Revolucao e guerra civil na Russia

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60 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO mente a legislação, e essas atividades eram "incompatíveis com uma dita- dura";" Ele foi veementemente atacado por se afastar da doutrina marxista ortodoxa, não apenas por Lenin, mas também pelos líderes do movimento social-democrata alemão, especialmente pela revolucionária polonesa Rosa Luxemburgo, membro proeminente da Segunda Internacional e ativa não apenas na Polônia, mas principalmente na Alemanha. Karl Kautsky, cujos pais eram tchecos mas que viveu a maior parte de sua vida na Alemanha, também atacou Bernstein, mas de uma posição mais centrista que a da in- flamada Luxemburgo. Kautsky havia sido durante algum tempo um teórico marxista que admirava muito Lenin. Mas já em 1893 demonstrara uma atitude mais simpática com o parlamentarismo, escrevendo que "um regime parlamentar genuíno pode ser um instrumento tão bom para a ditadura do proletariado quanto é para a ditadura da burguesia".» Mais tarde, não apenas Kautsky, mas também a mais radical Luxemburgo - que atacara duramente Bernstein por sua noção de socialismo evolucionário - apon- tariam as implicações ditatoriais da tomada de poder na Rússia por Lenin e os bolcheviques, Esse acontecimento e as revoluções da guerra mundial que o precederam são o tema do próximo capítulo. ,: i· . , i I ; , : 3 As revoluções russas e a guerra civil Nem todos os delegados do II Congresso do Partido Operário Social-Demo- c~ata - discutido no capítulo anterior - estavam preparados para serem "Iassificados por Lenin como mencheviques nem como bolcheviques. Um 'volucionário que claramente não se encaixava em nenhum dos dois campos 'a Leon Trotski. Embora mais próximo dos mencheviques, e identificado ~111-~í~~, i;ots'ki não se juntou realmente a eles depois da divisão de 1903. anteve boas relações com mencheviques individualmente, mas entre 1903 .1917 foi "um revolucionário sem uma base revolucionária".' Enfatizava rticularrnente a necessidade de o proletariado russo ter uma causa em .~mum com o proletariado mais numeroso da Europa Ocidental, bem como f';':apoiodeste. Também era a favor dereduzir a um mínimo o período entre una "revolução burguesa" e uma revolução socialista. Em 1917, ele achou ue Lenin poderia adotar sua opinião sobre essas duas grandes questões e iu suas forças com os bolcheviques. Embora em seus poucos anos no po- ~r, depois da revolução bolchevique, tenha sido no mínimo tão autoritário uanto seus colegas, Trotski foi um observador precoce dos perigos inerentes o modelo de organização de partido de Lenin, escrevendo em 1904: "Os métodos de Lenin levam a isso: primeiro, a organização do partido substitui ~~~siprópria pelo partido como um todo; depois, o Comitê Central substitui ':',a si próprio pela organização; e finalmente, um único 'ditador' substitui a si . : próprio pelo Comitê Central.,"? Contrariando isso, a insistência de Lenin :';na "importância da centralização, disciplina estrita e unidade ideológica . dentro do partido" fazia algum sentido para um partido político que atuava como organização clandestina em um Estado policiaJ.3 Quando, porém, '.. até mesmo cinquenta ou sessenta anos depois de os Comunistas chegarem ao poder, políticos soviéticos invocaram Lenin em busca de apoio 'a seu partido estritamente disciplinado e rigidamente hieráquico, a implicação de que Lenin teria desejado ou esperado que essa forma de organização ."prevalecesse por tanto tempo era dúbia.

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60 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

mente a legislação, e essas atividades eram "incompatíveis com uma dita-dura";" Ele foi veementemente atacado por se afastar da doutrina marxistaortodoxa, não apenas por Lenin, mas também pelos líderes do movimentosocial-democrata alemão, especialmente pela revolucionária polonesa RosaLuxemburgo, membro proeminente da Segunda Internacional e ativa nãoapenas na Polônia, mas principalmente na Alemanha. Karl Kautsky, cujospais eram tchecos mas que viveu a maior parte de sua vida na Alemanha,também atacou Bernstein, mas de uma posição mais centrista que a da in-flamada Luxemburgo. Kautsky havia sido durante algum tempo um teóricomarxista que admirava muito Lenin. Mas já em 1893 demonstrara umaatitude mais simpática com o parlamentarismo, escrevendo que "um regimeparlamentar genuíno pode ser um instrumento tão bom para a ditadurado proletariado quanto é para a ditadura da burguesia".» Mais tarde, nãoapenas Kautsky, mas também a mais radical Luxemburgo - que atacaraduramente Bernstein por sua noção de socialismo evolucionário - apon-tariam as implicações ditatoriais da tomada de poder na Rússia por Lenine os bolcheviques, Esse acontecimento e as revoluções da guerra mundialque o precederam são o tema do próximo capítulo.

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As revoluções russas e a guerra civil

Nem todos os delegados do II Congresso do Partido Operário Social-Demo-c~ata - discutido no capítulo anterior - estavam preparados para serem"Iassificados por Lenin como mencheviques nem como bolcheviques. Um

'volucionário que claramente não se encaixava em nenhum dos dois campos'a Leon Trotski. Embora mais próximo dos mencheviques, e identificado~111-~í~~,i;ots'ki não se juntou realmente a eles depois da divisão de 1903.anteve boas relações com mencheviques individualmente, mas entre 1903

.1917 foi "um revolucionário sem uma base revolucionária".' Enfatizavarticularrnente a necessidade de o proletariado russo ter uma causa em

.~mum com o proletariado mais numeroso da Europa Ocidental, bem comof';':apoiodeste. Também era a favor de reduzir a um mínimo o período entreuna "revolução burguesa" e uma revolução socialista. Em 1917, ele achouue Lenin poderia adotar sua opinião sobre essas duas grandes questões e

iu suas forças com os bolcheviques. Embora em seus poucos anos no po-~r, depois da revolução bolchevique, tenha sido no mínimo tão autoritáriouanto seus colegas, Trotski foi um observador precoce dos perigos inerenteso modelo de organização de partido de Lenin, escrevendo em 1904: "Os

métodos de Lenin levam a isso: primeiro, a organização do partido substitui~~~si própria pelo partido como um todo; depois, o Comitê Central substitui':',a si próprio pela organização; e finalmente, um único 'ditador' substitui a si

. : próprio pelo Comitê Central.,"? Contrariando isso, a insistência de Lenin:';na "importância da centralização, disciplina estrita e unidade ideológica. dentro do partido" fazia algum sentido para um partido político que atuavacomo organização clandestina em um Estado policiaJ.3 Quando, porém,

'.. até mesmo cinquenta ou sessenta anos depois de os Comunistas chegaremao poder, políticos soviéticos invocaram Lenin em busca de apoio 'a seupartido estritamente disciplinado e rigidamente hieráquico, a implicaçãode que Lenin teria desejado ou esperado que essa forma de organização

."prevalecesse por tanto tempo era dúbia.

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Entretanto, dificilmente seria fanrasioso identificar aqui °que cientistaspolíticos chamam de "dependência de caminho" - um padrão de aceitaçãode escolhas institucionais anteriores, embora feitas em diferentes circuns-tâncias e sob diferentes restrições. Houve uma lógica de desenvolvimentopela qual °partido bolchevique centralizado (com uma liderança que muitasvezes atuava em segredo) introduziu sua própria marca distintiva de governoainda mais autoritário, depois de suplantar o antigo regime e ocupar osescritórios do Estado." Não apenas numerosos estudiosos mais tarde, mastambém muitos contemporâneos de Lenin -entre eles ex-carnaradas desen-cantados - viram a antipatia de Lenin com "organizações de massa maisfrouxas, que permitiam maior diversidade e espontaneidade" não apenascomo uma questão de conveniência e necessidade tática, mas também comoum reflexo de uma mentalidade autoritária.' Um desses contemporâneos,Nikolai Volski, que se juntara aos bolcheviques e se tornara leal a Lenin,rompeu com este porque já não aguentava sua intolerância e intemperançaquando eles discutiam opiniões políticas que Lenin desaprovava.s De 1903em diante, os mencheviques apontaram os perigos de uma ditadura inerentesà certeza absoluta de Lenin de que estava correto, somada à sua insistênciaem uma obediência disciplinada dentro do grupo bolchevique. A intolerân-cia de Lenin estava evidente muito antes de ele se tornar o primeiro líderda União Soviética. Nos últimos dois ou três anos de sua vida, ele estavamais aberto às dúvidas do que havia sido durante toda a sua carreira derevolucionário profissional."

Os bolcheviques e mencheviques estavam longe de serem as únicas fac-ções em disputa no movimento revolucionário russo nas primeiras duasdécadas do século XX. O partido que gozava de maior apoio entre os cam-poneses russos - que constituíam mais de 80 por cento da população - erao Partido Ssocialista Revolucionário, conhecido simplesmente como SR.Este surgiu nos anos 1890 como uma ramificação do movimento populistarusso. Seu líder e principal teórico era Viktor Chernov, que argumentavaque os camponeses precisavam formar o "principal exército" da revolução,mesmo que o proletariado estivesse na vanguarda. Chernov não era mar-xista. Queria evitar a chegada do capitalismo à Rússia. Assim como seusprecursores populistas nos anos 1860 e 1870, acreditava que as comunascamponesas poderiam formar uma ponte para o socialismo na Rússia. Osmarxistas, ao contrário, discutiam sobre a extensão que o capitalismo jáalcançara no país.

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A revolução de 1905 e os últimos anos da RússiaCzarista

.A primeira das três revoluções que culminaram na tomada do poder pelosbolcheviques, no fim de 1917, teve como cenário condições sociais terríveis

("'DáS cidades russas, pobreza no interior e falta de direitos e liberdade po-,IP;"líticos básicos. Nas últimas décadas do século XIX, estava havendo uma;'d:"jndustrialização bastante rápida na Rússia, não obstante a predominância

':: 'numérica dos camponeses. Em 1861, a abolição da servidão (uma forma de.E:escravidão) envolveu concessões demais aos proprietários de terras - que" eriam privados de suas propriedades em termos de pessoas, mas-mantendo

as terras - para que representasse um ajuste satisfatório para os campo-ses." Significou, porém, que agora os camponeses podiam deixar o interior

procurar trabalho nas cidades, enquanto a indústria se desenvolvia. Assim,rgiu a primeira geração do proletariado industrial, ainda que fosse uma

equena proporção da população total: um grupo social desorientado pelatoca da probreza rural pela miséria da cidade.

Uma depressão econômica, iniciada em 1899, trouxe mais motivos paradescontentamento nos grupos de trabalhadores em expansão, e houve

, andes greves (embora localizadas) em várias cidades russas nos primeiros"os do século XX.9 Além desses problemas internos, em 1904-05 a Rússiaravou uma guerra malsucedida com o Japão. Seu fracasso nesse conflitooi um grande choque para a elite política, bem como para a população emeral. Eles se consideravam uma grande potência europeia e, por definição," onômica e militarmente superiores a qualquer Estado asiático. Embora"s dois lados fossem culpados pela explosão da guerra, os japoneses semostraram mais eficientes para conduzi-Ia. A guerra terminou com o Japãoassegurando mais espólios imperiais. Isso prejudicou a reputação do czarNicolau II e aprofundou a sensação de crise política na Rússia.!"

Um elemento curioso na luta política russa era conhecido como "so-cialismo policial". Tratava-se de um movimento incentivado por algumasautoridades, em parte por elas reconhecerem as reclamações popularescomo genuínas e em parte para roubarem o impacto dos revolucionários.Mas, paradoxalmente, foi uma marcha liderada por um misterioso líder dosocialismo policial, um padre chamado Georgy Gapon, que desencadeou aRevolução Russa de 1905. No início de janeiro daquele ano, cerca de 120mil trabalhadores estavam em greve em São Perersburgo e Gapon abraçoua causa deles. Em uma petição ao czar, eles reivindicaram "justiça e pro-teção", dizendo que estavam empobrecidos, oprimidos, sobrecarregados

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e sendo tratados com desdém." Gapon conduziu uma grande procissãodesarmada - muitos dos participantes eram trabalhadores em greve - emdireção ao Palácio de Inverno, para entregar a petição. A marcha - queaconteceu em 9 de janeiro, de acordo com o calendário juliano usado naRússia até 1918 (e ainda usado pela Igreja Ortodoxa), e em 22 de janeiro,de acordo com o calendário moderno - foi completamente pacífica, atéseus participantes serem atacados a tiros por soldados instruídos a impedirque chegassem ao palácio. O czar não estava preocupado o bastante como protesto e passava o fim de semana fora de São Petersburgo. Aquele diaficou conhecido como o "Domingo Sangrento". Além da morte de muitosparticipantes da marcha, outros manifestantes pacíficos foram massacradósem diferentes áreas da cidade. Os rumores na época foram de que milharesde pessoas haviam morrido. Os números verdadeiros - aproximadamenteduzentos mortos e oitocentos feridos - foram ruins o bastante.'?

Este foi o começo do fim da autocracia. A reputação do czar nunca serecuperou completamente do Domingo Sangrento. Muitos que respeitavamNicolau II agora o consideravam responsável pelo assassinato a sangue-friode pessoas inocentes. O acontecimento deflagrou um ano de distúrbios revo-lucionários. Ao longo de 1905, as greves, manifestações e saques em casasde proprietários de terras foram diários. Os SR mataram um tio do czar,o grão-duque Sergei, que se tornara especialmente impopular ao defendera repressão. As pressões contra o governo vieram de vários setores - desindicatos do comércio, de um sindicato de camponeses criado em meadosde 1905 por incentivo dos SR e também de classes profissionais, que exi-giam alguma participação no governo. Assim, houve pressão tanto liberalquanto revolucionária. Uma fonte de pressão liberal foram os zemstvos,autoridades de governos locais formados por Alexandre II como parte dasGrandes Reformas dos anos 1860. Mesmo com tantas forças voltadas contraa autocracia em 1905, ainda havia uma diferença vital em relação a 1917.Em 1905, grande parte do exército permaneceu firmemente ao lado dasautoridades. Em 1917, o exército estava desorganizado e em revolta aberta.

As greves constantes de 1905 culminaram em uma greve geral - aprimeira do tipo - em outubro. Diante disso, o governo fez concessões,exortadas a Nicolau II por seu primeiro-ministro, o conde Sergey Witte,um conservador moderado. O czar emitiu o que se tornou conhecido comoseu "Manifesto de Outubro", que concedeu liberdade pessoal à populaçãoem geral e propôs a eleição de uma duma nacional com base em ampla vo-tação. Mesmo em princípio, essa nova assembleia seria bem menos do que

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parlamento. Podia "participar" da supervisão da legalidade introduzidapelo czar e seus ministros, mas não tinha uma supremacia legislativa clara.E-nem o czar nem seu governo eram responsáveis por ela. O Manifesto

.erà um documento contraditório e refletia a confusão na própria mente de

. Nicolau. O czar achou que havia protegido a autocracia ilimitada, embora",Manifesto incluísse uma promessa de que nenhuma lei teria efeito sem atprovação da Duma. A palavra "duma" deriva do verbo "pensar" em russo,"'as era evidente a falta de um pensamento claro em seu projeto institucional.

