Santa Gema Galgani (Parte I)
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Transcript of Santa Gema Galgani (Parte I)
* /
P* GERMANO DE SANTO ESTANISLAU*
Santa G em a G a lg aniA F L O R D A P A I X Ã O
íroduçÔD do Rcv.° P.* MATOS SOARES
T [ * C t l « A C D I Ç A O
Aurrcnícco e cctoslticdoP t L O
P.« JOSÉ 0 £ OLIVcIRA DIAS. S. J.
S3 * M I L H A R
P O K I O
LIVRARIA APOSTOLADO DA iMrRENSA
EUA Dc CEDOfEirA. 623 * .
JÇíO
N ImI f.bital
Olyi'pcr»*, 3-2-íÇ^O
PAULUS DURÃO. S J.
Pioep. Piov. Lvnl
P ^j* Imprim’#.i^.
Pd:*.0 ió d t F«/.° <£♦ *«940.
f A . A.f SISPO D O FCR TO
Todos os direitos ce piopriedcdo teservatioi
Com p. c l.rp. no f«p. StÇceuo. llmítoda — Poilo
E x p l i c a ç a o que s e im p õ e
S T A nova edição da vida d c Santa O cn u
Galga.ni atendeu-se sobretudo a er.riquccéda
com abundante ilustração— i 2 ião as feto-
gr a r uras que a adornam — . a esclarecera com algumas
notas oportunas, a aetualirã-la c a complctá-h. por.do-a
cm dia com r. ad ição das novos capítulos references à
glorificação da mística Passiflora de /.«ca .
£s tc tiaba lho per err. competia per todes cs titi:!os
ao Rev." P .e h ia tos Scare*, a quem sc deve a tradução
desta encantadora biografia. Com cia teve Sua R cv .' o
merecimento dc to rrar conhecida cm Portuga!. d<: hã 18
anes para cã. esta jói.i autêntica da graça divina, cujo
nome auspicie>i> Jc i a dv jin içâo perfeita da sua alma.
M as. absorvido actualmente por um grande em
preendimento d a glória dc Deus. r.ão pode o Rcv " ,*r.i
dutor ocupar-sc deste trabalho, para o qua! ninguém
mais do que cie estava naturalmente indicado.
11. o que mãos menos competentes fizeram. Ji.it> o
V I S A N T A G E M A G A L G A N l
fariam. sc não fôsse o que já estava feito. Por isso ainda
sc pode d í;cr que esta nova edição é obra do Sr. P.«
Matos Soares, exceptuando as deficiências que o leitor
nela encontrar.
Creio que a encantadora virgem dc Luca. que tanta
influência, mostrou exercer no coração do D ivino C ru
cificado. não me levará a ma! que eu aqui lhe diga que
o Rev." P .e Matos Soares, iniciador da sua devoção em
Portugal, tem direito a tódas as bênçãos da Sua pro
tecção para a grandiosa obra que nesta hora o preocupa.
J. O . D.
L M A G A L G A S I Sar.ta'
S ã o 05 prem id a s auspiciosas cun ; p on íi/ ú .i.fo
<;ui' desponta esperançoso. cr-.bora s o b re : :t- ta J o pels* c la r in s de M a rre . S ã o j s
c/.if/o c r - <ync desabroche:: o secuto X X . <yyf r i.i c. n ftr.jí. c p rit i'e ira santa do nosso século.
Gema santa! Sont.1 . cp.:e c r.::::%!e•
/rioro. que essa foi a fãtna que na u r u daxo:: ,:C ivor
para o céu. V ox popi:!: vo\ Dei. COjí-t-.j d::ee-se. /’- </e-
-facto. Sonto //:c co.T.eça a chamar r-.o;e a If .c .a /:.i jy.i
espie r.d o rosa li tu rijia.
Opero» c::> nirn çrorulcs rr.orovilhos AçucSc <JtC i
poderoso c cu jo nome c sorto. poJro ela ds:er. fa;çr.Jo-so
eco da Virgem dc Naeaeè. Sim. também Gctr.a Gal-
pant tir.ha o seu Magnifico: para cr.rear. l i entcou’o
hoje. sob a majestosa cúpula de S. Pedro. pela i o : de
Cristo repercutida r.os lábios de se.: \'igãrio. entifo-
nciro augusto de tidas a< gerações que lhe hão dc cha-
V III S A N T A G E M A G A L G A N I\
mar beni-avcntuiada. que hoje lhe começam a chamar
santa.
Escuta, leitor, as harmonias disse Magnificat, reco
lhe o j ecos dessa apoteose que transcende todos os encó-
mios que na terra se podem tributar a unt simples mortal:
«Para honra da Santíssima Trindade t dc cada uma
das Pessoas Divinas, para exaltação da fé católica :
aumento da religião cristã, per autoridade de N . S.
Jesus Cristo c dos bemaventurados Apóstolos Pedro c
Paulo, depois dc madura deliberação c tendo reiteradas
veres implorado o socorro divino e tomado conselho com
os Cardiais da Santa Igreja Romana. Patriarcas. Arce
bispos e Bispos presentes nesta cidade de Roma. D E
C L A R A M O S S A N T A A BEATA G E M A GAL-
G A N I. como tal a definimos c inscrevemos r.o catálogo
dos Santos».
íi a ro : de Cri?to. tornado visirel no seu Pontífice.
a anunciar ao mundo que em Gema Galgani operou dc-
■facto grandes maravilhas Aquêle que c pederoso e cujo
nome c santo.
E queres saber, leitor, que maravilhai foram essas
do poder e da santidade dc Deus?
Abre este Urro. que nele verás a angélica açucena
de I.uca aliando a uma inocência imaculada os santos
excessos duma penitência que nunca puderam saciar os
seus anseios de expiação. Ve-la-is enreredando corajo
samente pelos caminhos da santidade. Mas a santidade
dc Gema não foi ir.fusa. não. Também ela peccu cm
Adão. e... não foi confirmada enf graça. Nem foi de
rosas o caminho que seus pês trilharam. Os espinhos — .
c dos mais dolorosos — foram a sua herança. Ô rf i
P R E F A C I O IXi
desde menina, viu sôbre a sua. família, afeita a uma vida
desafogada, desabar a ruina e a miséria.
A leitura destes contratempos não fará mais que
aulncntar em ti o interesse que desperta uma vida tá o
clieia de maravilhas.
Abre este livro, leitor: e. r.o meio da tantos vaivéns
da fortuna, verás a jóia primorosa da família Galgani
aureolada de refulgentes carismas. como o* que r:ais
r.os assombram na vida dos maiores sar.tos. Vc-la-ás
em frequentes êxtases que arrebatavam o seu espirito
às alturas luminosas dum mundo sobrenatural e qt:e aca
baram por fazer de tèda a sua vida cm continuo extase
d : amor c de inefável contacto cem a Divindade.
Abre este livro e dc-pressa experimentarás esse
magnetismo divir.o. essa irresistível atracção que no
mundo das almas r.áo cessa de exercer a gema virginal
de I.uea. «cui r.oiv.cr. orr.cn». dis<c esta manhã o Augusto
Pontífice r.o aureo panegírico engastaJo r.a homilia da
Canor.i: i ;ão.
Verdadeira jóia da graça, esplendorosa pérola do
paraifO. o seu nome foi de-facto o auspicioso preságio
da sua auréola de santa. f\ a atracção da virtude, c a
in«.vjira>'.u' da santidade, são os castos er.levos duma can
dura que extasu c cativa, começando por te despertar
a admiração c terminando — quem sabe? c oxalá! — por
te arras/ar à imitação.
Folheia éste livro, c ser-te-á dado assistir a inefáveis
ascensões duma alma que sobe de claridade cm claridade
por todos os degraus da vida mística, dcsdc o recolhi- .
ncnlo infuso, c da união extátiea até um inexprimível
çontacto divino, até não sei que transfigurações será
X S A N T A G E M A G A L G A N I
ficas, deliciosas fruiçccs do amor dirino. que nos dei
xam a ilusão dc serem já beatíficas.
Observa atra ris destas despretenciosas páginas os
passos da sua rida angelical, sobretudo nos últimos anos.
c verás a grande apaixonada da Paixão do Salvador,
ora bar.hada cm misterioso suor dc sangue, que lhe jorra
copiosamente de todos os poros durante os seus êxtases,
era ferida visivelmente, freqüentemente e dum modo
cruento petos estigmas do Dirino Crucificado, que se lhe
reproduzem nas mãos. nos pés. no lado. eir.quar.to o
espirito, transportado para as regiões Itimincsas dum
mundo superior, se abisma na contemplação dos misté
rios dc Getsemani. do Pretório, do Gólgota.
N io e tudo. leitor. Para acabar de retratar cm
Gema a fisionomia dolorosa do Salvador, são ainda as
chagas da flagelação que misteriosamente se lhe abrem
por todo o corpo, e nele cicatrizam não menos misterio
samente: c a agonia mortal: c a cruenta coroação de espi
nhos que lhe deixa tõda a cabeça cr irada dc inexpli-
eàreis picadas, donde dimana o sangue em fio: são
cmfim lágrimas de sangue que lhe bretam dos olhos e
deslisam pela face. fenómeno inédito nos anais da agio-
grafia mística. Efeitos assombrosos, originados da sim
ples meditação da Paixão, cm que se abisma a alma
compassiva da mistica P.issiHor.i dc Luca. ou Flor da
P.ii\5o. como hoje mesmo lhe chamara Pio X I I no acto .
da canonização.
\'olta a página, leitor, prossegue na tua leitura.
Peru fut.j j j confidir.cias da santa donzela, as intimida
d a ,f.i «uj t-íJa angélica: e no santuário augusto dum
rccar.ufo aposento, transformado em celeste mansão
P R E F A ' C I O X I
duma virgem candidissima. terás mil ocasiões dc a veres
perdida na contemplação do Salvador. que. ora em apa
rições sensíveis, ora em visões extáticas, se lhe apresenta
c a entretém, já com ir.di:iveis comunicações c colóquios
que te convido a saborear, já ccm revelações c caricias
divinas que não te è dado ambicionar.
Nem deixarás de a aJir.ircr também. já sorrindo
extaticamente para a Rainha das Virgens que visivel
mente lhe serri. e a quem ela com encantadora familia
ridade chama a sua qucrni.i n.im.V ; j recreada num
esfsontãnco .Vvonuác per alguns bem-ai-enturadot c es
píritos angélicos que a vim visitar, já trava-.do a ti rela
ções de fraternal convivência e vivendo, quási diria, de
braço dado com o íc:i bom Anjo. que ser. c do correio
visível para lhe levar a* cartas ao director da sua
alma.
Penetra no santuário do seu espirito e vi-lo-ás com
frequência iluminado de I::: profética descobrindo o fu
turo e o longínquo com a clarividência duma perfeita
intuição e lendo r.o interior das almas o* seut mais
recônditos segredos.
E que— se não sentirá extasiado d-ar.te dessa sim
plicidade infantil, com que tão naturalmente a todos
julgava dotados dot mesmos carismat que ela. a ponto
de um dia pedir ao Senhor escondesse da vi-:a de outros
o semblante demasiado severo do seu An:o Custódio*
Não e-.contrarás. leitor, exemplo de tZo sublime inge
nuidade. como a que. ao sentir pela primeira ve: em
suas mãos e pis os estigmas da crucifixão, fé: correr a
inocente menina ccm as mãos abertas para sua tia. e
di:cr-lhe: «Olhe o que n c fiz Jesus!»
X I I S A N T A G E M A G A L G A S I0
Não dês ainda por terminada o tua leitura. Tcris
também ensejo dc presenciar episódios duma rida será
fica. Estende a mâo sôbre esse peito incandescente.
or.de palpita tin coração cm cachões. Bruscamente, ins
tintivamente. fugindo <i veemência da combustão, terás
de a retirar quasi a arder, como teve dc a retirar q:ien
ousou fa:er a experiência. Labaredas inefáveis do amo:
divino, qttc lhe deixaram o peito marcado Jc queimadura*
bem viuveis e que tJo de-pressa a ca b j ram per lhe con
sumir a existência'
Auscu’.t.i C' pu lgões inauditas dêsse coração incen
diado. e vè-la-is sublevar os pesados cobertores que o
abafavam: vè-lo-á< encurvar violentamente as três vér
tebras da caixa torácica que teimavam cm represar na
sua cavidade natural o fogo dum coração que nenhuma
fõrça humana podia reprimir. Coração dc virgem c cora
ção de serafim, consumido por misteriosas chamas, que
sujeito a uma autópsia indiscreta quar.do nêlc já não pal
pitara a vida. deixo:: boquiaberta a ciência medica, ciên
cia bem limitada que tar.to ambicionava proferir o seu
oráculo e que teve de emudecer diante de maravilhas
parJ ela incompreensíveis!
t\'a< paginas dêste livro te aparecerá cinda a figura
imaculada de Gema Calgani nimbada com a glória do
Apostolado. /:. se o idea! da Acção Católico te sedu:. nela
c nos seus exemplos encontrarás o mais simpático esti
mulo do :êlo das almas. Vitima dc expiação pelos peca
dores mais empedernidos, também ela soube dar almas
o Jesus. Mas o Salvador exigiu que ela lhas pagasse
pelo mesmo preço por que P.le as comprara: oração, sacri
fícios. sangue, h'oram conversões admiráveis, mas custa-
# •» «r •
\
P R E F A C I O X I I I
nm-iíie suores de sangue. custaram-lhe as flagelações do
Pretório, custaram-lhe a agonia do Getscmani. E porque
assim cooperou apaixonada c crucntarr.cnte na ebra da
Redenção, por isso sJo também sem conta as conversões
por meio dela operadas r:.j mu n J .i gloriosa.
• • •
Deva-:eios de fantasia exaltada tvJo o que ac3 bas
de lerí Maravilhas de palácios encantados? Scnb.cs durr.a
ilusa. duma histérica?
Também cu seria tentado a crê-h. se r.io sc tra
tasse duma rida contemporânea cujos prodígios puderam
see verificados. estudados, testemunhados e sujeitos à
critica mais exigente. Também cu me inclinaria a ver
cn Gema Galgani uma simples figura lendária, se n.íc
estivesse fresca air.da a tinta des seus escritos, retrato
da sua bela alma. fresco o sangue dos seus estigmas e
das suas transpirações, fresca a memória de tantas mar.1 -
vilhas: se durante mais de trinta anos a Igreia não tivesse
intervindo com todo o rigor dos seus exames, sujeitando
ií mais ir:p!ac.ivet j : itica a vida. as virtudes, os milagres
e os escritos dc Gema. sem excluir a sua autobiografia,
as suas i ai:as e os >eus êxtases.
F. depois de tri 'ta c três mos de exame severíssimo
a Igreja acaba por colocá-la r.os altares. E a Igreja na
canonização dos santos empenha rigorosamente a sua
infalibilidade dogmática. E uma Igreja infalível não
canoniza i/usas nem histéricas.
A / r 5 A S T A G E M A G A L G A .V )
Por outro lado não /ui testemunhos que ofereçam
garantia mais sólida que os desta biografia. E la não
podia ter autor mais autorizado do que tece. Dir-se-ia
difinamente predestinado para escrever a vida desta
alma assim cono fera por Deus predestinado para a
dirigir.
O P y Germano de Santo Estanislati era o director
espiritual c .i Santa, cuja alma foi para cie rnr. Urro
aberto. E foi. além disso, testemunha ocular de muitas
maravilhas que conta.
«/Wio me foi preciso, d i; cie. interrogar traduces
antigas. nem referir-me a testemunhos alheios para re
constituir a vida da Ser\-a de Deus. Também nno corri
0 risco dc apresentar ao leitor, como verdades históricas,
impressões de estranhos. q:ie muitas rezes são menos
justas. Fui eu próprio a testemunha. maior e a me
lhor parte da vida mística de desenrolou-se sob
os meus olhos, podendo repetir com verdade as palavras
do Evangelista 5 . João vamos anunciar-vos o que vimos,
o que o in iir.es, o cue apnlpàtr.os com as nossas mãos. E o
meu testemunho não c o dum observador ordinário, que
só rò a< cotsas superficialmente. mas C o da testemunha
mais íntima que pede haver: do confessor c director espi
ritual a quem r.âo pedia escapar nenhum segredo duma
alma tào cândida».
N ão te escandalizem, leitor, estas últimas palavras.
Dos segredos que esse director espiritual revela, uns
foram presenciados por ête. não coir.o confessor, mas
P R E F A C I O . XV
»
como testemunha, outros /er.i«i*//:c eonji.ide< fera :1a
intimidade do fôro sacramental. tudo lhe fei comu
nicado por escrito — <íc ordinário cm cortcsficndêr.cia
epistolar— . c sobretudo êle recebeu da santa'dirigida
autorização para de iõdas at manifestares de cons
ciência. f citas de qualquer modo que fôrse. fazer o u<o
que a glória de Deus lhe inspiraste.
Em ccr.ehs.lo. ao autor desta biografia r..':o se pode
assacar ignorância de causa, li fa!:a dc ra—.peter.cia.
para interpretar objectivamente cs fenômenos extraordi
nários dc que era teatro j ai ma da j dirigida, muito
menos. file foi um dos homens mais eminentes que hon
raram a Igreja e a benemérita Congregação de S. Paulo
da Cruz.
Arqueólogo ilustre. iniortalizeu-ie pelas excjraeôes
que empreendeu c pelas interessantíssimas descobertas
levadas a cabo no sub-selo da Basilica romana dos San
tos Mártires João c Paulo. Professor abalisado. ensinou
com brilho quasi tôdas as ciências eclesiásticas, como se
em cada uma se houvesse especializado, sen [alar dos
seus profundos conhecimentos de pir.tura. escultura, ar
quitectura. epigrafia e literatura. De tudo dâo testemu
nho as numerosas obras que publicou.
A Ias i? sobretudo cm teologia i?::síh\i que êle te
manifestou mestre consumado e merecedor do elogio que
lhe tributou Pio X . cm carta assinada pelo Cardial Merry
del Vai a i 9 do Seicir.bro de 1907.
A par desse conhecimento das ciências moticas. o
P.e Qermano foi um profundo conhecedor das ciências
medicas, fisiológicas e patológicas.
Este duplo conhecimento, com que dominara a mis-
A í 7 S A N T A G E M A G A L G A M
tic a c a mcdicina. foi o que lhe deu o autoridade c -1
competência cabal dc guia duma alnta que pairara e n
tão cleradas esferas da rida miitica.
M a is do que ninguém habilitado a discernir o fenó
meno mis tic o dos efeitos do histerismo e do hipnotismo.
o sib io Passior.i<ia. com uma intuição dc mestre que
desde o principio acertou sempre, pede com clhar sereno
fazer a autópsia delicadíssima da alma. cuja direcção
Deus lhe confiara dur:: modo tão m.tra ühoso.
Para defender o seu ponto de rista. publicou três
dissertações que rerelam cs mais sólidos conhecimentos
de patologia e q::e foram tidas em grar.de apreço por
mcdicos eminentes. Nelas ficaram refutadas as r.cscias
interpretações de medicos materialistas, que tanto se «.*.%•
forçaram por atribuir a cautas morbosas de histerismo e
dc hipnotismo o< fenómenos sobrenaturais renficitdos
na rida dc Gema Galgani. l i a Igreja infah.-el. cano
nizando a mistica pa» si flora dc Lu ca. deixou plenamente
autorizado o P s Germano, porque, digamo-lo outra re:.
a Igreja não põe nos altares histéricas nem ilusas.
M as há também no Autor desta obra uma qualidade
que o preserra dc precipitações e de entusiasmos des
cabidos.
O s Apóstolos obstinaram-se cm não acreditar na
verdade da Ressurreição, emquanto a não rissem c apal
passem. O P s Germano principiou por nem querer ir
rer e apalpar, a-pesar-de instantemente solicitado pela
Santa c por seu confessor Mor.s. Volpi. Foi necessário
que seu. Superior Provincial interviesse, dando-lhe ordem
expressa de ir a Luca. ■ t
C. já que me referi a M ons. Volpi. não será inopor-
P R. K F A C I O X V/ l
tuno acrescentar. â guita Je parèntac. q-jc êstc v i r t u e -o
Prelado, confessor dc Gema desde a mais tenra infànci,a.
não sc mostrou menos exigente c céptico. A/as tar.;réni
ele. ccmo 7 'on:e. rc/u a cair Jc jcelhcs d;ar.sc da verdade-
f: no falecer. a 1!) dc Junho dc 1921. quando ;a Üare-a: .i
o.s horizontes do seu espirito a aurora da glorificação !e
Gema Galgani. qi-.is deixar em tc: tamer to tea farte da
sua fortuna para sc levantar um templo A santidade -;j
sua penitente.
• • t
Caro leiter. quando ehegjret ao termo d a ta * pagt-
rtes. não terãs a menor dificuldade ern fazer iu j * j í j-
rras do F.ni.ri • Cárdia! i:r. A. Gau;::ct. O . S f í . a? pre
faciar a trad::-;.lo inglesa desta í iegraf-.j «Qv:ar.: -> a ~.:m.
não conheço biografia dc santo pcrtcnccntc a qualquer
cpoca da I$re;a que r.mfo tenha j;-ra\ínado do -s.eu
espirro o sch:-:na:i:ral. cono a bicara!;.» dc Cetra Ual-
qan». cscrica pelo P.* Germano. Ccni:dero a v:da dc
G cina cc:r:o um daqueles .*ux*.!ics q .ç dc tftr.pcs a fc~-
pos nos >ào dados p.v. i avijjerar a r.ova t i e m.ií
as nossas almas dc Deus...»
Assim c de-facto. /■ raro er.cer.ttae na ;:a ‘.a
cristã uma rida tão aturada dc sehe-aSura!. L).t■ c a
que Deus quis inundar a <craftca d . do\ ru is
extraordinários carismas, para que o r.o*so scc::\\
c um scculo de naturah-mc e de mater.a pudeste ar.::.':r
o mundo sobrenatural. /: <e cj- .V .i a >arr i /au :-
n .V áo exercida pela nda de Gema em todo o /-ando.
São exemplares da >i:.i c ida que dc ano para ano se têm
esgotado por dezenas de milhar cm edifões sucessivas:
{
u
•'JK ^
A T /// S A N T A G E M A G A L G A N I
sáo traduçòcs que se multiplicam cm tódas as lir.guas
conhecidas. Sáo graças c milagres, são conversões. que
como chuva benéfica de bênçãos não cessam dc procla
mar que verdadeiramente operou nela grandes maravi•
"ias quem c poderoso c cujo nome c santo.
Ate os leitores sôfregos do sensacional tem encon
trado nc>tdf páginas o que nem nas páginas tie novela
r.crr. r.os filmes do cinema têm p-ydido saciar essa avide:
de paladares estragados Não c o sensacional mórbido,
produzido por fantasia< ru í* cu menos engenhosas, o
sensacional sempre mentiroso do romar.ee que encon
trarás nestas páginas. It o sensacional que inspira os
grandes ideais da santidade, c sensacional que eleva ns
r.lrr.a«. que as transfigura e arrasta até ao heroísmo da
virtude, porque e o sensacional inimigo do fantástico,
qtie só se alia com a realidade pura e simples: realidade
empolgante, como as que mais o são. mas antes de tudo.
realidade flagrante, realidade autêntica, realidade pal
pitante.
Tais são as grandes realidades que sc desenrolam
ne iti biografia e que tio salutares revoluções têm provo
cado nas alrrjc generosas, desde que o nome de Gema
Galgani começou j ser prenunciado fora de I.u:a.
Na profusão de tão extraordinários carismas, que
enriqueceram a alma de Gema. vê-se que de-facto non
est abbreviate manus Domini.
£ porque o Senhor r.ào encolheu ainda a sua mão
pródiga de dons sobrenaturais, praza ao céu que pela
leitura duma rida que c tfda ela um n o numer.to levan-
tado «i5 maravilhas do Altíssimo e uma epepeia d*s divi
nas prodigalidades. sc suscitem em Portugal renovado
pelas virtudes dos novos, r.ovas gemas. novas pérolas
de igual quilate. jdias de refulgente sanridade. eomo a
que hoje. -ia apcteóse duma suprem* ik t n j J o , subiu
glorificada ao altar de Deus. Em ve: dsma ónica es
tréia. serà urr.a esplendorosa ccnstelaçSo a eintdar no
firmamento da lgre;a
S’So te detenho r:ais. le:tcr. Oxalá untas atrai-és
destas paginas palpitar o coração dc Gema Galgani.
comunicando aos seus leitores os ir.cêndtcs de atncr d i-
vir.o que ela experimentei:, comunicando-lhes etsat tuas
instas dc amar. que te le.ario a dizer ta /w : foi uta
ícraíim q-c passou p<!a terra.
Draga. 2 de Maio dc 19i0.
, Feita da Ascensão do Senhor. t
P.e JOSH DE O U V E !RA DIAS. S. J.
C A P í T • U i L o I
Nascimento c infância dc Gem a__Pre
coces flores dc virtude — Doença e
morte de sua m5i
— i* :s . i«so -
AMIGUANO. pequena povoação virinha da ci-
dadc de Luca. na Toscana, foi o berço da
angélica virgem, cuja vida vou descrever.
Nasceu a 12 de Março de 1S7S. Seu pai tinha fitado
residência com todos os seus. havia j* olguns enos. resta
localidade, or.de exercia a profissão de farmacêutico.
Chamava-se Hcr.rique Galgani e era descendente por
parte da r.ãi. scgur.do sc dir. da famiUa do Beato João
Leonardo.
Sua mãi. Aurélia. pertencia A respective! casa dos
Landi. Eram dois cristãos dc fé antiga. Do seu casa-
r.ento nasceram oito filhos: cinco meninos, um dos quais
morreu ainda no berço, c trés meninas: excepto três
todos morreram no verdor dos anos. Gema era a mais
vélha das meninas.
Segundo o costume de pais verdadeiramente cris
tãos. os esposos Galgani eram solicitos em r.ão retardar
aos recém-nascidos a graça sacramental. Por isso. no
i
2 S A N T A G E M A G A L G A S i
dia seguinte ao do nascimento. levavam-nos à pia baptis
mal para serem regenerados cm Cristo. O mesmo acon
teceu com Gema, baptizada vinte c quatro horas depois
dc nascer, na manhã do dia 13 dc Março, pelo P.f Pedro
Quilici. Pároco de S. Miguel (1).
Não deixa de parecer singularmente providencial o
nome que a menina rcccbcu. Ficava bem o nome de
Gema a uma criança que pelo brilho das suas virtudes,
devia ilustrar a sua familia c resplandecer na Igreja dc
Deus como pccoh brilhantíssima (2). Seus pais escolhe
ram-no. levados certamente pelo grande aíccto que con-
(1) Eis. por ordem crono!ógka. o r.orc dos filhos da casa
Ga!$ar.l:
Cuido, nascido a 30 dc Maio de 1871: falecido perto de P;sa
< !:a!ia) a 19 de Junho de 1922;
Heitor. nascido a ? ! de Março de 157J; íaleciio no Brasil
em 1927;
Euçtr.io. nascido a 5 de Junho de IS76; falecido em Lu:a a
I I de Setembro de 1S91;
C f f l i — Maria — llmberta —- Pia. r.ascida a 12 de Março ie
1S76. falecida a 11 de Abril de 1903;
Artòr.io. n au (do a H dc Março de ISSO; faleodo em Lu* a
a 21 de Outubro de 1W2:
Ar.$e!a. rasc:ia a 30 de Setembro de ISSl; úr.ica sotievi
ver, te & data da car.oniraçSo de Gema. Viveu na America do Su!.
Actualmente viúva reside em Luca
Jú!ia. r.ascida a 30 de Outubro de 1SS3; falecida em Luca a
19 de A$ô*to de 1902.
Acfrca do cutro filho, falecido quási ao r.aKcr. r io temos
noticias certas.
(2) Gemma em Italiar.o. do mesmo modo çue em portu^uff.
significa pedra preciosa. (Nota do Revisor).
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c A P I T u L O 1 3
sagravam a esta filha abençoada. Entre todos os seus
irmâo:inhos Gema era a mais querida. Henrique G al
gani dizia muitas veses: «só tenho dois filho»: Eugênio
c Goma».
Ainda não era decorrido um mis depois do nas;i-
ir.cnto da querida menina, quando Henrique Galgani.
para ficar em condições dc da: a seus filhos educação
r.a is esmerada, fixou residência em Luca. cem tid s a
sua familia.
Havia nesta cidade um per.s:onato para ac&r.os e
meninas, magistralmente dirigido por duas Irsiis. *s
Senhoras Emilia c Helena Valltai. H. Galgani. q je as
tinha conhecido muito bem r.a sua pequena cidade tatal
quando, ainda jovem, vivia cem seu pai Carlos, deuter
en medicina r.ão hesitou em lhes confiar Eugtmo e
Gema. e depois sucessivamente António. Angela e Ju!»a.
Gema freqüentou éste instituto durante cisco ano*, mdo
para lã de manhã e sò voltando â tarde ao se;o de sua
familia. domiciliada então r.a ve ink i rua dos Bctgh«.
Do-pressa aprendeu as primeiras letras, assim ceno
a prática de pequenos trabalhos manuais, prôprics d 3
seu sexo c da sua idade. Suas belas disposições morais,
não menos que suas qualidades intelectuais, causaraa
grande admiração às mestras que. alguns aros depois
de Gema ter saido de casa. escreviam: «A querida Gema
apenas tinha deis ar.es quando o pai nes conficu a sua
cd^'a;ão. Mostrou desde lego uma inteligência preccce.
parecendo até que a ra:ão ja tires se nela desabrochado.
