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C A R L S C H M I T T

O G U A R D I Ã O D A C O N S T I T U I Ç Ã O

Coordenador

  e

  Supervisor

L U IZ MO R E IR A

Tradutor

G E R A L D O

  D E

  C A R V A L H O

Belo Horizonte

  -

  2 0 0 7

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C o p y r i g h t

  ©

  2 0 0 7

  b y

  E d i to ra

  D e l R e y

  Ltdo.

C o p y r i g h t  ©  p o r o  o  q u a r t a e d i ç ã o a l e m ã  d e D e r  H ü f e r  de r  V er fassu n g : D u n k le r

&

  H u m b l o t ,

  1 9 9 6 .

N en h u ma p a r t e d es t e l i v ro p o d erá

  s e r

  r ep ro d u z id o , se j am q u o i s fo rem

  o s

m e i o s e m p r e g a d o s ,

  s e m a

  p e r m i s s ã o ,

  p o r

  escr i to ,

  d o

  Editora.

I m p r e s s o

  n o

  Brasil

  |  Prinled

  in

  Brazil

E s ta o b ra

  {o i

  p u b l i c a d a o r i g i n a l m e n t e

  e m

  a l e m ã o

  c o m o

  t í tu lo

  O e r

  Hüter

de r  Verfossung

p o r

  D u n k l e r

  &

  H u m b lo t G m b H , B er lim .

C o l e ç ã o

  D e l R e y

  In t e rn ac io n a l

C o o r d e n a d o r

  e

  Sup erv iso r: Luiz Mor ei ra

E D I T O R A  D E L R E Y  LTDA.

w w w . d e l r e y o n l i n e . c o m . b r

Editor;  A m o l d o O l i v e i ra  Cons elho Editor ial

l e i . : ( 3 1 )  3 2 8 4 - 9 7 7 0

e d  í t o r (cpd e I r e y o n N n e . c o m . b r

Editora assistente W a n e s k a D i n i z

Editora  OH

R u o

  A i m o r é s ,

  6 1 2 -

  F u n c i o n á r i o s

B e l o H o r i z o n t e  - M G - C Ê P  3 0 1 4 0 - 0 7 0

T e l e f o *  ( 3 1 )  3 2 7 3 - 1 6 8 4

e d i t o r o ( â> de l r e y o n l i n e . c o m .  b r

Editores  SP

R u o

  M u m a i t á ,

  5 6 9 -

  Be l o Vis ta

T e l e f o x :  ( 1 1 ) 3 ) 0 1  - 9 7 7 5

S ã o  P a u l o  - S P - C E P 0 1 3 2 1 - 0 1 0

e d i f o r a s p @ d e f r e y o n l i n e . c o m . b r

A n t ô n i o A u g u s t o C o n ç o d o T r i n d a d e

A n t o n i o A u g u s t o J u n h o A n a s l o s i a

A r i o s v a l d o

  d a

  C o m p o s P i r e s  (In

  memoriam)

A r o l d o P li n io G o n ç a l v e s

C a r l o s A l b e r t o P e n n a

  R . d e

  C a r v a l h o

C e l s o  d e  M o g o l h ô e s P i n t o

E d e l b e r t o A u Q u s t o G o m e s L i m a

E d é s i o F e m o n d e s

E u g ê n i o P o c e H i  d e  O l i v e i r a

F e r n o n d o G o n z a g o J o y m e

H e r m e s V i l c h e z G u e r r e r o

J o s é A d é r c i o L e i t e

  S a m

  p o i o

J o s é E d g o r d P e n n a A m o r i m P e r e i r a

M i s a b e l A b r e u M a c h a d o D e rz i

P l í n i o S a l g a d o

R é n o n K f u ri L o p e s

R o d r i g o  d a  C u n h a P e r e i r a

S é r g i o l e f li s S a n t i a g o

W i l l e D u o r t e C o s t a

Schmitt. Carl.

S 3 5 5

  O

  guard ião

  d a

  Const i tu ição

  /

  Carl Schmitt; tradução

d e

 Geraldo

  d e

  Carvalho; coordenação

  e

 s upervisão

Luiz Moreira.

 -

  Belo Horizonte:

  Det Rey,

 2007.

2 5 2 p .

 (Coleção

  D e l R e y

  Internacional)

Tituloorigmal;  O e r  Huter  d e r  Verfassung.

ISBN 85-7308-886-9

1.

  Direito constitucional.

  I.

 Título.

C D D . 3 4 1 . 2

. C D U : 3 4 2

Bib l io tecár ia responsável : Mar ia

  d a

  C o n c e i ç ã o A r a ú i o

C R B 6 / 1 2 3 ó

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S U M A R I O

A P R E S E N T A Ç Ã O

Gilmar Ferreira Mendes

  ix

P R E F Á C I O  xvii 

I N T R O D U Ç Ã O  1 

P r i m e i r a p a r t e

A   J U S T I Ç A C O M O G U A R D I Ã

D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

1 . O

  CHAM ADO DIREITO

  D E

  EXAME JUDICIAL MATERIAL

GERAL (ACESSÓRIO)  N Ã O S E  CONSTITUI  N A  ALEMANHA

E M U M

  GUARDIÃO

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

  1 9

2 .

  LIMITES OBJETIVOS

  D E

  TODA JUSTIÇA (JURISDIÇÃO

PENAL  N O  CASO  D E  DELITOS POLÍTICOS CONTRA  O

ESTADO

  E A

  CONSTITUIÇÃO, ACUSAÇÃO MINISTERIAL)

  . . . . 3 3

3 .  ESTIPULAÇÃO NORMATIVA  D O  CONTEÚDO  D E U M A

NORMA CONSTITUCIONAL DUVIDOSA

  E M S O U

  CONTEÚDO

É , N O  CASO, NORMA CONSTITUCIONAL  E N Ã O  JUSTIÇA  5 5

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6 . 2 O

 p rob lema

 d a

 neutral idade

 d a

 polí tica interna

n o

 Es ta do partidá rio pluralista

  146

6 . 3

 Insuficiência

 d a

 maioria

 d a s

 neutralizações;

ambigüidade  d o s conceitos d e neutral idade e

despolitização  157

6 . 4 U m   panorama  d o s diversos significados e

funções

 d o

 conceito

  d e

 neutral idade

  d e

política interna

 d o

 Estado

  161

6 . 5

 Procedimento

 d o

 gov er no constitucional

segundo o artigo  4 8 d a Consti tuição  d o Rei ch.

Desenvolvimento d o  estado d e ex ce çã o militar-

policial ru mo a o econômico-financeiro  167

T e r c e i r a p a r t e

P R E S I D E N T E

  D O

  R E I C H C O M O

G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

7 . A  TEORIA  D O  DIREITO PÚBLICO  D O  "PODER NEUTRO"

(POUVOIR NEUTRE)

  1 9 3

8 .  SIGNIFICADO ESPECIAL  D O  "PODER NEUTRO"  N O

ESTADO PARTIDÁRIO PLURALISTA, EXPOSTO  PO R  MEIO

D O  EXEMPLO  D O  CONCILIADOR PÚBLICO  D E

CONTENDAS TRABALHISTAS

  2 0 7

9 . O  FUNCIONAL ISMO PÚBLICO  E A S  DIVERSAS

POSSIBILIDADES

  D E U M A

  " INDEPENDÊNCIA"

  D O

ESTADO PARTIDÁRIO PLURALISTA  2 1 9

1 0 . O

  EMBASAMENTO DEMOCRÁTICO

  D A

  POSIÇÃO

  D O

PRESIDENTE  D O  R E I C H  2 2 9

vii

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A P R E S E N T A Ç Ã O

Gilmar Ferreira Mendes

Tenho

  a

 honra

  d e

  apresentar mais

  u m a

  importante obra

  da

Coleção  D e l R e y  Internacional, desta feita  O  Guardião  da

Constituição  (Der  Hiiter  der  Verfassung),  d a

  autoria

  do em i -

nente pensadoí alemão,

  o

  Professor Carl Schmitt.

Refer ido trabalho f o i publicado, inicialmente, em 1929, sob

o

  título

  Das

  Reichgerichts

  ais

  Hüter

  de

  Verfassung.

  Em 1931,

Carl Schmitt publicou versão ampliada daquelas reflexões, d e-

nominada  Der  Hiiter  der  Verfassung.

N a

  referida obra, Schmitt questionava

  o

  papel

  d o

 Judiciá-

rio como guardião d a Constituição. Schmitt negava  a o Judiciá-

rio o

  título

  d e

  guardião

  d a

  constituição. Segundo

  sua

  concep-

ç ã o ,  somente  o  Presidente  d o  Reich  teria legitimidade para

desempenhar semelhante função.

Hans Kelsen, ainda

  em 1931 ,

  respondeu diretamente

  a o

artigo  d e Schmitt,  a o publicar  u m ensaio intitulado  Quem deve

ser o  guardião  da  Constituição?  (Wer  soll  der  Hüter  der

Verfassung sein?). N a  ocasião, reafirmou  a  importância  de

Ministro d o  Supremo Tribunal Federal, Professor d e Direito Constitucio-

nal do Instituto Brasiliense d e Direito Públicos d a Universidade d e Brasília.

E m português,  o  texto dessa apresentação ganhou  o nome  d e  A  Jurisdi-

çã o

  Constitucional.

  Publicada pela Editora Martins Fontes,

 em

  feverei-

i x

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u m

 Tribunal Constitucional para

 u m a

 democracia moderna,

 e m

franca defesa

  de uma de

  suas criações,

  a

  Corte Constitucional

austríaca, instituída

  em 1920, já

 destacada

  n a

 célebre conferên-

c ia

  sobre

  a

  jurisdição constitucional  Wesen  und  Entwicklung

der  Staatsgerichtsbarkeit  (Essência  e  Desenvolvimento  d a

Jurisdição Constitucional), proferida

  e m

  Viena,

  em 1928 , pe -

rante  a Associação  d o s  Professores Alemães  d e  Direito Públi-

c o  (Vereinigung

  der

  Deutschen Staats-rechtslehrer).

Assim

  se

 manifestou quanto

  à

 proposta

  d e

 Carl Schmitt

  d e

emprestar

  a o

  Presidente

  d o  Reich  a

  legitimidade para "guar-

d a r a

 constituição,

  e m

  detrimento

  d a

 Corte Constitucional:

( . . . )  para tomar possível  a  noção  d e q u e  justamente  o g o -

verno  — e  apenas  e l e —  seria  o  natural guardião  d a  Consti-

tuição,  é  preciso encobrir  o  caráter  d e s u a  função. Para

tanto serve  a  conhecida doutrina:  o  monarca  é — exclusiva-

mente  o u n ã o — u m a  terceira instância, objetiva, situada

acima  d o  antagonismo (instaurado conscientemente pela

Constituição)  d o s  dois pólos  d e  poder,  e  detentor  d e u m

poder neutro. Apenas  s o b  esse pressuposto parece justi-

ficar-se  a  tese  d e q u e  caberia  a e le , e  apenas  a e le ,  cuidar

q u e o

  exercício

  d o

  poder

  n ã o

  ultrapasse

  o s

  limites estabe-

lecidos

  n a

  Constituição. Trata-se

  d e u m a

  ficção

  d e

  notável

audácia,  s e  pensarmos  q u e n o  arsenal  d o  consti tuciona-

lismo desfila também outra doutrina segundo

  a

  qual

  o m o -

narca seria

  d e

  fa to

  o

  único, porque supremo, órgão

  d o

exercício

  d o

  poder estatal, sendo também, particularmen-

te ,  detentor  d o  poder legislativo:  d o  monarca,  n ã o d o p a r -

lamentes, proviri a  a  ordem para  a lei , a  representação popu-

l a r  apenas participaria  d a  def in ição  d o  conteúdo  da l e i .

Como poderia  o  monarca, detentor  d e  grande parcela  o u

mesmo  d e  todo  o  poder  d o  Estado,  s e r  instância neutra  e m

relação  a o  exercício  de t a l  poder,  e a  única  c o m  vocação

para  o  controle  d e s u a  constitucionalidade?

2

E  prosseguiu  em sua crítica:

ro de  2003,  a  edição combina oito títulos  da  autoria  d e  Hans Kelsen,

dispostos  e m  ordem cronológica.

KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional.  S ã o  Paulo: Martins Fontes

2003,

  p .

  241-242.

x

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( . . . )  quando  n a  Consti tuição  d e  Weimar  se  prevê,  a o  lado

d e

  outras garantias,

  o

  presidente

  d o

  Reich como garante

d a  Constituição, manifesta-se  a  verdade elementar  de que

essa garantia

  s ó

  pode representar

  u m a

  parte

  d a s

  institui-

ções  d e  proteção  d a  Constituição  e que  seria  u m a  sumária

super f ic ia l idade esquecer ,  e m  f u n ç ã o  d o  pres idente  d o

Reich atuando como garante  d a  Const i tuição,  o s  estrei-

tíssimos limites desse tipo  d e  garantia  e a s  muitas outras

espécies

  e

  métodos

  d e

  garantia constitucional

3

Já a  crítica  d e  Schmitt  ao  positivismo alemão tradicional

estava claramente ligada

  a u m a

  rejeição muito mais ampla

  d o

autor

  e m

  relação

  a

  toda

  u m a

  estrutura estatal

  que e le

  fatal-

mente caracterizava como burguesa. Para  u m  pensador  que

tinha convicção  de que  todo  o conceito  d e  direito  é fundamen-

talmente político,  a  pretensa neutralidade  d o  positivismo  d e

Laband  e d a Teoria Pura  d e  Kelsen  n ã o passava  de um  reflexo

disfarçado

 d o s

 ideais liberais

  n a

 fi losofi a política

 e

 jurídica,

 v i-

sando garantir  a  segurança  e  liberdades burguesas perante  o

Estado.

  É

  principalmente

  a

  partir

  de sua

  visão antiliberal

  que

Schmitt construirá

  seu  Der

  Hüter

  der

  Verfassung

  (O

  Guar-

dião

  da

  Constituição).

Segundo Schmitt,  a  criação  o u o  reconhecimento  de um

Tribunal Constitucional,

  p o r

  outro lado, transfere poderes

  d e

legislação para

 o

 Judiciário, politizando-o

 e

 desajustando

 o

 equi-

líbrio  d o  sistema constitucional  d o Estado  d e Direito.

A

  recusa

  d e

  Schmitt

  e m

  aceitar

  u m

  controle concentrado

d e

 constitucionalidade encontra

  s u a

 origem

  n a

 própria concep-

ção que o  autor alemão fazia  d e  Constituição. Para Schmitt,  a

idéia d e Constituição não se equipara  a u m simples conjunto d e

leis constitucionais. AConstituição seria,

 n a

 verdade,

 a

 decisão

consciente  d e u m a  unidade política concreta  q u e  define  a for-

ma e o  modo  de sua existência.

D e

  acordo

 c o m o

 pensador alemão,

 o

 princípio político

 qu e

guiava

  a

  Constituição

  d e

  Weimar

  era o

 princípio

  d a

  democra-

cia. A democracia  d e  Schmitt, contudo,  n ã o s e  assemelha  em

'  KELSEN, Hans. Jurisdição Constitucional,  op. cit.,  p .  287-288.

x i

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nada

  à

  democracia kelseniana,

  que v ia na

  maioria

  u m

  instru-

mento útil para

  a

  realização

  d a

  idéia básica

  da

  democracia:

  a

liberdade. Para Schmitt,  só há uma  idéia verdadeiramente  d e -

mocrática:  a  igualdade,  que é  fundamento  d e  todas  as  outras

igualdades.

N o q u e  concerne  à  jurisdição constitucional, tanto Schmitt

como Kelsen atingiam conclusões b e m distantes d e seus pontos

d e  partida. Enquanto Kelsen,  que se  reconhecia como herdeiro

d a

  tradição labandiana, projetara

  e

  desenvolvera

  u m

  sistema

concentrado

  d e

  controle

  d e

  constitucionalidade

  q u e

  contrariava

frontalmente os princípios  d o positivismo legal  d o  século  X I X ,

Schmitt,  q u e  sempre construía suas obras  e m  contraposição  a

u m a imagem d a teoria positivista liberal, acabara p o r chegar justa-

mente

  ao

  posicionamento defendido

  p o r

  Laband cinqüenta

anos antes:

  a

 revisão

  d o s

 atos legislativos

  por um

  tribunal inde-

pendente

  é u m a

  afronta clara

  à

  soberania estatal.

Miguel Herrera

  b e m

  ilustrou essa dicotomia:

Ref i r i éndose  a l o s  t raba jos  d e  Kelsen  d e  esse período,

Schmitt impugna

  la

  tesis normativista

  de la

  identidad

  e n -

t r e

  orden jur íd ico

  y

  Es tado , sena lando

  q u e e l

  método

kelseniano desarrolla

  la

  vieja negación liberal

  d e i

  Estado

p o r

  médio

  d e i

  derecho. Según

  e l

  jurista alemán, Kelsen

funda  su  teoria  d e i  Estado  e n u n a  crítica  d e i  concepto  d e

' s u s t a n c i a ' ,  q u e e s  p r o p i o  d e l a s  c iênc ias na tura les ,

c o n s t i t u y e n d o  u n a  me ta f í s i ca moni s t a  q u e  e x p u l sa  l a

excepción

  y lo

  arbitrario.

  D e

  acuerdo

  c o n

  Schmitt,

  por e i

contrario,

  la

  situación excepcional pertenece

  a l

  derecho,

siendo definido

  e l

  Estado

  por e l

  monopolio

  de la

  decisión.

En el

  caso excepcional

  ' l a

  existencia

  d e i

  Estado conserva

la  superioridad sobre  la  validez  de la  norma jurídica',  e s  allí

donde  la  decisión  se  libera  d e  toda obligación formativa  y

la

  norma

  ' s e

  reduce

  a

  nada'.*

Vencedor

  d o

  embate judicial realizado

  n o

  caso "Prússia

contra Reich", Carl Schmitt também ganhara, aparentemente,

HERRERA, Miguel. La polémica Schmitt-Kelsen sobre  el guardiándela

Constiísicirín, trabalho publicado

 na

 Revista

  d e

 Estúdios Políticos,

 ri. 86,

1994, p.

  195-227.

X I I

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a

  disputa intelectual sobre quem realmente deveria

  ser o

guardião

  d a

  constituição.

E m

  decisão

  de 25 de

  outubro,

  o

 Tribunal

  d o

  Estado nega-

ra-se

  a

  definir

  o s

  limites

  d a

  atuação

  d o

  Presidente

  e de seu

Chanceler. Ambos ficaram livres, assim, para agirem contra

as poucas instituições democráticas  d e  Weimar  q u e  ainda  d e-

sempenhavam algum papel relevante

  n o

  cenário político

  a le -

mão de 1932 .

A história mostraria, contudo,  q u e a vitória d e  Schmitt não

e ra  definitiva. Três meses após  a  decisão  d o  caso "Prússia

contra Reich", Hitler chegava

  a o

  poder

  se m

  romper

  com ne -

nhum aspecto

  d e

  legalidade existente

  à

  época.

Concretizava-se,  e m  certo sentido,  a  previsão  d e  Schmitt:

o  sistema político d e Weimar permitiria  que seu maior inimigo

assumisse

  o

  poder

  e

  destruísse,

  d e

  dentro

  d o

  sistema, todo

  o

regime constitucional  de 1919.

A  história parecia  d ar  alguma razão  a  Kelsen

N a

  famosa conferência proferida perante

  a

  Associação

d o s

  Professores Alemães

  d e

  Direito Público Kelsen deixou

claro  que a  jurisdição constitucional haveria  de ter um  papel

central  e m u m  sistema democrático moderno:

Contra

  a s

  muitas censuras

  que s e

  fazem

  a o

  sistema demo-

crático

  -

  muitas delas corretas

  e

  adequadas

  n ã o h á m e -

lhor defesa senão  a d a  instituição  d e  garantias  q u e  asse-

gurem  a  plena legitimidade  d o  exercício  d a s  funções  d o

Estado.

  N a

  medida

  e m q u e

  amplia

  o

  processo

  d e

  democra-

tização, deve-se desenvolver também

  o

  sistema

  d e

  contro-

le. É  dessa perspectiva  que s e  deve avaliar aqui  a  jurisdi-

ç ã o  constitucional.  S e a  jurisdição constitucional assegura

u m  processo escorreito  d e  elaboração legislativa, inclusi-

ve no que s e

  refere

  a o

  conteúdo

  da le i ,

  então

  e l a

  desempe-

n h a u m a

  importante função

  n a

  proteção

  d a

  minoria contra

o s  avanços  d a  maioria, cuja predominância somente  há de

se r

  aceita

  e

  tolerada

  se

  exercida dentro

  d o

  quadro

  d e

  lega-

lidade.

  A

  exigência

  d e u m

  quorum  qualifi cado para

  a m u -

dança  d a  Constituição traduz  a  idéia  d e q u e  determinadas

questões fundamentais devem  s e r  decididas  c o m a  partici-

pação

  d a

  minoria.

  A

  maioria simples

  n ã o t e m o

  direito

  d e

XII I

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impor

  a sua

  vontade

  —

  pelo menos

  e m

  algumas questões

  —

à  minoria . Nesse ponto, apenas mediante  a  aprovação  d e

u m a l e i

  inconsti tucional poderia

  a

  maioria afe tar

  o s

  inte-

resses  d a  minoria constitucionalmente protegidos.  P o r  isso,

a

  minoria, qualquer

  q u e

  se ja

  a s u a

  natureza

  - d e

  classe,

  d e

nacionalidade  o u d e  religião  — t e m u m  interesse eminente

n a  cons t i tuc iona l idade  d a l e i .

Isso  s e  aplica , sobretudo,  e m  caso  d e  m u d a n ç a  d a s  rela-

ções entre maioria  e  minoria ,  s e u m a  eventual maioria  p a s -

sa a se r  minoria,  m a s  ainda suficientemente forte para  o b s -

t a r u m a  decisão qualificada relativa  à  reforma constitucional.

S e s e

  considera

  q u e a

  essência

  d a

  democracia res ide

  n ã o

n o  império absoluto  d a  minoria,  m a s  exatamente  n o  perma-

nente compromisso en t re maior ia

  e

  m i n o r i a

  d o s

  grupos

populares representados  n o  Parlamento, então representa

a

  jurisdição consti tucional

  u m

  instrumento adequado para

a  concre t ização dessa idé ia .  A  s imples poss ib i l idade  d e

impugnação peran te  a  Corte Consti tucional parece confi-

gurar ins trumento adequado para preservar

  o s

  interesses

d a  minoria contra lesões, evitando  a  conf iguração  d e u m a

ditadura

  d a

  maioria,

  q u e ,

  tanto quanto

  a

  ditadura

  d a

  mino-

r i a , s e  revela perigosa para  a p a z  social.

5

Tal

  como anota Pedro

  d e

 Veja Garcia,

  a

  tese

  d e

  Kelsen

  se

impôs  à maioria  d o s estados democráticos  a partir d a  Segunda

Guerra Mundial:

Bien  e s  verdad  q u e , a  partir  de la  Segunda Guerra Mundial,

Ias  tesis  d e  Kelsen  se  imponen  en la  praxis constitucional  d e

la

  mayoría

  d e l o s

  estados democráticos

  c o n

  resultados posi-

tivos  y  encomiables.  A h í  está  el  ejemplo  de la  Corte Constitu-

cional italiana,

 d e i

 Tribunal Constitucional alemán

  o de i

  todavia

reciente Tribunal Constitucional espanol.  S i n  embargo,  n o e s

menos cierto  q u e I a s  cuestiones sobre  Ia  legit imidad,  f u n -

cionalidad  y  coherencia  de l a  Justicia Constitucional distan

muc ho  d e  haber sido definitivamente dilucidadas."

5

  KELS EN, Hans.  Wesen

  und

  Entwicklung

  der

  Staatsgerichtsbarkeit,

VVDStRL  5, 1928, p. 80-81; C f . tamb ém tradução italiana d e GERA CI,

Carmelo.  L a  Garanzia giurisdizionale delia Constituzione",  in: La

giustizia costituzionale,  Milão,  1980, p. 144  (201-203).

Veja GA RC ÍA , Pablo. "Prólogo à obra d e Schmitt".  In : SCHMITT, Carl.

IM

  defensa

  de la

  Consiitución.

  2. ed .  Madrid: Tecnos,  1 9 9 8 , p ,  22-23.

x i v

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A  controvérsia sobre  a  jurisdição constitucional, ápice  de

u m a

  disputa entre dois

  d o s

 mais notáveis juristas europeus

  do

início

  d o

  século

  X X ,

  mostra-se relevante ainda hoje.

 O

 debate

sobre  o  papel  a ser  desempenhado pelas Cortes Constitucio-

nais, atores importantes  e, às  vezes, decisivos  d a  vida insti-

tucional d e inúmeros países  n a atual idade, obriga o s estudiosos

a

  contemplarem

  a s

  considerações

  d e

  Schmitt

  (e ,

  inequivoca-

mente,

  as

  reflexões

  d e

  Kelsen)

  a

  propósito

  d o

  tema.

Como  se  sabe, tais controvérsias manifestam-se  sob fo r -

m as diversas, referindo-se ao s limites d a jurisdição constitucional,

à

 jurisdição constitucional

  e

  democracia,

  à

 jurisdição constitu-

cional

  e

 política,

  à

 jurisdição constitucional

  e

 divisão

 d e

 pode-

re s ,  para ficarmos  e m  alguns exemplos  que têm  ocupado  a

moderna teoria constitucional.

A

  atualidade dessa discussão vê-se,

  v.g., na

  multicitada

obra

  d e

  Habermas,  Faticidade

  e

  Validade (Faktizitat

  und

Geltung),  q u e dedica u m capítulo  a o estudo sobre  a legitimida-

de da

  jurisprudência constitucional, tendo

  p o r

  leitmotiv

  as re-

flexões

  d e

  Schmitt

  e m o

  Defensor

  da

  Constituição.

Parecem evidentes, assim,

  a

  importância

  e

  atualidade

  da

obra  que a  Editora  De l Rey  coloca  a o  alcance  d o s  estudiosos

d e Direito Público  n o Brasil.

X V

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P R E F A C I O

O

  artigo

  O

  guardião

  d a

 Constituição" publicado

  em m ar -

ço de 1929

  (Archiv

  des

  òffentlichen Rechts,  Neue Folge,

  X V Í ,

p .

  161-237) encontra-se processado

  e

  continuado

  n o

  presente

tratado. Ademais, foram inseridas

  no

  contexto sistemático

  d o

tema algumas formulações  d e  artigos  e  palestras  d o s  anos  d e

1929 e 1930.

O  tratamento científico  de tal  objeto  não se faz  possível

s e m u m a apresentação d a concreta situação constitucional. M a s

nisso reside  u m a  tarefa muito difícil  e  cheia  d e  perigos,  não

devido  às  falsas interpretações político-partidárias pelas quais

se

  espera,

  m a s

  isso

  f a z

  parte

  d o

  risco geral

  da

  liberdade

  d e

espírito, muito mais devido

  à

 extraordinária complicação

  das

condições constitucionais atuais

  d a

 Alemanha,

  as

  quais

  se en-

contram

  e m

  meio

  a u m a

  grande transformação. Quem hoje

quiser falar

  e m

  poucas páginas

  e d a r u m a

  idéia geral

  d e

  Statu

Imperii Germanici,

  n ã o pode perder  d e vista u m a  mistura c o n -

traditória

  d e

  sistemas, fragmentos

  d e

  sistemas

  e

  tendências.

N a

 maioria

 d o s

 Estados

  d o

 planeta, talvez

  a

 Constituição tenha

se

  tomado hoje

  u m

 novo problema

 e, a té

 mesmo,

  na

 França.

  J.

Barthélemy pôde recentemente (durante

  u m a

  palestra perante

a

  Union

  des

  Intérêts Economiques)  partir

  d o

  princípio

  de que

a

 exigência

  p o r u m a

  reforma

 d o

 Estado seria

 o

  tema mais atual

d o tempo presente. Assim,  c o m u m a  mera "reforma do Reich"

como mudança  d o  sistema federativo presente,  a  questão  n a

XVII

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Alemanha ainda  n ã o  estaria resolvida.  O q u e  mais dificulta  o

reconhecimento

  d e

  nossa situação constitucional concreta

  é a

concomitante ligação

  e

  interseção

  d e

  organização federalista

c o m

  outros princípios

  d e

  volição estatal. Tentei caracterizá-la

como "Estado partidário pluralista"  e  "policracia"  e  também

tratar  o  problema,  d a í  resultante,  d a  "neutralidade  da  política

interna

  d o

  Estado",

  d e

  modo algum

  p o r

  prazer

  c o m u m a

  tese

"brilhante"  ou  "estimulante",  e, s im, sob a  força coercitiva  d e

u m a  necessidade criada  c o m o  próprio tema.

Res

  dura

  et

  regni novitas

  me

  talia cogunt Moliri

Berlim, março  de 1931

Carl Schmitt

x v i i i

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O ^ G m R D I Ã O ^ Ç O N S T I T U I ^ O

idéias, passando  p o r  constituições  d a  Pensilvânia  até as  cons-

tituições

  d a

  revolução francesa. Aqui aparece

  n a

  Constitui-

ç ã o d o a n o

  VIII (1799)

  u m

  Senado como guardião

  (

c o n -

servateur)  d a  Constituição. Essa instituição também precedeu,

diretamente, u m  movimento contrário,  à época d e Napoleão  I.

Destarte,  é  duplamente interessante  o  fato  de que o

  Sénat

Conservciteur  tenha des emp enh ado apenas após

  a

  derrota

militar

 d e

  Napoleão

  o

 papel

  de um

 defensor

 d a

 Constituição

 e ,

pelo decreto de 3 de abril de 1814, abjudicado o trono a Napoleão

e sua  família  p o r  violação  d a  Constituição  e dos  direitos  p o -

pulares.

3

O s  embates constitucionais alemães  d o  século  X I X n ã o

podem  se r  comparados  c o m  grandes revoluções. Porém,  as

constituições

  d a

  monarquia constitucional alemã também

  n ã o

desconsideram

  d e

 modo algum

  a

  salvaguarda

  da

 Constituição.

Especialmente características para tanto  são as determinações

d a Constituição  d a  Baviera (1818)  e d a  Saxônia (1831).  Sob o

título  D a  garantia  da  Constituição", elas tratam:  1. do  jura-

mento

  do re i , dos

  servidores públicos

  e dos

  cidadãos sobre

  a

Constituição;

4

 2. do

 direito

 d o s

 estamentos

  e m

  apresentar quei-

xas  p o r  violação  à  Constituição;  3. do  direito  d o s  estamentos

em  instaurar  u m  processo  p o r  violação  à Constituição;  4. das

"guardar  o q u e  quer  q u e s e  tenha decidido  n a  Cons t i tu ição  e

prevenir

  a

 restauração

  d a

  monarquia"

  [ n o

  original

  e m

  inglês. N.T.].

2

  Sobre  o s  deta lhes  d a  t r a je tó r ia  q u e  co n d u z  d e  H a r r in g to n  a

constituições norte-americanas  e de lá a  Sieyès,  c f .  SMITH,  F .

Russel.  Id . p . 20 8 . Como outra prova, gostaria d e  chamai  a  atenção,

n o

  tocante

  à s

  exposições

  d e

  Russel Smith, para

  a s

  propostas

  d e

Thibaudeau c i tadas  p o r  BL O N D E L , A n d r é .

  Le

  contrôle juri-

dictionnel

  de la

  constitutionnalité

  des

  lois.

  Paris  1928 , p . 177 .

Thibaudeau lembra  a s  experiências  q u e  teriam sido feitas pelos

censo res

  d a

  Pensilvânia.

3

  D e c r e t o

  d o

  Senado

  de 3 de

  abril

  d e 1 8 1 4 ;

  j u n t an d o - s e

  a e l e

( " C o n s i d e r a n d o  q u e  N ap o leão Bo n ap a r t e v io lo u  o  pacto

consti tucional"  [no  original  e m  francês. N.T.])  a  deliberação  d o

corpo legislativo  d o  mesmo  d i a , e m  Duguit-Monnier  p. 177 .

4

  Sobre

  o

  juramento constitucional,  vide  mais detalhes

  n o

  excelente

(ratado  d e  FRIESENHAHN, Ernst .  Derpolilische  Eid,  Bonn  1 9 2 8

p .  35/36, 112/113.

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I N TR O D U Ç Ã O

1

condições

  d e u m a

 emenda constitucional. Além disso,

  a

 Cons-

tituição  d a Saxônia  de 1831  trata ainda,  s o b  esse título,  do po-

d e r d o

  tribunal

  d o

  Estado

  e m

  decidir dúvidas sobre

  a

  interpre-

tação d a Constituição, desde q u e n ã o haja acordo entre governo

e

  estamentos.

5

 Todavia, após

  as

 experiências vividas

  na

  época

d e

  conflito

  na

  Prússia

  e

  após

  os

  grandes sucessos

  d a

  política

d e  Bismarck,  fo i  tacitamente desconsiderada, como  era de se

supor,

  a

  questão

  d e u m a

  garantia

  da

  Constituição

  e na

 geração

seguinte, quando

  da

  indiferença geral

  p o r u m a

  teoria constitu-

cional,  não se  tinha mais  u m a  verdadeira consciência dela.

Georg Jellinek alude

  a o

 problema

  n o

 capítulo final

  de sua  Teo-

ria  geral  do  Estado  ( I

a

  edição

  em 1900) sob o

  título

  As ga -

rantias  d o  Direito público".  O q u e e l e  enumera como tais

garantias (juramento político, responsabilidade parlamentar

  e

acusação ministerial) corresponde

  às

  condições políticas

  e ao

esquema  d o  século  X I X  alemão. Otto Mayer  d iz , em seu

Sachsischen Staatsrecht (1909),

  a

  respeito

  d a s

  determinações

sobre

  a

 proteção

  d a

  Constituição violada

  o u m a l

  compreendi-

d a :  "Todas elas estão determinadas  a ,  porventura,  n ã o  serem

empregadas

  e, de

  fato,

  n ã o

  tiveram

  a té

  agora oportunidade

para tanto".

Provavelmente naquele tempo,

  e m

  meio

  a o

  sentimento

  d e

segurança política  e bem-estar  da  proteção,  já se  teria qualifi-

cado

 d e

 "política"

 a

 mera pergunta pelo guardião

 d a

 Constitui-

5

  C f .  p a r a  a  B a v i e r a : S T O E R K .  Handbuch  der  deutschen

Verfassungen,  2.  Aufl .  1 9 1 3 , p . 1 0 5 ,  além disso SEYDEL,  M. v .

Bayerisches Staatsrecht,

  1.

  Auf l .

  1 8 9 6 , I , p . 3 8 6 , 5 1 7 , e t c .

(característica

  é a

  repart ição

  d a s

  garantias

  e m

  particular sobre

vários pontos

  d o

  sistema, enquanto

  a

  "garantia

  d a

  Constituição"

como

  t a l n ão t em

  mais

  u m

  lugar sistemático

  e n e m

  mesmo aparece

como vocábulo

  n o

 excelente

  e

 minucioso

  4

volume

  (d e

  registros));

para

  a

  Saxônia: STOERK.

  p . 3 4 3 ; J . H .

  B E S C H O R N E R .  Die

Ministerverantwortlichkeit  und der  Staatsgerichtshof  im

Kònigreich Sachsen,  B e r l i n  1 8 7 7 ;  O P I T Z .  Staatsrecht  des

Kõnigreichs Sachsen  (1884) ,  I I , p . 2 4 6 ;  MAYER, Ot to .  Das

Staatsrecht  des  Kõnigreichs Sachsen  (1909)

  p .

  214/215. Outros

exemplos

  e m R .

  MOHL.

  Die

  Verantwortlichkeit

  der

  Minister

  in

Einherrschaften  mit  Volksvertretung, Tiibingen

  1 8 3 7 . p .

  14/15.

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I N T R O D U Ç Ã O

5

A s

  propostas

  de lei e

  projetos,

  a té

  agora, partiam quase

todos

 d o

 princípio

 de que um

 tribunal

 d o

 Estado deveria decidir,

e m u m   processo judicial, tanto litígios constitucionais quanto

dúvidas e divergências d e opinião acerca d a constitucional idade

d e  leis  d o  Reich. Entretanto,  as  várias propostas resultam  e m

u m a

 justaposição

  e

 confusã o assistemáticas

  d as

  supremas

  ins-

tâncias decisórias, tribunal

 d o

 Estado

 o u

 constitucional, tribunal

d o Reich (segundo o  artigo  13, § 2

o

, d a Constituição d o Reich),

tribunal sentenciai  d o  Reich ('Tribunal  d o  Reich para  a  inter-

pretação vinculativa

  da le i no

  sentido

  d o s

  esforços

 d e

 Zeiler)'

e

  juízo administrativo

  d o

  Reich devem

  s e

 juntar,

  so b

  relações

coordenadas pouco claras,  ao s  numerosos supremos tribunais

existentes  d o  Reich  e dos  estados,  d e  maneira  q u e R .  Grau

falou

 c o m

 razão

  d e u m a

  "maioria

  d e

  guardiões constitucionais

e m

  concorrência

  u n s c o m o s

  outros

  e

  talvez para contradição

u n s c o m o s  outros".

10

  N o  todo,  a  forma hoje comum  d e  trata-

mento dessa difícil questão constitucional continua sendo

  fo r -

temente influenciada pela tendência

  d o s

  "juristas

  d a

  justiça"

para transferir

 a

  solução

  d e

  todos

  os

  problemas simplesmente

para  u m  processo judicial e  desconsiderar  p o r completo  a dife-

rença fundamental entre  u m a  decisão processual  e a  decisão

d e

  dúvidas

  e

 divergências

  d e

 opinião sobre

  o

 conteúdo

  de um a

determinação constitucional. Sentia-se, sobretudo,  a  necessi-

dade  d e u m a  proteção perante  o  legislador,  ou  seja,  o  parla-

mento

  e ,

  conseqüentemente, limitava-se

  o

  problema

  d a

  prote-

ç ã o

  constitucional arbitrariamente

  ao

  problema

  d a

  proteção

contra leis e decretos anticonstitucionais  e se desnaturava  t a m -

b é m este problema novamente p o r procurar o guardião da Cons-

d a  propriedade  e  desapropriaçao,  1930 , p . 319 , 320 , e no  Manual

do  direito público alemão,  artigo

  72 (a le i

  ordinária

  d o

  Reich),

I I , p .  177-178.

0

  SCHIFFER,

  E .

  Die  deutsche Ju.stiz,  Berlin

  1928 , p .

 25 7/25 8; contra,

W .  S I M O N S  n a  int rodução  a o  vo lume  II da  coleção publicada

p o r e l e ,

  a s s i m c o m o L A M M E R S .

  D i e

  R e c h t s p r e e h u n g

  d e s

Staatsgerichtshofcs  f ü r d a s  Deutsche Reich", Berlin  1930, p. 8,

e  GR ÜNHUT,  e m  ludicium,  193 0 , p . 143 .

10

  Archiv  des  õffentlichen Rechts,

  N . F . B d . XI  (1926),  p .  287/288.

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6

O

  GUARDIÃO

  D A

  CONSTITUIÇÃO

tituição  n o  território d a justiça,  sem se  "preocupar muito"  c o m

o

 próprio assunto, como Rudolf Smend disse

 d e

 passagem,

  m a s

acertadamente,

  e m u m a

  crítica." Apenas

  L .

  Wittmayer repre-

senta  u m a  exceção entre  o s  autores  d o s  primeiros anos  d o

pós-guerra,

  a o

  qualificar

  o

  conselho

  d o

  Reich, devido

  a seu

direito

  d e

  oposição, como guardião

  da

  Constituição

  e,

  desse

modo,

  f a z

 valer novamente

  o

 nexo, muitas vezes caído

  em es -

quecimento, entre proteção constitucional  e  dificultação  d a

emenda constitucional.

12

  Hm

 contrapartida,

 o s

 planos

  e

 propos-

ta s  existentes querem,  n a  maioria  d a s  vezes, transferir  a um

tribunal (tribunal sentenciai d o Reich, tribunal d o Estado d o Reich

alemão)

  a

 decisão

  d e

  dúvidas

  e

 divergências

  d e

  opinião sobre

a  constitucionalidade  d e  prescrições legais (leis  e  decretos).

E m

  especial

  as

  propostas

  da 33

a

  e da 34

a

  assembléia alemã

  d e

juristas ( em 1924 em Heidelberg e e m  1926emColônia)procu-

ram

 solucionar

  o

 problema

  a o

 proporem ampliar

 a

 competência

d o  tribunal  d o  Estado para  o  Reich alemão, pelo artigo  19 da

Constituição d o Reich,  d e litígios constitucionais dentro de um

estado para aqueles também dentro

  d o

 Reich.

11

 Provavelmen-

11

  Verfassung

  und

  Verfassungsrechr,

  Míinchen  u n d  Leipzig  1 9 2 8 ,

p . 143.

12

  Die  Weimarer Verfassung,  Tíibingen  1922, p . 329.

1 3

  Provavel mente, Alfred Friedmann (Friters)  fo i o  primeiro após  a

r evo lução

  a

  re iv indicar

  q u e

  se ja confer ida

  a

  poss ib i l idade

  a o

t r i b u n a l s u p e r io r

  d e

  " i n v a l i d a r

  u m a l e i q u e

  c o n t r a d i g a

  a

Constituição,  q u e  queira eliminar direitos,  o s  quais  a  Constituição

fundamen tou" ( R evo lu t ions gewah

  und

  Notstandsrecht,  Berlin

1919 , p . 182) , Da s

  deliberações

 d a

 Assembléia Nacional

  d e

 Weimar

interessa-nos

  o

  requerimento  Indulto

  ( n . 2 7 3 ,

  protocolo

  p . 483) ,

segundo  o  qual  o  Tribunal  d o  Estado para  o  Reich alemão decide

vinculativamente  a  pedido  d e 1 0 0  membros  d o  parlamento sobre

a

  constitucionalidade

  d a s

  leis,

  m a s o

  requerimento (igualmente

u m

  requerimento subsidiár io)

  f o i

  r ecusado .

  A 3 3

assembléia

alemã  d e  juristas  ( e m 1 9 2 4 e m  Heidelberg; relatores  H .  Triepel  e

conde  zu  Dohna) exigiu  q u e  deva  s e r  prevista  a  possibil idade

d e ,  antes  d a  promulgação  d e u m a l e i ,  produzir  u m a  decisão  d o

tribunal

  d o

  Estado sobre

  a

  compatibil idade

  da l e i com a

  Cons-

ti tuição

  e ,

  ademais, exigiu

  u m a

  ampl iação

  d a

  competênc ia

  d o

tribunal  d o  Eslado para  o  Reich alemão  ( q u e ,  pelo artigo  19, só  é

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I N T R O D U Ç Ã O

1

competente para li t ígios constitucionais dentro  d e u m  Estado)

também para incluir litígios constitucionais dentro

  d o

  Reich.

  A

34'

  assembléia alemã

  d e

  juristas

  ( e m 1 9 2 6 e m

  Colônia; relatores

AnschUtz  e  Mende) recomendou, igualmente,  « m a  mudança  n o

artigo

  19 da

  Constituição

  d o

  Reich;

  o

  tribunal

  d o

  Estado para

  o

Reich alemão deveria também decidir sobre litígios constitucionais

d e n t r o

  d o

  Reich; ademais ,

  o

  t r ibunal

  d o

  Estado dever ia

  ser

exclusivamente competente paia examinar

  a

  validade

  d e

  leis

  d o

Reich devidamente promulgadas; como objetivo legislativo, dever-

se-ia aspirar reunir

  a

  interpretação

  d o

  direito constitucional

  d o

Reich

  n a

  instância suprema junto

  a o

  tribunal

  d o

  Estado para

  o

Reich alemão".  O  ministério  d a s  relações interiores  d o  Reich

publicou

  e m 1 9 2 5

  (Editora Heymann)

  o

  projeto

  d e u m a l e i

  para

a

  conservação

  d a

  unidade

  d o

  Reich" , segundo

  o

  qual ,

  e m u m

processo

  d e

  decisão judicial sobre questões

  d e

  direito público,

especialmente, também,

  d e

  direito constitucional,

  a

  decisão deva

s e r  tomada  p o r u m  tribunal sentenciai  d o  Reich.  U m  projeto  d e

lei  publicado  n o  Jornal Jurídico Alemão  d e 1 9 2 6 , c o l . 8 4 2 ,  pelo

então ministro

  d a s

  relações interiores

  d o

  Reich,

  D r.

  Külz, prevê

q u e , s e  existirem dúvidas  o u  d ivergências  d e  opinião sobre  se

u m

  preceito legal

  d o

  direito

  d o

  Reich contradiz

  a

  Constituição,

  o

parlamento,

  o

  conselho

  o u o

  governo

  d o

  Reich pode apelar para

a  decisão  d o  tribunal  d o  Estado para  o  Reich alemão,  m a s ,  segundo

esse projeto, aparentemente

  n ã o

  deve

  s e r

  exc luído

  o

  direito

  d e

exame judicial geral;

  cf. o

  artigo

  d e

  Külz.

  D J Z . 1 9 2 6 , S p . 8 3 7 ;

POETZSCH.  DJZ.  192 6 , Sp . 1269 ; BÕTTICHER. Leipz.  Z. 1926 , p.

8 2 2 ;

  GRAU, Richard.  Zum  Gesetzentwurf über  die  Prüfung  der

Verfassungsmafíigkeit vort Reichsgesetzen

  und

  Rechtsverordnungen,

A õ R . , N . F . X I , p . 2 8 7 e  seguintes (1926); MARX, Fritz Morstein.

Variationen über richterliche Zustündigkeit  zu r  Prüfung  der

RechímaJSigkeit

  des

  Gesetzes,

  p .

  129-130 (Ber l in 1927) ;

SCHELCHER, Fischers.  Zeitschr.  f  Verwaltungsrecht,  Bd.60  p .

3 0 5 ;

  BREDT.  Zeitschr.  f d. ges.  Staatsw.

  Bd . 82 , 1927 , p . 44 3 ;

NAWIASKY.  A õ R . , N . F . X I I  (1927)  p .  130/131; HOFACKER.

Gerichtssaal,

  B d . 9 4 , p . 2 1 3

  (1927).

  O

  projeto enviado

  e m 2 5 d e

m a r ç o

  d e 1 9 2 7 à

  c o m i s s ã o

  d e

  d i r e i t o

  d o

  p a r l a m e n t o

  e q u e

c o r r e s p o n d e  à  p u b l i c a ç ã o  d o  minis t ro K.ülz ( Impressos  d o

parlamento

  n .

  2855,

  I I I ,

  1924/1926), deixa

  o

  tribunal

  d o

  Estado

  (a

pedido

  d e u m a

  minoria qualificada

  d o

  parlamento

  o u d o

  conselho

d o  Reich,  m a s  também  d o s  tribunais  q u e t ê m q u e l h e  apresentar

o s

  autos quando consideram

  u m

  preceito legal incompatível

  c o m

o  precei to  d o  Reich) decidir  c o m  força  de le i  sobre  a  const i -

tucionalidade;  a respeito,  K . Frhr. v o n  IMHOFF. Bayr. Verwaltungs-

blãtter,

  B d . 7 5

  (1927),

  p .

  241-242. Sobre

  o

  caráter

  d e

  emenda

constitucional

  d e u m a l e i

  desse tipo: HOFACKER

  id. ; R.

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8

O  GUARDIÃO  D A  CONSTITUIÇÃO

te ainda sob a impressão d e resíduos d o período anterior à guerra

e sob a influência da naquela época muito citada "solução  aus -

tríaca"

14

, pouco

  se

 discutiu,

  n a

  fadiga

 d a

  primeira década após

o

 colapso,

 o

 s ignificado objetivo

 d e

 tais ampliações

  da

 justiça

  e

se

 contentou

  c o m

  normativismos

  e

  formalismos abstratos.

Porém,  a grande ampliação  que a competência  d o  tribunal

d o

 Estado para

  o

 Reich alemão parecia tomar

  a

 partir

  de 1925,

e m

  especial

  na

  prática

  d o

  artigo

  19 da

  Constituição

  d o

  Reich,

conduziu logo  a  dúvidas políticas  e  constitucionais,  p o r  meio

d a s  quais  fo i  impedida  a, até  então, expansão naturalmente

exigida  e m  direção  à esfera judicial.  A prática  d o  artigo  19 da

Constituição determinou exclusiv amente pelos precedentes tanto

o

 conceito

 d o

 litígio constitucional ,

 que não se

 resolve

 c o m u m a

"definição" ilimitada d a palavra (litígio constitucional é todo li-

tígio sobre  u m a  determinação  d a Constituição), quanto  o con -

ceito

  d o s

  "litígios constitucionais dentro

  d e u m

  estado", assim

como, também,

  a

  questão decisiva

  da

  capacidade

  d e

  agir

  e m

juiz diante  d o  tribunal  d o  Estado.  Er a de  sobressair  o  fato  d e

q u e partidos políticos, facções parlamentares e grupos isolados

d e  deputados, sociedades religiosas, comunidades  e , a té mes-

m o ,

 cooperativas nobiliárquicas podiam citar

  u m

 estado

  ou um

GRAU.

  Icl.;

 IMHOFF.

  Id . ;

 BREDT.

  Id . p .

 453-454,

  q u e

 cons ideram,

todos, como necessária  u m a l e i d e  emenda  à  Constituição; contra

ta l  f a to ( n a  minha opinião,  s e m  razão) LOWENTHAL.  D J Z . 1 9 2 7 .

p . 1 2 3 4 ,  Reichsverwaltungsblatt  1 9 3 0 p . 7 4 8 .  Além disso, deve-

s e  ainda notar sobre  a  literatura  a  respeito  d o  tribunal  d o  Estado,

q u e o s

  autores

  d e

  teses

  e

  dissertações sobre

  e l e

  (aparentemente

u m   tema preferido para "teses  d e  doutorado") atacam  a  difícil

questão  n a  maioria  d a s  vezes  c o m a  ajuda  d e  algumas fórmulas

e  padrões adquir idos  h á  pouco, isso  é  perdoáve l  e n ã o  causa

censura  a o s  jovens autores.

14

  Artigos

  89 e 139 da

  Constituição federal austríaca

  d e I

o

  d e

  outubro

d e 1 9 2 0 .

 Sobre isto, p.ex.,

  W .

 JELLINEK.

  Ju r

  Woch.

  1 9 2 5 , p . 4 5 4 ,

c o m o

  seguinte pronunciamento, característico para

  o s

  ânimos

d a

  época:

  S e

  considerarmos

  a

  chamativa utilidade

  d o

  regulamento

austríaco (.,.), este  v a i  supostamente também  s e  estender  u m d i a

5  Alemanha". Esta suposição  n ã o s e  realizou,  a  partir  d e 1 9 2 5 ,

aliás, devem  ter se  sobressaído  a o s  olhos ainda outras proprie-

dades  d a  solução austríaca  q u e n ã o a s u a  utilidade.

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I N T R O D U Ç Ã O

2.

governo estadual diante

  d o

  tribunal

  d o

  Estado

  e m

  questões

freqüentemente

 d e

 alta política,

15

 e

 pareciam incalculáveis quais

grandezas  e  grupos sociais (representações profissionais,  as-

sociações

  d e

  interesses, entidades

  d e

  direito público) seriam

um dia  admitidas como partes  no  processo. Todavia , surgiu,

aqui  h á  aproximadamente  u m a n o , u m a  certa contenção,  que

dizia respeito  a u m a  questão  d e  direito eleitoral suscitada  na

Prússia

  de 17 de

  fevereiro

  d e

  1930,

17

  q u e

  será discutida mais

e m   detalhes abaixo, representa  u m  importante indício.

E m

  todo caso, torna-se necessário apreciar

  o

  problema

  n o

contexto concreto

  d e

  nossa situação

  d e

  direito público

  e

 cons-

titucional. Como prova dessa necessidade basta relembrar,

perante as abstrações precipi tadas daquelas primeiras tentativas

d e  solução,  os diversos "guardiões  d a Constituição" q u e  surgi-

15

  A t é 1 9 2 9 ,

  facções parlamentares: decisão

  d o

  tribunal transitório

d o  Estado  de 12 de  ju lho  d e 1 9 2 1 ,  Jurisprudência civil  do  Reich

102,  p . 4 1 5 e d e 2 1 d e  novembro  d e 1 9 2 5 ,  Jurisprudência civil  d o

Reich

  1 1 2 ,

  anexo

  p. 1;

 partidos políticos

  ( c o m

  cuidadosa restrição

a  litígios  d e  direito eleitoral): Jurisprudência civil  d o  Reich  118 ,

anexo  p . 2 2 ,  Jurisprudência civil  d o  Reich  1 2 0 ,  anexo  p . 19 (Gau

Me c k l e n b u r g - L i i b e c k  d o  par t ido operár io nac ionaí -soc ia l i s ta

contra

  o

  Es tado

  d e

  Mecklenburg-Schwer in ) ;

  e m

  contrapartida,

n ã o :  par t ido soc ia l -democra ta independente  n a  Saxônia contra

o  Estado  d a  Saxônia, Jurisprudência civil  d o  Reich  1 2 1 ,  anexo  p .

8 ;

  igrejas  do  Estado:  Jurisp rudênc ia civil

  d o

  Reich

  1 1 8 ,

  anexo

  p .

1;  municípios: decisão  de 12 de jane i ro  d e 1 9 2 2 , D J Z . 1 9 2 2 ,  coluna

4 2 7 , e ,  além disso,  a  decisão  e m  matérias  d o  magistrado  d a  cidade

d e

  Potsdam contra

  o

  Estado

  d a

  Prússia

  d e 9 d e

  ju lho

  de 1928 ,

Jurisprudência civi l  d o  Reich  1 2 1 ,  anexo  p. 13, o  grupo local

Nassau  d a  nobreza direta  d o  Reich  (5  famílias )  d e  então contra

o

  ministério estatal

  d a

  Prússia, decisão

  de 10 de

  maio

  de 1924 ,

Jurisprudência civil  d o  Reich  1 1 1 ,  anexo  p. 1.

16

  C f . a crítica especialmente enfática d a  ampla extensão d a competên-

ci ad o tribunal d o Estado p or W.HOFACKER. Verfassungsstreitigkeiten

innerhalb eines Landes, Reichsverwaltungsblatt

  1 9 3 0 , p .

  33/34.

17

  Jurispru dência civil

  d o

  Reich

  1 2 8 ,

  anexo

  p . 1 ; e (com

  protocolo

d e  audiência) Decisões selecionadas  d o  tribunal  d o  Estado para

o

  Reich alemão, publicadas pelo presidente

  d o

  tribunal

  d o

  Reich

D r .

  Bumke, caderno

  2 ,

  Berlin

  1 9 3 0 ;

  sobre esta sentença,  vide

ainda adiante.

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1 0

O  GUARDIÃO  D A  CONSTITUIÇÃO

r am em

  grande número

  na

  longa história

 d o

 problema constitu-

cional.

  O

  exemplo clássico

  d o s

  éforos espartanos

  é

  ainda

freqüentemente citado  n o  século  XJX, na  maioria  das  vezes

c o m o  inevitável

  quis custodiet ipsos custodes

  e co m a ad-

vertência como aditamento  de que o  guardião  se  torna facil-

mente senhor

  d a

  Constituição

  e que

  ocorre

  o

  perigo

  de um

duplo chefe  d e  Estado,  m a s à s  vezes também  c o m a  queixa

sobre

  as

  conseqüências ruins

  d e u m a

  instância inamovível,

  ir-

responsável

  e que

  decide

  à sua

 discrição.

18

  Outras propostas

  e

18

  Sobre  o  e forado  n o  Estado lacedemônio: BUSOLT-SWOBODA.

"Griechische Slaatskunde" (Handbuch  der  Altertumswissenschaft,

IV, 1,  München  1 9 2 6 ) p . 6 7 0 ,  683-684;  a í  encontram-se  a s  fontes

e o s  outros escri tos.  O s  éforos t inham  a  tarefa  d e  conservar  a

ordem social

  e

  estatal existente, assim como cultura

  e

  costumes

cívicos, para  q u e o  nomos  fosse  o  único senhor  n o  Estado. Eles

a juramentavam  o rei e  prestavam  u m  contrajuramento. Tinham

também

  q u e ,

  sobretudo, proteger

  a

  ordem existente contra

  u m a

rebelião  d o s  helotas subjugados  e  podiam matar,  s e m  mais, helotas

suspeitos. Isso  e r a  válido como guerra contra  o  inimigo interno,

p o r

  isso, todo

  a n o , o s

  éforos declaravam formal

  e

  festivamente

guerra  a o s  helotas. Busolt-Swoboda  (p . 6 7 0 ) t em  isso como  u m a

"astúcia ingênua".  E le t em  razão, pois  há na  luta contra  o  "inimigo

i n t e r n o " m é t o d o s

  q u e

  d e m o n s t r a m m a i s a s t ú c i a

  d o q u e

ingenuidade.  E m  todo caso,  o s  éforos foram historicamente  u m a

autoridade, cujo caráter polít ico  s e  comprova justamente neste

contexto

  c o m u m

  termo inimigo

  e d e

  política interna. Também

  d e

interesse  é a  queixa  d e  Aristóteles (Política,  I I , 7 , B 10 1272 C)

sobre  a  inst i tu ição  d o s  é f o r o s  e d o s  cosmos .  M a s o  p ior  é a

su sp e n sã o

  d o

  cosmos pe los poderosos

  q u e

  f r e q ü e n t e m e n t e

  a

provocam quando  n ã o  querem  se  submeter  à s  decisões judiciais

| n o  original  e m  grego  e e m  alemão  n a  tradução  d e  Stahr], Sobre

o s  c f o r o s  e m  A l t h u s i u s :  G .  L E I B H O L Z .

  Der

  fíegriff

  der

Repriisentation,  Berlin  1 9 2 9 , p . 8 4  nota; sobre  a  p ropos ta  d e

Fichte

  a

  respeito

  d e u m

  e forado

  q u e

  levaria

  a u m

  duplo chefe

  d e

Estado:

  K .

  W OL Z E NDOR FF.  Siaatsrecht  und  Naturrecht,

  1 9 1 6 ,

p . 4 0 8 ; MOHL.  Encyclopadie  2 . Auf l .  1 8 7 2 , p . 6 4 7 ; DAHL MANN .

Politik

  3 .

  A u f l .

  1 8 4 7 , p . 1 9 7 e

  s e g u i n t e s ; B L U N T S C H L I ,

Allgemeines Staaisrecht  B d. 2 , 4 .  Aufl . , München  1 8 6 8 , Cap . 1 0 ,

p . 5 5 2 . O   trecho mais importante desta literatura sobre teoria  d o

Kstado

  e

  teoria constitucional

  q u e

  atravessa séculos encontra-

se n a  c r í t ica  d c  Hege l  d o s  p l a n o s  d o  e f o r a d o  d e  FICHTE.

Wissenschafiliche Dehandlungsarten

  des

  Naturrechts,

  Samtliche

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I N TR O D U Ç Ã O

1 1

instituições como  as de  tribunos,

19

  censores

2

"  e  síndicos

21

  per-

tencem igualmente  a este tipo  d e  guardiões  d a Constituição.  O

segundo tipo baseia-se  n o  modelo  d o  senado  romano  que, por

meio

  de sua

  tarefa inibitiva

  e

  conservadora,

  fo i um

  verdadeiro

Wcrke  I, p . 47 9 : Po r  causa disso (porque,  s e c o m  isso quisermos

obrigar

  o

  poder supremo

  a o

  acordo

  c o m a

  vontade geral,

  a

  volonté

générale,  ao se lhe  opor  u m  outro poder igual,  n a  verdade  não

está resolvido

  o

  problema

  e m s e

  obrigar

  o

  poder supremo) refugia-

se  numa diferenciação totalmente formal. Todavia,  o  poder  real

é  colocado como único  e  abrangente ,  mas o que s e lhe  opõe  é

o

  poder  possível,

  e

  essa possibilidade deve

  s e r

  capaz

  d e

  obrigar

aquela realidade.  A  esta segunda existência  sem  poder  d a  vontade

geral deve

  s e r

  atribuído

  o

  ju lgamento

  s e o

  poder abandonou

  a

pr imei ra  ( o u  seja,  a  vontade geral ,  a  volonté générale),  se o

poder

  n ã o

  está mais conforme

  a o

  concei to

  d e

  liberdade geral".

E l e  "deve  vigiar,  e m  geral,  o  poder supremo  e , da  mesma forma

q u e  nele surge  u m a  vontade part icular  n o  lugar  d a  geral, deve

l h e

  privar

  d o

  mes mo

  e o

  modo pelo qual isso deve acontecer,

deve  s e r u m a  declaração pública  da  nulidade total,  c o m  efeito

absoluto,

  d e

  todas

  a s

  ações

  d o

  supremo poder públ ico

  a

  partir

deste momento". Então, continuando, este segundo representante

d a

  vontade geral teria

  q u e t e r u m

  "poder real" para poder obrigar

o  poder supremo.  M a s  c o m o  o  "poder real" está  c o m o  outro

r e p r e s e n t a n t e

  d a

  vontade geral , es te pode impedir qualquer

decisão concreta  e m  aniquilar, " independente  d e  quais funções

fo i  encarregado  o  eforado,  a  vigilância,  a  declaração pública  d o

interdi to  e  qua i s formal idades  s ã o  t ramadas ;  e c o m o  mesmo

direito (...), pois estes éforos  n ã o s ã o , a o  mesmo tempo, menos

vontade particular

  d o q u e

  aqueles

  e

  tanto

  o

  governo pode julgar

s e a  vontade particular destes  se  isolou  d a  vontade gera , quanto

o

  eforado sobre

  o

  governo" .

' ' '  Artigos  21 e 28 da  Consti tuição francesa  d o a n o  VIII (1799)  e

numerosos

  senatus-consultes

  até a  e l iminação  d o  tribunado pelo

senatus-consultes  de 19 d e  agosto  de 1807 .

211

  Sobre  o s  censores  d a  Pens i lvânia ,  vide  acima nota  2 ;  outros

exemplos

  e m R .

  MOHL.  Verantwortlichkeit  der  Minister,

  p . 2 2 3 -

2 2 4 ,  sobre "censores expressamente chamados",  o s  quais obser-

v a m

  todas

  a s

  ações

  d o

  gove rno

  n o

  tocante

  a sua

  cons t i tucio-

nal idade. Sobre  o s  defensores  d a  Boêmia será publicada  u m a

pesquisa pelo  D r.  Rudolf Stanka.

2 1

  SPINOZA.  Tractatus politicus VIII  920921;  X, §§  I

o

  e 3

o

;  editio

Bruder  p. 108, 130;  quorum  (destes síndic os)  officium solummodo

si t

  observare,

  ut

  irnperii jura, quae concilia

  et

  imperii ministros

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1 2

O

  GUARDIAQ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

defensor d a s condições constitucionais romanas  e cuja autori-

dade

  — a

  palavra

  é ,

  aqui, usada

  e m s e u

  expressivo sentido

para  s e  diferenciar  d e  potestas

22

  — tinha  q u e  homologar  a s

deliberações populares para

  q u e

  fossem impedidas violações

d a ordem constitucional  e das obrigações internacionais." Este

modelo também continuou

  a

 produzir efeitos

 p o r

 muito tempo

n o  pensamento constitucional  d o s  europeus. Nele baseia-se  o

hábito

  em se

  tomar

  u m a

  segunda câmara  guardiã

  d a

  Consti-

tuição. Segundo  o  artigo  21 da  Constituição francesa  do ano

VIII,

  e.g.,  u m

  Sénat Conservateur  homologa

  ou

  anula todos

os atos d o tribunado ou do governo apresentados como anticons-

titucionais, semelhantemente, segundo

 o

 artigo

 2 9 d a

 Constitui-

ção de 14 de janeiro  de 1852 ,  todos  os  atos  a e le  levados como

anticonstitucionais pelo governo

  o u

 pela petição

  d o s

  cidadãos.

Pelo direito constitucional vigente  d a  república francesa, o se -

nado

  (a

  segunda câmara) constitui-se como  Haute Cour

  de

Justice  n o

  caso

  d e

  queixas ministeriais

  e e m

  outros casos

  d e

justiça política (artigo 9 da lei  constitucional de 24 de  fevereiro

d e

  1875).

  N a

  literatura

  a

  respeito

  d e

  teoria

  d o

  Estado

  e

  teoria

concernunt, inviolata serventur,

  qui

  propterea potestatem

habent, delinquentem quemcumque imperii ministrum,

  qui

scilicet contra jura, quae ipsius ministerium concernunt,

peccavit, coram  su o  iudicio vocandi  et  secundum constituía

iura damnandi, eles de ve m

  t e r u m

  cargo vitalício,

  ter no

  mínimo

6 0

  anos,

  n e

  longa admodum dominatione nimirum superbiant",

t e r

  exército

  à

  disposição, poder exercer

  u m

  direito

  d e

  convocação

frente

  à

  soberana reunião

  d o

  conselho,

  e t c .

  C o m o

  a

  verdadeira

f u n ç ã o

  e

  v e r d a d e i r a p r e s t a ç ã o

  d o s

  s índ icos ind ica - se ,

caracteristicamente,

  q u e s u a

  autoridade deveria conservar

  o

  regime

estatal

  (H Í

  imperii forma servetur).

2 2

  Sobre

  a

  diferença entre  autorítas

  e

  potestas: SC HM IT T, Carl.

Verfassungslehre,

  192 8 , p . 75

 nota.

  U m

  emprego muito interessante

dessa diferenciação para

  a

  atual situação

  d e

  política interna

  d a

Alemanha

  n a

  revista  Die Tat,  outubro

  d e 1 9 3 0 , p .

  509-510 (artigo

anônimo

  D i e

  kalte Revolution"); além disso, ZIEGLER, Leopold.

Fiinjundzwanzig Sátze

  vo m

  deutschen Staat,  Darmstadt

  1931, p. 43,

2 1

  MOMMSE N.  Rómisches Siaatsrecht

  II I , p . 104 1;

  outra bibliografia

sobre

  a

  auctoritas

  d o

  senado romano:  Verfassungslehre

  p . 75

nota;  c f .  também mais adiante neste livro.

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I N T R O D U Ç Ã O

constitucional, sempre permaneceu vivo

  o

  modelo

  de um

"senado" defensor  d a  Constituição. Assim,

  Junius Brutus

exige,  na  mais famosa publicação monarquista,  u m  senado

encarregado

  d e

  vigiar

  e

  examinar

  a

  interpretação

  e a

  execu-

ç ã o d a s  leis empreendidas, ambas pelo rei.

2

" Harrington j á foi

mencionado,  a partir dele  u m a  linha contínua conduz a Sieyès

e a o  século  X I X .

Mesmo  a

  representação

  do

  povo,

  o u  seja,  a  câmara elei-

t a  surge  e m u m a  determinada situação constitucional como

guardiã

  d a

  Constituição, pelo menos

  d o s

  "direitos

  d o

  povo"

perante

  o

  governo,

26

  em

  especial novamente

  u m a

  comissão

  d e

2 4

  BRU TUS , Junius.  Vindiciae contra tyrannos, Aus gab e Edinbur g

1579,p.

  128 .

2 5

  Sobre  a  linha histórica: SMITH,  H. F .  Russel.  Id . p . 15 ,  205/206;

sobre

  a s

  idéias

  e

  propostas

  d e

  Sieyès : BLONDEL.

  A. Id . p . 173;

sobre seus efeitos  n a  Suíça:  H I S ,  Eduard.  Geschichte  des  neuern

Schweizerischen Staatsrechts,

  B d . 1, D i e

  Geschichte

  d e r

  Helvetik

u n d d e r  Vermittlungsakte 1798-1813, Basel  1 9 2 5 , p .  196-197.

2 6

  Pr inc ipa lment e quan do  o  par lamento es tadual recebe agravos

constitucionais. Segundo  o título  VI I , § 21 , da Car ta Constitucional

d a  Baviera  d e 2 6 d e  maio  d e 1 8 1 8 ( n a  redação  da lei de 19 de

janei ro  d e  1872),  e.g.,  qualquer cidadão  o u  qualquer comunidade

podia apresentar

  a o

  parlamento estadual agravos sobre violação

d o s  di re i tos cons t i tucionais .  E m  R.  Mohl,  n o  caso extremo,  a

r ep re s en t ação

  d o

  povo pode conc lamar

  o

  p o v o

  à

  res is tência

armada  n o  caso  d e  violação constitucional  p o r  parte  d o  governo

(Verantwortlichkeit  der  Minister,

  p . 5 7 5 ) ,

  além disso, (eviden-

temente

  c o m a

  ressalva

  d o

  direito

  d e

  exame judicial):

  Über  die

rechtliche Bedeutung verfassungswidriger Gesetze,  M o n o -

graphien

  a u s

  Staatsrecht, Volkerrecht

  u n d

  Politik,

  Bd . I ,

 Tübin gen

1860 , p .  85-86; sobre  a  crítica desta concepção  d o s  "conselhos

estamentários como guardas

  d a

 Consti tuição",

  R .

  GNEIST. Parecer

a  respeito  da 4* assembléia  d e  juristas sobre  a  questão: "Deve  o

juiz

  t e r q u e

  decidir sobre

  a

  ques tão

  d a

  cons t i tuc iona l idade

  d e

u m a  lei?", Berlin  1 8 6 3 , p . 2 8 .  Gneist  v ê a  verdadeira garantia  n a

cooperação entre monarcas hereditários,

  u m a

  primeira câmara

permanente

  e u m a

  segunda eleita, todavia,

  e m s u a

  fala

  n o p a r -

l amento es tadua l  e m 9 d e  f eve re i ro  d e 1 8 6 6 ,  d e n o m i n o u  o s

deputados

  d o

  parlamento estadual

  d e

  "guardas

  d a

  Constituição",

m a s  este  f o i u m  caso específico,  c f .  nota  4 7  mais adiante. Sobre

a  concepção  d e  Bluntschli ,  vide  mais  à  frente.

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1 1

O

  GUARDIÃO

  D A

  CONSTITUIÇÃO

supervisão formada  p o r  representantes  d o  povo "para  a defesa

d o s

 direitos

 d e

 representantes

 d o

 povo perante

 o

 governo". Aqui

se

 pode

  ver, de

 forma mais clara,

  q u e

  tais instituições

  só

 podem

ser consideradas  n o contexto concreto geral  d a  estrutura consti-

tucional.  S e a  Constituição  se  baseia, como correspondente  a

u m a

 concepção difundida

 n o

 século

 X I X , e m u m

 contrato entre

príncipe  e  povo, governo  e  representação  d o  povo,

28

  toda parte

contratual surge como guardiã  da  parte constitucional  que d iz

respeito

 a

 seus próprios direitos

  e

 poderes

  e

  tenderá

  a

 qualificar

as  determinações constitucionais vantajosas  a  suas reivindica-

ções políticas como  a Constituição.  M a s  mesmo  o

  governo,

q ue

 representa

 a

 unidade, pode

  ser

 concebido,

 d e

 acordo

  com seu

conceito, como "guardião

  dos

  serviços públicos

  e

  defensor

  das

instituições estatais".

29

  Otto Mayer  d iz em seu

  Sãchsisches

Staatsrecht  (1909,

 p. 214): o

 guardião supremo

 d a

 Constituição

 é

o rei.

Pode-se igualmente mencionar nesse contexto

 a

 teoria

  - a

sec tratada posteriormente mais  e m  detalhes  - d o poder neutro  e

medianeiro  do rei ou de um presidente d e Estado.

3

"

2 7

  O  artigo  35 , §  2

a

,  d a  Constituição  d o  Reich incluiu  n o  texto  d a

regulamentação consti tucional

  a

  expressão "para

  a

  de fesa

  d o s

direitos

  d a

  representação

  d o

  povo perante

  o

  governo

  d o

  Reich",

a

  pedido

  d e

  HauBmann,

  e m 4 d e

  j u l h o

  d e 1 9 1 9 .

  Correspondia

especialmente  a u m a  tradição  d o  Estado  d e  Wilrt temberg  (cf . a

antiga Constituição

  d e

  Würt temberg

  d e 1 8 1 9 ,

  artigo

  187 e ss . )

colocar es ta comissão interina

  s o b o

  p o n t o

  d e

  vis ta

  d a m a -

nutenção

  d a

  Cons t i tu ição",

21 i

  Vide  mais adiante sobre outros efei tos prát icos deste termo

constitucional.

  O

  protesto

  de 10 de

  fevereiro

  d e 1 8 6 6 d a

  câmara

d e

  depu tados

  d a

  Prússia contém

  u m

  e x e m p l o

  d e s u a

  história

consti tucional

  ( a t a n . 4 1 ,

  re la tos es tenográf icos .

  p . 1 3 7 , 1 4 1 -

142)-.

  A

  câmara, paTa

  a

  salvaguarda

  d e

  seus direitos

  e d o s

 direitos

d e

  t o d o

  o

  p o v o ,

  p o r e l a

  r e p re s e n t a d o p e l o a r t i g o

  8 3 d a

Consti tuição, protesta" contra

  o

  pedido

  d a

  promotoria pública

para

  a

  persecução judic ia l

  d o s

  depu tados  Twesten

  e

  Frentzel

d e v i d o  a  suas fa las  n a  c â m a r a  d o s  d e p u t a d o s .  M a s  deve-se

considerar  q u e s e  trata, aqui,  d a  defesa contra  u m a  intervenção

n a

  própr ia es fera ,

  o u

  se ja ,

  d e u m

  caso

  d e

  autoproteção;

  c f .

também mais adiante.

2S

  Assim, p.ex., TR EN DE LE NB URG , Adolf. Naturrecht,  1860,p.375.

, n

  O  artigo  7 1 d a  Constituição portuguesa  d e 2 9 d e  abril  d e 1 8 2 6

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N T R Q D U C Ã O

1 5

Se nas  constituições alemãs  d o  século  X IX  está previsto

u m  tribunal especial  d o  Estado para  a  "proteção judicial  da

Constituição"  ao  lado  d e  outras garantias/

1

 manifesta-se nelas

a

  simples verdade

 de que a

 proteção judicial

  d a

 Constituição

 só

constitui  u m a  parte  d a s  instituições para  a  proteção  e  garantia

d a

  Constituição

  e q u e

  seria

  u m a

  superficialidade sumária

  es-

quecer,  p o r  causa dessa proteção judicial,  o s  limites muito  es-

treitos d e toda judicância  e os muitos outros tipos e métodos d e

u m a

 garantia constitucional.

(DARESTE,

  p . 497) e o

  artigo

  9 8 d a

  Constituição brasileira

  d e 2 5

d e  março  d e 1 8 2 4 denominam  o rei e o imperador, respectivam ente,

d e  "chave  d e  toda  a  organização política"  e lhe  atribuem  a  tarefa

d e  velar continuamente sobre  a  manutenção  d a  independência,

d o  equi l íbr io  e d a  ha rmonia  d o s  outros poderes polí t icos,  cf .

nota mais

  à

  frente.

3 1

  A

  formulação "proteção judic ia l

  d a

  Consti tuição" encontra-se,

p.ex.,  no a r t . 195 da  Constituição  d e  Württemberg  de 1819 , e l a é

es pec i a lmen te pe r t i nen t e , po i s  e l e  d i s t i n g u e  a s  ins t i tu ições

judiciais

  e

  outras instituições para

  a

  proteção

  d a

  Consti tuição

  e ,

c o m   isso, previne  u m a  falsa  e  perigosa absolutização  d a  proteção

judicial.

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P r i m e i r a p a r t e

A   J U S T I Ç A C O M O G U A R D I Ã   D A

C O N S T I T U I Ç Ã O

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O   c h a m a d o d i r e i t o   d e   e x a m e

j u d i c i a l m a t e r i a l g e r a l

a c e s s ó r i o )

  n ã o s e

  c o n s t i t u i

  n a

A l e m a n h a   e m u m   g u a r d i ã o   d a

C o n s t i t u i ç ã o   . . . )

O s  tribunais  c o m  jurisdição civil, penal  ou  administrativa

não são , em um   sentido preciso, guardiões  d a  Constituição.

Todavia,

 é

 normal

  o

 erro

 e m

  qualificá-los como tais

 ao

 exerce-

r e m u m  chamado direito d e  exame judicial material, isto  é, ao

examinarem

  as

  leis ordinárias

  e m s u a

  coerência material

  c o m

os comandos constitucionais e , em caso d e conflito, negarem  à

lei

 ordinária

 su a

 aplicação.

 P o r

 conseguinte,

 o

 tribunal

  d o

 Reich,

desde

  q u e s e

  declarou autorizado,

  na

  decisão

  de 4 de

  novem-

bro de 1925 ,

  (Jur isprudênc ia civil

  do

  Reich

  111, p. 32 0) a

examinar leis ordinárias  d o  Reich quanto  à sua  concordância

c o m a

 Constituição

  d o

 Reich, também

  fo i

 ocasionalmente

  cha -

mado  d e guardião  da  Constituição.

1

A  tendência  e m  apresentar tribunais sentenciadores como

a

  suprema garantia

  d e u m a

  Constituição pode

  ser

  provavel-

mente explicada, principalmente, a partir d e idéias amplamente

difundidas sobre

  o

  supremo tribunal

  d o s

  Estados Unidos

  d a

América. Es.se tribunal, q ue é com razão mundialmente famoso,

tornou-se entre alguns juristas alemães, como parece,

  u m

  tipo

d e  mito.  N a s  deliberações  da  comissão constitucional  da as-

sembléia nacional

  de

  Weimar, surgiram notáveis obscuridades

1

  Sobre  o  t r ibunal  d o  Reich como guardião  d a  Const i tu ição",

vide  o  art igo  n o  presente  d a s  faculdade s jurí dicas  p o r  ocasião

d o 5 0 °

  aniversário

  d o

  tribunal

  d o

  Reich, Berlin

  1929 , p . 1

 .*54-178.

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIA  D A  C ONS TITUIÇ ÃO  •

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O  CHAMADO DIREITO  D E  EXAME lUDICIAL MATERIAL..

2 1

Considerando

  su a

  strictly judicial function,

6

  ele

 recusa todo pare-

c e r

 político

  ou

  legislativo

  e não

  deseje

  se r nem

  mesmo

  um tri-

bunal administrativo.

7

 Basicamente, e le  recusa-se  a  redigir  u m

parecer  ao  congresso  ou ao  presidente.

8

  N o q u e  tange  a seu

significado e efeito práticos,  não se pode, a partir  d a  considera-

ç ã o d a

  atual situação anormal

  d a

  Alemanha, avaliar

  su a

  ativi-

dade pelas épocas

  d e

  prosperidade econômica

  e d e

  segurança

d e  política interna,  e , s im, se ter em  vista épocas críticas  e

turbulentas. Aqui, mostram  o s  famosos precedentes  d o  perío-

d o d a

  guerra civil

  —

  decisões

  q u e

  dizem respeito

  a

  questões

politicamente discutíveis como escravidão

 o u a

 desvalorização

d a  moeda  - que a  autoridade  d o  tribunal  se  encontrava  e m

grande risco nesses casos  e não  podia  d e  modo algum impor

sua

  concepção sobre

  a

  matéria.

9

  M a s a

  maior

  e, na

  verdade,

fundamental característica

  d a

  suprema corte norte-americana

residia provavelmente  n o  fato  de que e la , com a ajuda d e p o n -

tos de  vista básicos  e  princípios gerais,  os quais  s ó  podem  ser

abusivamente qualificados

 d e

 "normas", examina

  a

  retidão

  e a

racionalidade

 d e

 leis

 e , po r

 conseguinte, dado

  o

 caso, trata

 u m a

lei  como não-aplicável.

10

  Ela é  capaz para tanto, pois  ela se

6

  "Funçã o estri tamente judi cial"  [ n o  original  e m  inglês. N.T.].

7

  Provas  e m  HUGHES.  Id. p. 32.

8

  Primei ro caso,  a té  então,  d e u m  parecer (advisory opinion)  sob o

presidente Monroe;

  a

  respeito, WARREN

  id . , I I , p . 56;

  t ambém

  a

observação  d e  HUGHES.  Id . p . 31 :  "nada assim poderia acontecer

ho j e "

  [n o

  original

  e m

  inglês. N.T.].

  O

  solicitor-general James

  M .

Beck

  f e z , a t é

 agora

  e m v ã o , a

 proposta

  de da r o

 direito

 a o

 cong resso,

conjuntamente  c o m o s  presidentes,  d e  pedir  à  suprema corte  u m

parecer quando

  u m

  anteprojeto

  de l e i fo r

  duvidoso

  n o

  tocante

  a

s u a  consti tucionalidade;  c f .  OGG-RAY.  Introduction  to  American

Government,  2.  Aufl . ,

  1 9 2 6 , p . 4 2 2 ,

  nota

  3 .

9

  WAR R EN,  I I I , p .  22/23  (Dred Scott Case),  p . 2 4 4  (Legal Tender

Case)\  e

  mais,

  a  Income  Tax  Case,  1895 .

10

  Aqui

  é o

  caso

  d e

  conceitos como  reasonableness

  e

  expediency.

Sobre  a s  relações  e  identif icações  d e  "constitution", "fundamental

rights", "natural equity", "will  o f the people",  e tc . , a s  interessantes

observações

  e m

  DICKINSON, John.  Administrative justice  and

the

  Supremacy

  of Law in lhe

  United States,

  Cambr idge, Harvard

University Press,

  1927, p . 97 e 101.

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO  •

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O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

apresenta,  na  realidade, como guardiã  d e u m a  ordem social  e

econômica,

  a

 princípio não-discutível, perante

  o

 Estado. Como

R .

