Robert Castel O Fim do trabalho assalariado:Mito Desmobilizador

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  • 7/24/2019 Robert Castel O Fim do trabalho assalariado:Mito Desmobilizador

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    O FIM DO TRABALHO, UM MITO DESMOBILIZADOR

    Publicado noCEPAT Informan 44/1998O socilogo Robert Castel, diretor de estudos do Centro de Movimentos Sociais na Escola de ltosEstudos Sociais de Paris, ! autor do livro As Metamorfoses da !est"o So#$al. "ma cr#nica do

    sal$rio, Ed% &o'es, 1998%

    Ele se (osiciona contra os )ue diagnosticam o *im do trabal+o e mostra como este constitui sem(re o

    modo dominante de inser-o social% Segundo ele, ! no )uadro da renova-o da sociedade salarial )ue

    se deve (ensar a luta atual contra o desem(rego e a (recari'a-o%

    O (resente te.to est$ sendo (ublicado num livro coletivo, Le Monde d! Tra%a$le no Le Monde D$&lomat$'!ede setembro de 1998, (%40%

    Os subt2tulos s-o nossos.

    Interrogar-se sobre a centralidade do trabalho, , em grande parte, fazer um diagnstico sobre amudana e o futuro da sociedade salarial. Pois neste tipo de formao social que o trabalho, sob aforma de emprego, tem ocupado uma posio hegemnica. o somente porque o emprego

    assalariado era largamente ma!orit"rio, #as tambm porque ele era a matriz de uma condio socialest"$el que associa$a ao trabalho as garantias e os direitos.

    So#$edade Salar$alPudemos falar de %sociedade salarial% a partir do momento em que as prerrogati$as prioritariamenterelacionadas com o trabalho salarial protegiam contra os principais riscos sociais, no somente ostrabalhadores e suas fam&lias, mas tambm os no-assalariados e a quase totalidade dos no ati$os.'ste era o n(cleo do %compromisso social% que culmina no comeo dos anos )*, num certo equil&brio,certamente conflitual e fr"gil, entre o econmico e o social, isto , entre o respeito das condi+esnecess"rias para produzir as riquezas e a eigncia de proteger aqueles que as produzem.ue feito disso, ho!e/ 0odos estamos de acordo na constatao que assistimos, depois de $inte anos,1 degradao deste tipo de regulao. #as qual a amplido desta degradao/ Podemos afirmar,

    como se tornou moda, que ns estamos quase %saindo% da sociedade salarial/ 23

    4estes (ltimos anos podemos e de$emos falar de uma desagregao da sociedade salarial. #as aestrutura deste tipo de sociedade se mantm 2ou se mantinha4 enquanto que seu sistema de regula+esse fragiliza. 0rata-se de uma conseq5ncia maior da prioridade que comea ser dada, a partir docomeo dos anos )*, aos imperati$os da rentabilidade econmica e 1 apologia da empresa pensadacomo a (nica fonte da riqueza social. 6s direitos e a proteo do trabalho so, desde ento, percebidoscomo obst"culos ao imperati$o categrico da competiti$idade.

    So#$edade Salar$al desestab$l$(ada7 primeira conseq5ncia destas orienta+es no consiste, no entanto, no desmantelamento dasociedade salarial. Pois a desagregao da sociedade salarial se caracteriza pelo aparecimento deno$os riscos tornando a relao de trabalho aleatria. 8eguramente, o primeiro risco o desemprego.

    #as h" outros riscos que pro$m da proliferao de contratos de trabalho %at&picos%9 de duraolimitada, de tempo parcial, interinos etc. 6 desemprego de massa e a precarizao das rela+es detrabalho que se agra$am no decorrer da dcada seguinte, so as duas grandes manifesta+es de umadesestabilizao profunda das regula+es da sociedade salarial.: necess"rio, portanto, atualizar, ho!e, esta a$aliao, e tal$ez re$is"-la. ;uas caracter&sticas, pelomenos, parecem atestar um agra$amento da situao.

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    Horror E#on)m$#o* d$s#!rso #atastrof$sta'stas constata+es alimentam desde algum tempo os discursos catastrofistas sobre o %horroreconmico%Be o fim do %trabalho assalariado%. 6 diagnstico da desagregao da sociedade salarialteria que ser substitu&do pela constatao do seu desabamento. 'sta formao social no teria sidomais do que um parnteses de algumas dcadas, que de$eria ser contado !" entre os lucros e as perdasda histria.

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    A He4emon$a do Mer#ado: em relao com um diagnstico deste tipo que preciso se confrontar, em $ez de imaginar ou sonharde qual ser" o lugar e natureza do trabalho em dez ou $inte anos, pois seria necess"rio ser profeta parao saber. 7 questo de fundo, ento, torna-se a seguinte9 preciso ou no renunciar a fazer, ho!e, dotrabalho a frente principal das lutas para promo$er amanh um futuro melhor/ 7 ren(ncia de fazer dotrabalho um desafio estratgico representa um gra$e erro, e isto por uma razo decisi$a9 a importDnciafundamental do mercado e o problema crucial que coloca a sua crescente hegemonia do ponto de $istada coeso social.Podemos ser tentados a relati$izar a importDncia do trabalho. #as no podemos relati$izar aimportDncia do mercado. Pelo contr"rio, sua hegemonia se imp+e 1 medida do enfraquecimento dasregula+es do trabalho. : o que se obser$a todos os dias9 as institui+es do capitalismo financeirointernacional, como o G#I e o Janco #undial, ocupam cada $ez mais o lugar das institui+es!ur&dico-pol&ticas dos 'stados-na+es. 6ra no se pode pensar um futuro da ci$ilizao sem a presenado mercado.

