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Revista SÍNTESE DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL ANO XVII – Nº 100 – MAR-ABR 2016 REPOSITÓRIO AUTORIZADO DE JURISPRUDÊNCIA Superior Tribunal de Justiça – nº 45/2000 Tribunal Regional Federal da 1ª Região – nº 20/2001 Tribunal Regional Federal da 2ª Região – nº 1999.02.01.057040-0 Tribunal Regional Federal da 3ª Região – nº 19/2010 Tribunal Regional Federal da 4ª Região – nº 07/0042596-9 Tribunal Regional Federal da 5ª Região – nº 10/2007 DIRETOR EXECUTIVO Elton José Donato GERENTE EDITORIAL E DE CONSULTORIA Eliane Beltramini COORDENADOR EDITORIAL Cristiano Basaglia EDITORA Simone Costa Salleti Oliveira CONSELHO EDITORIAL Ada Pellegrini Grinover, Antônio Carlos Marcato, Araken de Assis, Arruda Alvim, Ênio Santarelli Zuliani, Humberto Theodoro Jr., João Baptista Villela, José Carlos Barbosa Moreira, José Roberto Neves Amorim, José Rogério Cruz e Tucci, Nehemias Domingos de Melo, Ricardo Raboneze, Sérgio Gilberto Porto, Silvio de Salvo Venosa COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Aldem Johnston Barbosa Araújo, Clito Fornaciari Júnior, Eric Cesar Marques Ferraz, Gisele Leite, Guilherme Carvalho e Sousa, José Henrique Mouta Araújo, Leonardo Oliveira Soares, Marcio Evangelista Ferreira da Silva, Rogério Montai de Lima, Tiago Bitencourt De David ISSN 2179-166X

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Revista SÍNTESE Direito Civil e ProCessual Civil

ano Xvii – nº 100 – Mar-abr 2016

rePositório autorizaDo De JurisPruDênCia

Superior Tribunal de Justiça – nº 45/2000Tribunal Regional Federal da 1ª Região – nº 20/2001

Tribunal Regional Federal da 2ª Região – nº 1999.02.01.057040-0Tribunal Regional Federal da 3ª Região – nº 19/2010

Tribunal Regional Federal da 4ª Região – nº 07/0042596-9Tribunal Regional Federal da 5ª Região – nº 10/2007

Diretor eXeCutivo Elton José Donato

Gerente eDitorial e De Consultoria Eliane Beltramini

CoorDenaDor eDitorial Cristiano Basaglia

eDitora Simone Costa Salleti Oliveira

Conselho eDitorial

Ada Pellegrini Grinover, Antônio Carlos Marcato, Araken de Assis, Arruda Alvim, Ênio Santarelli Zuliani, Humberto Theodoro Jr., João Baptista Villela,

José Carlos Barbosa Moreira, José Roberto Neves Amorim, José Rogério Cruz e Tucci, Nehemias Domingos de Melo,

Ricardo Raboneze, Sérgio Gilberto Porto, Silvio de Salvo Venosa

ColaboraDores Desta eDição

Aldem Johnston Barbosa Araújo, Clito Fornaciari Júnior, Eric Cesar Marques Ferraz, Gisele Leite, Guilherme Carvalho e Sousa, José Henrique Mouta Araújo,

Leonardo Oliveira Soares, Marcio Evangelista Ferreira da Silva, Rogério Montai de Lima, Tiago Bitencourt De David

ISSN 2179-166X

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1999 © SÍNTESE

Uma publicação da SÍNTESE, uma linha de produtos jurídicos do Grupo SAGE.

Publicação bimestral de doutrina, jurisprudência e outros assuntos de Direito Civil e Processual Civil.

Todos os direitos reservados. Proibida a reprodução parcial ou total, sem consentimento expresso dos editores.

As opiniões emitidas nos artigos assinados são de total responsabilidade de seus autores.

Os acórdãos selecionados para esta Revista correspondem, na íntegra, às cópias obtidas nas secretarias dos respec-tivos tribunais.

A solicitação de cópias de acórdãos na íntegra, cujas ementas estejam aqui transcritas, e de textos legais pode ser feita pelo e-mail: [email protected] (serviço gratuito até o limite de 50 páginas mensais).

Distribuída em todo o território nacional.

Tiragem: 5.000 exemplares

Revisão e Diagramação: Dois Pontos Editoração

Artigos para possível publicação poderão ser enviados para o endereço [email protected]

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

REVISTA SÍNTESE DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL Nota: Continuação de REVISTA IOB DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL

v. 1, n. 1, jul. 1999

Publicação periódica Bimestral

v. 17, n. 100, mar./abr. 2016

ISSN 2179-166X

1. Direito civil – periódicos – Brasil 2. Direito processual civil

CDU: 347.9(05) (81) CDD: 347

(Bibliotecária responsável: Helena Maria Maciel CRB 10/851)

IOB Informações Objetivas Publicações Jurídicas Ltda.R. Antonio Nagib Ibrahim, 350 – Água Branca 05036‑060 – São Paulo – SPwww.iobfolhamatic.com.br

Telefones para ContatosCobrança: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900

SAC e Suporte Técnico: São Paulo e Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7247900E-mail: [email protected]

Renovação: Grande São Paulo (11) 2188.7900Demais localidades 0800.7283888

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Carta do Editor

Esta edição da Revista SÍNTESE Direito Civil e Processual Civil fala sobre outras questões do Novo Código de Processo Civil, que entrou em vigor em março de 2016.

O Assunto Especial desta edição trata do tema “Novos Paradigmas sobre o Novo CPC”, com a participação dos brilhantes juristas: Tiago Bitencourt De David, José Henrique Mouta Araújo, Leonardo Oliveira Soares, Marcio Evangelista Ferreira da Silva, Gisele Leite, Aldem Johnston Barbosa Araújo, Eric Cesar Marques Ferraz e Clito Fornaciari Júnior.

Ainda, na Seção “Em Poucas Palavras”, artigo de Guilherme Carvalho e Sousa intitulado “Dano Moral e Valor da Causa: Entre o Velho e o Novo CPC”; e, na Seção “Acontece”, artigo de Rogério Montai de Lima inti-tulado “A Data da Entrada em Vigor do Novo Código de Processo Civil –18.03.2016”.

O Código de Processo Civil trata das regras de andamento de todas as ações cíveis, que incluem as ações de família, de consumidores, pedidos de reparação de danos, questionamentos sobre contratos, entre outros. As normas também são aplicadas subsidiariamente na Justiça trabalhista e em outros ramos.

O objetivo principal do projeto é acelerar o andamento das ações cí-veis ao simplificar procedimentos, limitar recursos, incentivar a conciliação e determinar um rito específico para as ações de massa.

A principal inovação do texto é a criação do incidente de resolução de demandas repetitivas, que vai dar uma só decisão a várias ações que tratem do mesmo tema. Esse procedimento poderá ser aplicado nas várias ações que questionam contratos com operadoras de telefonia celular, em-presas de TV a cabo e outros serviços públicos.

É com prazer que a IOB deseja a você uma ótima leitura!

Eliane BeltraminiGerente Editorial e de Consultoria

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Sumário

Normas Editoriais para Envio de Artigos ......................................................................7

Assunto Especial

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

doutriNas

1. A Revogação da Gratuidade em Sentença, a (Des)Necessidade do Preparo da Apelação, a Competência da Primeira Instância para o Reconhecimento da Deserção e Brevíssimas Anotações sobre o Novel Regime de Preparo Recursal no NCPCTiago Bitencourt De David ........................................................................9

2. A Estabilização das Decisões Judiciais Decorrente da Preclusão e da Coisa Julgada no Novo CPC: Reflexões NecessáriasJosé Henrique Mouta Araújo ....................................................................18

3. Incidência de Multa pelo Não Comparecimento da Parte à Audiência de Conciliação nos Juizados Especiais da Fazenda PúblicaLeonardo Oliveira Soares .........................................................................43

4. O Novo Código de Processo Civil: a Evolução do Sistema JurídicoMarcio Evangelista Ferreira da Silva .........................................................52

5. Cuidados com a Entrada em Vigor do NCPCGisele Leite ..............................................................................................73

6. A Desconsideração da Personalidade Jurídica no Novo Código de Processo CivilAldem Johnston Barbosa Araújo ...............................................................79

7. Noções Elementares sobre Recursos no Novo CPC e Suas Principais AlteraçõesEric Cesar Marques Ferraz ......................................................................124

8. O Novo Perfil da Tutela ProvisóriaClito Fornaciari Júnior ............................................................................146

em PouCas Palavras

1. Dano Moral e Valor da Causa: entre o Velho e o Novo CPCGuilherme Carvalho e Sousa ..................................................................149

aCoNteCe

1. A Data da Entrada em Vigor do Novo Código de Processo Civil – 18.03.2016Rogério Montai de Lima .........................................................................152

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Parte GeralJurisPrudêNCia

Acórdãos nA ÍntegrA

1. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1542. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1663. Superior Tribunal de Justiça....................................................................1724. Tribunal Regional Federal da 1ª Região ..................................................1855. Tribunal Regional Federal da 2ª Região ..................................................1916. Tribunal Regional Federal da 3ª Região ..................................................1987. Tribunal Regional Federal da 4ª Região ..................................................2078. Tribunal Regional Federal da 5ª Região ..................................................213

ementário

1. Ementário de Jurisprudência Civil, Processual Civil e Comercial ............216

Índice Alfabético e Remissivo ...............................................................................244

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Normas Editoriais para Envio de Artigos1. Os artigos para publicação nas Revistas SÍNTESE deverão ser técnico-científicos e fo-

cados em sua área temática.2. Será dada preferência para artigos inéditos, os quais serão submetidos à apreciação do

Conselho Editorial responsável pela Revista, que recomendará ou não as suas publi-cações.

3. A priorização da publicação dos artigos enviados decorrerá de juízo de oportunidade da Revista, sendo reservado a ela o direito de aceitar ou vetar qualquer trabalho recebido e, também, o de propor eventuais alterações, desde que aprovadas pelo autor.

4. O autor, ao submeter o seu artigo, concorda, desde já, com a sua publicação na Revista para a qual foi enviado ou em outros produtos editoriais da SÍNTESE, desde que com o devido crédito de autoria, fazendo jus o autor a um exemplar da edição da Revista em que o artigo foi publicado, a título de direitos autorais patrimoniais, sem outra remune-ração ou contraprestação em dinheiro ou produtos.

5. As opiniões emitidas pelo autor em seu artigo são de sua exclusiva responsabilidade.6. À Editora reserva-se o direito de publicar os artigos enviados em outros produtos jurí-

dicos da Síntese.7. À Editora reserva-se o direito de proceder às revisões gramaticais e à adequação dos

artigos às normas disciplinadas pela ABNT, caso seja necessário.8. O artigo deverá conter além de TÍTULO, NOME DO AUTOR e TITULAÇÃO DO AU-

TOR, um “RESUMO” informativo de até 250 palavras, que apresente concisamente os pontos relevantes do texto, as finalidades, os aspectos abordados e as conclusões.

9. Após o “RESUMO”, deverá constar uma relação de “PALAVRAS-CHAVE” (palavras ou expressões que retratem as ideias centrais do texto), que facilitem a posterior pesquisa ao conteúdo. As palavras-chave são separadas entre si por ponto e vírgula, e finaliza-das por ponto.

10. Terão preferência de publicação os artigos acrescidos de “ABSTRACT” e “KEYWORDS”.

11. Todos os artigos deverão ser enviados com “SUMÁRIO” numerado no formato “arábi-co”. A Editora reserva-se ao direito de inserir SUMÁRIO nos artigos enviados sem este item.

12. Os artigos encaminhados à Revista deverão ser produzidos na versão do aplicativo Word, utilizando-se a fonte Arial, corpo 12, com títulos e subtítulos em caixa alta e alinhados à esquerda, em negrito. Os artigos deverão ter entre 7 e 20 laudas. A pri-meira lauda deve conter o título do artigo, o nome completo do autor e os respectivos créditos.

13. As citações bibliográficas deverão ser indicadas com a numeração ao final de cada citação, em ordem de notas de rodapé. Essas citações bibliográficas deverão seguir as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT).

14. As referências bibliográficas deverão ser apresentadas no final do texto, organizadas em ordem alfabética e alinhadas à esquerda, obedecendo às normas da ABNT.

15. Observadas as regras anteriores, havendo interesse no envio de textos com comentá-rios à jurisprudência, o número de páginas será no máximo de 8 (oito).

16. Os trabalhos devem ser encaminhados preferencialmente para os endereços eletrôni-cos [email protected]. Juntamente com o artigo, o autor deverá preen-cher os formulários constantes dos seguintes endereços: www.sintese.com/cadastro-deautores e www.sintese.com/cadastrodeautores/autorizacao.

17. Quaisquer dúvidas a respeito das normas para publicação deverão ser dirimidas pelo e-mail [email protected].

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Assunto Especial – Doutrina

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

A Revogação da Gratuidade em Sentença, a (Des)Necessidade do Preparo da Apelação, a Competência da Primeira Instância para o Reconhecimento da Deserção e Brevíssimas Anotações sobre o Novel Regime de Preparo Recursal no NCPC

TIAGO BITENCOURT DE DAVID

Juiz Federal Substituto da 3ª Região, Mestre em Direito (PUCRS), Especialista em Direito Pro-cessual Civil (Uniritter), Pós-Graduado em Direito Civil pela Universidad de Castilla-La Mancha (UCLM, Toledo/Espanha).

RESUMO: O presente ensaio trata da questão do indeferimento e da revogação da gratuidade em sentença, analisando a correção da aferição do preparo da apelação pelo juízo prolator do ato ataca-do. São estudadas as correntes que versam sobre o tema, apontando os respectivos argumentos, cotejando-os e valorando-os para, ao final, declinar posicionamento sobre o assunto. Inclui-se tam-bém, no escopo do estudo, a mudança do tratamento legal do preparo no Novo Código de Processo Civil.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Posição no sentido do processamento da apelação e conhecimento da (des)necessidade de preparo apenas pela instância superior; 2 Entendimento no sentido da aferição do requisito extrínseco do preparo já pelo órgão a quo; 3 O regime jurídico do preparo no NCPC; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

A questão sob análise consiste na postura jurídica adequada em face da apelação interposta sem o recolhimento das custas quando, na senten-ça, foi revogada a gratuidade. Duas possibilidades se abrem, a saber, (I) o recebimento do recurso, deixando-se a cognição sobre a (des)necessidade de preparo ao órgão ad quem, ou (II) a declaração de deserção do recurso, negando-se sua admissibilidade pelo Juízo a quo.

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1 POSIÇÃO NO SENTIDO DO PROCESSAMENTO DA APELAÇÃO E CONHECIMENTO DA (DES)NECESSIDADE DE PREPARO APENAS PELA INSTÂNCIA SUPERIOR

A doutrina (p. ex., Nery/Nery1 e Araken de Assis2) e a jurisprudência inclinam-se predominantemente pelo prosseguimento recursal para exame da instância superior sobre o acerto ou desacerto da recusa ao direito de acesso gratuito ao Poder Judiciário, recusando ao órgão jurisdicional a quo o exame sobre o cumprimento do preparo. Os argumentos para a negativa do trancamento do processamento da apelação são os seguintes:

a) direito ao duplo grau de jurisdição, de modo que admitir o não--recebimento em sede de 1ª instância significaria negar ao juris-dicionado a apreciação de uma decisão judicial pela instância superior;

b) o CPC/1939 previa expressamente a impossibilidade de negativa de seguimento ao recurso por falta de preparo quando houvesse a recusa ao reconhecimento da gratuidade postulada;

c) a Lei da Assistência Judiciária Gratuita (Lei nº 1.060/1950) con-templaria, em seus arts. 5º e 7º, uma sistemática recursal própria a obstar o controle de admissibilidade no que tange ao prepa-ro quando se tratasse de indeferimento ou revogação da gratui-dade.

Note-se que o entendimento jurisprudencial dominante filia-se a tal corrente, invocando sempre a garantia do duplo grau de jurisdição, ainda quase se faça isso de forma implícita, tal como quando se diz que a negativa de processamento poderá causar dano irreparável a quem eventualmente faça jus ao benefício. Exemplificando tal posicionamento, veja-se julgado do STJ:

Agravo interno. Agravo de instrumento. Republicação de decisão. Inclusão do nome de novo advogado. Violação à legislação federal não configurada. Dissídio não demonstrado. Assistência judiciária gratuita. Deserção. Prece-dentes do STJ. I – A republicação de uma decisão, por ausência do nome do novo advogado constituído pela parte, não afronta a legislação proces-sual, principalmente quando o pedido de juntada da nova procuração foi feito antes de sua publicação. Por isso, correto o acórdão recorrido que considera tempestivo o recurso, contando o prazo da nova intimação. II – A apelação da sentença que indeferiu o benefício da assistência judiciária

1 NERY, Rosa Maria de Andrade; NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil e legislação extravagante. 13. ed. São Paulo: RT, 2013. p. 1798 e 1799.

2 ASSIS, Araken. Manual dos recursos. São Paulo: RT, 2007. p. 205.

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gratuita não pode ser obstada pelo decreto de deserção, sem que a questão seja examinada pelo tribunal. Se denegado o requerimento, deve ser opor-tunizado o pagamento do preparo. Precedentes do STJ. Agravo improvido. (STJ, AgRg-AI 354.812, J. 03.12.2001)

Veja-se, ainda, que causa espanto que um dos precedentes jurispru-denciais citados para amparar tal posicionamento é o julgamento do Re-curso Especial nº 137.246, descurando de que, em tal caso, sequer houve decisão judicial sobre o pedido de gratuidade em primeira instância. Ou seja, o aresto invocado contempla situação absolutamente diversa daquela na qual há o enfrentamento do pleito, indeferindo-o ou revogando o deferi-mento. Pior ainda, o REsp 137.246 está superado pela jurisprudência atual do STJ (p. ex., AgRg-AREsp 499.310), que rejeita firmemente o “deferimento tácito”, de forma que assentou a necessidade do recolhimento de custas até que seja deferido o pedido.

Assim, observa-se que o cerne da tese é realmente o item “a” acima declinado.

2 ENTENDIMENTO NO SENTIDO DA AFERIÇÃO DO REQUISITO EXTRÍNSECO DO PREPARO JÁ PELO ÓRGÃO A QUO

Por outro lado, a corrente minoritária que sustenta o oposto, aduzin-do que a regra da exigência do preparo é previsão legal para a qual não foi igualmente prevista uma exceção nos casos de indeferimento/revogação da gratuidade. Representando tal entendimento, veja-se precedente do TJRS:

Apelação cível. Ensino particular. Ação de indenização por dano moral. In-terposição de recurso de apelação sem o respectivo preparo. Gratuidade de justiça revogada na sentença. Deserção configurada. Trata-se de recurso de apelação interposto pela parte ré em face da sentença de improcedência do pedido formulado na ação de indenização por dano moral. Ainda que forte corrente jurisprudencial admita a possibilidade de recebimento e conheci-mento do apelo no caso de revogação da AJG na sentença, entendo que a interposição do recurso sem o respectivo preparo fere o requisito extrín-seco de admissibilidade do apelo. A regra acerca da necessidade de com-provação do preparo recursal deve valer para todos nos termos do art. 511 do CPC, que determina a demonstração do recolhimento das custas no ato da interposição do recurso. A exceção se dá apenas nas hipóteses previstas no § 1º do art. 511 e no art. 519 do diploma processual, inocorrentes no caso em apreço. Desta forma, evidenciado que a interposição do recurso de apelação ocorreu sem a comprovação do preparo, o não conhecimento

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do recurso, por deserção, é medida imperativa. Apelação não conhecida. (TJRS, AC 70047776562, 6ª C.Cív., Rel. Sylvio José Costa da Silva Tavares, J. 01.10.2015)

Isso posto, vejamos se os motivos que sustentam a primeira corrente são adequados.

O duplo grau de jurisdição não ostenta caráter absoluto. Do contrá-rio, entre outros, o art. 34, caput, da Lei de Execução Fiscal seria incons-titucional. Na falta de regra expressa que contemple o duplo grau como garantia constitucional inarredável, revela-se inviável entender que todo provimento jurisdicional deve ser submetido ao crivo de autoridade judiciá-ria superior. Na verdade, nem mesmo se regra expressa houvesse a garantia seria absoluta, vez que é certa a admissão de restrições constitucionais im-plícitas e aplicação dos princípios/postulados/regras da proporcionalidade e da razoabilidade.

Quanto ao CPC/1939 e à LAJG, nenhuma das leis contempla expres-samente a sistemática advogada. Pelo contrário, nada é dito a respeito, le-vando ao entendimento contrário, a saber, da submissão ao regime normal de exigibilidade do preparo.

A primeira posição, aliás, contempla em si diversas dificuldades prá-ticas que revelam a ausência de lógica do entendimento. Isso porque, se o ato de indeferimento/revogação da gratuidade não pode obstar a subida do recurso subsequente, então, uma vez que se admita que a questão deve subir, independentemente de preparo, ao TJ/TRF, então, de igual modo, se um dos tribunais entender que se revela ausente o direito à gratuidade, logo os mesmos pretórios não poderão negar seguimento ao STJ e ao STF os re-cursos especial e extraordinário despidos do preparo.

O argumento de que o indeferimento da gratuidade, caso fosse adota-da a segunda corrente, estaria blindado à cognição do órgão ad quem tam-bém se mostra infundado. Afinal, a decisão que reconhece a ausência de cumprimento de requisito extrínseco para a apelação é agravável, de forma que se a instância superior entender devida a gratuidade logo determinará o destrancamento do apelo e seu regular processamento. Em última análise, há cognição em duplo grau sobre a (des)necessidade do preparo, mas de forma tecnicamente mais acurada, sem saltar-se sobre a primeira instância que, julgando deserto o recurso, verá então sua decisão ser agravada, hipó-tese na qual o tribunal decidirá sobre o (des)trancamento do apelo.

Portanto, mostra-se adequada a inadmissão da apelação quando inde-ferida/revogada a gratuidade ante a falta de preparo, isso já na 1ª instância.

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3 O REGIME JURÍDICO DO PREPARO NO NCPC

O preparo terá sua sistemática profundamente alterada com a vigên-cia do Novo Código de Processo Civil (NCPC). O art. 1.007 da novel codi-ficação assim dispõe:

Art. 1.007. No ato de interposição do recurso, o recorrente comprovará, quando exigido pela legislação pertinente, o respectivo preparo, inclusive porte de remessa e retorno, sob pena de deserção.

§ 1º São dispensados de preparo, inclusive porte de remessa e retorno, os recursos interpostos pelo Ministério Público, pela União, pelo Distrito Fe-deral, pelos Estados, pelos Municípios, e respectivas autarquias, e pelos que gozam de isenção legal.

§ 2º A insuficiência no valor do preparo, inclusive porte de remessa e de re-torno, implicará deserção se o recorrente, intimado na pessoa do advogado, não vier a supri-lo no prazo de 5 (cinco) dias.

§ 3º É dispensado o recolhimento do porte de remessa e retorno no proces-so de autos eletrônicos.

§ 4º O recorrente que não comprovar o ato de interposição do recurso, o recolhimento do preparo, inclusive porte de remessa e retorno, será intima-do, na pessoa de seu advogado, para realizar o recolhimento em dobro, sob pena de deserção.

§ 5º É vedada a complementação se houver insuficiência parcial do pre-paro, inclusive porte de remessa e retorno, no recolhimento realizado na forma do § 4º.

§ 6º Provando o recorrente justo impedimento, o relator relevará a pena de deserção, por decisão irrecorrível, fixando-lhe prazo de 5 (cinco) dias para efetuar o preparo.

§ 7º O equívoco no preenchimento da guia de custas não implicará a apli-cação da pena de deserção, cabendo ao relator, na hipótese de dúvida quanto ao recolhimento, intimar o recorrente para sanar o vício no prazo de 5 (cinco) dias.

Do artigo acima transcrito depreende-se que: (I) o preparo continua sendo exigido quando da interposição do recurso3; (II) a deserção não será

3 Deve ser feita ressalva em relação à Justiça Federal e ao JEC. Atualmente e enquanto não entra em vigor o NCPC, na JF a Lei Federal permite o recolhimento 5 (cinco) dias após a interposição da apelação, nos termos do art. 14, II, da Lei Federal nº 9.289/1996, que assim dispõe: “Aquele que recorrer da sentença pagará a outra metade das custas, dentro do prazo de cinco dias, sob pena de deserção; [...]”, e, por isso, Gilson Delgado Miranda (MARCATO, Antonio Carlos (Coord.). Código de Processo Civil interpretado. 3. ed. São

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mais automática, impondo-se a intimação para realização do preparo, em dobro; (III) quando realizado o preparo em dobro, ou seja, depois de não fazê-lo, ser intimado a fazê-lo e vir a fazê-lo, não se admitirá nova intimação para complementação no caso de insuficiência, ou seja, dada uma segunda chance, não haverá terceira; (IV) vício formal no preenchimento de guia não será causa de deserção, devendo o relator intimar o recorrente para corrigir o equívoco somente quando remanescer dúvida a respeito do efetivo paga-mento; (V) manteve-se a possibilidade de intimação para suprir a deficiência do preparo (art. 511, § 2º, do CPC); algo lógico, pois o NCPC veio a admitir até mesmo o pagamento da integralidade do preparo quando nada tenha sido pago até então, desde que de forma dobrada; (VI) no processo eletrôni-co, é dispensado o pagamento do porte de remessa e retorno, afinal não há custo de transporte de autos, mas trâmite digital – mas isso não dispensa o pagamento das custas do recurso. Como é permitida a realização do prepa-ro mesmo depois de não o ter sido feito, então perde sentido a rejeição da possibilidade de preparo após a interposição do recurso e dentro do prazo que existia na jurisprudência do STJ (p. ex., REsp 1114.478 e REsp 168.318), sendo admitido o preparo até mesmo depois do prazo recursal e antes de intimação para fazê-lo.

Infelizmente, perdeu o legislador a oportunidade de estabelecer ex-pressamente a possibilidade de recolhimento das custas no valor da con-denação naqueles casos no quais o autor atribui valor exagerado à causa em pedido de indenização por danos morais, valendo-se abusivamente da gratuidade judiciária. Mas isso não impede que se reconheça a suficiência do preparo com base no quantum da efetiva condenação, combatendo-se o abuso de direito e prestigiando-se o acesso à justiça, tal como feito no julgamento do AI 148.612-4 pelo TJSP. Note-se que o art. 292, V, do NCPC avançou ao exigir expressamente a identificação do valor da causa como o valor da indenização por dano moral, mas ainda assim não previu expres-samente a possibilidade da correção judiciária do valor ínfimo comumente atribuído por autor sem gratuidade judiciária ou absurdo, geralmente aposto por quem é beneficiário da justiça gratuita, de forma que o valor das custas para recorrer deveria ser, para o réu, aquele do valor da efetiva condenação. Espera-se que a jurisprudência conforte a correção judicial do valor da causa com fulcro no art. 292, § 3º, do NCPC, dispositivo este inovador em relação

Paulo: Atlas, 2008. p. 1752) diz que, “em suma, o art. 511 do CPC não alcança os processos de competência da Justiça Federal”. Entretanto, isso muda completamente com o NCPC, que, em seu art. 1.060, confere nova redação ao art. 14, II, da Lei Federal nº 9.289/1996, passando a ser exigido o preparo no ato da interposição do recurso, unificando a sistemática e harmonizando-se com o regime jurídico instituído pela nova codificação. No JEC, “o preparo será feito, independentemente de intimação, nas 48 (quarenta e oito) horas seguintes à interposição, sob pena de deserção”, conforme o art. 42, § 1º, da Lei Federal nº 9.099/1995.

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ao atual CPC e que estampa entendimento já encontrado na jurisprudência do STJ que tem admitido a correção de ofício do valor da causa para coibir abusos (p. ex., o recente julgamento do AgRg-EDcl-Ag 1404991).

Postos os termos do novel regime, cumpre a análise de sua influência no deslinde da vexata quaestio objeto do presente ensaio.

Digamos que o autor tenha pedido a gratuidade e tal pleito não tenha sido decidido até a sentença. Quando do julgamento da demanda, inde-fere-se a gratuidade. Ele apela da sentença e não efetua o preparo. Então sobrevém a questão: admite-se a apelação, deixando-se para o órgão ad quem examinar a presença do requisito extrínseco de admissibilidade ou a deserção poderia ser objeto de cognição já pelo Juízo a quo?

Com o NCPC, ainda que se entenda correta a aferição da necessida-de de preparo já em primeira instância, mesmo nesse caso a deserção não surge automaticamente, devendo o recorrente ser intimado a recolher em dobro as custas. Desse modo, dado que já em primeiro grau de jurisdição estará sendo oportunizado, então a possibilidade de controle pelo Juízo a quo soa bem menos gravosa do que no regime atual.

Então, o regime jurídico vindouro acaba por suavizar o impacto do posicionamento que defendemos, possibilitando o recolhimento das custas, mesmo depois de não o ter sido realizado, deixando-se de declarar auto-maticamente a deserção. Assim, torna-se ainda mais difícil sustentar a aferi-ção do preparo somente em sede de segunda instância, pois há ainda mais uma oportunidade para o recorrente regularizar pressuposto de tramitação recursal.

Acreditamos, firmemente, que, uma vez que se intime o recorrente para recolher as custas, dificilmente ou, pelo menos, imprudentemente, dei-xará ele de realizar o preparo, tornando-se mais arriscado insistir na desne-cessidade de preparo, visto que ficará escancarado aos olhos da autoridade judiciária superior que foi expressamente instado a fazê-lo, mas que preferiu apostar na continuidade do entendimento dominante anterior – que atribui caráter absoluto ao duplo grau de jurisdição –, mesmo quando oportuniza-do o preparo em primeira instância. Note-se que, ao lado do argumento do duplo grau de jurisdição, é certo que lastreia o entendimento majoritário a opinião de que seria muito severo, muito drástico, esperar que o recorrente fizesse o preparo depois de ver indeferida/revogada a gratuidade, mas é cer-to que o NCPC, ao dar uma segunda chance para o recolhimento das custas, acaba por atenuar bastante a dureza do entendimento de que a aferição

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deve dar-se já no Juízo a quo, favorecendo o entendimento que defendemos no presente estudo.

CONCLUSÃO

A polêmica a respeito da possibilidade de trancamento do processa-mento da apelação por falta de recolhimento do preparo após indeferimen-to/revogação da gratuidade em sentença tende a ganhar novos contornos após o advento do NCPC.

Como no art. 1.007, mais especificamente em seu quarto parágrafo, está prevista a intimação para realização do preparo, vedando-se a deserção automática, é certo que se torna ainda mais factível a decisão de inadmissi-bilidade da apelação já em primeiro grau de jurisdição, já que a severidade de tal entendimento no regime atual certamente influenciou a adoção da tese de que somente o órgão ad quem poderia realizar tal análise.

Com o advento do novel CPC, uma vez intimado o recorrente para recolher o preparo, sua omissão soará ainda mais grave e tende a haver maior aceitação por parte da jurisprudência e quiçá da doutrina a respeito da possibilidade de reconhecimento da deserção pelo mesmo órgão julga-dor que recusou a existência de direito à gratuidade.

Acerca do novel regime de preparo, revela-se inarredável o registro do progresso em relação à necessidade de oportunização da realização do preparo quando não tenha sido realizado e, ao mesmo tempo, impelindo ao pagamento ao dobro para desestimular que a parte se valha, de forma maliciosa, de tal expediente. A tolerância em relação a erros formais na guia também foi um avanço, sendo a parte instada a esclarecer o preenchi-mento somente quando remanescer dúvida a respeito do efeito pagamento. De igual modo, é adequada a submissão do regime de preparo na Justiça Federal quanto ao regime pelo NCPC, pois é injustificável a diversidade de procedimentos no que toca ao preparo. Enfim, o novel regime é superior, mas poderia ter avançado mais, submetendo o JEC ao quanto normatizado pelo NCPC em relação ao preparo e instituindo o pagamento de custas pelo valor da condenação, evitando as elevadas custas quando o valor da causa foi atribuído de forma bastante elevada por parte beneficiária da justiça gra-tuita, algo que acabou sendo minimizado pela autorização expressa para o controle judicial do valor da causa (art. 292, § 3º, do NCPC).

REFERÊNCIAS

AMARAL, Guilherme Rizzo. Alterações do novo CPC. São Paulo: RT, 2015.

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ASSIS, Araken. Manual dos recursos. São Paulo: RT, 2007.

DANTAS, Bruno; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduardo; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: RT, 2015.

MARCATO, Antonio Carlos (Coord.) Código de Processo Civil interpretado. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2008.

NERY, Rosa Maria de Andrade; NERY JUNIOR, Nelson. Código de Processo Civil e legislação extravagante. 13. ed. São Paulo: RT, 2013.

THEODORO JÚNIOR, Humberto. Código de Processo Civil anotado. Rio de Janeiro: Forense, 2008.

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Assunto Especial – Doutrina

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

A Estabilização das Decisões Judiciais Decorrente da Preclusão e da Coisa Julgada no Novo CPC: Reflexões Necessárias

JOSÉ HENRIQUE MOUTA ARAÚJO1

Pós-Doutor (Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa), Doutor e Mestre (Universidade Federal do Pará), Professor do Centro Universitário do Estado do Pará e da Faculdade Metro-politana de Manaus, Procurador do Estado do Pará, Advogado.

RESUMO: Um dos grandes temas do novo sistema processual diz respeito ao sistema de estabi-lização das decisões judiciais no curso do processo e das decisões já transitadas em julgado. No presente texto, portanto, será debatido como esta estabilização atinge os institutos como preclusão e coisa julgada, inclusive no que diz respeito à possibilidade dos seus efeitos atingirem terceiros e a questão prejudicial incidental.

PALAVRAS-CHAVE: Estabilização; preclusão; coisa julgada; terceiros; questão prejudicial; decisão interlocutória.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A preclusão das interlocutórias no CPC/2015; 2 Os vícios no curso do pro-cesso e o sistema de preclusão: a impugnação na apelação e nas contrarrazões; 3 As decisões par-ciais de mérito, a preclusão e a coisa julgada progressiva; 4 Os limites da coisa julgada e as questões prejudiciais: inovação a ser observada com cautela; Conclusões; Referências.

INTRODUÇÃO

Um dos temais mais importantes e complexos do CPC/2015 diz res-peito ao sistema de estabilização das decisões judiciais, incluindo a amplia-ção das situações jurídicas atingidas pelo fenômeno da coisa julgada.

A rigor, existem alguns textos2 em que se procura enfrentar o tema ligado à recorribilidade das interlocutórias e à preclusão das questões de-cididas no curso do processo. Com o CPC/2015, ocorreram modificações

1 Site: www.henriquemouta.com.br.2 Sobre o tema, ver, entre outros: ARAÚJO, José Henrique Mouta. Coisa julgada progressiva & resolução parcial

de mérito. Curitiba: Juruá, 2007; e, do mesmo autor, o artigo “Tutela antecipada do pedido incontroverso: estamos preparados para a nova sistemática processual?” Revista de Processo, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 116, 2004.

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importantes ligadas diretamente a esses temas, que acabaram por provocar a necessidade de reanálise completa deles.

Destarte, do ponto de vista histórico, os questionamentos ligados à estabilização decorrente da preclusão e da coisa julgada, com reflexos na recorribilidade das decisões no curso do processo, ganharam espaço com as reformas ocorridas ainda durante a vigência do CPC/1973. Naquele mo-mento, várias modificações nos artigos ligados ao sistema recursal foram consagradas para, de um lado, garantir a atribuição de efeito suspensivo ao agravo pelo próprio relator (art. 527, II, c/c art. 558 do CPC/1973) e, de outro, permitir a conversão do agravo instrumental em retido, quando não atendidos os regramentos previstos no sistema processual. Naquele momen-to, o CPC determinava a interposição de agravo (retido ou por instrumento) contra as interlocutórias proferidas no curso do processo.

Agora, com o CPC/2015, novos paradigmas são estabelecidos, espe-cialmente no que respeita à extinção do agravo retido e à previsão expressa das hipóteses de cabimento de agravo de instrumento contra as interlocutó-rias de 1º grau. Além disso, expressamente o diploma processual estabelece que algumas interlocutórias são recorríveis de imediato e outras só ao final, ampliando, com isso, o efeito devolutivo do recurso de apelação e das con-trarrazões recursais (arts. 1.009 e 1.015 do CPC/2015).

Destarte, o CPC/2015 acabou ampliando o efeito devolutivo da ape-lação (e das contrarrazões – art. 1.009), além de provocar maiores debates acerca do cabimento de mandado de segurança contra decisão judicial.

De outro prisma, mudanças significativas foram consagradas em re-lação à estabilização decorrente da coisa julgada, que também merecem reflexão e debate.

Vamos aos argumentos.

1 A PRECLUSÃO DAS INTERLOCUTÓRIAS NO CPC/2015

O primeiro aspecto a ser enfrentado neste ensaio diz respeito ao esva-ziamento da recorribilidade imediata e em separado das interlocutórias de 1º grau, o que gera, como consequência, a revisão do sistema de preclusão das decisões proferidas no curso do processo e a ampliação da devolutiva do recurso contra a decisão final.

Vale lembrar que, pelo sistema do CPC/1973, as interlocutórias de 1º grau estavam sujeitas a agravo (retido – escrito ou oral, ou por instrumento – arts. 522 e seguintes), sob pena de preclusão imediata. Contudo, com o CPC/2015, resta bem esvaziado o cabimento de recurso imediato em rela-

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20 ������������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA

ção às interlocutórias de 1º grau, ao consagrar: a) maior restrição ao recurso de agravo de instrumento (arts. 1.015); b) extinção do agravo retido; c) revi-são do regime de preclusão; d) a ampliação do efeito devolutivo por profun-didade do recurso de apelação (art. 1.009)3 e das respectivas contrarrazões.

Em suma: o novo sistema estabelece que seja “diferida a preclusão do direito de impugnar as decisões interlocutórias não sujeitas a agravo de ins-trumento, ao incluir a recorribilidade no âmbito do recurso de apelação”4.

Nesses casos, o momento da apreciação das questões decididas no curso do processo será feito em conjunto com a decisão final, e também a sua impugnação fará parte de um capítulo do recurso de apelação ou con-trarrazões recursais.

Portanto, resta claro que o CPC/2015 atinge o regime de preclusão temporal, tendo em vista que, à exceção das hipóteses expressamente pre-vistas no art. 1.015, as interlocutórias não serão recorríveis de imediato, mas apenas como um capítulo do recurso de apelação interposto contra a sentença ou nas contrarrazões recursais.

Aliás, vale fazer uma crítica em relação à redação do art. 1.009 do CPC/2015, tendo em vista que, ao invés da expressão não estar coberta pela preclusão, o correto é entender que o novo diploma processual apenas adia a sua ocorrência, para o momento da interposição da apelação ou a apresentação das contrarrazões (que poderão conter um pedido contraposto recursal – como restará claro em outra passagem). Na verdade, está diferida a preclusão, para momento posterior (razões ou contrarrazões de apelação), não sendo cabível a recorribilidade em separado e imediata5.

Vale ressaltar que, durante a tramitação do projeto do novo CPC, foi tentada a inclusão do protesto como instrumento para evitar a preclusão

3 “Entendemos que tal inovação possui o condão de simplificar a recorribilidade das decisões interlocutórias. Afinal, se, sob a égide do CPC de 1973, cabe à parte ratificar o agravo retido na preliminar de apelação/contrarrazões, mais simples se afigura dispensá-la de interpor previamente o recurso de agravo retido, concentrando a impugnação das decisões interlocutórias no próprio recurso de apelação.” (HILL, Flávia Pereira. Breves comentários às principais inovações quanto aos meios de impugnação das decisões judiciais no novo CPC. In: DIDIER JR., Fredie (Coord. Geral); MACÊDO, Lucas Buril de; PEIXOTO, Ravi; FREIRE, Alexandre (Org.). Novo CPC doutrina selecionada, v. 6: processo nos tribunais e meios de impugnação às decisões judiciais. Salvador: Podivm, 2015. p. 367)

4 BARIONI, Rodrigo. Preclusão diferida, o fim do agravo retido e a ampliação do objeto da apelação no novo Código de Processo Civil. Revista de Processo, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 243/2015, p. 269-280, 2015.

5 Alexandre Freitas Câmara entende que “as decisões interlocutórias que não se enquadram no rol taxativo, porém sendo não agraváveis, são irrecorríveis em separado, só podendo ser objeto de impugnação em apelação ou em contrarrazões de apelação. E este é um ponto que precisa ser destacado: a afirmação de que certa decisão interlocutória não é agravável não implica dizer que é ela irrecorrível. Contra as interlocutórias não agraváveis será admissível a interposição de apelação autônoma ou inserida na mesma peça que as contrarrazões” (O novo processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015. p. 520).

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imediata6, o que, de uma maneira ou de outra, ocuparia o lugar do agra-vo retido do regime do CPC/1973. Se essa redação tivesse sido aprovada, o novo CPC estaria consagrando a preclusão imediata das interlocutórias não submetidas ao protesto. Contudo, na redação aprovada do art. 1.009 do CPC/2015, não há a menção à necessidade de protesto em relação aos pronunciamentos judiciais não enquadrados na recorribilidade imediata do art. 1.015 do CPC/2015.

Assim, o texto aprovado não indica qualquer necessidade de protesto, o que, inclusive, pode ser objeto de severas críticas e, a meu ver, de inter-pretação futura dos órgãos do Poder Judiciário em relação a sua necessida-de prática, até mesmo como forma de atender às diretrizes do sistema de nulidades (art. 278 do CPC/2015 estabelece a necessidade de alegação da nulidade na primeira oportunidade, sob pena de preclusão).

Aliás, há certa incongruência e contradição entre os arts. 1.009, § 1º, 1.015 e 278 do CPC/2015, especialmente em relação aos pronunciamentos interlocutórios não recorríveis imediatamente. Como adiar a recorribilidade da interlocutória para momento posterior se o art. 278 estabelece a sua ime-diata impugnação, sob pena de preclusão?

De outro prisma, a restrição da recorribilidade imediata irá gerar, como consequência, a ampliação do efeito devolutivo do recurso de ape-lação, não deixando sujeitas à preclusão as questões processuais resolvidas na fase cognitiva, que não se enquadrem no rol do art. 1.015 (isso se não for caso de obrigar a parte, fazendo interpretação do art. 278 do CPC/2015, a apresentar o protesto imediato). Essa hipótese merece detida reflexão, tendo em vista que, como mencionado, altera o regime da preclusão temporal e o próprio efeito devolutivo recursal.

Três perguntas devem ser feitas: será que a nova sistemática irá gerar um número elevado de processos anulados em decorrência do provimento de apelações, discutindo vícios ocorridos na fase cognitiva, como nos ca-sos de cerceamento de defesa, incompetência etc.? O CPC/2015 não está abrindo oportunidade para a impetração de mandado de segurança contra ato judicial7, a partir do momento em que veda o cabimento do agravo imediatamente após a decisão interlocutória? O rol das situações jurídicas agraváveis (art. 1.015 do CPC/2015) é taxativo ou exemplificativo?

6 Art. 1.022, § 2º, do então Projeto do Novo CPC – versão Câmara Federal.7 Sobre o tema, ver ARAÚJO, José Henrique Mouta. Mandado de segurança. 5. ed. Salvador: JusPodivm,

2015. p. 363-379; e CHEIM JORGE, Flávio. Teoria geral dos recursos. 7. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 290.

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Iremos tentar enfrentá-las a partir deste momento.

2 OS VÍCIOS NO CURSO DO PROCESSO E O SISTEMA DE PRECLUSÃO: A IMPUGNAÇÃO NA APELAÇÃO E NAS CONTRARRAZÕES

Como já mencionado, a sistemática recursal do CPC/2015 pretende, de um lado, diminuir o número de interlocutórias agraváveis e, de outro, ampliar a devolutividade da apelação ou das contrarrazões recursais.

É dever ressaltar, por oportuno, que a restrição prevista no art. 1.015 do CPC/2015 apenas se aplica às interlocutórias da fase de conhecimento, eis que, em seu parágrafo único, consta expressamente que o agravo de instrumento será cabível contra as interlocutórias na fase de liquidação ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.

Além disso, há que se defender uma das alternativas processuais para as demais interlocutórias não previstas nos incisos do art. 1.015 do CPC: ou o rol é meramente exemplificativo (cabendo o agravo em outras situações excepcionais), ou o novo sistema processual acaba por ampliar a utilização do cabimento de mandado de segurança contra decisão judicial.

No CPC/2015, existem três situações distintas, a saber: i) interlocu-tórias com preclusão imediata, caso não seja interposto agravo de instru-mento; ii) interlocutórias com preclusão no momento da apresentação das razões ou contrarrazões de apelação; iii) interlocutórias atingidas pela efi-cácia preclusiva da coisa julgada, em caso de capítulos de mérito julgados antecipadamente (como, v.g., ocorre nas hipóteses previstas no art. 356 do CPC/2015). As duas primeiras situações serão tratadas neste momento e a terceira, no item seguinte.

Com efeito, o novo Código elenca a possibilidade de interlocutórias apeláveis ou mesmo impugnadas nas contrarrazões de apelação, o que, a rigor, se trata de novidade no sistema processual. No CPC/1973, a existên-cia de agravo retido provocava a necessidade de interposição imediata do recurso e sua confirmação (ratificação) na apelação ou nas contrarrazões. Agora, com o novo sistema processual, não existe recorribilidade imediata das interlocutórias não previstas no art. 1.015, adiando a impugnação re-cursal para momento posterior (preliminar da apelação ou das contrarrazões recursais8).

8 Vale, no tema, transcrever as lições de Rodrigo Barioni: “Apesar da menção ao termo ‘preliminar’, o que encerraria hipótese de a matéria ser deduzida antes dos fundamentos concernentes à sentença, deve ser reputada válida a alegação mesmo após os fundamentos relacionados à sentença, desde que em capítulo

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Assim, nos termos da redação do art. 1.009, § 1º, e 1.015 do CPC/2015, poderão existir múltiplos capítulos impugnativos na apelação e nas contrarrazões, a saber:

a) interposição bipartida, com um capítulo preliminar9 visando a discutir a interlocutória e, em seguida e em caso de não acolhi-mento do primeiro, outro impugnando a própria sentença;

b) interposição apenas com um capítulo discutindo a interlocutó-ria: neste caso, dependendo do resultado do apelo, a decisão do Tribunal fará coisa julgada em relação à sentença não recorri-da10. Esta, portanto, ficará aguardando o resultado da apelação interposta contra o capítulo referente à interlocutória anterior11. Nada impede, outrossim, que a parte vencedora requeira o cum-primento provisório da sentença irrecorrida, desde ocorra uma das hipóteses do art. 1.012 do CPC/2015. É importante observar que o cumprimento de sentença é provisório, em que o vencido não ter impugnado o capítulo de mérito contido na sentença, tendo em vista que o resultado da apelação pode desconstituir o título executivo judicial como, v.g., na hipótese de reconheci-mento de cerceamento de defesa e determinação de retorno ao grau de origem para a produção da prova que foi indeferida12;

próprio do recurso ou das contrarrazões. Aplica-se, ao caso, o princípio da instrumentalidade das formas, também consagrado no art. 277 do CPC/2015. O importante é que o apelante faça constar a impugnação como objeto do recurso de apelação. Caso omisso o recurso sobre o ponto, a questão não integrará o efeito devolutivo do recurso de apelação e, portanto, não poderá ser examinada pelo órgão ad quem, ainda que venha a ser arguida pelo apelante em sustentação oral” (Preclusão diferida, o fim do agravo retido e a ampliação do objeto da apelação no novo Código de Processo Civil. Revista de Processo, São Paulo: Revista dos Tribunais, n. 243/2015, p. 269-280, 2015).

9 Preliminar em relação à irresignação contida na apelação. Contudo, este capítulo preliminar também tem o seu mérito recursal ligado à questão resolvida no curso do processo e que poderá, dependendo do resultado do julgado, prejudicar a análise do mérito recursal ligado ao capítulo que o recorrente impugna os vícios da sentença.

10 Vale citar as lições de Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha: “É possível, ainda, que o vencido interponha apelação apenas para atacar alguma interlocutória não agravável, deixando de recorrer da sentença. Não é incomum haver decisão interlocutória que tenha decidido uma questão preliminar ou prejudicial a outra questão resolvida ou decidida na sentença – a decisão sobre algum pressuposto de admissibilidade do processo, por exemplo. Impugnada a decisão interlocutória, a sentença, mesmo irrecorrida, ficará sob condição suspensiva: o desprovimento ou não conhecimento da apelação contra a decisão interlocutória; se provida a apelação contra a decisão interlocutória, a sentença resolve-se; para que a sentença possa transitar em julgado, será preciso aguardar a solução a ser dada ao recurso contra a decisão interlocutória não agravável, enfim” (Apelação contra decisão interlocutória não agravável: a apelação do vencido e a apelação subordinada do vencedor. Revista de Processo, São Paulo: RT, v. 241, p. 235, mar. 2015).

11 Como mencionado anteriormente, em que pese o art. 1.009, § 1º, mencionar que a impugnação relativa à questão decidida no curso do processo deve ser feita em preliminar de apelação, nada impede que o mérito recursal seja somente esta questão, ficando a sentença aguardando o resultado deste julgamento para transitar em julgado. Em suma: a irresignação pode ser feita em preliminar, quando há mérito relativo aos eventuais vícios da sentença.

12 Questão interessante é indagar se esta apelação tem ou não efeito suspensivo legal, eis que, apesar de ser manejada contra a sentença, tem o seu móvel uma interlocutória que não era agravável no momento de sua prolatação.

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c) interposição de apelação com apenas o capítulo impugnando a sentença: neste caso, ocorrerá a preclusão da interlocutória não recorrida. O julgamento do Tribunal não pode reapreciar aquela decisão anterior, em decorrência de sua estabilização no curso do processo (art. 1.009 do CPC/2015);

d) apresentação de contrarrazões bipartida (impugnação recursal e recurso contra a interlocutória não recorrida de imediato)13: o re-corrido apresenta, de um lado, a irresignação ao recurso do ad-versário e, em caso de provimento daquele, pugna pela análise da interlocutória recorrida nas contrarrazões (capítulo com pedi-do próprio da peça de impugnação recursal). Neste caso, ocorre um recurso de apelação do vencedor no bojo da contrarrazões14, ficando, em regra15, subordinada a sua apreciação ao resultado do julgamento do recurso de vencido (apelação subordinada). Outrossim, se o apelante requerer a desistência recursal (art. 998 do CPC/2015), deverá ser analisada a manutenção do interes-se para o julgamento do recurso subordinado apresentado nas

13 No tema, escreve Vinicius Silva Lemos: “Existe, de forma excepcional, a hipótese de o vencido interpor apelação somente para falar sobre a decisão interlocutória, sem mencionar a sentença. É uma possibilidade um tanto arriscada processualmente, se a apelação for provida; consequentemente, há impacto na sentença, com possível anulação e retorno do processo àquele momento da decisão. De todo modo, com o improvimento, sem impugnação sobre a sentença, o tribunal não obteve a devolutividade sobre esta, não podendo julgar nada sobre ato sentencial” (Recursos e processos nos tribunais no novo CPC. São Paulo: Lexia, 2015. p. 153).

14 Como bem explica Rogério Licastro Torres de Mello, ao comentar o § 1º do art. 1.009 do CPC/2015: “Pode haver, nas contrarrazões, por assim dizer, uma defesa (relativamente à apelação da outra parte) e um possível ataque (relativamente às interlocutórias que o recorrido entenda por bem impugnar). Disto pensamos decorrer uma importante circunstância: se, por alguma razão, a apelação é inadmitida por intempestividade, por exemplo, ou deixa de existir por qualquer outro motivo (desistência do recurso), não necessariamente as contrarrazões deixarão de ter utilidade e relevância: se nas contrarrazões houve o apelado suscitado impugnação relativamente a alguma decisão interlocutória, e se for pertinente sua apreciação pelo tribunal, pois ainda não foi extinto o interesse recursal do apelado a respeito, pensamos que as contrarrazões que contenham impugnação de decisão interlocutória, mesmo que a apelação não mais exista, deverão ser apreciadas pelo tribunal, demonstrando-se que remanesce o interesse de agir, repita-se, do apelado a respeito” (In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduardo; DANTAS, Bruno (Coord.). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 2236).

15 Considerando que as contrarrazões possuem um capítulo recursal subordinado, me parece que a desistência recursal (art. 998 do CPC/2015) pode ser apresentada e trará, como consequência, na maioria das vezes, o julgamento prejudicado do apelo do recorrido, em decorrência de sua dependência. A propósito, não há nenhum prejuízo imediato a este, tendo em vista que o recurso impugnado decisão interlocutória em demanda que, ao final, a sentença foi a seu favor. Contudo, em algumas situações, o interesse no julgamento do recurso contido nas contrarrazões pode permanecer. Sobre esta subsistência de interesse recursal, vale citar a seguinte passagem: “As interlocutórias impugnáveis nas contrarrazões serão devolvidas ao Tribunal. Pode, é claro, acontecer que o ‘recurso’ (= contrarrazões de apelação) não seja conhecido por falta de interesse. Mas pode haver casos em que o interesse sobreviva. Imagine-se que o juiz tenha fixado um valor para a causa no início do processo, por meio de decisão de que não cabe recurso. Afinal, na sentença, fixam-se os honorários com base nesse valor. Mesmo que o apelante desista da apelação, as contrarrazões terão devolvido a impugnação a esta interlocutória e o vencedor no mérito tem direito a ver esta questão apreciada pelo Tribunal” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogério Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil – Artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1440).

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contrarrazões do apelado16. Será, portanto, um recurso apresen-tado nas contrarrazões à apelação, sem pagamento de custas, preparo etc., e cujo interesse recursal pode permanecer mesmo em caso de desistência do apelante. Aliás, neste aspecto, não pode ser confundido com o recurso adesivo onde, em relação ao capítulo principal, houve sucumbência recíproca17. Em termos comparativos, as contrarrazões impugnando interlocutória ante-riormente irrecorrível, guarda semelhança, inclusive no que res-peita ao não impedimento de julgamento, ao caso de desistência da ação, estando pendente de apreciação o pedido contraposto formulado pelo réu18. É possível concluir, portanto, que se trata de um pedido contraposto recursal nas contrarrazões à apelação do vencido;

e) contrarrazões com apenas um capítulo, impugnando a interlocu-tória: neste caso, sendo provida a apelação do adversário, deve ser julgada a tese recursal contida na peça do apelado, tendo em vista a possibilidade de decretação de nulidade da sentença em decorrência de vício do processo (ex.: cerceamento de defesa). Aqui também é caso de pedido contraposto recursal contido nas contrarrazões ao recurso do vencido);

f) contrarrazões com apenas um capítulo, impugnando o recurso do vencido: neste caso, ocorrerá a preclusão em relação à deci-são interlocutória não impugnada (art. 1.009, § 1º, do CPC/2015);

g) em caso de sucumbência recíproca, como já mencionado, po-derão existir até três peças apresentadas pelas partes: razões de apelação; recurso adesivo (referente ao capítulo que o recorrido foi derrotado – art. 997, §§ 1º e 2º, do CPC/2015); contrarrazões à apelação, impugnando o recurso do adversário e, se for o caso, suscitando um capítulo referente à interlocutória não agravável de imediato.

16 “Qual a condição para julgar a apelação do vencedor, constante nas contrarrazões? O provimento da apelação do vencido. É uma condição, somente nesta hipótese há o julgamento daquele recurso interposto.” (LEMOS, Vinicius Silva. Recursos e processos nos tribunais no novo CPC. São Paulo: Lexia, 2015. p. 155)

17 Nada impede que, em determinada situação concreta, o apelado parcialmente derrotado apresente, no prazo das contrarrazões, a antítese ao recurso do apelante, a sua impugnação em face da interlocutória anterior (art. 1.009, § 1º) e a apelação adesiva (art. 997, § 1º). Apenas este último não será conhecimento automaticamente e, caso de desistência ou inadmissibilidade da apelação principal (art. 997, § 2º, III).

18 Rogério Licastro Torres de Mello, ao comentar o § 1º do art. 1.009 do CPC/2015, faz a mesma comparação. In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduardo; DANTAS, Bruno (Coord.). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 2237.