  Gneist disse

  d e

  forma muito acertada,

  e la t em um

  poder

transcendental

" perante  o  Estado.  S ó  neste contexto  é que

se  pode considerar  a  crítica freqüentemente feita referente  a o

fato

  de que e la , por

  muitos anos, impediu

  e

  deteve leis

  de p ro -

teção  a o s  trabalhadores  e  determinações sociopolíticas,  até

mesmo aquelas sobre  o  trabalho  d e  mulheres  e  crianças,  que

n o s

  eram naturais

  n a

  Alemanha,

  a o

  tratá-las como anticons-

titucionais.  N ã o s e  trata aqui, naturalmente,  n em d e u m a ap o -

logia  n e m d e u m a  refutação d o  tribunal norte-americano,  m a s

apenas

  d e

 impedir,

 p o r

 meio

 d e u m a

 pequena re tificação, trans-

ferênc ias irrefletidas e mitificações. Deve-se dizer basicamente

que o direito d e exame judicial,  por si só, apenas tom a o s tribu-

nais sentenciadores guardiões

  d a

  Constituição

  e m u m

  Estado

judicial

  q u e

  subordina

  a

  totalidade

  d a

  vida pública

  a o

  controle

d o s  tribunais ordinários  e s ó  quando,  p o r

  Constituição,

  forem

entendidos, sobretudo,  os  direitos fundamentais  d o  Estado  d e

Direito civil, liberdade  pessoal

 e

 propriedade privada,

  o s

 quais

devem  ser protegidos contra o Estado pelos tribunais ordinários,

i.e.

  contra legislação, governo  e  administração. Dessa forma,

a

  prática

  d o

  tribunal americano defendeu

  e

  procurou proteger

contra  o  legislador,  com.  base  n a s  emendas (

Amendment

)  d e

número  5 e 14 e desenvolvendo  a muito discutida fórmula

 due

process oflaw,

n

  os

 princípios

  d a

 ordem civil social

  e

 econômi-

ca

  como

  a

  ordem superior

  e a

  verdadeira Constituição.

Parecer  id . p . 23, cf . a  citação detalhada mais adiante  a o  final

desse livro.

12

  Dev ido processo legal

  1 n o

 original

  e m

  inglês. N.T.]. Quinta Emenda

d e J 7 9 1

  (dirigida

  à

  união): ninguém deve

  s e r

  "privado

  d a

  vida,

d a  l iberdade  o u d a  p ropr iedade  s e m o  devido processo legai;

n e m a  propriedade privada deve  s e r  tomada para  u s o  público

s e m u m a

 justa compe nsação "

  [n o

 original

  e m

  inglês. N.T.]. Décima-

quarta emenda

  d e

  Í868 (dirigida

  a o s

  Estados):

  N e m

  qualquer

estado deve privar qualquer pessoa  d a  vida,  d a  liberdade  ou da

propriedade,  s e m u m  devido processo legal;  n e m  negar dentro

d e s u a

  jurisdição

  a

  igualdade

  d a

  proteção legal"

  [n o

  original

  e m

inglês. N.T.]. Exagerada,

  m a s

  característica

  é a

  critica constante

1

  PRI MEIR A PARTP.

  - A

  J U S TI Ç A C O M O G U A W I Ã

  l i A

  CONSTITUIÇÃO

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O

  CHAMADO DIREITO

  D E

  EXAME IUDICIAL MATERIAL.

2 3

O  direito  d e exame judicial,  a o contrário,  ao qual recorre  o

tribunal  d o  Reich alemão  na  famosa decisão  de 4 de novembro

d e  1925,'

3

  assim como,  d e  forma semelhante,  os  demais tribu-

nais supremos (tribunal financeiro

 d o

 Reich, tribunal

  de

  previ-

dência social  d o  Reich, tribunal administrativo superior  d a

Prússia, etc.),

  t em u m a

  importância muito modesta

  em

 compa-

ração  com o  direito  d e  exame  de um  tribunal norte-americano

e , em uma  observação mais detalhada  d e  suas proporções,  se

movimenta dentro

 d e

 limites muito estreitos.

 A

 fundamentação

d a

  decisão

  de 4 de

  novembro

  de 1925

  baseia-se

  na

  seguinte

frase: que o juiz esteja subordinado  à lei  (artigo  102 da  Consti-

tuição

  d o

  Reich)

  n ã o

  exclui

  o

  fato

  de que e le

 possa privar

  d e

validade  uma le i ou  suas determinações particulares, contanto

q u e  estejam  em  contradição  c o m  outros preceitos  que as pre -

cedam  e a  serem observados pelo juiz".

14

  C o m  isso  se  afirma

n a  f rase f reqüentemente profer ida:  o  devido processo  é  curió

d o

  modo

  q u e a

  Suprema Corte norte-americana

  d iz que e le o é

[n o  original  e m  inglês. N.T.].

Jurisprudência civil  do  Reich,

  1 1 1 , p . 3 2 2 ; a

  isso,

  a

  discussão

detalhada  n o  presente  p o r  ocasião  d o 5 0 °  aniversário  d o  tribunal

d o

  Reich,

  vol . I , p . 171

  et seq.

i 4

  E m

  termos comparativos podem

  s e r

  aqui citadas

  a s

  frases corres-

pondentes  d a  famosa decisão fundamental  d o  supremo tribunal

d o s

  Estados Unidos  Marbury

  v.

  Madison

  (1

  Cranch,

  137) -

  Chief

Justice  M a r s h a l l  - d o a n o d e 1 8 0 3 : O s  p o d e r e s  d o  poder

legislativo

  sã o

  definidos

  e

  limitados (...).

  É u m a

  proposição

  por

demais simples para  s e r  contestada  q u e o u a Constituição conirola

todo

  a to

  legislativo repugnante

  a e la , ou que o

  poder legislativo

pode al terar  a  Cons t i tu ição  p o r u m a t o  ordinário. Entre estas

duas al ternativas  n ã o h á u m  meio- te rmo.  A  Const i tuição  ou é

u m a l e i  superior  e  primordial, inalterável  p o r  meios ordinários,

ou e la  está  e m u m  mesmo nível  c o m  atos legislativos ordinários

e ,

  como outros atos,

  é

  modif icável quando

  o

  poder legislativo

quiser fazê-lo.  S e a  primeira parte  d a  alternativa  f o r  verdadeira,

então

  u m a t o

  legislativo contrário

  à

  Constituição

  não é lei , se a

última parte  f o r  verdadeira, constituições escritas  s ã o  tentativas

absurdas

  d a

  par te

  d a s

  pessoas

  e m

  l imi ta r

  u m

  poder pela

  s u a

própria natureza ilimitável" [citação  n o  original  e m  inglês. N.T.].

O  t r i b u n a l  d o  R e i ch ev i t a e s s a s ponde rações  d e  d i re i to

constitucional, apesar

  d a

  brevidade

  d e s u a

  argumentação,

  ele o

PRIMLilRA 1'AliTH  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO  »

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2 4

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

q u e h â

  determinações

  d a

  norma constitucional,

  a

 cuja regula-

mentação

  d o s

  fatos típicos pode-se subsumir

  o

  caso

  à

  espera

d e  decisão  e que , no  caso  d e  conflito, essa regulamentação  d a

norma constitucional precede a regulamentação legal ordinária

d o  mesmo fato típico. Apenas enquanto  a  determinação  d a

norma constitucional possibilitar, pelo  s e u  conteúdo,  u m a

subsunção correspondente

 a o

  tipo, calculável

 e

 mensurável,

 d o

caso

  a ser

  decidido

  é que e la

  interessa para

  o

 caso

  d e

  conflito,

pois

  u m

  conflito desse tipo pressupõe, como todo conflito

 au -

têntico,  u m a  identidade  d a s  determinações colidentes. Para

princípios e máximas gerais, autorizações e simples determina-

ções  d e  competência,  o  caso  é b em  diferente  d o q u e  para

subsunções correspondentes

  a o

  tipo. Apenas

  a

  subsunção

  a o

fato típico

 d o

 regulamento

 da

 norma constitucional possibilita

 o

juiz

  (n ão

  privar

  a lei

  ordinária

  d e

  validade,

  m as , s im ,

  como

  se

expressa  o  tribunal  d o  Reich) negar aplicação  à lei  ordinária

o u ,  mais precisamente, subsumir,  em vez de a  seus fatos típi-

cos , a aqueles  da lei que tem  primazia  e ,  assim, decidir  o  caso

presente.

  N a

  verdade, isso

 n ã o é u m a

  abjudicação

 d a

  validade,

m a s u m a n ã o

 aplicação

  da lei

  ordinária

  ao

  caso concreto ocor-

rida devido

 à

 aplicação

 da

 norma constitucional.

 P o r

 isso consta

acertadamente

  e m u m a

  frase posterior

  d a

 decisão

  (p .

 322/323)

que o  juiz estaria obrigado  a  deixar  a lei  "fora  d e  aplicação".

D e u m a  observação mais detalhada dessa frase j á  resulta  q u e

a  vinculação  d o juiz  à lei não se encontra  e m  contradição  c o m

esse tipo

  d e

 direito

  d e

 exame judicial,

  m as é ,

  antes,

  s u a

 base

  e

su a

  única justificação.

  M a s

  isso significa,

  a o

  mesmo tempo,

q u e s ó

  normas

  q u e

 possibilitem

  u m a

  subsunção conforme

  aos

fatos determinam, n o caso d e  conflito, a subsunção n o lugar  d a

le i ordinária,  e não princípios gerais, autorizações,  etc.

O s  motivos  d a  decisão daquela sentença  de 4 de  novem-

bro de 1925

  acentuam ainda

  q u e s e

  recorre

  a u m

  direito

  d e

f a z  mais cuidadosamente  e d e  natureza menos principiológica,

contentando-se  c o m a  frase: "pois  o s  preceitos  d a  Constituição

d o

  Reich

  s ó

  podem

  s e r

  anulados

  p o r

  meio

  d e u ma l e i d e

  emenda

consti tucional

  q u e s e

  realiza

  d e

  maneira regular".

PRJMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIA  D A  CONSTITUIÇÃO

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O

  C H A M A D O D I RE I TO

  D E

  EXAME lUDiCIAL MATERIAL.

2 5

exame  apenas perante leis ordinárias  do  Reich,  e nã o  para

a emenda  à Constituição  d o Reich,  ou  seja decorrentes do pro-

cedimento estabelecido pelo artigo 7 6 d a Constituição d o Reich.

T ã o

  logo

  se

  apresente

  uma le i do

  Reich realizada segundo

  o

artigo  7 6 ,  cessa, segundo essa fundamentação, qualquer outra

possibilidade  d e  exame.  A questão constitucionalmente muito

significativa  d o s  limites  d a  autorização para reforma  ou  revi-

são, a possibilidade  de um  evidente abuso  d a  determinação  d o

artigo

  76 e a

  necessidade

  d e u m a

  diferenciação dentro

  da au-

torização para reforma,  j á  pormenorizadamente discutida  na

teoria jurídica  d a  Constituição vigente  e que é  impossível  d e

se r

 realizada

 c o m o

 sumário absolutismo

 que , no

 artigo

 7 6 ,

 quer

encontrar o onipotente soberano assim como  o titular d o  poder

legislativo constitucional,

15

  são  todas questões  q u e n ã o  mais

interessam para  u m  direito  d e  exame judicial existente dentro

d e

 tais estreitos limites.

 C o m

 isso suprime-se, outrossim,

 a pe r-

gunta sobre

 se

 existem,

 p o r

 exemplo, rupturas inadmissíveis

 d a

Constituição que não se tornam legítimas mediante d o procedi-

mento  d o  artigo  76 e se esse artigo possibilita "atos  d e sobera-

n ia

  apócrifos"

 d o

 direito consuetudinário.

  O

  tribunal

  d o

  Reich

parece também  n ã o  recorrer  a u m  direito d e exame judicial  se

f o r publicada  u m a  prescrição  o u  medida  n a  forma  de uma le i

ordinária que , no caso, n ã o seja  lei no sentido d o conceito de lei

d o

  Estado

  d e

  Direito

  e ,

 destarte,

  p o r

  falta

 d e

  expressa permis-

são da  norma constitucional,  n ã o  possa  se r  efetuada p o r  meio

d e u m  processo legislativo  e  abuse  d a  autorização legislativa

d o

  legislador. Pode-se facilmente abusar

  d o

  procedimento

  d o

15

  A  respeito, SCHMITT, Carl.  Verfassungslehre,  p . 102 , Jur .  Woch.

1 9 2 9 , p . 2 3 1 4 ;

  BILFINGER, Carl.  Der  Reichssparkommissar,

  1928 ,

p. 17; e  mais,  A o R . X I  (1926),  p . 194 e

  Zeitschrift fiir Politik,

  B d .

X X , 1 9 3 0 , p .

  81/82;

  R .

  T H O M A

  e m

  NIPPERDEY.  Grundrechte

un d

  Grundpflichten

  de r

  Reichsvetfassung,

  192 9 , B d . I , p .

  38-39,

assim como  n o

  Handbuch

  âes

  deutschen Staatsrechts

  I , p . 14 3,

publ icado

  p o r

  A N S C H Ü T Z ; T H O M A ;

  W .

  I E L L I N E K ,

  p . 154

(restrições,

  a o

  menos, para quebras consti tucionais) ,

  p o r f i m e

sobretudo,  E .  JACOBI.

  Reichsverfassungsanderung

,  n o  presente

d a s  faculdades jurídicas  p o r  ocasião  d o 5 0 °  aniversário  d o  tribunal

d o

  Reich,

  1929, vol . I , p .

  233-234.

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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O  CHAMADO  D I R E I T O  DE  E X A M E  IUDICIAL MATERIAL.

2 1

novembro  de 1925  atém-se rigorosamente  à  subsunção  cor -

respondente

  a o

 tipo

  e não se

 pronuncia,

  d e

 modo algum, sobre

o

  outro tipo

  d e

  direito

  d e

  exame

  d o s

  tribunais

  q u e

  serve

  à

autoproteção

  d a

  justiça independente.

Finalmente, resulta

  d o s

  motivos

  d a

 decisão dessa sentença

d e 4 de novembro de 1925 qu e o tribunal d o Reich não  pretende

examinar leis ordinárias  d o Reich  n o  tocante  a sua concordân-

c ia com os princípios gerais  da  Constituição  (diferentemente

d a  concordância  c o m  determinações particulares  d a  norma

constitucional).

 E l e n ã o

 reivindica nenhum exame geral

 de uma

lei, o

 qual

 não t em e m

 conta

 u m

 fato típico subsumível

 da

 norma

constitucional,

 n o

 tocante

 a sua

 concordância

  c o m o

 espírito

 d a

Constituição

 o u n o

  tocante

  à

 observância

  d o s

 princípios gerais

q u e  formam  o componente  d e  Estado  d e  Direito  da  Constitui-

ç ã o d o  Reich,  a  saber, direitos fundamentais  e  diferenciação

d o s  poderes. Pelo contrário,  a  fundamentação atém-se cuida-

dosamente, para  n ã o  falar formalmente,  à  normatização  d a

norma constitucional

  e

  correspondente

  a o

  preceito jurídico,

  a

qual, pelo

  seu

  tipo

  e sua

  estrutura lógica, possibilita

  u m a c o n -

frontação

 co m a lei

  ordinária. Sobretudo,

  n ã o h á

  segundo essa

decisão

  nenhum exame judicial

  de um a le i no  tocante  a sua

concordância  c o m  princípios jurídicos gerais  com o boa-fé,

direito certo, razoabilidade (reasonableness, expediency)  e

noções semelhantes  d a s  quais  se  serve  a  prática  d o  supremo

tribunal

  d o s

  Estados Unidos.

  N a

  decisão "Jurisprudência

 c i-

vil do

  Reich,

  vo l . 118, p.

  326/27"

  (J . W. , 1928, p. 102  et seq.)

consta

  a té

  mesmo, expressamente,

  que o

  conceito

  d o s

  bons

costumes (artigo

  8 2 6 d o

 código civil) estaria destinado apenas

para relações  d e direito privado  e não  seria aplicado  n a relação

d e  direito público entre legislador  e cidadão  e o presidente  d o

tribunal d o Reich, D r. Simons, comunicou, pelo visto aprovan-

d o  totalmente,  q u e a s  câmaras recusaram criticar,  s o b o ponto

d e

  vista

  d o

  direito certo,

  u m a

  norma originada constitucional-

mente

 e se

 colocar,

 c o m

  isso, acima

  d o

 "legislador soberano".

17

17

  Deutsche Juristen-7.eitung,

  19 24 , p . 24 3 .

PRIMF.IRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  C ONS TITUIÇ ÃO  »

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28.

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

Essa comprovação

  é d e

  especial interesse, pois

  a

  associação

d e  juízes usara  u m a  sentença  da 5° câmara cível  de 28 de no-

vembro de 1923 (sobre o princípio da valorização p o r eqüidade

e

  boa-fé

  d e

  caso

  e m

  caso,

  Jurisprudência civil

  do

  Reich

107, p . 78)

 para exigir

  q u e o

 princípio

  da

 boa-fé também fosse

aplicado perante

  a

  regulamentação legal

  d a

  valorização.

P o r

 conseguinte,

 o

 direito

 d e

  exame judicial

  a o

 qual recor-

re o  tribunal  d o  Reich leva apenas  as  características daquele

direito

  d e

 exame judicial

  d e

  tribunais decisórios:

  ele é

  apenas

"acessório"

 e

 apenas, como assinala

 H .

 Triepel, "jurisdição

 o c a -

sional";

18

  e le  torna-se apenas ocasionalmente  incidente  a um a

decisão judicial

  e ,

  segundo

  as

  possibilidades,

  é

  exercido

  por

qualquer juiz,

  ou

  seja,

 d e

 forma

 difusa;'

9

  seu

 efeito

 é o

  simples

efeito como precedente  d a

  decisão

  d e u m

  supremo tribunal

existente

  n a

  Alemanha ainda

  a o

  lado

  d e

  vários outros supre-

m o s  tribunais d o Reich e dos Estados. A diferença d o direito d e

exame

 da

 justi ça norte-americana reside principalmente

 n o

 fato

de que esse defende princípios gerais, tornando, assim, o tribu-

nal  guardião  e  defensor da  ordem social  e  econômica existen-

te .

  Segundo

  o s

  limites

  de seu

  direito

  d e

  exame, expostos

  h á

pouco,

 o

 tribunal

  d o

 Reich alemão

  n ã o

 recorre

 d e

 modo algum,

n e m

  distante,

  a u m a

  posição desse tipo. Para esse direito

  d e

exame judicial trata-se, assim,

 d e o

  ponto principal

  d a

  decisão

política permanecer situado na legislação. Toda jus tiça está v i n -

culada

  a

 normas

  e

 cessa quando

  as

  próprias normas tomam-se

em seu  conteúdo duvidosas  e  discutíveis. Conseqüentemente,

e m um Estado como  o  atual Reich alemão,  o direito  d e exame

judicial depende

  d e

  normas

  q u e

  possibilitem

  u m a

  subsunção

correspondente

  a o

  fato típico. Existe

  u m a

  segunda questão

acerca

  d e

 quão imaginável

  e

 admissível

  é dar, em

  território

  d e

direito privado,  u m a  certa liberdade  d e  movimento  e  margem

18

  Wesen  und  EntwicUung  der  Sraatsgerichtsbarkeit,

  Verõffentlichungen

d e r  Vereinigung  d e r  deutschen Staatsrechlslehrer, Heft  5, p. 26.

19

  Des ejo propor esta palavra "dif usa " para desig nar

  u m a

  contra-

posição  a u m  direito  d e  exame  concentrado  junto  a u m a  única

instância .

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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O

  C H A M A D O D I R EI T O

  D E

  EXAME IUDICIAL MATERIAL.

2 2

d e  ação  ao  juiz para  seu  parecer  p o r  intermédio  d e  conceitos

indeterminados

  e

 gerais,

  p o r

 meio

  d e

 referência

 à

 boa-fé

  ou ao

u s o

  comum. Condições relativamente estáveis

  e

  sólidas

  con-

cepções sociais podem causar, aqui,  u m a  suficiente mensu-

rabilidade  e vinculação. Também  e m território de direito públi-

co ,

 principalmente

  em

  questões

  d e

 direito administrativo

  e até

mesmo d e direito penal, s ão possíveis conceitos indeterminados,

enquanto

  a

  situação

  q u e

  toda norma pressupõe puder encon-

trar  u m a  formalização suficientemente clara  e  segura median-

te as  concepções  d o s  colegas  d o  direito  ou da  prática jurídica,

mesmo

  s e m a

 expressa decisão legislativa

  ou do

  governo.

  E m

todos  os  casos, normas determináveis  e  mensuráveis  que pos-

sibilitam subsunções

  t ê m q u e

  permanecer

  a

  base

  d o

  exame

judicial  e d a  decisão.  A  vinculação  a u m a  norma desse tipo  é

também  o pressuposto  e a condição  d e  toda independência j u -

dicial. Caso

  o

  juiz abandone

  a

  base

  na

  qual realmente exista

u m a  subsunção  d o fato típico  a  normas gerais  e , com e la , uma

vinculação material

  à lei , ele não

  mais pode

  se r

 ju iz indepen-

dente  e n e m u m  sinal  d e  aparência  d e  justiça pode protegê-lo

dessa conclusão.  " A vinculação  à lei,  unicamente  à qual  o jui z

está subordinado pelo artigo

  102, não

 significa apenas

  o

 limite,

m a s a  verdadeira justi ficação para  a  liberdade  da  decisão,  por

causa

  d o

  poder

  da le i que se

  impõe unicamente pela sentença,

todas

  as

  outras vinculações

  t ê m q u e

  cair perante

  o

 juiz."

20

  Por

isso, o problema d o movimento d o livre direito e d a magistratura

"criadora"

 é , em

 primeiro lugar,

  u m

 problema constitucional.

  1

2 0

  G R Ü N H U T ,

  M .  Die

  Unabhangigkeit

  der

  richterlichen

Entscheidung,  M o n a t s s c h r i f t  f ü r  K r i m i n a l p s y c h o l o g i e  1 9 3 0 ,

Beiheft  3, p. 3;  SCHMITT, Carl.

  Verfassungslehre,

  p .  274/276.

2 1

  Apesar

  d a s

  indicações

  d e

  R ADB R UC H.  ArchSozW.,

  N .F . 4

  (1906)

p . 355 , o movimento  d o  livre direito  n ã o  compreendeu, numerosas

v e z e s ,  a s  r e l a ç õ e s c o n s t i t u c i o n a i s e n t r e i n d e p e n d ê n c i a  e

vinculação. Mui to per t inentes

  a s

  expos ições

  d e E .

  Kaufmann

n a  c o n f e r ê n c i a  d e  p r o f e s s o r e s  d e  d i r e i t o púb l i co  e m 1 9 2 6

(publicações caderno  3, p. 19): o  juiz  t e m q u e s e  manter dentro

d e s u a  tarefa judicial específica,  e l e n ã o  pode derrubar  a  ordem

re inante en t re ju iz  e  l eg i s lador ,  n ã o s e  a p o d e r a r  d e  t a re fas

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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• M O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

Segundo  o  exposto acima,  o  direito  d e  exame judicial  d o

juiz sentenciador baseia-se

  n o

  oposto

  de um

  certo tipo

  d e

superioridade  d o juiz perante  a lei ou o legislador.  E le  origina-

se de uma

  espécie

  d e

  estado  de  emergência

  d o

 juiz quando

  se

apresentam determinações legais contraditórias

 e o

 juiz,

  qu e se

defronta

  c o m

  vinculações contraditórias,

  t e m q u e ,

  apesar

  d is -

s o , tomar  u m a  decisão quanto  a o  processo." Caso  e le escolha.

especificamente legislativas,  e l e  pode apenas censurar  a  violação

d e  determinados l imites extremos. Apesar  d e  toda "liberdade"

d a

  atividade judicial "cr iadora", apesar

  d a

  abrangência

  d e s u a

discr ição

  e d e

  alguns conceitos indeterminados, permanece-se,

e n q u a n t o  s e  p e r s e v e r a r  n o  E s t a d o  d e  Di re i to c iv i l , nessa

"vinculação  à l e i " . C f .  a inda JELLINEK,  W .

  Verwaltungsrecht

1 9 2 8 , p . 1 0 : " B e m   livre  s e  man tém  a  jus t iça  d a  leg is lação"  o u

TRIEPEL,

  H .  Streitigkeiten zwischen Reich  und  Landern,  1 9 2 3 ,

p . 52 : " O

  preenchimento

  d e

  lacunas

  na l e i po r

  meio

  d e

  ponderação

d e  interesses  t e m  sempre q u e partir, e m  primeiro lugar, d a  valoração

d e  interesses executada pela própria  l e i de  modo perceptível" .

Sobre

  o s

  l imites

  d a

  d i sc r ic ionar iedade jud ic ia l

  n o

  tocan te

  à

Constituição

 d o

 novo direito,

  c f .

 JUNCKER.

  3 .

 Aufl .

 d e s Steinschen

Grundrisses  des  Zivilprozefirechtes,  1 9 2 8 , p .  23-24; sobre  o  fato

d e q u e n ã o  existe discricionariedade "adequada  a o  dever",  m a s

ap en as " ad eq u ad a  à l e i " :  S C H E U N E R .

  Nachprüfung  des

Ermessens durch  die  Gerichte,

  VerwArch.

  3 3

  (1928),

  p . 77

  (para

a  justiça, isso  é  correto  s e m  dúvida;  d e  resto, continua  a  proble-

mát ica  d a  diversidade entre determinações  q u e  "au to r izam"  à

"livre" ação  e  normas vinculadoras  e m s e u  conteúdo  q u e p o s -

sibil i tam

  u m a

  subsunção correspondente

  a o

  fato típico, mesmo

q u e  seja pela remissão  a  normas como "boa-fé",  u s o  comum, etc.).

2 2

  S o b r e  o  " e s t ad o  d e  em er g ên c i a " co n s t i t u c io n a l  d o  j u i z ,  c f .

RA D BRU CH .  Arch

  Soz- W.,  N. F. 4

  (1906),

  p . 3 5 5 .

  Nesse artigo,

encontra-se reconhecida

  a

  relação

  c o m a

  questão constitucional

d a  d i f e r e n c i a ç ã o  d o s  p o d e r e s ( r e f e r in d o - s e  a  H A T S C H E K .

Englisches Siaatsrecht  I , p .  1065) ,  m a s  depo is novamen te

incompreend ida  s o b a  impressão  d a  cr í t ica  d o  m o v im en to  d o

livre direito

  e

  também, talvez,

  s o b o

  vácuo

  n a

  teoria constitucional

d o

  período anterior

  à

  guerra.

  A

  diferenciação

  d o s

  poderes passa

a s e r  depreciada  s o b o  rótulo  d e  " r ac iona l i smo"  ( c f .  também

K A U F M A N N ,  E .  Auswartige Gewalt  und  Kolonialgewalt  in

den

  Vereinigten Staaten

  von

  Amerika, Leipzig  1 9 0 8 , p . 3 4 ) .

Radbruch fala

  d o

  "espírito

  d e  Montesquieu,  q u e

  ainda continua

a

  assombrar"

  (p . 365) , mas

  esse espírito

  é o

  próprio espírito

  d o

Estado  d e  Direitocivil, pelo qual  s e  decid iu  a  Cons t i tu ição  d e

—•

  PRIMEI RA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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O  C H A M A D O D I R E I T O  D E  E X A M E jU D I CI A L M A T E RI A L .

3 1

para proferir

 su a

 sentença judicial,

  u m a d a s

  determinações

  le-

gais conflitantes como embasamento para

  su a

 decisão,

  a

 outra

determinação conflitante n ã o  será aplicada. Isso  é  tudo.  É ine-

xato dizer, como  j á  mostrado,  q u e o  juiz sentenciador teria

"abjudicado validade"  à lei  não-aplicada, corretamente pode-

se

 falar tão-só

  d e u m a

  "não-aplicação

  da le i "

  restrita

  à

 decisão

d o  caso concreto, exercendo, para  as  decisões  d e  outras  ins-

tâncias,  u m efeito como precedente mais  ou menos previsível.

M a s a

  justiça permanece, sobretudo, vinculada

  à lei e,

  pelo

fato

  d e

  antepor

  su a

  vinculação

  a u m a

  norma constitucional

  à

vinculação  a uma le i  ordinária,  e la não se  torna guardiã  da

Constituição.

  E m u m

  Estado

  que não é

 puro Estado

  d e

 justiça ,

e l a n ã o  pode exercer tais funções.  D e  resto, deve-se conside-

ra r que a observância  d o  princípio geral  da  legalidade  e , com

ele ,

  também

  o da

  constitucionalidade

  n ã o

  constitui nenhuma

instância especial, senão ter-se-ia  q u e  avistar  e m  cada depar-

tamento público e , po r f im , também  e m cada cidadão u m even-

tual guardião

 d a

 Constituição,

 o que

 a lgumas constituições

 aca-

b a m p o r

  expressar, confiando

  a

  proteção

  d a

  Constituição

  à

vigilância  p o r  parte  d e  todos  o s  cidadãos."  M a s  disso resulta

tão-somente  u m  direito geral  à  insubordinação  e, p o r fim, à

resistência

  passiva

  o u

  ativa,

  o

  qual

  se

  denominou também

  d e

"direito  d e  emergência revolucionário".

24

  P o r  isso,  em exposi-

Weimar

  e q u e s ó

  desaparecerá

  c o m o

  próprio Estado

  d e

  Direito

civil. Sobre  a s  visões  d e  Montesquieu sobre  a  justiça,  c f .  também

adiante

  e m

  nota.

2 3

  Ass im , temos  a s  cons t i tuições f rancesas  d e 1 7 9 1  (conclusão),

1830 e 1848

  (sobre

  a

 tentativa

  m a l

  sucedida

  d e d a í

  tirar conclusões

práticas,  c f .

  Verfassungslehre,

  p. 116).  Recentemente  a Constituição

d a

  cidade livre

  d e

  Danzig

  de 15 /17 de

  novembro

  d e

  1920/14

  d e

j unho  d e 1 9 2 2 ,  artigo  8 7 : " É  dever  d e  todo cidadão proteger  a

Consti tuição contra ataques i legais" ,

  o u a

  Const i tuição grega

de 2 de

  j unho

  d e 1 9 2 7 ,

  art igo

  127: A

  guarda

  d a

  Consti tuição  é

conf i ada  a o  pa t r io t i smo  d o s  helenos  I n o  or iginal  e m  francês.

N . T . ]

  (DARESTE-DELPECH,

  p . 656) .

24

  GNEIST,  R .  Parecer sobre  a 4

a

  assembléia  d e  juristas: "Deve  o

ju iz  t e r q u e  decidir sobre  a  ques tão  d a  cons t i tuc iona l idade  d e

u m a  lei?" Berlin  1863, p . 31 .

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CO N ST I T U I ÇÃ O

  •

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O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

ções sistemáticas aparece

  o

  direito

  d e

  resistência como

  u m a

suma garantia  d a  Constituição,  a  cuja proteção  e  defesa  ele

deve servir.

25

  M a s a  função constitucional  d e u m  guardião  d a

Constituição reside justamente

  n o

  fato

  d e  substituir esse

  di-

reito  de  insubordinação  e de  resistência, geral  e  ocasio-

nal,

  e

  tomá-lo supérfluo. Só  então passa  a existir  um guardião

da  Constituição  no  sentido institucional.  Assim, guardiões

da Constituição  não são  todas  as  posições  e  pessoas  que , oca -

sionalmente pela não-aplicação

  d e

  leis anticonstitucionais

  ou

pela não-obediência

  a

 disposições anticonstitucionais, possam

contribuir para  que a  Constituição seja respeitada  e não  seja

violado  u m  interesse protegido constitucionalmente. Essa  é a

ponderação sistemática

  q u e

 justifica

  n ã o

  considerar

  os

  tribu-

nais, mesmo quando exercerem

 o

 direito

 d e

 exame judicial aces-

sório  e  difuso, como guardiões  d a  Constituição. Todavia,  por

causa  da garantia  d a  independência judicial, talvez seja menos

arriscado para

  o s

  tribunais negar obediência

  à s

  leis

  e à s

  dispo-

sições anticonstitucionais.

  Mas não se

  trata

  , po r

  isso,

  de de-

clarar

  u m a

 categoria

  d e

 departamentos públicos como guardiã

da  Constituição porque, para eles,  a  defesa  d a  Constituição

está ligada  a  riscos menores. Esse ponto  d e  vista  d o  menor

risco também

  n ã o

 pode

  ser

 justificado

 p o r

  nenhum "guardião

d a

  Constituição".

2 5

  M O H L ,  R .

  Die

  Verantwortlichkeit

  der

  Minister,  1 8 3 7 . p . 1 8 , 5 7 5 ;

D A H L M A N N .  Politik  (3 . Auf l. 1847),  p ,  L97-198; BLUNTSCHLL

Allg. Staatsrecht,  B d . 2 , 4 .  Aufl. ,  1 8 6 8 , p .  552/553; GÉNY  in:

EISENMANN, Charles.  La  justice Constitulionelle  et La  Haute

Cotir Constitutionnelle d'Autriehe,  Paris  1 9 2 8 , p .  44/45,

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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L i m i t e s o b j e t i v o s   d e   t o d a   q

j u s t i ç a j u r i s d i ç ã o p e n a l   n o j

c a s o

  d e

  d e l i t o s p o l í t i c o s

c o n t r a   o   E s t a d o   e a t

C o n s t i t u i ç ã o , a c u s a ç ã o   ^

m i n i s t e r i a l )   j

U m a

  outra questão independente versa acerca

  do que a

justiça pode fazer, e m  geral, para  a  proteção  d a  Constituição  e

d o  quanto  é  possível organizar,  em seu  território, instituições

especiais, cujo sentido

  e

  finalidade sejam

  a

  segurança

  ou a

garantia

  d a

  Constituição.

  O

  fato

  d e

  primeiramente

  não se ter

feito essa evidente pergunta  n o  período  d o  pós-guerra, tendo-

se em  vista quase  q u e  exclusivamente  u m a  proteção judicial

d a

  Constituição

  (a ser

  exercida

  por um

  tribunal

  d o

  Estado)

  e

procurando-se,

  c o m u m a

  inofensiva naturalidade,

  o

  guardião

d a  Constituição  n a esfera d a  justiça, pode  se r  explicado  a pa r -

t ir de várias razões. Primeiro  p o r  causa  d e u m a  idéia  m a l c o m -

preendida

  e

  abstrata

  d o

  Estado

  d e

 Direito.

  E

  natural conceber

a

  resolução judicial

  d e

  todas

  a s

  questões políticas como ideal

d o  Estado  d e  Direito  e ,  nisso,  não ve r , com uma  expansão  da

justiça  a u m a matéria talvez  n ã o  mais sujeita à ação  d a justiça,

q u e

  esta

  só

  pode

  ser

  prejudicada, pois

  a

  conseqüência seria,

como mostrei muitas vezes tanto para  o  direito constitucional

quanto para o internacional, não , po r exemplo, umajur idicização

d a  política,  e , s im, uma  politização  d a  justiça. Contudo,  u m

método conseqüentemente formalístico

 é

  superior

  a

  tais dúvi-

das e ,

  pura

  e

  simplesmente, irrefutável, porque trabalha

  c o m

ficções abstratas  e , por  isso, irrefutáveis.  N ã o  mais haverá  d i-

ficuldades  e dúvidas objetivas  se  todas  as  diversidades objeti-

v a s  puderem  ser  descuradas,  se as  diversidades objetivas  en -

PRlMIilRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

t re

 Constituição

 e

 norma constitucional,

 lei no

 sentido

 d o

 concei-

to de lei no

 Estado

  d e

 Direito

  e lei no

  sentido

 d o

 conceito

  de lei

formal, isto  é ,  político, puderem  ser  ignoradas, assim como  a

diversidade entre  lei e  sentença judicial  ou a diferenciação f u n -

damental d e Triepel entre decisão d e litígio e conciliação d e inte-

resses.

1

  T ã o  logo  se  transforme  o  direito  e m  justiça  e ,  depois,

novamente  se  formalize a justiça  a o  denominar  d e  justiça tudo

que fo r

 feito

 p o r u m a

  autoridade judicial,

  o

 problema

 d o

 Estado

d e

 Direito estará rapidamente solucionado

 e o

 mais simples seria

se deixassem definir as diretrizes d a política pela boa-fé do tribunal

d o

 Reich,

 a fim de

 ultimar

 o

 Estado

 d e

 Direito

 no

 sentido formal.

Talvez  u m a  parte  d a  naturalidade,  c o m a qual  se exige  u m

tribunal  d e  Estado dotado  d e u m a  competência ilimitada,  se

baseie

  e m

  tais confusões conceituais.

  M a s

  disso

  n ã o

  resulta

u m a  instituição concreta  e  dever-se-ia evitar  a  referência  a o

"Estado  d e  Direito", dessa forma,  u m  tanto quanto ingênua.

Apenas

  c o m o

  termo Estado

  d e

  Direito nada

  se

  decide

  a res-

peito

  d e

 nossa questão. Instituições muito diferentes

 e

  contra-

ditórias pod em ser demandadas invocando-se o Estado d e Direi-

to. Po r

 exemplo,

 o

 direito

 de

 exame judicial acessório

 é

 apresentado

p o r  conceituados autores como  o  único método  d o  Estado  d e

Direito, combatendo-se intensamente  u m  tribunal  d e  estado

especial, haja vista

 q u e

 este

 te m q u e

 conduzir, necessariamente,

a u m a

  restrição

  d o

  direito

  d e

  exame geral

  e

 concentra,

  e m u m

único posto,  u m controle difuso, exercido  p o r  toda  a magistra-

tura

 d o

 Estado, pelo

  qu e

 pode

  ser

 mais facilmente concebido

 e

influenciado politicamente. Nesse contexto, Hugo PreuB fala

a té mesmo  e m  "fazer d o bode  o jardineiro",

2

 enquanto  H .  Stoll

1

  Streitigkeiten zwischen Reich  und  Làndern,  Berl iner Fes iga be

f ü r W .

  Kahl, TUbingen

  1 9 2 3 . p .

  19-20.

2

  N a

  comissão constitucional

  d a

  assembléia nacional

  d e

  Weimar,

protocolos  p .  483-484: "Agora querem  o s  senhores eleger  u m a

alternativa (frente

  a o

  direito

  d e

  exame judicial geral)

  a o

  privarem

o  tribunal  d o  direito  d e  exame,  m a s , e m  compensação, cr iando

u m  tribunal  d e  exceção  ( ) q u e  pode entrar  e m  atividade  c o m o

r e q u e r i m e n t o

  d e 1 0 0

  m e m b r o s

  d o

  p a r l a m e n t o . E s t a

  é u m a

regulamentação, pela qual  —  queiram  m e  desculpar  o s  membros

1

  PRIME IRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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LIMITES OBIETIVQS

  D E

  T O D A I U S TI Ç A .

Í 5

diz : "É o

 pleno direito

  d e

 exame judicial

  q u e

 primeiro coroa

 o

Estado d e Direito." " D a mesma maneira, como juízos adminis-

trativos independentes oferecem exame

  e

 proteção contra

  abu -

sos do  Estado administrativo, órgãos independentes  t êm que

fiscalizar

  o

 Estado como legislador."

5

 N o

 século

 XIX , fo i

 exigida,

freqüentemente  com as  mesmas expressões  d o  Estado  de Di -

reito,

  a

 responsabilidade ministerial judicial,

  que s e

  acreditava

ser a  chave  d e  abóbada  e a  suprema coroação  da  Constitui-

ção . "A

 responsabilidade jurídica

 d o s

 ministros, segundo Gneist,

4

conclui, como último complemento,

 o

 Estado

 d e

 Direito"

 ou "a

responsabilidade ministerial jurídica  não é só a  chave  de abó -

d o  parlamento  - a té um  certo limite, faz-se  d o  bode  o  jardineiro

(...). Isto

  n ã o é u m

  complemento pela proteção legal

  q u e s e

  retira

d e

  todo cidadão

  a o

  privar

  o

  juiz ordinário

  d e u m a d e

  suas mais

importantes tarefas." Muito interessante também

  é a

  exposição

seguinte: "Outra coisa

  é se os

  senhores,

  s e m u m a

  determinação

  d e

exclusão,

  ( . . . )

  quiserem conceder

  a u m

  determinado número

  d e

membros

  d o

  parlamento

  a

  possibilidade

  d e

  levar

  a

  julgamento

  tal

questão

  (d a

  constitucionalidade material

  d e u m a l e i ) .

  Isso poderia

s e r  j u s t i f i c ado  s o b o  aspecto  d e q u e ,  rea lmente ,  ta l  prova  d a

constitucionalidade

  s ó

  raramente ocorreria." Esse erro

  d e

  Preuss

explica-se pelo fato  d e q u e e l e n e m  quis  e n e m  previu  a  enorme

expansão  d o s  chamados direitos fundamentais. Contra  a  chamada

solução austríaca (vista anteriormente)

  e

  contra

  a

  tuCeia

 d o

  tribunal

d o

  Reich (vide  acima nota

  1 3 )

  evidente

  n o s

  projetos presentes,

d e

  modo especialmente enfático: MARX,

  F .

  Morstein.

  Id . p . 116-

117,139-140.

3

  IHERING.  Jahrbücher  7 6 , p . 2 0 0 , 2 0 1 , Ju r .  Wochenschri ft  1 9 2 6 ,

p . 1 4 2 9

  (nota sobre

  a

  sentença

  d o

  t r ibunal

  d o

  Reich

  de 4 de

novembro

 d e 1 9 2 5 ;

 todavia, aqui intervé m Stoll

  e m

 prol

 d o

 "mod elo

austríaco"), além disso

  n a

  coletânea

  d e

  NIPPERDEY.

  Grundrechte

und

  Grundpflichten

  der

  Deutschen,  B d . I H . ,

  Berlin

  1930 , p . 187 .

D a

  mesma forma, MARX, Morstein.

  Id . p .

  151-152: "Nada menos

d o q u e a

  legalidade

  d o a t o

  legislat ivo,

  a

  forma judicial

  do a to

legislat ivo

  é

  realizada pela irrestrita competência judicial para

exame  n a v i a  legal comum.  É sd a partir  d a í q u e  temos  a conc lusão

d o  Es tado  d e  Direi to." ADLER,  F.  Verfassung  un d  Richieramt,

Z. f . b .  Recht,  B d . X  (1930),  p . 120 ,  considera  o  direito  d e  exame

uniforme geral como sendo

  o

  natural, enquanto

  a

  concentração

e m u m a

  instância especial como sendo

  u m a

  "solução artificial".

Der  Rechtsstaat,  Berlin

  1872 , p . 175 .

VRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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2 6

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

bada d a  responsabilidade d o funcionário público,  m a s d o Esta-

do de  Direito  e m  geral,  é a  mais alta garantia  d a situação jurí-

dica pública,  sem ele, a Constituição  e o s direitos constitucio-

nais estão entregues  a qualquer abuso  d e poder  e  todo  o direito

público  de um  povo permanece  u m a

  lex  imperfecta

".

5

  M as , a

seguir, será logo mostrado  q u e ,  segundo todas  a s  experiências,

é

 justamente

  a

 responsabilidade ministerial judicial

  q u e ,

 frente

à

 política,

  é

  bastante insignificante

 e d e

 pouco interesse

  e que ,

p o r

  meio

  de tal

  estrutura judicial,

  o

  remate

  e a

  conclusão

  d o

Estado

  d e

 Direito

  se

  tomam problemáticos

  n a

  mesma medida

em que a

  estrutura judicia l

  se

  aperfeiçoa. Dessas experiências

históricas

  e d a

  ambigüidade

  do

  termo "Estado

  d e

  Direito"

  re-

sulte  e m u m a  referência abstrata  " a o "  Estado  d e  Direito  que

seria melhor  se não se  realizasse  e se, em vez  disso, fossem

empregados conceitos  e  diferenciações  d e u m a  teoria consti-

tucional concreta.

Abstraindo-se  a  equivocidade  e a  comodidade  d o  termo

Estado  d e Direito  e , mais, abstraindo-se  a difundida necessida-

d e d e u m a  centralização  e  concentração  d o  direito  d e  exame

difuso, aplicado na Alemanha p o r numerosos tribunais superio-

res, há  talvez ainda  u m a  outra explicação,  e mais interessante,

para

  o

  fato

  de se

  querer, hoje, transformar

  e m

  guardião

  d a

Constituição

 u m

 tribunal

 q u e

 decide judicia lmente . Exigindo-se

u m

  guardião, espera-se, naturalmente,

  u m a

  determinada

  p r o -

teção

  e se

 parte

  d a

  idéia

  d e u m

  determinado risco

  que vem de

u m a

  determinada direção.

  O

  guardião

  n ã o

  deve

  se

  proteger

abstrata  e  simplesmente,  mas , s im, se  proteger contra riscos

b e m  definidos e  temidos concretamente. Enquanto antigamen-

te, no  século  XI X , o  risco provinha  d o governo,  o u  seja, vinha

d a esfera d o  "executivo",  a preocupação s e dirige, hoje, sobre-

5

  SCHULZE.  Preufiisches Staaisrecht,  2 .  Aufl., Berlin 1888-1890,

B d . I I , p . 9 0 5 ;

  c o n c o r d a n d o

  c o m e l e ,

  P I S T O R I U S .

  Der

Staatsgerichtshof

  und die

  Ministerveranlwortlichkeit nach

heutigem Deutschem Staaisrecht,  Tiibingen  1 8 9 1 , p . 2 0 9 . R .  Mohl

d i z n o

  prefácio sobre

  a

  responsabilidade

  d o s

  ministros (1837):

" U m a l e i

  sobre

 a

 responsabi lidad e ministerial parece para

  a

 maioria

como  a  chave  d e  abóbada  d a  construção estatal constitucional."

-  PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIA  D A  CONSTITUIÇÃO

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A S O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I R Ã O

de que , na  democracia,  a  maioria decide  e de que a  minoria

derrotada

  só se

  enganou sobre

  sua

  verdadeira vontade,

  t a m -

b é m

  pode

  s e r

  convertida

  em seu

  inverso.

  M a s n ã o

  importa

como seja, aquela mudança

  d e

  função

 d o

  regulamento

  da nor -

m a  constitucional  é  sempre seguida, naturalmente,  p o r u m a

mudança  da  concepção  d o  guardião  da  Constituição. Enquan-

to no

  século

  X I X

  lutava-se, sobretudo,

  p o r

  proteção contra

  o

governo, tem-se

  e m

  mente hoje, freqüentemente, apenas

 a pro-

teção contra  a  legislação  p o r  parte  d a  maioria parlamentar.

Mas se o  risco para  a  Constituição emanar, doravante,  da es-

fera  d o  legislativo,  o  legislador  n ã o  pode mais  se r  guardião.

N ã o s e

  procurou

  o

  guardião

  n a

  esfera

  d o

  executivo, pois

  se

encontrava ainda  sob a  impressão  d a  secular luta constitucio-

n a l

  contra

  o

  governo.

  Mas se o

  guardião

  n ã o

  pertence

  nem à

esfera  d o  legislativo  n e m à d o  executivo, parece  n ã o  restar

mais nada  a não se r  mesmo  a  justiça.  E m  tais pensamentos

fica novamente claro

  o

  quão viva

  é ,

  também

  na

  Alemanha,

  a

teoria

  d a

  diferenciação

 d o s

  poderes

  c o m s u a

  usual tripartição.

Ela se

 liga aqui

  à

 tradição

 d o

 Estado

  d e

 justiça

 d a

 Idade Média ,

q u e  ainda continua  a produzir fortes efeitos, e  leva, dessa  m a -

neira,  às  "indiscutíveis" exigências  d e u m  tribunal soberano.

P o r

 conseguinte, deve

  ser

 primeiramente levantada

  a

 ques-

tão : o

 quanto

  é

 possível constituir

  o

 guardião

  da

  Constituição

dentro  d a  esfera  d a  justiça? Pode  a  função  d e u m  guardião

da  Consti tuição  se r ,  fundamental  e  geralmente, cumprida

judicialmente?

  E tal

  atividade, mesmo

  se seu

  exercício

  for

envolto

  p o r u m a

  aparência

  d e

  estrutura judicial,

  é , no

  caso,

ainda justi ça

  e a

 estrutura judicial algo diferen te

 d a

  enganosa

p. 81. Além  do  conceito "formal" de  monarquista acertadamente

comprovado

  por

  HENSEL,

  A.  AoR,  N. F. Bd. XV, p. 415

("Monarquista seria, então, aquele

  que tem uma

 opinião diferente

da  escola vienense"),  há  talvez também  um  conceito formal  de

democrata, construído analogamente,  A comprovação  de  Hensel

não é

 apenas "cômica",

  com a

  clareza

  da

  comicidade,

  ele

  atinge

o

  ponto essencial,

  que é

  exatamente

  o

  formalismo

  no

  direito

público  que  pode  ter um  sentido especificamente político;  cf.

também mais adiante neste livro.

— •

  PRIMEIRA PARTF,

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIA

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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U M I T t S O B J E T I V O S  D E  T O D A \ U S T \ Ç A ^

3 2 .

dissimulação  d e  poderes diferentes  e , em  todo caso,  d e  gran-

d e

  importância política?

Para responder

  a

  essas questões, interessam primeiro

  os

casos

 n o s

 quais

 u m a

 violação

 d e

 determinações

 d a

 norma cons-

titucional conduz a u m autêntico processo penal, civil ou admi-

nistrativo. N o caso d a jurisdição civil e administrativa, a proteção

judicial serve

  a o

  interesse jurídico

  d e u m a

  parte

  e à

 realização

d e  suas reivindicações.  N o  processo penal, devido  a  determi-

nados delitos,

 a

 alta traição

 e a

 outras ações puníveis,

 é a

 Cons-

tituição como

 u m

  todo

 qu e é o

 objeto

 d a

 tutela penal (diferente-

mente d e determinações constitucionais isoladas)  é o objeto d e

proteção

  da le i

  penal.

  O

  caráter político

  d e

  tais processos

  faz -

s e  valer  ao  serem introduzidas exceções  à  habitual competên-

c ia do  tribunal criminal. Para processos  d e  alta traição,

  e.g.,

  o

tribunal

  d o

 Reich

  é

  competente

  e m

  primeira

  e

  última instância

(L e i  judiciária alemã, artigo  134) . Alei  de 21 de julho  de 1922

para

  a

  proteção

  d a

  república (Diário oficial

  do

  Reich

  I, p.

5 2 5 ) , q u e  entrementes perdeu  su a  eficácia, introduziu  um tr i -

bunal

  d o

 Estado especial como tribunal

  d e

  exceção

  d e

 jurisdi-

ç ã o  penal política.  E m  outros Estados,  a  exemplo  d o  Senado

inglês,  é  competente  u m a  segunda câmara como tribunal  d o

Estado, segundo

  o

  artigo

  9° da

  norma constitucional francesa

de 24 de

  fevereiro

  de 1875,  e.g.,

  competente

  é a

  Segunda

  C â-

mara,  o  Senado,  q u e  pode  se r  constituído como tribunal (cour

de  justice

) para julgar

  o

  presidente

  d a

  república, ministros

  e,

além disso, para sentenciar sobre ataques  à  segurança  do Es -

tado (

attentats commis contre  la  süreté  de  1'Eíat).

  Mesmo

  n o

mais conseqüente Estado  d e  Direito  há nesses casos,  p o r  inte-

resse político, exceções  à  competência geral  d o s  tribunais  cri-

minais comuns.

8

  Apesar

  d e

  tais modificações, continua

  a ser,

aqui,  o  caso  d e  punição posterior  d e  culpa residente  n o  passa-

d o ,

  caso

  d e u m a

  justiça criminal repressiva

  e

  vindicativa.

  Tal

just iça criminal

  é u m a

 questão importante

 e

  significante

 e

 pode

8

  A  respeito,

  Verfassungslehre,

  p . 134 ,  assim como TRIEPEL,  H .

Bericht  vo m  Staatsrechtslehrertag  19 28 , id . p . 9 / 10 .

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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á a

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

se r  qualificada,  n o  sentido amplo  e  geral, como proteção  d a

Constituição. Apesar disso,

  c o m

  isso

  n ã o

  está solucionado

  o

problema  d o guardião d a Constituição, pois, devido  à estrutura

judicial  e judiciária,  a  proteção  d a  Constituição fica restrita  a

fatos típicos

 j á

  concluídos

  e

  passados, enquanto

  os

 casos

  ver -

dadeiramente interessantes  da  proteção constitucional perma-

necem fora

 d a

  abrangência judicial.

  T ã o

  logo

  s e

 realiza

 de fo r -

m a  conseqüente  a  juridicização  e se  elabora  u m  autêntico

processo contendo

  as

  devidas partes, essa proteção

  é ,

  essen-

cialmente, tão-só  u m a  correção  a  posteriori,  ha ja vista  q u e

apenas fatos típicos concluídos continuam

  a ser

  subsumidos

  a

determinações legais  e m  questão.

Nesse aspecto,

  é

  instrutivo

  o

  destino

  d o s

  tribunais para

queixas ministeriais.  Benjamin Constant,  u m  defensor liberal

dessa instituição, ainda

 e ra

  totalmente consciente

  d a

 particula-

ridade  e d a  anormalidade  d e u m a  queixa ministerial.  Em sua

famosa obra sobre

  a

  responsabilidade ministerial (1815),

  e le

f a z  alusão  ao  fato  de que a le i a  respeito  d a  responsabilidade

ministerial

  n ã o

  pode

  se r "nem

  precisa

  e n e m

  detalhada",

  e n -

quanto  q u e , p o r  motivos ligados  a o  Estado  d e  Direito,  se tem

q u e

 exigir para

 o

 direito

 e

 processo penais

 u m a

 clara subsunção.

" É

  uma lei

 política,  cuja natureza  e  aplicação  t ê m ,  inevitavel-

mente, algo

  d e

 discricionário."

9

  P o r

  isso, também teria

  que ser

competente  u m  tribunal  d e  tipo especial,  ou  seja,  u m a  câmara

d e pares distinguindo-se  por sua  independência  e  neutralidade.

O  caráter  d e  publicidade  d a  discussão,  " l a  publicité  de la

discussion",

  ao

  mesmo tempo

  a

 essência

  e a

 idéia reguladora,

é o

  cerne

  d o

  pensamento liberal.

  O

  ministro

  n ã o

  poderia

  re -

clamar  d e q u e o s  asseguramentos para  a  proteção  do réu ,

como conhecidos pelo processo penal normal,

  não são

  aplica-

d o s  aqui,  já que e le  teria fechado  u m  contrato especial  com o

Estado,

  a

 cujo serviço

  e le

 entraria.

  Se sua

  ambição

  é

  satisfeita

pela alta  e  brilhante posição  de um  ministro,  e le  também teria

q u e

 assumir

  o

 risco

  de um

 processo político desse tipo

  e se ver

diante  de um  tribunal  que , amplamente, julgaria d e forma arbi-

9

  N o

  original

  e m

  francês.

  N. T .

,  PRIM EIR A PARTI:  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà L>A  CONSTITUIÇÃO

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LIMITES OBIET1VOS  D E  T O D A IUST1ÇA.

4 1

trária (

arbitraire

).

  " M a s a

  discricionariedade

  é n o

  sentido

  da

própria coisa."

10

 Ele é atenuado pela solenidade  da forma, pela

publicidade  da discussão, pela repercussão  na opinião pública,

pela distinção

  d o s

 juízes

  e

 pela particularidade

  d a

 pena." Essas

exposições  de um  clássico representante  d o  caráter  d e  Estado

d e

  Direito civil

  sã o

  aqui lembradas

  p o r

  mostrarem

  u m

  senti-

mento sensato pela particularidade  d o processo  e pelas dificul-

dades  d e u m a justiça política  e estarem  b e m distantes  de rudi-

mentares abstrações.

  M a s

  mesmo

  n o

  caso

  d e

  máximo respeito

à s

  particularidades

  da

  justiça política,

  o

  efeito politicamente

paralisante  da estrutura judicial  é  inevitável. Isso  fo i mostrado

pelas experiências  d o  século  X I X ,  pode-se mesmo dizer  que

foi a  experiência mais autêntica  n a  história constitucional  e o

cerne  d e  toda  a  luta  na  política interna entre  a  monarquia  ale-

mã e a  burguesia alemã  n o  século  X I X ,  pois,  n a s  monarquias

constitucionais alemãs,

  a

  responsabilidade ministerial judicial

tinha exatamente

 o

 sentido político

 d e

 evitar

  u m a

  responsabili-

dade política

 d o

 ministro

 e d e

 tornar,

 o

 máximo possível, inofen-

siva politicamente toda  a  "responsabilidade".

12

  A estrutura j u -

dicial  era o  meio seguro  d a  ineficácia política. Encontrava-se

consolo  ao se dizer  que o  tribunal  d o Estado cumpria  seu obje-

tivo quando

  sua

 existência conduzia

  a o

  resultado

 de nã o

 preci-

s a r  entrar  em  ação".

13

  Hoje, praticamente perdeu importância

o

  instituto

 d a

 responsabilidade ministerial judicial

 e o

  artigo

 5 9

1 0

  N o  original  e m  francês.  N .T .

11

  De la  responsabilité  des  ministres,  Paris

  1815 , p . 36 , 44 , 52

  entre

outras. Sobre  o  grande significado  d e  Benjamin Constant para  a

doutrina consti tucional  d o  Es tado  d e  Direito civil  e d o  sistema

parlamentar,  c f .  mais adiante neste livro.

12

  Verfassungslehre,  p . 33 1 .

1 3

  PISTORIUS.

  Id . p . 209 ; c f .

  também

  a

  observação

  d e

  Otto Mayer,

citada  n a  parte introdutória deste livro. Ademais, como sabido,

mesmo

  a

  responsabil idade judicial

  n a

  Prússia

  e n o

  Reich

  não fo i

real izada.

  M a s

  onde

  e la e ra

  regulamentada

  d e

  forma aplicável,

como  n a  maioria  d o s  Estados  d o  centro,  e la  podia,  s e m  esforço

e m

 conseqüência

  d a

  subordinação

  à

  liga alemã,

  s e r

  tornada ineficaz.

"Porém, desmoronou-se exa tamence aque la Cons t i tu ição  q u e

comprovou  a  responsabil idade mais eficaz  d o s  ministros,  a de

PRIMEIRA PARTI:  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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d a Constituição  d e Weimar, u m  resíduo  d o s embates entre  p a r -

lamento e  monarquia,  fo i diluído  o  fato e o objeto da  responsa-

bilidade  ao  determinar  que se  pode proceder  a u m a  acusação

em  virtude  d e u m a  violação culposa  não só da  Constituição  d o

Reich,  mas , a té  mesmo,  de uma le i do  Reich.

14

Para  u m a  melhor elucidação dessa experiência  n a  história

constitucional, atenhamo-nos  ao  caso mais importante  e  mais

discutido d e u m a contenda constitucional d o século X I X , o c o n -

flito prussiano  d e  1862-1866,  e  tentemos apreciá-lo  p o r  meio

d o  manual  d o professor Anschütz,  u m d o s  mais famosos  p r o -

fessores  d e  direito público  d a  Alemanha. Anschütz defendeu,

de  modo especialmente resoluto,  a  exigência  por um  tribunal

d o  Estado geral,

  i.e.,

  competente para

  todos

  os  litígios consti-

tucionais, como  u m a  exigência  d o  Estado  d e  Direito.

15

  Mas se

aplicarmos suas palavras  e  seus posicionamentos  ao  interes-

sante litígio constitucional  de 1862,  ter-se-á  o  seguinte como

resultado: segundo Anschütz,  é  "normal"  q u e u m  tribunal  d o

Estado  s ó  possa decidir questões  d e  direito  (e m  contraposição

a  questões políticas).  "Eu não  creio",  d iz e le , "que  ainda haja

algo  a  mais  a  observar sobre esse ponto".

16

  Contudo, sobre  a

questão  d a  qual trata  o  conflito constitucional prussiano,  se o

Kurhessen,

  n o a n o d e 1 8 5 0 s o b a s

  a r t imanhas

  d o

  parlamento

alemão"; THUD1CHUM,

  F .

  Pie  Minister Anklage nach geUendem

deutschem Recht  und  ihre Unrathlichkeit  in  Reichssachen,

Annaien

  d e s

  Deuischen Reiches,

  1885 , p . 668 .

u

  Sobre

  a

  crí t ica

  a o

  a r t igo

  5 9 ,

  vide,  sobre tudo, BINDI NG.  Die

staatsrechtliche Vercmtwortlichkeit

  ( Z u m

  Le b e n

  u n d

  Werden

d e r

  Staaten, Mllnchen

  u n d

  Leipzig

  1 9 2 0 , p . 4 0 8 ) : " É

  evidente

q u e  nessa queixa ministerial  n ã o  restou  n e m u m  á tomo  d e s u a

natureza

  de a té

  então, resultante

  d a

  co-autoria

  d o

  pacto entre

re i

  e povo."

  A

 força

  d e u m

  pensamento substancialmente jurídico,

sempre admirável

  e m

  Binding,

  é

  também comprovada nessas

expos ições sobre

  o

  Es tado

  d e

  Di re i to

  e

  atinge logo

  o

  ponto

essencial :

  a

  Constituição antigamente como contrato, hoje

  n ã o

mais como contrato.

n

  C f .

  nota

  13.

16

  Verhandlungen  des  Deutschen Juristentages  1926,  Berlin

  1927 ,

p. 13.

'  PRIMEI RA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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LIMITES OBIET1VOS

  D E

  T O D A I U S T I Ç A . . .

governo poderia continuar

  o s

  negócios

  s em u m a l e i

  orçamen-

tária,

 d iz e le

 literalmente

  em s eu

 manual

  (c f .

 Meyer-Anschütz):

" O

  direito público termina aqui,

  a

  questão acerca

  d e

  como

  se

deveria proceder

  n o

  caso

  d e

  inexistência

  d e u m a l e i

  orçamen-

tária  n ã o é u m a  questão  d e  direito."

17

  O q u e  então, segundo

Anschütz, poderia fazer  u m  tribunal  d o  Estado prussiano  o u

alemão q u e tivesse q u e decidir  a respeito daque le conflito cons-

titucional prussiano?  P o r u m  lado,  o tribunal d o Estado é restri-

to a puras "questões d e direito", p o r outro, o direito público t em

aqui  o seu  limite. C o m a ajuda d a s  exposições  d e Anschütz,  e m

viitude  de um  caso  tão  concreto  e  importante como  o d o co n -

flito constitucional prussiano  em 1 8 6 2 , n ão  provém nenhuma

possibilidade d e u m a decisão judicial.  M a s o valor de um  tribu-

n a l d o Estado desse tipo deve residir justamente  n o  fato  de que

todos  o s  litígios constitucionais  s ã o  formalizados  e  decididos

p o r  meio  d e  sentença judicial.  A  possibilidade  d e u m  nori

liquet",  j á  reconhecida  p o r R .  Mohl  a té  mesmo para  a  queixa

ministerial,

  e o

  "caso levemente possível"

  de que o

 juiz

  " t e m

q u e  declarar  o sentido  da lei co mo duvidoso", '

8

  n ã o s ã o absolu-

tamente considerados.  P o r  isso,  ta l concepção,  n o caso  d e  todo

conflito constitucional sério, conduz

  a

 dificuldades

 e

 contradi-

ções. Isso reside, mesmo,

  n a

  natureza

  d a

  coisa

  q u e

  dificulta

enormemente

  u m a

  ligação entre verdadeira justiça

  e

 verdadei-

r o

  litígio constitucional

  e q u e n ão s e

  repara

  ao se

  declarar

  a

corte constitucional como autorizada

  a

  estabelecer,

  por si, o

sentido duvidoso

  d e u m a

  norma constitucional.

Para  o  presente,  a  mesma  e  simples estrutura  d e  toda  d i-

vergência

  d e

  opinião política sobre condição

  e

  conteúdo

  d e

poderes  d e  direito constitucional  é  ilustrada  p o r  meio  d e u m

outro exemplo, embora

  d o

  mesmo tipo.

  P o r

 meio

  d e u m

  decre-

to de 18 de

 julho

  de 1930

  (

Diário oficial

  do

  Reich  I , p . 29 9) , o

presidente

  d o

  Reich dissolveu

  o

  parlamento alemão

  nos se -

guintes termos: "Depois

  d e o

 parlamento

  te r

 hoje decidido

  ex i -

1 7

  M E Y E R - A N S C H Ü T Z .

  Lehrbuch

  des

  Deutschen Staalsrechts

Miinchen uncl Leipzig,  1 9 1 9 , 7 .

  Aufl.,

  p . 906 .

18

  MOHL,  R .

  Die

  Verantwortlichkeit

  der

  Minister,

  18 37 , p . 185.

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà DA  CONSTITUIÇÃO  i—

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gir que

  meus decretos

  de 16 de

  julho, promulgados

  c o m

  base

no  artigo

  48

  da  Constituição  d o  Reich, sejam tornados  s e m

efeito, dissolvo o  parlamento  c o m base  n o  artigo  25 da Consti-

tuição." Então,

  n o

 decreto

  d e 2 6 d e

 julho

  de 1930

  (Diário  ofi-

cial  do  Reich

  I , p. 311),

  publicado

  c o m

  base

  n o

  artigo

  48, o

govemo

  d o

  Reich repetiu,

  e m

  grande parte, aqueles decretos,

cuja supressão fora exigência  d o  parlamento  o ra  dissolvido.

Entre

  a s

  muitas dúvidas

  e

  divergências

  d e

  opinião tocantes

  a o

direito constitucional

 q u e

 aqui redundam

  (e

 hoje, dezembro

 d e

1 9 3 0 ,  talvez ainda apenas alguns zelotes  d e u m  cego

normativismo exigirão  q u e  todas elas sejam decididas pelo  tri-

bunal

  d o

 Estado

  e m

 Leipzig),

  u m a

  pergunta pode

  ser

 especial-

mente importante:

  de se a

  aplicação

  d o

  artigo

  4 8 ,

  contida

  n o

decreto

  de 26 de

 julho

  de 1930 ,

  significa

 u m

  desvio

  e uma e l i -

minação inconstitucionais  a o  poder  d e  legislar  p o r  parte  d a

maioria parlamentar

  e se se

  pode falar

 c o m

  propriedade

  que o

parlamento

  não fo i

  capaz

  d e

  obter

  a

  maioria

  d o s

  votos, resul-

tando  e m  inação. Jsso,  n o  caso, depende,  por sua vez , se o

governo  f e z tudo para ganhar  u m a  maioria  - u m a questão alta-

mente discutida

 n o s

 jornais quotidianos

  e na

 agitada propagan-

d a eleitoral. Evidentemente,  n ã o

 é

 necessário, aqui, aprofundar

os

 argumentos relativos

  a o

 objetivo

 e à s

  flores

  d e

 retórica agita-

doras

  d a

  propaganda partidária.

  M a s a

  título

  d e u m

  indício

  ca -

racterístico, citam-se aqui

  o s

  seguintes posicionamentos

  c o n -

traditórios d e u m mesmo caderno d e u m a revista social-democrata

de

  nível especial.

  N o

  caderno

  8, ano 1, de

  "Neue Blatter

  fü r

d en

  Sozialismus" (agosto

  d e

  1930),

  d iz

  August Rahmann,

  n a

página 340, em u m artigo "Ofensiva civil contra o parlamento e

a

 Constituição":

 " O

 procedimento

 d o

 governo

 d e

 Brünig pode-

ria ser

  desculpado

  se ele

  fosse subjetivamente

  da

  convicção

d e q u e u m a

  maioria suficiente

  n o

  parlamento para

  o

  governo

n ã o  pudesse,  de  forma alguma,  ser  conseguida.  M a s , d e m a -

neira alguma,  ele  empenhou esforços  por ta l maioria  e m  dire-

ç ã o à

 esquerda, onde

  só lá

 podia

  ser

  obtida.

 A o

  contrário,

  d e s -

prezou

  e

  malogrou todos

  os

  esforços feitos pelo outro lado,

pelos social-democratas, esforços limítrofes quase  d a  abnega-

«

  PKÍMRIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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LIMITES OBIETIVQS

  D E

  T O P A [ US T 1Ç A .

4 5

ção. É

  totalmente inequívoco,

  ou o

  governo

  d e

  Brünig queria

apenas

  u m a

  maioria sustentada pela direita

  ou e la não

  queria

nenhuma. Como

  a

  primeira opção

  e ra

  inatingível,

  e le

  preferiu

s e r  governo minoritário  e ,  pelo abuso tático  d o  artigo  48 , per -

manecer  n o poder.  C o m  isso escapa  a possibilidade  d e  conce-

der ao governo  d e Brünig  a boa-fé de te r considerado objetiva-

mente como existentes

  o s

  pressupostos para

  a

  aplicação

  d o

artigo

 4 8 .

 Trata-se tão-somente

  d e u m a

  simples violação cons-

titucional.

M a s n o

  mesmo caderno encontra-se,

  n a

  página

3 7 4 , a

  seguinte declaração

  d e

  Eduard Heimann: "Porém,

  c o n -

sidero errado  se ,  como  n as  declarações oficiais d o s  social-de-

mocratas,  se  fala  q u e  seria possível  à  esquerda obter maioria.

( . . . ) Mas sem  partido popular  n ã o houve nenhum tipo d e  maio-

ria. Se  isso estiver correto, Brünig  n ã o tinha nenhuma escolha,

e le

  tinha

  q u e

 procurar

  u m a

 maioria

  d e

 direita

  e, no

 caso

  de um

fracasso, tinha

  q u e

  recorrer

  à

  dissolução

  d o

  parlamento

  ou ao

artigo

  4 8 . " S e

 forem possíveis tais divergências

  d e

 opinião

  so-

b re um

  fato ainda diretamente claro entre

  o s

  correligionários

d o  mesmo círculo  e d a  mesma revista, torna-se visível  - e só

essa comprovação  é a  finalidade  d a s  citações  - que , em  tais

posicionamentos tocantes  ao direito constitucional, sob o ponto

d e vista jurídico,  s ó pode continuar a se tratar d o

 quis judicabit,

i.e.,  da

 decisão

  e nã o da

  pseudonormatividade

  d e u m a

  estrutu-

r a

 judicial. Pela Const ituição vigente , dependendo

 d a s

 circuns-

tâncias, autorizado

  à

 decisão está

  o

 governo

  d o

 Reich,

  o

 presi-

dente

 d o

 Reich juntamente

 c o m o

 primeiro-ministro referendário

o u o parlamento d o Reich.  S e o parlamento realmente f o r inca-

paz de se r  governado  p o r  maioria  e  incapaz  d e  ação,  o u  seja,

n ã o estiver  e m  condições  d e  fazer  uso de seus poderes consti-

tucionais (p.ex., resolução expressa segundo  o  artigo  54 de

suspender  a confiança depositada  n o  primeiro-ministro  ou re-

solução segundo

  o

  artigo

  48, § 3

o

, d e

  exigir

  a

  ineficácia

  das

disposições publicadas segundo

  o

 artigo

  48 , § 2

o

) , um

  tribunal

também

  n ã o

  poderá suprir essa falta.

  A o

  invés

  d e a

  função

obter investidura constitucional fosse utilizado u m  tribunal,  in-

cumbido  d e  dirimir todas  as  dúvidas  e  divergências emergen-

te s , para  o  qual pudesse apelar  a maioria  e até mesmo  a mino-

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

  •

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O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

ria

  parlamentares,

  ma s que nã o

  fosse competente para outras

decisões,

  tal

  tribunal seria

 u m a

  instância política junto

  a o

 parla-

mento,

  a o

 presidente

 e a o

 governo

  d o

 Reich,

  e não se

 alcançaria

nada além  do que , sob os fundamentos d e decisão,  a publicação

ou a proibição d o s atos d o  governo  sob a aparência  d e estrutura

judiciária. Nenhuma ficção, mesmo

  que t ão

  forçada, poderia

impedir

 que t a l

 tribunal fosse considerado

 p o r

 cada

 u m u m a in s -

tância política  e como fosse avaliado. Então afloram, evidente-

mente,  as dificuldades e  contradições  a que  deve levar toda  re-

lação entre sérios conflitos constitucionais

  e a

 justiça real.

O

  caráter problemático dessa relação

  fo i

  exposto

  por R.

Smend

  (em seu

 livro "Constituição

  e

 Direito constitucional")

  e

H .  Triepel  (em seu  relato para  a  assembléia alemã  d e  profes-

sores

  d e

  direito público

  em

  1928).

19

  C o m

  base

  n a s

  experiên-

cias

 de a té

 então

 j á se

 pode alegar, para qualquer tribunal,

  u m a

alternativa

  simples,

  que , s e m

  mais,

  é

  evidente para queixa

ministerial  n o  tribunal  d o  Estado  e que  sempre  se  repete  nas

variadas realizações  d e u m a  "jurisdição estatal"  o u  "justiça

constitucional" fiscalizadoras

  d o

  legislador

  e d o

  governo,

  ou

existe

  u m a  evidente violação constitucional  a ser

  indubitavel-

mente comprovada, exercendo

  o

  tribunal, então,

  u m

  tipo

  re -

pressivo

  e

  vindicativo

  d e

 justiça

  e

 declarando,

  d e

  alguma

  f o r -

m a ,  alguém "culpado"  p o r  feitos passados,  ou  o  caso  se

encontra

 obscuro

  e

 duvidoso,

  seja

  p o r

 motivos reais, seja pela

necessária incompletude

  e

  amplidão

  d e

  toda Constituição

  e s -

crita,  e m  geral,  ou da característica  d a  segunda parte principal

d a  Constituição  d e  Weimar,  e m  especial,  n ã o  existindo, dessa

feita, nenhuma "questão

  d e

  direito pura"

 e

  sendo

  a

  decisão

  d o

tribunal diferente

 d e

 decisão judicial,  i.e.,  diferente

  d e

 justiça.

A

  lógica interna

 d e

  toda estrutura judicial pensada

  p o r

 comple-

to  leva inevitavelmente  a que a verdadeira decisão judicial  s ó

19

  S M E N D .  I d . p . 135 ;  Triepel  n a s  pub l i cações  d o s  professores

alemães

  d e

  direito público, caderno

  5 , 1929, p . 8 : "a

  essência

  d a

Const i tu ição encont ra-se ,  até um  certo grau,  e m  cont rad ição

c o m a  essência  d a  jurisdição constitucional"  ( " a t é u m  certo grau"

e m

  itálico

  n o

  original).

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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chegue  post eventum.  Caso  se  corrija essa desvantagem  m e-

diante  disposições transitórias

  do

  tribunal,  o juiz  se  verá  na

situação

  d e

  tomar medidas políticas

  ou de as

  evitar

  d e

 modo

  a

s e

  tornar politicamente ativo, tornando-se

  u m

  fator poderoso

d e

  política interna estatal

  e ,

  eventualmente,

  a té

 mesmo

  da po -

lítica externa;  su a  independência judicial  n ã o  poderá mais

protegê-lo d a responsabilidade política, s e ainda tiver q u e exis-

tir,

  afinal

  d e

  contas,

  u m a

  responsabilidade política.

20

  A

  inde-

pendência judicial perde

  seu

  embasamento constitucional

  nas

mesmas proporções  e m q u e s e  distancia  d o  conteúdo indu-

2 0

  Sobre  a  admissibil idade  d e  disposições transitórias  d o  tribunal

d o  Estado para  o  Reich alemão segundo  o  artigo  19:  GIESE,  Fr.

DJZ , 1 9 2 9 , p . 1 3 2 ; Giese considera "totalmente  s e m inconveni entes

ju lgar admiss ível  a  o rdem  o u  pro ib ição  d e  atos soberanos  d o

Reich  p o r  meio  d a disposiçã o transitória". Tamb ém afirmat ivame nte

H E I N S H E I M E R.  Jur.  Woch,  1 9 2 6 , p . 3 7 9 , L A M M E RS .  Id . p . 3 7 6 ,

SIMONS.  W .  Einleitung  zu  Lammers-Simons  11, p . 11 .  Diferen-

temente,  o  presidente  d o  tribunal  d o  Reich para finanças, JAHN.

Darf  der  Staatsgerichtshof einstweilige Verfügungen erlassenl

J u r .  Woch,  1 9 3 0 , p . 1 1 6 0 ,  especialmente  p . 1 1 6 2 :  "Aqui  se  trata

d e  tarefas  d o  governo  q u e  deve arcar  c o m a  responsabilidade";

e a p . 1163  (contrariamente  à  analogia  c o m o  artigo  9 4 4 d o C P C ,

segundo  o  qual,  e m  s i tuação  d e  emergência ,  o  pres idente ,  e m

v e z d o  t r ibunal , pode promulgar  u m a  disposição transitór ia) :

" C o m   isso estaria criado  o  direito  d e u m a s ó  pessoa  e m  decidir

autocraticamente  s e m  considerar  o  presidente  d o  Reich,  o s  minis-

tros,  o  par lamento  d o  Reich,  o s  parlamentos estaduais. Isso  n ã o

m e  parece compatível  c o m a s  concepções  d e u m a  Constituição

democrática  ta l qual criada  e m  Weimar". Sobre  a prática  d o  tribunal

d o  Estado para  o  Reich alemão: decisão  de 17 de  novembro  d e

1 9 2 8  (Jurisprudência civ i l  do  Reich  1 2 2 ,  a n e x o  p .  18-19,

L A M M E R S - S I M O N S  I , p .  156/157) :  O  Tr ibuna]  d o  Estado

reivindica para  s i  esse poder,  m a s  deve-se observar  q u e $ e  tratava

aqui  d e  pretensões pecuniárias. Aparentemente,  a  admissibilidade

d e  disposições transitórias  é  aprovada,  a  pr incípio,  n a  decisão

d e 1 0 d e  outubro  d e 1 9 2 5  (Jurisprudência civil  do  Reich  1 1 1 ,

anexo  p .  21-22 . LAMMERS-SIMONS  I , p . 2 1 2 ) :  considerando  a

possibil idade  ( e p o r  segurança)  d e u m a  execução,  e c o m o  interes-

san te argumento :  " M a s  para  o  f a to  d e q u e a  p r o m u lg ação  d e

disposições transitórias deva  s e r  excluída, nada existe" (consi-

derando-se mais  d e  perto, isso  é  apenas  u m , p o r q u e  não?).  P o r

outro lado, existe  u m a  série  d e  recusas  d o s  pedidos  d e  disposições

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIA

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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4 8

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

bitável

  d a s

  determinações

  da

  norma constitucional.

  É

  inevitá-

vel que a  justiça, enquanto permanecer justiça, sempre chega

tarde politicamente

  e

  ainda mais quando

  a

  forma

  d o

 processo,

n o Estado  d e  Direito,  fo i minuciosa  e cuidadosa, mantido  sob

o s

  auspícios

  d e

  jurisdição.

  N o

  caso

  d e

  violações constitucio-

nais indubitáveis,  q u e , em u m  Estado cultural,  n ã o  serão roti-

neiras, esse fato leva,  n o  caso mais favorável,  à  punição  d o

culpado

 e às

 compensações

 p o r u m a

 injustiça existente

 n o p as -

sado. E m casos duvidosos , toma-se visível a desproporção entre

a

 independência judicial

 e seu

 pressuposto,

 a

 rigorosa vinculação

a uma le i que  contém  em s i  vinculações materiais.

Isso

  é

  comprovado

  n ã o

  apenas pelo desenvolvimento

  d a

queixa ministerial,  m a s  também  p o r outras experiências práti-

cas . Ainda será falado abaixo  (4

o

 ponto deste capítulo) sobre  a

especificidade de um  tribunal  d o Estado, n o caso  d e u m a orga-

nização federal,

 e

  sobre

 o

 tribunal

  d o

 Estado para

  o

 Reich

  a le -

m ã o , segundo o artigo  19 da Constituição d o Reich. O princípio

geral

  q u e

  sempre

  se

  impõe para

  a

 relação entre proteção cons-

titucional  e justiça, distingue-se, e m  toda parte, na realidade d a

vida política. Destarte, correções

  e

  modificações

  s ão

  inevitá-

veis

  n a

 estrutura judicial, mesmo

  n o

  Estado

  d e

 Direito

  o

  mais

conseqüente  e mais honesto,  tão logo  se faça valer u m respeito

à

  Constituição.

  Se já no

 direito tributário mostrou-se necessá-

r io determinar  que, na  interpretação d as leis tributárias, devam

ser

 "consideradas

  s u a

 finalidade,

 s u a

 importância econômica

  e

transitórias: resolução

  de 23 de

  outubro

  d e 1 9 2 9

  {Jurisprudência

civil  do  Reich  126 ,  anexo  p. 1/2;  LAMMERS-SIMONS  I I , p. 72) ,

aqui

  j á u m a

  restrição fundamental: "apenas

  c o m

  grande reserva

  e

s ó e m

  casos excepcionais"; especialmente importante

  a

  resolução

de 13 de  julho  de 1929  (LAMMERS-S1MONS  I I , p. 98) : o  tribunal

d o

  Estado

  n ã o

  pode frustrar,

  p o r

  meio

  d e

  disposição transitória,

  a

publicação  de  leis deliberad as  e , sobretudo,  a declaração  n a  decisão

de 17 e 18 de

  julho

  d e 1 9 3 0

  (Jurisprudência civil  do  Reich

  vol .

129 ,

  anexo

  p . 31) "de que o

  tribunal

  d o

  Estado também

  n o

  futuro,

como  a t é  agora, fará  u s o d o  recurso  d e u m a  ordem provisória  com

extrema cautela

  e

  reserva .  Aliás, nesta decla ração encon tra- se

também dito expressamente

  q u e ,

  nessas disposições transitórias,

trata-se  d e  conciliação  de  interesses,  n ã o d e  jurisdição.

•  PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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U M I T | |

=

^ | E T | ^ S

=

D Ê

=

T O ^ ^ y ^ ^ .

4 2

a  evolução  d a  situação"  (§ 4

o

 d o código Fiscal d o Reich), então

n o direito constitucional  é  ainda menos possível  n ã o  levar  em

conta

  o

  objeto concreto.

