MOVERGS. Dentre os eventos promovidos pelas entidades, destacam-se a MOVELSUL, que é uma feira onde participam empresas de todo o Brasil e exterior, onde são verificadas as tendências dos móveis, e a FIMMA, que dedica-se a apresentação das novidades em termos de equipamentos e materiais para fabricação de móveis. 3. Procedimentos Metodológicos 3.1 Caracterização da Pesquisa

O método escolhido para a pesquisa é o estudo descritivo, pois segundo Gil (1996), este tipo de estudo tem como objetivo principal a descrição das características de determinada população ou fenômeno, ou o estabelecimento de relação entre as variáveis. Como a pesquisa visa estabelecer um panorama da segurança do trabalho nas indústrias moveleiras da região central do Rio Grande do Sul, este método torna-se apropriado. Uma das características mais significativas do estudo descritivo é a utilização de técnicas padronizadas para a coleta de dados. Neste estudo, utilizado-se um questionário como instrumento de coleta de dados, por meio da pesquisa de campo.

3.2 População e Amostra

A população de interesse da pesquisa abrangeu 32 empresas fabricantes de móveis de madeira e assemelhados (MDF, aglomerados, compensados), da região central do Rio Grande do Sul, cadastradas no SEBRAE/RS, tendo como referência o mês de Junho de 2003.

O tipo de amostragem utilizado na pesquisa foi a amostragem estratificada não proporcional, que consiste em selecionar uma amostra em cada subgrupo da população

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considerada, com o tamanho de cada subgrupo na amostra não sendo proporcional ao tamanho destes na população de interesse, conforme Vergara (2000).

Dentro da população, foiá selecionada uma amostra de 29 empresas, pelo critério de acessibilidade, envolvendo os seguintes municípios da região central do Rio Grande do Sul: Santiago, Faxinal do Soturno, Agudo, Nova Palma, Santa Maria e Restinga Seca. A Tabela I abaixo apresenta a composição dos subgrupos de interesse na amostra estratificada.

SUBGRUPOS

MUNICÍPIO MICRO PEQUENA MÉDIA

TOTAL

Agudo 2 0 0 2

Faxinal do Soturno

1 0 1 2

Nova Palma 2 0 1 3

Restinga Seca 1 1 1 3

Santa Maria 11 0 0 11

Santiago 8 0 0 8

TABELA 1: AMOSTRA DA POPULAÇÃO DIVIDIDA EM SUBGRUPOS DE INTERESSE FONTE: SEBRAE/RS (2003)

Para classificar as empresas por tamanho foi utilizado o critério proposto pela

MOVERGS, que considera microempresas aquelas com até 15 funcionários, pequenas de 16 a 150 funcionários, médias de 151 a 500 funcionários e grandes acima de 500 funcionários. Devido à ausência de empresas classificadas como grandes na população de interesse, não se considerou este subgrupo.

3.3 Coleta de Dados

Para a realização da coleta de dados, o instrumento utilizado foi o questionário, respondido pelos responsáveis, ou conhecedores de todos os processos das empresas analisadas. Antes de ser aplicado, foi realizado um pré-teste do questionário, pois segundo Gil (1996), o pré-teste visa fazer uma avaliação dos instrumentos de pesquisa, verificando se estes irão medir exatamente aquilo que pretendem estudar.

O questionário utilizado tem três partes distintas, porém complementares. A primeira e segunda parte referem-se à coleta de dados gerais do empregador e da empresa, para determinar o seu perfil, enquanto a terceira parte é baseada nas premissas da segurança do trabalho e da organização do trabalho, expostas no referencial teórico, buscando identificar as práticas das empresas frente a tais premissas.

Além da coleta de dados estruturada através do questionário, realizou-se observações diretas e entrevistas não estruturadas com os funcionários do setor produtivo, das empresas moveleiras da região em análise.