'!Entre a eleição da primeira Duma, em 1906, e o ano de 1917, houve; tro dumas, embora estas tenham representado uma restrição, e não umapliação do direito ao voto. Assim sendo, o crescente controle das autori-es sobre a composição dessa assembleia legislativa reduziu o número deicos radicais nas duas últimas dumas. Mesmo em 1905, o Manifesto

;Outubro do czar não satisfez os liberais que surgiam na Rússia e foifado com desprezo pelos revolucionários. Um dia depois da promulgação;:Manifesto, dezenas de milhares de pessoas se concentraram em frenteniversidade de São Petersburgo, estimuladas, nas palavras de Trotski,da luta e intoxicadas com a alegria de sua primeira vitória".J3 Trotski. scenta: "Gritei para eles da sacada para não confiar em uma vitória

,ompleta; que o inimigo era teimoso, que havia armadilhas à frente;guei o manifesto em pedaços e os espalhei ao vento."!":Trotski teria um papel importante em uma instituição bem diferente; surgiu em 1905 e que mais tarde teria repercussão política: a formaçãoprimeiro soviete. Embora "soviete" seja simplesmente a palavra russa

.:raconselho, este adquiriu desde o início uma conotação revolucionáriatido à sua origem, como uma comissão de greve em São Petersburgo, eeu nome completo: Soviete de Representantes dos Trabalhadores. De-1s da prisão do primeiro presidente do Soviete, uma "presidência" foi

. ita, sendo Trotski seu líder. Ele se tornou a principal força impulsora eptelectual do Soviete, uma organização que seria habilmente ressuscitadam 1917. Trotski também estava formulando na época sua teoria da "revo-

ução permanente". Em parte, esta era sua opinião, já insinuada, de que as,revoluções "burguesa" e "socialista" iriam interagir uma com a outra e deque era preciso não perder tempo algum com a primeira antes de pressionarpela segunda. Além do mais, na Rússia de 1905, argumentou ele, foram"as greves dos trabalhadores que pela primeira vez puseram o czarismo dejoelhos", e isso o levou a tirar conclusões otimistas sobre o Ocidente. Se

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"o proletariado jovem da Rússia pode ser tão formidável, como pode serimenso o poder do proletariado dos países mais avançados!"."

Quando, porém, Petr Stolypin foi nomeado ministro do Interior, em1906, e quando, estando no cargo, tornou-se Presidente do Conselhode Ministros (ou primeiro-ministro) no ano seguinte, os revolucionáriosacharam que estavam diante de um opositor mais terrível do que a maioriadas figuras nomeadas pelo czar, Stolypin empreendeuurila forte repressão,fechando jornais radicais e prendendo (e em alguns casos executando)dezenas de milhares de opositores do regime. Ele combinou isso, porém,com uma política de implementação de reformas. Em particular, instituiuuma importante reforma agrária destinada a tornar o camponês algomais semelhante ao fazendeiro da Europa Ocidental. A política incluiu orompimento da velha comuna de vila, conhecida como obshchina ou miro,que desde a abolição da servidão, em 1861, possuía coletivamente as terrasonde os camponeses trabalhavam. O objetivo era dar prosseguimento a ummovimento de delimitação e criar a propriedade de terra individual do cam-ponês. A reforma preocupou inúmeros revolucionários, entre os quais Lenin.Eles não acreditavam que esta poderia impedir que a revolução acabasseacontecendo, mas temiam que pudesse adiá-Ia por décadas. Entretanto, areforma tardia foi menos bem-sucedida do que os liberais esperavam e doque os revolucionários temiam. A maior parte da elite do país se opôs efez o máximo para miná-Ia. Os próprios camponeses inicialmente não seanimaram a aceitar o risco de cultivar terras por conta própria, perden-do, assim, os recursos compartilhados (mesmo que de vez em quandoisso significasse miséria compartilhada), proporcionados pelas comunas.Além disso, eles não confiaram na fonte ou nos motivos por trás daquela"emancipação" renovada. No fim das contas, Stolypin teve o apoio apenasde uma faixa estreita de conservadores liberais. Suas reformas foram longedemais para os tradicionalistas, sua propensão a dispensar a Duma e mudaro sistema eleitoral para obter uma assembleia mais complacente contrariouos liberais e os revolucionários tiveram bons motivos para considerá-Io uminimigo implacável.

Stolypin quase foi assassinado em 1906 - no atentado contra ele, váriaspessoas foram mortas e dois de seus filhos ficaram feridos. Embora 1906 e1907 tenham sido considerados anos relativamente tranquilos em compara-ção a 1905, os assassinatos de autoridades por revolucionários continuaramem larga escala. Houve inúmeros assaltos a bancos, alguns deles lideradospor Ioseb Djugashvili, com o objetivo de financiar o movimento revolucio-

'~rio.16Esse bolchevique georgiano que estudara em um seminário religiosoé ser expulso em 1899) se tornaria mais conhecido como Stalin, nome que

eçou a usar no fim de 1912. O próprio Lenin aprovou vários assa ltos e.r considerou uma parte legítima da luta contra o czarismo. Como explicoua esposa, Nadezhda Krupskaya, "os bolcheviques achavam admissível:iIiaro tesouro czarista e permitiam expropriações". Os mencheviques,<~contraste,opunham-se fortemente aos assaltos a bancos."'Em 1911, Stolypin acabou sendo assassinado, um destino que ele supu-~,que teria desde a época em que se tornara presidente do Conselho de"lstros.18A pessoa que.atirou nele - em um teatro em Kiev, durante. '::apresentação comemorativa, na presença do czar - tinha ligações

'com socialistas revolucionários quanto com a polícia. Não ficou claro_oca para qual dos lados ele estava agindo, embora alguns indícios

nrem na direção de membros da polícia secreta czarista insatisfeitos.'bchefe daOkhrana de Kiev quem deu ao assassino, Dmitry Bogrov, oresso para a ópera de Kiev no dia fatal. Bogrov foi enforcado sem umamento público.".ntre 1905 e 1917, o reformismo liberal na Rússia era representadocipalmente pelos Democratas Constitucionais, um partido políticolarmente conhecido como os Kadets (Cadetes), e por um partido li-

al ainda mais moderado, os Outubristas, assim chamados devido a seu_cioao Manifesto de Outubro de 1905, do czar. À parte o liberalismo e

cialismo revolucionário, aqueles foram anos em que uma corrente de",Íonalismo, xenofobia e antissemitismo também estiveram em evidência.uve massacres de judeus e, como resultado, uma emigração judaica em

,rga escala do Império Russo para a Europa Ocidental e a América doorte. A discriminação contra os judeus não tinha nada de novo na Rússiarn em outras partes do império, especialmente na Ucrânia. EH~ é um dosotiv~~"'p"eLosquais os judeus _t:.ra~tªQJ?~nuee~esent_ados nosprincipaisstosdos partidos revolucionários -nã() tanto os Sk.com.suas orig~vs--

O l!listas, mas os mencheviques (em particular) eos bolcheviques.,.' Á frente da perseguição aos judeus estava a nacionalista União do Povo

_Russo, ou Cem Negros, como os democratas russos a chamavam. Foi::formada em 1905, com a bênção de Nicolau Il, para mobilizar a massa de,-peSsoas contrárias aos revolucionários e aos reformistas radicais." Muitos",dos próprios Cem Negros consideravam o czar demasiadamente fraco

,~e hesitante em seus esforços para reprimir os revolucionários. QualquerpeSSoaconsiderada democrata e oponente da autocracia, estava sujeita a

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ser espancada pelos Cem Negros, mas os judeus eram particularmente es-colhidos. Vários milhares de pessoas foram assassinadas ao longo de 1905- oitocentas só em Odessa, No fim de 1906, a Un ião do Povo Russo tinhacerca de 300 mil membros." Algumas das organizações demagógicas e an-tissemitas formadas na Rússia entre o início do século XX e 1917 pareciamimpressionantemente protótipos dos movimentos fascistas que floresceriamem outros lugares da Europa nos anos 1920 e 1930. Seria ingênuo suporque a única alternativa concebível à revoluçãosocialisraou comunista de1917 era uma democracia liberal desenvolvida gradualmente, Os liberaistinham bem menos apoio não apenas que os revolucionários, mas tambémque os fanáticos do lado oposto do espectro político. Uma alternativa com-pletamente possível à vitória dos Comunistas era o desenvolvimento de umregime nacionalista de extrema direita.

A crise crescente na sociedade russa chegou a um clímax quando a Pri-meira Guerra Mundial estourou. Lenin e muitos revoluciunários declararamque aquela era uma guerra imperialista e que não tinham nada a ver comela. Entretanto, o advento da guerra dividiu o movimento socialista emtoda a Europa. Alguns de seus principais representantes (tais como EduardBernstein na Alemanha e Keir Hardie na Grã-Bretanha) se opuseram aoconflito por motivos pacifistas, outros principalmente pelo motivo políticode ser uma guerra imperialista. Mas muitos se uniram em defesa de suapátria particular. Todos os bolcheviques conhecidos que permaneceram nopaís - inclusive membros da Duma - foram presos depois que a Rússiaentrou na gue~ra, em aliança com a França e a Grã-Bretanha, contra aAlemanha e a Austria-Hungria.22 Marxistas russos se dividiram em termosde apoio ao esforço de guerra russo. Lenin e Trotski se destacaram entre os"derrotisras", não apenas se opondo à guerra por princípio mas tambémacreditando que esta representava uma grande oportunidade. Estavamconvencidos de que uma derrota russa aceleraria o sucesso da revolução. Aocontrário, Plekhanov acreditava que a causa do socialismo avançaria com avitória da Rússia e de seus aliados. Na realidade, a legitimidade do regimeera, àquela altura, tão fraca, que quando o exército sofreu grandes reveses,os russos em geral não se uniram às autoridades do Estado em defesa dapátria, como haviam feito ao serem atacados por Napoleão e pelo exércitofrancês em 1812, ou como fariam na Segunda Guerra Mundial, sob o ataqueviolento da Alemanha de Hitler. A incompetência na condução da guerra,as grandes perdas humanas e confiança cada vez menor nas autoridadestorn~ram o regime czarista mais vulnerável do que nunca.P

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I'll. A "posa de Nicolau 11,Alexandra, era neta da rainha britânica, Vitó·f . o': 'a que ela reverenciava, mas sua origem étnica era principalmente alemã.,,' fi,}. ;. Como resultado disso, foram levantadas dúvidas - bastante equivocadasl~:o,.' :fS sobre seu comprometimento com a causa russa. Uma preocupação'.. t' o

~':~4h~~inda maior entre alguns ministros do czar, bem como entre membros da$r'':-~orte, era a influência exercida por Grigori Rasputin sobre a imperatriz,

~Camponês siberiano carismático e bissexual, Rasputin era ligado a uma~ita que promovia orgias sexuais, misturadas a revelações religiosas. Foi,:, ;ém, a influência que se acreditava que ele exercia o que mais agitou seus;v~is, por causa da atenção do czar, Algumas pessoas - particularmente.imperatriz Alexandra - sustentavam que ele possuía poderes místicos.',asputin ganhou a confiança de Nicolau, e mais ainda de sua esposa, comi'aparente capacidade de conter o sangramento de Alexei, o filho hemo-kÜ deles e herdeiro do trono, em uma época em que a profissão médicao era capaz de ajudá-Io.'O impacto de Rasputin aumentou durante a Primeira Guerra Mundial,incipalmente durante os períodos em que o czar estava fora da capital,~frente de batalha. O fato de seus conselhos serem rapidamente aceitosr Alexandra - que, por sua vez, exercia profunda influência sobre o

arido - revoltou muitas pessoas na corte e no governo. Em dezembro de,16, Rasputin foi assassinado por um grupo que incluía um primo-irmão

czar, o grão-duque Dmitry, e um deputado ultraconservador da Duma,:M. Purishkevich. Até mesmo o assassinato aumentou o status de lenda deisputin. Beberrão inveterado, ele virou vários copos de vinho envenenado

tomeu bolo confeitado com cianeto sem sofrer qualquer efeito maléficobvio. Depois de esperar impacientemente durante uma hora que Rasputin,t;>rresse,um dos conspiradores, o príncipe Felix Yusupov, atirou nele com'i?1a pistola e, supondo que agora estava morto, deixou a sala por algunsstantes. Quando voltou, Rasputin estava atravessando o pátio na direção

a barragem do rio Neva. Mais dois tiros finalmente o mataram e seu corpo,esado foi jogado no Neva."

As revoluções de 1917

A remoção de Rasputin não serviu em nada, porém, para salvar o antigoy~!egime. Na segunda metade de 1916 e no início de 1917, o fator crucial era'.0 crescente descontentamento no exército russo. Os "camponeses de unifor-

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me", (Orno Lenin os chamou, estavam cansados da guerra. Em outubro de .1916, ao serem enviados para reprimir uma greve em Petrogrado (como SãoPetersburgo fora rebatizada em 1914), soldados atiraram na polícia, e nãonos trabalhadores. Na Primeira Guerra Mundial, bem mais de um milhãode soldados russos foram mortos, mais de quatro milhões ficaram feridose cerca de 2,5 milhões foram feitos prisioneiros." A promessa bokheviquede paz e terra tinha muito mais repercussão popular em 1917, mas a revo-lução que pôs fim a mais de trezentos anos de dinastia Romanov (fundada ~em 1613) foi uma completa surpresa para a maioria dos revolucionáriosmarxistas. Três dos mais famosos deles - Nikolay Bukharin, Leon Trotskie uma mulher que se tornaria membro proeminente do primeiro governobolchevique, Alexandra Kollontai - estavam em Nova York na véspera,da revolução de fevereiro." Como quase todos os principais bolcheviques,Lenin também estava morando no exterior na época. Em janeiro de 1917,em uma palestra para uma plateia escassa em Zurique, em comemoraçãoao décimo segundo aniversário da revolução de 1905, ele claramente nãotinha o menor indício de que a revolução na Rússia era iminente, emboranão duvidasse de que acabaria acontecendo. Lenin disse: "Pode ser que nós,mais velhos, não vivamos para ver as batalhas decisivas da revolução quese aproxirna.?" Lenin estava, então, com 47 anos.