  P o r que , em

  qualquer Estado, para

delitos como

  a

  alta traição

  o u o

  ataque

  à s

 bases

  d o

 Estado,

  há

divergências  n o  tocante  à  competência  d o s  tribunais penais

ordinários  e ou é declarado como competente  u m  supremo  tri-

bunal  e m primeira  e última instância  ou a té mesmo  é instituído

como tribunal  d e exceção  u m  tribunal  d o  Estado especial para

a proteção d a segurança  do Estado?

21

  C o m q u e direito é restrin-

gida  o u eliminada  a competência para exame  do s  tribunais  or-

dinários

 pOT

 meio

  de um

 tribunal

  d o

 Estado

 o u

  constitucional

 e

c o m q u e

  direito

  é

 dado

  o

 poder apenas

  a

  determinados cargos

políticos (governo, parlamento, entre outros. Artigo

 13, § 2

o

, da

Constituição

  d o

  Reich apenas

  à

  "competente" autoridade

  c e n -

tral

  d o

 Reich

  ou do

  estado)

  d e

  instaurar

  o

 processo perante

  tal

tribunal

  d o

 Estado

 o u

  constitucional?

32

 P o r que o

 respeito espe-

cial

  a

  questões

  d e

 utilidade

  é

  razoável

  e

  inevitável como,

  e.g.,

acontece  n a  esfera  d o  direito fiscal  d o  estado  da  federação

entre  a  competência  d o  tribunal  d e  finanças  d o  Reich  e a do

conselho  d o  Reich?

23

  Por que na l e i do  Reich  de 30 de  agosto

de 1924 (o  chamado plano Dawes) estava prevista, frente  à

decisão  do  tribunal para assuntos  d a  companhia ferroviária d o

Reich,  a  possibilidade  d e o  governo  d o  Reich  ou a companhia

2 1

  C f .  anteriormente neste livro.

2 2

  Segund o projeto alemão

  de 1926 (

D J Z

, 1926 , co l . 842) , o

 parlamen to

d o  Reich,  o  conse lho  d o  Reich  o u o  gove rno  d o  Reich devem

poder apelar para  a decisão d o  tribunal d o Estado . Outros exemp los

e m

  "Verfassungslehre",

  p . 137 .

  Sobre

  o

  sentido puramente político

dessa restrição  a o  direito  d e  queixa  e c o m  crítica muito notável,

c f .

  MARX, Morstein.

  Id . p . 116

  et seq.

2 3

  Artigo  6 da le i da  compensação f inanceira  d e 2 7 d e  abril  d e 1 9 2 6

{Diário oficial

  do

  Reich  I , p . 20 3)

  entre

  o

  Reich,

  o s

  Estados

  e os

municípios.  N o  caso  d e  divergências  d e  opiniões entre  o  ministro

d a s

  f inanças

  d o

  Reich

  e u m

  governo estadual

  n o

  tocante

  à

  questão

se u m

  dispositivo fiscal estadual  é

  compatível

  com o do

  Reich,

a  q u e s t ã o  é  dec id ida pe lo t r ibuna l  d e  f i n a n ç a s  d o  R e i c h  a

requerimento  d o  ministro  d a s  finanças  d o  Reich  o u d o  governo

estadual. Competente

  é o

  grande Senado

  n a

  composição prevista

« o  artigo  4 6 , § 2

o

,  alínea  1 , do  código fiscal d o  Reich.  O s  preceitos

PRIMEIRA PARTF

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

  • - - -

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ferroviária

  d o

  Reich apelar para

  u m

  árbitro quando

  u m

  deles

achava

  que a

  realização

  d a

  decisão judicial ameaçava

  o

  servi-

ço de juros e d e amortizações d a s obrigações c o m reparações?"

S e,  frente à  decisão  de um  tribunal  d e  exceção, como  o  tribu-

n al

  para assuntos

  da

  companhia ferroviária

  d o

  Reich, tais

  co r -

reções possam

  s e

  tornar necessárias

  p o r

  motivos

  d e

  utilidade

d a  política externa,  não são  elas, pelo menos, igualmente  n e -

cessárias frente

 à

 decisão

  de um

  tribunal encarregado

  d e

  deci-

dir

  sobre todos

  os

  litígios constitucionais

  d o

  Reich alemão?

  E

se são  necessárias, j á não se  renuncia  c o m  isso  a o  princípio  d a

estrutura judicia l ilimitada?

Enquanto

  o

 difícil problema

  e ra

  tratado

  c o m u m a

 concreta

consciência

  d e

  direito constitucional,

  fo i

  sempre evitado falar

d e u m a

  geral "jurisdição estatal"

  o u

  "justiça constitucional".

Sieyès, considerado  o pa i dessas idéias, falava apenas  e m u m

jury constitutionnaire

,

  d e u m a  magístrature constituíionelle

q u e  deveria  se r  aplicada para  a  proteção  d a  Constituição  c o n -

tra violações constitucionais. Nesse aspecto,  e le dizia  q u e essa

magistratura nada seria

  na

  esfera

  d o

  executivo

  e d o

  governo,

pormenorizados ficam reservados  à  especial regulamentação legal.

E m  contrapartida,  a  questão  se  impostos estaduais  o u  municipais

s ã o

  apropriados

  a

  prejudicar

  a s

  a r recadações

  d e

  impos tos

  d o

Reich

  e se

  preponderantes interesses

  d a s

  f inanças

  d o

  Reich

  se

opõem  à  arrecadação  d e  impostos,  é  decidida pelo conselho  d o

Reich  a  requerimento  d o  ministro  d a s  f inanças  d o  Reich  ou do

governo estadual . Ademais ,

  o

  minis t ro

  d a s

  f inanças

  d o

  Reich

pode apresentar

  a o

  tr ibunal

  d a s

  f inanças

  d o

  Reich, para  apre-

ciação

, que stõe s l igadas  à  exegese  d a s  leis tributárias (artigo

4 3 d o  código fiscal  d o  Reich).

2 4

  Art igo  44 , § 3

o

, da lei do  Reich sobre  a  companhia ferroviária

estatal alemã  d e 3 0 d e  agosto  d e 1 9 2 4 ,

  Diário oficial  do  Reich  II,

p . 2 7 2 :  caso  o  governo  d o  Reich  o u a  companhia creia  q u e , n a

r e a l i z a ç ã o

  d a

  d e c i s ã o

  d o

  t r i buna l ,

  o

  s e r v i ç o

  d e

  j u r o s

  e de

amor t izações

  d a s

  obr igações

  c o m

  reparações seja ameaçado,

cada  u m a d a s  partes pode apelar para  o  árbitro (artigo  4 5 )  dentro

d e u m  prazo  d e u m m ê s  con t ado  a  par t i r  d a  p romulgação  d a

decisão. Após

  a lei do

  Reich

  d e 1 3 d e

  março

  d e 1 9 3 0

  (Plano

Young), esse parágrafo, assim como

  o

  artigo

  4 5 , f o i

  eliminado

  d o

Diário oficial  do  Reich  I I , 193 0 , p . 36 4 .

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIA  D A  CONSTITUIÇÃO

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LIMITES QBIETIVOS  P E  T O D A I U S TI C A .

n e m n a esfera d o  legislativo, pois seria,  s im , uma magistratura

constitucional.  E le não a  denomina expressamente  d e justiça,

dando, antes,  a  perceber  que e le a  considera  u m a  parte  d o

poder legislativo constitucional

 o u q u e ,

 pelo menos,

 a

 conta para

o

  exercício desse poder.

25

  N o s

  planos constitucionais suíços

deste tempo,

  q u e

  falam

  de um

  tribunal

  d o

  júri velando sobre

  a

Constituição, trata-se igualmente

  d e u m a

  queixa contra viola-

ções constitucionais cometidas.

26

  C o m o fato d e u m sénat  con-

servateur  s e  transformar  e m  guardião  d a  Constituição  na s

constituições napoleónicas,  j á é  novamente abandonada  a es-

fera  d a justiça  e feita competente  u m a  instância legislativa  ou

consultiva.

  O s

  representantes

  d o

  Estado

  d e

  Direito liberal,

  e m

especial Benjamin Constant

  e

 Guizot, permanecem cientes

  dos

limites naturais

  d a

 justiça

  e se

 exprimiram

  a

 respeito

  c o m u m a

precisão epigramática, Constant

  n a s

  exposições citadas ante-

riormente sobre queixa ministerial, Guizot

  c o m a

  frase

  de que

hoje,  n a Alemanha,  não se  pode parar  d e  repetir  que , no  caso

d e  tais juridicizações,  " a  política  n ã o t e m  nada  a  ganhar  e a

justiça nada  a perder".

7

  O s professores  d e direito constitucio-

na l na  Alemanha liberal  d o  século  X I X  intencionados  com o

Estado

 d e

 Direito,

 e m

 especial Mohl, Bluntschli

  e

 Gneist, vêem

o

  problema

  e m

  grandes

  e

 sistemáticas relações objetivas, para

eles,

  a

 mais segura garantia

 d a

  Constituição

  ou é a

  corporação

legislativa (como representante

  d e

  formação

  e

  posse)

  ou a

cooperação entre monarcas hereditários

  e

  duas câmaras.

28

  D e

resto, eles

  se

  interessam, principalmente, pela queixa ministe-

rial  -  naquela época  o único instrumento  d e u m a  responsabili-

dade ministerial

  é ,

  segundo

  se d iz , "a

  chave

  d e

  abóbada

  d a

2 5

  Comprovações

  e m

  BLONDEL, André .

  Id . p .

  174-175.

2 6

  A  respeito,  c f . H I S , E d .  Ceschichte  des  neueren Schweizerischen

Staatsrechts,  B d . 1 ,

  Base)

  1 9 2 1 , p .

  196/202.

27

  Des

  conspirations

  et de la

  justice politique, BrUssel  1846 , p .

1 0 1 . N o  confl i to entre  o  presidente  d o  tribunal  d o  Reich,  Dr .

Simons,  e o  governo  d o  Reich, essa frase também  s e  confirmou,

infe l izmente ,

  n o

  aspecto pessoal.

2S

  C f .  mais adiante.

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

construção estatal constitucional"" - ou pelo direito  d e exame

judicia] perante decretos reais, porém, também aqui, evitam-se

ficções superficiais d e absoluta estrutura judicial.

30

 Mais tarde,

na

  segurança

  d o s

  anos antecedentes

  à

  guerra, permitiu-se

  u m

formalismo barato

  e que

  simplesmente negava

  o s

  problemas

M

  M O H L ,  R .  Verantwortlichkeit  d e r  Miníster,  1 8 3 7 ,  prefácio:  " U m a

le i  sobre responsabilidade ministerial parece  à  maioria como  a

c ha ve

  d e

  a bóba da

  d e u m a

  construção es ta ta l consti tucional ,"

3 0

  M O H L ,

  R .  Verantwonlichkeil

  der

  Miníster,  p . ex . , p . 15

  (crítica

à

  solução saxónica

  q u e

  transforma

  o

  tribunal

  d o

  Estado

  e m

  árbitro

e

  intérprete),

  p . 187 (da

 desculpa devido

  a

 situação

  d e

 emergência),

e t c . :

  além disso,

  n a s

  observações sobre

  a

  Constituição francesa

d e

  J848 ,

  Staatsrecht, Vólkerrecht

  und

  Politik, Monographien

I , p .  561-564 (Tübingen 1860),  p . 5 6 2 : " N ã o  importando como  u m

t r ibuna l

  d o

  Estado se ja ordenado

  e a

  responsab i l idade de te r -

minada, fica

  e m

  todo caso claro

  q u e a l e i

  me ra me n te

  s ó

  pode

garantir

  u m

  tra tamento f irme

  e

  jus to após

  u m a

  exigida vitória

contra

  u m

  ataque

  d e

  a l ta t ra ição." BLUNTSCHLl.

  Id . II , p . 550-

5 5 1 ; c f .

  também

  a

  citação mais adiante.

  Gneist,

  parecer

  p . 23 :

nenhum exame minucioso

  d e

  infrações contra princípios gerais

d a

  Consti tu ição. Refere-se

  à

  ju r isd ição admin is t ra t iva

  a

  frase

inequívoca

  d e

  Gneist: "Para todo artigo constitucional entra

  n o

lugar

  d a

  interpre tação

  a

  ju r isd ição"

  (

D e r

  Rechtsstaat

,

  1 8 6 7 , p .

1 7 5 ) ;

  ademais, Gneist manifestou pouca confiança

  e m u m

  tribunal

constitucional  o u d o  Estado ocupado  p o r  funcionários d e  carreira;

c f . s u a

  declaração

  n a

  reunião

  de 9 de

  fevereiro

  d e 1 8 6 6

  (relato

estenográfico,

  p . 1 3 0 ) d a

  câmara

  d o s

  deputados prussiana: "Pelo

q u e e u  c onhe ç o  d a  h is tó r ia ,  o  f u n c i o n a l i s m o  d e  ca rre i ra  n ã o

suportou  u m a  única  v e z a  prova quando  s e  quis colocar sobre

o s  ombros  d e  a lguns homens  d e  conf iança toda  a  ques tão  d a

constitucionalidade  d e u m  governo  e m  pleno poder Mesmo  n a

Ingla terra ,  u m  corpo  d e  ju ízes , e s tando  e m  bri lhante posição

igual  a d e  ministros, cercado pelos colegas  d e u m a  brilhante,

independente advocac ia

  d e

  nobre cará ter ,

  n ã o

  supor tou

  u m a

única  v e z t a l  prova  d e  poder, como  a q u e  deve  s e r  feita aqui

todos

  o s

  dias.

  E e m

  nossa pobre situação

  d e

  func ioná r io

  ( . . . )

sete homens desse tipo deveriam proferir

  a

  sério

  u m a

  sentença

judicial imparcial sobre essa questão

  q u e s e

  encontra entre

  o s

minis tros

  e o s

  acusadores

  d o s

  min is t ros?

E u

  nunca escondi

  o

fa to

  d e q u e

  todo

  o

  grande colegiado

  d o

  superior tribunal

  e m

seus seis

  o u

  sete Senados quase

  n ã o

  seria forte

  o

  suf ic ien te

  -

s e  t ivéssemos  q u e  criar leis  — para fo rma r  c o m  seus membros

fixos  u m  tribunal  d o  Estado".  O q u e  Thudichum  d iz a  respeito

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITl/IÇAO

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LIM ITES O BIETIV O S

  D E

  T O D A I US T I Ç A .

objetivos.

  M a s t ã o

  logo, novamente, eclodiam concretos anta-

gonismos políticos, despertava concomitantemente a consciência

para

 o

  fato

 d e q u e

 toda estrutura judicial encontra-se vinculada

a estreitos limites e quando,  no ano de 191 9 , fo i feita a tentativa

d e

  decidir

  c o m

  tais recursos

  a

  questão

  d a

  culpa pela guerra,

fez-nos lembrar Erich Kaufmann ,  e m u m  impressionante estu-

do , dos

  limites

  da

 justiça

  n o

 Estado

  d e

  Direito.

91

d o  "caráter impuro"  d a  queixa ministerial  ( Id . p .  637/638)  j á  é

f ru to  d e  outro espírito. HAENEL,  A .  Deutsches Staatsrecht,  B d .

I  (1892),  p . 5 6 2

  et seq

.,  trata  d a  jur isdição federal ,  n o  caso  d e

litígios constitucionais dentro

  d o s

  Estados-membros,

  n o

  contexto

sistemático

  d a

  "manutenção

  d o s

  Estados"

  ( e n ã o d a

  administração

d e  justiça).

31

  Vntersuchungsausschuss

  und

  Staatsgerichtshof,  Berlin  1 9 2 0 ,

p .  83-84, sobre  o  concei to  d o  processo judicial.

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

  •

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E s t i p u l a ç ã o n o r m a t i v a   d o o

c o n t e ú d o   d e u m a   n o r m a   ^

c o n s t i t u c i o n a l d u v i d o s a

  e m p

s e u   c o n t e ú d o   é , n o   c a s o ,  ^

n o r m a c o n s t i t u c i o n a l   e n ã o < ;

j u s t i ç a   C J

Para responder  à pergunta fundamental d a  teoria constitu-

cional deve-se repetir, aqui, mais

  u m a v e z q u e n ã o h á

  Estado

d e

  Direito

  s e m u m a

  justiça independente,

  n ã o h á

  justiça inde-

pendente s e m vinculação material a um a le i e nã o há vinculação

material à lei se m diversidade objetiva entre le i e sentença judi-

cial.  O Estado d e Direito civil baseia-se jus tamente  n a diferen-

ciação objetiva entre diversos poderes. Pode-se rejeitar

  a

 dife-

renciação

  d o s

  poderes devido

  a

  tendências absolutistas, como

usual  n a  teoria  d o direito público  d a  monarquia constitucional

alemã,  e  pode-se, também, deixar  a o jui2  u m a  certa liberdade,

mas não se lhe pode outorgar  a decisão política,  que é  assunto

d o

  legislador,

  s e m

  alterar

  seu

  posicionamento

  d e

 direito públi-

co . Não se

  refuta tampouco

  a

  diferenciação fundamental

  e n -

tre

  legislativo

  e

 justiça

  c o m o

 fato

  de se

  forçarem designações

imprecisas (divisão  d o s  poderes, repartição  d o s  poderes)  e m

seu

  sentido literal,

  ou ao se

  referir

 a

  dificuldades

  d a

  delimita-

ç ã o e m

  seus pormenores,

  a

 possibilidades

  d e

 entrecruzamento

d e

  limites

  o u

 coisa semelhante,

 ou , po r f im , ao

  lembrar

  que, ao

invés

  d a

 usual tripartição (legislativo, executivo

  e

 justiça),

  são

também possíveis outras divisões e diferenciações. Como acer-

tadamente proferido  p o r  Larnaude,

1

  h á  tantas diferenciações

d e

  poderes quanto

  o

 número

  d e

 Estados.

  M a s a

  variedade

  n ã o

1

  Revue politique

  et

  parlementaire

  1 2 6  (1926),  p . 186.

PRIMEIRA PARTI:  - A  JUSTIÇA COMO CilJARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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comprova

  que nao há em

  absoluto diferenciação alguma

  ou

que se

  teria

  o

  direito

  d e

  menosprezar todas

  a s

  diversidades

entre legislativo e justiça. Ainda continua  a valer para o Estado

d e

 Direito civil

 q u e u m

 Estado

 s e m

 diferenciação objetiva entre

legislativo, executivo (governo

 e

 administração)

 e

 judiciário

 n ã o

tenha " u m a Constituição" n o sentido d o Estado d e Direito civil.

2

N o

 Estado

  d e

 Direito, existe justiça somente como senten-

ça judicial

  com

  base  em u m a le i . A fórmula " c o m base  e m u m a

le i" ,

  empregada

  d e

  maneira típica

  p o r

  todas

  a s

  constituições

alemãs desde

 o

  século

 X IX , é d e

 importância primordial para

  a

organização d o Estado d e Direito civil. N o s  últimos anos,  c h a -

m e i

  freqüentemente

 a

  atenção para esse fato

  e

 mostrei

  o

  nexo

sistemático.

2

  Para  o  âmbito  de  todas  as  constituições  ale-

mãs, a fórmula  não tem  nenhum significado inferior  {mes-

mo se

  tiver

  um

  outro)

  à

 fórmula

  do

  d u e  process  of law  para

o  direita constitucional anglo-saxônico.  Também

  é

  resulta-

d o

 dessa fórmula

  que se

  deve diferenciar entre

  lei e

  sentença

judicial  e ,  conseqüentemente, também entre legislador  e juiz.

P o r  múltipla  q u e  seja  a  realização  d e diferenciação d o s  pode-

re s nos

  vários Estados, permanecerá

  a

  diferenciação desses

poderes

  e às

 divisões organizacionais

  d e

  suas funções corres-

ponde

  u m a

  diversidade objetiva

  d e

  atividade,

  a o

 menos para

  a

regulação normal  d a competência.  Uma le i não é uma  senten-

ça

 judicial,

 u m a

 sentença judicial

 n ão é um a le i , e , s im ,

 decisão

de um  "caso"  c o m  "base  em uma le i " . A posição especial  d o

juiz

 n o

 Estado

 d e

 direito

 - sua

 objetividade,

 seu

 posicionamento

acima  d a s partes,  su a  independência  e sua  inamovibilidade  —

baseia-se  n o  fato  de que e le decide justamente  c o m  base  e m

uma lei e de que sua

  decisão,  em seu  conteúdo,

  é

  derivada

  d e

u m a outra decisão d e modo mensurável  e calculável j á  contida

2

  Verfassungslehre,

  p . 127 .

3

  Verfassungslehre,

  p . 152 .

  Unabhãngigkeit  der  Richter, Gleichheit

vor dem  Gesetz  und  Gewahrleistung  des  Privateigentums nach

der  Weimarer Verfassung,  Berlin  1 9 2 6 , p .  17/18.  JW . 1 9 2 6 , S . 2 2 7 1

( m a l

  interpretado

 e m

 GRAU,

  R ,

 Der

  Vorrang

  der

  Bundeskompetenz,

Festschrift  f ü r  Heinitz,  1 9 2 6 , p . 4 0 3 ) .

  PRIMBI RA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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E S T I P U L A Ç Ã O N O R M A T I V A

  D O

  C O N T E Ú D O

  D E U M A

  N O R M A ,

SlL

na lei . Se,  excepcionalmente,  o s  órgãos legislativos percebe-

r e m , n a s

  formas

  do a to

  legislativo, outras funções

  que não as

do a to

 legislativo, pode-se qual ificar isso, então,

 d e

 "legislação

formal", como, analogamente,  se  pode também falar  de um

conceito formal  d e  justiça quando  u m a  repartição judicial  de-

clarada competente

  se

  torna ativa, dessa maneira, ultrapas-

sando  o  território objetivo  d a  justiça. Porém, isso ainda  não

permite

  as

  inversões

  de um

  formalismo inócuo

  q u e

  simples-

mente inverta  as coisas  e qu e  classifique d e jurídica aquilo q u e

o legislat ivo realize n a forma d e legislação, tudo como justi ça  o

q u e u m

  tribunal

  f az .

 Esse tipo

  d e

  lógica

  se

 processa,

  e m

  contí-

nuas trocas, d a seguinte maneira : jus tiça é o qu e um juiz fa z, ou

seja, tudo  o que um juiz  fa z é justiça,  o juiz  é independente, ou

seja, todo pessoa  que é  independente  é u m  juiz, assim, tudo  o

q u e u m  órgão independente  f a z sob a proteção  de sua  indepen-

dência

  é

 justiça,

  p o r

  conseguinte,

  só se

 precisa fazer

  com que

todos  o s litígios constitucionais  e divergências  d e  opiniões  se-

j a m

  decididos

  p o r

  juízes independentes

  e

  tem-se

  u m a

  "justiça

constitucional". Nestes tipos

  d e

  conceitos formais tudo pode

s e r  imputado  a todos, tudo pode  se tornar justiça,  m as , do m es -

m o

  modo, tudo pode

  s e

  tornar "norma"

  e

  estabelecimento

  d e

normas  e , po r f im , tudo pode  s e tornar Constituição.

4

 A organi-

zação constitucional transmuta-se

  e m u m

  mundo

  d e

  ficções

ilusórias

 e a

 ciência jur ídica

 n o

 campo

 d e

 exercício

 de um

 modo

d e pensar,  a o qual Hofacker afixou  o  nome  d e  "lógica  das per -

n a s d o

  ganso".

5

4

  " P o r  meio  d e  mediaçao  d a  idéia  d a  forma constitucional", como

Kelsen  s e  exprime (relato  p . 38) .

5

  Segundo  o  s i logismo  d o  qual graceja Schopenhauer:  o  homem

t e m

  duas pernas, assim, tudo

  q u e t e m

  duas pernas

  é u m

  homem,

então,  o  ganso  é u m  homem,  e t c . ;  "Gerichtssaal XCIV",  p . 2 1 3 /

2 1 4 , Arch.f

  Soz.

  Wissenschaft  X X I , p . 1 8 / 1 9 ( a

  re forma

  d a

  função

jurídica), Diário administrativo

  d o

  Reich,

  1 9 3 0 , p . 3 4 .

  Sobre

  a s

devastações feitas  p o r  esse tipo  d e  lógica  n a  doutrina  d o  conceito

de le i , c f .  Verfassungslehre,  p .

  143-144. Sobre

  o

  problema geral

teór ico- jur íd ico, deve-se a inda observar  o  segu in te :  n o  caso

n ã o

  existe nenhuma outra

  a n ã o s e r u m a

  justiça vinculada

  à lei.

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO  » -

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O  G U A R D I Ã O  P A  C O N S T I T U I Ç Ã O

P o r

  conseguin te , deve-se pe rsevera r

  n a

  d ivers idade ob je t iva

en tre leg is lação

  e

  ju s t i ç a

  e n ã o s e

  pode cons t ru i r nenhuma

"gradação un iversa l"

  d a

  Consti tu ição para

  a

  decisão judic ia l ,

como empreendido

  p o r

  Kelsen (Relato

  p . 3 1 - 3 2 e 4 2 ) . O q u e o

ju iz  f a z c o m  base  em uma i e i , é  regulamentado,  e m se u  conteúdo,

pela

  le i e ,

  ass im, a lgo essencia lmente diferente

  d e

  legislação

" c o m  base  n a l e i  (constitucional)"-  A  expressão  " c o m  base  n a

l e i "

  perde

  s e u

  sentido especifico

  d e

  Estado

  d e

  Direito quando

ela é

  aplicada, dessa forma,

  a

  outras relações materiais diferentes

e

  tornada "universal". Utilizando-se

  d e u m a

  imprec isão linguística,

pode-se dizer

  q u e o

  leg is lador

  f a z

  suas leis

  " c o m

  ba s e "

  n a s

determinações  d a  norma constitucional  q u e o  fazem legislador,

o

  parlamento, p.ex.,

  c o m

  base

  n o

  artigo

  6 8 d a

  Constituição,

  q u e

o  Primeiro-Ministro define  a s  diretrizes  " c o m  base"  n o  artigo  5 6

d a

  C o n s t i t u i ç ã o

  e q u e o

  p re s ide n te

  d o

  Reich toma medidas

dita toria is

  " c o m

  ba s e "

  n o

  art igo

  4 8 d a

  Cons t i tu ição .

  D e

  tais

instruções

  d e

  competências

  e

  "poderes"

  n ã o é

  possível nenhuma

der ivação concre ta

  d o a t o

  es ta ta l , como pensado

  n o

  caso

  d a

aplicação judicial  da l e i  e  d a  decisão  " c o m  ba s e "  e m u m a l e i .

Q u a n d o

  o

  ju iz ,

  c o m

  base

  e m u m a

  de te rminação

  da l e i

  penal,

condena  o réu à  pena  d e  reclusão,  a  sentença  q u e  determina  a

prisão

  é

  de r ivada ,

  e m s e u

  con teúdo ,

  d a l e i p o r

  me io

  d e u m a

subsunção  d o  caso  a s e r  dec id ido , correspondente  a o  t ipo,  a

u m a

  no rma

  q u e

  poss ibi l i ta

  u m a

  subsunção correspondente

  a o

tipo  e q u e j á  define antecipadamente, dentro  d e u m a  determinada

esfera (pena

  d e

  reclusão),

  o

  con teúdo

  d a

  sentença. Quando

  o

Primeiro-Ministro

  d o

  Reich

  f a z u m a

  aliança

  c o m a

  Rússia

  " c o m

base"  n o  artigo  5 6 d a  Constituição,  o u  quando  o  presidente  d o

Reich,

  " c o m

  base"

  n o

  artigo

  4 8 ,

  ordena

  u m a

  "ajuda para

  o

  leste",

a  aliança russa  o u a  ajuda para  o  leste  n ã o  é  derivada,  e m se u

conteúdo

  e p o r

  meio

  d e

  subsunção correspondente

  a o

  tipo,

  d a s

dispos ições

  d a

  norma consti tucional constantes

  n o

  art igo

  5 6

o u 4 8  como aquela pena  d e  reclusão  d a  norma  da le i  penal.  É u m

abuso de ixar mis tura r

  a

  d i f e re nc i a ç ã o e n t re in s t ruç ã o

  d e

competências  e  normalização material, justificar  a s  mais variadas

proposições, ordens, regulamentações, poderes

  e

  decisões

  c o m

a

  palavra "norma"

  e ,

 onde

  se

  trata

  d e

 justiça,

  n e m

  mais diferenciar

entre "normas" sujeitas

  e a s

  não-sujeitas

  à

  ação

  d a

  justiça.

  É da

essência

  da

  decisão judicial poder,

  e m s e u

  conteúdo,

  s e r

  derivada

d a norma basilar e qu e a norma q u e vincula o juiz , vincula realme nte

d e

  forma mensurável

  e

  calculável,

  n ã o

  apenas conferindo poderes.

U m a  m a r g e m  d e  ação para conce i tos inde te rminados pode

permanecer,

  mas se a

  norma

  s e

  tornar

  t ã o

  ampla

  e

  vazia

  a

  ponto

d e n ã o

  mais

  s e r

  poss ível

  u m a

  s ubs unç ã o c o r re s ponde n te

  a o

tipo  o u , s e  houver apenas  u m a  instrução  d e  competências, deixará

,  PRIMKIR A PARTE  -  A.  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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Todo  o  despropósito desse tipo  d e  lógica  que se passa  e m

u m a estranha mistura d e abstrações  s e m  fundamento e metáfo-

ra s

 fantasiosas revela-se

 n o

 problema

  d o

 guardião

 ou

 garantidor

d a  Constituição.  U m a l e i n ã o  pode  se r  guardiã  d e u m a  outra

lei. A lei mais fraca n ã o pode, obviamente, guardar  ou garantir

a

  mais forte.

 M a s ,

  inversamente,

  p o r

  exemplo, deve

  a lei

  difi-

cilmente emendável guardar

  a lei

  ordinária?

  C o m

  isso, tudo

seria transformado

  em seu

  oposto, pois

  se

  trata

  d a

  proteção

  e

d a guarda  da norma constitucional,  mas não da le i ordinária,  e

o

 problema

  é

 exatamente proteger

  a lei

 dificilmente emendável

contra alterações

 po r u m a l ei

  ordinária.

  O

 problema

  n ã o

 surgi-

ria,  caso  u m a  norma pudesse  s e  autoproteger normativamente.

que a l e i

  c omo

  t a l

  poderia

  s e r

  "ob je to"

  d e u m

  processo

  e m v e z

d e

  base para

  a

  decisão processual.

  P o r

  haver leis

  c o m

  fo rça

  d e

vigência mais forte

  e

  mais fraca

  e u m a

  norma constitucional

  s e r

emendável apenas

  s o b a s

  d i f icu l tadas condições

  d o

  art igo

  7 6

d a

  Constituição, enquanto

  u m a l e i

  ordinária pode

  s e r

  revogada

o u

  emendada

  p o r u m a l e i

  ordinária posterior, pode-se falar,

  c o m

u m a

 cert a razão,

 d e

 normas mais fortes

 o u

 mais fracas, "superiores"

e

  "inferiores".

  A

  expressão

  é

  útil

  e n ã o é

  equívoca, desde

  q u e ,

c o m e l a ,

  se jam designados apenas aqueles diversos graus

  d e

alteração

  e

  revogabilidade. Transforma-se

  e m u m a

  metáfora

  f a n -

tasiosa, caso  se  fale, então,  d e u m a  geral "hierarquia  d a s  normas"

e ,  nesse quadro,  s e  misturem três  o u  quatro tipos variados  d e

superioridade

  e

  subordinação,

  a

  "superioridade"

  d a

  Constituição

sobre  a  totalidade  d a  vida estatal,  a  "superioridade"  da le i  mais

forte sobre  a  mais fraca,  a  "superioridade"  da l e i  sobre  a  sentença

jud ic ia l  e  atos  d a  aplicação legal,  a  super io r idade  d o  superior

sobre  o  subordinado.  C o m  razão,  h á  apenas  u m a  hierarquia  d e

seres concretamente existentes,  u m a  superioridade  e  subordinação

d e  instâncias concretas.  U m a  "hierarquia  d a s  n o r m a s "  é u m a

antropomorfização  d a  "norma",  s e m  espírito crítico  e  ametódica,

e u m a  alegoria improvisada.  S e u m a  norma  é  mais difícil  de se r

a l t e r a d a

  d o q u e a

  outra , isso, então,

  s o b

  todos

  o s

  aspec tos

imagináveis ,

  é

  logicamente , juridicamente

  e

  soc io log icamente

algo diferente

  d e u m a

  hierarquia,

  u m a

  instrução

  d e

  competências

n a

  norma constitucional encontra-se

  e m u m a

  relação

  d e

  autoridade

públ ica super io r

  n o

  tocan te

  a o s

  a tos publicados pelo posto

competente (pois

  u m a

  normatização

  n ã o é u m a

 autoridade pública)

e , c o m  maior razão,  a lei  ordinária  n ã o é o  subordinado  da lei

dificilmente emendável.

'

  P R f M R I R A

  PARIE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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E S T I P U L A Ç Ã O N O R M A T I V A  D O  C O N T E Ú D O  D E U M A  N O R M A . . .  a i

U m a norma vige mais forte, mais fraca ou tão fortemente quanto

u m a

  outra norma, entre

  as

  normas

  sã o

  possíveis contradições

e

  colisões

  q u e

  devem

  s e r

  solucionadas

  d e

  alguma forma,

  u m a

norma pode repetir

  u m a

  outra norma

  em seu

  conteúdo,

  e la

pode  lhe dar também  u m novo e fortalecido tipo d e validade  (é

o  caso quando  u m a l e i ordinária  é  repetida como norma cons-

titucional),  u m a  norma pode introduzir novas conseqüências

jurídicas, ameaças

  d e

  punição,

  e t c .

  ("sanção fortalecida")

  e

sempre podem

  ser

 criadas normas mais fortes

 e

 mais dificilmen-

te emendáveis. M a s enquanto tudo transcorrer normativamente,

n ã o  será possível alcançar  u m a  proteção  e u m a  garantia ainda

mais forte

 p o r

 meio

  d e u m a

 norma suprema

  e

 mais forte, ainda

q u e constitucional. N a pergunta pelo guardião d a Constituição,

trata-se  d a  proteção  d a norma  a mais forte perante  u m a  norma

mais fraca. Para  u m a lógica normativa  e formalística, isso  n ã o

representa  e m  absoluto  u m  problema,  a  validade mais forte

n ã o

  pode

  se r

  ameaçada

  ou

  colocada

  e m

  risco

  p o r u m a

  mais

fraca

 e o

 direito constitucional formalístico novamente termina

também exatamente onde  o problema objetivo começa.

S e a

 justiça constitucional fosse

 u m a

 justiça

 d a

 norma cons-

titucional sobre

  a lei

 ordinária,

 a

 justiça

 d e u m a

 norma enquan-

to tal  projetar-se-ia sobre  u m a  outra norma.  Mas não há ne -

nhuma justiça  d a  norma sobre  u m a  norma, pelo menos  não,

enquanto

  o

 conceito

  d e

  "norma" manter

  u m a

  certa precisão

  e

a

  palavra

  não se

  tornar simplesmente

  u m a

 expressão

  c o m d ú -

zias

  d e

  entradas secundárias, laterais

  e

  traseiras,

  o u

  seja,

  u m

veículo  de ambigüidade ilimitada, para  o que e la se presta,  to -

davia, primorosamente.  Já há  muitos anos, Otto Mayer adver-

tira insistentemente contra

  o

  abuso

  e a

  confusão

  d a

  palavra

"norma".

6

  Infelizmente inultilmente. Caso contrário,

  a

  noção

d e  justiça constitucional como  u m a  justiça  d e  normas sobre

normas  n ã o  seria possível.  Se com a  palavra "justiça constitu-

cional " deve  se r designado  u m  tipo  d e justiça  que é determina-

da

  somente pelo tipo

  da lei

  utilizada como embasamento

  d a

6

  Verwaltungsrecht

  I . 3 .

  Aufl. , J924,

  p . 84

  nota.

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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decisão, então todo processo civil decidido c o m  base n o artigo

131 ou 153 da

 Constituição

  d o

  Reich

  é

 justiça constitucional.

O u  será  que a Constituição (mais precisamente,  a  norma cons-

titucional singular) deve

  ser

  objeto

  d o

  processo?

  Uma le i que

serve  d e  base para  a  decisão processual  não é  objeto  d o p r o -

cesso,

  m as

  justamente embasamento para

  a

  decisão.

  O u

  será

q u e s e deve imaginar  a norma constitucional personificada  na

figura

 d o

 juiz

  e a lei

 ordinária personifi cada

 n a

 figura

 d a

 parte?

Assim,  a particularidade  d a  "justiça constitucional" residia  e m

se r uma

 norma tanto juiz, quanto parte, quanto embasamento

para  a decisão  ser , por f im, a té  mesmo como teor  d a  decisão,

u m

 processo singular, cuja construtibilidade

 só vem

 provar tudo

o que se  pode fazer  c o m a  palavra norma quando  as  abstra-

ções

  se

  tornam metáforas

  e a

  "universalidade"

  d o s

  conceitos,

por f im, só

  reside

  n o

  fato

  de que as

  abstrações vazias

  e sem

fundamento se confundem d a mesma forma como,  e m u m jogo

d e

  sombras,

  a

  sombra

  d e u m a

  figura passa através

  d a

  sombra

d e u m a  outra figura.

A  aplicação  d e u m a  norma  a u m a outra norma  é algo  q u a -

litativamente diferente

  do que a

 aplicação

  d e

 unia norma

  a um

fato  e a  subsunção  d e u m a l e i a u m a  outra  le i (se é que é

imaginável) algo essencialmente diferente

  d o q u e

  subsunção

d e u m

  tipo legal regulamentado

  à sua

 regulamentação.

  Se for

averiguada  u m a  contradição entre  a lei  ordinária  e a  norma

constitucional

  e a lei

  ordinária declarada como nula,

  não se

pode denominar como aplicação  d a  norma constitucional  à lei

ordinária  n o mesmo sentido como o é a apl icação judicia l da lei

a o

  caso concreto.

  N o

  primeiro caso, comparam-se umas

  n o r -

m a s a s  outras  e ,  quando  d e  colisões  e  contradições possíveis

p o r

 diversos motivos,

 u m a

 norma suprime

  a

 outra.

  N o

 segundo

caso, quando d a aplicação judicial d a lei a u m determinado fato,

u m

 caso concreto

 é

 subsumido

 aos

 conceitos gerais

 (e ao

 "tipo"

legal). Quando  u m a norma constitucional determina  que as fa -

culdades teológicas serão mantidas (artigo

  149, § 3

o

, d a

 Cons-

tituição d o Reich)  e uma le i ordinária,  e m  oposição, determina

que a s

  faculdades teológicas serão eliminadas, então

  é

  aplica-

  PRIMEI RA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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E S T I P U L A Ç Ã O N O R M A T I V A  D O  C O N T E Ú D O  D E U M A  N O R M A .

6 3

ç ã o d a

 norma constitucional manter

  a s

 faculdades teológicas

  e

aplicação

 da lei

 ordinária eliminá-las. Isso

 n ã o

 poderá

  s e r

 facil-

mente contestado.  E m  ambos  o s  casos existem  u m a  aplicação

da lei a um  fato  e a  decisão,  e m  ambos  o s  casos,  é  obtida  d a

mesma forma mediante

  a

  subsunção correspondente

  a o

  tipo

de lei . Em  contrapartida,  se o conteúdo  d e u m a d a s  leis  é c o n -

frontado c o m o conteúdo  da outia,  s e u m a  colisão  ou contradi-

ç ã o é averiguada  e se  surge  a questão sobre qual  d a s  duas leis

contraditórias entre  s i deve valer, então regras gerais  s ã o c o m -

paradas umas  à s  outras,  mas n3o  subsumidas  ou  aplicadas.  A

decisão

  de que uma ou a

 outra

  d e

  ambas

  a s

  regras gerais deva

valer,

  não se

  realiza

 p o r

 meio

  d e

 subsunção correspondente

  a o

tipo

  d e u m a d a s

  regras

  à

  outra.

  O q u e

  deveria, então,

  ser

subsumido

  em ta l

 caso?

  S e u m a d a s

  leis ordena

  o

 contrário

  d a

outra

  lei e a

  contradição

  é

  decidida pelo fato

  de que uma de

ambas

  as

  prescrições contraditórias vale

  e a

  outra

  n ã o

  vale,

n ã o h á

  subsunção

  d e

  nula

  à

  válida

  ou da

  válida

  à lei

  nula.

  N o

exemplo citado  h á  pouco,  o  "tipo" legal  d e  ambas  a s  normas

que se  contradizem  -  faculdades teológicas  — é  exatamente  o

mesmo. Assim,  não se pode dizer  qu e as faculdades teológicas

d a

 norma constitucional seriam subsumidas

  à s

  faculdades

  teo-

lógicas  da lei ordinária. Tampouco,  n a  solução  da contradição,

u m a d a s prescrições opostas  é  subsumida  à outra  e "a ela  apli-

cada". Seria absurdo  se  concluir  q u e h á  subsunção quando

ocorre

  a

  "supressão"

  o u

  quando

  se

  "conserva" algo

  o u

  vice-

versa. Esse claríssimo caso

  d e u m a

  colisão

  d e

  normas mostra,

assim,

  que a

  primazia tipicamente judicial

  d a

  decisão judicial

obtida

  p o r

 subsunção correspondente

  a o

 tipo

 n ã o

 existe

  de for -

m a

  alguma

  n a

  decisão

  d e u m a

  colisão

  d e

  normas.

  Não há em

absoluto subsunção, sendo apenas averiguada

  u m a

  contradi-

ção e ,  depois, decidido qual  d a s  normas  que se  contradizem

deva valer  e  qual deva permanecer "fora  d e  aplicação".

7

1

  C f .

  comentário feito anteriormente

  a

  respeito

  d a

  "não-aplicação".

A  "contradição"  d e u m a d a s  normas  e m  relação  à  outra

  é

  também

diferente  d a  ' ' contrad ição"  e m  re lação  a u m a  norma verificada

e m u m a  sentença judicial  a  f av o r  d a  "cu lpa" .  S e u m a  norma

determina  q u e  você  n ã o  deve matar  e o  juiz comprova  q u e X

1'RJMFIRA  PA RTF. - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO  »

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6 4

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

Se nos  ativermos  a este simplíssimo caso  d e u m a

  evidente

contradição entre norma constitucional  e lei  ordinária,  não te-

remos  a  idéia  d e falar, aqui,  d e u m a  justiça  da  norma constitu-

cional sobre

  a lei

  ordinária.

 A

 única justiça possível

  em tal

 caso

seria justi ça penal vindicativa, devido

  a u m a

  violação constitu-

cional cometida contra  o  autor  d o  delito,  mas não  contra  u m a

norma.  M a s o  interesse prático  e m u m a  decisão  a respeito  da

colisão  d e  leis  não se  dirige,  e m  geral,  a  tais casos  de uma

contradição manifesta

 que , em

 tempos normais,

 n ão

 serão muito

freqüentes,

  ne m a uma

  posterior correção

  d e

  infrações perpe-

tradas

  n o

  passado,

  mas à

  pergunta

  d e

  tipo

  b e m

  diferente acer-

matou,  a  contradição  à  norma comprovada  c o m  isso  é  u m  outro

tipo  d e  contradição diferente  d a  contradição entre  a s  duas normas

q u e s e  contrar iam, você  n ã o  deve matar  e  você deve matar.  A

comprovação sobre  o que X  aqui  f e z é um  homicídio  e a  outra

comprovação sobre  u m a d a s  normas determina  o  contrár io  d a

outra norma,  n ã o  podem  s e r  colocadas, lógica  e  juridicamente,

dentro  d e u m a  categoria comum  e  "universal". Pode  se r que um

ponto  d e  vista normativo tenha desejado aplicar, aqui,  o  método

d e  duplicações fictícias,  o  qual  lhe é  geralmente característico

p o r n ã o  falar  d a  coisa, apenas  d e  suas sombras formalísúcas.  D a

mesma forma como  o  normativo conduz  a o  fato  de se  imputar  à

val idade  d o  contrato concreto  a  val idade  d o  precei to geral  d e

q u e  contratos vál idos sejam vál idos  ( c f .  Verfassungslehre,  p .

69/70), pode  s e r  acrescentada  à  val idade  d e  toda  l e i ,  ainda,  a

validade  da le i  geral  d e q u e  leis válidas sejam válidas,  d o  mesmo

modo  q u e a  cada proibição  se  acresce  a  outra proibição  de nã o

se  observarem proibições válidas,  e t c . P o r meio  d e  tais  v ã s  adições

poder-se-ia dizer  q u e ,  além  d a  norma constitucional  e  além  da lei

ordinária, lambem existiria, ainda,  u m a  determinação  d a  norma

constitucional, segundo  a qual  é proibi do promul gar leis ordinárias

q u e  contrar iem  u m a  norma constitucional, essa proibição teria

sido violada pelo autor  da le i  ordinária  e  essa violação consti-

tucional seria comprovada pelo juiz.

  M a s

  isso também

  n ã o

  seria

u m a

  hierarquia

  d a s

  normas

  n e m u m a

  justiça constitucional.

  S e

aqui

  o

  juiz decide

  q u e o

  legislador transgrediu aquela proibição,

isso seria, então, segundo

  o

  caso,

  u m a

  justiça penal repressiva

e n ã o

  just iça const i tucional . Ademais, nada

  se

  ob tém

  c o m o

acrésc imo

  d e u m a

  pro ib ição

  d a

  norma const i tucional ;

  a c o m -

provação

  d e q u e ,

  entre

  u m a

  ordem

  e a

  ordem contrária, existe

u m a

  contradição, também

  n ã o s e

  torna,

  p o r

  isso,

  u m a

  subsunção

correspondente

  a o

  tipo

  n o

  sentido

  de

  aplicação judicial

  da le i .

  PRIMEIR A PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  DA

  CONSTITUIRÃO

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E S T I P U L A Ç Ã O N O R M A T I V A  D O  C O N T E Ú D O  DF .  U M A  N O R M A .

ca de

 quem decide dúvidas

  e

 diversidades

  d e

 opinião

 a

 respeilo

se

  existe

  o u n ã o u m a

  contradição

  e até que

  ponto

  ela

  existe.

Tendo  e m  vista  a  Constituição  d e  Weimar,  o  interesse nessa

questão  é  muito grande, pois especialmente  na  segunda parte

estão colocados, lado

 a

 lado,

 o s

 mais variados princípios, dispo-

sições particulares

  d e

  direito material, programas

  e

 diretrizes,

assim como compromissos dilatórios incertos,

s

  e se

 qualificar-

m o s  como "normas" todos esses diferentes preceitos,  a  pala-

v r a norma terá perdido  seu  valor  e se tornado inútil. Aqui resi-

de , nos

 mais difíceis

 e

 praticamente mais importantes casos,

  a

obscuridade

  ou a

  contradição

  a té

  mesmo dentro

  d a s

  próprias

determinações d a norma constitucional, a s quais  são em s i ob s-

curas

  e

  contraditórias

  por se

  basearem

  e m u m a

  justaposição

desconexa

  d e

 princípios contraditórios. Aqui também termina,

evidentemente,

  a

 possibilidade

  de se

  simular

  u m a

  gradação

  d e

normas  e , s e um a determinação  da  norma constitucional deter-

mina algo diferente  d e u m a  outra  (e .g .  artigo  146, § I

o

  e § 2

o

) ,

a

  colisão

  n ão

 pode

  se r

 resolvida

 p o r

 meio

 d a

 idéia

  de um a "h ie -

rarquia"

  d a s

  normas.

  M a s

  mesmo

  em

  outros casos

  d e

  dúvidas

e  diversidades  d e  opinião sobre  a pergunta  se existe  u m a c o n -

tradição entre norma constitucional

  e lei

 ordinária,

  n ão se che -

g a a  subsunções correspondentes  a o  tipo  n o  sentido  de  verda-

deírajus tiça, porque

 a

 dúvida sempre

 só diz

 respeito

 a o

 conteúdo

d a

 norma constitucional. Quando

 a

 norma constitucional deter-

mina  que as  faculdades teológicas serão mantidas  e uma lei

ordinária determina  que as  academias teológicas serão elimi-

nadas, pode

  ser

 então duvidoso

  se as

 academias teológicas

  são

faculdades teológicas

 e se o

 fato atingido pela

  lei

 ordinária

 t a m -

b é m é

  atingido pela norma constitucional. Isso também

  não é,

considerando-se mais detalhadamente,  u m a  subsunção corres-

pondente

  a o

  tipo

  da lei

  ordinária

  à

 norma constitucional,

  nem

u m a

 subsunção

 d o

 tipo

 da

 subsunção judicial

 de um

 fato concreto

a uma le i .

  Pergunta-se, antes,

  se o

  caso

  q u e

  recai

  sob uma lei

ordinária, recai concomitantemente  sob a  norma constitucio-

nal?  O  mesmo fato  é  subsumido  a ambas  a s  leis.  A subsunção

8

  Verfassungslehre,

  p .  31-32.

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

  .

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6 6

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

d o

  mesmo fato legal

  à

  norma constitucional

  é a

  mesma

  d a

subsunção

  à lei

  ordinária.

  A

  questão gira apenas

  em

  (orno

  da

pergunta acerca  de  qual  das  duas leis contraditórias deve  s e

subsumir  o fato concreto,  m a s  apenas  o  caso concreto,  não é a

le i  ordinária  que é subsumida.  C o m  isso fica claramente  c o m -

provado

  q u e

  aquelas perguntas

  e

  dúvidas dizem respeito

  ape-

nas ao  conteúdo  da  norma constitucional,  m a s nã o à s ub -

sunção

  d a l e i

  ordinár ia

  a u m a

  de te rminação

  d a

  norma

constitucional.

  A

  pergunta

  se o

  tipo legal

  de uma le i

  ordinária

(as

  academias teológicas) recai sobre

  o

  tipo legal

  da

  norma

constitucional

  (as

 faculdades teológicas) tange

  à

 possibilidade

da

  subsunção

  de um

  conceito mais restrito

  a u m

  mais amplo,

nã o a

  subsunção

  de um

  fato ôntico

  a u m a

  norma impositiva.

Apenas psicologicamente

  se

  pode dizer

  d e

  forma imprecisa

que se  subsome  (o que , no  caso  da  evidente contradição entre

duas normas,  n e m  mesmo  d e  forma psicológica poder-se-ia

dizer). Porém, esse tipo d e subsunção  não é , no sentido especí-

fico,  o da justiça,  m a s  apenas  o d e  todo julgar  e  opinar huma-

nos em geral. Assim,  po r f i m , também  é "justiça"  e "criação  d e

normas" quando alguém

  diz que um

  cavalo

  não é um

  asno.

Mesmo

  n o

  caso

  d e

  decisão

  d e

  dúvidas

  e

  diversidades

  de opi -

nião

  a

  respeito

  de

  existir

  o u n ã o u m a

  contradição entre duas

normas,

  não se

 aplica

  uma da s

  normas

  às

 outras,

  e, s im -

  pelas

dúvidas

  e

 divergências

  d e

 opinião

  só

  dizerem respeito

  a o c on -

teúdo  d a  norma constitucional  - na  verdade  u m  conteúdo

normativo duvidoso  é colocado fora d e dúvida  e fixado de for -

m a  autêntica. Isso conduz  à  remoção  da  obscuridade sobre  o

conteúdo d e norma constitucional  e , po r conseguinte, d a defini-

ç ã o de conteúdo legal, logo, d e  legislação, a té mesmo  d e Cons-

tituição,

  ma s nã o de

 justiça.

Sempre resulta  a  mesma  e  óbvia alternatívá,  de que  ou

existe

  u m a

  contradição

  manifesta  e  indubitável

  contra deter-

minações

  da

  norma constitucional,

  e m q u e ,

  então,

  o

  tribunal

pune essa infração

  a o

  comprová-la, formal

  e

  expressamente,

n o

 modo

  de uma

  justiça penal vindicativa,  ou

  a

 dúvida  sobre

  o

conteúdo

  d e u m a

  norma

  é tão

  justificada

  e a

  norma

  em sua

matéria  é  tão  obscura,  q ue  também  n ã o  pode  se r  falado  e m

•  PRIMEI RA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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6 8

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

mesmo "decisões

  d e u m a s ó

  pessoa"

  e são

  criticadas, talvez,

exageradamente.

10

  C o m

  isso termina,

  e m

  todo caso,

  a

 ingênua

crença

  de que o

 arrazoamento

  d e

  tais decisões

  n ã o

  teria outro

sentido senão

  o d e

 transformar, doravante,

 u m a

 inconstituciona-

lidade  a té  então duvidosa  e m u m a  inconstitucionalidade óbvia

para todo mundo.

  O

  sentido

  n ã o é u m a

  argumentação dominan-

t e , mas justamente  u m a  decisão  p o r  meio  de eliminação autori-

tária  d a dúvida.  M a s ainda muito mais forre e mais essencial  é o

caráter decisionista  d e toda sentença  d e u m a  instância, cuja f u n -

ç ã o  específica seja dirimir dúvidas, inseguranças  e  divergên-

cias  d e  opiniões. Aqui,  o  elemento decisionista  não é  apenas

u m a

  parte

  da

  decisão

  que se

 junta

  a o

  elemento normativo

  v i-

sando possibilitar,

  n o

  geral,

  u m a  res judicata

,

  a

  decisão como

tal é,

 antes,

  o

 sentido

  e a

  finalidade

  d a

 sentença

  e seu

  valor

 n ão

reside

  e m u m a

  argumentação dominante,

  m a s n a

  eliminação

autoritária

  da

  dúvida surgida exatamente

  d a s

  muitas possíveis

argumentações contradizendo-se mutuamente. Explicação para

tanto

  é u m a

  experiência muito antiga

  e

  infelizmente, apesar

d o s

  progressos

  d e

  nosso pensamento crítico, ainda

  n ã o

  ultra-

passada  d e q u e u m a  perspicácia logicista  é  capaz  d e produzir

c o m  facilidade cada  v ez  mais novas dúvidas. Assim também,

cai, a  noção  q u e  freqüentemente aflora  nos  planos  d e  seme-

lhante tribunal

  ou que ,

 pelo menos, atua inconscientemente,

 d e

qu e ta l tribunal eliminaria  as dúvidas  e divergências  d e opinião

em su a característica como  o melhor perito jurídico, sendo ele,

assim,

  u m a

  espécie

  d e  expert

  jurídico supremo.

  N a

  maioria

d a s

  vezes,

  não se vê em

  lais raciocínios

  que o

  efeito

  d o

  pare-

cer .se

  baseia essencialmente

  em seu

  valor argumentativo

  e

q u e ,

  nesse ponto,

  o

  parecer perfaz

  o

  pólo oposto perante

  a

pura decisão.

  U m

 juiz

  não é um  expert  e a

 junção

  d e

 atividade

d e

 parecerista

  co m

 atividade judic ial

 j á

 contém

  em si u m a mes -

c la

  obscura, pois

  a

  atividade

  d e

  parecerista

  não é , no

  caso,

atividade judicial,  não é justiça,  e , s im , adminis t ração .Mas  se

l ü

  A

  r espe i to , p .ex . , OGG-RAY.  Iniroduction

  lo

  American

Government,  2 . ed . N e w  York  1 9 2 6 , p . 4 2 8 .

11

  D a í

  fazem parte, outrossim,

  o s

  pareceres

  d o

  tribunal

  d o

  Reich

segundo

  o

  artigo

  4 d a l e i

  introdutória

  à

  norma constitucional

^

  PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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E S T I P U L A Ç Ã O N O R M A T I V A  D O  C O N T E Ú D O  D E U M A  N O l i M A .

6 9

tomarmos obrigatório  o parecer  em seu  resultado,  e le  passa  a

se r  decisão  e não  mais parecer.'

2

  S e  isto  j á é  válido para todo

juiz, deve

 ser

 válido, então,

 d e

 maneira infinitamente intensifica-

d a ,

 para

 u m a

 instância constituída

 com o

 propósito

 de

 eliminação

autêntica

  e

 definitiva

 d a s

 dúvidas

  e

 divergências

  d e

  opinião.

Para

  u m a

  Constituição

  d o

  tipo

 d a

  Constituição

  d e

 Weimar,

isso

  tem

  ainda,

  po r um

  motivo especial,

  u m

 significado prático

e  direto. Toda Constituição  é cheia  de  "ressalvas",  mas os au-

judiciária alemã

  e o s

  pareceres

  d o

  tribuna anticartel segundo

  o

artigo

  2 0 d o

  decreto

  de 2 de

  novembro

  d e 1 9 2 3

  (Diário oficial

do  Reich

  I , p . 10 67 )

  contra abuso

  d e

  posições econômicas

  d e

poder.

  A

  respeito

  d o s

  pareceres

  d o

  tribunal

  d e

  f inanças

  d o

  Reich

segundo

  o

  artigo

  4 3 d o

  código fiscal

  d o

  Reich: POPITZ,

  J .

  Sicuer

und  Wirtschaft,  VIII (outub ro  d e  1928),  c o l . 9 8 5 ;  HENSEL,  A. id.

c o l . 1 1 3 0 ( " u m a  prova interessante  d a  mudança  d e  função  d e

instituições estatais").  U m a  relação especialmente notável contém

o

  artigo

  106 da l e i do

  tribunal

  d o

  trabalho'.

  " N a

  medida

  e m q u e a s

partes contratuais podem fechar

  u m

  convênio arbitral

  e m

  litígios

trabalhistas segundo

  o

  artigo

  9 1 .

  elas também podem,

  s e m

 exclusão

d a

  jurisdição trabalhista, acordar

  q u e

  questões

  de

  fato

  que são

consideráveis para  a  decisão  do  litígio, devam  s e r  decididas

p o r  meio  d e u m  parecer arbitral  (contrato  d e  parecer arbitrai).  O

acordo

  t e m o

  efeito

  d e q u e a s

  questões

  d e

  fato

  a

  serem decididas

mediante parecer arbitral estão subtraídas

  d o

  exame

  d a

  matéria

  e

d a

  apresentação

  d e

  prova

  n o

  processo t raba lhis ta

  e de que a

autoridade  do  tribunal  do  trabalho está vinculada  ao  parecer

arbitral."  Sobre

  a

  tentativa

  d e s e

  obter,

  p o r

  meio

  d o

  parecer,

  u m

Estado neutro perito  (expert).

12

  BERTRAM,

  A .

  Zeitschrift fiir Zivilprozess,

  vo l . 53 , 192 8 , p . 42 8 :

" C o m a  interpretação praticamente autêntica  p o r  meio  d a  apre-

ciação,  o  tribunal  d o  Reich tornar-se-ia  de  facto  u m  tribunal para

u m a  v incula t iva in te rpre tação  d a l e i ,  tudo  q u e é  apresentado

c o m

  razão contra

  o

  plano

  d e

  semelhante tribunal

  ( c f .

  REICHEL.

Gesetz  und  Richterspruch,

  p. 111 e

  aquelas

  lá

  citadas) também

depõe contra

  a

  realização

  de t a l

  dever

  d e

  parecerista

  d o

  tribunal

d o

  Reich.

  U m

  tribunal

  d o

  Reich

  q u e

  retificasse dúvidas

  e

  lacunas

da l e i  procederia  a u m a  t ransposição  d e  fronteiras para dentro

d o  território  d o  legislador  e ,  concomitantemente,  s e  privaria  d a

imparcialidade necessária

  à

  atividade julgadora."

  " A

  apreciação

n ã o é

  componente

  d a

  atividade judicial,

  é

  atividade administrativa

e , po r

  isso,

  t em que (a

  saber, devido

  a o

  artigo

  4 da lei

  introdutória

  d a

norma constitucional judiciária)

 s e

 restringir

 a o q u e

 pode

 s e r

 transferido

para

  o s

  tribunais,

  a

  atividades

  d a

  administração judiciária."

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO CiUABDIÀ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

  » —

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7 0

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

tores dessa Constituição desprezaram, além disso,

  a

  antiga

experiência  de que não se  pode escrever  p o r  demais  e m uma

Constituição.

11

  O s

  políticos partidaristas, contrariamente

  aos

primeiros projetos  d e  Hugo PreuG, muito escreveram, princi-

palmente

  n a

  segunda parte. Aliás, perante

  a

  situação

  d a

  teoria

constitucional daquele tempo, esse  e ra um procedimento total-

mente conseqüente

  e

  incontestável, pois

  se a

  Constituição

  é

equiparada formalmen te  à norma constitucional singular  e, as-

s im,

  é  definida igualmente como "nada mais

  do que uma le i

dificilmente emendável", cada  u m a g e  corretamente quando

aproveita

  a

  oportunidade para tornar dificilmente emendável

tudo  o que lhe for  importante. Ademais, como j á  dito, muitas

vezes

  a

  segunda parte

  da

  Constituição (sobre

  a

  qual recaem,

especialmente, muitas dúvidas  e  divergências  d e  opinião)  não

contém

  na

 diversidade

  de

  suas explicações fundamentais

 e d is-

posições particulares  d a  norma constitucional nenhuma deci-

são

  baseada

  e m

  acordo,

  m a s

  apenas fórmulas ambíguas,

  por

meio  d a s  quais  a  decisão deva  ser  protelada  e  deva  se  levar

e m

  conta variados pontos

  d e

  vista, freqüentemente,

  a té mes -

m o  contraditórios. Para tanto,  a  regulamentação acordada  na

questão eclesiástica

 e n a

 escolar

  nos

 fornece exemplos eviden-

tes . Em tais "acordos dilatórios  e m fórmulas",'

4

 a decisão sobre

"dúvidas  e divergências  d e opinião" é que primeiramente  c o n -

fere, na verdade,  e m  geral,  a  real normatização.  U m a instância

que , no

  verão

  de 1927 ,

 tivesse decidido

  a

 respeito

  da

 constitu-

cionalidade do , então, projeto de lei escolar d o Reich, altamen-

te

  controverso,

  é que

  teria primeiramente dado

  a o

  artigo

  146

.da Constituição  d o  Reich  seu  conteúdo  e decidido normativa-

mente

  a

 questão escolar, Quando aqui decide

 u m

  tribunal,

 ele é

manifestado como constituinte  em  função altamente política.

13

  Sobre  o s  problemas  d a s  ressalvas: BILFINGER,  C .  Zeitschr.  f .

ausl.  õ f f .  Recht  u.  Volkerrecht,  I . p . 63 ;  para  a  "jurisdição estatal",

JERUSALEM,

  F. W .  Die

  Staatsgerichtsbarkeit,  Tübingen,

  1 9 3 0

p .

  97-98. Ademais,

  c f .

  CONSTANT, Benjamin. Réflexions

  sur les

Constitutions,  Paris

  1 8 1 4 , C a p . 9 : " D e l a

  nécessi té,

  d e n e p as

étendre

  l e s

  constitutions

  à

  trop d'objets".

14

  Verfassungslehre,  p .  31-32;  c f .  também anteriormente.

'

  PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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7 2

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

ceíto

  da

  divergência constitucional

  "p o r

  meio

  d a m e d

  íação

  d a

idéia  da  forma constitucional",  ou  seja, retirar dele  seu  sentido

e objeto concretos  e, depois, qualificar tudo como divergência

constitucional, para a qual  se deva constituir u m "tribunal cons-

titucional" como competente.

A

 primeira condição

  d e

 toda jurisdição

  ou

 justiça constitu-

cional é , antes, um. conceito definido da divergência constitucio-

nal que

 tome nitidamente difere riçável essa espécie

 d e

 contenda,

pelo menos

  em seu

  princípio material

  e em sua

 estrutura, dife-

rentemente  d e  outras contendas,  ao  tornar visível  u m a  relação

diretamente objetiva co m a Constituição. Seria muito irrefletido

tomar

  o

 caminho inverso

  e

  fazer

 c o m q u e

 tudo dependa

  de que

o  tribunal  d o  Estado  ou o constitucional  dê a um  conceito  d e

divergências constitucionais totalmente indefinido

 e

 ilimitado,

u m

 conteúdo

 p o r

 meio

 d e

 meros prejulgamentos

 e,

 dessa forma,

determine

  o que

  seja

 u m a

  divergência constitucional. Isso

  s ig-

nificaria  que o  tribunal  d o  Estado busca suas competências.

Em si , é  totalmente possível criar  u m  órgão  q u e  desenvolva

suas competências

  e

 poderes

  de tal

  forma.

  F a z

  parte

  a t é mes-

m o d o s fenômenos típicos da vida constitucional  q u e u m órgão

que se  toma consciente  de sua  influência política amplie cada

v e z

  mais

  o

  âmbito

  d e

 seus poderes. Assim, apesar

  d a

  cuidado-

sa

 normatização

  e

 dosagem

  d e

  seus poderes pela Constituição

d e B ismarck  de 1871, o parlamento alemão  d o Reich teve,  sob

essa Constituição,  u m a  influência política maior  do que se po-

deria

  ter a

  partir

  d o

  texto constitucional.

  D e

  outra forma,

  o

significado teóricorconstitucional tanto

  d o

  conselho

  d o

  Reich

quanto  d o s  Estados alemães  e m  particular, especialmente  d a

Prússia,  é hoje b em  diferente e muito maior  d o q u e mesmo  u m

sagaz manejo

 d a s

 sílabas poderia interpretar

 a

 partir

  d o

  teor

 da

vigente Constituição  d o Reich. Talvez também  u m  tribunal  d o

Estado esteja  e m  condições  de se  desenvolver para além  das

competências

 a ele

 destinadas rumo

 a u m a

 autoridade

 d e

 grande

influência política.

  M a s u m a

  instância judicial encarregada

  d e

decidir hoje

  na

  Alemanha contendas

  da

  vigente Constituição

d o Reich encontra-se,  sem um  conceito  d e  divergência consti-

tucional razoavelmente delimitável,  e m u m a  situação singular.

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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O  T R I B U N A L  D O  ES TA D O P ARA  O  REICH A L EM Ã O

2 1

Primeiramente devido  à j á  acentuada particularidade caracte-

rística

  d a

 vigente Constituição

  d o

 Reich, cuja organização

  fe -

derativa justapõe Reich

  e

  Estados

  e m u m

  emaranhado quase

impenetrável  d e  competências  e poderes  e  cuja segunda parte,

d o  artigo  109 até 165, pode  se tornar,  sob o problemático título

"Direitos

  e

  deveres fundamentais

  d o s

  alemães'",

  u m

  abismo

praticamente insondável

 d e

 dúvidas,

 d e

 divergências

 d e

 opiniões

e — na  medida  em que é  positivado  e  atualizado  - d e  direitos

legítimos e , por conseguinte, também d e divergências jurídicas.

Instituir, perante

 ta l

 Constituição,

 u m

 tribunal constitucional para

divergências constitucionais

  e não lhe

  entregar

  e m

  mãos

  u m

conceito

  d e

 divergências constitucionais,

  ou

 seja, nenhuma

  ou -

tra  delimitação  de sua  competência além  d e u m a  definição

vocabular totalmente vã, segundo a qual toda divergência acerca

d e u m a

 disposição constitucional

 é u m a

 divergência constitucio-

na l ,

  significa,

  na

  realidade, nada mais

  d o q u e

  entregar

  ao pró-

prio tribunal  a  decisão sobre  su a  competência.  E m  virtude  d o

significado objetivo d e divergências constitucionais pode a í re-

sidir,

  n a

  verdade,

  u m a

 competência para competência

  d a

 espé-

cie a

  mais admirável

  que , no

  caso

  de um

  aproveitamento

  con -

seqüente,  não se  encontra distante daquela competência para

competência,  na qual  a literatura d e direito público d o pré-guer-

ra , segundo  o procedimento  d e  Haenel  e  Rosin, avistou muitas

vezes

  a té

  mesmo

  o

  critério

  d a

  soberania.

O

  resultado prático para

  a

  realidade atual será, evidente-

mente,  b e m  diferente  e ,  mais precisamente,  não só  porque  o

tribunal d o Estado  é competente, segundo  o  artigo  19 da Cons-

tituição, apenas para divergências constitucionais dentro

 de um

estado,  n ã o  para aquelas dentro  d o Reich.  U m  tribunal lotado

c o m

  juristas

  d e

  carreira

  e que

  permanece consciente

  de sua

posição como tribunal, provavelmente  não va i em  absoluto de -

sejar abandonar  a  esfera  d a  justiça real.  M a s  depois  ele se

defrontará

 c o m o

 dilema simples,

  a o

 qual sempre

  se faz

 alusão

nas

  presentes exposições,

  uma vez que

  resulta,

  c o m

  referên-

cia à Constituição, para toda consideração exata  d o s  limites  d a

justiça,

  ou

  se  trata

  claramente

  d e  infrações

  indubitáveis

  c o n -

tra a  Constituição,  ou  seja,  u m a  justiça atuante

 post eventum,

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA CÜMO GUARDIà DA  CONSTITUIÇÃO  "

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O

  T R I B U N A L

  D O

  ESTADO PAPA

  O

  REICH ALE MÃO

desejar "desmascará-la" psicológica

 ou

 sociologicamente. Fica,

antes, comprovado

  c o m

  isso

  que é

  inútil exigir

  da

 justiça,

  d e

maneira subjetiva, funções  q u e  ultrapassem  a  esfera  d e u m a

subsunção correspondente  a o  tipo,  ou  seja, saiam  d o s  limites

dados

  p o r

  meio

  d e u m a

  vinculação

  a

  normas determináveis

quanto

  a o

 conteúdo.

E m s u a decisão datada  de 17 de  fevereiro de 1930  sobre  a

constitucionalidade

 da le i

 eleitoral prussiana,'

 o

  tribunal

 d o E s -

tado para

  o

  Reich alemão recusou-se

  e m

  tratar determinações

d a l e i  eleitoral  d o  estado  d a  Prússia  d e  1920/1924 como

anticonstitucionais,

 d a s

 quais,

 e m

 todo caso, devido

 a u m a c o n -

cepção difundida

 e

 representada

 p o r

 conceituados jurisconsultos

e,

 especialmente, também segundo decisões anteriores

  d o p r ó -

prio tribunal

  d o

 Estado, podia

  ser , co m

  razão, discutível

  se

 elas

n ã o

  infringiriam

 o

 princípio

 d a

 igualdade

 d a

 ele ição estabeleci-

d o n a  Constituição  d o  Reich. Pode aqui ficar fora d e  conside-

ração  o modo como essas dúvidas teriam  que se r  corretamen-

te

 decididas

  n o

 caso.

  E m

  contrapartida,

  é d e

 suma importância

o  fato de que o próprio tribunal  d o Estado (visto d e forma  exa -

ta)  também  não a s  decidiu  n o  caso, declarando-se,  e m  certo

sentido, como não-competente, apesar

  d e

  decisão publicada,

pois,

 n o

 cerne

  d o s

 motivos decisórios dessa importante senten-

ça, se  encontra  o  raciocínio  a seguir.  O  tribunal  d o Estado  res-

ponde  à  pergunta  se existe  u m a  infração contra  o  princípio  d a

igualdade eleitoral: "Nesse caso

  (ou

  seja,

  n o

  caso

  d o

  princípio

da  igualdade eleitoral)  não se  trata  de um  conceito lógico-ma-

temático,  ma s de um  conceito jurídico ." E diretamente  a seguir

ainda acrescenta:

  " P o r

  isso, igualdade

  e

  desigualdade

  não são

opostos

  que se

  excluem."

  O

 confronto antitético entre lógico-

matemático,

 p o r u m

  lado,

 e

 jurídico,

 p o r

 outro,

 é

 metodicamen-

te de

  extrema importância

  e

 contém

  u m a

  repulsa muito consi-

derável

  d o v ã o

  normativismo,

  c o m o

 qual

  se

  tentou tomar

  sem

fundamento, por u m  tempo, o s direitos público e constitucional.

3

  Jurisprudência civil  do  Reich  1 2 8 ,  anexo  p . 1 - 2 ;  Ausgewcihlte

Entscheidungen  des  Staatsgerichtshofs  für das  Deutsche Reich,

herausgegeben

  v o n

  Reiehsgerichlsprasidenl

  D r .

  Bumke, Heft

  2 ,

Berlin

  1 9 3 0 , e m

  especial

  p .

  15/16.

1'UIMRIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIÀ  D A  CONSTITUIÇÃO  • —

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O  T R I B U N A L  D O  ES T A D O P ARA  O  REICH A L EM Ã O

2 2

dúvidas

  e

  inseguranças

  a

  respeito

  de

  determinações constitu-

cionais, esse posicionamento

 d o

 tribunal

 d o

 Estado para

 o

 Reich

alemão  é d e significado fundamenta l para  o problema d o tribu-

nal do

  Estado

  e m

  geral.

  E le só

  quer

  se

 opor

  a

  violações cons-

titucionais claras,

  o u

  seja,

  n ã o

  discutíveis.

  E le

  deixa valer

todas  as  decisões  d o  legislador,  n a s  quais, como consta  e m

mais adiante,

  "e le não se

 deixou conduzir, todo caso,

  p o r p o n -

derações subjetivas". A s palavras "claramente"  e " c o m  certe-

z a " , e m

  vista

  d e

  nosso ponto

  d e

 partida

  -

  eliminação

  d e

  inse-

guranças  e  dúvidas  - t êm que se  sobressair  d e  forma  b e m

especial.  A especificidade decisionista  d a resolução d e dúvidas

e

  inseguranças,

  q u e

  ultrapassa

  o s

  limites objetivos

  d a

 justiça,

distingue-se aqui

  d e

  forma

  tão

 clara quanto

  a

 aversão

  d o

 tribu-

nal do

  Estado

  em se ver

  empurrado para dentro

  d o

  papel

  d e

u m a decisão dessa espécie.  S e o  tribunal  d o Estado obsta  t ão -

somente  a violações constitucionais claras, indubitáveis  e pas-

síveis

  d e

  serem certificadas

  c o m

  segurança,

  e le

  passa

  a ser,

então,  o  contrário  d e u m a  instância convocada para  a  decisão

d e

  dúvidas

  e

  incertezas. Dessa maneira,

  é

  ainda mais saliente

e até  mesmo perturbador  o  fato  de que um  tribunal  d o  Estado

q u e s e

 restringe

  c o m

  extrema cautela apenas

  a o

  controle geral

d e

  leis claramente anticonstitucionais, acrescente ainda, além

disso,  a  essa restrição  a s  palavras  "se é que  pode".  Não se

pode saber,

  s e m

 mais,

  se

 isso

  tem que ser

 entendido como

  u m a

outra restrição  ou  como  u m a  ressalva  d e  características dife-

rentes

  e se

  também deve expressar ainda

  u m a

  discrição

  p e -

rante claras violações constitucionais. Provavelmente, seria

  o

caso aqui  d e u m a  limitação  d e  alcance mais abrangente.

A

  primeira condição

  d e u m a

  "justiça constitucional"

  p e r -

manece sendo  u m  nítido conceito  d e  divergência constitucio-

nal.

  Ele, por sua vez, só

  pode

  s e r

  definido

  e m u m a

  estreita

relação  c o m u m  claramente reconhecido  conceito  de  Consti-

tuição.  U m a  expansão  d a s  "divergências constitucionais",  d o -

minada apenas pelas mais próximas considerações

  d e

  conve-

niência  e sentimento,  e uma admissão irrefletida d e partes iria,

inversamente, afetar

  e

  transformar também

  a

 essência

  da pró-

pria Constituição

  e

  poderia acarretar conseqüências inespera-

PR1MEIKA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

  .

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das , nas quais  a falta de consciência teórico-constitucional p r o -

duzirá, então, efeitos nocivos.  O s  conceitos  d e  "divergência

constitucional", "jurisdição constitucional"  e  "Constituição"

estão objetivamente  tão  estreitamente ligados  q u e n ã o  apenas

u m a  mudança  d o  conceito  d e Constituição mudará  o  conceito

d e

 divergência constitucional,

 m a s

 também, inversamente,

 u m a

nova prática d e processos constitucionais e d e jurisdição cons-

titucional poderá transformar

  a

  essência

  d a

 Constituição.

U m  tipo teórica  e  praticamente definível  d e  divergências

constitucionais e , po r conseguinte, também  u m tribunal consti-

tucional  d e  características especiais para  s u a  decisão resultará

quando  a  Constituição  fo r  um  contrato  (ou  seja,  u m a  situa-

ç ã o

 jurídica

  bi ou

  plurilateral

  e n ã o u m a

  decisão

  ou le i

  política

unilateral)

 o u

 quando

 e la for

 concebida, pelo menos, como

 c o n -

trato. Isso porque

  é a

  partir

  da

  essência

  d o

  contrato

  q u e

  pode

se r  respondida  a pergunta central sobre  o que é um a  divergên-

c ia  constitucional  e  quem pode  se r  pane  d e u m a  divergência

constitucional. Essa questão situada  n o  início  d e  toda discus-

sã o

  sobre

 o

 tribunal

  d o

 Estado

  n ã o

 pode

  se r

 deixada

  a

 cargo

  d o

próprio tribunal

  ao se

  esperar como

  ele vai

  desenvolver,

  e m

sua

  prática

  e

 segundo

  seu

 julgamento,

  o

 conceito

  da

  divergên-

c ia

  constitucional

  e a

  admissão

  d e

  partes. Caso contrário,

  o

guardião teria

  se

  transformado

  e m

  senhor

  da

  Constituição.

  S e

u m   tribunal  d o  Estado deve decidir judicialmente acerca  d e

divergências constitucionais,  te m  antes  q ue  estar claro  o que

s ã o  divergências constitucionais  e tal  questão  n ã o  pode  ser

satisfeita

 p o r

 meio

  d e

  respostas "formais".

 M as se a

  Constitui-

ç ã o , de

  acordo

  c om s ua

  essência,

  é

  contrato

  ou

 acordo, resulta

d a í u m

 conceito útil

  e

 plausível

  de

  divergência constitucional,

pois

  d a

 mesma forma como contendas resultantes

  de um c on-

trato

  s ã o

  aquelas contendas

  q u e

  surgem entre

  a s

  partes

  d o

contrato sobre  o conteúdo  d o  contrato (divergências  e m  maté-

r ia de  locação,  p . ex . divergências entre locatário  e  locador  so-

bre o  conteúdo  d o  contrato d e  locação), divergências constitu-

cionais seriam aquelas entre  as  partes  d o  contrato  ou  acordo

constitucional sobre  o conteúdo  d e  suas estipulações. Diferen-

'  PRIM EIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

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, 0

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

4 .2 O

  Tribunal

  d o

  Estado como instituição

especificamente federativa

A

  Constituição

  é u m

  contrato

 e m u m a

  autêntica federação

(confederação

  d e

  Estados

  ou

  Estado federativo), como Cons-

tituição federal  d o s  Estados reunidos  n a  federação  p o r  inter-

médio  d o convênio federal. E m u m a organização política desse

tipo instaura-se, freqüentemente,

  u m a

  instância para dirimir

divergências entre

  os

 membros

  d a

 federação

 e ,

 mais aJém, para

decidir divergências dentro d e u m estado singular, apta a colocar

e m  risco  a paz e a  segurança  o u a  homogeneidade dentro  da

federação.' Nesse aspecto, está pressuposto

  q u e n a

  base

  d a

Constituição federal encontra-se

  u m

 contrato, sobre cuja inter-

pretação  e aplicação podem surgir, entre  as partes contratuais,

divergências  que t êm que ser  apaziguadas.  Se no  decorrer  d o

desenvolvimento deixar

  d e

 existir

  a

 base contratual

  e a

 organi-

zação federal repousar apenas  n a  decisão política  d e u m d e -

tentor uniforme  d o  poder legislativo constitucional, como  é o

caso para

  a

 organização federal

  d o

 Reich alemão após

  a

 Cons-

tituição

  d e

  Weimar, pode-se, juntamente

  c o m

  outras institui-

ções federais, assumir  ou criar também  u m  tribunal  d o  Estado

federal

  d e

  características especiais, enquanto existir constitu-

cionalmente

  u m a

  organização federal.

O

  artigo

  19 da

 Constituição

  d o

 Reich está totalmente liga-

d o ,  sistematicamente,  à  organização federal  d o  Reich alemão

n a

 seção

  "o

 Reich

 e os

 Estados". Fala

 d e

 divergências

 d e

 direito

7

  Verfassungslehre,  p .  1L3-1Í4.  C o m  isso  n ã o  deve,  p o r  exemplo,

s e r  af i rmada como possível  o u  correta  u m a  ilimitada estrutura

jud i c i a l pa ra t odas  a s  r e l a ç õ e s f e d e r a i s ;  a  respe i to , mui to

acer tadamente B1LFINGER,

  C .  Der

  Einflufi

  der

  Einzelstaaten

auf die

  Bildung

  de s

  Reichswillens,

  Tübingen,  1 9 2 3 , p . 9 - 1 0 , e

também  a  concepção  d e A .  Haenel,  vide  nota anterior. Trata-se,

aqui , apenas

  d a

  relação geral entre  contrato  cons t i tuc ional

  e

su j e i ção

  à

  ação

  d a

  just iça.

  T ã o

  pouco quanto qualquer outra

Const i tuição pode  s e r  dissolvida  a  Consti tuição federal  e m u m

sistema  d e  direitos e obrigações singulares (SM END ,  R .  Verfassung

un d

  Verfassungsrecht,

  p . 172 ) ,

—•  PRIMEIR A PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIA  D A  CONSTHUIÇAO

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O  T R J B U N A L  D O  ESTADO PARA  O  REICH ALE MÃO

8 3

parte

  d a

  Constituição estadual,

  e , s im,

  autonomamente.

  A or-

ganização  de um  estado  não é  moldada  d e  maneira  a se ba-

sear, primeiro,

  n a

 Constituição estadual

  e ,

 segundo,

  na

 Consti-

tuição  d o  Reich delimitada territorialmente  e  acolhida pela

Constituição estadual.