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Como se percebe, a solução dada pelo CPC/2015 em relação às inter-locutórias irrecorríveis de imediato gera uma multiplicidade de alternativas e pela revisão dos conceitos ligados à preclusão e ao efeito devolutivo da apelação e das contrarrazões. Além disso, pode ensejar um número maior de sentenças anuladas em decorrência de vícios processuais constantes do andamento do processo19.

3 AS DECISÕES PARCIAIS DE MÉRITO, A PRECLUSÃO E A COISA JULGADA PROGRESSIVA

Neste momento, vale enfrentar o sistema de preclusão e de coisa jul-gada das questões que, mesmo sendo proferidas no curso do processo, são definitivas em relação a alguns capítulos de mérito.

É mister, para tanto, visitar o que estabelece o Código em relação aos conceitos dos pronunciamentos judiciais.

O art. 203 do CPC/2015 procura classificá-los e, em resumo, passa a indicar que sentença é o pronunciamento por meio do qual o juiz encerra a fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução. Por outro lado, decisão interlocutória é qualquer procedimento judicial de-cisório que não se enquadre na descrição de sentença.

Portanto, é razoável entender que o CPC/2015 pretende colocar a última pá de cal na discussão existente no CPC/1973 acerca da existência de sentença parcial, tendo em vista que, em várias passagens, menciona a possibilidade de cisão do julgamento de mérito e a sua irresignação por meio de agravo de instrumento.

O novel diploma processual deixa clara a possibilidade de, no curso da relação processual, ocorrer decisão com caráter definitivo parcial (como no caso do julgamento antecipado parcial – art. 356), sendo conceituada como interlocutória de mérito e não sentença parcial de mérito, estando sujeita ao recurso de agravo de instrumento20. Neste caso, o agravo tem a

19 Vale citar passagem do ensaio de Rogério Rudiniki Neto: “Não obstante, as disposições do novo Código acerca da irrecorribilidade imediata, em regra, das decisões interlocutórias geram duas ordens de preocupações na doutrina. Para alguns, a nova sistemática poderá ocasionar a elevação do número de processos anulados quando do julgamento das apelações. Para outros, há decisões não inclusas no taxativo rol do art. 1.015 cuja revisão não pode aguardar o julgamento do recurso de apelação, como a que suspende o prosseguimento do feito em 1º grau em função da ocorrência de prejudicialidade externa. Nessas situações, será corriqueira a impetração de manado de segurança contra ato jurisdicional” (O efeito devolutivo do recurso de apelação no novo Código de Processo Civil. In: DIDIER JR., Fredie (Coord. Geral); MACÊDO, Lucas Buril de; PEIXOTO, Ravi; FREIRE, Alexandre (Org.). Novo CPC doutrina selecionada, v. 6: processo nos tribunais e meios de impugnação às decisões judiciais. Salvador: Podivm, 2015. p. 575).

20 Vale citar as lições de Alexandre Câmara, em relação às hipóteses de julgamento parcial do mérito: “Também se admite agravo de instrumento contra decisões interlocutórias que versem sobre o mérito do processo. É que no sistema processual inaugurado pelo CPC de 2015 existe a possibilidade de cindir-se a apreciação do mérito da causa (que o dispositivo chama de ‘mérito do processo’), de forma que uma parcela seja apreciada

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mesma função da apelação e, se não for interposto, poderá gerar a forma-ção da coisa julgada parcial em relação ao capítulo de mérito resolvido na forma do art. 356 do CPC/2015.

No tema, vale citar o Enunciado nº 103 do Fórum Permanente de Processualistas Civis:

103. (arts. 1.015, II, 203, § 2º, 354, parágrafo único, 356, § 5º) A decisão parcial proferida no curso do processo com fundamento no art. 487, I, su-jeita-se a recurso de agravo de instrumento. (Grupo: sentença, coisa julgada e ação rescisória; redação revista no III FPPC – Rio)

E quais seriam os reflexos desse entendimento? Penso que será pos-sível, reafirmando um posicionamento anterior21, a formação progressiva da coisa julgada (em capítulos) e a possibilidade de execução definitiva de partes do mérito resolvidas e imunizadas em momentos diferenciados.

Com efeito, a partir do momento em que o CPC/2015 estabelece a possibilidade de decisão interlocutória de mérito, também passa a consagrar a formação progressiva de coisa julgada e a multiplicidade de momentos para o cumprimento das decisões proferidas no curso do processo.

Ora, na formação do título executivo, a natureza do provimento ju-risdicional é menos importante do que a consequência processual dele de-corrente, razão pela qual pouco importa se o caso concreto diz respeito a uma sentença propriamente dita ou uma decisão interlocutória: possuindo conteúdo meritório e cognição suficiente para a formação de coisa julgada, é possível seu cumprimento definitivo. Assim, em que pese a Parte Especial, Livro I, Título II, do CPC/2015 mencionar cumprimento de sentença, é dever afirmar que as disposições lá contidas são cabíveis também para as decisões interlocutórias de mérito.

Aliás, é possível a formação prematura de título executivo parcial em decorrência de conduta da própria parte, que deixou, por exemplo, de inter-por agravo de instrumento contra decisão parcial de mérito ou apresentou recurso parcial diante de uma sentença em capítulos (arts. 1.015, II, 1.008 e 1.013, § 1º, do CPC/2015).

em decisão interlocutória enquanto outra parcela será resolvida na sentença” (Novo processo civil brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015. p. 521).

21 ARAÚJO, José Henrique Mouta. Coisa julgada progressiva e resolução parcial de mérito. Curitiba: Juruá, 2007; além do ensaio intitulado “O cumprimento de sentença e a 3ª etapa da reforma processual – Primeiras impressões”. Revista de Processo, São Paulo: RT, n. 123, p. 156-158.

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Nesses casos, os capítulos não impugnados podem, desde já e depen-dendo do caso concreto, ensejar execução definitiva, mesmo inexistindo o trânsito em julgado total da sentença22.

Aliás, o Enunciado nº 100 do Fórum Permanente de Processualistas Civis expressa que:

100. (art. 1.013, § 1º, parte final) Não é dado ao tribunal conhecer de maté-rias vinculadas ao pedido transitado em julgado pela ausência de impugna-ção. (Grupo: Ordem dos Processos no Tribunal, Teoria Geral dos Recursos, Apelação e Agravo)

Em suma: há a possibilidade de fracionamento dos capítulos de méri-to e dos momentos de formação da coisa julgada.

Outra questão importante é a análise da recorribilidade das questões processuais discutidas anteriormente à decisão parcial de mérito (art. 356 do CPC/2015). In casu, seria necessária a impugnação no agravo de instru-mento ou podem ser suscitadas na apelação ou contrarrazões (art. 1.009, § 1º, do CPC/2015) que serão apresentadas futuramente e estarão ligadas a outros capítulos de mérito? O art. 1.009, § 1º, é aplicável às hipóteses de agravo de instrumento interposto contra decisão parcial de mérito?

Vejamos um exemplo: demanda proposta com pedidos cumulados. O juiz do feito indefere a produção de provas requeridas na contestação pelo réu em relação a um deles e, em momento posterior, resolve julgá-lo procedente de forma antecipa, pois, a seu ver, estava em condições de ime-diato julgamento (art. 356, II, do CPC/2015), deixando os demais para aná-lise após a fase instrutória. O agravo de instrumento (art. 356, § 5º23) deve impugnar o indeferimento de prova, sob pena de preclusão, ou esta questão poderá ser suscitada no recurso de apelação ou contrarrazões em relação a outros capítulos da demanda que foram deixados para momento posterior (art. 1.009, § 1º, do CPC/2015)?

22 No mesmo sentido, observa Nery Júnior Jr. que: “Entendemos ser possível a execução definitiva da parte da sentença já transitada em julgado, em se tratando de recurso parcial, desde que observadas certas condições: a) cindibilidade dos capítulos da decisão; b) autonomia entre a parte da decisão que se pretende executar e a parte objeto de impugnação; c) existência de litisconsórcio não unitário ou diversidade de interesses entre os litisconsortes, quando se tratar de recurso interposto por apenas um deles” (NERY JÚNIOR, Nelson. Teoria geral dos recursos. 6. ed. São Paulo: RT, 2004. p. 454).

23 Duas contradições existem no sistema das interlocutórias de mérito agraváveis que merecem destaque: a) há a indicação de que o cumprimento provisório pode ser sem caução (art. 356, § 2º, do CPC/2015), inovando em relação às situações jurídicas em que ela pode ser dispensada (art. 521 do CPC/2015); b) não há o efeito suspensivo legal, ao contrário do recurso de apelação (art. 1.012 do CPC/2015). Portanto, é possível afirmar que, se os pedidos cumulados forem julgados em conjunto, a apelação terá efeito suspensivo legal. Por outro lado, se ocorrer o julgamento antecipado parcial, o agravante terá que requerer o efeito suspensivo judicial (art. 1.019, I, do CPC/2015).

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Acredito que, para responder a essa pergunta, devem ser sopesadas duas situações jurídicas: a) questão processual exclusiva do capítulo resol-vido antecipadamente (ex.: indeferimento de produção de prova apenas em relação ao pedido que foi julgado antecipadamente, sob o argumento de que comportava tal solução processual); b) questão processual comum (ex.: inde-ferimento de produção de prova relativa a todos os pedidos cumulados).

Em relação à primeira hipótese, entendo que o art. 1.009, § 1º, do CPC/2015 deve ser estendido ao agravo de instrumento contra decisão par-cial de mérito. Portanto, o agravante, ao manejar seu apelo (art. 356, § 5º, do CPC/2015), necessariamente deverá impugnar a questão anterior relativa ao indeferimento de produção de prova, eis que, quando foi assim decidido pelo Magistrado de 1º grau, a interlocutória não estava sujeita ao agravo de instrumento.

Por outro lado, se não houver o agravo de instrumento contra a deci-são parcial de mérito ou se este for improvido (ou mesmo não conhecido), a coisa julgada deste capítulo (art. 502 do CPC/2015) ensejará a eficácia pre-clusiva decorrente da coisa julgada em relação ao indeferimento da prova (arts. 507 e 508 do CPC/2015); ou seja, o capítulo de mérito apreciado ante-cipadamente gera reflexos em relação às questões processuais a ele ligadas e resolvidas em momento anterior. Não será possível, neste caso, deixar para impugnar a questão processual relativa ao indeferimento da produção de prova apenas quando for apresentada a apelação ou contrarrazões, ten-do em vista que estas não poderão desconstituir a coisa julgada relativa ao capítulo julgado antecipadamente (e as questões processuais relativas a este julgamento antecipado parcial – arts. 507 e 508 do CPC/2015).

Assim, é razoável afirmar que o sistema processual, ao consagrar a irrecorribilidade imediata das interlocutórias não previstas no art. 1.015 do CPC/2015, acaba por ampliar o efeito devolutivo da apelação (ou con-trarrazões) e do agravo de instrumento (ou contrarrazões – art. 1.015, II) contra decisão parcial de mérito, em decorrência da interpretação dada ao art. 1.009, § 1º, do CPC.

Por outro lado, se a questão processual for comum, a resolução an-tecipada de um dos capítulos não impede que seja suscitada na apelação ou contrarrazões futuras, exclusivamente em relação ao capítulo de mérito constante na sentença. De fato, a ampliação do efeito devolutivo, prevista no art. 1.009, § 1º, fica adstrita ao capítulo de mérito resolvido na sentença, não impedindo que a análise feita em relação a capítulo de mérito resolvido antecipadamente possa ser imunizada pela coisa julgada parcial (art. 356, § 3º, do CPC/2015).

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Seguindo o exemplo proposto acima, o indeferimento da produção de prova comum pode ser suscitado na apelação futura, em relação ao ca-pítulo de mérito resolvido na sentença, não impedindo que ocorra a eficácia preclusiva em relação ao mesmo tema, relativamente ao capítulo julgado antecipadamente e não recorrido e que já restou imunizado pela coisa jul-gada, ou que fora atingido pelo improvimento do agravo de instrumento24.

4 OS LIMITES DA COISA JULGADA E AS QUESTÕES PREJUDICIAIS: INOVAÇÃO A SER OBSERVADA COM CAUTELA

O CPC/2015 também trouxe modificações importantes ligadas à esta-bilização decorrente da coisa julgada e seus limites subjetivos e objetivos, inclusive no que respeita à imunização25-26 das chamadas questões prejudi-ciais incidentais.

De início, é possível aduzir que a coisa julgada atinge o objeto liti-gioso do processo, a questão principal (art. 503 do CPC/2015), não estabili-zando as questões apenas conhecidas e não decididas. A cognição atinge as

24 Vale ressaltar que o grupo de recursos do FPPC (coordenado pelo Professor Luiz Volpe Camargo), realizado em Curitiba, nos dias 23 a 25.10.2015, propôs um enunciado sobre o assunto, o qual foi objetado na Plenária. A proposta do enunciado foi apresentada pela Professora Renata Cortez e o teor era o seguinte: “(Art. 354, parágrafo único; art. 356, § 5º; arts. 1.009, §§ 1º e 2º; art. 1.015, II). Na hipótese de decisão parcial com fundamento no art. 485 ou no art. 487, as questões a ela relacionadas e resolvidas anteriormente, quando não recorríveis de imediato, devem ser impugnadas em preliminar do agravo de instrumento ou nas contrarrazões”. Apesar da objeção, sou favorável à sua redação. Entendo que essa proposta de enunciado bem explica as situações apresentadas neste ensaio e consagra o entendimento ligado a temas como coisa julgada parcial, eficácia preclusiva da coisa julgada, resolução parcial de mérito, efeito devolutivo dos recursos etc.

25 Na verdade, o CPC/2015 gera reflexão em relação ao sistema de imunização das decisões judiciais, tendo em vista que, além dos institutos da coisa julgada e da preclusão, prevê também as hipóteses de estabilização das tutelas antecipadas antecedentes (art. 304 do CPC). Aliás, o § 4º do art. 304 expressamente consagra que a estabilização da tutela não fará coisa julgada e estará sujeita à outra ação judicial, no prazo de dois anos. Sobre esta estabilização da tutela antecipada, vale indicar os seguintes ensaios, entre outros: CAVALCANTI NETO, Antônio de Moura. Estabilização da tutela antecipada antecedente: tentativa de sistematização. In: COSTA, Eduardo José da Fonseca; PEREIRA, Mateus Costa; GOUVEIA FILHO, Roberto P. Campos (Coord.). Tutela provisória. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 195-222; PEIXOTO, Ravi. Por uma análise dos remédios jurídicos processuais aptos a impedir a estabilização da tutela antecipada antecedente de urgência. In: COSTA, Eduardo José da Fonseca; PEREIRA, Mateus Costa; GOUVEIA FILHO, Roberto P. Campos (Coord.). Tutela provisória. Salvador: JusPodivm, 2015. p. 243-256; GOMES, Frederico Augusto; RUDINIKI NETO, Rogério. Estabilização da tutela de urgência: algumas questões controvertidas. In: MACÊDO, Lucas Buril de; PEIXOTO, Ravi; FREIRE, Alexandre (Coord.). Doutrina selecionada: procedimentos especiais, tutela provisória e direito transitório. Salvador: JusPodivm, v. 4, 2015. p. 170; GRECO, Leonardo. A tutela da urgência e a tutela da evidência no código de processo civil de 2015. In: MACÊDO, Lucas Buril de; PEIXOTO, Ravi; FREIRE, Alexandre (Coord.). Doutrina selecionada: procedimentos especiais, tutela provisória e direito transitório. Salvador: JusPodivm, v. 4, 2015; NUNES, Dierle; ANDRADE, Érico. Os contornos da estabilização da tutela provisória de urgência antecipatória no novo CPC e o mistério da ausência de formação da coisa julgada. In: MACÊDO, Lucas Buril de; PEIXOTO, Ravi; FREIRE, Alexandre (Coord.). Doutrina selecionada: procedimentos especiais, tutela provisória e direito transitório. Salvador: JusPodivm, v. 4, 2015.

26 No CPC/2015, é possível enfrentar mais duas situações de estabilização, a saber: a) a estabilização da decisão de saneamento (art. 357, § 1º); b) a estabilização dos julgamentos das causas repetitivas (arts. 927, §§ 2º a 4º, 986, etc.). Estes assuntos, por certo, provocarão muitos debates entre os estudiosos do direito processual.

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questões prévias; contudo, a coisa julgada apenas atingirá o objeto litigioso do processo (questão principaliter tantum)27.

De outra banda, com a formação da coisa julgada, haverá também preclusão envolvendo todas as questões suscitadas, discutidas e mesmo sus-citáveis no processo28.

Vejamos um exemplo: “A” move demanda indenizatória em face de “B”, com base em procedimento de cognição plena e exauriente. Este, em contestação, impugnou os argumentos de 1 a 5. Por vontade própria ou mesmo por desídia, deixou de suscitar os pontos29 6 a 8, desatendendo, des-ta forma, o princípio da eventualidade previsto no art. 336 do CPC/201530. Com a sua condenação e o trânsito em julgado, a coisa julgada atinge todas as questões decididas e os pontos não apreciados, exceto as hipóteses ense-jadoras de ação rescisória.

Apontando hipótese semelhante, ensina Barbosa Moreira, em artigo publicado em seu primeiro Temas de direito processual civil (de 1977):

Entre os dois riscos que se deparam – o de comprometer a segurança da vida social e o de consentir na eventual cristalização de injustiças –, prefere o ordenamento assumir o segundo. Não chega a pôr a coisa julgada, em termos absolutos, ao abrigo de qualquer impugnação; permite, em casos de extrema gravidade, que se afaste o obstáculo ao rejulgamento: aí estão, no Direito brasileiro, as hipóteses de rescindibilidade da sentença, arroladas no art. 485 do Código de Processo Civil em vigor desde 01.01.1974. Torna-a, porém, imune, em linha de princípio, às dúvidas e contestações que se pre-tenda opor ao resultado do processo findo, mesmo com base em questões que nele não hajam constituído objeto de apreciação. Se o resultado é in-justo, paciência: o que passou, passou.31

Outro caso interessante é apontado por Eduardo Couture e merece transcrição:

27 Daí pelo que se faz necessário distinguir o objeto da cognição e o objeto de decisão. Sobre o assunto, ver DIDIER JR., Fredie. Cognição, construção de procedimentos e coisa julgada: os regimes diferenciados de formação da coisa julgada no direito processual civil brasileiro. Genesis: Curitiba, n. 22, out./dez. 2001. p. 709-34.

28 Como afirma Giuseppe Chiovenda: “Precluída no está solamente l ala facultad de renovar las cuestiones que fueron planteadas y decididas, sino que precluída está también la facultad de proponer cuestiones no planteadas y que habrían podido plantearse” (CHIOVENDA, Giuseppe. Cosa juzgada y preclusión. Ensayos de derecho procesal. Buenos Aires: Ejea, v. 3, 1949. p. 229).

29 Aqui são pontos e não questões, tendo em vista que não foram impugnados pelo demandado.30 Fala-se em destoar, tendo em vista que na contestação há o momento precluso para a referida impugnação.31 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A eficácia preclusiva da coisa julgada material no sistema do processo

civil brasileiro. Temas de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 99.

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Em uma ação proposta por A contra B para cobrar uma quantia em dinhei-ro, discute-se a causa lícita ou ilícita de determinada obrigação cambial que deu origem à demanda; o juiz, em sua sentença, afirma, entre outros motivos de nulidade da obrigação, como um argumento a mais dentre os muitos que formulada, que todas as obrigações cambiárias subscritas pelo réu tinham causa ilícita, motivo pelo qual é de presumir que a que deu ori-gem ao litígio também a tivesse. É evidente, na nossa opinião, que essa pre-missa de que todas as obrigações cambiárias do devedor têm causa ilícita não faz coisa julgada em outra ação que o mesmo credor venha intentar contra o mesmo devedor para cobrar outra obrigação cambiária, diversa da que fora objeto do processo anterior. Neste novo feito, o réu não poderá defender-se invocando a premissa, assentada no processo anterior, de que todas as obrigações têm causa ilícita. O objeto da nova demanda é diverso e o seu conteúdo jurídico não foi motivo de debate ou decisão alguma, ex-pressa ou implícita, no dispositivo da sentença anterior.32

Com base em todos esses exemplos, é possível concluir que a estabi-lidade decorrente da auctoritas rei iudicatae atinge o objeto principal (aqui entendido como principaliter tantum – art. 503 do CPC/2015), mas gera preclusão em relação às questões suscitadas, discutidas e mesmo suscitáveis no processo33. Caso contrário, poder-se-ia gerar sério risco de perpetuação das demandas, podendo a parte interessada alegar que não suscitou certo ponto e utilizá-lo para nova provocação judicial34.

32 COUTURE, Eduardo J. Fundamentos do direito processual civil. Trad. Benedicto Giaccobini. Campinas: Red Livros, 1999. p. 358-9.

33 Em outra passagem, observa Barbosa Moreira ainda sobre a formação da coisa julgada e as questões suscitáveis, que: “Ora, se assim é no tocante às questões (distintas da principal) efetivamente apreciadas, por mais forte razão é também assim no que concerne àquelas outras de que o órgão judicial nem sequer chegou a conhecer – relevantes que fossem, caso suscitadas pelas partes ou enfrentadas de ofício, para o julgamento da causa. O que se passa com a solução de semelhantes questões, após o trânsito em julgado da sentença definitiva, é o mesmo que se passa com a das questões que o juiz tenha apreciado unicamente para assentar as premissas da sua conclusão: nem a umas nem a outras se estende a auctoritas rei iudicatae, mas todas se submetem à eficácia preclusiva da coisa julgada. Nesse sentido, e somente nele, é exato dizer que a res iudicata ‘cobre o deduzido e o deduzível’” (BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A eficácia preclusiva da coisa julgada material no sistema do processo civil brasileiro. Temas de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 100). Já Giuseppe Chiovenda assevera que: “A coisa julgada contém, pois, em si, a preclusão de qualquer questão futura: o instituto da preclusão é a base prática da eficácia do julgado; vale dizer que a coisa julgada substancial (obrigatoriedade nos futuros processos) tem por pressuposto a coisa julgada formal (preclusão das impugnações). A relação, portanto, entre coisa julgada e preclusão de questões pode assim formular-se: a coisa julgada é um bem da vida reconhecido ou negado pelo juiz; a preclusão de questões é o expediente de que se serve o direito para garantir o vencedor no gozo do resultado do processo (ou seja, o gozo do bem reconhecido ao autor vitorioso, a liberação da pretensão adversária ao réu vencedor)” (CHIOVENDA, Giuseppe. Instituições de direito processual civil. Campinas: Bookseller, v. 1, 2000. p. 452).

34 Proto Pisani observa que a coisa julgada atinge o suscitado e o suscitável, ao ensinar que: “Questo principio, se inteso in modo corretto (il che non sempre avviene), non influisce in modo alcuno nel senso di restringere o ampliare i limiti oggetivi del giudicato: individuato (alla stregua di criteri cui è del tutto estraneo il principio ora in esame) l’ambito oggettivo del giudicato, il principio secondo cui il giudicato copre il dedotto e deducibile ci sta a dire solo che il risultato del primo processo non potrà essere rimesso in discussione e peggio diminuito o disconosciuto attraverso la deduzione in un secondo giudizio di questioni (di fatto o

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Seguindo esse raciocínio, a questão prejudicial, caso seja conhecida, mas não decidida, ficará adstrita aos fundamentos do decisum e, portanto, não ficará imunizada, exceto se a situação for enquadrada no art. 503 do CPC/201535.

Pela leitura dos arts. 503 e 504 do CPC/2015, é possível chegar a seguinte conclusão em relação aos limites objetivos da coisa julgada: imu-nizam e estabilizam a questão principal expressamente decidida. Aqui, há a necessidade de entender que deve ocorrer a expressa manifestação judicial sobre o objeto, sobre a questão principal.

Destarte, não resta dúvida de que a questão principal expressamente decidida ficará sujeita à coisa julgada (art. 503 do CPC/2015), enquanto as questões suscitadas e suscitáveis (de fato e/ou de direito)36 ficam sujeitas ao efeito preclusivo decorrente da coisa julgada, nos termos dos arts. 505 e 507 do CPC/201537.

di diritto, rilevabili d’ufficio o solo su eccezione di parte, di merito o di rito) rilevanti ai fini dell’oggetto del primo giudicato e che sono state proposte (dedotto) o che si sarebbero potute proporre (deducibile) nel corso del primo giudizio” (PROTO PISANI, Andrea. Lezioni di diritto processuale civile. 4. ed. Napoli: Juvene, 2002. p. 63).

35 Diferenciando ponto e questão prejudicial, assim se manifesta Antônio Scarance Fernandes: “Havendo dúvida sobre o ponto, seja ela suscitada pelas partes que podem manifestar sua controvérsia, seja ela levantada de ofício pelo juiz, ele se transforma em questão. A questão é o ponto duvidoso. Assim também a questão prejudicial. É a dúvida sobre o ponto prejudicial. Diferentemente do ponto prejudicial, que é visto pelo juiz como algo já assentado, a questão prejudicial deverá ser por ele apreciada, emitindo finalmente um juízo a seu respeito. O juiz decide incidentalmente a respeito da questão prejudicial para que seja possível a solução da questão prejudicada” (FERNANDES, Antônio Scarance. Prejudicialidade: conceito, natureza jurídica, espécies de prejudiciais. São Paulo: RT, 1988. p. 59). Já Enrico Tullio Liebman, em seu clássico Manuale, ensina que: “È um’affermazione troppo ampia, perchè non sono coperte dal giudicato le più o meno numerose questioni di fatto e di diritto che il giudice ha dovuto esaminare per decidire la causa, le quali hanno rappresentato il cammino logico da lui percorso per pervenire alla conclusione, ma perdono ogni importanza dopo che egli ha pronunciato la sua decisione. Tra l’altro, ache le questioni pregiudiziali eventualmente sorte nel processo subiscono analogo trattamento. Conciene ricordare cha di regola le questioni pregiudiziali vanno conosciute incidenter tantum, sono cioè oggetto di cofnizione, ma non di decisione, con efficacia logica, ma non imperativa” (LIEBMAN, Enrico Tullio. Manuale di diritto processuale civile. 3. ed. Milano: Giuffrè, v. 3, 1976. p. 168-9).

36 Sobre a eficácia preclusiva da coisa julgada atingindo questões de fato e de direito, ver BARBOSA MOREIRA, José Carlos. A eficácia preclusiva da coisa julgada material no sistema do processo civil brasileiro. Temas de direito processual civil. São Paulo: Saraiva, 1977. p. 103-06. Ainda sobre o assunto, assevera Ovídio Baptista da Silva identificando uma ação de mútuo (com indicação do Código Civil de 1916): “Imaginemos que, numa ação de cobrança de mútuo, o réu pudesse alegar contra o autor que: a) o contrato era anulável por dolo; b) também o era por erro (art. 147 do CC); c) que a dívida estava já prescrita; d) que a ação era improcedente porque o réu já havia pagado a dívida; e) ou que o credor renunciara ao seu crédito; f) ou que houvera novação (art. 999 do CC)”. Em seguida, conclui: “Todas essas defesas seriam pertinentes para elidir a ação de cobrança de mútuo. Eram questões da lide abrangida pela disposição do art. 474 do CPC; se o réu não as suscitou na ação, não poderá evitar a execução da sentença arguindo-as por meio da ação de embargos do devedor, para que o juiz o libere da ação executória, pois a tanto o impedirá a coisa julgada. As causas de extinção da obrigação, capazes de elidir a demanda executória, hão de ser posteriores à sentença do processo de conhecimento (art. 741, VI, do CPC)” (BAPTISTA DA SILVA, Ovídio A.; GOMES, Fábio. Teoria geral do processo. 2. ed. São Paulo: RT, 2000. p. 241).

37 Em uma só frase: a eficácia preclusiva atinge o deduzido e o deduzível. No Direito italiano, fala-se que “il giudicato copre il dedotto e il deducible”. Sobre o assunto, indica-se obra de PISANI, Andrea Proto. Appunti sul giudicato civile e soui limiti oggettivi. Rivisa di Diritto Processuale, Padova: Cedam, v. 45, 1990. p. 389 et seq.

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De outra banda, como mencionado anteriormente, uma das grandes inovações do CPC/2015 refere-se à possibilidade, desde que atendidos al-guns requisitos específicos, de a estabilização decorrente da coisa julgada atingir a questão prejudicial que não foi apreciada como objeto principal, mas como um antecedente.

A rigor, na tradição do CPC de 1973, a questão prejudicial decidi-da de forma incidental não ficava atingida pelos limites objetivos da coisa julgada, podendo ser objeto de outra ação judicial. Por outro lado, se a questão fizesse parte do objeto litigioso do processo, era atingida pela imu-tabilidade, como preconizava os arts. 325 e 470 do CPC/1973.

Contudo, o CPC/2015, no art. 503, § 1º, traz a possibilidade de am-pliação dos limites objetivos para fazer a estabilidade decorrente da coisa julgada alcançar a questão prejudicial, desde que atendidos os seguintes requisitos: a) sua apreciação ser condicionante ao julgamento do mérito (do objeto principal); b) existência de contraditório prévio e efetivo, o que não ocorre em caso de revelia; c) o juiz do feito for competente em razão da matéria e pessoa para apreciar a questão prejudicial como objeto principal. Ademais, o § 2º do mesmo dispositivo indica que não se aplica nos casos em que existir limite cognitivo que impeça o aprofundamento da análise da questão prejudicial.

Uma coisa é certa: o objetivo do CPC/2015 é simplificar o entendi-mento de quando a questão prejudicial será atingida pelos limites objetivos da coisa julgada, sendo vedada sua apreciação em outra demanda judicial. Contudo, há a necessidade de muita cautela na análise e interpretação des-ses dispositivos.

Ratifica-se, outrossim, que a ampliação dos limites objetivos apenas ocorrerá nos casos em que se discute a questão prejudicial de forma inci-dental, e não como objeto principal.

Assim, por exemplo, uma coisa é a propositura de demanda com pe-didos cumulados de declaração de existência de contrato com cobrança de valores (em que o pedido prejudicial – contrato – será atingido diretamente pelos efeitos objetivos da coisa julgada – art. 503 do CPC/2015) e outra, completamente diferente, é o ajuizamento de ação de cobrança de valores, em que a discussão sobre a existência ou não de contrato é feita de forma incidental (como condicionante ao julgamento do mérito).

Pelo CPC/2015, é possível ampliar os limites objetivos para fazer a coisa julgada alcançar a própria discussão incidental sobre a existência ou não de vínculo obrigacional, impedindo que o tema seja objeto de nova demanda judicial, desde que seja garantido o contraditório prévio e efetivo acerca da prejudicial.

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Como citado anteriormente, essa ampliação não ocorrerá nas causas em que existir limitação cognitiva; ou seja, em processos em que o limite cognitivo horizontal vedar a ampla discussão sobre a questão prejudicial, como nas ações de desapropriação, mandado de segurança, possessórias etc.

E mais. Deve existir a garantia de ampla discussão sobre a questão prejudicial, o que o § 1º, II, do art. 503 do CPC/2015 veda nos casos em que ocorrer a revelia. Indaga-se: o que é este contraditório prévio e efetivo? É razoável afirmar que se trata de ampla possibilidade de discussão sobre a questão prejudicial, inclusive no que respeita à eventual produção de pro-va. Naquele caso citado acima, a análise da prejudicial existência ou não de contrato é condicionante ao julgamento do mérito (dever jurídico de pagar ou não valor), pelo que deve ser garantido o contraditório e a ampla defesa em relação ao contrato.

Acredita-se que muita polêmica prática irá gerar esse dispositivo38. Por cautela, o julgador deverá, até para evitar dúvida quanto aos limites de sua decisão, informar, na fundamentação, de que houve a garantia do con-traditório prévio e efetivo, como forma de atender ao previsto neste art. 503 do CPC/2015 e fazer a estabilização também alcançar a questão prejudicial. Essa extensão da coisa julgada independe de provocação da parte, sendo consequência com contraditório efetivo39.

Por outro lado, nada impede que o prejudicado procure, por meio de outra demanda, uma declaração judicial de que os efeitos da coisa julgada não atingiram a questão prejudicial em decorrência da ausência do contra-ditório prévio.

Este é um risco decorrente da interpretação do CPC/2015. Poderá existir eternização de discussão judicial visando a compreender se efetiva-mente houve o contraditório prévio para a extensão da coisa julgada em relação à questão prejudicial decidida incidentalmente.

Além disso, devem estar presentes os demais requisitos: condiciona-mento (a prejudicial deve condicionar o julgamento da questão principal) e a competência (do juízo em razão da matéria e pessoa). Essa competência

38 Fredie Didier Jr., Paula Sarno Braga e Rafael Alexandria de Oliveira escrevem que: “Não há problema algum com a criação de um regime especial de coisa julgada: trata-se de uma legítima opção legislativa, com nítido propósito de estabilizar a discussão em torno de uma questão que tenha sido debatida em contraditório, ainda que não seja questão principal” (Curso de direito processual civil. 10. ed. Salvador: JusPodivm, v. 2, 2015, p. 534).

39 Assim está redigido o Enunciado nº 165 do PFFC: “(art. 503, §§ 1º e 2º) A análise de questão prejudicial incidental, desde que preencha os pressupostos dos parágrafos do art. 503, está sujeita à coisa julgada, independentemente de provocação específica para o seu reconhecimento” (Grupo: coisa julgada, ação rescisória e sentença; redação revista no VI FPPC – Curitiba).

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deve ser para ambas as questões discutidas: a incidental e prejudicial (con-dicionante) e a principal (e condicionada).

Outra reflexão refere-se às causas envolvendo a Fazenda Pública. Como bem consagra o Enunciado nº 439 do FPPC40, a coisa julgada em relação a essa questão prejudicial está condicionada, quando for o caso, à remessa necessária, exceto quando o caso incorrer em uma das hipóteses de dispensa de sua reanálise pelo tribunal (art. 496, §§ 3º e 4º).

Por derradeiro, vale enfrentar os limites subjetivos da coisa julgada. A indagação a ser feita é a seguinte: quem será atingido pela estabilidade e imutabilidade decorrentes da coisa julgada?

No tema, houve importante alteração em relação ao que estava pre-visto no CPC de 1973. No regramento anterior, a coisa julgada não poderia prejudicar nem beneficiar terceiros. Além disso, existia uma hipótese espe-cífica, na parte final do art. 472, relativa às causas de estado.

Contudo, essa interpretação literal gerava, na prática, a necessida-de de ajustes em relação às demandas transindividuais, em que o limi-te subjetivo da coisa julgada poderia gerar benefícios a terceiros. O Có-digo de Defesa do Consumidor, aliás, prevê expressamente a chamada eficácia in utilibus decorrente da coisa julgada (arts. 103 e 104 da Lei nº 8.078/1990). Assim, em caso de procedência da ação coletiva, os efeitos da coisa julgada podem beneficiar as vítimas e sucessores, mas não poderão prejudicá-los, desde que atendidos os regramentos constantes no CDC.

O novo CPC, portanto, passou a consagrar, no seu art. 506, que os limites subjetivos da coisa julgada não podem prejudicar terceiros. Nada impede, portanto, que os efeitos decorrentes da imutabilidade possam be-neficiar terceiros, o que está em conformidade com as previsões oriundas do CDC e atende, também, a outras situações jurídicas do dia a dia forense.

Na mesma pisada, foi retirado o regramento que existia na parte fi-nal do art. 472 do CPC de 1973. Não há qualquer tratamento diferenciado em relação às ações de estado. Nestas, deve ocorrer a citação de todos os interessados para que a coisa julgada lhes atinja. Não poderá prejudicar, consequentemente, quem não foi citado.

O novo CPC, em verdade, consagra a eficácia expandida da coisa julgada individual para beneficiar terceiros. Além dos casos já previstos no CDC, essa expansão dos efeitos subjetivos pode ocorrer: a) em casos repe-

40 “Enunciado nº 439. (art. 503, §§ 1º e 2º): Nas causas contra a Fazenda Pública, além do preenchimento dos pressupostos previstos no art. 503, §§ 1º e 2º, a coisa julgada sobre a questão prejudicial incidental depende de remessa necessária, quando for o caso.” (Grupo: Impacto do novo CPC e os processos da Fazenda Pública)

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titivos, em decorrência do caráter vinculante da decisão; b) em relações materiais idênticas41-42.

Importante observar que, em determinado caso concreto, a coisa jul-gada pode beneficiar um terceiro e prejudicar outro, hipótese em que não poderá ocorrer o efeito extensivo. A passagem dos comentários de Antonio do Passo Cabral ao art. 506 do CPC/2015, vale a pena ser citada:

É certo que nem sempre o terceiro pretenderá valer-se da coisa julgada pro-duzida inter alia contra uma das partes que participou do processo em que formada a coisa julgada. É possível que a coisa julgada formada, por exem-plo, num processo de A contra B, e que beneficia os interesses do terceiro C, seja por este invocada contra um outro sujeito D, que também não parti-cipou do processos em que se produziu a res iudicata. Nesse caso, a coisa julgada, embora beneficie um terceiro, prejudica outro, e sendo ambos ter-ceiros, a proibição do art. 506 impede que a coisa julgada seja invocada, não porque beneficia C, mas porque prejudica D. Ora, se um terceiro opu-ser o resultado estável que lhe beneficia a outro sujeito que também não participou do processo, este também seria um “terceiro” à disputa primitiva, e, portanto, não poderia ser atingido pela coisa julgada que o prejudique.43

Por fim, vale ressaltar que o art. 1.068 do CPC/2015, alterando o art. 274 do Código Civil, estabelece que os efeitos benéficos da coisa jul-gada individual envolvendo um dos credores solidários pode aproveitar os demais. Aquele que provocar a jurisdição estará submetido ao regime da coisa julgada e os demais, apenas nos casos benéficos (in utilibus).

Essas e outras situações podem ser incluídas na interpretação dos efeitos benéficos decorrente da coisa julgada individual, previstos no art. 506 do CPC/2015.

CONCLUSÕES

O CPC/2015 estabelece novos paradigmas ligados à estabilização das decisões judiciais, especialmente no que respeita à extinção do agravo retido e à previsão expressa das hipóteses de cabimento de agravo de ins-

41 O art. 601, parágrafo único, do CPC/2015 pode ser indicado como um exemplo dessa extensão da coisa julgada, ao estabelecer que “a sociedade não será citada se todos os seus sócios o forem, mas ficará sujeita aos efeitos da decisão e à coisa julgada”.

42 Em verdade, este efeito expansivo pode prejudicar também o terceiro, em determinadas situações concretas, em detrimento do que estabelece o regramento geral do art. 506 do CPC. Como exemplo, podemos citar os casos daqueles que são atingidos pela decisão vinculante em casos repetitivos (art. 927), o adquirente de coisa litigiosa (art. 109, § 3º, do CPC/2015), ou mesmo a previsão contida na nota anterior (art. 601, parágrafo único, do CPC/2015).

43 In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; DIDIER JR., Fredie; TALAMINI, Eduardo; DANTAS, Bruno (Coord.). Breves comentários ao novo Código de Processo Civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1305.

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trumento contra as interlocutórias de 1º grau. Além disso, expressamente o diploma processual estabelece que algumas interlocutórias são recorríveis de imediato e outras só ao final, ampliando, com isso, o efeito devolutivo do recurso de apelação e das contrarrazões recursais (arts. 1.009 e 1.015 do CPC/2015).

Pelo sistema do CPC/1973, as interlocutórias de 1º grau estavam su-jeitas a agravo (retido – escrito ou oral, ou por instrumento – arts. 522 e seguintes), sob pena de preclusão imediata. Contudo, o novo CPC esva-ziou o cabimento de recurso imediato em relação às interlocutórias de 1º grau, ao consagrar: a) maior restrição ao recurso de agravo de instrumento (arts. 1.015); b) extinção do agravo retido; c) revisão do regime de preclu-são; d) a ampliação do efeito devolutivo por profundidade do recurso de apelação (art. 1.009) e das respectivas contrarrazões.

A restrição da recorribilidade imediata irá gerar, como consequência, a ampliação do efeito devolutivo do recurso de apelação, não deixando sujeitas à preclusão as questões processuais resolvidas na fase cognitiva, que não se enquadrem no rol do art. 1.015 (isso se não for caso de obrigar a parte, fazendo interpretação do art. 278 do CPC/2015, a apresentar o pro-testo imediato). Essa hipótese merece detida reflexão, tendo em vista que, como mencionado, altera o regime da preclusão temporal e o próprio efeito devolutivo recursal.

O novo Código elenca a possibilidade de interlocutórias apeláveis ou mesmo impugnadas nas contrarrazões de apelação, o que, a rigor, trata-se de novidade no sistema processual. No CPC/1973, a existência de agravo retido provocava a necessidade de interposição imediata do recurso e sua confirmação (ratificação) na apelação ou nas contrarrazões. Agora, com o novo sistema processual, não existe recorribilidade imedia-ta das interlocutórias não previstas no art. 1.015, adiando a impugnação recursal para momento posterior (preliminar da apelação ou das contrar-razões recursais).

Como demonstrado no texto, a solução dada pelo CPC/2015 em re-lação às interlocutórias irrecorríveis de imediato gera uma multiplicidade de alternativas e pela revisão dos conceitos ligados à preclusão e ao efeito devolutivo da apelação e das contrarrazões.

Por outro lado, a partir do momento em que o CPC/2015 estabelece a possibilidade de decisão interlocutória de mérito, também passa a consagrar a formação progressiva de coisa julgada e a multiplicidade de momentos para o cumprimento das decisões proferidas no curso do processo.

É razoável afirmar que o sistema processual, ao consagrar a irrecorribi-lidade imediata das interlocutórias não previstas no art. 1.015 do CPC/2015,

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acaba por ampliar o efeito devolutivo da apelação (ou contrarrazões) e do agravo de instrumento (ou contrarrazões – art. 1.015, II) contra decisão par-cial de mérito, em decorrência da interpretação dada ao art. 1.009, § 1º, do CPC.

Outrossim, a estabilidade decorrente da auctoritas rei iudicatae atinge o objeto principal (aqui entendido como principaliter tantum – art. 503 do CPC/2015), mas gera preclusão em relação às questões suscitadas, discuti-das e mesmo suscitáveis no processo. Caso contrário, poder-se-ia gerar sério risco de perpetuação das demandas, podendo a parte interessada alegar que não suscitou certo ponto e utilizá-lo para nova provocação judicial.

Pela leitura dos arts. 503 e 504 do CPC/2015, é possível chegar a seguinte conclusão em relação aos limites objetivos da coisa julgada: imu-nizam e estabilizam a questão principal expressamente decidida. Aqui, há a necessidade de entender que deve ocorrer a expressa manifestação judicial sobre o objeto, sobre a questão principal.

Por outro lado, o CPC/2015, no art. 503, § 1º, traz a possibilidade de ampliação dos limites objetivos para fazer a estabilidade decorrente da coisa julgada alcançar a questão prejudicial, desde que atendidos os seguin-tes requisitos: a) sua apreciação ser condicionante ao julgamento do mérito (do objeto principal); b) existência de contraditório prévio e efetivo, o que não ocorre em caso de revelia; c) o juiz do feito for competente em razão da matéria e pessoa para apreciar a questão prejudicial como objeto principal. Ademais, o § 2º do mesmo dispositivo indica que não se aplica nos casos em que existir limite cognitivo que impeça o aprofundamento da análise da questão prejudicial.

Acredita-se que muita polêmica prática irá gerar este dispositivo. Por cautela, o julgador deverá, até para evitar dúvida quanto aos limites de sua decisão, informar, na fundamentação, de que houve a garantia do contradi-tório prévio e efetivo, como forma de atender ao previsto neste art. 503 do CPC/2015, e fazer a estabilização também alcançar a questão prejudicial. Essa extensão da coisa julgada independe de provocação da parte, sendo consequência com contraditório efetivo.

O novo CPC passou a consagrar, no seu art. 506, que os limites sub-jetivos da coisa julgada não podem prejudicar terceiros. Nada impede, por-tanto, que os efeitos decorrentes da imutabilidade possam beneficiar ter-ceiros, o que está em conformidade com as previsões oriundas do CDC e atende, também, a outras situações jurídicas do dia a dia forense.

Por fim, vale ressaltar que o art. 1.068 do CPC/2015, alterando o art. 274 do Código Civil, estabelece que os efeitos benéficos da coisa jul-gada individual envolvendo um dos credores solidários pode aproveitar os

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demais. Aquele que provocar a jurisdição estará submetido ao regime da coisa julgada e os demais, apenas nos casos benéficos (in utilibus).

REFERÊNCIAS

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Assunto Especial – Doutrina

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

Incidência de Multa pelo Não Comparecimento da Parte à Audiência de Conciliação nos Juizados Especiais da Fazenda Pública1

Aplicación de Sanción por la Ausencia de la Parte a Audiencia de Conciliación en los Juzgados Especiales de la Hacienda Pública

LEONARDO OLIVEIRA SOARESMestre em Direito Processual pela PUC-MG, Membro da Academia Brasileira de Direito Pro-cessual e do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, Procurador do Estado de Minas Gerais, atualmente na condição de Advogado Regional em Ipatinga/MG, Professor de Teoria Geral do Processo e Processo Civil na Faculdade de Direito de Ipatinga (MG).

RESUMO: No trabalho, examina-se a possibilidade de aplicar-se a multa específica prevista no NCPC nos procedimentos regidos pela Lei nº 12.153/2009.

PALAVRAS-CHAVE: Conciliação; sanção; Juizados Especiais da Fazenda Pública; NCPC.

RESUMEN: En el artículo, se examina la posibilidad de aplicación de sanción propia prevista en lo nuevo Código de Proceso Civil brasileño en lo universo de la Ley nº 12.153/2009.

PALABRAS CLAVE: Conciliación; sanción; Juzgados Especiales de la Hacienda Pública; Nuevo Código de Proceso Civil brasileño.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O módulo cognitivo padrão e os Juizados Especiais Civis; 2 Incidência do NCPC nos Juizados Especiais Cíveis sob a ótica normativa; 3 Outra observação normativa; 4 Inci-dência da multa prevista no artigo 334, § 8º, do NCPC nos Juizados Especiais da Fazenda Pública Estadual; 5 E a autocomposição?; Conclusões; Referências.

Nenhuma sanção se prevê para o não comparecimento pessoal ou do procurador ou preposto com poderes para transigir. Como resolver o problema? Se o autor não comparece, nem seu procu-rador ou preposto, nenhuma repercussão sobre os fatos haverá, nem sobre o pedido, dada a ausência de previsão legal. Sanção é

1 Publicado originalmente na Coleção Repercussões do novo CPC – Juizados Especiais, v. 7, da editora JusPodivm. Texto revisto e acrescido.

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insuscetível de construir-se mediante processo análogo. A nosso ver, a hipótese será vista como traduzindo recusa de conciliar, o que é um direito da parte, de que parece ainda não foram expro-priados os sujeitos de direito em nosso País, devendo prosseguir o feito caso não obtida a conciliação. O mesmo no tocante à ausência do réu ou de seu procurador. (CALMON DE PASSOS, José Joaquim. Comentários ao Código de Processo Civil. 9. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. III, 2005)

INTRODUÇÃO

Na judiciosa lição doutrinária anteriormente destacada, sustentou-se o direito de autodeterminação das partes, consistente, linhas gerais, na es-colha por deixar de comparecer à audiência inicial voltada para a resolução consensual de conflitos.

Uma particularidade merece, de logo, ser realçada, a saber: inexis-tir, ao tempo em que redigida tal passagem, sanção regularmente instituída para o caso da ausência em apreço.

Pois bem. Com a criação do NCPC2, tal singularidade caiu por terra. Sim, vez que o art. 334, § 8º, de aludido diploma legal autoriza a aplicação de multa na hipótese de uma das partes, de modo injustificado, não se fazer presente à respectiva audiência3.

Em síntese, o pressuposto normativo resta, agora, atendido, eis que – ao menos do ponto de vista formal4 – de nenhuma mácula se revestiu a aprovação do dispositivo em evidência, como, de resto, a do NCPC em sua inteireza considerado.

Dito isso, propõe-se examinar se a cominação em apreço ha-verá de ser aplicada no âmbito dos procedimentos regidos pela Lei nº 12.153/20095.

2 Os dispositivos do NCPC e o enunciado do fórum permanente de processualistas civis citados ao longo do texto foram extraídos da seguinte obra: DIDIER JR., Fredie; PEIXOTO, Ravi. Novo Código de Processo Civil. Comparativo com o Código de 1973. Salvador: JusPodivm, 2015.

3 Segundo o Enunciado nº 273 do fórum permanente de processualistas civis: “Ao ser citado, o réu deverá ser advertido de que sua ausência injustificada à audiência de conciliação ou mediação configura ato atentatório à dignidade da justiça, punível com a multa do art. 335, § 8º, sob pena de sua inaplicabilidade”.

4 Reserva-se para outro estudo o exame da constitucionalidade material da imputação em foco. 5 Empregado o tempo verbal no futuro, pois, até segunda ordem, o NCPC entrará em vigor em 18 de março de

2016, diante da vacatio legis de 1 ano prevista no art. 1.045 da Lei nº 13.105/2015 e do disposto no art. 8º, § 1º, da Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, acrescentado pela Lei Complementar nº 107, de 26 de abril de 2011, assim redigido: “A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subseqüente à sua consumação integral”. Para chegar-se a essa conclusão, foram considerados o prazo de 12 meses e a data de publicação da Lei nº 13.105, no caso, 17 de março de 2015. Ou seja, o período de

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Nada obstante a conclusão central a que se chegou englobe os Jui-zados Especiais Cíveis em seu todo6, optou-se pela respectiva delimitação, com o que se pontuaram, ao longo da exposição, especificidades inerentes aos Juizados Especiais da Fazenda Pública.

Dito isso, inicia-se propriamente o exame do tema.

Em primeiro lugar, à luz de perspectiva a que se vai chamar sistêmica.

1 O MÓDULO COGNITIVO PADRÃO E OS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS

No NCPC, pretendeu-se, acertadamente, valorizar as soluções não “adjudicadas” de conflitos.

Com efeito, pois, além de disciplinar a denominada audiên-cia de conciliação ou mediação (art. 334), cuidou-se da profissionali-zação de conciliadores e mediadores a fim de criar melhores condições para o êxito de cogitada audiência (art. 167). Ou, se preferir, com o in-tento de alcançar-se tanto quanto possível a pacificação social. Ademais, a partir de seu art. 190, o NCPC oferece amplo leque para a realização de negócios processuais7, desde quando o direito em disputa admita au-tocomposição. Sem contar a autorização para elaborar-se o calendário processual, por intermédio do que partes e juiz poderão estabelecer da-tas e fases compatíveis com as peculiaridades da demanda em juízo (art. 191 do NCPC).

Ou seja, ostenta o NCPC – no plano da cognição, para ficar com o que interessa ao presente estudo – características afins do universo correlato dos Juizados Especiais Cíveis.

De fato, pois, valorizadas, quer a oralidade, quer a simplificação pro-cedimental, pilares principiológicos do microcosmo em pauta8.

Em síntese, pode dizer-se que a filosofia de que se vê impregnado o módulo cognitivo padrão aproxima-se daquela presente no campo corres-pondente dos Juizados Especiais Cíveis.

vacatio legis, demarcado em lei, não foi computado em dias. Desse modo, e salvo melhor juízo, a entrada em vigor ocorrerá no primeiro dia útil subsequente: 18 de março de 2016.

6 Composto pelas Leis nºs 9.099/1995, 10.259/2001 e 12.153/2009.7 Colhe-se advertência quanto aos excessos a que se pode chegar mediante os “acordos” processuais, em

NUNES, Dierle. Reformas processuais: estatalismo ou privatismo? Por um modelo comparticipativo. RBDPro 90/146.

8 Ao propósito, vide CARDOSO, Oscar Valente. Juizados Especiais da Fazenda Pública (comentários à Lei nº 12.153/2009). São Paulo: Dialética, 2010. p. 21-30.

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Dessa maneira, por meio da defesa da incidência subsidiária em pau-ta, contribui-se, ao fim e ao cabo, para o uniforme funcionamento do siste-ma público de justiça pátrio.

Agora, uma ligeira abordagem de cunho prioritariamente normativo.

2 INCIDÊNCIA DO NCPC NOS JUIZADOS ESPECIAIS CÍVEIS SOB A ÓTICA NORMATIVA

No art. 15 da Lei nº 13.105/2015, estabeleceu-se que, na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, serão aplicados supletiva e subsidiariamente os comandos do NCPC.

Vê-se, portanto, que o legislador especificou os ramos do direito con-templados pela incidência nos moldes anteriormente demarcados.

Poder-se-ia sustentar que se trata de rol meramente exemplificativo, cabendo ao direito processual dito comum solucionar eventuais lacunas no plano dos procedimentos cíveis previstos em leis especiais. Notadamente, pelo fato de o art. 1.045, § 2º, inserto no Livro Complementar do NCPC, dispor que: “Permanecem em vigor as disposições especiais dos procedi-mentos regulados em outras leis, aos quais se aplicará supletivamente este Código”9.

Seja como for, não fica excluída interpretação literal, a desautorizar a aplicação residual do NCPC no campo cognitivo dos Juizados Especiais Cíveis10.

3 OUTRA OBSERVAÇÃO NORMATIVA

Ainda em suas disposições finais, o NCPC cuidou, em seus arts 1.062 a 1.066, de normas afetas aos Juizados Especiais.

Assim, em reforço à interpretação restritiva cogitada ao término do tópico anterior, ter-se-ia o seguinte argumento: as demais regras da Lei nº 13.105/2015 não se aplicam na esfera dos Juizados Especiais, já que o legislador – quando desejou tratar desse campo jurisdicional específico – o fez de modo expresso.

9 À luz do CPC/1973, defendeu-se sua aplicação subsidiária no campo dos Juizados Especiais. Para tanto, mencionou-se o art. 272, parágrafo único, de referido Código. Melhor se afigura, porém, tal aplicação a partir do disposto no art. 271 do CPC/1973. Feito, pois, o devido ajuste. SOARES, Leonardo Oliveira. Ainda o princípio da confiança nos pronunciamentos jurisdicionais. Novos escritos de direito processual: entre presente e futuro. Belo Horizonte: Del Rey, 2015. p. 148, nota de rodapé n. 11.

10 Sobre o tema, consulte-se BOLLMAN, Vilian. Aplicar novo CPC a Juizados Especiais Federais passa por condições. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2015-mai-31/aplicar-cpc-juizados-especiais-federais-passa-condicoes>. Acesso em: 8 jul. 2015.

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Vistos, em perspectiva geral, argumentos pró e contra a incidência subsidiária e supletiva geral do NCPC no microcosmo em tela11, é chegado o momento de particularizar o discurso.

4 INCIDÊNCIA DA MULTA PREVISTA NO ARTIGO 334, § 8º, DO NCPC NOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PúBLICA ESTADUAL

Em seu art. 27, a Lei nº 12.153/2009 prevê a aplicação subsidiária das normas do CPC/1973, da Lei nº 9.099/1995 e da Lei nº 10.259/2001.

Como o art. 1.045, § 4º, do NCPC estabelece que a remissão ao CPC/1973, feita em leis especiais, deverá, doravante, ser lida como alusão ao NCPC, tem-se como certa a incidência subsidiária do NCPC nos Juiza-dos Especiais da Fazenda Pública. O que, por óbvio, não corresponde a afirmar que os procedimentos em curso perante aludidos órgãos jurisdicio-nais deixarão de preservar suas especificidades, v.g., a inexistência de pra-zo diferenciado para a prática de atos processuais, conforme art. 7º da Lei nº 12.153/2009.

Então, para que haja a incidência em apreço, deverá, de modo con-corrente:

a) inexistir regra específica nas Leis nºs 9.099/1995, 10.259/2001 e 12.153/2009; e

b) haver compatibilidade procedimental e com a natureza dos di-reitos discutidos em juízo.

Quanto ao primeiro dos critérios, sabe-se que não há previsão de sanção (rectius: de sanção de multa) para a ausência injustificada das par-tes à audiência de conciliação na órbita do procedimento regido pela Lei nº 12.153/2009.