Si>uda. reflectida, grave en tjda a sua conduta, err.
r.aJa se parecia com as companheiras, mesmo mais
velha i. . - '
*
I, 4 S A S T A G E M A G A L C A N I
Nunca foi vista a chorar r.cm a discutir; a sua fitio.
nomia respirara sempre uma sorridente serenidade. Mos
trava-se sempre a mesma, quer fôsse elogiada, quer [ósse
repreendida. A sua resposta, cm tais circunstâncias, con
sistia cm um modesto sorriso, cmquanto que a sua ati
tude conservava uma calma imperturbável, embora fôsse
dotada de um temperamento viro e ardente. Emquanto
tiremos a felicidade de a possuir, nunca houve precisão
de a castigar. Nas suas pequenas faltas, inevitáveis cm
tão tenra idade, bastava uma ligeira observação para a
fa:cr entrar logo na ordem.
<Deis irmãos e duas irmãs a acompanhavam à nossa
cscola: só uma ve: foi surprendida em discussão com
eles. Á nerenda privava-te cm seu favor da melhor fruta.
A refeição do meio-dia preparada no instituto. Gema
mostrava-se sempre satisfeita: nos lábios nunca lhe mur
chava o seu perpétuo sorriso.
Aprendeu sem interrupção, e primeiro que os outros,
as orações usadas cm nossa cscola. cuja recitação com
pleta levava cerca de meia hora. Aos cinco anos lia o
oficio de Nossa Senhora c dos defuntos com tanta faci
lidade como uma pessoa grande: tal era a diligencia que
tinha empregado no estudo do breviário, que já sabia ser
um tecido de louvores ao Senhor, lira. além disso, assí
dua no trabalho e dc-pressa compreendia tudo o que sc
lhe queria ensinar, mesmo coisas acima do nivcl de sua
idade. Tais qualidades tão raras cm uma tenra menina,
faziam com que Gema fôsse amada em nosso instituto,
especialmente per suas companheiras que parecia não
poderem saciar-se de sua companhia».
Ainda h j pouco ( i ) tive ocasião dc ver confirmado
pelas duas referidas senhoras tudo o que s« contém resta
relação, a qual termina com o facto seguinte:
*Acérca desta inocente e virtuosa menina diremos
mais que. por suas orações, alcançámos de Deus uma
graça extraordinária. Tmha-se declarado na cidade a
coqueluche, atingindo todos cs mcnbrot da r.ossa lami-
ha. Um consciência nào pcdiarr.es. pelo peripo de con
tágio. conserrar conr.csco os cinco filhos de 11. Ga!$am.
Nào sabendo que fa:er. aconselha mo-no: con o Pareço
da sua freguesia, o qual no< dnsc que não abtndonisse-
mos .if pobres criancinhas: tar.to mais que sua rr. j i estaia
graremente doente e em perigo de vida. Aceitámos o
conselho e imediatamente, obedecendo aos nos tos dese
jos. Gema começou a implorar os auxilies de Deus.
desaparecendo a doer.ço sem ter atingido una só
da« nossas educanda?. — Assinado: F.mili* e Helena
Vallin:».
H. Galgani. que contemplava com satisfarão os
rápidos progressos da su.i Gema na virtude e nc estude,
sentia aumentar cada ve: mais a sua ternura paternal
para com ela. Nos dias feriados qucria-a incessante
mente junto dc si. Sc era obrigado a ausentar-se. à r.c.tc
quando voltava, as suas primeiras palavras exam quáji
sempre estas: «/: Gema. cr.dc estJ ela?». Indx avam-lhc
então o estreito aposento ende a querida eeniaa sc
recolhia habitualmente para estudar, trabalhar cu pedir
C A P I T U L O I í>
»l) O autor t u r t \ e ? o c í o i t p ^ i da isc f* ia S ís : j «A r.ia
h i *ijn if:c j pcrt.«!o « jj poe 1905». (Neta i o Rtvisor).
%a protecção do seu Jesus, passando quási despercebida
na casa.
Era uir.a alegria para H . Galgani levar a passeio a
sua querida filhinha pela cidade ou peto campo. E sc
não era possível, cm (ais circunstâncias, chegar a casa A
hora da refeição, encomendava para ela nos melhores
hot&s as iguarias mais e.vquisitas; para ela também man
cava vir dos mais céjebres estabelecimentos os vestuá
rios c enfeites.
Semelhante parcialidade, porém, por muito merecida
que seja. não é para louvar num pai. sabendo-se quantas
invejas c discórdias provoca quáíi sempre. A própria
Gema. cuja rectidão de espirito e de coração se mani
festou. podemos afirmá-lo. logo ao sair do bctço. cão
agradava este procedimento do pai: e. embora os seus
irmãorinhos não manifestassem sombra de inveja, ela
queixava-se vivamente a seu pai. protestava que não
merecia distinções c que não as queria. Quando r.ào
conseguia impedi-las. chorava dc desgosto.
Algumas veies êste pai afectuoso tomava a encan
tadora criança sóbre os joelhos para a cumular dc cari
cias c dc beijos. Encontrou sempre resistência e quási
nunca levava a melhor. Aquéle anjo cm carne pensava,
numa idade tão tenra, que não se deve fa:cr distinção
entre as pessoas no que dir respeito à modéstia, c por
isso. debatendo-se com suas pequenir.as forças, excla
mava chorando: «iV jo mc toque. Papá.
— Mas cu sou teu pai. replicava êle.
— Sim. Papá. mas cu nJo qjicro .«cr tocada por
ninguen?. Para não a contristar o pai deixava-a logo
em par. E embora ficasse descontente, terminava quási
6 S A N T A G E M A G A L G A N I
c A P I T I ! L O I 7
serr.pre por misturar suas lágrimas com as da filha, admi
rado de ver tanta virtude em tão tenra idade.
Conhecendo o poder mágico das suas lágrimas, o
pequenina Gema. que foi sempre muito atilada, sabia
tê-las de reserva para casos inocentes em que o seu
efeito era infalível.
A ternura da Sr.* Galgani para com sua filha, não
r.er.os profunda que a do pai. era de outra têmpera.
Era esta senhora uma verdadeira saata c um dos mais
perfeitos modelos dc mãi cristã. Orava incessantemente
ç abeirava-se tòdas as manhãs da mesa eucarística, em
bora o seu cs:ado dc saúde lhe r.ão permitisse ir & igreja
scr.ão com grar.de dif:culáadc. Era o Pão dos »ajos que
n enchia de fórça e dc coragem para se desempenhar,
com pontualidade c perfeição, de todos os seus deveres.
Amava todos os filhos, mas o seu coração era atraído
para Gema dum modo mais particular, porque nela.
melhor que nos outros, se manifestava a predilecção do
Senhor.
Efectivamente a graça do Altíssimo tinha começado
tem ceio a formar esta alma ainda tenr*: manifesta-
va-íc no seu carácter tão bom e tão dócil, no seu amor ò
solidão e ao silêncio, no desprêzo de diversóes e de futí-
lidades pueris, e numa tal ou qual majestade de porte
que não se costuma encontrar na idade infantil.
Em vez de se expandir em vãs demonstrações de
ternura sensível, a Sr.* Galgani. cônscia do seu dever.
codos os cuidados na cultura dêstes gérmens pre
coces de virtude c ccn*t!iuiu-jc. sem hesitar, directora
e>pi:i(uj! de sua filha. Gema recordava muitas vezes
com reconhecimento as indústrias incessantes com que
8 S A N T A G E M A . G A L G A N I%
$c exercia éste magistério nntcrn.il. c declarava dever
sobretudo a sua mãi o conhecimento de Deus c o amor
da virtude.
A Sr.* Galgani tomava muitas vezes nos braços a
querida menina e. apertando-a contra o seio que a tinha
nutrido, dava-lhe santos ensinamentos, acompanhados
ir.uitas veres dc lágrimas: «Pedi tanto .1 Jesus. lhe diria
ela. que me desse uma filha: ouriu-me. c certo, mas um
pouco tarde. Estou doente c dentro cm breve terei de te
deixar>.
Explicava-lhe as verdades da nossa santa fé. o
valor da alma. a fealdade do pccado. a dita dc scr tôda
de Deus e a vaidade das coisas déste raundo. Outras
veres mostrava-lhe o crucifixo e diria: «Olha Gema.
este querido Jesus morreu na cru: por r.ós■>: e. adaptan
do-se à capacidade da menina, procurava farer-lhe com
preender o mistério do amor de Deus para com os
homens c o modo por que todo o cristão é obrigado a
corrcsponder-lhc. Para lhe incutir o hábito da oração
recitava com ela várias preces, de manhã ao levantar, á
noite antes de se deitar c com freqüência durante o dia.
Todos sabem quanto custa ás crianças ouvir instru
ções religiosas c recitar orações vocais, incaparcs como
são dc estar atentas muito tempo, c inclinadas á dissi
pação c aos brinquedos.
Gema nào era assim. A sua felicidade consistia
nestes primeiros ensaios dc piedade cristã. Nunca se
cansava de ouvir e dc orar. E quando sua n ã i a deixava,
por causa dos cuidados doméSticos. a querida ir.enina
agarrava-se-lhe aos vestidos, direndo: «Afam i. fale-me
um pcuco mais de Jesus».
C A P I T U L O I
Esta piedosa mãi. ã ircdtd.i que sc aproximava o
fim da sua vida. com o aumento dej sofrimentos, rodo-
br.iva cíc zelo na educarão re3:g:csa do» filhos queridos.
Todos os sibades acompanhava ou. não podendo, man
dava acompanhar os ma:s \elhcs i igreja para con
fessarem.
Deste medo q-jeria hab^tu.S-lcs cedo à frequenoa
dc tão salutar sacramento. Ela mesma c i preparava; e
C a n i j l i j n j - ( . i ' J < n s’ •» *c 'Í J r j v . * .1 ; . v r j J j <f:rci.’J J .l
i t í e ã J ã ) c i i- c s .f i .1 - ' j j / j . v r l c i a
,-cf i%»i r-i
10 S A N T A G E M A G A L C A N Iê
quar.do chegava a ver dc Gema. a vista da sua gravi
dade. do seu recolhimento e da viva dor que sentia pelas
suas pequeninas faltas, arrancava-lhe muitas Vezes lá
grimas.
Um dia disse-lhe a r.3i: «O h! se cu pudesse lerar-tc
comigol Querias rir?
— £ para or.de7 preguntou a menina.
— Pa:j o Paraiso a «Ver com Jesus c com os anjos».
Estas palavras encheram a criança de grar.de alegria, c
dcsdc èsse momento ateou-se em seu coração um ardente
desejo dc ir para o céu. de»cjo que aumentou sempre,
terminando por consumi-la.
«Foi minha ir.ãi. escreveu mais tarde Gema. que
começou, sendo eu ainda pequenina, a fazer-me desejar
o Paraiso>. E acrescentava com sua simplicidade habi
tual. refcrindo-sc à proibição de pedir a morte: «Agora,
se ainda desejo ir para o céu. c ros peço licença para
isso. respond eis-me com um fortr.al não. Eu tinha dito a
minha mi t que sim. e rccordo-me que. depois de ela me
ter d:to que quer/a lerar-me p<tra o Paraiso. a minha
ro-:tjJe era não a ceixar mais. nem sair do seu quarto».
A doença de D. AurÜia era a tuberculose que h i
cinco anos a ia consumindo. Logo que os médicos re
conheceram a natureza do mal. foi proibido severamente
aos filhos apro\imarem-sc do leito da pobre enfirtna.
Gema ficou muito aflita por sc ver assim dc-repente
separada daquela que amava duplamente, como mãi e
como mestra. Pediu, chorou e com muito custo obteve
que abrissem para ela utra excepção. E agora imagine o
leitor como é que a fervorosa menina se aproveitaria da
permissão obtida. Aproveitou-a bem: mas. a-pesar-disso.
C A P Í T U L O ! II. >
mais tarde. farendo um cuidadoso exame de consciência,
ficou muito aflita por lhe parecer que tinha desobede
cido e que se tinha deixado levar pelo capricho. Ela
mesmo nos vai di:cr o que fa:ia junto do leito da en
ferma:
«7ot/as às r,o:tcs. ar.tcs dc me deitar. u junto
dela para dizer as orações. ajcelhaia á cabeceira do
leito c rezava». Sublime impulso de uma criança que nem
sete anos completos tinha ainda!
Entretanto a tísica multiplicava os seus cvtragos. e
o dia da suprema separação não podia tardar. A piedosa
m ii teve o cuidado de fa:er com que Gena recebesse o
Sacramento da Confirmação ( I ) . «Que melhor poderei
cu fazer, pensava cia. do que ccr.fiar es ta querida fJhi-
fi/u ao Espirito Sar.to antes de dar contas ao meu Deuif
Quando cu lhe faltar, sei a quem fica entregue».
Ela mesmo a tinha jA ido prep.irar.do e afervorando
para receber dignamente aquvle sacramento. Mas. rão
satisfeita com isto. mandava vsr tòdas as tardes a sua
casa uma mestra de doutrina p.ira aperícs-çoar a sua obra.
Depois, na primeira ocasião que se ofereceu, a 26 de
Maio dc ISS5. levaram a criança a basílica dc S. M iguel
in Foro. onde o Sef.hor Arcebispo Nicolau Ghilardi
administrava o Crisma. Um pormenor, que escapou mais
tarde à sua reserva, r.cs da r i uma idea d n graça» de
c!e:ção. dc que o E»p:r»to Santo a cumulou.
Terminada a cerimónia, as pessoas que a tir.han
(t) Na ItAJia. icro cn ir.c.tc» c«:r»t ,'j.k i catfÜcct. as ir.jr.ças f íctlv:n ti:« Sicrsxtr.'.o. ir.'.n pric*;ra co-.r.ur.h.3o.
I
12 S A S T A G E M A G A L C A N I$
acompanhado quiseram ficar na igreja a ouvic missa
em acção dc graças. Gcma alegrou-se com o pensamento
dc poder consagrar êste tempo a Deus. recomendando-
-Ihe sua pobre mái quási moribunda. <Eu ouvis, o melhor
que me era possível. a santa missa, conta ela. e orara
pela mamã: de-repente uma vo: diz-me ao coração: Que
res dar-me tua mamã?
— Sim. respondi eu. mas com a condição de que
também me levareis.
— Nào. replicou a voz. dá-me de boa vontade tua
mamã. Conduzir-ta-ei ao céu. Dâs-ma dc boa vontade?
Fui obrigaJa a dizer que sim.
Terminada a missa, corri para casa. Meu Deus!
Permanecia junto da mamã e chorava. Não pedia afa«-
tar-me dela».
Foi esta. segundo os apontamentos dc que dispo
nho. a'primeira comunicação sobrenatural com que Gcma
foi favorecida. A circunstância da descida do Eypirito
Santo pelo Sacramento da Confirmação a uma alma tão
pura c. por si mesma uma prova convincente dc que foi
Ê lí o verdadeiro autor dêste colóquio, facto que os acon
tecimentos futuros mostraram ser verdadeiro. Gcma
tinha feito a Deus o sacrifício do que no mur.do lhe era
mais querido; no céu lhe ficava certo o mérito.
Dc volta a casa. entra no quarto dc sua mái e cncon-
tra-a quási a expirar. Ajoelhando junto do leito, desata
em soluços. re:a com o coração angustiado e declara que
não sc afastará deste leito, porque quere recolher as últi
mas palavras de sua mái. Embora conformada com a
vontade divina generosamente aceita junto do altar.
Gema conservava a esperança secreta dc a seguir ao céu.
C A P I T U L O I «3
ft
Entretanto a doente experimentou certas melhoras
efêmeras. Depois tomou a piorar, c perdcram-ie tòdas
as esperanças. O pai. porem, temendo que a presença
duma filha tão amada apressasse o f ia da moribunda,
mandou-a sair c confiou-a. até nova ordem. a uma tia
materna chamada Helena Landi.
Passado pouco tempo, a 19 de Setembro de 1556.
D. Aurélia Galgani expirava santamente na idade dc
trinta c nove anos.
f.cvararr a triste r.ova a Gcma. que a?nda estava
em casa da tia. A resignação desta criança dc oito anos
foi tanto mais admirável, quar.to mais cruelmente a dor
duma tal separação havia de ser sent.da pelo seu cora
ção tão afectuoso.
£ assim. 6 r::cu Deus. que. para as desprender do
nundo c as purificar sempre mais. Vos cotr.pra:e-.s cm
abandonar ao martírio as almas que Vos são mais que-
ndas c desde os seus mais \erdes anos!
Começa a freqüentar o Instituto Guerra
Primeira Comunhão e retiro preparatório
- i>io - i*»: —
inuito bca c piedeja que físse D . Helena
Landi, não pcdta atenuar em Gema a saudade
dc sua nsii. A «anta menina, que só sent>a
cnconto nos exercícios dc piedade. experimentou bem
dc-prcssa a íalta que lhe lèz sua querida mi». «Fo» entio.
dtssc-mc ela um dia. çue tire ui:dâde$ do tempo en que
a minha rr.ái rr.e fazia orar tanto*.
Desejava ir à igreja dc mar.hâ cedo e nmguírn a
queria acompanhar Aquela hora. Desejava er.conirar-sc
sòrinha para conversar ccm Deus e n io lhe deixavam
u::i momento dc tranqüilidade. Grande p<cadcra como
era. diria, tinha necessidade de se ccnfcssar todos
cs dias: c raras xc:cs lhe concediam esta satisfação; tào
manifesta era aos olhes de tedos a sua cAndtda inocén-
cia. Privada dc director espiritual, ningutm lhe falava
dc Jesus, único amor dc sua alma. A pobre menina sofria
pois c morria de desgôsto cm S. Januário.
Entretanto Helena Landi, que amava muito a sobri
nha por suas maneiras ingênuas e graves, por sua mo
déstia c esclarecida piedade, verdadeiramente excepcio
nal em criaria de tão tenra idade, esperava obter a
permissão de a conservar ainda muito tempo.
Informado deste projecto. Eugênio, irmão de Gema.
i» quem a ausência da irmã. desde alguns neses. parecia
intolerável, fé: valer junto do pai todos os argumentos
próprios para impedir uma separação mais prolongada.
E o S: Galgam não linha menos desejo de conservar
cm casa a sua filhinha predilecta. Depois de madura
reflexão sôbrc o melhor partido a tomar, cm seguida ã
dor cruel que acabava de o ferir, chamou para junto dc
si todos os filhos, dispersos por várias partes, a-fim-de
olhar melhor pela sua instrução. Era nos fir.s de De:cn-
bra de I5S6
Gcma entrou, pois. na casa paterna no meio das
lágrimas dc alegria de tóda a familia e particularmente
de seu irmão Eugênio.
Não devia pcnsar-sc cm interná-la numa casa dc
educação: um novo afastamento custaria muito ao cora
ção terno de sou pai. Mandaram-na como externa ao
instituto, tão célebre, das Irmãs de Santa Z ita. vulgar
mente chamado instituto Guerra, do nome de sua fun
dadora. Excelente lembrança a do Sr. Galgani cm con
fiar sua filha a estas mestras eminentes que dão is
meninas, juntamente com vastos conhecimentos literá
rios c artísticos, uma intensa instrução religiosa, forman
do-as r.uma sólida piedade.
Gcma exprimiu nestes têrmos ao seu director a ale
gria que lhe causou esta determinação dc seu pai. inspi
rado muito provávelmcnte por ela: cLogo que comecei a
Exercido de d<»<aho e prova « k h s j (d»tado) de franc i s — extraídos do caderno escolar de Son:a Cerr.a. ç-jar.do a '.u r j do
ír.sJituío C ue n -j
N. B. Neste [ac-sirr.iU a dstiafi-jenj períeitac-.er.se 01 erros de Gesiaiir.ha < ai corrccs®«M da ir.eitra
C A P Í T U L O I I 17 ./
[requentar a escola das religiosas. CJÍirá no Paraíso».
Efectivamente sob a direcção de mestras consagradas a
Deu», entre tantos exercícios e prAticas dc piedade, sA-
biamente distnouidas pelo decorrer do dia. com tar.tat
instruções c exortações religiosas, a fervorosa menina,
habituada por sua n á i a viver cais no céu que r.a terra,
devii sem dúvida encontrar-se r.o seu elemento.
Logo que se viu neste instituto. G c=a solicitou o
favor dc fa:er a sua primeira comur.hão JA desde h i
muito, ferida r.o coração por Jesus coa as setas do ma;s
puro amor. como inocento potr.ba soltava gemidos e cor.-
sumia-se com o desejo do se unir a Ê!e pelo Sacramenta
da Eucaristia. Sua m ii querida tinha-lhe descoberto
tòdas as doçuras e dado como que um ante-gâito diste
manjar celcstc. Para intensificar mais e mais os seus
ardores. condu:ia-a muitas veres ao pé do santo taber-
r.iculo. donde o Senhor difunde os raios da sua graça
c as chamas do seu amor sôbre os que O procuram, c
principalmente sôbre as almas sisples e puras.
Excessivamente apaixonada pe!o Amigo Dtvinc.
Goma queria-0 c. todos os. d:as. suplicava com lAgrimas
ao seu confessor, a seu pai e a sua mestra que lhO
dessem. Opunham-lhe o costume de não s< admitirem A
comunhão crianças de tão pouca idade, un to ma:s que
sua pequena estatura c membros dehcados mal aparen
tavam seis anos. quanto mais nove.
Gema. porém, voltava incessantemente A carga, com
argumentos sempre novos: * Dai-me Jesus e haveis de
ver que serei mais sossegada: não farei nais pecados:
não serei já o mesma. Dai-mo: sinto-me consumir e não
posso ntais>.
s
18 S A N T A G E M A G A L G A N I\
Perante ião extraordinárias instâncias, o confessor,
P .e V o lp i, que veiu a ser bispo de Arezzo, term inou por
cedcr c disse a Henrique G a lgan i que. sc n ão queria ver
a sua fiih a definhar de tristeza, era preciso autorizá-la
sere dem ora a nutrir-se ccm o P ão da rida.
Q uem poderá descrever a alegria dèsse an jo ao
saber desta determ inação? Depo is de ardentes acções de
çraças ao Senhor c à Santíssim a V irgem , procurou o
m elhor m odo dc sc preparar para tão insigne favor, c
tom ou, scir. deliberação cem orada. o partido dc se re
colher no convento de suas mestras para ai seguir, crc:
pacifica solidão, um curso regular de exercícios espi
rituais.
N ã o era fácil levar o pai a aceitar este projecto,
pois ju lg ava não poder ficar um s6 dia privado da sua
cuerida G em a. E la porém fo i tão insistente c tantas
lágrim as derramou que a inda desta vez H enrique G a l
gan i sc v iu obrigado a cedcr. Ouçám o-la: é ela mesmo
que r.os vai contar o resultado:
aQbtU 'c a permissão A far dc, e no dia seguinte de
m anhã fu i sem perda de tempo para o co/:rc/:(o. ende
fique: dez dias. Durante este tempo não r i ninguctn da
minha fam ília . M as como eu estaca bem! que Par also!
Apenas me ri no con rente, ccrri â capela a agradecer a
jesus e a pedir-lhe ardentemente que me preparaste hem
pára a Santa Comunhão. Nesie momento senti nas
cer em minha alma um grandç desejo de conhecer
circunstanciadamente tôda a vida de Jesus e a sua
Pa ixão >.
)á dissemos que Gem a tinha sido in ic iada na m edi
tação por sua própria m ãi. M as quem tinha ensinado a
C A P I T U L O ! I ID
f
éste anjo dc nove anos que-o mistério da Paixão do
Salvador está tão intimamente liçado ao mistério da
Eucaristia, que o melhor cam inho para chegar ao se
cundo 6 passar pelo primeiro? Certamente o mesmo
Cspírito Santo, que a tinha jA snund.ido dc tanta lu : e
inflam ado ce tanto amor para com o Augusto Sacra
mento do aliar.
«A /an:/e iíe j este deseje a m in.'ij mesit*. continua
G e n a , c c/a começou imediatamente as sr.as r i ^ / i f j f c c í .
U n a noite. era j.i f.irde. /d/ara-me c /j da crucifixão,
d.i coroação de espinhos, de todo* c< supiicios de Jems:
/<*.: um a pintura rã o r:Va q::c uma der inteniJi te apede*
coa de mim, causando-mc r.o mesmo instante uma
febre ardente que mc prendeu ao leito ledo o dia
seguinte.
.As explicações foram-me suprim ida imediatamente.
iSeguia as práticas na capda. Tc-dcs os dias o pre
gador rjos dizia: cQ uen se r.uíre dc fesus viretá da sua
vida». Estas palavras cnchiam-me de grande cônscia;.ic.
levavam-me a fa :e r este racscvin:'*? *Sendo assim,
quando Jesus estiver comigo, r.jo viverei mais em mim,
l isto que cm mim viverá. Jesus*. £: ard.a em dese ja de
chegar ao momento em que pudesse d i;er com tód j a
verdade: <Jesus vire «.v.t rrirm». Algumas ve:cs. medi
tando cite pensamento, passava tóds a r.oite a consu-
mir-mc de desejos.
Preparei-me para a confissão gera! que f i: . indo por
t:cs ve:es aos pes do Senhor P / \ 'dp i. terminando-a
no sábado, véspera do ditoso d:a>.
■ fcste dia fe li: foi o d ia 17 de Junho dc ISS7, íesta
do Sagrado C oração de jesus. transferida da sexta-feira
antecedente. Na véspera. Gcma quis cscrev«r a seu pai.
Inspirando-se no seu coração tão chcio dc celestes afec
tos. fez só por si a carta seguinte, breve, porque, quanto
mais o coração transborda, menos se fala:
«Querido papá. estamos na lêspera do dia dã pri
meira comunhão, dia pa:a mim duma felicidade extrema.
Resolvi escrever-vos estas poucas linhas para vos certi
ficar do meu amor c vos di:er que peçais a Jesus a-fim-de
que. na sua primeira vinda à minha alma me encontre
preparada para receber todas as graças que me tem des
tinadas.
*Peço-vos perdão de tanta? desobediências e de
todos os desgostos que vos causei; suplico-ix><. nesta
tarde. que esqueçais tudo.
• Pedindo a vossa bênção, subscrevo-me vossa filha
muito afectuosa. GEM A *.
Antes de sair do santo retiro. Gema pòs por escrito
as resoluções seguintes: */." Sempre rr.e confessarei e
comungarei como se a morte devesse surpreender-me
imediatamente depois; 2.* Visitarei muitas t ezes n Jesus
Sacramentado sobretudo cm tempo de aflição: 3.* Pre
parar-me-ei para cada festa da minha M J i celeste com
Jilguma mortificação, c tôdas as noites lhe pedirei a bên
ção; -iS Quero conscri'ar-mc sempre na presença de
Deus; 5.’ Sempre que derem horas, direi très vezes:
M e u Jesus. Misericórdia
Gcma teria desejado continuar as suas resoluções:
mestra, porém, que a surpreendeu a escrevê-las. r.áo
lh o permitiu, com receio de que. sobrecarregando-se
«nuito. prejudicasse a saúde: pois sabia bem que a terna
m em na. dotada duma grande firmera de carácter c dum
C A P I T U L O I I 21t
fervor extraordinário, ap licaria tò d a s as er.ctg iza s d a sua
alma ao cumprimento dc suas prorr.essas.
Chegou cmfim o dom ingo dc m anh i. c o n t i n u a com
uma fc ardente a adm iráve l c r ia n ça . le r a n ie i - m e com
prontidão c corri a Jesus pe/a prim eira i t ; . . . s\ s m inhas
aspirações foram finalm ente satisfeitas c c c m preend t
então a promessa de Jesus: <Aquc:e que se r-. u r r e de
ir.ini rircrã da minha rida» .
C> meu Pai. escreverá e ’a m a is tarcc ao s e u c isrcc tcr
* • espiritual, o que sc passou nesse m om enta c r : rc~ Je sus e
mim. eu não o poderei exprim ir. Jesus fet-se sen tar- m uito ,
tnaitissimj ã minha ahr.it in d ig n a . E x pe rim en ta r* nesse
instante quanto as delicias c/o ceu diferem d a s d e lic ia s
da terra. Senti-me dom inada p e ie desejo dc t o r r m ^ r con
tinua c>ta u-.ião com o meu D e u s . Er.ccr.trai.-a -rr-s «r cada
re: mais desprendida do m und o c mais d ispose jm rc-
cdhimcnto.
Gcma quis fazer a s e g u n d a cem ur.hâo r .o d i j se
guinte. ra igreja paroquial, a insi<?nc hasi!;c.» d e i ? . Frc-
dtano. onde se conserva o p rec ioso tesouro d o * restos
mortais dc Santa Z ita.
As celestes impressões d e su a p u e e ir a c o c i u n h ú o
não sc apagaram nunca. «.*\ que r id a rr.cmns. a t e s t a uma de suas mestras, lembrara-se dèstc belo d ia c o m um
júbilo inexprímircl: nas horas d c recreio fa la r a d j * ptrras
c suares delicias saboreadas nestes diteses mer n-z *rntos.
Todos os anos quando chega ra a época d a p r i rneira
comunhão, sua alegria era ex trem a, c segui* cerrz e j p r i
meiros comungantes os exercícios d o re tire p r «rpara-
tório*.
Todos os anos c c n c m o ra v a co m espec ia l d c v o ç i o
02 i ‘ A .V T A O l i \1 A (i A I. G A N I
aquele d ia grande que chamava o d ia da sua festa.