    O Mer#ado n"o #r$a La.o So#$al7 promoo do mercado contemporDnea da promoo da modernidade a partir do sculo 3A, no

    momento da sa&da de uma sociedade %holista% dominada por rela+es de dependncia entre os homens.'la insepar"$el do surgimento de uma sociedade de indi$&duos e, necess"rio ousar dizer, que elate$e uma funo progressi$a. #as o mercado no cria lao social e ele destri as formas pr-industriais de solidariedade. Isto eplica porque os homens, para $i$erem positi$amente amodernidade continuando a %fazer sociedade% foram desafiados a aceitar o mercado procurandodomestic"-lo. Isto se deu recusando a anarquia do liberalismo e a regresso 1s formas pr-modernas deNemeinschaft 2comunidade4. 7 histria social mostra com muitas e$idncias que foram as regula+essociais constru&das a partir do trabalho que promo$eram esta domesticao relati$a do mercado cu!o"pice foi o compromisso da sociedade salarial.

    So#$edade toda ela Mer#ado7bandonar a frente do trabalho se arriscar a renunciar 1 possibilidade de regular o mercado e se

    encontrar no mais numa sociedade de mercado 2onde ns estamos desde muito tempo4, mas numasociedade tornada mercado de cima abaio, inteiramente atra$essada pelas eigncias a-sociais domercado. Gace a este cen"rio do pior, quais so os poss&$eis suportes para domesticar o mercado/

    O #erto e o $n#erto7 etrema dificuldade da con!untura que se, por um lado, $emos que a relao salarial cl"ssica est"profundamente abalada, no $emos o que a poderia substituir na sua globalidade enquanto soluocred&$el capaz de suportar os sistemas de regulao coleti$os capazes de afrontar a desregulaoimposta pelo mercado. Lemos a multiplicao de formas degradadas de emprego e tambm aemergncia de iniciati$as muito interessantes no setor no mercantil ou 1 margem do mercado. #aselas riscam constituir-se de caso isolados fora do mercado, espcie de reser$as protegidas do mercado,mas sem influncia sobre ele. 6ra, a hegemonia do mercado ameaa o lao social de maneira geral,

    destruindo as rela+es coleti$as de solidariedade.: poss&$el construir ou reconstruir regula+es coleti$as no fundadas sobre uma organizao coleti$ado trabalho, que no este!am inscritas num regime geral de emprego/ o falta o discurso sobre acidadania social, mas fazem, cruelmente, faltam as pr"ticas que lhe dem um conte(do real, para queao menos se mantenha uma definio um pouco mais eigente da cidadania. Por isso, renunciar debuscar articular esta cidadania com o trabalho, se arriscar de deiar o certo pelo incerto.Pretender que as regula+es do trabalho representem ainda a principal garantia da coeso social ep+e-me 1 cr&tica de permanecer cego 1s $irtualidades esperanosas de um futuro li$re das constri+es quedominam a %ci$ilizao do trabalho%. #as preciso recusar esta oposio entre o futuro e o passado,da utopia libertadora e da fiao sobre as constri+es obsoletas e compreender que eistem dois tiposde utopias. 7lgumas utopias, como aquela do fim do trabalho, se refugiam no futuro porque elas noesperam mais nada do presente. 7 utopia arrisca tornar-se, ento, o %sol de um mundo sem sol%, quedeia o mundo como est".

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    'ntretanto, o presente nosso (nico ponto de apoio para a nossa ao. ' se $erdade que o trabalho sempre a casa que determina a configurao da eistncia social da maior parte de nossoscontemporDneos, a eigncia de combater a degradao do seu regime permanece o principalimperati$o pol&tico, a %utopia% daqueles que no se pretendem dobrar aos ditames dos fatos.

    At!al$(ar o D$re$to do Trabal/oo se trata de algo insignificante. 0rata-se de atualizar o direito do trabalho para que a necessidade deaceitar uma maior fleibilidade dos empregos no se!a pagada com uma maior precariedadeC promo$eruma reduo substancial dos tempos de trabalho afim de redistribuir o trabalho e a proteo social aele relacionado, de outra forma do que por meio do desempregoC consolidar uma cobertura uni$ersaldos riscos sociais, inclusi$e dos no$os riscos que so o risco-precariedade e o risco-desemprego etc.'nunciar estes imperati$os suficiente para $er que eles no se colocam na perspecti$a daconser$ao do passado ou da gesto do eistente. : necess"rio antes temer que eles so muitoambiciosos se temos em conta o poder das estratgias de desregulamentao implementadas pelocapitalismo financeiro internacional. #as o futuro guarda uma margem de impre$isibilidade e o piorno o que certamente acontecer". ;a& que estas orienta+es so canteiros abertos aos quais podem seassociar todos aqueles que diagnosticam que nossa sociedade est" doente de trabalho, o melhor

    remdio no prematuramente fazer o seu enterro.

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    O I5ACESS67EL FIM DO TRABALHO

    CEPAT Informa n8 99:;

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    humanidade pela primeira $ez sob o !ugo da necessidade%=. 8egundo ns, a emancipao do trabalhono , aqui, mais do que um re$eladorC a generalizao do imprio da mercadoria, do dinheiro e docapitalismo que est" na origem da no$a necessidade econmica.4

    F$m do Trabal/o0?0Para falar seriamente do fim do trabalho, no suficiente dizer que com os meios tcnicos dispon&$eisest" ao alcance de nossas mos a abundDncia sob a base de uma fr"gil durao do trabalho.