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3.4 Variáveis

As variáveis consideradas em relação à segurança do trabalho são as seguintes: a) legislação trabalhista - verificar o conhecimento das empresas em relação à

legislação trabalhista referente à saúde e segurança do trabalho; b) medidas de proteção - quais as medidas de proteção coletivas ou individuais

adotadas pela empresa para proteger a saúde e integridade física de seus trabalhadores, frente aos riscos ambientais decorrentes do processo produtivo;

c) equipamentos de proteção individual - quais os EPIs fornecidos para os diferentes setores/funções e se os mesmos apresentam Certificado de Aprovação (CA);

d) investigação de acidentes - verificar se as empresas realizam investigações de acidentes e como ela se apresenta;

e) estatísticas de acidentes - verificar se as empresas adotam controle estatístico dos acidentes de trabalho e quais os setores/funções mais acometidos;

f) causas dos acidentes - quais as principais causas motivadoras dos acidentes de trabalho e/ou doenças do trabalho apontadas pela empresa;

g) monitoramento da saúde dos trabalhadores - qual o tipo de monitoramento adotado pela empresa, quais seus indicadores, quem faz e em que situações é feito;

h) treinamento - identificar se os trabalhadores são submetidos a treinamentos de segurança do trabalho e qual sua periodicidade;

i) comissão interna de prevenção de acidentes - identificar a existência de CIPA nas empresas ou trabalhador designado para o cumprimento do objetivo da mesma;

j) programa de prevenção de riscos ambientais - identificar sua existência e como se apresenta nas empresas em análise.

3.5 Análise dos Dados

Após a coleta de dados, as informações forma tabuladas e analisadas, com o auxílio de programa de estatística informatizado. Os resultados do questionário são apresentados em forma de quadros e gráficos, utilizando-se parâmetros da estatística, como média; enquanto os resultados das observações e entrevistas não estruturadas são analisados de forma qualitativa.

4. Análise dos Resultados

Para a análise dos dados partiu-se de uma amostra de 29 empresas, sendo que o retorno foi de 24, pelos seguintes motivos: 02 optaram em não participar, 01 mudou o ramo da atividade econômica e 02 não possuem mais trabalhadores como empregados.

Na seqüência, serão realizadas duas análises distintas, porém complementares, o perfil das empresas e segurança do trabalho.

4.1 Perfil das Empresas

Para efetuar a análise das empresas, as mesmas foram divididas em três subgrupos: pequenas, médias e grandes, tomando por base o número de funcionários, conforme critério adotado pela MOVERGS.

Predominam empresas de micro porte, com 71% do total, seguidas de 29% de empresas de pequeno porte. O subgrupo médio porte não foi considerado na análise dos resultados, devido a empresa abrangida não ter fornecido as informações necessárias, constantes no instrumento de coleta de dados.

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sim não

0

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A produção de móveis de madeira e assemelhados é única em 67% das empresas, enquanto 38% produzem, além dos móveis, esquadrias de madeira. Para isto, o tipo de produção adotado em 100% da amostra é sob encomenda, sendo exclusiva em 88% destas. O restante das empresas, também adota a produção contínua e em lotes.

Para a fabricação dos móveis e esquadrias de madeira, o layout, ou seja, as máquinas, ferramentas e pessoas estão dispostas conforme o produto a ser fabricado em 54% das empresas; é misto (produto e processo) em 25% e é organizado por processo em 17% das mesmas. O layout tipo celular é citado apenas por uma empresa.

4.2 Segurança do Trabalho

A análise da segurança do trabalho tem como finalidade identificar e avaliar as práticas adotadas pelas indústrias moveleiras da região central do Estado.

A primeira análise realizada refere-se à existência de política de segurança do trabalho, entendendo-se como tal, um conjunto amplo de ações de observância obrigatória na empresa, nos diferentes níveis hierárquicos, que visam a prevenção, eliminação/neutralização e o controle dos agentes ambientais capazes de causar acidentes de trabalho. Como resultado da pesquisa, obteve-se de 67% das empresas a informação de não existir política de segurança definida, contra 33% que afirmam possuir, conforme FIGURA 01.

FIGURA 01 - POLÍTICA DE SEGURANÇA FONTE: Pesquisa acadêmica (2003)

Nesta variável, percebe-se uma relação direta com as políticas e metas adotadas, as quais são seguidas e alcançadas parcialmente por 71% das empresas pesquisadas, evidenciando a ausência e/ou deficiência no planejamento estratégico empresarial.

Através da observação direta nos locais de trabalho e entrevistas não estruturadas, pode-se afirmar que esses dados não refletem a realidade, visto que a maior parte das empresas que afirmaram possuir política de segurança do trabalho, não souberam explicar seu funcionamento e não possuem a mesma formalizada e divulgada para todos os trabalhadores. Por outro lado, outras citam apenas o fornecimento de EPI e a elaboração de PPRA e PCMSO por empresa contratada, como política de segurança, o que torna a mesma incompleta e ineficaz.