No entanto, por força da aplicação subsidiária do art. 51, I, da Lei nº 9.099/1995, autorizada pelo art. 27 da Lei nº 12.153/2009, o não compa-recimento da parte autora – a quaisquer das audiências, é bom que se diga – já se vê sancionado com a extinção do processo sem resolução de mérito. Sem prejuízo, em todo caso, de consequência pecuniária, pois a isenção do pagamento de custas dependerá da comprovação de que a ausência decorreu de força maior, consoante art. 51, § 1º, da Lei nº 9.099/1995. Por outras palavras, há estipulação de consequência própria para o não com-

11 Quanto à aplicação subsidiária do CPC na fase executiva perante os Juizados Especiais no âmbito civil, consulte-se ASSIS, Araken de. Execução civil nos Juizados Especiais. 5. ed., rev. e atual. São Paulo: RT, 2013. p. 45. À luz do disposto no art. 1.045, § 4º, do NCPC, permanecerá válida aludida aplicação.

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parecimento do demandante, a afastar nova e, portanto, dupla penalização. Consequência, saliente-se, compatível com o direito de autodeterminação do autor. Afinal, na espécie, a ausência será interpretada tão só como desis-tência de postulação oriunda – vá a obviedade! – de livre e prévia manifes-tação de vontade própria.

Tal argumento, salvo melhor juízo, é bastante para que se deixe de aplicar o disposto no art. 334, § 8º, do NCPC na seara procedimental em exame, vez que referido comando visa a inibir ato omissivo injustificado do réu não menos que do autor no processo.

A partir do que se acaba de dizer, talvez se suponha que o passo se-guinte corresponda a defender a aplicação da sanção processual da revelia, prevista no art. 20 da Lei nº 9.099/1995, em virtude da ausência do réu à sessão de conciliação ou à audiência de instrução e julgamento.

Isso, por força da aplicação subsidiária permitida pelo art. 27 da Lei nº 12.153/2009.

No entanto, em se tratando da Fazenda Pública em juízo – ao menos em princípio –, vai se estar diante de direitos indisponíveis, que afastam o efeito material da revelia, pois, ao fim e ao cabo, cogitado efeito desenca-deia consequências substanciais de cunho dispositivo12.

Diz-se em princípio, pois nada obsta a que, mediante lei, sejam con-feridos poderes de disposição aos representantes judiciais da Fazenda Pú-blica, como, por exemplo, ocorre na órbita dos Juizados Especiais Federais (art. 10, parágrafo único, da Lei nº 10.259/2001).

Ao propósito da inaplicabilidade em questão, merecem consulta os seguintes precedentes do STJ: REsp 939.086/RS, AgRg-REsp 1170170/RJ, AgRg-AgRg-AREsp 234461/RJ e AgRg-EDcl-REsp 1288560/MT.

É certo que não se estava diante de demandas submetidas ao proce-dimento previsto na Lei nº 12.153/2009.

De outro lado, independentemente de se tomar partido a respeito dos requisitos, por hipótese, ensejadores de configuração de revelia nos Juiza-dos Especiais da Fazenda Pública, sustenta-se a inadmissibilidade de inci-dência da sanção estatuída no art. 334, § 8º, do NCPC no universo especial ora delimitado.

12 Inaplicável, dessa maneira, no âmbito dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, o Enunciado nº 78 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais Cíveis, segundo o qual: “O oferecimento de resposta, oral ou escrita, não dispensa o comparecimento pessoal da parte, ensejando, pois, os efeitos da revelia (XI Encontro – Brasília/DF)”.

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Com efeito, haja vista a impossibilidade de aplicar-se supletivamente apenas parte de um mesmo dispositivo do NCPC13, eis que, insista-se, refu-tada sua incidência em relação ao autor.

Aí, em suma, a razão pela qual se rechaça a aplicabilidade da multa em foco, seja ao autor, seja ao réu nos procedimentos regidos prioritaria-mente pela Lei nº 12.153/2009.

A rigor, a partir da interpretação desenvolvida no presente item, po-de-se concluir que a exclusão em tela envolve o microcosmo dos Juiza-dos Especiais Cíveis, dado o disposto no art. 51, I, da Lei nº 9.099/1995, e sua incidência subsidiária prevista, respectivamente, nos arts. 1º da Lei nº 10.259/2001 e 27 da Lei nº 12.153/2009.

Enfim, uma derradeira ponderação.

5 E A AUTOCOMPOSIÇÃO?

Ao tempo em que se apostam todas as fichas na autocomposição dos conflitos, poder-se-ia indagar o porquê de se desenvolver estudo no qual, por assim dizer, reduz-se o campo de aplicação de multa estatuída com o propósito (será mesmo?) de estimular o desfecho consensual de demandas, notadamente, em virtude de se tratar de incidência na esfera de órgãos juris-dicionais vocacionados para tal desiderato.

Ora, ora, forçoso convir que, no particular, bem mais oportuno se afi-gura voltar as atenções para o exercício da prerrogativa legislativa conferida pelo art. 8º da Lei nº 12.153/2009, a partir do que estarão, com efeito, os representantes judiciais da Fazenda Pública autorizados – vale destacar – a “conciliar, transigir ou desistir”14.

CONCLUSÕES

As regras do NCPC aplicam-se supletiva e subsidiariamente no cam-po cognitivo civil dos Juizados Especiais, quer em virtude de uma “aproxi-mação” de princípios e propósitos, quer em função de disposição expressa constante do Livro Complementar do NCPC.

13 Em estudo pendente de publicação, defendeu-se a incidência, em seu todo considerado, do art. 557 do CPC/1973, no plano dos Juizados Especiais, seja para autorizar o julgamento monocrático pelas Turmas Recursais, seja para permitir a interposição de agravo de cogitado decisum. SOARES, Leonardo Oliveira. Recorribilidade de liminares na Lei nº 12.153/2009 e repercussão geral: problema do legislador ou dos operadores do Direito? RDDP 149, ago. 2015.

14 Isso porque, diferentemente do que se sustentou em obra específica (SOUZA, Márcia Cristina Xavier de. Juizados Especiais Fazendários. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 119), a Lei nº 12.153/2009 não conferiu delegação de poderes para a autocomposição similar àquela presente no parágrafo único do art. 10 da Lei nº 10.259/2001.

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Para tanto, devem ser atendidos dois requisitos, a saber: a) inexistir regra específica nas Leis nºs 9.099/1995, 10.259/2001 e 12.153/2009; e b) haver compatibilidade procedimental e com a natureza dos direitos dis-cutidos em juízo.

Haja vista a previsão de sanção específica – art. 51, I, da Lei nº 9.099/1995, aplicável subsidiariamente nos procedimentos regidos pela Lei nº 12.153/2009 –, resta afastada a aplicação da multa estatuída no NCPC para a ausência injustificada da parte autora à audiência de conciliação designada nos Juizados Especiais da Fazenda Pública. Realmente, pois, do contrário, estará o autor sujeito à dupla penalização.

Diante disso, fica excluída, de igual forma, tal incidência em relação ao réu, eis que a norma em apreço visa a sancionar omissão injustificada do autor não menos que do demandado.

Nada obstante o recorte procedimental anteriormente citado, a exclu-são em tela alcança os Juizados Especiais Cíveis como um todo, em virtude do disposto no art. 51, I, da Lei nº 9.099/1995, e sua respectiva incidência subsidiária.

Na esfera dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, a autocomposi-ção – sua possibilidade, insista-se – encontra-se condicionada, em primeiro lugar, ao prévio exercício de competência legislativa pelos entes federados respectivos.

REFERÊNCIAS

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Assunto Especial – Doutrina

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

O Novo Código de Processo Civil: a Evolução do Sistema Jurídico

MARCIO EVANGELISTA FERREIRA DA SILVADoutorando em Direito e Políticas Públicas pelo UniCeub, Mestre em Direito e Políticas Públi-cas pelo UniCeub, Especialista em Direito pela UCM, Professor Universitário na IESB, Juiz de Direito no TJDFT.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A evolução do Direito; 2 A interpretação como forma de evolução do Direito; 3 O efeito vinculante como evolução do Direito; 4 O novo Código de Processo Civil como expressão da evolução do Direito; Considerações finais; Referências.

INTRODUÇÃO

O presente artigo analisa a evolução do sistema processual civil bra-sileiro diante do advento da Lei nº 13.015, de 16 de março de 2015 – o novo Código de Processo Civil. Pretende-se demonstrar se da atual forma de legislar pode se inferir ou não uma evolução tendente a alterar o sistema do civil law. Com o mesmo intuito demonstrativo, o estudo compreende a análise da interpretação dos enunciados normativos como forma de evolu-ção do Direito.

O tema, portanto, fecha-se na hipótese de os Poderes Legislativo e Judiciário estarem se afastando do sistema civil law diante da influência do common law. O problema é se os Poderes Legislativo e Judiciário, estabe-lecendo o precedente jurisprudencial (súmula, tese jurídica) como fonte do Direito, com suporte em eventual influência do common law, podem estar afrontando o sistema civil law e criando um novo sistema jurídico híbrido.

As hipóteses iniciais propostas para a pesquisa foram no sentido de que: (i) os Poderes Legislativo e Judiciário recebem influência do entorno – compreendido como irritações provocadas pelo sistema norte-americano – e, assim, como integrantes de um sistema autopoiético, internalizaram regras (de legislar e de julgar) do common law no sistema brasileiro, afas-tando-se do civil law; (ii) os Poderes Legislativo e Judiciário, como integran-tes de um sistema autopoiético, recebem influência do entorno (common law), no entanto, permanecem na esteira do sistema civil law, porquanto a

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criação de mecanismos de vinculação aos precedentes (respeito ao entendi-mento das Cortes Superiores) não descaracteriza o sistema.

A metodologia é parte importante para o estudo, que será científico quando apresentar um “círculo racional lógico”. O método adequado apre-senta uma “sequência lógica de observação, análise, formulação de hipóte-ses, experimentação, verificação das hipóteses e formação de conclusões”. Segundo a classificação das ciências, vários são os métodos utilizados para tratar o estudo, mas deve-se observar a natureza do objeto da área do saber. O Direito, compreendido como ciência social, adota um conjunto de méto-dos, “dentre os quais destacam-se o método de abordagem e os métodos de procedimento” (Figueiredo; Souza, 2008, p. 91-92).

No presente estudo, o método de abordagem adotado foi o dedutivo, e foram analisadas as teorias sobre a evolução dos sistemas jurídicos. Entre outras, foram consideradas as teorias de René David e de Niklas Luhmann.

Em uma análise inicial, a pesquisa sugere que o Poder Legislativo, ao criar mecanismos de vinculação de posicionamento jurídico pelos prece-dentes jurisprudenciais, com suporte em eventual influência do common law, poderia estar afrontando o sistema civil law.

Ainda na análise inicial, outra sugestão encontrada foi a de que o Po-der Judiciário, ao fundamentar as decisões em precedentes jurisprudenciais, bem como ao estabelecer teses jurídicas e súmulas com efeitos vinculantes, fundado nos precedentes jurisprudenciais e com suporte em eventual in-fluência do common law, poderia estar afrontando o sistema civil law.

No primeiro capítulo, foi analisada, ainda que superficialmente, a te-oria de Niklas Luhmann. Verificou-se que no Direito há a necessidade de evolução para o acoplamento entre o antigo e o novo devido às variações do próprio Direito.

Na sequência, foi visto que a evolução do Direito também ocorre pela interpretação que é uma constante devido às transformações fático--axiológicas, pois um texto escrito há cem anos, ao ser interpretado nos dias atuais, terá sentido, alcance e extensão diverso da época de sua publicação.

Em seguida, constatou-se que a evolução ocorre no momento em que se ventila a possibilidade de a legislação ceder aos novos entendimentos vinculantes externados nas decisões das Cortes, gerando um direito diferen-ciado e construído por decisões.

Ainda no desenvolvimento do presente artigo, no quarto capítulo, foi analisado o novo Código de Processo Civil. Constatou-se que a novel legis-

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lação trouxe vários dispositivos com nítida influência do common law, pois conferiu força normativa à tese jurídica (entre outros instrumentos), notando verdadeira evolução do Direito.

Nas considerações finais, ficou assentando que, sob a ótica da auto-poiese, em sendo o Direito dinâmico, sempre ocorrerá a evolução devido à necessidade de reduzir a complexidade das possibilidades do ser no mundo.

Ao final, apresenta-se resposta ao problema inicial de que a atuação presente dos Poderes Legislativo e Judiciário sugere uma evolução constante do Direito e conclui se estamos no caminho de uma alteração do sistema jurídico brasileiro pela influência do common law.

1 A EVOLUÇÃO DO DIREITO

Niklas Luhmann afirma que os conceitos sobre evolução do Direito são pouco nítidos e sem nenhuma precisão teórica e que “a evolução só se leva a cabo se tanto a diferença quanto a adaptação entre sistema e en-torno se mantêm, pois ‘do contrário desapareceria o objeto da evolução’” (Luhmann, p. 171-172).

Note-se que, ao abordar o tema evolução do Direito, é necessário considerar a influência dos movimentos sociais, mormente pelo fato de que os Tribunais estão vinculados aos textos legislativos (Campilongo, 2012, p. 34-35).

Campilongo assevera que:

[...] a aposta dos movimentos sociais no Direito – e, portanto, confiança na força do Direito – pode aflorar de três modos: “contra”, “pelo”, e “após” o Direito. [...] No fundo, identifica-se um obstáculo construído pelo Direito e procura-se removê-lo também através do Direto. [...] desse modo, ainda que de maneira não prevista ou indesejada, contribuem para o aguçamento da autorreflexão do Direito, para expansão de sua capacidade de auto-ob-servação e autocorreção de suas operações e, por fim, introdução de varia-bilidade no sistema jurídico. (Campilongo, 2012, p. 34-35)

A análise da evolução do Direito sob o enfoque da autopoiese e da heteropoiese cinge-se, principalmente, à irritação que o entorno causa no sistema jurídico. Segundo Luhmann, “[...] a expectativa normativa se equili-bra mediante a forma escrita, trazendo a estabilidade”. No entanto, há uma necessidade de acoplamento “entre o agora e o depois”, eis que “o texto está sujeito a contínuas reobservações mediante novas distinções”, sendo

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tarefa do intérprete, pois, “todo direito assegurado mediante escritos é um direito que pode ser interpretado” (p. 182-183).

Citado autor afirma, quanto à evolução autopoiética, que “la evolu-ción se efectúa cuando se cumplen diferentes condiciones y cuando éstas se acoplan entre sí de manera condicional (=necessária)”, quais sejam: va-riação, seleção e estabilização do sistema (Luhmann, p. 173).

E prossegue: “A autopoiese é conditio sine qua non de toda evolução, pois pode-se alcançá-la através da alteração das estruturas”. Note-se que a evolução, como visto anteriormente, depende do acoplamento estrutural, “pois a evolução se efetua quando se completam diferentes condições e quando estas se acoplam entre si de maneira condicional de variação, sele-ção e estabilização” (Luhmann, p. 173).

É importante asseverar que há inúmeros fatores que influenciam os sistemas, uma vez que “uma sociedade complexa só pode ser descrita por meio de uma teoria complexa e não há outro meio de alcançar um juízo sobre o direito da sociedade” (Luhmann, p. 79).

Conforme Bruno Amaral Machado1,

nas sociedades contemporâneas, diferenciadas funcionalmente, a econo-mia, a religião, a arte, a moral, a ciência, a política e o direito constituem sistemas autopoiéticos, cognitivamente abertos e operativamente fechados, os quais se autodescrevem e se autorreproduzem a partir de códigos e pro-gramas próprios.

Gunther Teubner, ao abordar o tema, narra que o Direito está em contato diuturno com crises políticas, movimentos sociais e variações do próprio Direito – fatores que são essenciais para a evolução. Destarte, a transformação decorre da comunicação interna do sistema jurídico (1989, p. 43).

Portanto, o Direito, nos termos de Robert Van Krieken2,

como qualquer outro sistema, tem de coordenar-se com outros sistemas e com o seu ambiente, e Luhmann sugere que essa relação produz um requi-sito correspondente para capacidade de resposta conceitual, somando-se o encerramento normativo do direito de uma segunda dimensão ou aspecto de “abertura cognitiva”.

1 Discursos criminológicos sobre o crime e o direito penal: comunicação e diferenciação funcional. Disponível em: <https://uniceub.br/media/180340/Artigo_DiscursosCriminologicos.pdf>.

2 Law’s autonomy in action: anthropology and history in court. University of Sydney, Australia. Disponível em: <http://sls.sagepub.com/content/15/4/574>.

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A par disso, a evolução do Direito – enquanto subsistema – ocorre devido ao distanciamento da legislação frente às situações reais. Com efeito, “o sistema do Direito é operativamente fechado e cognitivamente aberto ao mesmo tempo”, ou seja, fechado na programação do legislador, mas aberto enquanto programa finalístico (Rocha, 2013, p. 43).

Conclui-se que o subsistema do Direito é ligado ao passado (legisla-ção) e ao futuro (fatos reais) ao mesmo tempo, nascendo daí a necessidade de evolução, pois há irritação que gera desconforto – desencadeando o acoplamento que redunda na evolução do Direito.

2 A INTERPRETAÇÃO COMO FORMA DE EVOLUÇÃO DO DIREITO

No sistema do civil law, o direito positivo estabelecido no enunciado normativo não encerra os problemas da sociedade, tendo em vista que as disputas diuturnas, na maioria das vezes, resolvem-se com a aplicação da norma ao caso concreto, sendo que tal aplicação é levada ao Poder Judi-ciário, surgindo o problema da aplicação do enunciado normativo abstrato ao problema real, sendo que cada litigante apresenta sua forma de ver o enunciado normativo, apontando que norma seja aplicada (Coelho, 2001, p. 47-51).

O problema também ocorre, na maioria das vezes, quando não há uma correspondência métrica entre o que foi previsto pelo legislador e o caso do mundo, a distância entre a generalidade do enunciado normativo e a singularidade do caso concreto, ou seja, “a antinomia entre o abstrato e o concreto” (Coelho, 2001, p. 47-51).

Interpretar o enunciado normativo é tarefa necessária, pois a anti-ga máxima in claris cessat interpretatio não se sustenta, tudo se interpreta (Maximiliano, 2000, p. 9). Com efeito, sempre há margem de interpreta-ção, o enunciado normativo deve ser sempre avaliado quanto à vontade e à intenção da lei, pois, como disse Ulpiano, “embora claríssimo o edito do pretor, contudo não se deve descurar da interpretação respectiva” (apud Maximiliano, 2000, p. 33).

Uma lei, para obrigar “de maneira realmente efetiva”, deve ser bre-ve e clara, ou seja, acessível a todos (Villey, 2009, p. 742). Nítido, então, que a lei deve conter expressões de fácil compreensão, bem como deve o enunciado normativo ser taxativo, certo e sem obscuridade. No entanto, convém salientar que o problema da interpretação não se cinge às leis, mas a todos os enunciados normativos, inclusive constitucionais. Com efeito, os enunciados constitucionais não contêm termos unívocos, ou seja, contêm

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palavras (símbolos linguísticos) que podem ter vários sentidos (Alves Junior, 2010, p. 76).

Alf Ross relata que todo enunciado normativo, seja claro ou vago, depende de uma interpretação, pois “nenhuma situação concreta enseja uma aplicação única da lei”, sendo “errôneo, também, portanto, crer que um texto pode ser tão claro a ponto de ser impossível que suscite dúvidas quanto a sua interpretação” (2007, p. 164-165 e 330).

Com efeito, um texto escrito há cem anos, ao ser interpretado nos dias atuais, sem dúvidas terá sentido, alcance e extensão diversos do preconiza-do à época de sua edição, pois há evolução social. Assim, a hermenêutica apresenta processos que aproximam o texto normativo à realidade atual e, por isso, sempre há interpretação e não há enunciado normativo que não necessite de interpretação, pois o aplicador parte da abstração e encerra a realidade.

Quando o intérprete busca adequar o enunciado normativo aos tem-pos atuais, quando busca “o significado jurídico da lei, que só pode ser o seu significado atual, e não o significado histórico, aquele que lhe foi atribuído ao tempo da promulgação”, estará no caminho da interpretação progressiva/evolutiva. O intérprete, ao buscar o significado atual do enun-ciado normativo, expande o sentido e o alcance do aludido preceito, “in-corporando novos instrumentos de análise e descortina novos horizontes” (Coelho, 2011, p. 71).

Ao interpretar-se progressivamente, quer-se dizer que o enunciado normativo terá aplicação a “situações que contempladas à luz do sentido linguístico natural se encontram claramente fora de seu campo de referên-cia”. Assim se procede, estender o sentido do enunciado normativo, pelo fato de que houve uma “formulação parcial, uma revelação incompleta”, sob o argumento de que essa era a vontade do legislador, presumindo-se tal desiderato, mas “é forçoso ter ele desejado o que é desejável para o próprio juiz” (Ross, 2007, p. 179-183).

Assim, a interpretação progressiva/evolutiva atende aos progressos sociais, já que “a atividade interpretativa pode ser considerada um prolon-gamento ou até mesmo uma fase do processo legislativo”. E mais, ao longo dos séculos, juristas apresentam renovadas interpretações sobre textos anti-gos, como, por exemplo, a Lei das XII Tábuas e a Constituição dos Estados Unidos da América. Conclui-se, então, que as novas interpretações nada mais são do que a apresentação de elementos que originariamente já eram integrantes dos textos interpretados (Coelho, 2011, p. 41 e 71).

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Segundo Inocêncio Mártires Coelho, apoiado em Radbruch, a “inter-pretação jurídica não é pura e simplesmente um pensar novo aquilo que já foi pensado, mas, pelo contrário, um saber pensar até o fim aquilo que já começou a ser pensado por um outro”. A interpretação do enunciado nor-mativo, de acordo com as transformações sociais, são “fatores de atualiza-ção e regeneração da sua força normativa” (2011, p. 49-50, 61-62 e 70-71).

Conclui-se que o direito positivo deve evoluir pelo fato de não resol-ver os problemas da sociedade, e mais, não há um texto que seja tão claro que não demande interpretação evolutiva para resolver o caso concreto. Foi dito que ao texto normativo escrito há muitos anos deve ser conferido novo sentido, alcance e extensão, aproximando o texto à realidade, ou seja, evoluindo diante das novas facetas da sociedade.

3 O EFEITO VINCULANTE COMO EVOLUÇÃO DO DIREITO

O direito e a política permeiam a sociedade, e, assim, um influencia o outro e vice-versa, fazendo com que haja uma “autocriação histórica de uma sociedade”. O direito moderno enfrenta a complexidade das relações diuturnas e, assim, apresenta “decisões sempre diferentes”. Neste sentido, Leonel Severo Rocha afirma que “o Direito moderno, ao contrário [do jus-naturalismo], para sobreviver na sociedade indeterminada, será um direito positivo; um Direito diferenciado e construído por decisões” (p. 11-13).

Partindo de tal premissa – Direito construído por decisões – é que constatamos uma evolução do direito processual civil brasileiro. Com efeito, comumente se afirma que no Brasil o sistema jurídico é fundado no civil law. No entanto, diante das novas legislações brasileiras (a exemplo do novo Código de Processo Civil), constata-se uma mistura de sistemas, a saber: civil law e common law.

Antes de prosseguirmos no desenvolvimento do raciocínio sobre a evolução do Direito brasileiro pela vinculação do precedente, fundamental é analisar como sãos os sistemas do Direito e suas diferenciações em famí-lias (David, 2002, p. 24-25).

Sucintamente, o civil law é um sistema romano-germânico no qual o fato marcante é a compilação e a codificação em “textos harmônicos, normas costumeiras, normas escritas esparsas, decisões jurisprudenciais e doutrinárias [...]” (Soares, 2000, p. 27).

Com efeito, a partir do século XIX, atribuiu-se em tal sistema, papel importante à lei, e, assim, “os diversos países pertencentes a esta família dotaram-se de ‘códigos’” (David, 2002, p. 24-25).

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O sistema do common law pertence à segunda família, “comportan-do o Direito da Inglaterra e os direitos que se modelaram sobre o Direito inglês”. Cabe asseverar que, ao contrário do civil law, no common law, as regras existem para resolver o processo e não para serem abstratas e para o futuro (David, 2002, p. 24-25).

No Direito norte-americano, Guido Fernando Silva Soares levanta a questão da existência de mais de um sentido da expressão common law. Com efeito, o autor apresenta, em linhas gerais, dois sentidos. O primeiro como sendo “um sistema de direito escrito e esquematizado”, apontando a distinção entre common law e equity law. O segundo “permite aos Tribu-nais, na sua tarefa de distribuir justiça, definir regras abstratas do Direito”, apresentando a distinção entre common law e statute law (Soares, 2000, p. 14-15).

Pois bem, fica nítido que no Brasil o sistema adotado é o do civil law, no entanto, há vários institutos que se amoldam às regras do sistema da common law, havendo a convivência dos sistemas, ou, ainda, a existência de um sistema híbrido.

Joseph Raz, mutatis mutandi, relata que é possível a existência e con-vivência de dois sistemas jurídicos em uma sociedade, no entanto, “deter-minar se dois sistemas jurídicos são compatíveis ou não dependerá antes de tudo das formas de organização social de que eles fazem parte [...]”. Contudo, um sistema jurídico só pode existir por tempo determinado, pois “a esfera de existência efetiva de um sistema jurídico é mais estreita que sua esfera de aplicação” (Raz, 2012, p. 276-277).

Prosseguindo na análise da evolução do Direito brasileiro (civil law) pela influência do common law, cumpre asseverar que as fontes dos sis-temas em comento são diferentes. Com efeito, no civil law, “pensa-se na Constituição como fonte suprema de qualquer imposição, seguida por leis complementares, ordinárias, medidas de urgência, regulamentos, etc.” (Godoy, 2004, p. 93).

Enquanto que no common law há “institutos próprios, centrados na atividade produtora de judiciário de composição, natureza, origem, recru-tamento e garantias tão estranhas a protótipos que marcam nossos hábitos conceituais” (Godoy, 2004, p. 93).

Seguindo a abordagem da evolução do Direito, notadamente do sis-tema, no civil law é permitido ao juiz criar normas para que se alcancem resultados satisfatórios. A questão é de autorização ao “órgão aplicador do

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Direito” de “criar uma nova norma” para evitar resultados injustos ou iní-quos (Kelsen, 2005, p. 214).

Kelsen, ao abordar a nova norma criada, diz que o precedente é obrigatório, pois transmuda-se em norma genericamente aplicável a todos os casos semelhantes. No entanto, alerta que só é possível, assim, afirmar “onde os Tribunais estão autorizados não apenas a aplicar Direito substanti-vo preexistente nas suas decisões judiciais o caráter de precedentes (Kelsen, 2005, p. 216).

Interessante notar que a teoria da autopoiese pode, no meu sentir, ser encontrada em Kelsen, ainda que subliminarmente, quando afirma que “o Direito regula a sua própria criação, na medida em que uma norma jurídica determina o modo em que outra norma é criada e também, até certo ponto, o conteúdo dessa norma” (Kelsen, 2005, p. 181).

A calhar, no mesmo sentido, Luhmann afirma que “las ‘teorías del derecho’ que surgen em la práctica jurídica o en la docência del derecho son, junto con los textos del derecho vigente, la forma en la que el derecho se presenta como resultado de las interpertaciones” (Luhmann, p. 4).

Note-se que, no sistema de legislação, “os juízes se sentem obriga-dos, em alto grau, ante as declarações da legislatura e a doutrina ideológica oficial”, a aderirem ao texto legal, mas, sistema de precedentes “as decisões jurídicas anteriores” desempenham papel importante, eis que há “a exigên-cia de que os casos análogos recebem tratamento similar, ou de que cada decisão concreta seja baseada numa regra geral” (Ross, 2000, p. 110-111).

Prosseguindo, notou-se há algum tempo que no sistema do civil law, mesmo não havendo obrigatoriedade em seguir o precedente de Cortes hie-rarquicamente superiores, as Cortes Inferiores e os magistrados de primeiro grau, com maior ou menor frequência, seguem os entendimentos das Cortes Superiores.

No sentido, confira o excerto que segue:

Já tive alguma dificuldade em admitir, em casos dessa natureza, também a qualificadora que decorre do perigo comum. Mas o Superior Tribunal de Justiça, recentemente – por ocasião das notas taquigráficas, farei juntar o precedente a que me refiro, e um precedente até do nosso Tribunal, da nos-sa própria Turma –, entendeu por bem acolher o recurso do Ministério Pú-blico para incluir na pronúncia também a qualificadora do perigo comum, entendendo que essa atitude do réu no trânsito põe em risco a coletividade de pessoas que lá se encontravam, já que, forçosamente, ele não se teria destinado especificamente apenas àquele conjunto de vítimas, mas, com a

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conduta que desempenharam, poderiam ter, pelo menos em tese, se vol-tado contra mais pedestres e mais motoristas que por ali trafegavam ou transitavam. Então, filiando-me ao entendimento do colendo Superior Tri-bunal de Justiça, mantenho na pronúncia a qualificadora do inciso III do art. 121.3

E, ainda:

O Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do REsp 1.251.331/RS, julgado pelo regime dos recursos repetitivos previstos no art. 543-C do CPC, decidiu acerca da possibilidade de cobrança de tarifa de cadastro, desde que tenha sido contratada expressamente.4

Assim, verifica-se que há uma força do precedente, ainda que não vinculante, levando-nos a crer na ocorrência de interpenetração dos sis-temas, pois “o magistrado de primeiro grau está afeito à observância do precedente, pois se trata de opção cômoda e coerente” (Dias, 2004, p. 71).

Antes mesmo da publicação do novo Código Civil, o Poder Legis-lativo havia instituído mecanismos de vinculação dos precedentes, como a Emenda Constitucional nº 45/2004, que instituiu o efeito vinculante das decisões do Supremo Tribunal Federal nas ações declaratórias de constitu-cionalidade5.

Outro ponto a ser lembrado é a previsão existente de que o Supre-mo Tribunal Federal pode editar súmulas vinculantes6 pela Corte já citada. Ainda a título de exemplo, a Lei nº 9.868, de 10 de novembro de 1999, que regulamentou o julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade e declaratórias de constitucionalidade, estabeleceu o efeito vinculante das decisões do Supremo Tribunal Federal em sede das referidas ações.

A Lei nº 9.704, de 17 de novembro de 1998, embora de caráter ad-ministrativo, introduziu legalmente a tese jurídica com efeito vinculante, inaugurando a obrigatoriedade ao precedente do Superior Tribunal de Justi-ça e do Supremo Tribunal Federal. A Lei nº 13.015, de 21 de julho de 2014,

3 Trecho retirado do voto do Desembargador Edson Alfredo Smaniotto, TJDFT, Acórdão nº 387190, 1ª T.Crim., julgado em 17.09.2009. Disponível em: <http://pesquisajuris.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj>. Acesso em: 20 maio 2015.

4 Trecho do voto do Desembargador Hector Valverde Santanna, TJDFT, Acórdão nº 864585, 6ª T.Cív., julgado em 29.04.2015. Disponível em: <http://pesquisajuris.tjdft.jus.br/IndexadorAcordaos-web/sistj>. Acesso em: 20 maio 2015.

5 Art. 102 da Constituição Federal.6 Art. 103 da Constituição Federal.

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trouxe também a vinculação do precedente, bem como a fixação de tese jurídica com efeito vinculante na seara da justiça trabalhista brasileira.

O novo Código de Processo Civil7 – que será objeto de capítulo espe-cífico – dispõem de vários dispositivos8 que estabelecem a vinculação pelos precedentes, bem como a tese jurídica firmada pelas Cortes.

Conclui-se, portanto, que o Brasil tem seus fundamentos no sistema romano-germânico, no qual há a compilação e a codificação de textos nor-mativos, mas constata-se também que possui institutos que revelam a in-cursão em outro sistema, o do common law, pois é permitido aos Tribunais – pela vinculação do precedente – impor uma regra abstrata.

4 O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL COMO EXPRESSÃO DA EVOLUÇÃO DO DIREITO

A disciplina do direito processual civil é voltada para a efetividade da tutela jurisdicional com segurança. O antigo Código de Processo Civil (Código Buzaid), de 11 de janeiro de 1973, já vinha sendo modificado pau-latinamente9, como, por exemplo, a separação que existia entre o processo de conhecimento e o de execução. Pode-se dizer que as reformas que ocor-reram no vetusto código caminharam para imprimir o estímulo das partes na cooperação para a resolução das demandas, bem como para que o juiz fosse mais flexível com as formalidades, prestigiando a justiça do caso con-creto (Marinoni; Mitidiero, 2011, p. 95).

Não bastassem as reformas, o Poder Legislativo brasileiro publicou um novo Código de Processo Civil, que, de acordo com a dicção de seu art. 1045, entrará em vigor após um ano da publicação10.

Depreende-se do primeiro artigo do novo código que se trata de uma codificação de normas que disciplinam a tramitação do proces-so civil brasileiro, estabelecendo, entre outras prioridades, a inafastabi-lidade da jurisdição (art. 3º, caput), a solução consensual dos conflitos (art. 3º, § 2º), a boa-fé das partes (art. 5º) e a duração razoável do processo (art. 4º).

Trata-se de um código extenso, com várias peculiaridades e inova-ções. No entanto, o que mais chama a atenção é a existência de dispositivos

7 Promulgado em 16.03.2015.8 Arts. 489, 985, 987, 1.040, entre outros.9 Lei nº 8.952, de 1994, Lei nº 10.444, de 2002, e Lei nº 11.232, de 2005 – são as mais profundas

modificações que podemos apontar.10 Como visto anteriormente, foi publicado em 16 de março de 2015.

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que denotam uma possível alteração no sistema jurídico brasileiro – como já adiantado anteriormente.

O novo Código de Processo Civil trouxe vários dispositivos que rea-firma a tendência da vinculação de decisões aos magistrados no intuito de garantir celeridade, segurança e isonomia aos litigantes.

Com efeito, o ordenamento jurídico brasileiro, como visto anterior-mente, tem suas origens no sistema civil law, ou seja, predomina como fonte primária do Direito a lei – prevalecendo a codificação. No entanto, constata-se na nova legislação processual civil que o legislador privilegiou o respeito ao precedente jurisprudencial – como no comon law.

Ora, nota-se do art. 12, § 2º, II, do novo Código a possibilidade de jul-gamento em bloco “para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos”. Conforme Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, tal dispo-sitivo revela que o legislador priorizou o julgamento dos casos submetidos ao Poder Judiciário com a aplicação da tese paradigmática (Wambier et al., 2015, p. 89).

Outro dispositivo que amplia a aplicação do efeito vinculante diz respeito à concessão da tutela de evidência, pois poderá ser deferida, nos termos do art. 311, II, do novo Código, quando “houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante”. Segundo Daniel Mitidiero, a tutela de evidência é fundada em cognição sumária e se baseia na evidência do direito postulado e na “noção de defesa inconsistente”, ou seja, pelo fato de que “a defesa articulada pelo réu é inconsistente ou pro-vavelmente o será (Wambier et al., 2015, p. 796).

Aludido dispositivo dá cumprimento ao mandamento constitucional da duração razoável ao processo (art. 5º, LXXVIII) também previsto no art. 4º do novo Código. Note-se que a tutela de evidência, corroborando a ideia de segurança jurídica e celeridade, revela a preocupação do legislador em conceder antecipadamente o direito do demandante quando fundar-se o pleito em tese jurídica.

Outro dispositivo que revela a preocupação na celeridade da presta-ção jurisdicional é o disposto no art. 954, parágrafo único, do novo Código, que confere ao relator a faculdade de julgar de plano os conflitos de com-petência, fundamentando sua decisão em tese jurídica. No caso, conforme Patrícia Miranda Pizzol, “o relator age como um juiz preparador, permi-tindo maior celeridade na prestação jurisdicional, na medida em que evita que um conflito sem chance de prosperar seja processado” (Wambier et al., 2015, p. 2127).

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Entre outros dispositivos, o que revela a enorme intenção legislativa de vinculação das decisões é a disposição prevista no art. 927 do novo Có-digo, pois é enfática ao dispor:

Os juízes e os tribunais observarão:

I – as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle concentrado de constitucionalidade;

II – os enunciados de súmula vinculante;

III – os acórdãos em incidente de assunção de competência ou de resolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursos extraordinário e espe-cial repetitivos;

IV – os enunciados das súmulas do Supremo Tribunal Federal em matéria constitucional e do Superior Tribunal de Justiça em matéria infraconstitu-cional;

V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vin-culados.

Como visto anteriormente, a título de exemplo, o Livro III, que trata “Dos Processos nos Tribunais e dos Meios de Impugnação das Decisões Ju-diciais”, estipula em várias passagens que o juiz deve seguir o entendimento esposado pelas Cortes Superiores, enunciados de súmulas e outras hipóteses de vinculação.

É sabido que a decisão em controle concentrado de constitucionali-dade, a súmula vinculante e a resolução de demandas repetitivas já estavam previstas antes mesmo da publicação do código em comento. No entan-to, surgiu nova vinculação, qual seja: “Os juízes e os tribunais observarão: [...] V – a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados”11.

Assim, além das vinculações já existentes no sistema, a Corte local poderá estabelecer teses jurídicas que terão caráter obrigatório aos magis-trados do Tribunal. Nos termos do art. 985, a vinculação ocorrerá na área de jurisdição do Tribunal, inclusive aos Juizados Especiais. Em várias passa-gens, o legislador afirma que tal tese é vinculativa.

Os efeitos da tese jurídica vinculativa, nos dizeres de Bruno Dantas, ficam limitados “à área territorial de jurisdição de cada Tribunal. Evidente-

11 Art. 927, inciso V.

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mente, quando o incidente for julgado pelo STF ou pelo STJ, atingirá todo o território nacional” (Wambier et al., 2015, p. 2195).

O art. 987, § 2º, confirma o escólio anteriormente citado, já que as decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça que apresentam teses jurídicas vinculativas se aplicam a todos os processos – individuais ou coletivos – em todo território nacional.

No sentido, confira, ainda, Bruno Dantas:

A tese jurídica fixada por estes Tribunais, resultado de incidente, será apli-cada no território nacional a todos os processos individuais e coletivos que versarem sobre idêntica questão de direito. Nos processos sobrestados, mas que ainda não foi proferida sentença, o juiz deverá julgar aplicando a tese fixada. Já nos processos já sentenciados, com decisão impugnada, o Tribu-nal julga o recurso como prejudicado, se a decisão impugnada estiver de acordo com a tese firmada, ou devolverá os autos ao juiz para adequar sua decisão ao entendimento fixado, nos caso em que a decisão encontrar-se em desacordo. (Wambier et al., 2015, p. 2198)

A par disso, Luiz Guilherme Marinoni faz um alerta: o magistrado deve buscar a orientação nas teses jurídicas firmadas pelos Tribunais e Cor-tes Superiores, no entanto, a orientação vinculativa deve ser extraída “da ratio decidendi ou [d]os fundamentos determinantes do precedente que se deseja aplicar” (Wambier et al., 2015, p. 2077).

Muito foi aventado até aqui sobre a importância da tese jurídica no novo sistema processual civil. Tese jurídica será aquela fixada pelos Tribu-nais na análise de questões controvertidas, as quais há forte dissenso doutri-nário/jurisprudencial.

Com efeito, trata-se de uma evolução na forma de lidar com a justiça e de nítida influência do common law, pois dá força normativa ao prece-dente em sede de fixação de tese jurídica. Pode-se falar em verdadeira evo-lução do Direito, ou, como diria Thomas S. Kuhn, uma revolução científica paradigmática, pois deixamos um modo de fazer justiça devido à crise e à insegurança e passamos a outro patamar – a vinculação pela tese jurídica, o novo paradigma.

Sobre a questão posta, Thomas S. Kuhn argumenta que há o progresso por meio das revoluções científicas. Segundo o autor, há uma revolução científica quando o paradigma adotado não resolve mais as questões objeto de debates, nascendo posições divergentes, ou, como diria Kuhn,

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campos rivais que buscam o predomínio. Quando isso ocorre, há o período de crise científica no qual busca-se descobrir uma nova abordagem para as questões problemas e, na sequência, a revolução termina com a vitória total de um dos dois campos rivais. (Kuhn, 2011, p. 203-210)

A respeito do tema, pode-se afirmar que há uma insegurança jurídica em vários campos do direito, pois questões idênticas são invariavelmente decididas de maneiras diversas. Parafraseando Kuhn, os manuais de direito apresentam soluções que são predominantes, no entanto, surgem dissiden-tes que criam a mencionada instabilidade jurídica. Tal variação de entendi-mento para casos idênticos, mutatis mutandis, pode ser chamada de crise, e inicia-se o processo de revolução – a evolução do Direito. Parte-se de um paradigma (entendimento sobre determinada questão), surgem divergências (diferentes interpretações sobre a questão) e chega-se a um novo paradigma (novo entendimento predominante sobre a questão).

Pode-se dizer, então, que a vinculação obrigatória da tese jurídica firmada pelos Tribunais e pelas Cortes Superiores é o novo paradigma, pois existia um entendimento sobre a questão, surgiram divergências e, por fim, como uma revolução científica, surge o novo paradigma – a tese jurídica.

Ainda sobre a vinculação do precedente, ao analisarmos a novel le-gislação em comento, constata-se a preocupação na distribuição igualitária da justiça, uma evolução oriunda dos povos democráticos. Revela-se nos arts. 976 e seguintes a previsão do incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), que tem como objetivo a tutela isonômica.

Nos dizeres de Bruno Dantas, o IRDR é:

[...] o incidente processual instaurado para, mediante julgamento único e vinculante, assegurar interpretação isonômica à questão jurídica controver-tida em demandas repetitivas que busquem tutela jurisdicional a interesses individuais homogêneos. (Wambier et al., 2015, p. 2179)

Assim, fica nítida a importância que foi conferida à tese jurídica, pois conforme o aludido autor:

A decisão que o Tribunal profere em IRDR, como visto, não resolve a lide, mas meramente fixa a interpretação da quaestio iuris que compõe a causa petendi. Desta forma, não há que se falar em coisa julgada da questão de direito, mas sim de efeito vinculante. (Wambier et al., 2015, p. 2194)

Concluindo o presente capítulo, pode-se afirmar que o novo Código de Processo Civil traz um avanço ao Direito. Pode-se dizer que ocorre uma

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evolução autopoiética, eis que há o direito normativo que poderá evoluir de acordo com os precedentes vinculativos e as teses jurídicas que, sem dúvidas, recebem irritações diuturnas do entorno e, assim, acoplam as di-ferenças, introduzindo-as como fonte do Direito em conjunto com o texto normativo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente articulado não pretendeu esgotar o tema evolução do Di-reito. Pretendeu-se demonstrar, em poucas linhas, que há uma evolução constante do Direito – da mesma forma como a sociedade evolui –, com constantes divergências.

Nota-se de todo o argumentado que, nos dizeres de Ronald Dworkin, há uma inquietação ao aplicar uma lei antiga, pois “os juízes devem esco-lher entre a mão morta, porém legítima, do passado e o encanto claramente ilícito do progresso”.

Será mesmo ilícito o encanto do progresso? Talvez não. A inquieta-ção mencionada nos traz a ideia de evolução do atual sistema (civil law) e eventual incursão nas regras do common law.

Conforme visto no primeiro capítulo, Luhmann afirma que há a evo-lução devido à necessidade de acoplar o agora e o depois, ou seja, há “con-tínuas reobservações mediante novas distinções”. Essas observações, nos dizeres de Teubner, ocorrem pelo fato de que o Direito está em contato diuturno com crises políticas, movimentos sociais e variações do próprio Direito.

Portanto, há uma evolução do sistema do Direito, pois é ligado ao passado (legislação) e ao futuro (fatos reais) ao mesmo tempo, nascendo a necessidade da evolução, pois há irritação que gera desconforto – desenca-deando o acoplamento que redunda na evolução do Direito.

Vimos, também, no segundo capítulo, que a evolução se dá diutur-namente pela interpretação, pois, conforme Hans Kelsen, a “interpretação jurídico-científica não pode fazer outra coisa senão estabelecer as possíveis significações de uma norma jurídica”.

No mesmo sentido, Eros Roberto Grau argumenta que os enunciados do Direito não são completos, passando a sê-los somente quando o intér-prete os aplica aos casos concretos. Conclui-se, portanto, que os variados casos concretos podem apresentar variadas interpretações sobre os enun-ciados do Direito.

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Assim, não se pode olvidar que o processo de interpretação é uma constante. Inocêncio Mártires Coelho, com apoio de Richard Palmer, relata que o entendimento sobre certo enunciado normativo contém o que repre-sentava à época de sua edição, mas também o que representa no presente.

E mais, com suporte em Carlos Cossio, tal autor afirma que a altera-ção de uma interpretação sobre certo enunciado normativo não é correção de equívocos, mas, como na alteração legislativa, nada mais do que reno-vação decorrente de “epifenômenos de subjacentes transformações fático--axiológicas”, ou seja, é o trabalho do intérprete que revalida o enunciado às necessidades sociais e, assim procedendo, reduz o “descompasso entre os problemas sociais e as respectivas soluções legislativas”.

Corroborando a ideia de evolução pela interpretação do Direito, afirmou-se que um texto escrito há cem anos, ao ser interpretado nos dias atuais, terá sentido, alcance e extensão diversos da época de sua publi- cação.

Nesse sentido, Inocêncio Mártires Coelho relata que o intérprete bus-ca adequar o enunciado normativo aos tempos atuais para buscar “o signi-ficado jurídico da lei, que só pode ser o seu significado atual, e não o sig-nificado histórico, aquele que lhe foi atribuído ao tempo da promulgação” estará no caminho da interpretação progressiva/evolutiva.

No mesmo sentido, Luhmann afirma que as variações das interpre-tações surgem da prática jurídica, da docência em conjunto com os textos normativos, ou seja, se apresenta como o resultado das interpretações – evo-luindo diuturnamente.

Conclui-se que o direito positivo deve evoluir pelo fato de não resol-ver os problemas da sociedade, e mais, não há um texto que seja tão claro que não demande interpretação evolutiva para resolver o caso concreto. Foi dito que ao texto normativo escrito há muitos anos deve ser conferido novo sentido, alcance e extensão, aproximando o texto à realidade, ou seja, evoluindo diante das novas facetas da sociedade.

Já no terceiro capítulo constatou-se que há uma evolução constante do Direito quando se assenta a possibilidade de a legislação ceder aos no-vos contornos vinculantes das decisões das Cortes.

Com efeito, Leonel Severo Rocha afirma que “o Direito moderno, ao contrário [do jusnaturalismo], para sobreviver na sociedade indeterminada, será um direito positivo; um Direito diferenciado e construído por deci-sões”, ou seja, o Direito construído por decisões é a constatação de que ocorre a evolução do direito processual civil brasileiro.

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Verifica-se, portanto, que as irritações do entorno – no sentido de no-vos contornos que podem ser conferidos aos textos normativos – acarretam a evolução do Direito brasileiro (civil law) pela influência do common law.

No entanto, como visto, no civil law, nos dizeres de Arnaldo Sam-paio de Godoy, “pensa-se na Constituição como fonte suprema de qualquer imposição, seguida por leis complementares, ordinárias, medidas de urgên-cia, regulamentos, etc.”, enquanto que, ainda conforme o aludido autor, no common law há “institutos próprios, centrados na atividade produtora de judiciário de composição, natureza, origem, recrutamento e garantias tão estranhas a protótipos que marcam nossos hábitos conceituais”.

Por fim, nos dizeres de Mariângela Gama de Magalhães Gomes,

não obstante as importantes diferenças entre o ordenamento jurídico brasi-leiro e o sistema do common law, observa-se que, uma vez admitida a ne-cessidade de garantir o cidadão frente à aleatoriedade da jurisprudência, os institutos existentes naqueles ordenamentos podem fornecer significativas e úteis diretrizes de garantia a serem utilizadas também aqui. É que no sis-tema do common law, ao ser atribuído à jurisprudência um papel criativo no Direito, foram criados mecanismos que, ao invés de diminuir, aumen-taram as garantias que são dadas ao indivíduo frente às alterações jurispru-

denciais.

Assim, constata-se que o ordenamento jurídico brasileiro tem seus fundamentos no sistema romano-germânico, no qual há a compilação e a codificação de textos normativos, mas constata-se, também, que possui institutos que revelam a incursão em outro sistema, o do common law, pois é permitido aos Tribunais – pela vinculação do precedente – impor uma regra abstrata.

No quarto capítulo, aprofundou-se a pesquisa no novo Código de Processo Civil, texto normativo que trouxe vários dispositivos com tendên-cias da vinculação de decisões aos magistrados.

O ordenamento jurídico brasileiro, como visto anteriormente, tem suas origens no sistema civil law, ou seja, predomina que a fonte primária do Direito é a lei – prevalece a codificação. No entanto, constata-se na nova legislação processual civil que o legislador privilegiou o respeito ao prece-dente jurisprudencial – como no common law.

Como já afirmado, trata-se de uma evolução na forma de lidar com a justiça e de nítida influência do common law, pois confere força normativa

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ao precedente – tese jurídica –, verdadeira evolução do Direito ao abando-nar o vetusto modo de fazer justiça.

Pode-se afirmar, assim, que o novo Código de Processo Civil traz um avanço ao Direito, sugere uma evolução autopoiética; o direito normativo poderá evoluir de acordo com os precedentes vinculativos e as teses jurí-dicas que, sem dúvidas, recebem irritações diuturnas do entorno e, assim, acoplam as diferenças, introduzindo-as como fonte do Direito em conjunto com o texto normativo.

Sob a ótica da autopoiese, conclui-se que, conforme Leonel Severo Rocha, o Direito é dinâmico e aspira evolução diante da necessidade cons-tante de, como parte da estrutura social, reduzir a “complexidade das pos-sibilidades do ser no mundo”.

Finalizando, há um sistema brasileiro fundado em textos normativos (civil law) e há influência de outro sistema (common law). Tal constatação sugere uma evolução constante do direito, o que poderia se inferir que es-taremos no caminho da miscigenação do sistema jurídico brasileiro pela influência do common law.

Portanto, respondendo às hipóteses iniciais:

(i) os Poderes Legislativo e Judiciário, como organizações, recebem influência do entorno – compreendido como irritações provocadas pelo sistema norte-americano – e, assim, como integrantes de um sistema auto-poiético, internalizaram regras (de legislar e de julgar) do common law no sistema brasileiro, afastando-se do civil law;

A resposta é afirmativa, pois o Direito brasileiro, em especial o siste-ma processual civil, recebeu forte influência do common law. Notou-se do presente estudo que a novel legislação se afasta da lei como fonte predomi-nante do Direito. Confere a nova legislação grande importância ao prece-dente jurisprudencial, pois ampliou as hipóteses de vinculação das decisões de Cortes Superiores, ou seja, elevou ao caráter abstrato (anteriormente só conferido à lei) a tese jurídica firmada pelos Tribunais. Portanto, a hipótese restou confirmada.

(ii) os Poderes Legislativo e Judiciário, como integrantes de um siste-ma autopoiético, recebem influência do entorno (common law), no entanto, permanecem na esteira do sistema civil law, eis que a criação de mecanis-mos de vinculação aos precedentes (respeito ao entendimento das Cortes Superiores) não descaracterizam o sistema.

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A resposta é negativa. Ao analisarmos os fundamentos do civil law, denota-se que ocorreu, pelo Direito brasileiro, um distanciamento. Com efeito, é sabido que no civil law há a lei e o precedente, o que, por si só, não descaracteriza o sistema. No entanto, no aludido sistema, a lei tem ca-ráter abstrato – não o precedente. Como visto, no sistema do common law, o precedente tem caráter abstrato, e, assim, se a tese jurídica é vinculativa e deve ser aplicada com caráter abstrato, na verdade, houve sim descaracteri-zação do sistema. Assim, a hipótese restou refutada.

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Assunto Especial – Doutrina

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

Cuidados com a Entrada em Vigor do NCPC

GISELE LEITEMestre em Direito, Mestre em Filosofia, Doutora em Direito, Pesquisadora do Instituto Nacio-nal de Pesquisas Jurídicas.

É usual a afirmação de que um dos principais pontos positivos do novo CPC, ao menos para os advogados, refere-se aos prazos processuais, pois sua contagem restou restrita aos dias úteis (vide o art. 219) e à sua sus-pensão entre os dias de 20 de dezembro a 20 de janeiro (art. 220).

Primeiramente, cumpre atentar que o prazo processual é estabeleci-do em lei ou pelo juiz1. O parágrafo único do art. 219 alude que se aplica somente aos prazos processuais. Portanto, os demais prazos, especialmente aqueles voltados para a natureza material, como, por exemplo, para recla-mação de vício redibitórios, ou, ainda, os vícios de consumo, permanecem computados de forma contínua, mesmo nos fins de semana e feriados.

O principal busilis se refere ao fato de que nem sempre é fácil reco-nhecer quando o prazo seja processual, posto que o conceito seja intuitivo. Ou seja, é o período temporal estabelecido para a prática de um ato pro-cessual.

Com relação aos atos processuais, ainda não há teoria satisfatória para dar-lhe uma definição pacífica. Pois seja por sua unidade teleológica, seja pela interdependência entre os atos processuais, seja porque podem ser praticados tanto por sujeitos privados quanto os públicos, atraindo regimes jurídicos distintos.

Alguns exemplos são claros no sentido de serem prazos processuais, como os de contestar, recorrer, para se manifestar sobre provas, documen-tos e demais elementos colacionados aos autos, para a designação de au-

1 Quando a lei ou o juiz não determinar o prazo para as intimações, somente obrigarão a comparecimento após decorridas quarenta e oito horas, conforme o § 2º do art. 218 do CPC/2015.

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diências e citação2 do réu, com a antecedência mínima, e para a prática de atos pelo juiz ou pelos serventuários.

Porém, existem prazos que não podem propriamente ser reconheci-dos como processuais, posto que se relacionem a circunstâncias anteriores à instauração do processo. É o caso do prazo de 120 dias para a impetração de mandado de segurança, previsto no art. 23 da Lei nº 12.016 de 2009.

Mesmo no CPC/1973, diversos precedentes destacavam não se apli-car a suspensão3 de prazos processuais no recesso forense ao prazo para o mandado de segurança.

Mas há doutrinador que mencione até que se refere ao verdadeiro prazo pré-processual, porém é preferível qualificá-lo como decadencial de um direito potestativo específico, que se refere à escolha do procedimento mandamental pelo demandante, ao qual se submete o réu.

Ultrapassada tal ponderação, expirado o prazo ipso facto, perde-se o acesso ao mandado de segurança pelas vias ordinárias. Mas, mesmo com a denegação do MS, sem decidir o mérito, não impedirá que o requerente, por ação própria, peça os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais.

O prazo para pagamento voluntário previsto no art. 523 do NCPC, que é contado da intimação para o pagamento realizada na forma do art. 513, § 2º, seria de natureza processual ou material?

Há margem para discussão, mas, se se considerar que esse ato ou pagamento também se destina não apenas a produzir efeitos no processo, inibindo a deflagração das próximas etapas do cumprimento de sentença, com a realização, inclusive, de atos constritivos sobre o patrimônio do exe-cutado, portanto, deve tal prazo ser reconhecido como processual e com-putado somente em dias úteis.

Contudo, surge a polêmica quanto ao prazo previsto no art. 257, III, do NCPC, que se refere à espera ou dilação na citação por edital, após o qual se inicia o prazo processual propriamente dito (art. 231, IV).

2 Segundo o art. 172, § 2º, do CPC/1973, a citação e a penhora mediante autorização judicial, e em casos excepcionais, poderiam realizar-se em domingos e feriados, ou nos dias úteis, fora do horário estabelecido neste artigo, observado o disposto no art. 5º, inciso XI, da CF/1988. O art. 212, § 2º, do CPC/2015 traz regra inédita ao dispensar a autorização judicial para os mesmos atos nos dias e períodos acima indicados, agora incluindo a intimação ao lado da citação e penhora.

3 Na suspensão, o prazo para de correr, mas, quando retomar seu curso, fluirá pelo restante.

Morte das partes ou perda da capacidade processual (art. 265, I, CPC/1973). A morte de uma das partes torna a relação processual, inicialmente composta por autor e réu, incompleta. Sendo o objeto em discussão transmissível, o juiz suspenderá o processo até que a habilitação do espólio ou do herdeiro ocorra e a relação processual então se complete novamente. Sendo a natureza do direito material em litígio intransmissível, personalíssima, o processo não será suspenso e sim extinto.