Em 12 de março, no calendário moderno, e 27 de fevereiro, no calen-dário juliano, aconteceu a primeira das duas revoluções de 1917. O czarficou tão surpreso quanto Lenin. Em 7 de março, ele escrevera da frentede batalha para sua esposa: "Sinto imensamente falta de minha meia hora dejogo de paciência toda tarde. Vou recorrer novamente aos dominós em meutempo livre."2N Na véspera do dia decisivo do que ficaria conhecido como aRevolução de Fevereiro, quase todas as fábricas de Petrogrado estavam em I

greve, houve saques generalizados e os motins se espalharam pelas guar-nições posicionadas na capital russa." O clímax se deu quando a Dumatentou tomar o poder em suas próprias mãos e formou uma comissão que setornou o núcleo de um governo provisório. Simultaneamente, um Soviete deRepresentantes dos Trabalhadores foi formado em Petrogrado, tendo comomodelo a instituição que existira por um breve período em 1905. Combi-nados, a Duma e o Soviete assumiram o comando. Percebendo que umagrande parte do exército estava com ele, o Soviete se rebatizou de Soviere deRepresentantes dos Trabalhadores e Soldados. A maioria dos ministros dogoverno foi presa e quando o czar tentou voltar a Petrogrado, seu trem foidesviado. Nicolau IIabdicou em 15 de março. Foi convencido por generais

:, D a assumira o controle e de que havia sérias dúvidas sobre al:}uea um , , ' ., 'd d arnicões de Petrogrado se estas fossem solicitadas a agir em~eU~ ~ , _ " "'f O trono foi oferecido ao grão-duque Mikhail, que apoiara ade esa- , , -

"I - de Fevereiro Ele teve o bom-senso de recusá-lo. Mas nao teve, o uçao . " d" ' - de Lenin para emigrar e fOI morto a tiros por um grupo e, rffilSsao ,,' '

h," em junho de 1918 Um mês depois, Nicolau Il, a imperatrrz,.evlques . , ''andra, suas quatro filhas e o caçula, que era ~emofth(O, foram bru-';' t assassinados em Ecaterimburgo, nos Urais, onde estavam sendoen e , f 'I" '"d m prisão domiciliar. A decisão de exrermmar a arni Ia mterra

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dela alta liderança dos bo\chevlques, na qual se me uia erun.a a p " _.bolcheviques não haviam tido, porém, qualquer parucipaçao no• pôs fim à dinastia dos Romanov. Os mencheviques - algunsque I ' "

uais eram ativos no Soviete de Petrogrado - e os revo uClona~lOslistas tiveram uma pequena participação na Revolução de Fevereiro.

;."importante foi a agitação espontânea, juntament~ com os esforçosberais da Duma para forçar o czar a sair e introduzir um governo efi-t~. Na sucinta avaliação de um dos principais historiadores da Rússia;culo XX, Sheila Fitzpatrick, "a autocracia ruiu em face das manifes-es populares e da retirada do apoio da elite ao regi~e"Y O fato de queército não estava preparado para defender esse regime acabou sendo o

't:decisivo para pôr fim ao governo monárquico na Rússia. ,Lenin conseguiu voltar à Rússia apenas por gentileza d:s autonda~es, às, que ficaram satisfeitas por facilitar o retorno, da Suíça, de, a,lgue~causaria problemas no campo inimigo e que se opunha à pa,rt~Clpaçao

§'a na guerra. A ideia de voltar à pátria de trem, cO,m ~ COOlvenCla doo-comando alemão (e em um vagão trancado), havia Sido de Martov..in, por sua vez, ficou feliz por alguns mencheviques, assim ~omo ,oscheviques, fazerem essa rota de volta à Rússia, uma vez que ISSOSl~-cava que os mencheviques não conseguiriam utilizar sua colaboraçao. d DL '

s alemães como uma arma para bater nele e em seus alia os. erun e'grupo de revolucionários chegaram à Estação Finlândia, em, Petrogrado,

uco antes da meia-noite de 3 de abril de 1917. Durante a viagem, ele se, , d ""r d Ab '\" Estasupara escrevendo um documento que chamana e leses e fi.

-:o pediam abertamente a derrubada do governo provisório recentemente~tabelecido, mas implicitamente rejeitavam a ideia marxista ortod~xa deue deveria haver um longo período de regime burguês antes de a SOCiedade

, star pronta para a revolução socialista. E na chegada a Petrogrado, quando•~iscursou para uma multidão de vários milhares de pessoas, em CIma do teto

72 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

de um carro blindado fornecido pelos bolcheviques locais, sua mensagemfoi de que não deveria ser oferecido apoio algum ao governo provisório e deque a tarefa dos socialistas genuínos era pôr fim ao capitalismo na Rússiae em toda a Europa."

O governo provisório da Rússia em 1917 foi chefiado primeiramentepelo príncipe Georgi Lvov, membro do partido Cadete, e,a partir de julho,por Alexander Ker~:~~x,~~ocialista politicamentemoderad6, de tempe-ramento um tanto b,~is<Y. Sob seus dois líderes, o governo provisóriofracassou principalmente de três maneiras. Prirrieiro, prosseguiu com aguerra em um momento de grande desgaste no conflito. Embora agoraa Alemanha e seus aliados estivessem perdendo a guerra, o progresso dosaliados da Rússia era obscurecido pelo sucesso da propaganda bolchevi-que. Segundo, o governo não conseguiu dissolver o exército privado - aGuarda Vermelha - que os bolcheviques haviam rapidamente formado.Terceiro, não conseguiu lidar com o problema das terras. Os camponesesreivindicavam mais terras, e alguns deles ocuparam à força terras de grandesproprietários. O governo provisório insistiu que não podia tomar qualqueratitude nessa questão até que fosse formada uma Assembleia Constituinte ,e adiou a convocação da assembleia, aumentando a impaciência pública.Um Congresso de Sovietes foi realizado em junho de 1917, e logo depoiso Soviete de Petrogrado emitiu a Ordem N° 1, dirigida às forças armadas.Esta instruía os soldados a obedecer ao governo provisório somente se asordens deste não divergissem das ordens do soviete. Foi claramente um atoexecutivo do tipo que somente um governo deveria ter o direito de apro-var. Entretanto, os sovietes estavam rapidamente adquirindo poder semautorização, enquanto o governo provisório, que tinha autorização, estavarapidamente perdendo poder.

O período foi corretamente descrito como sendo de "poder dual" e,como tal, não podia durar - e não durou. Não tinha nada em comum comuma separação de poderes acordada, mas sim significava que havia doisorganismos competindo pelo pleno poder dentro de um Estado. Mais desetenta anos depois, quando o Estado soviético chegava ao fim, em 1991,uma forma de poder dual (com o presidente e o legislativo russos medindoforças com o presidente e o legislativo soviéticos) teve novamente importanteparticipação no colapso de um regime. No segundo caso, porém, não haviauma divisão ideológica aguda como no ano em que o governo Comunistanasceu. Em 1917, Lenin e Trotski, as duas figuras-chaves na derrubada dogoverno provisório, decidiram que os sovietes - que cresciam tanto em

AS REVOLUÇOES RUSSAS E A GUERRA CIVIL 73

.'meros quanto em apoio popular - seriam um instrumento adequadoira a próxima revolução. Além de seu slogan "Todo o poder aos sovie-'" os boJcheviques prometiam "liberdade, pão e paz". Eles não queriam,'Imente todo o poder nas mãos dos sovietes até que os controlassem,:s progrediram nessa direção ao longo do ano. O partido dos Socialistas'olucionários (SR) continuava sendo o mais popular entre os camponeses,';os bolcheviques eram mais bem organizados.sso não quer dizer que naquele ano de revoluções o partido bolchevique'~s'ecom a disciplina que Lenin evocara em Que fazer? Pode-se dar - e

'do dada - ênfase demais na organização bolchevique para explicarcesso em 1917. A disciplina rígida do partido viria mais tarde, mas

e era um momento de grande expansão nos números do partido e deeSdivergências abertas entre seus líderes, inclusive na questão crucialse os bolcheviques deveriam tomar o poder à força." Um exemplo

.da falta de unidade entre os bolcheviques foi o que aconteceu emde 1917, quando uma multidão de marinheiros do porto de Krons-

, juntamente com soldados e trabalhadores de fábricas de Petrogrado,jciparam de uma grande manifestação nas ruas sob a palavra de ordemo poder aos sovietes", com a intenção de derrubar o governo provisório

;bponto de vista de Lenin, aquilo foi perigoso e prematuro. Levouisão de vários bolcheviques, bem como de Trotski (que só integraria,'ãlmente o partido bolchevique a partir do início de outubro). Foramidas ordens para a prisão de Lenin e, como agora se espalhavam rumoresue ele era um agente alemão, ele decidiu buscar segurança na Finlândia.surreição de esquerda dos "Dias de Julho" foi seguida, em agosto, de,tentativa da extremidade oposta do espectro político de assumir O

role. O general Lavr Kornilov tentou conduzir suas tropas a Petrogrado; reprimir os sovietes e o perigo que ele via de uma revolução socialista.~àvaque Kerensky receberia bem essa ajuda. Apesar de inicialmente serivalente, a resposta de Kerensky acabou sendo hostil e, de qualquer

dó, ferroviários obstruíram e desviaram os trens de soldados. Kornilov'preso, embora mais tarde tenha participado de uma guerra civil contrabolcheviques, morrendo em uma batalha, em 1918.

.mbora longe de estarem unidos, em 1917 os bolcheviques eram orga-'zacionalmente mais fortes que os SR e muito mais implacáveis que os. ncheviqu~Sua insistência intransigente em condenar um compromisso- --I

m o governo provisório e sua "disposição para tomar o poder em nome1:l revolu'ção proletária" ganharam a simpatia dos trabalhadores urbanos, . .

"

! j

74 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO AS REVOLUÇOES RUSSAS E A GUERRA CIVIL 75

e de soldados e marinheiros insatisfeitos." Lenin e Trotski conquistaramgrande influência sobre o soviete de Petrogrado e sobre outros. Em 12 deoutubro, no calendário antigo, Trotski assumiu o comando da ComissãoRevolucionária Militar do Soviete de Petrogrado e, em 25 de outubro (7 denovembro no calendário moderno), os bolcheviques tomaram o poder em .Petrogrado. Tropas bolcheviques ocuparam prédios públicos e prenderam.ministros do governo provisório. Kerensky fugiu e viveu ate.1970, a maior'parte do tempo nos Estados Unidos.

\~!!lbora 7 de novembro tenha entrado para a história como o dia dabem-sucedida revolução bolchevique, em muitos aspectos esta foi mais umgolp'~ue uma revolu窺,--Substituiu um regime estabelecido como re-sultado da revolução anterior (em fevereiro), que inicialmente tivera amploapoio. Quando tomaram o poder, os bolcheviques não eram o partido mais 'popular da Rússia. Isso ficou bastante claro nas eleições para a AssembleiaConstituinte, realizadas em dezembro de 1917. Naquele ano, os bolchevi-ques haviam apoiado - com objetivos de propaganda - a realização daseleições, e permitiram que estas fossem adiante. Os SR conquistaram 299cadeiras, contra 168 dos bolcheviques. Entre os outros partidos, os maioreseram os SR de Esquerda com 39, os mencheviques com 18 e os Cadetes !

com 17.36 Quando a Assembleia Constituinte foi aberta, em 18 de janeiro,os bolcheviques a dissolveram. O primeiro dia da Assembleia foi tambémo último. Nas palavras de Lenin: "A dispersão da Assembleia Constituintepelo regime soviético é a eliminação total e aberta da democracia formal- ------em nome da ditadura revolucionária.::J

o poder bolchevique e a guerra civil

Uma das figuras mais respeitadas do movimento marxista internacional,Karl Kautsky - que na juventude conheceu pessoalmente Marx e Engels- escreveu em 1918 um livro intitulado A ditadura do proletariado, ar-gumentando que a "ditadura revolucionária" de Lenin estava muito longedo que Marx tinha em mente ao usar (muito raramente) a expressão "di-tadura do proletariado". Marx, escreveu Kautsky, não quisera dizer queisso erá "uma forma de governo'v" Chegando mais tarde que socialistascomo Bernstein a uma compreensão sobre aonde as ideias de Lenin estavamlevando, Kautsky insistia agora:

;' .lutada classe proletária, como uma luta das massas, pressupõe democracia:-..J. Massas não podem ser organizadas ~ecretamente e, sobretu,do, uma

. çâo secreta não pode ser democrática. Isso sempre leva a ditadu-.~~ . . ..a de um único homem, ou a um pequeno grupo de lideres. Os membrosi.> ns só conseguem se tornar instrumentos para cumprir ordens. Esseomu irnid A':~todo pode ser considerado necessário a uma classe op~lml a naAausenCla

aemocracia, mas não promove o autogoverno e a independência dasí-~sas.Em vez disso, fomenta a consciência de Messias dos líderes e seus,i~jtoSditatoriais.39

y também observou que, "bem apropriadamente", os bolcheviques,.;parado de chamar a si próprios de sociais-democratas, e ag~ra "~e. iam como Comunistas"." Lenin ficou indignado com a sóbria ana-'autsky sobre o caráter antidemocrático da revolução bolchevique.

.já tivesse assumido as rédeas do governo, ele dedicou seu tempover uma resposta cáustica, A revolução' proletária e o renegado

ky, na qual a injúria substitui o argumento fundamentado. Como'y observou, os bolcheviques começaram a chamar a si próprios denistas em 1918. Dessa época em diante, o abismo entre os socialistas'~itavam os princípios da democracia e os Comunistas que raciona-

. m a ditadura em nome do poder de classe do proletariado aumentou

ez mais.t:•• bora os bolcheviques tivessem tomado o poder com surpreendente.. de, sustentá-lo durante os anos que se seguiram foi muito mais difícil.átamente depois da Revolução de Outubro, foi formado um governo

fdo Conselho dos Cornissãríos.do.Eczo.tou Sovnarkom no acrônimosSO).-1flü;º-Pr.esidia. ~rQt*i~~ y~rE.?~.comis~~!i?s.l~ relações-~x-és e 5tal' inQme.ªg9-f_Ql;tli~sáriQ .p'ªrªlL"!,ÇWnalidad.es.- O primeiroo Conselho foi'emitir um Decreto da Paz e um Decreto da Terra. Oéiro convocava os governos de todos os povos ainda em guerra a iniciar

;.iatamente negociações para uma paz sem anexação de territórios. Essaosta não teve resposta alguma, mas com seu exército primeiramenteoralizado e em seguida dispersado, a Rússia não estava em condições

:'ontinuar a lutar. Trotski anunciou em feverereiro de 1918 que a guerra·é. a Alemanha havia acabado e que o exército russo seria desmobilizado.da naquele mês, o exército foi reconstituído com o nome de Exército Ver-lho - o Exército dos Trabalhadores e Camponeses - mas sua primeira\;fa foi lidar com inimigos dentro do Estado, e não participar de uma

. 'erra europeia. Os alemães haviam respóndido à declaração de Trotski

11'11,

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76 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

ordenando que suas tropas avançassem para a Rússia e, assim, no início demarço de 1918, o governo soviético foi obrigado a aceitar termos de pazbastante desfavoráveis, que incluíam uma perda significativa do territórioque pertencera ao Império Russo, e a assinar o Tratado de Brest-Lirovsk,Entretanto, a reivindicação geral de fim da guerra fora atendida.