Uma das principais contribuições para auxiliar e entender os acidentes de trabalho é a estatística desses acidentes. Através delas, pode-se definir prioridades e adotar medidas de prevenção contra os riscos envolvidos na atividade laboral dos trabalhadores. O controle estatístico da ocorrência dos acidentes de trabalho não é adotado por 88% das empresas

67%

33%

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analisadas, sob a alegação de não ocorrer acidentes de trabalho com seus funcionários, de forma freqüente ou significativa.

Constatou-se que as empresas analisadas consideram como acidente de trabalho os que acarretam lesões graves e vários dias de afastamento, ignorando as pequenas lesões e os acidentes que causam danos materiais e perda de tempo. Neste sentido, as citações de infortúnios referem-se a cortes e amputações, quando da operação das máquinas do processo produtivo. Na ocorrência de acidentes de trabalho, 71% das empresas não realizam investigação das causas que levaram o mesmo a acontecer, enquanto 29% realizam informalmente, através de conversa com o acidentado e com o grupo de funcionários do setor.

Nas investigações informais realizadas, a principal causa da ocorrência de acidentes de trabalho apontada pelas empresas é a falha humana, ou seja, negligência, falta de atenção e falta de experiência do acidentado. A investigação dos acidentes de trabalho ocorridos é uma ferramenta valiosa na prevenção dos mesmos, pois, quando realizada corretamente, permite, a partir do acidente e também do quase-acidente, do incidente e do desgaste material, identificar progressivamente os fatores envolvidos em sua gênese e evitar que eventos iguais se repitam nas mesmas circunstâncias.

Os custos diretos e indiretos que os acidentes de trabalho acarretam sobre o faturamento das empresas não são controlados formalmente por 100% destas, conforme QUADRO 01. Apenas 01 empresa faz acompanhamento informal do mesmo, alegando consumir 1% de seu faturamento no custeio das conseqüências dos acidentes do trabalho.

Apesar disso, 79% das empresas concordam que os acidentes do trabalho interferem negativamente no processo de produção, elencando as seguintes maneiras: desmotivação do quadro funcional, insegurança para o empregador, diminuição da produtividade e atrasos no prazo de entrega das mercadorias. Por outro lado, 21% das empresas acreditam que os acidentes de trabalho não interferem no processo produtivo, devido suas ocorrências não serem significativas e freqüentes.

QUADRO 01 - CUSTOS DOS ACIDENTES DE TRABALHO FONTE: Pesquisa acadêmica (2003) LEGENDA: AT (Acidente de Trabalho)

Dentre as empresas analisadas, 92% (FIGURA 02) afirmam prestar orientações de

segurança aos seus funcionários, bem como informar os mesmos sobre os riscos ocupacionais a que estão expostos e as medidas de prevenção a serem observadas. No entanto, constatou-se que essas informações de segurança são ministradas pelo próprio proprietário da empresa ou por funcionário com mais experiência no setor produtivo, através de diálogo informal, reuniões e palestras, podendo implicar em informações inadequadas quanto às práticas de segurança do trabalho. O adequado seria a realização de treinamentos por pessoas capacitadas no assunto.

Produção X AT

Custos AT

Não-resposta

sim

não

TOTAL

sim não TOTAL

1 0 1

0 0 0

18 5 23

19 5 24

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Orientações Riscos ocupacionais

0

22

sim não

EPIs com CA

Fornecimento EPI

sim

não

TOTAL

sim, todos não desconheço TOTAL

16 1 6 23

0 1 0 1

16 2 6 24

FIGURA 02 - ORIENTAÇÕES DE SEGURANÇA FONTE: Pesquisa acadêmica (2003)

Os EPIs são fornecidos gratuitamente aos funcionários por 96% das empresas analisadas, conforme QUADRO 02, sendo que 67% destas afirmam que os mesmos são providos de certificação emitida pelo MTE, enquanto 25% afirmam desconhecer essa exigência legal e 8% não fornecem EPIs com CA.

QUADRO 02 - FORNECIMENTO DE EPIs FONTE: Pesquisa acadêmica (2003)

Em algumas empresas, constatou-se divergências entre as respostas do questionário estruturado e a observação direta nos locais de trabalho, quanto à existência de certificação nos EPIs, visto a afirmação de fornecimento de EPIs com CA e, na observação, constatar-se o contrário. Isto confirma que os indicadores mostrados pelo QUADRO 03 não refletem a realidade, sendo maior o índice de desconhecimento das empresas quanto exigência legal de CA.

