SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

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ROGÉRIO MATOS DOS SANTOS PROJETO ESTRATÉGICO GUARANI: uma análise sobre a situação atual e os impactos da conjuntura no seu prosseguimento Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia. Orientador: Cel Alexandre Guimarães Reis. Rio de Janeiro 2015

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ROGÉRIO MATOS DOS SANTOS

PROJETO ESTRATÉGICO GUARANI : uma análise sobre a situação atual e os impactos da conjuntura no seu prosseguimento

Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia.

Orientador: Cel Alexandre Guimarães Reis.

Rio de Janeiro 2015

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C2015 ESG

Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitido a transcrição parcial de textos do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos neste trabalho são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG _________________________________

Rogério Matos dos Santos

Biblioteca General Cordeiro de Farias

Santos, Rogério Matos dos.

Projeto Estratégico Guarani: uma análise sobre a situação atual e os impactos da conjuntura no seu prosseguimento/Coronel Rogério Matos dos Santos. - Rio de Janeiro: ESG, 2015.

49 f.: il.

Orientador: Coronel Alexandre Guimarães Reis. Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao

Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), 2015.

1. Projeto Estratégico Guarani. 2. Soberania. 3. Base Industrial de Defesa. I.Título.

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À minha amada e dedicada esposa

Adriana pelo amor, carinho, apoio, ajuda

e compreensão evidenciados durante a

realização deste trabalho além da

abnegação na criação de nosso primeiro

filho e cuidado com seus pais.

Aos meus amados filhos Thiago e

Mateus pelo amor, afeto e carinho pelo

pai, mesmo não tendo recebido todo o

tempo de atenção e dedicação que

merecem.

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AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, professores, instrutores e chefes de todas as épocas por

terem sido responsáveis por parte considerável da minha formação e do meu

aprendizado.

Ao Coronel Alexandre Guimarães Reis, orientador desse trabalho, pela

paciência, orientações, sugestões e liberdade a mim dispensadas ao longo do

caminho que levou à conclusão da monografia.

Aos amigos Coronel Engenheiro Militar ARMANDO MORADO FERREIRA,

ex Gerente Técnico do Projeto Estratégico Guarani e Coronel Cavalaria Taylor de

Carvalho Neto, atual Supervisor do Projeto Estratégico do Exército Guarani por suas

valiosas e inestimáveis contribuições durante todas as fases desse trabalho.

Ao Corpo Docente e ao Corpo Permanente da Escola Superior de Guerra

pelos ensinamentos e pelo trabalho diário que permitiu aos Estagiários da TURMA

DESTINOS DO BRASIL realizar o CAEPE nas melhores condições possíveis.

Aos estagiários da melhor Turma do CAEPE de todos os tempos – TURMA

DESTINOS DO BRASIL - pelo convívio harmonioso de todas as horas e pelas

contribuições na elaboração da obra.

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RESUMO

O Brasil já foi um grande produtor e exportador de Material de Emprego Militar

(MEM). Fruto de um Projeto de Estado, apoiado pelas Forças Armadas, as

empresas brasileiras que integravam a Base Industrial de Defesa (BID), como a

AVIBRAS, ENGESA e EMBRAER, fabricavam e vendiam produtos de alto valor

agregado. Tais empresas atingiram o seu ápice de suas produções no período entre

o final dos anos 1970 e até o final dos anos 1980. Porém aspectos conjunturais,

tanto internos quanto externos, contribuíram para o desmantelamento da BID, no

início dos anos 1990. A partir daí, o Brasil passou a comprar seus MEM no mercado

internacional. Em meados de 2006, o Exército Brasileiro iniciou o projeto da Nova

Família de Blindados sobre Rodas (NFBR), chamado de Projeto Guarani, com o

objetivo de substituir as viaturas blindadas até hoje em uso a mais de 40 anos e já

obsoletas. Tal projeto está em andamento e tem previsão de vigência até 2045.

Neste trabalho, o autor apresentar o histórico do projeto e sua situação atual,

analisando os aspectos que o levaram a promover o renascimento da industria de

blindados no país. Após isso, analisa-se a conjuntura nacional e a internacional,

como forma de entender os possíveis óbices ao prosseguimento do Projeto Guarani.

Como conclusão, correlaciona-se o momento atual com o vivido antes do

desmantelamento, ocorrido início dos anos 1990, indicando as similaridades entre o

passado e o momento atual, com foco em apontar caminhos possíveis a serem

trilhados para assegurar o prosseguimento do projeto.

Palavras chave: Projeto Estratégico Guarani. Nova Família de Blindados sobre

Rodas. Base Industrial de Defesa.

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ABSTRACT

Brazil was the a major producer and exporter of rockets, tanks, aircraft, weapons and

ammunition. Result of planning, supported by the Armed Forces, Brazilian companies

that were part of the Defense Industrial Base (IDB), as AVIBRAS, ENGESA and

EMBRAER, manufactured and sold high value-added products. Such companies

reached their peak of their production in the period between the late 1970s and the

late 1980s. But conjunctural aspects, both internal and external, have contributed to

the dismantling of the IDB in the early 1990s. Since then, Brazil has to buy their MEM

in the international market. In mid-2006, the Brazilian Army initiated the project of

New Armored Family on Wheels (NFBR), called the Guarani Project, aiming to

replace the armored today in use for over 40 years and already obsolete. This project

is in progress and is expected to be effective until 2045. In this paper, the author

present the history of the project and its current situation, analyzing the aspects that

led him to promote the revival of the armored industry in the country. After that, it

analyzes the national and international situation, in order to understand the possible

obstacles to the continuation of the Guarani Project. In conclusion, it correlates the

current time with the lived before dismantling, occurred early 1990s, indicating the

similarities between the past and the present, focusing on pointing out possible paths

to be followed to ensure the project's continuation.

Keywords: Strategic Project Guarani. New Armored Family on Wheels. Defense

Industrial Base.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1 Cronograma de produção da VBTP-MR ..........................................22

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ABIMDE Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança

BID Base Industrial de Defesa

BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

BRICS Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul

Bda Inf Mec Brigada de Infantaria Mecanizada

CREDEN Câmara de Relações Exteriores e de Defesa Nacional

CIBld Centro de Instrução de Blindados

CAEx Centro de Avaliação do Exército

Ch EME Chefe do Estado Maior do Exército

C&T Ciência e Tecnologia

C2 Comando e Controle

COLog Comando Logístico

COTer Comando de Operações Terrestres

Cia Fuz Mec Companhia de Fuzileiros Mecanizada

CONDOP Condicionantes Operacionais e Doutrinárias

DCT Departamento de Ciência e Tecnologia

DPDN Documento de Política de Defesa Nacional

EPEx Escritório de Projetos do Exército

EB Exército Brasileiro

EME Estado Maior do Exército

EMFA Estado Maior das Forças Armadas

END Estratégia Nacional de Defesa

EUA Estados Unidos da América

FA Forças Armadas

FINEP Financiadora de Estudos e Projetos

FRF Fundação Roberto Franco

GLO Garantia da Lei e da Ordem

GU Grande Unidade

IPCA Índice de Preços ao Consumidor Amplo

IND Indústria Nacional de Defesa

LBDN Livro Branco de Defesa Nacional

LED Lote de Experimentação Doutrinária

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MEM Material de Emprego Militar

MD Ministério da Defesa

NFBR Nova Família de Blindados de Rodas

OECD Organization for European Economic Cooperation

OIG Organizações Internacionais Governamentais

ONG Organizações Não-Governamentais

Pel Fuz Mec Pelotão de Fuzileiros Mecanizado

P&D Pesquisa & Desenvolvimento

PEE Projetos Estratégicos do Exército

PN Poder Nacional

PDN Política de Defesa Nacional

PMD Política Militar de Defesa

PNID Política Nacional das Indústrias de Defesa

PND Política Nacional de Defesa

PRODE Produto de Defesa

PIB Produto Interno Bruto

PAC Defesa Programa de Aceleração do Crescimento de Defesa

PROTEGER Proteção de Estruturas Estratégicas Terrestres

1ª RD 1ª Reunião Decisória

RDEsp Reunião Decisória Especial

VBR-LR Viatura Blindada de Reconhecimento Leve de Rodas

VBR-MR Viatura Blindada de Reconhecimento Média de Rodas

VBTP-MR Viatura Blindada de Transporte de Pessoal Média de Rodas

SAE Secretaria de Assuntos Estratégicos

SCTEx Sistema de C&T do Exército

SISFRON Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras

SIPRI Stockholm International Peace Research Institute

SCh Subchefia

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ............................................................................................. 10

1.1 PROBLEMA .................................................................................................. 14

1.2 OBJETIVOS ................................................................................................. 14

1.3 HIPÓTESE ................................................................................................... 15

1.4 VARIÁVEIS ................................................................................................... 15

1.5 DELIMITAÇÃO DO ESTUDO ....................................................................... 16

1.6 RELEVÂNCIA DO ESTUDO ......................................................................... 16

2 METODOLOGIA ........................................................................................... 17

3 O PROJETO DA NOVA FAMÍLIA DE BLINDADOS SOBRE RODAS ........ 18

3.1 ORIGEM ...................................................................................................... 18

3.2 IMPLEMENTAÇÃO ....................................................................................... 19

3.2.1 Escolha da empresa parceira e assinatura de convêni o e contratos .... 20

3.2.2 Desenvolvimento do protótipo, fabricação do lote pi loto e avaliações . 22

3.2.3 A Experimentação Doutrinária e outras demandas do P rojeto NFBR ... 24

3.2.4 Instalação da fábrica da IVECO ................................................................. 26

3.3 SITUAÇÃO ATUAL ....................................................................................... 26

4 ANÁLISE DA CONJUNTURA ...................................................................... 30

4.1 CONJUNTURA NACIONAL .......................................................................... 30

4.1.1 A conjuntura Política e o papel do Ministério da De fesa ........................ 31

4.1.2 Conjuntura Econômica .............................................................................. 36

4.1.3 Situação econômica atual .......................................................................... 37

4.1.4 Projeção da situação econômica para 2016 ............................................. 40

4.2 CONJUNTURA INTERNACIONAL ............................................................... 41

5 CONCLUSÃO ............................................................................................... 44

REFERÊNCIAS ............................................................................................ 48

ANEXO A – DISTRIBUIÇÃO DOS VBTP-MR ............................................. 50

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1 INTRODUÇÃO

Em 1989, com a queda do muro de Berlim simbolizando o fim da Guerra

Fria, caracterizou-se o início de uma nova fase no sistema internacional de poder.

Com o fim da bipolaridade, acreditou-se no surgimento de uma nova ordem liberal e

democrática proporcionada pela Pax americana. Será que estamos vivendo essa

nova ordem? De acordo com Christopher Layne1, os EUA perderam espaço com o

surgimento de novos atores globais e hoje o mundo é multipolar.

Segundo a Política Nacional de Defesa (PND, p. 17), o mundo vive desafios

mais complexos do que os enfrentados durante o período de confrontação

ideológica bipolar.

Tais desafios são oriundos do surgimento de novos temas como meio

ambiente, imigração, saúde, direitos humanos, comércio e tecnologia,

incrementando a atuaçãodos atores não estatais, as Organizações Internacionais

Governamentais (OIG) e as Não-Governamentais (ONG). Além de tudo isso, o

narcotráfico, os crimes transfronteiriços e o fundamentalismo islâmico também

integram a lista de “novas ameaças”.

Confirmando o acima citado, MAGNOLI (2004) afirmou que os desafios

vividos são muito mais complexos e imprevisíveis, assuntos como meio ambiente,

terrorismo, fome e energia, entre outros, passaram a fazer parte da agenda global.

Segundo a REVISTA VERDE OLIVA sobre cenários:

Diante de um futuro cada vez menos previsível, lidar com a incerteza passou a ser um desafio. O ambiente de indefinição agrava-se quando não há um oponente claramente definido que motive a sociedade para assuntos de Defesa. O combate ao terrorismo, a proteção da sociedade contra as armas de destruição em massa, à participação em missões de manutenção da paz sob a égide de organismos internacionais e o controle de contingentes populacionais ou de recursos escassos (energia, água ou alimentos) tornaram--se vertentes inequívocas de possibilidade de emprego do aparato militar em defesa do Estado brasileiro. (BRASIL, 2015 p.16).

A Política Nacional de Defesa, destaca que, neste século, poderão ser

intensificadas disputas por áreas marítimas, pelo domínio aeroespacial e por fontes

de água doce, de alimentos e de energia, cada vez mais escassas (PND, p. 17).