O Decreto da Terra também atendia a pelo menos uma parte substan-cial da opinião dos camponeses. Abolia a propriedade privada da terra e .estabelecia, em princípio, a propriedade conjunta desta por aqueles que:trabalhavam na agricultura. Entretanto, seguiu-se uma luta de classes no ;4

interior, em que os camponeses pobres se voltaram contra os camponesesmais ricos, com o incentivo dos bolcheviques. Os camponeses em geralresistiam, porém, às tentativas do governo revolucionário de levar, em re-quisições compulsórias, o alimento que eles produziam. Na guerra civil queestourou na Rússia em meados de 1918, os camponeses às vezes apoiavamo Exército Vermelho e às vezes o Exército Branco, mas a crueldade dosdois lados rapidamente os isolou. Originalmente, os bolcheviques haviamsuposto que seu exército poderia ser composto em grande parte por volun-tários, principalmente trabalhadores. Logo, isso provou ser insuficiente, eentão eles instituíram a convocação compulsória. Por iniciativa de Trotski,eles também recrutaram oficiais do antigo exército imperial, mas puseramcomissários bolcheviques ao lado deles para assegurar que se lembrassemde que lado estavam lutando.

Os Brancos eram um exército diferente de antibolcheviques, que natu-ralmente incluía também oficiais do exército imperial, embora entre seusvoluntários mais entusiasmados estivessem os cossacos, que séculos anteshaviam conseguido escapar da servidão colonizando uma terra vazia nosul da Rússia. Muitos deles lutavam para impedir que os bolcheviques inva-dissem o território que cultivavam livremente. Considerando a composiçãosocial da Rússia na época, não surpreende que a maioria dos soldados dosdois lados fosse de camponeses. Enquanto a maioria dos operários das fábri-cas era bolchevique, os camponeses eram profundamente ambivalentes emrelação à guerra civil. Os que podiam se manter fora do conflito o fizeram.Às vezes, eles recebiam bem os Brancos, para em seguida descobrir que estesqueriam restaurar o antigo sistema de propriedade de terras arrendadas, oque os levava a colaborar com os Vermelhos para expulsá-los. O que elesqueriam, conforme alguns explicaram, não era nem os Vermelhos nem osBrancos, mas um governo Verde, o que para eles significava proteção aosinteresses distintos das comunidades rurais.

AS REVOLUÇÕES RUSSAS E A GUERRA CIVIL 77

)i. No interior da Rússia, as forças antibolcheviques foram reforçadas'~" rn ajuda externa, principalmente dos tchecos. Pequenas forças brirâ-.co~ icas desembarcaram no país, em parte para impedir que equipamentosnl{fuilitares que haviam sido fornecidos ao antigo governo russo caíssem nas" ãos dos bolcheviques. Winston Churchill estava disposto a lançar uma

iI1siva total contra o novo regime soviético, mas David L10yd George, oitheiro-ministro britânico na época, identificou o novo governo com o povo'~so em geral e opinou que ninguém poderia derrotar a Rússia em solo.~o.A identificação dos bolcheviques com a Rússia foi uma simplificaçãoessiva uma vez que o país continuava profundamente dividido, embora

" . ,'Cismo de Lloyd George em relação à viabilidade de uma intervençãoar ocidental fosse sem dúvida justificado.'epois de as forças britânicas desembarcarem na Rússia, pequenosngentes foram enviados também por França, Estados Unidos, Itália,'dá e japão." Eles ajudaram, talvez, a adiar a derrota dos Brancos,

ªs'.não tiveram um papel decisivo. O elemento de intervenção externaêgrlificativo durante algum tempo foi a Legião Tcheca. Cerca de 40 mil'. fCOS - que haviam chegado para lutar contra a Áustria, já que seu

étivo era ter um Estado independente e, portanto, derrotar o ImpérioJlstro-Húngaro - estavam na Rússia na época da revolução bolchevique."mudança de regime no país interrompeu sua participação na guerra

opeia e, ao viajar pela Rússia, eles se viam às vezes em conflito com oército Vermelho. Os tchecos tinham treinamento e equipamentos supe-,es, e venceram inúmeras vezes essas escaramuças antes de voltarem para, terra natal. Em contraste, os britânicos e outros soldados enviados àissia para combater os bolcheviques eram muito poucos para influenciar

:tesultado final, embora a intervenção estrangeira na guerra civil tenhanhado grande proeminência na historiografia soviética mais tarde.~Já em dezembro de 1917 os bolcheviques criaram uma nova organiza-p chamada Comissão Extraordinária de Toda a Rússia para Co~ºaterC<;mtra!~evoiução ~-_;'S_~bQtagem, ~ais c;~~d;Peia-fu~~~-;b;eviada,5a, Cheka. Chefiada por Felix Dzerzhinsky, um revolucionário de origembre polonesa, a Cheka se tornou o principal instrumento do Terror Ver-

elho. Foi, na verdade, a sucessora da polícia política czarista, a Okhrana,. c bora uma variante mais cruel. Era muito maior do que sua predecessoraarista e, nos anos em que existiu, enquanto Lenin ainda estava vivo, matou

·~ercade 140 mil pessoas." Em suas encarnaçôes posteriores, como OGPUe, principalmente como NKVD, tornou-se um instrumento de prisões em

-

78 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

massa temido e uma máquina impiedosa de assassinatos. Na forma finalque assumiu na era soviética - a essa altura mais restrita politicamente- era conhecida como KGB. A Cheka foi criada como uma organizaçãotemporária, para lidar com a situação "extraordinária" que os bokheviquesenfrentavam quando tentavam se manter no poder, logo depois da revolução.Entretanto, como muitas instituições supostamente temporárias, sobrevi-veu e prosperou sob diversos nomes até o fim da UniâoSoviêtica.e-> e, decerta forma, até mesmo depois desse fim. Durante o período Comunista, apolícia política gostava de se referir a si própria como os "chekistas", umavez que isso lhe dava um certo elã revolucionário, mesmo quando atuava,nos anos 1970, em defesa de uma elite política conservadora e envelhecida.

A guerra civil terminou em 1922, com os bolcheviques triunfantes. Comocomissário de guerra, Leon Trotski havia sido eficiente e implacável, e aCheka também tivera sua participação violenta. A organização bolcheviqueera superior à dos Brancos. Lenin liderava o governo e Stalin desempenhavaum papel cada vez mais importante na organização do Partido Comunis-ta. Os bolcheviques haviam se rebatizado de Partido Comunista em 1919 '(embora a palavra "bolshevik" tenha sido mantida entre parênteses até1952).:Mas a força e organização não produziram sozinhas a vitória dos

, Vermeflios na guerra civil. Embora nessa fase ainda houvesse uma brigaaberta dentro do partido, os bolcheviques possuíam uma ideologia maiscoerente que a dos Brancos. Estes não apenas não conseguiram conquistar

, a maioria camponesa do país, como não produziram nem um líder de des-: taque nem uma ideia unificadora.]

4

"Construindo o socialismo": a Rússiae aUnião Soviética, 1917-40

j'-

nre os meses de agosto e setembro de 1917, Lenin usara seu tempo na,dia para escrever um livro, O Estado e a revolução, que não conseguiu-'ar.Em um pós-escrito à primeira edição, ele escreveu que seu trabalho

",'interrompido' em decorrência de uma crise política - a véspera dalução de Outubro de 1917", acrescentando que foi "mais agradável e útil\:pela 'experiência da revolução' do que escrever sobre ela".' Compara-que se seguiria à tomada do poder pelos bolcheviques, a obra parece'te da realidade. Mas Lenin ficou feliz por ser publicada mesmo depois'overno bolchevique ter começado. É razoável considerá-Ia parte de seua de crenças, em vez de uma dissimulação por motivos táticos, já queve qualquer relevância imediata para a tarefa de se manter no poder.tá claro que Lenin acreditava não apenas na ditadura do proletariado. bora, como Kautsky sugeriu, em um sentido diferente de Marx -"também no definhamento total do Estado. Mesmo que negue ser um~ta, Lenin oferece provas do utopismo que acompanhava sua brutali-escrevendo que "somente o comunismo torna o Estado absolutamente

ecessário, por não haver ninguém a ser suprimido - 'ninguém' no:dode uma cla~se ..."2 Ele aceitava que pessoas fossem culpadas indivi-mente por "excessos", mas nenhum dispositivo especial de supressão.necessário para lidar com elas. Isso seria feito "pelas próprias pessoasadas", Além do mais, "a exploração das massas, sua vontade e sua

'reza" é que eram a causa dos "excessos". Com a remoção dessa causa,excessos inevitavelmente começariam a 'definhar'".' Se Marx falara de

:a primeira - ou inferior - fase da sociedade comunista, Lenin preferia,amar a primeira fase de "socialismo" e o estágio posterior de "comu-mo".' Nessa fase posterior, a liberdade se combinaria à igualdade e a.'tinção entre trabalho mental e físico desapareceria - juntail1ente com o

80 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

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Estado. "Enquanto o Estado existir", escreve Lenin, "não haverá liberdade.Q~§!!:ldo houver liberdade, não haverá Estado algum."?

',,o Estado e a revolução de Lenin tem sido frequentemente consideradournà prova de um Lenin libertário ou democrático, e tem sido contrastadocom o Lenin de Que fazer?, com sua ênfase na hierarquia e na disciplinadentro do partido revolucionário. Tem sido usado para sustentar a alegaçãode que ele era um "humanista revolucionário", bem C9mO pOI: aqueles quequerem disranciá-lo da maneira como o sistema soviético s~desenvolveudepois de sua morte." De maneiras contrastantes, tem sido avaliado como "oalcance culminante do pensamento político de Lenin no período mais tardio

,de sua vida"? e como "o mais ingênuo e improvável de todos os famosospanfletos políticos'Vt) argumento mais essencial é de que mesmo nessa obrade reflexão sobre o Estado, com seu aparente apoio a uma democracia maisplena e mais libertá ria do que até então se vira no planeta, Lenin rejeitaqualquer tipo de pluralismo político. Ele ignora o fato de oue as liberdadesdependem de instituições capazes de defendê-Ias. O Estado e a revoluçãofoi adicionado aos fundamentos doutrinários do que se tornou um regimeextremamente autoritário (e mais tarde totalitário). Como A.]. Polan obser-vou corretamente: "A ausência central na política de Lenin é de uma teoriade instituições políticas [...]. A forma do Estado de Lenin é unidimensional.Não permite nenhuma distância, nenhum espaço, nenhuma apelação, ne-nhuma verificação, nenhum equilíbrio, nenhum processo, nenhum atraso,

, nenhuma interrogação e, sobretudo, nenhuma distribuição de poder."?A rejeição às instituições que sustentariam a responsabilização, as liber-

dades individuais e o pluralismo político se tornou uma característica dossistemas Comunistas. Mas as ideias e os objetivos utópicos dos Comunistasexerceram sobre seus simpatizantes uma atração poderosa. A chegada dosbolcheviques ao poder na Rússia, em 1917, não foi apenas uma questão dedisposição para usar a força contra o governo provisório. Não foi simples-mente um resultado das dificuldades econômicas, e menos ainda algo quetivesse sido economicamente determinado. Não foi também uma questão dehabilidade tática e força de vontade de Lenin e Trotski, embora isso tenha

_sido importante. !9i, além de todas essas coisas, uma vitória de ideias - da\- ideia de que o capitalismo estava condenado, da crença de que o proletariado\ estava destinado a suplantar a burguesia como classe dominante e construiria. o socialismo antes de se fundir e formar uma sociedade sem classes, autoadrni-! nistrada, ostentando o nome de "comunismo". Para uma parcela significativa

dos trabalhadores jovens, bem como dos intelectuais, esta foi uma doutrina.

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il~\;. ·CONSTRUINDO O SOCIALISMO·, A RÚSSl.... 81

~J\~~~,linspiradora. Aqueles que a adotaram acharam fácil desprezar as instituições:t~}fJ~~r1amentares e judiciais ne.ces~árias p,ara proteger as Iibe~dades individuais:';'~,~;i:i~;;comose elas fossem meras ilusões de otica da "democracia burguesa". IYi:~'~r(A democracia efêrnera, e de algum modo anárquica, inauguradapela, . "::'? ~RevoluçãO de Fevereiro poderia muito bem - considerando o descontenta-

:iliento na sociedade russa - ter levado também a uma mudança com di-.nsão revolucionária, mesmo na ausência de Lenin e Trotski. Se a eleiçãoAssembleia Constituinte, em que os bolcheviques obtiveram apenas

'quarto dos votos, tivesse tido permissão para vigorar, um governoI.ia lista não Comunista teria surgido. Suas ideias teriam sido diferentes,'~ém, daquelas que, após a morte de Lenin, tornar-se-iam conhecidas

o marxismo-Ieninismo. As próprias ideias de Lenin não permaneceram'ticas, e em seus últimos anos ele teve que modificar algumas delas à luz(brcunsrâncias. Mas mesmo quando fez um grande recuo na políticanômica, na tentativa de rranquilizar o maior grupo social do país-~~mponeses - ele não apenas intensificou a repressão aos opositores

~~icos como rotulou pejorativamente a dissidência dentro do Partidomunista de oposição, e no X Congresso do partido, em março de 1921,larou que era hora de "pôr a tampa" nessa oposição. lU

,;O Congresso de março aconteceu quase imediatamente depois da Re-- e Krons,!.,a_Qt,uma rebelião de marinheiros na base naval que estivera:\ianguarda da militância bolchevique em 1917. Em 1921, os anseios. .manifestantes eram essencialmente democráticos, e nem um pouco

,ráveis à restauração do antigo regime, como sugeriu a propagandahevique contra eles. As principais reivindicações dos marinheiros de

-nstadt eram uma reeleição imediata dos sovietes por voto secreto, liber-. e de expressão e de reunião, sindicatos livres, rações iguais para todos,ermissão aos camponeses para fazer o que quisessem com as terras,esde que não usem nenhum trabalho contratado"." Em um momento de:nqueza no Congresso de março de 1921, Lenin chegou a admitir que.rebeldes de Kronstadt "não querem os Guardas Brancos e não queremmbérn nosso poder"." Ele estava também cada vez mais preocupado com:grupos do Partido Comunista que questionavam o modo como as coisasavam indo, entre os quais o Oposição dos Trabalhadores, liderado por

,lexander Shlyapnikov. Não era bem uma facção organizada, mas aqueles..,;e pertenciam a esse grupo queriam que sindicatos e representantes dos~balhadores controlassem a indústria. Foram recebidos com a alegação

',e que somente o Partido Comunista podia estar na vanguarda do prole-

82 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

tariado, do contrário as "massas trabalhadoras" não conseguiriam resistiràs "pequenas vacilações burguesas" e seriam vítimas dos "preconceitossindicais"." Discordar de políticas importantes era algo essencialmenteclassificado como facciosismo ou oposição. Facções organizadas eramidentificadas quando mal existiam, e uma resolução sobre a "unidade dopartido" deslegitimou a dissidência dentro de suas linhas, embora só nos 'I

anos 1930 isso passasse a ser considerado traição. 14 .