Todo o EPI deve apresentar, em caracteres indeléveis e bem visíveis, o número do certificado de aprovação emitido pelo MTE, devendo, ainda, o mesmo estar dentro do prazo de validade, conforme NR-06. Para obtê-lo, as empresas fabricantes de EPIs submetem os mesmos a testes, realizados por laboratórios credenciados no órgão fiscalizador, os quais buscam verificar a qualidade e a proteção a ser oferecida aos usuários. Quando aprovados, os EPIs recebem a certificação, devendo esta ser renovada a cada cinco anos.

O fornecimento de EPIs sem CA é considerado crime, podendo a empresa vir a sofrer as sanções previstas na legislação pertinente ao assunto, inclusive o pagamento de multas. Observou-se trabalhadores usando máscara respiratória sem CA, ou seja, sem condições de proteger sua saúde contra os contaminantes provenientes da produção de móveis de madeira e

92%

8%

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Não-resposta sim, todos não somente a minoria

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assemelhados, por não ter capacidade filtrante. Esta máscara foi produzida para outros fins, como por exemplo, proteção das pessoas próximas contra gotículas de saliva provenientes da conversação, em casos específicos.

Os programas de treinamento e conscientização dos funcionários quando do recebimento dos EPIs (admissão e periodicamente), são realizados por 67% das empresas, enquanto 33% não realizam. No entanto, das 67% das empresas, 50% realizam treinamentos através de pessoas não capacitadas no assunto, a saber: proprietário da empresa, gerente e pelos próprios funcionários. Por outro lado, 44% das empresas realizam os mesmos através de pessoas capacitadas, ou seja, Médico do Trabalho, Técnico de Segurança do Trabalho e empresa prestadora de serviços de saúde ocupacional; e 6% das empresas não responderam.

Durante as observações diretas no ambiente produtivo, identificou-se situações negativas, decorrentes de falta e/ou falha na realização dos treinamentos, em algumas empresas analisadas, como protetores auditivos que estão desgastados e máscaras respiratórias tipo manutenção sendo usadas com esponja ou pano, ao invés de filtro adequado.

Além de ser uma obrigação do empregador, prevista na NR-01 e NR-06, o treinamento dos funcionários é imprescindível para garantir a eficácia dos EPIs, devendo este abordar, no mínimo, a importância, maneira correta de uso, substituição, higienização e limites de proteção oferecidos.

Quanto à conduta dos funcionários frente às recomendações de segurança, bem como uso efetivo dos EPIs fornecidos, a FIGURA 03 mostra que 54% das empresas afirmam que todos os funcionários possuem conduta favorável à prevenção, enquanto 29% revelam que somente a minoria colabora. Por outro lado, 08% afirmam não haver respeito às orientações emitidas, por parte dos funcionários, e 8% das empresas não responderam.

FIGURA 03 - CONDUTA DOS FUNCIONÁRIOS FRENTE ÀS RECOMENDAÇÕES DE SEGURANÇA FONTE: Pesquisa acadêmica (2003)

A explicação das empresas para a conduta negativa dos funcionários frente às

recomendações de segurança e uso efetivo dos EPIs, baseia-se na falha humana e administrativa, ou seja, 42% negligência/imprudência do funcionário e 25% falta de cobrança por parte da empresa. Das empresas analisadas, 38% não responderam este questionamento.

Neste ponto, percebe-se das empresas a transferência de parcela da responsabilidade pelo cumprimento das normas de segurança aos funcionários, sob a alegação de imprudência/negligência. No entanto, a conduta negativa dos funcionários pode ser reflexo da

54%

29%

8%

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Execução dos exames

Exames médicos

sim, alguns

sim, todos

não

TOTAL

posto de saúde médico do trabalho não são realizados exames médicos

TOTAL

1 7 0 8

2 13 0 15

0 0 1 1

3 20 1 24

conduta negativa das empresas, visto as faltas e/ou falhas nos treinamentos e orientações de segurança, bem como a maneira com que as mesmas lidam com o tema, haja visto que 25% das empresas sabe que o problema de conduta dos funcionários reside na falta de treinamentos aos mesmos

Outra variável considerada nesta pesquisa é a CIPA. Cinco empresas analisadas possuem necessidade legal de tê-la implantada, conforme dimensionamento constante no Quadro II da NR-05. No entanto, apenas uma empresa possui a Comissão instituída, cuja atuação verificou-se não condizer com a legislação, visto a realização de reuniões semestrais, quando deveriam ser mensais.