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Apesar de deflagrado no processo, por decisão do magistrado, existe uma sutileza que é o fato de que o prazo não se destina à prática de nenhum ato ou mesmo omissão, sendo apenas um lapso temporal que se considerou prudente aguardar para dar a publicidade proporcional na citação por edital a fim de que tenha maiores chances de chegar ao conhecimento de seu real destinatário. De sorte que Gajardoni, Dellore, Roque e Oliveira Junior afir-mam que não deve ser qualificado como processual e deve ser computado mesmo nos fins de semana e feriados, o que também se aplica à suspensão prevista pelo art. 220 do CPC, que mais uma vez a limita aos prazos quali-ficados como processuais.

Há de se sublinhar peculiar circunstância constante no art. 219 do NCPC, pois a contagem dos prazos processuais só se dá em dias úteis quan-do se tratar de prazos computados em dias. Assim, caso haja prazos em meses ou anos, a existência de fins de semana ou feriados é irrelevante, e contar-se-ão os prazos de forma contínua.

A intimação eletrônica igualmente tem se tornado frequente e usual, posto da ampliação do uso do processo eletrônico4. Já é de sabença geral que o prazo para a intimação tácita decorre mediante a informação disponi-bilizada em portal próprio da Internet para esse fim, conforme os termos do art. 5º, § 3º, da Lei nº 11.419/2006.

O referido prazo de dez dias para intimação tácita eletrônica deve ser contado de forma contínua ou apenas nos dias úteis? De fato, sua natureza é nitidamente processual.

Assim, ao contrário do período de dilação temporal do edital, tal prazo é concedido para a prática de ato processual específico, qual seja, a abertura de intimação disponibilizada no portal do Tribunal, e deverá ser feita em até dez dias corridos contados da data de envio da intimação. Somente se o interessado não abrir essa intimação tempestivamente é que ocorre a chamada intimação tácita.

Frise-se que a regra cogita de dez dias corridos. Tal dispositivo fora preservado pelo art. 219 do NCPC e não pode servir de fundamento para revogação tácita, na medida em que a regra geral não é suscetível de retirar do mundo jurídico a regra especial.

Por isso, sustenta-se que o prazo para intimação tácita, mesmo no NCPC, deve continuar a ser contado de forma contínua.

4 Referente ao horário-limite para a prática de ato processual no processo eletrônico, inclusive no último dia do prazo. O legislador reproduz no art. 213 do CPC/2015 a regra já prevista na Lei nº 11.419/2006 (até vinte e quatro horas) do último dia do prazo.

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O direito intemporal descreve que a sucessão de normas processuais no tempo é tema bastante complexo. E há específico caso referente aos prazos processuais.

O CPC/1973 prevê diversas hipóteses de suspensão do prazo pro-cessual, algumas destas bem comuns, como a de convenção das partes e a exceção de incompetência relativa, sendo que, neste último caso, não mais se encontra no NCPC (que virou preliminar de contestação, conforme o art. 337, II).

A suspensão de prazo processual é sempre perigosa, sobretudo nos casos de exceção de incompetência, que pode vir a ser decidida muito tem-po depois, quando já em vigor o CPC.

É o caso, por exemplo, do réu ser citado em 2014 e resolver apresen-tar, no quinto dia de seu prazo, e ainda na vigência do CPC/1973, exceção de incompetência relativa, deixando de apresentar a contestação, em virtu-de da suspensão de seu prazo para a resposta.

A exceção de incompetência relativa vem a ser rejeitada em 2016, quando já em vigência o CPC de 2015, voltando a fluir o prazo para a con-testação do réu, a contar do dia em que foi suspenso, no caso do quinto dia, quando tinha apresentado a dita exceção.

No entanto, é curial tomar atenção, pois, a rigor, esse ainda é aquele mesmo prazo aberto sob o CPC/1973.

Portanto, a contagem deve ser computada de forma corrida, o que inclui fins de semana e feriado. Não faria sentido que o mesmo prazo fosse contado de forma diferente, de forma corrida até o quinto dia, e depois, dali para adiante, cessada a suspensão, fosse contado apenas em dias úteis, fixando-se um inusitado sistema híbrido.

Desse modo, se o prazo teve origem em ato processual na vigência do CPC anterior, deverá observar a mesma forma de contagem anterior, a saber, a forma contínua.

Nesse sentido, o Fórum Permanente de Processualistas Civis acaute-lou que o advogado deve estar atento para saber qual contagem irá preva-lecer no seu caso concreto.

Existem exceções para a regra de suspensão de prazos proces- suais, conforme prevê o art. 2155, e as regras especiais do art. 58, I, da Lei

5 No CPC/1973, ao lado dos feriados declarados por lei, os domingos também eram considerados feriados para efeitos forenses. Mas o CPC/2015 dispôs que os sábados e os dias em que não haja expediente forense são considerados feriados para efeitos forenses, conforme o art. 216 do CPC/2015.

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nº 8.245/1991 e do art. 39 do Decreto-Lei nº 2.265/1941 (processos subme-tidos à Lei de Locações e ações de desapropriação que tramitam durante as férias forenses) também não prejudicam a suspensão de prazos fixada pelo NCPC.

É prudente não contar com tal suspensão de prazos para as situações excepcionais enquanto não se formar jurisprudência confirmando tal enten-dimento. É que, sob a vigência do Código Buzaid, há precedentes afastando a suspensão de prazos processuais durante o recesso forense e consideran-do intempestiva a manifestação da parte que não atentou para a regra geral (vide STJ, REsp 766.154, 6ª T., Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura, J. 20.09.2007).

Apesar de o art. 220 do NCPC não vincular a suspensão de prazos processuais ao recesso forense, não se pode olvidar o risco de que tais pre-cedentes que foram construídos sob a égide do CPC/1973 continuem a ser reproduzidos, em mais de um exemplo “walking dead” processual.

A propósito, recomendo a visita ao link <http://www.cpcnovo.com.br/blog/2015/10/08/sumulas-do-stf-e-stj-perderao-seu-fundamento-de-vali-dade-com-o-advento-do-novo-cpc/>, em que se comenta sobre os enuncia-dos de súmulas que perderão nitidamente a validade (tanto do STF como do STJ).

De qualquer maneira, vale a recomendação de que, conforme o exemplo, se a sentença é registrada em 15.03, mesmo que a intimação ve-nha ser publicada em DO em 21.03, os requisitos de validade do ato serão avaliados com base no CPC/1973, e, portanto, o recurso cabível será o pre-visto pelo Código Buzaid.

Se a decisão interlocutória é registrada na vigência do CPC/1973, o recurso é admissível, ainda que a intimação ocorre em data na qual já se encontra em vigor o NCPC.

Ocorrerá diferentemente se a decisão interlocutória é datada e as-sinada no dia 15.03, porém é somente registrada em 21.03, quando já se aplicará o NCPC.

O NCPC trouxe regramento inédito quanto ao prazo para certos atos processuais que alcançam o juiz e serventuários de justiça e que aumenta o prazo para os despachos e sentenças que deverão ser proferidas em 5 e 30 dias, respectivamente, conforme o art. 226, I e III, do CPC/2015.

O prazo para os litisconsortes com procuradores distintos também foi objeto de alteração. Conforme prevê o art. 229 do CPC/2015, os litis-

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consortes que tiverem diferentes procuradores, de escritórios de advocacia distintos, terão prazos contados em dobro para todas as suas manifestações, em qualquer juízo ou Tribunal, independentemente de requerimento.

O prazo para a parte, o procurador, a advocacia pública, a Defenso-ria Pública e o Ministério Público será contado da citação, intimação ou da notificação.

Vale pelo menos ter bastante cautela!

REFERÊNCIAS

MACHADO, Marcelo Pacheco. Novo CPC e processos em curso: atenção às arma-dilhas processuais. Disponível em: <http://jota.uol.com.br/novo-cpc-e-processos-em--curso-atencao-as-armadilhas-processuais>. Acesso em: 8 mar. 2016.

ROQUE, Andre Vasconcelos. As armadilhas dos prazos no novo CPC. Disponível em: <http://jota.uol.com.br/as-armadilhas-dos-prazos-no-novo-cpc>. Acesso em: 7 mar. 2016.

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Assunto Especial – Doutrina

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

A Desconsideração da Personalidade Jurídica no Novo Código de Processo Civil

ALDEM JOHNSTON BARBOSA ARAÚJOAdvogado da UEN Contencioso Especializado de Lima e Falcão Advogados, Especialista em Direito Público (Pós-Graduação Lato Sensu) pela Faculdade Estácio Recife.

RESUMO: Teoria surgida no direito alienígena, a desconsideração da personalidade jurídica encon-trava-se positivada em diversos dispositivos do ordenamento jurídico brasileiro, sem que, contudo, tivesse um regramento que estabelecesse qual seria o seu procedimento. Com o advento do novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015), finalmente o instituto foi instrumen-talizado, garantindo segurança jurídica para sua aplicação. No presente trabalho, procura-se traçar um panorama sobre o tratamento dado pelo ordenamento jurídico ao instituto da desconsideração tanto em seu caráter material, como (e principalmente) nas novas regras procedimentais trazidas pelo NCPC.

PALAVRAS-CHAVE: Desconsideração; personalidade jurídica; novo Código de Processo Civil.

SUMÁRIO: Introdução; 1 A desconsideração da personalidade jurídica no direito material; 1.1 Artigo 135 do Código Tributário Nacional (CTN); 1.2 Artigo 28, § 5º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC); 1.3 Artigo 34 da Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência (SBDC); 1.4 Artigo 18, § 3º, da Lei nº 9.847/1999; 1.5 Artigo 4º da Lei de Crimes Ambientais; 1.6 Artigo 50 do Código Civil; 1.7 Artigo 14 da Lei Anticorrupção; 1.8 Artigo 2º da CLT; 2 Quem está sujeito a desconsideração da personalidade jurídica?; 3 O procedimento para desconsideração da personalidade jurídica estabele-cido no novo Código de Processo Civil; 4 Considerações de ordem prática; Conclusão; Referências.

INTRODUÇÃO

É inegável que, a partir da criação da figura da pessoa jurídica, deixou de ser viável se concentrar a prática de atos empresariais unicamente na figura do empresário. A sofisticação da economia, carecendo do emprego de mão de obra e tecnologia e demandando investimentos, restou por invia-bilizar que as atividades desenvolvidas pela indústria, comércio e serviços ficassem adstritas à esfera das pessoas físicas.

Se antes o artesão manufaturava o seu produto e o comercializava numa feira para dali obter o lucro necessário para o seu sustento e para a

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perpetuação da sua atividade, na medida em que as relações comerciais passaram a ser mais complexas, o artesão teve de contratar empregados para auxiliar na produção, passando a comercializar sua mercadoria para um intermediário ao invés de diretamente ao consumidor, restando clara a necessidade de se criar algum instrumento que não só descentralizasse a administração da atividade empresarial, como também a fomentasse.

Com a criação da pessoa jurídica, permitiu-se que fosse ela a captar recursos e a assumir os riscos patrimoniais da atividade empresarial, possibi-litando que diversos investidores passassem a integrar a economia por meio de participações em sociedades empresárias.

A partir de sua personificação, as empresas passaram a ter direito a nome, domicílio, capacidade contratual, capacidade processual, existência distinta e autonomia patrimonial1.

A importância da separação patrimonial entre a empresa e o empre-sário para o fomento da economia foi devidamente destacada pelo STJ no EREsp 1.306.553/SC relatado pela Ministra Maria Isabel Gallotti: “A criação teórica da pessoa jurídica foi avanço que permitiu o desenvolvimento da atividade econômica, ensejando a limitação dos riscos do empreendedor ao patrimônio destacado para tal fim”.

Diante das dificuldades impostas pela complexidade de determinadas atividades econômicas, o compartilhamento de bens e serviços por parte de pessoas físicas no âmbito de uma sociedade empresária permite que seja obtido um êxito que seria muito difícil de ser alcançado caso os sócios resolvessem empreender atividades empresariais em caráter individual, já que seu desforço coletivo (exercido por meio da pessoa jurídica) torna-se ferramenta para fazer frente aos riscos do negócio2.

1 “A última e mais importante consequência da personificação de uma sociedade é a autonomia patrimonial, isto é, a existência de um patrimônio próprio, o qual responde por suas obrigações. Disso decorre que, a princípio, é o patrimônio da pessoa jurídica a garantia única dos seus credores e, por conseguinte, os credores, a princípio, não possuem pretensão sobre os bens dos sócios. Do mesmo modo, o patrimônio social é imune às dívidas particulares dos sócios. A autonomia significa que as obrigações (créditos e débitos) da pessoa jurídica não se confundem com as obrigações (créditos e débitos) dos sócios, não havendo que se falar em compensação. [...] como corolário da personalidade jurídica, a sociedade assegura aos sócios uma distinção entre seu patrimônio pessoal e o patrimônio para o exercício da atividade.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 229/230)

2 “Para a realização de alguns empreendimentos, por vezes é imprescindível a união de várias pessoas, as quais, todavia, não querem simplesmente entregar recursos para que outra pessoa os administre, mas querem assumir responsabilidades e atuar diretamente na condução do empreendimento. De outro lado, as mesmas pessoas têm medo de comprometer todo o seu patrimônio, preferem não assumir o risco e investem seus recursos em atividades não produtivas.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 231)

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Entretanto, da mesma forma que se celebra a criação de pessoas jurí-dicas em razão dos diversos benefícios que a separação do seu patrimônio com relação ao patrimônio pessoal dos sócios que a compõem, há de aten-tar que se coíbe, com veemência, a utilização de tal separação patrimonial para fins que não se revelem consentâneos com a função social da atividade econômica, com a boa-fé nas relações negociais e com a segurança jurí-dica3.

Criada no direito anglo-saxão em 18974, o instituto da disregard of the legal entitty, disregard doctrine ou lifting the corporate veil recebeu entre

3 “Embora a pessoa jurídica também possa atuar no mercado como fornecedor, os bens e serviços no mercado são fornecidos maciçamente por intermédio de pessoas jurídicas. Como se sabe, vigem no Direito brasileiro, acerca da pessoa jurídica, os princípios da autonomia e da separação. O princípio da autonomia atribui personalidade própria à pessoa jurídica, distinta da dos seus membros, sendo ela, e não seus sócios, que pratica condutas, podendo ser sujeito passivo ou ativo em qualquer relação obrigacional. De acordo com o princípio da separação, há uma perfeita distinção entre o patrimônio da pessoa jurídica e o patrimônio dos sócios, que não se confundem. Atribuir a personalidade jurídica a uma pessoa, diferente do ser humano, dando-lhe a capacidade de ser sujeito ativo ou passivo de qualquer relação obrigacional, como uma pessoa comum, interessa não apenas às próprias pessoas que se associam, mas também à coletividade. Entretanto, é evidente que a personalização jurídica desses entes só pode vir para beneficiar a sociedade, desburocratizando as transações, a circulação de bens, enfim, o progresso social. [...] Mas, se à sociedade interessa a constituição de uma pessoa jurídica, esta deixa de considerá-la, enquanto tal, a partir do momento em que ela se vale dos princípios da autonomia da e da separação para prejudicar e lesar terceiros que com ela contratam. Não entende, algumas vezes, o empresário que a empresa não está a serviço apenas de seus interesses. Tanto que ele não pode retirar da pessoa jurídica o numerário que bem entender ou todo o seu patrimônio e transferi-lo para o da pessoa física. O único patrimônio que legalmente pode retirar da empresa habitualmente, sem desconstituí-la, é o lucro apurado. Se, mesmo sem obtenção de lucro, ele retira patrimônio da pessoa jurídica e transfere para o seu nome particular, os credores, que contratam com a pessoa jurídica, ficarão desprotegidos na hora de exigir judicialmente seus créditos. A partir desse momento, a personalidade jurídica deixa de ser um benefício para a coletividade, motivo pelo qual, em determinadas situações, se passou a admitir a sua desconsideração, como que suspendendo o princípio da separação, para fazer com que o patrimônio individual do sócio se confunda com o da própria pessoa jurídica.” (KHOURI, Paulo Roberto Roque Antonio. Direito do consumidor: contratos, responsabilidade civil e defesa do consumidor em juízo. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 200/201)

4 “O leading case para aplicação desta teoria ocorreu na jurisprudência inglesa, em 1897, e foi o Caso Salomon vs. Salomon & Co., envolvendo o comerciante Aaron Salomon e a sua empresa Salomon & Co. O comerciante Aaron Salomon havia constituído uma company, em conjunto com outros seis membros de sua família, e cedido o seu fundo de comércio à sociedade assim formada, recebendo 20.000 ações representativas de sua contribuição ao capital, enquanto para cada um dos outros membros foi distribuída uma ação apenas. Para a integralização do valor do aporte efetuado, Salomon recebeu ainda obrigações garantidas de dez mil libras esterlinas. A companhia, um ano após, entrou em liquidação, verificando-se que seus bens eram insuficientes para satisfazer as obrigações garantidas, sem que nada sobrasse para os credores quirografários. O liquidante sustentou que a atividade da company era ainda a atividade pessoal de Salomon para limitar a própria responsabilidade, e, em consequência, Aaron Salomon devia ser condenado ao pagamento dos débitos da company, vindo o pagamento de seu crédito após a satisfação dos demais credores quirografários. O Magistrado que conheceu do caso em primeira instância, secundado depois pela Corte de Apelação, acolheu esta solicitação, julgando que a company era exatamente apenas uma fiduciária de Salomon, ou melhor, um seu agent ou trustie, que permanecera na verdade o efetivo proprietário do fundo de comércio. A House of Lords acolheu o recurso de Aaron Salomon, para reformar aquele entendimento das instâncias inferiores, na consideração de que a company tinha sido validamente constituída, pois a lei simplesmente requeria a participação de sete pessoas, que no caso não havia perseguido nenhum intuito fraudulento. Esses acionistas, segundo os Lords, haviam dado vida a um sujeito diverso de si mesmos, e, em última análise, não se podiam julgar-se que a company fosse um agent, de Salomon. Em consequência não existia responsabilidade de Salomon para a company e seus credores e era, consequentemente, válido o seu crédito privilegiado.” (FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Lições de direito econômico. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014. p. 272)

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nós o nome de teoria da desconsideração, superação ou penetração da(na) personalidade jurídica.

A desconsideração permite “levantar o véu” da personalidade jurídi-ca da sociedade, removendo-se a barreira que separa o seu patrimônio do patrimônio das pessoas físicas que a integram, propiciando que determina-das relações jurídicas havidas pelos sócios passem a ser de responsabilidade da empresa e vice-versa, sempre que, a grosso modo, a separação patrimo-nial entre as pessoas naturais e a pessoa jurídica esteja violando o interesse público5.

O interesse público (manifestado na letra da lei) restará violado pela separação patrimonial entre a pessoa jurídica e seus sócios sempre que esta se verificar um óbice à boa-fé contratual, à segurança jurídica nas relações empresariais, à proteção ao meio ambiente, à ordem econômica, ao Erário e ao consumidor.

Não raro, as pessoas jurídicas são utilizadas para fins atentatórios à função social da propriedade, já que, ao invés de gerar emprego, renda e desenvolver a economia, tornam-se instrumentos para ocultar bens dos só-cios, frustrar credores e até mesmo sonegar tributos.

Em tais casos, há um evidente abuso de direito e um flagrante desvio das finalidades lícitas que devem pautar todas as empresas, fazendo a se-paração patrimonial entre os bens da sociedade e os bens individuais dos

5 “Diante de sua concepção como realidade técnica e orgânica, a pessoa jurídica é capaz de direitos e deveres na ordem civil, independentemente dos membros que a compõem, com os quais não tem vínculo. Tal realidade pode ser retirada do art. 45 do Código Civil de 2002, ao dispor que começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro. Fala-se em autonomia da pessoa jurídica quanto aos seus membros, o que constava expressamente no art. 20 do Código Civil de 1916, dispositivo que não foi reproduzido pela atual codificação, sem que isso traga qualquer conclusão diferente. Como decorrência lógica desse enquadramento, em regra, os componentes da pessoa jurídica somente responderão por débitos dentro dos limites do capital social, ficando a salvo o patrimônio individual dependendo do tipo societário adotado (responsabilidade in vires). A regra é de que a responsabilidade dos sócios em relação às dívidas sociais seja sempre subsidiária, ou seja, primeiro se exaure o patrimônio da pessoa jurídica, para depois, e desde que o tipo societário adotado permita, os bens particulares dos sócios ou componentes da pessoa jurídica sejam executados. Devido a essa possibilidade de exclusão da responsabilidade dos sócios ou administradores, a pessoa jurídica, por vezes, desviou-se de seus princípios e fins, cometendo fraudes e lesando sociedade ou terceiros, provocando reações na doutrina e na jurisprudência. Visando a coibir tais abusos, surgiu no Direito Comparado a figura da teoria da desconsideração da personalidade jurídica ou teoria da penetração (disregard of the legal entity). Com isso, alcançam-se pessoas e bens que se escondem dentro de uma pessoa jurídica para fins ilícitos ou abuso, além dos limites do capital social (responsabilidade ultra vires).” (TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito do consumidor: direito material e processual. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 348)

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sócios se tornar um inconveniente, de modo que a lei autoriza o Estado a promover a desconsideração da personalidade jurídica6-7-8-9.

Assim, restará desconsiderada a personalidade jurídica da empresa para possibilitar que os bens pessoais dos sócios sejam atingidos em vir-tude de responsabilização que, a princípio, só deveria afetar os bens da sociedade empresária, admitindo-se ainda o inverso, ou seja, que bens da

6 “Desconsideração da pessoa jurídica (disregard of legal entity). Consiste na possibilidade de se ignorar a personalidade jurídica autônoma da entidade moral sempre que esta venha a ser utilizada para fins fraudulentos ou diversos daqueles para os quais foi constituída, permitindo que o credor de obrigação assumida pela pessoa jurídica alcance o patrimônio particular de seus sócios o administradores para satisfação de seu crédito.” (NERY JUNIOR, Nelson. Código Civil comentado. 7. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 261)

7 “A regra é de que a responsabilidade dos sócios em relação às dívidas sociais seja sempre subsidiária, ou seja, primeiro se exaure o patrimônio da pessoa jurídica para depois, e desde que o tipo societário adotado permita, os bens particulares dos sócios ou componentes da pessoa jurídica serem executados. Devido a essa possibilidade de exclusão da responsabilidade dos sócios ou administradores, a pessoa jurídica, por vezes, desviou-se de seus princípios e fins, cometendo fraudes e lesando sociedade ou terceiros, provocando reações na doutrina e na jurisprudência. Visando a coibir tais abusos, surgiu a figura da teoria da desconsideração da personalidade jurídica ou teoria da penetração na pessoa física (disregard of the legal entity). Com isso se alcançam pessoas e bens que se escondem dentro de uma pessoa jurídica para fins ilícitos ou abusivos. Tal instituto permite ao juiz não mais considerar os efeitos da personificação da sociedade para atingir e vincular responsabilidades dos sócios, com intuito de impedir a consumação de fraudes e abusos por eles cometidos, desde que causem prejuízos e danos a terceiros, principalmente a credores da empresa. Dessa forma, os bens particulares dos sócios podem responder pelos danos causados a terceiros. Em suma, o escudo, no caso da pessoa jurídica, é retirado para atingir quem está atrás dele, o sócio ou administrador. Bens da empresa também poderão responder por dívidas dos sócios, por meio do que se denomina como desconsideração inversa ou invertida.” (TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 4. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 137)

8 “Por personalidade jurídica entende-se a situação fictícia que a lei confere a uma determinada universalidade de pessoas, bens, ou então de pessoas e bens tornando-as assemelhadas às pessoas físicas, no que diz respeito a serem sujeitos ativos e passivos de relações jurídicas. Assim, por exemplo, são pessoas jurídicas as associações civis sem fins lucrativos, as sociedades comerciais, as fundações etc. Ora, sendo assemelhadas às pessoas físicas, no que concerne à capacidade de agir no mundo jurídico, a lei civil parte do pressuposto de que o objetivo social constante dos estatutos ou contratos sociais e suas alterações é o almejado por todos os associados, o que exige deles lealdade, em primeiro lugar, boa-fé e firme propósito de agirem em prol do atingimento dos fins sociais. O Estado, desta forma, ao conceber a criação da pessoa jurídica, partiu exatamente da premissa de que seria utilizada para alcançar fins sociais previamente concebidos. Ao desviar-se de suas finalidades, entretanto, a pessoa jurídica perde sua razão de ser, cabendo ao próprio Estado, mediante o Poder Judiciário, desconsiderá-la. Desconsiderar essa personalidade jurídica, portanto, significa que os sócios passam a responder, com seu patrimônio individual, pelas obrigações sociais, ainda que se revista a sociedade, por exemplo, de responsabilidade limitada ao montante do capital social. E isto em decorrência de alguns abusos e outras circunstâncias, reputadas lesivas à própria sociedade, e a terceiros [...].” (FILOMENO, José Geraldo Brito. Curso fundamental de direito do consumidor. São Paulo: Atlas, 2007. p. 189)

9 “A personalidade da pessoa jurídica não se confunde com a de seus integrantes nem com a de seus administradores, e isso era norma expressa no art. 20 do Código Civil de 1916. O princípio se sustenta na medida em que a lei atribui personalidade a entidades que especifica (art. 44). Sucede, porém, que, muitas vezes, os sócios ou administradores, agindo contrariamente às finalidades estatutárias ou abusando da personalidade jurídica da pessoa jurídica, acarretam prejuízos a terceiros, quase sempre pela promiscuidade dos negócios próprios com os da entidade que administram. A fim de pôr cobro a esses desvios é que se formou a doutrina conhecida como disregard of legal entity, também chamada doutrina da penetração, para vincular e atingir o patrimônio dos sócios. Adverte, porém, Rubens Requião que ‘não se trata, é bom esclarecer, de considerar ou declarar nula a personificação, mas de torná-la ineficaz para determinados atos’, e prossegue delimitando ‘que a personalidade jurídica não constitui um direito absoluto, mas está sujeita e contida pela teoria da fraude contra credores e pela teoria do abuso de direito’ (Curso de direito comercial. 22. ed. São Paulo: Saraiva, v. I, 1995. p. 277).” (DUARTE, Nestor. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Sob a coordenação de Cezar Peluso. 3. ed. rev. e atual. Barueri: Manole, 2009. p. 60)

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pessoa jurídica tornem-se objeto de eventual constrição em virtude de atos praticados pelos seus sócios (o que caracteriza a chamada desconsideração inversa da personalidade jurídica10).

Estando disciplinada em diversos diplomas legais no Brasil, a des-consideração da personalidade jurídica sempre careceu de uma disciplina que regulamentasse o seu procedimento, o que gerava muitas dúvidas11 na doutrina e jurisprudência acerca de como aplicar tal instituto.

A partir da edição do Novo Código de Processo Civil (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015), foi instituído um procedimento (nos arts. 133 a 137 da lei) que confere segurança jurídica12 à aplicação do insti-tuto, garantindo previsibilidade e afastando o casuísmo.

10 “Ao invés de desconsiderar a personalidade jurídica para que eventual constrição de bens atinja o patrimônio dos sócios, a desconsideração inversa objetiva atingir os bens da própria sociedade em razão das obrigações contraídas pelo sócio, desde que, da mesma forma que a desconsideração tradicional, sejam preenchidos os requisitos legais.” (DONIZETTI, Elpídio. Novo código de processo civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 112)

11 “Muito se discute na doutrina a forma procedimental para a desconsideração da personalidade jurídica. Segundo o Superior Tribunal de Justiça, a desconsideração pode ocorrer em qualquer fase do processo, não havendo que se falar em decadência de um direito potestativo. Existe dúvida, entretanto, de como deve ser conduzido procedimentalmente para se efetivar a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade empresarial. A desconsideração tem natureza constitutiva, considerando-se que por meio dela tem-se a criação de uma nova situação jurídica. Seria possível a criação dessa nova situação jurídica de forma incidental no processo/fase de execução ou caberia ao interessado a propositura de uma ação incidental com esse propósito? Há corrente doutrinária que defende a existência de um processo de conhecimento com os pretensos responsáveis patrimoniais secundários compondo o polo passivo para se discutir os requisitos indispensáveis à desconsideração da personalidade jurídica. Cândido Rangel Dinamarco, ao elaborar parecer a respeito do tema, afirma que ‘seria indispensável colocar esses fatos supostamente caracterizadores da fraude ou da sucessão em algum processo de conhecimento, no qual em sentença o juiz declarasse que a consulente é, ou não é, cotitular da obrigação ou mesmo de responsabilidade por obrigação alheia’. Na realidade, para a corrente doutrinária que defende a existência de um processo para a desconsideração da personalidade jurídica, a maior parte dos doutrinadores afirma que, havendo processo de conhecimento contra a sociedade patrimonial, basta a formação de um litisconsórcio passivo com os sócios. Não seria, portanto, necessário um processo autônomo com o objetivo exclusivo de se determinar a desconsideração, bastando o aproveitamento em contraditório do processo já existente contra a sociedade empresarial devedora. Durante a execução, para uns seria necessário um incidente processual, enquanto para outros uma ação própria para a desconsideração. Por outro lado, há doutrina que afirma que, estando presentes os pressupostos para a desconsideração da personalidade jurídica, ‘e o credor consiga prová-los ou ao menos trazer fortes indícios desses fatos, conhecíveis de plano, deverá o juiz determinar a desconsideração, acatando o requerimento do exequente, tornando passíveis de penhora os bens dos terceiros que compõem o quadro societário da executada’.” (TARTUCE, Flávio; NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de direito do consumidor: direito material e processual. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 552)

12 “A jurisprudência já vinha reconhecendo, sob a égide do CPC revogado, a possibilidade de a desconsideração da personalidade jurídica dar-se incidentalmente no processo, prescindindo, assim, de ação autônoma para sua efetivação. Contudo, a ausência de procedimento específico previsto em lei gerava insegurança jurídica, na medida em que nem sempre se observava a também reconhecida necessidade de citação do sócio para se efetivar a desconsideração. Não raro, a desconsideração da personalidade jurídica e a penhora de bens dos sócios davam-se em decisão interlocutória não precedida do contraditório, obrigando o terceiro atingido em sua esfera jurídica pela decisão a voltar-se contra ela por meio de agravo de instrumento, que não substitui, em hipótese alguma, a defesa que poderia e deveria ser apresentada em primeiro grau de jurisdição. Os arts. 133 a 137 do atual CPC vieram, assim, trazer segurança jurídica ao tema da desconsideração, transformando em lei o procedimento que já vinha sendo aplicado pela jurisprudência do STJ em diversos julgados.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 357)

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Nas linhas a seguir, traçaremos um panorama sobre o regramento processual conferido à desconsideração da personalidade jurídica.

1 A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO DIREITO MATERIAL

Como já dito, no âmbito do direito material, o ordenamento jurídico brasileiro prevê, em diplomas e regimes legais distintos, diversas situações que ensejam a desconsideração da personalidade jurídica.

Antes da análise acerca dos dispositivos que preveem hipóteses auto-rizadoras da desconsideração, há de se esclarecer que em nenhuma delas acolhe-se a possibilidade de despersonificação13 da pessoa jurídica. Desta feita, esclareça-se: nas hipóteses que serão debatidas a seguir, não há casos em que a lei autorize a extinção da sociedade empresária, e sim tão somente o afastamento momentâneo14 e específico15 da sua personalidade jurídica.

1.1 Artigo 135 do Código tributário NACioNAl (CtN)

Talvez a primeira das hipóteses legais de aplicação da disregard doctrine previstas no ordenamento jurídico brasileiro, o art. 13516 do Códi-

13 “Na verdade, não se pode confundir a desconsideração com a despersonificação da empresa. No primeiro instituto, apenas se desconsidera a regra pela qual a pessoa jurídica tem existência distinta de seus membros. Na despersonificação, a pessoa jurídica é dissolvida. Sendo assim, no caso de ser deferida a desconsideração da personalidade jurídica pelo juiz da causa, deve-se manter a pessoa jurídica no polo passivo da demanda e incluir os sócios e administradores.” (TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 4. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 139)

14 “Claro está que a desconsideração da personalidade jurídica da sociedade que serviu como escudo para a prática de atos fraudulentos, abusivos, ou em desvio de função não pode significar, ressalvadas hipóteses excepcionais, a sua aniquilação. A empresa é um polo de produção e de empregos. O afastamento da personalidade deve ser temporário e tópico, perdurando apenas no caso concreto, até que os credores se satisfaçam no patrimônio pessoal dos sócios infratores, verdadeiros responsáveis pelos ilícitos praticados. Ressarcidos os prejuízos, sem prejuízo de simultânea responsabilização administrativa e criminal dos envolvidos, a empresa, por força do próprio princípio da continuidade, poderá, desde que apresente condições jurídicas e estruturais, voltar a funcionar. Entretanto, reconhecemos que, em situações de excepcional gravidade, poderá justificar-se a despersonalização, em caráter definitivo, da pessoa jurídica, entendido tal fenômeno como a extinção compulsória, pela via judicial, da personalidade jurídica.” (GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil. parte geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, v. I, 2011. p. 269)

15 “A desconsideração da pessoa jurídica não atinge a validade do ato constitutivo, mas a sua eficácia episódica. Uma sociedade que tenha a autonomia patrimonial desconsiderada continua válida, assim como válidos são todos os demais atos que praticou. A separação patrimonial em relação aos seus sócios é que não produzirá nenhum efeito na decisão judicial referente àquele específico ato objeto da fraude. Esta é, inclusive, a grande vantagem da desconsideração em relação a outros mecanismos de coibição da fraude, como a anulação ou dissolução da sociedade. Por apenas suspender a eficácia do ato constitutivo, no episódio sobre o qual recai o julgamento, sem invalidá-lo, a teoria da desconsideração preserva a empresa, que não será necessariamente atingida por ato fraudulento de um de seus sócios, resguardando-se, desta forma, os demais interesses que gravitam ao seu redor, como o dos empregados, dos demais sócios, da comunidade etc.” (COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial: direito de empresa. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 154)

16 “Art. 135. São pessoalmente responsáveis pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos: I – as pessoas referidas no artigo anterior; II – os mandatários, prepostos e empregados; III – os diretores, gerentes ou representantes de pessoas jurídicas de direito privado.”

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go Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966) adotou a teoria maior17-18 da des-consideração da personalidade jurídica, já que, para se levantar o véu do ente coletivo e assim desconsiderar a autonomia patrimonial que há entre os sócios e a empresa, é necessário que os responsáveis tributários atuem com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos:

As pessoas referidas no art. 134 do CTN, em regra, respondem de modo subsidiário, em relação aos atos em que intervierem e pelas omissões de que forem responsáveis, e apenas se o contribuinte não tiver condições de cumprir a obrigação tributária. Entretanto, quando agirem dolosamente, em contrariedade à lei, ao contrato ou aos estatutos, em prejuízo não só do Fisco, mas também do contribuinte, sua responsabilidade passa a ser pesso-al. Essa é a razão da remissão “às pessoas referidas no artigo anterior”, que mostra, ainda, que o mero inadimplemento não pode ser condição para a incidência do art. 135 do CTN, pois, do contrário, o inciso I do art. 135 tor-naria inócuo todo o art. 134. O art. 135, III, do CTN cuida da responsabili-dade de terceiros que tenham administrado a pessoa jurídica contribuinte, representando-a (ou presenteando-a, para usar a linguagem de Pontes de Miranda), como diretores, administradores ou gerentes. Não é necessá-rio, nem suficiente, que sejam sócios. Um sócio poderá responder se for sócio-gerente, sendo juridicamente impossível responsabilizar o sócio me-ramente quotista, a menos que se configure situação que autorize a apli-cação conjunta dos arts. 135, I, e 134, VII, do CTN (dissolução irregular da sociedade). Em outros termos, se se tratar de aplicação do art. 135, III, do CTN, o sócio meramente quotista não é responsável, e o “sócio-gerente responde por ser gerente, não por ser sócio” [...]. Pode ocorrer de o ter-ceiro, mesmo ostentando a denominação de “diretor”, não haver pratica-do atos de gestão. Naturalmente, o ônus de provar essa peculiaridade será dele, mas, de qualquer sorte, em tais hipóteses não haverá responsabilidade nos termos do art. 135, III, do CTN. [...] O inadimplemento de um débito tributário até pode configurar infração de lei, mas essa infração, em condi-ções ordinárias, é praticada pelo contribuinte, ou seja, no caso do art. 135, III, do CTN, pela pessoa jurídica, e não pelo seu representante, não sendo, portanto, causa para a sua responsabilização. Apenas quando este atua fora de sua competência, com excesso de poderes, em prejuízo do Fisco e da

17 “A importância do princípio da autonomia patrimonial nos leva, todavia, a aplicar a desconsideração com cautela, apenas em casos excepcionais, atendidos determinados requisitos, vale dizer, a regra é que prevaleça o princípio da autonomia patrimonial. Apenas em situações excepcionais é que se pode cogitar da aplicação da desconsideração. Essas situações excepcionais representam os requisitos fundamentais de aplicação da desconsideração. Para a chamada teoria maior da desconsideração, não basta o descumprimento de uma obrigação por parte da pessoa jurídica; é necessário que tal descumprimento decorra do desvirtuamento de sua função. A personificação é um instrumento legítimo de destaque patrimonial e, eventualmente, de limitação de responsabilidade, que só pode ser descartado caso o uso da pessoa afaste-se dos fins para os quais o direito a criou.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 239/240)

18 “Em virtude da adoção da teoria maior da desconsideração, é necessário comprovar, para fins de desconsideração da personalidade jurídica, a prática de ato abusivo ou fraudulento por gerente ou administrador.” (STJ, REsp 1315110/SE, 2011/0274399-2, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, DJ 28.05.2013, DJe 07.06.2013)

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própria pessoa jurídica, pode-se falar em infração de lei. E nem poderia ser mesmo diferente, sob pena de a responsabilidade das pessoas indicadas no art. 135 do CTN deixar de ser uma exceção à regra de que o tributo é devi-do pela sociedade, e passar a ser uma regra sem exceções. Por isso, “a sim-ples falta de pagamento do tributo não configura, por si só, circunstância que acarrete a responsabilidade solidária dos terceiros, nomeadamente dos sócios-gerentes, pelos débitos tributários da empresa (art. 135 do CTN)”. (SEGUNDO, Hugo de Brito Machado. Código Tributário Nacional: anota-ções à Constituição, ao Código Tributário Nacional e às Leis Complementa-res nºs 87/1996 e 116/2003. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 260)

Registre-se o caráter excepcional de tal responsabilização prevista no CTN, já que, ao responsabilizar diretores, gerentes ou representantes em caráter pessoal pelo pagamento dos créditos da pessoa jurídica contribuinte quando estes forem correspondentes a obrigações tributárias resultantes de atos praticados com excesso de poderes, infração de lei, contrato social ou estatutos, está o diploma legal instituindo verdadeira responsabilidade sub-jetiva (já que vai se aferir a atuação ilegal ou com excesso de poderes do responsável tributário19) para a incidência da obrigação tributária quando em regra a responsabilidade é objetiva20.

1.2 Artigo 28, § 5º, do Código de defesA do CoNsumidor (CdC)

Por seu turno, consagrando a chamada teoria menor21-22 da descon-sideração da personalidade jurídica, o caput e principalmente o § 5º do art. 2823 do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) permitem

19 “A responsabilidade tributária prevista no art. 135 do CTN é subjetiva e refere-se às infrações à lei comercial, civil, trabalhista etc., e não ao mero inadimplemento da obrigação tributária.” (STJ, REsp 923909/RS, 2007/0007785-2, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJ 24.06.2008, DJe 14.08.2008)

20 “A responsabilidade tributária é, em regra, objetiva, e tem por causa a mora, fato objetivo caracterizado pela impontualidade no pagamento do crédito tributário.” (STJ, REsp 1161661/AL, 2009/0199963-8, 2ª T., Relª Min. Eliana Calmon, DJ 17.06.2010, DJe 28.06.2010)

21 “A respeito da desconsideração da personalidade jurídica, a melhor doutrina aponta a existência de duas grandes teorias, a saber: a) teoria maior – a desconsideração, para ser deferida, exige a presença de dois requisitos: o abuso da personalidade jurídica + o prejuízo ao credor. Essa teoria foi adotada pelo art. 50 do CC/2002; b) teoria menor – a desconsideração da personalidade jurídica exige um único elemento, qual seja, o prejuízo ao credor. Essa teoria foi adotada pela Lei nº 9.605/1998 – para os danos ambientais – e, supostamente, pelo art. 28 do Código de Defesa do Consumidor.” (TARTUCE, Flávio. Manual de direito civil: volume único. 4. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014. p. 138)

22 “Fábio Ulhoa Coelho ressalta a existência de uma linha de entendimento, que afirma que não há requisitos específicos para a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. Essa teoria, chamada de teoria menor, afirma que basta o não pagamento de um crédito para se aplicar a desconsideração da personalidade jurídica. Se a sociedade não tiver patrimônio para honrar suas obrigações, mas os sócios forem solventes, deve-se aplicar a desconsideração da personalidade jurídica.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 241/242)

23 “Art. 28. O juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração. [...]

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ao juiz aplicar o instituto sempre que a personalidade jurídica do ente cole-tivo se mostre um empecilho para o ressarcimento do consumidor.

Assim, nos termos do CDC, mesmo que não haja fraude ou abuso de direito na relação da empresa e os seus sócios para com os seus credores, a mera existência de uma dívida proveniente de uma relação de consumo pode ser capaz de ensejar a penetração na personalidade jurídica da so-ciedade para fins de possibilitar o atendimento do interesse do consumidor lesado:

A respeito da desconsideração da personalidade jurídica no CDC, é impor-tante registrar que tal instituto se encontra regulamentado justamente no Capítulo IV, que cuida da qualidade dos produtos e serviços e da repara-ção de danos ao consumidor. Isto demonstra a intenção clara do legislador em dar efetividade aos direitos do consumidor, quando tenha seus direitos violados por conta de um acidente de consumo ou de um vício do pro-duto. Não basta dar-lhe uma sentença de mérito favorável, reconhecendo seus direitos; o importante é que o consumidor tenha seu eventual crédi-to totalmente recebido, seja da pessoa jurídica ou da pessoa física do só-cio. O art. 28 fala expressamente em desconsideração da pessoa jurídica. Entretanto, das hipóteses enumeradas pelo legislador para a aplicação do instituto, pode-se dizer que foram criadas outras situações permissivas da desconsideração, além da fraude e do abuso de direito, que não eram trata-das pela doutrina, anteriormente [...]. Parece que as situações indicadas no caput do art. 28 são meramente exemplificativas. É que a disposição conti-da no § 5º autoriza o Magistrado a desconsiderar a personalidade jurídica e obrigar pessoalmente os sócios pelo ressarcimento dos prejuízos causados, toda vez que a personalidade for obstáculo para tanto. É como se a dispo-sição do § 5º atuasse como caput e as situações listadas no caput do art. 28 atuassem como incisos meramente exemplificativos. [...] E qual poderá ser este obstáculo de que fala o § 5º do art. 28? Parece-me que aqui a simples ausência de bens penhoráveis na pessoa jurídica, ainda que seus sócios não tenham procedido com fraude ou abuso de direito, é suficiente para que se proceda à desconsideração. [...] Entretanto, o entendimento anteriormente exposto deve cingir-se às hipóteses de acidente de consumo, previstas nos arts. 12 e 14 do CDC para dar efetividade à reparação dos danos, seja de ordem material ou moral, causados pelos produtos e serviços. [...] Ou seja, a desconsideração, nos termos em que está disciplinada no CDC, encontra também respaldo no risco da atividade econômica, que deve ser suporta-do pelo capitalista e não pelo consumidor. E o ressarcimento de que fala o

§ 5º Também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores.”

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§ 5º do art. 26 é exatamente a indenização a que faz jus o consumidor em decorrência do acidente de consumo. Se a pessoa jurídica, a sua autonomia patrimonial, constitui o obstáculo ao recebimento da indenização, seja pela ocorrência de fraude, abuso de direito, falência, ou até mesmo pela simples falta de bens penhoráveis no seu patrimônio, deve esta ser desconsidera-da para atingir os bens particulares dos sócios.” (KHOURI, Paulo Roberto Roque Antonio. Direito do consumidor: contratos, responsabilidade civil e defesa do consumidor em juízo. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2009. p. 203/205)

1.3 Artigo 34 dA lei do sistemA brAsileiro de defesA dA CoNCorrêNCiA (sbdC)

Em sede de direito regulatório econômico, o revogado art. 1824 da Lei nº 8.884/1994 (Lei de criação do Cade) e o art. 3425 da Lei nº 12.529/2011 (Lei do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência) dão azo ao debate se, na seara administrativa, seria admissível ao Estado desconsiderar a persona-lidade jurídica de empresas por meio de ato administrativo.

Analisando a questão num caso concreto que envolvia um certame licitatório, o STJ admitiu, em precedente isolado, a possibilidade de a Ad-ministração Pública, com base no princípio da moralidade, desconsiderar a personalidade jurídica de uma sociedade empresária:

A Administração Pública pode, em observância ao princípio da moralidade administrativa e da indisponibilidade dos interesses públicos tutelados, des-considerar a personalidade jurídica de sociedade constituída com abuso de forma e fraude à lei, desde que facultado ao administrado o contraditório e a ampla defesa em processo administrativo regular. (STJ, RMS 15166/BA, 2002/0094265-7, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, DJ 07.08.2003, DJ 08.09.2003, p. 262; RDR, v. 27, p. 378; RSTJ, v. 172, p. 247)

Também considerando válida a atuação administrativa neste particu-lar, o Tribunal de Contas da União proferiu decisões na qual ele próprio promovia a superação da personalidade jurídica, citando-se, como exem-plo, o Acórdão nº 1.327/2012-Plenário:

24 “Art. 18. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.”

25 “Art. 34. A personalidade jurídica do responsável por infração da ordem econômica poderá ser desconsiderada quando houver da parte deste abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. Parágrafo único. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração.”

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Em caso de fraude comprovada, é possível a responsabilização não só da empresa, mas também dos sócios, de fato ou de direito, a partir da descon-sideração da personalidade jurídica da instituição empresarial. (TCU, Acór-dão nº 1.327/2012-Plenário, TC 008.267/2010-3, Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, 30.05.2012)

Contudo, registre-se que o STF concedeu, em caráter liminar, medida que suspendeu um acórdão do TCU onde se decidiu pela desconsideração da personalidade jurídica, destacando-se, entre outros argumentos, a exis-tência de posicionamentos da doutrina26 no sentido de considerar que a aplicação da disregard doctrine está adstrita à reserva jurisdicional, sendo, portanto, defeso ao Estado aplicá-la:

Ocorre, no entanto, que razões de prudência e o reconhecimento da plau-sibilidade jurídica da pretensão deduzida pela parte impetrante impõem que se outorgue, na espécie, a pretendida tutela cautelar, seja porque esta Suprema Corte ainda não se pronunciou sobre a validade da aplicação da disregard doctrine no âmbito dos procedimentos administrativos, seja por-que há eminentes doutrinadores, apoiados na cláusula constitucional da re-serva de jurisdição, que entendem imprescindível a existência de ato juris-dicional para legitimar a desconsideração da personalidade jurídica (o que tornaria inadmissível a utilização dessa técnica por órgãos e Tribunais ad-ministrativos), seja porque se mostra relevante examinar o tema da descon-sideração expansiva da personalidade civil em face do princípio da intrans-cendência das sanções administrativas e das medidas restritivas de direitos, seja, ainda, porque assume significativa importância o debate em torno da possibilidade de utilização da disregard doctrine, pela própria Administra-ção Pública, agindo pro domo sua, examinada essa específica questão na perspectiva do princípio da legalidade. (STF, MS 32.494-MC/DF, Rel. Min. Celso de Mello)

Como não há posicionamento definitivo da nossa Suprema Corte acerca da possibilidade de a desconsideração da personalidade jurídica ser efetuada pela Administração Pública, a presunção de constitucionalidade do art. 34 da Lei nº 12.529/2011 autorizaria concluir que seria lícito ao Estado (no caso, os integrantes do SBDC – Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência: o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade e

26 “A desconsideração da pessoa jurídica é ato privativo do juiz, que, também, não agirá de ofício, dependendo de iniciativa da parte ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo. A decisão fixará quais relações ou obrigações serão estendidas aos sócios ou administradores, de modo que a pessoa jurídica não se extingue, mas é apenas afastado o véu protetor, para que os bens particulares daqueles respondam pelos atos abusivos ou fraudulentos.” (DUARTE, Nestor. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. Sob a coordenação de Cezar Peluso. 3. ed. rev. e atual. Barueri: Manole, 2009. p. 60)

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a Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda) desconsiderar a personalidade jurídica de empresas por meio de ato admi-nistrativo.

Em razão do disposto no art. 1527-28-29-30 do NCPC, é possível defender que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade e a Secreta-ria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda quando da aplicação do art. 34 da Lei nº 12.529/2011, ou seja, quando forem promo-ver em sede administrativa a desconsideração da personalidade jurídica, deverão observar, fazendo-se as adequações necessárias, o procedimento previsto nos arts. 133 a 137 do Novo Código de Processo Civil.

1.4 Artigo 18, § 3º, dA lei Nº 9.847/1999

Finalizando as considerações acerca da superação da personalidade jurídica no direito regulatório econômico e fazendo-se as mesmas ressalvas já feitas com relação ao art. 34 da Lei nº 12.529/2011, registre-se que o § 3º do art. 1831 da Lei nº 9.847/1999 concede à ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) o poder de promover, em sede administrativa, a desconsideração da personalidade jurídica de empresas que infrinjam as normas pertinentes ao exercício de atividades relativas à

27 “Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.”

28 “[...] na ausência de norma específica, a disciplina do processo civil tem caráter geral – isto é, transetorial.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado (livro eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 55)

29 “A despeito da inexistência de dispositivo semelhante no CPC revogado, a introdução do art. 15 no CPC atual em nada altera o estado de coisas anterior, em que se reconhecia a aplicação subsidiária do CPC, como norma fundamental, a todo o ordenamento jurídico, inclusive aos processos regidos por leis especiais.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 79)

30 “O legislador disse menos do que queria. Não se trata somente de aplicar as normas processuais aos processos administrativos, trabalhistas e eleitorais quando não houver normas, nestes ramos do direito, que resolvam a situação. A aplicação subsidiária ocorre também em situações nas quais não há omissão. Trata-se, como sugere a expressão ‘subsidiária’, de uma possibilidade de enriquecimento, de leitura de um dispositivo sob um outro viés, de extrair-se da norma processual eleitoral, trabalhista ou administrativa um sentido diferente, iluminado pelos princípios fundamentais do processo civil. A aplicação supletiva é que supõe omissão. Aliás, o legislador, deixando de lado a preocupação com a própria expressão, precisão da linguagem, serve-se das duas expressões. Não deve ter suposto que significam a mesma coisa, se não, não teria usado as duas. Mas como empregou também a mais rica, mais abrangente, deve o intérprete entender que é disso que se trata.” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo (livro eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 45)

31 “Art. 18. Os fornecedores e transportadores de petróleo, gás natural, seus derivados e biocombustíveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade, inclusive aqueles decorrentes da disparidade com as indicações constantes do recipiente, da embalagem ou rotulagem, que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor. (Redação dada pela Lei nº 11.097, de 2005) [...] § 3º Poderá ser desconsiderada a personalidade jurídica da sociedade sempre que esta constituir obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados ao abastecimento nacional de combustíveis ou ao Sistema Nacional de Estoques de Combustíveis.”

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indústria do petróleo, à indústria de biocombustíveis, ao abastecimento na-cional de combustíveis, ao Sistema Nacional de Estoques de Combustíveis e ao Plano Anual de Estoques Estratégicos de Combustíveis.

1.5 Artigo 4º dA lei de Crimes AmbieNtAis

Estranhamente deslocado em um diploma que dispõe sobre sanções penais e administrativas em face de infrações contra o meio ambiente, o art. 4º32 da Lei nº 9.605/1998 (Lei de Crimes Ambientais) permite a supera-ção da personalidade jurídica para fins de reparação civil:

Embora seja instituto importante, transferindo a responsabilidade da pessoa jurídica aos sócios, caso aquela se torne insolvente, diz respeito à área civil e não penal. Outra não poderia ser a interpretação em face do disposto no art. 5º, XLV, da CF: “Nenhuma pena passará da pessoa do condenado, po-dendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido”. Portanto, qualquer pena de caráter pecuniário aplicada à pessoa jurídica, caso ela torne insolvente, não poderá ser executada – o mesmo se dá quando a pessoa física é, crimi-nalmente, condenada ao pagamento de multa. A pena não passará da pes-soa do delinquente. Logo, não se poderia desconsiderar a pessoa jurídica, buscando ressarcimento penal diretamente dos sócios. Estes, aliás, somente seriam obrigados a cumprir pena – ainda que pecuniária – se forem conde-nados como coautores, mas cada um cumpre sua parte da sentença, não sendo responsável pela do corréu. Se a pessoa jurídica, no entanto, em ra-zão do ilícito penal, ficar obrigada a repará-lo civilmente, há possibilidade de se desconsiderar a pessoa jurídica, voltando-se a cobrança aos sócios, conforme o caso. (NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais penais comentadas. 4. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribu-nais, 2009. p. 881/882)

Entretanto, esclareça-se que a dicção do art. 4º da Lei de Crimes Am-bientais só autoriza a superação da personalidade jurídica para alcançar os bens dos sócios apenas e tão somente nos casos em que a indenização devida pela pessoa jurídica pela prática de infrações às normas penais e ad-ministrativas contra o meio ambiente também redunde de responsabilidade civil.

32 “Art. 4º Poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados à qualidade do meio ambiente.”

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Destarte, quando as infrações às normas penais e administrativas con-tra o meio ambiente derem azo apenas a sanções de natureza pecuniária e não ao ressarcimento decorrente de responsabilidade civil, não há de se cogitar em levantar o véu corporativo da pessoa jurídica.

1.6 Artigo 50 do Código Civil

Diferentemente do § 5º do art. 28 do CDC, do art. 34 da Lei do SBDC e do art. 4º da Lei de Crimes Ambientais, o art. 5033 do Código Civil (Lei nº 10.406/2002) adotou, a exemplo do art. 135 do CTN, a chamada teoria maior34 da desconsideração da personalidade jurídica.

As hipóteses35 para que ocorra uma determinação judicial autorizan-do a penetração na personalidade jurídica previstas no art. 50 do Código Civil são o desvio de finalidade36 e a confusão patrimonial37, o que denota a

33 “Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade, ou pela confusão patrimonial, pode o juiz decidir, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurídica.”