Lenin, a NEP e a ascensão de Stalin

o aperto de parafusos político no X Congresso foi acompanhado, porém,de uma liberalização econômica. A tentativa, feita logo depois da revoluçãobolchevique, de nacionalizar toda a indústria e negar aos camponeses odireito de comercializar havia sido desastrosa. Havia famintos em muitaspartes do país e uma inquietação crescente. Consequentemente, Leninlançou a Nova Política Econômica - logo conhecida como NEP* - noCongresso de março de 1921. Em maio daquele ano, o decreto que na-cionalizara toda a indústria de pequena escala foi revogado. O Partidomanteve o "alto-comando" da economia - a indústria de grande escala,o sistema bancário e o comércio exterior - mas, em um recuo de grandesproporções, introduzia agora "uma forma de economia mista, com umaagricultura predominantemente privada, além de comércio privado e pro-dução privada em pequena escala legalizados".'! Ao longo dos anos 1920,a economia se recuperou, com a agricultura em particular se beneficiandodas novas liberdades. Entretanto, aqueles que lucraram com a restauraçãoparcial do capitalismo em escala pequena se tornaram conhecidos comohomens da NEP e ficaram em geral ressentidos.

O ano de 1922 foi especialmente significativo. Em abril, ]osif Stalin foi •escolhido, com aprovação plena de Lenin, para ocupar o novo cargo desecretário-geral do Partido Comunista. Na época isso não pareceu ser umacontecimento tão monumental, mas Stalin se tornou a única pessoa a sermembro dos três principais organismos executivos do partido: o EscritórioPolítico, ou Politburo; o Escritório Organizacional, ou Orgburo; e o Secreta-riado. O Orgburo foi fundido com o Secretariado em 1952, mas o importanteé que a partir de 1922 Stalin chefiou o Estado-Maior do partido, liderando

"Sigla em inglês para New Economic Policy. [N. do R. T.]

'CONSTRUINDO O SOCIALISMO": A RÚSSIA ... 83

t.~.:~i.{~~jO· Orgburo quanto o Secretariado. Como o Politburo - do qual Lenin<0.<., ãríto

. :·5:.J;:;:: . membro com maior autoridade - era, em princípio, um órgão mais

. J'<''-éfl:\' o .~~. "~oecomo grande pa rte da política era elaborada no Sovnarkom, presid ido

,':~ \':ó;Lenin, não ficou imediatamente óbvio em 1922 quais eram as alavancas~~'~pôderde grande potencial que estavam sendo postas nas mãos de Stalin.(,itibtanto, o poder já estava sendo transferido do Sovnarkom para os ór- .;Y~ó~.dopartido. O autor de um importante estudo sobre os primeiros cinco

'do Sovnarkom observa que "em 1921, o Comitê Central e seus órgãos;'~osestavam a caminho de se tornar o verdadeiro governo da República

'tca, enquanto a hierarquia dos funcionários do partido despontava'o instrumento-chave de domínio em todo o país".";'ótencial que o Secretariado-Geral representava teve uma oporruni-'inda maior de se tornar realidade quando, em maio de 1922, Lenin. m derrame. Este foi o segundo dos três acontecimentos com imensasuências de longo prazo que ocorreram naquele mesmo ano, sendo o

'iro a ascensão de Stalin ao cargo de secretário-geral. Lenin reassumiubrigações no outono, e no fim do ano se tornara tão crítico da arro-

'a de Stalin que concluiu que fora um erro pôr nas mãos do georgianoeres substanciais do Secretariado-Geral. Ele não era contra essesS, mas contra o contínuo exercício destes por Stalin.'? Não consegu iu,

rti, fazer o que queria: afastar Stalin do cargo. Sua saúde enfraquecerallíke um novo derrame em março de 1923 pôs fim efetivamente à suaira política. Morreu em janeiro de 1924. Com Lenin fora do caminho,;':passou o resto dos anos 1920 desacreditando seus rivais (muitostais haviam subestimado tanto sua habilidade quanto sua ambição),solidando seu poder. Trotski - embora tivesse desempenhado um}\mais importante do que Stalin em 1917 e na guerra civil, períodonte o qual os dois entraram em choque com frequência - destacou-se

eaqueles que cometeram o erro de ignorar a inteligência e a habilidaderica de Stalin, bem como de subestimar a importância da base política

. este adquirira no Secretariado."~Oterceiro acontecimento de grande importância a longo prazo aconteceu:fimde1922....>quando as quatro repúblicas sob governos comunistas - a'blica russa, a Ucrânia, a Bielorrússia e a Transcaucásia - juntaram-se

, a formar a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas - a URSS, oupião Soviétic~,-~~;;-õ's~tornõu mais co~heci.d~JYõõiTie1õideliberadamente.' ',blhidopara evitar a menção de qualquer nacionalidade específica, uma vez•ue a ideia por trás do nome era de que aos poucos outros países se tornassem

; I

II.

84 ASCENSAo E QUEDA DO COMUNISMO

parte da nova entidade socialista. A URSS foi criada como uma federação"embora ao longo de quase toda a era soviética tenha sido um Estado altam€nte:'centralizado, longe de cor responder aos critérios normalmente associados aofederalismo. Entretanto, dentro dessa federação formal que, nas palavras deStalin, seria "nacional na forma, socialista no conteúdo", abriram-se novaspossibilidades para o florescimento de culturas e línguas nacionais."

~.Esse último acontecimento teve um significado a longo prazo. Antes de1917, por exemplo, no caso importante da Ucrânia-,o nisso era a língua .de alfabetização - até onde isso era possível, -já que em 1920 apenas 24 "por cento da população ucraniana eram alfaberizados.ê" Apesar da faltade livros escolares e de outras dificuldades, essa realidade mudou nos anos,1920. Em 1927, 76 por cento dos alunos da república ucraniana frequen- ~tavam escolas de língua ucraniana." Alguns dos muitos idiomas falados!na Rússia só receberam uma forma escrita na primeira década depois da •.guerra civil. A política soviética, principalmente de 1922-23 em diante, era,reconhecer os numerosos territórios nacionais onde predominava uma ou !outra das muitas nacionalidades diferentes do país e treinar e promovera posições de liderança pessoas que pertenciam à nacionalidade local. Ao J

mesmo tempo, foram tomadas medidas para estabelecer a língua local como i

língua oficial nos territórios." As duas medidas tiveram consequências im- :portantes a longo prazo. Embora a partir do início dos anos 1930 e até pelomenos a morte de Stalin fosse haver uma reversão substancial na políticade "indigenização" dos anos 1920, o Estado comunista haviaplantado ..as primeiras s@e.ºg!~<!e_§~.a.jerradeira destruição, tanto 'p~o~ovend~ adisseminação da educação qua-õrõ-iõserlnâoestruturas nacionais em seusistema institucional a partir da constituição de 1922 em diarife.:

Stalin havia sido comissário para nacionalidades no governode Lenin e seconsiderava - e era considerado - um especialista nessa questão. Ao longodo tempo, porém, suas opiniões tomaram uma direção próxima ao chauvi-nismo russo. Conforme observado anteriormente, Stalin era um georgianocujo nome original era Djugashvili, sendo o nome Stalin apenas um de seuspseudônimos pré-revolucionários, derivado da palavra russa para aço (stal').Ele se tornou um admirador dos mais fortes e severos czares, que haviamgovernado com mão de ferro o território russo e o expandido, principalmenteIvan, o Terrível e Pedro, o Grande. Em outros aspectos também, Stalin seafastou das ideias e práticas de Lenin. Diferentemente de Lenin - bastantedisposto a empregar a arma do terror contra opositores da revolução bol-chevique, mas contente por vencer discussões com seus opositores dentro do

"CONSTRUINDO O SOCIALISMO": A RÚSSIA _ 85

r.i;h' -"'d Stall'n na época em que se sentia suficientemente poderoso, em~.~" 'rtl 0- , "')j~i'P~, danos 1930 usou o terror contra seus companheiros bolcheviques.*.0'." eados os' ._ ~\'~L"bém acabaria permitindo que um culto à sua personaltdade chegasse a

r~;Ip No fim dos anos 1930 isso incluiu até a atitude de as pessoas setremos. ' ._ " ~',.' ,. . prontamente em reuruoes publicas e conferenCias, cada vez que

'~vantarem , , ' ' " dos nc'. . ra mencionado. Era "uma especie de cultura física que to os nos,orne: disse Nikita Kruschev, sucessor de Stalin como líder soviético."tamos , , I XV 11 . " d'rentemente de Pedro, o Grande, que no final do secu o ,.e II11CIOo

I buscou ideias avançadas na Europa, Stalin, em seus últimos anos,tivou a propagação de uma versão absurda ,da história rus,~as~gu~do'!todas as principais invenções científicas - normalme~te, atnbUld~s~os marxistas ortodoxos esperariam) a países de economia e educaçao- vançadas - haviam sido previstas por u~ russo.,. . .rante a maior parte dos anos 1920, porem, Stalin fOIum leninista

inte ortodoxo. Embora Lenin tivesse sido pragmático o bastante paraQf. um bocado do poder pós-revolução nas mãos do novo governo ~ oynarkom, como algo diferente do Partido C~mul1lsta.- ~~ucos marxls.tas

.',de 1917 haviam concedido um papel maior, em pnncipio, a um partido, linado e revolucionário do que o próprio Lenin. Assim, o fato de oo se revelar como um instrumento mais poderoso de domínio do que

erno (no sentido soviético do termo), como aconteceu nos anos 1920,-.dificilmente estranho à tradição bolchevique. O que se tornou umaura do Partido Comunista não era chamado como tal pelos líderesRSS. Eles descreviam seu governo tanto como um "poder soviético"

nto como uma "ditadura do proletariado". Também alegavam cada'&ais, principalmente a partir da época da adoção da "Constituição deh" em 1936 que o regime era democrático., , .enhuma dessas três atribuições fazia muito sentido. Os sovietes tive-

, ,'alguma importância no ano revolucionário de 1917, mas ainda .assi~()i.ó partido bolchevique que tomou o poder em novembro. A partir dai,

ovietes nunca foram os principais órgãos de poder político. Duranteprimeiros anos pós-revolução, os ministérios (ou comissariad~s, comoim conhecidos) foram talvez ainda mais importantes do que a liderança

9 partido nas decisões políticas, mas isso mudou em 1921. Nos anos sub-:quentes, ficou especialmente claro que a liderança do Partido Comunistan,ha poder e autoridade superiores aos do Sovnarkom (que em 1946 se'.fnou Conselho de Ministros)."."Ditadura do proletariado" também não era um nome apropriado. ?.rOletariado em geral não podia ditar. Era o Partido Comunista que fazia

86 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

isso em nome do proletariado. A liderança do partido simplesmente assumiuque representava a vontade dos trabalhadores - ou, pelo menos, a "verdn.deira vontade" deles, se pelo menos reconheciam os verdadeiros interessesdeles - e substituiu o verdadeiro proletariado por ela própria. Para uma"ditadu ra do proletariado" ser compatível com uma noção mínima de de-mocracia, seria preciso presumir, primeiro, que 00 proletariado constituía amaioria absoluta da população, o que na URSS dos anos 1"920 estava longede ser verdade (em 1926, os moradores urbanos ieprésentavamapenas 18por cento da população), e, segundo, que dentro do proletariado não havia 'diferenças de opinião reais e persistentes, algo que nunca foi verdade naRússia nem em qualquer outro lugar.iK"noção de unidade de opinião den-tro de qualquer classe trabalhadora, não importa como ela seja definida, édificilmente menos fantasiosa do que a ideia de que um consenso universalseria alcançado na sociedade comunista do futu~~~4

~_.. --.:.

A revolução de Stalin

As concessões feitas aos camponeses pela Nova Política Econômica nãoforam populares entre muitos cidadãos comuns Comunistas. A partir demeados dos anos 1920, Stalin assumiu duas posições importantes criadaspor ele mesmo. A primeira delas era a possibilidade do "Socialismo em umsó país". Ou seja, ele argumentou que mesmo sem revoluções em paísesindustriais avançados, a URSS poderia prosperar de maneira independente.Isso lhe deu uma arma política para atacar Trotski, cujo internacionalismopodia ser representado como uma falta de patriotismo. A linha de Stalin foibem aceita entre os trabalhadores do partido que não gostavam da ênfasede Trotski na necessidade de os comunistas tomarem o poder em outrosgrandes países europeus.o A segunda - e intimamente ligada _ ênfase deStalin foi na importância primordial de uma industrialização veloz, acom-panhada de uma coletivização forçada da agricultura. Entre 1928 e 1932,cerca de 12 milhões de pessoas deixaram suas vilas, principalmente homensjovens.w Algumas foram enviadas para trabalhos forçados por resistiremà coletivização, ou foram presas como kulaks, nome dado aos camponesesmais ricos. "Kulak" era, porém, algo tão imprecisamente definido, quequalquer pessoa que se opunha à incorporação compulsória de sua vila,juntamente com outras vilas, a uma única e vasta fazenda coletiva podia serenquadrada nessa categoria. Outros camponeses migraram voluntariamentepara as cidades visando a indústria em desenvolvimento.