A carta $ci:i:in!r d irig ida act s.-u d im .to r cm 1901 no dia
im edia to a um <lí*sfc.s anivcrsArios. vai-nes c : :c : que sen
timentos a anim avam então. Tem duas partes: a pri
meira. ir de p ió logo. fui escrita num desses êxtases
i|-a.' a tom avan muitas veies, mesmo em presença dos
:.eus familiares.
t M eu P<‘i. não sei se já vo< disse que o d ia da festa
d» Sagrado Cors^ão dc Jesux é também o dia da minha
fc^ta. O fifrm r/cr um dia de P ara ;so: esfire sempre com
Jesus, /a/ei sempre dc jesus. fui ,'e/i< corn Jesus e chord
também con2 jesus. O recolhimento interior rdevc-me,
raa ií que de ordinário. unida ao /mcü bem-sm.ido Jesus...
Ú frios pensamentos do mundo. afastai-cos de mim: cu
r.ào quero c.*.'ir senão com Jesus, e jesus só». Ccncen-
(rande-se neste memento cm si mesma para se hutr.iihar,
como costumava, depois dos s c -j s transportes dc amor.
cor.tinna: <Mcu Jesus, c ainda n:c suportais? Q uant0
.•r:ar\v penso em meus deméritos, mais confundida tico. e
só encontro meio dc me tranqüilizar recorrendo pron~
temente à vossa imer.sa misericórdia, ó compassivo
Jesus!»
Depois desla expansão dc alma. G em a recupera os
• ra t idos e vi-sc com uma pena na m ão diante da carta
ii'ii'.eçada. Retoma o seu assunto com a maior scm-ceri-
■ : .ón ia : * P‘ii. para or.de vai agora o meu pensamento?
/ ’. r.i i> belo dia de minha primeira ccniunhão. Ontem.
f»"t. i .Zn ( dc Jesus, experimentei ce novo o júbilo
deste mi f/i.-). O a íe m de novo gozei o Paraíso. Max,
•' j , í o um só dia. quando é cerro que mais tarde
o </xK\ircr)io\ jMr.t ,vrri|irc?
C A P I T u I O I I
i
cQ cia da minha primeira co>r;i:n/i.io /ot. posso .i/ír-
m á - ío , a ç u é f c e/r: q a c o m e t i "co r/ip ão í c c n c o n f r o r j r/sa/s
abrasado de amor por Jesus. Como cu e r a q u a w / o r
possuindo Jesus, p o d i a cxziamur: Ú met: Deus. o vosso
Coração é meu. O çue [az a vossa felicidade potle tam
bém lazer a minha. Q u e fa ltara cntào i: minha felici
dade? N ado».
E G cm a entra dz novo ctr. si pata sc hum ilhar:
«Ó P a i Pai. mas r.em todos os dias se parecem: há
elgitns e/r. que ter.h.o vergonha de mim. O h ! Quanta*
rezes tenho cedido aos atractivos do mur.de>! Que J a u s
/•io tome de-pressa o co ra fâo c o guarde para si. sc v
não quere ver ainda bem cedo roubado pelos meus
pecados».
N unca cu term inaria sc quisesse reprodusif por
completo os pensamentos c sentimentos expressos nas
carta* de Gcm a. ccni um a eloqüência sempre nova. sóbre
o assunto da sua prinícir.i comunhão. O pouco que re-
procu=i bastará pnra mostrar em que ahu ra p j.rava .
Jon jc das ba ixelas da terra, o grande cotação deste
ar.jo. desde a idade dos nove anos.
D itosa criança, bem cedo to fei concedido conhccer
os mistérios do reino do Deus. ocultos ã m aicr parte dos
homens, c saborear a suavidade ce !« tc do M .um Li:<.n-
rístico preparado por A quê lc evie disse: « P que úvm :r
a minha carne c beber o meu sangue terá a rida
eterna.
C arácte r de G em a — Seu espírito dc
p iedade — M o rte dc seu pai e dc seu
irm ão Eugên io •• • /
— tíSS - tSCH -
« | ' - *
^\ V E ?o :s das restas da sua primeira comunhão.
Gem o retemou com ardor a vida escolar.
a-----' M estras e alunas, que tinhaci notado desde o
principio as raras disposições da recím-vinda. não sc
cansavam de a adm irar. Entretanto a santa mcnir.a p ro
curava dissim ular as suas qualidades para permanecer
desconhecida. N ão o conseguia, de tal modo transpa
recia a candura cesta bela a 5c»a cm tôda a sua pessea
e sobretudo nos olhos. « G o r a . Gema. lhe disse um dia
urr.a das suas mestras. .<e eu não lesse nos teus olhos
não tc conhecia».
Em bora fõsse das mais novas da aula. inspirava ia l
respeito que (òdas a tratavam como mais v íln a . «E ra a
aí/na da cscola. atesta um a outra mestra, e nada se fazia
ai sem c/a. Tcdas as companheiras a estimai-am c gos-
ía fam de a associar às suas festas e brinquedos; e não
obstante G em a fir/ia uma natureza pouco expansiva.
'_'0 S A S T A G E M A C A L C A S }
I
brevidade dc palavras, acção decidida e mandras per
rezes jparcnlc.T.ctilc rudes*.
A ss im sc manifestava no exterior. M as no exterior
s ò n e n tc . perque o seu temperamento era m uito diferente.
Confessou-m c rnvitas vezes que tomava de propósito
Ca^ipííano ■— Igreja paroquial dc S or.de o Santa foi
baptizodi
rr.ar.eiras um tan to Ásperas com' o fim dc sc ocultar c
com receio de ca ir na d issipação e ofensa dc Deus, cis-
trai ndo-se por causa dos sentidos. Sab ia domir.ar-se a
ponto de ihc tom arem por efeito da nossa pobre natu-
rc:a o que era nela fru to de v irtude . E fo i assim que
alguém , vendo-a tâo grave e tão avara de palavras, a
-tratou de a ltiva e orgulhosa.
*Cor?:o me [alais dc orgulho? respendeu sorrindo:
nc;<t sequer penso nisso. N ào /a /o muito, pcrqve n Jo sei
o q<ie hei-dc d i:e r ; não sei tambem sc ‘t h r i j bem cu
mal, por isso ca /o-m o .
Q uando , sendo já maior. G em a sc lembrar de ter
sido acusada dc o rgu lho , escreverá com impressionante
hum ildade: <Sr/n. era o meu grancc pecado: Jesus ju lgará
sc c.s o tinha, o:: não . sem sai’Cr. fist-.rc muitas ivzcs
para ir pedir perdão a m.:n/ias mestras, a minhas eorr.-
pao.heitãs c .i .Mestra Superiors. Depois â tarde e muttas
cc:cs dc noite chorava em silêncio. N ão ccnhecia c.<tc
pecado cm mim*.
O h ! . . . não tivéssemos r.ós outro que dc**.; só §cr-
tnínaria em nós. com o gcrm ir.ou na v irgcn :inha dc Luca
a encantadora flor da hum ildade .
O íraço dom inan te d o carácter dc G em a era a v iv a
cidade. U m observador atento bem dc-prcsM dcs-ccbro
nc!a um tem peram ento ardente, cu jo sangue fàc*lr.:cntc
irritável lhe fervia nas veias. Sem urr.a vio lência continua
sòbrc si. esía criança teria sido. como costum a dircr-sc,
um vivo dem ónio ; ao mesmo tem po que. pelos recursos
dum espirito pronto c pcrspicar. teria cvcrcido sóbre
qua)quer um com ple to com in io .
Q uan tas veres a v i eu aba far , mesmo á custa dc
f
esforços musculares. os primeiros movim entos de c ó
lera!
O u tro s form aram dela a mesma op in ião . tEmboea
dc natureza i’ii>a. diz uma testem unha, G em a era paci-
fica, porque triunfava sempre de si mesma. Longe dc se
perturbar, dc discutir. se alguém a provocava. se a m al
trataram mesmo, a principio vespor.dia por um amável
olhar, depois por um sorriso tão meigo que algumas
rezes a sua adversária, desarmada, se lhe lançava nos
braços para a ;iperfar afectuosamente ao coração».
Q u a n d o lhe atribuiam um a desordem acontecida na
casa. declara um a outra, e a repreendiam por isso emir-
o icamente. G em a ouvia cr.i siiéncio, depois, quer tivesse
quer não tivesse razão, d ir ia com voz ca lm a: *N ão vos
perturbeis, n ão ves encolerizeis: serei obediente, prome
to-vos, não fare i mais is$or>, E ra assim que ês í^ an jo
sabia dominar-se.
Q u a n to à aparente aspereza de que fala um a das
suas mestras, prcvir.ha ela do na tu ra l franco e sincero
cue particu larm ente d is tingu iu esta bem dita criança.
P ara ela s.:m era sim. e não era nao; b ranco era brar.co
e preto preto.
N ã o havia refolhos em seu coração; fa lava e ag ia se
gundo o seu pensamento, sem usar de rodeios. Ignorava
tudo o que r.o m undo se cham a cerimónia, etiqueta. C u i
dadosa em observar as regras essenciais da delicadeza.
Gem a n ão queria saber de mais n ad a . F a lav a franca
mente a todos sem d istinção de pessoas, e n ão com preen
deria quê se pudesse achar que d izer acêrca desta s in
ceridade. De-facto. n inguém jam ais se o fendeu com a
sua linguagem ou com as suas m aneiras.
*
^ #1 1-VJ/i A i
1
C A P Í T U L O 1 1 1 29 ‘
>
Por outro lado, quando a cândida m enin3 estava
disposta a prestar-se a um a longa conversa — o que era
raro — de boa vontade ficaria qualquer longas horas sob
o encanto das suas palavras. É o que acontecia no insti
tu to Guerra, cujas alunas, na sua totalidade, tinham pela
sua Gcir.a uni tal afecto, que haveria ura lu to geral r.o
d ia eiu que a doença a firesse voltar defin itivam ente
para o seio de sua fam ília.
Esta singular parcimónia dc palavras, ju n to com um
hab itua l recolhimento, fizeram com que a lguns a ju lgas
sem lir.iida por natureza. H ouve até quem a considerasse
quãs i estúpida. Gom a não se preocupava com estas apre
ciações. e se lhe falavam netas, d ir ia hum ildem ente:
íQí.-c necessidade tenho cu de agradar ao mundo? Es-
í\ipidj. sot:-o muito: teem-me pejro çue sou na realidade;
í>:35. pouco me importa».
Estando doente, veiu um dia o médico v i- la . A d m i
rado do seu recoihimento. modéstia e repugnância cm
deixar-se tocar, tomou-a por uma dcyota fa n it ic a c no
fim da visita tentou convencê-la dc erro. recorrendo a
argum entos trazidos dos salões m undanos. Gerr.a. até
en tão silenciosa, respondeu imediatamente. Re fu tou um
por um estes mesquinhos argumentos, com ta l prontidão
c tal viger de frase, que o pretencioso vendo-se na im
possibilidade de responder. retirou-se con fund ido , com
singu lar adm iração das pessoas presentes.
Eu mesmo, mais de uma ver. usando de certos sofis
mas quis experimentar alé or.de chegava a sua lógica e
penetração dc ju iro . Devo. porém, confessar que as suas
icspostas subtis e judiciosas lhe deram sempre vantagem.
T an to 6 verdade que os homens ju lgam segundo as-
1
30 S A N T A G E M A G A L G A N I•
aparências. só Deus. porém, conhece perfeitamente os
corações.
Voltemos ao instituto Gucrrn. A admiração das
mestras para com sua discípula é traduzida nos seguintes
térmos extraídos duma longa memória a que temos jà
recorrido: <Tódas as religiosas, inctuir.do a Superiora
que foi sua mestra no curso superior do ano escolar
IS91-1S92. tiveram uma profunda estima e vivo afecto
a esta querida menina. Eu mesma, que escrevo estas
linhas, tive ocasião, em virtude do meu cargo, dc a ver
mais de perto e de admirar particularmente a sua sólida
piedade e a sua ingenuidade infantil. Desde os primei
ros dias em que a conheci, julguei-a uma alma predilecta
de Deus. mas oculta ao mundo.
<Eu ensinava as alunas a fazer de manhã um pouco
de meditação, e à noite alguns minutos de exame dc
consciência. Observei que Gema. conhecedora já destas
práticas piedosas, as tomava mais a peito. Nunca me foi
possiveí saber dela o tempo preciso que consagrara a
estes exercidos. De suas respostas evasivas conclui que
devia dar-lhes muito, sobretudo à meditação.
* A vida de ouvir a palavra dc Deus. manifestava
uma alegria extraordinária nos dias em que o capelãc
rinha explicar o catecismo. O mesmo acontecia por oca
sião das pregações que se fazem na capela do instituto
nas dirersas festas do ar.o. Queria tornar-se uma santa
A imitação da venerável Bartoloméa Capitanio. E eu
lembrara-lhe muitas vezes a sua resolução por estas
palavras: <Pensai bem. Gema. vós deveis ser uma gema
dc grar.de preço».
Por sua ver a Reverenda Madre Guerra me escre
via a respeito de Gema. trere anos depois da sua saida
do instituto: «O meu pobre ccra{ão exulta ao saber que
Vossa Reverencia trabalha err. glorificar uma santa das
minhas alunas. Cena Galgam. Tire-a cerca de dois anos
nas aulas que dava. e posso afirmar que nunca se ofere
ceu ocasião de me queixar dela. Era muito siltr.ciosa e
muito obediente. — Irmã H ele r. a Gucrt a».
Como tóda a santidade sc forma junto da Cru:.
Deus pôs na alma desta jovem um vivo desejo de conhe
cer o grande mistírio da nossa Redenção. Ccaeçou a
importunar sua mestra (a mesma que ihc faiava da Pai
xão durante o seu retiro para a primeira comunhão) e
terminou por obter, à fõrça de instâncias, a prcaessa dc
receber amplas explicações sôbrc este miítério. durante
uma hora. tódas as veres que obtivesse na aula de: valo
res. isto é óptima, tanto no estudo como nos trabalhos
manuais.
Que melhor recompensa poderia eu esperar? diria
cia a si mesmo: e. redobrando dc diligtncia. ccnsc-
guiu. a partir deste momento, merecer quisi todos cs
dias o óptimo, de modo que a hora do exercício combi
nado lhe estava ordinariamente assegurada. *Quantas
re:cs. me diria ela um dia. reflectindo r.o amer de Jefus
que tanto sofreu por nós. e na ingratidão com que lhe
pagamos, ambas choráramos, a mestra e eu'»
A piedosa directora indicava-lhe pequenas mortifi
cações corporais para compensar um pouco esta ingra
tidão dos homens, c dava-lhe a cor.heccr dnersos instru
mentos de penitência. A fervorosa criança procurou uns
c fabricou outros. Foi-lhe inútil, porem, insistir, pois não
lhe permitiram farer uso dèles. Por conselho da mesma
*•■. ■* * > v j : •. • \
*32 $ A S T A C E M A G A LG A X I
directora substituiu as m a c e r a is ■ da came por uma
rigorosa mortificação dos olhos, da lingua, de todos os
sentidos, e mais particularmente da vontade: c nisso foi
verdadeiramente admirável durante o resto da vida.
No rr.ês de Março de 1S8S foi Deus servido chamar
a si esta excelente mestra. irmJ Camila Vaglieusi. reli
giosa de rara santidade, e Gema passou para a direc
ção da irmã Júlia Sistini. bela alma de não menos vir
tude. c dotada, dum modo particular, do espirito de
oração.
«5oí> a direcção desta mestra. me contou ela. comecei
.1 yentir i/m.» grande necessidade de orar. Tódas a.< urdes
cepois da aula. logo que chegara a casa. cncerrara-mc
r.un quarto para recitar de joelhos o rosário inteiro: de
r.oite. Icvantara-me muitas vezes durante cérca de um
quarto dc hora. para encomendar a minha pobre alma a
Jesus*.
Foi reste fervor de espirito c na par doméstica que
se passou o resto do ano. Desta criança podia dizer-se o
que do Salvador adolescente atesta o Evangelho: que.
avançando em idade, crescia cm sabedoria c cm uraça
diante de Deus e dos homens.
Mas a passagem dos justos sóbre a terra è ordina
riamente assinalada mais por tristezas que por alegrias,
mais por trabalhos que por deleites e passatempos: c
muito raro é que o Senhor os não submeta á prova desde
a juventude para os habituar, pouco a pouco. As grandes
lutas da vida espiritual.
Assim aconteceu bem cedo. como vimos, a Gema
que aos sete anos perdeu uma tão tarinhosa e virtuosa
mãi como era a sua. Mas uma tribulação muito mais
C A P I T U 'L O I I I 33• ) .
cruel i.i agora cair sôbre sua alma: a desolação espiri*
tual. chamada pelos doutores ascéticos martírio interior.
Até aqui a piedosa menina só saboreou consolações
celestes e só conheceu atractivos c estimulantes para a
virtude perfeita. Agora. A sua aversão scasivel por tudo
o que é do mundo sucedem o desçósto. a triste:* e a
repugnância pela oração. Quàsi que j* n io sente o seu
Jesus, cujos amorosos amplexos, de-repeote desapare-
cidos. lhe aparecera cor.? sor.hcs longínquos: sofrimento
intoIer.Nvcl é-.tc para o sou cor.ição tão pcueo habituado
a tal abandono, c que sc prclcngari. r.ão por alguns
dias. mas por um ano qu is i inteiro.
Entretanto éste período de extrema aride: não ser*
para ela um tempo dc repoifo r.o caminho da perfeição.
Feio contrário, sentindo ocultar-se éste Deus cujo ataor
era ja o único encanto da-sua vida. lança-se c a Sua
procura com mais ardor ainda, pelo desprendimento pro
gressivo dos afectos terrestres, pela frequência fervorosa
da santa comunhão c pela prãíica assídua das virtudes
mais sólidas.
K?força-íc por arraigar bem r.o seu coração o
horror ao pecado, que veremos aumentar incessante
mente com a idade, e uma dor cada ve: mais inter, sa d.u
pequenas faltas, que lhe parecem graves c de que pede
perdão a tedus com receio dc ser objecto de escândalo.
Para melhor purificar a alma quis mesmo recovar a sua
confissão geral, o que o ccnfesscr. bem convencido da
sua candura, não permitiu.
Para di:cr tóda a verdade, éste método dc vida
adoptado pela r.ossa Ccmarinha agradava pouco aos
membros da sua fam:lia. que igr.oravam os altos desi-
s
> r*
$i S A S T A G E M A G A L G A S' Ic
gnios do céu acerca dela: c repreendian-na muitas veres
da sua piedade, que lhes parecia exagerada. Não lhe
permitiam ir à igreja de manhã cedo c freqüentã.Ja
muito. A tarde queriam*na no passeio e preparada como
as irmãs mais novas. etc. Semelhantes contrariedades
enchiam de tristera o coração da pobre criança.
A Providência, porém, veiu era seu auxilio. Em
seguida à morte de seu tio Maurício, que foi a 15 de
Março de 1690. dois anos depois da dc seu avô Carlos,
suas tias Elena e Elisa vieram habitar com o irmão Hen
rique. pai dc Gema. Eram duas senhoras dc grande pie
dade c muito afeiçoadas aos sobrinhos. Com a chegada
das tias. Gema. confiada aos seus cuidados, rccupcrou
inteira liberdade.
Tódas as manhãs, antes da aula. assistia ao lado
delas à primeira missa, e A tarde visitava o Santíssimo
Sacramento. Juntas oravam e conversavam piedosa*
mente. A fervorosa criança julgou ter voltado aos fcclos
dias em que vivia sua virtuosa mãi. Dal por diante nunca
mais foi privada da santa comunhão. Comungava infa
livelmente todos os dias. embora até ai o seu confessor
apenas lho permitisse trés veres por semana.
A medida que progredia na vida espiritual. )csus
tornava-se-lhe reais íntimo. «Faria-sc sentir dc cada ve:
mais à minha pobre alma. confessa ela ingènuamcntc:
di:ia-mc muitas coisas e dara-mc a saborear mais fre
qüentemente grandes consolações».
Chegou o ano de 1891. Gema. tendo agora 13 anos
de idade, encontra-se elevada a um grau de virtude tal
que outros raramente o atingem (iepois dum longo tempo
dc esforços assíduos. Entretanto ela julga-se quàsi esta-
C A P I T U L O I I I t
cionària. A exemplo do Apóstolo, sen olhar para os
progressos obtidos, tem constantemente os olhos fixos
na perfeição ideal a que o Ser.hor a chama, c trabalha
sem descanso por adquiri-la. Êste ano devia faolitar-lhe
novos progressos.
As irmãs do instituto Guerra costumam dc dois em
dois anos proporcionar às suas alunas um turro de exer
cícios espirituais: «CcjMra-mc a crer. escreverá ela mais
tarde. que se me oferecesse esta ocasião de me encontrar
de novo com Jesus. Desta ve: deixaram-me só. sem auxi
liar»: quere e!a d::er. sem o assistência ce suas mestras,
considerada inútil para essa alma de elcjçic.
«Compreendi, continua ela. que Jesus me oferecia
uma ocasião dc bem me conhecer, c dc melhor me puri
fica: para assim lhe ser mais agradável». No Im o das
suas mais caras lembranças (ornou nota diste retiro cos
seguintes lêrmos: «Exercícios do ano de 1691. durante
os quais Gema deve mudar c dar-se tòJa a Deus». N io
se podiam desejar melhores disposições nuca acam a de
treze anos.
«Lembro-me. escrevei ela que o prigaJe-r r.ct f<;
uma meditação sôbre o pecado. Fci então que <em
preendi verdadeiramente quanto era digna do dnprè:o
de t:Jos: via-me ir.grata para com o meu Deus e cheia
de pecados. Vciu depcJs a meditação sóbre o inferno:
reconheci tê-lo merecido e tomei a resolução de fa:er
actos dc contrição, mesmo durante o dta. sobretudo
depois de alguma falta». Mesmo durante o dia: estas
palavras deixam perceber que a santa menina consa
grava a tais actos uma parte das noites.
<Kas últimas praticas dos exercícios, continua ainda.
3ò S A S T À G E M A G A L G A S I
mcditou-sc sóbrc os exemplos de humildade, nansidão.
obediência e paciência de Jesus: c desta meditação tirei
duas resoluções:
1/ — Visitar tedos os dias a Jesus Sacromentado c
falar-lhe mais com o coração do que com os lábios:
2.' — Ter o maior cuidado possirel cm evitar con
versas indiferentes, c falar de coisas celestes».
Ah! se os cristãos de idade madura levassem aos
exercícios espirituais as mesmas disposições que levava
esta tenra menina, que abundantes frutos dc salvação
não colheriam!
Ur.a tal aplicação às coisas divinas não levava a
angélica menina a negligenciar os exercícios cscolarcj.
Pelo contrário, era apontada entre as mais laboriosas c
obtinha sempre os prémios mais honrosos. No fim do
ano escolar dc 1593-1S94 obteve cm religião o prémio
crandc em ouro que sòmcr.tc sc dá a alunas que. durante
todo o curso dc catecismo, alcançaram a nota mais alta.
Quando chegavam as exposições dc trabalhos es
colares. cm uso no instituto, as mestras conseguiam algu
mas veres vcnccr a repugnância que a humilde menina
tinha dc aparcccr. c mandavam-lhe farer poesias, exer
cícios dc francês, problemas de aritmética, etc.: prova
indiscutível de seus bons êxitos nestas matérias. Con
ta-se que os seus. vendo-a tâo absorvida no estudo, lhe
diriam algumas veres cm tom dc vitupério: «Para que c
tanto estudar? És já tão sábia c ainda não estás satis-
fcita?>
Entretanto preparava-se uma grande provação para
a querida inenina. Seu irmão Eugênio, que tinha con-
croido o doença da mãi. aproximava-se do fio; da vida.
Eram duas almas cm perfeita comunhão dc ideas c de
sentimentos, dc sentimentos dc piedade sobretudo. *Eu
amava-o mais que todos os outros, d i: Gema. c nos dias
dc ferias estávamos sempre juntos, entretcr.do-nos a armar a!tar;inhos c ú imitar as cerimónias religiosas».
Eugênio tinha obtido dc seu pai autorização para
entrar no Seminário. Já com ordens menores, prepara
va-se para o subdiacor.ato quando a doença o prostrou.
Em tais circunstâncias poderiam separar-se estes dois
corações? O bom irmão, logo que sabia que sua irmãri-
nha estava cm casa. queria-a imediatamente junto do seu
leito. Sem desconhecer o perigo real do contigio. Gema.
pouco cuidadosa com a própria vida. conservava-se dia e
noite à cabeceira do doente, servia-o. confortava-o. suge
rindo-lhe piedosos pensamentos a-fim-de o dispor para
uma santa morte. O casto jovem adormeceu r.o Senhor
r.o mês dc Setembro de 1594. com disposições admi
ráveis.
Atingida por sua ver duma doença grave que a
obrigou a ficar dc cama durante mais de trés meses, a
generosa menina viu a sua vida ameaçada. Foi para a
família uma consternação geral, essa perspectiva dum
novo luto. Recorreram ansiosamente a todos os meios
para arrancar à morte ao menos esta filha, esta irmã.
esta sobrinha tão amada. «iV io pesso exprimir, conta
Gema. os cuidados dc que era objecto por parte de todos,
mas sobretudo de meu pai que eu ria muitas ve:es cho
rar c oferecer a Jesus a sua vida para salvar a minha*.
Parece que o céu aceitou o sacrifício do pai afec
tuoso. porque morreu ao cabo de dois anos. como vere-
S Ç yvT fí “ T ' ’ • ' j - - : - •'.--k -
38 S A S T A G E M A G A L G A M
mos no próximo capitulo, emquanto a filha bem de-pressa
escapava dc todo o perigo. Contudo a demora da conva
lescença obrigou-a a dizer um adeus definitivo ãs suas
queridas mestras do Instituto Guerra. Resignou-se paci
ficamente com a vontade áo Senhor para viver só no seio
dc sua familia.
Ê assim que Deus semeia de flores c de espinhos
as veredas dos escolhidos. N ão lhes dã felicidade alguma
sem a fazer seguir imediatamente dc alguma tristeza.
Feliz daquele que. como Gema. encara os diversos acon
tecimentos da vida perfeitamente conformado com a
vontade de Deus.
C A P í T. Ú L O I V•I
V ida dc Gcma cm família — Primeiras
comunicações sobrenaturais — Começa
a provar o cilix da dor — Morte de
seu pai
— n®5. iw r —
OMPLETAVA Gema os seus derassete anos. Livre
daqui err. diante das ocupações do estudo,
entregou-se por completo aos cuidados do
govèrr.o da casa e sobretudo A educaçào de seus
irr.:ão:inhos. os quais sc esforçou por d;rigir r.o ca
rrinho da virtude por meio do seu próprio exemplo,
por meio de bons conselhos e por uca cuidadosa vigi
lância. •
Informações precisas sòbre o carácter da sua direc
ção fraternal, não as temos: ra s o que j i sabemos desta
bendita menina permite conjecturar o que deveria ser.
Compenetrada da importância da sua cissão. cujas con
tas temia ter dc dar ao Senhor, esforçava-se por cum
pri-la com um cuidado extremo: e quando a!gum dos
seus educandos caia em qualquer falta, atribula a si a
responsabilidade, por não ter sabido preveni-la com uca
vigilância mais activa. Era solicita em acudir às r.ccessi-
dades de cada um. a-ftm-de evitar os descontentamentos
40 S A S T A G E M A G A L G A S I>
c discussões que tão fàcilmente surgem «ntre rapares c
meninas de tenra idade.
, O seu bom exemplo no seio da família oferecia além
disso um espectáculo raro cm nossos dias; provocava a
admiração dos sr.esmos estranhos que ainda a recordam.
Um criado da casa. Pedro Maggi. ligado mais parti
cularmente no serviço da bondosa menina, exprimia
assim a sua admiração sempre nova perante a extraordi
nária virtude de Gema: «Que quereis? Gema não tea
igual».
Motivo particular dc admiração nesta menina era o
seu amor aos pobres, o único bem que lhe restava, se
gundo a sua opinião, entre tantas faltas e misérias espi
rituais. « Tòdas as feres que eu saia. conta ela. pedia
dinheiro a meu pai c. se mo recusara, pedia-lhe que r-.e
deixasse levar pão. farinha ou outros comestíveis. Gra
ças a Deus. encontrara sempre pobres no caminho e ate
três cu quatro. Aos que vinham a ca «a dara rcupa branca
c tudo o que tinha à m2o. ,
Em breve, porém, meu confessor mo proibiu; meu
pai nJo me deu mais dinheiro, e nSo me deixou apoderar
de mais nada. Entretanto, quando saia. não encontrara
senão pobres que corriam para mim. e n io tir.ha que lhes
dar. Chorara continuamente de triste:a e terminei per
não sair mais».
Nem sempre foi permitido a Gema viver ir.?e::3-
ner.te enclausurada no seio da família. Seu pai. saben-
dc-a uma destas natureras ardentes que ten necessi
dade dc movimento, obrigava-a a sair algumas veres, e
também algumas veres, na falta dc outros, lhe confiava
a vigilância dos irmãos nos p*asscios que davam. A jo-
vem obedecia. Mas. apenas transposto o limiar da porta,
dirigia-se apressadamente por travessas bem conhecidas
para o campo, a-firr.-de go:ar $o mesmo tempo do ar
livre e da solidão, longe das v
habitações. *
Para a contristar, serviu-
-sc o demónio um dia desta
inocente distracção tomada por
obediência c com tantas pre
cauções práticas. Um jovem
oficial, que a tinha observado,
põs-se a segui-la. A angélica
\irgem. cujos olhos andavam
sempre baixos, não deu por
isso: quando o notou. sua afli
ção foi extrema: chorou eu:to
c. depois de fervorosas pre^;*:
tomou dc no-.o a resolução 5c
nunca mais sair ser.ão para a
igreja vi:inha de S. Frediano.