34 “Para analisar o cabimento da desconsideração, o Magistrado deverá verificar se foram preenchidos os requisitos estabelecidos em lei (art. 134, § 4º). O art. 50 do Código Civil, por exemplo, que consagra a chamada teoria maior da desconsideração, prevê a necessidade do preenchimento dos seguintes requisitos: (i) o requisito objetivo, que consiste na insuficiência patrimonial do devedor; e (ii) o requisito subjetivo, consistente no desvio de finalidade ou confusão patrimonial através da fraude ou abuso de direito. Para a aplicação da teoria da desconsideração, não basta estar presente apenas o primeiro requisito. Deve, pois, também estar demonstrada, no caso concreto, a existência de uma conduta culposa do sócio ou a sua intervenção abusiva ou fraudulenta de utilizar os bens da sociedade para fins diversos daqueles permitidos em lei (requisito subjetivo).” (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 115)

35 “A desconsideração será possível, a requerimento da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir, se o abuso consistir em: a) desvio de finalidade; b) confusão patrimonial. No primeiro caso, desvirtuou-se o objetivo social, para se perseguirem fins não previstos contratualmente ou proibidos por lei. No segundo, a atuação do sócio ou administrador confundiu-se com o funcionamento da própria sociedade, utilizada como verdadeiro escudo, não se podendo identificar a separação patrimonial entre ambos. Nas duas situações, faz- -se imprescindível a ocorrência de prejuízo – individual ou social –, justificador da suspensão temporária da personalidade jurídica da sociedade.” (GAGLIANO, Pablo Stolze. Novo curso de direito civil: parte geral. 13. ed. São Paulo: Saraiva, v. I, 2011. p. 272)

36 “Desvio de finalidade. A identificação do desvio de finalidade nas atividades da pessoa jurídica deve partir da constatação da efetiva desenvoltura com que a pessoa jurídica produz a circulação de serviços ou de mercadorias por atividade lícita, cumprindo ou não o seu papel social, nos termos dos traços de sua personalidade jurídica. Se a pessoa jurídica se põe a praticar atos ilícitos ou incompatíveis com sua atividade autorizada, bem como se com sua atividade favorece o enriquecimento de seus sócios e sua derrocada administrativa e econômica, dá-se ocasião de o sistema de direito desconsiderar sua personalidade e alcançar o patrimônio das pessoas que se ocultam por detrás de sua existência jurídica.” (NERY JUNIOR, Nelson. Código civil comentado. 7. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 261/262)

37 “Confusão patrimonial. Também é aplicada a desconsideração nos casos em que houver confusão entre o patrimônio dos sócios e da pessoa jurídica. Essa situação decorre da não separação do patrimônio do sócio e da pessoa jurídica por conveniência da entidade moral. Neste caso, o sócio responde com seu patrimônio para evitar prejuízos aos credores, ressalvada a impenhorabilidade do bem de família e os limites do patrimônio da família.” (NERY JUNIOR, Nelson. Código Civil comentado. 7. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. p. 262)

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coexistência no nosso ordenamento tanto da teoria maior subjetiva38 como da teoria maior objetiva da desconsideração da personalidade jurídica:

O art. 50 representa um nítido avanço na sistematização e consagração de soluções reconhecidas pela jurisprudência, especialmente quanto à des-consideração da personalidade jurídica (Nichtbeachtung der juristischen Personen), cuja atenção se volta especialmente para o regime das socieda-des (Medicus, Allgemeiner Teil des BGB, p. 455: “weil sie für Verein und Stifung kaum Bedeutung hat”). Apesar da complexidade do tema propos-to pelo art. 50, a finalidade da desconsideração é simples, como informa Menezes Cordeiro: “O levantamento destina-se, precisamente, a evitar que, a coberto da personalidade coletiva, os agentes possam, contra o sistema, contornar situações de responsabilidade que lhes seriam imputáveis” (O levantamento da personalidade colectiva, p. 164). Várias são as hipóteses práticas que podem levar à aplicação da desconsideração, as quais são en-quadráveis em sua generalidade: a) no abuso de direito; b) abuso específico da personalidade; c) no desvio da finalidade da empresa; c) infração à lei ou do contrato social que vise a prejudicar as relações constituídas e am-paradas pela boa-fé; d) e a confusão patrimonial, especialmente na socie-dade unipessoal. Esta última situação merece exame cuidadoso, especial-mente pela possibilidade expressa de limitação da responsabilidade, pelo sistema atual (art. 980-A). As construções do quadro probatório para fins de aplicação da desconsideração dependerão do caso concreto, embora al-gumas sejam mais simples quanto à sua constatação, como na hipótese de subcapitalização da empresa com o objetivo de contratar e limitar a futura responsabilidade da pessoa jurídica. (MEDINA, José Miguel. Código Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 101)

A pessoa jurídica é uma realidade autônoma, capaz de direitos e obriga-ções, independentemente de seus membros, pois efetua negócios sem qual-quer ligação com a vontade deles, e, além disso, se a pessoa jurídica não se confunde com as pessoas naturais que a compõem, se o patrimônio da sociedade não se identifica com o dos sócios, fácil será lesar credores, me-diante abuso de direito, caracterizado por desvio de finalidade, tendo-se em vista que os bens particulares dos sócios não podem ser executados an-tes dos bens sociais, havendo dívida da sociedade. Por isso o Código Civil pretende que, quando a pessoa jurídica se desviar dos fins determinantes

38 “Uma primeira vertente pode ser chamada de teoria subjetiva, na qual o pressuposto fundamental da desconsideração é o desvio da função da pessoa jurídica, que se constata na fraude e no abuso de direito relativos à autonomia patrimonial, pois a desconsideração nada mais é do que uma forma de limitar o uso da pessoa jurídica aos fins para os quais ela é destinada. A autonomia patrimonial da pessoa jurídica só subsiste quando ela é usada para seus devidos fins, isto é, quando ela não se confunde com os sócios e quando não é utilizada para fins não merecedores de tutela de acordo com o ordenamento jurídico.” (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 240/241)

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de sua constituição, ou quando houver confusão patrimonial, em razão do abuso da personalidade jurídica, o órgão judicante, a requerimento da par-te ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo, está autorizado, com base na prova material do dano, a desconsiderar, episodi-camente, a personalidade jurídica, para coibir fraudes de sócios que dela se valeram como escudo, sem importar essa medida numa dissolução da pes-soa jurídica. Com isso subsiste o princípio da autonomia subjetiva da pes-soa jurídica, distinta da pessoa de seus sócios, mas tal distinção é afastada, provisoriamente, para dado caso concreto, estendendo a responsabilidade negocial aos bens particulares dos administradores ou sócios da pessoa jurí-dica [...]. Ter-se-á a ineficácia temporária da personalidade jurídica para de-terminados efeitos, afastando a fraude perpetrada contra terceiro mediante a utilização da autonomia patrimonial da pessoa jurídica, prosseguindo in-cólume para atender suas finalidades sociais. (DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. 14. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 100/101)

Para o STJ, o art. 50 do Código Civil (e consequentemente a teoria maior da desconsideração) caracteriza-se como uma regra geral para a su-peração da personalidade jurídica, devendo os efeitos decorrentes da sus-pensão momentânea e episódica da separação patrimonial entre a empresa e seus sócios alcançar apenas as pessoas físicas que agiram de forma ilícita ou se beneficiaram da ilicitude:

3. A regra geral adotada no ordenamento jurídico brasileiro, prevista no art. 50 do CC/2002, consagra a teoria maior da desconsideração, tanto na sua vertente subjetiva quanto na objetiva. 4. Salvo em situações excep-cionais previstas em leis especiais, somente é possível a desconsideração da personalidade jurídica quando verificado o desvio de finalidade (teoria maior subjetiva da desconsideração), caracterizado pelo ato intencional dos sócios de fraudar terceiros com o uso abusivo da personalidade jurídica, ou quando evidenciada a confusão patrimonial (teoria maior objetiva da desconsideração), demonstrada pela inexistência, no campo dos fatos, de separação entre o patrimônio da pessoa jurídica e os de seus sócios. 5. Os efeitos da desconsideração da personalidade jurídica somente alcançam os sócios participantes da conduta ilícita ou que dela se beneficiaram, ainda que se trate de sócio majoritário ou controlador. (STJ, REsp 1325663/SP, 2012/0024374-2, 3ª T., Relª Min. Nancy Andrighi, DJ 11.06.2013, DJe 24.06.2013)

1.7 Artigo 14 dA lei ANtiCorrupção

No direito administrativo, a Lei nº 12.846/2013 (a chamada Lei An-ticorrupção), ao dispor sobre a responsabilização administrativa e civil de

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pessoas jurídicas pela prática de atos contra a Administração Pública, na-cional ou estrangeira, previu, em seu art. 14, a possibilidade de desconsi-deração da personalidade jurídica das empresas que sejam utilizadas para praticar os atos coibidos pelo art. 5º39 do aludido diploma legal:

Art. 14. A personalidade jurídica poderá ser desconsiderada sempre que uti-lizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática dos atos ilícitos previstos nesta lei ou para provocar confusão patrimonial, sendo estendidos todos os efeitos das sanções aplicadas à pessoa jurídica aos seus administradores e sócios com poderes de administração, observa-dos o contraditório e a ampla defesa.

Sobre a possibilidade de a Administração Pública promover spon-te propria, ou seja, sem recorrer ao Judiciário, a desconsideração da per-sonalidade jurídica, cabem aqui as mesmas considerações feitas quando da análise do art. 34 da Lei nº 12.529/2011 e do § 3º do art. 18 da Lei nº 9.847/1999.

1.8 Artigo 2º dA Clt

Por fim, diga-se que, muito embora já tenha sido considerado um exemplo de positivação da disregard doctrine no ordenamento jurídico bra-sileiro40, entendemos que o § 2º41 do art. 2º da CLT não configura uma hipó-

39 “Art. 5º Constituem atos lesivos à Administração Pública, nacional ou estrangeira, para os fins desta lei, todos aqueles praticados pelas pessoas jurídicas mencionadas no parágrafo único do art. 1º, que atentem contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, assim definidos: I – prometer, oferecer ou dar, direta ou indiretamente, vantagem indevida a agente público, ou a terceira pessoa a ele relacionada; II – com-provadamente, financiar, custear, patrocinar ou de qualquer modo subvencionar a prática dos atos ilícitos previstos nesta lei; III – comprovadamente, utilizar-se de interposta pessoa física ou jurídica para ocultar ou dissimular seus reais interesses ou a identidade dos beneficiários dos atos praticados; IV – no tocante a licitações e contratos: a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público; b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público; c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo; d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente; e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo; f) obter vantagem ou benefício indevido, de modo fraudulento, de modificações ou prorrogações de contratos celebrados com a administração pública, sem autorização em lei, no ato convocatório da licitação pública ou nos respectivos instrumentos contratuais; ou g) manipular ou fraudar o equilíbrio econômico-financeiro dos contratos celebrados com a Administração Pública; V – dificultar atividade de investigação ou fiscalização de órgãos, entidades ou agentes públicos, ou intervir em sua atuação, inclusive no âmbito das agências reguladoras e dos órgãos de fiscalização do sistema financeiro nacional.”

40 “A teoria da desconsideração da personalidade jurídica – disregard doctrine –, conquanto encontre amparo no direito positivo brasileiro (art. 2º da Consolidação das Leis Trabalhistas, art. 28 do Código de Defesa do Consumidor, art. 4º da Lei nº 9.605/1998, art. 50 do CC/2002, entre outros), deve ser aplicada com cautela, diante da previsão de autonomia e existência de patrimônios distintos entre as pessoas físicas e jurídicas.” (STJ, REsp 693235/MT, 2004/0140247-0, 4ª T., Rel. Min. Luis Felipe Salomão, DJ 17.11.2009, DJe 30.11.2009)

41 “Art. 2º Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. [...] § 2º Sempre que uma ou mais

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tese de desconsideração da pessoa jurídica como as demais aqui analisadas, já que aqui não se desconsidera a autonomia patrimonial da empresa para alcançar os bens dos sócios ou vice-versa, pois o que ocorre na hipótese prevista na norma juslaboral é a possibilidade de se penetrar na personali-dade jurídica para considerar que ela integra um grupo econômico42-43 em que existe uma natureza da relação de dominação44 entre as empresas par-ticipantes (com unicidade de controle45 e direção46), podendo tal natureza ser de: a) de direção, quando há efetivo controle, por meio do exercício do poder diretivo (diretivo, de fiscalização e disciplinar); b) de controle, quan-do se verifica a possibilidade do exercício de uma influência dominante, de uma empresa sobre a outra, a fim de subordinar a sua atuação à consecução de suas finalidades; ou c) de administração, quando há uma organização destinada a um fim comum.

2 QUEM ESTÁ SUJEITO A DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA?

Como bem esclarece a doutrina, só podem ser objeto de medidas (ad-ministrativas ou judiciais) visando a desconsiderar a personalidade jurídica as sociedades personificadas e em que haja responsabilidade limitada dos sócios:

empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas.”

42 “Grupo econômico é um conglomerado de empresas que, embora tenham personalidade jurídica própria, estão sob o controle administrativo ou acionário de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de outra atividade econômica.” (BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 385)

43 “Preferimos definir o grupo econômico como um conjunto de empresas no qual uma das integrantes pode exercer o domínio sobre as demais.” (MEIRELES, Edilton. Grupo econômico trabalhista. São Paulo: LTr, 2002. p. 80 apud CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho. 6. ed. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2011. p. 320)

44 “A relação que deve haver entre as empresas do grupo econômico é uma relação de dominação, mostrando a existência de uma empresa principal, que é a controladora, e as empresas controladas. A dominação exterioriza-se pela direção, controle ou administração. O requisito principal é o controle de uma empresa sobre outra, que consiste na possibilidade de uma empresa exercer influência dominante sobre outra, mesmo não tendo a maioria das ações, mas sim o número suficiente para controlá-la. A administração decorre da organização do grupo, do poder de uma empresa se investe em relação a outra, quanto à orientação e ingerência de seus órgãos.” (MARTINS, Sergio Pinto. Curso de direito do trabalho. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2009. p. 78)

45 “O controle, segundo Octavio Bueno Magano, é a ‘possibilidade do exercício de uma influência dominante de uma empresa sobre a outra, subordinando os bens a ela atribuídos à consecução de suas finalidades’. Ele poderá ser administrativo ou acionário. Já a direção é a efetivação do controle. Consiste, como assevera o mesmo autor, ‘no poder de subordinar pessoas e coisas à realização dos objetivos da empresa’, enquanto a administração é a submissão de uma empresa à orientação e à interferência de órgãos administrativos de outra.” (BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 6. ed. São Paulo: LTr, 2010. p. 385)

46 “[...] sempre que houver uma gestão única de todas elas, haverá um grupo de empresas.” (CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho. 6. ed. ampl. e atual. Salvador: JusPodivm, 2011. p. 320)

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A própria terminologia usada deixa claro que a desconsideração só tem ca-bimento quando estivermos diante de uma pessoa jurídica, isto é, de uma sociedade personificada. Sem a existência de personalidade, não há o que desconsiderar. (TOMAZETTE, Marlon. Curso de direito empresarial: teoria geral e direito societário. 3. ed. São Paulo: Atlas, v. 1, 2011. p. 229/230)

A disregard doctrine tem um papel importantíssimo, mas deve ser aplicada com cautela para conter os casos efetivos de desvio de propósito da pes-soa jurídica. Trata-se de uma forma de correção. Os pressupostos para a sua aplicação são: a) existência da pessoa jurídica distinta dos seus sócios. Logo, deverá ter situação de registro e existência, pois quando for uma so-ciedade de fato, a responsabilidade será automaticamente voltada para os seus membros; b) a sociedade deve ter responsabilidade limitada, pois, se fosse ilimitada, a desconsideração seria desnecessária [...]. (MEDINA, José Miguel. Código Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 101/102)

Assim, não estão sujeitas à desconsideração as chamadas sociedades despersonificadas, como: a) a sociedade em comum (também conhecida como sociedade de fato ou sociedade irregular), caracterizada por não ter seus atos constitutivos registrados na Junta Comercial, uma vez que nelas os sócios assumem responsabilidade solidária e ilimitada pelos atos prati-cados pela sociedade; e b) a sociedade em conta de participação, em que apenas o sócio ostensivo responde perante terceiros em face das obrigações contraídas47.

Registre-se ainda que Amador Paes de Almeida entende que as em-presas submetidas à recuperação judicial não estão sujeitas à desconsidera-ção da personalidade jurídica48 (pelo menos não a que for fundamentada no art. 50 do Código Civil):

47 “‘Na sociedade em conta de participação, o sócio ostensivo é quem se obriga para com terceiros pelos resultados das transações e das obrigações sociais, realizadas ou empreendidas em decorrência da sociedade, nunca o sócio participante ou oculto que nem é conhecido dos terceiros nem com estes nada trata’ (REsp 168.028/SP). Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido.” (STJ, REsp 192.603/SP, 4ª T., Rel. Min. Barros Monteiro, J. 15.04.2004, DJ 01.07.2004, p. 197)

48 Todavia, é bom pontuar que o STJ não vislumbra tal óbice: “1. Nos termos da Súmula nº 480/STJ: ‘O juízo da recuperação judicial não é competente para decidir sobre a constrição de bens não abrangidos pelo plano de recuperação da empresa’. 2. Desse modo, não configura conflito positivo de competência a apreensão, pela Justiça Especializada, por eventual aplicação da teoria da desconsideração da personalidade jurídica (disregard doctrine), de bens de sócios ou dos diretores da sociedade em recuperação, porquanto tais medidas não implicam a constrição de bens vinculados ao cumprimento do plano de reorganização da sociedade empresária, tampouco interferem em atos de competência do juízo da recuperação. 3. Os bens dos sócios ou dos diretores da devedora não estão sob a tutela do juízo da recuperação judicial, a menos que haja decisão deste em tal sentido. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ, AgRg-EDcl-CC 130436/MT, 2013/0333637-8, 2ª S., Rel. Min. Raul Araújo, DJ 27.11.2013, DJe 19.12.2013)

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No período de recuperação judicial, o devedor é mantido na condução da atividade empresarial, podendo, porém, ser destituído, entre outros fatos, se agir com dolo, simulação ou fraude contra os interesses de seus credo-res. Assim, deferido o pedido de recuperação judicial, estando suspensas as ações contra o devedor (exceto quanto ao processo do trabalho – até a fixação do crédito trabalhista para posterior habilitação no juízo cível da recuperação), não há fundamento legal para a invocação da teoria da des-consideração da personalidade jurídica, mesmo porque ausentes os seus pressupostos fundamentais, a saber: desvio de finalidade ou confusão patri-monial (art. 50 do CC). (ALMEIDA, Amador Paes de. Execução dos bens dos sócios: obrigações mercantis, tributárias, trabalhistas: da desconsideração da personalidade jurídica (doutrina e jurisprudência). 9. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 210)

Por outro lado, estão sujeitas à desconsideração da personalidade ju-rídica: a) as sociedades empresárias, b) as sociedades simples, c) as socieda-des anônimas, d) as pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos ou de fins não econômicos (conforme entendimento contido no Enunciado nº 28449 da Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal e e) as sociedades de economia mista50 e empresas públicas51 que explorem ati-vidade econômica, já que, por mandamento constitucional, se submetem ao mesmo regime jurídico das demais empresas privadas que integram o mercado52-53.

49 “284. As pessoas jurídicas de direito privado sem fins lucrativos ou de fins não econômicos estão abrangidas no conceito de abuso da personalidade jurídica.”

50 “Agravo de instrumento. Recurso de revista. Execução. Legitimidade passiva. Estado. Responsabilidade subsidiária. 1. Não importa em violação direta e literal dos arts. 5º, II e LV, e 173 da Constituição Federal a decisão proferida em execução em que, não obstante o silêncio do título exequendo, declara a responsabilidade subsidiária da unidade da federação ao pagamento de verbas trabalhista devidas por sociedade de economia mista integrante da Administração Pública estadual, da qual o Estado é sócio majoritário e controlador. A desconsideração da personalidade jurídica do ente público (Companhia Alagoana de Recursos Humanos e Patrimoniais – CARHP), justificada ante a inexistência de patrimônio próprio para cumprir o débito trabalhista, remete a questão ao plano infraconstitucional, insuscetível de reexame em recurso de revista interposto em fase de execução. 2. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento.” (TST, AI-RR 1853007020005190005, 185300-70.2000.5.19.0005, 4ª T., Rel. João Oreste Dalazen, DJ 13.11.2013, DEJT 22.11.2013)

51 “Agravo de instrumento. Execução. Desconsideração da personalidade jurídica. Execução direcionada contra o Estado. Acionista majoritário. Não viola a Constituição da República a desconsideração da personalidade jurídica de empresa pública, com o consequente direcionamento da execução ao ente federado instituidor. Juros de mora. Recurso desfundamentado a teor da Súmula nº 266 do TST e do art. 896, § 2º, da CLT. Agravo de instrumento a que se nega provimento.” (TST, AI-RR 1630000920025010050, 8ª T., Relª Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, DJ 03.06.2015, DEJT 08.06.2015)

52 “Quanto às relações com terceiros, fornecedores e empreiteiros, estas estão submetidas, no Brasil, em face do art. 173, § 1º, II, ao direito privado, na sua pureza.” (MUKAI, Toshio. O direito administrativo e os regimes jurídicos das empresas estatais. 2. ed. rev. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2004. p. 303)

53 “De início, observemos o já anteriormente referido art. 173, § 1º, da CF. Como já salientado anteriormente, seja no seu texto original, seja no texto hoje vigente, nossa Lei Maior firma a diretiva de que as empresas públicas e as sociedades de economia mista que exploram atividade econômica deverão sujeitar-se sempre ‘ao regime

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3 O PROCEDIMENTO PARA DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA ESTABELECIDO NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

O novo Código de Processo Civil instituiu – nos seus arts. 133 a 137 – o procedimento judicial (obrigatório e aplicável também à Justiça do Trabalho54 e aos juizados especiais, conforme dicção dos arts. 1555, 795, § 4º56 e 1.06257 do referido diploma) para se promover a desconsideração da personalidade jurídica.

Em linhas gerais, a desconsideração da personalidade jurídica no NCPC é uma intervenção de terceiros58 que provoca necessariamente uma

jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários’. A intenção do legislador parece ser clara. Seu desejo é o de equiparar as empresas estatais a empresas privadas comuns para que, no exercício de suas atividades privadas, atuem em condição igualitária, ou ao menos a mais equivalente possível. Devem ter os mesmos direitos e os mesmos deveres. Sendo assim, parece-nos rigorosamente correto afirmar que as empresas públicas, as sociedades de economia mista que explorem atividade econômica e suas subsidiárias jamais poderão receber da legislação infraconstitucional qualquer tipo de tratamento privilegiado que as coloque em patamar jurídico diferenciado daquele em que estão situadas as empresas comuns, de modo a que possam vir a receber qualquer favorecimento especial na sua atuação.” (CARDOZO, José Eduardo Martins. O dever de licitar e os contratos das empresas estatais que exercem atividade econômica. In: Curso de direito administrativo econômico. São Paulo: Malheiros, v. III, 2006. p. 784/785)

54 Enunciado nº 124 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “A desconsideração da personalidade jurídica no processo do trabalho deve ser processada na forma dos arts. 133 a 137, podendo o incidente ser resolvido em decisão interlocutória ou na sentença”.

55 “Etimologicamente, existe uma diferença entre aplicação supletiva e aplicação subsidiária. A primeira se destina a suprir algo que não existe em uma determinada legislação, enquanto a segunda serve de ajuda ou de subsídio para a interpretação de alguma norma ou mesmo um instituto. Todavia, na prática, tem-se confundido a etimologia destas palavras, aplicando, uma ou outra, nos dois sentidos. A propósito, o art. 769 da CLT afirma que, ‘nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, e assim tem ocorrido com aplicação de inúmeros institutos previstos no CPC ou em leis específicas. É o caso, por exemplo, e respectivamente, das regras que dispõem sobre a tutela antecipada e da lei que regulamenta o mandado de segurança (Lei nº 12.016/2009). É justamente no processo do trabalho que o novo Código de Processo Civil terá grande utilidade. Isto porque a CLT, que contém reduzido número de artigos que regulamentam os conflitos trabalhistas (um título com oito capítulos), foi elaborada em 1940, e, apesar do grande avanço para a época, encontra-se, hoje, longe da realidade e desatualizada. Nesta linha, algumas inovações processuais do novo Código de Processo Civil terão importante papel no processo trabalho, como o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (arts. 133 a 137) e o incidente de resolução de demandas repetitivas (arts. 976 a 987) etc. No que se refere ao incidente de desconsideração da personalidade jurídica, é comum na justiça do trabalho a aplicação indiscriminada do instituto, com a imediata determinação da penhora online nas contas dos sócios, sem que a eles seja sequer dada oportunidade de defesa, isto porque dificilmente os sócios participaram da relação jurídica processual. Ora, os eventuais abusos cometidos pelos sócios de algumas empresas, que não cumprem as suas obrigações trabalhistas, não justificam, por si só, a generalização que hoje ocorre, sem que sejam observados, minimamente, os princípios do contraditório e da ampla defesa. Assim, a partir da vigência do novo Código de Processo Civil, a Justiça do Trabalho só poderá desconsiderar a personalidade jurídica da empresa depois de assegurar o procedimento previsto nos arts. 133 a 137 do novo CPC.” (CARNEIRO, Paulo Cezar Pinheiro. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 69/70)

56 “Art. 795. [...] § 4º Para a desconsideração da personalidade jurídica é obrigatória a observância do incidente previsto neste Código.”

57 “Art. 1.062. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se ao processo de competência dos juizados especiais.”

58 “O incidente de desconsideração da personalidade jurídica é uma novidade trazida pelo CPC/2015. Trata-se de uma espécie de intervenção de terceiros que não era encontrada no CPC/1973 e que recebeu disciplina processual expressa pelo novo diploma legal com o objetivo de harmonizar a desconsideração da personalidade

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mudança no polo passivo da demanda, já que, num primeiro momento, ha-verá sua ampliação59 (com a formação de litisconsórcio passivo60), em razão da inclusão do sócio (ou da pessoa jurídica, no caso da desconsideração inversa e da desconsideração fundada na CLT) e, num segundo momento, poderá ocorrer sua substituição, com a exclusão do réu/executado original:

O Código de Processo Civil inclui, entre as modalidades de intervenção de terceiro, o incidente de desconsideração da personalidade jurídica. Trata--se, na verdade, de um incidente processual que provoca uma intervenção forçada de terceiro (já que alguém estranho ao processo – o sócio ou a so-ciedade, conforme o caso –, será citado e passará a ser parte no processo, ao menos até que seja resolvido o incidente). Caso se decida por não ser caso de desconsideração, aquele que foi citado por força do incidente será excluído do processo, encerrando-se assim sua participação. De outro lado, caso se decida pela desconsideração, o sujeito que ingressou no processo passará a ocupar a posição de demandado, em litisconsórcio com o deman-dado original. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica, então, pode acarretar uma ampliação subjetiva da demanda, formando-se, por força do resultado nele produzido, um litisconsórcio passivo facultativo. (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 513)

Nos termos do NCPC, tal procedimento de ampliação subjetiva da demanda (verdadeiro incidente cognitivo61), por acarretar o risco de constri-

jurídica com o princípio do contraditório (CF, art. 5º, LV, e CPC/2015, arts. 7º, 9º e 10).” (SOUZA, André Pagani de. Código de Processo Civil anotado. Sob a coordenação de José Rogério Cruz e Tucci, Manoel Caetano Ferreira Filho, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Sandro Gilbert Martins, Rogéria Fagundes Dotti. Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 227)

59 “Importante notar que o conceito de parte na demanda ou no processo não se confunde com o conceito de parte material, que é o sujeito que participa da relação de direito material que constitui o objeto do processo. Dessa forma, mesmo que não seja o titular dessa relação de direito material, mas participe do processo, o sujeito será considerado parte processual, independentemente da legalidade de sua presença no processo. É por isso que, mesmo sendo parte ilegítima, o sujeito é considerado parte processual pelo simples fato de participar do processo. Significa que o sócio será parte, querendo ou não, tendo ou não legitimidade para participar da execução.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. p. 148)

60 Enunciado nº 125 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “Há litisconsórcio passivo facultativo quando requerida a desconsideração da personalidade jurídica, juntamente com outro pedido formulado na petição inicial ou incidentemente no processo em curso”.

61 “A utilização de um incidente cognitivo para desconsiderar a personalidade jurídica é prescrita pelos arts. 133 a 137 do CPC/2015 como forma de garantir que o princípio do contraditório seja observado sempre que, por determinação judicial, os efeitos de certas e determinadas obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou dos sócios da pessoa jurídica. Com a instauração deste incidente, permite-se que seja estabelecido o contraditório entre aquele que pede a desconsideração da personalidade jurídica e aquele que poderá sofrer os seus efeitos, de maneira que o juiz realize a sua cognição e profira a sua decisão no curso de um processo pendente, sem prejudicar o direito de defesa do integrante da pessoa jurídica.” (SOUZA, André Pagani de. Código de Processo Civil anotado. Sob a coordenação de José Rogério Cruz e Tucci, Manoel Caetano Ferreira Filho, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Sandro Gilbert Martins, Rogéria Fagundes Dotti. Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 227)

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ção judicial do patrimônio daquele que passa a integrar a lide, necessaria-mente estará submetido ao crivo do contraditório:

Importante, ainda, é registrar que este incidente – que não estava previsto expressamente na legislação processual anterior – vem assegurar o pleno respeito ao contraditório e ao devido processo legal no que diz respeito à desconsideração da personalidade jurídica. É que sem a realização desse incidente, o que se via era a apreensão de bens de sócios (ou da socie-dade, no caso de desconsideração inversa) sem que fossem eles chamados a participar, em contraditório, do processo de formação da decisão que de-fine sua responsabilidade patrimonial. O Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, ao tempo da legislação processual anterior, admitia a desconsi-deração da personalidade jurídica sem prévia citação daqueles que seriam atingidos pelos efeitos da decisão, diferindo-se o contraditório. (STJ, REsp 1266666/SP, Relª Min. Nancy Andrighi, J. 09.08.2011). Este entendimento, porém, contraria frontalmente o modelo constitucional de processo brasi-leiro, já que admite a produção de uma decisão que afeta diretamente os interesses de alguém sem que lhe seja assegurada a possibilidade de partici-par com influência na formação do aludido pronunciamento judicial (o que só seria admitido, em caráter absolutamente excepcional, nas hipóteses em que se profere decisão concessiva de tutela de urgência, e mesmo assim so-mente nos casos nos quais não se pode aguardar pelo pronunciamento pré-vio do demandado). Ora, se ninguém será privado de seus bens sem o de-vido processo legal, então é absolutamente essencial que se permita àquele que está na iminência de ser privado de um bem que seja chamado a deba-ter no processo se é ou não legítimo que seu patrimônio seja alcançado por força da desconsideração da personalidade jurídica. (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 514)

Desta forma, ao instrumentalizar a desconsideração da personalidade jurídica, o NCPC criou procedimentos para alterar não só o polo passivo da demanda como também a responsabilidade patrimonial (art. 78962 do NCPC), sem, contudo, descurar do contraditório e da ampla defesa.

Tecidas essas considerações gerais, passemos a analisar um a um os artigos do NCPC que regulam a desconsideração da personalidade jurídica.

No art. 133 e seus respectivos parágrafos, o NCPC começa apresen-tando a desconsideração da personalidade em sua forma incidental:

62 “Art. 789. O devedor responde com todos os seus bens presentes e futuros para o cumprimento de suas obrigações, salvo as restrições estabelecidas em lei.”

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Art. 133. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.

§ 1º O pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei.

§ 2º Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração in-versa da personalidade jurídica.

O dispositivo deixa evidente que o juiz só atua mediante provocação das partes, de modo que, não havendo expresso pedido da parte ou do Ministério Público, é vedado ao julgador sequer cogitar63 em promover o afastamento da personalidade do ente coletivo:

De acordo com o NCPC, não há possibilidade de atuação jurisdicional sem o requerimento da parte ou do Ministério Público; ou seja, é vedado ao juiz, de ofício, determinar a inclusão do sócio ou do administrador no polo pas-sivo da demanda, para fins de desconsideração da personalidade jurídica. O art. 133 do NCPC está em consonância com o art. 50 do Código Civil, que também prevê o expresso requerimento do interessado ou do Ministé-rio Público, não se podendo cogitar de atuação ex officio. (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 112)

O pedido de desconsideração da pessoa jurídica deve ser necessariamen-te formulado pela parte ou pelo Ministério Público, este quando estiver no processo atuando como custos legis (fiscal da lei). Não é possível atuação do juiz sem provocação da parte. O art. 133, § 1º, deixa claro que os pres-supostos de aplicação desta teoria que leva à alteração da responsabilidade patrimonial estão previstos na lei material, já que o conflito entre as par-tes pode ter fundamento no direito civil, no direito do consumidor etc. [...] Os pressupostos para a incidência deste mecanismo são diferentes em di-versos ramos do direito material, mas a disciplina processual é uma só: em caso algum pode haver a instauração de ofício deste incidente. (WAMBIER,

63 “O incidente de desconsideração da personalidade jurídica não pode ser instaurado de ofício, dependendo sempre de provocação da parte interessada ou, quando atue no processo, do Ministério Público. O dispositivo está em plena consonância com o que dispõe o art. 50 do CC/2002, que expressamente exige provocação da parte (ou do Ministério Público) para a desconsideração da personalidade jurídica, mas vem eliminar o risco de que, nas causas regidas pela legislação consumerista, se desse ao art. 28 do CDC (que é silente sobre o ponto) interpretação no sentido de que ali seria possível desconsiderar-se ex officio a personalidade jurídica. Fica claro, então, que a desconsideração da personalidade jurídica jamais poderá ser decretada de ofício, dependendo, sempre, de provocação.” (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 515/516)

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Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 252)

Entretanto, a vedação à atuação ex officio do juiz em sede de pe-netração da personalidade jurídica repousa no sistema previsto no NCPC, uma vez que o § 2º64 do art. 82 da Lei de Recuperação Judicial e Falências alberga-se tal possibilidade:

Há casos especiais em que a legislação permite adoção de medidas de ofí-cio pelo juiz em decorrência da descon ideração da personalidade jurídica, como ocorre no art. 82, § 2º, da Lei nº 11.101 (regula a recuperação judi-cial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária). Trata-se, contudo, de exceção à regra geral estabelecida no CPC. (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 362)

Entre outras determinações, o art. 134 do NCPC disciplina o momen-to processual65-66 em que pode ser formulado o pedido de desconsideração da personalidade jurídica, bem como a possibilidade de ele integrar o bojo

64 “Art. 82. A responsabilidade pessoal dos sócios de responsabilidade limitada, dos controladores e dos administradores da sociedade falida, estabelecida nas respectivas leis, será apurada no próprio juízo da falência, independentemente da realização do ativo e da prova da sua insuficiência para cobrir o passivo, observado o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil. § 1º Prescreverá em 2 (dois) anos, contados do trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência, a ação de responsabilização prevista no caput deste artigo. § 2º O juiz poderá, de ofício ou mediante requerimento das partes interessadas, ordenar a indisponibilidade de bens particulares dos réus, em quantidade compatível com o dano provocado, até o julgamento da ação de responsabilização.”

65 “Pode-se suscitar o incidente de desconsideração da pessoa jurídica em qualquer fase do processo e em qualquer tipo de processo, seja qual for o procedimento. É indiferente que o processo esteja em 1º ou em 2º grau de jurisdição. Já na fase de recurso especial ou extraordinário, não é possível a suscitação do incidente, já que é a Constituição Federal que disciplina a competência dos Tribunais Superiores e, ademais, por causa dos estreitos limites do efeito devolutivo destes recursos, que estão adstritos à questão federal ou à questão constitucional, revestida esta última de repercussão geral, seria despropositado admitir-se um incidente cujos limites pudessem extrapolar o da questão discutida nestes recursos.” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 253/254)

66 “É claro que poderá o órgão julgador julgar inconveniente a instauração do incidente em determinados casos e, com isso, indeferi-la, sem prejuízo de renovação do requerimento em momento posterior. Isto porque se a desconsideração da personalidade jurídica serve para que ‘os efeitos de certas e determinadas obrigações sejam estendidos aos bens particulares dos administradores ou dos sócios da pessoa jurídica ou aos bens de empresa do mesmo grupo econômico’, não haveria interesse processual em se instaurar o incidente, por exemplo, em grau de apelação contra sentença que julgou improcedente a demanda, na medida em que nem sequer o reconhecimento da obrigação do réu verificar-se-ia na hipótese.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 364)

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da peça vestibular67 e assim dispensar68 a sua apresentação por meio de incidente:

Art. 134. O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.

§ 1º A instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distri-buidor para as anotações devidas.

§ 2º Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da per-sonalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica.

§ 3º A instauração do incidente suspenderá o processo, salvo na hipótese do § 2º.

§ 4º O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica.

O art. 134 também deixa claro que o incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo69, quer no processo de conhecimento,

67 “Há casos em que o demandante, já na petição inicial (de processo cognitivo ou executivo), postula a desconsideração da personalidade jurídica. Nesse caso, a citação do sócio ou da sociedade (esta no caso de desconsideração inversa) já será requerida originariamente. Ocorrendo esse requerimento originário, a demanda terá sido proposta em face do indigitado devedor da obrigação (seja a sociedade, seja o sócio) e, também, em face de terceiro (o sócio ou a sociedade, conforme o caso) que, não obstante estranho à relação obrigacional deduzida no processo, pode ser considerado também responsável pelo pagamento. Formar-se-á, aí, então, um litisconsórcio passivo originário entre a sociedade e o sócio. E em razão desse litisconsórcio originário não haverá qualquer motivo para a instauração do incidente. Afinal, nesse feito a pretensão à desconsideração integrará o próprio objeto do processo, cabendo ao juiz, ao proferir decisão sobre o ponto, acolher ou rejeitar tal pretensão. Sendo originário o litisconsórcio entre sociedade e sócio, não haveria como tratar o indigitado responsável (não devedor), seja ele o sócio, seja a sociedade (no caso de desconsideração inversa), como terceiro, motivo pelo qual não haveria qualquer sentido em instaurar-se um incidente que tem por fim promover uma intervenção de terceiro. Ressalvado esse caso, porém, a instauração do incidente é obrigatória para que se possa ampliar subjetivamente o processo e, com isso, legitimar-se a decisão que determina que a execução contra a sociedade atinja o patrimônio do sócio (ou vice-versa).” (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 521)

68 “Não será necessária a instauração do incidente, logicamente, quando o pedido de desconsideração da personalidade jurídica for realizado na própria petição inicial, hipótese em que o sócio (ou a pessoa jurídica, na desconsideração inversa) será citado como parte já de início. Neste caso, tampouco há falar em suspensão do processo, uma vez que a desconsideração da personalidade jurídica já integra seu objeto original.” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 364/365)

69 “De acordo com a redação do art. 134, o incidente é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento da sentença e na execução fundada em título extrajudicial. Logo, quem pretender a desconsideração não precisará aguardar a sentença ou acórdão para pleitear a medida. Prova disso é que o § 2º possibilita à parte requerer a desconsideração ainda na petição inicial, hipótese em que será desnecessária a instauração do incidente. Ressalte-se que a medida também é aplicável no âmbito dos processos que tramitam perante os Juizados Especiais Cíveis, nos termos do novo art. 1.062.” (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 114/115)

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na fase recursal (à exceção óbvia das instâncias extraordinárias) ou quando da fase executiva:

O incidente de desconsideração da personalidade jurídica pode instaurar--se em qualquer tipo de processo, cognitivo ou executivo, seja qual for o procedimento observado, comum ou especial. Pode, ainda, instaurar-se em qualquer fase do desenvolvimento processual, inclusive na fase executiva que o processo civil brasileiro designa por “cumprimento de sentença”. É possível, inclusive, que o incidente se instaure perante os tribunais, seja nos processos de competência originária, seja em grau de recurso, como se ex-trai do disposto no parágrafo único do art. 136, que prevê a possibilidade de decisão do incidente por relator. Caso o incidente se instaure no cur-so de um processo cognitivo (ou na fase de conhecimento de um processo “sincrético”), e vindo a ser proferida decisão que desconsidere a personali-dade jurídica, o sócio (ou a sociedade, no caso de desconsideração inversa) passará a integrar o processo como demandado. Consequência disso é que a sentença poderá afirmar sua condição de responsável pela obrigação, o que tornará possível fazer com que a execução atinja seu patrimônio, nos termos do art. 790, II. De outro lado, não tendo sido instaurado o incidente durante o processo de conhecimento, sempre será possível postular a des-consideração da personalidade jurídica na fase de cumprimento da senten-ça. Neste caso, assim como ocorrerá quando o incidente for instaurado no curso de execução fundada em título extrajudicial, sendo proferida a de-cisão que desconsidera a personalidade jurídica, o sócio (ou a sociedade, no caso de desconsideração inversa) assumirá a posição de executado, de modo que sobre seu patrimônio passará a ser possível incidir a atividade executiva. (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Processo Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 519)

Sendo a desconsideração da personalidade jurídica requerida de for-ma incidental, o § 3º do art. 134 prevê a suspensão70 do feito. O que é pas-sível de discussão é a abrangência de tal suspensão, conforme leciona José Miguel Medina:

De acordo com o § 3º do art. 134, a instauração do incidente suspenderá o processo. Não nos parece acertado suspender-se todo o processo, em razão da instauração do incidente. Mais adequado cingir-se eventual suspensão à questão da desconsideração – nada impedindo a prática de outros atos exe-

70 “A instauração do incidente de desconsideração implica suspensão do processo, salvo quando requerida na petição inicial, hipótese em que o sócio ou sociedade serão citados para responder ao incidente no prazo para a defesa. Suspenso o processo, fica resguardada ao juiz a prerrogativa de determinar atos urgentes (art. 314). Frise-se, ainda, que independentemente da suspensão, o incidente deve ser decidido antes do mérito, uma vez que o seu resultado pode inserir novos réus no processo, os quais terão suas garantias processuais violadas se contra eles incidir decisão prolatada anteriormente.” (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 115)

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cutivos, por exemplo, no curso do procedimento. (MEDINA, José Miguel. Novo Código de Processo Civil comentado: com remissões e notas compa-rativas ao CPC/1973. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 227)

Sobre a suspensão da marcha processual prevista § 3º do art. 134, veja-se também o entendimento de Ruy Zoch Rodrigues:

A suspensão do processo prevista no art. 134, § 3º, faz sentido para a gene-ralidade dos casos, que ocorrem ao tempo da penhora na execução/cum-primento de sentença para cobrança de valor pecuniário, quando se revela a falta de patrimônio penhorável. A decisão do tema incidental se torna, aí, condição para o ato seguinte do processo – a penhora –, com o que não há como prosseguir a execução, que fatalmente ficará suspensa. Entretanto, a desconsideração não se limita àquelas hipóteses. Por isso, e porque a lógica do NCPC prestigia a celeridade com menos destaque à formalidade, pare-ce que a melhor exegese do § 3º do art. 134 deva ser a de que o processo em que tem curso a questão principal só se suspende em vista do incidente se o tema incidental constituir condição para o prosseguimento. Fora disso, não. E tudo remete à possibilidade de autuação apartada, a fim de se garan-tir celeridade e melhor organização procedimental. Ainda sobre suspensão, a parte final do § 3º do art. 134, que remete ao § 2º, não significa que o mero posicionamento topográfico do incidente (na inicial) seja o elemen-to-chave para definir se o processo deve ser suspenso ou não. Até porque o § 2º sequer trata de tema propriamente incidente, mas de hipóteses me-nos frequentes em que a desconsideração compõe a lide principal, ainda que acessoriamente. Inclusive ações reais ou reipersecutórias, nas quais, ao tempo da propositura, tendo-se já claro qual é o bem (ou conjunto de bens) apto à satisfação da parte autora, esse patrimônio se encontra desviado (ao sócio ou à sociedade). Nessas hipóteses, a desconsideração da personalida-de jurídica é proposta na inicial e não suspende o andamento do processo, porque está ligada ao objeto principal. (RODRIGUES, Ruy Zoch. Novo Có-digo de Processo Civil anotado/OAB. Porto Alegre: OAB RS, 2015. p. 145)

Ainda sobre o pedido de desconsideração feito em caráter inciden-tal, há de se atentar que nele deverá se demonstrar (e não alegar, em que pese o entendimento de Daniel Amorim Assumpção Neves71) que houve o

71 “Como toda petição postulatória, a petição que veicula o pedido para a instauração do incidente processual de desconsideração da personalidade jurídica deve conter fundamentação (pressupostos legais para a desconsideração) e pedido (desconsideração e penhora sobre o bem dos sócios). Nesse sentido, deve-se compreender o § 4º do art. 134 do Novo CPC, que não foi feliz em prever que no requerimento cabe à parte demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais para a desconsideração, o que pode passar a equivocada impressão de que o requerente terá que apresentar prova pré-constituída e liminarmente demonstrar o cabimento da desconsideração. Na realidade, o requerente não deve demonstrar, mas apenas alegar o preenchimento dos requisitos legais para a desconsideração, tendo o direito à produção de prova para convencer o juízo de sua alegação, inclusive conforme expressamente previsto nos arts. 135 e 136 do novo CPC, ao preverem expressamente a possibilidade de instrução probatória no incidente ora analisado.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. p. 143/144)

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preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica (ou seja, os requisitos previstos no direito material):

O incidente tem cabimento em todas as fases do processo, assim na fase de conhecimento e na de cumprimento de sentença. Também cabe nas execuções fundadas em título extrajudicial. Trata-se, em qualquer caso, de incidente predestinado à criação (ou à ampliação) do título executivo (judi-cial ou extrajudicial) para permitir a prática de atos executivos em face de quem, até então, não consta, como devedor, do título que embasa o cum-primento de sentença ou a execução. O pedido de sua instauração, com a demonstração da presença dos pressupostos materiais, será comunicado imediatamente ao distribuidor, que fará as anotações cabíveis, suspenden-do o processo, salvo se o requerimento for feito com a petição inicial, hi-pótese que, em rigor, nenhuma relação tem com o instituto ora anotado. Neste caso, que está previsto no § 2º, a situação parece se amoldar melhor à ocorrência de um litisconsórcio, ainda que formulado a título eventual e provavelmente fundado em diversa causa de pedir, isto é, na hipótese de a pessoa jurídica não ter condições de arcar com sua responsabilização. (BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 133)

O que nos parece sensato é que essa demonstração do preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica exigida pelo § 4º do art. 134 deve se dar à luz da verossimilhança das alegações do requerente e não num juízo de cognição exauriente, con-forme bem esclarece Guilherme Rizzo Amaral:

Ao requerer a instauração do incidente, deve a parte ou o Ministério Pú-blico demonstrar os preenchimentos legais específicos para a desconside-ração. Note-se que, aqui, o juízo de admissibilidade do incidente não será um juízo de certeza nem mesmo de preponderância de provas, mas, sim, de verossimilhança das alegações do requerente. É o que basta para a ins-tauração do incidente, sendo que a efetiva comprovação dos pressupostos legais da desconsideração é exigida apenas para a desconsideração propria-mente dita da personalidade jurídica, a ser determinada em decisão final do incidente após sua devida instrução. (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comen-tários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 364)

Diferentemente do que ocorre quando o pedido de desconsideração é formulado por meio de incidente, quando ele se dá na exordial, não há ne-cessidade de suspensão do processo e, como bem apontam Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero, não é necessário se de-monstrar, de imediato, que houve o preenchimento dos pressupostos legais

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específicos para desconsideração da personalidade jurídica, permitindo-se que as provas de tal demonstração sejam carreadas durante o trâmite do processo:

O incidente de desconsideração é cabível em qualquer tipo de processo e em qualquer momento do processo. Na instância recursal, a atribuição é do relator, embora de sua decisão caiba recurso de agravo interno para o colegiado (art. 136, parágrafo único, do CPC). Se a desconsideração é re-querida na petição inicial, o contraditório se faz na própria contestação, dispensando a realização de incidente autônomo. Nesse caso, para o pro-cesso, devem também ser citados o sócio ou a pessoa jurídica que poderão ser atingidos pela desconsideração. Não haverá suspensão do processo e a prova dos requisitos para a desconsideração devem ser trazidos no curso do processo. Se requerida em outro momento, o incidente suspende o curso do processo até sua decisão. Será objeto de petição própria, em que o reque-rente demonstrará a satisfação dos pressupostos materiais para a descon-sideração. Além da oitiva da parte contrária, também deverão ser citados para o contraditório o sócio ou a sociedade que poderão ser atingidos pela desconsideração. (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 208/209)

Demonstrando uma grande preocupação em manter a superação da personalidade jurídica como uma medida excepcional, o legislador garan-tiu, no art. 135 do NCPC, que a autonomia patrimonial entre a empresa e os seus sócios só será afastada após o inevitável oferecimento do contraditório para aquele que poderá a vir sofrer com os efeitos da decisão (de modo que não haverá constrição judicial de patrimônio72 sem a possibilidade de defe-sa): “Art. 135. Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será cita-do para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias”.

Ao fazer referência à citação (e não intimação, como bem ressalta Cassio Scarpinella Bueno73-74), o art. 135 do NCPC deixa bem patente um

72 “Apesar da ampliação do instituto, o NCPC condicionou o deferimento da medida – pleiteada na petição inicial ou em caráter incidental – à prévia citação do sócio ou da pessoa jurídica (art. 134, § 2º, parte final, e art. 135). O que a nova legislação pretende é evitar a constrição judicial dos bens do sócio (ou da pessoa jurídica, na hipótese da desconsideração inversa) sem qualquer possibilidade de defesa.” (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 115)

73 “A citação (e não mera intimação) dos sócios ou terceiros é indispensável, estabelecendo-se, de maneira incidental ao processo em curso, independentemente da fase que ele se encontre, o cabível contraditório sobre a existência, ou não, de fundamento para a desconsideração da personalidade jurídica pretendida. O prazo para defesa é de quinze dias.” (BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 134)

74 Como contraponto, registre-se a posição de Guilherme Rizzo Amaral, que pugna pela possibilidade de intimação para apresentação da manifestação, muito embora ele não esclareça como alguém possa fazer

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cenário no qual há uma ampliação subjetiva momentânea da demanda, já que haverá um réu no incidente de desconsideração de personalidade jurídica que poderá a vir se tornar o réu da ação principal em substituição ao réu originário:

Em atenção à garantia do contraditório e da ampla defesa, uma vez instau-rado o incidente, a pessoa jurídica ou o sócio – conforme o caso – será ci-tada para apresentar defesa e, se necessário, requerer as provas cabíveis, no prazo de 15 dias. A regra vale quando o requerimento se der de forma in-cidental. (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 116)

Bem, como dito acima, o réu, no incidente, terá 15 dias para se mani-festar (e a terminologia do Código impõe que o nome da peça seja manifes-tação, não defesa ou muito menos contestação, muito embora o conteúdo da petição, por óbvio, assemelhe-se àquela última75-76). Ao contrário de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero77, entende-mos que não há motivos para, estando presentes as condições estabelecidas no art. 22978 do NCPC, não se dobrar o prazo para os réus no incidente

já parte do processo principal e ainda assim dar azo à instauração do incidente de desconsideração de personalidade jurídica: “Embora o dispositivo faça menção à citação, caso uma dessas pessoas já seja parte no processo principal, poderá ela ser intimada na pessoa de seu advogado constituído nos autos, sendo desnecessária a adoção da forma de citação para o ato. Isto porque, sendo a citação ‘o ato pelo qual são convocados o réu, o executado ou o interessado para integrar a relação processual’ (art. 238), não há sentido na sua realização caso o destinatário já integre a relação processual originária” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 365/366).

75 “O sócio ou a pessoa jurídica, citados para integrar a relação processual, têm em suas manifestações todos os contornos de verdadeira contestação, submetendo-se inclusive, na hipótese de não apresentação da defesa, aos efeitos da revelia, entre os quais a presunção de veracidade dos fatos afirmados por quem requereu a desconsideração da personalidade jurídica, desde que as alegações deste sejam verossímeis (arts. 344 e 345, IV).” (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 366)

76 “O CPC 135 apenas fala em ‘manifestação’ do sócio ou da pessoa jurídica. Pressupõe-se, então, que essa manifestação se dará por meio de petição. Mas nessa petição deverão ser apresentadas todas as alegações e argumentos pelos quais não seria possível o reconhecimento de confusão patrimonial ou desvio de finalidade, bem como requeridas as provas necessárias. É praticamente uma contestação àquele pedido incidente.” (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao Código de Processo Civil (livro eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 1.201/1.202)

77 “Os interessados (a parte contrária e o sócio ou a sociedade que poderão ser atingidos pela desconsideração) deverão ouvidos no prazo comum de quinze dias. Não se aplica aqui a causa de aumento de prazo prevista no art. 229 do CPC. Os terceiros, que não compõem os polos da relação processual (sócio ou sociedade que podem ser atingidos pela decisão), deverão ser citados para o incidente, podendo oferecer defesa no prazo de quinze dias.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 209)

78 “Art. 229. Os litisconsortes que tiverem diferentes procuradores, de escritórios de advocacia distintos, terão prazos contados em dobro para todas as suas manifestações, em qualquer juízo ou tribunal, independentemente de requerimento. § 1º Cessa a contagem do prazo em dobro se, havendo apenas 2 (dois) réus, é oferecida defesa por apenas um deles. § 2º Não se aplica o disposto no caput aos processos em autos eletrônicos.”

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apresentarem suas manifestações (basta, por exemplo, que a desconsidera-ção alcance mais de um sócio da empresa e que cada um deles tenha seu próprio advogado). Por fim, caso o réu no incidente não se manifeste, há de se aplicar os efeitos da revelia:

Citado o sócio ou a pessoa jurídica, terá 15 (quinze) dias para se manifestar e requerer provas que pretende produzir. O fato de a lei exigir que haja ci-tação do requerido indica: 1) que se trata, realmente, do réu do incidente; 2) e que, se acolhido no mérito o requerimento de desconsideração, este passará a ser réu no processo em que o incidente foi suscitado. Silente o re-querido, incidem, a nosso ver, os efeitos da revelia (art. 319 do CPC/1973). Se este, ao contrário, se defender, o juiz deferirá as provas para depois, de-cidir.” (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 254)

Embora discordemos de tal opinião, por a considerarmos equivoca-da (por atentar contra expressa previsão legal), há de se registrar o enten-dimento de Daniel Amorim Assumpção Neves e André Pagani de Souza no sentido de que seria possível um contraditório diferido no qual a des-consideração da personalidade jurídica poderia anteceder a manifestação do réu:

Ao prever que, instaurado o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, o sócio ou a pessoa jurídica será citada para manifestar-se e re-querer as provas cabíveis no prazo de quinze dias, o art. 135 do novo CPC consagrou a exigência do contraditório tradicional para a desconsideração da personalidade jurídica, exigindo a intimação e a oportunidade de mani-festação dos sócios e da sociedade antes de ser proferida a decisão. [...] É preciso registrar que a previsão legal que exige o contraditório tradicional não afasta peremptoriamente o contraditório diferido na desconsideração da personalidade jurídica, apenas tornando-o excepcional. Dessa forma, sendo preenchidos os requisitos típicos da tutela de urgência e do pedido de antecipação dos efeitos da desconsideração da personalidade jurídica, entendo admissível a prolação de decisão antes da intimação dos sócios e da sociedade. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Pro-cesso Civil – Lei nº 13.105/2015. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Méto-do, 2015. p. 144/145)

Na hipótese de haver risco ao resultado útil do processo se for determina-da a citação do sócio, do administrador ou da própria pessoa jurídica para se manifestar no incidente de desconsideração da personalidade jurídi-ca, pode-se primeiro pleitear uma tutela de urgência de natureza cautelar

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(CPC/2015, art. 301), para depois ser realizada a citação a que se refere o art. 135 do CPC/2015 e a prática dos demais atos processuais previstos nos arts. 133 a 137 do CPC/2015, sob pena de se violar o art. 5º, XXXV, da CF. (SOUZA, André Pagani de. Código de Processo Civil anotado. Sob a coordenação de José Rogério Cruz e Tucci, Manoel Caetano Ferreira Filho, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Sandro Gilbert Martins, Rogéria Fagundes Dotti. Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 234)

Finalizando a análise do art. 135 do NCPC, que preconiza a obrigatorieda-de do contraditório antes de acolher o pedido incidental de desconsidera-ção da personalidade jurídica, há de se esclarecer que, quando tal pedido se dá na petição inicial, cabe ao réu impugnar na sua contestação não só o pedido de superação da personalidade do ente coletivo, como também todos os demais:

Enunciado nº 248 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: Quando a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, incumbe ao sócio ou à pessoa jurídica, na contestação, impugnar não so-mente a própria desconsideração, mas também os demais pontos da causa.

Em seu art. 136, o NCPC categorizou a decisão que resolve o inci-dente de desconsideração da personalidade como interlocutória, passível, portanto, de questionamento mediante a interposição de agravo de instru-mento (art. 1.015, IV79, do NCPC), agravo interno (caso o incidente tenha sido ajuizado e decidido na segunda instância) ou agravo de petição (no caso do processo do trabalho80):

Art. 136. Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória.

Parágrafo único. Se a decisão for proferida pelo relator, cabe agravo in-terno.

Coerente a decisão do legislador em classificar a decisão que resolve o incidente de desconsideração de personalidade jurídica como interlocu-tória, uma vez que, nos termos do § 1º do art. 20381 do NCPC, considera-se sentença “o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, bem como extingue a execução”. Como a decisão que resolve o incidente não

79 “Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: [...] IV – in-cidente de desconsideração da personalidade jurídica; [...]”

80 Enunciado nº 126 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “No processo do trabalho, da decisão que resolve o incidente de desconsideração da personalidade jurídica na fase de execução cabe agravo de petição, dispensado o preparo”.

81 “Art. 203. Os pronunciamentos do juiz consistirão em sentenças, decisões interlocutórias e despachos.”