·CONSTRUINDO O SOCIALISMO": A RÚSSIAo_o 87

'. d c ndeu uma guerra indiscriminada contra os kulaks e a im-alto ele _ ~ _;ão de uma coletivizaçâo brutal- até a resistencia dos camponesesal

çfazer um recuo tático. Em muitas regiões, os camponeses.pre-- O a I __

;' atar os animais de suas fazendas a colerivizá- os. Nos primeiros;> IDs de 1930, houve mais de 1.600 casos de resistência armada." Emese I' - d to -"bro de 1929, Stalin disse: "Passamos de uma po itica e imitar as o

. xploradoras do kulak para uma política de eliminar o kulakelas elâsse." No início de março de 1930, ele já estava adotando umalferenre, escrevendo um artigo para o principal jornal comunista,

,o qual dizia que alguns camaradas, em sua busca de coletivização,''cado "tontos com o sucesso". Hipocritamente, ele reclamou que

. usado a força de maneira inapropriada na criação de fazendasfi vez de permitir aos camponeses uma escolha."

tíivização forçada e a revolta maciça no interior tiveram consequên-í~eis. Milhões de camponeses foram arrancados de suas terras e, no':930, pelo menos 63 mil "chefes de família" haviam sido presos e'dos. Muito mais de um milhão de "kulaks" foram deportados entre'início de 1932.29 A coletivização aconteceu mais rapidamente na.do que na república russa, e quando a fome atacou, como resulta~oísição de grãos pelo Estado e dos tumultos no interior, a Ucrâniaiialmente atingida. No verão de 1933, cerca de cinco milhões de.haviam morrido. Corpos jaziam à beira das estradas e houve ca-:anibalismo. A fome atingiu seriamente o norte do Cáucaso e oistão, além da Ucrânia, e foi resultado direto das políticas adotadas

b5.cou - a combinação de coletivização compulsória e apreensão~os por autoridades centrais para alimentar as cidades e até paraação, enquanto as pessoas no interior soviético morriam de fome;!!]dicalização dá política foi acompanhada pela consolidação do po-

"·Secretariado-Geral. Por ordem de Stalin, Trotski foi enviado para[io interno na União Soviética em 1927 e expulso do país em 1928.fio resto de Sua vida no exterior, escrevendo críticas eloquentes ao que~:oude "a Revolução Traída" e "a Escola de Falsificação de Stalin"."'ora grande parte do que escreveu sobre a União Soviética fosse verdade,

algumas profecias bastante erradas. Por. exemplo: no fim dos anosacreditava que se a União Soviética se envolvesse em uma grande

a, isso levaria à derrubada do regime de Stalin, quando na verdade anda Guerra Mundial fortaleceu a ordem política stalinista. Embora

Ún tivesse muito mais coisas para pensar do que em Trotski, o fato de

88 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

que este estava fora do alcance de sua visão nunca significou que estivessefora ~~ sua cabeça. Com a ajuda de seus espiões, ele monitorou de pertoas atividades de seu rival derrotado durante as diversas viagens deste n. oextenor. Em 1940, a polícia secreta soviética conseguiu se infiltrar no am-biente de Trotski no México, e um dos assassinos da polícia o matou Comum golpe de picareta de gelo. .

Na fase da Nova Política Econômica de concessões aos -campones-g .Stalin tivera o apoio de uma das outras grandes figuras da liderança bol-:chevique, Nikolay Bukharin, que era, porém, um entusiasta muito mais'autêntico da NEP. Lenin havia visto essa mudança de rumo como umrecuo estratégico, e não tático - consequentemente, como algo que pre-cisaria durar várias décadas. Bukharin compartilhava essa opinião. Com'sua disposição para tolerar concessões à iniciativa privada, Bukharin era:considerado, no fim dos anos 1920, uma pessoa que estava à "direita" do'partido. Ele fora um aliado de Stalin na luta contra Trotski, que chefiava.a "oposição de esquerda". Stalin, em contraste, conseguira se caracterizar:durante grande parte dos anos 1920 como "cenrrista" e, depois de derrotara "esquerda", voltou-se para a "direita".

Isso envolveu uma mudança fundamental da política, não apenas oacerto de contas com potenciais rivais. As mudanças foram tão radicaisque têm sido alternadamente descritas como uma "revolução de cima parabaixo", "revolução de Stalin", "a segunda revolução", ou (sem fundir asrevoluções de fevereiro e outubro) a "terceira revolução". Simultaneamente,com a dramática mudança na economia, houve uma "revolução cultural"envolvendo uma revolta maciça de profissionais liberais e um esvaziamentode estudantes e professores de origem burguesa em instituições de ensino"

, 32 O fi d .supenor. m os anos 1920 fOI marcado não apenas pelo abandono daNEP e pelo início da coletivização forçada da agricultura, mas também, em ,1928, pela introdução do Primeiro Plano Quinquenal, criado para acelerardramaticamente a industrialização da Rússia. Stalin não teve dificuldade "'alguma para reduzir a influência de seu outrora aliado Bukharin, afastado do .Polit~~ro em 1929. Embora Bukharin tenha mantido uma posição frágil no ,Comitê Central do partido até meados dos anos 1930, Stalin o prendeu em ,1

1937 e em seguida, depois de um julgamento teatral, executou-o, em 1938 ..Para comunistas reformistas posteriores, inclusive alguns em meados dosanos 1980, Bukharin se tornou um símbolo de uma maneira não stalinistade "co~str~ir o socialismo'Lv Embora pessoalmente honesto e corajoso,Bukhann ajudara a construir um sistema fortemente autoritário que tornouincontrolável o poder bolchevique (que se transformou no poder de Stalin).

.CONSTRUINDO o SOCIALISMO": A RÚSSIA .. , 89

'::n discurso em 1931 muito citado, Stalin, depois de se referir à URSS~ossa pátria socialista", falou da necessidade de "desenvolver um

:bolchevique genuíno na construção da economia socialista", porquei~~'que ficam para trás são derrotados" e "nós nos recusamos a ser

, os". Ele declarou: "Estarnos cinquenta ou cem anos atrás dos paísesos. Precisamos cumprir essa distância em dez anos. Ou fazemos, tindaremos."34 Como foi feita precisamente uma década antes deoviética ser atacada por alemães nazistas, em 1941, a referência

, .avançar meio século, ou mesmo um século, em dez anos temtas vezes celebrada como um tributo a sua visão de futuro. Dez:ais, a URSS de fato tinha uma base industrial que podia atenderi ;pIa indústria de armamentos, bem como recursos para vencer

ír'desesperada e longa contra a Alemanha.o pago pela industrialização foi, porém, terrível. E Stalin não:tão longe quanto acreditavam seus admiradores comunistas em

·~Wtdo.Ingenuamente, ele fez um pacto com Hitler em 1939 que nãoque este rompesse com um ataque surpresa, como fez em junho de

despreparo da União Soviética para a guerra havia sido imensamenteo pelos expurgos de Stalin. Por algum motivo, ele confiou em Hitlerue confiou em muitos altos oficiais que haviam lutado no Exército

o durante a guerra civil. No fim dos anos 1930, eliminou grandesunidades de oficiais do Exército. Assim, a União Soviética sofreuaiores nas primeiras fases da guerra no front russo do que teria:,seuexército estivesse preparado e liderado de maneira profissional.

Transformação social e repressão .polltica

,mudanças políticas e sociais diferenciaram a União Soviética dos30 daquela dos anos 1920. Na década de 20, Stalin, por meio de..80S apelos aos membros comuns do partido, bem como por meioe recursos do Secretariado, derrotou politicamente seus potenciais

'o Partido Comunista. Na década de 30, ele os destruiu fisicamente., rção da carnificina será mais comentada logo adiante, mas o regimeiveu não apenas devido ao brutal emprego do terror contra os inimi-ssem eles reais ou imaginários. Prevaleceu também porque parecia

'. r a esperança de um futuro melhor, fazendo as pessoas acreditaremistória estava do lado delas. Além disso, consolidou-se porque mesmo

Ó prazo houve muitos vencedores, bem como perdedores.

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f~~' .90 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMOf~t!,jj,~,j , 'CONSTRUINDO O SOCIALISMO": A RÚSSIA,." 91

Os Comunistas no poder empreenderam um grande programa educaJ(t~·::~..i' cllrsoS superiores e setornar profissionais em diversas ocupações - tais'li; ''' .. ,/,' j'Jjizer '

cional. Na época da eclosão da Primeira Guerra Mundial, menos de 40~'} '~:~;;c~moengenheiros, arquitetos, médicos e muitas outras especialIzações. Opor cent~ da população do Império Russo.era alfabetizada. Em 1926, eSSa ,; i:{,':i~normeimpulso à industrialização foi po_rsi só res.ponsá~el.r0r grande parteproporçao aumentara para um pouco mais de 50 por cento, embora hou, ·lt~.;;F~ssamobilidade SOCIal- modernização ao estilo stalinista , Os aspectosvesse grandes discrepâncias entre áreas urbanas e rurais e entre homens e ':ais terríveis do sralinismo também contribuíram a seu próprio modo paramulheres. No interior - onde o grosso da população ainda vivia em meados ',.obilidade social. O expurgo de centenas de milhares de pessoas (muitasdos anos 1920 - dois terços das mulheres eram analfabetàs:'s O início dos: ías mortas, outras enviadas para campos de trabalho forçado) produziu umanos 1930 foi marcado por uma ênfase ainda maior do que a dos anos 1920 i\riero equivalente de vagas. Na medida em que um número muito maiorno crescimento dos níveis de alfabetização. Estendeu-se o número de anos! ..'nte!ectuais e colarinhos-brancos do que de trabalhadores manuais eraque as crianças passavam na escola e foram criadas mais turmas de alfabe.·'inado nos expurgos, as perspectivas de ascensão dos novos beneficiá riostização de adultos. Enquanto em 1926 apenas 39 por cento das mulheres. ' ucação soviética aumentavam de maneira correspondente.e 73 por cento dos homens na Rússia rural sabiam ler e escrever, em 1939, ' ~:1exanderZinoviev, que ganhou renome como estudioso no campo dade acordo com fontes oficiais soviéticas, esses percentuais (possivelmente ta formal, e depois uma fama muito maior como autor de um relatoinflados, embora não se possa averiguar o quanto) haviam se tornado 79 astadoramente brilhante e satírico sobre a política e a sociedade so-por cento no caso das mulheres e 95 por cento no caso dos homens." Nos icas, The Yauming Heights (cuja publicação no Ocidente, durante oanos 1920, havia enormes diferenças nos níveis de alfabetização entre uma " 'Ódo de Brejnev, levou à sua demissão do trabalho acadêmico e à suanacionalidade e outra. Nessa época, 45% dos russos sabiam ler e escrever,'equente emigração para a Alemanha), descreveu o que aconteceu emmas na outra extremidade da escala estavam quirguizes, uzbeques, cheche- ' própria família:nos, turcomanos e tadjiques, que tinham índices de alfabetização inferiores 'a 5 por cento. Havia, em outras palavras, uma enorme divisão leste-oeste . ntes da Revolução,80 por cento, se não 90 por cento, da população russadentro do país, bem como uma divisão por sexo." 'a decamponesesqueviviamem nívelde subsistência,na baseda pirâmide

Juntamente com uma sociedade industrializada, o Partido Comunista' 'cial. Eles tinham vidas miseráveis,apenas um pouquinho acima do nível. d . 'o·~s servos. A Revolução produziu mudanças. "o mecornoexemplo minha

estava mteressa o em errar sua própria nova elite, promovendo trabalha- .,. l'

d d.i;Ópriafamília, que eradecamponeses.Como resultadodacoletivizaçãoda

ores e camponeses e e ucando a eles e seus filhos. Nisso, o partido tevesucesso. A União Soviética teve sete líderes em sete décadas, e somente o ' gricultura, meus pais perderam tudo o que tinham. Mas meu irmão mais

~1,i1Oacabou subindo e se tornando gerente de fábrica; o segundo irmãoprimeiro tinha profissionais instruídos entre seus antepassados. O pai de Ifihegouà patente de coronel;outros três irmãos se qua i caram como en-Lenin, conforme observado no capítulo 2, teve uma carreira tão bem-su- , h . . f d U' id d de M scou Ao mesmoen erros,e eu me tornei pro essor a nrversi a e 1 o .cedida na Rússia czarista, que foi promovido à nobreza. Stalin era filho . empo, milhões de camponesesrussos receberam uma educação formal ede um sapateiro beberrão que durante algum tempo trabalhou por conta. )lguns deles se tornaram profissionais, homens e mulheres.Pprópria e depois em uma fábrica de sapatos. Dos quatro líderes soviéticos ':restantes - Nikita Kruschev, Leonid Brejnev, Yuri Andropov, Konstantin .Chernenko e Mikhail Gorbachev - apenas Andropov (filho de um funcio- .nário administrativo da ferrovia) não vinha de uma família de camponesesou operários." Milhares de p~ssoas de origem modesta ocuparam cargosem todos os níveis da hierarquia do partido.

De maneira mais geral, camponeses se tornaram operários e muitos ope-rários se tornaram gerentes. Filhos de operários e, em menor proporção, decamponeses tiveram a chance, em uma proporção até então impensável, de '

esar do terrível sofrimento infligido aos camponeses, muitos beneficiá-':'sda rápida mobilidade social, inclusive o próprio Zinoviev, chegaram ànclusão de que aquilo tudo valera a pena. Houve aqueles que tiraram um

Jhete menos afortunado na loteria da vida sob o regime de Stalin e tiveram'a opinião diferente. Entretanto, o sucesso na construção da imagem de

!;:tlincomo uma figura rígida mas paternal foi tanto, que inúmeras vítimas à'~~perada execução, ou realizando trabalhos forçados nos campo~, acharamque ele interviria em benefício delas se ao menos soubesse o quanto elas

92 ASCENSAo E QUEDA DO COMUNISMO 'CONSTRUINDO O SOCIALISMO": A RÚSSIA ... 93

estavam sendo tratadas injustamente. A maioria não culpou nem Stalin nemo sistema, interpretando seu destino como uma falha no funcionamento do 'sistema, e não como uma característica do próprio sistema.

O enorme número de pessoas que foram vítimas do terror do Estadonos anos 1930 excedeu muito o dos anos 1920. Nos característicos "jul-gamentos teatrais", as vítimas eram espancadas para recitar um roteiropreparado pela polícia política, admitindo crimes que não 'poderiam ter'imaginado, e menos ainda cometido. Estes eram~ma invenção d~ era do'"alto stalinismo" - o período que vai de meados dos anos 1930 até a ,;morte de Stalin. Mas naquela época, até mesmo um indício de oposição I

a suas políticas por parte de membros do Partido Comunista governanrslevava à prisão e, geralmente, à execução. Embora a ideia de assassinarseus camaradas do partido tenha sido impensável para Lenin, foi ele quem!serviu de instrumento para acionar a brutal máquina mortífera que Stalin ."criativamente desenvolveu".

Em dezembro de 1917, uma reunião do Sovnarkom presidida por Lenin festabeleceu a Cheka. Não houve sequer um decreto criando essa predecessora ;do NKVD e do KGB. A rigor, a Cheka não tinha uma base legal, mas isso não Iinibiu seu funcionamento. Os principais propulsores da fundação desse braçopolítico e punitivo da polícia do Estado foram o próprio Lenin e o revolucio-nário polonês que se tornou o primeiro chefe da Cheka, Felix Dzerzhinsky.t"A disposição de Lenin para usar a violência de maneira brutal é ilustrada em .uma carta enviada por ele a Vyacheslav Molotov, que mais tarde se tornariaum dos aliados mais próximos de Stalin, presidente do Sovnarkom e ministro 'do Exterior soviético. Escrevendo em 19 de março de 1922, Lenin declarou:"Quanto mais representantes do clero reacionário e da burguesia reacionáriaconseguirmos matar, melhor. Neste exato momento, precisamos ensinar aesse público [essa lição], para que durante várias décadas eles sequer ousemsonhar em qualquer resistência.?" Ainda assim, o uso do terror por Leninfoi muito mais seletivo do que por Stalin, e foi direcionado contra opositoresda revolução bolchevique, e não contra aqueles que a apoiavam (como foi ocaso de dezenas de milhares de vítimas de Stalinj.?