1 Disponível em http://www.theatlantic.com/international/archive/2012/04/the-end-of-pax-americana-how-western-decline-became-inevitable/256388/. Acessado em 23 de agosto de 2015.

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A defesa externa e a soberania do Brasil são garantidas pelo emprego da

Marinha, Exército e Força Aérea de forma integrada, bem estruturada e atualizada,

tanto operacionalmente quanto tecnologicamente.

Cada nação almeja aparelhar as suas Forças Armadas (FA) com os mais

variados Materiais de Emprego Militar (MEM) suficientes e necessários ao

cumprimento de suas missões: armas, munições, eletrônicos, fardamentos,

equipamentos, viaturas, carros de combate, mísseis e foguetes, dentre outros tantos.

Como atender tal demanda?

Há Nações que desenvolvem e produzem os MEM necessários para suas

FA. Outras, por diferentes motivos, optam por adquirir no mercado internacional.

Porém parte significativa das Nações procura o equilíbrio entre a produção e a

aquisição.

O Brasil, ao longo da história, estabeleceu e desenvolveu um setor da

indústria voltado para a produção de MEM. Para tal, se fez (e se faz) necessária

uma política com consequentes estratégias de implantação.

A Política de Defesa Nacional (PDN), 2005, e a PND, 2012, priorizaram a

Estratégia de Dissuasão. Segundo tais documentos, a dissuasão é a estratégia mais

viável para a resolução de conflitos em tempos de paz, seja na defesa externa ou na

interna. Para tal, segundo HARNISCH (2009, p.18) tornam-se necessários a

compreensão e desenvolvimento do Poder Nacional (PN) de forma abrangente no

campo militar e em estreita associação aos demais campos econômico, político,

psicossocial e científico e tecnológico.

Neste conceito de desenvolvimento do PN, reside a importância estratégica

da indústria de defesa para o Brasil, pois associa as FA – campo militar, o segmento

nacional produtor de MEM – expressão econômica, os centros de pesquisa em

Ciência e Tecnologia (C&T) – campo da C&T, a sociedade de forma geral –

expressão psicossocial – e o governo, expressão política.

Completamente integrado com a PND, com a Estratégia Nacional de Defesa

(END) e com a Política Nacional das Indústrias de Defesa (PNID), o Exército

Brasileiro (EB) iniciou, em meados de 2006, o desenvolvimento do projeto da Nova

Família de Blindados sobre Rodas (NFBR), chamado de "Projeto Guarani".

“O Projeto Guarani tem por objetivo transformar as Organizações Militares

de Infantaria Motorizada em Mecanizada e modernizar as Organizações Militares de

Cavalaria Mecanizada”. (BRASIL, 2012). Tais ações dotarão o EB de meios para

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incrementar a dissuasão e a defesa do território nacional, atendendo a determinação

constante da END e trazendo novas oportunidades de desenvolvimento tecnológico

e industrial à Base Industrial de Defesa (BID) nacional.

Segundo BOABAID (2014, p. 72), a execução do projeto Guarani possibilitou

o início de uma nova era na história da indústria de defesa no Brasil. A concepção e

o desenvolvimento da NFBR, materializada pela produção da primeira versão - a

Viatura Blindada de Transporte de Pessoal – Média de Rodas (VBTP-MR), foram os

responsáveis pelo ressurgimento da indústria de blindados no Brasil.

“Estratégia nacional de defesa é inseparável de estratégia nacional de

desenvolvimento. Esta motiva aquela. Aquela fornece escudo para esta. Cada uma

reforça as razões da outra” (END, p. 43).

O Brasil já foi um grande exportador de MEM. Nos anos de 1970, implantou

e desenvolveu, na região de São José dos Campos, um parque industrial do setor

de Defesa. Conforme FERNANDES (2013, p. 51), na década de 1980, figurou como

um dos maiores exportadores de MEM do mundo.

Com política de incentivo governo, voltada à Pesquisa & Desenvolvimento

(P&D) e com a participação das Forças Armadas, empresas como a ENGESA e a

AVIBRÁS desenvolveram produtos (tanques, veículos de transporte, sistemas de

lançamento de mísseis de pequeno porte e etc) de média sofisticação adaptados às

condições e à capacidade de pagamento de países do Oriente Médio, América

Latina, África e do próprio Brasil, contribuindo para a redução da dependência

externa do País.

Contudo aspectos da conjuntura interna e externa geraram uma crise

fulminante no setor. A grande oferta de material de defesa do leste europeu, após o

final da Guerra Fria, aliada à falta de uma visão estratégica de Defesa na área

industrial e os problemas econômicos surgidos naquele período desestruturaram a

BID em poucos anos e quase a desintegraram. Com isso, houve um retrocesso e um

aumento do hiato tecnológico entre os materiais empregados pelas FA brasileiras e

os utilizados pelos países mais desenvolvidos.

Na conjuntura internacional, os gastos militares globais apresentam ligeira

redução nos últimos três anos. Tal fato é reflexo direto dos cortes dos EUA, fruto da

desocupação do Iraque e redução dos efetivos no Afeganistão. Tal redução é

também observada na Europa Ocidental, fruto da crise econômica. Entre os países

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em desenvolvimento, em particular o bloco formado pelo Brasil, Rússia, Índia, China

e África do Sul (BRICS), os gastos militares estão em ascensão2.

Segundo o SIPRI Military Expenditure Database3, na América do Sul, o

Paraguai, a Colômbia, a Argentina e o Equador registraram significativos aumentos

nos gastos militares de 2010 a 2014. A Venezuela, entre 2011 e 2013, duplicou seu

orçamento de defesa. O Peru, por sua vez, vem incrementando gradualmente seus

gastos de defesa no marco de um plano quinquenal lançado em 20124. Os gastos

chilenos mantiveram-se no mesmo patamar ao longo dos últimos três anos,

enquanto a Bolívia registrou leve incremento. Em contraste com todos os outros

países, o Brasil reduziu os gastos militares em 3,9% em 2014.

A atual situação econômica do Brasil não é muito favorável. O Professor

Reinaldo Gonçalves – Universidade Federal Rio de Janeiro – afirma que o Brasil vive

a segunda pior fase da história econômica. Os principais indicadores

macroeconômicos que atestam a difícil situação do País são os seguintes: dívida

pública superior a 1,6 trilhões de dólares, o insignificante crescimento econômico em

2014, a desvalorização do Real e a elevada taxa de inflação.

O atual Presidente do Conselho de Comércio Exterior da Federação das

Indústrias do Estado de São Paulo, Rubens Barbosa, salientou que o Orçamento

Geral da União atribui à Defesa apenas 1,3% do Produto Interno Bruto (PIB), valor

muito abaixo das necessidades das FA. Acrescenta que o forte contingenciamento

em 2015 trará sérios prejuízos, podendo comprometer inclusive os projetos

estratégicos.

Historicamente, o contingenciamento de verbas por parte do governo

sempre foi uma ameaça de interrupção no cronograma de desenvolvimento dos

projetos de grande vulto na área de defesa. Segundo CARRILHO (2013, p. 39), o

Projeto Guarani foi incluído no Programa de Aceleração do Crescimento de Defesa

(PAC Defesa) na tentativa de assegurar o aporte de recursos. Porém tal inclusão

garantiu a aquisição de apenas 46 (quarenta e seis) unidades e a previsão são mais

de 2000 (dois mil). Há como garantir tal demanda?

2SIPRI, World Military Expenditures 2014. Disponível em www.sipri.org. Acessado em 05 de abril de 2015 3SIPRI, World Military Expenditures 2014. Disponível em www.sipri.org. Acessado em 15 de agosto de 2015 4http://www.infodefensa.com/latam/2013/09/19/noticia-peru-incrementara-el-gasto-en-defensa-en-un-1338- hasta-2018.html. Acessado em 05 de abril de 2015

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O governo federal, em maio de 2015, decidiu cortar 69,946 bilhões de reais

do Orçamento Geral da União de 2015 como parte do ajuste fiscal para equilibrar as

contas públicas do país. O objetivo era atingir a meta de superávit primário de 1,2%

do PIB. Nem mesmo o PAC Defesa ficou isento de contingenciamento. Em julho, o

governo revisou e reduziu a meta do superávit primário para 0,15% do PIB5 e

também estabeleceu novo corte de 8 bilhões de reais do Orçamento Geral da União

de 2015.

Desse modo, por meio de pesquisa bibliográfica descritiva e documental,

utilizando-se também da técnica de entrevistas, este trabalho busca avaliar os

possíveis óbices que a conjuntura interna e a externa podem apresentar ao

desenvolvimento do Projeto Guarani.

1.1 PROBLEMA

A BID já elevou o Brasil a uma posição de destaque entre os principais

exportadores mundiais de armamentos, nas décadas de 70 e 80. Fruto de aspectos

conjunturais e de uma falta de visão estratégica por parte de diferentes entes da

Nação, a BID desestruturou-se e, desde então, o país passou a adquirir parte

considerável dos MEM no mercado internacional.

O Projeto Guarani é um dos sete Projetos Estratégicos Indutores da

Transformação do Exército. A execução de tal projeto marcou o renascimento da

indústria de blindados no Brasil.

A conjuntura atual, tanto interna quanto externa, impõe medidas restritivas

ao desenvolvimento do Brasil, obrigando o governo a adotar, dentre outras ações,

cortes orçamentários e alterações em políticas diversas.

Deste quadro surgiu a situação problema: as mudanças na conjuntura

nacional e internacional podem tornar-se óbices para o prosseguimento do Projeto

Guarani?

1.2 OBJETIVOS

5Disponível em http://g1.globo.com/economia/noticia/2015/05/entenda-medidas-do-ajuste-fiscal.html. Acessado em 15 de agosto de 2015

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Objetivo geral - analisar o Projeto Guarani, a conjuntura nacional e

internacional, desde a edição da PDN em 2012, concluindo sobre as possibilidades

de sucesso do referido Projeto.

Objetivos específicos:

a) Quais as principais causas do declínio da Indústria Nacional de Defesa

(IND) nas décadas de 1980 e 1990?

b) Como se processaram a implantação e o desenvolvimento do Projeto

Estratégico Guarani?

c) Qual a atual fase do Projeto e quais as próximas fases?

d) Quais mudanças ocorridas na conjuntura nacional após a edição da

PDN, em 2012, podem afetar o sucesso do Projeto Guarani?

e) Quais mudanças ocorridas na conjuntura internacional após a edição

da PDN, em 2012, podem afetar o sucesso do Projeto Guarani?

f) Quais efeitos tais mudanças produziriam no sentido de afetar a

continuidade do Projeto?

1.3 HIPÓTESE

A hipótese que a pesquisa pretende estudar é que há evidências que

comprovem que as mudanças conjunturais têm potencial para dificultar o

prosseguimento do Projeto Guarani.

1.4 VARIÁVEIS

Considerando o título deste trabalho "PROJETO ESTRATÉGICO GUARANI:

uma análise sobre a situação atual e o impacto da conjuntura no seu

prosseguimento", serão apresentadas como variáveis:

- Variável independente – é o projeto estratégico em si;

- Variável dependente – impacto da conjuntura no seu prosseguimento;

- Variáveis intervenientes: cenário econômico, continuidade do aporte

financeiro ao projeto, possibilidade de alterações contratuais, reajustes na

estratégia, possibilidade de vendas externas, interferências externas, restrições de

acesso a tecnologias e equipamentos.

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1.5 DELIMITAÇÕES DO ESTUDO

Questionaram-se quais os reflexos que o projeto da nova família de

blindados teve ou terá sobre a indústria de materiais de defesa no Brasil a partir de

2009 até 2016.

Este trabalho tem por objetivo analisar o Projeto Guarani, sua concepção

inovadora, as fases já concluídas, a atual e as futuras no horizonte até 2020.

Quanto à análise da conjuntura serão correlacionados os aspectos

econômicos, o papel estratégico do governo e as interferências externas do

ambiente interno e externo das décadas de 1980 e 1990 (desestruturação da BID) e

o mais recente desde 2012 a 2016 e uma projeção até 2020.

1.6 RELEVÂNCIA DO ESTUDO

A análise é importante e tem potencial para apontar fatores cruciais para o

prosseguimento do Projeto Guarani, um dos vetores do Processo de Transformação

do Exército Brasileiro. Contribuirá assim para seu sucesso e a consequente

continuidade ao fomento da BID, considerando sua importância dentro da estrutura

econômica do Brasil, além do caráter estratégico decorrente da produção dos

equipamentos de defesa do País e o domínio de tecnologias sensíveis.