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encerra a fase cognitiva ou executiva do processo (já que o incidente é um processo assessório), enquadra-se como decisão interlocutória nos termos § 2º82 do art. 203 do NCPC. O art. 136 deve ser interpretado em conjunto com o art. 1.015, IV, do NCPC (que prevê a possibilidade de a decisão que resolve o incidente ser questionada por meio de agravo de instrumento), já que, a princípio, as decisões interlocutórias são irrecorríveis:

A decisão de mérito proferida no incidente (assim entendida a decisão que resolve o mérito próprio do incidente, isto é, que acolhe ou rejeita a pre-tensão de desconsideração da personalidade jurídica) é apta a alcançar a autoridade de coisa julgada material, tornando-se imutável e indiscutível. Após seu trânsito em julgado, só será possível desconstituí-la por meio de ação rescisória, nos casos previstos no art. 966 do CPC. O pronunciamen-to judicial que resolve o incidente tem natureza de decisão interlocutória, já que não põe termo ao processo ou a qualquer de suas fases (cognitiva ou executiva). Assim, não sendo este provimento judicial capaz de enqua-drar-se no disposto no art. 203, § 1º, deve ser ele classificado como de-cisão interlocutória, nos precisos termos do § 2º desse mesmo art. 203. E sendo este ato uma decisão interlocutória, o recurso admissível só pode ser o agravo de instrumento. Vale ressaltar, porém, a importância de a lei expressamente afirmar o cabimento do agravo de instrumento, já que pelo sistema recursal inaugurado pelo Código de Processo Civil só são agravá-veis as decisões interlocutórias expressamente indicadas por lei (art. 1.015). Pois o cabimento de agravo de instrumento contra a decisão que resol-ve o incidente de desconsideração da personalidade jurídica vem ex-pressamente afirmado no art. 1.015, IV. É agravável não só a decisão de meritis proferida no incidente, mas também a que o declara inadmissível (liminarmente ou após a manifestação do requerido). Eventuais outras de-cisões interlocutórias proferidas no curso do incidente, porém (como seria o caso de alguma decisão que indeferisse a produção de certa pro-va), serão irrecorríveis, só podendo ser impugnadas juntamente com a de-cisão final do incidente (aplicando-se, por analogia, o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 1.009 do CPC). (CÂMARA, Alexandre Freitas. In: WAMBIER, Teresa Arruda et al. (Coord.). Breves comentários do Código de Proces-so Civil (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 527/528)

Decidirá o juiz por decisão que a lei qualifica de interlocutória e considera recorrível por agravo de instrumento (art. 1.015, IV). No entanto, trata-se de decisão que resolve o mérito do incidente: a desconsideração. Portanto, é

82 “Art. 203. [...] § 2º Decisão interlocutória é todo pronunciamento judicial de natureza decisória que não se enquadre no § 1º.”

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equiparável a uma sentença, tendo, pois, o condão de transitar em julga-do. Trata-se, também, de pronunciamento rescindível. Está-se, aqui, dian-te de mais uma exceção criada pelo NCPC, quanto à regra geral sobre a irrecorribilidade das interlocutórias. É que, na verdade, esta interlocutória é a “sentença” do incidente. Tanto é assim que as demais interlocutórias proferidas no curso deste incidente não são objeto de recurso autônomo: serão impugnadas, se for o caso, no agravo de instrumento interponível da decisão “final” (de mérito) do incidente. Por coerência, criou a nova lei ou-tra possibilidade de recurso: a decisão sobre a desconsideração proferida pelo relator, caso o incidente seja instaurado em 2º grau. O relator admi-tirá, conduzirá e julgará o incidente como se fosse o juiz de 1º grau. Só é recorrível, indubitavelmente, a decisão final, porque é necessário haver simetria entre os dois procedimentos: o de 1º e o de 2º grau. Só poderá haver pedido de desconsideração no Tribunal se o processo já estiver no Tribunal, em razão de já ter sido interposta apelação. O agravo de instru-mento que pode ter sido antes interposto da decisão que resolveu o pedi-do de desconsideração, segundo pensamos, não tem o condão de “trans-ferir o feito” para a segunda instância. Da decisão do relator, como diz o parágrafo único, caberá agravo interno. (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Primeiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 254/255)

Encerrando o tratamento acerca dos procedimentos processuais para desconsiderar a personalidade jurídica, o NCPC prevê, em seu art. 137, efei-tos materiais decorrentes do acolhimento do pedido, no caso a equiparar as alienações de bens havidas durante a desconsideração da personalidade ju-rídica à fraude à execução83-84: “Art. 137. Acolhido o pedido de desconside-ração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente”.

Só se promove a desconsideração da personalidade jurídica quando se pretende alcançar o patrimônio de alguém (pessoa física ou jurídica, no caso da desconsideração inversa) que a princípio, pelo princípio da auto-

83 “A alienação de bens realizada em fraude à execução é considerada ineficaz, em relação àquele que pediu a desconsideração.” (MEDINA, José Miguel. Novo Código de Processo Civil comentado: com remissões e notas comparativas ao CPC/1973. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 228)

84 “Embora, em regra geral, a fraude à execução só se caracterize quando o devedor aliena bens na pendência da demanda, porque na desconsideração de personalidade jurídica bens de terceiros (sócios ou sociedade) são atingidos, responsabilizando-os pela dívida do devedor original, a fraude de execução também pode atingir esses terceiros.” (MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz; MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 209)

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nomia patrimonial entre a empresa e seus sócios, não seria alcançado na relação processual original. Em tal cenário, o art. 137 torna ineficazes as alienações e onerações de bens que ocorrerem em fraude à execução, uma vez que, do contrário, correr-se-ia o risco de ser inócua a desconsideração da personalidade jurídica:

O principal efeito da decisão que desconsidera a personalidade jurídica da sociedade, para atingir o patrimônio dos sócios (ou o contrário, no caso da teoria da desconsideração inversa que desconsidera a personalidade da pessoa física, para atingir a sociedade), é o de tornar possível que atos da execução atinjam o patrimônio dos sócios (ou, no caso da teoria da des-consideração inversa, da empresa), estendendo a responsabilidade patrimo-nial a um terceiro, que passa a ser réu. A alienação dos bens realizada por aqueles (ou aquela) a quem a responsabilidade for estendida por causa da decisão que desconsiderou a personalidade jurídica será tida como inefi-caz (ou seja, serão desconsiderados seus efeitos) em relação ao requerente, se ocorrida em fraude à execução, i.e., se preenchidos os pressupostos do art. 593 do CPC/1973. Assim como será ineficaz alienação de um réu qual-quer, em relação ao autor, se realizada em fraude à execução. A lei men-ciona requerente, mas quer referir-se àquele em favor de quem for decre-tada a desconsideração, uma vez que, como já vimos, a desconsideração pode ser requerida pelo Ministério Público – e, neste caso, o Ministério Pú-blico será o requerente! Por fim, a decisão que declara a desconsideração, por ser declaratória, retroage pelo menos à data do requerimento. Deve-se ter em mente a necessidade de se verificar, pela análise dos elementos pro-duzidos pela instrução, em que momento ocorreu o fato gerador da descon-sideração (o ato praticado com excesso de poder, a confusão patrimonial etc.). (WAMBIER, Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva; MELLO, Rogerio Licastro Torres de. Pri-meiros comentários ao novo Código de Processo Civil: artigo por artigo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 255/256)

Este dispositivo remete-nos aos preceitos contidos no art. 792 do NCPC, que prevê as hipóteses caracterizadoras da fraude à execução. Se, acolhido o pedido de desconsideração, algumas daquelas hipóteses ocorrerem após a instauração do incidente, a respectiva alienação ou oneração de bens da pessoa jurídica ou do sócio não gerará efeitos perante o que requereu a desconsideração. Assim, por exemplo, se o credor propuser demanda para cobrar uma dívida e, ao mesmo tempo, requerer e for concedida a descon-sideração da pessoa jurídica da qual o devedor é sócio, serão considerados nulos todos os atos realizados por este, na pendência do processo, que vi-sem ao desfazimento de seus bens. A norma prevê efeito retroativo (ou ex tunc), impossibilitando que os direitos do requerente (credor) sejam atingi-dos pelos atos cometidos em fraude à execução. Quanto ao terceiro adqui-rente de boa-fé, nada impede que pleiteie, em ação de regresso contra o só-

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cio, o ressarcimento dos valores pagos para aquisição do bem. Nesse caso, o terceiro adquirente ainda poderá requerer a desconsideração inversa da personalidade jurídica, a fim de atingir o patrimônio da sociedade caso se torne insolvente o sócio fraudador. (DONIZETTI, Elpídio. Novo Código de Processo Civil comentado (Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015): análise comparativa entre o novo CPC e o CPC/73. São Paulo: Atlas, 2015. p. 117)

O art. 137 do NCPC deverá ser interpretado levando em considera-ção o art. 792, § 3º85, do mesmo diploma, já que há claramente dúvidas na doutrina86-87 acerca de qual interpretação harmonizará as regras contidas nos dois dispositivos. Debate-se a partir de que momento se considera ocorrida a fraude à execução: se quando a alienação ou oneração de bens se der após o acolhimento do pedido de desconsideração da personalidade jurídica ou se quando a alienação ou oneração de bens se der a partir da citação88 da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar. Neste cenário, nos parecem acertadas as lições de Nelson Nery Junior e Guilherme Rizzo Amaral:

A intenção do dispositivo é punir a conduta do sócio ou administrador que aliena bens no curso do incidente de desconsideração. Todavia, parece mais correto considerar que a ineficácia da alienação ou oneração de bens ocorrida nessa situação incida apenas caso ocorram após a citação do só-cio ou administrador para responder aos termos do incidente, ou após al-gum fato que dê a entender que tais pessoas tinham ciência da instauração. (NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Comentários ao

85 “Art. 792. A alienação ou a oneração de bem é considerada fraude à execução: [...] § 3º Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica-se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar.”

86 “O art. 137 do Novo CPC prevê que, sendo acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente. Como se pode notar do dispositivo legal, somente após o acolhimento do pedido de desconsideração haverá fraude à execução, em previsão que contraria o disposto no art. 792, § 3º, do Novo CPC, que estabelece haver fraude à execução nos casos de desconsideração da personalidade jurídica a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar.” (NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2015. p. 149)

87 “O art. 137 quer evidenciar que a alienação de bens nas condições que especifica é considerada fraude à execução e, como tal, ineficaz em relação àquele que pediu a instauração do incidente. O inciso VII do art. 790 preceitua que fica sujeito à execução os bens do responsável, nos casos de desconsideração da personalidade jurídica. Cabe destacar que a instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor (art. 134, § 1º), o que dará ensejo, certamente, a interessantes questões sobre o instante em que cessa a boa-fé de eventual terceiro adquirente, máxime diante do § 3º do art. 792, segundo o qual a fraude à execução considera-se ‘a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconsiderar’. O sócio (ou a sociedade) que teve bem seu penhorado independentemente da instauração do incidente aqui anotado tem legitimidade para opor embargos de terceiro, como expressamente prevê o inciso III do § 2º do art. 674.” (BUENO, Cassio Scarpinella. Novo Código de Processo Civil anotado. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 134)

88 Enunciado nº 52 da Enfam – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados: “A citação a que se refere o art. 792, § 3º, do CPC/2015 (fraude à execução) é a do executado originário, e não aquela prevista para o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 135 do CPC/2015)”.

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Código de Processo Civil (livro eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribu-nais, 2015. p. 1203)

O art. 137 deve ser interpretado à luz do art. 792 do CPC, que prevê as hipóteses de fraude à execução e que estatui, em seu § 3º, que, “nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica--se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconside-rar”. Assim, o simples fato de se desconsiderar a personalidade jurídica não gera presunção de que os bens alienados pela pessoa jurídica ou pelo sócio (na desconsideração inversa) o tenham sido em fraude, sendo necessário o reconhecimento de uma das hipóteses do art. 792. Além disso, a aliena-ção havida antes da citação do sócio ou da pessoa jurídica no incidente de desconsideração ou na ação principal (art. 134, § 2º) não será conside-rada fraude à execução, podendo, contudo, ser configurada como fraude a credores e vir a ser objeto da competente ação pauliana (CC, art. 161). (AMARAL, Guilherme Rizzo. Comentários às alterações do novo CPC (livro eletrônico). 1. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015. p. 369)

Ainda sobre o momento em que se configura a fraude à execução na desconsideração da personalidade jurídica, veja-se a lição de André Pagani de Souza:

Questão de difícil solução será estabelecer o momento a partir do qual a alienação ou oneração de um bem particular do sócio ou do administrador – ou da própria pessoa jurídica, no caso de desconsideração inversa – pode ser considerada fraude de execução em relação ao requerente da desconsi-deração da personalidade jurídica. Como se sabe, a fraude de execução in-depende de ação própria para seu reconhecimento, sendo permitido ao juiz que a reconheça incidentalmente no processo. Dentre as hipóteses mais co-muns de fraude de execução, há a do inciso IV do art. 792 do CPC/2015, que repete a norma do art. 593, II, do CPC/1973, ou seja, a de se considerar a alienação ou oneração de bens fraudulenta quando “ao tempo da alie-nação ou oneração, tramitava contra o devedor ação capaz de reduzi-lo à insolvência”. Se assim é, a questão a ser respondida será indicar qual o mo-mento a partir do qual se deve considerar que contra o devedor tramitava ação capaz de reduzi-lo à insolvência: (i) o momento que houve a citação válida da pessoa jurídica no processo em que posteriormente foi instaura-do o incidente de desconsideração da personalidade jurídica ou (ii) o mo-mento em que o sócio ou administrador foi citado nos termos do art. 135 do CPC/2015 para se manifestar sobre o requerimento de desconsideração. Sob pena de se instaurar grave insegurança jurídica para todos os adquiren-tes de boa-fé, a solução mais adequada para o problema que se apresenta seria considerar fraude de execução a alienação ou oneração de bens por

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parte do sócio ou administrador da pessoa jurídica somente após eles terem sido validamente citados para se manifestarem no incidente de desconsi-deração da personalidade jurídica (CPC/2015, art. 135), pois, nesse caso, o distribuidor já teria sido informado da instauração do incidente e reali-zado as anotações cabíveis (CPC/2015, art. 134, § 1º), tornando possível ao adquirente tomar conhecimento da existência de “ação capaz de reduzi--lo à insolvência” (CPC/2015, art. 792, IV). Solução diversa da ora sugeri-da prejudicaria o adquirente de boa-fé que comprou um bem do sócio ou administrador da pessoa jurídica, fez todas as pesquisas no distribuidor em nome dessas pessoas e não encontrou qualquer demanda capaz de reduzi--los à insolvência. Nem se diga que seria possível ao adquirente consultar algum órgão para saber se o alienante de determinado bem é sócio ou ad-ministrador de pessoas jurídicas, pois teria que se fazer uma consulta em todas as juntas comerciais de todos os Estados da nação, depois em todos os cartórios de registro civil das pessoas jurídicas de todas as comarcas do país, além de verificar nos órgãos de classe, como a Ordem dos Advoga-dos do Brasil, que também são responsáveis pelo registro de pessoas jurídi-cas em todo o território nacional para saber se o alienante integra alguma pessoa jurídica em vias de se tornar insolvente. Entretanto, parece que o CPC/2015 adotou esta última solução anteriormente indicada como parâ-metro para estabelecer o momento a partir do qual determinada alienação ou oneração de bem por parte do sócio deve ser considerada fraude de exe-cução. Isso porque a redação do § 3º do art. 792 é a seguinte: “Nos casos de desconsideração da personalidade jurídica, a fraude à execução verifica--se a partir da citação da parte cuja personalidade se pretende desconside-rar” (grifos nossos). Assim, pela interpretação literal, se o sócio ou o admi-nistrador de determinada pessoa jurídica alienarem ou onerarem um bem particular deles, no curso de um processo movido exclusivamente contra a pessoa jurídica, pode haver risco de tal alienação ou oneração serem con-sideradas fraude de execução caso no futuro seja formulado um pedido de desconsideração da personalidade jurídica e ele seja acolhido (CPC/2015, art. 137). Esta interpretação literal do art. 792, § 3º, do CPC/2015, ao que tudo indica, prejudica os terceiros de boa-fé que não têm como verificar se aquele que aliena ou onera um bem é ou não é sócio ou administrador de uma pessoa jurídica, à míngua de um cadastro unificado das pessoas jurídicas em território nacional. Uma solução interpretativa para o § 3º do art. 792 do CPC/2015 é considerar que tal dispositivo se refere à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica (CPC/2015, art. 133, § 2º). Nesse caso, a “citação da parte cuja personalidade se pretende des-considerar” acontece após a instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica e a comunicação ao distribuidor para as anota-

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ções devidas (CPC/2015, art. 134, § 1º). Assim, o adquirente de um bem da pessoa jurídica não pode alegar desconhecimento de que havia uma de-manda capaz de reduzi-la a insolvência (CPC/2015, art. 792, IV). Caso con-trário, é inútil a determinação constante no § 1º do art. 134 do CPC/2015 para que o distribuidor realize as anotações devidas após a instauração do incidente, se for considerada fraude de execução a alienação ou oneração de bens por parte de alguém que nem sequer constava dos registros do dis-tribuidor na época em que tal alienação ou oneração fora praticada. Nesse caso, seria melhor então que se determinasse a todos os cartórios distribui-dores que mantivessem um registro de todos os sócios e administradores de todas as pessoas jurídicas que figurassem como parte nos processos sob os seus cuidados. Assim, mediante uma pesquisa no distribuidor, seria possível saber todas as pessoas jurídicas, todos os sócios e todos os administradores que podem ser atingidos por uma decisão de desconsideração da personali-dade jurídica, mesmo que não tenham sido ainda instaurados os incidentes de desconsideração. Portanto, para proteger terceiros de boa-fé e garantir a segurança jurídica, o mais adequado seria considerar que a ineficácia da alienação do bem somente deve ser reconhecida se ela for realizada a par-tir da citação do sócio, administrador ou pessoa jurídica para manifestar-se no incidente. (SOUZA, André Pagani de. Código de Processo Civil anotado. Sob a coordenação de José Rogério Cruz e Tucci, Manoel Caetano Ferreira Filho, Ricardo de Carvalho Aprigliano, Sandro Gilbert Martins, Rogéria Fagundes Dotti. Curitiba: AASP, OAB/PR, 2015. p. 236/237)

Por fim, a citação referida no art. 792, § 3º, do NCPC é a que ocorre no processo originário, e não a que ocorre para apresentação de manifesta-ção no incidente de desconsideração de personalidade jurídica89.

4 CONSIDERAÇÕES DE ORDEM PRÁTICA

Os arts. 133 a 137 do NCPC se detiveram mais em regulamentar o pedido de desconsideração da personalidade jurídica formulado de forma incidental, tratando de forma residual ou reflexa quando ele é formulado entre os demais pedidos da petição inicial.

Para não descaracterizar o tratamento processual conferido pelo le-gislador ao instituto da desconsideração da personalidade jurídica, será necessário adaptar o procedimento da desconsideração intentada junto à petição inicial ao procedimento da desconsideração incidental.

89 Enunciado nº 52 da Enfam – Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados: “A citação a que se refere o art. 792, § 3º, do CPC/2015 (fraude à execução) é a do executado originário, e não aquela prevista para o incidente de desconsideração da personalidade jurídica (art. 135 do CPC/2015)”.

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Por exemplo, a decisão que resolve o incidente de desconsideração de personalidade jurídica é passível de reforma pelo tribunal ante a inter-posição de agravo de instrumento (art. 1.015, IV, do NCPC), ao passo que, via de regra, o pedido de desconsideração formulado na petição inicial será julgado na sentença e será passível de discussão por meio de apelação (art. 1.00990 do NCPC). Pois bem, mantendo-se o espírito do microssistema da desconsideração da personalidade jurídica constante dos arts. 133 a 137 do NCPC, nada impede que, em alguns casos, o pedido de desconsidera-ção formulado na petição inicial enseje a prolação de decisões passíveis de questionamento por meio de agravo de instrumento.

Ora, nos casos em que o pedido de desconsideração formulado na petição inicial se fundamente em elementos enquadráveis nas tutelas pro-visórias previstas no art. 29491 do NCPC, o deferimento ou indeferimento de tal pedido ensejará a possibilidade de manejo de agravo de instrumento (art. 1.015, I92, do NCPC).

Ainda em observância ao espírito que inspira o microssistema da des-consideração da personalidade jurídica constante dos arts. 133 a 137 do NCPC, há de se atentar para o fato de que, mesmo quando o pedido de desconsideração formulado na petição inicial seja enquadrável como uma hipótese de tutela provisória, não se autoriza a concessão de tal pleito em sede inaudita altera pars, já que a obrigatoriedade de realização do con-traditório, antes de quaisquer atos que promovam o afastamento da perso-nalidade do ente coletivo, é uma das marcas mais acentuadas deste novo tratamento processual dado aos procedimentos para desconsiderar a perso-nalidade jurídica.

CONCLUSÃO

Instrumento valiosíssimo para coibir condutas abusivas que deturpam o objetivo e a utilidade social das empresas, a desconsideração da persona-lidade jurídica, em face do seu caráter excepcional, não pode ser utilizada indiscriminadamente, sob pena de tornar inócua a garantia da separação patrimonial e transformar aquilo que deveria ser exceção em regra.

Alguns abusos praticados na aplicação da desconsideração da perso-nalidade jurídica geravam uma grande incerteza jurídica nas partes que se

90 “Art. 1.009. Da sentença cabe apelação.”91 “Art. 294. A tutela provisória pode fundamentar-se em urgência ou evidência. Parágrafo único. A tutela

provisória de urgência, cautelar ou antecipada, pode ser concedida em caráter antecedente ou incidental.”92 “Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: I – tutelas

provisórias; [...]”

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viam arrastadas para um processo que poderia redundar na constrição dos seus bens. Incerteza essa que, com a entrada em vigor do NCPC, espera-se tenha fim.

Ao estabelecer um procedimento com contraditório, ampla defesa e acesso a um duplo grau de jurisdição, o NCPC torna a desconsideração da personalidade jurídica racional, sem desnaturar o instituto ou enfra- que cê-lo.

Ainda sujeitos a diversas interpretações (e eventuais críticas), os arts. 133 a 137 do Novo Código de Processo Civil inequivocamente consti-tuem um grande avanço, permitindo que a desconsideração da personalida-de jurídica seja aplicada em estrita observância a garantias constitucionais que se manifestam no ambiente processual.

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Assunto Especial – Doutrina

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

Noções Elementares sobre Recursos no Novo CPC e Suas Principais Alterações

ERIC CESAR MARQUES FERRAz1

Advogado, Pós-Graduado.

RESUMO: O presente artigo tem como objetivo analisar sucintamente algumas noções elementares sobre os recursos, que são os meios de impugnação das decisões judiciais quando há inconformis-mo da parte sucumbente com base em consagrada doutrina e sob a luz dos arts. 994 a 1.008 do novo CPC; a seguir, traçamos singelas linhas sobre as diversas espécies de recursos voltando nossa atenção sobre o diploma processual civil (Lei nº 13.105/2015), que trata do tema no Livro III – Dos Processos nos Tribunais e dos Meios de Impugnação das Decisões Judiciais, Título II – Dos Recursos, dos arts. 1009 a 1.044; por fim, fazemos uma breve análise sobre recursos com o advento do CPC de 2015 e suas principais alterações.

PALAVRAS-CHAVE: Noções elementares sobre recursos; meios de impugnação das decisões judi-ciais; recursos em espécie; novo CPC; principais alterações.

ABSTRATCT: This article aims to briefly review some basic notions about the features that are the means to challenge judicial decisions when there is dissatisfaction on the part sucumbente based on consecrated doctrine and in the light of arts. 994-1008 the new CPC, then we draw simple lines on the various kinds of resources turning our attention to the civil procedural law (Law 13,105/15) which deals with the theme in the Book III – Proceedings in the Courts and the Disputes Means of Judicial decisions, Title II – Resources, arts. 1009-1044 finally make a brief analysis of resources with the advent of CPC 2015 and its main changes.

KEYWORDS: Elementary notions of resources; disputes means of judgments; in-kind resources; new CPC; major changes.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Desenvolvimento: noções elementares sobre recursos; 2 Recursos em espécie; 3 Breve análise sobre recursos com o advento do novo CPC (Lei nº 13.105/2015) e suas principais alterações; Síntese conclusiva; Referências.

INTRODUÇÃOFoi adotada, no presente trabalho, a linha de pesquisa científica ba-

seada na interpretação literal, teleológica, sistemática e histórica através do método de raciocínio lógico-indutivo, integrativo e criativo com vistas a

1 E-mail: [email protected].

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contribuir modestamente com um tributo mínimo para o enriquecimento do inestimável conhecimento cultural humano.

A presente pesquisa teve como substrato a consulta, leitura e análise de livros, enciclopédias, da legislação constitucional e infraconstitucional pertinentes ao tema, bem como da doutrina cientifica e artigos especializa-dos citados na bibliografia.

O presente artigo tem como objetivo analisar sucintamente algumas noções elementares sobre a teoria geral dos recursos, como conceituação, principais características, pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissi-bilidade recursal, juízo de admissibilidade e de mérito e efeitos dos recur-sos. Os recursos são os meios de impugnação das decisões judiciais quando há inconformismo da parte sucumbente com base em consagrada doutrina e sob a luz dos arts. 994 a 1.008 do novo CPC. Em seguida, traçamos sin-gelas linhas sobre as diversas espécies de recursos voltando nossa atenção sobre o referido diploma processual (Lei nº 13.105/2015), analisamos as principais alterações trazidas pelo novo Código como unificação do prazo recursal de 15 (quinze) dias, com exceção dos embargos, redução da quan-tidade de recursos, entre outras, alinhando-se o novo Código com as mais modernas tendências do processo civil na busca de uma tutela jurisdicional justa, eficaz e mais célere. Por fim, no último tópico do desenvolvimento do presente artigo, fazemos uma breve análise sobre recursos com o advento do Novo CPC e suas principais alterações, que, diga-se de passagem, são de tamanha magnitude que acreditamos levará algum tempo para serem absorvidas e implementadas pelos profissionais do mundo jurídico. Mas a mudança já reluz no horizonte, e temos certeza de que ela é muito mais positiva do que negativa, se o Código for operado por pessoas capacitadas que tenham consciência do cenário processual moderno no qual ocorre tamanha mudança. O certo é que todos estamos aflitos, ansios, temerosos, inseguros etc. Mas esta não será a primeira, nem a última vez que este País terá um novo Código de Processo Civil; se absorvermos os anteriores, com certeza absorveremos este também para o bem da evolução científica do processo civil na busca de uma tutela jurisdicional justa, eficaz e em tempo razoável.

1 DESENVOLVIMENTO: NOÇÕES ELEMENTARES SOBRE RECURSOS

Iniciamos o singelo artigo emprestando-nos da conceituação de re-curso de renomados doutrinadores, para depois traçar a nossa própria, como sendo:

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Define Barbosa Moreira recurso como remédio voluntário e idôneo a ense-jar, dentro do mesmo processo, a reforma, a invalidação ou a integração de decisão judicial que se impugna.

Tal conceito atende às peculiaridades do instituto para o direito processual civil brasileiro, podendo ter maior ou menor extensão segundo a política legislativa adotada em cada país.

Analisando ainda o conceito, temos que recurso é um remédio. Remédio que, segundo Carnelutti, é um instrumento, portanto, de correção, em sen-tido amplo.2

Segundo o saudoso e consagrado Professor Moacyr Amaral dos Santos3, em obra atualizada pela Professora Maria Beatriz Amaral Santos Kohnen:

Recurso é, pois, o poder de provocar o reexame de uma decisão pela mes-ma autoridade judiciária ou por outra hierarquicamente superior, visando obter a sua reforma ou modificação.

Ainda nas palavras dos Professores Dinamarco, Grinover e Cintra4:

A fim de que eventuais erros dos juízes possam ser corrigidos e também para atender à natural inconformidade da parte vencida diante de julga-mentos desaforáveis, os ordenamentos jurídicos modernos consagram o princípio do duplo grau de jurisdição: o vencido tem, dentro de certos li-mites, a possibilidade de obter uma nova manifestação do Poder Judiciário. Para que isso ocorra, é preciso que existam órgãos superiores e órgãos infe-riores a exercer a jurisdição.

Fala-se, então, na terminologia brasileira, em juízos (órgãos de primeiro grau) e tribunais (órgãos de segundo grau). Quer as justiças dos Estados, quer as organizadas e mantidas pela União, todas elas têm órgãos superio-res ou inferiores. Acima de todos eles e sobrepairando a todas as justiças, estão o Supremo Tribunal Federal (cúpula do Poder Judiciário) e o Superior Tribunal de Justiça; a função de ambos é, entre outras, a de julgar recursos provenientes das Justiças que compõem o Poder Judiciário nacional.

2 Cf. GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2000. p. 263.3 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 27. ed. São Paulo: Saraiva, v. 3, 2011.

p. 104. 4 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do

processo. 28. ed. São Paulo: Malheiros, 2012.

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Sendo assim, acreditamos que recurso é o meio processual disposi-tivo5 adequado, desde que observados os pressupostos de admissibilidade para julgamento, para devolver a análise da matéria de mérito ao órgão competente, quando ocorrer o inconformismo em razão da sucumbência da parte ou prejuízo de terceiro ou pelo MP enquanto fiscal da lei, devolução esta que ocorre com a finalidade de obter-se a reforma, integração ou nu-lidade da decisão – definição que mais se aproxima com a dos renomados Professores Teresa Arruda Alvin Wambier6 e José Miguel Garcia Medina.

O juízo de admissibilidade, com base nas lições do Professor José Carlos Barbosa Moreira, que os classifica em dois grupos: os pressupostos intrínsecos de admissibilidade, que, por sua vez, se subdividem em: cabi-mento, legitimação para recorrer, interesse em recorrer e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do direito de recorrer. Já com relação aos pres-supostos extrínsecos, que são tempestividade, regularidade formal e prepa-ro. Enfim, em outras palavras, o juízo de admissibilidade se dá quando o órgão recursal verifica a aptidão formal do recurso e importa em conheci-mento ou inadmissão dele.

Com relação ao preparo7, que é o adiantamento das despesas, in-cluindo taxas e porte de remessa e retorno, deve este ser comprovado com a interposição do recurso. A ausência de preparo8 importa em deserção, in-dependentemente de intimação da parte para efetuá-lo. Quando o preparo for insuficiente, só haverá deserção se o recorrente intimado não efetuar o preparo no prazo de 5 (cinco) dias.

Já com relação ao mérito recursal, entendemos ser ele o próprio pedi-do de reforma, integração ou declaração de nulidade legalmente embasado. Dá-se quando o órgão recursal aprecia a irresignação propriamente dita; importa em provimento ou desprovimento do recurso.

5 Uma das características dos recursos é sua voluntariedade. Corrobora-se ainda essa voluntariedade quando tratamos da desistência e renúncia dos recursos. Com relação à desistência do recurso já interposto, a qual é causa de revogação dele e não depende de anuência da outra parte, e pode ser requerida até o julgamento do mesmo. Já com relação à renúncia, esta é sempre anterior à interposição do recurso e trata-se de fato extintivo do direito de recorrer. Também não depende de concordância da outra parte.

6 “Os meios de impugnação às decisões judiciais previstos em lei, que podem ser manejados pelas partes, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público, com o intuito de viabilizar, dentro da mesma relação jurídico-processual, a anulação, a reforma, a integração ou o aclaramento da decisão judicial impugnada.” (Cf. MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e ações autônomas de impugnação. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 36)

7 Nos Juizados Especiais, o recorrente comprovará o preparo, independentemente de intimação, nas 48 (quarenta e oito horas) seguintes à interposição dos recursos.

8 “Admite-se que o preparo seja efetuado no primeiro dia útil subsequente, quando a interposição do recurso ocorrer após o encerramento do expediente bancário.” (Súmula nº 484 do STJ)

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Por meio do recurso, a parte apresenta o seu inconformismo, sub-metendo as questões impugnadas ao órgão ad quem, evitando a formação de coisa julgada e a preclusão da matéria, que ainda está sub judice. A expressão tantum devolutum quantum appellatum refere-se à restrição do conhecimento pelo tribunal da matéria efetivamente impugnada pelo recor-rente nos limites do pedido da parte. O efeito devolutivo, segundo o qual o tribunal está impedido de conhecer de matéria que não foi submetida a pe-dido do recorrente, decorre do princípio dispositivo; em suma, o princípio devolutivo transfere ao órgão ad quem a matéria impugnada. Outro efeito que podemos atribuir ao recurso é o obstativo, visto que a interposição do recurso, por si só, impede o trânsito em julgado da decisão. Alguns autores falam ainda do efeito regressivo do recurso que autoriza o Magistrado a rever a decisão recorrida típico do recurso de agravo. Outro efeito tam-bém encontrado em doutrina é o expansivo objetivo, do qual um recurso interposto por um litisconsorte a todos aproveita, no caso de litisconsórcio unitário (cf. art. 1.005 do novo CPC).

Com relação ao efeito suspensivo, que é o qual impede a produção imediata de efeito da decisão recorrida, podemos observá-lo previsto no art. 955 do novo CPC abaixo transcrito:

Art. 995. Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso.

Parágrafo único. A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a pro-babilidade de provimento do recurso.

Com relação ao efeito translativo, como nos ensinam os renomados Professores Teresa Arruda Alvim Wambier9 e José Miguel Garcia Medina:

A possibilidade de o órgão ad quem examinar de ofício as questões de or-dem pública não é decorrência do efeito devolutivo dos recursos em senti-do estrito, nem da atuação do princípio dispositivo, mas do efeito transla-tivo: o poder dado pela lei ao juiz para, na instância recursal, examinar de ofício as questões de ordem pública não arguidas pelas partes não se insere no conceito de efeito devolutivo em sentido estrito, já que isso se dá pela atuação do princípio inquisitório e não pela sua antítese, que é o princí-pio dispositivo, de que é corolário o efeito devolutivo dos recursos. Mesmo porque o feito devolutivo pressupõe ato comissivo de interposição do recur-

9 Cf. MEDINA, José Miguel Garcia; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Recursos e ações autônomas de impug-nação. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 151 e 152.

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so, não podendo ser caracterizado quando há omissão da parte ou interes-sado sobre determinada questão não referida nas razões ou contrarrazões do recurso. Esta é a razão pela qual é perfeitamente lícito ao tribunal, por exemplo, extinguir o processo sem julgamento de mérito interposta apenas pelo autor, não ocorrendo aqui a reformatio in pejus proibida: há, em certa medida, reforma para pior, mas permitida pela lei, pois o exame das condi-ções da ação é matéria de ordem pública a respeito da qual o tribunal deve pronunciar-se ex officio, independentemente de pedido ou requerimento da parte ou interessado (art. 267, VI, e § 3º do CPC). Dizemos em certa medida porque, na verdade, nem se poderia falar da reformatio in pejus, instituto que somente se coaduna com o princípio dispositivo, que nada tem a ver com as questões de ordem pública transferidas ao exame do tribunal desti-natário por força do efeito translativo do recurso.

Acreditamos que essas lições devem ser agora temperadas de acordo com observação do art. 10 do novo CPC, que prescreve: “O juiz não pode de decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respei-to do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício”, em aparente contraposição art. 485, § 3º: “O juiz conhecerá de ofício da matéria cons-tante dos incisos IV, V, VI e IX em qualquer tempo e grau de jurisdição, en-quanto não ocorrer o trânsito em julgado”, haja vista que o efeito translativo continua existindo, apesar de não previsto explicitamente, devendo o órgão competente, ao invocá-lo, dar às partes oportunidade de se manifestar pres-tigiando o contraditório e a ampla defesa, numa interpretação sistemática e teleológica do novo Código, visto que o art. 10 está previsto no Capítulo das Normas Fundamentais do Processo Civil, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

Vejamos agora as palavras do experiente Professor Vicente Greco Filho10 sobre o tema recursos ainda sob a égide do Código de 1973:

Todos sabemos que nosso sistema recursal é um dos mais complexos do mundo. Disse-me certa ocasião um Ministro do Supremo Tribunal Federal que julgara um recurso cujo nome tinha três linhas: tratava-se de algo como “embargos de declaração em agravo regimental de despacho de indeferi-mento de embargos de divergência em agravo de despacho denegatório de recurso extraordinário”.

O pior é que esse recurso existe.

10 Cf. GRECO FILHO, Vicente. Direito processual civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, v. 2, 2000. p. 340.

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As Ordenações Filipinas, segundo alguns autores, previam sete tipos de agravos. No sistema processual vigente, cheguei a contar oito, entre tipos e subtipos, mas talvez sejam nove ou dez.

Pode parecer que por essas observações signifique de nossa parte uma pro-posta de redução do número de recursos, mas não é. Somos, no caso, um tanto fatalistas: não adianta a lei eliminar recursos porque imediatamente serão substituídos por sucedâneos.

Seguindo as lições do saudoso e ilustre professor supracitado, bem como as experiências advindas por mais de três décadas de vigência do CPC de 1973, vem o novo Código de Processo Civil, Lei nº 13.105/2015, observando os princípios e novas tendências do processo civil moderno, no almejar de um processo justo e eficaz, conforme prelecionam os processua-listas modernos da escola italiana, entre eles Luigi Paolo Comoglio e Mauro Cappelletti, entre muitos outros, bem como mais célere também como já previsto em nossa CF, art. 5º, LXXVIII, concebido dentro de novos princípios que refletem positivamente sobre o tema abordado neste artigo.

Com o advento de referido diploma processual, podemos observar que ele, em seu art. 99411, prevê nove espécies de recursos com o escopo de promover a celeridade processual; apesar de o Código de 1973 prever oito espécies de recursos em seu art. 496, percebemos a pertinente observação acima transcrita, em especial com a enormidade gama de diversos tipos de agravos, sendo que, no novo CPC, foram reduzidos textualmente para três: agravo de instrumento, agravo interno e agravo em recurso especial ou ex-traordinário.

Mais uma vez, lembramos a crítica tão bem cabida do consagrado Professor Vicente Grego; apesar de ele se autodenominar um fatalista, temos esperança de que os sucedâneos recursais sejam vistos com olhos cautelo-sos pelo Poder Judiciário, sob pena de desvirtuar o espírito mais moderno e célere do novo Código previstos nos arts. 1º a 12 do novo CPC, enquanto pensamos que talvez uma boa forma de evitar sucedâneos procrastinatórios seja a aplicação, por parte do Judiciário, da multa prevista no art. 80 do novo CPC como forma severa de punição da má-fé processual. Assim es-peramos que nossa jurisprudência opere, para desestimular gradativamente a enxurrada de recursos em razão da nossa cultura demandista que entrará

11 “Art. 994. São cabíveis os seguintes recursos: I – apelação; II – agravo de instrumento; III – agravo interno; IV – embargos de declaração; V – recurso ordinário; VI – recurso especial; VII – recurso extraordinário; VIII – agravo em recurso especial ou extraordinário; IX – embargos de divergência.”

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em choque com a adoção do princípio colaborativo pelo novo diploma processual.

Com o escopo de evitar uma justiça morosa e burocrática, bem como de facilitar o trabalho dos procuradores e juízes, outra importante alteração do novo Código diz respeito à unificação dos prazos recursais em dez dias, conforme previsto no art. 1.00312, § 5º, que serão de 15 dias contados da data de intimação da decisão, com exceção dos embargos de declaração, que permanece o prazo de cinco dias, conforme o art. 1.053 do novo CPC.

Em atenção ao princípio da inércia da jurisdição (art. 2º do CPC/1973 e do de 2015) e ao conceito de recurso, infere-se que o princípio dispositi-vo (arts. 998 e 999 do novo CPC)13 aplica-se aos recursos. Todavia, faz se mister lembrar que o novo CPC traz muitas inovações sobre as normas fun-damentais do processo civil, em especial os arts. 1º, 6º e 8º, os quais ainda precisaram chocar-se com a realidade dos fatos, para vermos a tendência jurisprudencial e doutrinária acerca deste tema.

Por fim, para evitar maiores debates doutrinários e jurisprudenciais, o novo diploma processual diz que a decisão recursal substitui a decisão ora recorrida, conforme o art. 1.008: “O julgamento proferido pelo tribunal substituirá a decisão impugnada no que tiver sido objeto de recurso”.

Para um estudo mais aprofundado sobre a teoria geral dos recur-sos, remetemos o leitor às obras dos Professores Araken de Assis (Manual dos recursos. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008) e do Professor Nelson Nery Junior (Teoria geral dos recursos. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004).

12 “Art. 1.003. O prazo para interposição de recurso conta-se da data em que os advogados, a sociedade de advogados, a Advocacia Pública, a Defensoria Pública ou o Ministério Público são intimados da decisão. § 1º Os sujeitos previstos no caput considerar-se-ão intimados em audiência quando nesta for proferida a decisão. § 2º Aplica-se o disposto no art. 231, incisos I a VI, ao prazo de interposição de recurso pelo réu contra decisão proferida anteriormente à citação. § 3º No prazo para interposição de recurso, a petição será protocolada em cartório ou conforme as normas de organização judiciária, ressalvado o disposto em regra especial. § 4º Para aferição da tempestividade do recurso remetido pelo correio, será considerada como data de interposição a data de postagem. § 5º Excetuados os embargos de declaração, o prazo para interpor os recursos e para responder-lhes é de 15 (quinze) dias. § 6º O recorrente comprovará a ocorrência de feriado local no ato de interposição do recurso. Art. 1.004. Se, durante o prazo para a interposição do recurso, sobrevier o falecimento da parte ou de seu advogado ou ocorrer motivo de força maior que suspenda o curso do processo, será tal prazo restituído em proveito da parte, do herdeiro ou do sucessor, contra quem começará a correr novamente depois da intimação.”

13 “Art. 998. O recorrente poderá, a qualquer tempo, sem a anuência do recorrido ou dos litisconsortes, desistir do recurso. Parágrafo único. A desistência do recurso não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido reconhecida e daquela objeto de julgamento de recursos extraordinários ou especiais repetitivos. Art. 999. A renúncia ao direito de recorrer independe da aceitação da outra parte.”

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2 RECURSOS EM ESPÉCIE

Segundo o art. 994 do novo CPC, são nove14 as espécies de recurso: I – apelação; II – agravo de instrumento; III – agravo interno; IV – embargos de declaração; V – recurso ordinário; VI – recurso especial; VII – recurso extraordinário; VIII – agravo em recurso especial ou extraordinário; IX – em-bargos de divergência. Em apertada síntese, tentaremos escrever algumas linhas sobre as espécies de recursos.

Antes de tecer sucintas linhas sobre as espécies de recursos, é impor-tante observar que, conforme dispõe o art. 997, § 2º, se houver sucumbên-cia recíproca e um dos sucumbentes perder o prazo para interpor recurso de apelação, recurso especial ou extraordinário, poderá, no prazo de con-trarrazões destes, interpor recurso adesivo – não sendo este, portanto, uma espécie de recurso, e sim uma modalidade ou forma de interposição dos recursos já existentes. O recurso adesivo15 fica subordinado ao recurso inde-pendente (ou principal), sendo-lhe aplicáveis as mesmas regras deste quanto aos requisitos de admissibilidade e julgamento no tribunal – sendo que o recurso não é conhecido se houver desistência do recurso principal ou se for ele considerado inadmissível.

A apelação prevista nos arts. 1.009 a 1.114 é o recurso por excelên-cia. Ela é um recurso ordinário, de primeiro grau. O novo diploma prevê que cabe apelação da sentença; o novo Código não define explicitamente sentença, apenas enumerando, no art. 485, os casos em que o juiz não resolverá o mérito e, no art. 487, os casos em que o juiz resolverá o méri-to; nos arts. 489 e seguintes, os elementos e os efeitos da sentença. Sendo assim, por dedução, cabe apelação quando o juiz sentencia com base nos arts. 485 e 489, observados os arts. 489 e seguintes, exaurindo o primeiro grau de jurisdição.

Nota-se que as questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão não comportar agravo de instrumento, não são cobertas pela pre-clusão e deverão ser suscitadas em preliminar de apelação ou contrarrazões conforme o caso.

A petição de interposição é dirigida ao próprio juiz prolator da sen-tença recorrida de primeiro grau contendo os nomes e a qualificação das

14 A Lei de Execuções Fiscais prevê uma modalidade de recurso denominada embargos infringentes (art. 34 da Lei nº 6.830/1980): “Art. 34. Das sentenças de primeira instância proferidas em execuções de valor igual ou inferior a 50 (cinquenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional – ORTN, só se admitirão embargos infringentes e de declaração”.

15 “Não cabe recurso adesivo em juizado especial por falta de expressa previsão legal.” (Enunciado nº 88 do Fonaje)

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partes (cf. art. 1.010), a exposição de fato e de direito, as razões do pedido de reforma ou de decretação de nulidade e o pedido de nova decisão, den-tro do prazo unificado de quinze dias, cabendo à parte contrária, no mesmo prazo, contrarrazoar. Esse recurso tem como finalidade principal evitar o trânsito em julgado da sentença e serve como forma de obtenção do duplo grau de jurisdição.

Sendo recebida a apelação pelo Juízo a quo ou de primeiro grau, in-dependentemente de juízo de admissibilidade, será ela remetida ao tribunal ou juízo ad quem, que será distribuída ao relator, que poderá decidi-lo mo-nocraticamente ou elaborar seu voto (cf. art. 1.011). O novo diploma prevê taxativamente, no art. 1.012, as hipóteses em que a apelação terá efeito suspensivo, sendo a regra, portanto, que ela seja recebida sem este efeito.

Por fim, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada (art. 1.013), total ou parcialmente. No primeiro caso, o tribunal conhece de toda a matéria objeto da lide, abordando completamente as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que a sentença não as tenha julgado por inteiro. Isto não significa ter sido citra petita a sentença de primeiro grau. Ao juiz singular é possível, dentro de seu raciocínio lógico, afastar pedidos cumulativos pelo indeferimento daquele que é causa em relação aos demais, que são efeitos.

Além disso, pode ele convencer-se por uma das teses de direito dedu-zida pela parte, ocasionando a dispensa de análise das restantes. Daí a fixa-ção de amplos limites à devolutividade da matéria impugnada ao tribunal, com autorização de conhecimento dos demais fundamentos do pedido ou da defesa, quando o juiz tiver acolhido apenas algum deles. As decisões já decididas foram objetos de preclusão, vedada a reapreciação de ofício pelo tribunal, sem provocação do recorrido via recurso de agravo, com exceção das matérias de ordem pública (ausência das condições da ação e pressu-postos processuais), as quais devem ser conhecidas a qualquer tempo e grau de jurisdição, independente de provocação das partes, e desde que as partes possam se manifestar antes da decisão judicial acerca delas, conforme o art. 10.

Se parcial o recurso, encontra-se o tribunal limitado em seu conheci-mento, sob pena de proferir acórdão ultra ou extra petita. Entretanto, para conhecimento da pretensão específica do recorrente, tem ele amplos pode-res de analisar todas as questões ligadas ao limite estabelecido.

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Por fim, à parte é vedada a inovação fática em fase de apelação, salvo se deixou de fazê-lo em primeiro grau por motivo de força maior (art. 1.014 do CPC/2015).

O agravo de instrumento, conforme o art. 1.015 do CPC de 2015, é o recurso contra as decisões interlocutórias que versarem taxativamen-te sobre: tutelas provisórias; mérito do processo; rejeição da alegação de convenção de arbitragem; incidente de desconsideração da personalidade jurídica; rejeição do pedido de gratuidade da justiça ou acolhimento do pe-dido de sua revogação; exibição ou posse de documento ou coisa; exclusão de litisconsorte; rejeição do pedido de limitação do litisconsórcio; admissão ou inadmissão de intervenção de terceiros; concessão, modificação ou re-vogação do efeito suspensivo aos embargos à execução; redistribuição do ônus da prova, nos termos do art. 373, § 1º; e outros casos expressamente referidos em lei.

Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutó-rias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.

O agravo de instrumento, recurso de segundo grau, é interposto dire-tamente ao tribunal competente, por meio de petição escrita no prazo de 15 dias, com os seguintes requisitos: os nomes das partes, a exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão e o próprio pedido, o nome e o endereço completo dos advogados constantes do processo.

A petição de agravo de instrumento será instruída: obrigatoriamente, com cópias da petição inicial, da contestação, da petição que ensejou a decisão agravada, da própria decisão agravada, da certidão da respectiva intimação ou outro documento oficial que comprove a tempestividade e das procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado; ou com declaração de inexistência de qualquer dos documentos supracitados, feita pelo advogado do agravante, sob pena de sua responsabilidade pes-soal; facultativamente, com outras peças que o agravante reputar úteis.

Acompanhará a petição o comprovante do pagamento das respecti-vas custas e do porte de retorno, quando devidos, conforme tabela publica-da pelos tribunais.

Não sendo eletrônicos os autos, o agravante tomará a providência prevista no caput do art. 1.018, no prazo de 3 (três) dias a contar da inter-posição do agravo de instrumento, isto é, no prazo de três dias, contados da interposição, deverá a parte comunicar ao juiz recorrido a interposição,

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com cópia do recurso e relação dos documentos de instrução. Tal previ-são visa a possibilitar ao juiz da causa o juízo de retratação e a prestação de informações eventualmente requisitadas pela instância superior. O não cumprimento dessa exigência, desde que arguido e provado pelo agravado, importa inadmissibilidade do agravo de instrumento.

Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediata-mente se não for o caso do art. 932, II e IV, o relator, no prazo de cinco dias, poderá atribuir efeito suspensivo ou deferir em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão, ou ordenar a intimação do agravado para que responda no prazo de quinze dias, facultando-lhe juntar a documentação que entender necessária para julgamento do recurso.

Uma inovação importante do CPC de 2015 foi a do art. 1.020, no que tange à celeridade processual, que dispõe que o relator, adotadas as provi-dências do art. 1.019, solicitará dia para julgamento em prazo não superior a 1 (um) mês da intimação do agravado.

O agravo interno previsto no art. 1.021 do novo CPC é o recurso cabível contra decisão monocrática de segundo grau de jurisdição. O agra-vo interno, também denominado de agravo regimental, é dirigido ao órgão colegiado pertencente à mesma câmara ou turma que proferiu a decisão recorrida, observadas as regras do regimento interno do tribunal quanto ao processamento. O prazo para interposição é o unificado de 15 dias; ele será dirigido ao relator, que intimará o agravado para se manifestar em 15 dias, ao final do qual, não havendo retratação, o relator levá-lo-á a julgamen-to pelo órgão colegiado, sendo vedado ao relator limitar-se à reprodução dos fundamentos da decisão agravada para julgar improcedente o agravo interno.

Os embargos de declaração previstos nos arts. 1.022 e ss. do CPC são um tipo de recurso que visa à integração de qualquer decisão judicial, esclarecendo obscuridade ou eliminando contradição ou suprindo omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento, ou, ainda, corrigir erro material. O novo CPC andou bem nessa definição, pois, no conceito de decisão judicial, já fica acobertada a decisão interlocutória, a sentença e o acórdão.

Essa modalidade recursal é a única com prazo diferenciado prevista no novo diploma processual, cujo prazo é de 5 (cinco) dias, em petição diri-gida ao juiz ou relator, com indicação do erro, obscuridade, contradição ou

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omissão. O juiz ou relator intimará o embargado para, querendo manifestar--se em igual prazo, sendo que o juiz julgará os embargos em cinco dias.

A princípio destinados apenas a corrigir a decisão judicial viciada, e não modificá-la, podem os embargos versar sobre erro ou omissão de tamanho grau que sua sanação gerará modificação de sua parte dispositiva. É o exemplo da ausência de análise de uma das teses de defesa, como, por exemplo, prescrição, num processo com sentença de procedência. Vemos que o novo CPC acertadamente anteviu algumas possibilidades destes casos como no art. 1.024, §§ 4º e 5º.

Os embargos de declaração não possuem efeito suspensivo (ressalva-do o art. 1.026, § 1º) e interrompem o prazo para a interposição de qualquer outro recurso. Essa modalidade recursal é usada também para prequestio-namento de matérias necessário para interposição de recurso nos tribunais superiores, conforme o art. 1.025 do novo CPC.

Os embargos declaratórios de cunho protelatório geram imposição de multa não excedente a dois por cento (art. 1.026, § 2º) sobre o valor da causa, mediante declaração fundamentada do juiz ou relator. Em caso de reiteração, a multa é elevada até dez por cento (art. 1.026, § 3º), condicio-nando a interposição de qualquer outro recurso ao depósito desse valor, sendo plenamente possível o cabimento de embargos de declaração de de-cisão proferida em primeiros embargos de declaração.

No capítulo VI, dentro do Título dos recursos, são analisados os recur-sos para o Supremo Tribunal Federal e para o Superior Tribunal de Justiça. O primeiro desses recursos é o recurso ordinário previsto no art. 1.027 do novo Codex; com o advento da Constituição Federal de 1988 e a criação do Superior Tribunal de Justiça, alterações ocorreram para análise dos recursos ordinários tirados contra denegações de writs em processo de competência originária dos tribunais, como os previstos no art. 1.027, I e II, a do novo diploma processual e também com previsão constitucional nos arts. 102, II (hipóteses de julgamento de recurso ordinário pelo STF), e 105, II (hipóteses de julgamento do recursos ordinário pelo STJ). Tem o recurso ordinário emi-nentemente finalidade de garantir o duplo grau de jurisdição nesses proces-sos, diretamente ajuizados em instâncias superiores. Esse recurso funciona também como uma apelação cível contra decisão proferida em processos existentes entre Estados estrangeiros ou organismos internacionais e muni-cípios ou pessoas domiciliadas ou residentes no Brasil (cf. art. 1.027, II, b, do novo CPC).

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Aos recursos ordinários é aplicável a mesma disciplina da apelação, quanto ao procedimento e aos pressupostos de admissibilidade, como se observam nos arts. 1.027, § 2º, e 1.028 do CPC/2015. Diante de tal previ-são, não podemos negar cabimento de recurso adesivo aos recursos ordi-nários, similares em cabimento, procedimento e pressupostos à apelação.

Já na sessão II do supracitado capítulo VI, o novo diploma processual civil trata dos recursos extraordinário e especial. Estabelecendo disposições gerais sobre eles nos arts. 1.029 a 1.035, regulamentando o julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos nos arts. 1.036 a 1.041 e na Seção III, no art. 1.042, trata de recurso de agravo em recurso especial e em extraordinário.

A definição das hipóteses de cabimento do recurso extraordiná-rio e especial está prevista respectivamente na Constituição Federal, nos arts. 102, II, e 105, III. A finalidade do recurso especial é manter a integri-dade da legislação infraconstitucional; já a do extraordinário é manter a in-tegridade das normas constitucionais. O novo CPC tenta traçar disposições gerais sobre eles, dispondo que estes recursos, nos casos previstos na Cons-tituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em petições distintas que conterão a exposição do fato e do direito, a demonstração do cabimento do recurso interposto, as razões do pedido de reforma ou de invalidação da decisão recorrida. O recorrido será intimado também para apresentar resposta em petição distinta. Esses re-cursos poderão ter efeito suspensivo, desde que requerido e concedido nos termos do art. 1.029, § 5º. Recebida a petição do recurso pela secretaria do Tribunal, o recorrido será intimado para apresentar contrarrazões no prazo de 15 dias, findo o qual os autos serão remetidos ao Tribunal. A remessa ao Tribunal dar-se-á independentemente de juízo de admissibilidade. Na hipó-tese de interposição conjunta dos referidos recursos, eles serão remetidos primeiramente para o STJ detentor de prioridade.

Nos arts. 1.031 a 1.034, dispõe o CPC sobre a interposição conjunta dos referidos recursos, e os possíveis conflitos de entendimento entre os respectivos tribunais no caso de julgamento e suas soluções. Por sua vez, sendo admitido o recurso extraordinário ou o recurso especial por um fun-damento, devolve-se ao Tribunal superior o conhecimento dos demais fun-damentos para a solução do capítulo impugnado.

Para a interposição de ambos os recursos, é necessário o preques-tionamento, conforme podemos observar pelas Súmulas nºs 320 do STJ e 735 do STF. Com relação às turmas recursais dos juizados especiais, só é

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possível interposição de recurso extraordinário e não de especial, conforme Súmula nº 640 do STF.