As empresas que não precisam constituir CIPA, por não se enquadrarem no dimensionamento previsto pela NR-05, devem designar um funcionário para ser o responsável pelo objetivo dessa Comissão, qual seja, prevenção de acidentes e doenças ocupacionais. Contudo, essa situação não foi verificada em nenhuma das empresas analisadas. Destaca-se o fato de 8% das empresas desconhecerem a necessidade de ter CIPA ou designado.

O Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) é obrigatório para todas as empresas que admitam trabalhadores como empregados, devendo ser considerado em nível estratégico, pois visa a preservação da saúde e da integridade física dos trabalhadores, através da antecipação, reconhecimento e controle dos riscos ambientais. Conforme a pesquisa 33% das empresas possuem o mesmo elaborado, enquanto 63% não possuem e 4% desconhecem a necessidade de ter.

Paralelamente ao PPRA, deve caminhar o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), cujo objetivo é monitorar, individualmente, a saúde dos trabalhadores expostos aos riscos ambientais, através da realização de exames médicos (admissional, periódico, demissional, mudança de função e retorno ao trabalho), anamnese ocupacional e exames complementares, por Médico do Trabalho.

Nas empresas analisadas, 63% submetem seus funcionários a todos os tipos de exames médicos, enquanto 33% submetem somente aos exames de admissão e demissão e 4% não adotam a realização de exames médicos, conforme QUADRO 03. Os exames são executados por

Médico do Trabalho em 88% das empresas e pelo posto de saúde municipal por 13% delas. QUADRO 03 - EXAMES MÉDICOS FONTE: Pesquisa acadêmica (2003)

O monitoramento da saúde dos trabalhadores é acompanhado somente por 50% das empresas, e, quanto aos resultados, 63% destas afirmam não haver anormalidades que caracterizem doença do trabalho, enquanto 8% afirmam existir entre os funcionários, casos de perda auditiva induzida pelo ruído ocupacional (PAIR).

Merece destaque o fato de 25% das empresas que não acompanham os resultados do monitoramento da saúde de seus funcionários, afirmarem não existir casos de anormalidades entre os mesmos, o que sugere uma conduta irrelevante e superficial das empresas para com o tema pesquisado.

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Outra variável analisada nesta pesquisa é o pagamento dos adicionais de insalubridade e/ou periculosidade. Através do questionário estruturado, constatou-se que 96% das empresas pagam o adicional de insalubridade para seus funcionários, sendo que 79% delas contemplam todas as funções, enquanto 17% somente algumas.

Nas empresas da amostra, os percentuais pagos a título de insalubridade variam de 20 a 40% sobre o salário mínimo dos funcionários, sendo predominante o adicional de 20% para todas as funções, seguido dos adicionais de 20% para marceneiros (e outras funções do setor do beneficiamento da madeira) e 40% para pintores. Por outro lado, 29% das empresas não souberam responder este quesito.

Os adicionais referidos acima são pagos conforme orientações do sindicato da categoria em 46% das empresas, em 25% segundo orientações do escritório contábil, em 21% com embasamento em laudo técnico pericial elaborado por profissional habilitado e, em 8% por iniciativa do próprio empregador, temendo problemas futuros.

Condição insalubre é aquela cuja concentração, intensidade e/ou tempo de exposição aos agentes ambientais excede os limites de tolerância fixados na legislação pertinente, acarretando ao trabalhador o risco de adoecer. A obrigação do empregador não é tão somente pagar o adicional de insalubridade devido, mas, acima de tudo, adotar medidas de ordem coletiva ou individual que conservem o ambiente de trabalho dentro dos limites de tolerância, neutralizando os riscos à saúde dos trabalhadores.

Neste sentido, pode-se afirmar que a atuação do sindicato dos trabalhadores da indústria moveleira está aquém da ideal, visto ser bitolada à orientação de pagamento de adicional de insalubridade aos funcionários, condição que jamais garantirá a preservação da saúde dos mesmos. Os escritórios contábeis ou contadores, também, possuem sua parcela de responsabilidade nessa situação, pois, segundo pesquisa realizada pelo SEBRAE, 85% das micro e pequenas empresas entregam toda a sua área de pessoal, e com ela a questão da segurança dos trabalhadores, aos cuidados de seus contadores.