O fortalecimento da BID é fundamental para o Brasil, uma jovem nação com

enorme potencial, que almeja sua ascensão no competitivo jogo geopolítico e

econômico internacional.

Além disso, este trabalho servirá de subsídio para pesquisas futuras; como

parâmetro para análises de viabilidade,evitando a interrupção em projetos de longa

duração e estabelecendo uma nova visão sobre o papel fomentador do governo na

BID.

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17

2 METODOLOGIA

A pesquisa iniciar-se-á pelo levantamento das principais causas do declínio

da BID. Tal levantamento será realizado em trabalhos ou em revistas especializadas

sobre o assunto. Além disso, e se necessário, buscar-se-á relatos e análises de

documentos.

A seguir, proceder-se-á a um levantamento bibliográfico e documental e/ou

por meio de entrevistas, com o propósito de se ter desvelado o contexto e o

processo sob o qual e pelo qual, respectivamente, concebeu-se o Projeto

Estratégico, qual sua fase atual e as próximas a serem executadas a curto e médio

prazos. As principais fontes de consulta serão documentos do Estado Maior do

Exército (EME), do Escritório de Projetos (EPEx), do Departamento de Ciência e

Tecnologia (DCT) do Exército, assim como entrevista com os militares que estão

diretamente envolvidos com a condução do Projeto Guarani.

Prosseguir-se-á examinando-se as conjunturas nacional e internacional, em

particular as ações e/ou omissões do Governo que podem afetar o sucesso do

Projeto Guarani. Tal exame dar-se-á na literatura geral (livros, manuais, revistas e

publicações especializadas, jornais, artigos, palestras, internet, teses e

dissertações).

Por fim, analisar-se-ão os efeitos das ações e/ou omissões do Governo que

podem afetar a continuidade do Projeto Guarani.

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18

3 O PROJETO DA NOVA FAMÍLIA DE BLINDADOS SOBRE RODA S (NFBR)

Segundo o Livro Branco de Defesa Nacional (LBDN), o Projeto Guarani

consiste na implantação da NFBR do Exército Brasileiro:

[...] concebidapara dotar as unidades mecanizadas denovos blindados que incorporam as maisrecentes tendências e evoluções tecnológicas.No contexto da Estratégia Nacionalde Defesa, o projeto contribui para a aquisiçãode novas capacitações, fortalecendoa indústria brasileira com a obtenção detecnologia dual (LBDN, 2012, p.198).

O Projeto GUARANI, alinhado com os objetivosda Estratégia Nacional de

Defesa, em sinergia com os demais Projetos Estratégicos do Exército (PEE),

contribui diretamente para o Processo de Transformação do Exército. O Processo de

Transformação teve início com a percepção da necessidade de o EB tornar-se capaz

de proporcionar ao Brasil o respaldo necessário para enfrentar os novos desafios no

cenário internacional.

3.1 ORIGEM

No início dos anos 90, o EB iniciou estudos para o desenvolvimento de uma

nova família de blindados que substituísse a Viatura Blindada de Reconhecimento

Cascavel e a Viatura Blindada de Transporte de Pessoal Urutu.

A Diretriz de Implantação do PEE Guarani, publicada no Boletim do Exército

nº 34 de 22 de agosto de 2013, afirma que as Condicionantes Operacionais e

Doutrinárias (CONDOP) da NFBR foram aprovadas em setembro de 1998 (BRASIL,

2013).

A 1ª Reunião Decisória (1ª RD) da NFBR ocorreu no dia 03 de março de

2006, presidida pelo Chefe do Estado Maior do Exército (Ch EME) e contou com a

presença dos demais responsáveis pelos órgãos envolvidos: DCT, Comando

Logístico (COLog), 3ª, 4ª e 6ª Subchefias do EME (3ª SCh, 4ª SCh, 6ª SCh) e

Comando de Operações Terrestres (COTer). O conceito e o projeto básico da VBTP-

MR foram apresentados e, após analisados todos os fatores, o parecer do EME foi

favorável à continuidade do projeto.

Decidiu-se também que o Sistema de C&T do Exército (SCTEx) seria

responsável pelo desenvolvimentodo Projeto da NFBR em parceria com empresa

Page 20: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

19

nacional ou consórcio por meio de realização de contrato, preferencialmente por

dispensa de licitação. Naquela reunião, conforme está escrito na Ata, o Projeto da

NFBR passou a ser o de desenvolvimento prioritário para o EB.

Deliberou-se, também, que a nova viatura deveria ser MEM Tipo “A”.

Segundo as Instruções Gerais para o Modelo Administrativo do Ciclo de Vida dos

Materiais de Emprego Militar (IG 20-12):

MEM Tipo A é um material novo a ser pesquisado e/ou desenvolvido, no país ou no exterior, pelo Exército ou por empresa nacional ou por empresa estrangeira ou por conjunto dessas organizações, mediante convênios, contratos ou acordos de cooperação com o Exército”. (BRASIL, 1994, p.3).

Segundo as orientações do Alto Comando do Exército e emanadas na 1ª

RD, todas as fases do projeto deveriam ser concebidas de modo a buscar a

integração com os demais PEE, em particular com o Projeto do Sistema Integrado

de Monitoramento de Fronteiras (SISFRON) e do Sistema Integrado de Proteção de

Estruturas Estratégicas Terrestres (PROTEGER) e, na medida do possível, buscar a

integração com as demais Forças.

3.2 IMPLEMENTAÇÃO

Sobre a implementação, Paulo Cezar Gomes Carrilho destaca que:

O projeto teve como base os elementos de definição de um PRODE, a saber: Condicionantes Doutrinárias e Operacionais, Requisitos Operacionais Básicos, Requisitos Operacionais Técnicos, Anteprojeto e Estudo de Viabilidade Técnica e Econômica (CARRILHO, 2014, p.22).

Atendendo às condicionantes operacionais, a NFBR terá 02 (dois) modelos

básicos, cuja principal diferença será o tipo de “chassi”. Isso originou duas

subfamílias:

- LEVE: tipo 4x4, de elevada mobilidade em estradas e boa mobilidade

através do campo, baixa silhueta, a partir do qual serão desenvolvidos os diversos

tipos de viaturas leves integrantes da subfamília;

- MÉDIA: tipo 6x6 e 8x8, com boa mobilidade através do campo, baixa

silhueta, a partir do qual serão desenvolvidos os diversos tipos de viaturas médias

integrantes da subfamília.

Page 21: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

20

O Projeto NFBR seguiu três fases: elaboração do projeto da VBTP-MR, a

construção de um protótipo e sua avaliação e, após a aprovação, a produção do lote

piloto e sua posterior avaliação. A previsão inicial foi a fabricação de um protótipo e

de 16 (dezesseis) viaturas para o lote-piloto. O prazo para a fabricação e a avaliação

do protótipo e do lote piloto foi de 04 (quatro) anos - de janeiro de 2008 a dezembro

de 2012.

Em 2012, o EME criou EPEx com a missão de gerenciar o Projeto NFBR e

os demais PEE. O EME decidiu pela criação do EPEx tendo em vista a amplitude do

projeto NFBR, seu impacto na Força Terrestre, os vultosos recursos envolvidos e

longos prazos de execução e aplicação.

3.2.1 Escolha da empresa parceira e assinatura de convêni o e contratos

No âmbito do Exército, nas décadas de 80 e 90, a maioria das tentativas de

realização de projetos não logrou êxito, em particular as relacionadas com o

desenvolvimento de Produto de Defesa (PRODE). As causas são as mais variadas,

porém, para fins deste trabalho, destaca-se a falta de recursos no orçamento do EB.

No caso da NFBR, além do problema do recurso, havia também outros

obstáculos a serem superados: falta de pessoal qualificado para um projeto tão

complexo, falta de equipamentos e laboratórios, falta de tempo, dentre outros. Para

se evitar mais um insucesso, o DCT decidiu contratar uma empresa para o

desenvolvimento do projeto. O objeto do contrato foi a elaboração de protótipo e

lote-piloto.

Segundo CARRILHO, o método utilizado pelo DCT foi o mais acertado e

demonstrou absoluto profissionalismo:

O DCT mudou o enfoque dado ao desenvolvimento de um PRODE e passou a exercer um papel de grande gerente (técnico, financeiro e administrativo), não se esquecendo de itens como a capacitação de recursos humanos, prioritariamente engenheiros militares, bem como o domínio de tecnologias críticas. [...] elaborou um criterioso processo para se escolher a empresa que seria responsável pela execução da tarefa de desenvolver e fabricar o protótipo e o lote-piloto (CARRILHO, 2014, p. 30).

O primeiro obstáculo superado foi o do aporte financeiro. Como solução, o

DCT assinou um convênio com a Financiadora de Estudos e Projetos (BRASIL,

Page 22: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

21

2008). O convênio possibilitou a transferência de recursos financeiros para a

execução do Projeto VBTP-MR.

A Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP)6 ficou responsável em aportar

R$ 10.445.852,24 (dez milhões, quatrocentos e quarenta e cinco mil, oitocentos e

cinquenta e dois reais e vinte e quatro centavos). Já o Comando do Exército, por

meio da Fundação Roberto Franco, aportou um total de R$ 15.000.000,00 (quinze

milhões de reais).

Outro problema superado foi a Lei de Licitações e Contratos. Tal legislação

determina como serviços e bens devem ser adquiridos por todos os agentes

públicos. A elaboração e tramitação de um processo licitatório para a contratação de

uma empresa para o desenvolvimento do projeto da NFBR seriam de difícil

execução. Por isso, após solicitação do DCT, o Gabinete do Comandante do

Exército, pelo Despacho nº 001/2007, de 19 de março de 2007, deu parecer

favorável à dispensa de licitação por alta complexidade e interesse da Defesa

Nacional para aquisição de bens e contratação de serviços, produzidos ou prestados

no País, para atender ao projeto da VBTP-MR. Tal despacho foi introduzido como

inciso XXVIII (originalmente XXVII) do Art. 24 da citada Lei.

Superado o obstáculo financeiro, o primeiro aporte de recursos aconteceu

ainda em 2006 e, aliado à dispensa de licitação, possibilitou o início do processo

seletivo para escolha da empresa que produziria o protótipo e o lote-piloto.

A escolha da empresa foi de capital importância para o sucesso do projeto.

O DCT lançou o edital para empresas nacionais e estrangeiras participarem do

processo de escolha, o qual transcorreu durante o ano de 2007. O modelo a ser

seguido para a obtenção da viatura seria aquele que combinasse a possibilidade de

fomento pela FINEP e pelo Exército para o desenvolvimento do protótipo e a

fabricação do lote piloto e, ainda,a viabilidade econômica para a empresa parceira.

Em dezembro de 2007, a FIAT SA foi escolhida como parceira do Exército. A

escolha foi a mais adequada, pois a FIAT, na Itália, é a projetista e fabricante de

diversos veículos blindados, dentre eles o blindado CENTAURO B1 do Exército

Italiano, em parceria com a OTO Melara, do Grupo Finmeccanica.

6 FINEP é uma empresa pública brasileira de fomento à ciência, tecnologia e inovação em empresas, universidades, institutos tecnológicos e outras instituições públicas ou privadas. É vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação.

Page 23: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

22

A FIAT SA é uma das maiores indústrias de veículos instaladas no Brasil.

Isso possibilitou negociar junto aos seus fornecedores a disponibilização de

componentes a preço acessível. Todos os fornecedores, mesmo sem interesse na

área militar, foram convencidos a fornecer componentes segundo as especificações

da FIAT SA, pois não desejavam deixar de trabalhar para uma indústria tão sólida.

Tal fato traduziu-se em uma economia para projeto e tornou-se outra grande

vantagem da escolha da FIAT SA.

A FIAT SA designou sua divisão IVECO Veículos de Defesa do Brasil para a

assinatura do contrato de desenvolvimento da VBTP-MR, com base no Projeto

Básico e a fabricação do lote-piloto. O custo total foi de R$ 32.722.231,00 (trinta e

dois milhões, setecentos e vinte e dois mil, duzentos e trinta e um reais). O contrato

foi assinado em 22 de dezembro de 2007.

De acordo com o contrato, os direitos de propriedade intelectual adquiridos

são exclusivos do EB, porém a IVECO está licenciada à produção e comercialização

no Brasil e no exterior dos bens relativos aos direitos mencionados acima por 20

anos.