O primeiro julgamento de pessoas que realmente haviam colaborado I

com autoridades soviéticas foi o de engenheiros de origem "burguesa" con-siderados culpados desabotagem, em 1928, no que ficou conhecido comoJulgamento de Shakhty. Mais de cinquenta engenheiros e técnicos que í

trabalhavam na bacia de Donetsk (Donbass), na Ucrânia, foram acusadosde sabotagem. O julgamento marcou o lançamento de uma campanha

\~ada contra "destruidores", embora a maioria das provas de sabo-': ~deliberada contra os acusados de Shakhty fosse frágil. Aqueles que'~~~ram o crime o fizeram sob pressão. Cinco dos réus de Shakhty"leXecutados em julho de 1928 e a maioria dos outros ficou presa.

"foram libertados.43 Comparados ao período entre 1928 e 1931, os"uatro anos que se seguiram - entre 1932 e o primeiro semestre

.~ foram uma espécie de pausa para respiração antes dos Grandes'&~de 1937-38.'.

MULHERES NA SOCIEDADE SOVIÉTICA

·asmuitas transformações sociais ocorridas nesse período da história.~,uma das maiores foi a da posição das mulheres. Essa transfor-'tai,rflIonge de ser a autêntica libertação das mulheres proclamada. aganda soviética, mas um dos primeiro atos dos bolcheviques, foi pô-Ias em pé de igualdade legal com os homens. Embora astenham sido levadas para a força de trabalho industrial e espe-

.~ da União Soviética em uma proporção muito maior do que na'pré-revolução, a maioria delas, que era de camponesas, há muito

,desempenhava um papel importante na economia rural- partici-~da ceifa, da limpeza dos terrenos e do enfardamento do feno, bemcuidando da horta, além de assumir praticamente todas as tarefastjcas, incluindo cuidar dos filhos." Mas, fosse casada ou não, a'n~o tinha direito a heranças - exceto seus dotes de noiva e alguns

s domésticos - enquanto um parente do sexo masculino vivesse'a.em algumas regiões tenha havido exceções para viúvas]." Mudar

utura legal ajudou - ainda que devagar e muito parcialmente - ar profundamente atitudes sociais enraizadas.

os primeiros anos do governo Comunista, o controle religioso sobrernento e o divórcio foi abolido, apenas o casamento civil era reco-

ido e o divórcio se tornou fácil e barato. O aborto foi legalizado em,I embora fosse visto não como parte da libertação das mulheres, masq um mal necessário e temporário. O aborto sancionado pelo Estadobrigatório para ajudar a reduzir a grande incidência de mortes asso-

}.as a abortos ilegais." As mulheres sob o governo soviético hão apenas~~am direito a um trabalho remunerado, como eram solicitadas a integrar:9rça de trabalho, o que a grande maioria delas fez. Até a guerra estourar

tempo de guerra, as condições se tornaram devastadoramente piores),

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'I,I

94 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO .CONSTRUINDO O SOCIALISMO": A RÚSSIA ... 95

as mulheres na União Soviética tinham que cumprir a famosa jornada du-pla, combinando o trabalho em horário integral em fábricas, campos ouescritórios com a responsabilidade total (mais frequentemente do que não)pelas tarefas domésticas. E elas tinham que fazer isso sem os instrumentosfacilitadores do trabalho - cada vez mais disponíveis às mulheres ociden_,tais - ao mesmo tempo que enfrentavam filas e escassez de produtos, o;'que era parte indissociável da economia soviética. Isso, não simplesmente"porque a URSS tinha uma economia de comando, e ~ão' de mercado.

. "mas porque as prioridades políticas dos planejadores estavam na esfera da ,:indústria pesada e de defesa, com um concomitante subdesenvolvimento dosetor de serviços e da produção de bens de consumo." O aspecto positivofoi que a rápida melhoria das oportunidades de educação para as mulheres'permitiu a uma minoria significativa delas obter qualificações profissionais e .oportunidades de carreira que antes de 1917 estavam disponíveis a poucas.Outras, porém, viram-se realizando pesados trabalhos braçais que antesnão eram desempenhados por mulheres, pelo menos no ambiente urbano. ,

Nos anos 1930, outras mudanças legais e sociais ocorreram na posição 'das mulheres na sociedade soviética. Paradoxalmente, Stalin - à luz de ,sua notável contribuição para reduzir o número de cidadãos soviéticos pormeio de execuções - ficou preocupado com o tamanho insuficiente dapopulação. As condições de vida eram tais - apartamentos comunitários 'apertados nas cidades, em conjunção com a jornada dupla das mulheres- que para os moradores urbanos era extremamente difícil ter famíliasgrandes. As autoridades soviéticas decidiram que a resposta a esse problema :era tornar o divórcio mais difícil, o aborto ilegal e celebrar a família comoinstituição. Um decreto de junho de 1936 proibiu o aborto, exceto quandohouvesse fortes motivos médicos, e em novembro do mesmo ano as exce-ções se tornaram sujeitas a critérios mais rigorosos. Essas medidas foram !acompanhadas de uma ampla campanha de propaganda sobre os perigosdo aborto, sem qualquer referência aos riscos ainda maiores de interrompera gravidez com praticantes de aborto ilegais. Foram oferecidos incentivosfinanceiros a famílias grandes, sendo o bônus especialmente alto para cadafilho além dos primeiros dez de uma família. Os beneficiários dessa genero-sidade do Estado eram predominantemente camponeses, e não moradoresde cidades. Os últimos, no entanto, se beneficiaram de uma ampliação dascreches e clínicas pediátricas, como parte do incentivo à natalidade." Na 'mídia soviética, havia uma nova ênfase à santidade da família. Como ob-servou David L. Hoffmann, "Em meados dosanos 1930, a percepção das

.~, idades soviéticas sobre as famílias evoluíra. Elas não apenas viam as~ias fortes como um meio de maximizar o índice de natalidade como:aram a achar que a família devia incutir os valores e a disciplina so-os nos filhos e, portanto, atuar como um instrumento do Esrado.?".bora tivessem alguma coisa em comum com as políticas pró-natali-de outros países, as políticas soviéticas para promover uma taxa deidade maior tinham também características distintas. As mulheresincentivadas a continuar trabalhando durante a gravidez e a voltar aolho depois do parto. Em 1936, o Politburo aprovou um decreto que'ti·delito criminal recusar trabalho a uma mulher grávida ou reduzir'fgamento durante a gravidez. E "em nenhum momento, durante a

ha para aumentar a família, as autoridades soviéticas sugeriramgar da mulher era em casa"."

.lÍtica cultural mudou em vários aspectos nos anos 1930, inclusive na. ntação visual das mulheres. A mulher musculosa e totalmente vestida'da em cartazes e na mídia durante o Primeiro Plano Quinquenaligar, em filmes e jornais, a imagens de mulheres que enfatizavam aÜidade.51 De maneira mais geral, os anos 1930 tiveram alguma reabi-\. dos aspectos da vida burguesa, entre os quais as danças nos salões.

to os anos 1920 produziram mais uma "alta cultura" marcante, oo de 1932-36 teve uma expansão da cultura popular. O folclore -vezes um pseudofolclore - foi oficialmente incentivado, sem, porém,

'"gredientes religiosos. A título de contraste, esta foi também a "eralha do jazz", em que bandas ocidentais e soviéticas visitaram muitas~S.52Apesar da doutrina do "realismo socialista", que deveria permear'arte - e que na prática significava expor a degradação do capitalis-lorificando a vida soviética e sustentando um otimismo obrigatório

'elação ao futuro da sociedade - houve alguma arte popular de massa,,' te o período soviético. Nos anos 1930, aumentou muito o número-lnemas na União Soviética, mas à medida que a década avançou, os

. es estrangeiros mais populares eram vistos cada vez menos. A viradaem 1936, quando a repressão aumentou. A cultura de massa soviética

ornou mais completamente "foldorizada" e as importações se tornaramis profundamente suspeitas.P Os cidadãos soviéticos também foram

,resentados a uma versão artisticamente aprimorada e esterilizada de sua~pria experiência pós-revolução. Como observou, porém, o historiador do'ema soviético Richard Taylor, entre as duas guerras mundiais, as plateias'URSS preferiam Charlie Chaplin, Buster Keaton, Douglas Fairbanks e

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96 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

Mary Pickford a "tratores e a história do que deveria ser, afinal de contas,sua Revolução. Em outras palavras, preferiam escapar do realismo, pOrmais irreal que o realismo pudesse, de fato, ser"."

A ditadura pessoal de Stalin

Em diversos aspectos, no fim dos anos 1920, e principalmente depois doinício dos anos 1930, houve um grande salto para trás, assim como paraa frente." A celebração da data oficial do quinquagésimo aniversário deStalin - 21 de dezembro de 1929 - foi marcada pelo lançamento do quemais tarde seria chamado de "culto à personalidade". Embora isso tenhaajudado a sustentar o poder exagerado de Stalin, ele achava que isso também 'se adequava à psique russa. Pode-se argumentar que estava, pelo menos, 'de acordo com uma forte tradição russa. As revoluções de 1917 "haviamexpulsado em rápida sucessão tanto o czar quanto Deus, esses antigosapoios e focos de devoção". 56 Com a morte de Lenin, seguida rapidamenteda remoção de Trotski do poder e de seu subsequente exílio, o regime foiprivado de seus líderes mais inspiradores, embora fortemente autoritários.Não era desejável recorrer à democracia como uma base de sua legitimidade,já que isso teria levado à rejeição eleitoral e à derrota do projeto leninista,conforme interpretado por Stalin. Dessa forma, como explica o historiadorbritânico john Gooding:

[...] o regime sob Stalin tomou um rumo antibolchevique, mas profunda-mente russo, de restauração do elemento carismático. Stalin fez isso comtanto sucesso, que no fim dos anos 1930 grande parte da população se tor-nara miseravelmente dependente dele. O objetivo de Lenin de um genuínoapoio maciço e de uma ligação verdadeira entre o povo e os governantes foi,assim, alcançado, mas alcançado por meios que nada tinham a ver com osocialismo ou com as ambições originais dos bolcheviques.F

o XVII Congresso do Partido Comunista, realizado no início de 1934, foichamado de "o Congresso dos Vitoriosos". Aparentemente, os inimigosinternos haviam sido derrotados, a coletivização da agricultura fora con-sumada e a rápida industrialização estava indo bem. O clima mudou como assassinato de Sergey Kirov, chefe do Partido Comunista em Leningrado(nome dado à antiga capital, São Petersburgo - rebatizada de Petrogradodurante a Primeira Guerra Mundial- depois da morte de Lenin). A morte

'CONSTRUINDO O SOCIALISMO": A RÚSSIA." 97

.' de Kirov, em dezembro de 1<134, levou a uma onda de prisões. Tem,~s. I do que o próprio Stalin foi responsável pela ordem de assas-especu a , '

fo tanto porque talvez o temesse como potencial rival, quanto talvez'o ~ma desculpa para iniciar uma novaonda de terro:. ~enhuma provatimplicidade de Stalin (fortemente insinuada ~or Nlkl~~ ,Kruschev em.

" o no XX Congresso do Partido Comunista Soviético, em 1956)~~ ,

.~ém! apresentada, mesmo depois da abertura parcial dos arqul~osícos no fim dos anos 1980 e início dos 1990. Certamente, porem,"e ~proveitou plenamente da atmosfera cri,ada pelo ass~ssinato de

ara acertar muitas contas. Alguns dos antigos bolcheviques marsentes, que haviam se oposto a ele nos anos 1920 e antes, entre

'igory Zinoviev e Lev Kamenev, foram presos, embora não tivessem~fálguma com a morte de Kirov. Ambos foram executados em 1936.<': tigo bolchevique Zinoviev não tinha relação alguma com o escritorder Zinoviev, cujo relato positivo sobre a ascensão profissional de sua

. já foi citado. O nome tipicamente ruSSO deste último era original,rigory Zinoviev e Kamenev haviam trocado seus sobrenomes judeus

;~t'ros, russos. Embora a suspeita de Stalin sobre os judeus fosse se'[ mais evidente nos anos posteriores à Segunda Guerra Mundial, já nos1930 a origem judaica não era recomendável aos seus olhos. Kamenev~r~muito as coisas tanto por se casar com a irmã de Trotski quantoa ocasião, oscilar na disputa entre Stalin e Trorski. No início dos anos,ele apoiara Stalin contra Trotski, porém mais tarde, naquela década,'imou-se da "oposição de esquerda". Foi expulso três vezes do Partido'~(~ista, e nas duas primeiras readmitido. Sua última expulsão, em 1?34,prelúdio de sua prisão, em 1935, e de sua execução no ano seguinte.'"poder pessoal de Stalin aumentara durante a primeira metade dos1930, mas foi com seus expurgos em massa, entre 1936 e 1938, que

ltimos vestígios do regime oligárquico deram lugar à ditadura pessoal.tn0 observa o historiador russo (e veterano pesquisador dos arquivos do

;ado russo) Oleg Khlevniuk:

\I

\

\

A tese do papel decisivo do "Grande Terror" na consolidação da ditadura, pessoal de Stalin tem sido aceita há muito tempo na historiografia, e novOSdocumentos a confirmam completamente. Valendo-se de órgãos punitivos,

. Stalin fez com que vários membros do Politburo fossem executados e subor-dinou seus colegas restantes com ameaças de violência a eles e suas famílias.[...] Líderes mais jovens levados para o Politburo por Stalin ascenderam [.. ,]

.CONSTRUINDO o SOCIALISMO": A RÚSSIA ... 9998 ASCENSÃO E QUEDA DO COMUNISMO

em uma tradição diferente, cuja essência era a lealdade pessoal a [Sralin],[...] Nessa nova ordem, decisões políticas cruciais eram uma prerrogativaexclusiva de Sralin. O Polirburo deixou de funcionar como órgão coletivoe foi substituído por reuniões de Stalin e certos colegas ... 5M

;ke piadas políticas, como a resposta à pergunta: "Qual é o povo mais{~. . do mundo?" A resposta era: "Os russos, porque uma em cada'raloso ..' d I' .<lic essoas é um informante, e ainda assim eles contam pIa as po in-atrop- . - .ad<~Na verdade, a proporção de IOformantes nao chega~a a ~n:em ~a. a