A qualidade de vida no trabalho não é uma preocupação de 92% das indústrias moveleiras da região central do RS. No entanto, deveria ser enfatizada e ser uma das questões mais valorizadas dentro das organizações.

As condições de trabalho interferem diretamente na qualidade de vida no trabalho, sendo uma categoria a ser avaliada nestes programas, além de ser um aspecto preponderante para a eficaz consecução das atividades operacionais nas indústrias moveleiras, tendo um efeito determinante na saúde mental e física dos trabalhadores, mas, conforme Vasconcelos (2001), o maior obstáculo para a implementação ainda reside na falta de importância estratégica e na baixa relevância em relação a outros programas.

Neste sentido, Andrade (2003) relata que um dos enfoques é a integração da produtividade com a melhora das condições de trabalho, através da quebra das resistências para a realização de mudanças, que, segundo a OIT, pode ser conseguido a partir da realização de seminários práticos que gerem: melhoras adaptadas às necessidades locais, ênfase em resultados concretos, vinculação das condições de trabalho com a produtividade, aprendizagem através da prática, favorecimento para o intercâmbio de experiências e fomento à participação dos trabalhadores. 4.2.1 Dificuldades e Sugestões para Implementação da Segurança do Trabalho

Segurança do trabalho é um tema novo para muitas empresas. Com isso, surgem dificuldades de compreensão e correta aplicação de suas técnicas. Para auxiliar no objetivo de

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identificar as práticas adotadas, foram formuladas às empresas duas questões abertas, que tratam das dificuldades e sugestões que os empregadores apontam para a implementação das técnicas de segurança do trabalho, sendo os fatores identificados descritos na seqüência.

As principais dificuldades citadas pelos empregadores são a falta de informação sobre a legislação pertinente à segurança do trabalho e falta de consciência e colaboração dos funcionários quanto ao tema. Por outro lado, 25% das empresas não responderam ou não vêem dificuldades na implementação da segurança do trabalho, sob alegação do porte e número reduzido de funcionários.

De fato, as informações referentes ao tema não são assuntos freqüentes da mídia, mas isso não justifica a alegação dos empregadores de desconhecimento da mesma, haja vista a possibilidade de obtê-la junto ao sindicato, profissionais da área e delegacias regionais do trabalho.

Sobre as dificuldades citadas, pode-se afirmar que ambas estão diretamente relacionadas, pois quando uma empresa deixa de executar ações necessárias, não pode esperar comportamento positivo de seus funcionários quanto à segurança do trabalho. Cardella (1999), escreve que a visão reducionista do homem deve ser substituída por uma visão holística, onde o acidente de trabalho é visto como um fenômeno de natureza multifacetada e multicausal, resultante de interações complexas entre vários fatores.

Neste sentido, destaca-se a importância da cultura organizacional que, segundo Cardella (1999), é o sistema de ações, valores e crenças compartilhadas que se desenvolve numa organização e orienta o comportamento dos seus membros, originando, conseqüentemente, a cultura da segurança.

A cultura de segurança é condição ideal de existir nas empresas, pois nela todos se sentem responsáveis pela segurança e a buscam a todo o momento, identificando comportamentos e condições de risco para, intervindo, corrigi-los. Nela, a segurança não é uma prioridade que pode ser mudada dependendo das exigências da situação, é, pois, um valor ligado a todos os aspectos do trabalho, quer se referindo à produtividade, qualidade, lucratividade ou eficiência.

A segurança do trabalho deveria ser mais do que usar EPIs, desligar a força, verificar possíveis riscos com equipamentos, etc. e, sim, uma regra tácita que se seguisse independentemente das situações. Os fatores responsáveis pela mesma, que Geller (1994 apud QUELHAS 1999) identifica como sendo os três domínios fundamentais para uma cultura de segurança, são: fatores ambientais em que se incluem equipamentos, ferramentas, layout e temperatura; fatores pessoais, tais como: atitudes, crenças e traços de personalidade; fatores comportamentais, ou seja, práticas de segurança onde se vai além das obrigações para garantir a segurança de outra pessoa. Esses três itens se resumem numa única palavra: cultura.