Outro ponto interessante regulamentado pelo CPC diz respeito à re-percussão geral a ser reconhecida pelo STF, para conhecimento do recurso extraordinário, sendo que, para o efeito da repercussão geral, será conside-rada a existência ou não de questões relevantes do ponto de vista econômi-co, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo (art. 1.035, § 1º). O recorrente deverá demonstrar a repercussão geral, para apreciação exclusiva do STF, lembrando que desta decisão não cabe qualquer recurso. De outro canto, o próprio CPC, no art. 1.035, § 3º, menciona os casos em que sempre haverá repercussão geral e que ocorrem quando o acórdão contrarie súmula ou jurisprudência dominante do STF ou tenha sido proferido em julgamento de casos repetitivos e, por fim, quando tenha reconhecido a inconstitucionalidade de tratado ou de lei federal, nos termos do art. 97 da CF.

Reconhecida a repercussão geral, o relator do Supremo Tribunal Fe-deral determinará a suspensão do processamento de todos os processos pendentes, individuais ou coletivos, que versem sobre a questão e tramitem no território nacional. O recuso que tiver repercussão geral reconhecida deverá ser julgado no prazo de um ano e terá preferência sobre os demais feitos, ressalvados os que envolvam réu preso e pedido de habeas corpus. Outra importante regulamentação trazida pelo CPC de 2015 diz respeito ao julgamento de recursos extraordinário e especial repetitivos previstos nos arts. 1.036 a 1.041, visto que, sempre que houver multiplicidade de recur-sos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições da Subseção II, que trata do julgamento dos recursos extraordinário e especiais repetitivos, sobre os quais não nos alongaremos, visto que perderíamos o foco do presente artigo – mas fica aqui novamente o comentário de que o novo CPC vem acertadamente regulamentando tais questões, o que mais uma vez prova a busca pelas mais modernas tendências processuais civis na busca de um processo justo, eficiente e célere.

Outra modalidade recursal prevista pelo novo diploma processual é o agravo em recurso especial e em recurso extraordinário, previsto no art. 1.042. Esse recurso deverá ser interposto em 15 dias e é cabível contra decisão do presidente ou vice-presidente do tribunal que: indeferir pedido formulado com base no art. 1.035, § 6º, ou no art. 1.036, § 2º, de inad-missão de recurso especial ou extraordinário intempestivo; inadmitir, com base no art. 1.040, I, recurso especial ou extraordinário sob o fundamento

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de que o acórdão recorrido coincide com a orientação do tribunal superior ou inadmitir recurso extraordinário, com base no art. 1.035, § 8º, ou no art. 1.039, parágrafo único, sob o fundamento de que o Supremo Tribunal Federal reconheceu a inexistência de repercussão geral da questão consti-tucional discutida.

A petição do agravo será dirigida ao presidente ou vice-presidente do tribunal de origem e independe do pagamento de custas e despesas postais. O agravado será intimado, de imediato, para oferecer resposta no prazo de 15 (quinze) dias. Após o prazo de resposta, não havendo retratação, o agra-vo será remetido ao tribunal superior competente.

Sob pena de não conhecimento do agravo, incumbirá ao agravante demonstrar, de forma expressa: a intempestividade do recurso especial ou extraordinário sobrestado, quando o recurso fundar-se na hipótese do inciso I do caput do art. 1.042 ou a existência de distinção entre o caso em análise e o precedente invocado, quando a inadmissão do recurso especial ou ex-traordinário fundar-se em entendimento firmado em julgamento de recurso repetitivo por tribunal superior ou extraordinário ou fundar-se em decisão anterior do Supremo Tribunal Federal de inexistência de repercussão geral da questão constitucional discutida.

Por fim, a última modalidade recursal prevista pela comissão elabora-dora do Novo CPC, e aprovado pelo Poder Legislativo nacional, devidamen-te sancionado e publicado pelo Poder Executivo nacional, diz respeito ao recurso denominado embargos de divergência previsto nos seus arts. 1.043 e 1.044. Esse recurso será admitido sempre que houver divergência entre turmas ou entre câmaras ou, ainda, entre turmas e câmaras dos tribunais de superposição, ou seja, STF e STJ. Seu prazo de interposição é o mesmo dos demais, 15 dias, e será dirigido ao presidente ou vice-presidente do tribunal que proferiu o acórdão divergente.

A divergência que autoriza a interposição de embargos de divergên-cia pode verificar-se na aplicação do direito material ou do direito proces-sual. Cabem embargos de divergência quando o acórdão paradigma for da mesma turma que proferiu a decisão embargada, desde que sua composição tenha sofrido alteração em mais da metade de seus membros.

No recurso de embargos de divergência, será observado o procedi-mento estabelecido no regimento interno do respectivo tribunal superior. A interposição de embargos de divergência no Superior Tribunal de Justiça in-terrompe o prazo para interposição de recurso extraordinário por qualquer das partes. Segundo disciplinou a Súmula nº 599 do STF, não será admitida

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a interposição do presente recurso de decisão de turma em agravo regimen-tal, sendo hoje este o agravo interno.

3 BREVE ANÁLISE SOBRE RECURSOS COM O ADVENTO DO NOVO CPC (LEI Nº 13.105/2015) E SUAS PRINCIPAIS ALTERAÇÕES

No novo Código de Processo Civil, podemos observar que ele, em seu art. 994, prevê nove espécies de recursos com o escopo de promover a celeridade processual; apesar de o Código de 1973 prever oito espécies de recursos em seu art. 496, percebemos a pertinente observação acima transcrita com relação à grande quantidade de agravos diversos, sendo que, no novo CPC, foi reduzido textualmente para três: agravo de instrumento, agravo interno e agravo em recurso especial ou extraordinário.

Mais uma vez, lembramos a crítica tão bem cabida do consagrado Professor Vicente Grego; apesar de ele se autodenominar um fatalista, temos esperança de que os sucedâneos recursais sejam vistos com olhos cautelo-sos pelo Poder Judiciário, sob pena de desvirtuar o espírito mais moderno e célere incorporado ao novo Código previstos nos arts. 1º a 12 do novo CPC, e pensamos que talvez uma boa forma de evitar sucedâneos procrastinató-rios seja a aplicação por parte do Judiciário da multa prevista no art. 80 do novo CPC. Assim esperamos que nossa jurisprudência opere.

Na tentativa de evitar uma justiça morosa e burocrática, bem como facilitar a vida profissional dos operadores do Direito, outra importante al-teração do novo Código diz respeito à unificação dos prazos recursais em quinze dias, conforme previsto no art. 1.003, § 5º, que serão contados da data de intimação da decisão – com exceção dos embargos de declaração, que permanece o prazo de cinco dias, conforme art. 1.053 do novo CPC.

No que se refere aos recursos, registra-se que o novo Código não contempla o agravo retido e os embargos infringentes como modalidades recursais, concentrando a solução de diversas controvérsias para a via do recurso de apelação, bem como a unificação dos prazos recursais, o que se alinhou com os objetivos que nortearam os trabalhos da comissão do ante-projeto do novo CPC.

No que tange ao fim do efeito suspensivo automático da apelação, situação que não ocorreu no novo CPC e que contrariou a onda de avanços que permearam o novo CPC e que se alinhava totalmente com a ideia de se implementar um processo mais célere e eficiente. Acreditamos que o fim do efeito automático da apelação repercutiria uma situação processual deveras justa, uma vez que, por meio de uma inversão simples, técnica e altamente

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positiva, é possível, de uma só vez, reconhecer o valor da atividade cogniti-va exercida pelo julgador de primeiro grau e transferir ao sucumbente, mui-tas vezes devedor (parte vencida), o ônus de arcar com os efeitos deletérios que o transcurso do tempo causa ao processo e aos litigantes.

Observamos que o novo CPC absorveu bem as novas tendências do direito processual que vêm sendo desenvolvidas em países da Europa e da América, em torno do que se convencionou chamar “acesso à justiça”16, sendo relevantes, a respeito, os sucessivos trabalhos publicados por Mauro Cappelletti e Vittorio Denti. Com relação ao acesso à justiça, chamamos a atenção para o sincretismo e a simplificação processual, como podemos ver ao longo da leitura do novo Código; a prevenção de gratuidade de justiça no art. 98, defensoria pública aos necessitados prevista no art. 185. Já com relação à celeridade e efetividade, observa-se: art. 12, que diz que os juí-zes e tribunais deverão obedecer à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão, previsão da tutela urgência; arts. 300 e ss. e a estabilização da tutela antecipada; arts. 304 e ss. e a tutela de evidência; arts. 311 e ss. e a ordem dos processos nos tribunais; art. 929 e o incidente de resolução de demandas repetitivas; arts. 976 e ss., entre outras.

Sendo este o cenário de concepção do novo diploma processual civil brasileiro, vislumbramos assim as principais inovações dele como sendo:

1. Criação de uma parte geral tornando mais claras as diretrizes que devem nortear o operador do Direito;

16 Essa concepção individualista do processo ficou superada, mostrando-se insuficiente para atender às exigências dos tempos modernos, de uma sociedade de massa cada vez mais consciente dos seus direitos, embora a grande maioria de seus membros, na prática, esteja impossibilitada de executá-los pela dificuldade de acesso aos órgãos componentes do sistema judiciário. Daí o surgimento do fenômeno da litigiosidade contida (Ref.: Prof. WATANABE, Kazuo. Acesso à justiça e sociedade moderna: In: GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel; WATANABE, Kazuo (Coord.). Participação e processo. São Paulo: RT, 1988), ou, até mesmo, cada dia mais o descrédito do Poder Judiciário e o surgimento de revolta dos cidadãos, que optam, muitas vezes, por usos próprios da violência, próprio de sociedades primitivas, o que é forçoso nos fazer repensar os mecanismos processuais de efetividade do processo. Em suma, o que pretende essa corrente de pensamento é a abertura da ordem processual aos menos favorecidos da fortuna e à defesa de direitos e interesses supraindividuais, com a racionalização do processo, para que ele seja um processo de resultados, não um processo de conceitos e extremamente formal e burocratizado. O que se busca é a efetividade do processo, sendo indispensável, para isso, pensar no processo como algo dotado de bem definidas destinações institucionais e que deve cumprir os seus objetivos sob pena de ser menos útil e tornar-se socialmente ilegítimo. Nesta revolução trazida à tona por esta recente doutrina, que foi bem digerida pelo novo CPC, surge em tempos mais atuais, em momento fértil para tanto, uma nova corrente de pensamento que está muito em discussão no meio acadêmico denominada neoconstitucionalismo, que reflete diretamente no direito processual, o que alguns já têm intitulado de neoprocessualismo ou formalismo valorativo, haja vista a atual tendência dele de absorção literal dos princípios e normas constitucionais, como podemos observar em seu arts. 1º a 12, e cria um terreno fértil e propício ao surgimento de novas ideias, correntes de pensamento e, quem sabe, novas doutrinas.

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2. Inclusão de diversas cláusulas e princípios gerais no corpo do CPC. A inclusão expressa de novos princípios, entre eles o prin-cípio colaborativo (art. 6º do CPC);

3. A criação de novas técnicas de julgamento que valorizem o pre-cedente, numa verdadeira fusão entre o Direito codicista (civil law) e o Direito consuetudinário (commom law), com a criação de um sistema de precedentes vinculantes para todas as instân-cias; súmulas vinculantes, cf. art. 332 do CP; (incidente de jul-gamento conjunto de demandas repetitivas, com inspiração no direito alemão17, com intento de se atingir segurança jurídica e evitar a dispersão da jurisprudência, rendendo-se, definitiva-mente, às influências do commom law, onde a jurisprudência do STF e dos Tribunais Superiores devem nortear as decisões de todos os Tribunais e Juízos singulares do país, de modo a efetivar plenamente os princípios da legalidade e da isonomia); Nesta esteira, vem o novo CPC podendo ser considerado tam-bém um exemplo emblemático, mas vindo em sentido oposto, isto é, do civil law, absorvendo o commom law – diferentemente do modelo inglês e do norte-americano, que, de certa forma, o commom law vem absorvendo o civil law;

4. A possibilidade de que a sentença condenatória de obrigação de pagar sirva de instrumento para a promoção de protesto e inclu-são do nome do devedor em órgãos de restrição ao crédito;

5. Ampliação do julgamento de casos repetitivos com a inclusão de incidente de solução de demandas repetitivas, com a suspensão de ações no 1º grau – criação de técnicas de julgamento que valorizem o precedente com inclusão da força dos precedentes ao julgar demandar repetidas (arts. 976 a 987 do CPC) – litigiosi-dade de massa e mecanismos de gestão de processos repetitivos;

6. Tutela provisória dividida em tutela de urgência (aproximação da tutela cautelar e da antecipação de tutela) e tutela de evidên-cia (arts. 294 a 311 do CPC), bem como a inclusão da técnica de estabilização;

17 No direito alemão, a figura se chama Musterverfahren e gera decisão que serve de modelo (= Muster) para a resolução de uma quantidade expressiva de processos em que as partes estejam na mesma situação, não se tratando necessariamente do mesmo autor nem do mesmo réu (RALF-THOMAS WITTMANN. Il “contenzioso di massa” in Germania. In: ALESSANDRO, Giorgetti; VALLEFUOCO, Valerio. Il contenzioso di massa in Italia, in Europa e nel mondo. Milão: Giuffré, 2008. p. 178).

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7. Criação de mecanismos que visam à valorização da conciliação e mediação (art. 165 do CPC) e da arbitragem;

8. Prática eletrônica dos atos processuais (art. 193);

9. Previsão negócio jurídico processual (art. 190 do CPC) e “calen-darizarão” (art. 191);

10. Simplificação processual com a abolição e reformulação de di-versos conceitos e extinção de diversos incidentes, possibilitan-do um processo mais organizado;

11. Fixação da ordem cronológica para julgamento (art. 12 do CPC) e sua publicidade;

12. Supressão de algumas modalidades recursais e unificação de prazos recursais;

13. Flexibilização procedimental como instrumento da tutela, entre outras;

14. Ampliação do prazo da ação rescisória art. 975, § 2º (prova nova); ampliação do prazo para 5 anos e § 3º (simulação ou de colusão) a contar da data da ciência, acatando em parte a suges-tão da Professora Ada Pelegrini Grinover, a qual seria de permitir que o prazo de dois anos da ação rescisória seja contado a partir da descoberta da prova nova, pois assim evitaria a denominada relativização da coisa julgada, sendo que o novo Código per-deu uma boa oportunidade de enfrentar a teoria da relativização da coisa julgada como foi feita com a desconsideração da per-sonalidade jurídica importada ao Brasil pelo Professor Rubens Requião, e encampada no Código Civil de 2002, e anteriormen-te a este no CDC, hoje tão amplamente utilizada;

15. Inserção do amicus curiae (art. 138);

16. Falta de previsão do procedimento sumário do CPC de 1973, sendo agora procedimento comum ou especial, e aplicação das normas do procedimento comum subsidiariamente ao especial e ao processo de execução (art. 318, parágrafo único);

17. Regras foram concebidas dando concreção a princípios consti-tucionais, como, v.g., as que preveem um procedimento, com contraditório e produção de provas, prévio à decisão que des-considera a pessoa jurídica, em sua versão tradicional ou na in-vertida; contraditório prévio e questões de ordem pública, entre outras;

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18. A hipoteca judiciária da sentença (art. 495);

19. Coisa julgada sobre a questão prejudicial (art. 503, § 1º);

20. Adoção da teoria da carga dinâmica do ônus probatório;

21. Adoção da modulação dos efeitos, fim do agravo retido, novas regras de intervenção de terceiros, entre outras.

SÍNTESE CONCLUSIVA

Seguindo as lições e experiências da consagrada doutrina supracita-da, nasce o novo Código de Processo Civil, Lei nº 13.105/2015, observando os princípios e as novas tendências do processo civil moderno, no almejar de um processo justo e eficaz, conforme prelecionam os processualistas modernos, bem como mais célere, como já previsto em nossa CF, art. 5º, LXXVIII.

Mais uma vez, na tentativa de evitar uma justiça morosa e burocráti-ca, e com o objetivo de facilitar a vida profissional dos operadores do Direi-to, uma importante alteração do novo Código diz respeito à unificação dos prazos recursais em quinze dias, conforme previsto no art. 1.003, § 5º, que serão de 15 dias contados da data de intimação da decisão, com exceção dos embargos de declaração, cujo prazo permanece de cinco dias.

No que se refere aos recursos, registra-se que o novo Código não contempla o agravo retido e os embargos infringentes como modalidades recursais, concentrando a solução de diversas controvérsias para a via do recurso de apelação, bem como ampliação do julgamento de casos repeti-tivos com a inclusão de incidente de solução de demandas repetitivas, com a suspensão de ações no 1º grau – criação de técnicas de julgamento que valorizem o precedente com inclusão da força dos precedentes ao julgar demandar repetidas (arts. 976 a 987 do CPC), fazendo uma fusão entre Di-reito codicista (civil law) e Direito consuetudinário (commom law), com a criação de um sistema de precedentes vinculantes para todas as instâncias, o que se alinhou com os objetivos que nortearam os trabalhos da comissão do anteprojeto do novo CPC.

Percebemos, dentro do texto do novo CPC, a encampação de muitos princípios gerais, institutos e mecanismos para guiarem os operadores do Código, para sua boa operacionalidade na realização de um processo justo, eficaz e em tempo razoável, mas frisamos que tais ideais só serão atingidos através de uma reflexão, reeducação e mudança de postura dos principais operadores do direito, como juízes, advogados, promotores, que muitos são professores, para que a nova lei processual possa refletir positivamente para

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA �������������������������������������������������������������������������������������������������������145

as futuras gerações, sem continuar cometendo os erros do passado, mas aperfeiçoando para abraçar o futuro com a devida cautela inerente a que toda grande mudança pode infringir

REFERÊNCIAS

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MONTEIRO, Vitor José de Mello; GIANNICO, Mauricio. A evolução do processo civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, v. 1 e 2.

NERY JUNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 27. ed. São Paulo: Saraiva, v. 1, 2 e 3, 2011.

WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 4. ed. São Paulo: RT, 1997.

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Assunto Especial – Doutrina

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

O Novo Perfil da Tutela Provisória

CLITO FORNACIARI JÚNIORMestre em Direito Processual Civil pela PUCSP, Advogado.

Quando da promulgação do Código de Processo Civil de 1973, des-tacou-se e recebeu elogios a sistemática do processo cautelar, que foi dis-ciplinado no mesmo plano dos processos de conhecimento e de execução (cf. LACERDA, Galeno. Comentários ao Código de Processo Civil. 2. ed. Forense, 1981, n. 1, p. 2). Por seu turno, quando, em 1994, foi introduzida na legislação processual a tutela antecipada, por meio da qual, em síntese, se poderia até entregar ao litigante, provisoriamente, o próprio bem da vida disputado, viu-se nisso a redenção do processo, de vez que se venceriam as barreiras burocráticas e as práticas proletórias, antecipando seu resultado final. Os dois institutos, que tinham muito em comum, conviveram, desde então, cada qual dentro de seu âmbito, sem atrapalhar ninguém.

Apesar disso, o novo Código resolveu agrupar os dois institutos, elimi-nando a longa e bem desenhada disciplina da cautelar do Código de 1973, e redefinir a forma e os próprios requisitos para a antecipação da tutela, que pode ser simplesmente a cautelar. O novo desenho apresenta-se no Livro V da Parte Geral do Código, sob a denominação de tutela provisória. Desapa-receu, pois, o vistoso processo cautelar, que passou a ser uma subespécie de tutela provisória, sem ritos particulares, diferentemente dos quinze procedi-mentos especiais de natureza cautelar trazidos ao Código de 1973.

A nova tutela provisória pode fundamentar-se na urgência ou na evi-dência. A assentada na urgência pode ter natureza cautelar ou antecipató-ria, e sua postulação é viável como antecedente ou como simples incidente do processo principal. Exige-se para sua concessão (art. 300) o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo associado, um ou outro, à probabilidade do direito discutido. A recusa de autorização para um proce-dimento médico revela enorme perigo de dano, que pode ser irreversível; o desaparecimento de uma prova põe em risco o resultado do processo, ense-jando ambas as situações a busca da providência de urgência, em um caso objetivando o próprio bem da vida, com caráter antecipatório, e em outro

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – DOUTRINA �������������������������������������������������������������������������������������������������������147

a preservação da prova, de natureza, pois, cautelar. Ambas as situações justificam o provimento antecipatório porque se depara com um quadro de risco, que é de ser evitado, porém somente àqueles que têm um direito plausível, provável, ou seja, que evidenciem a fumaça do bom direito.

A tutela de evidência prescinde da demonstração do perigo de dano ou do risco ao resultado útil do processo (art. 311). Na essência, representa um pedido de julgamento antecipado, seja porque a prova é somente docu-mental (incisos II, em parte, III e IV), seja porque existe súmula vinculante ou tese firmada em julgamento de casos repetitivos (inciso II). Além disso, também pode ter lugar nas hipóteses de abuso do direito de defesa ou pro-pósito protelatório do requerido (inciso I). Não se está, porém, diante de uma sanção ao litigante desleal, de modo que não há certeza de julgamen-to de procedência. Embora se mencione a possibilidade de concessão de liminar (parágrafo único do art. 311), a existência efetiva dos pressupostos declinados pela lei conduz a um julgamento final e não provisório, até im-pondo providência irreversível, de forma a não parecer afeito aos casos de antecipação de tutela.

O rito estabelecido para a tutela de urgência confere a ela uma im-portância que confirma a constatação de Giuseppe Tarzia, no sentido de ganhar a tutela provisória, nos dias atuais, um espaço muito grande, quando não maior do que a própria tutela definitiva (apud ZAVASCKI, Teori Albino. Antecipação da tutela. 6. ed. Saraiva, 2008. p. 27). De fato, a importância que se dá a ela é tanta que pode mesmo dispensar a tutela final.

Requerida como antecedente, a tutela provisória enseja um autêntico rito especial. Nesse sentido, admite-se que a inicial seja singela, limitando--se o autor a requerer a tutela antecipada e só indicando o pedido final, sem discorrer sobre seus fundamentos. Se for concedida liminar e não houver recurso da parte contrária, “torna-se estável” a tutela antecipada, e o pro-cesso simplesmente é extinto (art. 304). Elimina-se o direito de defesa, que, portanto, passa a pressupor a existência de recurso contra a concessão da tutela antecipada. Esta, apesar da tal estabilidade, que não é coisa julgada, pode ser revista, reformada ou invalidada por demanda posterior, a ser pro-movida, no prazo de até dois anos, por qualquer das partes.

O § 1º do art. 303, ignorando a imprescindibilidade do recurso contra o deferimento da tutela antecipada, cogita das providências a cargo do au-tor, diante de sua concessão. Sem dúvida, esse parágrafo deixaria a lei mais clara se colocado em seguida à exigência de recurso para que a tutela não se estabilize. Conforme a regra, a inicial (se for o caso) deverá ser aditada, em quinze dias ou mais (inciso I, § 1º, art. 303), para complementação da

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demonstração (fala-se em argumentação) do pedido de tutela final. Men-ciona o § 2º que a falta de aditamento conduz à extinção do processo sem julgamento de mérito. Evidente que, se a inicial estiver completa, não há de ser aditada, e o processo há de seguir.

Superada a questão do aditamento, o processo toma o rito comum, citando-se e intimando-se o requerido para a audiência de conciliação, que, por sua vez, faz surgir o prazo para a defesa do requerido, como se dá nas ações sem pedido de tutela antecipada. Exatamente depois desta intimação é que há possibilidade de interposição do tal recurso que evita a estabiliza-ção da tutela. As disposições que tratam do assunto, como se vê, fogem da melhor lógica.

O direito de emendar a inicial também se confere, com prazo me-nor (5 dias), em não sendo concedida a liminar (§ 6º do art. 303). Com o aditamento, permite-se ao magistrado o reexame do pedido de liminar, sem a qual o processo seria extinto sem julgamento de mérito. Não parece, todavia, adequado atrelar a liminar à sobrevivência da demanda, melhor entender-se que, se não houver a liminar, a inicial poderá ser recebida e o processo seguirá o rito comum.

O pedido de índole cautelar, por sua vez, pode vir em petição autô-noma ou com o pedido principal, com possibilidade de deferimento de limi-nar, sem que isso, contudo, influencie a sequência do procedimento, que a lei nomina de comum. Se houver pedido autônomo, terá o requerente que, no prazo de trinta dias da efetivação da cautelar, intentar a ação principal. Lamenta-se o desaparecimento dos procedimentos especiais de natureza cautelar. Essa supressão impõe ao juiz, ao deferir a providência que julgar adequada, ditar os atos específicos que deverão ser trilhados, estabelecendo um procedimento judicial para que se alcance o fim colimado, o que, sem dúvida, aumentará o seu trabalho.

Supõe-se, no silêncio da lei, que o pedido incidental de tutela ante-cipatória ou cautelar seja formulado em petição simples, apenas indicando os elementos que evidenciam o risco de dano e a probabilidade do direito, direcionando-a, logicamente, aos autos do processo.

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Assunto Especial – Em Poucas Palavras

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

Dano Moral e Valor da Causa: entre o Velho e o Novo CPC

GUILHERME CARVALHO E SOUSADoutorando em Direito Administrativo pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Mestre em Direito e Políticas Públicas pelo UNICEUB, Especialista em Direito Públi-co e Especialista em Direito do Trabalho e Processual do Trabalho. Advogado militante, com atuação prioritária nos tribunais superiores e na área de contratação pública e Direito Empre-sarial. Sócio do escritório Guilherme Carvalho & Advogados Associados. Professor universitário em Brasília, palestrante e Professor de Pós-Graduação em vários cursos, faculdades e tribu-nais de contas. Autor de vários artigos e pareceres jurídicos publicados em revistas de grande circulação. Ex-Procurador do Estado do Amapá e Bacharel em Administração de Empresas.

A discussão acerca do valor da causa não é algo novo. O art. 58 do ainda vigente CPC1 assevera que “a toda causa será atribuído um valor cer-to, ainda que não tenha conteúdo econômico imediato”. Não há qualquer controvérsia quanto a esse ponto, eis que o valor da causa serve, entre tantas finalidades, para a fixação do rito, para a condenação em custas e para a delimitação da sucumbência.

O debate que aqui se traz é pontual: valor da causa em se tratando de ações de indenização por dano material e moral. Qual valor deve ser fixado? Apenas o valor do dano material ou, cumulativamente, os valores pretendidos a título de danos material e moral?

É regra comum na prática forense deixar ao livre arbítrio do julgador o valor da indenização por danos morais, fato pelo qual se faz impraticável a delimitação mais precisa do valor da causa. O próprio Superior Tribunal de Justiça reconhece essa corrente, quando, por meio de seu Verbete Sumular nº 326, preceitua que, “na ação de indenização por dano moral, a condena-ção em montante inferior ao postulado na inicial não implica sucumbência recíproca”. Ou seja, se não há sucumbência recíproca, é sinal de que o valor atribuído à causa pouco importa.

Alguns juízes, quando da apreciação da inicial em que se cumulam danos material e moral, determinam a emenda desta para que a parte de-

1 Até a data de fechamento do presente artigo, ainda estava em vigência a Lei nº 5.869, que institui o Código de Processo Civil de 1973.

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limite o valor da causa. Tal conduta, contudo, em que pese ser exceção, é afastada pela jurisprudência dominante, que entende ser atribuível à causa o valor que se intenta de indenização por danos materiais somente:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – EMENDA À INICIAL – VALOR DA CAU-SA – DANOS MORAIS – Havendo a parte deixado ao critério do julgador a fixação dos danos morais, sem apresentar na exordial qualquer estimativa do prejuízo extrapatrimonial sofrido, possível a fixação do valor de alça-da à causa. Desnecessidade de emenda à inicial. Precedentes desta Cor-te. Agravo de instrumento provido. Decisão monocrática. (TJRS, Agravo de Instrumento nº 70061755112/RS, 10ª C.Cív., Rel. Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em 25.09.2014, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 30.09.2014)

VALOR DA CAUSA – DETERMINAÇÃO DE EMENDA DA INICIAL – DA- NO MORAL – Requerimento de indenização por dano moral em valor a ser arbitrado pelo juízo, o que dispensa a parte de estimá-lo na inicial. Dou-trina e jurisprudência. Agravo de instrumento provido, em monocrática. (TJRS, Agravo de Instrumento nº 70059366328/RS, 19ª C.Cív., Relª Mylene Maria Michel, Julgado em 15.05.2014, Data de Publicação: Diário da Justi-ça do dia 19.05.2014)

Agravo de instrumento. Responsabilidade civil. Briga entre parentes. Ação de indenização por supostos danos material e moral. Insurgência contra decisão que determinou a emenda da inicial com adequação do valor da causa. 1. Determinação de emenda que pode se dar ex officio. Ausência de ilegalidade. 2. Agravante que não estipulou o valor pretendido a título de dano moral, requerendo arbitramento pelo juiz. Providência admitida pela lei. Art. 258 do Código de Processo Civil. 3. Pretensão da ação, todavia, que não envolve somente a reparação moral. Pedido de danos materiais com valor especificado. Necessária emenda da inicial para atribuir à causa o valor perseguido a tal título. 4. Resultado. Desnecessidade de emendar a inicial para estipular danos morais, observando, quanto ao valor da causa, a pretensão deduzida a título de dano material. Recurso parcialmente pro-vido. (TJSP, AI 21864465820158260000/SP, 2186446-58.2015.8.26.0000, 6ª CDPriv., Relª Ana Lucia Romanhole Martucci, Data de Julgamento: 07.10.2015, Data de Publicação: 08.10.2015)

Ocorre que o novo Código de Processo Civil é enfático ao tratar so-bre o valor da causa, determinando que este constará da petição inicial e será, “na ação indenizatória, inclusive a fundada em dano moral, o valor pretendido”2. É dizer: toda causa, independentemente de se tratar de inde-nização por dano moral, deverá ter um valor fixado.

2 Art. 292, V, do novo CPC.

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Subjaz, contudo, o exame sobre a validade da Súmula nº 326 do STJ em face do novo Código de Processo Civil. Indagando-se de outro modo: caso o valor arbitrado a título de indenização por danos morais, em senten-ça proferida já na vigência do novo CPC, seja inferior ao valor fixado no pedido, haverá sucumbência recíproca?

Mais um dilema a ser solucionado a partir de 18 de março de 2016!

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Assunto Especial – Acontece

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

A Data da Entrada em Vigor do Novo Código de Processo Civil – 18�03�2016

ROGÉRIO MONTAI DE LIMAJuiz de Direito, Pós-Doutor em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade de Lisboa, Doutor em Direito Público – Acesso à Justiça e Efetividade do Processo – pela Unesa/RJ, Professor Adjunto da Universidade Federal de Rondônia.

Após anos de tramitação no Congresso (PL 166/2010 do Senado Fe-deral e Projeto de Lei nº 8.046/2010 da Câmara dos Deputados), o ordena-mento jurídico prepara-se para receber um novo caderno processual civil, a Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015, publicada no Diário Oficial da União em 17.03.2015. O novo Codex entrará em vigor depois de decorrer 1 (um) ano da data de sua publicação oficial, nos termos do seu art. 1.045.

É importante destacar que o Código foi construído sobre matriz cons-titucional e já em seu art. 1º afirma que o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil.

Diante de divergências na doutrina, em especial se a nova legislação entrará em vigor em 16, 17 ou 18.03.2016, o presente texto tem a finalidade de apresentar uma posição sobre a data exata em que entra em vigor o novo Código.

A Lei nº 13.105, de 16.03.2015, que cria o novo Código de Processo Civil, foi publicada em 17 de março de 2015. O art. 1.045 estipula um pe-ríodo da vacatio legis e diz: “Este Código entrará em vigor após decorrido 1 (um) ano da data de sua publicação oficial”.

A Lei Complementar nº 95/1998 dispõe sobre a elaboração, a reda-ção, a alteração e a consolidação das leis, conforme determina o parágrafo único do art. 59 da Constituição Federal, e estabelece normas para a conso-lidação dos atos normativos que menciona.

A vigência de uma lei deve ser indicada de forma expressa e de modo a contemplar prazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento,

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – ASSUNTO ESPECIAL – ACONTECE �������������������������������������������������������������������������������������������������������153

reservada a cláusula “entra em vigor na data de sua publicação” para as leis de pequena repercussão. Essa é a redação do art. 8º da Lei nº 95/1998.

Note-se que § 1º do mesmo diploma diz que a contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral. Esse parágrafo foi incluído pela Lei Complementar nº 107, de 26.04.2001. Já o § 2º diz que as leis que estabeleçam período de vacância deverão utilizar a cláusula “esta lei entra em vigor após decorridos (o número de) dias de sua publicação oficial”.

A questão reside no fato de que o novo Código de Processo Civil utilizou a expressão “em vigor após decorrido 1 (um) ano da data de sua publicação oficial”. Logo, não fez menção em “dias”.

Nessa linha, então, é preciso definir o que é “ano”. A resposta é en-contrada na Lei nº 810, de 6 de setembro de 1949, que define o “ano civil” já em seu art. 1º: “Considera-se ano o período de doze meses contado do dia do início ao dia e mês correspondentes do ano seguinte”.

A mesma lei regulamenta o “mês” como o período de tempo contado do dia do início ao dia correspondente do mês seguinte. Quando no ano ou mês do vencimento não houver o dia correspondente ao do início do prazo, este findará no primeiro dia subsequente.

Com olhos nessas regras, verifica-se que o prazo final da vacatio legis (“decorrido um ano”) da Lei nº 13.105/2015 é 17.03.2016 – quando se en-cerra o período de doze meses da publicação do novo Código de Processo Civil.

Assim, o novo Código de Processo Civil – Lei nº 13.105/2015 – entrou em vigor “após decorrido um ano”, tendo vigência desde 18.03.2016.

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Parte Geral – Jurisprudência

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Superior Tribunal de JustiçaEDcl‑AgRg nos Embargos de Divergência em Agravo em Recurso Especial nº 365.011 – SP (2013/0209478‑6)Relator: Ministro Marco Aurélio BellizzeEmbargante: Romeu PiresAdvogados: Fernanda Zampol Loberto

Filipe Panace Menino Marcos Von Glehn Herkenhof e outro(s) Olavo Zampol Renato Ribeiro do Valle e outro(s) Roberto Koenigkan Marques e outro(s)

Embargado: Líria Bernardes e outrosAdvogado: Douglas de Oliveira Santos e outro(s)

emeNtA

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE TESTAMENTO PúBLICO – VÍCIO DE FORMA – FLEXIBILIZAÇÃO – PRE- VALÊNCIA DA REAL VONTADE DO TESTADOR – AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA – ACÓR- DÃO EMBARGADO EM CONSONÂNCIA COM A ATUAL JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR – SúMULA Nº 168/STJ – ALEGAÇÃO DE OMISSÕES NO DECISUM – NÃO OCORRÊNCIA – ADVERTÊNCIA DE MULTA – EMBARGOS REJEITADOS

1. Não sendo admitido o processamento dos embargos de divergên-cia, por ausência de similitude fática entre os arestos confrontados, revela-se despiciendo o exame dos fundamentos utilizados pelo Tri-bunal de origem, razão pela qual não há que se falar em omissão no acórdão embargado.

2. Advertência de que a oposição de novos embargos de declaração de cunho protelatório ensejará a aplicação de multa, nos termos do art. 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

3. Embargos de declaração rejeitados.

ACórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������������������������������155

e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, rejeitar os embargos de declaração, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão, Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Buzzi votaram com o Sr. Mi-nistro Relator.

Brasília, 25 de fevereiro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Marco Aurélio Bellizze, Relator

relAtório

O Senhor Ministro Marco Aurélio Bellizze:

Romeu Pires opõe os presentes embargos de declaração contra acór-dão proferido pela Segunda Seção desta Corte assim ementado:

AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRA-VO EM RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL – AÇÃO DECLARA-TÓRIA DE NULIDADE DE TESTAMENTO PÚBLICO – VÍCIO DE FORMA – FLEXIBILIZAÇÃO – PREVALÊNCIA DA REAL VONTADE DO TESTADOR – IMPOSSIBILIDADE DE DISCUTIR O ACERTO OU DESACERTO NA APLI-CAÇÃO DE REGRA TÉCNICA DE CONHECIMENTO DE RECURSO ESPE-CIAL – AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA – ACÓRDÃO EMBARGADO EM CONSONÂNCIA COM A ATUAL JURISPRUDÊNCIA DESTA CORTE SUPERIOR – SÚMULA Nº 168/STJ – DECISÃO AGRAVADA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS

1. A divergência de entendimento entre as turmas do Superior Tribunal de Justiça só se configura quando devidamente demonstrada a identidade de situações fáticas com soluções jurídicas diversas, sendo a finalidade dos embargos de divergência a uniformização da jurisprudência desta Corte, ra-zão pela qual não podem ser utilizados como nova via recursal, visando corrigir eventual equívoco ou controvérsia advinda do julgamento do pró-prio recurso especial, sobretudo no que concerne ao acerto ou desacerto na aplicação de regra técnica de conhecimento.

2. Inexistindo similitude fática entre o acórdão recorrido e o trazido como paradigma, não há como processar os embargos de divergência.

3. Ademais, ambas as Turmas da 2ª Seção desta Corte Superior têm contem-porizado o rigor formal do testamento, reputando-o válido sempre que en-

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cerrar a real vontade do testador, manifestada de modo livre e consciente, como reconhecido pelo acórdão recorrido, circunstância que faz incidir o óbice da Súmula nº 168/STJ.

4. Agravo regimental desprovido.

Alega o embargante que o acórdão foi omisso em relação à dúvida externada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo no acórdão recorrido acer-ca da real vontade da falecida.

Ademais, aduz que o decisum embargado também incorreu em omis-são “quanto à dúvida levantada pelo Eminente Ministro Antônio Carlos Ferreira, na MC 21.162/SP” (e-STJ, fl. 1.842), ocasião em que, “diante das incertezas presentes nos autos, inclusive afirmou que ‘o acórdão recorrido, em princípio, afigura-se em consonância com a jurisprudência desta Corte’, tese esta defendida pelo ora embargante” (e-STJ, fl. 1.843).

Conclui, dessa forma, que “a simples presença de decisões judiciais, que levantaram dúvidas quanto à real intenção da falecida, afasta o adjetivo ‘inequívoco’ necessário para possibilitar a flexibilização das regras previstas no Código Civil para o testamento, conforme estabelecido pela jurisprudên-cia deste E. STJ” (e-STJ, fl. 1.844).

Busca, assim, “seja sanada a omissão ora apontada, reformando-se o v. Acórdão embargado, para que seja dado provimento ao agravo regi-mental, determinando-se o processamento e julgamento dos embargos de divergência, com o seu consequente provimento, restabelecendo o v. Acór-dão proferido em sede de recurso de apelação, julgando-se totalmente pro-cedentes os pedidos iniciais, por inteira justiça e adequação legal” (e-STJ, fl. 1.845).

É o relatório.

voto

O Senhor Ministro Marco Aurélio Bellizze (Relator):

Na parte que interessa, o acórdão embargado está assim fundamen-tado:

Em relação ao REsp 294.691/PR, o agravante, nas razões dos embargos de divergência, consignou que o referido acórdão paradigma optou por en-tendimento oposto ao do decisum embargado, pois entendeu que se tra-ta “de requisito essencial a presença das testemunhas em todo ato, sendo

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nulo todo e qualquer ato que não observar tal formalidade, nos termos do art. 1.632 do Código Civil”.

No presente agravo regimental, complementou o agravante que a mesma peculiaridade observada naquele feito ocorreu neste, isto é, as testemunhas instrumentárias não presenciaram o ato de lavratura do testamento público, configurando, assim, a divergência.

Não obstante os substanciosos argumentos, entendo que o referido acórdão também não serve como paradigma, pois ausente a necessária similitude fática com o acórdão recorrido.

Com efeito, conforme afirmei na decisão agravada, da leitura do inteiro teor do referido decisum , constata-se que a questão foi decidida com base nas peculiaridades do caso concreto, tanto que o saudoso Ministro Relator Menezes Direito, em seu voto, consignou ser “certo que muitas circunstân-cias de caráter excepcional podem conduzir a uma decisão que privilegie a intenção do testador. Mas, de todos os modos, a forma como posta a ques-tão pelo acórdão recorrido não pode deixar de descobrir que houve a literal violação de lei, impondo-se a procedência da rescisória”.

No presente caso, contudo, a Quarta Turma desta Corte concluiu justamen-te pela presença de circunstâncias excepcionais que justificaram a preva-lência da vontade da testadora, em detrimento de alguns requisitos formais.

Veja-se, por oportuno, trecho do acórdão recorrido nesse sentido (e-STJ, fls. 1.628-1.632):

A declaração de nulidade do testamento deixado pela Sra. Cleusa tra- duzir-se-ia em resultado antagônico àquele que ela desejava e mani- festou na oportunidade de sua lavratura. Com efeito, mostra-se ine- quívoco que, por motivos que não importa aqui indagar, almejou excluir o esposo de sua sucessão, beneficiando apenas aqueles que indicou no ato de disposição de vontade.

Em suma, o apego desmedido às formalidades legais previstas para a elaboração de um testamento (que, em última instância, têm por escopo a preservação da vontade do falecido) importaria, no caso sob exame, contrariar frontalmente o sentido da lei e o desejo da testadora.

De se dizer que não se trata de deixar de aplicar a lei – as disposições que regem as formalidades do testamento –, mas, efetivamente, atribuir-lhe a interpretação que melhor se harmoniza com as demais normas e princípio que regem a sucessão testamentária, dentre as quais, em especial, a máxima preservação da vontade do testador e a orientação contida no art. 1.666 do Código Civil revogado (reproduzido, ipsis literis, no art. 1.899 da lei civil vigente), segundo o qual:

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‘Art. 1.666. Quando a cláusula testamentária for suscetível de inter-pretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador.’

Com essa premissa, esta Corte Superior tem frequentemente afastado o ri-gorismo da lei quando ele confronta com a vontade do testador falecido, reconhecendo a validade de disposição testamentária que, conquanto não observe determinadas formalidades legais, atinge sua finalidade precípua, sobretudo quando, como no caso presente, sequer se cogita de falta de li-berdade ou debilidade mental da testadora.

[...]

Ainda na análise do caso concreto, a propósito da preservação da vonta-de, da liberdade e do perfeito estado das faculdades mentais da testadora (questões sobre as quais o tribunal de apelação não se aprofundou), o juiz de primeiro grau, aquele que mais se aproximou da colheita das provas, explicitou raciocínio lógico e coerente para robustecer seu julgamento, exa-rando fundamentação que não sucumbe à argumentação do agravado, esta exclusivamente apegada à transgressão dos requisitos formais.

Confira-se (e-STJ, fls. 785 e ss.):

‘Nesta oportunidade, após a colheita da prova oral, pode-se afirmar categoricamente que nenhuma testemunha levantou dúvida quanto a higidez mental da testadora. Sequer indícios desta condição foram arguidos.

Tampouco houve qualquer menção à falta de livre manifestação de vontade da testadora no momento da disposição de seus bens ou mesmo posteriormente.

Por outro lado, na mesma esteira da proteção da manifestação livre da vontade, estabelece o art. 1.858 que o testamento é ato personalíssimo, podendo ser mudado a qualquer tempo, proibido o testamento conjuntivo, seja simultâneo, recíproco ou correspectivo (art. 1.863).

[...]

E nesse passo, não há qualquer indicio de que a testadora não estivesse em seu perfeito juízo no ato de testar e, mais importante, que sua vontade estivesse de qualquer forma viciada.

Vale anotar novamente que as testemunhas ouvidas em nenhum momento colocaram dúvida na capacidade de testar da falecida, tam-pouco que sua vontade estivesse de qualquer modo viciada.

Não há nos autos o menor indício de tal circunstância. Há sim, ao me-nos no sentir deste julgador, a certeza do atendimento da vontade da

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testadora, não só diante da falta de prova do vício de vontade, mas pelo fato do transcurso de tempo entre o ato de testar e seu falecimento. Decorreu tempo demais entre esses dois momentos. Foram 16 (dezesseis!) anos. E tempo mais que suficiente para, se o quisesse, pôr por terra o que testara, se realmente em desacordo com sua vontade estivesse.

Como já observado antes por este juízo, salta aos olhos que a testadora por vontade própria excluiu o cônjuge – autor da herança que eventualmente poderia lhe advir com o falecimento.

E isso porque, novamente como já apontado, conforme alegado pelos réus em suas defesas, o testamento foi firmado em 08 de outubro de 1.986 (fl. 52), transcorridos pouco mais de 02 anos do casamento com o autor, convoladas núpcias em 21 de janeiro de 1.984 (fl. 49). Seu passamento se deu em 24 de agosto de 2002 (fl. 50), ou seja, quase 16 anos após a feitura do testamento.

De se perguntar: estando a falecida em seu perfeito juízo (nada foi alegado em contrário) ao testar, permanecida casada por 16 anos com o autor, porque não teria então revogado o testamento ou o alterado para contemplar seu cônjuge, posto que conforme visto, é o testamento ato personalíssimo, podendo ser mudado a qualquer tempo?’

De se dizer que, eventual vício da manifestação de vontade (e não, apenas, no que diz respeito às formalidades concernentes às testemunhas instru-mentárias) deveria ser alegado e provado pelo autor-agravado, observando o critério de distribuição do ônus probatório ditado pelo art. 333, I, do CPC.

Neste caso, o que se constata é uma mera irregularidade (praticada, diga-se, por um delegatário da atividade estatal – o Tabelião), que todavia não compromete a higidez do ato. Não se demonstrou, sequer cogitou, o intento deliberado da prática de fraude, visando a escamotear norma legal cogente.

Seria, destarte, insensata a decretação de nulidade da escritura tão somente em razão desse fato – que merece censura, não há dúvida –, pois disso sobreviria resultado contrário àquele desejado pela testadora e pela lei.

No ponto, mais uma vez andou bem o julgador de piso:

‘Parece não haver dúvida que o Cartório onde elaborado o testamento púbico era conduzido por um Notário que não se preocupava em nada com as formalidades legais dos atos que ali e sob sua responsabilidade eram praticados.

Era omisso e descumpridor dos seus deveres funcionais, segundo atestam as testemunhas ouvidas (fls. 462/469).

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Nesse ponto vale indagar: mostra-se justo anular um ato de tamanha importância (vontade de pessoa já extinta) por eventual desrespeito meramente à forma, mas não ao conteúdo, a que não deu causa?’

Como visto, enquanto no referido aresto paradigma, a forma como posta a questão no decisum estadual não deixou outra opção a não ser reconhecer a violação do dispositivo legal invocado, no acórdão recorrido entendeu-se que os fatos narrados nos autos demonstraram, de forma inequívoca, a von-tade da testadora, adotando a Quarta Turma desta Corte os fundamentos do Juízo de primeiro grau, em detrimento daqueles consignados pelo Tribunal de origem.

Dessa forma, é de se concluir pela ausência de similitude fática entre os arestos a viabilizar o processamento dos embargos de divergência.

Nota-se, assim, que não foi acolhido o processamento dos embargos de divergência por ausência de similitude fática entre os arestos confronta-dos. Isso porque, conforme visto acima, enquanto no acórdão paradigma a forma como posta a questão no decisum estadual não deixou outra opção a não ser reconhecer a violação do dispositivo legal invocado, anulando-se o testamento, no acórdão recorrido a Quarta Turma do STJ entendeu que os fatos narrados demonstraram, de forma inequívoca, a vontade da testadora, adotando-se os fundamentos do Juízo de primeiro grau, em detrimento da-queles consignados pelo Tribunal estadual.

Diante desses fundamentos, não cabe a esta Segunda Seção analisar acerca da dúvida externada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo em rela-ção à real vontade da falecida, sobretudo porque os embargos de divergên-cia não foram admitidos. Relembre-se que essa análise foi feita pela Quarta Turma desta Corte, ao concluir pela demonstração inequívoca da vontade da falecida, culminando com a reforma do acórdão estadual. Somente se os presentes embargos de divergência fossem processados é que, em tese, seria possível imiscuir-se em tal matéria.

Da mesma forma, também revela-se completamente despiciendo o exame dos fundamentos utilizados pelo Ministro Antonio Carlos Ferreira, por ocasião do indeferimento da liminar na MC 21.162/SP, máxime porque tratava-se de juízo perfunctório, o qual, inclusive, foi reformado quando do julgamento do recurso especial, objeto dos presentes embargos.

Por tais razões, verifica-se a ausência de qualquer omissão no acór-dão embargado, revelando-se o intuito do embargante apenas em tentar re-discutir as questões já julgadas, o que não se admite na via dos aclaratórios.

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Por fim, faz-se necessário examinar a petição de fls. 1852-1873 (e-STJ), em que Romeu Pires, ora embargante, afirma que há matéria de or-dem pública, cognoscível de ofício, que deve ser analisada por esta Corte.

Afirma o recorrente que “apenas possui legitimidade passiva no pre-sente caso a Sra. Liria Bernardes”, pois “o testamento objeto da lide é suces-sivo e exclusivo, ou seja, Liria Bernardes receberia a integralidade dos bens se sobrevivesse à testadora; se Liria morresse antes da testadora, os bens iriam todos para Sebastião; caso ambos já houvessem falecido, e apenas nesta hipótese, os bens iriam para Victor Bernardes da Silva Neto” (e-STJ, fl. 1.853).

Assim, aduz que “como Liria Bernardes sobreviveu à testadora, em se mantendo a validade do testamento, esta – e apenas esta – herdou todos os bens, não havendo que se falar em legitimidade dos demais para pleitear a validade do instrumento” (e-STJ, fl. 1.853).

Reforça que “a questão é de fácil percepção, bastando analisar a pró-pria petição inicial para se concluir que o autor (ora embargante) propôs a demanda justamente contra a Sra. Liria Bernardes, esta ainda em vida, para buscar o reconhecimento da nulidade do testamento deixado por sua falecida esposa” (e-STJ, fl. 1.853), consignando, ainda, que, “apesar de indi-cado ao polo passivo os três beneficiários apontados no testamento objeto da lide, apenas a primeira possuía legitimidade passiva, pois o fato de ter sobrevivido à testadora descaracterizou as demais disposições, que eram condicionais” (e-STJ, fl. 1.853).

Feita essa digressão, Romeu Pires sustenta que o agravo em recurso especial não podia nem sequer ser conhecido, pois a Sra. Liria Bernardes não estava devidamente representada nos autos por advogado regularmente constituído. Para tanto, enumera os seguintes fatos:

21 – Na petição de fls. e-STJ 1031, o advogado, ao juntar a procuração, jus-tifica que Liria Bernardes já havia falecido, porém era representada no ato pelo seu inventariante, Sebastião Bernardes da Silva, que por sua vez era representado por sua curadora.

22 – A procuração de fls. e-STJ 1033 foi outorgada apenas em nome pró-prio de Sebastião Bernardes da Silva, Glória Aparecida Campos Mura (cura-dora) e Victor Bernardes da Silva Neto, não havendo qualquer menção de que o mesmo outorgava o mandato também em nome de Liria Bernardes.

23 – Em tal instrumento de mandato, outorgou-se poderes aos advogados Eduardo Bichir Cassis e Luís Felipe Belmonte dos Santos.

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24 – Não acostou aos autos o atestado de óbito de Liria Bernardes e tam-pouco o termo de nomeação de inventariante, de modo que, ainda que a procuração fosse outorgada em nome da falecida, não comprovou poderes para representá-la (fato que persiste até agora).

25 – Como a procuração não fora assinada por Liria Bernardes, e tampou-co por seu representante legal, tem-se que a procuração originária (fls. e-STJ 138) pela mesma outorgada aos Dr. Gilberto Barreta (OAB/SP 27450) e José Vinha Filho (OAB/SP 62620) jamais fora revogada, seja pela outorga de substabelecimento, seja pela revogação tácita por constituição de novos causídicos.

26 – Persistem então como seus patronos referidos profissionais.

27 – Da petição de Recurso Especial e também do Recurso de Agravo de Instrumento, não se verifica a assinatura de qualquer dos patronos da Sra. Liria Bernardes, mas apenas os posteriormente constituídos pelas demais (ilegítimas) partes.

28 – Por conseguinte, Liria Bernardes, única interessada na reforma do jul-gado, não está representada nos autos.

29 – É certo também que esta Corte não admite posterior retificação da re-presentação, devendo a condição ser provada no ato da interposição do Re-curso. Ainda, ad argumentandum tantum, a última procuração fora firmada em fevereiro de 2012, e o Agravo de Instrumento em Recurso Especial foi protocolado em fevereiro de 2013, um ano depois, tempo suficiente para a regularização da representação processual – se fosse o caso.

30 – Logo, atinge-se a segunda conclusão: Liria Bernardes não está repre-sentada nesta Corte pelos advogados subscritores do REsp e do AREsp.

31 – A conferência da representação processual é rigorosamente efetuada por este Sodalício quando da propositura de qualquer recurso ou petição incidental, não havendo que se falar em revolvimento da matéria fático--probatória também para apurar esta questão na presente esfera recursal.

32 – Finalmente, é certo que Sebastião Bernardes faleceu em 03.12.2012, antes ainda da interposição do Agravo de Instrumento dirigido a este Egré-gio STJ, o que leva também ao não conhecimento do recurso, tendo em vista que não houve regularização processual quando da interposição do referido recurso.

33 – Logo, ainda que se entendesse que Liria Bernardes outorgou procu-ração aos novos causídicos, é certo que sua representação dependia de

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Sebastião Bernardes, pois este afirmara que a representou por ser inventa-riante.

34 – Com o falecimento do segundo, a procuração outrora outorgada – de Liria e Sebastião – perdeu sua validade, sendo obrigação da parte regulari-zar sua representação processual nos moldes da legislação processual em vigor (art. 13 do CPC).

35 – Em suma: Liria Bernardes não outorgou procuração aos novos causí-dicos, tendo Sebastião Bernardes o feito em nome próprio; ainda que Liria tivesse nomeado novos patronos, com a morte de seu pretenso (não com-provado) inventariante, a procuração pereceu.

36 – Sob qualquer ótica, a mesma (e o próprio Sebastião) não está(ão) representada(os) no AREsp.

Busca, assim, “seja reconhecida a inexistência dos atos praticados por procurador não constituído (todas as petições a partir do próprio AREsp, inclusive), nos moldes da Súmula nº 115/STJ, revogando-se as decisões de mérito proferidas até o presente momento, inclusive o acórdão objeto da divergência, não conhecendo do Agravo de Instrumento interposto por Liria Bernardes, nos moldes da fundamentação supra, mantendo-se incólume o acórdão proferido pela Instância a quo (e-STJ, fl. 1.856).

O presente requerimento, contudo, não merece prosperar.

Como visto, para fundamentar sua alegação, o requerente partiu da premissa de que somente a Sra. Liria Bernardes era parte legítima para figu-rar no polo passivo da demanda, porquanto o testamento objeto da lide era sucessivo e exclusivo, isto é, somente “se Liria morresse antes da testadora, os bens iriam todos para Sebastião; caso ambos já houvessem falecido, e apenas nesta hipótese, os bens iriam para Victor Bernardes da Silva Neto” (e-STJ, fl. 1.853).

Ocorre que essa questão não foi objeto de análise em nenhum mo-mento nas instâncias ordinárias, tampouco no acórdão embargado proferi-do pela Quarta Turma desta Corte. Em outras palavras, nada foi decidido acerca da forma em que se deu o testamento, ou seja, se sucessivo e ex-clusivo, como alega o recorrente, ou se em benefício de todos em con-junto; tampouco se reconheceu a legitimidade passiva apenas da Sra. Liria Bernardes, excluindo a dos demais, circunstância que impossibilita a aná-lise da questão neste momento processual, não havendo que se falar em matéria de ordem pública.

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Assim, somente se no acórdão objeto dos embargos de divergência ficasse decidido expressamente que a Sra. Liria Bernardes era a única parte legítima para figurar no polo passivo da demanda, reconhecendo a ilegiti-midade do Sr. Sebastião e do Sr. Victor, e ficasse comprovado que a mesma não possuía representação nos autos por ocasião da interposição do recurso especial, é que seria possível discutir a aplicação da Súmula nº 115/STJ, como pretende o recorrente, o que, todavia, não ocorreu na espécie.