Com o aporte de recursos da FINEP, escolhida a FIAT SA e assinado o

contrato com definição de responsabilidades e obrigações, partiu-se para a próxima

fase - desenvolvimento do protótipo.

3.2.2 Desenvolvimento do protótipo, fabricação do lote pi loto e avaliações

Segundo informação da Gerência do Projeto, o cronograma de produção da

VBTP-MR pode ser observado na figura abaixo:

Figura 01 - Cronograma de produção da VBTP-MR. Fonte : Gerência do Projeto P&D da Família de Blindados Guarani, 2014.

Page 24: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

23

O desenvolvimento do protótipo se deu em um período de seis anos,

abrangendo: a elaboração do plano de gestão, a revisão do projeto preliminar, o

projeto executivo do produto e do processo de fabricação, a fabricação do protótipo,

os testes de engenharia, a avaliação técnica e operacional e a elaboração do pacote

de dados técnicos.

O primeiro protótipo do VBTP-MR foi desenvolvido no Brasil por uma equipe

de engenheiros militares do Exército Brasileiro e da IVECO, além de especialistas da

Comau, empresa de engenharia automotiva do Grupo FIAT, num total de 30

pessoas.

Os engenheiros brasileiros realizaram treinamento especial na IVECO

Defence Vehicles, na Itália, uma divisão internacional da IVECO que projeta e

produz diversos veículos militares, incluindo modelos similares ao VBTP-MR.

Tal treinamento possibilitou um enorme ganho para o SCTEx. Foram

adquiridos conhecimentos específicos nas áreas de engenharia, qualidade, logística,

compras, tecnologia, funilaria, montagem e pós-venda. Toda a experiência adquirida

ao longo de tal processo foi incorporada como capital intelectual e poderá ser

utilizada futuramente. Um exemplo da experiência adquirida pode ser comprovada

com o trabalho dos técnicos em solda de aço balístico da carroçaria do modelo. .As

carcaças do protótipo e de outras duas viaturas foram soldadas na Itália para

capacitação dos soldadores brasileiros.

Em 2009, na Exposição Latin America Air & Defence (LAAD, sigla em

inglês), a IVECO apresentou um modelo em tamanho original do Guarani.

No dia 04 de abril de 2011, A IVECO anunciou oficialmente ao governador

de Minas Gerais, Antonio Anastasia, sua nova unidade de negócios, a IVECO

Veículos de Defesa, em evento realizado no Centro Administrativo do Governo do

Estado e que teve a participação do Comandante do Exército Brasileiro, General

Enzo Peri, dentre outras autoridades civis e militares. O projeto de implantação de

uma unidade de veículos blindados, na fábrica da IVECO em Sete Lagoas, previu

investimentos da ordem de R$ 75 milhões, com a geração de 350 empregos diretos.

Na cerimônia acima, foi apresentado também o primeiro protótipo do VBTP-

MR, batizado “Guarani”. Após isso, seguiu para o Rio de Janeiro eficouexposto na

Latin America Air & Defence (LAAD), entre 12 a 15 de abril de 2011.

Durante a LAAD 2011, o “Guarani” foi visitado pelo Senhor Arturo Puricelli,

Ministro da Defesa da Argentina, o qual demonstrou interesse de seu país em

Page 25: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

24

participar do projeto. Abriu-se a primeira possibilidade de exportação do novo

blindado.

Após a LAAD 2011, o protótipo seguiu para Brasília. Foi apresentado à

Presidente Dilma Rousseff durante as cerimônias do Dia do Exército,em 19 de abril,

e retornou à fábrica para a avaliação de engenharia.

Em julho de 2011, o protótipo começou a ser avaliado pelo Centro de

Avaliação do Exército (CAEx), órgão do SCTEx, no Rio de Janeiro. Tal avaliação

observou critérios técnicos e operacionais e contou com suporte da IVECO. O

processo foi longo e foram necessários vários ajustes e mudanças até a sua

aprovação final.

Após tal aprovação, começou a produção do lote piloto de 16 viaturas. Em

abril de 2012, aconteceu a Reunião Decisória Especial (RDEsp). O Alto Comando do

Exército decidiu que seria realizada uma Experimentação Doutrinária da VBTP-MR.

Tal experimentação aconteceria ainda na fase de P&D do Ciclo de Vida da viatura. A

15ª Brigada de Infantaria Mecanizada, com sede em Cascavel-PR e o Centro de

Instrução de Blindados (CIBld), localizado em Santa Maria, foram escolhidos para tal

experimentação. Obedecendo àquantidade de dotação de uma Brigada de Infantaria

Mecanizada, o Lote de Experimentação Doutrinária (LED) foi estipulado em 112

(cento e doze) VBTP-MR. Sendo assim, o total de viaturas a serem fabricadas

passou para 128 (cento e vinte e oito), uma vez que o lote piloto de 16 (dezesseis)

viaturas foi incorporado ao lote de experimentação.

3.2.3 A Experimentação Doutrinária e outras demandas do P rojeto NFBR

Paralelamente ao desenvolvimento da VBTP-MR, o EME planejou, ainda em

2010, a inserção do novo MEM e todos seus desdobramentos operacionais e

logísticos. Segundo Revista VERDE OLIVA:

Ainda em 2010, o EME aprovou as diretrizes para a implantação, em caráter experimental, da Base Doutrinária da Brigada de Infantaria Mecanizada e do Batalhão de Infantaria Mecanizado. Em consequência, o então 33º Batalhão de Infantaria Motorizado (33º Btl Inf Mtz), sediado em Cascavel (PR), foi designado para ser a organização militar (OM) responsável pela execução de todas as atividades inerentes à experimentação doutrinária, iniciadas com o Pelotão de Fuzileiros Mecanizado (Pel Fuz Mec), a partir de 2012 (BRASIL, 2015, p.31).

Page 26: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

25

Tal experimentação iniciou-se em 2012 com atividades relacionadas ao

escalão Pelotão de Fuzileiros Mecanizado (Pel Fuz Mec) e, prosseguiu em 2013,

com o escalão Companhia de Fuzileiros Mecanizada (Cia Fuz Mec).

Foram realizadas várias atividades, dentre outras estágio de formação de

motoristas de VBTP Urutu, exercício de Marcha para o Combate e Ataque

Coordenado, defesa móvel e exercício de emprego em Operações de Garantia da

Lei e da Ordem (GLO). A execução dessas atividades permitiu que fossem

respondidos os Garantia da Lei e da Ordem (GLO), estabelecidos pelo EME. Além

disso, foram levantados dados e informações relevantes para a elaboração das

propostas iniciais do Quadro de Cargos do Batalhão e do Programa Padrão de

Qualificação do Cabo e do Soldado Fuzileiro Mecanizado.

No ano 2013, iniciaram as obras de adequação ao Projeto da Infantaria

Mecanizada na área do aquartelamento do 33º Batalhão de Infantaria Motorizado.

Durante os anos de 2013 e 2014, intensificaram-se os trabalhos de

desenvolvimento da capacitação de pessoal e do suporte logístico integrado, em

estreita colaboração com o CIBld e efetiva participação da IVECO, possibilitando a

formação de motoristas, comandantes de carro, mecânicos e demais profissionais

que tornarão possível preparar a infantaria mecanizada. Tal preparação ora se

consolida no CIBld e se multiplica no âmbito da 15ª Bda Inf Mec.

Com relação à logística, a utilização das VBTP-MR experimentais está

coberta por um pacote que contempla a utilização de cada viatura por 22.500 km ou

1.000 horas, até julho de 2017, e que abrange, também, o desenvolvimento da

capacidade de manutenção do sistema logístico da tropa em 1º e 2º escalões e de

diagnose em 3º escalão.

A Diretoria de Material, após adoção final da viatura e definição das

quantidades nas diversas versões e configurações, com base nas informações

obtidas, estabelecerá o Sistema Logístico Integrado (SLI).

Os elementos essenciais à implantação do SLI são: a manutenção planejada

preventiva, a manutenção corretiva, o treinamento do pessoal de apoio logístico, os

dados e informações técnicas de caráter logístico, os equipamentos de apoio, os

componentes e recursos computacionais, os sobressalentes e itens de reparo e a

manutenção contratual. Esses elementos visam a garantir que o apoio logístico seja

planejado, obtido e gerenciado como um todo, a fim de se obter o índice desejável

de disponibilidade do material e a máxima eficácia do custo otimizado.

Page 27: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

26

3.2.4 instalação da fábrica da IVECO

Em 7 de agosto de 2012, o Exército Brasileiro fez a primeira encomenda

para aquisição de 86 (oitenta e seis) VBTP-MR. Tal encomenda representou o início

da produção do blindado.

Por sua iniciativa, mas em consonância com os objetivos do Projeto de P&D,

a IVECO decidiu implantar uma fábrica dedicada exclusivamente à fabricação dos

blindados. Tal assunto foi tratado em edição da Revista VERDE-OLIVA de abril de

2014, cujo preâmbulo sintetiza o feito:

A inauguração da fábrica IVECO, em Sete Lagoas (MG), torna realidade o sonho do Exército Brasileiro de desenvolver e produzir uma NFBR com todas as suas versões, o que leva, cada vez mais, à maior adequação ao Processo de Transformação da Força Terrestre e contribui para o crescimento da indústria nacional de defesa (BRASIL, 2014, p.67).

A IVECO contou com financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social (BNDES). A inauguração ocorreu no dia 13 de junho de 2013. A

capacidade produtiva é de 140 (cento e quarenta) unidades por ano, com

possibilidade de alcançar 200 (duzentos) conforme a demanda. Nesta fábrica foram

produzidas as VBTP-MR do lote-piloto, sendo 04 (quatro) com a mesma

configuração que o Protótipo em uma linha de produção provisória e as outras 12

(doze) restantes na nova linha de produção com correções e melhorias.

O EME, por meio do DCT, vem atualizando as características da NFBR e

aprovou, em agosto de 2013, as novas condicionantes doutrinárias e operacionais

(CONDOP) nº 003/2013.

3.3 SITUAÇÃO ATUAL

A Subfamília Média da Família de Blindados Guarani prevê outras

configurações, além da VBTP-MR, a serem desenvolvidas conforme planos do EME:

reconhecimento; morteiro; central diretora de tiro; socorro; oficina; comunicações;

posto de comando; ambulância; engenharia; desminagem; lançadora de pontes;

defesa antiaérea; defesa química, biológica, radiológica e nuclear e escola.

Além disso, cabe ressaltar que o Projeto NFBR abrange vários subprojetos.

O SLI e a demanda por adaptação de infraestrutura foram mencionados acima.

Page 28: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

27

Porém há muitos outros que impactarão em diferentes setores do Exército. Por

exemplo, há a demanda por simuladores para a capacitação de pessoal,

desenvolvimento de software de comando e controle (C2), dentre outros.

Até o presente momento, já foram fabricadas 188 (cento e oitenta e oito)

VBTP-MR 6x6. O Anexo A mostra a distribuição deste total.

Recentemente, por determinação do EME, o EPEx concluiu um estudo sobre

a demanda de unidades da VBTP-MR. O Foco do estudo foi visualizar, dentro do

enfoque de capacidades, quais Grandes Unidades (GU) de Infantaria e Cavalaria

necessitam ser transformadas e modernizadas, respectivamente. Na estimativa

anterior de 20447 viaturas, todas as GU de Infantaria seriam transformadas.

Concluiu-se que serão necessárias VBTP-MR para transformar 04 (quatro) GU e 03

(três) Subunidades de Infantaria e modernizar todas as GU de Cavalaria

Mecanizadas. Sendo assim, a demanda foi reduzida para 1200 (um mil e duzentas)

VBTP-MR, além das 188 (cento e oitenta e oito) já fabricadas.

Segundo o Cel Taylor de Carvalho Neto8, atual supervisor do PEE Guarani,

a IVECO já concordou com tal redução e, além disso, o prazo de aquisição foi

estendido até 2045. Para firmar tais alterações, em breve será assinado um Termo

Aditivo. Além disso, foi acordado que o EB adotará a VBTP-MR como seu blindado

oficial. Tal adoção possibilitará a IVECO atender à legislação italiana e comercializá-

lo no exterior. Adoção oficial do Guarani foi decidida em uma Reunião Decisória9

ocorrida em 05 de junho de 2015. O Chile, o Iraque, a Arábia Saudita e o Líbano já

demonstraram interesse em adquirir a VBTP.