 A

 Constituição estadual atinge apenas

 o

resto  do se r  estatal  q u e  ainda compete  à o s  Estados, apenas

nesses moldes

  são

 possíveis divergências constitucionais

  den-

t ro de um   estado  e só a  isso  se  refere também  o  estabeleci-

mento

  de um

  tribunal

  d o

  Estado

  de um

  estado

  d a

  federação,

cuja competência pelo artigo  19 da Constituição  d o  Reich  tem

primazia sobre

 a

 competência

 de um

 tribunal

 d o

 Reich. Segundo

o desenvolvimento histórico-constitucional  da fórmula "diver-

gências constitucionais dentro

  de um

  estado",

11

 divergências

  a

partir  da Constituição  d o Reich  não são divergências dentro d e

u m

  estado. Nesse fato, nada deveria

  se r

  mudado pelo artigo

19,  como nitidamente resulta  d a s  declarações  d o  representan-

te do

 ministério

  d a

 justiça

  d o

 Reich, conselheiro Zweigert,

12

 na

assessoria  d a  Constituição  d e  Weimar,  e o  teor  d o  artigo  não

d iz , por

 exemplo, "indubitavelmente" (como consta

 na

 decisão

de 13 de  abril  de 1927 ,  Jurisprudência civil  do  Reich  120,

anexo,

  p. 21) o

  contrário. Muito mais

  tem

  razão

  R .

  Thoma

quando  d i z q u e " o  teor  d o  artigo denota, antes,  a  negação  da

questão"

  se um

  litígio sobre

  a

 Constituição

  d o

  Reich também

pode  se r  visto  o u n ã o  como divergência constitucional dentro

d e u m

  estado.

13

  O s

  materiais também denotam

  a

  negação.

14

  A

condição feita pelo artigo  19 (divergências constitucionais  den-

t ro de um

  estado,

  " n o

  qual

  n ã o

  haja nenhum tribunal para

  sua

u

  C f . a

  respeito  Verfassungslehre,

  p . 11 4.

12

  Protocolo,  p . 4 1 1  (contra  a concepção  d e  Kahl  q u e queria qualificar

todo litígio tendo como objeto  a  Constituição como divergência

constitucional); além disso,  a  declaração  d e  Hugo PreuB  de 2 de

abril  d e 1 9 1 9 , n a s  atas manuscritas  d a s  reuniões  d a  comissão

constitucional,

  vol . I , n . 6,

  atas anexas

  3 .

Die  Staatsgerichtsbarkeit  im  Deutschen Reich, Reichsgerichts-

festschrift  I , 19 29 , p . 181 .  Todavia, logo  a  seguir  d i z  T h o m a  q u e

o  teor admitiria, porém,  a  afirmação  d a  questão.

u

  Assim,

  c o m

  razão, THOMA,

  R. Id . , p . 181.

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTII UIÇÀO

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8 4

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

resolução") confirma esse ponto

  d e

  vista.

  O

  artigo

  19 não ob-

jetiva transferir, para decisão, divergências constitucionais  a

partir  d a  Constituição  do  Reich  a u m  tribunal  d o  estado  da

federação

  e

  transformar

 o s

  tribunais

  d o s

  Estados

  e m

  instânci-

a s

  para

  u m

  direi to const i tucional

  d o

  Reich delimitado

territorialmente.

  E le

  serve apenas

  a o

  interesse

  d o

 Reich, como

o todo da organização federal, e m dirimir conflitos políticos que

surgem

  a

 partir

  d a

 Constituição estadual dentro

  d e u m

  estado.

Todavia,  o  tribunal  d o  Estado para  o  Reich alemão  deu à

sua  competência ainda  u m a  dimensão maior, tratando diver-

gências "radicadas

  na

 Constituição

 d o

 Reich", "desde

 q u e u m a

prescrição  da  Constituição  d o  Reich esteja  e m  discussão  a o

complementar  a Constituição estadual  ou outras normas  de d i -

reito constitucional estadual", como divergências constitucio-

nais dentro

  d e u m

  estado.

15

  A

  partir disso,

  a

  restrição "dentro

de um estado" torna-se  ou u m a  limitação meramente territorial

15

  Decisão  de 12 de  ju lho  d e 1 9 2 1  (Jurisprudência civil  do  Reich

102 , p . 415 e

  Arquivo

  d e

  direito público

  4 2 , p . 7 9 ;

  L A M M E R S -

S I M O N

  I , p . 357) ;

  decisão provisória

  de 15 de

  outubro

  d e 1 9 2 7

(Jurisprudência civil

  do

  Reich

  1 1 8 ,  anexo,  p. 4 e  L A M M E R S -

S I M O N  I , p . 2 9 2 ) ;  três decisões  d e 1 7 d e  d e z e m b r o  d e 1 9 2 7

( L A M M E R S - S I M O N  I , p . 3 3 0 ,  341 /342  e  398/399); decisão

provisória  de 12 de  maio  d e 1 9 2 8  (Ju ris pru dên cia civil  do  Reich

1 2 0 ,

  anexo,

  p . 1 9 ;

  L A M M E R S - S I M O N

  I , p . 3 5 2 ) ;

  f inalmente,

confirmando expressamente

  a

  prática exercida

  a t é

  então, decisão

d e 2 4 d e  j u n h o  d e 1 9 3 0 ,

  Jurisprudência civil

  do

  Reich

  1 2 9 ,

anexo,  p . 1/2; aí  também  na p . 6 a  formulação ci tada  n o  texto

acima; igualmente, POETZSCH-HEFFTER.  Handkommentar,  3 ,

A u f l a g e ,  p . 1 5 7 ( c o m  r e m i s s ã o  a o s  a r t igos  17 , 37 e 38 da

C o n s t i t u i ç ã o

  d o

  R e i c h ,

  o q u e , a m e u v e r , n ã o é

  dec i s ivo) ;

L A M M E R S ,

  H . H .

  Hebdomadário Jurídico

  1 9 2 8 , p .

  3255, nota,

seguindo pré-decisões  a té  então  d o  tribunal  d o  Estado,  j á  consi-

dera  " s e m  dúvida"  q u e  divergências  a  partir  d a  Consti tuição  d o

Reich pertençam

  à s

  divergências consti tucionais dentro

  d e u m

estado.

  E m

  posição contrária,

  m e

  parece

  s e r

  correto

  o

  argumento

d e LEIBHOLZ,  G.

 Gleichheit vordem Gesetz,

  p . 126 ,  nota, segundo

o  q u a l ,  n o  a r t igo  1 9 ,  d e v e - s e e n t e n d e r  p o r  d i v e r g ê n c i a

cons t i tuc ional  " u m a  discussão acerca  d o  emprego, manuse io

o u

  interpretação

  d e u m a l e i

  fundamental

  d e u m

  estado individual".

"Isso resulta certamente  d a  competência apenas subsidiária  d o

PRIMEIRA VAKrE  - A  JUSTIÇA COMO CUARDIÀ  D A  CONSTITUIÇÃO

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ou

 dependente

  d o

  fato

  d e q u e

  ambas

  as

 partes,

  ou

  pelo menos

a

  parte acusada, sejam instâncias

  ou

  organizações estaduais.

Assim, será tratado como divergência constitucional dentro

  de

u m

  estado

  o

  caso

  d e

  sociedades religiosas quando,

  c o m

  base

e m  títulos históricos, fizerem reivindicações contra  o  estado

remetendo  a determinações d a Constituição d o Reich, teria que

ser considerado -  pressupondo-se u m a capacidade  em se r parte

judicialmente  -  como divergência constitucional dentro  de um

estado quando  u m a  organização  d e  funcionários públicos  vis-

lumbra  na lei de remuneração  de um  estado  u m a  infração c o n -

tra o  artigo  129 da Constituição  d o  Reich, quando comunida-

d e s ,

 igrejas, minorias dissidentes, câmaras

 d e

 comércio, câmaras

d e

  artesãos, câmaras

  d e

  advogados

  e

  médicos, sindicatos,

  as-

sociações

  d e

  interesses

 d o s

 mais variados tipos, universidades,

a té

  mesmo, talvez, faculdades teológicas possam fazer valer

para  si  qualquer  u m a d a s  intermináveis normas  d a  segunda

parte  d a  Constituição  d e  Weimar.  A  expressão "divergências

constitucionais dentro  d e u m  estado" fica, assim, desligada  da

relação rigorosamente federal. O limite aqui não é mais visível.

M a s  também para  as  divergências entre  o  Reich  e os Es-

tados resultam muitos pontos obscuros, quando todas

  as "di-

vergências

  d e

  direito não-privado" entre

  o

  Reich

  e u m

  estado

puderem

  se r

  apresentadas,

  se m

  mais, diante

  d o

  tribunal

  d o

Estado para

  o

  Reich alemão

  e ,

  além disso, quando

  o

 conceito

tribunal  d o  Estado, pois, senão, haveria  a  possibilidade para  o s

Estados

  q u e

  instituíram

  u m

  tribunal para dirimir tais divergências,

d e

  contornar

  a

  assim fundamentada competência

  d o

  tribunal

  d o

Reich  o u d o  tribunal  d o  Estado  e  substituí-la pela decisão  d o

t r ibunal

  d o

  es tado

  d a

  federação". Além disso, corretamente:

HUBER,  E . R . Arquivo  de  direito público  X I X  (1930),  p . 456 , na

discussão d o livro d e KUHN,  Fr. Formen  des  verfassungsgerichtlíchen

Rechtsschutzes

  im

  deutschen Reichs-

  und

  Landesstaatsrecht,

Leipzig,  1 9 2 9 .  ANSC HÜT Z .  Kommentar,  3 .  Bearbeitung,  p . 154

(n. 2

  sobre

  o

  artigo

  1 9 )

  abandonou

  s u a

  atual concepção

  e

  assumiu

a

  concepção

  d o

  tribunal

  d o

  Estado; G1ESE-  Kommentar,

  8 .

  Aufl.,

p . 82 ,

 acentua

  o

 caráter

  d e

 exceção

  d a s

 divergências constitucionais

dentro

  d e u m

  estado, resultantes

  d a

  Const i tuição

  d o

  Reich.

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO  •

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d e

 divergência

  f o r

 concebido

  d e

 forma

  tão

 ampla

  que, por fim,

toda divergência  d e  opinião entre  o  Reich  e u m  estado nele

recaia. Então,

  a

  autoridade competente

  d o

  Reich pode

  s im-

plesmente fazer

 d o

 tribunal

  d o

  Estado

  a

 mais alta instância

  con-

troladora d o Reich  e , inversamente, prevenir o estado, p o r meio

d e u m a  queixa junto  ao  tribunal  d o Estado, contra  o curso  nor -

ma l d o controle pelo Reich,  e m q u e divergências entre  o Reich

e u m estado podem  ser, concomitantemente, divergências cons-

titucionais dentro

  de um

  estado

  e

  vice-versa,

  e tc . As

  possi-

bilidades, instâncias  e  vias constitucionais introduzidas pela

Constituição  d o  Reich para  a  relação entre Reich  e  Estados,  a

saber, execução pelo Reich segundo

 o

 artigo

 48, § I

o

, d a

 Consti-

tuição d o Reich, decisão sobre a conformidade jurídica a o direito

d o  Reich  de uma l e i  estadual segundo  o  artigo  13, § 2

o

, e a

instituição jurídica

 d o

 controle pelo Reich segundo

 o

 artigo

  15,

16

l f i

  A

  concepção fundamental

  d a

  relação

  d o

  artigo

  1 5 c o m o

  artigo

19 da  Constituição  d o  Reich  f o i  proferida pelo tribunal  d o  Estado

n a  decisão  de 9 de  dezembro  d e 1 9 2 9  (Jurisprudência civil  do

Reich

  1 2 7 .  anexo,  p . 125 ,  L A M M E R S - S I M O N  I I , p . 2 5 ) : " U ma

divergência

  d a

  espéc ie

  d e

  direi to não-pr ivado

  q u e

  recai

  so b o

artigo

  19

  é  também,

  p o r

  conseguinte ,

  u m a

  divergência entre

  o

Reich  e u m  estado sobre  a  execução  d e u ma l e i d o  Reich pelo

estado infr inge  o  sent ido  d a l e i d o  Reich  a s e r  executada ,  o u

seja,  s e a  execução, pela  s u a  fornia,  é  imperfei ta ."  D a  expressa

regulamentação

  d o

  ar t igo

  15, § 3

o

, " n ã o s e

  pode concluir

  q u e

naqueles casos ,

  n o s

  qua i s

  a

  d ive rgênc i a

  d e

  opinião sobre

  a

forma  d a  execução  d e u ma l e i d o  Reich ainda  n ã o  encontrou  sua

especial manifestação  p o r  meio  d e u m a  reclamação formal, essa

d i v e r g ê n c i a  d e  t ipo  d e  d i r e i t o n ã o - p r i v a d o  n ã o  p o s s a  s e r

apresentada diante

  d o

  tribunal

  d o

  Estado. Nesses últimos casos,

ocorre, antes,  complementarmente,

  a

  intervenção

  d o

  ar t igo

  19.

E le

  es tabe lece

  u m

  pr incípio geral" .

  À

  guisa

  d e

  crí t ica,

  cf . as

expos ições  d e V O N J A N .

  Diário administrativo

  da

  Baviera,

1 9 3 0 , p . 68/69,  a meu ver , mu ito pertinentes.  N o litígio concernen te

à s  rezas  n a s  escolas  d a  Turíngia (decisão  de 11 de  ju lho  de 1930 ,

Jurisprudência civil

  do

  Reich

  1 2 9 ,

  anexo,

  p . 18) , o

  tr ibunal

  d o

Estado declarou

  " n o

  caso presente como

  n ã o

  necess i tando

  d e

exame"

  a

  questão

  se ,

  conforme

  o

  artigo

  15, § 3°, da

  Constituição

d o

  Reich,

  a

  convocação

  d o

  tribunal

  d o

  Estado deve

  s e r

  precedida

pela chamada reclamação, primeiramente porque  ta l  repreensão

teria ocorrido  e ,  segundo, porque,  e m  todo caso, existiria  u m a

  PRIMEIR A PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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O  T R I B U N A L  D O  ES TA DO PARA  O  REIC H AL EMÃ O

J £ 2

tornar-se-iam ainda mais complicadas

  do que já são .

  Poder-

se-ia tentar escapar desse resultado  a o acentuar  o caráter  sub -

sidiário d a competência segundo o artigo  19 da Constituição d o

Reich. Contudo,  a prática, a té então, d o  tribunal  d o Estado não

restringiu  a  própria competência  sob  esse ponto  d e  vista.  O

governo  d o  Reich parece também utilizar-se, ocasionalmente,

d o

  tribunal

  do

 Estado para escapar

 de um

 posicionamento polí-

tico próprio." Além disso,

 p or

 princípio,

 nã o é

 possível apresentar

a

  decisão

  po r um

  tribunal

  d o

  Estado como complementação

alternativa geral (juntando-se

 a

 possibilidades decisórias

 de di -

reito civil, penal, administrativo, financeiro

 e a

 outras). Pode-se

tornar

  u m

  tribunal competente subsidiariamente,

  m as não t o r -

na r o conceito material  d e divergência constitucional  u m c o n -

ceito "subsidiário".

 A

 existência

  ou não de um a

  divergência

 d e

divergência  d e  direito não-privado segundo  o  artigo  19 , do que

resultaria,

  " s e m

  mais",

  a

  competência

  d o

  tribunal

  d o

  Estado para

o  Reich alemão.  O  argumento apresentado pelo Reich  d e q u e a

Turíngia teria  reconhecido

  a

  competência

  d o

  tribunal

  d o

  Estado

(p . 14)

  não

  é  aceito, admiravelmente, pelo tribunal  d o  Estado.

17

  Mu i t o c a r a c t e r í s t i c a

  a

  o b s e r v a ç ã o

  d e

  L A M M E R S ,

  H . H .

Hebdomadário Jurídico

,  1 9 2 8 , p .  3255, nota:  " O  fato d e o  governo

d o  Reich  n ão se t e r  colocado abertamente  d o  lado  d a  igreja  e ,

c o m

  isso,

  t e r

  causado

  u m a

  'divergência

  d e

  opinião'

  n o

  sentido

d o  artigo  15, § 3

o

, d a  Constituição  d o  Reich  o u u m a  'divergência '

n o

  sentido

  d o

  artigo

  19 da

  Const i tuição

  d o

  Reich, residiu, pelo

visto,  n a  d i f i cu ldade  d a  a p r e c i a ç ã o  d a s  questões s i tuadas  n a

esfera  d o  direito estadual, para  a s  quais faltaram  ao  governo  d o

Reich

  o s

  e l ementos , como t ambém

  e m

  p o n d e r a ç õ e s

  d e

  tipo

político. Parece compreensível  q u e o  Reich valorize  o  fa to  d e

q u e u m a

  divergência

  d e

  direito público,

  a

  qual,

  n o s

  moldes

  d o

ar t igo  19 da  Const i tu ição  d o  Reich, pôde  s e r  resolvida tanto

como 'divergência  d e  direito não-privado entre Reich  e  estado'

quanto como 'divergência constitucional dentro

  d e u m

  estado'

diante  d o  tribunal  d o  Estado, tenha encontrado  s u a  resolução,

d e

  acordo

  c o m a

  possibi l idade, desta úl t ima forma. Destarte ,

parece  se r o  melhor para  o  governo  d o  Reich deixar  a  própria

igreja dir imir  a  contenda diante  d o  t r ibunal  d o  Estado, ainda

mais

  q u e a

  igreja lutou pelos direitos

  a e la

  competidos

  e

  estava

e m  m e l h o r e s c o n d i ç õ e s  d o q u e o  g o v e r n o  d o  Reich para

representar  a  si tuação  d a  matéria  e d o  caso radicada  n o  direito

estadual  d a  Saxônia."

PRJMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO  i

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direito

  de

  estado

  d a

  federação

  n ão

  pode

  se r

  dependente

  n e m

d o

  fato

  d e q u e

  outras instâncias  não  tratem

  d a

  matéria,

  n e m

pode  se juntar  complementarmente  a qualquer divergência  d e

opinião. Tampouco quanto

  o

 próprio conceito

  d e

 Constituição,

pode  se r  definido  o  conceito  d e  tais matérias litigiosas, seja

subsidiária, seja complementarmente.

  A

  atividade

  d o

  tribunal

d o

 Estado

  tem

  sempre

  q u e

 deixar visível

  u m a

  relação direta

  e

específica c o m a própria Constituição.

4 .3

 Jurisdição estatal

  e

  constitucional como

expressão

 d a

 tendência

  e m

  transformar

a

 Constituição

  e m u m

  contrato (acordo)

constitucional

Além  da  possibilidade  d e  direito  d e  estado  d a  federação

e m

 considerar

  a

 Constituição como contrato, existe ainda

  u m a

outra possibilidade

  de

  característica muito diferente

  e m

  tratar

a  Constituição como contrato  e . co m  isso, como base  e m u m a

jurisdição estatal

  ou

  constitucional. Isso porque

  se o

  Estado

n ã o f o r  concebido como  u m a  unidade realizada  e  fechada  e m

si  mesma (seja  p o r  meio  d o  poder  d e u m  monarca  ou de um

grupo dominante, seja

 po r

 intermédio

 d e

 homogeneidade

 d o

 povo

em si  uniforme),  e le se  fundamenta, assim,  dualisticamente

ou até

  mesmo

  pluralisticamente  n o  contrato  e n o  acordo  d e

várias partes.

  O

  tipo

  e a

  forma

  de sua

  existência política

  e s -

t ão ,  então, determinados  p o r  contiatos  e  acordos.

18

  Assim,  o

18

  A

  diferenciação entre contrato

  e

  acordo pode

  s e r

  desconsiderada

aqui,

  m a s

  tem-se

  q u e , a o

  menos, mencionar

  q u e é u m

  sintoma

chamativo,

  s e n ão

  inquietante, quando, hoje,

  n a

  Alemanha, essa

diferenciação desenvolvida

  p o r

  Binding

  e

  Triepel para relações

internacionais (direito internacional  e  direi to federal)  e ,  ainda

recentemente, qualificada

  d e

  "incontestável"

  p o r

  KOROVIN-

  Das

Volkerrecht

  der

  Übergangszeit, Berlin-Grunewald,

  192 9 , p . 25 ,

se j a t r ans fe r ida para r e l ações  e  acordos in ternos , p .ex . ,

L I E R M A N N ,  H .  Über  die  rechtliche Natur  der  Vereinbarungen

polizischer Paríeien untereinander,

  A õ R , N . F . X I

  (1926),

  p .

PRIMEIRA  PA RT F - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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O  T R I B U N A L  D O  ESTADO PARA  O  R E I C H A L E M Ã O

estamento medieval baseava-se

  e m

  contratos

  d o s

  mais varia-

d o s

  tipos,

  e m

  acordos, ajustes, capitulações, conciliações,

  ne-

gociações, estatutos, entendimentos,  e m  resumo,  e m u m  siste-

m a d e contratos mútuos c o m direitos adquiridos contratualmente

e com as  típicas ressalvas existenciais,  e m  caso  d e  necessi-

dade,  d o  direito  d e  resistência,  q u e  agora, subitamente, fazem

parte desse tipo  d e contratos. Correspondia igualmente  a um a

concepção

  d o

  século

 X I X

 alemão, amplamente difundida

 e to-

talmente dominante  p o r décadas,  o  fato d e  considerar  a Cons-

tituição como

  u m

 contrato, mais precisamente

  u m

  contrato

  es-

crito, cujos parceiros eram príncipe

  e

  povo,

  rei e

  câmaras,

governo  e  representação popular. Disso resultou, como  u m a

conclusão especialmente prática aqui, u m conceito inequívoco

d e  divergências constitucionais,  ta l  qual  se  manteve incon-

troverso,  e m  substância, como conceito transmitido historica-

mente

  a té o ano de 1919 na

  Alemanha, onde divergências

constitucionais foram apenas divergências entre governo  e

parlamento sobre seus direitos recíprocos

  a

  partir

  d o

  pacto

constitucional.

  U m a

 outra conseqüência politicamente deveras

importante reside n o  fato d e q u e mesmo  a

 emenda constitucio-

nal

, por conseguinte,  t em que s e r concebida como  u m  contrato

entre  o s  contratantes  d o  pacto constitucional. Para  a  relação

q u e  aqui interessa  é  importante, principalmente,  q u e divergên-

cias

  d e

  opinião, diferenças

  e

  contendas sobre

  o

  conteúdo

  da

Constituição escrita sejam resolvidas  p o r  meio  d e  mútuo  en-

tendimento.

  Assim surgiu  na  Baviera  o  famoso entendimento

constitucional

  de 1843 , o

  qual, embora

  n ã o

  valesse como

interpretação constitucional autêntica, apenas como "meio inter-

pretativo",  sob a  reserva  d o s  pontos  d e  discórdia não-ajusta-

d o s ,

  serviu

  a o

 exercício

 d o

 direito

  d e

 deferimento

 d o

 orçamen-

4 1 1 ; c o m  respeito a o  "acordo"  n a bibliografia d o  direito  d o trabal ho

sobre  a  doutrina  d o  contrato coletivo  d e  trabalho,  c f . E .  JACOBI,

E .

  Grundlehren  des  Arbeitsrechis,  Leipz ig ,

  1 9 2 7 , p .

  260/261;

ademais , HUECK-NIPPERDEY.  Lehrbuch  des  Arbeitsrechts

  II,

1 9 3 0 , p . 1 1 6 ,  onde  a  diferenciação  é  apresentada como  s e m  valor

para  o  direito  d o  trabalho  e a  bibliografia  a í  mencionada.

PRIMEIRA PARTE  - A  IUSTIÇA COMO GUARDIA  D A  CONSTITUIÇÃO  "

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2 2

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

m a m , c o m

  seus métodos

  de

  negociação,

  o

  próprio Estado

  e m

u m  construto pluralista.  N a  bibliografia teórica,  já se  procla-

m o u , c o m

  grande despreocupação

  c o m a

  teoria constitucional,

a  tese  de que o Estado parlamentarista  e m geral seria, pela  sua

essência,  u m  acordo.

21

  C o m  isso  se d iz  abertamente, mesmo

talvez  s em a  consciência  d e  todas  as  conseqüências  d e direito

constitucional,  que o Estado atual  é , juntamente  co m su a Cons-

tituição,  o objeto  de acordo  das grandezas sociais participantes

d o

  contrato acordado.

Mesmo

  a

 própria Constituição

 de

 Weimar

 é

 freqüen temente

concebida

  e

 definida como acordo, mais precisamente,

  em seu

todo,  n o  qual nela  se  concebe  u ma "p az d e  classes"  ou uma

"pa2 de

  religiões", talvez também apenas

  u m

  simples "armis-

tício" entre  a  classe operária  e a burguesia alemãs, católicos  e

protestantes, cristãos  e  ateístas, etc.,

22

  quanto também para

importantes trechos  e  disposições  e m  particular,  p . ex .  igreja  e

escola, onde

 a

 designação

 d e

 "acordo escolar"

 é ,

 especialmente.

21

  KELSEN,

  H .

  AUgemeine Staatslehre,  Berlin,

  1 9 2 5 , p . 3 2 4 ( co m a

confusão t ipicamente l iberal entce l iberal ismo  e  democrac ia) ;

Wesen  und  Wert  der  Demokratie,  2 .  Aufl . , Tübingen,  1929 , p . 57 ;

especialmente característ ico também  n o  relato sobre essência  e

desenvolvimento  d a  jurisdição estatal, publicação  d a  associação

d o s

  professores alemães

  d e

  direito público, caderno

  5 , p . 81, no

qual

  s e

  c o n c i l i a

  o

  c a r á t e r

  d e

  a c o r d o

  d o

  m o d e r n o E s t a d o

democrát ico  c o m a  jurisdição consti tucional  n o  Estado federa).

Nesse aspecto, todo  o  relato par te  d o  pr inc íp io  d e q u e  Cons -

tituição seria igual

  a

  norma constitucional, norma constitucional

igual

  a

  norma.

  O

  ambíguo conceito

  d e

  norma apresenta-se, aqui,

novamente como veículo  d a s  modif icações concei tuais , como

tudo  q u e s e  puder imaginar  é  vá l ido como norma, mesmo  a

fundamenta] diversidade  d o  concei to  d e  Const i tuição, s i tuada

teór ica  e  p r a t i camente  n o  cent ro  d e  toda discussão teór ico-

constitucional

  — a

  Constituição

  é u m a

  decisão política

  d a

  unidade

d o

  povo, homogênea

  em s i ? É u ma l e i ( d e

  qual legislador)?

  É u m

cont ra to

  o u

  acordo (entre quais par tes contratuais)?

  —

 po de

desaparecer rapidamente  e  tudo, decisão,  lei e  contrato, pode

s e r  englobado  n a  palavra "norma".

2 2

  A

  respeito, SCHMITT, Carl; PREUB, Hugo.  Sein Staatsbegriff

un d

  seine Stellung

  in der

  deutschen Staatslehre, Tübi ngen (Recht

undStaat,  Heft

  72) 1930 , p .

  31-32.

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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O

  T R I B U N A L

  D O

  ESTADO PARA

  O

  REICH AL EM ÃO

3 1

sempre corrente

  e

  não-insigniflcante.

 E m

  todos esses casos

 d e

fragmentação pluralista  d a unidade estatal  e constitucional,  as

partes portadoras  d o  pluralismo reivindicam  a própria Consti-

tuição,  i.e.,  o  poder estatal  e seu  exercício.  A  constituição  se

toma  s u a  Constituição, pois foram eles  que a contraíram.  F a -

z e m

  valer

  direitos  ao  poder público  em s i ,

  porque podem

recorrer

  a o

  fato

  de que são os

  titulares

  d o

  acordo,

  i.e.,  os

contraentes,  p o r  meio  d o  qual  se  realiza tanto  a  Constituição

quanto toda outra volição estatal. Suas diferenças tornam-se

cada  v e z  mais semelhantes  às  divergências internacionais  e ,

p o r  isso,  s ão  resolvidas, primeiramente,  p o r  meio  d e  negocia-

ções mútuas, conciliação

  e , por f im,

 desde

 q u e

 haja submissão

voluntária  e u m a divergência arbitral  ou sujeita à ação d a justi-

ça ,  também  p o r  meio  d e  decisão judicial. Falta  na  atual teoria

d o  Estado  e d e  Constituição alemã  a  consciência sistemática

dessa situação. Ademais,  os interessados nesse pluralismo  não

têm, por v ia de

  regra,

  a

  pretensão

  d e

  deixar

  su a

  prática

  ser

analisada

  s o b u m

  esclarecimento sistemático.

  N e m t ê m u m

interesse

  e m

  levar

  a

  cabo

  as

  conclusões práticas, pois procu-

r a m  escapar, quando possível,  d o  risco político,  j á  tendo  em

consideração seus partidários  e  eleitores. Dessa forma, reúne-

s e muita coisa  a o encobrir  a realidade  c o m a ajuda  de um  dito

formalismo

  e

  mantê-la, mediante

  u m a

  turva antítese entre

  o

"jurídico"

  e o

  "político", servente

  a

  todos

  o s

  subterfúgios

  e

volatilizações, numa confusa situação.

E m  algumas divergências jurídicas  que se  passam hoje

perante

  o

  tribunal

  d o

  Estado para

  o

  Reich alemão, pode-se

reconhecer facilmente

  que as

 verdadeiras partes

  d o

  litígio

  são

tais construtos sociais  d e  poder  o u  suas coalizões partidárias,

d e  modo  q u e o  processo  s ó  reflete  a  estrutura pluralista  d o

Estado. Mesmo  e m  divergências entre  o  Reich  e u m  estado,

n a realidade, freqüentemente, apenas u m a d as coalizões políti-

co-partidárias processa

 o

 partido hostil.

 O

 fato, aqui,

 de se

 chegar

a  acordos  e d e

  tais acordos serem concluídos

  c o m a

  maior

naturalidade

  é a

 melhor prova

  de que os

 partidos políticos,

  sob

o

  reconhecimento geral, tratam

 o

 objeto

 d o

 litígio constitucional

como algo suscetível  a seu  entendimento  e  acordo, destarte

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIA

  DA

  CONSTITUIÇÃO

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também

  a sua

  disposição. Assim,

  na

  contenda recentemente

decidida (dezembro  de 1930)  entre  o  Reich  e a  Turíngia  por

causa

  d o

  bloqueio

  d o s

  subsídios

  a o s

  policiais,

  f o i

  fechado

  u m

acordo desse tipo." Todavia, pode-se, nesse caso, justificar  a

disposição sobre

  o

 objeto

 d a

 lide

  ao se

 dizer

  que se

 trataria,

 e m

primeiro lugar,

  d e u m a

  relação

 federal

  entre

  o

  Reich

  e um

estado,

  d a

  qual

  não se

 pode eliminar

  po r

 completo

  o

 elemento

23

  A

  proposta

  d e

  acordo apresentada pelo presidente

  d o

  tribunal

d o

  Estado

  a o s

  envolvidos

  e p o r

  eles aceita tinha,

  d e

  acordo

  c o m

a s  informações veiculadas pela imprensa  e m 2 3 d e  dezembro  d e

1 9 3 0 , o  seguinte teor:

A s

  par tes colocam-se

  d e

  acordo

  q u e , n o s

  moldes

  d o

  presente

p rocesso ,  n ã o  pode  e n ã o  deve  s e r  r e s o lv id a  a  q u es t ão  q u e

versa sobre  s e e e m q u e  med ida  o  par t ido  d o s  t rabalhadores

alemão nacional-socia l is ta persegue obje t ivos subvers ivos  o u

puníveis

  d e

  outra forma.

  O

  ponto

  d e

  vista defendido

  p o r

  cada

parte

  c o m

  relação

  a

  essa questão,

  n ã o é

  afetado

  d e

  modo algum

p o r  meio desse acordo  e d a s  declarações nele apresentadas.  A s

partes partem  d o  princípio  d e q u e , e m  breve,  a  questão funda-

mental será esclarecida

  e m u m

  outro processo pendente

  n o

  tribunal

d o

  Reich.

O  Reich suspende  o  bloqueio  d o s  subsídios  à  polícia,  a s  quantias

retidas,  a té  então, serão pagas

  a

  posteriori.

  O  estado  d a  Turíngia

retira

  s u a

  petição

  d o

  tribunal

  d o

  Estado.

O  Estado  d o  Turíngia reconhece amiúde  a  obr igação  d e  cuidar

para  q u e  seja incondicionalmente garantido  o  caráter apolítico

d a

  guarda civil como

  u m

  todo, assim como

  o

  compor tamento

apolítico  d o s  funcionár ios ,  e m  particular,  a  serviço.  E m  confor-

m i d a d e  c o m  i s s o ,  o  g o v e r n o  d a  T u r í n g i a p r o c e d e r á ,  n a

contratação, promoção  e  transferência  d e  policiais ,  n ã o  segundo

pontos

  d e

  vista

  d e

  política partidária,

  m a s

  apenas segundo

  o s

pon tos  d e  vista  d a  ap t id ão  e d o  in te resse o f ic ia l .  A s  par tes

es tão  d e  acordo  q u e , c o m  isso,  u m a  recusa ,  p o r  pr incípio,  d a

contra tação  d e  socia is democratas  é t ão  incompatível quanto

u m a

  t r ansmissão

  d e

  l is tas

  d e

  cand ida tos

  a u m a

  o rgan ização

partidária  c o m  vistas  à  constatação  d a  f i l iação  a o  partido.

O  ministério  d e  estado  d a  Turíngia,  e m s u a  totalidade  ( ) ,  assume

a

  garantia pela observância dessas obrigações.

Esse acordo  n ã o  antecipa  a  questão  de os  princípios  e o s  acordos,

c o m  base  n o s  quais  o s  subsíd ios  a o s  policiais  s ã o  repassados

a o s  Estados, justificarem  u m  compromisso jur ídico  d e  pagamento

ou

  tão-somente

  uma

  vinculação política

  do

  Reich.

PRIMEIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUAROIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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i 6

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

as

 panes

  de um

  litigio constitucionaJ  dentro  de um  estado,

  sob

a  participação  d o  tribunal  d o  Estado, consideram  o  objeto  d o

litígio constitucional algo suscetível

 a seu

 entendimento

 e

 acor-

desse princípio

  n o

  caso

  e m

  particular,

  m a s n o

  qual,

  j á

  agora,

  o

ministério  d e  estado  se  declara expressamente disposto  a  manter

o

  conselho

  d e

  estado informado, desde

  q u e

  possível, sobre todas

a s  questões s ignificat ivas , mesmo sobre diretr izes gerais  d a s

instruções

  a o s

  representantes prussianos

  n o

  conselho

  d o

  Reich.

I I .  As  partes litigantes colocam-se  de  acordo  sobre  o  fato  d e

q u e a

  questão

  d e o

  ministério

  d e

  estado

  t e r que

  publicar também

aquelas le is votadas pe lo par lamento es tadual , para cuja

apresen tação

  n ã o s e

  ouviu

  o

  pa rece r

  d o

  conse lho

  d e

  estado,

n ã o  pode  s e r  decidida  s e m a  assistência  d o  parlamento estadual.

Porém,

  o

  minis tério

  d e

  estado  reconhece

  co m

  relação

  ao con-

selho  de  estado,  se m  reservas,  que  está incondicionalmente

obrigado,  pela determinação

  d o

  artigo

  40 , § 2

o

, d a

  Constituição

prussiana,  a da r a  tempo conhecimento  a o  conselho  d e  estado,

para fins

  d e

  parecer,

  d e

  todos

  o s

  anteprojetos

  de le i ,

  antes

  q u e

sejam apresentados  a o  parlamento estadual .

I I I .  O

  ministério

  de

  estado deixa

  em

  aberto

  a

  questão perante

  o

conselho  de  estado,  s e a  interpretação  d o  artigo  40, § 4

Q

, d a  Cons-

tituição prussiana também deve

  s e r

  diferenciada entre decretos

admin i s t ra t ivos  e  dec re tos ju r íd icos  n o  s en t ido  d o  exercício

constatado

  n a

  aplicação

  d o

  artigo

  51 e se o

  conselho

  d e

  estado

  ou

su a

  comissão competente

  s ó

  deve

  se r

  ouvido

  n o

  caso

  d e

  decretos

administrativos.

  M a s

  todos

  o s

  casos

  n o s

  quais

  se

  tratar

  d a

  mistura

d e  decretos administrativos  e  decretos jurídicos  o u n o s  quais,

seguindo essa orientação,

  o

  caráter

  d o

  decreto parecer duvidoso,

são  decididos  a  favor  de se  ouvir  o  conselho  d e  estado.

Por sua vez, o

  conselho

  de

  estado deixa

  em

  aberto

  a

  questão

formulada anteriormente perante  o  minis té r io  d e  estado,  m a s ,

para regulamentos

  d e

  execução urgentes

  o u

  importantes, sejam

eles concebidos como decreto administrativo  o u  decreto jurídico,

instituirá

  u m

  processo abreviado

  d e

  audição,

  o

  qual levará

  e m

con ta

  a s

  necessidades

  d o

  Estado.

IV. O

  mencionado acordo

  f o i

  apresentado para ' aprovação

  à s

partes litigantes pelos representantes  n a  negociação  d o  acordo,

o

  conselheiro

  d e

  justiça professor doutor Kahl para

  o

  conselho

d e  estado,  o s  secretários  d e  estado  D r .  Freund  e  Fritze para  o

ministério

  d e

 estado. Essa aprovação

  f o i

  concedida pelo ministério

d e

  e s tado

  e m

  julho, pelo conselho

  d e

  e s tado

  e m

  ou tubro

  d e

1 9 2 3 . O

  represen tan te

  d o

  conse lho

  d e

  es tado par t ic ipará

  a o

presidente

  d o

  tribunal

  d o

  Estado.

  Com

  isso,

  o

 processo pendente

deve  se r  considerado  se m  fundamento  e  terminado.

  PRIM EIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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O  T R I B U N A L  D O  ESTADO PARA  O  REIC H AL EM ÀO

2 1

d o . M a s ,

  aqui, objeto

  do

 litígio

  não é

 nada mais

  do que  o exer-

cício  de  poderes  e  competências constitucionais.

A  resolução processual  d e  divergências sempre conduz

facilmente a u m a coordenação  d a s partes, especialmente quan-

d o  prepondera  a  noção  de um

  processo civil

  e as  analogias  a

ele são  aplicadas  a o processo constitucional. Nesse caso,  reú-

ne-se

  a

  coordenação entre

  a s

  partes, contida

  na

  situação

  p r o -

cessual,

  c o m a

 coordenação ocorrente pela noção contratual

  e

contida

  na

  coordenação entre

  a s

  partes processuais

  e

  contra-

tuais,

  q u e

  também surge

  c o m

  respeito

  a o

  objeto

  d o

  litígio,

  d e

modo

  q u e

  ambas concomitantemente

  se

  apóiam

  e se

  fortale-

c e m .  Somente  n o caso  d a punição  d e  violações constitucionais

evidentes  é que a analogia  a o processo penal  tem  efeito.  M as ,

caso contrário, aparecerão inopinavelmente pontos  d e  vista  e

argumentos

  d o

 processo civil. Assim consta

  n a

 decisão

  de 3 de

dezembro

  de 1927 do

  tribunal

  d o

 Estado:

  " N o

  exame

  da

 ques-

tão, se o

  litígio

  e m

  particular

  se

  apresenta como divergência

jurídica, deve-se partir,

  n o

  entanto,

  d o s

  argumentos apresenta-

d o s  pelo requerente, nada  é  diferente  d o  fato  de que , no pro-

cesso civil, quando d o exame d a admissibilidade da via judicial ,

as  alegações  d o  autor  sã o  tomadas como base".

26

  Isso pode

ser  totalmente correto  n o  caso  e m  particular,  só necessitando

ainda

  d e

 mais diferenciação, sobretudo, teria

  que ser

  respeita-

d a a

 particularidade

  da

 jur isd ição estatal

  e

 constitucional,

  que

n ão

  pode separar capacidade

  d e

  agir

  e m

  juízo

  e

  legitimação

ativa

 n o

 modo

  do

 processo civil.

 E m

  contrapartida,

  é

  incorreto

e

  enganoso quando

  o

  processo civil

  é

  apresentado,

  e m u m a

única frase, irrefutavelmente  e sem  outra argumentação  ou

diferenciação, como  u m a  analogia normativa  e  considerado

como algo evidente  e natural  e m  si.

N a

  bibliografia

  d e

  direito público,

  sã o

  visíveis tendências

semelhantes. Enquanto

  a

 teoria

  d e

 direito constitucional

  de até

então, como  e m  geral  a  teoria  d e  direito público, parte,  c o m

toda certeza,  d o princípio  de que não existe nenhum direito  ao

2 6

  Decisão  de 3 de  dezembro  d e 1 9 2 7 ,  Jurisprudência civil  do  Reich

1 2 0 ,  anexo,  p. 1/2;  L A M M E R S - S I M O N S  I , p. 147.

PRIMEIRA 1'ARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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9 8

0

=

G U A R D j t ó

=

^

=

Ç 0 N S T T U l Ç

i

^ 0

poder público  e ,  para  seu  exercício, nenhum direito  à fun-

ção  pública  e de qu e o

  titular

  de um

  poder

  ou

  competência

  d e

direito público

  n ão

 pode,

  de

 modo algum, deles dispor

  d a m e s -

m a

  maneira

  de um

 direito subjetivo

  que lhe

 compete,

  a o

 passo

que a  singularidade,  a anormalidade  e o  caráter inoportuno  d e

u m a

  monarquia

  são

 justamente vistos

  n o

  fato

  de que o

 monar-

ca tem um

  direito

  à

 função pública

  e a seu

 poder estatal,

  o que,

n o Estado modemo,  é  pretensamente totalmente impensável  -

Bematzik construiu, como  se  sabe,  c o m  base nessa singulari-

dade  d a  posição  d o  monarca,  u m a  definição jurídica  d a  dife-

rença entre monarquia  e  república

77

  - as  várias instâncias  p a r -

ticipantes  da  volição estatal tornam agora  a  interpretação  da

Constituição  e o exercício  d e seus poderes objeto d e  acordos  e

d e processos, conduzidos analogamente  a processos civis,  sem

que a  bibliografia  de  direito público tenha encontrado  a í  algo

q u e

  chamasse

  a

  atenção.

  E l a

  parece, antes, contentar-se

  e m

registrar precedentes,

  e e m

  deixar

  a

  cargo

  d o

  futuro

  as

  sérias

conseqüências

  de um

  princípio

  de

 estado completamente novo

e,

  primeiramente, introduzido inconscientemente. Todavia,

  a

publicação

 a té

 hoje mais importante sobre esse tema,

 o j á

 várias

vezes citado tratado  de H . Triepel sobre "Divergências entre  o

Reich

  e os

  Estados" (1923), trata, conforme

  seu

  título, apenas

d e divergências  d e direito federal, ou seja, daquelas  n a s quais  a

coordenação contratual  d a  parte pode  ser justificada  a  partir

d o  elemento federalista  d a  Constituição  d o  Reich,  e  quando

Triepel concebe  o  conceito  d e  divergência  d e  forma muito

ampla,  e le  insiste  e m q u e nenhum estado poderia intentar  u m a

ação  sem  levar  e m  consideração  " u m a  especial relação  c o m o

direito". Nesse ponto, encontra-se aqui salientada  d e  forma

especialmente enfática,  a  relação entre capacidade para  d e-

mandar

  e

  direito público subjetivo.

 O

  tribunal

  d o

  Estado

  t a m -

b é m n ã o

  quer,

  d e

  modo algum,

  ver em

  toda violação

  de uma

determinação constitucional vigente

  u m a

 violação

 de um

 direi-

to

  subjetivo

  e , com

  isso,

  o

  embasamento

  d e u m a

  capacitação

2 7

  Republik

  u n d

  Monarchie,

  2 .

  Aufl. Tübingen

  1 9 1 9 ( 1 .

  Aufl. 1892).

  PRIM EIRA PARTE

  - A

  JUSTIÇA COMO GUARDIÃ

  D A

  CONSTITUIÇÃO

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100

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

mento medieval

  a tal

 ponto

  d e

 ainda tentar garantir

  a

 posse

  d o

poder  a té  mesmo como direito adquirido.  M a s  para  o  grau  d e

decomposição  d o  conceito  de  Estado, frases semelhantes  são

altamente sintomáticas  e merecem  a maior atenção. Jerusalem

encerra esse parágrafo  c o m a  seguinte tese:  " A o  decidir esta

(ou

  seja,

  a

  jurisdição estatal) constitucionalmente sobre diver-

gências entre órgãos  n o  tocante  a sua  competência,  a  Consti-

tuição  d o  Reich reconheceu, nesse ponto,  a  participação  dos

órgãos estatais como objeto

 d e

 direitos subjetivos, como aque-

l es com

  poder para defender suas competências perante

  o u -

tros órgãos

  p o r

  meio

  de

  reivindicações correspondentes junto

à

  jurisdição estatal." Jerusalem acha "crítico"

  o

  modo

  de se

expressar

  d e

  Anschütz (comentário

  p. 154),

  segundo

  o

 qual

  o

poder advindo

  d o

  órgão estatal

  se

  iguala

  a o

  direito subjetivo,

mas só por não ser

 abrangente

  o

 suficiente, aquele poder deve

ser,  antes, idêntico  ao direito subjetivo. Igualmente caracterís-

tica é a formulação d e M . Lõwenthal  q u e encontra  a diferencia-

çã o  entre jurisdição estatal  e jurisdição administrativa  n o  fato

de que , na  jurisdição estatal,  se  fazem valer  direitos

  ao

  poder

público  e, na  jurisdição administrativa,  direitos contra

  o po-

der

  público,

M

  E m  comparação  c o m  semelhantes construções

teóricas,

  a

 prática

  d o

  tribunal

  do

 Estado para

  o

 Reich alemão

  é

extremamente cuidadosa

  e

  evita

  se

  tornar

  o

  instrumento

  d o

pluralismo estatal. Permitiu,

  e m

  especial,

 a

 competência jurídi-

ca dos

  partidos políticos apenas para divergências

  de

  direito

eleitoral,

32

  n ão

  permitiu

  a

 competência jurídica

  d a s

  facções

  d e

partidos políticos,

  d e

  forma alguma,

  d e

  maneira geral,

  e, sim,

so b  rigorosa restrição." Como, além disso, divergências cons-

31

  Diário administrativo

  do

  Reich,

  1 9 2 9 , p . 5 2 6 .

  Tanto mais chama

a

  a tenção

  o

  fato

  d e q u e

  Lõwen tha l ,

  n a

  d i scussão

  d o

  l ivro

  d e

Jerusalem  n o  Diário administrativo

  do

  Reich,  1 9 3 0 . p . 7 4 8 , s e

pronuncia, muito decidida  e  oportunamente, contra  a  construção

d e  direitos subjetivos  d o  órgão estatal.

32

  Decisões  de 17 de  dezembro  d e 1 9 2 7 ;  L A M M E RS - S I M O N S  I, p.

3 3 4 e 3 4 5 ; c f .  também mais adiante neste livro.

33

  Facç ões fo ra m admitidas co mo partes para  o s  seguintes objetos

d e

  litígio: validade

  d e u m a

  eleição para

  o

  parlamento estadual;

PRIMEIRA PARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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O  T R I B U N A L  D O  ESTADO PARA  O  REIC H ALE MÃO

1 0 1

titucionais dentro

  d o

  Reich

  n ã o

  pertencem

  à

  competência

  do

tribunal

  d o

  Estado, estão, assim, retiradas

  d a

  tendência

  ao

pluralismo, localizada

 n a

 expansão

  d o

 conceito

  d e

 divergência

constitucional, suas mais perigosas possibilidades .

Apesar disso,  a s  extremas conseqüências daquelas cons-

truções

  d e

  direitos subjetivos permanecem teoricamente

  dig-

nas de

  consideração,

  a

  Constituição deixaria

  de se r

  tratada

como decisão política

 d a

  totalidade

 d o

 povo, homogêneo

 em si,

os ditos órgãos estatais,  i.e.,  o s  detentores  d o s  plenos poderes

estatais, poderiam  v e r  seus plenos poderes  e  competências

como direitos subjetivos q u e exercem n a s organizações sociais,

cuja incumbência

  se

  tornaram "órgãos estatais",

  e

  reclamar

contra organizações hostis,

  e m

  caso

  d e

  necessidade, também

pela  v ia processual. A volição estatal tornar-se-ia,  em sua  tota-

lidade  e e m  todos  os  detalhes importantes,  u m  acordo, cujos

parceiros  - os  detentores sociais  d o  poder  q u e formam o Esta-

d o

 pluralista

 — d e

  acordo

  c o m a

 situação

 d a

 coisa, fariam valer

e m

  breve direitos subjetivos

  à

  detenção

  d o

  poder estatal

  por

meio

  d o s

  órgãos estatais

  p o r

  eles constituídos,

  mas em

  breve,

caso  se  trate  d e  escapar  ao  risco político,  se  recordariam  d e

q u e ,  "formalmente"  e  "como direito público", absolutamente

n ã o

  existem.

E m minha teoria constitucional, contrapus a tais tendências

o  sistema  de um  Estado constitucional democrático  c o m u m

conceito positivo

  d e

  Constituição. Caso

  se

  persevere

  n o

  fato

de que a

 Constituição

 d e

 Weimar signifique

 u m a

 decisão políti-

ca do

 povo alemão

 em sua

 homogeneidade como

  o

 detentor

 d o

duração  d a  eleição  d e u m a  assembléia estadual; inst i tuição  d e

comissões

  d e

 investigação; validade

  d e

  leis,

  n a s

 quais participaram

o u eram autorizadas  a participar; constitucionalidade  d e u m  decreto

d e  emergência ; senão,  " s u a  competênc ia jur íd ica  s ó  pode  ser

f u n d a m e n t a d a

  p o r

  circunstâncias especiais" ,

  c f . a

  enumeração

d o s  precedentes  e a  exposição fundamental  n a  decisão  de 24 de

j unho

  d e 1 9 3 0 ,

  Jurisprudência civil  do  Reich

  1 2 9 ,

  anexo,

  p. 8.

D e

  resto,

  n ã o s e

  deve continuar

  a

  discutir aqui

  a

  capacidade

  d e

agir  e m  juízo perante  o  tribunal  d o  Es tado,  é de s e  esperar  po r

meio

  d e E .

  Fr iesenhahn (Bonn) ,

  u m

  tratamento dessa questão

para  a  qual falta,  a té  agora,  u m a  apresentação sistemática.

PRIMEIRA 1'ARTE  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO  •

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Í f i 9  O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

poder legislativo constitucional  e , em  virtude dessa decisão,  o

Reich alemão seja

  u m a

  democracia constitucional,

  a

 pergunta

pelo guardião  da  Constituição pode  ser,  então, respondida  d e

forma diferente

 d o q u e p o r

 meio

 d e

 estruturas judiciais fictícias.

PRIMEIRA PARTIS  - A  JUSTIÇA COMO GUARDIà D A  CONSTITUIÇÃO

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S e g u n d a p a r t e

C O N C R E T S I T U Ç Ã O

C O N S T I T U C I O N L

  D

T U L I D D E

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o

— I

P l u r a l i s m o p o l i c r a c i a

  e ^

f e d e r a l i s m o   Q

A

 concreta situação constitucional

 d o

 Reich alemão

 d e

 hoje

deve  s e r  brevemente caracterizada aqui  p o r  meio  d e  três  c o n -

ceitos: pluralismo, policracia  e  federalismo. Trata-se, nesse

aspecto,

  d e

  três fenômenos

  d o

  desenvolvimento

  d e

  nossas

  re-

lações  d e direito público,  a  serem diferenciados entre  si e que

s e  colocam  e m  evidência,  d e  forma distinta,  e m  várias esferas

d a

  vida estatal.

  A

  primeira vista, esses três fenômenos estão

tão-somente ligados  p o r u m a  oposição comum,  a  oposição  a

u m a  unidade  estatal fechada  e  universal,  mas , de  resto, entre

si , são de  natureza diferente.  C o m a  palavra federalismo,  p ro -

cura-se expressar aqui apenas

  a

  justaposição

  e a

  cooperação,

existentes dentro  d e u m a  organização federal  d e u m a  maioria

d e  Estados encontra-se, aqui,  u m a pluralidade  d e  formas esta-

tais

  sobre base

  estatal. Pluralismo

,

  e m

  contrapartida, designa

u m a

  maioria

  d e

  complexos

  sociais  d e

  poder, solidamente

  or-

ganizados  e estendendo-se pelo Estado, /.<?., tanto pelas várias

áreas  d a  vida estatal, quanto pelas fronteiras  d o s  Estados  e

pelas corporações territoriais autônomas, esses complexos

  d e

poder como tais  se apoderam  d a volição estatal,  s e m  deixar  d e

ser u m produto apenas social (não-estatal).  Por fim, a policracia

constitui-se numa maioria  d e detentores  d a  economia  pública,

juridicamente autônomos,

  e m

 cuja autonomia

  a

 vontade estatal

encontra

  u m

  limite. Sobre

  a

 primeira diferenciação provisória

pode  ser  feita  a  seguinte confrontação: o pluralismo designa  o

SEGUNDA )*ARTE  - A  C ONC R ETA S ITUAÇ ÃO C ONS TITUC IONAL. . .

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1 0 6

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

poder  d e  várias grandezas sociais  sobre  a  volição estatal;  a

policracia  é  possível  co m  base  e m u m a  retirada  d o  Estado  e

e m u m a

  autonomização

  perante  a

  vontade estatal;

  n o

  federa-

lismo reúnem-se ambos na antítese formulada por Carl Bilfinger,

influência  na  volição  d o  Reich  e  liberdade  d o  Reich  na  esfera

da  própria independência  e  autonomia. Essas breves defini-

ções  n ã o  devem  ser  definições completas,  m a s  servir apenas

como ponto  de partida para  u m  panorama  d e nossa atual situa-

ção

 constitucional.

Cada

  u m d o s

  três fenômenos pode

  se r

  individualmente

considerado  e examinado, porém,  n a  realidade  d a vida estatal,

e le

  aparecerá,

  na

  maioria

  d as

  vezes, junto

  a um ou

  dois

  dos

outros fenómenos, seja aliado

  a

  eles, seja para

  se

  opor

  a

  eles

o u  reagir contra eles.  U m  sempre  va i  poder  se  abrigar  p o r

detrás  d o outro  e , apesar disso, encontrai' simul taneamente  nos

abusos

  d o

  outro

  su a

 própria justificação. Assim,

  p o r

  exemplo,

os  complexos sociais  d e  poder,  q u e  ultrapassam  a s  fronteiras

estaduais, solidamente organizados  e portadores  d o pluralismo

podem

  ser

  apresentados,

  c o m

  seus partidos políticos univer-

sais  p o r  todo  o  Reich, como  u m a  proteção contra  o  perigo  d e

u m a  fragmentação federalista-particularista  d o  Reich.  M a s ,

inversamente, tais partidos políticos podem também,  se manti-

verem ocupado

  o

  poder estatal

  e m u m

  Estado, recorrer

  aos

elementos federalistas  d a  Constituição  d o  Reich perante  u m

partido normativo

  n o

 Reich

  que lhe

 seja hostil.

 A

 policracia

  d a

economia pública pode, desde

  q u e

  apoiada

  p o r

  corporações

territoriais autônomas, especialmente pela autonomia adminis-

trativa municipal, servir, igualmente,  a u m partido político e ao

complexo social

  de

  poder,

  ao

  qual

  o

  partido pertence, como

sustento  e  assistência perante  u m  outro partido,  se não , t am-

b ém , n a  mesma medida  que a autonomia federalista, m a s  todo

o

 tradicional

 pathos  da

  autonomia administrativa serve, então,

na

  realidade,

  à

  pluralização

  da

  essência

  d o

  Estado alemão.

  O

federal ismo pode  se justificar c o m o fato  de ser uma  organiza-

ção d e

  Estados, neutralizando

  e

  superando, assim,

  o s

  detento-

res do

  poder

  d o

 pluralismo, meramente sociais,

  e que, por

  isso,

atuam  s em u m  sentimento  d e  responsabilidade estatal. Dessa

•  SEGUNDA. PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.. .

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P L U R A L I S M O . P O L I C P A C I A  E  F E D E R A L I S M O

1112

forma, dependendo

  d a

 situação tática,

 u m

 pode sempre tirar

 d e

jogo  ou  aproveitar, apoiar  ou  minar, combater  ou  favorecer  o

outro.  E  sobre essa complicada confusão  d e  forças centrífu-

gas e um  sistema  d e  movimentos contrários centrípetos  que se

encontra

  o

  Reich alemão

  d e

  hoje.

A s  tendências pluralistas,  e m  especial,  que j á se  delinea-

r a m e m u m a

 definida concepção

  d e

  jurisdição estatal, discuti-

d a

  anteriormente,

  não são , de

 modo algum, fenômenos aciden-

tais

  e

  isolados.

  A o

  contrário, pertencem

  às

  forças,

  s e m

  cuja

consideração

  a

  situação constitucional atual

  d a

 Alemanha

  per -

manece inexplicável  e a s  quais  t êm que se r  aqui caracteriza-

d a s  pelo menos  p o r  meio  d e  algumas breves exposições para

q u e se

 torne visível tanto

 a

 concreta situação

 da

 vigente Consti-

tuição d o Reich quanto o problema concreto  d o guardião cons-

titucional. Toda instituição  e, até  mesmo, toda norma  tem em

s i ,

 como condição imanente

  de sua

 existência

  ou de sua

 valida-

d e ,

  essa relação

  c o m u m a

  situação

  e a

  relação

  tom a - se

  mais

intensa

  e

 mais direta

 n a

  mesma medida

  e m q u e a

  instituição

  se

aproxima

  d o

  centro político

  d a

  volição estatal.

  É

  suficiente-

mente estranho

  o

  fato

  de que se

  tenha procurado instituir

  na

Alemanha,

  p o r u m

  tempo,

  u m

  guardião

  d a

  Constituição

  sem

u m conceito objetivo de Constituição e divergência constitucional.

M a s  mais admirável  é que se quis inserir  tal  instituição inima-

ginável  se m  estabilidade  e sem  constância  e m u m a  situação,

cuja consideração  e contemplação  fo i inicialmente recusada.

5.1

  Desenvolvimento

  d o

  parlamento como

cenário  d e u m sistema pluralista

A

  situação constitucional

  d a

  atualidade

  é

  primeiramente

caracterizada pelo fato

  d e q u e

  numerosas instituições

  e nor-

malizações

  d o

  século

  X I X

  permaneceram inalteradas,

  mas a

atual situação

  se

 modificou completamente

  e m

  relação

  à

 ante-

rior. A s constituições alemãs  d o século  X I X  situam-se  em uma

época, cuja estrutura fundamental  fo i  colocada pelas grandes

SEGUNDA PARTE

  - A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL. . .

  •

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i n » O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

ciências políticas desse tempo sobre

  u m a

 fórmula básica, clara

e  útil,  a  diferenciação entre Estado  e

  sociedade.

  Nesse caso,

h á u m a

  segunda pergunta: como avaliar

  o

  Estado

  e a

  socieda-

de, se  eles  se  opõem reciprocamente  e são  dependentes entre

s i?

  Tudo isso

  n ão

  suprime

  a

  diferenciação. Ademais, deve-se

observar

  q u e

  sociedade

era ,

  essencialmente,

  u m

  conceito

polêmico  e  tinha  e m  vistas, como noção contrária,  o concreto

Estado-funcionário

 e

 militar monárquico existente naquela época

e , por

  conseguinte,

  o que

  não  pertencia

  a

 esse Estado

  e ra cha-

mado  d e  sociedade. Naquele tempo,  o  Estado podia  se r  dife-

renciado

  d a

  sociedade

  e era

  forte

  o

  suficiente para

  se

  opor

autonomamente  às  demais forças sociais  e ,  assim, determinar

a  partir  de s i  mesmo  o s  agrupamentos,  d e  modo  q u e  todas  as

numerosas diversidades dentro

  da

 sociedade independente

  d o

Estado -  oposições confessionais, culturais, econômicas  -

foram relativizadas

  a

  partir dele

  e, em

  caso

  d e

  necessidade,

pela oposição comum

  a ele e não

 impediram

  a

 reunião

  na " s o -

ciedade .  M a s , p o r  outro lado, manteve-se  e m u m a  considerá-

v e l

  neutralidade

  e

  não-intervenção perante

  a

  religião

  e a eco-

nomia, respeitando amplamente  a  autonomia dessas esferas

da  vida. Assim,  e le não era  absoluto  n o  sentido  e não era tão

forte

  a

  ponto

  d e

  tornar

  se m

  significado tudo

  o que não e ra

Estado, dessa forma, f o i possível  u m equilíbrio e u m dualismo.

Podia-se,

  e m

  especial, considerar possível

  u m

  Estado

  sem re -

ligião

  e s e m uma

  concepção

  d e

  mundo,

  a té

 mesmo

  u m

  Estado

completamente agnóstico,  e  construir  u m a  economia  que nã o

necessita

  d o

  Estado

  e u m

  Estado

  q u e n ã o

  depende

  d e

  econo-

mia .  Contudo,  o  ponto  d e  referência determinante continuava

sendo  o Estado, pois  e le  detém  u m a  existência nítida  e concre-

ta .

 Ainda hoje,

  a

 ambígua palavra sociedade ,

  no que

  interes-

sa  aqui, deve designar, sobretudo, algo  q u e  não  seja Estado,

além disso

  e

  eventualmente também,

  o que nã o

  seja igreja.

1

Essa diferenciação serve

  de

  base, como condição, para todas

' O

 mais simples

  e

 mais claro res umo

  d a s

  noções inconcebivelmente

ambíguas  d e  sociedade encontra-se  e m  SPRANGER, Eduard.

SEGUNDA PARTE

  - A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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E m

  todos

  os

  importantes desenvolvimentos

  d e

  conceitos

se

  expressa

  a

  estrutura dualística básica.

  A

  Constituição

  6

tida como contrato entre príncipe  e povo.  O conteúdo essencial

d e u m a  le i

 estatal

  é

 visto

 n o

 fato

  de que e la

  intervém

  n a

  liber-

dade  e n a  propriedade  d o s  cidadãos . Diferentemente  d e u m

decreto administrativo, publicado apenas para  a s  repartições  e

funcionários públicos,

  u m  decreto jurídico

  dirige-se

  a

  todos

os  cidadãos.  O  direito orçamentário  baseia-se  n a  idéia  d e

q u e ,

  entre

  o s

  parceiros,

  s e

  realiza regularmente

  u m  acordo

orçamentário  e  ainda  na  última edição  d o  manual  d e  Meyer-

Anschiitz (1919,  p. 890, 897), a lei orçamentária  é chamada  d e

acordo orçamentário . Quando, para

  u m a to

  administrativo,

como  a avaliação  d o orçamento nacional,  se exige  u m a dita

  lei

formal

, apresenta-se nessa

 formalização

  nada mais  do que a

politização  d o

 conceito,

 o

 poder político

 d o

 parlamento

 é

 grande

o  suficiente para,  de um  lado, impor  o fato d e q u e u m a  norma-

lização

  só

  é

  então válida como

  le i

  quando

  o

  parlamento tiver

participado,  e ,  simultaneamente,  d e  outro lado, conquistar  u m

conceito  de le i  formal,

  i.e.,

  n ã o  levando  e m  conta  o  conteúdo

objetivo

  d o

  processo, assim, essa formalização exprime

  a p e -

nas o  sucesso político  d a  representação popular perante  o go-

verno,  da sociedade perante o Estado-funcionário monárquico.

Mesmo

  a  autonomia administrativa

  pressupõe

  e m

  todas

  a s

suas instituições  a  diferenciação entre Estado  e  sociedade,

autonomia administrativa

  é u m a

  parte

  d a

  sociedade defronte

a o  Estado  e a seu  funcionalismo  e co m  base nessa condição

fundamental, desenvolveram-se e formularam-se n o século X I X

seus conceitos

  e

  instituições.

Tal Estado dualístico é u m equilíbrio entre dois diferen-

tes  tipos d e Estado: ele é, ao mesmo tempo, u m Estado dirigen-

te e um

  Estado legiferante. Desenvolve-se

  e m

  direção

  a um

München,

  1921 , I I , p . 41) : a

  câmara

  é o

  órgão

  " p o r

  meio

  d o

  qual

a  sociedade domina  o  Estado ;  o u a  rica observação  d e  GNEIST,

Rudolf.

  Die

  nationale Rechtsidee

  von den

  Stünden,  Berlin,

  1 8 9 4 ,

p . 2 6 9 : a  exigência geral  p o r  votação secreta  é " o  sinal seguro  d a

pene t ração

  d a

  sociedade dentro

  d o

  Es tado .

S E G U N D A P A R T E  - A  C O N C R E T A S I T U A Ç Ã O C O N S T I T U C I O N A L .

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A  E  FEDERALISMO

1 1 1

Estado legiferante quanto mais

  o

  parlamento, enquanto

corporação legisladora,  se mostra superior  ao governo, ou seja,

quanto mais

  a

 sociedade

  d e

 então

  se

 mostra superior

 ao

 Estado

existente naquela época.

  O s

  Estados podem

  ser

  classificados

segundo  a  área  na  qual encontram  o  cerne  de sua  atividade.

Assim sendo,

  há

 Estados judican tes,

  ou

  melhor, jurisdicionais ,

além disso. Estados

  q u e s ã o

  essencialmente governo

  e

 execu-

tivo  e , por f im, Estados legiferantes. O Estado medieval,  e até

hoje

 a

 teoria

 d o

 Estado anglo-saxão, parte

 d o

 principio segundo

o  qual  o  núcleo d o poder público  é a jurisdição.  Poder público

e

 jurisdição

 são

 aqui equiparados, como ainda hoje corresponde

a o  modo  de se  exprimir  d o  Codex Júris Canonici  (p.ex.  can.

1 9 6 , 2 1 8 ) ,  devendo-se observar, todavia,  q u e a  paráfrase

normativa para

  a

  autoridade

  da

  igreja católico-romana

  e de

seus supremos cargos  não se  expressa usando  a  imagem  d e

u m

 juiz,

  mas de um

  pastor sobre

  seu

  rebanho.

  O

  Estado abso-

lutista q u e v e m ganhando  sua forma desde  o século X V I  origi-

nou-se precisamente

  d o

  colapso

  e d a

  dissolução

  d o

  Estado

  d e

direito medieval, pluralista, feudal-estamentário e d e sua juris-

dição, apoiando-se

  n o

 exército

  e n o

 funcionalismo.

 P o r

 conse-

guinte,  ele é  essencialmente  u m  Estado  d o

 poder executivo

  e

d o  governo.  S u a  ratio,  a  ratio status,  a  freqüentemente  mal

interpretada razão

  d e

  Estado

  n ã o

  reside

  e m

  normas repletas

d e  conteúdo,  m a s n a  efetividade  com que e l e  cria  u m a  situa-

ção , na

 qual

  s ó a

 partir dela normas podem passar

  a

 valer, haja

vista

  que o

 Estado coloca

  u m f i m à

  causa

  d e

  toda desordem

  e

guerras civis  e à  luta pelo normativamente correto. Esse Esta-

d o  estabelece  a  ordem  e a  segurança públicas .  S ó  quando

isso sucedeu  é que o  Estado legiferante  d a  Constituição  d e

Estado

  d e

  direito

  e

 civil pôde nele penetrar.

  N o

  chamado esta-

do de  exceção, aflora abertamente  o  respectivo centro  do Es -

tado.  O  Estado judicante serve-se, para tanto,  d a

  le i

  marcial

(mais precisamente:

  d a

  jurisdição marcial),

  ou

  seja,

  de uma

justiça sumária, o Estado como executivo, sobretudo, d a trans-

ferência

  do

  poder executivo,  ligada,  e m  caso  d e  necessida-

de , à suspensão d e direitos fundamentais, o Estado legiferante,

SEGUNDA PARTF.

  - A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.. .

  •

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1 1 2

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

do s

  decretos

  d e

  Estado

  d e

  emergência

  e

  exceção,

  i.e.,  de um

processo legislativo sumário.

3

E m

  tais classificações

 e

  tipificações

  d a s

  espécies

  d e

  Esta-

do ,

  deve-se sempre observar

  que é

  pouco provável

  q u e

  haja

u m  Estado puramente legiferante, assim como  u m  Estado  m e -

ramente judicante  ou um  Estado  q u e  nada mais seria  a não ser

governo

  e

  administração. Nesse aspecto, todo Estado

  é um a

ligação  e u m a  mistura entre essas espécies,  u m  status mixtus.

M a s c o m  essa ressalva,  é  possível obter  u m a  caracterização

útil

  d o s

  Estados segundo

  a

  área central

  d a

  atividade estatal.

P o r conseguinte,  é legítimo  e especialmente elucidativo para  a

questão  do  guardião  d a Constituição qualificar o Estado  de di -

reito

 e

 constitucional civil, como

 o

 desenvolvido

 n o

 século

 X I X ,

como  u m  Estado legiferante. Como acertadamente afirmado

p o r  Richard Thoma,  f a z  parte  d a s  tendências determinantes

d o

 tipo

 d o

 Estado moderno retirar

 d o

 juiz

  e

 transferir

 a o

 legisla-

dor" a decisão, cu ja racionalidade  e justiça podem sempre  ser

objeto  d e  discussão .

4

  U m  Estado jurisdicional  é  possível  en -

quanto normas definidas

  em seu

 conteúdo possam também

  ser

pressupostas  e serem reconhecidas d e f orma incontroversa s em

o  estabelecimento consciente  e  escrito  d e  normas  po r um po-

d e r

  central organizado.

  E m

  contrapartida,

  e m u m

  Estado

legiferante

  n ã o

  pode haver nenhuma justiça constitucional

  ou

jurisdição estatal como verdadeiro guardião  da  Constituição.

3

  Infor mações adic ionais sobre  o  estado  d e  exceção ,

  vide

  mais

adiante neste livro.

  N o

  tratado

  d e

  WALDECKER, Ludwig.  Die

Grundlagen

  des

  militãrischen Verordnungsrechls

  in

  Zivilsachen

wãhrend

  des

  Kriegszustandes,

  A õ R .  XXXVI (1917),  p .  389/390,

encont ra-se observada

  a

  re lação ent re Estado judicante

  e le i

m a r c i a l ,

  m a s

  m a l - c o m p r e e n d i d a

  a

  c o n s e q ü ê n c i a l ó g i c a

  d o

desenvolvimento poster ior .

4

  Grundrechte

  und

  Polizeigewalt

  (Edição comemo rat iv a para  o

Supremo Tribunal Administrativo), Berlin,

  1 9 2 5 , p . 2 2 3 ; n ão

  tanto

d o  mesmo modo  n o  pronunciamento durante  o  encontro alemão

d e

 professores

 d e

 direito público

  em 1 9 2 8 em

 Viena,

 Verõffentlichungen

der

  Vereinigung

  der

  deutschen Staatsrechtsíehrer,

  He f t

  5 , p .

109 ;  mais ainda  n a  edição comemorativa  d o  tribunal  d o  Reich  d e

1929 , p . 20 0 e em

  Handbuch

  des

  Staatsrechts,

  B d. I I , p . 109,  136/137.

SEGUNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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114

^ G y A R D I Â O D A _ C O N S T I T U I ^ O

res com  espírito anticonstitucional

A última frase

  é

  deci-

siva.  E la  mostra  q u e ,  para  as  noções  d o  século  X I X , o parla-

mento, consoante

  s u a

  natureza

  e sua

  essência, trazia

  em si

mesmo  a  verdadeira  garantia

  da

  Constituição.  Isso  f a z  parte

da  crença  n o  parlamento  e é  condição para  que a  corporação

legislativa seja  o  portador  d o  Estado  e o  próprio Estado  u m

Estado legiferante.

M a s

  essa posição

  d a

  corporação legiferante

  fo i

  possível

apenas  e m u m a  determinada situação, isto porque sempre  se

pressupõe, nesse aspecto,

  q u e o

  parlamento,

  a

  assembléia

legislativa, como representante  d o  povo  ou da  sociedade  —

ambos, tanto

 o

 povo quanto

  a

 sociedade,

  s ó

 podem

  s e r

 identifi-

cados, enquanto ainda forem contrapostos  a o  governo  e ao

Estado

  - v ê

  diante

  de s i um

  poderoso Estado-funcionário

monárquico, independente dele, como parceiro  d o  pacto cons-

titucional. Enquanto representação popular,

  o

  parlamento

  tor-

na-se, aqui,  o  verdadeiro guardião  e  garantidor  da  Constitui-

ção ,

 pois

  o

  governo, opositor

  a o

 contrato, relutou

  e m

  fechar

  a s

portas  d o  parlamento. Desse modo, porque  o  Governo gasta  e

exige taxas

 é

 tido como perdulário, sendo visto

 c o m

 desconfian-

ça . No  entanto,  a  representação popular  é  tida como econômi-

c a e

 contrária

  ao s

 gastos, pois,

 n o

 liberal século

  X I X , a

 tendên-

cia era a de  restringir  o  Estado  a u m  mínimo,  restringir suas

intervenções  n a  economia,  neutralizá-lo  perante  a  sociedade

e

  seus interesses conflitantes

  a f im de que

  sociedade

  e

  econo-

m ia  cheguem  às  decisões necessárias para  su a  área segundo

seus princípios imanentes.

  N o

 jogo livre

 d as

 opiniões

  c o m

 base

na  livre propaganda, surgem partidos cuja discussão  e  luta  d e

opiniões configuram  a opinião pública  e ,  assim, determinam  o

conteúdo  d a  vontade estatal,  n o jogo livre  das  forças sociais  e

5

  Allgemeines Staatsrecht,

  4 .

  A u f l .

  1 8 6 8 , B d . I , p .

  561 /562 .

  É

especialmente instrutivo comparar  c o m  essas frases  d e  Bluntschli

a

  argumentação

  d e R .

  Gneist: este

  v ê a

  garantia

  n a

  cooperação

durante  o  processo legis lat ivo,  d o  qual part ic ipam monarquia

hereditária, primeira câmara permanente  e  segunda eleita; parecer,

op. cit.,  p . 23.

SEGUNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A  E  FEDERALISMO

U S

econômicas, dominam liberdade

  d e

  contratar

  e

  liberdade

  eco-

nômica,

 p o r

 meio

  das

 quais parece assegurada

  a

 suprema pros-

peridade econômica, haja vista  q u e o  mecanismo automático

d a livre economia  e d o livre mercado  se autocontrola e se auto-

regula segundo leis econômicas (pela oferta  e  procura, troca

d e

 prestações, formação

 d e

  preços, formação

 d e

  renda

  na eco-

nomia nacional).  O s  direitos políticos fundamentais, em  espe-

cial

  a

  liberdade pessoal,

  a

  liberdade

  d e

 opinião,

  a

 liberdade

  de

contrato,  a  liberdade econômica,  a  liberdade  d e  profissão  e a

propriedade privada,  os  verdadeiros alvos  da  suprema corte

d o s

  Estados Unidos, pressupõem

  u m

  Estado neutro

  que , em

princípio, n ã o  intervém  ou que só intervém, n o máximo,  com o

objetivo de restituir a s condições alteradas da livre concorrência.

Esse Estado fundamentalmente neutro

  n o

  sentido liberal

  e

n ã o

  intervencionista perante

  a

 sociedade

  e a

 economia perma-

nece também como pré-requisito  d a s  constituições, mesmo

quando para

  a

 política social

  e

  cultural sejam admitidas exce-

ções.  Mas e le se  modificou  p o r  completo,  na  medida  em que

aquela construção dual entre Estado/sociedade e governo/povo

perdeu  su a  tensão  e o  Estado legiferante chegou  ao f im, uma

vez que  agora  se  torna  a  auto-organização  d a  sociedade .

C a i , c o m

  isso, como

 j á

  mencionado,

  a

  diferenciação

 a té

  agora

sempre pressuposta entre Estado  e  sociedade, governo  e  povo,

pelo  q u e  todos  os  conceitos  e  instituições construídos sobre

esta pressuposição

  (lei,

  orçamento, autonomia administrativa)

tornam-se novos problemas.  M a s  surge, concomitantemente,

algo ainda mais amplo  e  mais profundo.  S e a  sociedade  se

auto-organiza como Estado,  se  Estado  e  sociedade devem  ser

fundamentalmente idênticos, todos os problemas sociais e eco-

nômicos tomam-se, então, problemas diretamente

  estatais  e

não se  pode mais diferenciar matérias político-estatais daque-

l a s de  cunho social  e  apolítico. Acabam todas  as  confronta-

ções

  a té

 então comuns

  e

  situadas

  sob o

  pressuposto

  d o

  Estado

neutro,  as quais ocorrem como conseqüência  d a diferenciação

entre Estado  e  sociedade  e são  apenas casos  d e  aplicação  e

circunlocuções dessa diferenciação. Separações antitéticas.

SEGUNDA PARIS  - A  CONCRETA S1TUAÇAO CONSTITUCIONAL.

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A  E  F E D E R A L I S M O

112

para  u m  Estado potencialmente  total.  Essa violenta mudança

pode

 ser

 construída como parte

 de um

 desenvolvimento dialético

q u e

  decorre

  em  três estágios:  d o

  Estado

 absolutista  d o s

  sécu-

l o s  XVII  e  XVIII, passando pelo Estado  neutro,  d o  liberal  sé-

culo

  X I X ,

  para

  o

  Estado

  total

  d a

  identidade entre Estado

  e

sociedade.

O q u e

  mais chama

  a

  atenção

  é a

  mudança

  q u e

  ocorre

  na

esfera econômica. Pode-se aqui partir  do  princípio, como  d e

u m

  fato reconhecido

  e

  incontroverso,

  de que a

  economia

  f i -

nanceira pública, tanto

 e m

 relação

  às

 anteriores dimensões

 p ré -

guerra quanto n a relação atual  c o m a economia livre  e privada,

o u  seja, n ã o pública, atingiu proporções tais q u e passa  a existir

não

  apenas

  um

  aumento quantitativo,

  m a s

  também

  u m a

  modi-

ficação qualitativa,

  u m a

  mudança estrutural

e q u e

  todas

  as

esferas  d a  vida pública,  e não  apenas  as  questões diretamente

financeiras e econômicas,  s ã o atingidas p o r essa mudança. N ã o

é

 aqui necessário responder

  c o m

  quais números

  a

 modificação

é

  indicada

  e se , por

  exemplo, está estatisticamente correto

  o

dado variadas vezes citado  e calculado para  o ano de 1928 de

q u e 5 3 % d a receita nacional alemã  s ã o controlados pelo poder

público,

6

  pois

  o

  fenômeno

  e m s u a

  totalidade

  é

  incontestável

  e

incontroverso.

  U m  expert  n o

  assunto

  d e

  maior autoridade,

  o

secretário  d e  Estado, professor  J .  Popirz, parte  d o  princípio,

e m u m

 discurso resumido sobre

  a

  compensação financeira,

1

 d e

que , de

  fato, para

  a

 repartição

  d a

 parte maior

  d a

  receita nacio-

b

  Este núm ero encontra- se calculado

  n o s

  fascículos tr imestrais

d e

  pesquisa conjuntural,

  v o l . 5

  (1930), fascículo

  2 , p . 72; e le é

aproveitado  e  validado,  p. ex.. , por J.  Popitz  ( c f .  nota seguinte),  G.

Mtlller-Oerl inghausen,  e m s u a  palestra sobre  a  crise econômica

de 4 de  novembro  d e 1 9 3 0 ,  Mitteilungen  des  íuingnamvereins.

Jahrg.

  1 9 3 0 ,

  Neue Folge

  1 9 .

 Heft ,

  p . 4 0 9 ; c f .

 P FLE IDER ER, Oito.

Die  Staatswirtschaft  und das  Sozialprodukt, Jena  1 9 3 0 ;  SATZEW,

Manuel.  Die  õjfentliche Unternehmung  de r  Gegenwart, TUbingen

1 9 3 0 , p . 6 /7 .

7

  Der  Finanzausgleich  und  seine Bedeuiung  für die  Finanzloge

des  Reichs,  der  Lãnder  und  Gemeinden;  Verrtffentlichungen

  d e s

Reichsverbandes

  d e r

  deutschen Industrie, Berl in,

  1 9 3 0 , p . 6 ;

SEGUNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇAO CONSTITUCIONAL.

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1 1 8

O  G U A R D I A O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

nal

  alemã, encontra-se desligado

  o

  mecanismo auto-regulador

da

  livre economia

  e d o

  livre mercado

  e ,

 ocupando

  o seu

  lugar,

entrou  "a influência determinate  d e u ma vontade fundamental-

mente extra-econômica,  o u  seja,  a  vontade  d o  Estado .  U m

outro

  expert  n o

  assunto

  d e

  alto nível,

  o

  ministro

  d a s

  finanças

do

  Reich, ministro

  d e

  Estado Saemisch,

  diz que é a

  economia

pública financeira,  a  qual influencia decisivamente  a  situação

política

 d a

 Alemanha.

5

 Pelo lado científico-econômico,

  fo i ex -

posta

  u m a

  formulação, como

  m e

  parece, extremamente acer-

tada para  a  oposição  d o  sistema  de até  então perante  o  atual,

do

  sistema

  de

  participação,

  n o  qual compete  ao  Estado  a p e -

nas uma

 parcela

 d a

 receita nacional,

  u m a

  espécie

  d e

 dividendo

d o

  lucro líquido,

 para  o sistema  de  controle,  n o

 qual

  o

 Estado,

e m

  decorrência

  d a s

  intensas relações entre economia finan-

ceira

  e

  economia nacional,

  e m

  decorrência

  d o

  forte aumento

tanto

  da

  demanda quanto

  d a

  renda estatais, como sócio

  e

redistribuidor da renda nacional, como produtor, consumidor  e

empregador, co-determina normativamente

  a

 economia nacio-

nal .