5. Considerações Finais

A falta de um modelo prevencionista aliado à falta de cumprimento das normas existentes sobre segurança do trabalho por parte das empresas analisadas, ressalta um duplo aspecto que reduz o crescimento do país: um elevado gasto em benefícios decorrentes do trabalho pôr parte do governo e perda da produtividade pôr parte das empresas devido aos custos de acidentes.

Não se pode imaginar que exista uma única estratégia que possa, por si só, resolver ou mesmo atuar significativamente sobre a questão. A situação e as dificuldades enfrentadas pelas empresas, levam a crer que somente um conjunto articulado de ações, formando um sistema harmônico de estratégias, que envolvam políticas públicas, empresas e trabalhadores, poderá a médio e longo prazo, alterar o atual cenário da segurança do trabalho nas indústrias moveleiras da região central do RS.

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A adoção de estratégias de sensibilização, persuasão e motivação são necessárias para promover a mudança educacional que, por sua vez, é necessária para o nascimento da cultura da segurança nas empresas que, aliadas às estratégias de informação, formação e assistência técnica, podem permitir a melhora efetiva das condições e meio ambiente de trabalho, desenvolvendo, assim, a segurança de seus trabalhadores.

Segurança não é prerrogativa de um segmento econômico ou de um porte de empresa, é inerente ao trabalho, e trabalho é um meio de ganhar a vida e não de perdê-la. Com este pensamento, conclui-se o presente trabalho salientando a importância de estudar-se meios para a diminuição dos acidentes de trabalho, haja vista à proteção da integridade física e mental dos trabalhadores, que como tal, são seres humanos merecedores de proteção. Além disso, quanto maior a iniciativa de estudos sobre esse tema, maior será a conscientização dos segmentos sociais, com relação a evitar que este problema permaneça. Referência Bibliográfica ANDRADE, Luís Renato Balbão. Estratégias Para as Menores. Revista Proteção. Edição nº 142, Porto Alegre: 2003 ANUÁRIO BRASILEIRO DA REVISTA PROTEÇÃO, Porto Alegre: Revista Proteção, 2002. ARAÚJO, Giovanni Moraes de. Normas Regulamentadoras Comentadas – Legislação de Segurança e Saúde no Trabalho. 2. ed. Rio de Janeiro, 2000. CARDELLA, Benedito. Segurança no Trabalho e Prevenção de Acidentes – Uma Aborgagem Holística: Segurança Integrada à Missão Organizacional com Produtividade, Qualidade, Preservação Ambiental e Desenvolvimento de Pessoas. São Paulo: Atlas, 1999. GIL, Carlos Gil. Projetos de Pesquisa. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1996. OS NOVOS DESAFIOS PARA A INÚSTRIA MOVELEIRA, Rio de Janeiro: BNDES, 2002. Disponível em <www.bndes.gov.br/conhecimento/bnset/set1504.pdf> Acesso em: 09 maio, 2003. PROGRAMA DE MEDICINA DO TRABALHO, Santiago: Unimed Santa Maria – Coordenadoria Regional de Santiago, 2003. QUELHAS, Osvaldo Luís Gonçalves; D.Sc. Articulação dos Programas de Qualidade e de Saúde do Trabalhador. Laboratório de Qualidade, Segurança e Produtividade, UFF. Rio de Janeiro, 1999. RELATÓRIO DE ANÁLISES DE ACIDENTES DE TRABALHO. Sistema Federal de Inspeção do Trabalho. Disponível em <www.mte.gov.br/temas/SegSau/defaul.asp> Acesso em 09 maio, 2003. SLACK, Nigel. et al. Administração da Produção. São Paulo: Atlas, 1997. VASCONCELOS, Anselmo Ferreira. Qualidade de Vida no Trabalho: Origem, Evolução e Perspectivas. Caderno de Pesquisas em Administração. Volume 08, São Paulo, 2001. VERGARA, Sylvia Constant. Projetos e Relatórios de Pesquisa em Administração. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2000. VENZKE, Cláudio Senna. A Situação do Ecodesign em Empresas Moveleiras da Região de Bento Gonçalves, RS. Porto Alegre: UFRGS, 2002. Disponível em <http://www.portalga.ea.ufrgs.br/acervo/disserts/Venzke.PDF> Acesso em: 25 maio, 2003. ZOCCHIO, Álvaro. Prática da Prevenção de Acidentes – ABC da Segurança do Trabalho. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2002.