No tocante ao desenvolvimento da subfamília leve 4x4, os Requisitos

Operacionais Básicos das várias versões já foram definidos. Esse processo teve

início com uma pré-qualificação em apreciação técnica, a cargo do CAEx, com

requisitos estabelecidos pelo EME. A nomenclatura da subfamília será Viatura

Blindada Multitarefa Leve de Rodas (VBMT-LR).

No ano de 2013, foi realizada a 1ª RD para a Subfamília Leve, sendo

decidido que o processo de obtenção será a nacionalização, a ser conduzido pelo

DCT, por intermédio da Gerência de P&D da Família de Blindados Guarani. O

7 Conforme Contrato nº 3/2009. 8 Entrevista com o Coronel Taylor de Carvalho Neto, atual Supervisor do PEE Guarani concedida em 22 de julho de 2015. 9Participaram da Reunião Gen Farias (COLog), Gen Etchegoyen (EME) e Gen Juarez (DCT)

Page 29: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

28

modelo de inovaçãoda VBTP-MR será adaptado para as peculiaridades da

Subfamília Leve.

Segundo o Cel Taylor de Carvalho Neto10, atual supervisor do PEE Guarani,

o EB tem uma demanda de cerca de 1500 viaturas blindadas 4x4. Porém há uma

demanda urgente por 156 (cento e cinquenta e seis) unidades desse tipo de viatura.

A experiência adquirida na última operação de Garantia da Lei e da Ordem (GLO)

realizada no Rio de Janeiro (Operação São Francismo) demonstrou que os militares

ficaram expostos aos tiros quando realizaram patrulhamento motorizado com

viaturas Maruá. Além disso, será necessário este tipo de viatura para as futuras

missões de paz que o Brasil deve participar (Líbano e Congo, possivelmente).

Em função da demanda urgente citada acima, por determinação do

Comandante do Exército, o DCT conduziu processo licitatório para aquisição de 156

(cento e cinquenta e seis) viaturas blindadas 4x4. Participaram da licitação a AM

General (EUA), a IVECO (ITA) e a Renaut – AVIBRAS (BRA). A IVECO e a Renaut –

AVIBRAS apresentaram os veículos com as características que melhor atendem aos

requisitos estabelecidos pelo DCT. A próxima fase será a convocação das empresas

para que apresentem as propostas (valor).

O desenvolvimento da Viatura Blindada de Reconhecimento Média de

Rodas (VBR-MR), em configuração 8x8, partirá da plataforma base da VBTP-MR e

também seguirá o mesmo modelo de inovaçãoda VBTP-MR que será adaptado para

as peculiaridades da subfamília. Os estudos sobre a subfamília média 8x8 estão em

fase inicial. Primeiro serão definidos a torre e os sistemas de armas para depois se

decidir sobre os requisitos da plataforma veicular que melhor promova a integração

de todos os sistemas. Tal plataforma terá proteção blindada contra armas de maior

calibre. O sistema de armas será de calibre 105 mm. Além disso, incorporará novas

tecnologias que já equipam os blindados pesados sobre lagartas mais modernos.

Segundo o Cel Taylor do EME, o início do projeto será em 2016 e o protótipo deve

ser entregue em 2020. O EB tem uma demanda atual de 396 (trezentos e noventa e

seis) unidades.

A concepção e o desenvolvimento da NFBR, materializada pela produção da

VBTP-MR, marcaram o início de um novo ciclo para a indústria nacional de defesa.

A execução do projeto Guarani foi responsável pelo renascimento da indústria de 10

Entrevista com o Coronel Taylor de Carvalho Neto, atual Supervisor do PEE Guarani concedida em 22 de julho de 2015.

Page 30: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

29

blindados sobre rodas e a inauguração da fábrica da IVECO Veículos de Defesa, em

Sete Lagoas, marcou este renascimento. Porém é necessária a garantia de recursos

para que o projeto continue em execução. Desta forma, evitar-se-á uma nova

“morte” da construção de blindados no Brasil.

Page 31: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

30

4 ANÁLISE DA CONJUNTURA

4.1 CONJUNTURA NACIONAL

Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Defesa e

Segurança (ABIMDE 2013), nas décadas de 1970 e 1980, o Brasil possuía uma

indústria destinada à fabricação de materiais de emprego militar com grande

capacidade produtiva, tendo o seu período de máxima expansão no início dos anos

1980.

Ao longo das décadas de 1970 e 1980, a Indústria BID muito contribuiu com

o desenvolvimento nacional. Isso aconteceu graças a uma parceria entre o governo

brasileiro e a iniciativa privada investindo em P&D. O resultado foi o crescimento da

Indústria de Defesa e o desenvolvimento do país.

As relações entre desenvolvimento militar e desenvolvimento científico e

tecnológico são muito antigas – em 212 A.C. Arquimedes desenhou máquinas de

guerra para a defesa de Siracusa contra os romanos. Na era moderna, a Primeira

Guerra Mundial foi chamada a “guerra dos químicos” e a Segunda, a “guerra dos

físicos”. Esta última, principalmente através do programa nuclear, definiu o formato

de grandes projetos científicos, tecnológicos e industriais – a “Big Science”. A própria

Guerra Fria consolidou a articulação entre os sistemas militar, industrial e científico e

tecnológico.

No auge da BID, o Brasil alcançou a quinta posição entre as indústrias de

defesa do mundo, exportando cerca de US$ 2 bilhões por ano em carros de

combate, aviões, mísseis e armas leves. Para exemplificar tal volume e

diversificação de produção, mais de 90% dos equipamentos do EB eram de origem

nacional.

Ao final dadécada de 1980 e início da década de 1990, fatores geopolíticos e

econômicos tornaram-se obstáculos para as empresas da Indústria de Defesa.

Esses, dentre outros motivos, levaram o governo a reduzir os investimentos nas FA

e não foi possível manter o nível de aquisições de MEM. As FA tentaram, mas não

conseguiram manter a continuidade de produção em série, como vinha acontecendo

desde o início do regime militar. Não houve fôlego suficiente para resistir às variáveis

políticas internas e externas.

Page 32: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

31

O fato acima mencionado atingiu as quatro grandes empresas fabricantes de

MEM, a ENGESA (blindados e demais viaturas), a EMBRAER (aviões), a AVIBRÁS

(foguetes) e a IMBEL (armas e munições), com reflexos negativos para suas

principais fornecedoras. A falta de pedidos provocou o fechamento de mais de 30

empresas de médio porte do setor.

Nos últimos cinco anos aconteceram, anualmente, restrições orçamentárias

que reduziram os recursos inicialmente destinados às FA. É marcante entre os

políticos brasileiros a falta de conscientização da importância da BID para o

desenvolvimento do País. Países mais desenvolvidos para defender seus interesses

normalmente utilizam ações coercitivas em prol de suas empresas e tornam a

concorrência desigual. Tal conjuntura guarda características muito parecidas com o

final dos anos 80 e início do anos 90 e tem potencial para, mais uma vez, tornar-se

um obstáculo e dificultar o prosseguimento do Projeto da NFBR.

4.1.1 A conjuntura Política e o papel do Ministério da De fesa

O Brasil, no início dos anos de 1990, enfrentou problemas internos como o

fim do regime militar e o consequente retorno dos civis ao controle do país, a crise

da Década Perdida, a elevada dívida externa, a desaceleração e a estagnação do

crescimento. Tais problemas obrigaram o governo a corrigir rumos em diferentes

setores do país, adaptando-se à nova realidade.

No tocante ao setor estratégico, o governo mudou sua postura da defesa

nacional. O setor estratégico estava associado ao regime militar, isso precisava ser

quebrado. Para tal as preocupações de segurança nacional foram redirecionadas ao

vetor “pacífico”. Por isso, o governo reduziu os investimentos nas FA e no programa

nuclear e assinou o Tratado de Não Proliferação Nuclear. Além disso, foi criado o

Ministério da Defesa para promover a aproximação entre a sociedade civil e as

Forças Armadas.

Passados 27 (vinte e sete) anos, está nítido que a adoção do viés pacífico

não se mostrou eficiente, pois novas ameaças surgiram e as antigas ameaças nunca

se dissiparam. Estrategicamente o Brasil está inseguro. Será que a sociedade tem

consciência disso?

No que concerne à segurança, o país possui vulnerabilidades em todas as

dimensões. Destaca-se a baixa capacidade de projeção nacional e a permeabilidade

Page 33: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

32

das fronteiras aos riscos: migração, tráfico de drogas e armas, pirataria, lavagem de

dinheiro, terrorismo, crime organizado, degradação ambiental e a instabilidade

política de seus vizinhos sul-americanos. Duas fronteiras são as mais vulneráveis: o

Cone Sul, na região da tríplice fronteira Brasil-Paraguai-Argentina, e a Amazônia. Na

palestra para o Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia, em maio de 2015, o

titular da Delegacia da Polícia Federal de Foz do Iguaçu disse que não há um

controle sistemático do fluxo de pessoas e mercadorias na fronteira entre o Paraguai

e o Brasil.

Avaliando a segurança humana, o Brasil também possui muitos problemas,

afetando outra dimensão de segurança, a da segurança pública. Dada a ausência do

Estado, problemas de governança, baixo crescimento, perda de controle dos setores

estratégicos (defesa, energia, transportes e telecomunicações), a não atenção

continuada ao setor social, houve um aumento da violência urbana, da miséria e

exclusão. Esta fragmentação afeta a projeção internacional. Sistematicamente, as

FA tem sido empregadas para em operações de GLO, cujo objetivo em síntese é a

garantia da segurança pública.

Segurança interna e externa são interdependentes, reforçando-se e/ou

anulando-se mutuamente.

O Brasil está entre os cinco maiores países possuidores de riquezas naturais

ou construídas do planeta. Para garantir a sua preservação e proteção, há que se

desenvolver conveniente e adequadamente a sua capacidade de defesa. A extração

de petróleo da plataforma continental proporcionou a autosuficiência do Brasil. É da

“Amazônia Azul” que provém cerca de 89% do petróleo nacional, mais de 1,5 milhão

de barris/dia, gerando recursos de mais de US$ 3 bilhões mensais. Além de possuir

outras riquezas minerais e marinhas, nossa costa cobre cerca de 8 mil km de

extensão.

A maioria das reservas indígenas estão localizadas exatamente sobre ricos

depósitos minerais, principalmente na Amazônia Brasileira; sendo que, muitas delas

fazem fronteira com países vizinhos. O Brasil possui inúmeras riquezas naturais,

entre outras cerca de 98% das reservas de Nióbio conhecidas, a sexta maior reserva

do mundo de urânio, um dos maiores lençóis freáticos de água potável do mundo, o

Aquífero Guarani, etc.

Fazemos parte do grupo dos países com grande potencial de

desenvolvimento, os chamados BRICS. Deste grupo, é o Brasil que tem a maior

Page 34: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

33

reserva florestal e de água doce do planeta e o único que não possui tecnologia

nuclear para sua defesa. Diante de tamanho patrimônio a ser defendido, será que o

Estado Brasileiro pode prescindir de uma Indústria Nacional de Defesa vigorosa e de

suas Forças Armadas bem equipadas e adestradas?

Desde a Proclamação da República até a criação do Ministério da Defesa

(MD) em 1999, a Política de Defesa não estava centralizada em um único Órgão.

Além dos Ministérios da Marinha, Exército e da Aeronáutica, havia também a Casa

Militar e o Estado Maior das Forças Armadas (EMFA). Todos tinham atribuições

diretas ou indiretas com a política de defesa nacional.

Uma das primeiras tentativas do Estado Brasileiro em legislar sobre a

Política de Defesa, de forma centralizada, foi a criação da Câmara de Relações

Exteriores e de Defesa Nacional (CREDEN) no Conselho de Governo em maio de

1996. A CREDEN reuniu os Ministérios das Relações Exteriores, de Justiça, da

Marinha, da Aeronáutica, o Estado Maior das Forças Armadas, a Casa Civil, a Casa

Militar e a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE). A recém criada Câmara

divulgou, em setembro do mesmo ano, a PDN que buscou instituir um consenso

sobre o planejamento da Defesa, bem como centralizar a administração da Defesa

no Brasil.