 Essa fórmula elaborada

  p o r

  Fritz Karl

  em u m

  interessante

e  importante tratado,  "A  economia política  d e  nosso tempo

(Jena, 1930), deve também  se r  aqui empregada apenas como

fórmula,

  sem que

  dependa,

  de

  resto,

  d e u m a

  crítica econômi-

co-nacional. Decisivo, aqui, para

  a

 consideração

  d e

 ordem

  t eó -

rico-política e teórico-constitucional  é que a relação d o Estado

c o m a

 economia, hoje,

  é o

 verdadeiro objeto

 d o s

 problemas

  d e

política interna

  e que as

  fórmulas transmitidas pelo antigo

  E s-

tado, baseado  na  separação entre Estado  e  sociedade,  só são

apropriadas para ocultar essas circunstâncias.

E m

  qualquer Estado moderno,

  a

  relação

  d o

  Estado

  com a

economia compõe

  o

 verdadeiro objeto

 d a s

 questões

  d e

 política

interna imediatamente atuais. Elas

  n ã o

  mais podem serresol-

além disso:  Der

  Õffentliche Finanzbedarf

  und der

  Reichsspar-

kommissar,

  Bankarchiv,

  X X X ,

  Heft

  2 (15

  Oktober

  1930) p . 21 .

Deutsche Juristenzeitung,

  2

o

  d e  jane i ro  d e 1 9 3 1 , co l . 1 7 ;  além

d i s s o

  e m  Der  Reichssparkommissar  un d  seine Au/gabe;

Finanzrechtl iche Zeitfragen,  vo l . 2 ,  Berlin  1930, p . 12.

•  SECU NDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.. .

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A

  E

  FEDERALISMO

1 1 9

vidas  c o m o  antigo princípio liberal  da  não-interferência,  da

absoluta  não-intervenção.  Exceto poucas exceções, isso  é de

conhecimento geral. Atualmente, quanto mais  o  moderno  Es-

tado tiver conotações industriais, tanto mais

  as

  questões

  eco-

nômicas ocuparão  o  centro  d e  política interna  e  externa,  que,

e m

  grande parte

  se

  trata

  d e

  político econômica,

  n a

  verdade,

n ã o s ó  como política alfandegária  ou de  comércio.  Se uma lei

estatal  é publicada contra  o  abuso  d e posições econômicas  de

poder (como

  o

  decreto anticartel

  de 2 de

  novembro

  d e

  1923),

reconhecem-se

  c o m

  essa formulação

  o

 conceito

  e a

 existência

d e u m  poder econômico c o m  base  n o  Estado  e na lei. O

Estado atual

  t em um

  extenso direito trabalhista, regras relati-

vas ao  contrato coletivo  de  trabalho  e u m a conciliação estatal

d e  divergências salariais,  p o r  meio  da  qual influencia  nor -

mativamente

  os

  salários, concede gigantescas subvenções

  aos

vários ramos

  d a

 economia,

  é u m

  Estado assistencial

  e

 preocu-

pado  c o m o  bem-estar social  e , por  conseguinte, concomi-

tantemente

  e m

  ingentes proporções,

  u m

  Estado fiscal

  e

  tribu-

tário. Além disso,

 n a

 Alemanha,

 e le

 ainda também

  é u m

 Estado

reparador  q u e t e m q u e  levantar bilhões  d e  tributos para Esta-

d o s  estrangeiros.  Em ta l  situação,  a  exigência  p o r u m a n ã o -

intervenção torna-se

  u m a

  utopia,

  a té

  mesmo

  u m a

  autocon-

tradição, pois

  a

  não-intervenção significaria deixar

  o

 caminho

livre,  n o s  antagonismos  e  conflitos econômicos  q u e  hoje  não

são

  combatidos

  c o m

  meios puramente econômicos,

  aos

  vários

grupos

 d e

 poder.

 A

 não-intervenção,

  em ta l

 situação, nada mais

é do que  intervenção  e m  favor daquele  e m  posição superior  e

se m  consideração  ao  outro, mostrando-se novamente  a s im-

ples verdade  da frase, aparentemente,  tão paradoxal pronuncia-

da por

  Talleyrand para

  a

 política externa:

  a

  não-intervenção

  é

u m conceito difícil, significando aproximadamente o mesmo que

a

  intervenção.

N a  mudança para  o  Estado econômico reside  a  modifica-

ç ã o  mais acentuada perante  as noções estatais  d o  século  X IX .

Essa mudança pode

  se r

 igualmente observada

  em

  outras áreas,

mesmo

  se a í for

 hoje sentida,

  na

  maioria

  d a s

  vezes, como

  m e -

n o s  atual  em  conseqüência  d o  esmagador sobrepeso  das  dili-

Slit iUNtJA PARTE  - A  CONCRETA SITUARÃO CONSTITUCIONAL.

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1 2 0

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

culdades  e  problemas econômicos.  N ã o é estranho  que a  rejei-

ção a

  essa expansão

  d o

  Estado surja, primeiramente, como

rejeição àquela atividade estatal  que, em tal  momento, deter-

mina exatamente  o  tipo  d e  Estado, portanto, como rejeição  a o

Estado

 qu e

  legisla.

 P o r

  isso, clama-se, inicialmente,

  p o r

 garan-

tias contra  o  legislador. Dessa forma, podem também  se r p ro-

vavelmente explicadas  as primeiras tentativas pouco claras  d e

restrições,

  as

  quais foram discutidas

  na

  primeira parte

  d o p r e -

sente livro  e as  quais  se  prendiam  à jus tiça para obter  u m c o n -

trapeso contra

  o

  legislador,

  que se

  tornava cada

  v e z

  mais

  p o -

deroso

  e

  cada

  v e z

  mais abrangente. Terminaram

  e m v ã s

formalidades  p o r  terem  se  originado  nã o do  reconhecimento

concreto

 d a

 situação constitucional

  e m s ua

 totalidade,

 m a s a pe-

nas de uma  reação  d e  reflexo.  S e u  verdadeiro erro residiu  n o

fato  de que  podiam contrapor  a o poder  d o  legislador moderno

apenas

 u m a

 justiça

  que ou era

 vinculada,

  em seu

 conteúdo,

  por

determinadas normas desse mesmo legislador  ou ,  porém,  po -

dia lhe

 opor apenas princípios indeterminados

 e

 discutíveis,

 c o m

cuja ajuda

  não se

  podia fundamentar nenhuma autoridade

  su-

perior  a o  legislador. Embora  a mudança para  o  Estado econô-

mico

  e

  preocupado

  c o m o

 bem-estar social tivesse significado

u m  momento crítico para  o  tradicional Estado legiferante,  ela

ainda n ã o precisou  e não pôde, p o r  isso, alimentar  os tribunais,

se m

  mais,

  co m

 nova força

 e

 energias políticas.

  Em t a l

  situação

alterada  e diante  de tal  expansão  das  tarefas e  problemas esta-

tais,

  é o

  governo,

  m a s

  certamente

  nã o a

  justiça,

  q u e

  talvez

possa propiciar  o  remédio. Talvez faltem hoje  à  justiça,  na

maioria  d os  Estados  d o  continente europeu, todas  as  normas

materiais,

  co m

  base

  nas

  quais

  e la

  estaria

  e m

  condições

  de do-

minar,

 per se,

  a  situação totalmente nova.

O

  parlamento,

  a

  corporação legislativa,

  o

  titular

  e

  ponto

central

  d o

 Estado legiferante tornaram-se,

  no

  mesmo momen-

to no qual  sua vitória parecia estar completa,  u m produto  c o n -

traditório

  em si

 mesmo

  e que

  negava

  o s

 próprios pressupostos

e os  pressupostos  de sua  vitória.  S u a  posição  e sua  superiori-

dade  a té  então,  seu  ímpeto  de  expansão perante  o  governo,

seu

  comportamento

  e m

  nome

  do

  povo, tudo isso pressupunha

1  SKG UND A 1'ARTH  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL...

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A  E  FEDERALISMO

1 2 1

u m a  diferenciação entre Estado  e  sociedade  q u e ,  após  a  vitó-

r ia do

  parlamento,

  n ão

  mais continuou

  a

 existir.

  S u a

  unidade,

e ra definida a té agora pelo seu  rival na política interna, o antigo

Estado-funcionário e  militar monárquico. Quando este caiu,  o

parlamento,  p o r assim dizer,  se despedaçou. Agora,  o Estado é ,

como

  se diz , uma

  auto-organização

  da

  sociedade,

  mas a

 dúvi-

d a é  como  a  sociedade  que se  auto-organiza chega  à  unidade

e se a

  unidade ocorre realmente como resultado

  d a

  auto-or-

ganização , pois esta significa, primeiramente, apenas

  um pos -

tulado  e u m procedimento caracterizado pela oposição  a méto-

d o s

  anteriores

  e

  hoje

  n ão

  mais existentes

  da

  formação estatal

d a  vontade  e d a  unidade,  ou seja, caracterizado apenas negati-

v a e  polemicamente. A identidade  q u e reside n a palavra auto

e  afixada linguisticamente  à  organização n ã o  precisa ocor-

re r de  qualquer forma  e d e  modo incondicionalmente seguro

n e m

  como unidade

  da

  sociedade

  em s i , nem

  como unidade

  d o

Estado.  H á , como já por nós suficientemente vivenciado, orga-

nizações

  s e m

  sucesso

  e sem

  resultado.

Foram primeiramente imaginados  os partidos como titula-

res da

 auto-organização,

 m a s

 provou-se

 q u e

 eles,

 em sua

 grande

parte, haviam  se  transformado muito.  N o  sentido  d o  Estado

constitucional liberal,

  é

  característica

  d o

  partido

  que e le

  seja

u m

  produto baseado

  e m

  livre propaganda,

  não  se

  tornando,

então, u m complexo social sólido, constante, permanente e m i-

nuciosamente organizado. Tanto

  a

  liberdade quanto

  a "pro-

paganda proíbem, conforme

  a

  idéia nelas contida, toda pres-

são social  ou econômica, permitindo, como motivação, apenas

a  livre persuasão  d e  pessoas social  e  economicamente livres,

mental

  e

  intelectualmente autônomas

  e

 capazes

  d e

 proferir

 u m

juízo próprio. Essa idéia

  de um

  partido, presumida

  nas

 consti-

tuições civis

  e de

  Estado

  d e

  direito

  até o

  Estado atual, serve

também  d e  base para  as  normalizações  d a  vigente Constitui-

ç ã o d o  Reich.  F o i  freqüentemente acentuado  que a  Constitui-

ç ã o d o

  Reich

  n ã o

  conhece

  o

  partido

e que só

  profere

  tal

palavra  em um  único trecho,  n o  artigo  130, §  2 ,  e  apenas  d e

forma negativa  e  denegatória.  F o i  também Freqüentemente

SEGUNDA PARTfc  - A  CXJNCKKTA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL...  »

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1 2 2

O

  G U A R D I Ã O

  O A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

delineada

  a

 grande distância desse regulamento

 c o m a

 realida-

de de

  nossas atuais condições

  d e

  política intema.

  A

  isso

  s e

pode ainda acrescentar

  que a

  Constituição

  d o

  Reich,

  se e la

ignora  o partido político,  só o faz e pode fazê-lo porque sempre

continua querendo partir d o princípio de que o partido político é

u m  produto sociologicamente  tão pouco sólido,  tão  pouco  f o r -

mado,

  tão

  fluido

  ou até

  mesmo volúvel,

  q u e

  pode

  se r

  mesmo

tratado como não-existente, pois

  a

  região

  na

  qual

  o s

  partidos

devam tão-somente existir,

  é ,

  como Hugo PreuB afirmou

  d e

modo conseqüente  e  enfático, apenas  a  esfera  d a  opinião

pública  que e le - em  consonância  c o m  toda  a  tradição desse

conceito  - vê como  um  fluido indefinível e não-organizável.

Em v ez

  disso,

  os

 partidos maiores,

  em sua

  maioria,

  s ão ,

  hoje,

em  parte, produtos rígidos  e  minuciosamente organizados  e ,

e m

 parte, localizam-se

  em u m

 complexo social minuciosamen-

te

 organizado

  co m

  burocracias influentes,

 u m

  exército perma-

nente  d e funcionários remunerados  e todo  u m  sistema  d e orga-

nizações d e ajuda e apoio, n a s quais se encontra vinculada u m a

clientela unida intelectual, social  e economicamente.  A exten-

são a

  todas

  a s

  áreas

  d a

  existência humana,

  a

  supressão

  das

separações

  e

  neutralizações liberais

  de

  várias áreas como reli-

gião, economia  e educação,  e m  suma,  o que  antes  e ra  qualifi-

cado como  a  mudança para  o  total ,  já se  encontra realizado

para  u m a  parcela  d o s  cidadãos,  d e  certa forma,  p o r  alguns

complexos organizacionais sociais,  d e  modo  q u e ,  embora  não

tenhamos

  u m

  Estado total,

 j á

  temos algumas construções

  p a r -

tidárias sociais

 q u e

  aspiram

  à

  totalidade

  e

  reúnem inteiramente

seu

  time ainda

  n a

  juventude. Dessas construções partidárias,

cada

  u m a t e m ,

 como

  d iz

 Eduard Spranger, todo

  u m

  programa

cultural e sua convivência lado a lado forma e conduz o Estado

pluralista. Pelo fato de existir  u m a  maioria  d e  tais complexos,

concorrente  u m a co m a  outra  e que se  mantém mutuamente

dentro

  de

  determinados limites,

  ou

  seja,

  u m

  Estado

  partidá-

rio-pluralista

, fica evitado

  que o

  Estado total

  se

  faça valer

como

  ta l com o

 mesmo ímpeto

 c om que já o fez , nos

 chamados

Estado.?  unipartidaristas,  a  União Soviética  e a  Itália.  M as ,

p o r intermédio d a pluralização, n ã o s e suprime a mudança para

'

  SECUNDA

  PA R TF - A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL...

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A  F  FEDERALISMO

1 2 3

o  total,  e la  apenas  se  torna,  por  assim dizer, parcelada quando

todo complexo

 d e

 poder social organizado procura tanto quanto

possível

 -

  desde

 o

 orfeão

 e o

 clube desportivo

 até a

 autoproteção

armada

  -

  realizar

  a

  totalidade

  em si

  mesmo

  e

  para

  si

  mesmo.

O  fato  d e u m a  expressão como Estado unipartidarista ter

sido possível para designar aquele outro produto estatal  e, sem

mais,

  te r

  sido acolhida pelo

  u so

  geral

  d a

  língua, talvez seja

  a

prova mais evidente

  d o

  quanto

  a

 palavra partido deixou

  d e

designar  u m  produto desorganizado  e baseado  em  livre propa-

ganda.  O  claro  e  firme crítico liberal dessa evolução,  M. J .

Bonn, caracterizou

  a

  transformação como transição para

  um

Estado feudal

  e d e

 estamento,

  u m

  professor

 d e

 direito público

da autoridade  d e Triepel mostrou  a contradição  d o sistema par-

tidário rigidamente organizado

 c o m a s

 normalizações

  e os

 pres-

supostos

  da

  Constituição,

  u m a

 bibliografia abrangente sobre

  a

mudança  d e  forma  e  estrutura  d o  sistema partidário alemão

mostra  que a  mudança  que se esconde  p o r  detrás daquela  fó r -

mula

  d e

  auto-organização

  da

 sociedade

  p o r

  meio

  d o

  partido

entrou, há muito tempo, para  a consciência científica como  u m

novo problema.

Apesar disso,  o conceito  d e partido pressuposto  n a Consti-

tuição parece desaparecer  c o m u m a  inconsciente naturalida-

de . Não

  vejo causar

  u m a

  impressão duradoura além

  d a s

  fron-

teiras daquela bibliografia científica especializada

  e

  além

  das

tristes queixas isoladas, quando  u m  erudito como  M a x  Weber

persevera  na definição de partido como  u m  produto baseado

essencialmente

  " e m

  livre propaganda .

  O

  tribunal

  d o

  Estado

para

  o

  Reich alemão,

  e.g.,

  apresentou,

  ao

 contrário,

  u m a

  defi-

nição d e partido político  q u e , exatamente devido  a sua  natura-

lidade  sem complicações, d á a perceber, d e maneira impressio-

nante,

 a

 profunda transformação

 d o

 conceito

 d e

 partido

 e ,

 assim,

todo o nosso sistema político. E m s u a sentença de 7 de julho de

1928, o  tribunal  d o  Estado  d iz :  Para  o  processo perante  o tri-

bunal

  d o

 Estado

  só

 podem

  ser

  válidos como partidos políticos

aquelas associações

  de

  pessoas

  n as

  quais exista

  a

  possibilida-

de de que sua

  atividade seja

 d e

  interesse para

  o

  resultado elei-

toral. Grupos  que não estejam indubitavelmente  em condições

SEGUNDA 1'AIÍTR  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.. .  • - —

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1 2 4

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

de se

  proporcionarem acesso

  à

  representação popular, cuja

possibilidade  de atividade, então,  n ão seja e m absoluto atingida

pela configuração d o direito eleitoral,  não são partidos  no sen-

tido parlamentar. Quando

  f o r

 admitida apenas

  a

 propícia

  p r o -

paganda

  (e

 apenas aquela comprovada como propícia median-

te os  sucessos eleitorais anteriores)  c o m  igualdade  d e direitos,

está, então, suprimido o princípio normativo anterior  da propa-

ganda incondicionalmente livre

  e o da

  chance

  d e

  propaganda

incondicionalmente igual para toda opinião política

 e

 todo parti-

do.

9

  Como critério para

  os

  partidos

  n o

  sentido parlamentar,

  o

tribunal  d o  Estado apresenta  u m a  série  d e exigências.  Em p r i -

meiro lugar,  u m  número  de membros  n ã o  baixo demais,  o Par-

tido Social-democrata Independente

  da

  Saxônia

  não é

  consi-

derado partido,

  c o m a

 justificativa

  de que , nas

  eleições para

  o

parlamento

  d o

  Reich

  em 20 de

  maio

  de 1928,

  teria reunido

apenas 2.953 votos  n o s  três distritos eleitorais  da  Saxônia  e ,

po r  conseguinte,  n ã o  teria  a  menor expectativa  d e  conquistar

u m

  mandato

  n a s

  eleições para

  o

  parlamento estadual saxão.

Além disso,

  c o m a

 justificativa

  de que, do

 contrário,

  u m

 escru-

tínio proporcional seria impossível,  sã o admitidos apenas parti-

d o s  rigidamente organizados,  mas não  grupos desarticulados .

Aqueles podem  ser  reconhecidos pelas seguintes característi-

cas: um  programa

,

  u m a  base organizacional

  relativamente

abrangente

  e jornais  de que

  dispõe

  o

  partido.

  E m

  suma,

  tem

que se  tratar  d e produtos,  o s quais  " n ã o podem  ser privados  d e

certa  solidez  e "nos  quais  se  pode contar  c o m u m a  duração

suficiente .

  " U m

  partido pressupõe

  a

  união

  sólida  de um nú-

A  frase citada  n o  texto encontra-se  n o s  fundamentos  d a  decisão

d o

  tribunal

  d o

  Estado

  de 7 de

  julho

  d e 1 9 2 8 e

  refere-se

  a o

  Partido

Social-democrata Independente  d a  Saxônia (Ju ris pr udê nc ia civil

do  Reich  1 2 1 ,  anexo,  p . 8 ;  LAMMERS-SIMONS  I, p.  309/310).

N ã o

  completamente

  d e

  acordo

  c o m

  esse tratamento

  d o

  caráter

malpropíc io temos  a  frase  n a  decisão  de 17 de  dezembro  d e

1 9 2 7  referente  a o  Partido Popular  d e  Direita Associação Nacional

d e

  Hamburgo (LAMMERS-SIMONS

  I , p . 3 4 8 ) : "Po r

  isso

  não é

admissível submeter propostas malpropícias  d e  candidatos  à s

eleições

  a

  condições diferentes

  ( . . . ) do que as

  mais propicias .

SEOUNDA PARTE  - A  CONCRETA S1TUAÇAO CONSTITUCIONAL.

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A  b  F b D b R A L l S M O

mero maior

  d e

  cidadãos para alcançar objetivos políticos.

10

Partido, ligação, ordem tomam-se iguais.

Vista  d e forma mais detalhada, aquela definição d e partido

d o

 tribunal

  d o

 Estado

 é u m

  indício

 de qu e não

 apenas

 o

 concei-

to de partido,  m as  também  o conceito  d e

  eleição

  se  modificou

p o r

  total.

 A

  consideração

  d e u m a

  realização

  d o

  sistema

  de es-

crutínio proporcional desempenha

  n o s

  motivos

  d e

  decisão

  d o

tribunal  d o Estado  u m  papel decisivo,  m a s q u e ainda necessita

d e  mais discussão, pois  n ã o  apenas aquele novo conceito  d e

partido

  é

 justificado

 c o m a s

  necessidades

  d o

  sistema

  de

  escru-

tínio proporcional.

 A té

 mesmo desvios

 d o

 princípio

 d a

 igualda-

d e

  eleitoral

  são

  justificados

  c o m o

  fato

  de que o

  sistema

  d e

escrutínio proporcional tornaria necessárias tais restrições  da

igualdade eleitoral, j á que igualdade eleitoral não é um concei to

lógico-matemático,

 e, sim, um

 conceito jurídico

 e,

 ademais,

 se -

r ia um

  objetivo político digno

  d e

  reconhecimento combater

  a

fragmentação partidária.

  O

  tribunal

  d o

 Estado passa

  e m

  silên-

c io por  cima  d o  fato de qu e  ambas  as coisas  por e le  negadas  -

o  caráter matemático e a  fragmentação partidária  - só en-

traram

  e m

  nossas condições partidárias nessa intensidade

  por

meio  d o  sistema  d e  escrutínio proporcional  e de que  seus dois

pontos

  d e

 vista justificam,

  p o r

  isso, mais

  u m a

  restrição

  do s is-

tema d e escrutínio proporcional  d o q u e u m a restrição da igual-

dade eleitoral  ou da  imediatidade  d a eleição. Porém, direito d e

escrutínio proporcional e part ido rigidamente organizado estão,

e m

 realidade, intimamente ligados

  u m a o

 outro.

  M a s ,

  também,

independentemente

  d o

  direito

  d e

  escrutínio proporcional,

  a s

atuais condições constitucionais estão caracterizadas  p o r  rígi-

das  organizações partidárias.  A  critica difundida  e,  freqüen-

temente, muito severa ao direito d e escrutínio proporcional não

deveria deixar

  de ver

  isso, principalmente,

  ao

  perguntar quão

possíveis

  são as

  reformas

 e o qu e se

 conseguiria

  c o m a

  aboli-

l u

  Decisões

  de 17 de

  dezembro

  d e 1 9 2 7 ,

  LAMMER S -S 1MONS

  , p .

346 ; de 12 de  maio  d e 1 9 2 8 ,  L A M M E R S - S I M ON S  I , p . 414 e de 7

d e  j u l h o  d e 1 9 2 8  (Par t ido Soc ia l -democra ta Independente  d a

S axôn ia ) ,  Jurisprudência civil

  do

  Reich

  1 2 1 ,

  a n e x o ,

  p. 8 e

LAMMER S -S IMONS  I , p . 311.

SECUNDA PARTE

  - A

  CONCRETA SITUAÇÃ O CO NS TO UCIONAL. ..

  • —

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1 2 6

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

ção " d o sistema d e escrutínio proporcional.  M a s o mais impor-

tante

  q u e

  pode

  ser

 averiguado nesse contexto

  e que

  mostra,

  d e

forma mais acentuada,  a  mudança total  d o s conceitos tradicio-

nais,

  é o

  seguinte:

  na

  realidade

  d a

  atual prática eleitoral,

  não é

apenas  a  igualdade  da  eleição  e não é  apenas  a  iinediatidade

da eleição  q u e  estão restringidas pelo sobrepeso  d o  sistema  d e

escrutínio proporcional

 e , em

 parte, abolidas,

 m a s o

 próprio

 p ro -

cedimento qualificado como eleição obteve  u m  conteúdo  in-

teiramente novo.

  A.

 superioridade

 d o

 antigo parlamento

  d a m o -

narquia constitucional baseava-se

 n o

 fato

 d e q u e

 seus membros

eram  eleitos.  Como  u m a  corporação eleita pela totalidade  d o

povo,

  ele se

  contrapunha

  ao rei e a seu

  governo

  e m

  nome

  d o

povo. A eleição manifestava u m a relação imediata entre  o elei-

tor e os deputados.  O  fato d e a minoria vencida  n o s votos  não

obter nenhuma representação expressamente organizada

  era

conseqüentemente democrático, pois  é  destruído  o pressupos-

to

  fundamental

  d e

  toda democracia, caso seja abandonado

  o

axioma

  de que a

 minoria vencida

  p or

 maioria

 d o s

 votos

  só que-

ria o resultado d a s eleições (não sua vontade especial) e , destarte,

anuiu

  à

 vontade

  da

  maioria como

  su a

  própria vontade.

  M as s e

fo r  organizada, para tornar  a derrota  p o r  maioria  d e  votos  im -

possível,  a representação  d a s  minorias  p o r  meio  d o  sistema  d e

escrutínio proporcional, tem-se

  q u e ,

  conseqüentemente,

  t a m -

b é m  admitir  a validade  d e u m  grande número  d e partidos  m e -

nores.

  Se fo r

  combatida

  a

  fragmentação partidária, combate-

se,

 então,

 u m

 efeito

 d o

 sistema

 q u e n ão

 mais compreende aquele

axioma fundamental democrático  d a  identidade  d a  vontade  d e

todos  os

  cidadãos.

  Se

  restringirmos

  ao

  sistema

  d e

  escrutínio

proporcional  a igualdade  e a imediatidade  da eleição, exprime-

se com  isso  que um  processo eleitoral, dominado pelo sistema

d e

  escrutínio proporcional

  e

  colidente

  c o m a s

 duas caracterís-

ticas básicas  d o  direito eleitoral democrático igual  e  imediato,

precede

  a

 essas características básicas, sendo considerado mais

importante  do que a própria eleição democrática, pois,  e m últi-

m a conseqüência,  o sistema  de escrutínio proporcional conduz

com seu

  sistema

  d e

  listas

  a que a

 massa

  d o s

 eleitores

  n ão

 eleja

mais,  e m  absoluto, nenhum deputado. Pelo contrário,  o que

— — 1  SEO\ÍNT>A PART E  - A  CONCRETA SlTL'AÇÀO CONSTITUCIONAL...

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A  E  F E D E R A L I S M O

122

sucede

  é o

  seguinte:

  da

  escuridão

  d e

  deliberações secretas

  de

comitês incontroláveis apresenta-se  às  massas  d o s  eleitores

u m a  pluralidade  d e  listas partidárias  c o m u m a  longa série  d e

nomes,

  em que s e

 dividem, então,

  nas

  eleições segundo

  as lis-

ta s

  partidárias.

  Não se

  trata mais

  de um

  eleitor

  e m

  particular

definir diretamente

  u m

  deputado

  e m

  particular, existe tão-so-

mente  u m  agrupamento  e uma  divisão estatísticos  das mas-

sas dos  eleitores segundo  uma  maioria  de  listas partidárias.

Enquanto  se  tratar  d o s membros  d e  rígidas organizações parti-

dárias, socialmente ligados,

  e dos

 membros

  d o s

 grupos sociais

d e  poder  a elas aliados, esse processo  n ã o  significa nada mais

q u e u m a

  revista pelos permanentes exércitos partidários,

  m as

desde

  que a

 massa

  d o s

 demais cidadãos ainda

 n ã o

  atingida

  por

tais organizações participe

  d o

  processo,

  e la

  flutua, como

  os

desprezivelmente chamados pedaços  d e  madeira flutuantes

o u

  como areia levada pelo vento , entre essas rígidas organi-

zações, determinando,  n a  maioria  d a s  vezes,  a  decisão. Isso

também

  n ão

  pode

  ser

 chamado

  d e

 eleição, embora

  n ã o

 contra-

diga

  a

  noção

  d e

  democracia

  n a

  mesma proporção

  que o

pluralismo  d o s  complexos rigidamente organizados.  Mas t am -

bém não é

 mais eleição

  n o

  sentido

  d a

 noção tradicional

  de de-

putados  e  representantes,  m as , na  realidade,  u m  processo  se-

melhante

  a u m  plebiscito.  O

  processo

  d e u m a

  atual eleição

para  o  parlamento estadual  ou do  Reich,  q u e  ainda continua  a

se r

  qualificado

  d e

  eleição , separa-se, assim,

  e m

  dois lados:

por um  lado,  a  averiguação puramente estatística  da  divisão

pluralista

  d o

 Estado

 em

  vários complexos rigidamente organi-

zados e , por outro,  u m pouco plebiscitário.

O

  Estado democrático encontra-se freqüentemente quali-

ficado,  e até  mesmo definido, como Estado  partidário.  E m

u m

  sentido especial,

  o

  Estado democrático-parlamentar

  é ain-

da  mais  u m  Estado partidário.  D e  alguma maneira, pode-se

talvez qualificar qualquer Estado como Estado partidário,

  m as

c o m  isso prova-se apenas  que ta l designação  é vazia  e  insigni-

ficante, desde  que não se  acrescente nenhum dado mais deta-

lhado acerca

  d o

  tipo,

  da

 organização,

 d a

 estrutura

  e d o

 número

d o s

 partidos. Para

 que um

 Estado legiferante democrálico-parla-

SfiC.UNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL. . .  •

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1 3 0

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

car,

  insignificantemente,

  à

  parte

  e , no

  final, encontram-se

  na

situação daquele conhecido cachorro  da  fábula de La Fontaine,

o  qual guarda  c o m a  melhor  d a s  intenções  o  assado  de seu

senhor,  m a s ,  quando  vê  outros cachorros caírem sobre  o m es -

m o ,

  também passa

  a

 participar, finalmente,

  da

  refeição.

A  diferença entre  u m  Estado partidário-parlamentar  c o m

partidos livres,

  ou

  seja,

 n ã o

  rigidamente organizados,

  e u m E s -

tado partidário-pluralista

  c o m

  produtos rigidamente organiza-

dos ,  como  o s  portadores  da  volição estatal, pode  ser  maior  d o

qu e  entre monarquia  e  república  ou  qualquer outro regime  e s-

tatal.

  A s

  rígidas relações sociais

  que s ão

  hoje portadoras

  d o

Estado pluralista fazem  d o  parlamento, onde seus expoentes

surgem  na  forma  de  facções,  u m a  mera imagem  d a  repartição

pluralista  d o  próprio Estado. Nessas circunstâncias,  d e  onde

deve

  se

 originar

  a

 unidade

  n a

 qual estão suprimidas

  e

 fundidas

as  rigorosas vinculações partidárias  e d e  interessados?  Não se

realiza mais  u m a  discussão  e ate  minha pura alusão  a  esse

princípio ideal

  d o

 parlamentarismo levou Richard Thoma

  a fa-

l a r de um a  base inteiramente bolorecida . Alg umas assim

chamadas relações transversais q u e  passam pelos partidos

políticos (interesses agrícolas, interesses

 d o s

 operários, funcioná-

rios públicos,

  em

 casos particulares também mulheres) podem

conseguir,  e m determinadas matérias,  u m a  maioria,  m a s  como

n o

 pluralismo

  não se

 trata apenas

  d o s

  partidos

  e

 facções parla-

mentares

  e ,

  além disso, tais relações transversais podem

  ser,

fatores  d o  agrupamento pluralista, embora signifiquem  u m a

complicação,  não significam  u m a  supressão  ou  eliminação,  a o

contrário,

  a té

  mesmo

  u m a

  confirmação

  e u m

  reforço dessa

situação.

A

 famosa solidarité parlementaire ,

  os

  comuns

  e

 egoístas

interesses particulares

  d o s

  deputados parlamentares,

  q u e p a s -

sam por  cima  das  fronteiras partidárias, principalmente aque-

les dos

  verdadeiros políticos

  de

 caixeira, podem

  ser um

  motivo

eficaz

 e u m

 útil fator

 d e

 unidade,

  m as não s ão

 mais suficientes,

como

  era de se

  supor,

  e m u m a

  situação

  tão

  difícil como

  a da

Alemanha atual  e no  forte enrijecimento  das  organizações.

Dessa forma,  o  parlamento  d o  cenário  d e u m a  livre negocia-

•  S H G U N D A F A R T E  - A  C O N C R E T A S I T U A Ç Ã O C O N S f l l I J C I O N A L .

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A  C  FLDLRALISMQ

m

ç ã o  formadora  d e  unidade entre livres representantes popula-

res e de um

  transformador

  d e

  interesses partidários

  em uma

vontade suprapartidária, torna-se  u m  cenário  d e  repartição

pluralista

  d a s

 forças

 sociais

  organizadas.

 A

 conseqüência

 é que

ele se

  torne,

  po r

  meio

  de seu

  imanente pluralismo, incapaz

  de

ação

  ou se

  transformar

 e m

  maioria

  o u ,

  porém,

  que a

 respecti-

v a  maioria faça  u so de  todas  as  possibilidades legais, como

instrumentos  e meios  d e proteção  de sua posse  d o poder, apro-

veite

  o

  tempo

  de seu

  poder

  e m

  todas

  a s

 direções

  e ,

  sobretudo,

procure restringir  a chance, segundo  a possibilidade,  a o adver-

sário mais forte

  e

  mais perigoso

  d e

  fazer

  o

  mesmo. Seria

  tal-

v e z

  ingênuo explicar isso apenas

  a

  partir

  da

  maldade humana

ou a té

 mesmo

  a

 partir

  d e u m a

 infâmia especial,

 s ó

 possível

  nos

dias

  d e

 hoje.

  A

  história estacai

  c

 constitucional alemã conhece

processos análogos

  e m

  séculos anteriores,

  e m

  número

  e

 regu-

laridade inquietantes,  e o que  imperadores  e príncipes  da na-

ç ã o

  alemã fizeram

  na

  decomposição

  d o

  antigo reino romano

para proteger seus poderes dinásticos,

  se

  repete hoje

  por nu-

merosos paralelismos.

Também nesse aspecto

  é

  fundamental

  a

  mudança

  c o m

relação

  a o

  século

  X I X .

  Também aqui

  ela é

  encoberta pelo

  véu

d e  palavras  e  fórmulas inalteradamente conservadas  p o r  anti-

g o s

  modos

  d e

  pensar

  e

  falar

  e por um

  formalismo

  a

  serviço

desses resíduos.  Mas não s e  pode deixar enganar pelo fato d e

q u e o

 efeito tanto sobre

  a

 atitude política

 d o

 Estado

  e d a

 Cons-

tituição quanto diretamente sobre

  o

 próprio Estado

  e a

 própria

Constituição seja extraordinariamente grande.  Tal  efeito  c o n -

siste principalmente

  e m

  transformar

  o

  Estado

  em um

  produto

plural

  e, na

 mesma proporção, substitui

  a

  lealdade

  ao

 Estado

  e

à sua

  Constituição pela lealdade

  à

  organização social, àquilo

q u e  sustenta  o  pluralismo estatal, ainda mais  que o  complexo

social  t em a  tendência  de se  tornar total,  o u  seja,  d e  vincular

totalmente

  o s

 cidadãos

  por e le

 abrangidos, tanto

 na

 esfera

 eco -

nômica quanto

  em sua

  concepção

  d e

  mundo. Assim surge,

  f i -

nalmente, também  u m  pluralismo  d e  vinculações morais  e

obrigações  de  lealdade,  u m a  plurality  o f  loyalties , pelas

quais

  a

  repartição pluralista

  se

 torna, cada

  v ez

  mais, fortemen-

SEGUNDA 1'ARTC

- A  CONCKKIA SITUAÇÃO CONSTITl /OÍONAl .

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O  G U A R D I Ã O  P A  C O N S T I T U I Ç Ã O

te estabilizada  e  torna-se cada  v ez  mais ameaçada  a formação

d e u m a

  unidade estatal.

  Em seu

  conseqüente resultado torna-

se, assim, impossível u m funcionalismo público compromissado

co m o  Estado, pois mesmo esse tipo d e  funciona lismo pressu-

p õ e u m

  Estado

 q u e

 pode

  se r

 diferenciado

 d o s

 complexos sociais

organizados.  M a s ,  além disso, surge  u m pluralismo

  dos con-

ceitos

  de

  legalidade  q u e

  destrói

  o

  respeito

  à

  Constituição

  e

transforma

  a

  base

  d a

  Constituição

  em u m

  terreno inseguro

  e

dispufadopor vários iados, enquanto  é da  lógica  d a  Constitui-

ç ão

  tomar

  u m a

  decisão política capaz

  de

 colocar fora

 d e

  dúvi-

da o que é a  base comum  d a unidade estatal, posta pela cons-

tituição,  O  respectivo grupo  ou  coalizão dominante denomina

legalidade,  c o m a  melhor  d a s  consciências,  o  aproveitamento

d e  todas  as  possibilidades legais  e a proteção  d e  suas respecti-

v as

  posições

  d e

 poder,

  a

 utilização

  d e

  todos

  os

 poderes estatais

e

 conformes

 à

 Constituição

 n a

 legislação, administração, políti-

ca de pessoal, direito disciplinar  e autonomia administrativa,  o

q u e

  resulta, então,

  de per si,

  q u e

  toda crítica séria

  ou

  mesmo

u m a  ameaça  à sua  situação  lhe pareça ilegal, como subversão

c  como  u m a  infração  a o  espírito  da  Constituição,  e m  contra-

partida, toda organização adversária atingida  p o r  tais métodos

d e governo baseia-se  n o fato de que a violação  da chance cons-

titucionalmente igual significa a pior infração contra  o espírito

e as

  bases

  d e u m a

  Constituição democrática,

  com o que e la

pode rebater  a acusação  de ilegalidade  e inconstitucionalidade,

d a

  mesma maneira,

  c o m a

  melhor

  d a s

  consciências. Entre

ambas

  as

  negações recíprocas,

  que, na

  situação

  de um

  plura-

lismo estatal, funcionam quase q u e automaticamente, a própria

Constituição torna-se gasta.

Essa consideração

 d a

 concreta situação constitucional deve

tomar consciente  u m a realidade,  de cuja contemplação muitos

preferem

  se

  privar pelos mais variados motivos

  e sob

  toda

  a

sorte  de  subterfúgios,  m a s  cujo conhecimento nítido, apesar

disso,  é  totalmente inevitável para  u m  exame  d e  caráter  d e

direito constitucional

  que se

 ocupa

  d o

 problema

  d a

  salvaguar-

da e proteção  d a vigente Constituição  d o Reich.  N ã o  basta,  d e

1  SEGU NDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL...

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P L U R A L I S M O , P O L I C R A C I A  E  FEDERALISMO

modo algum, falar,  n o geral,  d e u m a  crise ou menosprezar  a

consideração anterior, remetendo-a  à  bibliografia  d e  crise .

S e o  atual Estado deve  ser um  Estado legiferante, se , ademais,

sucede  u m a  expansão tamanha  d a s  áreas  d e  vida  e  atividade

estatais,  d e  modo  que já se possa falar d e u m a  mudança rumo

a o  Estado total,  mas se , então, concomitantemente,  a corpora-

ç ã o legislativa  se toma cenário  e centro d a repartição pluralista

d a unidade estatal e m u m a maioria d e complexos sociais rigida-

mente organizados, então  n ã o a juda muito falar e m  soberania

d o parlamento c o m propósitos  e fórmulas contrárias, cunhadas

para

  a

 situação

 d a

 monarquia constitucional

  d o

 século

 X I X ,

 para

responder

  à

 questão mais difícil

 d o

 atual direito constitucional.

5 .2 A policracia  na economia pública

O

  desenrolar

  d a s

 tendências pluralistas

  que se

  concentram

e se

  expressam

  n a

  corporação legislativa ocorre simultanea-

mente

  c o m a

  mudança para

  o

  Estado econômico.

  N a

  área

  d a

economia pública, teriam

  que se

 distinguir,

 n a

 verdade,

 em um a

relação conseqüente  c o m s u a grande expansão,  u m a  uniformi-

dade mais forte

 d e

  toda

  a

  direção, diretrizes uniformes

  e , com

isso,  a possibilidade  de um  programa financeiro  e  econômico

uniformes. Como toda unidade econômica, mesmo  a  menor

delas,  u m  complexo econômico  d e  tais proporções, como  o

apresentado pela atual economia pública  na Alemanha, neces-

sitaria, pelo menos,  d e certo plano, mesmo  se for o  caso  de se

querer manter ainda  b e m  distante  d e u m a  economia socialista

planificada.  M a s u m  parlamento  que é  tão-somente  o  cenário

e o  reflexo  de um  Estado partidário  d e  coalizão pluralista  e

instável,  n ã o  será capaz  de tal  planejamento, porque dele  faz

parte  u m a  conseqüência  e u m a  permanência  que se  estendem

p o r  períodos  d e  tempo maiores  e  situações diversas  e com as

quais  não se  pode contar  na  presente situação partidária  e de

maioria. Devido à falta de tal uniformidade e coerência, desen-

volvem-se, então, na economia pública, u m a justaposição e uma

desordem  d e  numerosos sustentadores

  autônomos

  da  econo-

SF.üUNDA PARTE  - A  CONCUETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL. . .  •

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1 3 4

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

m ia

 pública, amplamente emancipados

 e

 independentes

 un s dos

outros. Essa situação

  fo i

  chamada

  p o r

  Popitz

  d e  policracia,

c o m a

 qual

  se

 encontra qualificado

 de

  forma sumamente acer-

tada  u m  fenômeno  d e  características especiais  q u e ,  embora

esteja estreitamente ligado  ao pluralismo  d e  nosso sistema  po-

lítico, não é absolutamente idêntico a e le . N a economia pública

da

  Alemanha, reina hoje

  u m a

  pluralidade quase ilimitada

  d e

entes detentores

  de

  vontade

  da

  mais variada espécie

  e

  qualifi-

cação,

  n ão

  suficientemente ligados entre

  s i" .

  Popitz enumera:

o  Reich,  os 17 Estados, 65.000 municípios  e federações muni-

cipais,  as  instituições  de  seguro social (7.427 caixas  d e  assis-

tência médica  e hospitalar,  106 entidades  d e classe,  35  institu-

tos de  seguro social  dos  operários,  o  instituto  d e  seguro social

d o  Reich para empregados,  o  seguro social  d e  assistência  aos

mineiros,

  a

  instituição para colocação

  d e

  mão-de-obra

  e

  segu-

ro-desemprego), além disso, ainda acrescenta

  as

 grandes insti-

tuições  d a economia pública equipadas  c o m o s próprios domí-

nios dinásticos, especialmente  o banco  d o Reich,  os correios  e

a ferrovia d o Reich  e mais outros institutos e empreendimentos

públicos mais  ou  menos autônomos . Pode  se r que  essa visão

geral

  e

 essa enumeração necessitem

  d e u m a

 diferenciação mais

detalhada  e  sejam imagináveis algumas complementações  e

novos pontos

  de

 vista.

 O

 mérito científico

 de ter

 aludido

  a

 esse

importante fenômeno  de nossa atual situação estatal  não é , por

isso, menor  e o  valor  d o  reconhecimento dessa constatação,

assim como  seu grande significado para  o  quadro concreto  d e

nossa situação constitucional,

  n ã o

 ficam diminuídos

  co m

  isso.

Como conseqüência  de ta l  policracia, apresenta-se  u m a

falta

  de

  diretrizes uniformes,

  u m a

  desorganização

  e

  falta

  d e

planejamento,  a té  mesmo  u m a  adversidade  a o  planejamento,

cujo alcance

  é

  especialmente grande pelo fato

 d e o

  Estado

  ter

tomado, h á muito, o rumo d o Estado econômico. S u a  influência

econômica aumentou  d e  forma tamanha  que a  expansão  da

atividade estatal, como afirma Popitz,

  " n o

 caminho para

  o Es -

tado administrativo,

 já

 superou

 há

 muito

  com seu

 equivalente,

 o

" C f .  referência bibliográfica apresentada  e m  not;t anterior.

— .  SKGU NDA PARTF.  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.. .

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P L U R A L I S M O , P O U C H A C I A  E  F E D E R A L I S M O

I 2 S

Estado fiscal,  o  nível  d o  Estado preocupado  c o m o bem-estar

social

 e

 ameaça tomar, pura

 e

 simplesmente,

 o

 desenvolvimento

rumo

  ao

 Estado fornecedor

 d a

 previdência social .

 A

 policracia

d o s

 sustentadores públicos

 d a

 economia ergue-se juridicamen-

te,  principalmente, fundado  n a  autonomia  e na  independência

administrativa, sobretudo

 c o m

 base

  na

 autonomia administrati-

va dos

 municípios.

 O

  reconhecido princípio

 d a

  universalidade

d a esfera d e atividade possibilita u m a expansão quase ilimita-

da das  atividades econômicas  d a  comunidade.

A

 forma

 d e

 direito privado

  d a s

 sociedades municipais

  p o s -

sibilita escapar amplamente

  a o

  controle estatal (fiscalização

pelo Estado, assessoria municipal junto a o ministério das  finan-

ç a s d o  Reich)  e  conseguir  u m a  espécie  d e  alódio  d e  direito

privado

  q u e

 pode

  te r

 significado político semelhante

  ao

 alódio

medieval para

  o

  vassalo

  q u e

  podia,

  c o m

  isso,

  se

  esquivar

  à

associação estatal fundamentada

  n a

  Constituição feudal.

  E m

tudo isso pode

  ser

  facilmente reconhecida

  e

  explicada

  a m u-

dança funciona l sofrida pelo instituto d a autonomia administra-

tiva.  F o i  mencionado acima  que a  organização  d a  autonomia

administrativa, como transmitida  à Alemanha e normalizada em

numerosas leis  d o  século  X I X  ainda vigentes  c o m u m  texto

inalterado, pressupõe

  a

  situação concreta deste século

  c o m

su a

  diferenciação entre Estado

  e

  sociedade

  e que a

  autonomia

administrativa  aí  surge essencialmente como  u m a  parte  da so-

ciedade diferenciada d o Estado.  Mas se o Estado  se toma auto-

organização  d a  sociedade  e se as  posições  d a  autonomia

administrativa  são  ocupadas pelos mesmos sustentadores  d o

pluralismo estatal

  q ue

  também detêm

  as

  posições

  d e

  poder,

  a

estrutura  da  instituição jurídica  da  autonomia administrativa,

e m

  especial

  a

 relação entre fiscalização pelo Estado

  e

 autono-

m i a administrativa, tomou-se, então, problemática. Toda tenta-

tiva  e m  estabelecer  e  impor  u m  programa financeiro e  econô-

mico, abrangente co m diretrizes uniformes d a gestão econômica

pública, encontra  os  empecilhos  e  obstáculos dessa policracia

multifacetada, assegurada por detrás de um forte dique d e prote-

ç ã o

  legal

  e

  constitucional.

  Mas sua

  resistência

  não é

  intrans-

ponível po r causa de sua própria força, m as só porque policracia

SEGUNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇAO CONSTITUCIONAL.

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1 3 6

O  G U A R D I Ã O  D A .  C O N S T I T U I Ç Ã O

e pluralismo (além disso, também, policracia  e o  federalismo a

ser em

  breve discutido)

  se

  aliam

  u m a o

  outro.

Será necessário pesquisar  e  discutir mais detalhadamente

essa questão

  d a

  policracia. Parece-me, sobretudo, necessário,

para

  o s

  interesses

  d a

 presente investigação

  n o

  direito constitu-

cional, proceder  à  seguinte diferenciação dentro  d o  assim  d e -

signado complexo total.

 U m a

 parte daquelas forças

 d a

 policracia

retira  seu significado e sua  resistência políticos  d e u m a  aliança

c o m o s  sustentadores  d o  pluralismo estatal  q u e t ê m u m  inte-

resse

  n a

  policracia, desde

  q u e

  esta lhes ofereça, simultanea-

mente, posições  d e  poder para suas organizações.  U m a  outra

parte,

  e m

  contrapartida, deve

  sua

 justificação

 e

  talvez também

a sua  origem  a u m a  tendência oposta, perante  a  repartição

pluralista d o Estado, determinados complexos e instituições que

carecem, especialmente,

  d e

 proteção para

  a

  totalidade

  da eco-

nomia, devem  se r subtraídos  à influência d a política partidária

e ser

  político-partidariamente neutralizados. Nisso,

  se

  encai-

x a m ,

  principalmente,

  o

 banco

  e a

  ferrovia

 d o

  Reich.

  O

 proces-

s o d e  tais neutralizações será discutido mais  à frente. E l e t e m

q u e s e r

 mencionado aqui, porque seja talvez necessário,

  d e n -

tro da  totalidade  d o  fenômeno  d a  policracia, fazer  u m a  dife-

rença  sob o ponto  d e  vista  de que há  portadores  d a policracia

q u e

  tão-somente

  são

  assistidos

  e

  aliados

  d o

  pluralismo

  e ou-

tros  q u e  devem  s u a  existência  a u m  movimento contrário  a

esse pluralismo.

C o m

  isso,

  não se

  nega

  n em s e

  refuta,

  d e

  modo algum,

  o

próprio fato e a  totalidade  d o fenômeno q u e deve  se r qualifica-

d o co m a

 palavra policracia. Torna-se apenas mais evidenciado

q u e  várias orientações divergentes  t êm q u e s e r  consideradas

para  q u e  seja possível  u m a  descrição exata  da  atual  e  concreta

situação constitucional

  e , com

  isso, possam

  se r

  estudadas

  a s

numerosas negações  e  ameaças  da  unidade política  d o  povo,

que são

 pressupostos

  e m u m a

  democracia.

 A

 policracia

  da eco-

nomia pública obtém  seu verdadeiro significado

 da

  coincidên-

cia

  entre

  a

  quebra pluralista

  de

  Estado legiferante

  par-

lamentar  e o  desenvolvimento intenso  do  Estado rumo  ao

Estado econômico.  N o  centro  da  totalidade  d o  problema, aqui

— •  SEGCNO/K TftR TE  - f .  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL...

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P L U R A L I S M O . P O L I C R A C I A

  E

  FEDERALISMO

1 3 7

esboçado apenas  c o m  poucas palavras, encontra-se  u m a ques-

t ã o  formulada primeiramente  da  seguinte forma:  o  quão  são

compatíveis  u m c o m o outro, afinal, parlamentarismo  e Estado

q u e

  atua

 c o m

  economia planificada?

 A

 questão

  fo i

 firmemente

negada  e m u m a  publicação  de H .  Gõppert, ainda hoje muito

atual, Estado  e  Economia (Staat

  und

  Wirtschaft, Tübingen,

1924).

  M a s e l a

  pode

  ser

 diferenciada

  d e

 forma mais detalhada

considerando

 a

 característica concreta

 d o

 parlamentarismo, pois,

para  o  Estado, cujo parlamento  se  tornou apenas  o  reflexo  d o

pluralismo

  d e

 complexos sociais

  d e

 poder,

  e la

 seria, provavel-

mente, mais urgente  e  mais perigosa  d o q u e  para  u m  Estado

q u e

  forma

 su a

  vontade estatal

  c o m u m

  bipartidarismo normal-

mente funcionando.  U m  grau ainda mais alto  d e  intensidade

alcança  a  questão, então, quando, simultaneamente  com o de -

senvolvimento rumo

  a o

  pluralismo,

  o

  Estado exerce

  não só

empreendimentos econômicos isolados,

  mas e l e

  mesmo

  já se

tornou  u m  Estado econômico  que se  encontra  n o  ponto  de se

t r a n s f o r m a r

  e m u m

  Es tado soc ia l , subvencionador

  e

assistencial.  E  atinge-se  o  ponto mais extremo  e  mais crítico

d o questionamento, quando semelhante Estado econômico com

semelhante parlamento determinado pluralisticamente,  e m

grandes dificuldades econômicas  e e m u m a  situação econômi-

c a  anormal,  se vê obrigado, para continuar  a existir,  a executar

diretrizes uniformes

  e

  grandes planos econômicos

  e

  financei-

ro s ,  abrangentes tanto  n o  tocante  a  suas proporções objetivas

quanto  à  extensão temporal.  A  pergunta assim especificada,

hoje provavelmente respondida negativamente,

  é de se o par-

lamentarismo plurista  e o  moderno Estado econômico  são ou

n ã o

 compatíveis

  um com o

 outro.

5.3 O  Federalismo

A  pergunta sobre  o  sistema parlamentarista  se r ou não

compatível  c o m  determinados tipos d e  organização estatal,  fo i

anteriormente formulada

 na

 ciência política alemã apenas

  com

respeito  a organização federal  e , para tanto,  até o ano de 1918,

SüCUNDA PARTE

A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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1 3 8 ^ O j 5 U A R D j à O _ D A ^ C O N S T n j U K ^ O

na

  maioria

  d a s

  vezes, respondida negativamente.

  N o

  direito

federal alemão da Constituição d o Reich  da época d e Bismarck,

e ra  válido como axioma  o fato de que  parlamentarismo  e orga-

nização federal

  são até

 mesmo opostos

  que se

  excluem mutua-

mente.

 Erich

  Kaufmann defendeu durante

  a

 guerra

 (1917)

  essa

tese,

  em

  sua  publicação sobre  a  herança  d e  Bismarck  n a

Constituição  d o  Reich e  afirmou  a  estreita relação, funda-

mentada

  na

  natureza

  d o

  assunto, entre federalismo

  e

  impossi-

bilidade

  do

  parlamentarismo

d e

  maneira geral

  e não

  apenas

para

  o

  Estado federal monárquico

  de 1871. Na

  base

  d o s p e n -

samentos  d e  Hugo PreuG estava  u m a  tese semelhante, pelo

menos para  o  Estado federal monárquico,  c o m  valoração  in -

versa,

 p or

 conseguinte,

 e m

 seus primeiros projetos constitucionais,

ele  partia  d o  princípio  de que o  Estado federal teria  que ser

substituído p o r u m a ampla descentralização e autonomia admi-

nistrativa.  E m  minha 'Teoria  da  Constituição (Verfassungslehre,

1928), defendi

  o

 ponto

  d e

 vista

  de que o

 verdadeiro motivo

  das

incompatibilidades

  que são

 aqui indubitavelmente perceptíveis,

nã o

  pode

  ser

  encontrado,

  e m

  primeiro lugar,

  n o

  antagonismo

entre parlamentarismo  e  federalismo,  m a s n a  relação  de ca -

racterísticas especiais entre democracia  e  federalismo. Como

a  democracia nacional  e  aquela organização  na  forma  de uma

federação pressupõem

  u m a

  identidade substancial, torna-se

difícil just ificar u m a maioria  de Estados autônomos democráti-

c o s existentes dentro da unidade homogênea nacional.  E m u m a

democracia nacional,

  u m

  Estado federal

  é

 possível apenas

  en -

quanto deixarem existir,

  c o m

  função essencialmente modifica-

da. as

  bases firmes

  de um

  federalismo transmitido

  por

  outras

condições constitucionais.

N a  assembléia nacional  de  Weimar,  não fo i  observada  a

difícil questão

  d o

  princípio

  d e

  construção

  d o

  Estado federal,

conservou-se, antes,

  a

  organização federal

  e

  introduziu-se

  si-

multaneamente  o parlamento,  no nível  de uma democracia  na -

cional,  n ã o  apenas  no Reich,  mas a té mesmo, devido  à Consti-

tuição

  d o

  Reich (artigo

  17), em

  cada Estado

  e m

  particular.

Doravante, coexistem,

  há

  doze anos, organização federal

  e

parlamentarismo no Reich e nos Estados, d e modo que a compa-

SCGUNDA PARII-:

  - A

  C O N C R LTA S I TU A Ç Ã O C O N S TI TU C I O N A L.

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1 4 0

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

Confederação Suíça,

  são

  compatíveis,

  sob

  determinados pres-

supostos concretos

  e o

  federalismo,  i.e.,

  a

  organização estatal

forme nessa democracia  os  meios mais seguros para  a descen-

tralização.  E m u m a  coletividade estatal  que é , ao  mesmo  t em -

p o ,  organizada federalmente  e  governada parlamentarmente

n o  atual Reich alemão,  o federalismo obtém,  p o r conseguinte,

duas novas justificativas, primeiro,

  ele é um

 meio

  d e

  autêntica

descentralização territorial

  e,

 segundo,

  e le

  pode,

 d e

  forma

 an á -

loga

  às

  anteriormente mencionadas separações autônomas

  da

economia pública  d o  Reich  e às  tentativas  d e  neutralização

ainda  a  serem discutidas,  ser  visto como antídoto contra  os

métodos de um pluralismo político-partidário.

SEGUNDA PARTE

- A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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R e m é d i o s   e   m o v i m e n t o s

c o n t r á r i o s

6.1  Tentativas d e u m a Constituição econômica

Diante d o intrusivo fato de que o Estado domina ou influên-

c i a  amplamente  a área econômica,  é natural exigir  u m a  refor-

m a d a

  vigente Constituição

  d o

  Reich como resposta

  a

 proble-

m a s

 como pluralismo

  e

 policracia, pois, embora

  o

 Estado atual

possa  ser  qualificado como Estado econômico,  a constituição

estatal, assim como  n a maioria  d o s  Estados modernos também

n a

 Alemanha,

  n ã o é u m a

  Constituição econômica ,

  mas, s im,

u m a

 constituição imprecisamente chamada

 d e

 constituição

 "po-

lítica ,  a qual ignora  as grandezas  e poderes econômicos como

tais  e  parece estar neutra perante  a  economia. Naturalmen-

te ,

  toda economia

  e

  toda sociedade , assim como todo conví-

v io

 humano,

  têm em s i

 algum tipo

 d e

  constituição ,

  i.e.,

 algum

tipo d e ordem, d e modo que , em um sentido totalmente diferen-

te , se  possa falar,  d e  forma imprecisa  e  falsa,  d e  constituição

social

  e

 econômica

  ao se

  separar

  u m d o

  outro,

  à

  maneira

  he r -

dada d o século X I X , Estado e sociedade, política e economia, e

vê-los como diferentes matérias.  M a s  semelhante organiza-

ç ã o " ,

  econômica

ou

  social ,

  não é a

  constituição estatal.

Para

  a

  organização

  e a

  construção política

  d o

  Estado, forma-

ções

 e

 grandezas

 n ã o

 econômicas

  são

 utilizadas como tais

  ( e m -

presa, sindicato, associação comercial, câmaras econômicas

o u  outras representações  d e  interesses)  e o  cidadão  em par-

<

u

SBÜUNDA PARTE

  - A

  CO N CRE T A SI T U A ÇA O CO N ST I T U CI O N A L . . .

  • -

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1 4 2

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

ticular  tem seu posicionamento político  e seus direitos  de cida-

dão não em sua  propriedade como sujeito econômico, como

empregador

  ou

  empregado, produtor

  ou

  contribuinte fiscal,

 ou

d e  algum modo  co m  base  e m u m a  qualidade  ou um  serviço

econômicos, m as para semelhante organização estatal, e l e co n -

tinua sendo

  citoyen

  e n ã o

  producteur.

  F a z  parte  d a s  decisões

fundamentais

 e

 positivas

  da

 vigente Constituição,

 o

 fato

 de q ue

esta recusou  o  sistema  d e u m a  Constituição econômica, espe-

cialmente

  o

  sistema político

d e

  conselhos. Mesmo

  a

  anco-

ragem

  d o

 sistema

  de

  conselhos ,

 n o

 artigo

  165 da

 Constituição

d o Reich, deveria, como expressamente salientado,  te r apenas

u m  significado econômico  e não de  organização estatal.  S e

concebêssemos aquele artigo

 d e

 outro modo,

  a

 vigente Consti-

tuição seria, então, u m produto  d e u m a  monstruosidade fantás-

tica, pois conteria  em s i  várias constituições contraditórias  e

fundamentaria

  em s eu

  último artigo, digamos,

  u m a

  segunda

Constituição adicional  q u e colocaria novamente e m dúvida toda

a  construção organizacional anterior.  P o r  isso,  não se  admite

utilizar

  o

  artigo

  165

  para fazer

  d a

  Constituição vigente

  u m a

Constituição econômica

  e d a

 Constituição econômica

  d o

 artigo

165, a  organização estatal  da  Alemanha,

1

  Mesmo  o  conselho

econômico  d o  Reich  n ã o é

  nenhum

  órgão estatal

  decisivo,

1

  A s

  expos ições

  d e u m d o s

  maiores conhecedores dessa á rea ,

E .  TATAR1N-TARNHEYDEN,  e m

 Berufsverbande

  und

  Wirtschafts

demokratie,  ein  Kommentar  zu  Artikel  165 der  Reichsverfassung,

Berlin,

  1 9 3 0 , p . 1 3 , s ão

  apenas aparentemente contraditórias

  a

isso. Todavia, Tatarin

  d i z q u e o

  artigo

  165, § I

o

,

  daria

  " a

  base

ideal para  a  Constituição econômica regulamentada legalmente

e  de l ineada  n o s  outros parágrafos . Essa  n ã o  deve  s e r " u m a

constituição social econômica separada  d a  constituição política ,

e , s i m , " u m a

  parte integrante

  d a

  própria constituição política .

M a s , s e  entendo corretamente,  a  autonomia administrativa (artigo

1 2 7 d a  Constituição  d o  Reich) possa  se r  chamado  d e u m a  parte

integrante

  d a

  organização política. Embora conste ainda, assim,

q u e a

  C o n s t i t u i ç ã o

  d e

  W e i m a r t e n h a t r i l h a d o

  u m

  d u p l o

c a m i n h o d e  volição política  — o da  democracia representativa

c o da  cooperação entre classes econômicas  e  associações profis-

sionais

  -

  afirma-se

  na p . 12 que a

  democracia representativa

  fo i

SEGUNDA. PARTE

  - A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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R E M É D I O S

  L

  M O V I M E N T O S C O N I H Á R I O S

1 4 3

transformada pela Constituição

  d e

  Wcimar

  n a

  base

  de s eu

  sistema

poli t ico e ,  além disso,  " p o r s u a v e z ,  como freqüentemente  n a

Consti tuição  d e  Weimar,  u m  produto  d e  acordo.  A  justaposição

d e

  dois sistemas políticos diferentes

  - d o

  atomístico

  e d o

  orgânico

  -

a  qual  só s e  torna suportável  n a  realidade política pela atribuição

a o  úl t imo importância secundária  p o r  me io  d e s e u  desvio  d o

puramente pol í t ico para

  a

  área econômica . Sobre isso resta

dizer,  conseqüentemente.  Quando  H .  Herrfahrdt formulou  que o

art igo

  165 , o

  últ imo art igo

  d a

  Consti tuição vigente, seria,

  a o

mesmo tempo,

  o

  pr imeiro ar t igo

  d e u m a

  futura Consti tuição,

isso passa  a ser , no  fundo, apenas  u m a  conf i rmação  d a  tese  d o

texto acima. Nesse aspecto,

  s ã o d e

  especial interesse

  e

  valor

  a s

expos i ções  d e  J A C O B I S ,  E .  Grundlehren  de s  Arbeirsrechis,

Leipzig,  1927 , p .  392-395: Aq ui  (o  artigo  165 da  Constituição  d o

Reich)  é , e m  todo caso, despropositada  a  idéia  d e u m a Constituição

econômica separada  a o  lado  d a  orga nizaç ão pol í t ica . Jacobi

n ã o v ê " d e  forma alguma n o  artigo  165, § I

o

, " u m a  nova criação

d e  direito público .  E m  contrapartida,  se o  sistema planejado  n o

artigo

  165, § 2",

  fosse realizado, iria

  " s e

  tratar,

  n a

  realidade,

  d e

novas cr iações  d e  direi to púb lic o . Con tu do , esse pro gra ma

n ã o

 está realizado (...).

 A

  Constituição econômica

  d e

 direito púb lico

d o  art igo  165, § 2

o

, d a  Cons t i tu ição  d o  Reich  n ã o  exis te . A

decisão fundamental sobre t ipo

  e

  forma

  d a

  existência política,

par te  d e u m a  C ons t i t u i ção , t o rna impos s íve l s eme lhan t e

jus t apos i ção  d e  dois pr incípios  d e  const rução contradi tór ios ,

seria, muito provavelmente,  a  razão mais importante para  o  fato

d e q u e o  programa  d o  art igo  1 6 5 n ã o  pode  s e r  executado,  s e m

p ô r ,

  literalmente,

  à s

  avessas

  a

  Constituição

  d e

  Weimar.

  A í

  também

res ida , t a lvez ,  o  pon to e s s enc i a l  d a  q u e s t ã o  s e , n a  vigente

Consti tuição  d o  Reich, possa  o u n ã o  existir  u m a  representação

(diferentemente

  d a

  pura representação)

  d e

  interesses econômicos.

Insisto  c m q u e  esse  não é o  caso;  a  argumentação  d e  GLUM  F.

Der  deutsche  und der  franzosische Reichs-wirtschaftsrat,  Berlin,

1929 , p .  37-38; ademais,  o  capítulo  " O  conselho econômico  d o

Reich e m  Handbuch  des  de.utschen Staatsrechts,  vol . I , p . 58 2,

baseiam-se  n o  fato  d e q u e " a  economia é  transformada  e m u m

todo  e , po r  conseguinte,  e m  algo político,  s e m  deixar  d e  estar

defronte

  a o

  Estado .

  A

  partir

  d a

  representação

  e l a

  deve, então,

s e r  puxa da para dent ro  d o  Estado . Glum refere-se  a o  artigo  17

d o

  decreto

  de 4 de

  maio

  d c 1 9 2 0

  sobre

  o

  conselho econômico

interino

  d o

  Reich:

  " O s

  membros

  d o

  conselho econômico

  d o

  Reich

s ã o  rep re s en t an t e s  d e  toda  a  economia  d o  p ovo a l emão ,  e

cont inua,

  " c o m

  isso

  s e

  expr ime

  q u e o s

  m e m b r o s

  d o

  conselho

econômico  d o Reich  — mais precisamente  o s  membros permanentes

e o s  não-permanentes  - n ã o t ê m q u e ,  absolutamente, defender

nenhum interesse,  n e m o s  interesses econômicos  d e  todo  o  povo .

ShGUNDA PARTF;  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.. .  i —

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1 4 4

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

mesmo

  se ele, na

 execução

  d o

  programa

  d e

  conselhos

  d o

  arti-

go 165,

  tivesse sido feito definitivo.

  A

  primeira parte organi-

zacional  d a  Constituição  d o  Reich permanece sendo  a  parte

politicamente decisiva.

 E la

 contém

 u m a

 decisão tomada

 de

 plena

consciência  contra  a  construção política  d o  Reich  e m u m a

Constituição econômica.

Assim resulta

  u m a

  evidente discrepância,

  em que se tem

u m  Estado econômico,  m a s n ã o u m a  Constituição econômica.

É

  natural

  se

  querer produzir

  u m a

  harmonia segundo

  uma das

duas direções dadas,  ou ao se  limpar  o  Estado  d e  todos  os

elementos

  que lhe dão o

 caráter

  de um

  Estado econômico,

  ou

seja, deseconomizar  o Estado, ou ,  inversamente, a o substituir a

vigente Constituição não-econômica

  p o r u m a

  econômica,

  o u

seja, economizar, resoluta  e  totalmente,  o  Estado.  A  primeira

exigência levaria

  a

  transformar novamente

  os

  atuais partidos

políticos,  que , em  grande parte,  são  representações  d e interes-

ses

  rigidamente organizadas

  e

  relações mais

  ou

  menos

  " f e u -

dais", e m produtos independentes, orientados pela livre opinião

e

  baseados

  e m

  livre propaganda,

  e

  também tornar novamente

independentes  os  deputados  e m  particular, como correspon-

dente

  à

 vigente Constituição (artigo

 21) .

 Poder-se-ia tentar isso

principalmente  a o  introduzir rigorosas "incompatibilidades"  e

n ão

  apenas

  as

 incompatibilidades tradicionais como

  a

 "incom-

patibilidade" entre mandato parlamentar  e  posto  d e  funcioná-

r io, mas as

  chamadas incompatibilidades econômicas,

  i.e.,  in-

compatibilidades entre mandato parlamentar  e  determinadas

profissões

  ou

  postos econômicos,

  p .ex . de

  síndico, secretário

d e

 associação

  ou

 partido, membro

  d o

  conselho administrativo,

banqueiro, fornecedores

  de

  materiais para

  o

  Estado,

  e tc . Se-

Isso  só  pode significar:  o u  eles  s ã o  representantes, representando,

então, todo  o  povo,  m a s n ã o a  economia;  ou não o s ão . O  fato

d e n ã o  s e r e m d e f e n so r e s  d e  in t e re sses a inda  n ã o o s  torna

representantes. Glum reconhece outra possibilidade  d e q u e  possa

se ter a  intenção  d e u m  tipo  d e  grêmio independente  d e  especia-

listas.  M a s  m e sm o  o  peri to independente  n ã o é  representante.

Sobre  o s  diferentes t ipos  d e  independência, cuja diferenciação

também

  se

  mostra necessária aqui.

1  SHGUN DA PARTE  - A  C O N C K P T A S I T U A Ç Ã O C O N S T I T U C I O N A I - .

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1 4 6

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

hoje apenas dois grandes Estados tenham tais constituições

econômicas,  a Rússia comunista  c o m u m  sistema soviético  e a

Itália fascista  com seu  siato corporativo.  São  dois países,  e m

grande parte, ainda agrícolas,  que não  estão  d e  forma alguma

n o  ápice  d o  desenvolvimento econômico e d o progresso indus-

trial  e dos quais todos sabemos  que sua  Constituição econômi-

ca se encontra  à  sombra  d e u m a  organização partidária rigida-

mente centralizada e d o chamado Estado unipartidário. O sistema

da  Constituição econômica  n ão t em  aqui absolutamente  o o b -

jetivo  d e  tornar  a  economia livre  e  autônoma,  mas , ao  contrá-

rio, de  entregá-la  na mão do  Estado  e d e  submetê-la  a ele. O

sistema unipartidário resulta  d a  necessidade  d e  impedir  o do-

mínio  d o Estado  por meio  d e vários partidos, o u seja, u m a divi-

são  pluralista  d o  Estado.

6.2 O

  problema

  d a

  neutralidade

  d a

 política

interna

 n o

 Estado partidário pluralista

É  normal  e  facilmente compreensível  q u e ,  perante  o s m é-

todos pluralistas  d a  volição  d o  Estado partidário, sejam exigi-

d o s  instâncias  e procedimentos neutros,  ou  seja, independentes

d o s  poderes desse tipo  d e  Estado partidário. Como aqui  se ob-

jetiva apenas  u m a  breve exposição  d a  presente situação cons-

titucional, n ã o devem  se r discutidos planos  d e reforma, mesmo

se,  devido  a seu  especial significado,  as  diretrizes,  o s projetos

de lei e  materiais publicados pela "União para  a  renovação  d o

Reich" sobre o "problema d o conselho d o Reich" (Berlim,  1930)

tiverem  que se r  pelo menos mencionados.  M a s  excetuando-se

todas

  as

  propostas

  e

 exigências,

  j á

  existem hoje instituições

  e

organizações, cujo verdadeiro objetivo reside n o fato d e represen-

tarem  u m a  reação  aos  métodos  d o Estado partidário pluralista.

N a maioria d o s casos, ainda n a o tomaram claramente consciên-

cia de sua  relação, porque  sã o  entre  si muito diferentes e  estão

apenas ligadas pela oposição comum  ao  instável Estado  d e

coalizão partidário, porque algumas delas estão disfarçadas sob

vocábulos míticos  ou  permanecem invisíveis, enquanto outras

>  SKGUNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL. . .

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

1 4 7

s e  distinguem abertamente  e ,  sobretudo, porque algumas  de-

las ,  segundo  a natureza  da  coisa,  são  menos salientes, enquan-

to os  métodos  d o  instável Estado  d e  coalizão partidário domi-

n a m o primeiro plano d e nossa vida política d e forma importuna

e  evidente. Apesar disso, tais forças contrárias neutras fazem

parte d o Estado atual e esse Estado seria, sem elas, inimaginável,

pois,

  e m

  verdade,

  n ã o

  pode existir nenhum Estado

  q u e

  fosse

apenas  u m

 Estado partidário pluralista. Além

  d as

 forças pura-

mente típicas

  de

 partido,

  te m

  sempre

  q u e

  haver também outras

forças imparciais

  e

  suprapartidárias,

  se não

  quisermos

  que a

unidade estatal  se  dissolva  e m u m a justapos ição pluralista  d e

complexos sociais  d e  poder.

Se,

  além disso,

  os

  órgãos

  e

  instâncias constitucionalmente

previstos ainda  n ã o  forem capazes  d e u m a  vontade política

uniforme, torna-se, assim, inevitável  que a  substância política

emigre para alguns pontos d o sistema social  ou político. Outros

poderes, sejam eles legais

  ou

  apócrifos, assumem voluntária

o u

  forçosamente, consciente

  o u

  semiconscientemente

  o

  papel

d o

  Estado,

  e

  governam,

  a b e m

  dizer, sub-repticiamente. isso

porque  a  "astúcia  d a  idéia",  p o r  força d a  qual deve  se dar jus-

tamente  n o parlamento  a  unidade volitiva  d e  todo  o povo,  não

depende  d e  modo algum  d o s  partidos coligados  e dos

  bureaux

d o s

  grupos parlamentares,

  o

  parlamento

  não t em

  nenhum

  m o -

nopólio imperdível

  em ser o

 único cenário

  d a

 astúcia

 da

  idéia

 e

esta pode mudar facilmente

  seu

  campo.

  P o r

  isso, também

  fa -

z e m  necessariamente parte  d e u m a  visão total  da  realidade  d e

nossa atual situação estatal,  os diversos remédios  e  forças con-

trárias. Enquanto estiverem unidos p o r u m a oposição comum  à

situação  d o  presente  e  instável Estado  de  coalizão partidário,

podem  ser  qualificados  em sua  totalidade como tentativa  d e

u m

  Estado

  politico-parlidariamente neutro.

  Nesse aspecto,

é  naturalmente compreensível  que a  palavra "neutro",  em si

ambígua  e ,  como todo conceito político, determinada  por seu

antagonismo concreto, significa, nesse contexto , nada mais qu e

a  oposição  às  forças e  métodos  d o  instável Estado  d e  coalizão

partidário, cujo poder  é suficientemente grande  e  central para

reunir

  u m a

  maioria

  d e

  forças contrárias, diferentes entre

  si,

mediante  a  oposição comum. Conforme  as  exposições acima

SECllJNUA PARTE  - A  CO N CRI iTA SI T U A RÃ O CO N S T n U O I O N A L . . .  •

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1 4 8

O  GUARDIÃO  O A  CONSTITUIÇÃO

sobre

  o s

  agrupamentos pluralistas, policráticos

  e

  federalistas,

em  parte aliados,  e m  parte opostos  uns aos  outros,  é  facilmen-

te

 explicável

  q u e ,

  dependendo

  da

  situação tática,

  nã o

  está

  e x -

cluída,  d e  forma alguma,  u m a aliança ocasional.

Corresponde

  à

  tradição histórica

  d o

 Estado alemão pensar

aqui,

 e m

 primeiro lugar,

 nas

 instituições

  e

 métodos

 d e u m

 Esta-

dQ-funcionário e  procurar,  aí, o  verdadeiro contrapeso para

os

 desorganizadores efeitos

 d o

 instável Estado

  d e

 coalizão

 pa r -

tidário, p o r meio do que o funcionalismo público obtém, simul-

taneamente, função  e  tarefa novas  que se  adaptam  à  situação

modificada

 d o

 Estado,

  a s

 quais

  n ão

 podem

  ser nem

  compreen-

didas,  n e m  justificadas  c o m o s  conceitos  d o  direito público

monárquico.

 A

 isso

  v e m a o

 encontro

  a

 vigente Constituição

 d o

Reich

  e

 protege

  o

  funcionalismo público alemão,

  p o r

  meio

  d e

garantias constitucionais

  e

 institucionais, contra

  o s

 métodos

  da

política parlamentar

  d e

  saque (artigos 129/130

  d a

  Constitui-

ção) . E la  proíbe,  a té  mesmo expressamente,  que os  funcioná-

rios sejam "servidores

  de um

  partido"

  e dá

  certas seguranças

para  sua posição independente (princípio d o emprego vitalício,

inviolabilidade

 dos

 direitos adquiridos, viajurídica ordinária para

reivindicações

  d e

 direitos patrimoniais, etc.).

Sabe-se  h á  muito tempo  q u e ,  apesar daquela proibição

constitucional,

 o s

 cargos

 d e

 funcionário, pelo menos

 e m

  muitos

países,  são abertamente tratados como objetos d e  saque  e acordo

dos

  partidos governistas.

  A

 maioria pensa hoje

 d e

 forma muito

cética  e  resignada sobre  a  força  d e  resistência  d o  Estado-fun-

cionário alemão perante  o  Estado  d e  coalizão partidário.  M a s

deve

  se

  considerar

  que , no

 Reich, quando

  u m presidente

  inde-

pendente dos partidos  d e coalizão nomeia os funcionários , mais

precisamente também

 os

 ditos funcionários políticos,

 a

 distribui-

ção dos  cargos  de  funcionário entre  o s  adeptos  d o s partidos  d e

coalizão ainda  não se  tornou  tão  natural quanto  e m  países  nos

quais

  o s

 ministros

  d o s

 partidos

  d e

 coalizão atuam,

  s em o

  impe-

dimento contido  em tal  desvio, como agentes  d o partido. A d e -

mais, pode-se talvez esperar

 c o m

 algum otimismo

 que , em con-

seqüência

  d o

  emprego vitalício

  d o s

  funcionários públicos

  e

outras garantias constitucionais,  o s  adeptos  de um  partido  no -

»  S E G U N D A P A U TE  - A  C O N C K f . T A S I T U A Ç Ã O C O N S T I T U C I O N A L . . .

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R E M É D I O S

  E

  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

1 4 9

meados funcionários sejam desligados d o partido, sejam atingi-

d o s pelo sentimento estatal  d o funciona lismo público alemão e,

pela instituição

 d o

 funcionalismo público

 d e

 carreira, sejam trans-

formados  d e  servidores  do  partido  e m  funcionários d o Estado.

O s

 elementos

 d o

 Estado-funcionário,

 qu e

 ainda podem

  ser

 pres-

supostos hoje  n a  Alemanha, podem, dessa forma, compor  um

fator considerável

 n o

 sistema

 d o

 Estado político-partidariamente

neutro  e  salvar  o  sentido  p o r u m a  objetividade imparcial.  M a s

p o r

 mais valiosos

 e

 insubstituíveis

 q u e

 indubi tavelmente sejam,

eles  n ã o  conseguem sanar  o verdadeiro  mal do  instável Estado

d e coalizão partidário,  ou  seja,  a falta  d e u m  govemo estável  e

capaz  d e  governar. Pela natureza  d a  matéria,  o  funcionalismo

público

  d e

  carreira está restrito

  à

  justiça

  e à

  administração.

P o r  conseguinte,  ele  obtém  d a  legislação  ou do  governo suas

normalizações

  o u

  diretivas decisivas.

  Ele é

  incapaz

  d e

  tomar,

por si , a decisão política e determinar,  sob as normas  e critérios

de sua

  tecnicidade,

  as

  diretrizes

  da

  política.

  E l e

  pode obstar,

deter  e ,  nesses moldes, acionar  seu  efeito neutralizador,  m as

n ã o

  decidir

  e

  governar

  n o

  sentido verdadeiro

  d a

  palavra.

Seria ainda muito menos possível basear  o  Estado neutro

na

 justiça

  e

 confiar

  a s

  decisões políticas,

  so b

  quaisquer enco-

brimentos judiciais,  aos tribunais  ou tribunais d o Estado ocupa-

d o s c o m

  juízes

  d e

  carreira.

  Já se

  falou

  n o

  primeiro capítulo

deste livro sobre  a s  exigências  e  planos  d e  deixar  a  decisão

d a s

  difíceis questões

  d e

 nossa atual situação constitucional

 po r

conta  de um  tribunal  sob a aparência d a estrutura judicial. Tal -

v e z

  semelhantes tentativas

  d e

  solução possam parecer plausí-

veis  n ão  apenas  a o s  verdadeiros juristas  da  justiça, cuja habi-

tuação mental está determinada pelas vias

 d o

 código

 d e

 processo

civil

  e

  penal,

  m a s

  também

  a

  certas tendências

  d o

  caráter

  ale-

m ã o ,

  especialmente

  à

  freqüentemente citada "necessidade

  d e

legalidade"

  d o s

  alemães. Hoje, tais planos

  d e u m a

  "jurisdici-

zação" d a política s ão avaliados, provavelmente, c o m mais cons-

ciência

  e se

 reconhecem melhor

  a s

 estreitas fronteiras

 d a

 estru-

turajudicial qu e têm que ser protegidas just amen te  n o interesse

d a

 justiça independente

 e d o

 Estado

 d e

 direito contra

 a

 politização

partidária.

  O

  independente juizado

  d e

  carreira alemão

  faz par -

SEOUNDA PARTK

  - A

  CO N CRE T A SI T U A ÇÃ O CO N ST I T U CI O N A L . .

  •

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1 5 0

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

te,

 como grandeza neutra

  de

  política interna,

  d o

  complexo

  c a -

racterizado anteriormente

  d e

  Estado-funcionário. Ameaçaría-

m o s

  tanto esse próprio juizado

  d e

 carreira quanto

  a

  finalidade

d e u m a  objetividade imparcial,  se  quiséssemos utilizá-lo para

introduzir u m Estado judicante criptopolítico como Estado neutro.

Mais sério

  e

  mais expandido

  d o s

  círculos

  d o s

  juristas

  d a

justiça  é o  esforço  em  criar  u m a  espécie  d e  Estado pericial  e

parecerista {experto) neutro,  n o  qual  a s  decisões políticas

sejam cedidas

  aos

 especialistas

  d e

 cada matéria

  em

  particular,

especialmente

  a o s

  peritos administrativos, técnico-financeiros

ou  econômicos.