Soube cispor tão bom tôdas as
coisas que seu pai quasi a r.ào
contrariou neste ponto.
Tal era cm sua vida fami
liar a virtude déste anjo: vir
tude que ela julgava não ter._
csforçar.do-se incessar.ie=epte^
por adquiri-la. <Gcn:j. repena,
cla a todos os instantes, i pre- PiJ Je Cvri.
ciso que mudes c te dês tôda s enj e j s^r.:j [ci
jesus9. ■ f
0 » 0«. '■ Para sc animar ao fervor tirava motivo áe tudo: das
solenidades da Igreja, das belezas da natureza, da suces
são das estações, e dos próprios jogos em que algumas
vezes tomava parte para se distrair. Num destes, o da
'palhã, a sorte deu-lhe um dia a haste maior. «Eis, disse
ela. um sinal dc que Deus quere de mim uma grande san
tidade. e eu também a quero».
Findava o ano dc 1S95. e eis que a idea dum ano
novo lhe veiu inspirar novos desejos de vida mais per
feita. Levantou-se da meditação, tomou o livro das reso
luções c escreveu: «Nette noro ano proponho começar
. u/na vida nora. O que c/c me resena não o sei: aban
dono-me a Vôs. ó meu Deus. Tódas as minhas esperan
ças c todos os meus afectos serão para Vós. Sinfo-mc
fraca, ó Jesus, mas com o rosso auxilio espero c quero
rirer dum modo diferente, isto é. mais próxima de Vós».
O seu regulamento de vida era o seguinte:
Logo ao levantar, sempre cedo. recitação das ora-
CCvS costumadas, em seguida assistência «\ santa missa c
comunhão. Tòdas as tardes. a sua visita tão querida ao
Santíssimo Sacramento, mais ou menos prolongada, se
gundo o número e urgência dc suas obrigações domés
ticas.
Ainda à tarde. meditação com outros exercícios dc
piedade e recitação do santo rosário dc joelhos. Dc noite
continuava, a interromper o sono. ao menos uma vez.
durante perto de um quarto de hora, para recomendar a
Jesus a sua pobre alma.
Que vivos sentimentos de amor. dc confiança e dc
arrependimento das suas faltas não brotariam do seu
coração durante estes momentos de prece solitária aos
42 S A S T A G E M A G A L G A S !
pés do seu Jesus! Soube-se da su3 própria bóca que
Deus. desde então, se comunicava à sua alma por suaves
amplexos de amor. e ao seu espirito por vivas ilustra
ções ou claras lures, segundo a sua expressão. E assim,
noite e dia. mesmo entre as ocupações domésticas, em-
quanto os pis pisavam a terra, o seu espirito pairava nas
regiões celestes.
Tão profundo recolhimento interior, longe de ser
prejudicial às suas ocupações materiais, ajudava-a pelo
contrário a desempenhar-se delas com mais perfeição,
pela lembrança dc assim sc conformar com a Vontade
Divina, cujo cumprimento farã sempre a alegria da ver
dadeira piedade.
A-fim-de mais desprender ainda das coisas terre
nas o coração desta virgcnrmha c cnsir.ar-lh.e a n io sc
comprazer com n3da aqui no mundo que não fósse Êle.
o Senhor tinha-se servido, no cecurso do ano dc 1S95.
dum meio extraordinário.
Como oferta dum seu parente, recebeu um dia um
relógio de ouro c uma cru: com a sua cadeia:inha do
mesmo metal precioso. Gema. para ser agradável ao
doador, julgou dever levar estes objectos num dos seus
passeios.
Dc volta a casa. cmquanto tirava estas jóias, pa-
receu-lhc ver o seu Anjo da Guarda. O espirito ce
leste. olhando-a com aspecto severo, pronunciou pausa
damente estas palavras: As únicas jóias que embelezam
a cspõíJ dum rei cruci[i<ado 5J 0 os apinhes c a cruz:
c desapareceu.
A impressão produrida r.o espirito da piedosa me
nina por esta visão sem precedentes e por palavras tão
. . C A P I T U L O I V : 43
44 S A N T A G E M A G A L G A N I
expressivas fácil é adivinhá-la. Atira com desprêio para
longe de si o relógio c a cadeia. tira do dedo um lindo
anel. e prostrada cora o rosto por terra. toma. chorando,
a seguinte resolução: «Por i*osso amor. ó Jesus, e para
nJo agradar senão a Vós. prometo-Vos não mais trazer
objecto que traduza vaidade c n.lo /alar mais nele».
Cumpriu a sua palavra e. a pattir disse dia. não mais
quis saber de modas nem de adornos.
Tal é. segundo as memórias deX ícm a. o primeiro
vestígio dessas aparições angélicas que depois se torna-
raram freqüentes c a t i quotidianas. c<yno veremos.
O próprio Rei dos anjos se dignava desde então
honrá-la com ternas visitas, segundo esta ingénua decla
ração ao seu Director:
<A-pesar-de eu ser fio rr.i. Jesuf vinka ver-me e
dizia-me muitas coisas*. E continua: <Não sei como não
me aparecia irritado: sô uma ve: o -t'i encolerizado>.
Êstc aspecto severo, duma só ve:, mais uma prova
do que o castigo dc qualquer falta voluntária, visto que
Gema. no decorrer da sua vida. nunca cometeu pecado
algum com plena deliberação.
Ditosa menina, que fóste julgada digna, desde a
idade dos de:assete anos. de ouvir a vo: humana dc
Jesus, de O ver e dc O contemplar com teus olhos
mortais!
Sem dúvida tais favores não constituem a santidade,
pois muitas almas há que, sem os ter çeccbido. merece
ram. por heróicas virtudes, as honras dos altares. Toda
via são cm sinal muito certo de santidade, porque nunca
se notam em almas de virtude ordinária.
s
• N ão é de admirar que esta criatura privilegiada,
olhando com desdém para os bens caducos desta pobre
vida. suspirasse ar
dentemente p e la
pátria celeste.
•Desde o d:3.
escreve ela. cm que
minha mài me ins
pirou o desejo do
Paraiso íjJo deixct
dc o experimentar.
c. sc o Senhor me
tivesse dado a es-
colhec. cu teria pre
ferido rer quebra
rem-se os laços do
meu ccrpo para
voar ao céu. Tàda.*
as rezes que era
acometida de febre
ou dc qualquer cu-
ira doença, experi
mentara unia doce
esperança, tiiinna
dor porem aumen
tara quando, afaitar.de-fC a dc<r.ça. scnr.a icltarem-rne
«jj forças.
U m dia. depois c a S a g ra d a C c-.u -.'-.Jo. prcgu-.tet a Jesus porque motivo me r..io .V: j-. j ; j ra o ParaiíO .
— « M inha filha, re jp c r .d cu . quero dar-te r.o deccr- re r da tua existência m uitas cca.-iccs de te enriqueceres
S A S T A GEMA G A L G A S I4
de méritos: avivarei sempre mais o teu desejo do céu. c
continuarás a suportar a vida com paciência v
Com estas incessantes aspirações cresciam rápida-
mente em seu coração as chamas do amor divino. E den
tro em breve, no ano dc 1S96. despertava nela c nela se
radicava mais e mais um novo desejo que bem revela a
sinceridade do seu amor e o seu grau dc perfeição. Dê
mos-lhe a palavra:
«L/m outro desejo desabrochou na minha alma. um
ardente desejo dc sofrer e dc acompanhar Jesus nas st:as
dores> (>)•
E continua: «.Vo meio dos meus numerosos peca-
dos» pedia todos os dias a Jesus sofrimento e muito so*
frimento. Sim . meu Jesus, repetia eu. quero sofrer por
\~ós e sofrer muito*.
Um ardente desejo, disse bem: porque lhe bastava
uma palavra, uma lembrança, um olhar sôbrc a imagem
dc Jesus Crucificado, para sc sentir completamente pene
trada dc compaixão c dc amor. eUm dia. conta ela.
fixando o olhar no crucifixo, fu i possuide de tal dor que
cai desfalecida. Meu pai. que estaca presente, pós-sc a
repreender-me e acusou-me de prejudicar a saúde com a
minha vida retirada e ccm o hábito de ir à igreja muito
cedo.
(*) Mais que urca ver. o Salvador se mostrará 6 sua serva sob o aspecto da dor. cu coco çue suportaedo verdadeiramente os
suplícios da Pa'xSo. ou saturado de tristeza por causa da InçratídSo dos hocens. Todos os santos conhece ran mlstlrlo. e. com esta *.Uo de piedade, rea! ou imaginária. procura/ara condoer-se axroro-
taseote do» sofrimentos do rosso Redentor, embora a U lhes reve- Uue que Êle es:S para sempre çlorloso e lo$asslvcL
• \ * ’ • • i;'? ' ’• . •
C A P Í T U L O I V 47i .
«O que me fa : mal. respondi, c ser obrigada a estar
longe do tabernáculo de Jesus. E fui encerrar-me no
quarto onde. pela primeira ve:, desafoguei a minha der.
só com o Coração de Jesus».
Destas palavras sc dedu: que ati ésse momento,
isto é. ate aos dc;ói:o ar.es. a piedosa ir.cn.r.j tinha aba
fado na sua altaa a tr;s'.era que ihc ca usa van semelhan
tes dificuldades. E ccr.tmua amda: «£u disse a Jesus:
quero seguir-Vos. 6 Jesus, .i custa de sofrimentos, sejam
eles quais forem: quero scguir-Vos cem /error. S'io.
meu Jesus, não rr.ais quero cautar-Vcs repugr.Ànoa com
as minhas obras tibias. r.em inspirar-Ves desgisto com
a frouxidão com que Vos tcr.ho procurado até agera*.
E. como sc quisesse garantir as suas presessa».
acrescenta: «Per isso. para o futuro. ora;io mais re
colhida. comunhão nais fcrccrcsa. Afea Jesus per V is
quero sofrer muito, ter.co sempre a prece nes libios».
Depois, ao cons:dcrar. as suas resoluçí«s. c pensa
mento da fragilidade Humana leva-a a escrever esta re
flexão: «Cai muitas vezes quem muitas ve:es fetna bens
propósitos: mas cue sera de quer: só raramente cs
fermah
Gema não era dc modo algum inexperiente r.o cami
nho da dor. que cia tão ardentemente deseja perccrrer
cm seguimento do seu Divino Mestre. Muito querida dc
]csus desde a ma:s tenra idade, tinha, cm ccnscqütnoa
disso, rcccbido ccdo a sua parte da cru:. • Posso di:er.
descobria cia ao seu Director, que. desde a merte de mi
nha mài. não parses um só d:a sem sofrer alguma coi-
sinha por Jesus».
Agora, que j i r.ão estava na infância, mas numa
S A X T A G E M A G A L G A S /
idade m adura , c Senhor ia tornar pesada a sua n ã o
d iv in a e aplicar goipes ce mestre.
A princípio veio-lhe u n mal terriveí a um pé. a
necrose, acom panhada de dores muito agudas. À v ir
tuosa donzela , ju lg ando não dever ligar im portânc ia ao
m a l. suportava os sofrimentos com unta generosa co ra
gem . O mal. porém desprezado, agravou-se. a cárie p ro
pagou-se. e foi forçoso recorrer ao cirurg ião . Êste. à
v ista dos estragos d a gangrena. n ão ocultou os seus
receios e declarou que provàvelmente seria necessária a
am pu tação do pé. [.imitando-se a prir.cipio a um a opera
ção parcia l, descobriu o osso atacado e pós-se a raspá-lo
p ro fundam ente para e lim inar dêle os por.tos cariados.
À paciente, que n ão tinha querido ser cJcroíormi-
zada . suportava heroicamente as torturas da operação:
e. em quanto todos os assistentes estremeciam de horror
c pena. só e!a. imóvel, parecia estar indiferente. N o mais
du ro da operação, scltou alguns suspires invo luntários,
mas. o lh ando im ediatam ente para a imagem ce jesus
C ruc ificado , pediu-lhe perdão desta fraqueza e retomou
a im passib ilidade.
Ê assim que. para empregar a sua própria expres
são , depo is de tanto ter pedido um pouco dc sofrim ento.
Jesus a tinha consolado! O D iv ino M esíre libertou em
breve a sua am ada serva destes primeiros tormentos cor
porais. mas para lhe apresentar, no cális de sua paixão,
am argura bem diferente.
H enrique G a lgan i. seu pai. era um homem educado
à an tig a : bem, simples, caridoso, incapaz de enganar
a lguém , incapaz de ju lg a r que o enganassem a êle. M as ,
embora o n ão supusesse, vivia em maus tempos. M u ito s
do ’s que conheciam a sua bondade excessiva procuravam
explorá-la em seu proveito . D e tòca a parte v in h a a ter
com ele. Ê s íe v inha ped ir dinheiro emprestado, aquèle
v inha pedir-lhe que ficasse por seu fiadoc; os seus arren
datários e inqu ilinos n ão pagavam as rendas. A lém disso,
longas e con tinuas doenças na fam ília, entre cias as de
sua esposa, c ce dois f:'hos. doenças a que sc seguiu a
morte, e mil outros in fo rtún ios contribuíram para consu
m ir pouco a pouco o seu rico património.
Q u a n d o chegou o vencim ento das letras, im p ruden
temente caucionadas, foi comple'.a a ruíca. T o dos 05
bens móveis e imóveis foram penhorados, e a numerosa
fam ília encontrou-se reduz id a h mais lamentável m iséria.
Pouco depois, o pobre pai caía doente com uca can
cro na garcar.ta e n ão tardou a expirar, deixando os seus
queridos íilhes r.a m ais completa penúria. A nova do seu
falecimento, os o fic ia is da justiça e a fôíça púb lica vie
ram . em nome dos credores, fechar a farmácia e « b r c»
pôucos móveis que a in d a restavam.
Perante a narração dum tal infortúnio. n ão te pa
rece. ó leitor, ver passar d iante des oihos as d .íc :e n ic s
cenas das des.jraças de Job? Entre tanto o s qua:s eram
os sentimentos de G em a cm semelhante a fhçáo :
«.Entráramos no a/?o dc 1S97. t3o d c lc rc ic para
tôda a fã m i! ia. S ó cu. sen cora; Jo . //ca ta indiferente a
fa.-ifcs ici'cscs (* )• O f; 1-0 mais afUgia cs ciittos. era
cncOnlrarctn-sc sem recursos e, para cúmulo, rerem
nosso pãi tão doente. Certa m ar.k i ccmprcer.di a $ran*
(1) Sem coroçJo — rr.oJéütJ tr.ar.tidcr» <c~i que cscor.cc
o licrciscro dc v.sa virtude.
OV S A A I A O r, M A u A L U A S' I JOf
de:a do novo sacrifício que Jesus is impor-me: chord
muito. M as o D irino Mestre nestes dias de dor, fazia-se
sentir muito à minha alma. E depois, a visto da edifi-
cante resignação de meu pai em face da morfe inspi- '
rou-me tanta fôrça que recebi o golpe terrível com calmo.
N o dia do seu falecimento, Jesus proibiu-mc derra
mar lágrimas inúteis. Passei-o em oração. muito resi
gnada com a vontade de Deus. meu Pa i do céu. que
r.este momento tomou c lugar do meu pai da terra.
Dcpcis desta perda ficávamos sem nada: não tinhamos
com que viver».
Era a 11 dc Novembro de 1S97 que Gem a se via
órfã pela segunda vez. Com q-.ic heroísmo abraçou as
cruzcs. dc cada vez mass pesadas, que o D iv ino Mestre
costuma distribuir prodigamente pelos seus predilectos. *
i
íi
C A P Í T U L O V
Gem a com sua tia cm C am a io re— O seu
pudor v irg ina l — V olta a Luca — Às por
tas da morte — Aparições celestes e cura
prodigiosa
— tS O M S W —
é sempre grande a desolação numa famiha
depois da morte do pai. para a casa Galgani
foi ela incalculável. O falecido deixava sem o
menor recurso seis filhos e duas irmãs: Helena e Elisa.
i Felizmente. outras tias que viviam fora. comovidas
por um tal abandono, vieram cm auxilio dos seus sobri
nhos. e Gema. a preferida de entre todos, foi recolhida
por sua tia dc Camaiore. Carolina Lencioni. cujas rique
zas lhe permitiriam voltar aos dias mais prósperos da
casa paterna.
Mas. assim como a virtuosa donzela se não tinha
afligido com a extrema penúria dc Lu ca. assim tambóm
não sc regozijou com a opulência de Camaiore. A sua
única felicidade devia consistir, como sempre, no traba
lho. na oração e na un ião intima com Jesus. Retemperada
no amor div ino pela tribulação, esperava poder agora
gozar em paz os seus frutos e levar em casa de sua tia.
como num mosteiro, uma vida túda celeste.
Esta espectativa foi ilud ida . Se no seio de sua farai-
Iia lhe deixavam plena liberdade para se entregar a prá
ticas de piedade, evitando as distracções mundanas, em
Camaiore. cocno outrora em S. Gennaro, multiplica-
ram-se de dia para dia os entraves ao seu ideal dc san
tidade. Por um !ado, o seu bom coração sofria era se
subtrair às conveniências da sua condição, por outro
experimentava, em as seguir, escrúpulo e remorsos.
Q ue fazer?
Longe de seu confessor ordinário,. Gema não
podia manifestar-lhe as suas incertezas. Abrir-se com
outro, pouco ao corrente do trabalho interior da graça
em sua aíma. era coisa que lhe repugnava invencivel
mente. A lém disso, a inda que o quisesse, não poderia
c>:pl:car-sc nem fazer-se compreender.
A todos estes motivos de amargura vieram juntar-se
ir.úmcras dificuldades externas contra a Com unhão fre
qüente. seu único sustento. F-m tal angústia, d irigia ao
seu Jesus súplicas e queixas amorosas. M as Êle. pare
cendo permanecer surdo, abandonava-a a uma profunda
aridez.
A piedosa menina multiplicava contudo os esforços
para se tornar mais agradável a seus olhos: e. à im itação
de Santa Catarina de Sena. como que tinha levantado
em seu coração um aitar donde incessantemente se ele
vavam à M ajestade D iv in a humildes adorações e palpi
tações de amor. Q uando lhe era concedida autorização.
di:igia-ic a tôda a pressa, em companhia de sua prima,
para a igreja da colegiada vizinha, S-fim-de viver alguns
instantes muito cuitos junto do seu am ado Jesus.
A inda hoje os Reverendos Cónegos da Colegiada
62 S A N T A G E M A G A L G A N l
C A P I T U L O V • 53
gostam de indicar aos visitantes o lugar que ocupava
habitualmente a nossa santa nas suas visitas eucarísticas.
O s seus passeios, aliás forçados, tinham quási sem
pre por meta o santuário da Abadia em que se vcr.íra
uma antiga imagem da V irgem Santíssima. Com que
felicidade expandia ai a sua terna devoção para com sua
querida M am ã. como costumava chamar-lhe! Recomen
dava-lhe com lágrimas a alma dc seu falecido pai e dali
só se retirava ao sinal de obediência.
Bem de-pressa um acontecimento doutra natureza a
vciit perturbar profundamente. A modestíssima virgem,
nos seus vinte anos. era dotada dc rara beleza. Dum
porte nobre e gracioso, em seu modo de vestir, pôsto que
dos mais simples, apresentava-se encantadora. O s seus
olhos, difíceis dc ver. porque os trazia constantemente
baixos, brilhavam como o meigo scir.tilar das estrelas; e a
estes atractivos externos, a piedade, o recolhimento e a
modéstia, que transpareciam em toda a sua pessoa,
acrescentavam r.ovo encanto.
O ra . aconteceu, peia segunda ve:, que um jovem da
terra, dc muito honrada família, só com vc-la se enamo
rou dela: c, sem tirar muitas informaçòcs. pediu a sua
mão. Era uma ocasião favorável para levantar da ruir.a
a fam ília Galgani. A angélica donzela, porém, nem
sequer quis ouvir falar cm casamento, c para sc subtrair
a inúteis vexames tomou a resolução dc abandonar Ca-
maiorc-
V endo que êste motivo não seria fàcilmente adm i
tido por sua tia. implorou de novo com a mais v iva con
fiança o auxilio do Senhor: c Êle para livrar a sua serva
de todo o perigo, permitiu que logo se lhe declarassem
S A N T A G E M A C A L G AN I\
dores agudas na cspinha dorsal e nos rins. Animando-se
então c se n se preocupar com a perspectiva das priva
ções que a esperam cm Luca. Gem a pretexta o seu estàdo
de saúde para solicitar a partida. A fôrça de instâncias
c de lágrim as obtém a permissão de entrar novamente
na casa paterna que ela ia encontrar, como a tinha dei
xado. sepultada na miséria.
Conta-se que no .m om ento da despedida todos os
membros da fam ilia Lencioni sentiram despedaçar-se-
-Ihcs o coração, tanto os tinha atraido por suas belas
qua lidades a cativante menina. Viu-se o próprio tio.
carácter rude e d ifíc il dc comover, lançar-se irresistivel
mente nes braços desta querida sobrinha, derramando
abundantes lágrimas.
M a l chegara a Luca. sentiu Gem a agravar-se o seu
estado. A s dores dos rins e da espinha dorsal vieram
juntar-se o desvio da coluna vertebral, criscs terríveis
da meningite, perda total do ouvir, queda do cabelo e
por ú ltim o a paralisia dos membros. A principio, na espe
rança de evitar o exame médico, temido pelo seu pudor,
d issim ulou ela a agudeza dos sofrimentos, particular
mente excessivos na região dos rins. Como se deixaria
exam inar c tocar por um estranho, ela que nem sequer
se perm itia dirig ir um olhar para os membros dolorosos,
nem mesmo aproximar deles a m ão para verificar a exis-
tcr.cia do mal?
Perante o agravamento assustador dos sintomas, a
sua perplexidade tornou-se extrema. Teria certamente
preferido suportar torturas dez ypzes mais cruéis a rece
ber um a visita médica, porque, lembrando-se sempre das
palavras de sua mãi — o nosso corpo é o templo do Espí
C A P I T U f. O V 55
rito Santo — . queria a lodo o custo fazê-lo respeitar
como tal.
Urr.a tarde. porém, um médico, cham ado pela fam í
lia sem ela o saber, entrou-lhe subitam ente no quarto, e,
a-pesar-da sua recusa inacessível a qualquer argumento,
quis a tõda a fôrça examiná-la. Perante a ordem formal
de suas tias. Gem a teve de oferecer a D eus o inevitável
sacrifício.
O exame revelou na região lom bar um grande
abcesso, parecendo comunicar com um dos rins. O mé
dico. assustado, reüniu uma jun ta de outros clínicos que
declararam unanimemente a jovem ating ida dum a afec
ção vertebral de natureza m uito grave e dificilmente
curável (1 ). Receitaram alguns medicamentos cu jo efeito
foi nulo. Bem de-pressa os progressos incessantes do
mal obrigaram a enferma ao leito incapacitada já de mo
vimento. • ••
Em quanto se consumia o frág il corpo d3 inocente
menina, a sua alm a expandia-se cm ternos gemidos,
nesses gemidos de amor que consolam e aliviam , e que
ninguém trocaria pelos efémeros prazeres mundanos.
Seu pensamento voava constantemente para Jesus que
lhe satisfazia emfim os ardentes desejos de sofrer para
Lhe agradar. Poc outro lado. como o confessor estava
agora ao seu alcance, a sua alm a permanecia cm paz; e
o Senhor, em sinal de particular estima, fazia-lhe sentir
um a dor intensa e um horror sempre m aior ao pecado.
Dores fisicas c arrependimento purificador dum
• • •
" • •'(!) Mal de Por- ÍM * * *•
66 S A N T A G E M A G A L G A N 1
passado menos peifcito uniam-se para activar a obra de
sua santificação.
Impossibilitada de se mover por si mesma, a doente,
no seu leito de sofrimento, permaneceria em perpétua
imobilidade, sc braços caridosos lhe r.ão viessem trazer o
alivio duma mudança de posição. E assim sc lhe iam
passando os dias c as noites, sem outras consolações
interiores além das que lhe davam a oração e a confor
m idade com as disposições da Providência D iv ina.
A lgum as veres, quando se queixava amorosamente
ao Salvador de nem mesmo poder já orar. rcccbia por
intermédio do seu A n jo da G ua rda fortificantes exorta
ções. «Se Jesus te aflige no feu corpo, dizia o Espirito ce
leste. c para melhor purificar a tua alma: tem paciência*.
A lud indo mais tarde a esta fam iliaridade sempre
crc^ccnte com o seu bem A n jo . cscrcveu G em a: « O hl
quantas ve:es. durante a minha longa doença, me disse
ao coração palavras consoladores!*
O s membros da fam ília Galgani faziam o impossí
vel para valer à sua querida Gema. A-pesar-de redu
zidos a uma penúria extrema, com nenhum cuidado lhe
faltavam , diante de nenhum sacrifício recuavam para
obter a sua cura. até que por fim, desesperando dos
meios hutcar.cs, se voltaram coníiadamente para o céu.
Comovida por tantos testemunhos de afecto, a jo
vem sofria ao lembrar-se que era para todos um motivo
de embaraço por causa da sua longa e fastidiosa doença.
A tristeza to:nou-se-lhe tão intensa que o Senhor, quer
para a humilhar quer para a cogfortar, se dignou vir
pessoalmente repreende-la por isso.
«Cer/a nanhS. conta Gema. depois de me ferem
C A P I T I I % c O * V 57
trazido a Sagrada Ccmunhào. Jesus cerr. voz muito forte,
dirigiu-me una grande censuta: <A!ma pusilânime, me
C&jjelit in terior cf-n / r r r l j dc /£>.* j . <--n / fin-Vyra (ju e e r.J
disse, c o teu amor-próprio que recalcitra for r.io poder
tomar parte r.a vida ordinária dc ; que te cercam; ou
antes c a necessidade inevitável dos cuidados dou trem
qué te causa umà excessiva confusãc. M a is morta para
ti mesma, não experimentarias semelhante inquietação>.
T ão consolada com o esclarecida por estas palavras,
a piedosa donzela recuperou a par, e; desde então, ficou
indiferente tanto às vicissitudes do seu estado, como aos
incidentes da fam ília . , -
• " r Entretanto a notícia da sua cruel doença tiDha-se
espalhado pela c idade , e numerosas am igas vinham
adm ira r de perto o que elas próprias cham avam um pro
d íg io de paciência em tão tenra donzela. G em a, acolhen
do-as com amável sorriso e provas dc gratidão , trocava
'com ctas palavras edificantes, as únicas que sabia, tirar
d o seu coração. Era-lhe indiferente, d iz ia ela. voar ao
céu imediatamente ou ficar a inda nesta pobre terra para
sofrer tanto quanto aprouvesse a Deus.
Essas boas am igas vendo o inu tilidade dos cuidados
médicos, esforçavam-se por lhe fazer esperar um mi!a-
:grc. umas vezes por intercessão dum santo , outras por
intercessão doutro, segundo a sua deveção particular.
U m a destas visitantes, querendo excitar a sua con
fiança em um novo intercessor, ou ao menos amenizar
por um a edificante le itura as longas horas do dia, trou
xe-lhe a vida de S . G abrie l de Nossa Senhora das Dores,
d a Congregação dos Passionistas. então somente V ene
rável. Gerr.a núr.ca tinha ouv ido falar d?sse Santo jovem
r.eir. dc seus numerosos m ilagres, cu ja nom eada enchia
já tôda a Itália. T am bém não m anifestou nenhum entu
siasmo a seu respeito, embora a fam ília começasse a d ir i
gir-lhe ardentes súplicas.
t:is como o Senhor acendeu no coração da sua serva
um a centelha de devoção, de confiança e dc amor para
C A P I T U L O V 59
. 1
com êstc Santo , cente lha que de-pressa se devia trans
form ar em incêndio .
E m um a das suas. horas de so lidão , a pobre pa
ciente sentiu-se de-repcnte invadida por sombrios pen
samentos dc m elancolia e por uma tristeza imensa.
C ansada , enfraquecida , impotente para encontrar cm
motivos dc fé o menor conforto, apodcrou-sc dela um-
desalento p ro fundo c a v id a parecia-lhe insuportável.
N a d a parcce mais na tu ra l que semelhante crise num a
rapariga doente e reduzida a tão lamentável estado.
1 odavia isto n ão era mais do que um a tentação
habilm ente d iss im ulada , do astucioso in im igo , que assim
procurava insir.uar-sc-lhe pela calada na alma para
mais seguramente conseguir perdê-la. Q u a n d o por
seu artific io ju lgou tê-la completamente perturbada,
tirando dc súbito a mascara, manifcsta-sc e diz-lhe: «Sc
í7;c ourires eu te livrarei dos teus tormentos: dar-te-ei
com certe:a a saúde, c ccm a saúde tudo o çise te puder
agradar».
Pela prirr.eira vez vemos Gerr.a face a face com
Satanás que vem abertamente travar a lu ta . N ão sabe
mos se esta tentação foi produzida por m eio dc aparição
real. se. como parecem dar a entender as palavras da
serva dc Deus. por meio dc simples sugestão. Fôssc o
que fôssc. o resultado foi bem claro.
A um a forte ag itação e grande perturbação in te
rior, até a í desconhecida, a piedosa m enina, a-pesar-da
sua inexperiência em casos desta natureza, reconheceu
im ediatamente a presença do dem ônio . Lembra-se de
S . G abrie l, inveca-o confiadam cnte e exclama: primeiro
a a/m a, e só dep-ois o corpo.
€0 S A N T A G E M A G A L G A X Ii
O tentador foi repelido; mas não tardou a vo itar
para um segur.do assalto. N o v a invocação ao santo e o
sinal da crus pusecam-no defin itivam ente em fuga.