Na década de 1990, o gerenciamentodo assunto defesa ainda estava

pulverizado em diferentes órgãos do Estado. Por isso, legislar sobre o assunto era

extremamente difícil. O Poder Executivo viu a necessidade de uma reforma, a qual

se pautou nas ideias de aperfeiçoamento do sistema de defesa nacional, formalizar

uma política de defesa sustentável e integrar as três Forças Armadas, racionalizando

as suas atividades. Além desses, também compuseram os objetivos desta reforma,

uma maior articulação entre civis e militares e, também, entre as Forças Armadas e

o Itamaraty.

Diante de tal quadro, o MD foi instituído em 10 de junho de 1999, ainda no

governo de Fernando Henrique Cardoso, por meio da Lei Complementar n° 97, de

09 de junho de 1999, com a finalidade de estabelecer políticas ligadas à defesa e à

segurança do país.

O PDN de 1996 ficou muito aquém das expectativas de especialistas e

estudiosos do tema. Estes esperavam algumas definições e limitações mais claras –

particularmente em relação aos conceitos de “Defesa” e “Segurança” e ao emprego

das FA – nem cumpriu os objetivos norteadores da revisão da Defesa do Brasil,

Page 35: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

34

gerando discussões que perduraram até o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da

Silva como Presidente do Brasil.

Ao longo de 2004, o MD promoveu rodadas de interessantes e intensos

debates sobre segurança e Defesa, no Centro General Ernani Ayrosa, em Itaipava-

RJ. A tentativa do Ministro da Defesa, José Viegas Filho, era levar o tema para a

agenda pública. Apesar do esforço, o assunto defesa permaneceu afastado da

agenda pública e tal fato dificultava a reflexão sobre missão e emprego das Forças

Armadas, além decontribuir para a falta de cultura da Defesa na sociedade.

Assim, em 30 de junho de 2005, pelo Decreto nº 5.484, foi aprovada a nova

PDN, o documento de mais alto nível do planejamento de defesa, tendo por

finalidade estabelecer objetivos e diretrizes para o preparo e o emprego da

capacitação nacional, com envolvimento dos setores militar e civil, em todas as

esferas do Poder Nacional.

O afastamento da sociedade do assunto defesa começou a reverter sua

tendência durante a gestão de Nelson Jobim à frente do MD. Fruto de seu trabalho,

o presidente Lula aprovou a Estratégia Nacional de Defesa em 18 de dezembro de

2008. A END aproximou o assunto da sociedade e o trouxe para a agenda pública.

A Câmara aprovou em 12 de setembro de 2013, o Projeto de Decreto

Legislativo 818/13, o qual contém os textos atualizados da PND e da END. Aprovou

também a primeira edição do Livro Branco de Defesa Nacional. Os documentos

foram encaminhados ao Congresso pelo Executivo ainda em 2012, atendendo ao

que estabelece a Lei Complementar 97/99, segundo a qual os três documentos

devem ser enviados ao Legislativo a cada quatro anos, com suas respectivas

atualizações. O texto já havia sido aprovado pelo Senado e foi promulgado.

A PND fixa os objetivos da Defesa Nacional e orienta o Estado sobre o que

fazer para alcançá-los. A END, por sua vez, estabelece como fazer o que foi definido

pela Política. Os documentos pavimentam o caminho para a construção da Defesa

que o Brasil almeja. Uma Defesa moderna, fundada em princípios democráticos,

capaz de atender às necessidades de uma nação repleta de riquezas e inserida num

mundo turbulento e imprevisível como o atual.

A reedição da PND e da END procurou conscientizar a sociedade brasileira

sobre a importância do tema para o País. A Defesa não deve ser assunto apenas

dos militares ou do governo; deve ser uma preocupação de toda a sociedade.

Page 36: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

35

Além da PND, da END e do LBDN, o MD aprovou várias documentos

voltados para o incremento da Defesa Nacional: em 2002, a Política e as Diretrizes

de Compensação Comercial, Industrial e Tecnológica do MD; em 2005, a Política

Nacional da Indústria de Defesa (PNID); em 2005, a Política Militar de Defesa

(PMD). Sobre a PNID, BOABAID afirma:

A Política Nacional da Indústria de Defesa (PNID) estabelecida pela portaria normativa nº 899 do Ministério da Defesa, de 19 de julho de 2005, e a Política de Desenvolvimento Produtivo (PDP) de 2008, visam revitalizar um setor industrial que se encontra em crise aguda desde a segunda metade dos anos 90 e tem como objetivo maior o fortalecimento da Base Industrial de Defesa (BID), buscando a diminuição progressiva da dependência externa em produtos estratégicos de defesa (PED), desenvolvendo-os e produzindo-os internamente (BOABAID, 2014 p. 31).

O mundo do Século XXI vive desafios mais complexos do que os outros

períodos da história da humanidade. Inserido no contexto mundial, para preservar a

soberania e os interesses nacionais, é essencial estruturar a Defesa Nacional de

modo compatível com a estatura político-estratégica do País. Tal tarefa cabe ao MD

e sua missão precisar ser cumprida, até mesmo para provar sua utilidade. Os

desafios são enormes, a começar pelos domésticos, como a conscientização de

elites políticas quanto à necessidade de serem feitos investimentos em Defesa, em

um novo momento com crescentes desafios e ameaças globais.

O MD, principal articulador da Política de Defesa, vem se esforçando para

que a defesa venha a ser tornar uma preocupação de toda a sociedade e, desta

forma, garantir a destinação de uma maior fatia do PIB no custeio e

desenvolvimento.

A atual presidente da CREDEN, Deputada Jô Moraes (PCdoB–MG),

destacou, em discurso no plenário, em 22 de abril de 2015, que não pode haver

corte no orçamento para os projetos estratégicos desenvolvidos pelas FA: Segundo

ela:

O mundo está permeado de enfrentamentos radicais e de ações de intolerância. O Brasil precisa estar pronto para defender sua política de paz preparando-se para a dissuasão. A sociedade tem que se apoderar do debate e da construção de uma Política Nacional de Defesa moderna e democrática11.

11 Disponível em http://www.vermelho.org.br/noticia/262719-1 Acessado em 24 de julho de 2015.

Page 37: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

36

4.1.2 Conjuntura Econômica

O Brasil, no início dos anos de 1990, enfrentou problemas internos como o

fim do regime militar e o consequente retorno dos civis ao controle do país, a crise

da Década Perdida, a dívida externa, a desaceleração e a estagnação do

crescimento. Tais problemas obrigaram o governo a corrigir rumos em diferentes

setores do país, adaptando-se à nova realidade.

No setor sócio-econômico, a “limpeza de agenda”, para atingir credibilidade

e responsabilidade trazendo benefícios, aderiu ao neoliberalismo do Consenso de

Washington de reforma do Estado (privatização, abertura comercial,

desregulamentação, liberalização financeira). Em resumo, o Estado deixou de ser o

principal condutor dos processos, o que gerou um vácuo de ação e poder. Segundo

o Professor Reginaldo Gonçalves, esse foi um dos principais erros econômicos que

tornou o Brasil um país vulnerável, tema de seu livro “Desenvolvimento às avessas”.

O Brasil praticamente retornou à condição de exportador de produtos primários.

Além dessa vulnerabilidade, a opção do governo gerou efeitos opostos aos

desejados: ao invés de dividendos, perda de poder de barganha e marginalização.

Ainda que o Brasil nunca tenha sido uma grande potência militar, sua capacidade de

defensiva havia sido bem construída, porém foi abandonada.

Tal abandono foi calcado em uma premissa defensiva da baixa percepção

de ameaças e da tradição diplomática e geopolítica do país. Abandonou-se a

expansão das FA. Priorizou-se a proteção das fronteiras, a ocupação nacional e o

desenvolvimento, sustentadas na lógica clássica do direito internacional, não-

confrontação e respeito à soberania. Outro pilar abandonado foi o da capacitação

tecnológica de ponta, encerrando experiências bem sucedidas na indústria de

defesa, como a ENGESA e a AVIBRÁS, no projeto de substituição de importações e

limitando a área nuclear. Tais conhecimentos foram perdidos e resgatá-los é tarefa

quase impossível.

A falta de Projeto de Estado, sintetizada nos fatos acima mencionados, seria

uma das principais causas da péssima situação econômica do país.

Durante a crise econômica de 2008, a General Motors, uma das muitas

multinacionais americana, que fabrica automóvel foi seriamente afetada e quase

decretou falência. Para evitar isso, o Estado Americano a socorreu com a injeção de

centenas de milhões de dolares. Porque os EUA, país por excelência adepto da não

Page 38: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

37

intervenção do estado, salvou uma empresa privada? A resposta é simples: o povo

americano a enxerga como uma empresa estratégica para a economia americana.

Segundo reportagem publicada em 05 de setembro de 2002, no Estadão12:

O governo federal quer restabelecer a boa posição da indústria brasileira de equipamentos militares de defesa no portifólio das exportações de produtos nacionais manufaturados. Nos anos 80 o segmento manteve cadência anual superior a U$ 1,5 bilhão em vendas internacionais, mas foi vitimado a partir dos anos 1990 pela combinação negativa de má gestão das principais corporações envolvidas, retração do mercado internacional e absoluta incompetência dos governos dos presidentes Fernando Collor de Melo (PRN), Itamar Franco (PMDB) e Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Em 1993, a ENGESA decretou falência. A ENGESA foi uma empresa

fundada em 1958 por um grupo de engenheiros recém-formados. A empresa, nos

primeiros anos, se dedicou à fabricação de equipamentos para a prospecção,

produção e refino de petróleo. Porém migrou para a fabricação de armamentos e

vendeu equipamentos para países do Oriente Médio e da África. A ENGESA

absorveu a capacidade de P&D da área militar e criou os produtos que foram

exportados para um total de 18 países, tais como o caminhão EE-25, o blindado EE-

9 Cascavel e o blindado EE-11 Urutu.

Porém a evolução político-econômica nacional não contemplou a indústria

bélica com a prioridade dos períodos passados e, fruto de novos rumos tomados

pelo mundo pós-guerra fria e pós-guerra do Golfo (1991), e a despeito da sua

importância estratégica, ocorreu um verdadeiro desmantelamento de grande parte

não apenas da ENGESA como de outras fábricas de material de emprego militar,

deixando as necessidades bélicas da nação brasileira à mercê dos conglomerados

fabris internacionais.

4.1.3 Situação econômica atual

A situação econômica do país não é boa. Vivemos o segundo pior momento

de nossa história econômica. A cada semana, uma nova análise e a percepção é

cada vez mais assustadora. A estimativa do mercado para a inflação em 2015

chegou a 9,04%, segundo Relatório Focus13do Banco Central divulgado em 03 de

12 Disponível em http://economia.estadao.com.br/noticias/geral,brasil-esta-de-volta-ao-mercado-de-armas. Acessado em 13/07/13 13 Disponível em http://www.bcb.gov.br/?FOCUSRELMERC. Acessado em 07 de julho de /2015

Page 39: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

38

julho de 2015. Na semana anterior, a previsão era de que o Índice de Preços ao

Consumidor Amplo (IPCA) fechasse o ano em 9%. Foi a 12ª semana seguida de alta

nesse indicador. Se confirmada a estimativa para o IPCA, a inflação de 2015 atingirá

o maior patamar desde 2003, quando ficou em 9,3%. O próprio Banco Central

admitiu que o IPCA deve ficar em 9% este ano, estourando a meta do governo, que

é de até 6,5%. Com isso, a inflação deverá superar o teto do sistema de metas em

2015, algo que não acontece desde 2003.

Segundo o mesmo Relatório Focus acima, os economistas do mercado

financeiro reduziram, ainda mais a previsão do PIB para uma retração de 1,50%

neste ano. Foi a sétima queda seguida deste indicador. Até então a estimativa do

mercado era de um recuo de 1,49%. Se confirmado, será o pior resultado em 25

anos, ou seja, desde 1990 – quando foi registrada uma queda de 4,35%.

Com relação à taxa básica de juros da economia, o Banco Central a elevou

em 14,25% em 29 de julho de 2015, conforme anunciou o Comitê de Política

Monetária. Foi a sétima elevação seguida da taxa Selic, que atingiu o maior patamar

desde julho de 2006, ou seja, em nove anos - quando estava em 14,75% ao ano.

Desde então está mantida nos mesmos 14,25%.

A taxa básica de juros é o principal instrumento do BC para tentar conter

pressões inflacionárias. Pelo sistema de metas de inflação brasileiro, o BC tem de

calibrar os juros para atingir objetivos pré-determinados. As taxas mais altas tendem

a reduzir o consumo e o crédito, o que pode contribuir para o controle dos preços.