3

  Sobre isso, encontram-se numerosos indícios

n a  maioria  d o s  Estados modernos. Como exemplo especial-

mente elucidativo para

  a

 Alemanha pode-se citar aqui,

  em p r i -

meiro lugar,

  a

  instituição

  d o  ministro

  das

  finanças

  do

  Reich,

"pois signif ica esse instituto, n o fundo, além de um testimonium

d o  conhecimento  de que ,  para  o  governo  e  seus membros,  há

muita coisa

  qu e

 eles como políticos

  n ã o

 podem dizer

  ou

 sugerir

s e m

  riscos,

  m a s q u e

  teria

  que se r

 dita

  ou

  sugerida

  e com o que ,

destarte,  u m  outro deve  se  ocupar,  o  qual esteja subordinado

apenas  a  deveres objetivos  e  cuja neutralidade  pareça garan-

tida

  po r

  meio

  de sua

 posição

  e sua

  personalidade.

  O

  conheci-

mento

  de que

  existem antagonismos entre política

  -

  no

  senti-

do da  política partidária  e de  coalizão,  não, o u  apenas  e m

proporções muito restritas,

  no

  sentido

  da

  política estatal  pura

Sobre  o  problema geral  d o  perito polftico-partidariamente neutro

n a  democracia atual: Z1MMERN, Alfred. "Democracy  an d t h e

Expert".

  The

  Politicai Quater-ly,  v o l , I  (janeiro  d e  1930),  p . 7 - 2 5 ,

acentuando-se  o s  Advisory Committees  n a  Liga  d a s  Nações  d e

Genebra.  D a  mais recente produção bibliográfica  e m  alemão sobre

o  Civil Service  anglo-saxão pode m  s e r mencionados: FRIE DRIC H,

Car l  J .

  Das

  Berufsbeamtentum

  in den

  Vereinigten Staaten,

Beamten-Jahrbuch Heft  3 , Beriin,  1930 , p . 3

  et seq.

  ( c f . igual mente

a  interessante observação  d o  mesmo autor sobre  a  inf luência

d o  Estado alemão  em seu  artigo "Deutsche Gedanken beim Aufbau

d e s  amerikanischen Staates",  Festgabe

  für

  Carl Schurz,  Berlin,

1 9 2 9 , p . 1 3 1 ) :  MARX, Fritz Morstein.  Berufsbeamtentum

  in

England,  Zeitschr.  f . d . ges .  Staatswissenschaft ,  v o l . 8 9  (1930)

p 449-495.

SEGUNDA PARTE  - A  CONCRIVTA SITUARÃO CONSTITUCIONAL.

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

1 5 1

e

  simplesmente

 - e

 rigorosa objetividade

 e m

  lodo regime esta-

tal e, em

  proporções especiais, talvez

  em um

  regime estatal

federalista

  e

  simultaneamente democrático,

  é a

  causa

  de ori-

g e m  determinante  de um  instituto  tão  notável quanto  o do mi-

nistro  d a s  finanças  d o  Reich".

4

  Pela decisão tomada pelo  con-

selho

  d e

 ministros

  em 27 de

  novembro

  de 1922, ao

  presidente

d o

  tribunal

  d e

  contas

  d o

  Reich alemão,

  o

  ministro

  d e

  Estado

D r.  Saemisch,  fo i  confiado  o  cargo  d e  ministro  d a s  finanças

n ã o c o m  base  e m  determinações legais,  mas na  maneira  em

q u e o s

  ministros,

  c o m

  base

  e m s u a

  confiança especial

  (que,

conseqüentemente,

  tem que se r

  proferida

  p o r

  ocasião

  d e

  toda

mudança ministerial),

  lhe dão a

  possibilidade

  d e

  conseguir

  o

material necessário para  sua  informação  e seu  parecer. Esse

ministro

  d a s

  finanças

  não t em um

  poder

  d e

  comando autôno-

m o e

 próprio.

 N a

 ligação desse cargo público

  c o m a

 posição

 d e

presidente  d o  tribunal  d e  contas,  h á u m a  incompatibilidade

típica para  a  maioria  d a s  tentativas  d e  neutralidade político-

partidária, pois, segundo

  o

  artigo

  123 do

  código orçamentário

d o

 Reich (texto

  de 14 de

  abril

  de 1930, Diário oficial  do  Reich

II , p . 693), os membros  d o  tribunal  d e  contas  n ã o  podem fazer

parte  d o  parlamento  d o  Reich.  A  atividade  d o  ministro  das fi-

nanças como perito

 e

 parecerista político-partidariamente neutro

é d e

 suma importância

 e

 ultrapassa

 e m

 muito

 a

 soma

 d o s

 parece-

r e s e m  particular, entre eles  o s  pareceres  a  respeito  da s

administrações estaduais  da  Turíngia, Wíirttemberg, Hessen,

Mecklenburg-Schwerin

  e

  Lippe,

  o s

  quais pertencem

  ao s

  docu-

mentos mais eminentes

 d e

 perícia

 e

 objetividade administrativas.

Exemplos  de peritos econômicos  são ,  além desse,  os  doze

membros  d o  conselho econômico  d o  Reich, nomeados pelo

governo

  d o

  Reich

  à

  discrição,

  " o s

  quais fomentaram

  ou

  estão

4

  P O P I T Z ,  J .  Bankarchiv,  15  O k t o b e r  1 9 3 0 , p . 2 2 ;  ademais .

B ILF INGER , C a r l .  Der  Reichssparkommissar,  Ber l in  1 9 2 8 ,

es pec i a lmen te

  p. 13 (a

  " ta re fa

  d e

  economia despol i t i zada" ) ;

S A E M I S C H .  Der  Reichssparkommissar  und  seine Aufgaben

(Finanzrechtliche Zeitfragen Heft

  2 ) ,

  Berlin,

  1 9 3 0 ;

  B ÜHLER ,

  O .

Der  heutige Stand  der  Verwallungs-  und  Verfassungsreform,  2 .

Aufl., Stuttgart  1931.

•SRGIJNDA PARTI-:  - A  CONCRliTA SITUAÇÃO CONS  I T I  Ü C I O N A L . . .  •

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1 5 2

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

aptos

  a

  fomentar,

  p o r

  meio

  d e

  realizações especiais,

  a

  econo-

mia do povo alemão  e m  excelente medida".  E m  certo sentido,

toda

  a

  instituição

  de um  conselho econômico  do  Reich  c o m -

posto

  p o r

  especialistas

  e m

  economia

  e

  interessados

  e que co-

labora  com seu  parecer para  a  legislação (também  o  Conseil

National Economique

  f rancês ,

  o  Economical Advisory

Council

  inglês

  e

  formações semelhantes) pode também

  ser

caracterizada como indício  de um Estado-perito,  se não se qui -

se r já

  encontrar aqui

  um e lo de

  transição para

  a

  verdadeira

Constituição econômica.  M a s a  característica  d e  tais institui-

ções ainda reside temporariamente  n o  fato  d e q u e  exercem

su a

  influência pelo peso

  d e

  seus pareceres expertos

  e de que

n ã o  atuam como poder político. Esse tipo  d e  influência  é de

grande significado prático, principalmente  e m  comitês.  Dentro

d o

 quadro

 d e

 funcionamento parlamentar,

 ela se

 mostra ocasio-

nalmente, mesmo ainda hoje,  n a  influência extraordinária  d e

alguns comitês parlamentares, dentre

  os

  quais

  se

  pode citar,

e m

  primeiro lugar,

  o  comitê  do  orçamento '  M a s ,

  evidente-

mente,  os  comitês parlamentares, apesar  d e  tais indícios,  e m

conseqüência

 de sua

 composição político-partidária, geralmente,

n ão

  estão

  e m

  condições

  d e

  obter

  a

  neutralidade necessária,

embora, teoricamente,  se  teria  q u e  perseverar  n o  fato  de que

eles, incluindo-se

  o

  comitê

  d e

  investigação, deveriam

  se r im-

parciais  e  "constituir u m a  representação correta  e  universal  d e

todas  a s opiniões". Contudo, mostra-se aqui mesmo  o efeito d o

fato

 de qu e o

 parlamento,

  e m

  amplo grau,

  se

  tornou cenário

  d e

u m  sistema pluralista,  d e  modo  que ,  pelo modelo inglês  que

conhece, além

  d o s

  "Sefect Committees" parlamentares,

  a s

"Royai Commissions" instituídas pela coroa,

6

  sã o

  formados

5

  Sobre  o  comitê  d o  o rçamento  d o  Reich,  c f . a  tese  d a  Escola

Superior

  d e

  Comércio

  d e

  Berlim

  a s e r em

  breve publicada

  por B.

Rilinger.

A

  respeito,

  o

  relatório

  de G.

  Lassar sobre "comitês

  d e

  investigação

segundo

  o

  Direito inglês", remetido pelo ministro

  d o

  interior

  d o

Reich

  a o

  parlamento

  em 11 de

  novembro

  d e 1 9 2 6

  (Impresso

  d o

parlamento  d o  Reich,  3

o

  mandato eleitoral,  n .  2690), conforme

esse relatório, também

  a

  citação retirada

  d e

  Todd,

  Parliamentary

SI-GUNDA PARTE  - A  C ONC R ETA S ITUAÇ ÃO C ONS TITUC IONAL.

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

m

comitês especiais  d e  investigação,  e m  especial

  comitês

  de in-

quirição econômicos  político-partidariamente independentes

q u e

  devem possibilitar

  u m a

  averiguação objetiva

  e

  indepen-

dente  d o  parlamento.  U m  exemplo desse tipo  d e  comitê  d e

inquirição político-partidariamente neutro

  é o

  "comitê alemão

para

  a

  investigação

  d a s

  condições

  d e

  produção

  e

  venda

  d a

economia alemã"

  (lei do

 Reich

  de 15 de

  abril

  de 1925 ,

  Diário

oficial

  do

  Reich

  I , p. 195), cujos membros  s ã o  nomeados pelo

governo  d o  Reich  e t ê m u m a ampla independência assegurada

pela isenção d e responsabi lidade. Ainda, d e outro modo, fazem

parte desse contexto

  as

  câmaras  (câmaras

  d o

  comércio

  e da

indústria, associações comerciais

  d e

  vários tipos)

  e

  ainda

  a s

juntas consultivas

  e m

  vários ramos

  d a

  administração.

N a

  esfera

  d a

  jurisdição, ' excetuando-se

  a

  composição

d o s

  tribunais

  do

  trabalho, podem

  ser

  mencionados

  o s m e m -

bros peritos  d o

  tribunal econômico

  do

  Reich,

  q u e  estão  a o

lado  d o s  membros juristas  e são  nomeados pelo presidente  a

partir

  d e u m a

  lista

  d e

  candidatos, formada pelo conselho

  e c o -

nômico

  d o

  Reich, "levando-se

  e m

  consideração

  o s

  variados

grupos profissionais

  e

  representações

  d e

  interesses, além

  dos

Estados

  e m

 particular",

  e m q u e ,

 salvo outra regulamentação,

  o

conselho d e magistrados d o  tribunal econômico  d o Reich deci-

d e  lotando  u m  presidente  e  quatro adjuntos peritos (decreto

sobre

  o

  tribunal econômico

  d o

  Reich

  de 21 de

  maio

  de

  1920).

D e

  especial interesse

  é a

  lotação

  d o

  tribunal anticartel

  f o r -

mado  n o  tribunal econômico  d o  Reich, pela qual  o  chamado

decreto anticartel (artigo  11 do decreto contra o abuso  d e posi-

ções econômicas  d e  poder  de 2 de  novembro  de 1923)  deter-

mina

  q u e

  devam

  se r

 convocados dois adjuntos, considerando-

se os

  interesses econômicos conflitantes,

  m a s

  ainda

  u m

  outro

Government; ademais, BERT RAM , A .  Hamburg, Wirtschaftsdienst,

de 28

  d e

  maio

  d e 1 9 2 6 ( an o 1 1 , p .

  701-702).

7

  A  respeito  d e  adjuntos peritos  e m  li t ígios  d e  direito econômico

e  participação leiga  ria  decisão  d e  tais litígios,  o s  pareceres feitos

para  a 36" assembléia alemã  d e  juristas pelo presidente  d o conselho

d e

  magistrados

  D r.

  KOppel

  e

  pelo advogado

  Dr , G.

  Friedlander

(pareceres,  p .  321-454).

SEGUNDA PARTE

  - A

  C O N C RE T A S I T U A Ç Ã O C O N S T I T U C I O N A L . . .

  »

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1 5 4

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

adjunto como pessoa experta

  n o

  assunto,

  "d a

  qual

  se

  pode

  es-

perar

  que e a

  defenderá

  os

  interesses

  do bem

  comum, inde-

pendentemente

  dos

  interesses econômicos conflitantes".

  Por

isso, esta última determinação  é  extraordinariamente instruti-

va,  porque  e la  diferencia  o  interessado versado  na  matéria

daquele

  perito

  independente  d e  interesses,  ou  seja,  d e  certo

modo absolutamente

  neutro

,

  e faz o

  confronto

  q u e é

  muito

necessário,

  m as que

  revela,

  a o

 mesmo tempo,

  a

 dificuldade

 do

problema entre peritos  d os  interessados  ( com os  quais pude-

ram ser  feitas experiências suficientes durante  a  economia

coletivista planificada

 d o

 período

 d a

 guerra

  e d e

 transição)

  e os

peritos não-vinculados

  a u m

  interesse.

  N o  processo concilia-

dor  estatal repete-se  u m  procedimento  d e  estrutura análoga,

m as em sua  estrutura peculiar ainda  a ser examinado  d e  forma

mais detalhada  ao  final deste livro. Comissão  e  câmara conci-

liadoras

  s ã o

 compostas

  de ta l

  modo

  q u e u m

  presidente impar-

cial

  se

  defronta

  com os

  adjuntos

  d e

  empregador

  e

  empregado

representados  e m  igual número (artigo  I

o

, § 5

o

, d o  decreto  d e

30 de  outubro  de 1923  sobre  o  processo conciliador,  Diário

oficial  do  Reich  I, p.

  1043), pelo decreto

  d o

  presidente

  d o

Reich

  de 9 de

  janeiro

  de 1931

  (

Diário oficial  do  Reich  I, p.

1), sobre  a solução  d e  litígios  p o r conciliação  n o  interesse  p ú -

blico, podem ainda ser convocados dois "adjuntos imparciais".

Além disso,

  co m

  base

  n o

  Estado

  obrigado  a  reparações

de  guerra,

  originaram-se

  n o

 Reich alemão dois institutos, cujo

objetivo reside justamente  e m  serem, contrariamente  a o  Esta-

do de

 coalizão partidário, grandezas independentes

 e

 neutras,

 o

banco

  e a

  companhia ferroviária

 d o

  Reich.

  S ã o

  complexos

  au -

tônomos

  e

  separados

  do

  governo

  e

  administração estatais

  res -

tantes, equipados  co m  amplas proteções contra  a  influência

político-partidária.  O  fato  d e  justamente incompatibilidades

parlamentares garantirem essa independência

 é o

 distintivo para

a

  direção

  na

  qual

  se

  movimentam tais autonomizações.

  M e s -

m o a

  nova regulamentação

  das

  leis

  d o

  plano Young

3

  persistiu

8

  O  Plano Young  d e 1 9 3 0  lidava  c o m a  questão  d o s  pagamentos

d e  reparações impostas  à  Alemanha depois  d a I  Guerra Mundial,

sendo  u m a  reformulação  d o  Plano Dawes [nota  d o  tradutor],

— i  SE GU ND A 1'AKI'fc  - A  C ONC R KTA S ITUAÇ ÃO C ONS TITUC IONAL. . .

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^  C Q W f c f t g í Q S

nisso. Para

  o  banco  do  Reich,  o

 presidente

  d o

 Reich, indepen-

dente

  d o

 parlamento, intermedeia

  a

 relação

  c o m o

 governo

  ale-

m ã o a o

  homologar

  a

  eleição

  d o

 presidente

  d o

 banco

  d o

  Reich

pelo conselho geral,

 a

 nomeação

 d o s

 membros

 d a

 diretoria pelo

presidente segundo anuência  d o  conselho geral  e a  revocação

d o

 presidente

 ou de um

  membro

  d a

 diretoria (artigo

 6

o

 da lei do

banco

  d o

  Reich

  n o

  texto

  da lei de 13 de

  março

  d e

  1930).

  O s

membros

  d o

 conselho geral

  d o

  banco

  d o

 Reich

  n ã o

 podem

  ser

n e m

  funcionários diretos

 d o

 Estado,

  n e m

 pessoas

  q u e

  recebem

pagamento

  d o

 Reich alemão

  ou de um

  Estado

 d o

 Reich (artigo

17). O controle da emissão d e papeJ-moeda realiza-se pelo  res-

pectivo presidente  d o  tribunal  d e  contas  d o  Reich alemão  n a

qualidade  d e  comissário, cercado  d e  todas  as  garantias  da in-

dependência judicial  e que , da mesma forma, n ã o  pode perten-

cer ao  parlamento  d o  Reich (artigo  121, 123 do  código orça-

mentário  d o  Reich).  N a  fundamentação para  as  leis sobre  a

conferência  d e  Haia  (2

a

 parte,  L e i  Bancária  p. 3/4),  está reco-

nhecida como necessária  a plena "salvaguarda  d o  princípio  d a

independência"

  e

  caracterizada como

  u m a

  "garantia funda-

mental para

  a  manutenção  da

  moeda".

N o  tocante  à

  companhia ferroviária

  do

  Reich

, encontra-

s e

  atenuada

  a

 rigorosa separação existente consoante

  à lei fer-

roviária

  d o

  Reich

  de 30 de  agosto  de  1924. O

  governo (parla-

mentar)

  d o

  Reich obteve amplos direitos

  d e

  informações

  e

poderes

  d e

  controle,

  os

  membros

  d o

  conselho administrativo

d a ferrovia d o Reich  são agora nomeados pelo governo d o Reich

(artigo

  2

o

, § 11), um

  representante permanente

  d o

  governo

  d o

Reich pode participar d a s  reuniões  d o conselho administrativo

e d e  suas comissões  sem  direito  d e  voto.  M a s , n o  restante,

vale também aqui  o  princípio  d a  independência  e  autonomia,

continuando a existir as incompatibilidades parlamentares para

o  conselho administrativo, cujos membros  têm que se r "conhe-

cedores experientes  da  vida econômica  ou ser  peritos  em a s -

suntos  da  ferrovia"  e não  podem  ser "membros  d o parlamento

d o  Reich,  de um parlamento estadual,  d o  governo  d o Reich  ou

de um  governo estadual" (artigo  10). A fundamentaç ão salien-

ta (p. 16) que,  embora  a  legislação  d o  Reich possa efetuar

SEGUNDA PARTL

  - A

  CONCRÜTA SITU AÇÃO CONSTI TUCI ONA L.

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m .

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

modificações

  na lei da

  ferrovia

  d o

  Reich,

  ela só o

  pode fazer

sob a

  condição

  de que não

  resulte nenhum encargo novo para

a  companhia  e q u e  "sejam intangíveis"  as  determinações  e

garantias  das  reparações  d e  guerra, "assim como  o  caráter

independente  da  companhia  c o m s u a  administração autôno-

m a " .  Aqui, torna-se visível  a base  d a  independência  e  neutrali-

dade

  da

  política externa

  e d o

  direito internacional,

  a

  última

  e

mais forte garantia contra

  a

  intervenção

  d o

  Estado partidário.

E m

  ambos

  os

  casos, banco

  e

 ferrovia, sobreveio

  u m a  cisão

d e direitos d e soberania estatais e fo i formado u m  sujeito jurídi-

c o  autônomo  q u e  aparece perante  o  Estado partidário  de fo r -

m a  independente  e  neutra.  S ã o  ainda também imagináveis  o u -

tras possibilidades

  d e

  produtos autônomos

  e, em

  parte,

  j á

também realizados, seja como patrimônio vinculado  s em fo r -

mação

  de um

 novo sujeito jurídico,

  mas sob a

 possibilidade

  d e

retirada  d o  orçamento nacional geral (assim  é o  correio  a le-

m ã o d o  Reich  c o m  base  na le i das  finanças  d o s  correios  e

telégrafos  d o  Reich  de í 8 de  marco  de 1924 ,  Diário oficial

do  Reich  I , p . 287) ,  seja  p o r  meio  de  monopólios autônomos,

seja pelo fato

  d e q u e

  produtos existentes autônomos, como,

p o r

 exemplo,

 o

 seguro social,

 a

 autonomia administrativa muni-

cipal  ou  econômica, igrejas, sociedades filosóficas  ou  outras

associações transformam-se  e m  titulares  d e  direitos estatais

dessa forma cindidos. Para tanto,  o s  produtos autônomos  da

autonomia administrativa municipal parecem, temporariamen-

t e , não

  mais interessar, pois,

  e m

  conseqüência

  da

  determina-

ção d o

  artigo

  17 da

  Constituição

  d o

  Reich, estão incorporados

a o

 âmbito direto

 d e

 poder

  d o

  sistema poiítico-partidário

 e

  polí-

tico-faccional, transformaram-se  n o s  titulares mais fortes  d a

"policracia" tratada acima. E m contrapartida, Estados alemães,

e m  particular, podem  se tornar titulares  d e certa função neutra-

lizadora. Embora também sejam Estados partidários governa-

d o s

  parlamentarmente,

  a

 circunstância

  d e q u e

  neles governam

coalizões compostas

  de

  forma diferente

  da do

  Reich, causa

 j á

a

  partir

  da

  mera diversidade

  u m

  contrapeso.

  O s

  elementos

federalistas  da  atual Constituição alemã obtiveram  p o r  meio

disso  u m a  tarefa  e  função totalmente novas,  a  saber,  a de um

— «  SEG UND A PARTE  - A  CON CRET A SIT UAÇÃO CONST1 TUCIONAL. . .

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

152

efeito neutralizador perante  o  instável Estado  d e  coalizão  par-

tidário

 n o

 Reich. Este

  se

  toma mais forte

 na

 mesma proporção

e m q u e a

  necessidade

  p o r u m a

  reação

  se

  torna mais forte.

Aqui

  se

  evidencia

  u m a

  peculiaridade

  d a

  mudança funcional

mencionada acima  que dá ao  federalismo d o  antigo estilo,  por

motivos  e  pontos  d e  vista outros,  u m a  nova  ratio essendi  e

nova vida

  à

  luta contra

  o

  unitarismo

  n o

  Reich

  e

  contra

  o

centralismo

  na

  Prússia.

  N o  conselho  do  Reich

  une-se

  o

  fede-

ralismo  c o m  elementos  d o  Estado-funcionário, o  fato  d e  essa

instância ainda  não ter se  transformado  e m u m a  assembléia d e

funcionários

 d o

 partido,

 m as se r um

 colegiado

 d e

 peritos admi-

nistrativos pode também

  ser

 explicado

  por a

 Constituição

 per-

severar  n o  caráter estatal  d o s  Estados  e  mostrar  que o  federa-

lismo pode  ser um  reservatório  d e  forças estatais. Assim, além

d o

 Estado-funcionário,

 do

 Estado-perito

 e d o

 Estado-parecerista

e  além  d o s produtos  d o Estado obrigado  a  reparações  d e  guer-

ra ,  também surgem ainda forças  d o  Estado federal  na  série d e

reações

  que , em seu

  concurso nada metódico,

  m a s

  levando

  ao

mesmo resultado, procuram hoje assumir

  as

  funções

  d o

  Esta-

d o político-partidariamente neutro.

6.3  Insuficiência d a maioria d as neutralizações;

ambigüidade d o s conceitos d e

neutralidade e despolitização

E m

  algumas tendências

  a

 outras formações

  e

  cisões autô-

nomas reside indubitavelmente  u m a  correção forçosa  e im-

prescindível.  M a s  pode  daí ser  realmente obtido  u m  princípio

geral  d e  estrutura estatal?  É  legítimo,  p o r  exemplo, apelando

para

 o

 princípio cooperativo autenticamente alemão, levar mais

adiante esse desenvolvimento

  em

 direção

  ao

  pluralismo?

  Já se

tem

  hoje

  o

  direito

  d e

  proferir

  o

  lema sobre evasão geral

  d e

capitais d e  tudo o que ainda existe  na Alemanha  e m  substância

estatal? Gostaria  de negar isso, mais precisamente pelo fato d e

que va i  falhar n o objetivo unicamente justificante, ou  seja,  im -

parcialidade  e objetividade d o Estado.

SEGUNDA PARTI-  - A  C O NC R E T A S U D A Ç Ã O C O N S T I T U C I O N A L . . .  •

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P m f c D \ Q S  £ .  W Q V \ M t N T O S C O N T B Á W O S

A 5 2 .

dos e não  interessados conduz  a u m  dilema  q ue  toma proble-

mático  o  valor  d o Estado-perito neutro, justamente ,  n o caso de

difíceis oposições  e conflitos: o u o perito  é, ao  mesmo tempo,

interessado,

  n ã o

  sendo, então, neutro

  e o

  recurso

  à

  paridade

n ã o  conduz  à  decisão, pois

  paridade

,  a o  contrário, significa

exatamente

  não-decisão

,

  ou o

  perito

  n ã o é

  interessado,

  fa l -

tando-lhe, então, freqüentemente  o  último  e  mais próprio  co -

nhecimento experto. Ocasionalmente, pode  se r uma boa  alter-

nativa impelir

  a

  decisão para peritos independentes,

  mas não

se podem conseguir decisões políticas dessa maneira  e, no caso

d e  sérios conflitos, a autoridade  d o  parecerista,  o  simples peso

d e

  seus argumentos,

  " the

  mere weight

  o f

  expert agreement",

n a  maioria  d a s  vezes  n ão  basta para superar  o  poder  d e  fortes

interesses contrários.  A  relação aqui  é  semelhante  à da  trans-

missão

 d e

 decisões políticas

  à

 justiça lotada

 d e

 funcionários

 d e

carreira,

  c o m o

 tempo, isso

 n ã o

 conduz

  a u m a

  objetivação

 neu-

t ra , mas ,  inversamente,  à  politização partidária  d a  grandeza,

a té

  então, neutra.

  O s

  reais detentores

  d o

 poder político podem

proporcionar facilmente

  a

  influência necessária para

  a

 ocupa-

ção dos cargos d e juízes  e a nomeação  d o s pareceristas peritos,

s e conseguirem isso, a resolução judicial  o u pericial  d a questão

tornar-se-á

  u m

  meio cômodo

  de sua

  política

  e

  isso

  é o

  contrá-

r io do que se

 objetivava verdadeiramente

  c o m a

 neutralização

e se não o  conseguirem, perderão  o  interesse  nas  opiniões  e

pareceres  d o s  peritos, cujos memoriais  e  votos podem  ser fa-

cilmente ignorados.

  O

  destino

  d e

  muitas comissões indepen-

dentes  d e  pareceristas  e  peritos veio freqüentemente confir-

m a r d e  forma suficiente, n o s  últimos anos, essa experiência.

A  falta  d e  clareza,  em si  mesmo contraditória,  da  maioria

d a s  "neutralizações" dirige-se, porém, também  em seu  resulta-

d o

  prático, contra seus verdadeiros objetivos.

  A

  policracia

  d a

economia pública seria levada ainda mais adiante mediante

novas formações  e  cisões autônomas  e juntamente  com o s is-

tema pluralista aproximar-se-ia, finalmente,  da situação  de um

Estado-estamentário medieval,

  na

 qual

  o

 Estado alemão

 já pe -

receu

  u m a vez . O

 verdadeiro perigo

 d o

 instável Estado

 d e

 coali-

z ã o partidário, q u e deve  ser combatido  c o m a s autonomizações

SJ-GUNfM CARTE  - A  CO N CRL T A SI T U A ÇÃ O CO N ST I T U CI O N A L . . .  •

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1 6 0

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

despolitizanies, reside

  n a

 mesma direção, pois também

  o

  siste-

m a pluralista, c o m seus contínuos acordos entre partidos e gru-

p o s

  parlamentares, transforma

  o

  Estado

  e m u m a

 justaposição

d e

  acordos

  e

  contratos,

  p o r

  meio

  d o s

  quais

  o s

  partidos respec-

tivamente partícipes  da operação  d e  coalizão repartem entre  si

todos

 os

 cargos, rendimentos

 e

 vantagens segundo

 a lei d a

 cota-

parte

  e

 sentem

  a

 paridade,

  que a í

 observam, ainda, porventura,

como algo justo.

  A

  Constituição

  de um

  Estado dominado

  por

tais métodos

  d a

  volição política reduz-se

  à

  frase

 pacta sunt

servanda  e à  proteção  d o s  "direitos adquiridos". Isso  f az pa r -

te da

 conseqüência

  d e

  todo sistema pluralista.

  O

  interesse

  dos

partidos  e grupos parlamentares,  d e  suas organizações  de a ju -

da e

  apoio

  e de

  suas burocracias

  não se

  encontra,

  d e

  forma

alguma,

  e m

  oposição necessária

  ao s

  interesses particulares

  d e

produtos cindidos  e  autônomos. Pode  se ligar  a eles  e  contrair

várias alianças. Como

  e m

  geral

  nas

  relações entre pluralismo,

policracia  e  federalismo  sã o  também aqui possíveis muitas

imbricações

  e a s

  chamadas relações transversais.

  A

  última

conseqüência

  de tal

 pluralismo duplamente fundamentado

  se -

r ia uma total dispersão  d a unidade alemã. Ficaria, então,  a car-

go da

  pressão

  de

  fora,

  d o

  interesse

  d o s

  Estados credores

  n a

unidade  d o devedor  das  reparações  d e guerra,  se a unidade  da

Alemanha deve perdurar

  ou não, e

  seria

  u m a

  questão

  de d is -

crição

  d e

  governos estrangeiros

  se um

  comissário

  o u u m a

potestade estrangeiro determina  a s  diretrizes  d a política inter-

n a

  alemã após

  o

  senso político

  d o

  povo alemão

  n ã o

  mais

  ter

sido suficiente para  u m a própria volição.

C o m

  isso,

  a

  situação alemã

  n ão

  estaria despolitizada,

  ape -

n a s

  teria entrado

  n o

 lugar

  d e u m a

  política alemã,

  u m a

  política

estrangeira.  O  erro fundamental  d e  todo  o  esforço p o r  despo-

litização

  j á

  está contido

  na

  equívoca

  e

  enganosa "despoliti-

zação".  N a  realidade, compreende-se  c o m  essa palavra,  des-

de que se  trate  d e  propostas sérias, quase sempre apenas  a

eliminação

  de um

 determinado tipo

 de

 política,

 a

 saber,

 da

 polí-

tica partidária,

  ou

 seja, apenas

  d e u m a

  "despolitização partidá-

ria , e

  isso também apenas

  n o

  sentido

  da

 política partidária

  d o

'

  S t G U N D A P A R T E

  ~

  A

  C ONC R ETA S ITUAÇ ÃO C ONS TITUC IONAL. . .

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

m

instável Estado

  d e

  coalizão partidário,

  a

  qual apresenta carac-

terísticas especiais.

  A

  palavra atinge, assim, apenas

  u m

  deter-

minado antagonismo contra determinados métodos,

  a

  saber,

político-partidários.  D e  resto, deve-se observar  q u e  política  é

inevitável  e  inexterminável. Pode  se  diferenciar,  co m  fáceis e

cômodos confrontos, entre política

  e

 direito, política

  e

 econo-

m i a ,

 política

 e

 cultura,

 m a s ,

 nesse aspecto, parte-se comumente

d a

  falsa noção

  d o

  século

  X I X

  liberal

  de que

  seria possível

  se-

parar  u m a área especial  d e  "política"  d e  outras matérias como

economia, religião e direito. Contudo, a peculiaridade d o políti-

c o

  reside justamente

  n o

  fato

  de que  toda

  área imaginável

  d e

atividade humana  é, na medida  d o possível, política  e se  torna

imediatamente política quando  o s  conflitos  e  questões decisi-

vos se

  passam nessa área.

  O

  político pode

  se

 unir

  a

  toda maté-

ria e lhe dar - se me é

 permitido tomar aqui

  u m a

 fórmula utili-

zada  p o r  Eduard Spranger  —  tão-somente  u m a  "nova virada".

Assim, constitui-se  em um  mal-entendido  e em um  modo  d e

falar ilusório,

  se não

  enganoso, sugerir

  c o m a

  palavra despo-

litização

 que a

  incômoda responsabilidade

  e o

 risco

 d o

 político

pudessem  se r  evitados  e  exterminados. Tudo  o que , de  algu-

m a  forma,  fo r d e  interesse público,  é d e  alguma forma polí-

tico  e  nada  d o q u e d i z  respeito essencialmente  a o  Estado

pode

  se r

  despolitizado.

  A

  fuga

  d a

  política

  é a

  fuga

  d o

  Esta-

d o .

  Onde essa fuga termina

  e

  onde

  o

  fugitivo chega

  n ã o

pode

  se r

  previsto

  p o r

  ninguém,

  e m

  todo caso,

  é

  certo

  que o

resultado será  ou o  declínio político  o u ,  porém,  u m a  outra

espécie  d e  política.

6 .4 Um

  panorama

  d o s

 diversos significados

 e

funções

 d o

  conceito

  d e

  neutralidade

  d e

política interna d o  Estado

E m

  vista

  da

  ambigüidade

  da

  palavra "neutralidade"

  e da

confusão

 q u e

  ameaça tomar

  u m

  indispensável conceito inútil

  e

inaplicável, é oportuno u m esclarecimento terminológico e ob-

jetivo.  P o r  isso, tentar-se-á aqui  u m a  exposição resumida,  na

SEGUNDA PARTE  - A  CO N CRE T A SI T U A ÇÃ O CO N ST I T U CI O N A L . . .  •

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m .

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

qual

  o s

 diversos significados, funções

 e

 orientaçoes polêmicas

dessa palavra estão agrupados

  c o m

  alguma sistemática.

I.  Significados negativos  da  palavra "neutralidade",

ou

  seja,

  que se

  afastam

  da

  decisão política.

}.  Neutralidade  no  sentido  da  não-inrervenção,  do de-

sinteresse,  do  laisser passer,  da  tolerância passiva,  etc.

Nesse significado,

 a

 neutralidade

  d e

 política interna

 d o E s -

tado primeiramente entra  na consciência histórica, mais preci-

samente como  neutralidade  do  Estado perante  as  religiões

e  confissões.

  Assim

  d iz

  Frederico

  o

  Grande

  em seu

  testamen-

to  político:

  je

  suis neutre entre Rome

  et

  Genève.

  Aliás,  u m a

antiga fórmula do século XVII  q ue já se encontra  n o retrato  d e

Hugo Grotius  e que é de  suma importância para  o processo  d e

neutralização iniciante neste século.

9

 E m

 última conseqüência,

esse princípio

  t e m q u e

  levar

  a u m a

  neutralidade geral perante

todos  os  problemas  e  concepções imagináveis  e a um a  igual-

dade absoluta  d e  tratamento,  em que , po r  exemplo, aquele qu e

pensa religiosamente  n ã o  pode  ser  mais protegido  do que o

ateísta,  o nacionalista  n ã o mais  do que o  inimigo  e contemptor

d a

  nação. Ademais, disso resulta

  a

  absoluta liberdade

  d e

  todo

tipo  d e propaganda,  da  religiosa como  d a anti-religiosa,  da na-

cional como d a antinacional, "consideração" absoluta para c o m

"aquele

  c o m

  modo diferente

 d e

 pensar" pura

  e

  simplesmente,

mesmo

  se ele

  escarnecer

  o

  costume

  e a

  moral,

  se

  minar

  o

regime estatal  e se  provocar agitação  a  serviço  de um  Estado

estrangeiro. Esse tipo  d e "Estado neutro" é o relativístico stato

neutrale

  ed

  agnostico

  q u e  nada mais diferencia,  o  Estado

vazio

  o u

  então apenas restrito

  a u m  mínimo  d e

  conteúdo.

  S ua

Constituição  é,  sobretudo, também neutra perante  a  econo-

mia   n o  sentido  d a  não-intervenção (liberdade econômica  e

contratual),

  c o m a

  "ficção

  d o

  Estado livre

  da

  economia

  e da

economia livre

 d e

 Estado"

 (F.

 Lenz). Todavia, esse Estado ainda

v

  Sob re esse proce sso

  d e

  neutralizaçao

  e

  seus estágios: SCHMITT,

Carl.

  Europaische Revue,

  novembro  d e 1 9 2 9 .

,

  SEG UND A PARTE

  - A

  C ONC R ETA S ITUAÇ ÃO C ONS TITUC IONAL. . .

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R E M É D I O S

  E

  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

m

pode  se  tornar político, pois  e le  ainda conhece, pelo menos

imaginavelmente, u m  inimigo, ou seja , aquele n ã o crente nesse

tipo  d e neutralidade  n o  modo  d e pensar.

2 .

  Neutralidade

  no

  sentido

  de

  concepções instrumen-

tais  de  Estado, para  as  quais  o  Estado  é um  recurso técni-

co que  deve funcionar  com  objetiva calculabilidade  e dar

a  todos  a  igual chance  de uso.

Idéias instrumentais

  d e

  Estado

  são a

  base,

  na

  maioria

  das

vezes, para

  as

  seguintes expressões:

  o  aparelho

  judiciário

  e

administrativo estatal,  a  "máquina  governamental",  o  Estado

como funcionamento  burocrático,  a máquina legislativa,  a ala-

vanca  d a  legislação,  etc. A  neutralidade  d o  Estado como  u m

instrumento técnico

  é

  imaginável para

  a

  área

  d o

  executivo

  e

pode  se imaginar talvez que o aparelho judiciário ou o aparelho

administrativo funcione da mesma maneira  e  esteja  à  disposi-

ção de

  todos

  o s

  usuários

  q u e

  dele

  se

  sirvam conforme

  a nor-

ma , com a

 mesma objetividade

 e

 tecnicidade, como

  o

 telefone,

o

  telégrafo,

  o s

  correios

  e

  semelhantes institutos técnicos

  que ,

s e m  levar  e m  consideração  o conteúdo  d a comunicação, estão

a  serviço  d e  todos  que se  atêm  às  normas  de seu  funciona-

mento.

 Tal

 Estado seria completamente despolitizado

 e nã o

 mais

poderia diferenciar,

 d e per s i ,

 entre amigo

  e

  inimigo.

3 .  Neutralidade  no  sentido  de  chance igual  na  volição

estatal.

Aqui,

  a

  palavra obtém

  u m

  significado

 q u e

  está

  na

  origem

d e  certas interpretações liberais  d o  direito  d e  eleição  e  voto

geral  e  igual, assim como  d a  igualdade universal perante  a lei,

desde

  q u e

  essa igualdade perante

  a lei já não

  recaía (como

igualdade perante

  a

  aplicação

  da lei) sob o

  número

  2

  acima.

Cada

  um t em a

 chance

  de

  conquistar

  a

 maioria,

  se

 pertencer

  à

minoria vencida por maioria  d e votos, será remetido  ao fato d e

que e l e  teve  a  chance  e  ainda  tem de se  tomar maioria. Isso

também

  é u m a

  idéia liberal

  d e

  justiça. Tais idéias

  d e u m a n e u -

tralidade

  d e

  igual chance

  n a

  volição estatal estão também

  na

origem,  m a s  quase sempre  d e  forma pouco consciente,  d a

Sf iGUNDA PARTE  - A  CONCRETA SI TUAÇ ÃO CONS TITUCIONAL.. .  •

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concepção dominante

  d o

  artigo

  76 da

  Constituição

  d o

  Reich.

Segundo  ela, o artigo  7 6  recebe  n ão  apenas  u m a  determinação

sobre emendas constitucionais (como seria

  de se

  supor pelo

teor  d o  texto),  m a s  fundamenta também  u m a  absoluta onipo-

tência ilimitada e infinita, assim como um poder legislativo. Assim,

p.ex.,  G. Anschütz  em s eu  comentário sobre  o  artigo  76 (10

a

ed., p .

 349/350),

 F r.

 Griese {Kommentar,

  8

a

 ed . ,

  1931,p.

  1 9 0 ) e

R .

  Thoma (

Handbuch

 des

  deutschen Siaatsrechts,  II , p . 154 ),

q u e  chega  a té  mesmo  ao  ponto  d e  apresentar  a  divergente

opinião tanto minha quanto

 a de C.

 Bilfinger como

 " d e

 direito

 a

u m  desejo", u m  epíteto q u e  exprime  u m  tipo d e insinuação  b a-

nal , no

  geral, não-comum. Essa concepção dominante

  d o

  arti-

go 76  retira  d a Constituição  d e  Weimar  su a  substância política

e seu

  "fundamento"

  e a

  transforma

  e m u m  procedimento  de

emenda neutro

  e

  indiferente

  a

  qualquer conteúdo,  q u e ,  prin-

cipalmente,

  também  é  neutro  com  relação  ao  regime estatal

respectivamente existente.  Assim, deve-se  dar a  todos  os par-

tidos, equitativamente,

  a

  chance incondicionalmente igual

  d e

conseguirem  as maiorias necessárias para,  c o m a ajuda d o p ro -

cedimento válido para emendas constitucionais, alcançarem

  seu

objetivo pretendido -  república soviética. Reich nacional-socia-

lista. Estado sindical econômico-democrata, Estado corpo-

rativista, monarquia

  d e

 antigo estilo, aristocracia

 d e

 todo tipo

 —

e u m a outra Constituição. Toda preferência pelo regime estatal

existente

  ou até

 mesmo pelos respectivos partidos govemistas,

seja através  d e  subvenções para propaganda,  d e  diferencia-

ções

 no uso das

 emissoras

 d e

 radiodifusão, diários oficiais, apli-

cação  da  censura cinematográfica, lesão  à  atividade político-

partidária

  ou à

  afiliação partidária

  d o s

  funcionários

 n o

  sentido

de que o respectivo partido governista permite a o s funcionários

apenas

  a

  afiliação

  ao

  próprio partido

  e aos

  partidos

  n ão p o r

demais distantes dele político-partidariamente, proibições  d e

reunião

  d e

  partidos extremistas,

  a

 diferenciação entre partidos

legais e revolucionários d e acordo c o m s e u programa, tudo isso,

n o

  sentido

  d a

  concepção dominante

  d o

  artigo

 7 6 ,

 elaborada

  d e

forma conseqüente,

 são

 inconstitucionalidades grosseiras

 e p ro -

vocantes.  N a  discussão  d a  questão  se a lei de 25 de  março  d e

•  SEG UNDA PARTE  - A  C O N C R ETA S I TU A Ç Ã O C O N S TI TU C I O N A L—

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=

0 _ G U A R D I Ã 0 ^ ^

i

Ç 0 N S T l T y i ^ 0

e d e  poder re la t ivamente incont roversa  d o s  parce i ros

paritariamente legitimados. U m número p o r demais alto de gru-

p o s q u e  reivindiquem  u m  tratamento paritário  o u u m a  insegu-

rança  p o r  demais alta  na  apreciação  de seu  poder  e  importân-

cia, ou

 seja, insegurança

  n o

 cálculo

  da

 quota

  a que têm

 direito,

impede tanto a realização d o princípio da paridade, quanto, t a m -

b é m , a

 evidência

  d o

  princípio

  que lhe

  serve

  d e

  base.

A  segunda dúvida sobre  u m a  paridade realizada  d e  forma

conseqüente reside  n o  fato  de que e la ,  necessariamente,  c o n -

duz ou a um  equilíbrio  sem  resolução  ( tão freqüente n a parida-

d e  entre empregadores  e  empregados),  ou ,  porém,  n o  caso  d e

grupos fortes  e  claramente definidos,  a u m a  itio  in  partes,

como  a  entre católicos  e  protestantes desde  o  século  X V I n o

antigo Reich alemão. Cada partido coloca, então,  e m  seguran-

ça

  para

  si a

  parte

  d a

  substância estatal

  q u e l h e

  interessa

  e ,

assumindo

  u m

  compromisso, está

  d e

  acordo

  em que o

  outro

partido

  c o m u m a

  outra parte faça

  o

  mesmo. Ambos

  os

  méto-

dos —

 igualdade aritmética

  ou  itio  in partes  — não t êm o

  senti-

do de uma  decisão política,  mas se  distanciam  d a  decisão.

II .  Significados positivos  da  palavra "neutralidade",

ou

  seja,

  que

  levam

  a uma

  decisão.

1.  Neutralidade  no  sentido  da  objetividade  e da im-

parcialidade  com  base  em uma  norma reconhecida.

Esta  é a neutralidade d o juiz enquanto  e le decidir c o m base

em uma l e i  reconhecida  e  definível  em seu  conteúdo.  É a

vinculação

  à lei (que

 contém vinculações materiais)

  q u e

 possi-

bilita

  a

 objetividade

  e , com

  isso,

  u m a

  espécie

  d e

 neutralidade,

assim como  a relativa autonomia  d o juiz perante  a outra vonta-

d e

  estatal

  (i.e.,

  expressa

  d e

  forma outra

  p o r u m a

  regulamenta-

ç ão

  legal). Embora essa neutralidade leve

  a u m a

  decisão,

  e la

n ã o

  leva

  à

 decisão política.

2.  Neutralidade  com  base  em um  conhecimento experto

não  egoísta  e  interessado.

Esta

  é a

  neutralidade

  d o

  parecerista

  e

  consultor experto,

d o  adjunto perito, desde  que não  seja representante  d e  inte-

S b ü UNDA P AR TE  - A  C ONC R ETA S ITUAÇ ÃO C ONS TITUC IONAL.

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ressados  e  expoente  d o  sistema pluralista  (vide  acima), nessa

neutralidade se baseia também  a autoridade d o mediador e con-

ciliador, desde  que não  recaia  sob o número  3 .

3 .

  Neutralidade como expressão

  de uma

  unidade

  e to-

talidade  que  abrange  os  agrupamentos opostos  e,  destarte,

relativiza  em si  todas essas oposições.

Esta

  é a

  neutralidade

  da

  decisão estatal

  d e

  antagonismos

internos

  de um

  Estado perante

  a

  fragmentação

  e

  divisão

  d o

Estado

  e m

  partidos

  e

  interesses especiais, quando

  a

  decisão

torna válido

  o

  interesse

  d o

  todo estatal.

4 .

  Neutralidade

  do

  estrangeiro

  que se

  encontra

  de

  fora

e que, na  qualidade  de  terceiro, provoca,  de  fora  e em

caso

  de

  necessidade,

  a

  decisão

  e, com

  isso,

  uma

  unidade.

Esta

  é a

 objetividade

 d o

 protetor perante

  o

 Estado

  sob p ro -

tetorado

 e

 seus antagonismos

  d e

 política interna,

 d o

 conquista-

d o r

  perante

  o s

  diversos grupos

  e m u m a

  colônia,

  d o s

  ingleses

perante

  os

 hindus

  e

  muçulmanos

  n a

  índia,

  d e

  Pilatos

  {quid  est

veritas?)

  perante

  as

  contendas religiosas

  d o s

  judeus.

6 .5

  Procedimento

  d o

 governo constitucional

segundo

  o

  artigo

  4 8 d a

 Constituição

  d o

Reich. Desenvolvimento

 d o

 estado

  d e

exceção militar-policial rumo  a o  econô-

mico-financeiro

A  solução  d a s dificuldades atuais  n ã o pode residir  n o  fato

de se  continuar  a enfraquecer o  Estado,  n e m  muito menos  n o

d e  deixá-lo perecer  e m u m  sauve  qui  peut  generalizado.  A

causa  d o s  inconvenientes  e da falta d e  imparcialidade  e objeti-

vidade  é exatamente  a f raqueza resultante,  e m u m  Estado  e c o -

nômico, d o s métodos pluralistas d o instável Estado d e coalizão

partidário  e não se pode remediar essa falta  p o r  meio  d e  mais

SECUNDA PARTE  - A  C ONC R ETA S 1 TUAÇ AO C ONS TITUC IONAL. . .  i—

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O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

enfraquecimentos  e  cisões.  A maioria  das  propostas  e exigên-

cias

  po r

 despolitização esquece

  a

 simples verdade

 d e q u e ,

 para

a neutralidade  n o sentido d e u m a  imparcialidade independente,

são

  necessárias

  u m a

  robustez

  e u m a

  força

  q u e

  possam ofere-

ce r

  resistência

  a

 agrupamentos

  e

  interesses poderosos.

  Se fal-

tarem  a o Estado,  u m a  outra força  t em que intervir  a seu  favor,

força esta

  que se

  transforma, assim,

  n o

  Estado. Neutralidade

n o sentido d e  imparcialidade e objetividade não se constitui  e m

fraqueza

 e

 apolitismo,

  m a s e m s e u

 contrário. Assim,

  a

  solução

n ã o

 reside

  e m u m a

  imparcialidade apolítica,

  m a s e m u m a

 polí-

tica objetivamente informada  e que não  perde  d e  vista  o  inte-

resse

  d o

  todo.

E o

 objetivo

  d e

  toda Constituição sensata

  dar um

  sistema

organizacional

  q u e

  possibilite

  u m a

 volição estatal

  e u m

  gover-

n o  capaz  d e  governar.  E ,  sobretudo,  a  intenção consciente  e

b e m

  refletida

  da

  vigente Constituição

  d o

  Reich alcançar esse

objetivo

  e

  todos

  os

  seus institutos

  d e u m a

  democracia parla-

mentar  e  plebiscitária devem,  e m  primeiro lugar, criar  u m g o -

verno eficiente. Parte-se

 d o

 princípio

 de que um

 governo apoiado

e m   camadas populares  e que  encontra  a  anuência  e a  aclama-

ção do

 povo

  é

 mais forte

 e

 mais intenso

  do que os

 demais tipos

d e governo.  P o r essa razão,  a primeira parte organizacional  d a

Constituição  d o Reich contém, fora a s determinações  d e direi-

to

 federal,

 u m

  equilíbrio,

 e m

  princípio,

 b e m

  refletido

 da

 demo-

cracia parlamentar para  c o m a plebiscitária.  N o  centro  da par -

te

  constitucional plebiscitária está

  o presidente

  do

  Reich  e é

d e  grande significado  q u e  esse,  n o s  esforços  d e  neutralização

q u e  conduziram  a  formações autônomas, apareça  e m u m p o n -

to

  especialmente importante, pois

  é e le que

  estabelece

  a

  rela-

ç ã o  entre  o  Reich alemão  e o banco  d o  Reich  a o  homologar  a

nomeação

  d o

  presidente

  d o  banco

  do

  Reich,

  eleito pelo

  c o n -

selho geral  d o  banco, e que assina  o título  d e nomeação (artigo

6

o

, §

 4°,

  da lei do banco  d o Reich  de 13 de março  d e  1930).  D a

mesma forma,

 n a

  sociedade ferroviária

  d o

  Reich,

  a

 escolha

  d o

presidente  d o  conselho administrativo (artigo  12 do estatuto)  e

a

 nomeação

  d o

 diretor geral

  e dos

  diretores (artigo

  17 do

  esta-

tuto) necessitam

  da

  homologação pelo presidente

  d o

  Reich.

  SEGU NDA PARTE

  - A

  C ONC R ETA S ITUAÇ ÃO C ONS TITUC IONAL. . .

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R E M É D I O S

  E

  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

  1 f i C)

Porém,  o  reconhecimento teórico  de sua  posição central  e de

suas possibilidades constitucionais ainda sofre

  sob as

 interpre-

tações,  as  quais,  c o m o s  velhos clichês surgidos  n o  período

pré-guerra, transformam

  a

  Constituição

  d e

  Weimar

  e m u m a

caricatura

  a o

  verem nela nada além

  d e u m a

  anti-Constituição

contra

  a

 antiga Constituição

  d o

  Reich. Mais atingida

  c o m

  isso

é a compreensão  d o s  artigos  2 5  (dissolução  d o  parlamento  d o

Reich, conceito

  d e

 "unicidade"

  e d e

 "igual motivo"

10

),

  5 4

 (voto

d e  desconfiança)  e 48 .  Contudo,  a  prática desses artigos  j á

produziu

  u m a

  série

  d e

 precedentes reconhecidos,

  o s

 quais

  não

podem  s e r juridicamente ignorados.

A

  questão

  q u e

  aqui interessa

  -

  quais remédios

  são

  consti-

tucionalmente possíveis perante

  a s

  dificuldades

  e o s

  métodos

destrutivos  d e  Constituição  d o sistema pluralista  -  encontrou,

assim,

 u m a

 outra resposta mais eficaz

 e que

 melhor corresponde

a o  espírito  da  Constituição  do que as  cisões  e  autonomizações

levadas cada

  v ez

  mais adiante.

  A

  prática

  d a s  leis

  de

  plenos

poderes,  especialmente  e m  ambos  o s  casos  d a s  leis  d o  Reich

de 13 de

 outubro

  de 1923

  (

Diário oficial

  do

  Reich  I , p. 943) e

de 8 de dezembro  de 1923 (Diário oficial

  do

  Reich  I, p .  1179),

mostra

  que , no

 caso crítico,

  é

 possível

  u m

  afastamento

 do pa r -

lamento.  E  característico  que , na  primeira  lei de plenos pode-

r e s

  para

  o s

  decretos

  d o

  governo

  d o

  Reich,

  a lei que

  admite

10

  Igual motivo,

  n o

  sentido

  d o

  artigo

  2 5 d a

  Constituição

  d o

  Reich,

é

  ap en as

  o

  ob je to concre to

  d a

  d iv e r s id ad e

  d e

  opinião entre

Presidente  d o  Reich (governo)  e  parlamento,  o u  seja,  o  tema  d e

u m  confli to  q u e o  povo decide  p o r  meio  d e  nova eleição.  M a s s e

u m

  par lamen to incapaz

  d e

  atingir maioria

  é

  dissolvido, essa

cond ição  n ã o é  aplicada  e  seria absurdo  d a r a u m  par lamento

posterior,  p o r s u a v e z  incapaz  d e  atingir maioria,  p o r  assim dizer,

u m direito  a 4 anos  d e  incapacidade d e atingir maioria; c f . SCHMIT T,

Ca r l .  Einmaligkeit

  und

  gleicher Anlass

  bei der

  Reichsiag-

sauflõsung nach

  Art. 25 RV.,

  Arch.

  d. Off.

  Rechts, Neue Folge,

vo l . 8  (1925),  p . 162 .  Recentemente, isso  f o i  novamente incom-

preendido  e m  GLUM,  F.  Parlameniskrise

  und

  Verfassungslücke,

Deutsche Juristenzeitung

  1930 , p . 1415 ;

  BÜHLER,

  Õ .  Die

  Grenzen

verfassungsmafiigen Vorgehens

  der

  Regierung

  bei

  Erledigung

des

  Sanierungs-programms

, Re ichsverwalcungsb la t t ,  vo l . 51

(1930), p . 780 .

SEGUNDA PARTE

  - A

  CONCRETA SITUAÇÃO  C ONS TITUC IONAL,

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120

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

divergências

 d o s

 direitos fundamentais constitucionais,

 nã o es-

tava prevista  u m a participação d o parlamento d o Reich,  e, s im,

apenas para informação

  e

  reivindicação

  de

  anulação, enquan-

to na  segunda  lei de  plenos poderes, antes  d a  promulgação  d o

decreto, tinha

  que ser

  ouvida  apenas

  u m a

  comissão

  d o

  parla-

mento composta

  por 15

  membros

  ( e u m a

  comissão

  d o

  conse-

lho do  Reich).  U m  outro sintoma  a ser  citado aqui  são

  minis-

tros-funcionários

  e

  gabinetes-funcionários.

11

  M a s o

  exemplo

decisivo  se  encontra  na

  prática

  do

  artigo

  48.  E la é  especial-

mente significativa para

  a

 estrutura

  d a

  atual situação constitu-

cional, porque

  e ra

 obrigada

  a se

 mover

  e m

  território econômi-

c o e  financeiro, pois  o  desenvolvimento rumo  a o  Estado

econômico

  se

  encontrou

  c o m o

  desenvolvimento simultâneo

d o

  parlamento rumo

  a u m

  cenário

  d o

  sistema pluralista

  e é aí

mesmo  que se têm  fundamentadas tanto  a  causa  d a  perturba-

ç ã o d e

 cunho jurídico-constitucional quanto

  a

 necessidade

  por

remédios  e  movimentos contrários.

1 . 0

  desenvolvimento

 de

 cunho jurídico-constitucional

 c o n -

duziu, para várias questões importantes

  d o

  estado

  d e

  exceção

e d o  direito  d e  baixar decretos  d e  emergência,  a  resultados

que , na

  prática

  dos

  governos,

  e m

  decisões

  d e

  supremos tribu-

nais

  e

  também

  na

  literatura específica,

  s ã o

  aceitos

  e

  reconhe-

cidos  a  ponto  de se te r que  partir deles como componente  d e

nosso atual direito constitucional.

  A

 interpretação

 d o

  artigo

 4 8

da  Constituição  d o  Reich contém, todavia,  u m a  série  d e  ques-

tões jurídicas especialmente difíceis, mais precisamente

  c o n -

forme  a  situação  d o  caso,  se  existe  o u n ã o u m a  considerável

ameaça  d a  ordem  e  segurança públicas  n o  Reich  - a  decisão

d a

  questão

  se de

  fato está

  o u n ã o

  dado

  o

  pressuposto para

  o s

poderes extraordinários,

  é,

  naturalmente, assunto

  de um go-

verno consciente

  de

  seus deveres

  - m a s ,

  sobretudo, para

  o

problema jurídico-constitucional

  d o

  conteúdo

  d o s

  poderes

  e

autorizações  d o  presidente  d o  Reich contidos  n o  artigo  48 ,

11

  A  r e s p e i t o , K O E L L R E U T T E R ,  O .  Der  deutsche Siaat  ais

Bundesslaat

  und ais

  Parteienstaat  (Recht

  u n d

  Staat, Heft

  5 1 ) ,

Tiibingen  1927 , p .  31-32.

SEGUNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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R E M É D I O S

  Q

  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

121

§ 2

o

. A s

  divergências

  d e

  opinião explicam-se, naturalmente,

primeiramente  a  partir  da  diversidade  d o s  interesses  e concep-

ções político-partidários que não nos cabe aqui discutir mais. A

isso  se  acresce  o  fato  de que , justamente  n o  "estado  d e  exce-

ç ã o " ,  termos  e  divisas  d o direito público  d a  monarquia consti-

tucional continuam a produzir efeitos por muito tempo e pertur-

b a m o s

 conceitos

 e

 pontos

  d e

 vista

 de u m

 direito constitucional

republicano, principalmente quando ainda surge  o  fato  de se

justificar  os  poderes  d o  presidente  d o  Reich  c o m a  palavra

"ditadura".

  P o r f i m ,

 muitas vezes

  não se

  observa

  que a s

 deter-

minações

  d o

  artigo

  48, § 2

o

, são

  pensadas pela assembléia

  n a -

cional legislativa como  um provisório  redigido d e form a inten-

cionalmente ampla,

  ao

  qual somente

  a  lei de  execução  a ser

promulgada segundo

 o

 artigo

 48, § 5

o

, dá su a

 limitação definiti-

v a mais precisa. Até lá , a interpretação jurídica, fora as dificul-

dades gerais  d e  toda questão  d e  alta política,  t e m  ainda  que

observar

  as

  particularidades resultantes

  d a

  provisoriedade

  que

se

 prolongou

  p o r

  muitos anos.

M a s ,  apesar dessa dificuldade  e  perturbação totalmente

extraordinárias, pode-se constatar

  q u e u m a

  praxe

  q u e

  conta

agora  c o m d e z  anos, desenvolveu, juntamente  c o m u m a

abrangente literatura específica, alguns preceitos sobre  a in-

terpretação  d o  artigo  48, § 2

o

,  pelos quais  não se  pode mais

negar,

  e m u m a

  consideração imparcial,

  a

  imposição

  de seu re-

conhecimento geral. Isso

  é

  válido, pelo menos, para

  os

  dois

pontos seguintes:

a) O

  poder

  d o

  presidente

  d o

  Reich

  e m

 promulgar

 decretos

substitutivos  de  leis  segundo  o  artigo  48, §2°.

A a té  então abrangente praxe  d e decretos jurídicos  do a r-

tigo

  48 , §§ 2

o

 e 4

o

, nã o

 necessita

  d e

 mais provas, basta lembrar

d o s  panoramas apresentados  po r  Poetzsch-Heffter (Jahrbuch

des  ojfentlichen Rechts

,

  vol. 13, 1925, p.

  141-157;

  vol. 17,

1929, p .

  99-101).

  O

 tribunal

  d o

  Reich homologou plenamente

essa praxe

  e

  tratou

  o

  presidente

  d o

  Reich, para tanto, como

legislador  n o  sentido  d a  "ressalva  da le i " ; por  exemplSo,  Ju-

risprudência penal  do  Reich  56, 115  (poder para decretos

jurídicos, especialmente dispositivos penais); igualmente,  56,

SECUNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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1 7 2 .

Q  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

163; 56 , 188 ("uma

  espécie

  d e

  direito

  d o

  presidente

  d o

  Reich

d e

  baixar decretos

  d e

  emergência");

  56 . 420 ("não se

  pode

duvidar"

  d o

  direito

  d e

  baixar decretos jurídicos);

  57 , 384; 58 ,

2 6 9 (decretos segundo o artigo 48, § 2

o

, são "indubitavelmente"

disposições legais no sentido d o s artigos 105,151,  152 da Cons-

tituição  d o Reich);  58 , 360 (nenhum direito  d e exame p o r parte

d o

  juiz para condições

  e

 duração

  d o s

 decretos);

  m as , em

  espe-

cial, 59,41: "Pois

  a

 alteração

 d o s

 dispositivos penais conforme

tipo delitivo

  o u

  margem entre

  a s

  penas máxima

  e

  mínima

cominadas  a o  delito recai  n a  área  d o  poder legislativo  e  fica,

portanto  ( ), como este  e m  geral  ( ) , por  conta d o presidente  d o

Reich p o r meio d o artigo 48, § 2

o

, d a Constituição d o Reich  sob

a

  condição

  lá

  apresentada

  e

  para

  o

  objetivo

  lá

  designado."

Ademais,

  Jurisprudência civil

  do

  Reich

  123, 40 9  (semelhan-

ça com o

  direito

  de

  baixar decretos

  d e

  emergência);

  ou

  corte

d e  finanças d o Reich  17, p. 73. Na literatura específica,  a dou-

trina predominante  fo i formulada pelo comentário d e Anschiitz

(p . 25 0) d a seguinte maneira: "Estes decretos (pelo artigo  48, §

podem tudo prescrever  ou proibir, para  o que é necessária  e

suficiente

 u m a le i

 ordinária

  d o

 Reich

  e não de

 emenda

  à

 Cons-

tituição," Analogamente, Poetzsch-Heffter,

 Kommentar

,

  p. 23 7;

Giese,

  Kommentar

,  8

a

  ed., p. 138.

Consoante isso.  n o  artigo  48, § 2°, além  d o s  demais pode-

re s extraordinários, está e m  todo caso  também  contido  o poder

d e  promulgar decretos jurídicos  c o m  força  de le i nos  moldes

dessa determinação constitucional . Pode-se aqui primeiramente

deixar

  em

  suspenso

  se

  esse poder estava dado pelo artigo

  4 8

desde

 o

 início (como suposto pela doutrina dominante

 n a

 teoria

e n a

  prática)

  ou se ele só foi

  acrescentado mediante

  o

  desen-

volvimento  d o s  últimos  10  anos.  U m a  outra questão  é a té que

ponto esse direito de baixar decretos pode  se r quali ficado como

direito

  de

  baixar decretos

  d e

  emergência.

  E m u m

  sentido

  g e-

ral ,

  pode-se qualificar todo decreto publicado

  c o m

  base

  e m

poderes extraordinários como decreto

  d e

  emergência

  e ,

  nesse

significado, conceber todos os decretos d o presidente d o Reich,

publicados segundo o artigo 48, § 2

o

, como decretos d e emergên-

•  SEC UNDA PARTE  - A  C O N C R ETA S I TU A Ç Ã O C O N S TI TU C I O N A L.

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

c ia . Em um

  sentido mais estrito

 e

  específico,

 em

 contrapartida,

o

 direito constitucional

  da

 monarquia constitucional

  só

 admitiu

o

  decreto

  d e

  emergência para

  o

  caso, desenvolvendo-o para

u m a  típica normalização,  d e o  parlamento  n ã o  estar reunido.

12

S e  forem publicados decretos  d e  emergência pelo presidente

d o Reich  em ta l  situação, poderemos então falar, em um  senti-

d o

 mais estrito,

  d e

  decretos

  d e

 emergência. Ambos

  os

  tipos

  de

decretos podem

  ser

 diferenciados eles

  t ê m

  também muitos

  tra-

ços em  comum  e o  poder para  s u a  promulgação recai  sob o

amplo conceito  d o s  poderes extraordinários.

b ) O

  desenvolvimento

  de um

  Estado

  d e

  emergência

  e de

exceção  especificamente econômico  e  financeiro.  Tanto  a

praxe  d o  artigo  48, § 2

o

, d a  Constituição  d o  Reich quanto,  e m

especial, aquela

  d o

  artigo

  55 da

  Constituição prussiana reco-

nheceu como admissível,  sob a  pressão  d o  caráter essencial-

mente econômico  e  financeiro  d e  atuais situações  d e  emer-

gência,

 a

 aplicação

 d o s

 poderes extraordinár ios sobre situações

d e emergência  e perigos  d e cunho econômico  e  financeiro. O s

resultados  d a praxe  d o artigo  55 da Const ituição prussiana  po-

d e m , s e m

  problemas,

  ser

  transferidos, nesse aspecto,

  a o

 artigo

48 da  Constituição  d o  Reich,  n ã o  importando  o  tamanho  que

possa  ter ,  ademais,  a  diversidade  d e  ambas  a s  disposições

12

  U m a

  notável

  e

  clara contradição reina hoje entre

  a

  concepção

d o  conceito  d e  "estar reunido"  n o  Reich (artigo  24 da  Constituição

d o

  Reich)

  e a da

  Prússia (artigo

  5 5 d a

  Constituição prussiana);

c f . a  respeito  m e u  artigo  n o  Jornal Jurídico Alemão  de 15 de

outubro

  de 1930 (p . 1285

  et  seq.).

  A

  decisão

  d o

  tribuna

d o

  Estado

d o

  Reich alemão

  de 13 de

 ju lho

  d e 1 9 2 9

  sobre

  o

  direito

  d e

  baixar

decretos  d e  emergência  n a  Prússia (

Jurisprudência civil

  do

  Reich

1 2 5 ,

  anexo,

  p. I ;

  L A M M E R S - S I M O N S

  I I , p . 66 , 69) não se deu

conta dessa questão  d e  direito público. Mesmo  o  tratado  de W.

Jellinek,

  de 6 de

  dezembro

  de 1930 , no

  Diário administrativo  do

Reich,  p . 7 7 9 ,  dirigido contra  m e u  artigo  h á  pouco mencionado,

n ã o  solucionou  a  contradição entre  a  prá t ica  d o  art igo  24 da

Consti tuição

  d o

  Reich

  e a do

  artigo

  5 5 d a

  Constituição prussiana.

E m  todo caso, caso  se  queira abolir  o a té  então conceito (como

t a l  abs o lu t amen te  n ã o  d u v i d o s o )  d e  "es tar reunido" , todo  o

p r o b l e m a

  d o

  atual direi to parlamentar teria

  q u e s e r

  s i s t ema-

ticamente colocado sobre  u m a  nova base.

SEGUNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

constitucionais  e  institutos jurídicos. E m  todo caso,  o artigo  4 8

da  Constituição  d o  Reich contém hoje  também  u m  direito  d e

baixar decretos

  q u e

  preenche

  as

  funções

  de um

  direito

  de bai-

x a r  decretos  d e  emergência. Nesse único aspecto  q u e  interes-

sa  aqui,  u m a  transferência  d o s  pontos  d e  vista  e  argumentos

normativos  não é  apenas admissível,  m a s  injuntiva (também

dessa forma

  Jurisprudência civil

  do

  Reich  123, p . 40 9) .

  Isso

t em um   duplo significado: a condição  para os poderes extraor-

dinários (estado

  d e

  emergência, considerável ameaça

  d a

  segu-

rança

  e

  ordem públicas) pode estar fundamentada

  e m u m a

situação  d e  emergência econômica  e  financeira  o u em u m p e -

rigo  q u e  surge  d e  circunstâncias econômicas  e  financeiras  e o

caráter primeiramente

  só

  econômico

  e

  financeiro

  da

  situação

de  partida  n ã o  exclui  a aplicação  d o s  poderes extraordinários."

Ademais,  d o  conteúdo  dos  poderes extraordinários  f az , t am -

1 J

  S ã o  mui to numerosos  o s  e x e m p l o s  d e  dec re tos  d e  conteúdo

econômico

  e

  financeiro, publicados

  c o m

  base

  n o

  artigo

  4 8 , §  2°.

Pode-se mencionar aqui apenas  o s  decre tos  d e  n o v e m b ro  d e

1 9 2 3  sobre divisas  e o  Rentenmark,  a  moeda  d e  transição alemã,

decreto  de 5 de  novembro  d e 1 9 2 3  (Diário oficial

  do

  Reich  I, p.

1 0 8 2 )

  relativo

  à

  recusa momentânea

  d e

  serviços devido

  à

  cotação

externa  d o

  Reichmark.

  Ademais ,  d o  m e s m o  d i a :  decreto para

complementação  d o  decreto sobre  a  mobil ização  d e  fundos  p o r

m e i o  d e  emprés t imo  e d e  emis são  d e  títulos  d a  dívida pública

(Diário oficial

  do

  Reich

  I . p . 1 0 8 3 ,

  tendo

  q u e s e

  observar

  q u e o

decreto complementado  d e 2 0 d e  outubro  d e 1 9 2 3  fora publicado

c o m   base  na l e i de  plenos poderes; decreto  de 13 de  outubro  d e

1 9 2 3  ( revogação  da l e i de  impostos sobre  o  carvão  d e 2 0 d e

março

  d e 1 9 2 3 ,

  Diário oficial

  do

  Reich

  I , p . 9 4 5 ,

  publ icada

novamente como decreto  c o m  base  na l e i de  plenos poderes  e m

18 de  outubro  d e 1 9 2 3 ,  Diário oficial  do  Reich  I , p . 97 9) ;  decreto

d e 5 d e  abril  d e 1 9 2 4  (

Diário oficial

  do

  Reich

  I , p . 3 9 7 )  sobre

taxas

  d e

  embarque,

  de 10 de

  novembro

  d e 1 9 2 4 .

  (Diário oficial

do

  Reich

  I , p . 73 7)  sobre abrandamentos fiscais economicamente

necessários,  e t c .  Exemplos  d e  decretos econômicos  d o s  governos

d o s  Es tados conforme  o  a r t igo  4 8 , § 4

o

,  estão especialmente

assinalados

  n o

  panorama

  d e

  Poetzsch-Heffter mencionado acima.

A  praxe  d e  decretos  d e  emergência  d o  governo prussiano segundo

o  artigo  5 5 d a  Constituição  d a  Prússia perseverou,  s o b  constante

aprovação  d o  tribunal  d o  Estado (decisões  d e 2 1 d e  novembro

d e 1 9 2 5 ,

  Jurisprudência civil

  do

  Reich

  1 1 2 ,

  anexo,

  p . 10; de 23

SEGUNDA PARTE

  - A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

125

b é m ,  parte  o direito  d e publicar decretos  d e  conteúdo  e  caráter

econômico  e financeiro, substitutivos  d e  leis.

14

Ambos  o s  resultados  -  direito  d e  baixar decretos subs-

titutivos  d e leis pelo presidente  d o Reich conforme o artigo 48 ,

§ 2°,

  e o caráter (admissivelmente também) econômico  e finan-

ceiro

  d o

  estado

  d e

  exceção

  e dos

  poderes

  d o

  estado

  d e

  exce-

ção -  baseiam-se  e m u m a  interpretação  d o  artigo  48 que se

impôs  e m u m a evolução  d o direito po r 10 anos e qu e faz justiça

às

  particularidades concretas

  d a

  situação

  d e

  emergência

  d e

u m

  Estado

  e m

  apuros financeiros, tributário

  e que, ao

  mesmo

tempo, toma  a seu  cargo prestações sociais. Embora sejam

ainda possíveis

  e

  existentes muitas divergências

  d e

  opinião

  e

litígios interpretativos n o tocante àquela difícil disposição cons-

titucional, j á há um a praxe inequívoca para ambos os resultados

citados.  N ã o é  necessário tratar  d a s  controvérsias  e  distinções

teóricas sobre direito consuetudinário , mudança constitucional,

evolução constitucional,  e t c . ,  para poder fazer  a  simples

constatação  de que  aqui existe  h á  anos  u m  constante exercício

suportado  por uma  rígida convicção jurídica.  E le deu ao

provisório

  d o

  artigo

  48 , o

 qual perdura

  até a lei de

  execução

  a

ser  publicada consoante  o  artigo  5, seu  conteúdo  a ser  obser-

vado conforme

  o

  direito positivo. Para tanto, quatro fatores

cooperaram:

  1. a

  concepção

  d o

  artigo

  48, § 2

o

,

  dominante

  n a

teoria  do  direito público,  a qual equipara o presidente d o Reich,

nesse aspecto,

  ao

  "legislador ordinário

  d o

 Reich";

  2. os

 nume-

rosos

 precedentes  da

  praxe

  d o

  govemo

  d o

  Reich, desde

  que

se  trate  d o  caráter substitutivo  d e  leis  d o s  decretos  e -  essen-

d e  março  d e 1 9 2 9 ,  Jurisprudência civil  do  Reich  1 2 9 ,  anexo,  p .

19; de 13 de

  ju lho

  d e 1 9 2 9 ,

  Jurisprudência civil  do  Reich

  125,

anexo,  p. 7) ,  também Estados  d e  emergência urgentes  e  incomuns

d e

  cunho financeiro

  n o

  Estado

  e a té

  mesmo

  e m

  suas associações

autônomas just if icam  a  promulgação  d e  decretos  d e  emergência.

14

  Dessa forma,  o s  decretos mencionados anteriormente conforme

o

  artigo

  48 , § 2

o

, e ,

  especialmente,

  o

  decreto

  d e

  emergência

  d o

governo prussiano  de 8 de  maio  d e 1 9 2 9 ,  sobre  a  regulamentação

d o  imposto industrial para  o  exercício contábil  d e 1 9 2 9 ,  aprovado

n a  decisão  de 13 de  ju lho  d e 1 9 2 9 d o  tribunal  d o  Estado,

  op. cit.

SEGUNDA PARTE

  - A

  CO N CRE T A SI T U A ÇÃ O CO N ST I T U ClO N A l . . . .

  •

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1 7 6

O   G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

cialmente colaborando

  - a

  praxe

  d e

  decretos

  d e

  emergência

d o  governo prussiano, desde  que se  trate  d a  realização  de po-

deres  d e  exceção, econômicos  e  financeiros, devendo  se ob-

servar

  que o

  efeito

  de um

  precedente

  n o

  direito público

  que

permanece íncontradíto costuma  se r  mais forte  e  mais decisi-

vo do que n o

 direito privado,

  mas o

 precedente

  n o

 direito cons-

titucional

  e n o

 direito internacional pode

  t e r um a

 força,

 por sua

vez ,  especialmente intensa;  3. as  numerosas decisões prelimi-

nares, nesse aspecto, totalmente claras  e  seguras,  d o  tribunal

d o  Reich,  d a  corte  d e  finanças  d o  Reich,  d e  todos  o s  outros

supremos tribunais, sobretudo

 d o

 tribunal

 d o

 Estado para

 o

 Reich

alemão,

  as

  quais homologaram tanto

  o

 caráter econômico

  dos

poderes  d e  exceção quanto  o poder  d o governo  d e recorrer,  n o

caso

  de um

  parlamento incapaz

  d e

 atingir maioria

  ou de

  traba-

lhar,  aos  poderes extraordinários (decisão  de 13 de  julho  d e

1929 ,  Jurisprudência civil  do  Reich  125,  anexo,  p. 8); 4. o

reconhecimento  daquela praxe  p o r  meio  d o  comportamento

d o parlamento  do  Reich,  o  qual  n ã o  exigiu  a  revogação  dos

decretos substitutivos

 d e

 leis publicados segundo

  o

 artigo

 48, §

2

o

, em que

  está contida, pelo menos,

  u m a

  anuência

  a sua

 vali-

dade jurídico-constitucional.

JS

15

  N a

  teor ia

  d o

  d i r e i to cons t i tuc iona l ,

  a

  eq u ip a r ação

  d o

  poder

extraordinário e m  tomar medidas  c o m u m  direito  d e baixa r decretos

s u b s t i t u t i v o s

  d e

  le is

  p o r

  p a r t e

  d o

  p r e s i d e n t e

  d o

  R e i c h

  f o i

f reqüentemente contes tada, especia lmente  p o r  Erwin Jacobi  e

p o r m i m , n a  exposição sobre  a  ditadura  d o  presidente  d o  Reich

d u r an te  a  con fe rênc ia  d e  p r o f e s s o r e s  d e  d i r e i to púb l ico  e m

1 9 2 4  (Verõffentlichungen  der  Vereinigung Deutscher Staats-

rechtslehrer,

  vo l . 1 , 19 24 , p . 99 ,  110/111); ademais, mesmo  se

c o m  outra fundamentação  a té  mesmo contraditória,  p o r  GRAU,

R .  Die  Diktatur  des  Reichsp.rasidenten,  1923 , p .

  102-103, assim

c o m o  n o  es tudo "Poder d i ta tor ia l  e  Co n s t i t u i ção  d o  Re ich"

('Gedachtnisschriftfür Seckel

, Berlin,

  1 9 2 7 , p . 4 9 0 ) . A t é q u e

  ponto

o s  decretos jurídicos  d o  presidente  d o  Reich  d e 2 6 d e  ju lho  e de

I

o

  d e

  dezembro

  d e 1 9 3 0

  (

Diário oficial  do  Reich  I , p . 3 1 1 e p.

5 1 7 )  seriam admissíveis quanto  a seu  conteúdo,  é u m a  questão

em s i que , em

  larga escala, poderia

  s e r

 respondida afirmativam ente,

porque , afinal, toda apli cação da lei e  todo poder executivo decorrem

p o r  m e io  d e  med idas . D ian te  d a  evo lução  d o  d ire i to  q u e s e

SEGUNDA PARTE

  - A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

122

2 .  Para  a  relação  d a s

  determinações constitucionais

  de

direito financeiro  c o m o s  poderes extraordinários  d o  presi-

processou nesse ín ter im,  a  con t rovér s ia es tá ,  e m  todo caso,

resolvida, contanto

  q u e o

  direito

  d e

  baixar decretos substitutivos

d e  leis  p o r  parte  d o  presidente  d o  Reich ,  s e  rião estava contido

n o

  poder

  e m

  decretar medidas,  doravante,

  se

  junte

  a ele.  D e

r es to ,  a  controvérs ia sobre  a s  p r o p o r çõ es  d a  au to r ização  d o

artigo  48 , §  2°,  alínea  1, permanece  e m  aberto, pois  n a  constatação

d e q u e o  presidente  d o  Reich  t e m ,  hoje, indubitavelmente aquele

direito  d e  baixar decretos,  n ã o  reside nenhuma restrição  a seu

poder fundado  n o  artigo  4 8 , §

  2

a

,

  alínea  1 , em  tomar medidas

necessárias, tampouco reside  n a  limitação natural  d o  direito  d e

baixar decretos substi tutivos

  d e

  leis

  a

  leis ordinárias

  ( n ã o d e

emenda

  à

  Constituição)

  u m a

  restrição

  d o

  poder

  e m

  tomar medidas

necessárias  n o  sentido  d e q u e  toda determinação constitucional,

e m  par t icu lar , sobre medidas para pro teção  d a  Cons t i tu ição

constituiria  u m  obstáculo intransponível, assim,  n ã o s e  encontra

a í  nenhum reconhecimento  d a s  opiniões doutrinárias teóricas,

a s  quais declaram cada  u m a d a s  numerosas particularidades  d a

l e i

  constitucional como sendo mais importante

  d o q u e a

  própria

Co n s t i t u i ção .

  A

  d iferenciação en tre decretos ju r íd icos subs-

t i tu t ivos

  d e

  leis

  e

  med idas con t inua

  a

  ex is t i r , mantendo

  s e u

significado (para  o  caso  d e q u e , p o r  desconhecimento  d a  essência

d e u m a  garantia insti tucional,  a  redução salar ial ordenada  v i a

decreto substitutivo  de le i  fosse declarada inadmissível, ter-se-

i a q u e  considerar admissível, como  medida,  a  ordem dada  à s

caixas públicas para pagar,  s e m  prejuízo  d o s  direitos legítimos

d o s  funcionár ios ,  u m a  parte  d o  salário),  o  poder  d o  presidente

d o

  Re ich

  e m

  tomar todas

  a s

  medidas necessár ias cont inua

  a

existir ,

  e m s u a

  plena escala constitucional,  junto

  a o

  direito

  d e

baixar decretos substitutivos

  d e

  leis,

  a té que a le i de

  execução

tenha estabelecido  u m a  regulamentação mais detalhada.  A  recusa

d o  direito  d e  baixar decretos substitutivos  d e  leis poderia apoiar-

se ,  sobretudo,  n o  caráter provisório  d a  regulamentação  d o  artigo

4 8 , § 2

o

, e na  n ece s s id ad e  d e  p roduz i r ,  p o r  meio  da l e i de

execução prevista  n o  ar t igo  5 , u m a  regulamentação def in i t iva

d o

  estado

  d e

  ex ceção

  e , a í ,

  também autorizações para decretos

ju r íd icos

  e m

  cur t íss imo tempo.