. as era grande o suficiente para tornar um relato a polícia polmcaro,rn.possibilidade terrível demais nos anos 1930 e 1940.) ., _ .., acontecimento que criou uma enorme fanfarra de autofehcltaçoesrn . 'd

''-:niao Soviética - e felicitações também de muitoS estrangeIros crer u-~ foi a adoção de uma nova Constituição soviética em 1936. Era, na;ii'de a terceira Constituição - as duas anteriores foram promulgadas

,18 e 1924 - e, em seu teor, a mais democrática. A de 1918 tinha,"~~plo, elementos indesejáveis privados de direitos, tais como clérigos"as as seitas e pessoas que usavam o trabalho contratado para seu10proveito. Em 1936, havia bem menos clérigos e nenhum explorad~rbalho alheio; e na nova Constituição ninguém era pnvado de direi-

'550 não teve, porém, absolutamente nenhuma consequência, porqueç,ições soviéticas tinham um único candidato. Em seu discurso de 25óvernbro de 1936 para apresentar a Constituição, Stalin a contrastou.~s Constituições de países burgueses, que eram puramente formais e às

continham restrições baseadas em sexo ou propriedade. Enaltecendo.Constituição como a mais democrática já vista até então, Stalin disse.ta propiciaria "não apenas liberdades democráticas", mas tambéms materiais" para obtê-Ias. "É compreensível", acrescentou ele, "que ocratismo do esboço da nova Constituição não seja em geral um demo-mo 'comum' e 'reconhecido universalmente', mas é um democratismo

Íista [ênfase no original]."62a verdade, a constituição superficialmente democrática tinha muitas

,'rições e maneiras' de limitar os direitos dos cidadãos - bem diferente-.::I).teda qualificação de "socialista" indicada pela compreensão de Stalin}s~alguém ousasse apelar a ela, contra o Estado ditatorial. Já o primei-.artigo afirmava: "A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas é umtado socialista de operários e camponeses." Isso punha imediatamente. intelectuais _ considerados na ideologia soviética um estrato socialferente, mas não uma classe - em certa desvantagem., O Artigo 125meçava: "Em conformidade com os interesses dos trabalhadores e a fim

" fortalecer o sistema socialista, os cidadãos da URSS terão garantidos (a)dberdade de expressão; (b) liberdade de imprensa; (c) liberdade de reunião,:,inclusive a realização de encontros de massas; (d) liberdade para procissões

"Socialismo", estilo Stalinista .

Os meados dos anos 1930 foram marcados pelo surgimento do que setornou conhecido como movimento stakhanovista. Conta-se que AlexeSt kh . . " ya anov, .um mmeiro, escavou 102 toneladas de carvão em um único'turno de seis horas em agosto de 1935", uma quantidade 14 vezes maiordo que a norma estabelecida pelos gerentes da mina.ê? As autoridad. d' 9ime latamente incen~ivaram outros mineiros a imitar o feito e, com isso,acelerar o desenvolvimento da economia. Embora alguns trabalhadorestenham sido inspirados pelo patriotismo ou pela "construção do socialis-mo" a. tentar fa~er. o mesmo, havia um grande elemento de subterfúrgioenvolv~do na maioria das conquistas dos stakhanovistas. Stalin alegou que~ ~ovlmen~o s~,ak~anovista era a expressão de "um novo tipo de compe- .nçao SOCialista ,diferente do antigo porque se baseava em novas tecnolo-gias.6u .Esses trabalhadores exemplares exigiam, porém, a colaboração do 'gerenciamento para criar o máximo de condições favoráveis, sem falar noexagero das ~statísticas sobre sua produção. E aqueles que conseguiamser reconhecidos como stakhanovistas naturalmente faziam outros tra-balhadores parecerem vagarosos, comparados a eles. Os stakhanovistastambém recebiam privilégios especiais, tais como acesso a bens escassos. 'Como resultado, os elogios feitos a eles na imprensa soviética não tinhamcorrespondente em termos de popularidade entre outros trabalhadores 'Isso é ilustrado por uma história dos anos 1930 sobre uma senhora surdaque entrou em uma fila na Rússia sem saber do que se tratava. Esta erauma prática comum na Rússia durante todo o período soviético. A maioriados bens e alimentos era escassa, portanto filas longas eram um sinal deque ~lgo se tornara disponível. Muitas vezes, as pessoas só perguntavam omotivo da fila depois de entrarem nela. Neste caso, a idosa quis saber: "Oque estão dando?" Alguém respondeu: "Um tapa na cara." E ela voltou a'perguntar: "A todos ou só aos stakhanovistas?"?' (Os soviéticos contavampiadas políticas mesmo na época de Stalin, embora a disseminação fossemenor do que nos períodos de Kruschev e Brejnev. Havia inclusive piadas

,,'

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100 ASCENSAo E QUEDA DO COMUNISMO ·CONSTRUINDO O SOCIALISMO": A RÚSSIA ... 101

e manifestações nas ruas." Nenhuma dessas liberdades existia realmentee os admiradores da Constituição de Stalin e da suposta concessão dessa'liberdades sentiram falta dessa ressalva na introdução do artigo. Se um:

. pessoa quisesse reivindicar essas liberdades, quem decidiria se ela estavaem conformidade "com os interesses dos trabalhadores" ou se suas a"õe

'" s,eram destinadas "a fortalecer o sistema socialista"? A resposta, é claro .~era a liderança do Partido Comunista e a políciapóíítica que cumpria a~'ordens de Stalin. .'

O discurso em que Stalin apresentou a constituição de 1936 foi, entre-tanto, importante. Foi nesse pronunciamento que, pela primeira vez, eledeclarou inequivocamente que a União Soviética se tornara um Estadosocialista. Até então, eles estavam "construindo o socialismo". Stalin :;cujo estilo didático incluía muita repetição intencional, de efeito rerórico .e pedagógico, declarou: "Nossa sociedade soviética já conseguiu produziro socialismo em sua maior parte; criou uma estrutura socialista, ou seja,realizou o que os marxistas chamam de primeira fase do comunismo, oufase inferior. Isso significa que já cumprimos em essência a primeira fasedo comunismo, do socialismo't.P

Em termos de autopercepção e ideologia soviética, este foi um momentoimportante em que se decidiu que o "socialismo" fora construído "em suamaior parte". Na realidade objetiva, porém, foi mais ou menos tão signifi-cativo quanto a alegação de que a sociedade soviética também se tornara :democrática em 1936. (Tenho mais a dizer adiante - no capítulo 6 - sobre'por que é muito mais preferível chamar esse sistema de Comunista e não',de socialista.) O que se tornou imediatamente óbvio foi que a Constituição _soviética de 1936 não anunciou uma era de respeito aos direitos humanos, .de democracia ou de liberdade. Na verdade, os dois anos que se seguiramforam os do Grande Expurgo, quando prisões e execuções adquiriram umanova intensidade e quando a revolução devorou tanto seus pais quanto seusfilhos - antigos bolcheviques que haviam sido companheiros de batalhade Stalin no fim do período czarista e na guerra civil, e pessoas que haviam ,ingressado no Partido Comunista quando este já estava no poder e quehaviam sido rapidamente promovidas a cargos elevados no partido e eminstituições do Estado. .

Quando, pela primeira vez, um líder soviético chamou atenção paraalguns crimes de Stalin, não foi surpresa que seu foco tenha sido 1937e 1938, porque esses foram os anos em que o terror se voltou com força

. total contra os membros do Partido Comunista, inclusive alguns bastante

< A pessoa que quebrou um tabu ao criticar Stalin foi Kruschev, e em~ .'frulo adiante será abordado o XX Congresso do Partido, em 1956,P . d .. d id~lele fez isso. Muito mais camponeses o que opera rIOS o parn o\p~esos ou mortos por ordem de"Stalin nos an.os 19~0, e antes disso:.padres e opositores "burgueses dos Comunistas tiveram o mesmo;'Eles foram ignorados em silêncio por Kruschev quando este chamou:i~para alguns crimes de Stalin. O tempo de serviços ao sistema de'pessoas executadas na segunda metade dos an~s 1930 era, porém,

" riante. Como aqueles que compareceram ao tribunal confessaram~omplôs - sendo a história de cada um deles corroborada por's, de acordo com um roteiro previamente ensaiado - a culparesumida por muitos embaixadores e jornalistas ocidentais, não. fato de que antigos bolcheviques estavam confessando estranhostriô se tivessem sido espiões alemães, britânicos ou japoneses. A

as'crédulos incluiu o embaixador americano em Moscou, ]oseph\s, que escreveu: "O testemunho extraordinário de Krestinsky,

rin e os outros parece indicar que os temores do Kremlin eram bem~do~. [...] Mas o governo agiu com grande rigor e rapidez. Os generais'tcíto Vermelho foram executados e toda a organização do partido~rgada e completamente limpa."64)" ev tinha uma opinião diferente sobre a legitimidade da violência

construção do socialismo e comunismo, e o que mais o chocoue de Comunistas dedicados. Sua plateia no partido ficou ainda

cada do que ele (que sabia muito mais) quando ele disse que "dos'bras e candidatos do Comitê Central do partido eleitos no XVIIse [em 1934], 98, isto é, 70 por cento, foram presos e executados

. _'ia em 1937-1938)".65 O mesmo destino, acrescentou Kruschev, teve,~r!a dos delegados desse Congresso (que, como ele lembrou à plateia,

amado de Congresso dos Vitoriosos). Dos 1.966 delegados, 1.108,resos sob acusações de crimes contra a revolução." Considerandoschev estava se dirigindo a delegados de um Congresso do Partido

imo), não é de surpreender que o relato oficial registre que sua re-.foi recebida com "indignação na sala".67

. 'havido muita controvérsia em relação ao número de pessoas presas e. em diversos períodos dos anos Stalin. Porém, a abertura dos arquivos

. :auma convergência para um cálculo médio (mas ainda assustador)19uns milhões a menos do que as estimativas anteriores mais altas e" milhões a mais do que as estimativas daqueles que subestimaram

i,,I. !

, .I •

102 ASCENSAo E QUEDA DO COMUNISMO. ,.,

a dimensão do terror de Stalin. Ronald Suny, editor de um importante '.recente vo.lume sobre a história russa no século XX, sugere que o "númer~total de vidas destruídas pelo regime stalinista nos anos 1930 está maisperto de 10-11 milhões do que dos 20-30 milhões estimados antes".68AnneApplebaum, autora de um estudo detalhado sobre prisioneiros políticos n .•União Soviética, chega ao cálculo de 28,7 milhões de trabalhadores forçado:e~ todo o período soviético. Ela inclui nesse número os "exilados especiais" .tais ~omo os "kulales" e outros de nacionalidades específicas.entre as quai:'os tar~aros e os alemães do Volga, deportados durante a Segunda Guerra;Mu/n~lal. Applebaum observa que um cálculo em torno de 78,6mil execuções:p~lltJcas entre 1934 e 1953 é hoje amplamente aceito, embora sua opinião j

seja de que o número verdadeiro é provavelmente bem maior do que esse.69A organização não governamental russa Memorial, dedicada a investigaros casos de repressão no período soviético, chegou mais recentemente aocálculo de 1,7 milhão de pessoas presas só em 1937-38, das quais, afirma ';pelo menos 818 mil foram executadas.7u '

Alguns dos primeiros expurgos foram uma consequência lógica da "escolha dos líderes soviéticos de não adotar o que Stalin chamou de "de- 'mocratismo comum" ou "democratismo reconhecido universalmente" mas'si~ de impor a vontade deles - e muitas políticas duras - à população por'meio de decretos ditatoriais. Outros expurgos, incluindo os de trabalhadoresdo partido e oficiais do Exército Vermelho, foram muito além da lógica dogoverno Comunista. Stalin era tanto alguém que acreditava piamente no mo- 'delo de leninismo que ele próprio desenvolvera, quanto uma personalidade'perturbada que, como Lenin reconhecera tarde demais nunca deveria tertido um grande poder posto em suas mãos. A medida que envelheceu, Stalinse tornou cada vez mais paranoico. Entretanto, sua experiência anterior à '.rev~luç~o fornecera um elemento lógico à desconfiança que mais tarde ele •.cu~tJvana. Quando era ativista revolucionário bolchevique, ele não conse- 'guira descobrir que um dos colegas nos quais confiava, Roman Malinovsky,:era agente da polícia secreta czarista, a Okhrana. E compensou essa cegueiraexageradamente e de maneira impressionante. A suspeita crônica, O amor ~ao poder (por trás de uma fachada de modéstia) e a sede de vingança setor~aram cada vez mais características proeminentes de sua personalidade.ASSim, o ~talinismo se tornou uma' forma distinta de Comunismo, cujosexcessos tiveram consequências devastadoras para a sociedade soviéticae cujos extremo~ se incorporaram muito mais do que era necessário paramanter um Partido Comunista no poder.

Jà da Grã-Bretanha, disse o primeiro-ministro David L10yd Georgevembro de 1918, era criar "um país adequado para os heróis vive-Soldados que voltaram dos horrores das trincheiras da Primeira'Mundial descobriram que nenhum país europeu correspondia aél de aspiração. Os trabalhadores - que haviam ficado calmos

e a guerra - ficaram cada vez mais agitados depois do conflito. Em'enhum momento no século XX a revolução no Ocidente pareceu ser.uma possibilidade remota. A principal exceção foi o período eritre.1920.1 Para um número significativo de operários, principalmente

s

s organizados em sindicatos, a Revolução Russa era uma inspiração,.'-tando a esperança de que a sociedade pudesse ser reconstruída sobre)J.ses. Os trabalhadores braçais formavam o maior grupo social nos'b~ldentais desenvolvidos, e um resultado natural da guerra foi umiú:eressepelo mundo além das fronteiras nacionais. Ao saudarem a~áa do czarismo e aprovarem a queda do Império Russo, mesmo osadores politicamente conscientes não viam, no entanto, com clareza ad.eda revolução bolchevique. Embora romantizada como uma tomada

l~er pelas mãos da classe operária, a revolução havia sido uma tomada'~er por revolucionários profissionais que eram uma minoria não apenasciedade russa, mas até mesmo entre os socialistas russos. Mas o que'bsequentemente chamado de "Grande Outubro" na União Soviética. Serconsiderado - e muitos inicialmente consideraram - a primeirativa séria, na paisagem de um país inteiro, de construir o socialismo..S bokheviques, por sua vez, esperavam que sua revolução desencadeassesérie de revoluções a oeste, na Europa. Na verdade, nenhuma tomada;der Comunista bem-sucedida e duradoura aconteceu antes do período

"êriorà Segunda Guerra Mundial. Entretanto, em 1921, um protetorado

5

o Comunismo internacional entreas duas Guerras Mundiais