Na edição do relatório Focus de 11 de setembro, a projeção do mercado

financeiro para a taxa de câmbio no fim de 2015 subiu para R$ 3,70 por dólar. A

projeção para o resultado da balança comercial (resultado do total de exportações

menos as importações) em 2015 subiu para US$ 8 bilhões para US$ 10 bilhões de

resultado positivo. Para este ano, a projeção de entrada de investimentos

estrangeiros diretos no Brasil recuou de US$ 65,7 bilhões para US$ 64,9 bilhões.

Percebe-se que a situação econômica atual do país é péssima. Todos os

indicadores econômicos citados acima corroboram para tal assertiva. Segundo o

Professor Reinaldo Gonçalves não há crescimento em ambiente inflacionário. Tanto

em 2015, quanto em 2016, o IPCA estará acima do plano de metas do governo que

é de 4,5% ao ano. Por isso, o governo federal divulgou, em maio deste ano, as

metas a serem atingidas com o plano ajuste fiscal - que é a tentativa de controlar as

suas contas e voltar a crescer.

Page 40: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

39

Para tentar salvar as finanças do governo em 2015, o Ministro da Fazenda,

Joaquim Levy, prometeu arrumar as contas públicas até o fim do ano. Criou a meta

de superávit primário de 1,2%do PIB, que equivalia a uma economia de R$ 66,3

bilhões no fim do ano passado, para pagar os juros da dívida pública. Para alcançar

tal objetivo, estabeleceu um ajuste fiscal. O ajuste fiscal consiste em duas ações:

cortar despesas do governo e elevar a arrecadação – pelo aumento de impostos e

outras receitas.

O governo anunciou no dia 22 de maio o bloqueio de R$ 69,9 bilhões em

gastos no orçamento de 2015, maior contingenciamento de recursos da história, em

termos nominais. Desse total, 67% estão concentrados nos investimentos e nas

emendas parlamentares.

Passados exatos 03 (três) meses, o governo anunciou no dia 22 de julho

que decidiu revisar a meta de economia para pagar os juros da dívida – o chamado

superávit primário – para R$ 8,747 bilhões em 2015, o equivalente a 0,15% do PIB,

ante previsão anterior de R$ 66,3 bilhões (1,19% do PIB). Foi anunciado também um

corte adicional de R$ 8,6 bilhões no Orçamento de 2015, totalizando um

contingenciamento acumulado de R$ 79,4 bilhões nos gastos entre todos os

poderes no ano.

Fruto do primeiro corte, o MD terá um orçamento de R$ 17,028 bilhões para

2015 em custeio e investimento. O contingenciamento foi de R$ 5,617 bilhões

(24,8%) em relação ao fixado na Lei Orçamentária Anual que era de R$ 22,645

bilhões. Em função disso, o EB planejou-se para um investimento anual de R$ 200

milhões no Projeto NFBR, mas teve que adaptar-se para recursos de cerca de R$

120 milhões. Para tanto, negociou com a IVECO e conseguiu evitar o fechamento da

fábrica que fora anunciado pelo Diretor of Bus and Defence Vehicles Divisions da

Iveco Latin America, Humberto Marchioni Spinetti14 .

Para evitar o fechamento da fábrica e garantir o prosseguimento do Projeto

NFBR, o Exército comprometeu-se em adquirir 60 unidades/ano (anteriormente

seriam 100), estendeu o prazo de aquisição para 2045 (anterior era 2035), assim

como adotou a VBTP-MR como um veículo blindado oficial. Tal ação possibilitará a

IVECO comercializá-lo no exterior.

14 Disponível em http://www.defesanet.com.br/bid/noticia/19226/Cortes-no-Orcamento-ameacam-a-linha-de-blindados-da-Iveco-e-atividade-militar-da-Embraer/ Acessado em 24 de julho 2015

Page 41: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

40

Porém ainda não há garantias de que tais medidas serão suficientes para

assegurar o prosseguimento do Projeto NFBR. A conjuntura é muito dinâmica e

novas ameaças podem surgir. O fraco desempenho econômico do país e os

cenários para 2016 e 2017 são ameaças em potencial.

4.1.4 Projeção da situação econômica para 2016

Na última edição do Relatório Focus, de 11 de setembro de 2015, a

estimativa do mercado para a inflação em 2016 é 5,84%. Tal previsão foi divulgada

pelo Banco Central. Com relação ao PIB, a previsão é de alta do PIB de 0,8%. O PIB

é a soma de todos os bens e serviços feitos em território brasileiro,

independentemente da nacionalidade de quem os produz, e serve para medir o

comportamento da economia brasileira.

Com relação ao resultado da balança comercial para 2016, a previsão de

superávit subiu de US$ 9,95 bilhões para US$ 10 bilhões. No tocante à taxa de

câmbio para o término de 2016, a previsão dos analistas avançou para R$ 3,75 por

dólar.

O governo enviou ao Congresso o orçamento para 2016. Em tal orçamento

há um déficit R$ 30,5 bilhões. Na noite de 14 de setembro de 2015, o governo

anunciou um corte em seus gastos entre R$ 25 bilhões e R$ 26 bilhões, além do

aumento de impostos, como o IOF, e a proposta de recriação da Contribuição

Provisória de Movimentação Financeira, com alíquota de 0,2 % para cumprir a meta

de 0,7% do PIB em 2016. Tal proposta depende de aprovação do Congresso, mas

demonstra que o governo além da falta de governabilidade terá muita dificuldade na

condução da política econômica. Além disso, a equipe econômica estuda realizar um

esforço para redução de incentivos fiscais e subsídios e, também, redirecionar a

contribuição do Sistema S (Senai e Sesi) para a cobrir o rombo na previdência.

Enfim, as projeções econômicas para 2016 não são animadoras. Há

previsão de piora em todos os indicadores macroeconômicos. Isso não nos faz

concluir que há grande possibilidade do ajuste fiscal continuar sendo o remédio a ser

aplicado para a solução dos problemas. Caso tal ajuste reduza ainda mais os

recursos para o investimento, será muito difícil conseguir manter o acordo firmado

com a IVECO e, desta forma, garantir o prosseguimento do Projeto NFBR.

Page 42: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

41

4.2 CONJUNTURA INTERNACIONAL

O Brasil poderia estar produzindo, em suas versões mais atualizadas, um

dos mais modernos carros de combate do mundo. Porém uma ação diplomática do

governo americano, em 1989, no processo de venda de carros de combate (CC)

para a Arábia Saudita, fez com que o blindado o M-1A1 Abrams fosse escolhido,

apesar do CC Osório tê-lo superado. O contrato de expressivos U$ 7,2 bilhões foi

fechado com a General Dynamics, fabricante do carro de combate.

A Arábia Saudita testou quatro carros de combate. As provas de

desempenho aconteceram durante uma semana nas areias do deserto sob

condições climáticas adversas (temperaturas acima de 50º Celsius). De acordo com

PAIVA (2013) “o CC Osório, fabricado pela ENGESA, superou em todos os aspectos

os M-1A1 Abrams (americano), o Challenger (inglês) e o AMX-40 (francês).”

Sobre essa passagem, o Jornal O Estado de São Paulo, de 10/12/2002, tem

o registro de um engenheiro de armamentos, ex-executivo da ENGESA, que disse:

“Nesse momento as luzes de emergência se acenderam no governo americano15” e

este pressionou imediatamente.

No final desse episódio, a Arábia Saudita comprou 702 blindados M-1A1

Abrams da General Dynamics. A ENGESA havia apostado suas últimas fichas no

desenvolvimento do CC Osório e a assinatura do contrato com a Arábia Saudita

chegou a ser marcada para duas oportunidades. A ENGESA decretou falência.

A partir de 1996, o Brasil comprou 87 CC Leopard 1A1 da Bélgica, 91 M-60

A3 TTS dos EUA, estes últimos sem condições de tráfego pelas pontes que cruzam

o interior do pampa gaúcho, onde estão as unidades de cavalaria que usam os CC.

Sobre a importância da ação do Estado na questão da defesa, o Jornal

Estado de São Paulo, em matéria16 de 05 de setembro de 2002, afirmou que o

engenheiro José Luiz Whitaker Ribeiro, ex-presidente da ENGESA, disse que:

As transações são feitas no mais alto nível do poder,sentam-se nas mesas de negociação governantes e seu primeiro escalão financeiro [...] depois de vender armas para um determinado exército nacional, fica muito mais fácil oferecer ao presidente do governo-cliente o fornecimento de serviços de engenharia, alimentos, automóveis ou qualquer outra coisa.

15 Disponível em http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2013/08/28/blindados-uma-autossuficiencia-abortada . Acessado em 26 de julho de 2015 16 Disponível em http://economia.estadao.com.br/noticias/geral, brasil-esta-de-volta-ao-mercado-de-armas,20020905p37101. Acessado em 26 de julho de 2015

Page 43: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

42

O Comércio mundial de armas, em 2014, movimentou cerca de U$ 1711

bilhões de dólares, segundo o Stockholm International Peace Research Institute

(SIPRI). Os EUA são os maiores exportadores mundiais com 31% do mercado,

seguidos de Rússia e China.

Outro episódio que demonstra a interferência e a concorrência internacional

é o caso da venda da VBTP-MR para o Exército Argentino. Durante a LAAD 2011, o

Guaranifoi visitado pelo Senhor Arturo Puricelli, Ministro da Defesa da Argentina, o

qual demonstrou interesse de seu país em participar do projeto. Tal interesse

desencadeou trocas de visitas, ao longo de 2011, entre os Ministros da Defesa da

Argentina e do Brasil com o objetivo de costurar a participação da Argentina no

projeto. Porém a demanda da Argentina era de uma viatura 8x8, mas isso não

impediu que o “Ejército Argentino” solicitasse, de forma emergencial, 14 (catorze)

viaturas para equipar a unidade binacional Argentina-Chile, Brigada de Paz “Cruz del

Sur”. Para tal o Exército Brasileiro cederia sua preferência nas primeiras viaturas do

lote de experimentação. A negociação avançou, porém não foi concluída, apesar do

esforço do Ministério da Defesa do Brasil. A aquisição não se concretizou. A

Argentina comprou blindados chineses.

Os governos investem em setores estratégicos para assegurar a sua

soberania. Como demonstração do suporte fornecido pelos países desenvolvidos, os

valores dos investimentos federais nos setores de Defesa, Aeronáutico e Espacial

vão de alguns bilhões de dólares, no caso dos países europeus e dos EUA, segundo

dados da Organization for European Economic Cooperation (OECD). No contexto

espacial, o Brasil gasta apenas US$ 50 milhões. A Deputada Jô Moraes, em

discurso para o plenário da Câmara dos Deputados, no dia 22 de abril de 2015,

afirmou que “entre os países dos BRICS, o Brasil tem o menor orçamento de Defesa

em relação ao PIB. A média do grupo é de 2,3% do PIB, enquanto os investimentos

brasileiros giram em torno de 1,5%”.

O esforço de investimento de governos em P&D tem como objetivo a

aquisição e manutenção do Poder por meio do domínio tecnológico completo, desde

a concepção até a operacionalização dos meios. Considerando que os produtos dos

setores de Defesa e Aeroespacial, pela evolução tecnológica exigida, não se acham

disponíveis "na prateleira" pois são baseados em especificações e requisitos, é

fundamental garantir seu completo desenvolvimento. O país que não possui

Page 44: SANTOS, Rogério Matos Dos. Projeto Estratégico Guarani

43

autosuficiência tecnológica e adquire seus materiais no exterior, paga pela execução

do incremento tecnológico no outro país, ajudando, assim, a consolidar o Poder

alheio, contribuindo para gerar empregos qualificados e abrir novos mercados além

fronteiras. Em termos de geração de empregos, estudos publicados pelo

Departamento de Comércio dos EUA indicam que uma exportação de US$ 1 bilhão

na área aeroespacial gera 15.000 empregos.

Os Estados com pretensão de liderança política e econômica aplicam

barreiras protecionistas e de concessão de incentivos para seus setores

estratégicos. Ciência e Tecnologia se desenvolvem atreladas ao parque industrial e

o país que não tiver capacidade ou interesse na absorção da inteligência de seus

próprios recursos humanos assistirá tal desperdício migrar para os Estados

desenvolvidos, sendo apenas exportadores de produtos primários, caracterizados

pelo baixo valor agregado, perenizando, assim, a dependência. Tal fato já está

acontecendo no Brasil.