  N a

  mesma medida

  e m q u e f o i

cont inuada

  a

  praxe

  d o

  ar t igo

  4 8 , §  2°,  e m q u e n ã o s e

  realizou

a lei de  ex ecu ção  e , c o m  isso,  a  determinação const i tucional

desist ia,  a  cada  d i a  mais,  d e s e u  caráter provisório, tornou-se

necessá r io inc lu i r  u m  au tên t ico d i r e i to  d e  ba ixar decre tos

subst i tu t ivos  d e  leis  n o s  poderes ex traord inár ios  d o  presidente

d o  Reich, embora,  d e  resto, enquanto  a lei de  execução  n ã o f o r

SEGUNDA PARTn

  - A

  C ONC R ETA S ITUAÇ ÃO C ONS TITUC IONAL. . .

  «

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dente

  d o

 Reich, conclui-se

  q u e

 decretos

  c om

  base

  n o s

  poderes

extraordinários

  são

  admissíveis também

  c o m

  conteúdo

  de di -

reito financeiro, desde

  que , de

  resto, respeitem

 os

  limites cons-

titucionais

  d o s

  poderes extraordinários.

  M a s

  importa saber

  se

a  ressalva  de  direito financeiro  da lei  -  para impostos  e

taxas, artigo

  134 da

 Constituição

 do

 Reich, para

 le i

 orçamentária,

artigo  85 da Constituição d o Reich, para autorizações  d e crédi-

to e prestações  d e  caução, artigo  87 da Constituição  d o  Reich

- é cumprida  por um  decreto substitutivo  de lei com  base  nos

poderes extraordinários  d o  artigo  48 ou se  essa ressalva  d e

direito financeiro

  da lei é a

  ressalva

  de uma le i formal.

A

  concepção

  d o

  artigo

  48, § 2

o

,

  dominante

  n a

  literatura

específica corresponde

  o

  fato

  de se

  equiparar,

  d e

  forma

  b e m

generalizada,

  os

  poderes extraordinários

  e m

  baixar decretos

p o r parte  d o presidente  d o  Reich  a o poder  e m criar leis ordiná-

rias  (cf. a formulação do comentário  d e Anschütz, comunicada

acima). Destarte,  n ã o  poderia  ser para  e la  duvidoso  que a res -

salva  d e  direito financeiro  da le i ,  nada diferente  d a  ressalva

normal

  da lei no

 caso

  d o s

 direitos fundamentai s

 e d e

 liberdade,

possa também

  ser

  preenchida

  por um

  decreto consoante

  o ar-

tigo

 48, § 2

o

. N o que

  tange

  à

 prática

  de a té

 então,

  e la não vê de

forma alguma,

 n a

 ressalva

 d e

  direito financeiro

  da lei, a

 ressal-

va de uma le i formal.  A

 imposição

  d e

 impostos

  e

  taxas,

  a

  fixa-

ç ã o da s

  taxas aduaneiras

  e

  outras normalizações

  de

  direito

  fi-

nanceiro,  h á  muito tempo,  n ã o  estão mais hoje restritas  a  leis

n o  sentido formal, existe, aqui,  u m a  antiga praxe  d e  decretos

q u e n ã o necessita de outra comprovação  e cuja validade jurídi -

c a nã o  pode  ser seriamente contestada. Contudo,  o  artigo  2 do

código fiscal

  do

  Reich determina expressamente

  q u e

  le i

  n o

sentido

  d o

  código fiscal

 do

  Reich,

  é

 qualquer norma jurídica.

M a s

  também para autorizações

  d e

  despesas, assim como para

autorizações

  d e

  crédito

  e

  prestação

  d e

  fiança,

  a

  praxe

  d o g o -

verno

 d o

 Reich tomou,

  sem

 oposição,

  o

 ponto

 d e

 vista

  de que a

publicada, cont inua

  o

  caráter provisório

  d a

  r egu lamen tação

  e

tenha  q u e  continuar  a se  impor.

«  SEGU NDA PARTE  - A  CO N CRE T A S I T U A ÇÃ O CO N S T I T U CI O N A L . . .

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

1 7 9

ressalva

  d e

  direito financeiro

  da le i não

  exige

  uma le i

  formal,

podendo

  se r

 preenchida

  por um

  decreto substitutivo

  d e

  lei.

16

S e fo r u m a v e z  reconhecido  q u e o  presidente  d o  Reich

pode promulgar decretos substitutivos d e leis, consoante  o arti-

go 4 8, § 2

o

, e se,

 ademais,

 fo r

 admitido

 q u e

 decretos substitutivos

d e  leis sejam também admissíveis  n a área d o direito financeiro

e tributário, então decretos substitutivos d e leis n ã o podem mais,

c o m   base  n o  artigo  48, § 2

o

,  serem inadmissíveis para  o plano

orçamentário  e as  autorizações  d e  crédito  e  prestação  d e  fian-

ç a ,

  porque

  o que

  para impostos

  e

  taxas

  é

  licito,

  n ão

  pode

  ser

ilícito para outros procedimentos

 de

 direito financeiro, haja vista

q u e  a  ressalva  de  direito financeiro  da lei só  pode  ser  apre-

ciada  de  forma uniforme.

  Todo

  o

  sistema financeiro estatal,

desde

  q u e

 efetuadas separações

  e

 isolamentos,

 n ã o

  exatamente

delineados,  d e  determinadas áreas  e  patrimônios  -  como para

o  banco  d o  Reich,  a  ferrovia  d o  Reich  ou  para  os  correios  e

telégrafos

  d o

  Reich como empresa autônoma

  - é

  dominado

pelo princípio

  da

 unidade

  e

  totalidade.

  O

  fato

 de qu e ,

 para

  e m -

préstimo,  h á  necessidade  de uma le i de  finanças autorizadora

d e  crédito,  é  justificado  e m  virtude  de os  empréstimos terem

u m a  repercussão  n o  sistema fiscal  (G .  Jèze,

  AUg.

  Theorie

  des

lf i

  Ass im  o  decre to  d o  governo  d o  Re ich  d e 2 0 d e  se tembro  d e

1 9 2 3

  (Diário oficial  do  Reich

  I , p . 38 6) ,

  assinado

  p o r

  Hilferding,

minis t ro  d a s  f inanças  d o  Reich, cuja validade jurídica  n ã o f o i

colocada  e m  dúvida, sobre aumento  d a  autorização  d e  crédito,

publicado

  c o m

  base

  n o

  artigo

  6

o

, § I

o

, n . 2 , da lei de

  emergência

d e 2 4 d e  fevereiro  d e 1 9 2 3  (Diário oficial  do  Reich  I , p . 147 ) . E le

acrescenta,

  c o m

  referência

  à

  autorização muito geral

  da le i de

emergência ,  a  autorização  d e  crédito  de 14 de  agos to  d e 1 9 2 3

(Diário oficial  do  Reich

  I I , p . 329 )

  prevista

  na le i ,

  sobre

  a

  fixação

d e u m   segundo adendo  a o  plano orçamentário  d o  Reich para  o

exercício contábil

  d o a n o d e 1 9 2 3 ,

  acrescenta

  a

  quantia corres-

pondente  à s  recei tas  d o  orçamento ex t raord inár io , aumenta  a

autorização concedida  a o  ministro  d a s  finanças  e m  emitir títulos

d a

  dívida pública

  c o m o

  objet ivo

  d e

  fortalecer temporariamente

o s  recursos ordinários  d o  caixa principal  d o  Reich  e  determina,

p o r f i m , q u e a s

  autorizações concedidas

  p o r

  meio desse decreto

s ó cessam  d e vigorar quando tiverem sido confe ridas  v ia  legislação

ordinária.

SEGUNDA PARTK  - A  CO N CRE T A SI T U A ÇÃ O CO N ST I T U CI O N A L

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1 8 0

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

Budgets,  Tübingen,  1927 , p. 93), o primário é , assim, a lei fiscal

e não a lei de  empréstimos.  A  estreita relação  d e  todas  as re-

ceitas  e  despesas  d o Estado  f e z valer  e ser  reconhecido  o prin-

cípio

  da

  unidade financeira justamente

  n o

  embate constitucio-

nal do

 direito orçamentário

  d o

  século

  X I X e

  declarou todas

  a s

tentativas de uma diferenciação partindo d o governo monárquico

(p.ex., as  tentativas  em se separar, e m Estados d o tipo orçamen-

tário bávaro-saxão, concessão

 d e

 impostos

 e

 direito orçamentá-

rio)

  inexequíveis

  e

  insustentáveis. Mesmo hoje

  a

  quase

  que

universalmente reconhecida interpretação

  d o

  artigo

  73, § 4

o

,

da  Constituição  do Reich (inadmissibilidade d e  todas  a s vonta-

des do povo relativas  às leis monetárias),  fo i decisivo  o princí-

pio da

  unidade

  d e

  todo

  o

  plano orçamentário estatal.

  P o r con -

seguinte,

  n ã o é

  possível fazer ressalvas legais

  n o

  direito

financeiro

  e

  para

  o

  plano orçamentário

  e as

  autorizações

  d o

artigo  87  fazer  u m a  ressalva quantitativamente diferente  da -

quela essencial  a o  orçamento,  a  saber,  o s  impostos  e as  taxas.

A  dúvida  q u e  poderia conter, quanto  a o  direito formal,  o

cerne

  da

  argumentação jurídica contra decretos substitutivos

d e

 leis

  d e

 finanças, baseia-se

  e m u m a

 consideração

  que , a meu

ver , em  geral,  não é  detalhadamente apresentada.

17

  mas que ,

e m  todo caso, necessita  d e  discussão  e  esclarecimento.  A res -

salva da lei relativa  a o direito financeiro (artigo 85, 87 da Cons-

tituição

  d o

  Reich) diferencia-se,

 d e

 modo especial,

  d a

  ressalva

da lei

  relativa

  a o s

 direitos fundamentais (artigos

  114, 115, etc.

da  Constituição  do Reich). Quando,  n o caso  de um  direito  f u n -

damental  ou de  liberdade, estiverem ressalvadas exceções  e

intervenções ocorridas  " c o m  base  em uma l e i " ,  embora  as ex-

ceções  e  intervenções decorrentes  de um  decreto substitutivo

de lei não se

  baseiem

  em uma l e i

  formal, elas

  se

  baseiam

  -

segundo  a definição  de lei do  liberalismo  d o  século  X I X ,  pela

qual a lei , no sentido material, é u m a  intervenção n a liberdade e

17

  GRAU.

  Op.

  d / . ;  NAWIASKY.

  AõR.

  N. F. 9 , p . 5 3 ;  LUKAS,  J .

Vereinigung deutscher Staatsrechtslehrer,  Heft  6 , 1 9 2 9 , p . 4 6 ;

HENSEL,

  A . DJZ.  3 5

  (1930).

  p . 1 0 5 8 .

«

  SEG UNDA PARTE

  - A

  C O N C R ETA S I TU A Ç Ã O C O N S TI TU C I O N A L. . .

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

na propriedade — pelo menos  em u m a le i no  sentido material, já

que o

  decreto intervém

  n a

  liberdade

  e n a

  propriedade. Logo,

em ta l definição da lei , existe,  se não uma le i  formal, u m a m a -

terial  e, de  algum modo, está satisfeita  a  ressalva  da lei. Dife-

rentemente  é o  caso  d a  ressalva  da lei no  tocante  ao  direito

financeiro.

  N a

  verdade, leis fiscais

  e

  tributárias valem hoje,

igualmente, como leis  n o  sentido material, embora essa  c o n -

cepção

  só

 tenha

  se

 imposto

  n o

  século

 X I X ,

  mais precisamente

e m  conseqüência  d o  direito orçamentário constitucional,

destarte, para  e la não  existiria nenhuma particularidade.  E m

contrapartida,

  a

 concessão

  d o

  plano orçamentário

  c o m

  autori-

zações  d e  despesas  o u a  outorga  d e u m a  autorização para  to-

madas  d e  empréstimo  o u  prestações  d e  caução  não é ,  pela

concepção dominante,  lei no  sentido material,  e , s im, um ato

administrativo  n o campo  d o  sistema financeiro. M a s  enquanto

n o

 caso daquelas intervenções

  e m u m

  direito fundamental,

 de-

correntes  d e u m  decreto,  é  satisfeita  a ressalva  da le i por  meio

de uma le i no

  sentido material,

  n o

  caso

  d e u m a

  fixação orça-

mentária decorrente  d e u m  decreto  ou  autorização  d e  conces-

são de

  crédito

  e d e

 prestação

  d e

  fiança (aliás, pela concepção

original também  n o  caso  d e  arrecadação  d e  impostos  e  taxas),

n ã o  existiria  n e m u m a l e i  formal  n e m u m a material, portanto,

nenhuma

  lei ,

  então,

  a

  ressalva

  da lei não

  estaria

  d e

  modo

  a l-

g u m

  satisfeita

  e o ato

  cairia

  n o

  vazio. Dessa forma,

  a

 ressalva

legal  d e direito financeiro, diferentemente da  ressalva legal  d e

direito fundamental, surge como

  u m a

  ressalva

  d e

  especial

  ri-

g o r  formal.  E la  torna-se  a  ressalva absolutamente formal  q u e

exclui todo decreto  e  autorização  e que só  pode  se r  satisfeita

por uma le i

 formal.

Porém, esse raciocínio desconhece

  o

  sentido constitucio-

nal da  diferenciação entre  le i  material  e  formal, como, aliás,

também  o d o  duplo conceito material  de lei, o qual define a lei

o ra

  como regra jurídica geral,

  o ra

  como intervenção

  na

  liber-

dade  e n a  propriedade. Mais  à  frente, entraremos  e m  maiores

detalhes sobre  o  significado constitucional  d o  conceito  de lei.

E m  todo caso,  a  diversidade  d a  ressalva  d e  direito financeiro

SEGUNDA PARTE  - A  CO N CRE T A SI T U A ÇÃ O CO N ST I T U CI O N A L . . .  •

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1 8 2

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

não é tão  grande como parece consoante aquela argumenta-

ção ,  pois trata-se,  em  ambos  os casos,  d e proteção  da  proprie-

dade,

  m a s ,

  além disso, tanto

  n o

  caso

  d a

  ressalva

  d e

  direito

fundamental quanto naquela

  d e

  direito financeiro, trata-se

  d e

u m a  regulamentação d e competência  d e caráter organizacional

e a ressalva  de uma lei de  direito financeiro  n ã o  contém mais

do que ta l

  determinação organizacional. Seria evidentemente

incorreto considerar toda regulamentação d e competência, como

tal ,  como "absolutamente formal"  e  explicar  a  partir dela  que

e la

 exclui toda outra

 v ia

 também admissível constitucionalmente.

Isso,

  e m

  todo caso,

  não é

  acertado segundo

  a

  vigente Consti-

tuição  d o Reich. A regulamentação  d e  competência  d o artigo  68

da

  Constituição

  d o

  Reich,

  e.g.  (as

  leis

  do

  Reich

  são

  deliberadas

pelo parlamento

 do

 Reich), também traz

 em s i

 caráter organizacional

e, apesar disso, n ão exclui decretos jurídicos c o m base em um a le i

de

 plenos poderes,

  n em

 aqueles segundo

  o

 artigo

 48, § 2

o

.

Excetuando-se isso, aquele raciocínio contém  u m  notável

ponto

  d e

 vista relativo

  a o

 Estado

  d e

  direito,

  ao

  fazer

 u m a

  dife-

renciação fundamental entre puras medidas

  e

  atos jurídicos.

Contudo,  a  interpretação hoje dominante  d o  artigo  48, § 2

o

,

recusou  a  diferenciação entre medidas  e atos jurídicos  e equi-

parou

  o

 presidente

  d o

  Reich, para

  o

 artigo

  48, § 2°,  a o

  legisla-

d o r  ordinário. Defendi, juntamente  c o m  Erwin Jacobi,  a  dife-

renciação entre medidas  e atos jurídicos  e  tentei fazê-la valer

perante

  a

  doutrina dominante. Ainda insisto hoje

  na

  exatidão

teórica  d a diferenciação  e sou da opinião  de que a diversidade

entre decretos substitutivos  d e  leis  e  medidas também  se faz

valer

  n a

  atual praxe

  d o

  artigo

  48 (cf .

  nota anterior).

  Mas a

resistência  d e opiniões doutrinárias relativas justamente  ao di -

reito público  fo i naquela época  tão violenta, que a não-diferen-

ciação teórica

  se

  impôs como doutrina dominante. Assim,

  n a

formação d o reconhecimento, hoje existente, d o direito em bai -

xa r  decretos substitutivos  d e  leis, essa teoria concorreu  não só

de

 forma incentivadora,

  e la

 acabou, verdadeiramente,

  por pos-

sibilitar

 o

 exercício

  de um

 direito, pois

  e la

  forneceu

 o

 erro

  t eó-

rico-jurídico típico  e  indispensável para  o  surgimento  d e  tais

formações jurídicas,  s em o  qual teria faltado  u m a  convicção

.  SEG UND A PARTE  - A  C ONC R ETA S ITUAÇ ÃO C ONS TITUC IONAL. . .

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R E M É D I O S

  E

  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

jurídica  que se junta  a o  mero exercício  e  praxe. Como acerta-

damente  d iz  Richard Thoma  Der  Vorbehali  des  Cesetzes,

Festgabe

  f ü r O .

  Mayer,

  1916, p . 213) ,

  justamente

  no

  direito

público constitui-se  e m " u m  fenômeno  b e m  usual"  o  fato  de

q u e " o

 erro

 se

 torna

 o pai de um

 direito consuetudinário". Como

mostrado acima, tem-se

 q u e

 aceitar, hoje, com o direito positivo

do artigo 48 , § 2

o

, qu e as ordens  d o presidente d o Reich podem

ser

  decretos substitutivos

  d e

  leis, pois,

  c o m

  isso, eles contêm

caráter jurídico diretamente  c o m  base  e m u m a  determinação

constitucional,

  e m q u e

  eles

  sã o

  equiparados

  à lei e

  param

  d e

se r  medidos  n o  sentido específico  d o  termo,  o s  quais, como

tais,

  n ã o

  poderiam, naturalmente, satisfazer

  a

  ressalva

  da lei .

Agora caiu  a  limitação  d o s direitos extraordinários contida  n o

fato

  d e

  estarem restritos

  a

  medidas. Seria inútil

  se a

  doutrina

dominante quisesse tentar agora anular  a forma ção jurídica que ,

nesse ínterim,

  se

 consumou

  p o r

 intermédio dela,

  t ã o

 logo reco-

nheça,  a  posteriori,  o s  efeitos  e  conseqüências advindos  d e

seu

 erro teórico.

  Mas e l a

 também

  não tem

 mais

  a

 possibilidade

d e fazer valer, perante o decreto substitutivo de le i do artigo 48,

§ 2

o

, o

  rigor formal

  d a

 ressalva legal

  d e

 direito financeiro.

3 . U m a

  outra dúvida

  a

  respeito

  d e

  decretos concernentes

à lei

  orçamentária

  e à

  autorização

  d e

  concessão

  d e

  crédito,

segundo  o  artigo  48, § 2

o

, da  Constituição  d o  Reich poderia

talvez

  ser

 extraída

 d o

  fato

 de qu e o

 poder

  d e

 controle

  do

 parla-

mento  -  i.e.,  aqui  o direito d o parlamento  e m  exigir revogação

segundo  o  artigo  48, § 3

o

 -  praticamente  se  tornaria  s e m  valor

se , com

  base

  n o

  decreto,

  se

  fossem efetuados gastos

  ou fe-

chados contratos  d e empréstimo. A exigência  p o r  anulação po r

parte

  do

 parlamento viria, então,

  po r

  demais tarde

  e não

  mais

poderia acabar  c o m o s efeitos e conseqüências jurídicos  e e fe-

tivos daqueles decretos.

M a s

  essa objeção refuta apenas aparentemente

  a

  admis-

sibilidade constitucional daqueles decretos.

  N a

  realidade,

  ela é

acertada,  sem  exceções, para  todos  o s  efeitos  e  conseqüênci-

as

 jurídicos

  e

 efetivos

 d e

  toda aplicação

 d o s

 poderes extraordi-

nários  e ,  destarte, para  o s  decretos  q u e  aqui interessam,  não

tem

  nenhuma força comprobatória especial. Toda medida

  to -

SECUNDA PARTE

  - A

  CO N CRE T A SI T U A ÇÃ O CO N ST I T U CI O N A L . . .

  •

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1 S 4 O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

mada  c o m  base  n o  artigo  48 , por mais cuidadosa  q u e s e m a n -

tenha

  n o

 limite mais estrito

 e

 indubitavelmente admissível

  de s -

se s

  poderes, provoca algum tipo

  d e

 tipo

  d e

 efeito fático

 e t a m -

b é m jurídico.  S ã o  promulgados dispositivos penais  e  tribunais

sã o  instituídos  sem que  sejam consideradas  a s  consequências

d e  prisões, condenações  e  execuções podem sempre  se r anu-

ladas, jornais passam

  a ser

 proibidos

  e, até a

 supressão

  d a

 proi-

bição,  n ã o  podem aparecer,  as  forças armadas  d o  Reich  en -

tram  em  ação  e  provocam destruições  d e  todo tipo, talvez  até

mesmo

  c o m a

  morte

  d e

  pessoas,

  etc. O

  fato

  de que

  tudo isso

n ã o

  mais pode

  se r

  desfeito

  se o

  parlamento

  d o

  Reich exigir

  a

revogação da medida, n ão justifica a conclusão de que a medida

n ã o poderia  ter sido e m absoluto tomada,  ou de qu e e la , apenas

devido

  à

 dificuldade

 ou

  impossibilidade

  de

 eliminar eventuais

conseqüências,

  e ra ,

 desde

  o

 início, inconstitucional. Senão

  se -

riamos levados  a o absurdo resultado de qu e o artigo 48 , § 2

o

, só

admitiria medidas ineficazes e  inoperantes,  o poder extraordi-

nário, como

  o

 tribunal

  d o

 Reich (

Jur isprudência civil  do  Reich

123, 409)

  acertadamente

  d iz ,

  "praticamente

  n ã o

 cumpriria

  seu

objetivo  se tivesse  q u e contar, regularmente,  c o m u m a revoga-

ção" . Mas o que se  reconhece natural  e  geralmente para  d is -

positivos penais

  e

  para

  os

  efeitos freqüentemente terríveis

  d o

procedimento

  à m ã o

  armada, deveria, pelo menos

  da

  mesma

forma, valer para ordens  d e  caráter monetário.

Houve

  na

  história constitucional européia

  u m a

  época

  que

parecia conceber

  a

 primazia

  da le i ,

 principalmente como

  a pri-

mazia

  da lei

  formal

  das

  finanças, acima

  d e

  todos

  os

  demais

valores estatais, constitucionais  e humanos, pois estava domi-

nada pela ficção  d e u m a  economia livre  d o  Estado  e de um

Estado livre  da economia. Isso  n ã o pode  se r  imputado  à vigen-

te

 Constituição

  d o

 Reich.

  E la

 acolheu,

 n o

 artigo

 48, § 2

o

,

 alínea

2, a

  propriedade privada (artigo

  153)

  entre

  os

  direitos funda-

mentais passíveis

  d e

  suspensão

  e ,

  assim, quis possibilitar,

  n o

geral, intervenções  na  liberdade contratual  e  econômica.  Por

meio disso,  e la  entrou  e m  oposição  à  tradição liberal  de até

então,  a qual  n ã o  conhecia  u m a  anulação  das garantias  de pro-

SEGUNDA PARTE

  - A

  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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R E M É D I O S

  E

  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

m

priedade  n o  geral.  O  motivo para  o acentuado desvio  d a  tradi-

ç ã o  liberal residiu  n o fato de qu e se queria possibilitar nã o ape-

nas a  confiscação  d e  armas (nesse sentido,  H .  PreuB, relatos

estenográficos,  p .  1332),  m a s  também medidas eficazes  de

caráter econômico e financeiro, p o r exemplo, determinação dos

preços

  d e

 gêneros alimentícios, ordem

  d e

  vendas,

  e tc .

  (decla-

ração

  d e

  Heine, ministro prussiano,

  na 47

a

  reunião

  d a

  assem-

bléia nacional  em 5 de  julho  d e  1919).  Já se  sentia,  em 1919,

q u e , correspondente a o desenvolvimento econômico e social, a

continuação

  d a

  formação

 d o

  Estado

  d e

  sítio

  e d e

  guerra, ante-

riormente apenas policial

  e

 militar, rumo

  a u m

  Estado

  d e

 emer-

gência e d e exceção econômico tinha qu e se r mantida e m aberto.

Fica, hoje, p or conta d a devida discrição d o presidente d o Reich

determinar

  se o

  artigo

  153

 deve

  ser

  temporariamente anulado

e  seria necessário, para tanto,  u m  gesto, caso  ele se  decida  a

isso,  já que a

 declaração

  da  "anulação"  é  apenas  u m a  forma-

lidade. Nesse aspecto, também

  n ã o

  resta

  a

 menor dúvida para

a

  interpretação mais estrita

 d o

  artigo

  48, § 2

o

.

 Assim, durante

o  período  da  anulação,  o  presidente  d o  Reich poderia, para  o

restabelecimento

  d a

  segurança

  e

  ordem públicas, proceder

  a

desapropriações livres d e indenização,  a f im de proporcionar o

dinheiro necessário para  o  restabelecimento  da  segurança  e

ordem públicas, poderia ordenar confiscos  e  impor contribui-

ções. Diante

 d e

 tais possibilidades constitucionais incontroversas

e

  incontestáveis, privá-lo

  d o

  poder

  d e

  arranjar

  o

  dinheiro

  n e -

cessário

  p o r

  meio

  d e

  crédito corresponderia

  ao

  espírito

  de um

constitucionalismo d o s primórdios d o  liberalismo, q u e  aparen-

temente, sacrificava todo  o  Estado  e a  Constituição restante  à

sacralização d o direito financeiro formal.

4. Mas a  verdadeira razão  d e  todas  as  dúvidas contra  os

decretos substitutivos

  d e

  leis

  d e

  finanças poderia

  ser

  procura-

da  menos  e m considerações relativas  a o  direito formal  do que

e m

  lembranças

  d a

  história constitucional

  e nas

  repercussões

d e  anteriores conflitos constitucionais. Eles provêm  d e  situa-

ções passadas  d e  características constitucionalmente diferen-

tes e são o que a

  sociologia denomina "

r é s i d u

D e s t a r t e ,

  é

necessário  se  lembrar  de que não  mais existe  a  situação  da

SEGUNDA PARTF.

- A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUClONAt..

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1 8 6

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

monarquia constitucional  d o  século  X I X c o m  suas separações

entre Estado

 e

 sociedade, política

 e

 economia. Isso

 é d e

 imediata

importância constitucional.

 A

 interpretação juríd ica

  d a

  Consti-

tuição  n ão  pode suceder  s e m u m a  consciência crítico-históri-

ca, se não  quiser cair  e m u m  formalismo irrefletido  e em vãs

contendas.

  N o

  geral,

  o

  conceito

  de le i

  formal

  e ,

  dentro dele,

por sua vez ,  justamente  o  conceito  de lei  formal  d e  finanças

carece

  d e

  esclarecimento.

  E le

  está vinculado

  a u m a

  determi-

nada situação constitucional  e  caracterizado pela mais estreita

relação

  c o m u m a

  determinada estrutura constitucional, rela-

ç ã o esta q u e  também abrange  o conteúdo  d e direito positivo  da

normalização.  Em seu  caráter "formal", possui  u m a  determi-

nação inteiramente política e a formalização significa aqui, como

j á mencionado anteriormente, o contrário d e u m a despolitização.

Ela é a

  expressão

  d e u m a

  ampliação

  d e

  poder

  e d e

  competên-

c ia

 puramente política autodenominada "formal", porque

  se li-

berta, perante  u m  determinado adversário,  de um  conceito  le -

gal

 material restringente

 de seu

 poder.

 Um a l e i no

 sentido formal,

como  o são  alguns atos administrativos  d o  direito financeiro,

n ã o

 deve

  ser uma lei

 devido

  a seu

 conteúdo objetivo,

  m a s a p e -

n a s  devido  a o  órgão  que a  promulga  ou que  dela participa.  O

caráter "formal" desenvolvido  (não  manifestado  n o  teor  das

constituições escritas) pela teoria

 d e

 direito público

  d a

 monar-

quia constitucional n ã o significa nada mais além do que o poder

ou a

 competência

  e m

 efetuar determinadas ações

  ou

 delas

  pa r -

ticipar, isso compete  a o  parlamento  se m  qualquer considera-

ç ão objetiva c o m a outra regulamentação d e competência. C o m

esse simples esclarecimento

  não se diz que o

  termo

  le i

  formal

seja injusto o u  errado.  O que se  tenta  é privá-lo  d e u m a  corre-

ção ao

  transferi-lo

  a

  situações constitucionalmente heterogê-

neas.

  O

  termo

  le i

  incondicionalmente formal

  é

  conveniente

  e

compreensível como meio d e pressão da burguesia na luta contra

a

  monarquia constitucional

  sob a

  condição

  d e u m a

  separação

entre Estado

  e

  sociedade.

  A

  formalização

  tem

  aqui

  o

  sentido

exclusivamente  d e u m a  politização,

  diante

  de um

  governo

não-parlamentar,

  e la  deve estender  a  área  d e poder  do  parla-

SEGUNDA PAKTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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R E M É D I O S

  E

  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

82

mento  a  importantes procedimentos  e  ações relativos  ao direi-

to  financeiro. Assim,  a ressalva  da lei dirige-se polemicamente

contra  u m adversário políico b e m definido, contra a monarquia

constitucional alemã, governo independente

  da

  representação

popular,

  e a

  ressalva

  d a  le i

  exprime

  n a s

  constituições alemãs

d o  século  X IX q u e , d o  poder  do re i ,  restrito apenas  p o r  meio

das  exceções listadas  n a  Constituição,  são  retiradas determi-

nadas matérias

  e

  questões reservadas

  a o

  legislador, isto

  é, à

participação

  d o  parlamento.  A lei

  orçamentária

  é

  qualificada

geralmente como  u m  acordo  entre governo real  e  representa-

ção popular (assim, ainda, Meyer-Anschütz, Staatsrecht,  p. 89 0,

897 , c f .

  acima),

  o que

  corresponde exatamente

  à

  construção

dualística d e semelhante sistema político, assim como ao trata-

mento  d a  Constituição como  se e la  fosse  u m  contrato (entre

príncipe  e  representação popular).  E  somente  e m  semelhante

estrutura constitucional

 q u e

 cabe

 o

 termo

 le i

 incondicionalmente

"formal".

18

 N a luta contra o  governo real independente  do pa r -

lamento, desenvolveu-se a lei formal d o direito orçamentário  e

a

 luta contra

  o

 direito real

 d e

 baixar decretos

  é u m a

  luta contra

o

  poder

  do re i ,

  segundo

  a

 suposição, continuadamente ilimita-

do , não é uma  luta contra  u m  direito  d e  baixar decretos, dele-

gado constitucional  ou  legalmente. Destarte,  e m  Estados  d e-

mocráticos,

  a

  ressalva relativa

  a

  direito financeiro

  não é de

modo algum concebida como ressalva absoluta

  e

  incondicio-

nalmente formal.

19

N a

  medida

  e m q u e

  surge

  u m a

  ressalva

  da lei de

  finanças

incondicionalmente formal, sempre  se pressupõe, então,  que o

1 8

  O  c o n c e i t o " f o r m a l " c o n d u z  a u m a  r e s t r i ç ã o  d o  p o d e r  e da

c o m p e t ê n c i a  d a  r e p r e s e n t a ç ã o p o p u l a r  — p o r  e x e m p l o ,  n a

a p l i c a ç ã o

  a o

  d i re i to escr i to pré-cons t i tuc ional

  q u e ,

  fo rma lmen te ,

n ã o  s e r i a  l e i n o  s e n t i d o c o n s t i t u c i o n a l  e , p o r  c o n s e g u i n t e ,  n o

conce i to fo rma l

  d e l e i

  r ea l i zado

  d e

  forma conseqüente , cont inuar ia

a  pe r t ence r  à  á rea  d e  p o d e r  d o  governo rea l  — e l e  será imedia ta  e

n a t u r a l m e n t e a b a n d o n a d o  e s e  r eco r re novamente  a u m  concei to

mater ia l

  de le i ( le i =

  in te rvenção

  n a

  l iberdade

  e n a

  propr iedade) .

  R .

T h o m a a p r e s e n t o u  c o m  c l a r eza exempla r e s se p roced imen to  e m

s e u

  estudo sobre

  a

  ressalva

  d a l e i

  (F e s t g a b e

 fur O.

  Mayer,  1916).

19

  P o r  e x e m p l o ,  a l e i  f r a n c e s a  d e 1 4 d e  d e z e m b r o  d e 1 8 7 9 , n a  qual  s e

b a s e i a  a  r e g u l a m e n t a ç ã o a t u a l m e n t e v i g e n t e  d o  direi to público

SEGUNDA PARTE  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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1 8 8 O

  G U A R D I A O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

parlamento como representação popular  se  defronte  c o m u m

governo independente dele,

  o

  qual

  n ã o

  pode,

  d e

  maneira

  n e-

nhuma,  se  reportar  a o  povo. Mesmo  o  direito  d a  coroa  e m

dissolver  o  parlamento  n ã o  tinha  na monarquia constitucional

alemã

  o

 sentido constitucional

  d e

 apelar para

 o

 povo,

  e l e

  tinha

apenas

  o

  dever

  d e

  assegurar

  a

  estrutura dualística

  e o

  equilí-

brio entre Estado

 e

 sociedade.

 A

 situação constitucional

 d o

 atual

Reich alemão  d a  Constituição  d e  Weimar  é  essencialmente

diferente disso.  Primeiramente,

  o

  Estado

  d e

  hoje

  não se ba-

seia  e m u m  contrato entre representação popular  e  governo  e

a lei

  orçamentária

  não é

  nenhum "acordo" entre parlamento

  e

governo.  Em  segundo lugar,  o  governo  não é  mais  u m  poder

independente

  d o

  parlamento, sendo

  os

  meios

  d e

  influência

  e

controle

  d o

 parlamento, desde

  q u e

 exista

 u m

 parlamento capaz

d e

  atingir maioria

  e d e

  agir,

  t ã o

 fortes

 que , j á p or

 esta razão,

  é

impossível reinvidícar  o s  pontos  d e  vista  q u e  faziam sentido

perante

  o

  governo real

  d a

  monarquia alemã.

  Em

  terceiro

  lu -

gar, o presidente  d o Reich é eleito pela totalidade  d o povo  a le -

m ã o , d e

 modo

 que e le é ,

 igualmente,

 u m

 representante

 d o

 povo,

caindo  o  monopólio  da  representação popular pressuposto  n o

parlamento

  n a s

  normas

  e

  termos

  d o

  direito constitucional

monárquico. Finalmente,

  em

  quarto lugar,

  a

  Constituição

  d e

f rancês . Segundo

  e l a , e m

  de te rminados casos , podem

  s e r

  abertos

c réd i tos

  p o r

  m e i o

  d e

  d e c r e to s

  (par

  décret)  t a m b é m

  n o

  c a s o

  d e

p a r l a m e n to r e u n id o , p a r a

  o

  c a s o

  n o

  qua l

  o

  p a r l a m e n t o

  n ã o s e

r e ú n a , e s t ã o r e g u l a m e n t a d a s ,

  e m

  s e u s p o r m e n o r e s ,

  a s p o s -

s ibi l idades

  d e

  decreto re la t ivas

  a o

 d i re i to o rçament á r io .

  O

  pr incípio

d a

  r e s s a l v a

  d e u m a l e i

  f o r m a l

  d e

  f i n a n ç a s

  n ã o

  es tá ass im,

  d e

m o d o a lg u m , e x e c u t a d o

  d e

  f o r m a a b so lu t a

  e s e m

  e x c e ç õ e s .

  O

t eór ico f rancês

  d o

  d i re i to o rçamentá r io ,

  G .

  Jèze

  -

  conhecido tanto

co mo au tor idade ju r íd ica

  e m

  maté r ia

  d e

  si st em a financeiro, q u a n t o

c o m o

  b o m

  r e p u b l i c a n o d e m o c r a t a

  —

 d e c l a r a

  a

  r e sp e i t o d e s sa

q u e s t ã o f u n d a m e n ta l ( A l l g .  Theorie  de s  Budgetrechts,

  1 9 2 7 , p .

1 9 1 ) :

  " Q u a lq u e r c a m in h o

  ( o u

  se ja ,

  o d a

  r e g u l a m e n ta ç ã o

  d e

  gastos

u r g e n t e s

  e n ã o

  p rev is tos pe lo governo)

  q u e

  e v i d e n t e m e n t e

  q u e

s e

  siga,

  é

  ce r to

  q u e e m

  sér ios per íodos

  d e

  c r i se

  — p o r

  exemplo ,

n o

  c a so

  d e

  a m e a ç a

  d e

  p e r ig o

  d e

  guer ra

  — o

  g o v e r n o

  n ã o

  hesitará

e m

  c o n t r a i r d e sp e sa s

  s e m

  a u t o r i z a ç ã o p a r l a m e n t a r

  ( . . . )

  Salus

populi suprema

  lex .

SEGUNDA PARTfc  - A  CONCRETA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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R E M É D I O S  E  M O V I M E N T O S C O N T R Á R I O S

J S 2

Weimar

  é u m a

  Constituição democrática

  e

  baseia-se

  em um

equilíbrio

  d e

  elementos parlamentares

  e

  plebiscitários,

  sua es-

trutura  é  essencialmente determinada pelo fato  de que o  povo

decide  d a  mesma forma perante  o  parlamento quanto perante

o govemo  e o presidente como  o terceiro superior  (por meio d e

reeleição, plebiscito

 ou

 outras votações).

  U m

  conf lito constitu-

cional

 n a

 forma

 d o

 monárquico século

 X I X , é

 hoje

 t ão

 impossí-

vel e  inimaginável quanto  sã o  intransferíveis  o s  argumentos  e

conceitos  d e  semelhante conflito.

Quando aqui, diante  d e  repercussões  e  transferências  d o

direito constitucional monárquico, faz-se valer  a peculiaridade

d a

  vigente Constituição

 d o

 Reich

  e se

 afirma

 a

 admissibilidade

d o  direito  d e  baixar decretos substitutivos  d e  leis  d e  finanças,

isso significa tudo, menos u m pleno poder ilimitado e incontrolado

d o

 presidente

 d o

 Reich. Isso porque,

 c o m

  isso,

  se

 afi rma simul-

taneamente  q u e  pressupostos, conteúdo  e  limites  d o s  poderes

extraordinários, desde  q u e n ã o especialmente regulamentados

mediante

  uma le i de

  execução,

  t êm que se r

  desenvolvidos

  a

partir

  d a s

  normas

  e

  pontos

  d e

  vista

  d a

  Constituição vigente.

Nesse aspecto, deve-se observar  o que  Hugo PreuR j á  expres-

samente acentuou como  o  essencial  na  comissão constitucio-

n a l

  (protocolo

  p . 277) e o que

  está exposto

  e m

  minha palestra

sobre

  a

 ditadura

  d o

 presidente

  d o

 Reich (Conferência

 dos p ro -

fessores  d e direito público,  1924, p. 103;  Die

  Diktatur,

  2 ed.,

p . 254) , qu e o

 verdadeiro limite

 d o s

 poderes extraordinários

 d o

presidente

  d o

  Reich

  e a

  verdadeira proteção contra

  u m

  abuso

de seu  poder residem  n o s  poderes  de  controle  do  parlamen-

to do Reich,

  não em normatividades ou inibições judiciais.  Não

será difícil para  u m  parlamento capaz  d e  atingir maioria  e de

agir fazer valer

  su a

 concepção perante

  o

  presidente

  e o

 gover-

n o d o Reich  p o r  meio d a exigência p o r  anulação  e, em  caso  d e

necessidade,

  po r

  meio

  d e u m a

  expressa resolução

  de

  descon-

fiança.

 A

  Constituição vigente

  d o

  Reich confere

  a u m

  parla-

mento capaz  de  atingir maioria  e d e  ação todos  os  direitos  e

possibilidades de que  carece  u m  parlamento,  a fim de se  impor

como  o  fator normativo  d a  volição estatal.  S e o  parlamento

que se  transformou  e m  cenário  d o  sistema pluralista  n ã o  esti-

SEGUNDA PARTE  - A  CONCHETA S ITUA ÇÃO CONS TITUCIONAL...  •

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1 9 0

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

ver em

  condiçoes disso,

  ele ,

  então,

  nao tem o

  direito

  d e

  exigir

q u e  também todos  o s  outros órgãos responsáveis  se  tomem

incapazes  de  agir.

Seria

  não só

 historicamente impossível

  e

 moralmente insu-

portável,  m a s  também juridicamente errado justificar hoje  tal

direito  a u m a incapacidade geral  d e ação c o m argumentos, c o m

os

  quais

  u m

  parlamento liberal

  d o

  século

  X I X ,

  composto

  por

notabiJidades, procurava colocar fora

  d e

  combate

  seu

  adver-

sário monárquico.  Se, na  presente situação constitucional  da

Alemanha,

  se

  formou justamente

  u m a

  praxe

  d o

  estado

  de ex-

ceção econômico-financeiro

  c o m u m

  direito

  d e

  baixar decre-

tos  substitutivos  d e  leis, isso, então,  não é  arbitrariedade  n e m

acaso,  n e m  mesmo "ditadura"  n o  sentido  da  divisa vulgar  e

político-partidária,

  mas a

 expressão

  d e u m a

 relação profunda

 e

internamente legal. Corresponde  a o  rumo  q u e u m  Estado

legiferante toma para o Estado econômico  e qu e não mais pode

ser

 executado

 po r um

 parlamento pluralisticamente dividido.

 O

estado

  d e

  exceção revela, como mostrado anteriormente,

  o

núcleo  d o  Estado  em sua  particularidade concreta  e o  Estado

judicante desenvolve  a lei marcial,  u m processo judicial sumá-

rio, o

  Estado militar

  e

  policial

  a

  transição

  d o

  poder executivo

como típico meio  de seu  estado  de  exceção.  O  direito econô-

mico-financeiro d e baixar decretos substitutivos d e leis d a atual

praxe

  d o

  artigo

 4 8

  permanece, analogamente,

  d e

 acordo

  com a

ordem existente

  e ,

  diante

  de um

  pluralismo inconstitucional,

procura salvar  o  Estado legiferante constitucional, cuja

corporação legislativa está pluralisticamente dividida.

 A

 tenta-

tiva

 de

 produzir

 u m

 antídoto

 e u m

 movimento contrário

  só

 pode

ser  empreendida constitucional  e  legalmente pelo presidente

d o Reich,  dá a perceber, simultaneamente,  que o presidente  do

Reich precisa

  ser

 visto como guardião

 d e

 toda essa ordem cons-

titucional.

SEGUNDA PARTF.  - A  CONCRILTA SITUAÇÃO CONSTITUCIONAL.

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- J

A

  t e o r i a

  d o

  d i r e i t o p ú b l i c o

  t

d o   p o d e r n e u t r o ^

pouvoir neutre)  j

A s  divergências  d e  opinião  e  diferenças entre  os  titulares

d e direitos políticos  d e  decisão  e influência  n ão  podem  ser de-

cididas,

  n o

  geral, judicialmente, caso

  n ã o

  seja exatamente

  o

caso

 d e

 punição

 p o r

 violações constitucionais abertas. Elas

  são

eliminadas o u p o r meio d e u m poder político mais forte situado

acima

  d a s

  opiniões divergentes, isto

  é , por

  intermédio

  de um

terceiro

  superior  - m a s

  isso

  n ã o

  seria, então,

  o

  guardião

  da

Constituição,  e , s im, o  senhor soberano  d o  Estado,  o u  então

s ã o  conciliadas  ou  resolvidas  p o r  meio  de um  órgão  não em

u m a

  relação

  d e

  subordinação,

  m a s d e

  coordenação, isto

  é, por

meio  de um  terceiro  neutro  -  este  é o  sentido  de um  poder

neutro,  de um pouvoir neutre  et  intermédiaire,  localizado  não

acima,

  e , s im, ao

  lado

  d o s

 outros poderes constitucionais,

  m a s

dotado

  d e

  poderes

  e

  possibilidades

  de

  ação singulares. Caso

n ã o  deva ocorrer  u m  efeito secundário meramente acessório

d e  outras atividades estatais,  mas , s im, devam  se r  organizadas

u m a

  instituição

  e u m a

  instância especiais, cuja tarefa seja

  as -

segurar

 o

 funcionamento constitucional

  d o s

 diversos poderes

  e

salvaguardar  a  Constituição, então  é  conseqüente  e m u m E s -

tado d e direito, onde  há diferenciação d o s poderes,  n ã o  confiar

isto, suplementarmente,

  a

 nenhum

  d o s

 poderes existentes, pois

senão obteria apenas

  u m

  sobrepeso perante

  os

  demais

  e

  pode-

ria ele  próprio  se  esquivar  d o  controle.  E le  tornar-se-ia,  por

meio disso, senhor da Constituição. Destarte, é necessário colo-

TliRCblRA PARTI ;

  - O

  PRI iSlDLNTK

  D O

  Rl i lCI I COMO GUARDIÃO.. .

  •

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1 9 4

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

car um  poder especial neutro  a o  Jado  d o s  outros poderes, rela-

cionando-o

  e

  equilibrando-o

  co m

  eles

  p o r

  intermédio

  d e

 pode-

res  específicos.

N a

 história constitucional

  d o

  século

  X I X

  surge,

  c o m B e n -

jamin Constant, '  u m a  teoria especial  d o

  pouvoir neutre,

intermédiaire

  e

  régulateur

  na  luta  d a  burguesia francesa  por

u m a

  Constituição liberal contra bonapartismo

  e

  restauração

'

  P r i m e i r a m e n t e

  n a s

  Réflexiuns

  sur les

  constitutions

  et les

  garanties,

p u b l i c a d a s

  e m 2 4 d e

  m a i o

  d e 1 8 1 4 ,

  i m p r e s s a s

  n a

  Collection

complete

  des

  ouvrages

  de

  B e n j a m i n C o n s t a n t , P a r i s ,  1 8 1 8 , p .

14/15 ; ademais ,

  Cours

  de

  politique constitutionnelle

>

edição

  d e

1818,1,  p .  13/14, edição  d e  Laboulaye ,  I , p .  18/19; CEuvrespolitiques,

e d i ç ã o  d e  Char les Louandre , Par i s ,  1 8 7 4 , p . 1 8 .  Fal ta ,  a t é  então,

u m  t r a t a m e n t o m o n o g r á f i c o d e s s a i m p o r t a n t e q u e s t ã o . I s s o  s e

expl ica , pa ra

  a

  França ,

  a

  pa r t i r

  d o

  des t ino po l í t i co

  d a

  m o n a r q u i a

f r a n c e s a  e d o  c h e f e  d e  Es tado , pa ra  o  d e s e n v o l v i m e n t o  d e a t é

e n t ã o  n a  A l e m a n h a ,  a  par t i r  d a  fa l ta  d e u m a  teor ia const i tucional .

B e n j a m in C o n s t a n t m e sm o r e m e te ,

  s e m

  indicação mais deta lhada

d e  t e m p o  e  lugar ,  à s  idé ias cons t i tuc iona is  d e  C le r m o n t - T o n n e r r e

( p . 1 4 ,  no ta ) ,  m a s s e  c o n t e n t a  e m  d i z e r  q u e s e  e n c o n t r a r i a m  lá

" o s

  g e r m e s "

  d e s u a

  teoria

  (on en

  trouve

  les

  germes,  etc.) . Es se

f o i  p r o v a v e l m e n t e  o  ú n i c o e m b a s a m e n t o p a r a  a  r e f e r ê n c i a  a

C l e r m o n t - T o n n e r r e  n a  Allg. Staatslehre  d e  G e o r g J e l l i n e k ,  p .

5 9 0 ,

  p o i s ,

  d e

  r e s to ,

  a

  r e l a ç ã o h i s t ó r i c a

  d a

  d o u t r i n a

  d o

  pouvoir

neutre  c o m a s  cons t ruções cons t i tuc iona is  d e  C le r m o n t - T o n n e r r e

a in d a  n ã o  es tá ,  a t é  e n t ã o , e x a m i n a d a  d e  fo rma mais de ta lhada .

E m b o r a

  a

  t e o r i a

  d e

  B e n j a m i n C o n s t a n t c o r r e s p o n d a

  à

  t e o r i a

m o d e r a d a m e n t e l i b e r a l

  d e u m a

  m o n a r q u i a

  q u e

  r e p o u s a

  n a

d i f e r e n c i a ç ã o  d o s  p o d e r e s , c o m o  j á  e n c o n t r a d a  e m  M o u n i e r  e

C l e r m o n t - T o n n e r r e  — C l e r m o n t - T o n n e r r e c a r a c t e r i z a t a m b é m  a

p o s i ç ã o

  d o r e i

  c o m o  pouvoir régulateur  ( "CEuvres co mp le te s

d e  S tan is las  d e  C le r m o n t - T o n n e r r e " ,  v o l . I V ,  Par i s , anexo  I I I , p .

3 1 6 ) —, eu , a t é   agora ,  n ã o  pude cons ta ta r  n o s  s e u s p o r m e n o r e s

d e q u e

  modo Cons tan t e s tá in f luenc iado

  p o r

  C le r m o n t - T o n n e r r e

e s e  es te  j á  ut i l izou  a  im p o r t a n t e  e  ca rac te r í s t i ca fó rmula "pouvoi r

n e u t r e " .  N o q u e  t a n g e  à s  r e l a ç õ e s b io g r á f i c a s ,  n ã o s e  encont ra

n e m n o

  l i v r o

  d e

  R U D L E R .

  La

  jeunesse

  de

  Benjamin Constam

(1767-1794), Paris,  1 9 0 9 , n e m n a  deta lhada bibl iograf ia d e R U D L E R .

Critique

  de s

  ceuvres

  de

  Benjamin Constant,

  P a r i s ,  1 9 0 9 , u m a

r e f e r ê n c i a

  a

  C le r m o n t - T o n n e r r e . A m b a s

  a s

  b io g r a f i a s

  d e

  L é o n

  e

D u m o n t - W i ld e n , su r g id a s  n o a n o d e 1 9 3 0 ,  t a m b é m  n ã o  contêm,

n e s se a sp e c to , n e n h u m a o u t r a i n f o r m a ç ã o .

- «  TERCEIRA PARTE  - O  PRt SIDENTfc  D O  REICH COMO GUARDIÃO.

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A

  T E O R I A

  D O

  DIREITO PÚBLICO

  D O

  " P O D E R N E U T R O "

25

monárquica. Essa teoria

  f a z

  parte, essencialmente,

  d a

  teoria

constitucional d o Estado civil  d e direito  e não  influi apenas  so-

bre as

 duas constituições,

  nas

  quais

  fo i

  adotada

  d e

  forma

  bas -

tante literal.

2

 A e la

 remonta, muito mais,

 o

 catálogo, típico para

todas

  a s

 constituições

  d o

  século

  X I X , de

 prerrogativas

  e

 pode-

res do

  chefe

  d e

  Estado (monarca

  o u

  presidente), todos imagi-

nados como meio  e  possibilidades  d e  atuação  de tal  pouvoir

neutre,  como, p o r exemplo, inviolabilidade ou , pelo menos, p o -

sição privilegiada

  d o

  chefe

  d e

  Estado, assinatura

  e

  promulga-

ç ã o d e leis, direito d e  indulto, nomeação d e ministras  e funcio-

nários públicos, dissolução

  d a

  câmara eleita.

  E m

  quase todas

as  constituições  d e Estados maiores, desde  q u e  correspondam

a o

  tipo

 d o

 Estado civil

  d e

 direito, tanto

  e m

  monarquias quanto

e m

  repúblicas, pode-se reconhecer essa construção

  d e

  alguma

forma, n ã o  interessando se a situação política possibilita ou não

s u a

  aplicação. Tanto

 d o

 ponto

 d e

 vista constitucional quanto

 da

2

  Constituição brasileira

  de 25 de

  março

  de 1824,

  a r t igo  9 8 : " O

P o d e r M o d e r a d o r  é a  c h a v e  d e  toda  a  o rgan ização po l í t i ca  e 6

de legado p r iva t ivamen te  a o  Imperador , como Chefe Supremo  d a

N a ç ã o

  e s e u

  P r ime i ro Represen tan te , pa ra

  q u e

  incessan temen ie

vele sobre  a  m a n u t e n ç ã o  d a  Independência , equi l íbr io ,  e  harmonia

dos~"máis Poderes Pol í t icos" .  D a  m e s m a f o r m a  a  C o n s t i t u i ç ã o

por tuguesa  d e 2 9 d e  abril  d e 1 8 2 6 ,  a r t igo  7 1 : O  Pode r Moderador

é a

  c h a v e

  d e

  toda

  a

  organização pol í t ica

  e

  compete pr iva t ivamente

a o R e i , e t c .

  T a m b é m

  n a

  Itália

  e n a

  E s p a n h a

  a

  in f luênc ia

  d a

  teoria

d e  B e n j a m i n C o n s t a n t  f o i  mui to grande , como pude cons ta ta r  a

par t i r  d e  c o n v e r s a s  c o m  colegas i ta l ianos  e  e spanhó i s , po rém,

fa l ta também aqui  u m  e x a m e m o n o g r á f i c o .  N o

  projeto

  d e u m a

nova Cons t i t u i ção e spanho la , pub l i cada pe lo gove rno

  d a

  época

e m  j u l h o  d e 1 9 2 9 , f o i  i m a g i n a d o  u m  Consejo

  dei

  Reino  como:

instrumento

  dei

  Poder armónico; garantia

  de la

  independendo

judicial; moderador

  de la

  Camera legislativa; salva guarda

de la

  constitucion , frente

  al

  Gobierno

  o a las

  Cortes; posible

organo

  de

  soberania

  en

  circunstancias culminantes; clave

  y

ornamento

  de

  todo

  el

  organismo politico,

  al

  cual presta

estabilidad

  y

  decoro.

  É u m a  ten ta t iva in te ressante  d e  re lac ionar

o r e i

  (cuja tarefa essencial

  n o

  a r t i go

  4 3 é

  de f in ida como  funcion

moderadora)

  c o m a

  au to r idade

  d e u m

  c o n s e l h o

  d e

  E s t a d o

  e da

c o r o a p o l í t i c o - p a r t i d a r i a m e n t e n e u t r o .  N a s  c o n s t i t u i ç õ e s

e s p a n h o l a s m a i s a n t i g a s ( 1 8 1 2 ,  1 8 3 7 , 1 8 4 5 , 1 8 6 9 ,  1 8 7 6 ) ,  a s

e x p r e s s õ e s

  q u e

  aqui in te ressam, a inda

  n a o

  es tão u t i l izadas .

T t K C E I R A P A R T F .  - O  P R E S I D E N T E  D O  R E I C H C O M O G U A R D I Ã O . . .  »

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1 9 6

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

teoria

  do

  Estado,

  a

  teoria

  é d e

  maior interesse.

  E la

  baseia-se

e m u m a  instituição política  q ue  reconhece claramente  n o Esta-

d o  constitucional  a  posição  do rei ou do  presidente  d e Estado,

manifestando-a mediante

  u m a

  formula exata.

  Ela faz

 parte

  in-

teiramente  da  teoria clássica  d o  Estado  d e  Direito  e  também  a

ela se  refere  o que  Lorenz  vo n  Stein disse  a  respeito desta

época

  (1789 a

  1848), decisiva

  não só

  para

  a

 França,

  m a s t a m -

b ém

  para toda

  a

  história constitucional

  d a

 Europa continental:

" E m  lugar algum conhece  o mundo  u m a  fonte mais profunda e

mais inesgotável

  d e

  maiores verdades sobre Constituição

  e

sociedade."

3

  S eu  autor merece para essa doutrina inteiramen-

te o louvor,  o qual  lhe fo i conferido p o r Georg Jellinek quando

este enaltece  seu "olhar livre d e parcialidade doutrinária"  e lhe

adjudica o incontestável mérito "d e te r mostrado primeiramen-

te ao  desenvolvimento continental  o  caminho para  a  correta

posição constitucional

  d o s

  ministros".

4

  Barthélemy admira

  a

clareza

  de seu

  raciocínio (

Vadmirable lucidité  du  raisonne-

ment

)  e diz com  razão  qu e  Constant  foi o  verdadeiro defensor

d o

  parlamentarismo liberal,

  o

  qual educou

  a

  burguesia france-

sa

 rumo

  ao

 parlamentarismo.

5

  É u m

  sinal considerável

  que seu

'

  Geschichte

  der

  sozialen Bewegung

  in

  Frankreich

  von 1789

bis auf

  unsere Tage,

  v o l . I ,  Der

  Begriff

  de r

  Gesellschaft,  edição

d e G .

  S a l o m o n , M ü n c h e n ,

  1 9 2 1 , I , p . 5 0 2 .

  S t e i n m e n c i o n a

e x p r e s sa m e n te  a  teor ia  d e  C o n s t a n t  d o  poder neu t ro ,  op. cit.,  I I ,

p . 5 1 , e d i z q u e  esse poder neutro ter ia surgido  n a  F r a n ç a  c o m a

m o n a r q u i a

  d e

  j u lh o ,

  a

  qual representa para

  e l e , e m

  ge ra l ,

  a

  fo rma

c l á s s i c a  d o  v e r d a d e i r o c o n s t i t u c i o n a l i s m o .

4

  Entwicklung

  des

  Ministeriums

  in der

  konstitutionellen

  Mo-

narchie.  R e v i s t a  d e  Grünhut pa ra  o  d i re i to púb l ico  e  p r i v a d o  X

(1883) .  p . 3 4 0 , 3 4 2 . C f .  t a m b é m  Allgemeine Staatslehre,  p . 5 9 0 .

C o n s id e r o c o m o in ju s t a  e  c o m o f a l s a a v a l i a ç ã o  d o  a d m i r á v e l

cons t ru to r cons t i tuc iona l

  o

  j u lg a m e n to p r o f e r i d o

  p o r G .

  Je l l inek

so b r e S i e y è s n e s sa o p o r tu n id a d e .

5

  L'introduction

  du

  régime parlementaire

  en

  France,  Par is ,  1 9 0 4 ,

p .  184 /185 . Também  d e  fo rma cor re ta MICHEL, Henry .

  L'idée

  de

1'Eiai,  Paris,

  1 8 9 6 , p . 3 0 4 : " O n n ' a

  jamais mieux déf ini , avec plus

d e  d é l i c a t e s s e  e t d e  süre té dans 1 'express ion ,  l e  rô le  d ' u n r o i

const i tu t ionnel ." ("Nunca

  s e

  havia definido,

  c o m

  mais del icadeza

e  segurança  n a  expressão ,  o  pape l  d c u m r e i  cons t i tuc iona l ."  N T ) .

TfvHCfcIRA 1'ARTfc  - O  PRKSIDt NTE  D O  RFJCH COMO GUARDIÃO.

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A  T E O R I A  D O  D I R E I T O P Ú B L I C O  D O  " P O D E R N E U T R O "

1 2 2

nome, após longo esquecimento, seja novamente citado agora

também

  na

  Alemanha

  e que se

  distinga, repetidas vezes,

  em

u m

 documento

  tão

 significativo

 da

 ciência alemã

  d e

 direito

 pú -

blico como  o relatório  de H . Triepel.

6

 Para  a história d e concei-

tos da  teoria  d o  Estado, parece-me  ser  especialmente  d e  inte-

resse  o  fato  de que a  bipartição entre

  auctoritas

  e

 potestas

,  a

qual considero

  u m a

 diferenciação fundamental

 d e

 pensamento

estatal europeu, também possa

  se r

  reconhecida nessa doutrina

d e  Benjamin Constant.

7

O

  valor prático

  da

  teoria

  d a

  posição

  d o

  chefe

  d e

  Estado

neutra, intermediária, reguladora

  e

  defensora reside primeira-

mente  n o  fato  de que ,  doravante, pode  se r  respondida  a per-

gunta sobre qual  o  significado  do  chefe  d e  Estado  e m  Estado

civil

  d e

 direito, seja

 e le

  monarquia constitucional

  ou

 democra-

c ia

 constitucional,

 e

 qual

  o

  sentido

 d e

 seus poderes,

  se o

 poder

d e  legislar fica totalmente  c o m a s  câmaras,  se os  ministros

nomeados pelo chefe  d e  Estado  s ã o  totalmente dependentes

d a

  confiança

  d a s

  corporações legislativas,

  se o

  próprio chefe

d e

 Estado está vinculado

 e m

  tudo

  à

 confirmação

 dos

 ministros

 e

se , po r conseguinte, se puder dele dizer:  il règne  et ne gouverne

pás.

s

  N a  Alemanha,  a diferenciação entre

  régner

  e

 gauverner

n ã o f o i

 compreendida

  nem  d e

  forma teórica,

 pois  a

 diferencia-

ç ã o

  entre

  auctoritas  e  potestas

  estava

  h á

  muito esquecida,

n e m d e  forma prática, pois  o  monarca  d a  monarquia constitu-

cional  d e  estilo alemão realmente reinava  e  "governava".  S e-

gundo

  a

 conhecida diferenciação

 de F. J .

 Stahl, nisso

  se

 basea-

va a té

  mesmo

  a

 oposição entre monarquia constitucional

  (i.e.,

q u e  governa realmente)  e  monarquia parlamentar,  u m a  antíte-

6

  C a d e r n o  5 d a s  p u b l i c a ç õ e s ,  op.

  c i t

p .  10 e p . 19 :  " V ê - s e  q u e

Benjamin Cons tan t e s tava

  c o m a

  razão ,

  n a o

  interessa tanto punir

o  m in i s t r o q u a n to t o r n á - lo i n o f e n s iv o . "

7

  C f .  logo adiante  e m  nota.

8

  Ass i m cons ta  n a  f rase  d e  Thie r s  d o a n o d e 1 8 2 9 : " L e r o i  règne,

e s

  min is t res gouvernen t ,

  l e s

  c h a m b r e s j u g e n t "

  ( e m q u e

  jugent,

n a tu r a lm e n te ,  n ã o  s ign i f ica jus t i ça ) .  Sobre  a  origem dessa célebre

f ó r m u la ,

  G .

  Je l l inek

  n a

  revis ta

  d e

  GrUnhut ,

  1 8 8 3 ,  op. cit.,  p . 3 4 3 ,

E S M E I N - N É Z A R D .  Élements

  du

  droit constitutionnel,

  7" ed . , I ,

p . 2 3 1 .

TERCEIRA FAKTE  - O  FRIiSIDENTl-  D O  KfilCH COMO UUAIU51ÃO...  •-

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1 9 8

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

se que  habilmente  u n e u m a  adaptação  a  exigências  e  modos

de se

  expressar

  d a

  época

  co m s u a

  neutralização

  e que só tem

que se r  compreendida como diferenciação política  d e  fim.

9

Contra

  a

  construção

  d o s

  liberais franceses

 fo i

 colocado, desde

o

  início

  e m

  vigor,

  n a

 ciência política alemã

 d o

  século

 X I X , q u e

o rei  teria também  q u e  agir  e  realmente executar, senão seria

u m a

  mera sombra.]

0

  Para tanto,

  M a x v o n

  Seydel encontrou

u m a  argumentação concludente:  o monarca teria  que , em  todo

caso, realmente governai'  e ter um  poder real, pois  n ã o  sobra-

ria

  nada mais

  d o  régner  se

  subtraíssemos

  o  gouverner.

n

  C i-

tava-se freqüentemente  u m  dito deveras rude  d e  Napoleão

12

  e

tinha-se razão enquanto

  a

 monarquia constitucional alemã

  era,

até 1918, de  fato, u m  poder superior  e mais forte, q u e justifica-

v a a  diferenciação entre Estado  e  sociedade,  n ã o  sendo  a p e -

nas um

  terceiro "nada mais

  q u e

  neutro".

  M a s c o m

  isso

  n ão

está resolvido  o  problema  da  ciência política geral  q u e  reside

n a

  diferenciação entre

  auctoriias  e potestas,  n e m o

  problema

9

  Rechts-

  un d

  Staatsphilosophie,

  2

a

  e d . ,

  a r t i go 97 / 98 ; sob re

  o

e s c l a r e c i m e n t o  d a  opos i ção en t r e cons t i t uc i ona l  e  pa r l amen t a r ,

S C H M I T T ,

  C .

  Verfassungslehre,

  p . 2 8 9 . A s

  d i f i cu l dades inso lúvei s

m o s t r a m - s e

  n o

  a r t i g o

  d e

  B i n d i n g s o b r e

  a

  r e s p o n s a b i l i d a d e

minister ial (v ide  anteriormente neste l ivro)

  q u e , s e m a

  teoria

  d a

p o s i ç ã o n e u t r a  d o  c h e f e  d e  E s t a d o ,  é  i n c o m p r e e n s í v e l  e n ã o

c o n s t r u t i v o .

10

  A s s i m ,  p o r  e x e m p l o ,  j á  R O T T E C K ,  C . v .  Lehrhuch  des

Vemunftsrechts

  und der

  Staatswissenschaflen,

  2'  e d . , v o l . 2 ,

Stuttgart ,  1 8 4 0 , p . 2 1 9 : s e m u m a  esfera própria_de poder,  s e m  agir

e s e m

  executar ,

  o re i

  seria

  u m a

  "mera sombra" .

  '

1

'  S E Y D E L ,  M a x v o n .  Über konstitutionelle  un d  parlcimentarische

Regierung  ( 1 8 8 7 ) ;

  e m

  Siaatsrechtliche

  und

  poliiische

Abhandlungen,  F re i bu rg

  e

  Leipz ig ,

  1 8 9 3 , p . 1 4 0 ;

  ademais, p .ex. ,

S A M U E L Y .

  Das

  Prinzip

  der

  Minis

  te

 rveramwortlichkeil,  Berl in,

1 8 6 9 , p . 1 5 ;  F R I S C H .  Die  Verantwortlichkeit  der  Monarchen

und

  hõchsten Magistrate,  B e r l i n ,

  1 8 9 4 , p . 1 8 6 ;

  c o n t r a ,

a c e r t a d a m e n t e , D O L M A T E W S K Y ,  L . C .  Der  Parlamenturismus

in der

  Lehre

  B.

  Consiants,  Zei tschr .

  f . d . g e s .

  S taa t swissenschaf t ,

v o l . 6 3 , 1 9 0 7 , p . 6 0 8 .

12

  T a l

  h o m e m s e r i a t ã o - s o m e n t e

  u m

  "cochon engra i s sé" , c i t ado ,

p . c x . ,  e m  B L U N T S C H L I .  Allgemeine Staatslehre  1, p . 4 8 3 ;

J E L L I N E K , G e o r g .

  Op. cit.,  p . 3 4 1 .

— •  TERCEIRA PARTE  - O  PRESIDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO...

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2 0 0

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

para  a  teoria  d o  poder neutro, porque  a  função peculiar  d o

terceiro neutro  n ão  consiste  e m  atividade contínua  d e  coman-

d o e  regulamentar,  m a s ,  primeiramente, apenas intermediária,

defensora  e reguladora,  e só é  ativa  e m  caso  d e  emergência  e ,

ademais, porque  e la não  deve concorrer  c o m o s  outros pode-

res no  sentido  d e u m a  expansão  d o  próprio poder  e  também

não tem que  normalmente estar,  em seu  exercício,  d e  acordo

c o m a  natureza  d o  assunto, discreta  e  morosa. Apesar disso,

e la  existe  e é  indispensável, pelo menos  n o  sistema  d o  Estado

d e  direito  co m  diferenciação d o s poderes. Aqui  ela é, como j á

sabia Benjamin Constant, mesmo  q u e  essa parte  de sua  teoria

tenha passado despercebida,  u m

  pouvoir préservateur

,  u m

"poder preservador". Evidentemente,  a tal  posição autoritária

compete tanto quanto competiu para  seu  reconhecimento  e

formulação  a intuição  d e Benjamin Constant,  o qual assinalou,

c o m   essa teoria,  a posição  d o  chefe  d e Estado  e m  geral  e m a n -

i g u a l m e n t e  e m u m a  r e l a ç ã o o b je t iv a  c o m  aque la d i fe renc iação ,

pois  o  j u i z  t e m  mui to mais  auctoritas  d o q u e  potestas,  con tudo ,

M o n t e s q u i e u  n ã o  ma i s  s e  lembra disso .  A  t radição a inda re laciona,

p o r  m a i s t e m p o ,  u m  senado  c o m o  c o n c e i t o e s p e c í f i c o  d a

auctoritas,  p o r  m e i o  d o q u e a  o p o s i ç ã o  q u e  a q u i i n t e r e s s a

t r a n s f o r m a - s e f r e q ü e n t e m e n t e  n a  o p o s i ç ã o e n t r e  deliberare  e

agere.  C o m a  n o ç ã o  d c u m  senado l igam-se d ive rsos t ipos  d e

au tor idade , como  o d a  idade ,  o d a  exper iênc ia ,  o d a  sabedor ia  e

o d o  c o n h e c ime n to e x p e r to a p e n a s  como conselho.  B O D I N .  Six

livres  de la  République,  I I I , C a p . 7 , p .  3 6 5 -3 6 6 ,  T  e d . d e 1 5 8 0 ,

a inda conhece  b e m a  d i f e r e n ç a :  " e t  quoy qu 'on  d i t d e l a  pu issancc

d u  Séna t Romain ,  c e  n ' e s t o i t  q u e  dignité, authorité, conseil  e t

pa s  puissance ,  pois para  e l e a  o p o s i ç ã o  s e  t rans fo rma naque la

en t re  conseil  e t  commandement.  Exem plo s pa ra  o  fa to  d e q u e s e

perde toda sens ib i l idade pe la d ive rs idade ob je t iva  s ó  e n c o n t ro

a  p a r t i r  d a  r e v o l u ç ã o f r a n c e s a , e s p e c i a l m e n t e c a r a c t e r í s t i c a  é

u m a  d e c l a r a ç ã o  d e  Gaut ie r (1792)  n o  Dictionnaire  de la  Cons-

titution  sobre  o  vocábu lo "Autor i tc" :  " C e m o t  s ignif ie pouvoir ,

p u i s s a n c e , e m p í r e . "  C o m  i s s o t a m b é m c o m e ç a m  a s  c ô m o d a s

a l te rna t ivas ,  n a s  qua is  s e  reve la  a  fa l ta  d e  t rad ição  d a  mo d e rn a

ciência pol í t ica : autor idade  e  l ibe rdade , au to r idade  e  democrac ia ,

e t c . a t é q u e , p o r f i m , n a  pe le ja  d a s  divisas pol í t ico-par t idâr ias ,  a

p ró p r i a d i t a d u ra  e  a u t o r i d a d e  o u  a u t o c r a c i a  e  a u t o r i d a d e  n ã o

se jam mais d i fe renc iadas .

fLRChlRA PARTE  - O  PRIiSIDENTli  D O  RüiCH COMO GUARDIÃO...

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A  TEO R I A  D O  DIREI TO PÚBL ICO  D O  " P O D E R N E U T R O "

201

leve viva

  u m a

  antiga sabedoria, fundada

  na

  tradição

  da

  estru-

tura estatal romana.

  A

 maioria

  d o s

  chefes

  d e

  Estado

  dos

  sécu-

l o s XI X e XX

  soube ficar atrás

  d e

  seus ministros,

  s e m

  perder

c o m

  isso

  e m

  autoridade.

  M a s u m a

  norma constitucional

  não

pode prescrever  e  forçar  a s  características pessoais neces-

sárias para desempenhar p o r completo o pape d e

 pouvoir neutre,

n e m  tampouco pode prescrever,  p o r  exemplo,  que o  primeiro-

ministro  d o Reich seja u m  grande líder político e determine,  ele

próprio,  as  diretrizes  da política. Porém,  c o m  isso  não se  refuta

n e m o  significado prático  n e m o  teórico  de tal conceito.

Conforme  o direito positivo  da  Constituição  d e  Weimar,  a

posição  do presidente d o Reich, eleito pela totalidade  d o povo,

só  pode  ser construída  c o m a  ajuda  de u m a  teoria mais desen-

volvida

  d e u m

  poder neutro, intermediário, reguladoT

  e p r e -

servador.

  O

  presidente

  d o

  Reich está munido

  d e

 poderes

  que o

tornam_independente

 d o s

 órgãos legislativos, embora esteja

 v in -

culado, simultaneamente,

  à

 referenda

 d o s

 ministros dependen-

tes da

  confiança

  d o

  parlamento.

  O s

  poderes constitucionais

  a

e le

  destinados (nomeação

  d e

  funcionários públicos conforme

artigo  4 6 ,  direito  d e  indulto conforme artigo  4 9 ,  promulgação

d e  leis conforme artigo  70 ) correspondem tipicamente  a o catá-

logo  d e  poderes  d o chefe  d e  Estado, j á  apresentado  po r  Benja-

m in  Constant.'

1

  O  peculiar equilíbrio, freqüentemente discuti-

do , do elemento constitucional plebiscitário c o m o parlamentar,

a  relação  d e u m a  independência  d o parlamento  d o  Reich devi-

d o a o s poderes autônomos  c o m u m a dependência devido à ex i -

gência geral

 d a

 referenda ministerial (artigo

 50 da

 Constituição

do

  Reich),

  a

  execução pelo Reich,

  i.e.,

  proteção

  d a

  Constitui-

ção do  Reich perante  os  Estados  e , por f im, a  proteção  d a

Constituição (diferentemente

  d a

  norma constitucional

  em par -

ticular) conforme

  o

  artigo

  48 da

  Constituição

  d o

  Reich, tudo

isso seria

  u m a

  mistura contraditória

  e

  absurda

  de

  determina-

ções incompatíveis,  sc não se  tornasse compreensível  por in-

termédio dessa teoria.  O s  autores  d a  Constituição  d e Weimar,

na  medida  e m q u e  empreenderam  sua  obra  c o m  consciência

M

  CEuvres politiques,

  op. rir.,

  p. 18.

T E U C í i l R A P A R T E  - O  P R E S I D E N T E  I I O  R E I C H C O M O G U A R D I Ã O . . .  i

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2 0 2

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

sistemática, eram provavelmente conscientes disso. Hugo

Preufi disse

  na

  comissão constitucional (protocolo

  p . 277) que

seria "apenas  u m a d a s  funções  d o  presidente  d o  Reich"  f o r -

m ar um  contrapeso para  o  parlamento  do  Reich. "Além dessa

existe

  a

  mais importante, formar

  u m

  centro seguro,

  u m  pólo

jacente

  na

  Constituição

A essa frase PreuG anexa  a se-

guinte outra observação,  q u e  pressente  o s  fracionamentos  e

dissoluções

  de um

  sistema pluralista

  e a

  necessidade

  de um

antídoto eficaz: "Quanto mais colegiados cooperantes

  os se-

nhores tiverem, quanto mais votações  e m  massa  p o r  intermé-

dio de

 referendos, conselho

 d o

 Reich, conselhos operários,

 etc.,

maior será

  a

  necessidade

  de se ter,  além disso tudo,  um pon-

to

 fixo

  no  qual, pelo menos  na  idéia,  o s  fios irão convergir".

P or conseguinte,  F.  Naumann explicou (protocolo  p .  277/278)

que e le

 gostaria

  de se

  "expressar

  e m

  sentido semelhante sobre

a  questão presidencial".  E le  prevê,  de  forma ainda mais  ev i -

dente

  do que

 PreuB,

 o

 Estado

 d e

 coalizão partidário pluralista

 e

diz ,

 então, literalmente:

  " O

 direito

 d e

  voto proporcional válido

para  a eleição  d o parlamento  d o Reich  e a pluralidade  dos par -

tidos  da í  resultante levam  ao  fato  de que o  Primeiro-Ministro

do

  Reich será

  o

  ministro

  d e

  coalizão. Exatamente

  p o r

  este

motivo far-se-á valer  d e  forma especialmente intensa  a  neces-

sidade  p o r  uma  personalidade  q u e  tenha  o

  todo

  e m  vista."

Nesse contexto encontra-se tanto

  a

  caracterização

  d o

  presi-

dente d o Reich como u m a "grandeza intermediária", u m pouvoir

intermédiaire,

  quanto  a  referência  à  possibilidade,  q u e  nesse

ínterim

  se

  tornou prática

  de um

  parlamento

  d o

  Reich incapaz

de atingir  a maioria:  " O motivo pelo qual  eu creio  q u e precisa-

m o s d e u m   presidente, reside, sobretudo,  n o  fato  de que, na

Alemanha, diante

  da

 pluralidade

  das

 jurisdições,

  n ã o

  podemos

chegar

  à

  completa unidade

  s em o

  presidente. Temos também

que ter  alguém  q u e  cumpra deveres representativos,  q u e m a n -

tenha relações

  c o m  todas  as  partes  do  país

,

  c o m  todos  os

partidos  e ( ) co m os

  Estados estrangeiros

  e que

  represente

u m a  grandeza intermediária  entre  o  parlamento  e o  governo.

Existe  a

 possibilidade

  de que, no

  parlamento

  do

  Reich,

  não

possa

  ser

  encontrada

  uma

  maioria

  e que , por  conseguinte,

  TERCEIRA PARTR

  - O

  PRESIDENTE

  D O

  REICH COMO GUARDIÃO.. .

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A

  T E O R I A

  D O

  D I R E I T O P Ú B L I C O

  D O

  " P O D E R N E U T R O "

n ã o possa, se m mais, ser formado u m governo. Então o presiden-

te tem que se

 tornar eficiente.

  (...)

 Toda

  a

 questão presidencial

n ã o  é  nenhuma questão partidária,  m a s , s i m , u m a  questão

d e

  técnica política

  e

  harmonia."

Isso também

  se

  confirmou,

  e m

  larga escala,

  na

  realidade

prática

  d a

 vida estatal.

  U m a

 grande parte

  da

 atividade tanto

 d o

Presidente Ebert,  que , em um  momento politicamente signifi-

cativo,

  se

  credenciou como guardião

  d a

  Constituição, quanto

d o  atual presidente Hindenburg, pode  se r  caracterizada pela

conciliação neutra

  e

  intermediária

  d e

  conflitos

  e

  teremos

  que

reconhecer  q u e  ambos  os presidentes  d o  Reich, cada  um a seu

modo, melhor cumpriram

  su a

 difícil tarefa

  do que

  alguns

  c h e -

fes de

  Estado

  q u e n ã o

  souberam compreender

  o que

  sobraria

d e  régner,

  caso

  se

  subtraísse

  o  gouverner.

  Posso ainda acres-

centar  à s  exposições  d e minha  Verfassungslehre  (p .  351/352),

q u e

  também pôde

  se r

  justificado,

  so b

  esse ponto

  d e

  vista,

  o

fato d e Simons,  o então presidente  d o  tribunal  d o Reich,  ter se

dirigido

 a o

 presidente

 d o

 Reich

 p o r

 ocasião

 de seu

 conflito

 c o m

o governo  d o Reich  e m dezembro  de 1928. Certamente,  o pre-

sidente

  d o

  Reich

  não e ra

  "competente" para receber

  e

  decidir

"recursos" formais

 d o

  presidente

  d o

  tribunal

  d o

  Estado contra

o

 governo

  d o

 Reich

  e se

 quiséssemos julgar aqui

  sob os

 pontos

d e vista  de um juiz  d o  registro  d e  imóveis,  e le não poderia  ter

dado outra resposta  a não se r que  seriam inadmissíveis tanto

u m  recurso e m geral quanto  su a invocação. Ouve-se ocasional-

mente  que o  presidente  d o  Reich teria  que te r  remetido  o re-

clamante

  " a o s

  trâmites

  d e

  serviço ordinários",

  v ia

  ministro

da justiça d o Reich ou ministro d o interior, e chamado a atenção

para

  o

  caráter inconstitucional

  de seu

  procedimento. Mesmo

e m jornais q u e , fora isso, mostravam grande compreensão pela

personalidade  e pelos esforços d e  Simons,  o  presidente  do tr i -

bunal  d o Reich, encontra-se  a observação  de que "a  invocação

d o

  presidente

  d o

  Reich pelo presidente

  d o

  tribunal

  d o

  Reich

simplesmente n ã o corresponde à Cons t i tu ição"Quando o pre -

15

  F E I L E R ,

  A .  Frankfurter Zeitung,  1 0 d e

  j a n e i r o

  d e 1 9 2 9 , n . 2 4 .

C o m

  r e l a ç ã o

  a

  isso ,

  é

  c o r r e io q u a n d o G 1 E S E ,  Jornal Jurídico

TERCfilKA PARTE  - O  PRESIDENTE  D O  RhICIl COMO GUARDIAO  . . • -

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2 0 4

O  G U A R D I A O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

sidente

  d o

  Reich,

  e m v e z

  disso,

  em sua

  resposta jun to

  à

 decla-

ração

  de que "por

  razões constitucionais,

  não se

 julgaria

  c o m -

petente para  u m a  decisão formal sobre  o  recurso", também

acaba

  p o r

  tomar posição frente

  a o

  assunto

  e dá

  razão

  ao go -

verno  d o  Reich,  m a s  respondendo simultaneamente  a o  presi-

dente

  d o

  tribunal

  d o

  Reich

  d e

  modo pessoalmente transigente,

isso corresponde

  a u m a

  correta concepção

  da

  posição neutra,

intermediária, reguladora  e  defensora  d o  chefe  d e  Estado  e

tem que ser

  compreendido

  e

 justificado

  a

  partir dessa teoria-

16

Alemão  3 4 , 1 9 2 9 , c o l . 1 3 4 , d i z q u e n ã o  seria "possível privar  o

p r e s i d e n t e

  d o

  t r i buna l

  d o

  E s t a d o , c o m o

  u m

  ó rgão supe r i o r

  d o

Rei ch ,

  d o

  d i re i to

  d e

  p r o m u l g a r r e c u r s o s d e s p r o v i d o s

  d a

  f o r m a

presc r i t a sob re v i o l ações cons t i t uc i ona i s r ea i s  o u  s u p o s t a s "  —

m a s p o r q u e  e x a t a m e n t e  a o  p r e s i d e n t e  d o  R e i c h ,  s e  e s t e  n ã o

deve  s e r  "gua rd i ão  d a  Cons t i t u i ção"?  O  própr io S imons ,  o  ant igo

pres i den t e  d o  t r ibunal  d o  Re i ch ,  s e  pos i c i onou  a  respe i to dessa

q u e s t ã o  n a  i n t r o d u ç ã o  a o  s e g u n d o v o l u m e  d a  c o l e ç ã o  " D i e

R e c h t s s p r e c h u n g  d e s  S taa t sger i ch t shofs f t i r  d a s  Deut sche Reich"

(p- 9 e 11)

  pub l i cada

  p o r e l e e H . H .