Depois da vitória . G em a recuperou a ca lm a e u n a
un ião mais in tim a com D eus , que a recompensou gene
rosamente da sua enérgica resistência.
T endo assim experim entado a eficaz protecção do
San to jovem , sentiu nascer cm sua a lm a sentimentos dc
g ra tidão c um princip io de afecto para com éle. N o fim
do combate, o seu p dm c iro pensam ento foi procurar o
livro da sua v ida que tinha co locado sóbre o travesseiro.
«i\'cssa mesma tarde. d iz cia , pus-me a ler a Vida do
Irmão Gabriel, li-a muitas rezes: não me podia saciar
dc a ler e de admirar suas virtudes e exemples. Desde o
dia em que o zioi'o protector me tinha salvado a alma
senti uma devoção particular para com è/e; de noite não
conciliava o sono se a sua imagem não estivesse sôbre o
meu travesseiro. Tinha sempre junto de mim o irmão
Gabriel,
Neste ponto não me sei explicar: mas sentia a
sua presença e em cada um dos meus actos me vinha
êle à lembrança>.
A senhora que tinha em prestado à enferma a V id a
do Santo veiu para a levar. M a s , quan to n ão diferi3tn
agora os sentimentos da donze la , prestes a perder o livro,
daqueles com que o tinha recebido! O seu coração entris
teceu-se e as lágrim as brotaram-lhe dos olhos. A se
nhora , comovida, deixou-lho por m ais a lgum tempo.
T odav ia» G em a teve fina lm ente que separar-se dêle.
«Este Santo do céu. escreveu ela. quis dentro em
breve recompensar-mc dèste pequeno sacrifício, porque
• *
C A P I T U L O V 61
na noite seguinte ■ me apareceu, envolvido num manto
branco. Não o conheci. Mas ê/e. percebendo isso. abriu
o manto c deixou ver o hábito dos Passionistas. Não
tardei cm o rcccnhecer. Preguntou-me porque tinha eu
chorado, ao entregar o livro da sua vida. NSo sei qual
foi a minha resposta. £le. porém. disse-me: Sè vir-
tuosã; voltarei a vcr~tc>.
Esta curta v is ita de S . Gabrid.- cncherdo de de li
ciosa paz e suav idade a alrr.3 da santa, reavivou forte
mente o seu an tigo desejo do céu: tVamos a Jesus
ouviam-na m uitas vezes exclamar, sim, vamos a Jesus
para ficar sempre com ê !c>. M as Jesus n áo tencionava
ouvi-la a inda , c c!a, sufocando no coração a q u é k ardeste
desejo, permanecia tranqü ila no seu leito de dor. p lena
mente resignada corn a vontade divina.
A lém dos membros da fam ília, as caridosas irmãs
dc S . C am ilo , cham adas Barbantinas. prestavam-lhe
assiduamente seus cu idados, levadas a isso certam er'e
não só pela caridade heróica de que. fazem profissão,
mas tam bém pelo m uito que veneravam a querida en
ferma.
P or vezes traziam a lgum a das suas noviças para
que se edificasse com o espectáculo de tan to fervor c
virtude. V ir .ham igualm ente com o fim de sc cdificarem
as irmãs de Santa Z ita . que conservavam um vivo afecto
à sua antiga a luna e que recordam a inda os belíssimos
exemplos de v irtude , de que ío ra n testemunhas cu ran tc
a sua longa doer.ça.
Entre tanto os meses iam correndo sem trazer m elho
ras à dolorosa s ituação da padecente. A miséria da fam í
lia aum entava com as dívidas ocasionadas por tantos
62 S A N T A C E M A C A L C A N It
médicos e remédios, chegando a ponto de ninguém lhe
querer emprestar um úcico ceitil. À s almas caridosas que
v inham ver a santa enferma teriam certamente, por q u a l
quer maneira, dado remédio a esta pobreza, mas os
infelizes filhos de H enrique G a lg an i. lembrando-se da
sua prosperidade de outrora abstinham-se cu idadosa
mente dc a revelar. E assim acontecia que muitas vezes
nem dispunham dum centavo para procurar a esta que
ridíssima irm à o mais ligeiro alív io.
Chegou a véspera da Im acu lada Conceição. 7 de
Dezem bro de IS9S. A s irmãs Barbantinas apresenta-
ram-se para a sua visita hab itua l, acom panhadas dum a
postulante a quem a pouca idade im pedia de vestir o
háb ito religioso. A vista deste an jo despertou em Gem a
o desejo de a im itar. C rendo ser uraa inspiração div ina,
faz voto a N ossa Senhora dc entrar para a Congregação
das Darbar.tinas; se chegar a convalescer.
«£sfe peoiJ.-nenfo consolou-n:e. escreveu ela: falei
nèle à irmã Leor.ilda que tomou o compromisso, se cu
chegasse a sarar, de me adm itir à profissão na mesma
época que a jovem postulante».
M u ito feliz, a-pesar-dos sofrimentos fisicos. a bon
dosa enfêrma manifestou a sua in tenção ao confessor,
que veiu nesse mesmo d ia trazer-lhe as graças do Sacra
mento da Penitência. «Aprovou imediatamente o meu
projecto, continua, e concecícu-me ainda outra consola
ção. sempre recusada até ai: a de fazer nessa mesma
tarde o voto de virgindade perpétua>.
Gem a atingia e n fim o apogeu dos seus desejos.
A gora já pode proclamar-se tôda de Jpsus. e de jesus só.
Nessa noite uma paz celestial desceu à sua a lm a, e o seu
C A P I T U L O V 63
am or esperou com impaciência a alvorada do d ia se
guinte que dev ia pela primeira vez depois do voto de
v irg indade perpétua , uni-la a Jesus na Santa C om unhão ,
c dar-lhe ao mesmo tempo a alegria de oferecer à sua
M á» celeste, na festa da Im acu lada Conceição, a bela
promessa de tom ar o véu.
Tendo-se abandonado a éstes doces pensamentos,
veiu um tranqü ilo sono cerrar-lhe as pálpebras e pôr em
repouso os seus doridos membros. Apareceu-lhe então
de novo o seu querido protector, S . Gabriel, que lhe
disse: «G em a. [aze dc boa vontade o voto dc entrar cm
religião, mas não lhe acrescentes nada*.
<Porque não lhe acrescentar nada?» pregunta ela.
n ão com preendendo o sentido destas palavras.
Por ún ica resposta ouviu estas duas palavras, acom
panhadas pelo San to dum terno olhar e dum delicioso
sorrjso: Sorella mia! M in h a irmã!
cEu nada compreendia de tudo aquilo, continua
G em a . Para lhe agradecer beijei-lhe o hábito. Despren
deu então do seu peito o corafão (emblema dos Passio
n is tas ). deu-mo a beijar, e coloccu-o sôbrc o meu. por
cima dos lençóis, dizendo de novo: Sorella mia! E desa
pareceu» (1 ).
N a m anhã seguinte a santa jovem, recebia Jesus
(3) O Santo queria significar â donzela que formu!asse sir.-
plesrrente o voto dc entrar em rcÜgiSc, sem se ligar a nenhuma con-
çregaçSo. Em seguida dava-lhe ficiJmente a entender que seria
' religiosa passionista. pelo menos de espirito e coraçJo, Isto é, mlstl-
camente transformada em Jesus Crucificado.
S A N T A G E M A G A L G A N I
S acram en tado e pronunciava o seu voto, com a a lm a
‘ in u n d a d a das mais suaves delícias.
Estes íavores espirituais n ão im pediam o en fraque
c im ento progressivo de suas fõrças. O s médicos recorre
ram , com o remédio extremo, à operação d o abcesso dos
rins e à ap licação de pontas.de fogo ao longo da esp inha
dorsa l. E ra a 4 de Janeiro de 1899. A san ta m enina que
antes de tudo sc preocupava sempre com a g uarda do
seu pudo r, n ão sc deixou cloroform izar. Suportou hero i
cam ente o suplicio, a liás inú til, porque, con tinuando o
m al com os seus estragos, a 28 do mesmo mês lhe apa-
rcccu um tum or na cabeça que causava A pobre cnfêrn ia
dores horrorosas.
O médico, cham ado a tôda a pressa, limitou-se a
verificar a grav idade do perigo. À fraqueza de G em a
n ão perm itia ata lhá- lo com uma operação c irúrg ica .
O u tro s médicos igualm ente declararam o caso desespe
rado . «.A 2 dc Fevereiro. escreve G em a. confessei-me.
recebi o Sagrado Viático, c esperei o momento de ir para
Jesus. Os médicos, julgando que eu não ouvia, disseram
entre si que não chegaria à meia-noite».
A-pcsar-de tudo . Gem a não dev ia morrer a inda .
E s tava r.os desígnios do Senhor glorificar-se nela pela
e fusão dos mais extraordinários dons sobrenaturais.
A cura exigia um m ilagre; mas D eus fè-!o e d o m odo
m u ito s ingu lar que Gem a nos vai descrever.
«.A minha família, d iz e la, fazia triduos e novenas
pela minha cura. Só eu. confortada pelas doces e fernas
palavras que ouvia da própria bôea de Jesus, esfat>a indi
ferente. Uma das minhas antiga^ mestras veiu visitar-me
pela última vez. para me dizer adeus até nos vermos no
C A P Í T U L O V «
céu. Insistiu comigo para qtfe c a mesmo fizesse uma
novena à Beata M argarida M aria A lcoque. asseguran-
do-me que obteria a graça duma cora perfeita o a dama
pronta morte que me abriria o céu. Para lhe fazer a von
tade comecei-a: era a 18 de Fevereiro de 18S9.
/.ui j — Igreja co S. Frcdiano o rde a Sa^Ja ft: a pt-.r-.e-.ta comu-
nh&o a 17 de JurJio dc IS57
Aro dia seguinte, porém, esqueci-me. Comecei de
novo r.o d ia 20. mas de novo a esqueci. Q u e atenção na
reza, meu Padre!
Comecei pela terceira vez no dia 23. A lguns momen
tos antes da meia-noite senti o mover dum tèrço, senti
uma mão pousar-se-me sôbre a fronte e uma voz começar
nore rezes a seguir um Pater. Ave. G lória . Respondia
com dificuldade, tão fraca eu esfa^a. Esta voz disse-me
cm seguida: Queres sarar? Invoca com fervor tôdas as
noites o Sagrado Coração de Jesus. Virei ter contigo
todos os dias da novena c oraremos juntamente.
Era o Venerável Gabriel, Passionista, que de-facto
voltou tôdas as noites. Colocava-me sempre a mão sôbre
a fronte e recitávamos as preces ao Sagrado Coração de
Jesus: fazia-me acrescentar três Glórias em honra da
Beata Margarida Maria.
A novena terminou na primeira sexta-feira do mês.
Confessei-me e. de manha cedo. recebi a S ag rad a Comu
nhão. Oh! que momentos deliciosos passei com Jesus1...
Repetia-me: Gema. queres sarar? Eu. de comoção. não
podia responder. No intimo do meu coração disse: Jesus,
como quiserdes. Como Jesus e bom! a graça estava con-
ccdida. eu estava curada (1 ).
Ainda não se tinham passado duas horas depois da.
Comunhão e eu jà de pé. A minha familia chorava de
alegria. Eu também estava contente. não por ter recupe
rado a saúde, mas porque Jesus me tinha escolhido para
sua filha.
Com efeito, antes de me deixar, nessa manhã.
tinha-me dito ao coração com uma voz penetrante: M i
nha filha depois da graça que acabas de receber, seguir-
-me-ás com mais ardor ainda. Estarei sempre contigo.
(t) Dois diaj antes deita cura miraculosa tem Geaa uma
cotáve! apariçAo da SaotSjsima Virgem, presenciada também por
Leilcia BeriucceHl. O relato desta aparição feito pela testemunha
ocuiar encontrá-lo-á o leitor maJs adiante, quAsl no fim desta bio
grafia. (N<Xa do Revisor).
servir^te-ei de pai. c tua mãi, ei-la (mostrava-me a Vir
gem das Doces)* ( I ) .
A minha assistência paternal não pede [altar àquele
que sc abandona nas minhas mãos; por isso nada te [al-
tará. mesmo quando eu te tirar tôda a consolação e todo
o apoio sôbre a terra».
Fe liz perda! ditoso ganho ! S im . feliz perda de tôdas
as alegrias hum anas, quando é compensada pelo ganho
e pela posse de Jesus! A seqüência desta b iografia vai-
-nos d a r um a prova palpáve l desta afirmação.
(1) O Salvador mostrava « n a estatueta de Nossa Senhora
das Dores, colocada era frente da cabeceira da doeate. Geca tinha-a
recebido de sua mâi moribunda, particularidade que lha tornava
duplamente querida. Gostava de fitar nela muitas vtxei o olhar,
mesmo durante n noite, para se cocdoer das IntfiveLs dorea de rua
M ii Celeste e oferecer-lhe o coraçOo.
C A P í (T U ' L O V I
Sonhos dc v id a c la u s tra !— E xerc idos
espirituais no conven to da V is ita ç ão
M ir ç o - M t io 1800
c u r a de Gem a foi instantânea e perfeita. Logo
que saiu do le ito de dor em que sua alm a se
tinha purificado, como o oiro no crisol, e
abrasado por completo co am or divino, a angélica me
nina apressou-se a retomar tôdas as práticas de piedade,
principalmente a da com unhão quotid iana. «Nessa oca-
sião. d iz ela. eu não podia viver sc não [ósse a Jesus
tôdas as manhãs>.
Sentia-se devorada por um a fopie intensa da E uca
ristia. feme que de m odo a lgum tinbam pod ido m itigar,
durante a sua doença de mais de doze meses, a lgum as
comunhões, concedidas dc longe em longe. Ê no B a n
quete sagrado que ela verá realizada a promessa d o
Senhor; «Nada te faltará, mesmo quando eu te tirar
tôda a consolação e ío<fo o apoio sôbre a ferra >. Jesus
Sacramentado suprir-lhe-á tudo .
A penas curada. G em a, que h á muitos anos suspJ- ..
r ã v à p d a v ida claustra], m anifestou & fam ília a in tenção
70 S A N T A G E M A G A L G A N l
de executar o seu projecto e o seu voto. N inguém pensou -
nesse momento cm contrariar um a vocação, a todos tão
m anifesta, tanto mais que não supunham próxima a sua
realização. A serva de Deus, porém , tencionava voar
sem demora para a solidão dum claustro silencioso
a-fim-de a í viver só com Jesus.
D iversas circunstâncias dos -últimos tempos da
doença podiam deixá-la indecisa sõbre a escolha dum a
congregação. Sob a inspiração das irmãs Barbantiaas,
tinha prometido à V irgem Santíssim a, no caso de cura.
entrar para o seu instituto. Por outro lado o Beato G a
briel. na aparição já relatada tinha-lhe várias vezes
cham ado irmã, co!ocando-lhe sôbre o peito o emblema
dos Passionistas.
Em fim . uma voz misteriosa parecia tê-la convidado
a tomar o véu na V is itação . G em a inclinava-se mais
para esta últim a O rdem , levada sem dúv ida pelo re
conhecimento para com a Beata M arg a r id a M aria ( l ) .
cu ja intercessão lhe tinha ob tido a saúde. Seis dias
depois d a sua prodigiosa cura, escrevia: «E u queria voar
quanto antes para onde me quere, a Bem-aventurada
Margarida Maria. O h i como se está mal no mundo!
Desde que deixei o meu leito de enfêrma. sinto uma
inexprimível aversão ao que passa».
Entretanto a noticia da cura espalhava-se pela ci
dade de Luca. não sem suscitar numerosos comentários.
À s V is itand inas manifestaram desejo de ver a donzela
(l ) Curiosa coLnddénda: os cntSo Beatos t hoje Santos
Gabriel e Margarida Maria vieram a ser canonizado* amboa co
cie^-no dia. p o r Bento X V , a 13 de Maio de 1920.’ (Nota do Revisor).
para ouvir dc Sua própria bóca as particularidades deste
acontecimento. N ão se podia recusar-lhes um a tão legi
tima satisfação.
A m iraculada foi acolh ida cora alvorôço no mos
teiro. e as religiosas, na persuasão de a possuírem um
dia definitivamente, m anifestaram todo o seu júbilo . Êste
d ia esperava Gem a certamente vê-lo alvorecer desde
aquele momento da sua cura. em que um a voz celeste
lhe tinha feito ouvir estas palavras: c/?eno:*a a Jesus
tôdas as tuas promessas. e acrescenta que. no mês con?
sagrado ao Seu C ora fáo , irás também consagrar-te
a £U»-
À piedosa m enina tinha interpretado estas palavras
como um chamamento à V is itação , c. r.o Impaciente
desejo de corresponder, esmorecia por ver ainda afas
tado éste momento. tHoje. escrevia ela, esfamos a 9 de
M arço ; como esperar até ao dia de Junho?» Para
suavizar o seu tormento, as Vvsitandinas prometeram
recebf-la como recolhida pelos princípios de M aio . e um
mês depois como postulante. Passaram-se trinta dias de
espera, durante os quais o Senhor cum ulou a sua serva
de inefáveis consolações.
Nesta época começa para .Gem a uma vida tôda
celesíe e a tal ponto extraordinária que pouco difere da
dos maiores santos.
A té aqui foi sem dúv ida favorecida por luzes inte
lectuais, colóquios d iv inos, suaves impressões de alma,
aparições celestes, mas sômente por intervalos mais oú
menos longos. H o je abre-se a série das comunicações
div inas quási in interruptas e de ordem tnais elevada;
inspirações luminosas, sublimès atracções, poderosos
T2 S A N T A G E M A G A L G A N l>
O tiaw U flte s qoc r io ràp idam ente v ão conduzir a vir-
tsosM jovem « um a adm irável perfeição.-
£ lo t ia a a sua un ião com D eus . contempla-O sen
^^ fa le c im e n to . sem poder detcr-se em nenhuraa cria-
mt*. Pelo scu absoluto ab andono à Providência, pela
$xu inalterável conform idade com a V o n tade D iv ina ,
conserva a paz e a alegria n o m eio das m ais duras pro
vas. Num a palavra. G em a n ão v ive senão para Deus.
para D e u i convergem todos os seus desejos, por Deus
clamam tôdas as pa lp itações do seu coração. N êle só se
deleita a sua a lm a e nêle repousa tranqü ila .
Entretanto a Sem ana San ta vínha-se aproxim ando.
G em a esperava-a com im paciência para expandir nesses
dias memoráveis 03 seus ternos sentimentos para com
Jesus C rucificado . A n tes de referir as graças im portan
tes recebidas nesta g rande sem ana devemos falar da
Hera santa, posta em p rá tica pela san ta donzela, pois foi
durante èste piedoso exerc ido que nela se realizaram ,
nos últimos anos d a sua v ida , os m a is adm iráveis pro
dígios do am or d iv ino .
Esta piedosa prática de so lidariedade com o D iv ino
Padecente tir.ha-lhe sido sugerida e explicada durante
a doença pela irm ã JúÜa, um a das suas an tigas mestras
do Institu to G uerra , com o fira de fortificar a sua
paciência.
Unir-se dum m odo especial ao d iv ino Redentor
cada quinta-feira, d ia cm que com eçou a dolorosíssima
Pa:xao, dev ia agradar imenso à fervorosa m enina que,
a ^ o obstante o enfraquecim ento ÍÍSico, quis abraçar sem
emera esta devoção. Ped iu o m anua l da Hora sanía.
te opúsculo , dev ido à fundadora d o Ins titu to de Santa
*
c A P 1 T U L : O V I 73
>
Z ita , H e lena G uerra , tem por titu lo : «Uma hera de
. oração com Jesus agonizante em Gethtsemani* t con
tém quatro m editações m uito piedosas sõbre éste m is
tério. seguidas de orações e ofertas.
Irutituto Guerra. cm Lxca. regido pç lã) írmÃs de Sanim Zita. onde
a SarJa foi educada
o n *» i n L* ík A U A L 7̂ / i /V /
D epo is de ter dado uma vista de olhos a estas p ág i
nas , G e m a julgou-sc na posse dum tesoiro e fêz ao C o ra
ção de Jesus a promessa de jamais em sua v ida om itir
tão comovente devoção, se chegasse a sarar da sua
doença mortal. Recuperada a saúde m iraculosamente,
apressou-se a cumprir a sua palavra com a aprovação do
confessor. Era em Quinta-feira Santa.
C om o fim de se dispor melhor para o piedoso exer
cício. a san ta fê-lo preceder dum a confissão geral. Esta
preparação tão séria revela o a lto conceito que o Senhor
lhe tin h a inspirado acerca dum a prática secretamente
ordenada por sua Providência com um fim m isericor
dioso d c que trataremos em outro cap itu lo . O uçam os
Gem a descrever-nos as operações da graça nesta Quinta-
-íeira S an ta .
«Cor/iecei pela primeira vez a fazer a Hora santa
[ora do leito, segundo a minha promessa ao Sagrado
Coração. O arrependimento de meus pecados atingiu tal
intensidade que sofri um verdadeiro martírio. Em minha
dor imensa restava-me uma fôrça que era ao mesmo
tempo um alívio: a de chorar. Chorei. pois, e orei du
rante tôda a hora: em seguida sentei-me. Á dor conti\
nuava. ,
Alguns instantes depois senti um grande recolhi
mento e como que um enfraquecimento repentino de
minhas forças. Quási que não pude levantar-me para
fechar à chave a porta do quarto.
■ Onde me encontrei então? Em presença de Jesus
Crucificado, jorrando sangue de tôdas as partes. Üluitó
perturbada com esta aparição, baixei os olhos e fiz o
••nal da Cru:. A perturbação xucedeu dentro em pouco
C A P I T U L O V I 76
a tranqüilidade dc espirito (1 ); mas a doc dos meus
pecados tornava-se com isto cada vez mais viva. Não
me sentindo com coragem de. nem sequer por um ins
tante. levantar os olhos para Jesus, prostrei-me com a
fronte em terra e fiquei muitas horas nesta posiçio. Vol
tei a mim: as chagas de Jesus tinham-se gravado tanto
no meu espirito que não mais se apagaram».
A visão desapareceu. Gem a ardendo no amor dc
Jesus C rucificado , suspirou então pela alvorada dc
Sexta-feira S an ta para contemplar Suas inefáveis dores
c para se un ir às Suas trÍ3 horas dc agonia . Chegada,
porém , a hora dos Santos O fíc ios, a fam ília , por p ru
dência. recusou-lhe autorização de ir à igreja, com re
ceio de que em ta l d ia a vivacidade da sua fé e a ternura
do seu am or lhe despedaçassem o coração.
G em a sentiu profundam ente esta contrariedade e os
seus olhos encheram-se de lágrimas. Dominou-se con
tudo. pois nos declara: <Fiz resolutamente a Jesus éste
prim eiro sacrifício, c Jesus tão generoso para comigo
quis rccompcnsà-lo».
Para não perder o fruto do exercício que quisera
realirar na igreja, a nossa santa encerrou-se r.o quarto:
e a sós começou as três horas de oração. Q ue digo, a
sós? M a l se havia ajoelhado, vê aproximar-se o seu A n jo
(1) Bi* KQU.-MÍO os teólogo», a diíereaça entre as aparata
celestes e ai apaiiçôes diabólica»; ai primeirai a priccipio inipl-
ram temor e. logo depoli uma suave tranqüilidade, emquanto que ai
segundai para melhor se irulnuarem começam por uma fingida *«gu-
rança. para terminarem por uoa graode perturbação e vivo terror.
Nao i pois difícil ordinàriamente diitingulr umaj das outrai.
76 S A N T A G E M A G A L G A N l
da G u a rd a . O espirito celeste censura-lhe as lágrim as
que acaba d e derramar; dirige-lhe sábias advertências
sóbre a fõ rça de alma que Deus quere em face d o sacri-
fid o ; depois uniu-se ás suas orações e ajudou-a a fazer
com panh ia a Jesus padecente e ò V irgem D olorosa .
C om esta assistência Gem a recebeu em sua contem
p lação tão grandes graças que mais tarde poderá dizer
ao seu director: <Foi a primeira vez e a primeira sexta
-feira em que Jesus se fê: sentir tão fortemente à minha
alma: e embora O não tivesse recebido das mãos do
sacerdote, porque era impossível (1 ), o próprio Jesus
reiu dar-se a mim (2). A nossa união foi tão intima que
fiquei confundida. Como era /mprew iona/ife a vo: de
Jesus».
Estes favores enchendo de consolação a a lm a da
santa donze la , enchiam-na também de confusão e dc
temor, tão ind ig na se ju lgava déles. Quereria , em sua
hum ildade , n ã o os deixar entrever a n inguém . P ara que
sc resolvesse a revelar ao seu próprio confessor a inter-
cecccora aparição dc Sexta-feira Santa , teve o A n jo ,d a
G ua rd a de a exortar muitas vezes e de a repreender até.
A vista do Redentor, todo coberto de sangue» tinha '
excitado no coração dc Gem a dois sentimentos: « O do
amor. nos d iz ia ela. do amor até ao sacrifício, e um vivo
desejo de sofrer alguma coisa por Aquéle que tanto tinha
sofrido por mim».
C om o conseqüência disto, que idea havia ela de ter?
Ern S«ta-fclra Santa n3o M dà a cotnunhSo boj fiéis,
talo X X V líf* <*Ut r"0t,° a Gema, ver-sc-á no capl-
C A P I T U L ò V I 77
% , ■*
Sem ser notada, vai ao poço da casa, desprende a
corda, dá-lhe muitos nós c, com ela assim , aperta a sua
carne.
M as . como chegar ao sonhado grau de amor de
D eus? A fervorosa m enina pregunta-o ao confessor, e
como a resposta lhe parecesse insuficiente, dirigiu-se
directamente ao Senhor. «Eu estava inquieta, escreve,
por não saber amar; Jesus, porém , em sua bondade infi
nita. dignou-se Jescer até ao ponto de se tornar meu
mestre*.
E ra um dia de A b ril do ano de 1599. duran te a o ra
ção da noite. Sòzinha, no seu estreito quarto , a fervo
rosa virgem tinha o pensamento e o coração abismados
no D iv ino Padecente, quando «efe-repenfe. continua ela.
me senti profundamente recolhida e me encontrei pela
segunda vez em presença de Jesus Crucificado. Mos
trando-me as suas cinco chagas abertas, disse: Vè. mi
nha filha, e aprende como se ama. Vês esta crui. estes
espinhos e estes cravos, estas carnes lividas, estas pisa
duras. estas chagas? Tudo é obra do amer e do amor
infinito. Eis até que pon to te amei. Queres amar-me ver
dadeiramente? APRENDE PR IM E IR O A SOFRER:
O SOFR IM EN TO ENSINA A AM AR*.
D ian te desta visão e ao ouv ir tais palavras, a terna
m enina experimentou uma dor tão intensa que. abando
n ada de suas fôrças, caiu desm aiada e ficou m uitas horas
estendida no chão. •
Predestinada menina, agora já sabes da própria
bóca do D iv ino Mestre como se am a. Prepara-te. agora,
para a dor que vai farer de ti um ardente serafim .
78 S A N T A G E M A G A L G A N I
Ia-se aproximando o primeiro de M a io . d ia fixado
a G em a pelas religiosas V is itand inas para o comèço
dura turno de exercícios espirituais no convento. A santa
donze la contava as horas que a separavam a inda desta
da ta tão ansiosamente esperada, que bem supunha devia
ser a do seu adeus definitivo ao m undo e a d a sua inteira
doação ao m uito A m ado Jesus. Por seu lado, o Salvador
con tinuava activamente na purificação desta alm a eleita,
com o fim de a preparar para um dom m ístico dos mais
raros.
C hegou emfim o primeiro de M a io . Pelas oito horas
da tarde. G em a dirigiu-se, transbordando de alegria, ao
santo asilo d a V is itação onde lhe pareceu, segundo a sua
expressão, estar no Paraíso. T in h a pro ib ido aos seus
que fõssern visitá-la durante os d ias do retiro, que deviam
ser. lhes disse, «todos para Jesus».
S igam os a fervorosa m enina nestes santos exercí
cios de que há de conservar a mais preciosa lem
brança. Dever-lhes-á a ú ltim a preparação para a graça
ex traord inária que va i ser o assunto do cap itu lo se
guinte .
Recebendo-a cm seu mosteiro, as V is itand inas não
tinham sòm ente a intenção, como já dissemos, de a con
servar a lguns dias; estavam na esperança de a adquirir,
porque , n ão obstante a sua pobreza e privação bem
conhecidas. Gema, por suas grandes virtudes, constituía
um verdade iro tesouro. Fo i dec id ido também , de acôrdo
com o seu confessor, que n ão faria os exercícios espiri
tuais em particular, como um a pessoa estranha, mas
seguiria em tudo o horário da com unidade . Tom aria
parte no oficio do côro, na m ed itação comum , nas re-
C A P I T U L O V I 79
I *
feições e nos outros exercícios da regra, como uma ver
dadeira noviça. ’
• A hum ilde virgenzinha preferiria permanecer soli^
tária e passar despercebida, mas. sabendo que a obe
diência e a abnegação da vontade própria agradam mais
ao Senhor, abandonou-se coafiadam ente à direcção" da
mestra de noviças, como se fôsse um a delas. C on fir
madas como estavam em sua grande estima a esta me
n ina por M g r. V o lp i. seu confessor e grande protector
do mosteiro, as V is itand inas intentavam assim exami
ná-la de perto e ao mesmo tempo proporcionar às Jovens
recolhidas um grande proveito espiritual pela edificação
de seus bons exemplos.