A ABIMDE indicou os ganhos com a venda de matérias sem valor agregado

e aquelas com alto valor agregado, partindo da mineração (ferro) a US$ 0,02/Kg e

produtos agrícolas a US$ 0,30, até produtos de defesa, como foguetes, a US$

200,00/Kg, ou ainda, mísseis e telefones celulares a US$ 2.000,00/Kg, comprovando

a nossa necessidade de investimento sem tecnologia e em produtos de alto valor

agregado.

O Barão do Rio Branco, em discurso pronunciado em 15 de outubro de

1911, quando da inauguração de seu retrato no Clube Militar do Rio de Janeiro, ao

falar sobre defesa nacional afirmou17:

Os povos que, a exemplo do Celeste Império, desdenham das virtudes

militares e se não preparam para a eficaz defesa de seu território, dos seus

direitos e da sua honra, expõem-se às investidas dos mais fortes e aos

danos e humilhações consequentes da derrota. (Obras do Barão do Rio-

Branco: Vol.IX Discursos, p.317).

17 Disponível em http://funag.gov.br/loja/download/978-Obras_do_Barao_do_Rio_Branco_IX_discursos.pdf. Acessado em 25 de julho de 2015.

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44

5 CONCLUSÃO

O presente trabalho, como exposto na introdução, teve como objetivo

analisar a conjuntura nacional e internacional identificando os possíveis impactos

sobre o prosseguimento do Projeto NFBR – o Projeto Guarani. Cabe ressaltar que o

Projeto GUARANI tem por objetivo transformar quatro Brigadas de Infantaria

Motorizada em Mecanizada e modernizar todas as Brigadas de Cavalaria

Mecanizada. Para isso, estão sendo desenvolvidas novas famílias de Viaturas

Blindadas de Rodas a fim de dotar a Força Terrestre de meios para incrementar a

dissuasão e a defesa do território nacional. Serão viaturas médias (6x6 e 8x8) e

leves.

A VBTP-MR 6x6 foi escolhida para ser a primeira da família a ser

desenvolvida. O projeto ficou a cargo do DCT que decidiu contratar uma empresa

para o desenvolvimento do protótipo. A empresa contratada foi a FIAT SA, a qual

designou a sua divisão IVECO para tal tarefa. O início dos trabalhos foi no ano de

2006. Atualmente já foram fabricadas 188 (cento e oitenta e oito) unidades da VBTP-

MR. Além dessas, outras 1200 (hum mil e duzentas) serão fabricadas.

Os estudos sobre a subfamília média na versão 8x8 (VBR-MR) estão em

fase de elaboração dos Requisitos Operacionais Básicos. Já foi escolhido o sistema

de armas 105 mm e alguns poucos detalhes. O EB tem uma demanda de 396

(trezentos e noventa e seis) unidades.

O desenvolvimento da subfamília leve 4x4 está mais adiantado do que a

VBR-MR 8x8. Os Requisitos Operacionais Básicos das várias versões já foram

definidos. Esse processo teve início com uma pré-qualificação em apreciação

técnica, a cargo do CAEx, com requisitos estabelecidos pelo EME. A demanda por

este tipo de viatura é maior do que as outras da NFBR - serão necessárias cerca de

1500 (hum mil e quinhentas) unidades.

Além do projeto de desenvolvimento e fabricação das plataformas, existem

vários subprojetos já em execução ou prestes a serem iniciados, tanto os

relacionados com sistemas do blindado quanto os que viabilizarão a preparação do

EB para recebê-los. São projetos de Infraestrutura, Doutrina, Desenvolvimento de

Software, Pesquisa e Desenvolvimento, Suporte Logístico Integrado (SLI),

Nacionalização da Munição, Recursos Humanos, Comando e Controle, Simulação,

Gestão Orçamentária, Gestão de Contratos e Meio Ambiente que perdurarão até

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2045. Como parâmetro, os blindados URUTU e CASCAVEL estão em uso no EB há

mais de 40 anos. Enfim, o Projeto da NFBR é bastante amplo e complexo. Sua

execução, por ter tal amplitude, além de contribuir para o crescimento da indústria

nacional de defesa, criará condições para que o Exército Brasileiro possa, cada vez

mais, adequar-se às exigências decorrentes do Processo de Transformação.

A indústria nacional de defesa, onde o Projeto Guarani está inserido, é um

setor estratégico diretamente relacionado com a soberania e o desenvolvimento. Ao

longo da história, passou por períodos de diversas dificuldades, entremeados por

pequenos momentos de bons resultados, tendo seu período áureo ocorrido entre a

década de 1970 até o início da década de 1990.

O Brasil já foi um grande exportador de armas convencionais, mas,

atualmente, não pertence mais a esse grupo. Hoje praticamente é composto pelos

países do G8. O mercado mundial movimentou, em 2014, aproximadamente 1,7

trilhões de dólares. Esse declínio da indústria nacional de defesa, motivado por

diversos fatores apresentados neste trabalho, acabou por colocar o Brasil como um

país dependente dos produtos de alta tecnologia do mercado internacional.

A partir da década de 1990, a indústria nacional de defesa entrou em

declínio e até os dias atuais passa por sérias dificuldades para sua sobrevivência.

Dentre as causas que levaram a indústria nacional de defesa ao declínio, destacam-

se, de um lado, as relacionadas com a situação econômica e as prioridades do

governo e, do outro lado, as relacionadas com fatores externos.

Infelizmente, algumas das causas permanecem presentes na conjuntura

atual e, ainda hoje, dificultam o desenvolvimento do setor BID: os altos custos

envolvidos na P&D de novos produtos; a baixa demanda do mercado interno, fruto

dos baixos orçamentos das Forças Armadas nos últimos anos; a existência de

barreiras interpostas pelos países mais desenvolvidos, dificultando ou mesmo

impedindo o acesso a tecnologias de emprego militar e o defasado nível tecnológico

da maioria dos equipamentos das FA com obsolescência elevada.

Tal conjuntura quase interrompeu o prosseguimento do Projeto Guarani. O

primeiro ajuste fiscal do governo, anunciado em maio de 2015, cortou os recursos

destinados ao MD na Lei Orçamentária Anual 2015. Tal corte afetou principalmente

as atividades de investimento e inviabilizou a manutenção das condições iniciais

contratuais do Projeto Guarani. A IVECO anunciou o fechamento da fábrica ainda

em maio de 2015. Porém o EME conseguiu negociar, diminuindo o número de

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unidades a serem compradas e estendeu o prazo de vigência do contrato até 2045.

Foi assinado um Termo Aditivo e a IVECO comprometeu-se em prosseguir com a

fabricação.

Pelo exposto acima, a hipótese deste trabalho já foi confirmada. Aspectos

econômicos da conjuntura interna quase impediram o prosseguimento do Projeto. A

conjuntura é dinâmica, isto nos leva a refletir que ainda é possível um agravamento

da situação econômica em futuro próximo ou até mesmo outro aspecto possa surgir.

As previsões econômicas para 2016 não são favoráveis. É possível que o

aperto da torneira de gastos públicos tenha que ser ainda maior que o de 2015.

Caso este cenário venha a se concretizar, é possível que outro corte de recursos

possa inviabilizar o prosseguimento do Projeto Guarani.

A Política e a Estratégia Nacional de Defesa são um marco histórico para

política de defesa do país, já que pretendem que a defesa possa ser discutida em

âmbito nacional. Ao mesmo tempo fazem a previsão de crescimento da indústria de

defesa com aporte financeiro e incentivam a pesquisa para o desenvolvimento no

campo científico e tecnológico.

Fruto de trabalho do Ministério da Defesa, a legislação, relacionada com a

indústria nacional de defesa evoluiu proporcionando sustentação às iniciativas para

o seu desenvolvimento dessa Indústria Nacional, para a nacionalização de produtos

e serviços e a diminuição da dependência externa brasileira.

A aplicação desta legislação tem grande potencial para alavancar a área de

C&T do EB. Constata-se, portanto, que o MD vem buscando, mesmo que de forma

incipiente, desempenhar seu papel como indutor de P&D, produção e inovação no

setor industrial de defesa. Porém, ao longo dos últimos cinco anos, dois dos

principais obstáculos têm sido a ausência da prioridade do governo e a falta de uma

maior conscientização da sociedade a respeito da importância da defesa do imenso

patrimônio que o Brasil possui.

Portanto, o que fazer para aumentar a capacidade militar das Forças

Armadas diante de um quadro de ausência de prioridade governamental para ações

de defesa? Quadro esse que é sustentado pela debilidade da mentalidade de defesa

brasileira.

Nesse ponto, depara-se com um grande obstáculo político: como aumentar a

participação das Forças Armadas no Orçamento Geral da União? Com certeza, a

disputa por maiores fatias do orçamento requer ação política. Tal tarefa é complexa

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e difícil além de requerer firme liderança estratégica com visão de antecipação aos

fatos. A situação exige que as FA mostrem o seu indispensável e intransferível papel

na defesa nacional. Faz-se necessário, também, convencer personalidades

influentes do processo decisório e opinião pública que a defesa nacional necessita

de atualização permanente do aparelhamento das Forças Armadas, com ênfase no

apoio à ciência e tecnologia para o desenvolvimento da indústria nacional de defesa.

Visa-se, com isso, à redução da dependência tecnológica e à superação das

restrições unilaterais de acesso a tecnologias sensíveis.

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REFERÊNCIAS

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______. Decreto no 6.703, de 18 de dezembro de 2008. Aprova a Estratégia Nacional de Defesa , e dá outras providências Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2008/Decreto/D6703.htm>. Acesso em: 17 maio 2015. ______. O Projeto Guarani. Revista Verde Oliva , Brasília, DF, n. 227, abr. 2015. Especial. _______. Projetos estratégicos Indutores da transformação do Exército. Revista Verde Oliva , Brasília, DF, n. 217, nov. 2012. Especial. BOABAID, José Wilson da Silva. GUARANI: uma análise sobre o projeto estratégico do exército e seus reflexos no fortalec imento da indústria de defesa no Brasil . Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de Comando e Estado Maior) - Escola de Comando e Estado-Maior do Exército. Rio de Janeiro, 2014. CARRILHO, Paulo Cezar Gomes. Projeto Estratégico Guarani . Trabalho de Conclusa de Curso (Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia) - Escola Superior de Guerra, Rio de Janeiro, 2014. FERNANDES, Cláudio Gadelha. O desenvolvimento da indústria de defesa para o fortalecimento da soberania nacional diante do ce nário político internacional . Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de Comando e Estado Maior) - Escola de Comando e Estado-Maior do Exército. Rio de Janeiro, 2013. HARNISCH, Marcelo Zanon. Indústria Nacional de Material de Defesa – Uma perspectiva de desenvolvimento provocado pelo equip amento das Brigadas de Infantaria Mecanizada com a Nova Família de Blindad os . Trabalho de Conclusão de Curso (Curso de Comando e Estado Maior) - Escola de Comando e Estado-Maior do Exército. Rio de Janeiro, 2007. GIL, Antonio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa . 4 Ed. São Paulo: Atlas, 2002. 175 p. ISBN: 85-224-3169-8. LANGE, Valério Luiz. A Indústria de Defesa no Brasil. Artigo publicado no International Journal of Defense & Conflict Analysis. Local: Instituto Galego de Estudos de Segurança Internacional e da Paz. 2007. PAIVA, Paulo Ricardo da Rocha. Blindados, uma autossuficiência abortada. Jornal do Brasil, 28 ago 2013. Disponível em: http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2013/08/28/blindados-uma-autossuficiencia-abortada. Acesso em: 28 jul . 2015.

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ANEXO A – DISTRIBUIÇÃO DAS VBTP-MR

OM Guarnição Quantidade CIBld Santa Maria - RS 04 33º BI Mec Cascavel - PR 32 34º BI Mec Foz do Iguaçu - PR 13 30º BI Mec Apucarana - PR 13 16º Esq C Mec Francisco Beltrão - PR 04 11º R C Mec Ponta Porã - MS 12 17º R C Mec Amambaí - MS 12 57º BI Mtz Rio de Janeiro - RJ 13 1º BI Mtz Rio de Janeiro - RJ 13 2º BI Mtz Rio de Janeiro - RJ 13 36º BI Mtz Uberlândia - MG 32 3º Esq C Mec Brasília - DF 04 10º R C Mec Bela Vista - MS 12 41º Bi Mtz Jataí - GO 11

Fonte : Gerência do Projeto P&D da Família de Blindados Guarani, 2015.