  Lammers . Suas expos i ções

c u l m i n a m

  n a

  seguinte passagem extremamente acertada:

  " A

  posição

d o

  p r e s i d e n t e

  d o

  R e i c h

  n ã o

  es t á de l imi tada

  n a

  C o n s t i t u i ç ã o

  d e

f o r m a  t ã o  est r i ta  e  r i go rosa  a  p o n t o  d e a  a t iv idade  d e  i n t e rmed i á r i o

a e l e  p ropos t a  s e r  p ro i b i da  p o r  m e i o  d e u m a  no rma j u r í d i ca ,  a o

cont rár io ,  e l a  t e r i a to ta lmente correspondido , segundo  o s  ar t igos

4 2 e 4 8 d a  Cons t i t u i ção  d o  Reich , pe los qua i s  o  p r e s i d e n t e  d o

Rei ch  é o  sup remo gua rd i ão  d e s e u  di rei to  e d e s u a  Const i tu ição ,

a o

  ob j e t i vo

  e a o

  sen t i do

  d a

  p o s i ç ã o

  d o

  ó r g ã o . "

  C o m

  i s so

  e p o r

m e i o

  d a s

  e x p o s i ç õ e s

  d o

  t ex t o ac i ma t ambém pode r i am es t a r

r e s o l v i d a s

  a s

  o b j e ç õ e s

  d e

  G L U M ,

  F .

  Staatsrechtliche

Remerkungen

  zu dem

  Konflikt zwischen

  dem

  Staatsgerichtshof

fiir  da s  Deutsche Reich  und der  Reichsregierung, Ze i t schr .  f ü r

aus l and i sches Of fen t l i ches Rech t  u n d  V õ l k e r r e c h t ,  I , 1 9 2 9 , p .

4 6 6 .  Al iás ,  o própr io Glu m qual i f i ca ,  e m s e u  ar t igo  Parlamentskrise

und

  Verfassungslücke,  Jorna l Jur íd i co Al em ão  d e 1 5 d e  n o v e m b r o

d e 1 9 3 0 , p ,

  1417 / 1418 ,

  o

  p re s i den t e

  d o

  R e i c h

  d e

  " g u a r d i ã o

  d a

C o n s t i t u i ç ã o "

  e

  ret i ra

  d a í

  c o n c l u s õ e s p r á t i c a s

  t ã o

  a m p l a s

  q u e ,

e m

  c o m p a r a ç ã o

  c o m

  e l as , aquela a t iv idade

  d e

  i n t e r m e d i á r i o

  d o

p r e s i d e n t e  d o  R e i c h  e m  d e z e m b r o  d e 1 9 2 8  p a r e c e r i a  d e u m a

na t u ra l i dade d i r e t amen t e anód i na .

P O H L ,  H .  Handbuch  des  deutschen Staatsrechts  I , p . 5 0 2 .  Como

e x e m p l o  d a  é p o c a  d e  f u n ç ã o  d e  Eber t ,  c f . a  carta  a o  g o v e r n o  d a

B a v i e r a  d e 2 7 d e  j u l h o  d e 1 9 2 2  (conf l i to en t re  o  Re i ch  e a  Baviera

TERCEIRA PARTE

  - O

  PRESIDENTE

  D O

  KbICH COMO GUARDIÃO.

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S i g n i f i c a d o e s p e c i a l   d o

p o d e r n e u t r o n o   E s t a d o

p a r t i d á r i o p l u r a l i s t a ,

e x p o s t o   p o r  m e i o  d o

e x e m p l o   d o  c o n c i l i a d o r

p ú b l i c o   d e  c o n t e n d a s

t r a b a l h i s t a s

A

  posição

  que o

  presidente

  d o

  Reich toma, conforme

  o

atual direito positivo  da  Constituição  d e  Weimar,  n o  sistema

global

  da

  organização

  d o

  Reich alemão pode

  se r

  explicada,

portanto,

  com a

 ajuda

 d a

 teoria

 d o

 "poder neutro, intermediário,

regulador  e  defensor". Além disso,  a  fórmula  de um  "poder

neutro",

  que fo i

 primeiramente imaginada apenas para

  o

 chefe

d e

 Estado

  e ,

 para isso, mantém

  seu

 especial significado consti-

tucional, também pode

  se r

  ainda expandida para

  a

  teoria geral

d o

  Estado

  e

  aplicada para

  o

  Estado

  em sua

  totalidade.

  E m

certo sentido, pelo menos

  e m

  alguns Estados,

  o

 destino

  do Es-

tado seguiu  o  destino  d o  chefe  d e  Estado  e o  Estado transfor-

mou-se,

  e m

  larga escala, perante

  o s

  antagonismos sociais

  e

econômicos

  da

 sociedade,

  e m u m a

  instância meramente

  " n e u -

t r a " .  Isso reside  n a  conseqüência  d e u m a  "auto-organização

d a

  sociedade",

  p o r

  meio

  d a

  qual

  a

  questão

  d a

  unidade estatal

tomou

  u m

 rumo totalmente novo,

 m a s

  também

 a

 "neutralidade"

s e  tomou  u m novo problema.  O s  "métodos  de  integração  f u n -

cionais" (eleições, votações, coalizões), assim chamados

  por

R .

  Smend, impuseram-se

  n o

  Estado legiferante atual, para

  a

área  da atividade legislativa, com o efe ito mostrado acima (vide

anteriormente

  na

  presente obra):

  a

  corporação legislativa

  tor-

nou-se  o  reflexo d a  pluralidade  d e  complexos sociais  d e  poder

organizados.  Mas se o  Estado  n ã o  fosse nada mais  do que

esse sistema pluralista,

  e le

  seria, então,

  d e

  fato, apenas

  vim

I t R C EIR A P AR TI ;  - O  P R ES IDENTE  P O  R EIC H C OM O GUAR DIÃO. . .  i

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S I G N I F I C A D O E S P E C I A L

  D O

  " P O D E R N E U T R O "

  N O

  E S T A D O .

2 0 9

correto

  e

 justo

  e

  proporcionar

  a

 vitória

  à

 razão.

  O

 próprio

  J. St.

Mill

  diz que, na

  moderna sociedade industrial,

  o s

  empregado-

r e s

  (employers

 of

  labour)

  e

  empregados (labourers) formam

o s grupos q u e mutuamente  se equilibram e qu e, por meio disso,

toma-se possível  u m a decisão neutra. Ainda hoje,  su a constru-

ç ã o d e  equilíbrio tipicamente liberal  é  muito difundida,  e não

apenas junto  aos  liberais burgueses. Friedrich Engels  j â  havia

falado  q u e  haveria (somente excepcionalmente) períodos  d e

luta  d e  classes,  " em que a s  partes beligerantes manteriam  o

equilíbrio

  u m a c o m a

  outra". Assim, após

  o ano de 1919,

  Otto

Bauer desenvolveu

  a

  teoria

  da

  "estrutura social

  d e

  equilíbrio"

d o

  modemo Estado industrial,

2

  que fo i

  aproveitada

  p o r

  Otto

Kirchheimer para u m a notável construção d a teoria constitucio-

nal e do

  Estado.

3

  A s

  relações partidárias

  na

  Alemanha

  e as

relações numéricas

  d o s

  diversos agrupamentos

  d e

  interesses

parecem confirmar,

 e m

  geral,

  a

 imagem

  d e u m

  equilíbrio, seja

entre empregadores

  e

  empregados, seja entre burgueses

  e so-

cialistas, tanto

  n o

  Reich quanto

  no s

  Estados.

4

  P o r

  meio disso,

2

  B A U E R , O t to .  Bolschewismus  un d  Sozialdemokratie,

  3

a

  e d . ,

V ie n a ,  1 9 2 1 , p . 1 1 4 ;

  Die

  õsterreichische Revolution.  Viena ,  1 9 2 3 ,

p . 1 9 6 ( a

  é p o c a

  d o

  e q u i l í b r i o

  d a s

  f o r ç a s

  d e

  c lasse ) ;  Der  Kampf

X V I I ,  p .  5 7 - 5 8 ; K A U T S K Y ,  K .

  Die  proletarische Revolution  und

ihr  Programm,  B e r l i n ,  1 9 2 9 , p . 1 0 0 ;  A D L E R ,  M a x .  Politische

oder soziale Demokratie,  Ber l in ,

  1 9 2 6 , p .

  112-113; sobre

  a

  crítica,

e m  especia l : GURLAND, Arkadi j . Marxismus undDiktatur,  Leipzig,

1 9 3 0 , p .  9 5 - 9 6 .  D e  f o r m a s e m e l h a n t e  à  d e f i n i ç ã o l i b e r a l  d e

d e m o c r a c i a  d e  Ke lsen menc ionada an te r io rmente , t ambém essa

c o n s t r u ç ã o  d e  e q u i l í b r i o s o c i a l - d e m o c r a t a  h á  m u i to e sq u e c e u

suas re lações s i s temát icas

  e n ã o t e m

  abso lu tamente nada mais

d a  "c la reza o fens iva"  d e  Mill.

3

  Zur  Siaatslehre  de s  Sozudismus  und  Bolschewismus,  Ze i t schr i f t

f ü r  Pol i t ik , XVIÍ ,  1 9 2 8 , p .  5 9 6 - 5 9 7 :  " O  pa radoxo to rnou-se fa to ,  o

va lor

  d a

  decisão res ide

  n o

  f a lo

  d e q u e é u m a

  dec i são ju r íd ica ,

  d e

q u e é  p r o f e r i d a  p o r u m a  i n s t â n c i a u n iv e r s a lm e n te r e c o n h e c id a ,

m a s d e q u e é ,  apesar disso,  o  menos possível, decisão objetiva.

4

  A  c o m p r o v a ç ã o e s t a t í s t i c a e s t á  u m  p o u c o d i f i c u l t a d a d e v i d o  à

d i s t r i b u i ç ã o  e m  m u i t o s p a r t i d o s  e à s  c h a m a d a s l i g a ç õ e s

t r a n sv e r sa i s ,

  m a s o

  f e n ô m e n o s e m p r e p o d e

  s e r

  d i s t i n g u id o ;

  c f .

D I X , A .

  Reichstagswahlen  un d  Volksgliederunx,

  Ttl bin gen (Rech t

u n d  S taa t  n . 7 7 ) , 1 9 3 0 , p . 3 7 ;  S A E M 1 S C H ,  E .

  W er

  vertritt

  das

TERCEIRA PARTIS  - O  PRESIDENTE  IX )  REICH COMO GUARDIÃO.

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litígios entre empregadores

  e

  empregados podem

  se

  transfor-

mar, em  geral,  e m u m  típico retrato  da estrutura estatal, pois  a

"sociedade" que se desenvolveu  n o século X IX e se fez vitorio-

samente valer,

  era ,

  sobretudo, como

  j á

  sabiam Saint-Simon

  e

Lorenz  v o n  Stein,  a  "sociedade industrial".  P o r  conseguinte,

também

  os

 juízes

  e

 conciliadores imparciais obtêm

  e m

  litígios

trabalhistas, perante  os adjuntos  que são os  representantes  dos

empregadores

  e

  empregados,

  u m a

  posição quase simbólica,

mediante  a qual  se  torna visível  a  situação  d e  todo  o Estado  (e

d o  todo estatal).

Nesse aspecto,  se não  levarmos  e m  consideração  o  tribu-

nal do

  trabalho incumbido

  da

  decisão

  d o

  processo,

  já que se

trata  de um  procedimento  d e  justiça, pode raramente  ter no

Estado atual

  u m

  significado típico para

  a

 estrutura estatal,

  e se

nos  limitarmos  a o  conciliador, este surge, assim,  no primeiro

estágio, como mero ajudante

 e

 incentivador

 d e u m a

 negociação

e de um entendimento comuns entre os complexos d e interesses

conflitantes,

 m as que , na

 realidade,

  se

 ajus tam entre

 si

 próprios.

Enquanto durar esse estágio  e le conduzirá  a u m  resultado, isto

é, a um

  acordo entre

  as

  duas partes,

  a u m a

  autoconciliação,

  o

representante  d o  Estado  é  apenas  u m  agente intermediador

e sua

 neutralidade conciliadora

  é a de um

  típico intermediário.

Ainda

  não se

  toma ativa nenhuma superioridade,

  ou a té mes-

m o  autoridade, especificamente estatal, essa neutralidade  é

Volk?,  n a

  r e v i s t a

  Die Tat,

  m a r ç o

  d e 1 9 3 0 , p .

  9 2 0 / 9 2 1 . P a r a

  a

Saxônia ,

  q u e ,

  como Estado industr ia l ,

  é

  aqui

  d e

  especia l in teresse ,

e s s e f e n ô m e n o e n c o n t r a - s e m a n i f e s t o , t a l v e z

  n ã o c o m u m a

in tenção s is temát ica ,

  m a s , e m

  c o m p e n sa ç ã o ,

  d e

  forma ainda mais

c a r a c t e r í s t i c a ,

  n a

  s e g u in t e f o r m u la ç ã o

  n o

  a r t i g o

  d e

  T H Õ R N I G .

Das  sachsische Polizeiwesen,  n a

  co le tânea

  Sachsen, Kultur  und

Arbeit

  des

  sachsischen Landes.  Ber l in ,

  1 9 2 8 . p . 3 8 : " A

  S a x ô n ia

  é

u m

  Estado industr ia l

  c o m

  população ex t raord inar iamente densa .

E m

  par te considerável , es ta per tence

  à

  c lasse operár ia

  e

  cul t iva

a

  c o n c e p ç ã o m a r x i s t a

  d e

  m u n d o . S e u s p a r t i d á r io s e q u i l i b r a m

n u m e r i c a m e n t e , a p r o x i m a d a m e n t e ,

  a

  p o p u l a ç ã o

  d e

  ou t ra o r ien-

tação . I s so mani fes ta - se espec ia lmente

  n a s

  e le ições . Dependendo

d a s

  r e l a ç õ e s m o m e n t â n e a s

  e

  po l í t i cas ,

  n o

  p a r l a m e n to e s t a d u a l

s a x ã o a l t e r n a

  u m a

  m a io r i a f r a c a

  d e

  e s q u e r d i s t a s

  c o m u m a s e -

m e l h a n t e

  d o

  cen t ro" .

•  TERCEIRA PARTE  - O  P R ES IDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO. . .

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determinada,  n a  forma negativa, como  a  neuwaWdade  do ter-

ceiro não-parcia\,  q u e  tira  d o  caminho inibições  d a  autocon-

ciliação  e que ,  exatamente  p o r  meio disso, obtém  a  possibili-

dade  e a  capacidade para "bons serviços" (

bons offices

)  e

"intermediação" (médiation).  N o  direito internacional, cujas

analogias fazem-se aqui valer para  o  direito trabalhista,

5

  isso

enconira-se desenvolvido

  e m u m a

  bibliografia pormenorizada

e u m a

  grande praxe,

  em que os

  bons serviços representam

  o

primeiro subestágio,

  ou

  seja,

 a

 mera reunião

  d a s

 partes litigan-

t es ,

  para

  q u e

  possa haver,

  n o

  geral,

  u m a

  negociação entre

  as

partes, enquanto

  o

  mediador

  j á t em um a

  certa liderança

  a o

conduzir

  a

 negociação

  e

  fazer propostas. Ambos

  sã o

  tarefa

 d o

conciliador estatal, correspondendo  na  típica estrutura  de sua

posição

  a u m a

  determinada concepção estatal,

  se não

  justa-

mente àquela da vigente Constituição d o Reich. A s negociações

para acordo teriam, então, n o atual Estado industrial, u m  signi-

ficado análogo àquele destinado ao parlamento no Estado cons-

titucional burguês  d o  século  X I X , a saber,  ser o fundamento de

u m a  vontade efetuada mediante negóciação  e persuasão'recí-

proca,  e m  cujo cerne reside  um(consensç/não  u m a  decisão.

S e  esse estágio  n ã o  levar  a  nenhum resultado,  o  concilia-

d o r  estatal surge  e m u m a  segunda função,  na  quajele  dá a

decisão  quando ambos  o s  complexos  d e  interesses, iguais  en -

tre si , não  chegam  a um  acordo,  mas se  mantêm opostamente

e m   equilíbrio. Nesse caso,  o  conciliador estatal produz  u m a

decisão a o se colocar  de um ou do outro lado d o balanço. El e é,

assim,  u m  terceiro

 formador

  de

  maioria,

  m a s  esse papel pode

se r  novamente  d e  dois tipos diversos. Primeiramente parece

corresponder àquela construção estatal  de J. St.  Mill: ambos

o s poderes confrontados e determinados d e forma parcial equi-

libram-se mutuamente,  c o m  isso, torna-se possível  a o  terceiro.

5

  A s  analogias entre di re i to in ternacional  e  d i re i to cons t i tuc iona l

fo ram des tacadas an te r io rmente . SCHINDLER, Die t r ich .  Festgabe

fü r  Fritz Fleiner,

  T ü b in g e n ,  1 9 2 7 , p .  400- 401 (d i re i tos emerg en tes ,

cons iderações sobre con tendas  e  r e so lu ç ã o  d e  l i t íg ios  n o  direito

in te rnac iona l

  e n o

  dire i to t rabalhis ta) , chamou

  a

  a tenção para

  a s

re lações en t re d i re i to in te rnac iona l  e  d i re i lo t r aba lh i s ta .

TLR C EIR A P AR IR

  - O

  PRES1DENTK

  D O

  R EIC H C OM O GUAR DIÃO. . .

  •—

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2 1 2

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

objetivo

  e

  imparcial, mesmo

  s e m u m a

  própria superioridade,

provocar  u m a  decisão  e m  favor daquele relativamente corre-

to. O  poder  ou  autoridade pertencente  a  este tipo  d e  decisão

pode  ser  muito pequeno  e  mínimo, pois  os  verdadeiramente

poderosos,

  os

  dois complexos

  d e

  poder

  e

  interesse litigantes,

paralisam-se reciprocamente  e ,  considerados aritmeticamen-

te ,

  resultam

  e m

  zero.

  O

  processo

  d e u m a  vitória  por  maioria

de  votos  pela formação  d e u m a  maioria  é, em  todo caso,  n o

assunto,  sob o ponto  d e vista  d a parte,  u m  processo compulsó-

rio,

  especialmente

  se o

  terceiro formador

  d e

  maioria vier

  d e

fora

  e fo r

  acrescido

  à s

  partes.

6

  O

  acordo assim realizado,

  se-

gundo  o  fundamental conceito formado  po r H .  Triepel,  é um

acordo compulsório.

  Contudo,  o  Estado, formador  d e  maio-

ria, só se  torna  u m  terceiro  q u e  decide

  de

 fora

  sob a influência

da

 concepção pluralista estatal

  q u e

  cada

  v e z

  mais

  se

  expande.

A  concepção estatal democrática  (não a  liberal)  t em que per -

severar  no  axioma democrático fundamental, freqüentemente

mencionado,

  de que o

  Estado

  é u m a

  unidade indivisível

  e de

que a

  parte vencida

  p o r

  maioria

  d e

  votos,

  na

  verdade,

  não é

violentada  n e m  forçada,  m a s  apenas conduzida  a sua  própria

vontade real. Logo,  n ã o  existe

  nenhuma vitória

  por

  maioria

de

  votos

,  m a s  apenas  u m

  acordo

  dado desde  o  início, sempre

existente

  e

  livre

  d e

  desvios errôneos mediante

  votação.  M a s

essa idéia  se  vê-se cada  v e z  mais destruída pelo sistema

pluralista,  o qual  é oligárquico  e não-democrático, pois  o Esta-.

N e s s e c o n t e x t o ,  s ã o d e  g r a n d e i n t e r e s s e  a s  d i f e r e n c i a ç õ e s

e s t a b e l e c i d a s  p o r  C a r l B i l f i n g e r p a r a  o  a c o r d o c o n t i n u a m e n t e

necessá r io den t ro

  d e u m

  Es tado federa l en t re União

  e

  E s t a d o s -

m e m b r o s  e  e n t r e  o s  E s t a d o s - m e m b r o s .  a  r e p r e s e n t a ç ã o  n o

c o n s e l h o

  d o

  R e i c h c o m o c o n c i l i a ç ã o

  d e

  i n t e r e s s e s

  e

  c o m o

r e p r e s e n t a ç ã o .  E m  B i l f i n g e r e n c o n t r a - s e t a m b é m  o  a c e r t a d o

p e n s a m e n t o , a i n d a  a s e r  a p r o v e i t a d o a d i a n t e ,  d e q u e , e m t a l

c o n s t e l a ç ã o ,

  o

  p r i n c í p i o

  d a

  vitória final

  po r

  maioria

  de

  votos

r e p r e s e n t a

  o

  momento

  da

  coação,  d e  m o d o  q u e , n o  c a s o  d a

vi tó r ia  p o r  m a i o r i a  d e  v o to s ,  j á s e  possa fa la r  d e u m  " a c o r d o

c o m p u l s ó r i o "

  n o

  sen t ido

  d e

  Tr iepe l .

  E u s ó n ã o

  e n t e n d o

  p o r q u e

B i l f i n g e r a c r e s c e n t a  a  e s s a c o n s t a t a ç ã o , s u m a m e n t e c o r r e t a  e

o b je t i v a ,

  o

  ad i t ivo ' " fo rmalmente compreendido" (H a n d b u c h

  des

Deutschen Staatsrechis,  v o l . I ,  TUbingen,  1 9 3 0 , p . 5 5 0 ,  n o t a  3 0 ) .

•  TKRCF.IRA PARTE  - O  PRRSJDKNTK  D O  KfclCtl COMO GUARDIÃO.. .

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2 1 1

O

  G U A R D I Ã O

  D A

  C O N S T I T U I Ç Ã O

leria sempre proporcionado

  a

  vitória, pelo

  seu

  voto,

  ou à opi-

nião

  d o

 adjunto

 d o s

 empregadores

  ou à do

  adjunto

 d o s

  empre-

gados.

A  partir d a  referência aos  princípios gerais  d e u m a decisão

colegiada, fica protelada

  a

  questão,

  m as e l a não

  cessa

  de ser

fundamental

  e

  típica para toda

  a

  concepção estatal.

  S e

  partir-

m o s d a

  tese

  de que

  esses adjuntos

  d a s

  partes interessadas,

componentes  de um colegiado formado paritariamente, seriam

assim tanto "órgãos" quanto u m  presidente imparcial, teremos,

p o r

  intermédio

  da

 confusa palavra "órgão"

  e de um ser

  estatal

e objetividade fictícios, resolvido o problema  d e forma t ã o rápi-

da  quanto  a d o  parlamentarismo atual,  ao  dizermos simples-

mente

  que o

  deputado individual, "juridicamente",

  n ã o

  seria,

e m

  absoluto, "parte",

  e le

  seria, antes, segundo

  o

  artigo

  21 da

Constituição  d o  Reich,  u m  representante  d o  povo  e  seria  t a m -

bém um

  "órgão individual", pois

  o

  parlamento seria

  um "ó r -

gão" , o

 Estado

  u m

  "organismo",

  etc .

  Aqui podem

  se

  aliar

  t eo-

rias  d e  órgãos  c o m u m  formalismo  s e m  fundamento,  a f im de

negar o problema c o m a ajuda d e ficções, a o invés de solucioná-

lo .

 Perante

  a

 sentença

  d o

  tribunal

  d o

  trabalho

  d o

  Reich, Erwin

Jacobi aludiu

  c o m

  razão

  a que, na

  sentença arbitral

  da

  instân-

cia de conciliação,  não se trata  d e u m a decisão judicial,  m as de

u m a  conciIiação_de interesses, e_a_ocupação_colegiada_de_tal

posto tèna

  u m

  sentido

  b e m

  diferente_da_pçupação colegiada

efetuadas

 p o r

 juízes. Todavia, Jacobi invoca, simultaneamente,

contra  F .  Haymann,  o  fato  de que  esse trataria  os  adjuntos  d a

comissão

  d e

  conciliação

  " p o r

  demais, unilateralmente, como

7

  E .  J A C O B I ,  Hebdomadário Jurídico,  v o l . 5 8 , 1 9 2 9 , p . 1 2 7 8 ;

H A Y M A N N ,  E .  Die

  Mehrheitsentscheidung

  in

  Rechtsprechung

un d

  Schlichtung

  und der

  Schiedsspruch

  im

  Ruhreisenstreit,

Ber l in  e  Le ipz ig ,  1 9 2 9 , p . 9 , 1 4 , 1 5 ;  S C H I N D L E R ,  D .

  Op. cit

., p.

4 1 6 . A

  p r o g r e s sã o e s t a b e l e c id a

  p o r H .

  H e r r f a h r d t

  -

  a u t o n o m i a

admin is t ra t iva , g rupo  d e  t rabalho, comando arbi t ra l  — t e m o  méri to

d e  d e s t a c a r  o  novo problema es ta ta l , contudo,  e u n ã o a  cons idero

e x p r e s s iv a

  o u

  comple ta , p r inc ipa lmente

  a

  c o m p o s i ç ã o " c o m a n d o

arb i t ra i "  é , e m s i ,  obscura . Sobre  a  s e n t e n ç a  d o  t r ibunal  d o  t rabalho

d o  Re ich da tada  d e 2 2 d e j a n e i r o  d e 1 9 2 9 ,

  vide,

  d e  res to ,  a  cole tânea

d e  G R A U E R T ; M A N S F E L D ; S C H O P P E N .

  Der

  Rechtsstreit

  im

,  TERCEIRA PARTE  - O  PRESIDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO.. .

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S I G N I F I C A D O E S P E C I A L  D O  " P O D E R N E U T R O "  N O  E S T A D O .

2 1 5

representantes  d a s  partes".

1

  M a s  Haymann  v ê c o m  precisão  o

significado objetivo d o  procedimento  e acentua,  po r  isso,  com

razão

  que a

  conciliação, além

  d a

  tarefa

  d o

  "agente honesto",

te m

  ainda

  a

  segunda tarefa autônoma

  d e

  "preparar, eventual-

mente,

  a paz

  forçada". Então,

 o

 voto

  d o

 presidente estatal

  neu-

tro,  isto  é , do não  delegado  p o r  interesses  d a s  partes seria  o de

u m

 "órgão imparcial

  da

 justiça"

  e

 deveria oferecer

 u m a

  garan-

tia  "para  que a opinião  da  maioria represente  u m  acordo justo

d o s  interesses". Isso  é  inteiramente correto  e  acertado.  Eu só

gostaria

  d e

  fazer

  a

  distinção, perante

  a

 bipartição

  d a

  tarefa

  d o

conciliador

  e n o

  interesse

  d o

  esclarecimento teórico-estatal

geral,  a o todo,  d o s quatro graus: após o primeiro grau,  ou  seja,

aquele

  d o

 agente honesto,

  u m

  segundo,

  o d o

 terceiro formador

d e

 maioria

 que é

 decisivo

 n o

 sentido daquela idéia

 d e

 Mill devi-

do a sua  neutralidade  (no  sentido  da objetividade). Depois  se-

g u e u m

  terceiro grau,

  n o

  qual

  o

 Estado aparece,

  d e u m a

  outra

espécie, como terceiro formador

 de

 maioria,

  ou

  seja, como

  ter-

ceiro  n o  sentido  de um  sistema imaginado pluralisticamente,

em que e le se  junta, assim,  aos  complexos sociais  d e  poder

existentes como

  u m

  outro complexo

  d e

  poder, sendo,

  de uma

maneira novamente especial, formador

 d e

  maioria

  e

  decisivo.

Porém, esta última interpretação contradiz  a  concepção ainda

dominante

  n o

  pensamento estatal alemão,

  m a s

  quase

  não se

pode negar  que e la  reside praticamente  na  conseqüência  d e

u m  comportamento  d a s  partes dominadoras  d o  Estado, deter-

minado

  d e

  forma meramente político-partidária. Essas partes,

s e m qualquer consideração a nenhum princípio, sempre somente

Arbeitskampf  Mannhe im,

  1 9 2 9 . O

  lado (eórico-esiataJ

  d o

  problema

n ã o é

  levado

  e m

  conta

  n a

  maioria

  d a s

  discussões. Quando floeniger

(Magazin

  de r

  Wirtschaft,

  1 4 d e

  fevereiro

  d e 1 9 2 9 , p . 2 2 3 ) d i z q u e s e

poderia "dizer muitas coisas

  a

  favor

  e

 contra

  a

  fund ament ação jurídico-

formal", isso está correto,  m a s  mostra apenas  q u e a  q u e s t ã o  n ã o

pode  s e r  solucionada dessa maneira.  A  própria referência  d e  Hoeniger

a o  artigo  196 , § 2

o

, d a  norma constitucional judiciária alemã sofre  d e

semelhante "formalismo", pois,

  n o

  cálculo

  d a

  maior ia

  d e

  votos

  e m

u m

  colegiado judiciário,

  se

  parte

  d a

  igualdade

  e

  homogene idade

  d o s

votos dados,

  m a s n ã o d e u m

  agrupamento

  d e

  interesses pressuposto

dentro

  d o

  "colegiado"

  c o m u m

  presidente "neutro".

TERCEIRA 1'ARTE

  - O

  PRBS1DENTE

  D O

  RfclCH COMO GUARDIÃO.. .

  »

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S I G N I F I C A D O E S P E C I A L  D O  " P O D E R N E U T R O "  N O  E S T A D O .

2 2

S e

  esse sistema conseguir impor para

  o

  processo concilia-

tório

  o

  mesmo resultado

  q u e

  conseguiu para

  o

  parlamentaris-

m o ,

 isto

 é ,

 transformar

 as

 instâncias conciliatórias, assim como

o  parlamento  e m u m  cenário  d o  pluralismo  e  torná-las,  com

isso, incapazes  d e  ação, surge, então, para  o Estado  u m a  alter-

nativa inevitável

 ou

 deixar

 d e

 existir como unidade

 e

 como todo

o u ,

  porém, tentar provocar

  a

  decisão necessária

  a

  partir

  da

força  d a  unidade  e d o  todo. Assim estaria alcançado  o

  quarto

grau  da  neutralidade,  o d e u m a

  decisão aberta

  e

  publicada

pelo Estado,

  na

 qual tanto

 a

 proposta

  d a

  instância conciliatória

quanto  sua  declaração  d e  obrigatoriedade  sã o  apenas obra  d o

Estado.

  Ò

  fato

  d e

  este também

  se

  esconder, assim,

  p o r

  detrás

da  formação majoritária  e ,  como  n o  decreto  d o  presidente  d o

Reich  de 9 de  janeiro  de 1931  (Diário oficial  do  Reich  I, p.

1),  preferir aumentar,  em  caso  d e  necessidade,  o  número  de

membros neutros

  d a

  câmara

  d e

  conciliação

  e

  convocar mais

dois adjuntos imparciais para

  o

  colegiado, nada muda

  na es-

sência deste procedimento:  que se  trata  d e u m a  decisão esta-

tal, a

 qual

  não é o

  resultado

  d o

  entendimento entre

  os

  interes-

sados

  e

  também

  não se

  realiza

  p o r

  mera formação majoritária

entre Estado  e  interessados.  O  fato  de que a  convocação  dos

juízes imparciais para formação majoritária  só  deve sobrevir

quando "parecer urgentemente necessária

  n o

  interesse

  do Es-

tado"  (de  acordo  c o m o  decreto  de 9 de  janeiro  de 1931) e,

como consta  na  fundamen tação oficial,  " s ó  deve  se r usada  em

casos excepcionais", comprova exatamente

  a

  relação

  com a

decisão estatal, cuja imparcialidade

  só

  pode

  ter seu

  ponto

  de

vista  na  base  da  unidade  e  totalidade políticas  e  cuja força  se

prova  n o  caso excepcional.

T al  ponto  d e  vista  é  possível enquanto  o  sistema pluralista

ainda  n ã o  tiver ocupado todas  as  partes  d o  todo estatal,  en -

quanto, ademais,

  a

  multiplicidade

  d o s

  partidos

  os

  impedir

  e

restringir reciprocamente

  e sua

  heterogeneidade filosófica,

econômica,  e tc .  reforçar ainda mais essa restrição recíproca,

m a s ,  sobretudo, enquanto ainda existirem forças  em um  povo

diferentes daquelas  q u e  estão compreendidas  e  colocadas  a

serviço  da  organização partidária  e  essas forças contrárias  da

JhKCKlRA 1'ARTR  - O  PRESIDENTE  D O  RF.ICH COMO GUARDIÃO...  •

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2 1 8

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

Constituição estatal forem colocadas  e m  contato  com um s i s -

tema

  d e

  instituições relativamente estáveis.

  A

 vigente Consti-

tuição  d o  Reich isso tentou  c o m a  ajuda  d o s  elementos

plebiscitários

  de sua

 parte organizacional.

  Já se faz

  referência

a tal

  processo quando

  fo i

 descrita

  a

  oposição entre

  as

  tendên-

cias centrífugas

 que se

 ocultam

  sob a

 palavra "neutralidade",

  a

unidade política  d o  povo imediatamente existente, desejada  e

pressuposta pela Constituição,  e a  unidade,  e o  presidente  d o

Reich eleito  p o r  todo  o povo.

TERCEIRA PART6 - O  PRESIDENTE  D O  RF-ICH COMO GUARDIÃO.

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O

  f u n c i o n a l i s m o

  O

p ú b l i c o   e a s  d i v e r s a s

p o s s i b i l i d a d e s

  d e u m a i _ ,

' i n d e p e n d ê n c i a d o

E s t a d o p a r t i d á r i o   <

p l u r a l i s t a

Quando  o  funcionalismo público surge, tanto  c o m  relação

à s  grandezas ambiguamente chamadas  d e  "neutras", quanto

n a

  questão

  d a

  unidade estatal,

  e m u m

  posto

  d e

  decisão

  -

  pois

o s  conciliadores, assim como  os juízes  d e  nossa jurisdição  tra-

balhista e d e nosso sistema d e conciliação,  são , no geral, retira-

d o s d o

  funcionalismo público

  -

  apresenta-se

  a í u m a

  grande

mudança

  d e

  função

 que ,

  também nesta área, sobrevêm

  de for-

m a  inevitável. Dissolve-se  o  confronto, tradicional  e  estático,

entre Estado,

  i.e.,

  Estado-funcionário monárquico  de um  lado,

e , de

 outro, sociedade,

  i.e.,

  esfera social "livre"

 e

 fundamental-

mente diferente

  d o

  Estado.

  O

  funcionalismo

  n ã o

  mais

  se en-

contra acima  d e u m a  "sociedade" dele separada,  e le não mais

deve, como  n o  Estado monárquico,  t e r uma  posição transcen-

dente perante

  a

  sociedade. Apesar disso,

  é

  mantido conscien-

temente como grandeza imparcial, pois

  e le

  também

  não

  deve,

consoante  a  vontade  d a  Constituição, estar

  abaixo

  da

  socie-

dade.

  A Constituição  d o  Reich contém,  n o s  artigos  129 e 130,

u m a

 garantia institucional

  d o

  funcionalismo

 d e

 carreira

 e , com

isso,

 u m

 elemento constitucional

 d e

 estática

 e

 permanência

 que

n ã o  deve  se r  usado pelos métodos  h á  pouco mencionados  de

"integração funcional".  O s  funcionários  sã o  "servidores  da

coletividade",

  mas sua

  neutralidade

  não é a de um

  mero

  Civil

Service

"

  ou de um

  funcionário técnico. Pelo contrário,

  a

 gran-

d e  tradição d o  funcionalismo d e carreira alemão deve também

T bRCt I RA PA K T K  - O  PRESIDENTE  D O  REICH COMO CUARD1AO.

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2 2 0

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

ser

  continuada

  n o

  Estado democrático.' Após terem caído

  a

base monárquica  e a  separação entre Estado  e  sociedade, isto

1

  S o b r e

  a

  " m o d e r n a m i s sã o

  d o

  f u n c io n a l i sm o p ú b l i c o "

  n a

  A le m a n h a :

K Õ T T G E N ,  A .

  Das

  deutsche Berufsbeamtentum

  und die

parlameniarische Demokratie,  B e r l i n ,  1 9 2 8 , p . 2 4 3 ;  Sàchsische

Schulzeitung

  a n o 9 6 ,

  D r e sd e n , n o v e m b r o

  d e 1 9 2 9 , p .

  7 5 7 / 7 5 8

  e

825/826 (con t ra  a  d i sso lução  d a  s i tuação  d e  f u n c i o n á r i o  e m u m a

s i t u a ç ã o  d e  con t ra to t raba lh i s ta soc ia l po l i t i camente assegurada ,

c o m o d e f e n d i d o

  p o r H .

  P o t t h o f f ) ;

  e

  Handbuch

  de s

  Deuischen

Staatsrechts,  v o l . I I , 1 9 3 0 , p . 1 5 ;  a d e m a i s , Z W E I G E R T ,  E .

  Der

Beamte

  im

  neuen Deuischland,

  e m  " V o l k  u n d  R e i c h  d e r

D e u t sc h e n " , p u b l i c a d o

  p o r B .

  Harms , Ber l in ,

  1 9 2 9 , v o l . I I , p . 4 6 7 :

" N o s s a é t i c a p r o f i s s i o n a l  n ã o s e  t o r n o u m e n o r  p o r  m e i o  d a

C o n s t i t u i ç ã o  d e  Weimar .  A o  con t rá r io ,  e l a s e  e n c o n t r a a p r o f u n d a d a

e

  enobrec ida pe la idé ia

  d e

  d e d i c a ç ã o

  à

  c o l e t i v id a d e . " Z w e ig e r t

t a m b é m f a l a  d o  "nexo in te rno  c o m a  co le t iv idade ,  q u e n ã o  apenas

s e  encontra mais a l to  d o q u e o  n e x o  c o m u m  pa r t ido ,  m a s  t a m b é m

s e

  e n c o n t r a e t i c a m e n te m a i s a l t o

  d o q u e o

  a n t i g o n e x o

  c o m a

p e s s o a  d o  m o n a r c a "  e q u e  p e r m a n e c e u i n t o c a d o m e d i a n t e  a

s u b o r d i n a ç ã o  d o  f u n c i o n á r i o  a  " p o d e r e s p o l í t i c o s a l t e r n a n t e s " .

L E I S E G A N G ,

  H .  Die

  Ethik

  des

  Berufsbeamtentums

  ( n a

  sé r ie

  d e

pa les t ras :  Berufsbeamtentum, Volksstaat

  und

  Ethik,  L e ip z ig ,  1 9 3 1 ,

p . 3 2 ) a t é  m e s m o  d i z :  es ta é t ica  d o  f u n c i o n a l i s m o p ú b l i c o  é  a

única subs tânc ia é t i ca  q u e  su s t e n t a e s se E s t a d o ,  n o  qual , fora

isso, tudo  o q u e  l iga  o s  h o m e n s e n t r e  s i ,  e sp e c i a lm e n te c o n c e p ç ã o

d e  m u n d o  e  r e l i g i ã o , t o r n o u - s e a s s u n t o p r i v a d o " .  A s  d u a s

p a l e s t r a s

  d e

  K A S K E L , W a l t e r .  Beamtenrecht

  und

  Arbeitsrecht,

Ber l in ,  1 9 2 6 , e  G I E S E ,  F .

  Das

  Berufsbeamtentum

  im

  deutschen

Volksstaat,

  B e r l i n ,  1 9 2 9  (ambas pub l icadas pe la casa ed i to r ia l

d a

  L ig a A le m ã

  d e

  F u n c i o n á r i o s ) d e v e m

  s e r

  aqu i espec ia lmente

ci tadas .  D e  maior in teresse  é  t a m b é m  a  e x p o s i ç ã o  d e  M I C H E L ,

E r n s t .  Das

  Beamtenproblem,

  n a  r e v i s t a " D e u t s c h e R e p u b l i k " ,

a n o 3 ,

  a g o s to

  d e 1 9 2 9 , p .

  1501-1502 , po is Miche l reconhece

  e

o b se r v a  a  expressão desc r i t a an te r io rmente  q u e  res ide  n a  "au to-

o r g a n i z a ç ã o  d a  s o c i e d a d e "  e n ã o t e m  n e n h u m a i l u s ã o  d e q u e

v i v e m o s

  e m u m

  "Estado socia l completamente pol i t izado" . Nesse ,

e u  d i r i a , "Es tado to ta l " ,  e l e  c o n s i d e r a  o  f u n c io n a l i sm o p ú b l i c o

d e s t i n a d o

  a

  " to rnar - se ,

  e m

  m e i o

  à

  revo lução soc ia l , ó rgão

  d a p a z

acima  d o s  c o n f l i t o s e c o n ô m i c o s , so c i a i s  e  p o l í t i c o s ,  e  exercer ,

e m  d e t a l h e s ,  o  e n o r m e t r a b a l h o  d e

  apaziguamento

  e m  d iá r ia

c o l a b o r a ç ã o r e s p o n s á v e l "

  ( o s

  des taques fo ram fe i tos

  p o r m i m ) .

S o b r e  a  q u e s t ã o t r a t a d a  p o r A .  K o t t g e n ,  c o m  n o v o s  e  m u i to

no táve i s a rgumentos ,

  n a

  d i s c u s sã o

  d e

  L E I B H O L Z ,

  G  Der

  Begriff

de r

  Reprüsemation,  A r c h .  d . õ f f .  R e c h t s ,  v o l . 1 9 , 1 9 3 0 , p . 3 0 7 ,

,  TERCEIRA PARTE  - O  PRESIDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO.. .

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O  F U N C I O N A L I S M O P Ú B L I CO  E A S  DIVERSAS POSSIBILIDADES. . .  7 9 1 /

s ó é

  possível sobre

  u m a

  nova base.

  A

  nova base distingue-se

pelo fato  de que é o presidente  d o Reich quem,  d e  acordo  c o m

o  artigo  4 6 d a  Constituição  d o  Rcich, nomeia  e  exonera  os

funcionários

 d o

  Reich. Essas duas determinações constitucio-

nais  - o  artigo  130 e o 46 -  estão correlacionadas. Visto  d e

forma prática, ainda assim

  é u m

  obstáculo notável quando

 não

é o  correligionário, tornado ministro,  q u e  nomeia diretamente

o s  funcionários, m a s u m  chefe d e Estado independente d o par-

lamento,

  i.e.,  de um

 partido.

 M a s

 ainda mais importante

 do qu e

essa vantagem prática  é a  relação sistemática entre Estado-

funcionário garantido constitucionalmente

  e u m

  presidente

  d o

Reich  que se encontra sobre base plebiscitária  e que  domina  o

elemento plebiscitário da Constituição  d o  Reich.

C o m  isso tem-se criada  a  única possibilidade imaginável

e m u m a

  Constituição democrática

  d e u m a

  instância

  indepen-

dente,  sem a qual  n ã o pode haver nenhum guardião  d a Consti-

tuição. "Independência"

  é a

  condição fundamental

  e

  todas

  as

propostas  de um  guardião  d a Constituição baseiam-se  na  idéia

d e

  criar

  u m a

  instância

  independente  e  neutra.  M a s ,

  geral-

mente,  n ã o fica nítido  e nã o sistematicamente claro o suficien-

te ,  quantas "independências" existem  na  atual vida estatal  e

porque novas instituições continuam

  a ter que ser

 retiradas

  d o

funcionamento político-partidário e d o sistema pluralista. É qu e

h á

  tipos muito diversos

  d e

  independência, como, p.ex.,

  u m a

independência

  d o juiz,  u m a

  independência diferente dessa

  d o

fiincionário  de  carreira

  e u m a  independência, composta  das

duas,

  d o funcionário  de  carreira judiciário  e,

  além dessas,

u m a  independência  d o  presidente  e dos  membros  d o  tribunal

d e

 contas para

  o

 Reich alemão.

2

  H á ,

  ademais,

  a

  independência

d o  deputado parlamentar

  conforme

  o

  artigo

  2 1 d a

  Constitui-

s o b r e  s e o s  f u n c i o n á r i o s a l e m ã e s  s ã o o u n ã o  hoje representantes

d o

  Es t ado , a inda que ro

  m e

  p o s i c i o n a r

  d e

  f o r m a e s p e c i a l .

  P o r

enquan to , i n s i s to  e m  d i ze r  q u e o s  funcionár ios , como di to pe la

C o n s t i t u i ç ã o ,  s ã o

  servidores,

  c f .

  Verfassungslehre,

  p . 2 1 3 .

2

  A r l i g o

  1 1 8 e 1 1 9 d o

  cód igo o rçamen tá r io

  d o

  Reich.

TERCEIRA PARTE  - O  PRESIDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO...  •

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2 2 2

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

ção do

  Reich

3

  e a

  independência

  e

  liberdade,

  por sua vez de

características especiais,  do  professor  de  escola superior,  a

quem está garantida  a  liberdade  d e  ensino consoante  o  artigo

142 da

 Constituição

  d o

 Reich;

4

 além disso,

 u m a

  independência

do

 parecerista

  e

 perito

, com o resultante  d a  natureza  d o  caso.

5

3

  A

  r e sp e i t o ,  Verfassungslehre,

  p . 2 5 5 .

4

  N o  r e l a to p a r a  a  c o n f e r ê n c i a a l e m ã  d e  p r o f e s s o r e s  d e  d i re i to

público  e m  Munique,  1 9 2 7 , R O T H E N B Ü C H E R , Ka rl . Verõffentlichun-

gen der

  Vereinigung deutscher Staatsrechtslehrer,  c a d e r n o

  4 ,

p .  32 /33 ;  R .  S m e n d ,

  op. cit.,

  p .  5 6 / 5 7 ; S C H M I D T ,  W . A . E .

  Die

Freiheis

  der

  Wissenschaft (Abhandlungen

  zu r

  Reichsverfassung,

e d . p o r W .

  J e l l i n e k , c a d e r n o

  3 ) ,

  B e r l i n ,

  1 9 2 9 , p .

  1 2 6 / 1 2 7 ;

B I E B E R S T E I N ,  F .  Fre iher r Marscha l l  v o n .

  Die

  Geführdung

  der

deutschen Universitat

  n a  r e v i s t a  " D i e  T a t w e l t " , J e n a , j u l h o /

s e t e m b r o ,

  1 9 2 9 , p .

  92 /93 . Mui to ins t ru t ivo para

  o

  p r o b l e m a

  d o

Estado , re l ig iosa  e  f i l o so f i c a m e n te n e u t r o ,  e s u a  r e l a ç ã o  c o m a

e d u c a ç ã o  e a  esco la  é o  ar t igo  d e  G I E S E ,  G .

  Staat, Staatsgedanke

un d

  Staatserziehung,

  n a

  r e v i s t a

  " D i e

  E r z i e h u n g " ,

  a n o 5 , 1 9 2 9 ,

e sp e c i a lm e n te  p . 1 5 3 ,  porém, t e r iam  q u e s e r  d i fe renc iados aqu i ,

d e  f o r m a m a i s d e t a lh a d a ,  o s  d iv e r so s t i p o s  d e  i m p a r c i a l i d a d e ,

s u p r a p a r t i d a r i s m o

  e

  n e u t r a l i d a d e

  ( c f .

  a n t e r i o r m e n te ) .

  D e

  f o r m a

e s p e c i a l m e n t e a c e r t a d a s o b r e  a  ratio  d a  c i ê n c i a a u t ô n o m a ,

S P R A N G E R ,  E .

  Das

  Wesen

  de r

  deutschen Universitãt,  " A k a d e m i s -

ches Deutsch land" ,

  1 9 3 0 , I I I , 1 , p . 5 :

  "Tra ta - se , mais p rec i samente ,

n a  n o r m a  d a  l ibe rdade  d a  c iênc ia ,  n ã o d e u m  d i re i to fundamenta l

i n d i v i d u a l i s t a c o m o  o d a  ü v r e e x p r e s s ã o  d e  o p i n i ã o ,  m a s d o

di re i to v incu la t ivo supra - ind iv idua l

  q u e

  resu l ta

  d a

  objetividade

su p r a - in d iv id u a l

  da

  procura pela verdade. A  ga ran t ia  d a  l ibe rdade

d e  ens ino c ien t í f i co  d o  ar t igo  1 4 2 d a  Const i tu ição  d o  Re ich  é u m a

garan t ia ins t i tuc iona l ( V e r f a s s u n g s l e h r e ,

 p . 1 7 2 ,

  a q u i e s c e n d o

A N S C H Ü T Z .  Kommentar,  p . 5 7 2 ;  G I E S E ,  F .  Kommentar,  p . 2 9 9 ;

K O T T G E N ,  A .

  Mitteilungen

  des

  Verbandes

  der

  Deutschen

Hochschulen,  j a n e i r o  d e  1931) . Sobre  a  re lação dessa l iberdade

a c a d ê m i c a  d e  ens ino  c o m o  p r i n c íp io  d a  l ivre discussão  e  sobre

o  p r i v i l é g i o  d a s  t a x a s u n i v e r s i t á r i a s ,

  vide

  a s  i n t e r e s s a n t e s

e x p o s i ç õ e s

  d e

  S T E I N , L o r e n z

  v o n .

  Lehrfreiheit, Wissenschaft

un d

  Kolleggeld,  Viena,  1 8 7 5  ( l ibe rdade  d e  ensino como l iberdade

d e

  discussão, taxas univers i tár ias como garant ia

  d a

  i n d e p e n d ê n c i a

e  l ibe rdade) .

5

  B E R T R A M ,  A .  Zeitschrift

  für

  Zivilprozess,  v o l . 2 8 , 1 9 2 8 , p . 4 2 1 :

" M a s n o  â m b i to  d a  a d m in i s t r a ç ã o  e m  ge ra l , jus tamente  o  parecer

o c u p a

  u m a

  p o s i ç ã o e s p e c i a l , c o n t a n t o

  q u e n ã o

  s u p o r t e

c o n c e i t u a l m e n t e  u m a  i n s t r u ç ã o . C e r t a m e n t e ,  o  c a r g o su p e r io r

•  TERCEIRA PARTE  - O  PHHSJDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO.

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O  F U N C I O N A L I S M O P Ú B L I C O  E A S  DIVERSAS PQSSIB1UDADFS.

2 2 5

se

  acredita

  te r

 despolitizado todos

  o s

  conflitos constitucionais

quando

  a

 decisão

  é

  conferida

  a u m

  coiegiado

  d e

 juízes funcio-

nários públicos.

  Ma s se fo r

 exigido,

 p o r

 tais motivos,

 u m

 tribu-

na l do

  Estado

  o u

  constitucional para todos

  os

 conflitos consti-

tucionais, esquece-se quase sempre qu e a independência judicial

é

  apenas

  o

 outro lado

  d a

 vinculação judicia l

  à lei e a

 Constitui-

ç ã o n ã o  pode realizar, geralmente,  ta l  vinculação.

6

  Também

não se vê  comumente  as  experiências tidas  na  última década

n a  área  d o s  litígios trabalhistas  e que  conduziram  a u m a  clara

separação entre juiz

  e

  conciliador.

  N a

  verdade,

  o

  anseio

  não é

tanto

  p o r u m a

  instância judicial,

  m a s p o r u m a

  independente

  e

neutra, desejando-se utilizar

  o

  caráter judicial apenas como

  o

meio mais seguro  e  mais nítido  d e u m a  independência garan-

tida constitucionalmente.  P o r  isso, também  n a  maioria  dos ca -

sos, não se  pensa,  d e  modo algum, apenas  n a  independência

judicia]

  n o

  sentido estrito

  d o

  termo,  i.e.,

  na

  independência

  p e-

rante instruções

  de um

  outro cargo

  q u e

  atingem

  o

 exercício

  d e

u m a

  atividade judicial,

  m a s n a

  independência

  d o juiz

  de car-

reira judicial reforçada pela independência  d o  funcionalismo

d e carreira. Destarte, diante  d e tais exigências, pensa-se comu-

mente  e m  reforçar ainda mais, possivelmente,  as  garantias  d o

funcionalismo

 d e

 carreira judicial. Semelhante tribunal

  d o E s -

tado

  ou

  constitucional teria,

  p o r

  exemplo,

  que se r

  protegido

contra

  o

 fato

 de que o

 número

 o u a

 composição

  d o s

 juízes

  ou o

processo podem  ser  mudados  p o r  meio  da lei  ordinária, para

que um  impulso  d o juiz  ou influências semelhantes  n ã o  sejam

possíveis como ocorre, p o r experiência,  e m  casos politicamen-

te

 importantes

  e

 como

  são

 talvez também conhecidos

  d a

 histó-

ria do

  supremo tribunal

  d o s

  Estados Unidos.

1

  P o r f i m ,

  seria

inteiramente conseqüente exigir  que ta l instância seja ocupada

6

  C f .

  anteriormente neste livro.

7

  Dessa for ma,  o  caso  Dred-Scott  d a  época  d a  luta pela abolição

d a

  escravatura (WARREN, Charles .  The  Supreme Court  in the

United States

Boston,  1924 , I I I , p .  22/23)  ou os

  Legal Tender

Cases  d a  época  d a  desvalorização monetária durante  a s  guerras

d e

  secessão

  op. cit.,  p . 244) , c f . no

  início deste livro; também

  a

sentença  d e  Gneist sobre  o s  func ioná r ios  é  também digna  d e

nota neste contexto.

TERCEIRA PARTE  - O  PRESIDENTE  IX >  REICH COMO GUARDIÃO.

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2 2 &

0 _ G U A R D l à g _ ^ Ç 0 N S T l T U I £ Á 0

apenas

  p o r

  sugestão

  d o

  presidente

  ou a té

  mesmo

  d e

  todo

  o

colegiado

8

  ou que se

 complemente,

  n o

  geral, apenas mediante

cooptação.

9

  O

  fato

 d e

  serem exigidas garantias cada

  v e z

  mais

fortes prova apenas  q u e  jurisdição  e estrutura judicial  em su-

gestões  de um  tribunal  d o  Estado  o u constitucional  s ó servem,

na  verdade,  ao  esforço  de, perante  o  funcionamento e a nego-

ciação político-partidários, criar  u m a  instância neutra  e  inde-

pendente

  e u m a

  certa "permanência",

10

  ou

  seja, estática."

8

  Direito  d e  sugestão  d o  presidente  d o  tribunal  d e  contas para  o  Reich

alemão, código orçamentário d o Reich, artigo  119, §2°. Para o planejado

tribunal administrativo

  d o

  Reich (projeto

  de le i

  sobre

  o

  tribunal

administrativo d o Reich de 26 de agosto de 1930 , impresso d o Conselho

d o

 Reich

 n. 155),

 Lassar recomendou

  u m

 direito

 d e

 sugestão semelhante,

n a  publicação LASSAR,  G

  Das

  Reichsverxvaltungsgericht eine Kritik

cies Regierungsentwurfs

Berlin,

  1930, p. 14. O

  direito

  d e

  sugestão

d a s  faculdades  e m  nomeações  é u m  resto  d e s u a  autonomia  q u e

pressupõe

  a

  independência

  d a

  ciência.

9

  E m s e u  r e la to , KELSEN.  Verõffentlichungen Deutscher

Staatsrechtslehrer

caderno

  5 , p . 56 . Até

  agora

  n o

  Reich alemão,

só se  pôde impor  ta l  cooptação para  o  conselho geral  d o  banco

d o

  Reich

  e

  apenas

  s o b a

  pressão

  d a

  política externa

  d o s

  Estados

credores. Are spei to  d e u m a  outra tentativa (frustrada), empreendida

n a

  França, para introduzir

  u m a

  cooptação,

  vide

  nota abaixo.

10

  Expressão  d e R .  Gneist  e m s e u  parecer sobre  o  direito  d e  exame

judicia),

  op. cit., p . 23.

  Gneist rejeita

  o

  exame judicial

  d a s

  leis,

exercido  n o s  Estados Unidos  d a  América, quanto  a sua  razoa-

b i l idade

  e

  ju s t iça

  ( s u a

  r ac iona l idade)

  c o m a

  seguin te funda-

mentação, especialmente interessante para  o  contexto  d a s  expo-

sições

  d o

  texto acima: "Como falta aqui (leia,

  n o s

  Estados Unidos

d a  América),  n o s  fatores  d a  legislação,  a  permanência necessária

para conceder  u m a  garan t ia contra reso luções precip i tadas  e

determinadas  p o r  interesses diversos  d o  corpo legislativo,  t e n -

tou-se, então, mediante  u m a  superior idade  d o s  tribunais como

guardiões para certos limites

  d o

  t ra tado fundamental , manter

algumas vantagens  d a  monarquia hereditária. Certamente, esse

poder transcendente

  n ã o

  cabe para

  a

  organização judicial alemã.

Antes , aquela  última garantia  n a  monarquia hered i tár ia ,  u m

segundo corpo permanente

  e u m

  terceiro eleito, reside

  d e

  forma

mais segura,  e m s u a  cooperação,  n a  legislação,  e l a  pelo menos

permanece tanto tempo quanto insti tuições humanas puderem

assegurar,  n o  geral,  ta l  garantia."

11

  Esse obj et ivo seria alc ança do, todavia ,

  d a

  forma mais segura,

m e d i a n t e  u m a  s e g u n d a  ( o u  p r i m e i r a ) - c â m a r a b a s e a d a  e m

TERClíIRA PARTE  - O  PRESIDENTE  D O  RB1CH COMO GUARDIÃO.

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O

  F U N C I O N A L I S M O P Ú B L I C O

  E A S

  DIVERSAS POSSIBILIDADES.

2 2 7

Todavia,  o  guardião_da Constituição  t em que se r  indepen-

dente  e  político-partidariamente neutro.

  No

  entanto abusa-

se dos  conceitos  de  estrutura judicial  e  jurisdição assim

como  da  garantia institucional  do  funcionalismo  de car-

reira alemão quando

em

  todos

  os

  casos

nos

  quais

por

motivos práticos surgem independência  e  neutralidade

como oportunas  ou  necessárias pretende-se logo introduzir

um

  tribunal

  e uma

  estrutura judicial lotados

  com

  juristas

funcionários

  de

  carreira.

  Tanto

  a

  justiça quanto

  o

  funciona-

lismo  d e  carreira receberão  u m a  carga insuportável  se  todas

as  tarefas  e  decisões políticas, para  as  quais forem desejadas

independência

  e

  neutralidade político-partidária,

  se

  amontoa-

re m sobre eles. Além disso, a instituição d e semelhante guardião

da

  Constituição seria diretamente confrontada

  c o m a

  conse-

qüência política d o princípio democrático. Perante o direito real

e m baixar decretos,  õ direito d é exarrie judicia l pôde  te r  suces-

so político  n o  século  X I X ,  tanto  n a  França quanto  n a s  monar-

quias constitucionais alemãs.

12

  Hoje,

  a

  frente

  da

  justiça

  não

estaria mais direcionada contra

 u m

  monarca,

  m a s

 contra

 o par-

hereditariedade. Como seria pouco possível,  n o s  atuais Estados

democráticos, introduzir

  d e

  novo

  u m a

  câmara

  d e

  pares segundo

o  modelo inglês,  só se  poderia repetir  a  tentativa  d e u m  senado

inamovíve l  n o  t odo  o u e m  par te  e q u e s e  c o m p l e m e n t a  p o r

cooptação.  A  tentativa  f o i  frustrada  n a  França republicana. Pela

norma constitucional  de 24 de  fevereiro  d e 1 8 7 5 ,  foram nomeados

pela assembléia nacional primeiramente

  7 5 d o s 3 0 0

  senadores

para cargo vital ício,  o s  quais dever iam, depois ,  s e r  comple -

mentados

  p o r

  cooptação, enquanto,

  d e

  resto,

  a

  maioria

  d o

  senado

resultava  d a s  eleições.  M a s u m a  norma const i tucional  de 9 de

dezembro  de 1884  afastou essas restrições  d o  princípio democrático

d a  eleição. Porém,  o s  membros nomeados vitaliciamente perma-

nece ram  e m s u a  pos ição inamovíve l ,  s ó q u e , n o  caso  de sua

ausência,

  n ã o

  foram complementados novamente.

  O

  último desses

senadores inamovíveis morreu  h á  apenas alguns anos.

1 2

  Para

  a

  França,

  cf . a

  observação sumamente acertada

  d e

  LEROY,

Máxime.  Les  transformations  de la  puissance publique.  Paris,

1907 , p . 97 : o s

  tr ibunais franceses ocuparam

  e m 1 8 2 9 o

  lugar

vago  d o

  Sénat conservateur

para  a  Alemanha ,  o  muitas vezes

citado parecer  d e R .  Gneist,  e m  especial também  o  local informado

logo atrás

  e m

  nota anterior.

TERCEIRA PARTE  - O  PRESIDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO.. .  •

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2 2 8

O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

lamento, isso significa

  u m a

 grave mudança funcional

  d a

  inde-

pendência judicial. Também aqui caiu

  a

 antiga separação entre

Estado  e  sociedade  e não se  pode simplesmente transferir  as

fórmulas  e o s  argumentos  d o  século  X I X à  situação política  e

socialmente totalmente transformada  d o  século  X X . A  neces-

sidade

  d e

  instituições estáticas

  e de um

  contrapeso para

  o par -

lamento  é  hoje  n a  Alemanha  u m  problema  d e  características

b e m  diferentes  d o  controle  d o  monarca naquele tempo. Isso  é

válido tanto para

  o

  direito judicial

  d e

  exame, geral

  e

  difuso,

quanto para  o  controle concentrado  e m u m a única instância. A

partir  da concentração  d e  todos  os conflitos constitucionais  e m

u m

  único tribunal composto

  p o r

  funcionários

  d e

  carreira

inamovíveis  e , nessa base, independente, seria criada  u m a s e -

gunda câmara, cujos membros seriam funcionários d e  carreira.

Nenhuma estrutura judicial poderia ocultar o fato de qu e se trata-

ria, em tal

 tribunal

  d o

 Estado

  ou

 constitucional,

  d e u m a

  instân-

cia de  alta política dotada  d e poderes legislativos constitucio-

nais.  D o  ponto  d e  vista democrático, seria praticamente

impossível transferir tais funções

  a u m a

  aristocracia

  da

  toga.

TERCEIRA PARTE

  - O

  PRESIDENTE

  D O

  REICH COMO GUARDIÃO.

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o

O

  e m b a s a m e n t o

  p

d e m o c r á t i c o   d a ^

p o s i ç ã o   d o < ;

P r e s i d e n t e   d o   R e i c h   C J

A  independência  d o s  juízes  não tem, no  Estado atual,  d e

form a alguma

  o

 objetivo

  d e

  criar

  u m

  titular

  d a

 correta volição

política,  m a s d e  delimitar  e  garantir  u m a  esfera da justiça  vin-

culada  à lei  dentro  de um se r estatal ordenado. Outros tipos  d e

independência

  tê m

  outras funções, entre elas, como mostrado

anteriormente, também precisamente

  a d e

 possibilitar

  u m a fo r -

te volição política, independente  d o s  métodos  d o Estado parti-

dário pluralista, métodos estes  d e  dissolução  d o  Estado. Isso,

freqüentemente, não é levado e m conta e m virtude d a confusão

entre neutralização, despolitização partidária

 e

 despolitização,

1

m a s s e

 distingue

 d e

  imediato quando

 é

 observado

  que às

 diver-

sa s  independências correspondem diversas  inamovibilidades

mesmo  se nem  sempre sistematicamente refletidas  e  realiza-

d a s ,  imunidades  e -

  para

 o que ,

 porém, parece existir

 na

 Alema-

1

  Especialmente,  o  tratado  d e  W1TTMAYER,  L .

  Reichsverfassung

und  Politik Tiibingen,

  1 9 2 3

  ( "Recht

  u n d

  Staat" , caderno

  2 4 )

s o f r e  c o m a  i n f e l i z e q u i p a r a ç ã o e n t r e " d e s p o l i t i z a ç ã o "  e

" des po l i t i z ação pa r t i dá r i a " ; s ob re e s s a equ ipa ração ,  vide

an t e r i o rmen te  n o  presente l ivro . Também  é u m  erro quando

W i t t m a y e r

  c r ê q u e

  " a n c o r a m e n t o s "

  n a

  Cons t i tu ição se r iam

"despoli t izações", eles podem conduzir justamente

  a u m

  novo

t i po  d e  a ç ã o p o l f t i c o - p a r t i d á r i a ;  a  r e s p e i t o , P O P I T Z ,  J .

Verfassungsrecht  und  Steuervereinheitlichungs^exetz Deutsche

Juris ten-Zeitung,  1 9 2 9 , p . 2 0 .  Política  e  política partidária  n ã o

s ã o a  mesma coisa.

TERCEIRA PARTE

  - O

  PRBSIDF.NTR

  D O

  REICH COMO GUARDIÃO.

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O  G U A R D I Ã O  D A  C O N S T I T U I Ç Ã O

n h a

  pouca compreensão

  e

  inclinação

  —

  incompatibilidades.

2

Sobretudo,

 e m

 todo caso,

 o

 direito público alemão conhece

 u m a

incompatibilidade  da posição  d o presidente  d o Reich  com a de

u m   deputado  d o  parlamento (artigo  44) . Seu  sentido político

reside no fato de que , aqui, a autonomia d o sistema plebiscitário

introduzido pela Constituição se manifesta perante o parlamen-

tar. E la

 alude

 a u m a

  independência político-partidária,

  m as não

apolítica.

3

 E m

 contrapartida,

 a

 incompatibilidade introduzida para

os  membros  d o  tribunal  d e  contas (artigo  118 do  código orça-

mentário

  d o

  Reich)

  tem o

  sentido

  d e u m a

  despolitização.

  E m

outros casos

  d e

  incompatibilidades

 j á

  tratados deve

  ser

  alcan-

çado  u m  afastamento d a máquina político-partidária, assim o é

no  banco  e n a  companhia ferroviária  d o  Reich. Enquanto  e m

outras democracias ainda existe, d e maneira muito natural, u m a

série

  d e

  incompatibilidades

  d e

  funcionários públicos,

  n a A l e -

manha

  são

  pouco conhecidas.

  N o

  entanto, merece menção

  o

fato de que , recentemente,  fo i proposta, p o r u m lado conceitua-

do , um a

 incompatibilidade parlamentar geral para funcionár ios

públicos judiciais.

4

 Evidentemente, para membros de um  tribu-

2

  Trata-se,

  a í ,

  principalmente,

  d e

  incompatibilidades parlamentares,

mencionadas  p o r  WEBER, Werner. Arch.  d . õ f f .  Rechts,  N. F . ,

v o l .  19,1930,  p .  161-254.

J

  Mui to

  b o m é o

  escrito

  d e

  W E B E R ,

  W .

  Op. cit.,

  p . 2 0 5 ,

  nota

  116:

N a  Alemanha , pode  a t é s e r q u e a  idéia  d a  d i fe renc iação  d o s

poderes  e a  tendência  p o r  neutralidade  se  equilibrem mutuamente

para justificar

  a

  incompatibilidade presidencial, contudo, ambas

n ã o s e

  de f ron tam i so ladamente ,

  m a s s e

  c o m p l e m e n t a m

  e se

condic ionam rec iprocamente ."

4

  SCH IFF ER, Eugen.

  Entwurf eines Gesetzes  zu r  Neuordnung  des

deutschen Rechiswesens 1928 , p . 1

  (artigo

  16) :

  "Juízes

  n ã o s ã o

elegíveis,  n e m  para  o parlamento  d o  Reich,  n e m  para  o  parlamento

estadual. Eles  n ã o  podem  se r  membros  d e  organização política  e

n ã o

  p o d e m

  s e r

  po l i t i camente a t ivos

  d e

  modo pub l i camente

pe rcep t íve l . "  A  i sso  s e  ac rescen ta  a  f u n d a m e n t a ç ã o  na p . 29

sobre  a  re t i rada  d a  função jud ic i a l  d a  pol í t ica .  C f . ,  ademais ,

KÕTTGEN,

  A .

  Das

  deutsche Berufsbeamtentumunddieparlamen-

tarische Demokratie Berlin,  1 9 2 8 , p .  105-106  e  Handbuch  des

Deutschen Staatsrechts vol . I I , p .

  17/18. Bibliografia adicional

c m  W E B E R ,  W .

  Op. cit.,

  p .  208/209.

TRRCtlRA PARTE  - O  PRESIDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO..

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O  E M B A S A M E NT O D E M O C R Á T I C O  D A  P O S I Ç Ã O  D O  P R E S I D E N T E ,

1

n a l

 constitucional estão dispostas

 as

  mais rígidas incompatibili-

dades mesmo onde,  d e resto,  o  sentido  por  claras separações  é

pouco desenvolvido.

5

N o s

  diversos casos

  d e

  "independência", portanto, tem-se

q u e  observar  e m  primeiro lugar  se a  independência deve  c o n -

ceder, somente defensiva e  negativamente,  u m a  proteção

  con-

tra

  a volição política  ou se, ao  contrário,  é garantida u m a

 par-

ticipação positiva  autônoma  n a  determinação  o u  influência

d a

  volição política.

  A

  independência judicial

  é

  tão-somente

  o

outro lado

  da

 vinculação judicia l

 à lei e,

 nesse ponto, apol ítica/

M a s , d e

  resto,

  é d e

  grande importância

  q u e

  tanto

  a

  indepen-

dência  d o  funcionário  d e  carreira quanto  a  independência  d o

deputado parlamentar  e , por f im,  também  a  posição  d o  chefe

d e

  Estado, protegida

  p o r u m a

  difícil revocabilidade

  e por pri -

5

  Artigo  4

o

, § 2

o

, da Le i do  Reich  de 9 de  abril  d e 1 9 2 1  sobre  o

tribunal

  d o

  Estado, Diário oficial  do  Reich:  "Elegíveis

  s ã o

  alemães

q u e  comple ta ram  os 30  anos  d e  vida. Membros  d o  governo  d o

Reich,

  d o

  parlamento

  d o

  Reich,

  d o

  conselho

  d o

  Reich,

  d o

  conselho

econômico  d o  Reich,  d e u m  governo estadual,  d e u m  parlamento

estadual

  o u d e u m

  conselho estadual

  n ã o

  p o d e m

  s e r

  adjuntos."

Além disso,  o  artigo  6 1 d a  Const i tuição  d o  Es tado  d e  Baden,

artigo  6 7 d a  Consti tuição  d o  Estado  d e  Mecklenburg-Schwerin,

L e i  t checo-es lovaca  de 9 de  março  d e 1 9 2 1  sobre  o  tr ibunal

constitucional, artigo  I

o

, § 6

o

:  "Membros  d o  tribunal constitucional,

assim como substitutos,

  s ó

  podem

  s e r

  pessoas juristas, elegíveis

para  o  senado,  q u e n ã o  se jam membros  d e u m a d a s  ci tadas

corporações legislativas" (EPSTEIN,

  p . 21 ) ;

  art igo

  147, § 4

o

, da

norma constitucional federal austríaca  n o  texto  de 7 de  dezembro

d e 1 9 2 9 (Diário oficial federal,  1929 , p .  1323).  D e man eira diferente,

o

  artigo

  7 0 d a

  Constituição

  d a

  Baviera

  e

  artigo

  2

o

, n. 3, da lei de

11 de  j unho  de 1920.

6

  E m  minha opinião vai-se longe demais, apesar disso, quando

SMEND. Rudolf .  Verfassungsrecht

p .

  69-70,

  d i z q u e a

  atividade

d o  juiz serviria, diferentemente  d a  atividade  d e  outras repartições

públicas estatais,  n ã o à integração  d a comunidade jurídica política,

m a s ,

  pr imeiramente ,

  à

  integração

  d e u m a

  comunidade jurídica

espec ia l . I s so t ambém poder ia , ce r tamente , conduz i r  a u m a

dissolução pluralista

  d o

  Estado.

  O s

  muitos ramos

  e

  áreas especiais

d o  direito material,  a o s  quais correspondem, novamente, inúmeras

jurisdições  d e  exceção, representariam então, igualmente, muitas

comunidades .

TERCEIRA PARTI:

  - O

  PRESIDENTE

  D O

  REICH COMO (JUARDIÁO.

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2 3 2

0 _ G U ^ D I ^

=

0 A

s

£0NSTITU ^^

vilégios especiais, estejam estritamente ligadas  c o m a  idéia  d o

todo  da  unidade

  política.

  A

 Constituição

  d e

  Weimar

  diz : O s

funcionários públicos

  são

  servidores

  da  totalidade

,

  não de um

partido" (artigo

  130) . O s

 deputados

 s ão

 representantes

 d e  todo

o

  povo" (artigo

  21) . O

  presidente

  d o

  parlamento

  d o

  Reich

  é

eleito pela

  totalidade

  d o  povo alemão" (artigo  41) e  represen-

ta o  Reich alemão  n o  exterior (artigo  45) . A referência à_tota-

lidade  da  unidade política sempre contém  u m a  oposição  aos

agrupamentos pluralistas

  da

  vida social

  e

  econômica

  e

  deve

provocar

  u m a

  superioridade sobre semelhantes agrupamentos.

Quando isso

 não f o r o

 caso,

  a

 adoção superficial

 d e

 tais formas

constitucionais atua

  ou

  como

  vã

  ficção

  ou

  expressa apenas

  a

objetividade  d o  parecerista imparcial, assim  o é  para  o s m e m -

bros  d o conselho econômico provisório d o Reich, para o s quais

o

  artigo

  5

o

  d o

  decreto

  de 4 de

  maio

  de 1920

  determina igual-

mente

  qu e

  esses membros

  sã o

  "representantes

  d o s

  interesses

econômicos

  d e

  todo

  o

 povo".

7

É só em uma  relação  de  comparação entre tais determina-

ções  que se  distingue  a posição  q u e  compete  ao  presidente  d o

Reich

  d e

  acordo

  c o m a

  Constituição

  d e

 Weimar.

  O

  presidente

d o

 Reich encontra-se

  n o

  centro

  d e

  todo

  u m

  sistema

  d e

  neutra-

lidade e independência político-partidárias, construído sobre u m a

base plebiscitária.  O  ordenamento estatal  d o  atual Reich  ale-

m ã o  depende dele  na  mesma medida  em que a s  tendências  d o

sistema pluralista dificultam, o u a té mesmo impossibilitam, u m

funcionamento normal  d o Estado legiferante. Antes  que se ins-

titua, então, para questões

  e

 conflitos relativos

  à

  alta política,

7

  Contrariamente

  a

  GLUM,

  F .

  Der

  deutsche

  und der

  franzõsische

Reichswirtschafisrat

B e i t r a g e

  z u m

  õ f f e n ü i c h e n R e c h t

  u n d

Voikerrecht . caderno  12, p .  25-26, Berlin,  1 9 2 6 , n ã o  vejo aqui

n e n h u m c a so  d e  a u t ê n t i c a r e p r e se n t a ç ã o  e n ã o  c o n s i d e r o

interesses econômicos "representáveis"

  n o

  sent ido específ ico

d a

  palavra.

  Vide

  também nota feita anteriormente

  n o

  presente

livro. Sobre  o  conselho econômico  d o  Reich conto órgão pare-

cerista  e  consultor (contrariamente  a u m  parlamento econômico),

H A U B O L D ,

  W .

  Dia

  Stellung

  des

  Reichswirtschaftsrates

  in der

Organisation  des  Reiches

Tese

  d a

  Escola Superior

  d e

  Comércio

d e  Berlin,  1931 .

TERCEIRA PARTE  - O  PRESIDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO.

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O

  E M B A S AM E N T O D E M O C R Á T I C O

  D A

  P O S I Ç Ã O

  D O

  P R E S I D E N T E .

2 2 2

u m

  tribunal como guardião

  d a

  Constituição

  e , po r

 meio

  d e

  tais

politizações,  se onere  e coloque e m  risco  a justiça, dever-se-ia,

primeiramente, lembrar desse conteúdo positivo

  d a

  Constitui-

ção de

  Weimar

  e de seu

  sistema constitucional. Consoante

  o

presente conteúdo

  d a

  Constituição

  d e

  Weimar,

  j á

  existe

  u m

guardião

  d a

  Constituição,

  a

 saber,

  o

  Presidente

  d o

  Reich.

  Tan-

to o

 elemento relativamente estático

 e

 permanente (eleição

  por

7  anos, difícil revocabilidade, independência d e maiorias parla-

mentares alternantes), quanto

  o

  tipo

  d e

  seus poderes

  (a s com-

petências segundo  o s  artigos  45 e 46 da Constituição, dissolu-

ç ã o d o  parlamento  d o  Reich segundo  o  artigo  25 e  instituição

d e

 plebiscito segundo

  o

 artigo

 7 3 d a

 Constituição, assinatura

  e

promulgação

  d e

 leis segundo

  o

 artigo

 7 0 ,

 execução pelo Reich

e proteção d a Constituição segundo o artigo  48) têm o objetivo

d e

 criar

 u m

 órgão político-partidariamente neutro devido

 a sua

relação direta

  c o m a

  totalidade estatal,

  o

  qual, como

  tal, é o

defensor  e  guardião  d a  situação constitucional  e d o  funciona-

mento constitucional  d a s  supremas instâncias jurídicas  e , em

caso

  d e

  necessidade, está dotado

  d e

  poderes eficientes para

u m a  proteção efetiva  d a  Constituição.  É  expressamente deter-

minado pelo artigo

  4 2 q u e p o r

  meio

  de seu

 juramento

  o

  Presi-

dente

  d o

 Reich "defenderá

 a

 Constituição".

  O

 juramento polí-

tico sobre a Constituição fa z parte, segundo a tradição d o direito

constitucional alemão,

  d a

  "garantia

  da

  Constituição"

  e o

  texto

escrito

 d o

 regulamento constitucional vigente qualifica

 o

 Presi-

dente  d o  Reich,  d e  forma nítida  o  suficiente,  d e  guardião  d a

Constituição.  N ã o se pode ignorar essa autêntica palavra cons-

titucional,

 n ã o

 importando com o

 se

 avalia,

 d e

 resto,

 o

 significa-

d o d o

 juramento político.

O  fato d e o  presidente  d o  Reich  ser o guardião  d a  Consti-

tuição corresponde, porém, apenas também

  a o

 princípio demo-

crático, sobre

  o

  qual

  se

  baseia

  a

  Constituição

  d e

  Weimar.

  O

presidente  d o  Reich  é  eleito pela totalidade  d o  povo alemão  e

seus poderes políticos perante

  as

  instâncias legislativas (espe-

cialmente dissolução  d o  parlamento  d o  Reich  e  instituição  de

u m  plebiscito)  s ã o ,  pela natureza  d o s  fatos, apenas  u m  "apelo

a o

  povo".

  P o r

  tomar

  o

  presidente

  d o

  Reich

  o

  centro

  de um

TERCEIRA PARI  £ - O  PRESIDENTE  D O  REICH COMO GUARDIÃO.

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G U A R D £ 0 ^

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sistema

  d e

  instituições

  e

  poderes plebiscitários, assim como

político-partidariamente neutro, a vigente Constituição d o Reich

procura formar, justamente  a  partir  d o s  princípios democráti-

cos , um

 contrapeso para

  o

 pluralismo

  d o s

 grupos sociais

 e e c o -

nômicos

  d e

  poder

  e

  defender

  a

  unidade

  d o

  povo como

  u m a

totalidade política. Talvez  se possa duvidar  de que , co m o t em-

po ,  será possível privar  a  posição  do  presidente  d o  Reich  d o

funcionamento político-partidário

 e

 mantê-la

  e m u m a

 objetivi-

dade

  e

 neutralidade imparciais, determinadas

  a

 partir

  d a

  totali-

dade estatal. Talvez  se  possa temer  que o  destino  d o  chefe  d e

Estado  n a  Europa republicana seguirá  o  destino  d o  monarca  e

que o

  destino

  d o

  presidente plebiscitário

  do

  Reich seguirá

  o

destino

  de até

 então

  d o

 plebiscito sobre

  o

 referendo, plebiscito

este  que f o i  também reduzido  à  inatividade.  E m  todo caso,  a

Constituição  d e  Weimar empreende  s u a  tentativa  d e  maneira

muito consciente, mais precisamente

  c o m

  meios especifica-

mente democráticos.

  E la

  pressupõe todo

 o.

 po.vo.alemão como

u m a

 unidade capaz

  d e

 ação direta, nSo_me.díada

 só. p o r

  organi-

zações sociais  e m  grupos,  q u e  pode expressar s u a  vontade  sua

vontade  e que , no  momento,  da  decisão, despreza  as  divisões

pluralistas, possa

  se

  exprimir

  e

  se-fazetrespeitar..A Constitui-

çã.o busca, e m especial, d_ar à autoridade do.presidente.do Reich

a  possibilidade  de se  unir diretamente  a  essa vontade política

da  totalidade  do  povo alemão  e  agir,  p o r  meio disso, como

guardião

  e

  defensor

 d a

 unidade

  e

 totalidade constitucionais

  d o

povo alemão.

  A

  esperança

  d e

  sucesso

  de tal

  tentativa

  é a

  base

sobre  a qual  se  fundam  a  existência  e a  continuidade  d o  atual

Estado alemão.

Impresso

  e m

  outubro

  d e

  2006

•«  TERCE IRA PARTE  - O  PRESiDENfF.  D O  REICH COMO GUARDIÃO.

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D i r e i t o P e n a l L i b e r t á r i o

\X 'mh ' i cd Hassemcr

T e o r i a  d a  C o n s t i t u i ç ã o

H a n k M i c h c l m a n

A

  g r a m á t i c a

  d a

  C o n s t i t u i ç ã o

e d o

  D i r e i t o