Prevenidas em seu favor, noviças e professas puse-
ram-se a cercar de atenções a recém-chegada. Sobretudo
a Superiora prodigalizava-lhe sinais particulares dé
afecto. N o refeitório queria que estivesse a seu lado. no
lugar de honra. Sua ategria era faiar muitas vezes com
ela de coisas divinas, durante o recreio da tarde. ou no
seu quarto, durante os momentos que a fervorosa exer-
citante não passava no cõro. a sós com Deus.
A s luzes e comunicações celestes recebidas nestes
santos dias. Gem a no-las deixa entrever por estas pa la
vras: € Jesus, sem olhar para a minha miséria, trazia-mt
as suas consolações c fazia-se sentir cada vez mais
à minha alma». Isto quere dizer, para quem conhece
a sua linguagem , que o céu se derramava em sua
alma para a excitar ao bem e arrebatar todos os seus
afectos.
• Gem a sentia-se realmente feliz no convento da V i
sitação.- Entretanto não se encontrava no seu verdadeiro
elem ento. A regra parecia m uito pouco severa ao seu
fervor. Para o seu desejo de oferecer a Jesus grandes
penitências, êsie género de v ida parecia-lhe demasiado
suave, e o próprio D iv in o M estre lho teria dado a eoten-
dcr. «Muitas vezes... conta ela, Jesus me disse interior-
nente: Minha filha, quero para ti uma regra mais aus
tera».
M as. enifim, ela ficaria de boa vontade no mosteiro:
só a atemorizava a idea de v jr a deixá-lo para de novo
se recolher à sua fam ília . E por isso não cessava de pedir
ao seu confessor lhe obtivesse da au toridade eclesiástica
perm issão para ali ficar defin itivam ente.
Foram ter com o Arcebispo. O santo prelado — era
M onsenhor G h ila rd i — já tinha ouv ido fa la r de Gem a:
e tinham-lha representado como um a pessoa de saúde
delicada, a-pesar-do m ilagre da sua cura. e de consti
tu ição fraca, trazendo além disso a inda o espartilho de
ferro imposto pelos médicos no princip io da doença, para
suspende: o desvio vertebral. Nestas condições houve
po : bem o prudente A rcebispo recusar a autorização
pedida.
A esta noticia, a Superiora, v ivam ente desejosa de
suprim ir todo o obstáculo, ordenou à jovem que deixasse
o espartilho de ferro. G em a n ão se fêz rogad3. N o
mesmo instante se despo jou do m a lfadado aparelho e
nunca mais o retomou, sem que tivesse por form3 algum a
sentido a falta dèle..
T udo. porém, foi inútil.
O Arcebispo, insp irado certamente por Deus, pec-
t in e c e u inflexível e proib iu que adm itissem a aspirante
â o noviciado no més de Junho , ío m o estava projectado.
» ' • . .
A tssüaá dc Ar.é «S.* dz3 Dcrcs quc s Sir.:* rcccbcra dc svâ m ii moribnrdj c «I tmhj gcdrdc afciç&c.
«Ah! r::nha quer.ca M<m3. hei-dc a.xa/-Vos sc.T.prc. scir.pro.
A u to r izou som ente a conservassem no mosteiro até vinte
de M a io , para lhe dar a alegria de assistir à profissão
dc a lgum as nov iças, fixada para esta da ta .
•N ão com un icaram logo a G em a a decisão arquie-
p iscopal. N a m a n h ã do d ia vinte de M a io e durante a
cerim ón ia da p ro
fissão, com que
tam bém ela espe
rava ser mais tarde
benefic iada , viram-
-na tôda rad ian te
de alegria.’ «Jesus.
d iz ela. errferaeceu
o meti coração mais
que de costume»;
sem dúv id a com o
fim de a preparar
para a partida im i
nente. E stava num
l u g a r i s o l a d o ,
absorv ida em d o
ce contem plação .
«.Chorei, chorei muito», acrescenta: lágrim as de amor e
de celestial a legria .
Conta-se que neste d ia , cm quanto tôda a com un i
d ade festejava as novas professas. G em a. ficara era o ra
ção tôda a m a n h ã na capela, sem que ninguém tivesse
no tado a sua ausênc ia ao alm ôço nem ao jan tar. E ela
em sua u n ião ín t im a com D eus. a inda menos tinha pen
sado nisso.
M as depo is d o meio-dia a fraqueza natural traiu-a.
e
O Sr. Henrique Gatgártí, pai dc Santa Ccmã •
62 S A N T A C E M A G A L G A N I*
Logo que as religiosas conheceram a causa d a . ind ispo
sição, apressaram-se a conduzi-la ao refeitório.
Êste incóm odo porém nada era, em com paração
do que ia experimentar essa mesma (arde: ter que sair
d o mosteiro e vo ltar para a sua fam ília . Fo i extrema a
dor da nossa santa e só a póde suavizar a sua heróica
subm issão às disposições da Providência. «F o i ás cinco
horas da manhã, no dia 21 dc Maio de 1899, que tive
dc partir, escreveu ela; pedi. chorando, a benção à Supe
riora. saüdci as religiosas e saí. Meu Deus, que dor!*
A pobre m enina entrou consternadíssima em sua
casa, a qual tão d iferente lhe pareceu do convento que
ju lgou não poder viver nela. C om o eram diferentes as
ocupações, as pessoas, as conversas. T odav ia , para cum
prir a vontade de D eus. acomodou-se e entregou-se aos
cuidados domésticos com o ardor dc antes. V ia por outro
lado que estes cu idados não lhe desviavam a atenção
das coisas celestes, as únicas que apaixonavam o seu
coração.
A ba fando na a lm a as suas tristezas e a sua dor.
aspirava ao cum prim ento perfeito dos seus deveres para
com as tias e os irm ãozinhos. Conservava-se inteiramente
ao seu serviço, e com o exemplo animava-os à paciência
no ne io da penúria sempre crescente da sua tão p ro
vada fam ília .
Entre as piedosas práticas da santa donzela nesta
época, conta-se a que vamos descrever.
Sabemos quão ternamente am ava seu pai. a quem
«n-.pre ccrcora de atenções filiais até ao ú ltim o suspiro.
tpois da sua morte, êste afectcv traduziu-se por contí
nuos sufrágios pelo repouso de sua a lm a. D uran te a
C A P I T U L O V I S3
< i
estada em casa da tia de Cam alore . la m uitas-vezes;
acom panhada de sua prim a, à igreja da A b ad ia , como
que em devota rom agem , para lá recomendar à V irgem
Santíssim a a alm a de seu pai. D c vo lta a Luca , n ão dei
xou passar nenhum d ia de festa sem ix ao cemitério
com sua irm ã Jú lia orar sôbre as campas de seus queridos
pais.
E agora,, de volta do convento da V is itação . Gem a
retoma com mais fervor a mesma prática de piedade
filial. D epo is de ouv ir missa e de receber o P ão E u
carístico, dirige-se com a sua querida com panheira
para o cem itério, s ituado fora da c idade . A í perm a
necem am bas até ao meio-dia, hora a que se fecham as
portas.
E n tre tan to a sua piedade não está a inda satisfeita,
e esperam fora a reabertura do cemitério, silenciosas,
recolhidas e sem se importarem nem com chuva nem com
frio ou calor.
U m dia um a v izinha pobre v iu do seu casebre as
duas m eninas expostas no cam inho público às in tem pé
ries da estação. Convidou-as a abrigarem-se. e sabendo
que estavam em je jum , ofereceu-lhes uma pequena refei
ção . V e n d o de perto as duas irm ãs, não tardou a ganhar-
-Ihes a fe ição e arrancou-lhes a promessa de virem sem
pre repousar em sua hum ilde choupana . •
Depo is d isto aconteceu muitas vezes às piedosas
meninas encontrarem ausente a caridosa hospedeira;
m uito tím idas para irem bater a outra porta , ficavam
sem alim ento até ao fim do dia. E quando se retiravam
não iam a inda directamente para casa. O u v in d o os sinos
da cidade cham ar os fiéis às cerimónias da tarde. deti-
S4 ; S A N T A G E M A G A L G A N I\
nhaa-sc na lgum a igreja para assistirem à bênção do
Santíssimo Sacramento. . .
Assim acabavam de santificar o d ia estes dois an jos,
depois de terem dado uma inte ira satisfação aos seus
sentimentos de piedade filial.*
Despedindo Gem a, a 21 de M a io déste ano , as Visi-
tandinas n ão lhe tinham tirado tôd a a esperança de a
tornar a receber, quando as d ificu ldades que sobrevieram
fóssem ap lanadas . A santa por sua v iz , embora não
encontrasse o seu ideal neste convento, a êle vo ltaria de
boa vontade, a inda que fósse sòm ente para fug ir à vida
secular.
A consagração ao Sagrado C oração , de que o Se
nhor lhe tinha fa lado no m om ento da sua cura m ira
culosa. interpretara-a ela no sentido de consagração
religiosa num mosteiro da V is itação . A f in a l era simples
mente um meio de apressar a sua tota l transform ação
cm Deus pela dor e pelo amor. G em a . porém , tom ando
á letra as palavras do Salvador, suspirava a inda e sus
pirava ardentemente, pôsto que com resignação, pela
vida claiistral e renovava sem se cansar o ped ido de
adm issão ao noviciado.
Entre tanto as dificuldades longe de desaparecer,
iam-se m ultip licando. Exig iam agora certificados do m é
dico e não sei que outros atestados difíceis de obter.
A lém disso, como todo o seu dote consistia única-
mente na sua grande virtude e em seus modestos vestuá
rio*. as V isitandinas, como no princ ip io não tivessem
txJo lito em consideração, ju lg a r ^ n encontrar agora
co n o tem po e com novas reflexões, um obstáculo insu
perável.
A santa m enina de-pressa com preendeu a hesitação
dessas boas religiosas» m as sem se perturbar. C om a sua
confiança hab itua l voltou-se de novo para o Senhor, que
lhe deu claramente a entender desta vez que a m isteriosa
consagração n ão d iz ia respeito à v id a religiosa, pelo
menos na ordem da V is itação . G em a deixou im ediata
mente de instar e esperou no seio de sua fam ilia , com
resignação e calma, que se manifestasse m elhor a von
tade do céu acêrca do seu futuro .
P rod íg io s de cstigm atixaçáo
— 8 ác JunKo i c tS^J’—
EPRODUZIR em sua pessoa um a perfeita im agem
de Jesus, ta l era a suprema asp iração de
G em a ; e como o F ilh o de Deus para resgatar
as nossas a lm as e ganhar m ais eficazmente os nossos
corações apareceu no m undo, sob a form a d a dor, sua
fiel serva n ão queria conhecer senão a Jesus C ruc ificado .
O s m istérios das grandezas d iv inas pareciam p reo
cupar pouco o seu espírito. < A h l o meu Bem-Amado.
d iz ia e!a com a Espôsa dos Cantares, i para m im
um feixe de m irra: não quero considerar nêle outra
coisa, porque fo i a parfe que escolheu. V i quem quiser
contemplà-lO no Tabor. eu fico no Calvário, em com*
panhia de m inha querida M ã i das Dores*. G em a n ão
queria outras im agens de devoção além das que repre
sentavam a Jesus sofrendo por nós.
P equen ina a inda , ouvia-se d izer muitas vezes a sua
piedosa m ã i: « M a m ã , falai-me da PaixSo de Jesus*: e
às mestras d o institu to G u e rra : tlrm ãs . cxplical-me
___ . . _ ------ -- - - - W « I 4* u n *1 Ir
a lgum ponto dos mistérios dolorosos de Jesus*. E bem sc
recordam das que era preciso ter um a grande prudência
n a satisfação dêstes.santos desejos, com receio dc que a
v iv a emoção, sempre provocada nesta a lm a terna pela
n arra tiv a dos sofrimentos de seu Bem -Am ado Jesus, lhe
causasse qualquer perturbação de saúde.
T a is princípios, longe de se desmentirem , pela v ida
ad ian te , de-pressa foram seguidos de adm iráveis prod í
g ios. que vieram revelar dum m odo evidente e coroar,
a com ple ta transform ação dc G em a e n Jesus C ru c i
ficado.
V im os como o Salvador, a-fim-de in flam ar a devo
ção dc sua serva para com sua do lorosa Paixão, lhe
aparecia a lgum as veres todo coberto de sangue e pela
v is ta surpreendente das suas chagas abertas a estimulava
a arná- lO e a sofrer por Êle.
Essas visões sobrenaturais e ine fáve is entrevistas
d ispostas com um a providência m u ito particular, iam
p reparando gradualm ente a sua a lm a para o dom in a
preciável que lhe reservava o S ag rado Coração.
Depo is de ter saido do convento da V is itação .
G em a ouviu uma voz misteriosa dizer-lhe com fòrça ao
o uv id o : «V am os, íom a coragem; esquece tôdas as cria-
turas: abandona-te sem reserva a D eus. A m a-0 muito,
não oponhas nenhum obstáculo aos seus desígnios, e
verás o caminho que em pouco fem po fe fará percorrer,
sem tu mesmo o notares. A fasta todo o temor; o Coração
de Jesus é o trono da misericórdia, em que ós miseráveis
são os mais bem acolhidos».
Reconfortada por estas palavras, a santa, voltan-
do- jc para uma imagem do Sagrado C oração , exclama:
■ C A P I T U L O ' . ‘ V 1 1 89• » . %
* * . * l *
< ó meu Jesus, queria amar-Vos. muito. muito: mas
' r.ão sei*. . . • - .
c E a voz sobrenatura l continuou: «Q ue res amar
v sempre a Jesus? N S ó deixes um momenío de sofrer por
Êle. A cruz é o trono dos verdadeiros amantes; a cruz é.
nesta vida, o patrimônio dos escolhidos».
F inalm ente, um d ia ouviu depo is da San ta C om u
n h ão o próprio Jesus dizer-lhe: «G em a , coragem! espe-
ro-te no Calvário, sòbre esta montanha para a qual te
d irig i>.
Ê realmente para éste nobre pon to de reüniâo
que a Providência a tinha encam inhado pelas multíplices
provas da vida doméstica, pelas atrozes dores de sua
longa doença, e recentemente por um retiro de trés sema
nas na V is itação , por um arrependim ento extraordinário
de suas faltas, por um a confissão geral acom panhada de
muitas lágrimas, pela recusa das mesmas V is itand inas
em a receber no noviciado, numa palavra , pelas graças
extraordinárias prod igalizadas à v irgenzinha dc Luca.
desde a sua cura prodig iosa até êste d ia . A go ra que sua
a lm a brilha com uma pureza ideal. Jesus convida-a ao
Calvário .
Cocxesponde. sim, ao seu convite, predestinada me
n ina . e deixa-te transform ar em teu Espôso C rucificado.
A & de Junho de 1899. véspera da grande festa do
Sagrado Coração, a lguns momentos depois de com un
gar, deu o Senhor a entender à sua priv ileg iada serva
que. nessa mesma tarde, um favor insigne lhe seria con
cedido. Sem perda de tempo, corre a in fo rm ar disto o seu
confessor e pede-lhe m ais um a absolvição de suas faltas.
D epo is , com o espírito cheio de santos pensamentos, o
Coração a transbordar de paz e dum a alegria fora do
costume, entrou em casa. \ •
' r ’ • ' C A P. I. T U l O • V I 1 91.’
* ' ' -« A tarde, conta ela. fu i tomada subitamente, e mais' j
de-pressa que de costume, dum uivo arrependimento dos
meus pecados, mas dum arrependimento tão vivo que
não mais experimentei semelhante, julgando-me a ponto
de morrer.
<Pcuco depois, tódas as potências de m inha alma
entraram num misterioso recolhimento: a inteligência
somente via os meus pecados e o horror da ofensa de
Deus: a memória recordava-mos todos, assim com o os
tormentos suportados por Jesus para me salvar; a von
tade detestava-os, prometendo sofrer tudo para os
expiar. O ndas de sentimentos se com prim iam no meu
coração: sentimentos de dor, de amor. de esperança, de
coragem , de temor.
<A éste recolhimento interior sucedeu cm breve a
perda dos sentidos, e encontrei-me cm presença dc minha
A íõ i celeste. T inha à sua direita o meu A n jo , que antes
dc tudo me ordenou que recitasse o acto de contrição.
« Q uando terminei, minha M â i d irig iu-me estas pa-
lavrat: «M in h a filha . Jesus quere fazer-te um a graça:
saberás tornar-te d ig na de la?»
*A minha miscria não sabia que responder.
«M ar ia continuou ; «Serei para ti um a n ã i ; mostrar-
-te-ás para com igo um a verdadeira f ilh a ?»
Estendendo então o manto cobriu-me com èle. N o
mesmo insíanfe apareceu Jesus: suas chagas estavam
abertas, mas n ão saia sangue: saiam chamas ardentes.
D e súbito estas chamas tocaram m inhas mãos. meus pés
e o meu coração. Senti-me morrer e ia a cair. quando
minha M ã i me sustentou, conservando-me sempre sob o
seu m anío . Fiquei muitas horas nesta posição: cm se-
/-VI X J C M A ' . G T I X G Í 7 Í 7
< .
gu ida m inha A /át beijou-mc na fron te ,'e tudo dcsapa-
receu. Encontrei-me ajoelhada no meu quarto.
* U m a forte dor persistia nas mãos, nos pés. no
coração, e notei, ao levantar-me. que destes lugares
corria sangue. Cobri o melhor possível as partes do lo
rosas: depois, a judada pelo meu A n jo , pude subir para
0 leito*.
Assim adornada com as jó ias d iv inas dos d iv inos
estigmas. G e m a tomava lugar jun to da c ru : entre as
mais belas e elevadas a lm as, ao lado de S . Francisco de
Assis, de S an ta C atarina de Sena, de S an ta V erón ica
G iu lia n i, igualm ente favorecidos com éste dom . Podia
ap licar a si estas palavras de S . P au lo : «N inguém me
seja molesto, porque trago cm meu corpo os estigmas do
meu Senhor Jesus» (1 ).
Q u a n d o o Seráfico Patriarca de Assis, recebeu a
impressão dos sagrados estigmas, sentiu-se com pleta
mente transform ado em D eus pelo am or, mas o seu em
baraço r.ão foi pequeno ao lembrar-se que n ão poderia
ocultar aos o lhos profanos estas chagas misteriosas. Por
conselho de seus discípulos do A lverne (2 ). o Santo
'resolveu dissimulá-las o m elhor possível.
Poderia G em a tom ar semelhante atitude , ela que
ivivia. não sôbre um monte solitário , mas no meio do
m undo e cercada de pessoas curiosas? N ã o pod ia pri-
1 _
t1) O prodígio da esttgraatízaç5o deu-se. na casa n.* 13 da
^ua BiscJooe onde Gema vivia eat3o com os seus.
(3) Moo te dos Aper.lr.os or.de S. Francisco recebeu o mira- Woso favor. '
c A P t T u L Ô V I I * 98/
. var-se dc ir à igre ja, de m anhã pàra a S an ta C om unhão
c de taede para a visita ao Santíssim o Sacram ento . O r a .
os seus estigmas derram avam .sangue em abundânc ia .*
Q u e deverá fazer? T ôd a a noite sc in terrogou a st
mesma sôbre èste ponto.
Q uand o , ao romper do d ia . sc quis levan tar, mal os
seus pés tocaram no chão, experimentou um a dor in to
lerável de que ju lgava morrer a cada instante.
C onsegu indo emfim ter-se de pé. a jovem calçou as
luvas para esconder as chagas das mãos c arrastou-se
atè à igreja.
D e voka a casa viu-se duplam ente perplexa: por
um lado não pod ia continuar a encobrir o prodig io. por
outro não conhecia a sua s ign ificação precisa, nem sabia
- se era fenóm eno raro. se freqüente entre as pessoas
piedosas.
Supondo que tôdas as alm as desposadas com Cristo
pelos votos de re lig ião recebiam estes sinais, foi pregun-
tar a uma c a outra, com um constrang im ento cheio dc
candura , se a lgum as vezes lhes r.ão tinham sobrevindo
feridas de tal e de ta l forma. N enhum a resposta a firm a
tiva . O u nada compreendem do motivo de suas pregun-
tas ingénuas, ou se riem da sua s im plic idade. •
Entre tanto o sangue corria sempre por debaixo das
luvas e G em a decide-se a revelar o fenóm eno a um a de
suas tias. A presentando os braços estendidos e as mãos
cobertas pelo m antelcte , d iz : <M inha tia. vêde o que me
f è : Jesus*. A tais palavras e à vista das p rofundas im
pressões sangrentas, a boa senhora ficou estupefacta,
tã o longe estava de explicar, como mais tarde o fará . .
tão estranho m istério.
94 S A N T A G E M A G A L G A N I\
O leitor espera certamente por particu laridades
sóbre a natureza dos estigmas na serva de Deus, como é
que apareceram, como evolucionavam e por que tempo
permaneciam . É o que passo a expor, no tando antes de
tudo que êste fenóm eno místico, embora raro, não é novo
na vida dos Santos. .
E m diferentes séculos foi 'éle adm irado em m uitos
dos maiores vultos da Igre ja , a lguns dos quais, como os
já referidos, estão canonizados. Fo i verificado dum
modo particular no -último século por m ilhares de teste
munhas na pessoa da virgem be lga , Luíza Lateau, a
quem exam inaram , sob o ponto de vista fisiológico, sá
bios médicos católicos e racionalistas e, sob o ponto de
vista teológico, doutores igualm ente d istintos por sisa
ciência e virtude, que publicaram sóbre éste caso parti
cular volumes inteiros.
N a virgem de Luca a estigm atização. depois de se
ter m anifestado a primeira vez pelo modo que acabamos
de ler. reproduziu-se. duran te dois anos, tõdas as sem a
nas. em dia e hora fixos, isto é. na quinta-feira pelas oito
horps da noite, para desaparecer na sexta às três horas
depois do meio-dia.
Exceptuando o recolhimento precursor do êxtase,
nenhum sintoma físico, nenhum a impressão dolorosa
anunciava a sua aproximação. M a s de-repente. com o
êxtase, via-se aparecer r.as costas das mãos e no centro
das palm as uma mancha vermelha; progressivamente
abria-se sob a epiderme e no vivo da carne um a fenda,
irregularm ente circular nas palma$ e ob longa na face
oposta. Em fim a epiderme rasgava-se, pondo a des
coberto um a chaga viva duns bons dez m ilímetros de
largo por v in te de com prido na pa lm a, e sómente com
dois m ilímetros de largo nas costas da m ão.
Esta. fenda, a lgum as vez.es m uito superficial e
mesmo quás i invisível a õ lho nu , a ting ia de ord inário
uma grande profund idade , parecendo até atravessar tòda
a espessura da mão. que se diria trespassada de lado a
lado. D izem os parecendo até atravessar, porque, ver
tendo as feridas sangue em parte coagu lado e fechan
do-se logo que o sangue parava, seria preciso, para ter
a certeza, sondá- las'com aux ilio dum estilete médico, o
que nunca se ousou, pelo temor reverenciai que inspirava
a extática neste estado misterioso.
A lém disso a operação seria d ifíc il: as mãos intei-
riçavam-se convulsivam ente sob a opressão da dor, e a
abertura das chagas ficava coberta. na face palmar, por
um a protuberância que à primeira vista se ju lgaria ser
um a re iin ião de grum os de sangue, mas que na realidade
era carnuda e dura; levantava-se nos bordos, inteira
mente livres, afectando a forma dum a cabeça de prego
de dois centímetros e meio de diâm etro.
O s estigmas dos pés, maiores e ceccados de côres
lívidas, apresentavam , ao contrário dos das mãos. no
peito do pé um d iâm etro maior do que na p lanta . A lém
disso, o d o pé esquerdo era tão largo na face superior,
como o do pé direito na p lan ta , o que é na tu ra l se os pés
do Redentor foram pregados à cruz por um só cravo,
tendo o d ire ito sobreposto ao esquerdo.
A lgum as vezes, em lugar de se forrqarem pouco a
pouco no espaço de cinco a seis m inutos, começando sob
a pele ou epiderme, as feridas abriam-se instantânea-
mente. com eçando d o exterior, como sob o im pulso vio-
S A N T A G E M A G A L G A N I
len to de cravos invisíveis. Era en tão um suplic io ver a
querida mártir, assim ferida de improviso, tremer de
dor em todos os músculos dos braços, das pernas, de
todo o corpo.
À abertura do lado raramente foi observada e por
poucas pessoas. N inguém ousava descobrir, para uma
simples satisfação de curiosidade, a sua carne virg inal.
F o i por isso que eu mesmo me privei da consolação de a
ver. M a s . a ju lgar pela agudeza do sofrim ento, que pene
trava até ao mais intimo do coração, devia êle ating ir
tam bém esta viscera. Dem ais, sc o fim d o Senhor na
rea lização de tais prodígios é traçar em a lguns dos seus
servos privilegiados uma viva c perfeita im agem de Jesus
C ruc ificado , não há motivo para supor que a reprodução
n ão seja completa.
F azendo a autópsia dum a serva de D eus igualmente
estigm atizada, Joana da C ruz . os cirurgiões notaram ,
com espanto, qúe a ferida do lado atravessava o pulm ão
para a ting ir em cheio o coração. O mesmo teria sido
verificado em Gem a. se o prod íg io não tivesse cessado
por completo dois anos antes da sua morte.
N esta santa donzela, o estigma do lado apresentava
a form a dum crescente, com as extrem idades voltadas
para c im a. O seu comprimento em linha recta era de
seis centímetros: a largura, no meio. dc três milímetros:
e a curvatura igualava a dum arco do mesmo tamar.ho.
tendo um a flecha de meio centímetro.
A forma de crescente, nova entre os estigm atizados
conhecidos, causava-me espanto, em quanto n ão vim a
saber. pela leitura da vida da V eneráve l D iom ira A lle
gri. florcntina, do século' xvit, que esta serva de Deus
C A P t T U L Ò V J I 97
tinha recebido um estigma de aspecto idêntico, segundo
a declaração, certificada por juram ento , dos médicos
encarregados de a exam inar c de m uitas outras teste
m unhas oculares.
Aó.icí.j efe Cem jíore. O exterior da igreja
U m a forma tão bem de fin ida , reaparecendo três
séculos depois, permite acreditar em um a conformação
correspondente do ferro da lança que atravessou o lado
d o Salvador.
Esta ferida produzia-se cm G em a . um a veres ins
tantaneam ente e do exterior, como se fôsse aberta por
um a lançada, outras pouco a pouco e começando do in te
rior. N o últim o caso viam-sc a p rinc ip io aparecer, era
núm ero sempre crescente, pequeninos orificics verme-
98 S A N T A G E M A G A L G A N I*
lhos ; depois a pele rasga'va-se, de ixando ver a chaga tão
im pressionante jà descrita.
O sangue corria em ta l ab undânc ia que os vestidos
in teriores ficavam ensopados. A hum ilde virgem esfor
çava-se o mais possivel por encobri-lo: aplicava sôbre o
pe ito um pano dobrado m u itas vezes que lhe era preciso
renovar freqüentemente e que ela lavava em segredo.
T odav ia a fluênc ia do sangue n ão era contínua.
Recom eçava com intervalos, m ais ou menos longos,
d u ran te os quais a chaga secava a lgum as vezes, a ponto
d c . sendo lavada, parecer em via de cura . M as . como não
se tratava dum fenóm eno natu ra l, ao primeiro incêndio
<io fogo misterioso que se m an tinha n o interior, a ferida
inflamava-se de novo e o sangue corria em grande q uan
tidade .
E m muitas de suas cartas G e m a fala d a chaga do
la d o : «Esfa manhã. pelas dez horas, d iz ela. o meu cora
ção batia, batia ... Sentia-me enfraquecer... A dor do
coração sucedeu urr.a dor muito forte cm todos os mem
bros; mas o que precedia e ultrapassara tudo era a dor
dos meus pecados. Com o é intensa esta dor! Se aumen
tasse não poderia sobreriver-lhe. como não poderia
sobreriver ao golpe violento que experimentei ( • ) •
O m eu pobre coração, não podendo por mais tempo per
manecer fechado, começou a expelir sangue cm grande
abundância*. E num a ou tra carta ; « Jesus fêz-se sentir
m uito à minha alma. e não podendo o meu coração con
ter-se. a chaga do lado abriu-se e deu sangue».
(1) Êste golpe violento é a invisível lançada que lhe abria
a chaga do lado.
C A P I T U L O V I I M€
N ã o sabemos quan tas vezes se produziu éste feflé-
raenò m arav ilhoso fora dos d ias habitua is , nem tamb^m
podemos precisar a q u an tid ad e de sangue que perdi* a
santa v itim a durante as v in te horas, pouco mais ou
menos, que duravam os estigm as. M as. segundo o testc '
m unho das pessoas que m ais sc aprox im avam dela. era
considerável.
U m a destas pessoas a firm ou , sob juram ento , qu* 0
fluxo de sangue d o lado chegava até à terra, se nãc se
lhe opusesse obstácu lo . A m esm a declaração foi feic* a
respeito do fluxo das m ãos e dos pés.
O sangue era v ivo. de cór bela e d a mesma r.3tu'
reza que o que sai dusr.a ferida recentemente ab« 'ta-
com o q u a l se parecia a in d a depois da sua completa dfe-
secação sôbre a pele. sôbre os vestidos ou sôbre o soalho-
•O m odo por que desapareciam os estigm as não cra
menos m aravilhoso que o da sua form ação.
D epo is d o êxtase de sexta-feira a fluência do 5l1n*
gue cessava de fin itivam ente , as fibras dos tecidos focc"
rados tornavam a soldar-se pouco a pouco, e no ^ ia
seguinte ou. o mais tardar, no dom ingo nenhum vesti9‘°
ficava destas p ro fundas feridas .1 cobertas já dum a
nova. semelhante à das outras partes contíguas. Apenas
um a m ancha esbranqu içada ind icava o lugar que tinhatri
ocupado e que ocupariam de novo. para se tornarei1 a
fechar sempre do m esm o m odo.
D o is anos depo is d o desaparecimento defin itivo ^ as
chagas, esta m ancha persistia e pôde ser observada à
vontade por ocasião d a morte de Gem a. sobretudo oos
pés. os quais , em quan to v iva . era muito d ific il desnü^ar
du ran te os êxtases.
100 S A N T A G E M A G A L G A N />
A ntes de seus directores, por d isposição manifesta—.»
mente insp irada, lhe proibirem sujeitar-se aos estigmas,
o fenóm eno renovava-se invariávelm ente tódas as sema
nas. dc q u in ta para sexta-feira e nunca em outros dias.
a-pesar-da sua solenidade ou da form a extraordinária
dc certos êxtases da san ta donze la . D igam os já tudo:
houve apenas uma excepção que nos será referida mais
ad iante pelo P.* Pedro Pau lo , passionista. que foi oca
s ião e testemunha dela.
O favor dos estigm as é evidentemente dos mais
raros. M as quem pode negar ao Senhor o direito de o
conceder a certas a lm as priv ileg iadas como foi, sem
d úv id a a lgum a , a virgem de Luca? O que se mostrasse
escanda lizado , sòmente por ouv ir fa la r nisto, daria prova
dum a com pleta ignorânc ia das leis da Prov idência na
santificação das alm as, e mesmo de fé pouco só lid a .'
C A P Í T U L O V I I I«
P rim e iro contacto cora os Padres Pa&sionistas
— D ific u ld ade s com que tropeça no seio da
sua fam ília — N a benem érita fam ília G ia n n in i
encontra um a segunda m5i — C on trad ições c
hum ilhações que suscita o exame ind iscre to
dos estigmas
— 1800-1000 —
DIVLSHA-SE quão seráfica teria sido a com unhão
de 9 de Junho, depois do m isterioso aconte
cim ento da véspera. Pela prim eira ve r Gem a
apresentava-se ao Salvador com as m ãos e os pés dc
lado a lado atravessados como os seus, e o p róp r io lado
aberto por um a la rga ferida. Q u e sentim entos de g ra
tidão e dê am or! Q u e celestes doçuras a suavizarem a
dor dos estigmas! Q uan tas vezes neste feliz estado não
terá ela repetido com tòda a efusão .da sua a lm a : « O meu
Bem-Amado é para mim e eu sou para Êle. Estou verda
deiramente crucificada com Jesus. V ivo. mas n ão sou eu.
c Jesus que vive em mim».
E ntre tan to a hum ilde virgem n ão tardou em experi
m entar um a verdade ira perplexidade com a lem brança de
ter que dar conta d a operação d iv ina ao seu confessor,
a quem na véspera tinha av isado do seu pressentimento
sõbre a im inênc ia dum a graça extraord inária .
Reservada em extremo quando a necessidade a obri-
102 S A N T A G E M A G A L G A N I ,
>
gava a fa lar dc si, e além disso não se ab rindo senão
com um a grande repugnância , e rubor a té , como iria ela
desvendar um favor tão insólito , tão m isterioso? «Que
pensará o meu confessor, d iz ia a si mesma, ao ouvir a
narração dêste favor celeste, é/e que conhece perfeita
mente quanto sou ind igna? E se chegasse a divulgar-se.
como todos me conhecem cheia de pecados, não me tor
narei eu antes pedra de escândalo?» --
A estes sentimentos de hum ildade acrescia talvez,
para ag ravar a repugnância da santa, a fa lta de cora
gem . ou uma tentação do demónio.
O facto é que o A n jo da G ua rda instou com ela
m u itas vezes para que se vencesse, e com vivas repreen
sões. T o d o o mês dc Junho sc passou nesta perplexidade,
setn que Gema pudesse resolver-se a cum prir o seu
dever. M a s o m isericordioso Salvador veiu em seu auxi
lio. encam inhando-a por sua adm irável prov idência na
v ia traçada por seus eternos desígnios.
Estava-se no ano dc 1899. Por ordem de Leão xiil.
dev iam prègar-se missões cm tôdas as c idades da Itália ,
para afervorar os fiéis por ocasião do jub ileu que come
m orava o final do século x ix e o coméço d o século xx.
O s Padres Passionistas foram enviados pelos fins dc
Ju n h o à igreja catedral de Luca, onde os seus trabalhos
apostó licos produziram frutos extraordinários de sal
vação .
G em a segui3 então num a outra ig re ja as pregações
d o mês d o Sagrado C oração .
N o coméço de Ju lho , m ovida por um im pu lso div ino,
correu aos exercícios da m issão na catedral. Q u a l não foi
a sua a legria ao reconhecer no háb ito dos m issionários o
ir.esmo que trazia em suas aparições S . G abrie l, seu que
rido protector?! c<4 im pressão*/o i tal. d iz ela. que não
pode descrevec-se. A primeira vez que vi estes Padres,
senti-me possuida por èles dum afecto especial c não
perdi uma só das suas pregações* ( l ) .
N ão se estranhe que a jovem , cuja v ida inteira se
tinha passado cm Luca or.de cs Padres Passionistaa
v inham muitas vezes exercer o santo ministério, não
conhecesse a inda de vista nenhum dêles, tan to mais
que a poucos quilóm etros da cidade se eleva um dos
(1) P ijjíO r t iiía i assim se chamam os religiosos da Coagre-
çjçSo de Clérigos Descalços da Santíssima Cruz e Paixão de N . S.
Jesus Cristo, fundada em Itália por Sáo Paulo da Crus em 1735
e aprovada pelos Pontífices Bento xiv (1746). Clemente xtv (1769).
Pio vi (17/5> e P io v« ( 1S01). O r.ome é Justificado por u a 4.*
voto especial que fazem os seus membros de promover a devoçJo
e memória da PaixSo c Morte de Jesus Cristo. Tém por escudo,
pregado ao próprio hábito, ura coraçáo encimado por uma crus e
teado r.o centro, sôbre fundo negro, a legend» leni Xpi Pãszio. e na
parte Inferior trés cravos. O coraçSo é clrrur.dado per um ramo de
palma e cutro de oliveira entrelaçados.
A Congregação, em 2 séculos de existência, propagou-se por
quási todos os países do véiho e novo mundo. Em Espanha muitos
de seus filhos, nos calamitosos anos q u í acabam de decorrer, glo
rificaram a Deus com um heróico raartirio. D u a s foram as vitimas
imoladas em 1934 duraate a RevoluçSo das Astúriaj e cérca de
30 os que em 1936. duraate o domfrJo do* comunistas ateus, de ran -
o sangue generoso e a vida por Jesus Cristo.
A perseguição religiosa, que á naçío vlricha trouxera o
advento da 2.* República, já antes obrigar» algvms dé«es benemé
ritos relJgiosos a refugiarem-se em Portugal, oede actualmente
desenvolvem o seu zélo apostólico, por melo de missóes rurais,
depois dc fundarem entre nós duas residências, uma em Braga, outra
em Barrosetas. província do M inho. (Nota do Revisor 1.
104 S A N T A G E M A G A L G A 'V /
seus conventos, muito freqüentado pelos habitantes de
Luca. é que a v ida muito retirada da serva de Deus e
a sua singular m ortificação afastava-a de tõda a curio
sidade, mesmo da mais inocente.
O uçám os a angélica Gem a continuar a narração do
seu primeiro encontro com os Passionistas:
«Estávamos no último dia du santa missão. Todo o
povo se encontrava reiinido na igreja para a comunhão
geral em que tomei parte, misturada com a multidão.
Jesus agradou-se do meu acto. porque se fêz sentir inten
samente à minha alma e me fêz esta pregunta: G em a
agrada-te o h áb ito de que éste padre está vestido? E in
dicava-me um Passionista próximo de mim.
«Nenhum a palavra me vinha par a responder a Je
sus. O meu coração porém melhor que os lábios, falava
por meio das suas palpitações.
«G ostarias , continuou Jesus, de vestir tam bém èste
mesmo hábito?
«M eu D eus! exclamei...
* E acrescentou: Serás um a filha da m inha Pa ixáo
e um a filh a predilecta. U m dêsses será teu pai. V a i e
revela tudo».
Gem a tomou à letra estas palavras, susceptíveis
contudo dum a dup la interpretação; e a lembrança de
vestir um dia a libré da Paixão inundou sua alm a da
mais doce alegria. A o mesmo tempo, tôda a repugnância
era se abrir tinha desaparecido.
Para obedecer sem dem ora à ordem do Salvador
correu a lançar-se aos pés dum dos m issionários, o
P.* C ae tano do M en ino Jesus, e descobriu-lhe com in
teira liberdade os seus mais íntimos segredos. Depois
C A P t T l l L O V I 1 1 105
falou-lhe dos estigmas c da d ificu ldade que sentia em
os descobrir ao seu confessor.
M arav ilhado dc tais confidências, não menos que
da ingenuidade da confidente, o Padre animou-a e exor
tou-a a conscrvar-se hum ilde e reconhecida pelos bene-
ficios divinos. M as. antes de se pronunciar sôbre a ori-
L u c a — j V / o s r c i r o d à s V i s i f n n d i r u 15 .
106 S A N T A G Ç t y A G A L G A N I
gem dos factos extraordinários subm etidos ao seu juízo,
declarou querer reflectir m aduramente.
Prometendo-lhe ayv^Ja de novo sôbre este assunto
logo que voltasse a L j j£ u .o prudente religioso impôs-
-lhe a ordem form al <^,ijcvelar tudo ao seu confessor
ord inário . ^ ,
H ã muito tempo que a pobre m enina, convencida de
ter sido chamada por Jesus à v ida religiosa entre as F i
lhas de S . Paulo da C »uz. desejava fazer, por devoção
particu lar, voto dc po& eza, castidade e obediência. Ju l
gou pois propicio o nttféknto de obter êste favor dum
m issionário passion ist^V ' -}-
O P.* Caetano coj&edeú-lho. m as por pouco tempo,
c com a condição de rif> renovar êsses votos sem o con
sentimento do confesâw’ ord inário . Mostrou-se. porém,
pouco conde scenden te ^ respeito dos instrumentos de
penitência fabricados pclá jovem com o fim de macerar •
a carne. Proíbiu-lhoskeonvencido de que o confessor
o rd inário não teria pç& edido dc m odo diferente.
Com quc alegria « fe rv o ro sa m enina se não ligou a
primeira vez pelos trêJ^o toS Í E la mesmo no-lo vai dizer:
*«£fu tinha tido sempre gràndç desejo de os fazer; apro
veitei a ocasião. O Padre fêz-mos pronunciar a cinco dc
Junho; deviam durar eié à solene festa de oito de Setem
bro. F iquei muito co> (finfe;' foi mesmo uma das minhas
■maiores consolações>
. . Ju lgará talvez o'
franca com o seu con
.não .estava em condi ■
quemo-nos: •
M ons . V o lp i cxercia.um m in istério muito laborioso
tór.vque G e m a não foi bastante
if-ordinário. N a d a disso. G em a
e ag ir .d e ou tro modo. Expli-
C A P I T U L O V I I I 107
. > • .
cm condições difíceis. A lém dos multíplices cuidados do
seu cargo (1) c das absorventes obras dc zélo, tinha
recorrido à sua d irecção espiritual tal número dc almas
que lhe era impossível ocupar-se dc tôdas.
O seu confessionário , onde passava todos os dias
m uitas horas, via-sc literalmente ccrcado. Em bora não
repelisse nenhum penitente que lhe parecesse ter real
necessidade do seu m inistério, muitos todavia podiam
desejar mais tempo do que as circunstâncias permitiam
conceder-lhes.
Para almas, com o G em a, conduzidas pelos cam i
nhos extraordinários d a graça d iv ina, esta pressa tem os
seus inconvenientes. A pobre menina sofria em silêncio.
M u itas vezes, na im possib ilidade dc sc aproximar de
M ons. V o lp i, pedia-lhe por escrito um a regra de conduta
a-propósito de a lgum a graça recebida ou dc qualquer
d ificu ldade: a resposta nunca era dada senão a seu
tempo no .confessionário, onde a necessidade de sc não
demorar, mal se conform ava com as suas precições.
É evidente que isto n ão bastava para a direcção desta
alma.
A lém disso, logo que voltou a Luca. o P.* Caetano,
dc acôrdo com a santa , resolveu cncarregar-sc élc mesmo
dc manifestar a M o ns . V o lp i as últim as operações da
graça, de que G em a fora favorecida.
O m issionário foi ter com Sua Ex.4 Rev.m\ seguido
logo depois por G em a que lhe abriu inteiramente o seu
coração.
(1) Mor.s. Volpi exercia entio as funções de coadjutor do
Arcebispo dc Luca.
S A N T A G E M A G A L G A N I< '
O Pre lado reccbcu-os a am bos com afab ilidade e
g rande benevolência. A provou a obra do confessor
ex traord inário ; mas a respeito dos estigm as, levado pela
responsabilidade que tinha d iante de D e u s e d iante dos
hom ens, com o confessor e como bispo, n ão ousou pro-
nundac-se sôbre a sua origem . «Q u e se dirá . pensava êle,
dum / acto tão insólito neste século incrédulo?»
P o ; um lado tem ia para a sua pen itente as conse
qüências lastim osas sofridas por outras pessoas por
causa de sem elhantes factos extraord inários, em que n ão
se reconheceu depois a in tervenção d iv ina .
Por outro lado. perfeitamente convencido da c a n
du ra de G em a . da beleza de sua a lm a, da p ro fund idade
ce sua v irtude que nunca tinha s ido a tin g id a peio m enor
desfalecim ento, d o seu ardente am or dc Deus. c das
com piacências do Senhor para com ela, repugnava-lhe
supô-la v itim a da ilusão, dum a doença, ou da m alícia
de Satanás .
A-pesar-disso, n ão queria de m odo a lgum , sem p ro
vas convincentes, pronunciar-se a favor de qua lquer
in tervenção sobrenatural. S egundo o conselho do E sp i
rito S an to : <Nolite ornni spiritid credere, omnia autem
probate», resolveu estudar m aduram en te o fenóm eno.
E n tre tan to , em v irtude de c ircunstâncias diversas c
por causa destas manifestações m ísticas, a v id a da don-
zcia no sc;'o da sua fam ília era das mais penosas, sobre
tudo depois da partida de seu irm ão H e ito r para o ser
viço n ::ita r , e de seu outro irm ão , G u id o , para a A m érica .
O b r ig a d a a sujeitar-se a ocupáções, pouco ou n ad a
era harm on ia com os seus gostos de v id a interior, sofria
C A P I T U L O V' / / / 109
>
por nao poder à sua vontade pcxmaccccr no quarto
a-fim- de se entregar à oração ou a um trabalho soli
tário.
Aconteceu um a vez ter certa pessoa d a fam iüa . no
ardor dum a a ltercação , proferido palavras irreverentes
contra a M a je s tad e d iv in a . T an ta foi a do r de G em a
que o sangue transudou de todo o seu corpo , cc rrcndc
a té â terra. In ú t il lhe fo i procurar encobrir este facto
prod;gioso.
H av ia a lgum tem po já quc os seus. tendo obser
v ad o r.ela coisas novas e misteriosas, p re g u n ta v a a entre
si com ccrta in qu ie tação : Q u c será isto? C ertos e itos,
v indos de fora tin ham con tr ibu ído para lhes desperta- a
atenção , sobre tudo na tia C avo lina , a quem a c ând id a
donze la revelara a im pressão dos estigmas.
U m a cena v io lenta seguiu o ú ltim o fenóm eno d o
suor de S3ngue.
D êm os a G em a a pa lav ra : «jEx .™ Senhor, escreveu
a seu confessor, quereis saber o que ontem me [êz i:ma
das minhas tias? Q u a n d o entrei no qvarto aprcximou-sc
de mim muito enco/eriracía c disse-me: <Esta noite n ã o
tens tua irm ã Ju lia para te defender.. M ostra-m e donde
saiu todo êsse sangue , scr.ão acabo contigo à fórça de
pancadas».
«Ca/ewne. E n tão agarrando-me com uma das m ãos
pelo pescoço, com a outra quis-me tirar os vestidos. N o
mesmo instante bateram à porta e retirou-se.
M as não tinha acabado a inda: à hora dc deitar vo l
tou e disse-me quc era tempo de acabar com éstes f in g i
mentos c que eu jà tinha espantado demais o povo. O uve .
continuou, se me n ã o dizes conde saiu ésse sangue.
110 S A N T A G E M A G A L G A N I(
nunca mais te deixo sair de casa sem com panh ia , e nunca
m ais te m ando a nenhum a p a r to .
<! m aginai a nunna a c r (1 ), A tais pa/auras pus-me
a cnorar, n áo sabendo que fazec. Em fim decidi-me a sa-
lisfazer minha tia. S ão as b lasfêm ias, respondi; q uando
ouço b lasfem ar vejo a Jesus sofrer m u ito c so fro com
É Ic; sofro no co ração e o sangue sai. Encão pareceu
sossegar um pouco e deixou-me tranqüila».
N ã o foi esta a única vez que a santa donze la teve
que sofrer por parte dos seus. que não com preend iam as
obras m aravilhosas da graça. N ã o podendo a ou tra sua
tia. a boa H e lena, de saúde delicada, acom panhá- la sem
pre ã igreja, C avo lm a não queria deixá-la ir só.
U rna curiosidade indiscreta de a lguns membros da
fam ília v inha a afligi- la mais a inda.
Q u a n d o se retirava ao quarto , espiavam-na espe
rando ver produzir-se nela a ígum facto ex traord inário .
Se a surpreend iam em êxtase, com unicavam entre si as
suas impressões, mais ou menos favoráveis, e corriam a
conv idar pessoas am igas para este desusado especcáculo.
A pobre m enina lamentava-se disto ao seu confes
sor e mesmo a Jesus, dc quem tinha 'receb ido a recom en
dação de subtra ir tudo a oihos profanos.
O D iv in o M estre ouv iu as queixas de sua fiel serva.
V iv ia então e vive a inda na c idade de Luca um a
dessas fam ílias patriarcais, para quem o temor de D eus
e as v irtudes cristãs constituem o princ ipa l tesouro. Com-
í 1) F.ra o rcccio cJe qut a tia nSo mais a autorizasse a Ir à
xr.issa c comungar.
C A P I T U L O V I I I 111
* i
põe-se de pai, m ãi. dum a irm ã e doze filhos* Seu nome
é tão querido a todos os seus concidadãos quanto é
grande a estima de que estão cercados. É a fam:I:a do
Senhor M ateus G ia n n in i. Semfeitora dos hum ildes íiihcs
de S . P au lo da C ru z , c ã hospitalidade aos que o exer-
cicio do m inistério apostólico obriga freqüentemente a
passar por I.uca.
A referida irm ã. Cecilia G iann in i. é senhora de
grande p iedade, totalmente dedicada a obras dc :c lo .
Som ente conhecia G em a de vista.
O P.* C ae tano talou-lhc nela loco que voltou a
Luca e. querendo cum prir a promessa de tornar a ver a
santa , pediu k boa senhora que a fõsse procurar. Esta .
desejando relacionar-se com uma alma tão privilegiada,
não se fêz rogada. De-pressa a descobriu; trouxc-3 para
sua casa e em breve se felicitou por ter encontrado um
tesouro.
A ausência da fam ília G iann in i. que tinha ido
durante èste mês de A gósto para a estância balnear de
V iaregg io , perm itiu-lhe convidar a santa donrela a vir
passar todos cs d ias algum as horas com ela. Dentro em
breve, pretextando a sua solidão, quis tê-la consigo tam
bém de noite.
A tendendo à bem reconhecida honradez da fam ilia,
perm itiram a Gem a satisfazê-la também neste ponte, a
princípio de tem pos a tempos, depois quási hab itua l
mente. Fo i um a alegria para a santa rnenina.
N esta hab itação de santos, em que nada pertur
bava a sua un ião com Deus, respirava eía um ar mais
puro; e ju n to dc D . Ceciüa. cuja caridade sólida e m ás
cula v irtude, a tinham impressionado, sua alm a dilata-
X
• •112 S A N T A G E M A G A L G A N I
va-sc à vontade, em quanto que o seu coração pressentia
nela um a segunda mãi.
P e r seu lado a excelente senhora, cada vez mais
encan tada com a rara bondade, sim plic idade in fan til, e
s in gu la r modéstia dc G em a, tinha por ela um vivo afecto.
Experim entou , logo no principio , um a certa perp lex idade
em face dos fenóm enos maravilhosos que se verificaram
r.esca sua am iga. Para melhor se inte irar cêles não dei
xou um m om ento de o observar, ce a espiar, a té nos
m enores movimentos.
G em a , por certo rcca'.o natural, e não m enos pcc
h um ild ade , em pregava tôda a sua indústr ia pa ra os sub-
trair à in tu ição de sua bca am iga. Julgando-se p ro fu n
dam ente ind igna dos favores d iv inos, tem ia tornar-se
um ob jecto de escândalo para a sua protectora no dia
em que esta viesse a descobri-los.
O Senhor, porém , cueria manifestar, para g ló r ia sua
e bem das alm as, os dons da ycaça; e tôda a c ircuns
pecção da sua serva de nada servia.
E is como ela conta ao confessor um a dessas c ir
cunstâncias em que as suas precauções mais ponderadas
foram inúteis e que ela mesma cham a suas desventuras:
cO ntem Jesus /éz-me sofrer muito. Sue i sangue
tedo o d ia: não estava em minha casa. mas em casa de
D . Cecilia. Jesus recomenda-me continuamente que nada
deixe suspeitar: se eu fa lto a isso, castiga-me. Diz-me
repefiefas rezes que devo tec vergonha de me deixar ver.
sejã por quem fôr. porque a minha alm a está cheia de
imperfeições*. \
D . Cecília, para n ão contristar a serva de Deus,
n enhum a adm iração manifestava perante factos tão pro-
c A P ! T U L Q V I I I 113e
dig iosos. Qemdizia ao Senhor, redobrando de veneração
e de am or para com o sua hóspeda . <Vtc-a Jesus! d iz ia
D. C iz ilia Giannini o bondosa Scnhcra q-~c foi /t
2.' er.ji ria Santa •: confrJcnfc r ij sva i ’>da núilica
ela. temos cn; casa um anjo. Corr.o corresponder a tão
grande graça?*
Entre tan to , depois do P.* C ae tano , o P .e Pedro
Pauto, en tão provincial des P ass ion isus . e depois arce-
114 S A N T A G E M A G A L G A N I
i
b ispo de Cam erm o, M o n s . M oresch in i. teve ocasião dc
verificar, a 29 cie A gosto de 1899, n3 casa dos G iann in i,
o fenóm eno dos estigmas. C om o notei no cap itu lo sétimo,
fo i a ún ica vez que a estig m atiz ação. se p roduz iu fora dos
c ia s habitua is da qu in ta e scxt3-fei'ra.
C edam os a pa lavra à em inente te s tem unha :'
* Eu tinha, d iz cie, ouvido contar acerca da jovem
coisas maravilhosas. Suspeitar,do que fossem puras ilu '
sões, assaz freqüentes no seu sexo. formei o projecto dc
me inteirar bem de tudo por mini mesmo.
* Dirigi-me pois para casa da fam ilia G iann in i. Era
um a terça-feira. Depcis 'de a ter visto senti-me inspirado
a pedir a Deus algum sinai palpável da origem divina
destes factos prodigiosos, e, sem nada d izer a ninguém,
especifiquei dois: um suor ce sangue e a form ação dos
estigmas.
cA hora de vésperas, <t jovejn fo i só para diante do
grande crucifixo da sala dc jan ta r a-fim-de fazer as suas
orações costumadas. M inu to s depois, abri a porta e vi-a
cm êxtase, transfigurada per com pkto. Embora abis
m ada cm uma dor imensa, parecia verdadeiramente um
an jo . ■
<AprOximci-me: do rosto, da cabeça, dás mãos c
sem dúvida de tôdas as partes do corpo, corria um san
gue vermelho que sc dcssecaoa ar.tcs dc chegar ã terra
e que nãc parara senão depois de meia hora. pouco mais
ou mer.es. Rctirei-me vivamente comovido.
<Saida do êxtase, G e m a disse confidencialmente a
D . Cecilia: O P adre ped iu do is sinais a Jesus, c Jesus
deu-lhe um; dar-lhe-á tam b ém "o outro.
«Q u e sinais serão estes? Sabe i- lo?...
C A P I T U L o ' V I I t 115
t
«Chegada a noite, fo i esta Senhora ter-comigo. o fe
gante de emoção: <Padre, me disse. n ã o seriam os esti
gm as o segundo s ina l que esperáveis?»
<Fiquei fora de m im . c ela continuou: cPregunto-
-vos isto. porque se 6 assim , G em a já cs tem abertos;
v inde ver».
«C o rr i e encontrei esta bendita m enina em êxtase.
Con:o da primeira ce;. suas mãos estacam traspassadas:
traspassadas, afirmo-o, de lado a lado: tinham n a carne
viva uma larga chaga donde o sangue corria cm abun
dância. O comovente espectáculo durou cinco minutos.
A q u i :az o venerando p re lado u a ia descrição m in u
ciosa que om ito por concordar perfe itam ente com a que
atrás íicou já feita.
«N o fim do êxtase o de rram a m ento de sangue ces
sou. as feridas fecharam, a pele rasgada retomou subita
mente o estado prim itivo, e. logo que a serva de Deus
laveu as mãos. nenhum vestígio do fenóm eno se notou.
<Jesus tinha-se d ignado ouvir a m inha prece. D a n
do-lhe i 'ã ’as acfõcs de graças, abandonei tóda a dúvida
desfavorável, firmemente convencido de que estava ali
o dedo de Deus*.
Esta narração , env iada pelo au tor q M o ns . V o ip i a
3 de Setembro dc 1S99, term inava pelas seguintes p a la
vras: * V i corn os m eus próprios olhos as chagas das
mãos. tanto as das cosias com o as da face palmar, e eram
verdadeiras feridas. N o fim do êxtase tinham-se fechado
íòdas. ficando somente as cicatrizes. O ra , como e posst-
vel que uma chaga se feche assim naturalmente? Q uan to
a mini reconheço a í a acção d iv ina*.
Por seu lado o Padce C ae tano tin h a subscrito a
declaração seguinte: *H u ; abaixo assinado, atesto ter
visto no mês dc Ju lho do ano de 1899, nas mãos da
jovem Gema Galgani. certas chagas que nada tinham de
comum com as que SC observam ordinàriam ente nu natu
reza. Via-se na parte inferior exactamente nas palmas,
como que um bocado de carne salier.te semelhante A
cabeça de um prego, com a superfície de um sôldo (1 ).
jNas ccstas de ambas as mãos aparecia uma abertura um
pouco profunda. O que faltava de carne dava a impres
são dc ter sido levado por um prego rombo quc se tivesse
enterrado pela palma.
*N ão hesito em itir a opinião, conform e à da teste
munha ocular que mc acompanhou, de q ue a origem dês-
tes estigmas de m odo algv.m podia atribuir-se a uma
causa natural; porque, tendo observado as mãos da jo
vem na quinta-feira â tarde, não notámos s inal de nada;
r.a sexta-feira de m anhã apresentavam o estado descrito,
e no sábado apenas uma pequena cicatriz avermelhada
se notavav.
T ais testemunhas fizerarr. sentir m ais a M ens . V c lp i
a dc licacera do sua posição. Ju lg ando obrigação sua
procede: corn extrema reserva, resolveu, depo is de m a
du ra de liberate ), tentar um a experiência quc supunha
ser decisiva. Sem nada dizer à santa donze la , pediu a um
. m éc ico de confiança, tão piedoso ccrr.o sáb io , o favor
dc verificar e estudar o fenómeno.
G em a conta na sua auto-biografia com o o Senhor
316 S A N T A G E M A C A L G A N J
t 1) Moeda de 5 cíntimcs da lira de cccSo. cujo deâmeCro é
ser.slvdnrnte igual oo da ROvsa rr.otda hodierna de 20 centavos.
(N ota do Revisor).
C A P I T U L O . V 1 I I 117
«
a in form ou dèste projecto . <fvionscr.hor, d iz ela. ju lgou
que era bem fazer-me visitar por um m éd ico sem eu o
saber; mas fu i avisada pelo peôpcio Jesus que mc disse:
«D ize «o confessor que cm presença d o m éd ico n áo
farei n ad a do que êle dese ja». Por ordem de Jesus
adverti o confesso:».
Com efeito G em a escreveu a Sua Ex.* Rcv.mJ:
«Onfe.Ti à noite Jesus dirigiu-me estas palavras: Deves
dizer ao teu confessor que, se êle quere um sinal de mim.
lho darei e à sua escclha. contar,:o que esteja só. Q ue
sossegue: hão há doença como suposeram*.
Q u e resolução de fin itiva iria tom ar S ua Ex.*
Rev.n,‘ ? Fiar-se na sua própria observação? M a s assim
a responsabilidade que êle queria evitar cabia-lhe por
completo: e se êle suspeitava que estes factos singulares
eram o resultado de um a dcença ou. d içâm o-lo , de auto-
-sugestáo. ccmo ê que. só por suas lures e sem compe
tência médica, poderia d iss ipar as dúvidas?
M anteve pois a sua decisão c in form ou disso a
D . Cecília que o conservava ao corrente dos menores
incidentes relativos à piedosa jovem . O exame médico
foi marcado para sexta-feira. 8 de Setembro de 1899.
festa da N ativ id ade dc N ossa Senhora.
Nesse dia. peias 10 horas da m anhã. G em a . retirada
no seu quarto , entrou em êxtase. Pelas I I horas retomou
os sentidos e escreveu a M onsenhor, dizendo-lhe que
pocia vir, mas só. sem o. quê jesus. descontente, naca
ihe daria a ver. <Entretanto, acrescentou cia, fa :e i como
bem vos parecer: de qualquer modo ficarei contente».
Entregou o bilhete a D . Cecilia ; e esta. depois dc *IT
o ler. apressou-se a cnv:5-Io ao seu destino.
118 S A N T A G E M A G A L G A N l
> ' .
À uma hora da tarde G em a , de novo no seu quarto ,
• to rnou a cair em êxtase. D . C ecília , que n ão ta rdou a ir
ter com ela. v iu o sangue correr-lhe da fronte e das m ãos
«bertas, m arcadas ccra os estigm as. V ie ram contemplá-la
neste estado, com religioso respeito, o cava lhe iro M ateus
G ia n n in i. que tinha checado das águas, sua espôsa Jus-
tina e a lguns outros m em bros da fam ília . • •
Pelas duas horas, M o n s . V o lp i e o m édico foram
• an u nc iad o s ' D . C ecília correu ao seu encontro: «V inde ,
-vinde, lhes disse, rad ian te de a legria , estamos no mo
mento m ais òe ío»; e in troduziu-os no qua rto onde a inda
se encontravam as pessoas já m enc ionadas. O m édico
tom a um pano, molha-o em ág u a e lim pa as m ãos e a
fronte da jovem em êxtase. Sub itam en te o sangue pára
e*a pele aparece sem chaga , sem a m enor arranhadura
• ou p icadela . Imagine-se a estupefacção e o desaponta-
. o e n to de tedos os espectadores. O médico. ier.do ficado
-<5f> com D . Cecilia , qu is exam inar tam bém os pés e o
c.oração, mas nada descobriu de ano rm al.
D ês íe m odo o Senhor, cu jos desígnios são muitas
veres im penetráveis para nós. co n fund ia a ciência h u
m ana . náo lhe perm itindo verificar um facto ce orcem
sobrenatura l. G em a diz-nos na sua au to-bioçrafia com
sim p lic idade ingénua : « O confesser procedeu a seu
77:0do . mas as coisas passaram-se como Jesus tinha
ar.unciadc-t.
: E nessa mesma tarde escrevia ao Pre lado: «Se tivés
seis vindo sd, Jesus ter-oos-ia persuadido bem».
O êxtase tinha d u rad o tçdo o tem po d o examê.
' P or isso G em a nada advertiu . Recuperando porém os
sentidos, notou certa m udança nas pessoas que a cerca-
C A P I T U L O V I I 1 m
vam , vendo-as desconcertadas, m ortificadas. co n fun
d idas .
D . C cc ilia pa ra a d istrair, e a fas tar dèste meio Lccó-
m odo . propôs-lhe q u e saísse. N o cam inho diz-ihe G em a:
*Conduzis-me a Jesus? 7'enho necessidade de Jesus*.
À p iedosa Senhora concordou em a acom panhar à igre ja
de S . S im ão , bastan te a fa s tada . A visita ao Santíssim o
Sacram en to prolongou-se cêrca de um a hora.
A o sair da ig re ja a san ía m enina disse à sua pro
tectora: <Eu queria comunicar-vos uma coisa, mas sinto
r.isso m uita vergonha». A n im a d a a fa lar, m ostrou as
m ãos d o nde o sangue corria. D . Cecilia teve a iem brança
ce as fazer ver neste estado a M o ns . V o lp i, e encarre
gou um a pessoa de con fiança de lhe conduz ir Gem a.
O P re lado pôde verificar com seus próprios olhos,
não o sangue, é ve rdade , mas a pequena ferida donde
tinha corrico . N e n h u m a adm iração m anifestou com re
ceio de expor a dor.ze la o qualquer perigo dc vaidade,
mas. depo is dum a s im p les observaçao das mãos, apres
sou-se a m andá- la em bora.
O Senhor em sua m isericórd ia, atenuava assim c.
h um ilh ação da sua serva, levan tando um pouco a cora
gem de seu m in istro e das o u tra i testemunhas do in ú t il e
desairoso exame m éd ico .
t1 \—i ' —J 1 j\.
• * .• ■ • * — . * «I. • % - .»
i • • -
•
Jesus acode em favor de Gema humilhada —
Novas intervenções que comprovam a vera
cidade da estigmatização— Portentosos fenó
menos místicos (suor de sangue, flagelação,
coroação de espinhos, agonia mortal)
— 18Q9-S000 —
a lg u m a s ve zes D e u s a f l ig e os seus se rvos , n ã o
os a b a n d o n a n u n c a . À P ro v id ê n c ia , sem pre
a d m ir á v e l err. seus c a m in h o s , s ab e c o n so
lá- los e de fe ndê- lo s n o s casos m a is d e se spe rad o s . G e m a ,
n ó s o verem os, :a d e c a ir m u ito n a o p in iã o d e a lg u n s
ce po is d o ex am e m é d ic o e. h u m a n a m e n te f a la n d o , n ã o
pod e r ia m a is le v an ta r- se . M a s n e la se r e a liz a r ã o as
p a la v ra s d o E c le s iá s t ic o : F ac ile est in ocu lis D c : sub ito
h o n e s ta ce p a u p e r e m .
D e- fac to , a v ir tu o s a m e n in a escreve n a su a auto-
- b iog ra fia : « D e sd e o d ia d a visita d o m ed ico com eçou
para m im um a v id a n o v a * . T eve um a v id a de in t im o
so fr im e n to . N ã o só o s m em b ros d3 fa m ília G ia n n in i ,
m as a té o p r ó p r io c o n fe s s o r conse rv avam su a s d ú v id a s
in q u ie ta d o ra s , e ês te ú l t im o , a-pesar-da v e r if ic a ç ã o pes
so a l dos e s t ig m as . « O confessor , d iz G e m a . d e novo me
p ro ib iu tôdas as cc isas ex trao rd in árias da q u in ta e sex ta-
122 S A N T A G E M A G A L G A N I
voltou como era costume, e até com mais intensidade que
antes».♦
À serva de D eus. posta por Jesus ao corrente das
incertezas de seu pai esp iritual, afliçia-se por êle.
Pessoalmente alegrava-se com esta hum ilhação
<a mais bela. são pa lavras suas. que me deu o meu
amado Jesus». Mas, n ão pod ia deixar de se compadecer
do estado de alma dc quem desde a sua ir.fânc ia am ava
c venerava como-pai. A lém disso era ag itada pelo temor
de perder éste bom gu ia . seu ún ico sustentácu lo nas con
tinuas provas . A b ando nada por êle. a quem havia de
recorrer ?
O S enho r veiu em aux ilio de sua serva nestes m o
mentos de prostração. * M in h a filha, lhe disse, em tôdas
as tuas incertezas, nas tuas aflições, n a adversidade,
lembra-te menos dos outros qite de m im ; procura mais
em mim que nêles aiiu io e conforto». P or outros tênnos,
por m ais ju s ta e ra :o áve l que íôsse a sua afe ição ao
m in istro sagrado, por m ais santa que fòsse' a sua con
fiança nêle. r.ão devia lamentar-se, a in d a que viesse a
perdê-lo sem culpa sua: ficar-lhe-ia Jesus, r.ão necessi
tava dc mais.
G e m a com preenceu estas pa lavras d iv in as que res-
ü tu ír a m im ediatam ente a paz ao seu coração aflito , aca
bando de o despo ja : de todo o sentim ento hum ano.
O seu abandono a D eus tornou-se completo: e como
eram som ente os p rinc ip ies da v irtude que inspiravam
•as menores particu laridades da sua condu ta , os receios
de que o bom Pre lado tivesse conceb ido a seu respeito
ideas desfavoráveis cm n a d a ’d im inu ir iam a sua con
fiança nêle . . • . ■ ‘ : .
* * * 5 A /V / A & t> M A ( J A L G A S Ir
r. E m m uitas das suas cartas, d ir ig idas ao próprio
M o n se n h o r V o lp i e a outras pessoas in tim as, declara ela
que ped ia constantemente a Jesus o ilum inasse e conso-=
lasse; A t é r.os colóquios de seus êxtases, n o meio das
expansões da sua alma cansada e do lo rida , a lembrança
d o confessor apresentava-sc muitas vezes ao seu espí
rito . « Ó Jesus, ide consolar M onsenhor que é muito infe
liz . U m ju lga uma coisa, outro ju lga outra. M as prefe- *
ris V ós que assim seja? Agora que todos me chamam
louca tendes-me mais am or que r.o tempo em que me ju l
gavam santa? O h ! Agora, r.ão é verdade?*
O s escritos, que só a fòrça da obed iênc ia conse
g u ira a rrancar à hum ildade de G em a . projectava Sua
E x .J R cv .',,■, subcncte-los a outro r;iéd:cc. M as a santa
cle-pressa soube, por meio do seu d iv ino Espõso. do pro
jecto cio confessor. Eis com que c ând id a sim plicidade
exp rim ia o seu descontentam ento num cos êxtases:
<Ó Jesus, querem mostrar os escri:os ate ao c/ou/or?
Q u e isto não sconteça. Ó Jesus. mcteni-Vo$ a ridí
culo. S e quiserem ler os escritos que não vejam mzis
do que pape l em branco. !de, Jesus, ide ter com Mor\se
nhor e tranqi':izai-o. consolai-o
A lg u m a s vezes julgou-se ela ab ando nad a do Pre
lado . o q u a l. em virtude de suas ausências e ocupaçòes
absorventes , ou simplesmente para se aux ilia r com as
lu zes de entrem , a m andava umas vezes a um confessor,
o u tras a outro. •
M a s nem poc isso deixou de lhe coijnervar tôda a
sua a fe i;ã o e de continuar até à 'm o rte a confessar-se'.a
êle. n ã o cessando de o venerar como a uin pai. O h !
q u a n to nos não ensina a adm irável condu ta de Gem a
\ . ' C A P Í T U L O - í X 125
no meio d c tantas provas! E como são verdadeiras as
palavras dc Jesus à sua serva: Sofrendo aprende-se a
amar. -
N este mesmo iv.c.s de Setem bro dc 1S99, motivos
dc saúde levaram a Luca o P .* C aetano . Sabendo o
resultado d o exame m édico e a sua in fluênc ia desfavo
rável sôbre o espírilo dc M o n s . V o lp i. êle mesmo sentiu
m uito a b a lad a a su3 prim itiva convicção, O Senhor,
poréir., d ig non-sc seguir a seu respeito o mesmo processo
que seguiu para com o apósto lo S . Tom é. «M e ie aqu i o
dedo. considera as m inhas n ão s . e n ão sejas ir.crcdulo
mas fie!».
D u ran te os dois meses da sua residência na cidade
o P .c C ae tano v iu ce novo e à vontade o ‘ fenóm eno da
estigm aíiraçào . observou, ap a lpou e de-pressa lhe desa
pareceram as dúv idas.
N u m a carta a M ens . V o lp i apressava-se a a n u n
ciar çuc . tendo procurado repetir a experiência do me-
cicp. fizera lavar por três ou quatro veres as chagas das
mãos. de aparência p ro funda . F.stas não desapareceram
e o sangue, de tido por um instante , outras tantas vezes
tornava a brotar.
O R cv . P.® Pedro Pau lo , a quem as funçòes dc
P rov inc ia l trariam freqüentem ente a Luca, M ateus
G ia n n in i. sua esposa, seu filho mais vê lho c especial
mente sua irm ã Cecília. Iodos pessoas m uito honradas e
abso lu tam ente d ignas dc crédito, tiveram muitíssimos
veres ocas ião dc verificar por espaço de ano e meio.
tan to depo is como anlcs da visita do médico, os estigmas
e os ou tros sinais da Paixão de que se tratará no fim
J r . * . ------
“ * \ * . - t •. •
J2b S A S T A G E M A G A L G A N I
O testemunhe do P.* Pedro Pau lo é particu larm ente
au torizado . Sua doutrina, seu 2 êlo e sua prudência no
governo, no ministério apostólico e na d irecção das alm as
são conhecidos c apreciados em Itá lia . Depo is que exer
ceu per algurr. tempo o cargo de Superior G era l da C o n
gregação dos Passionistas. o 'S a n to Padre P io x con-
fiou-lhe a visita apostólica de des dioceses im portantes
c acabou por elevá-lo à cadeira arquiep iscopal de C a
in erino.
A os testemunhos precedentes seja-me perm itido
ju n ta : o meu. porque tive tôdas 'as fac ilidades de veri
ficar e exam inar rigorosamente os factos prodigiosos que
aprouve a Deus operar em sua serva.
Tem os, ê vercade. relativamente aos estigm as,-a
in frutuosa prova do médico, mas o depoim ento de muitos
mem bros da família G iann in i. confirm ando a realidade
das chagas antes do exame, a predição m iraculosa dêste
exame e da sua inutilidade. depois o súb ito desapareci-
ur.ento. sob as mãos dc doutor, das chagas ou feridas na
rea lidade existentis. visto que o sangue corria , consti
tuem um a prova evidente do carácter sobrenatura l do
fenóm eno.
T ud o se passara a fina l como Gem a tinha anunc iado
da parte de Jesus. No coso contrário é que haveria m o
tivo para suspeitar da realidade das suas com un ica
ções com o Salvado: e portanto da origem d iv in a dos
estigm as.
Adm i;err.os aqui as disposições da Providencia-
A san ta m enina nào vivia na so lidão dum claustro
fechado à curiosidade pública, mas « io m eio d o m undo.
À necessidade de ir a casa dos G ian n in i. ou à igreja
)
a-fim-de ouv ir a santa missa, rccebcr a sagrada comu
nh ão e v isitar o Santíssim o Sacramento obrigava-a a sair
•muitas vezes ao dia. S òn e n te algumas pessoas Sr.tLmas
da fam ília G iann in i conheciam os factos extraordiná
rios dc que se trata, c guardavam tão bem o segrêdo que
na reaiidade estes factcs eram ignorados - na cidade
de Luca.
M as o que teria acontecido, se o médico e outros
estranhos tivessem verificado a existência dos estigmas
e de semelhantes sinais maravilhosos? Q uan tas provas e
contraprovas para o futuro ! Q uantos curiosos espreitando
as saídas de Gem a ou a sua chegada à igreja! A hum ilde
virgem tornar-se-ia assunto das conversas de tôda a
cidade e das zombarias dum grande número. O Senhor,
subtra indo aos olhares do m édico e de outros profanos
o prodig ioso fenómeno, hum ilhou a sua serva e conser
vou escondida esta gema preciosa.
D c resto, a prudência, a discreção. a ciência e hon
radez das pessoas oue observaram esíes prodígios, sem
excluir o próprio M ons . V o lp i, podem suprir bem o insu
cesso do exame médico.
A ciência não pode ter a pretenção de explicar o
sobrenatural, deve limitar-se a verificar os factos. O tes
temunho dos sábios não é indispensável para que um
facto seja adm itido . T o d o aquêle que tem mãos para
apalpar e o lhos par3 ver pode atestar a verdade. E como
neste caso o fenómeno, sem ser permanente, sc m an i
festava por diversas vezes, o sábio só poderia afirmar
que no m om ento do seu exame não se produziu . M as.
para o tornar indub itável, deve bastar a palavra de tes
temunhas d ignas de íé que o observaram muitas vezes.
C A P I T U L O I X 127
o n t* J s \ \ j l , n KJ / 1 1* \ j A t i I
O s outros sinais da Paixão de que vou falar peia
ordem cronológica, m encionando apenas alguns, r.ão
fo ram menos severamente verificados r.a serva de
D eus .
O s tan tos favorecidos com os cinco estigmas ao
mesmo tempo são raros. O Espirito sopra cnc/c quere e
com o quere, a ting indo sempre os seus altíssimos fins.
Aprouve-lhe d irig ir dum moco particu lar sôhre a ditosa
G em a a torrente cos seus favores, e torná-la partic i
pan te . n ão só das cinco chagas sim ultâneas co d iv ino
C ruc ificado , mas também ce tedos os suplicios da
Paixão .
O prodigioso suor de sangue. mencionado em sua
narração por M ons . M oreschini e que eu tive já ocasião
de assinalar, foi verificado freqüentemente na angélica
m en ina durante as suas meditações sôbre a agonia no
Jard im das O live iras e sôbre outros mistérios da Paixão .
N ã o aparecia, entretanto, nos êxtases periódicos da
q u in ta e sexta-feira, mas cm outros sim , e. mesmo a lg u
m as vezes, quando esta%-a no uso pleno dos sentidos.
C om prim ido no coração e nas artérias peia veemência da
sua com paixão dolorosa, o sangue saia por todos os
poros, especialmente pelos do lado esquerdo do peito
que encerra o coração, c Gem a ficava literalmente b a
nh ad a cm sangue.
Com que respeito não recolheriam os an jos êste san
gue c o apresentariam ao Senhor, a-fim-de apaziguar a
sua justiça pelos méritos da inocente vitima quc o espa
lhava tão generosamente, a exemplo do div ino S u p li
c iado do C alvário !
C A P f T U ' l O I X m
A o suor ce sang ue d o G etesem an i, seguiu-se pouco
d e p o is a f la g e la ç ão d o R eden to r . A inocente v irg e m de
L u c a , con tem p lava
sem pre êste d o lo
roso m is tério com
u m sen tim en to es
p e c ia l de devoção .
C o n ta n d o um a por
u m a as p ro fu ndas
c h a g a s abertas p e
los a ço u te s no corpo
s a g r a d o d o ceieste
E s p ô so , d iz ia : «7'ò-
das são obras do
am o r» . E era c o n
s u m id a pe lo dese jo
de as ver ig u a l
m en te im pressas em
sua p ró p r ia carne.
O s êxtases nos
c u a is o S enho r se•
m o s tra v a coberto
d e ch a g a s , que G e
m a e ra co n v id ad a a
to c a r e a be ija r ,
n ã o e ram d e s tin a
do s a d im in u ir o fo g o de seus desejos.
N a prim e ira sexta-feira de M a rç o de 1901, d u ran te
o ês tase h ab itu a l, fo i o uv id a a súplica que ela com lá g r i
m as d ir ig ir a ao seu E spôso par3 que a tornasse dc a l^ u m
m o d o p a r tic ip an te d o m artír io da flaoe lacáo . c . V * ç o rC * -
ò\ G j Í t í c l d ; .V.* S .’ das Doces.
pàSiior.isía quc tar.in j vc:e.i aparzçtu à
r.oaa SzrJà
330 S A > ( T A G E M A G A L G A N I' " >
-feira; pelas-duas horas. escrevia-me ela. Jesüs fez-me
sentir alguns pequenos açoutes, fiquei tôda em chagas,
meu Pa:, e sefro com cias um poucochinho. V iva Jesus!>
^7*-" E s tás chagas esiavatn longe dc ser im ag inárias.* * • •
D . Cecília , que muitas vezes as exam inou atentamente,
faz delas a seguinte descrição: '
«AfTa primeira sexta-feira de M arço, notei que Gem a
sofria mais que dc costume durante o êxtase. Tomei-lhe
um ò ra fo ; tinha grandes sulcos vermelhos. Aproximei
deles um lenço; ficou tinto dc sangue. Ccm o a santa me
nina parccia sofrer muito c cu lhe c.uvisse dizer: <Seriam
estes os vossos açoutes, ó Jesus?» pensei numa invisível
flagelação. '■
h to renovou-se nas 'outras três sextas-feiras de
M arço, com agravamento progressivo. N a segunda
sexta-feira, 6. corpo da extática ficava dilacerado: na
terceira, quási se viam os ossos: na quarta, era uma ccisa
indiscritiue/:‘ chagas por tôdas as partes c. nalguns sítios,
da profundidade dum centímetro. Depois de dois ou três
dias. desapareciam sem deixar vestígios.
U m a vez quis ligar duas destas chagas. E las porém
agravaram-se cm vez dc sc fecharem, e não pude tirar o
penso sem produzir as mais vivas dores: a cura efec
tuou s e por si pouco a pouco. As outras chagas tinham-se
cicatrizado sc/n demora.
Estas chagas estavam dispostas do medo seguinte:
duas cm cada braço, do comprimento de quatro a cinco
centímetros e muito profundas: uma r.o peito, bem no
meio c na direcção da garganta: duas a cima do joelho,
as mais consideráveis c mais oblongas: duas nes joelhos
c duas nos cotovelos que quási descobriam o osso; duas
C A P i t T Ú . L O i X 131/ • .
cm cada «m a das panturrilhas.-redondas c maiores que
uma moeda de duas /íras ( l ) ; ou/ras dúas na-frente
da perna, ao longo do 6 sso; finalm ente um a profunda e
mats ou menos circular no peito dos pés. H av ia outras
sôbre o tronco, que n ão pude notar bem. • .
N a primeira sexta-feira sòmente se notaram, como
já dissemos, sulcos sanguinolentos; mas depois apare
ceram profundos rasgões, e preguntando eu a Gema a
razão, respor.deu-me: «a principio eram as var3s: agora
São os.azorragucs».
Para vos dar uma idea do seu estado lamentável,
imaginai o grande crucifixo da nossa sala de jantar, aos
pês do qual ela tanto gostava de orar. A semelhança era
perfeita: as mesmas pisaduras, as mesmas lacerações da
pele e da carne, nas mesmas paries do corpo, o mesmo
aspecío comovente. O sangue corna por sulcos, alguns
des quais mediam quarenta a cinquenta centímetros de
comprimento per cinco de largo; descia ate à terra, se
ela estava de pé. e, quando estaca deitada, ensangilen-
tava os lençóis do leito, molhando por completo o col
chão».
O s quc puderam ver estas chagas vivas, fizeram
delas a mesma descrição. A sua origem sobrenatural não
sc pode contestar, porque seria impossivcl à jovern d ila
cerar-se assim com disciplinas ou outros instrumentos
de penitèr.cia.
0 ) A mocd.-i dc 2 liras, ir.ocda de prata ectfo conecte ca j .
Itália era um pouco neoor que a r.ossa actuat mocoa de de; escudos.
cNoía do Revisor). . ■ • . . •
■' P o r outro lado estas horríveis feridas íorm àvac-se
mesmo durante o êxtase. em presença de testemunhas,
c aesápaicciam com um a rapidez hum anam ente ioex-
p lic áv e i. , ‘ • • '• ........• ‘ • ’•
Adivinhava-se pela atitude da querida vitima
quaDto devia sofrer sob os golpes invisíveis que abriam
tais chagas na carne v iva.
cDurante a flagelação, d iz um a testemunha, mcj-
tra-se possuída de terríveis sofrimentos, mas nãõ se
move. Algumas vezes sobreveen: ligeiras convulsões, c
05 òra^os tremem. P, evidente que possue então teda a'
sensibilidade. Pobre menina! como sc nos confrange o
coração ao vê-la sofrer assim1 E quereis saber o que ela
me disse no meio destas torturas? cRccomendai-me muito
a Jesus». E acrescentou: « ó m inha celeste M ã i! 0 eterno
P a i!» Depois do êxtase sentiu fraqueza, mus pe r pouco
tempo. Notei que conservava perfeitamente a lembrança
de tudo o que se passnra».
N ã o sabemos se êste fenómeno m ístico se repetiu
cm outros dias além das sextas-feiras de M arço de 1901.
Poderia acontecer, porque a hum ilde virgem tir.ha uma
hab ilidade sem igual para ocultar cs dons de Deus.
U m c ia cm que-pedira a D . Cecília perm issão para
tom ar um banho, porque sentia, segundo afirmava, cs
vestidos colados à carne, encontrou-lhe esta Senho.*?, o
corpo v irg ina l sulcado etr. iodos os sentidos de grandes
chagas jà s Zc ò s às qua is a cam isa, em vários sities, se
tinha pegado. Para a arrancar das costas foi preciso
reabrir as feridas, n ão sem atrozes dores.
C on tudo , todos estes tormentos, d iz ia ela, consis
tiam somente «em alguns golpes pequenos que Jesus lhe
C A P I T U L O I X 133é
fazia sentir>, para lhe dar a graça de sofrer <um poc-
cochinko*.
Depois da flage lação d o Salvador, a so’dadesca do
Pretório, entre outras mostras de escárr.eo apoderac-
do-se do D iv in o Padecente, coroou-o de espinhos, cujas
pontas cruéis se enterravam na cabcça.
Coroa adorável! Q u e cristão poderia recusar-te o
seu amor, e não consideraria um a suprema honra cingir
contigo a fronte, ao lembrar-sc conio tu cingiste a p ró
pria fronte do Hom em -Deus?
A %'irgen: de Luca tinha ap ro fundado muito os mis
térios da in fin ita grandeza de Jesus-Padecente; e isto a
levou a apaixonar-se bem cedo pelo seu doloroso d ia
dema como por um a incom paráve l jó ia . Por outro lado o
Redentor aparecia-lhe m uitas vezes, tendo na fronte a
coroa sangrenta c p re g u n ta n d o lh e se ela não a queria.
Q u an d o a santa donze la adqu iriu , por seus desejos
e purificações místicas, a ú lt im a preparação para êste
dom extraordinário, os actos sucederam às palavras, a
realidade à visão.
«Finalmente esta noite, escrevia ela a 19 de Junho
de 1900, depois dc ter sofrido por seis dias o afasta-
mento dc Jesus, fiz esforços para me recolher. Comecei
a orar, como em tôdas as quintas-feiras: meditei na cru
cifixão de Jesus. ' . ■
A principio nenhum sentimento experimentei; alguns
- momentos depois, sobreveio um pouco de recolhimento;
Jesus estava próximo. N es íe recolhimento peedi a ca
beça, como das outras vezes e encontrei-me diante de
Jesus que sofria penas terríveis. Será possível ver sofrer
134 S A N T A G E M A " C A L C A N 1*. 1
>
Jesus/e não procurar ãliviâ-lo? Senti-me penetrada‘dum
grande desejo de sofrer e pedi instantemente a Jesus que
o satisfizesse. Ouviu-me imediatamente.
: . Aproximando-se de mim, tirou d a cabeça a coroa
de espinhos para a colocar sôbre a m inha, comprimin
do-a com suas divinas mãos contra as m inhas fontes.
Foram momentos dolorosos, mas felizes. F ique i uma
hora a sofrer assim como Jesus*.
*'*• U m pouco mais tarde Gem a, tornava a escrever:
«O n te m , às fres horas depois do meio-dia, cansada e
esgotada, experimentei, para dizer a verdade, uma
grande repugnância, quar.do dc novo n:e encontrei
diante de Jesus. Êle porém, jà não estava triste, como
em a noite p3ssada.
Depcis de rr,e ter feito algumas caricias, tirou-me
da cabeça, com um aspecto muito alegre, a coroa de espi
nhos (sofri um pcuco neste'momento, mas menos) e tor
nou-a a cclocar na sua. Tôda a cor desapareceu; recupe
rei de súbito as fòrças e senti-me melhor que antes dc
sofrers.
O s efeitos palpáveis destas aparições demostraram
que cias n ão eram o produto dum a im ag inação doente.
A cabeça da angélica don:c !a aparecia, ao mesmo tempo,
crivada de picadelas donde corria um sangue vivo, não
sòm entc em volta, mas tam bém cm tòda a sua superfície
por debaixo do cabelo; e isto d á crédito à op in ião dc
a lguns santos contemplativos, segundo os qua is a coroa
dc espinhos cobriu tõda a cabeça co Sa lvador.
A lg u m as vezes as picadelas, quósi invisíveis a õlho
nu . adivinhavam-se sòmcr.te pelo sangue que derram a
vam . O u tras veies, no d irer co Rev- P ad re Lourenço
Ç A - P t T U XL O ■■ 1 X 325
A g r ia o n t i. e de outras testemunhas oculares, distia-
guiam-se perfeitamente na fronte c n o couro cabeludo
buracos de espinhos, triangulares, em cada um dos quais
brilhava, como péro la , uma grande gota dc sangue.
O . prod íg io renovou-se regularmente,-sempre d u
rante o mesmo espaço de tempo, dc qu in ta paxa sexta:
-feira de cada semana, mesmo cepois d o desapareci
mento defin itivo dos outros estigmas. Çcm eçava muitas
vezes antes do êxtase habitual dc quinta-feirs à tarde.
D uran te a refe ição fam iliar, viam-se aparecer sôbre
a fronte de G em a , em núm ero sempre crescente, gotns
de sangue que desciam ao longo das faces, co pcsccço.
dos vestidos. « C a c a cabdo. a firm a um a testemunha,
tinha uma gcta, de sorte que o sangue corria até à
terra >.
Era ura espectáculo comovedor, capaz de enterne
cer um coração de gelo. Estava-se d ian te da rr.3is bela
reprodução do Eccc Homo. «Se vós vísseis. Padre, escre
viam-me. o sangue corrç-the dos olhos, dos ouvidos c
dã testa! Nêle molhei dois lanços. E que efervescência
cm seu peito* ( l ) .
U m d ia , em que eu mesmo fui testemunha dèste
facto prodig ioso, mandei-a enxugar e lavar tôdas as
pequenas chagas d a cabeça. M as , depois dc alguns m i
nutos. o sangue tornava a correr dos mesraçs pontos
para de novo lhe b anh a : o rosto v irg ina l. Saía cçm v iva
cidade. como sob urna forte pressão, corri3 ao longo das
faces e não dem orava a secar sôbre a pele. ;
( !) A tcjfixunha fa i aJus3c> palpitações víolict.u aes-
clocadaj enj cutri> lugar. ' ■' . '