Feitas essas considerações, revela-se manifestamente inoportuno e in-tempestivo o argumento, apenas neste momento processual, de que “Liria Bernardes herdou todos os bens, passando o testamento a não gerar quais-quer direitos aos demais mencionados, por não implementação da condi-ção imposta (falecimento anterior)” (e-STJ, fl. 1.854), não obstante os três beneficiários do testamento tenham figurado no polo passivo da demanda, desde a petição inicial.

O recorrente tenta, a qualquer custo, modificar a decisão proferida por esta Corte que reconheceu a validade do testamento, inclusive trazendo matéria que não foi objeto de arguição das partes e nem de análise nos jul-gamentos anteriores, o que se revela de todo incabível.

Por essas razões, impõe-se advertir que a oposição de novos embar-gos de declaração de cunho protelatório ensejará a aplicação de multa, nos termos do art. 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil.

Ante o exposto, rejeito os embargos de declaração.

É como voto.

Certidão de JulgAmeNto seguNdA seção

Processo Eletrônico EDcl-AgRg-EAREsp 365.011/ P

Número Registro: 2013/0209478-6

Números Origem: 0005899392007 00058993920078260032 0320120070058995 125107 1362004 320120070058995 365011 56243549 5624354900 5899392007 58993920078260032 990101352290

Em Mesa Julgado: 25.02.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Marco Aurélio Bellizze

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Raul Araújo

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Maurício Vieira Bracks

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Secretária: Belª Ana Elisa de Almeida Kirjner

AutuAção

Embargante: Romeu Pires

Advogados: Olavo Zampol Roberto Koenigkan Marques e outro(s) Renato Ribeiro do Valle e outro(s) Marcos Von Glehn Herkenhof e outro(s) Fernanda Zampol Loberto Filipe Panace Menino

Embargado: Líria Bernardes e outros

Advogado: Douglas de Oliveira Santos e outro(s)

Assunto: Direito civil – Sucessões – Nulidade e anulação de testamento

embArgos de deClArAção

Embargante: Romeu Pires

Advogados: Olavo Zampol Roberto Koenigkan Marques e outro(s) Renato Ribeiro do Valle e outro(s) Marcos Von Glehn Herkenhof e outro(s) Fernanda Zampol Loberto Filipe Panace Menino

Embargado: Líria Bernardes e outros

Advogado: Douglas de Oliveira Santos e outro(s)

Certidão

Certifico que a egrégia Segunda Seção, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Seção, por unanimidade, rejeitou os embargos de declaração, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão, Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Jurisprudência

8615

Superior Tribunal de JustiçaAgRg na Ação Rescisória nº 3.913 – RN (2008/0020790‑0)Relator: Ministro Rogerio Schietti CruzAgravante: Antônio Barbosa de OliveiraAgravante: Maria Lúcia Barbosa de OliveiraAgravante: Severina Barbosa de OliveiraAgravante: Maria Astécia Medeiros de OliveiraAgravante: Edilberto José de MedeirosAgravante: Eliane Maria de Medeiros Oliveira SantosAdvogado: José Maria Gama da Camara e outro(s)Agravado: Instituto Nacional do Seguro SocialProcurador: Procuradoria‑Geral Federal – PGF

emeNtA

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO RESCISÓRIA – CÁLCULO DE LIQUIDAÇÃO EM DESACORDO COM O TÍTULO EXEQUENDO – POSSIBILIDADE DE CORREÇÃO A QUALQUER TEMPO – INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DA LITERALIDADE DA LEI – PROVIMENTO NEGADO

1. Segundo a pacífica jurisprudência desta Corte, é possível a corre-ção da conta de liquidação na hipótese em que a memória de cálculo apresentada pela parte exequente está em desacordo com o comando expresso no título judicial exequendo, sem que isso implique viola-ção da coisa julgada. Precedentes.

2. Hipótese em que o cálculo de liquidação não estava perfeitamente adequado à metodologia definida na sentença, que determinou o re-ajuste dos valores do benefício, desde a primeira renda mensal, com aplicação, no primeiro reajuste, do índice integral da política salarial.

3. Possibilidade de retificação dos cálculos, ainda que acobertados pela coisa julgada, para ajustá-los ao comando expresso na sentença.

4. Agravo regimental não provido.

ACórdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Seção, por unanimidade, negar provimen-

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to ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Nefi Cordeiro, Gurgel de Faria, Reynaldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas, Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP), Felix Fischer e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Jorge Mussi. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior.

Brasília (DF), 25 de fevereiro de 2016.

Ministro Rogerio Schietti Cruz

relAtório

O Senhor Ministro Rogerio Schietti Cruz:

Antônio Barbosa de Oliveira e outros agravam de decisão monocráti-ca na qual, com fundamento nos arts. 34, XVIII, do RISTJ, julguei improce-dente o pedido formulado na ação rescisória, por inexistir a alegada afron-ta à literalidade dos dispositivos legais invocados, porquanto entende esta Corte Superior que é possível a correção de erro de cálculo, que não transita em julgado, segundo os ditames do art. 463, I, do CPC, na hipótese em que a planilha apresentada utiliza critérios diversos daqueles estabelecidos na sentença exequenda.

Afirmam os agravantes, em síntese, que “a fase de tramitação do processo originário não estava dependendo de sentença e, por conse-quência, tal decisão inexiste, impossibilitando qualquer averiguação sobre a ocorrência de erro material dentro do contexto de que dispõe o art. 463, I, do CPC” (fl. 261).

Defende que o erro material deve ser aferido tão somente em senten-ça ou até mesmo em acórdão, mas “o caso que deu origem à ação rescisória se prende a cálculos de execução de sentença por quantia certa, o que, ob-viamente, não se coaduna com a regra delineada pelo art. 463, I, do CPC” (fl. 261).

Requer a reconsideração da decisão agravada ou o processamento do agravo regimental perante o órgão colegiado.

emeNtA

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NA AÇÃO RESCISÓRIA – CÁLCULO DE LIQUIDAÇÃO EM DESACORDO COM O TÍTULO EXEQUENDO – POSSIBILIDADE DE

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CORREÇÃO A QUALQUER TEMPO – INEXISTÊNCIA DE VIOLAÇÃO DA LITERALIDADE DA LEI – PROVIMENTO NEGADO

1. Segundo a pacífica jurisprudência desta Corte, é possível a corre-ção da conta de liquidação na hipótese em que a memória de cálculo apresentada pela parte exequente está em desacordo com o comando expresso no título judicial exequendo, sem que isso implique viola-ção da coisa julgada. Precedentes.

2. Hipótese em que o cálculo de liquidação não estava perfeitamente adequado à metodologia definida na sentença, que determinou o re-ajuste dos valores do benefício, desde a primeira renda mensal, com aplicação, no primeiro reajuste, do índice integral da política salarial.

3. Possibilidade de retificação dos cálculos, ainda que acobertados pela coisa julgada, para ajustá-los ao comando expresso na sentença.

4. Agravo regimental não provido.

voto

O Senhor Ministro Rogerio Schietti Cruz (Relator):

A parte agravante não trouxe nenhum argumento novo capaz de infir-mar os fundamentos da decisão agravada, que deve ser integralmente con-firmada.

Conforme salientado na decisão agravada, “o vocábulo ‘literal’ in-serto no inciso V do art. 485 revela a exigência de que a afronta deve ser tamanha que contrarie a lei em sua literalidade. Em contraposição, quando o texto legal dá ensejo a mais de uma exegese, não é possível desconstituir o julgado proferido à luz de qualquer uma das interpretações plausíveis” (SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação resci-sória. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 829).

No caso vertente, inexiste a alegada afronta à literalidade dos dispo-sitivos legais invocados, porquanto entende esta Corte Superior que é possí-vel a correção de erro de cálculo, que não transita em julgado, segundo os ditames do art. 463, I, do CPC.

A possibilidade de correção do erro de cálculo, a qualquer tempo, aplica-se, por óbvio, aos cálculos realizados na fase de execução de senten-ça, sobretudo na hipótese em que a memória de cálculo apresentada pela

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parte exequente está em desacordo com a metodologia definida no título judicial exequendo, sem que isso implique violação da coisa julgada.

Desse entendimento não destoa o acórdão rescindendo, ao estabe-lecer: “fixado na sentença o reajuste dos valores do benefício, desde a pri-meira renda mensal, com aplicação, no primeiro reajuste, do índice integral da política salarial, tal critério deve ser observado, cabendo a retificação dos cálculos, ainda que acobertados pela coisa julgada, para ajustá-los ao comando expresso na sentença” (destaquei).

Confiram-se, a propósito, os seguintes precedentes:

[...] Consoante a jurisprudência deste Sodalício, observando-se a norma in-serta no art. 463, I, do CPC, os erros de cálculo são passíveis de correção em qualquer tempo, de ofício ou a requerimento da parte, sem que isso importe em violação a coisa julgada, quando constatadas inconsistências de ordem material na elaboração dos cálculos, com a efetiva necessidade de correção, de maneira a afastar qualquer indício de enriquecimento sem causa pelo recebimento de valores acima dos realmente devidos. (AgRg--AREsp 113.266/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª T., DJe 06.11.2015)

[...] A regra prescrita no art. 463, I, do CPC é clara em permitir a correção de inexatidões materiais ou retificação de erros de cálculo a qualquer tem-po, sem implicar ofensa à coisa julgada ou à preclusão. Precedentes. (AgRg--AREsp 402.188/RS, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., DJe 14.11.2013)

[...] A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça acolhe a possibilidade de correção da conta de liquidação, a qualquer tempo, na hipótese de erro material ou de desrespeito ao comando expresso na sentença, sem que isso implique contrariedade à coisa julgada. (AgRg-REsp 636.567/RN, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, 5ª T., DJe 05.05.2008)

[...] A jurisprudência consolidada do STJ possui o entendimento de que a correção de erro material disciplinado pelo art. 463 do CPC não se sujeita aos institutos da preclusão e da coisa julgada, porquanto constitui matéria de ordem pública cognoscível de ofício pelo magistrado. (EDcl-AgRg-AgRg--Ag 1.119.026/SP, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., DJe 10.06.2011)

[...] 1. A homologação dos cálculos não os torna imunes de impugnação quando verificado erro material, pois é cediço nesta Corte que “o erro ma-terial não transita em julgado, podendo ser corrigido a qualquer tempo pelo juiz ou Tribunal de onde se originou a decisão” (REsp 545292, Relª Min. Eliana Calmon, DJ de 24.11.2003).

2. Deveras, não obstante a liquidação não possa se afastar do julgado, os cálculos que infringem esse preceito, posto basearem-se em premissas fal-

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sas, são corrigíveis como erros materiais. Aliás, não foi outra razão que a lei estabeleceu que o juiz e, a fortiori, os tribunais, podem rever decisões judiciais em embargos de declaração ou quando instados a verificação de “erros materiais”, esses em qualquer prazo, o que afasta a alegada re-lativização da coisa julgada, que, mercê de violentar a segurança jurídica constitucional atenta contra um dos pilares da Jurisdição que distingue e caracteriza o Poder Judiciário. (REsp 694.374/PE, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª T., DJ 28.11.2005)

À vista do exposto, nego provimento ao agravo regimental.

Certidão de JulgAmeNto terCeirA seção

Processo Eletrônico AgRg-AR 3.913/RN

Número Registro: 2008/0020790-0

Números Origem: 13702 200300143800 20520 9205067849 9805518680

Em Mesa Julgado: 25.02.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Rogerio Schietti Cruz

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior

Subprocuradora-Geral da República: Exma. Sra. Dra. Zélia Oliveira Gomes

Secretário: Bel. Gilberto Ferreira Costa

AutuAção

Autor: Antônio Barbosa de Oliveira

Autor: Maria Lúcia Barbosa de Oliveira

Autor: Severina Barbosa de Oliveira

Autor: Maria Astécia Medeiros de Oliveira

Autor: Edilberto José de Medeiros

Autor: Eliane Maria de Medeiros Oliveira Santos

Advogado: José Maria Gama da Camara e outro(s)

Réu: Instituto Nacional do Seguro Social

Procurador: Procuradoria-Geral Federal – PGF

Assunto: Direito previdenciário – RMI – Renda Mensal Inicial, reajustes e revisões específicas

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AgrAvo regimeNtAl

Agravante: Antônio Barbosa de Oliveira

Agravante: Maria Lúcia Barbosa de Oliveira

Agravante: Severina Barbosa de Oliveira

Agravante: Maria Astécia Medeiros de Oliveira

Agravante: Edilberto José de Medeiros

Agravante: Eliane Maria de Medeiros Oliveira Santos

Advogado: José Maria Gama da Camara e outro(s)

Agravado: Instituto Nacional do Seguro Social

Procurador: Procuradoria-Geral Federal – PGF

Certidão

Certifico que a egrégia Terceira Seção, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Terceira Seção, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimen-tal, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Nefi Cordeiro, Gurgel de Faria, Reynaldo Soares da Fonseca, Ribeiro Dantas, Ericson Maranho (Desembargador convocado do TJ/SP), Felix Fischer e Maria Thereza de Assis Moura votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Jorge Mussi.

Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Sebastião Reis Júnior.

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Parte Geral – Jurisprudência

8616

Superior Tribunal de JustiçaConflito de Competência nº 142.726 – GO (2015/0207184‑8)Relator: Ministro Marco BuzziSuscitante: Nutrisal Ind. Com. Suplementos p/ Alimentação Animal Ltda.Suscitante: Fabio Girotto RibeiroSuscitante: Fausto Girotto RibeiroAdvogado: Joslaine Fábia de Andrade e outro(s)Suscitado: Juízo de Direito da 2ª Vara Cível de Rio Verde/GOSuscitado: Juízo de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SPInteres.: Banco ABC Brasil S/AAdvogado: Marcelo Alexandre Lopes e outro(s)

emeNtA

CONFLITO DE COMPETÊNCIA – DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO AJUIZADA EM FACE DE SÓCIOS-AVALISTAS DE PESSOA JURÍDICA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL – SUSPENSÃO DA AÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – AUTONOMIA DAS OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS NO TÍTULO DE CRÉDITO – PRECEDENTES DO STJ

1. O disposto no art. 49, § 1º, da Lei nº 11.101/2005, prevê que os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (REsp 1.333.349/SP, DJe 02.02.2015).

2. A exceção prevista no art. 6º, da Lei de Falências somente alcança os sócios solidários, presentes naqueles tipos societários (em nome coletivo) na qual a responsabilidade pessoal dos associados não é limitada às suas respectivas quotas/ações.

3. O deferimento do pedido de recuperação judicial não obsta o pros-seguimento de eventual execução movida em face de seus respecti-vos avalistas, tendo em vista o caráter autônomo da garantia cambiá-ria oferecida. Precedentes do STJ.

4. Conflito conhecido para declarar o prosseguimento da execução da cédula de crédito bancária junto ao Juiz de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP.

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ACórdão

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do conflito de competência para declarar o prosseguimento da execução da cédula de crédito bancária nº 2127312 junto ao Juiz de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP, julgando prejudicado o agravo regimental interposto às fls. 236/242 (e-STJ), nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão, Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília (DF), 24 de fevereiro de 2016 (data do Julgamento).

Ministro Raul Araújo Presidente

Ministro Marco Buzzi Relator

relAtório

Exmo. Sr. Ministro Marco Buzzi:

Trata-se de conflito positivo de competência instaurado por Nutri-sal Indústria e Comércio de Suplementos para Alimentação Animal Ltda. e Outros, apontando como suscitados o Juízo de Direito da 2ª Vara Cível de Rio Verde/GO, onde se processa a recuperação judicial da suscitante e o Juízo da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP, no qual tramita a execução de cédula de crédito rural ajuizada pelo Banco ABC Brasil S/A, ora interessado.

Sustentam, em suma, que, em 23 de abril de 2014, foi deferido o pe-dido de soerguimento em favor da sociedade empresarial pelo juízo goiano (fls. 197/211, e-STJ), todavia, a casa bancária ajuizou uma ação de execu-ção (Processo nº 1068873-41.2014.8.26.0100), em face das pessoas físicas que avalizaram o título cambiário: os sócios da empresa recuperanda e de suas esposas (Virginia Ferreira Rodrigues Carneiro Girotto e Raquel Ferreira Guimarães).

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Narram, também, que a instituição financeira busca a satisfação do débito oriundo da cédula de crédito nº 2127312, no valor originário de R$ 1.500.000,00, garantida originalmente por 1.944,46 toneladas de soja a granel, que deveria ter sido paga em 04 parcelas.

Defendem, ainda, que “o plano de recuperação da empresa já foi apresentado e nele consta o arrolamento do presente débito no rol de credo-res. Além disso, o próprio Administrador Judicial da empresa, em manifes-tação coligida na Impugnação de Crédito oposta pelo Banco ABC entendeu pela permanência desses haveres na classe de credores com garantia real” (fl. 05, e-STJ).

Informam, por fim, que o Juízo da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo, nos autos da ação executiva, deferiu inaudita altera pars o arresto dos imóveis indicados pelo exequente na petição inicial.

Requereram, assim, liminarmente, o cancelamento dos leilões de-signados pelo Juízo de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP e, no mérito, pleitearam a declaração da competência do juízo da recuperação judicial.

O pedido liminar foi indeferido nos termos da decisão juntada às fls. 216/221 (e-STJ).

Impugnação apresentada pela casa bancária às fls. 256/344 (e-STJ).

O Juízo de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP, por ofício juntado às fls. 359/363 (e-STJ), prestou informações, noticiando que a exceção de pré-executividade apresentada pelos executados não foi acolhida.

O Ministério Público Federal, no parecer de fls. 364/371 (e-STJ), opi-nou pelo conhecimento do conflito e, no mérito, pelo prosseguimento da execução junto ao juízo paulista, afastando, por conseguinte, a vis atractiva do juízo recuperacional.

É o relatório.

emeNtA

CONFLITO DE COMPETÊNCIA – DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO AJUIZADA EM FACE DE SÓCIOS-AVALISTAS DE PESSOA JURÍDICA EM RECUPERAÇÃO

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JUDICIAL – SUSPENSÃO DA AÇÃO – IMPOSSIBILIDADE – AUTONOMIA DAS OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS NO TÍTULO DE CRÉDITO – PRECEDENTES DO STJ

1. O disposto no art. 49, § 1º, da Lei nº 11.101/2005, prevê que os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso (REsp 1.333.349/SP, DJe 02.02.2015)

2. A exceção prevista no art. 6º, da Lei de Falências somente alcança os sócios solidários, presentes naqueles tipos societários (em nome coletivo) na qual a responsabilidade pessoal dos associados não é limitada às suas respectivas quotas/ações.

3. O deferimento do pedido de recuperação judicial não obsta o pros-seguimento de eventual execução movida em face de seus respecti-vos avalistas, tendo em vista o caráter autônomo da garantia cambiá-ria oferecida. Precedentes do STJ.

4. Conflito conhecido para declarar o prosseguimento da execução da cédula de crédito bancária junto ao Juiz de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP.

voto

Exmo. Sr. Ministro Marco Buzzi (Relator):

Inicialmente, destaca-se a competência deste Superior Tribunal de Justiça para o conhecimento e processamento do presente conflito, uma vez que envolve juízos vinculados a Tribunais diversos, nos termos do que dispõe o art. 105, I, d, da Constituição Federal.

1. Examinando os autos, observa-se que o processo executivo não foi ajuizado contra a empresa recuperanda Nutrisal Ltda., mas em face dos avalistas da cédula de crédito rural por ela firmada junto ao Banco ABC Brasil S/A.

É, aliás, o que se extrai do seguinte excerto da petição inicial do pro-cesso executivo (fls. 98/99, e-STJ):

Banco ABC Brasil S/A, estabelecido na cidade de São Paulo, SP, na Av. Pres. Juscelino Kubitschek, nº 1400, 4º andar, inscrito no CNPJ sob o nº XXXX (“Banco ABC”), vem, por seus advogados abaixo assinados, re-gularmente constituídos (docs. 1/2), com fundamento nos arts. 585, VIII, e 615, III do CPC, propor execução por título extrajudicial com pedido limi-

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nar, contra (1) Fábio Girotto Ribeiro, brasileiro, empresário, casado, resi-dente e domiciliado na cidade de Rio Verde, Estado de Goiás, na Rua José Iran, s/n, QD. 05, LT. 09 – Setor Morada do Sol, inscrito no CPF/MF sob o nº XXXX (“Fábio”); (2) Virgínia Ferreira Rodrigues Carneiro Girotto, brasi-leira, empresária, casada, residente e domiciliada na cidade de Rio Verde, Estado de Goiás, na Rua José Iran s/n QD. 05, LT. 09 – Setor Mora-da do Sol, inscrita no CPF/MF sob o XXXX (“Virgínia”); (3) Fausto Girotto Ribeiro, brasileiro, empresário, casado, residente e domiciliado na cidade de Rio Verde, Estado de Goiás, na Rua L, s/n, QD. 14, LT. 475/476 – Solar do Agreste, inscrito no CPF/MF sob o nº XXXX (“Fausto”) e (4) Raquel Fer-reira Guimarães, brasileira, empresária, casada, residente e domiciliada na cidade de Rio Verde, Estado de Goiás, na Rua L, s/n, QD. 14, LT. 475/476 – Solar do Agreste, inscrita no CPF/MF sob o nº XXXX (“Raquel”), pelos mo-tivos a seguir expostos:

[...]

4. Como se vê do item X da CCB, os executados Fabio, Virgínia, Fausto e Raquel figuraram no título como avalistas e coobrigados, tendo assumido, por força da Cláusula 10, as mesmas obrigações da Nutrisal, emitente da CCB (doc. 3).”

Verifica-se, ainda, da leitura do título de crédito juntado às fls. 110/126 (e-STJ), que os referidos sócios da empresa em processo de soer-guimento, ora suscitantes, encontram-se nominalmente identificados como avalistas da dívida.

Delineado o cenário fático, procura-se, agora, decidir se a execução deve prosseguir em relação aos devedores coobrigados, ainda que sócios da sociedade empresarial limitada (contrato social acostado às fls. 18/24, e-STJ).

Inicialmente, cumpre destacar que a orientação jurispruden-cial esposada pelo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso re-petitivo, firmou-se no sentido de que o disposto no art. 49, § 1º, da Lei nº 11.101/2005, prevê que os credores do devedor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obri-gados de regresso.

Nesses termos:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA – ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ Nº 8/2008 – DIREITO EMPRESARIAL E CIVIL – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – PROCESSAMENTO E CONCESSÃO – GA-RANTIAS PRESTADAS POR TERCEIROS – MANUTENÇÃO – SUSPENSÃO

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OU EXTINÇÃO DE AÇÕES AJUIZADAS CONTRA DEVEDORES SOLIDÁ-RIOS E COOBRIGADOS EM GERAL – IMPOSSIBILIDADE – INTERPRETA-ÇÃO DOS ARTS. 6º, CAPUT, 49, § 1º, 52, INCISO III, E 59, CAPUT, DA LEI Nº 11.101/2005 – 1. – Para efeitos do art. 543-C do CPC: “A recuperação judicial do devedor principal não impede o prosseguimento das execuções nem induz suspensão ou extinção de ações ajuizadas contra terceiros deve-dores solidários ou coobrigados em geral, por garantia cambial, real ou fi-dejussória, pois não se lhes aplicam a suspensão prevista nos arts. 6º, caput, e 52, inciso III, ou a novação a que se refere o art. 59, caput, por força do que dispõe o art. 49, § 1º, todos da Lei nº 11.101/2005”.

2. Recurso especial não provido.

(REsp 1333349/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª S., J. 26.11.2014, DJe 02.02.2015)

Outrossim, relativamente à suspensão das ações por ocasião do de-ferimento da recuperação judicial, vale destacar que a exceção prevista no art. 6º da Lei de Falências somente alcança os sócios solidários, presentes naqueles tipos societários (em nome coletivo), na qual a responsabilidade pessoal dos associados não é limitada às suas respectivas quotas/ações.

A propósito, confira-se:

AGRAVO REGIMENTAL – DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL – RECURSO ESPECIAL – EXECUÇÃO AJUIZADA EM FACE DE SÓCIO-AVA-LISTA DE PESSOA JURÍDICA EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL – SUSPENSÃO DA AÇÃO – IMPOSSIBILIDADE

1. O caput do art. 6º da Lei nº 11.101/2005, no que concerne à suspensão das ações por ocasião do deferimento da recuperação, alcança apenas os sócios solidários, presentes naqueles tipos societários em que a responsabi-lidade pessoal dos consorciados não é limitada às suas respectivas quotas/ações.

2. Não se suspendem, porém, as execuções individuais direcionadas aos avalistas de título cujo devedor principal é sociedade em recuperação ju-dicial, pois diferente é a situação do devedor solidário, na forma do § 1º do art. 49 da referida Lei. De fato, “[a] suspensão das ações e execuções pre-vistas no art. 6º da Lei nº 11.101/2005 não se estende aos coobrigados do devedor” (Enunciado nº 43 da I Jornada de Direito Comercial CJF/STJ).

3. Agravo regimental não provido.

(AgRg-REsp 1342833/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., J. 15.05.2014, DJe 21.05.2014)

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Não se verifica, contudo, a excepcionalidade acima ressalvada, pois, consoante se depreende da análise do contrato social juntado aos autos, a empresa recuperanda é limitada, respondendo os seus sócios tão somente ao valor das cotas integralizadas.

Ora, como é sabido, a sociedade limitada é aquela em que o capital social encontra-se dividido em quotas, as quais podem ser iguais ou desi-guais, pertencendo uma ou diversas a cada sócio, cuja responsabilidade é restrita ao valor de suas quotas, respondendo todos apenas pela integrali-zação do capital social, e não solidária e ilimitadamente perante terceiros. Logo, diversamente das sociedades em nome coletivo, onde a solidariedade é inerente à sua constituição, na sociedade limitada os sócios podem restrin-gir as perdas, porquanto respondem somente pelo capital social, uma vez integralizado totalmente.

Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL – AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – DEFE-RIMENTO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL À EMPRESA CO-EXECUTADA – EXECUÇÃO INDIVIDUAL – SUSPENSÃO – NÃO CABIMENTO – AU-TONOMIA DAS OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS NO TÍTULO DE CRÉDITO EXEQUENDO

1. Conforme o disposto art. 6º da Lei nº 11.101/2005, o deferimento de re-cuperação judicial à empresa co-executada não tem o condão de suspender a execução em relação a seus avalistas, a exceção do sócio com responsa-bilidade ilimitada e solidária.

2. O Aval é ato dotado de autonomia substancial em que se garante o pa-gamento do título de crédito em favor do devedor principal ou de um co--obrigado, isto é, é uma garantia autônoma e solidária. Assim, não sendo possível o credor exercer seu direito contra o avalizado, no caso a empresa em recuperação judicial, tal fato não compromete a obrigação do avalista, que subsiste integralmente.

3. Agravo Regimental improvido.

(AgRg-AREsp 62.794/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., Julgado em 25.06.2013, DJe 01.08.2013)

AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA – RECUPERA-ÇÃO JUDICIAL – EXECUÇÃO EM FACE DOS SÓCIOS/ADMINISTRADO-RES QUE FIGURAM COMO AVALISTAS/GARANTIDORES DA EMPRESA RECUPERANDA – SUSPENSÃO DAS AÇÕES EXECUTÓRIAS – IMPOSSIBI-LIDADE – PRECEDENTES – AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������������������������������179

1. “Conforme o disposto no art. 6º da Lei nº 11.101/2005, o deferimento de recuperação judicial à empresa co-executada não tem o condão de sus-pender a execução em relação a seus avalistas, a exceção do sócio com responsabilidade ilimitada e solidária” (EAg 1.179.654/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, J. 28.03.2012, DJe 13.04.2012).

2. Agravo regimental não provido.

(AgRg-CC 126.173/MS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª S., J. 24.04.2013, DJe 30.04.2013)

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO DE INSTRUMENTO – DE-FERIMENTO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL À EMPRESA CO-EXECUTADA – EXECUÇÃO INDIVIDUAL – SUSPENSÃO – NÃO CABIMENTO – AUTO-NOMIA DAS OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS NO TÍTULO DE CRÉDITO EXE-QUENDO – ACOLHIMENTO

1. Conforme o disposto art. 6º da Lei nº 11.101/2005, o deferimento de re-cuperação judicial à empresa co-executada não tem o condão de suspender a execução em relação a seus avalistas, a exceção do sócio com responsa-bilidade ilimitada e solidária.

2. Os credores sujeitos aos efeitos da recuperação judicial conservam in-tactos seus direitos e, por lógica, podem executar o avalista desse título de crédito (REsp 1.095.352/SP, Rel. Min. Massami Uyeda, DJe 03.02.2011).

3. O Aval é ato dotado de autonomia substancial em que se garante o pa-gamento do título de crédito em favor do devedor principal ou de um co--obrigado, isto é, é uma garantia autônoma e solidária. Assim, não sendo possível o credor exercer seu direito contra o avalizado, no caso a empresa em recuperação judicial, tal fato não compromete a obrigação do avalista, que subsiste integralmente.

4. Embargos de Divergência acolhidos.

(EAg 1179654/SP, Rel. Min. Sidnei Beneti, 2ª S., J. 28.03.2012, DJe 13.04.2012)

Ademais, diante da autonomia e independência das obrigações cam-biais, o avalista é responsável por obrigação autônoma e independente, exi-gível inclusive se a obrigação principal for nula, falsa ou inexistente.

Cite-se, a propósito, a lição do professor Fábio Konder Comparato (in Direito Empresarial. São Paulo: Editora Saraiva, 1995, p. 481):

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180 �������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

“[...] na Lei Uniforme, porém, essa solução foi afastada, ao se declarar que a obrigação do avalista mantém-se, mesmo no caso de a obrigação que ele garantiu ser nula por qualquer razão que não seja um vício de forma. Ti-rante essa ressalva, oriunda da tradição alemã, a lei genebrina consagrou a completa autonomia do aval. A única exigência é que haja, no título, a as-sinatura do avalizado, nada importando que essa assinatura seja falsa, pois às obrigações decorrentes do aval entende-se aplicável a norma geral do art. 7º”.

Logo, o deferimento do pedido de recuperação judicial não obsta o prosseguimento de eventual execução movida em face de seus respectivos avalistas, tendo em vista o caráter autônomo da garantia cambiária ofere-cida.

Nesse diapasão:

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO (ART. 544 DO CPC) – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE – PROSSEGUIMENTO DA EXECUÇÃO EM RE-LAÇÃO AO AVALISTA – DECISÃO MONOCRÁTICA QUE CONHECEU DO AGRAVO PARA NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL – IN-SURGÊNCIA DO EXECUTADO/AVALISTA

1. Por força da autonomia da obrigação cambiária, o processamento de re-cuperação judicial deferido à empresa coexecutada não suspende a execu-ção em relação aos coobrigados. Precedentes.

2. Agravo regimental desprovido.

(AgRg-AREsp 457.117/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, 4ª T., J. 01.04.2014, DJe 07.04.2014)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL – DEFE-RIMENTO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL À EMPRESA – EXTENSÃO DOS EFEITOS A COOBRIGADOS AVALISTAS – NÃO CABIMENTO

1. Por força da autonomia da obrigação cambiária, o processamento de re-cuperação judicial deferido à empresa co-executada não suspende a execu-ção em relação aos coobrigados.

2. Agravo regimental não provido.

(AgRg-AREsp 276.695/SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, 3ª T., J. 18.02.2014, DJe 28.02.2014)

AGRAVO REGIMENTAL – EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA – RECUPERA-ÇÃO JUDICIAL – DEFERIMENTO – EMPRESA CO-EXECUTADA – PEDIDO

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������������������������������181

DE SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO EM RELAÇÃO AOS AVALISTAS – IMPOS-SIBILIDADE – OBRIGAÇÃO CAMBIÁRIA AUTÔNOMA – ACÓRDÃO RE-CORRIDO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA DO STJ – SÚ-MULA Nº 168/STJ

1. Não há como abrigar agravo regimental que não logra desconstituir os fundamentos da decisão atacada.

2. Ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça possuem entendimento de que o deferimento do pedido de pro-cessamento de recuperação judicial à empresa co-executada não autoriza a suspensão da execução em relação a seus avalistas, por força da autonomia da obrigação cambiária.

3. Não cabem embargos de divergência quando a jurisprudência do Tri-bunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado. (Súmula nº 168/STJ).

4. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg-EREsp 1095352/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª S., J. 22.05.2013, DJe 24.05.2013)

AGRAVO REGIMENTAL NO CONFLITO DE COMPETÊNCIA – RECUPERA-ÇÃO JUDICIAL – AS AÇÕES E EXECUÇÕES MOVIDAS CONTRA OS AVA-LISTAS NÃO SE SUSPENDEM POR FORÇA DO DEFERIMENTO DA RECU-PERAÇÃO JUDICIAL DA COOBRIGADA

1. Decorre do art. 6º da Lei nº 11.101/2005 a suspensão das ações e execu-ções que se voltem contra o patrimônio da sociedade em recuperação.

2. O art. 49, § 1º, da Lei nº 11.101/2005, prevê que os credores do deve-dor em recuperação judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e obrigados de regresso.

3. A obrigação que decorre do aval é autônoma, não tendo a sua eficácia suspensa pelo deferimento da recuperação judicial da sociedade garantida. Precedentes.

4. Agravo regimental desprovido.

(AgRg-CC 116.173/AL, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 2ª S., J. 10.04.2013, DJe 15.04.2013)

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO NO RECURSO ESPECIAL – AÇÃO DE EXECUÇÃO JUDICIAL HIPOTECÁRIA – EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVI-DADE – RECUPERAÇÃO JUDICIAL – DEFERIMENTO – EMPRESA CO-

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182 �������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

-EXECUTADA – PEDIDO DE SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO EM RELAÇÃO AOS AVALISTAS – IMPOSSIBILIDADE – OBRIGAÇÃO CAMBIÁRIA AUTÔ-NOMA

O deferimento do pedido de processamento de recuperação judicial à em-presa co-executada não autoriza a suspensão da execução em relação a seus avalistas, por força da autonomia da obrigação cambiária.

Agravo no recurso especial não provido.

(AgRg-REsp 1378984/RS, Relª Min. Nancy Andrighi, 3ª T., J. 06.08.2013, DJe 19.08.2013)

RECURSO ESPECIAL – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – NÃO OCORRÊNCIA – QUESTÃO DA COMPETÊNCIA ABSOLUTA DO JU-ÍZO FALIMENTAR – AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO – INCIDÊN- CIA DA SÚMULA Nº 211/STJ – PROCESSAMENTO DO PEDIDO DE RE-CUPERAÇÃO JUDICIAL – DEFERIMENTO – SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO EXCLUSIVAMENTE EM FACE DA EMPRESA CO-EXECUTADA – POSSIBILI-DADE – OBRIGAÇÃO CAMBIÁRIA – AUTONOMIA – PROSSEGUIMENTO – EXECUÇÃO – AVALISTAS – RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CO-NHECIDO E IMPROVIDO

I – Não há omissão no aresto a quo, no qual se examinou os temas rele-vantes para deslinde da controvérsia, ainda que o resultado não tenha sido favorável à parte recorrente.

II – O tema atinente à competência absoluta do Juízo Falimentar não foi ob-jeto de deliberação, sequer implícita, na Instância a quo, o que convoca o óbice da Súmula nº 211/STJ.

III – O deferimento do pedido de processamento de recuperação judicial à empresa co-executada, à luz do art. 6º, da Lei de Falências, não autoriza a suspensão da execução em relação a seus avalistas, por força da autonomia da obrigação cambiária.

IV – Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido.

(REsp 1095352/SP, Rel. Min. Massami Uyeda, 3ª T., J. 09.11.2010, DJe 25.11.2010)

Assim, como bem ratifica o parecer ministerial, “os suscitantes (pes-soas físicas) comparecem como avalistas do negócio jurídico – cédula de crédito bancário – firmado entre a sociedade em recuperação e o Banco ABC Brasil S/A” (fl. 368, e-STJ), razão pela qual “no presente caso, os sócios tem responsabilidade limitada conforme contrato social de fls. 18-24 (e-STJ),

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������������������������������183

não havendo óbice, portanto, ao prosseguimento da execução” (fl. 369, e-STJ).

Concluindo, à luz do posicionamento doutrinário, legal e jurispru-dencial acima colacionados, respeitada a moldura fática apresentada no presente incidente processual, verifica-se, na hipótese, que a relação jurídi-ca envolvendo os avalistas e o credor não pode ser abalada pelos efeitos da decisão que defere o processamento do pedido de recuperação judicial ou, ainda, que decreta a falência da devedora principal.

Por conseguinte, a ação executiva fundada em título cambiário au-tônomo ajuizada em face dos suscitantes, avalistas da empresa devedora, não pode ser sobrestada, devendo o seu processamento continuar com as formalidades e garantias inerentes ao rito executivo, previstas na legislação processual, junto ao seu juízo natural, inobstante o curso do processo de recuperação judicial do estabelecimento empresarial.

2. Ante o exposto, conheço do conflito para declarar o prosseguimen-to da execução da cédula de crédito bancária nº 2127312 junto ao Juiz de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP.

Julgo, outrossim, prejudicado o agravo regimental interposto às fls. 236/242 (e-STJ) contra o indeferimento do pedido liminar.

É como voto.

Certidão de JulgAmeNto seguNdA seção

Número Registro: 2015/0207184-8

Processo Eletrônico CC 142.726/GO

Números Origem: 10688734120148260100 201401360569 28587120148090137

Pauta: 24.02.2016 Julgado: 24.02.2016

Relator: Exmo. Sr. Ministro Marco Buzzi

Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro Raul Araújo

Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. Hugo Gueiros Bernardes Filho

Secretária: Belª Ana Elisa de Almeida Kirjner

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AutuAção

Suscitante: Nutrisal Ind. Com. Suplementos p/ Alimentação Animal Ltda.

Suscitante: Fabio Girotto Ribeiro

Suscitante: Fausto Girotto Ribeiro

Advogado: Joslaine Fábia de Andrade e outro(s)

Suscitado: Juízo de Direito da 2ª Vara Cível de Rio Verde/GO

Suscitado: Juízo de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP

Interes.: Banco ABC Brasil S/A

Advogado: Marcelo Alexandre Lopes e outro(s)

Assunto: Direito civil – Empresas – Recuperação judicial e falência

Certidão

Certifico que a egrégia Segunda Seção, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Seção, por unanimidade, conheceu do conflito de competência para declarar o prosseguimento da execução da cédula de crédito bancária nº 2127312 junto ao Juiz de Direito da 29ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo/SP, julgando prejudicado o agravo regimental interposto às fls. 236/242 (e-STJ), nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha, Luis Felipe Salomão, Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.

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Parte Geral – Jurisprudência

8617

Tribunal Regional Federal da 1ª RegiãoApelação Cível nº 0064829‑24.2010.4.01.9199/MG Relator(a): Juiz Federal Emmanuel Mascena de MedeirosApelante: Instituto Nacional do Seguro Social – INSSProcurador: Adriana Maia VenturiniApelado: Geralda Veronica Pedrosa de AlmeidaAdvogado: Adalto Quaresma Lemos

emeNtA

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – PRESCRIÇÃO ANTERIOR À SENTENÇA – IMPOSSIBILIDADE DE ALEGAÇÃO EM SEDE DE EMBARGOS – ART. 741, VI, DO CPC – SENTENÇA MANTIDA – APELAÇÃO IMPROVIDA

1. Insurge-se o INSS contra a decisão do MM. Juízo a quo que, ao pro-ferir a sentença nos embargos à execução, rejeitou a alegação relativa à prescrição quinquenal.

2. A decisão está em consonância com o posicionamento do Tribunal acerca da matéria, segundo o qual a regra de que a prescrição pode ser alegada, em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem apro-veita (art. 193 do CC/2002) somente se aplica à prescrição anterior à sentença.

3. Em se tratando de execução fundada em título judicial, somente é possível a arguição, em sede de embargos à execução, da prescrição superveniente à sentença, consoante o disposto no art. 741, VI, do CPC, sob pena de ofensa à coisa julgada.

4. Na hipótese dos autos, a prescrição suscitada teria ocorrido an-tes do ajuizamento do processo de conhecimento, de modo que não poderia ser levantada em sede de embargos à execução, já que as parcelas supostamente prescritas integram o título executivo e, assim, são exigíveis.

5. Não assiste, portanto, razão ao INSS. Sentença mantida.

6. Apelação improvida.

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ACórdão

Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 1a Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do voto do juiz relator.

Primeira Turma do TRF da 1ª Região, 17 de fevereiro de 2016.

Juiz Federal Emmanuel Mascena de Medeiros Relator Convocado

relAtório

O Exmo. Sr. Juiz Federal Emmanuel Mascena de Medeiros (Relator convocado):

Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro So-cial – INSS contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido dos embargos à execução para decotar da execução a multa do art. 475-J do CPC, os juros de mora cobrados entre o vencimento das parcelas e a citação e o correspondente excesso da cobrança dos honorários advocatí-cios. Em virtude da sucumbência recíproca, o embargado foi condenado a arcar com metade das custas e cada parte com os honorários de seu próprio advogado, observado, quanto ao embargado, o disposto no art. 12 da Lei nº 1.060/1950.

Em sede de apelação, o INSS sustenta a inobservância da prescrição quinquenal, arguição que foi afastada na sentença dos embargos. Defende que, desde a época do ajuizamento da ação originária, já vigiam os arts. 1º e 2º do Decreto nº 20.910/1932, estabelecendo que prescrevem em cinco anos as dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios , bem como todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Pública, seja qual foi sua natureza.

Afirma, ademais, que, por força do § 5º do art. 219 do CPC, a prescri-ção pode ser declarada de ofício pelo juiz. Requer a reforma da sentença de fls. 20/21 para que sejam excluídas do título executivo judicial as parcelas anteriores ao quinquênio que antecede a propositura da demanda.

Sem contrarrazões, os autos foram remetidos ao Tribunal.

É o relatório.

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������������������������������187

voto

O Exmo. Sr. Juiz Federal Emmanuel Mascena de Medeiros (Relator convocado):

O presente processo está vinculado ao Projeto Piloto de Aceleração de Julgamentos do Conselho Nacional de Justiça.

Referido programa tem relevância constitucional no que diz respeito ao princípio da razoável duração do processo e o regime de julgamento das causas que lhe foram atribuídas, segue regramentos, metodologia e metas a serem alcançadas, destacando-se a Portaria CNJ nº 17/2015.

Realmente, em matéria de temas tão relevantes quanto o direito pre-videnciário, de índole fundamental, de cunho manifestamente alimentar e onde a demora é incompatível com os seus desígnios magnos, como os postulados da dignidade humana e o da eficácia imediata das prestações previdenciárias, faz-se imperiosa a necessidade de julgamentos mais obje-tivos e consentâneos com a sua natureza e de acordo com as diretrizes que os magistrados vinculados ao PAJ são obrigados a seguir.

MÉRITO

Insurge-se o INSS contra a decisão do MM. Juízo a quo que, ao pro-ferir a sentença nos embargos à execução, rejeitou a alegação relativa à prescrição quinquenal.

Conforme o magistrado, a prescrição teria se verificado antes do ajuizamento do processo de conhecimento e, conforme a inteligência do art. 741, VI, do CPC, a prescrição somente poderia ser levantada em sede de embargos se verificada após a sentença.

A decisão está em consonância com o posicionamento do presente Tribunal acerca da matéria, segundo o qual a regra de que a prescrição pode ser alegada, em qualquer grau de jurisdição, pela parte a quem aproveita (art. 193 do CC/2002) somente se aplica à prescrição anterior à sentença.

Em se tratando de execução fundada em título judicial, somente é possível a arguição, em sede de embargos à execução, da prescrição super-veniente à sentença, consoante o art. 741, VI, do CPC, sob pena de ofensa à coisa julgada.

Em outras palavras, se a prescrição suscitada pelo embargante for an-terior à sentença, a matéria não pode ser discutida em sede de embargos à execução:

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É a seguinte a redação do art. 741, VI, do CPC:

Na execução fundada em título judicial, os embargos só poderão versar sobre:

[...]

VI – qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação com execução aparelhada, tran-sação ou prescrição, desde que superveniente à sentença.

Na hipótese dos autos, a prescrição suscitada teria ocorrido antes do ajuizamento do processo de conhecimento, de modo que não poderia ser levantada em sede de embargos à execução, já que as parcelas supostamen-te prescritas integram o título executivo e, assim, são exigíveis.

Sobre o tema, elucidativa a ementa de julgado do TRF1:

PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – BENEFÍCIO PREVI-DENCIÁRIO – PRESCRIÇÃO QUINQUENAL – RENÚNCIA A CRÉDITO EXCEDENTE AO VALOR DO RPV – SENTENÇA TRANSITADA EM JULGA-DO – VERBA HONORÁRIA – IMPOSSIBILIDADE DE RENÚNCIA – 1. Em se tratando de execução fundada em título judicial, somente é possível a arguição, em sede de embargos à execução, da prescrição superveniente à sentença, consoante o disposto no art. 741, VI, do CPC, sob pena de ofensa à coisa julgada. 2. A execução deve ser fiel ao título executivo transitado em julgado, sendo defeso extrapolar os comandos nele definidos, à medida que está sob o pálio da coisa julgada e da preclusão. Precedente desta Cor-te. 3. O acordo firmado entre as partes, sem a presença do advogado, não afeta os honorários convencionados ou fixados judicialmente na sentença exequenda, porque tais parcelas não pertencem às partes, mas ao profissio-nal, pelos serviços prestados aos contratantes. 4. Na espécie, o pagamento da verba honorária, fixada em sentença transitada em julgado, não pode ser afastado em decorrência de a parte autora ter renunciado aos valores da condenação que excederam a sessenta salário mínimos, sobretudo porque consiste em parcela autônoma pertencente exclusivamente ao advogado e porque o patrono não participou da transação realizada. 5. Apelação a que se nega provimento.

(AC 0003505-88.2006.4.01.3503/GO, Rel. Des. Fed. Francisco de Assis Betti, Rel. Conv. Juiz Fed. Cleberson José Rocha (Conv.), 2ª T., e-DJF1 p. 1248de 09.10.2015)

No mesmo sentido, já se pronunciou o STJ em Recurso Especial, con-soante ementa abaixo transcrita:

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������������������������������189

RECURSO ESPECIAL – PROCESSUAL CIVIL – EMBARGOS DO DEVEDOR – ESTADO DE SÃO PAULO – PRESCRIÇÃO INOCORRENTE NA ESPÉCIE – ART. 741 DO CPC – PRECEDENTE – Não se verifica a alegada afronta aos citados dispositivos do CPC pois, nos termos do precedente de relato-ria do il. Ministro Hamilton Carvalhido, À luz do que preceitua o art. 741, inciso VI, do Código de Processo Civil, em se tratando de embargos do devedor opostos contra execução fundada em título judicial, somente se pode discutir prescrição superveniente à sentença, sob pena de ofensa à coisa julgada. (Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 258662/SP, DJ 29.10.2001). Recurso desprovido. (REsp 453451, SP, 2002/0091835-1; Min. José Arnaldo da Fonseca, 5ª T., J. 10.06.2003, DJ 04.08.2003, p. 368)

Não assiste, portanto, razão ao INSS.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS, mantendo inal-terada a sentença proferida em sede de embargos à execução, em todos os seus termos.

É como voto.

deCisão

Tendo em vista o disposto no art. 165 do RITRF1, retornem os autos à Corip a fim de que se dê cumprimento ao comando contido no despacho de fls.

Brasília, 10 de julho de 2014.

Desembargador Federal Candido Moraes Relator

tribuNAl regioNAl federAl dA 1ª região seCretAriA JudiCiáriA

3ª Sessão Ordinária do(a) Primeira Turma

Pauta de: 17.02.2016 Julgado em: 17.02.2016

Ap 0064829-24.2010.4.01.9199/MG

Relator: Exmo. Sr. Juiz Federal Emmanuel Mascena de Medeiros

Revisor: Exmo(a). Sr(a).

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Presidente da Sessão: Exmo(a). Sr(a). Desembargadora Federal Gilda Sigmaringa Seixas

Proc. Reg. da República: Exmo(a). Sr(a). Dr(a). Marcus da Penha Souza Lima

Secretário(a): Lilio da Silva Ramos

Apte.: Instituto Nacional do Seguro Social – INSS

Procur.: Adriana Maia Venturini

Apdo.: Geralda Veronica Pedrosa de Almeida

Adv.: Adalto Quaresma Lemos

Nº de Origem: 686092303359 Vara:

Justiça de Origem: Justiça Estadual Estado/Com.: MG

susteNtAção orAl Certidão

Certifico que a(o) egrégia(o) Primeira Turma, ao apreciar o processo em epígrafe, em Sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, à unanimidade, julgou nos termos do voto do Relator.

Participaram do Julgamento os Exmos. Srs. Juiz Federal Rafael Paulo Soares Pinto e Desembargador Federal Carlos Augusto Pires Brandão.

Brasília, 17 de fevereiro de 2016.

Lilio da Silva Ramos Secretário(a)

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Parte Geral – Jurisprudência

8618

Tribunal Regional Federal da 2ª RegiãoApelação Cível – Turma Espec. III – Administrativo e CívelNº CNJ: 0105274‑90.2014.4.02.5101 (2014.51.01.105274‑8)Relator: Desembargador Federal Ricardo PerlingeiroApelante: Marlene Conceição Pimentel de OliveiraAdvogado: Jose Roberto Soares de OliveiraApelado: União FederalProcurador: Advogado da UniãoOrigem: 28ª Vara Federal do Rio de Janeiro (01052749020144025101)

emeNtA

APELAÇÃO CÍVEL – EXECUÇÃO INDIVIDUAL DE SENTENÇA COLETIVA – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA – INOCORRÊNCIA – ANTERIOR AJUIZAMENTO DE EXECUÇÃO COLETIVA – CAUSA INTERRUPTIVA DO PRAZO PRESCRICIONAL – APELAÇÃO PROVIDA

1. Título executivo decorrente de sentença proferida em ação coletiva proposta pela Associação Nacional de Assistência ao Consumidor e Trabalhador – Anacont, na qual a União Federal foi condenada a pa-gar aos substituídos as diferenças apuradas entre os valores devidos, no período de 1º de março de 1992 a 31 de dezembro de 1993, con-siderando o valor integral a que faria jus os respectivos ex-militares instituidores, e aqueles efetivamente pagos mensalmente. Decisão judicial impugnada que julgou procedente o pedido formulado nos embargos à execução, extinguindo a demanda executória, ante o acolhimento da prescrição, nos termos do art. 269, IV do CPC.

2. O fato de constar da fundamentação do acórdão produzido na ação coletiva, uma diretiva para a forma de execução, não tem o condão de afastar a interrupção da prescrição, ocorrente pelo ajuizamento da execução coletiva, tendo em vista o disposto no art. 219 do CPC e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre a questão. Pre-cedente: TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 201251010474730, Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, e-DJF2R 27.11.2015.

3. Além de a prescrição executiva ser contada no prazo de 5 (cinco) anos, a partir do trânsito em julgado do decisum condenatório, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, tal prazo é passível da

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incidência de uma causa interruptiva, conforme prevê o art. 8º do mesmo diploma legal. Configurada a interrupção do prazo da prescri-ção executiva, a qual pode decorrer do ajuizamento de ação de exe-cução coletiva, o prazo prescricional terá sua contagem reiniciada, pela metade, consoante dispõe o art. 9º do referido decreto, a partir do ato que o interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo. Afastada a prescrição da pretensão executória. Precedentes: TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 201451011104219, Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, DJF2R 03.12.2015.

4. Apelação provida.

ACórdão

Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a 5ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, por unanimidade, dar provimento à Apelação, nos termos do relatório e voto constantes dos autos, que passam a integrar o presente julgado.

Rio de Janeiro, 1º de março de 2016 (data do Julgamento).

Ricardo Perlingeiro Desembargador Federal

relAtório

Trata-se de apelação interposta por Marlene Conceição Pimentel de Oliveira em face da sentença de fls. 100/102, autos eletrônicos, proferida pelo Juízo da 28ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro/RJ, que julgou procedente o pedido formulado nos embargos à execução, ex-tinguindo a demanda executória, ante o acolhimento da prescrição, nos termos do art. 269, IV do CPC.

Depreende-se dos autos que a execução foi lastreada em título judi-cial originário da ação ordinária nº 97.0006625-8, proposta pela Associa-ção Nacional de Assistência ao Consumidor e Trabalhador – Anacont, na qual a União Federal foi condenada a pagar aos substituídos as diferenças apuradas entre os valores devidos, no período de 1º de março de 1992 a 31 de dezembro de 1993, considerando o valor integral a que faria jus os respectivos ex-militares instituidores, e aqueles efetivamente pagos mensal-mente.

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Nesse contexto, a exequente/embargada promoveu a execução indi-vidualizada do julgado, consubstanciando o valor de R$ 26.408,44 (vinte e seis mil quatrocentos e oito reais e quarenta e quatro centavos), atualizado até dezembro de 2011.

Citada para os fins do art. 730 do CPC, a União Federal/embar-gante opôs embargos alegando, em síntese, prescrição da pretensão executória, ausência de elementos de cálculos e excesso de execução (fls. 01/04).

Impugnação aos embargos à execução às fls. 45/48.

Manifestação da União Federal/embargante às fls. 52/53.

Nova manifestação da União Federal/embargante às fls. 85/86.

Cálculos da contadoria judicial às fls. 92/93, no valor de R$ 19.572,40 (dezenove mil quinhentos e setenta e dois reais e quarenta centavos), atualizado até dezembro de 2011, com os quais as partes con-cordaram (fls. 97/98).

Sobreveio a sentença recorrida, proferida nos seguintes termos:

[...]

Acolho a preliminar suscitada pela União e reconheço a prescrição da pre-tensão executória com base na Súmula nº 150 do Supremo Tribunal Fede-ral, que dispõe que “prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação”, e nos arts. 1º e seguintes do Decreto nº 20.910, de 1932, que estabelece um prazo de cinco anos para o exercício de qualquer pretensão contra a fazenda pública.

Com efeito, a sentença exequenda, proferida nos autos da ação coletiva nº 97.0006625-8 (v. documento de fls. 36/40 dos autos principais), julgou procedente o pedido e condenou a União a pagar aos substituídos da As-sociação Nacional de Assistência ao Consumidor e Trabalhador os valores devidos a título de revisão de pensão militar, acrescidos de juros e correção monetária, bem como a pagar os honorários advocatícios, estabelecidos no montante de 5% (cinco por cento) sobre o valor da condenação.

Interposto recurso de apelação, o Tribunal Regional Federal da 2ª Região negou-lhe provimento, consignando expressamente no título judicial em questão que a execução fosse promovida individualmente pelos substituí-dos interessados, a qual transitou em julgado em 20 de fevereiro de 2006, in verbis:

[...]

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Proposta a execução em 17 de maio de 2013 (v. termo de autuação da ação de execução nº 0014756-88.2013.4.02.5101, ocorreu a prescrição da pretensão executória).

Vale ressaltar que o Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no julgamen-to da Apelação Cível nº 2012.51.01.041946-9, relatada pelo Desembarga-dor Federal Marcus Abraham, reconheceu que “a liquidação e execução do julgado nos autos principais não tem o condão de interromper o prazo prescricional, uma vez que o acórdão que confirmou a sentença coletiva já havia determinado que a execução deveria ser feita individualmente. Pre-cedentes: TRF 2ª R., AC 201251010467221, 6ª T.Esp., Rel. Des. Guilherme Couto de Castro, e-DJF2R 13.11.2013; TRF 2ª R., AC 201351010125636, 6ª T.Esp., Relª Juíza Fed. Conv. Carmen Silvia Lima de Arruda, e-DJF2R 25.09.2013 TRF 2ª R., AC 201351010125946, 6ª T.Esp., Rel. Des. Fed. José Antonio Neiva, e-DJF2R 25.09.2013” (grifei).

Pelo exposto, acolho a prescrição e julgo procedente os embargos, decre-tando extinta a ação de execução, diante da prescrição da pretensão execu-tiva, nos termos do art. 269, IV do CPC. (Grifos no original)

[...]

Em suas razões recursais, a exequente/embargada alega, em síntese, que “não há falar em prescrição da pretensão executória, porquanto a deci-são nos autos da ação coletiva (processo nº 6625-86.1997.4.02.5101) que determinou o prosseguimento da execução de forma individual por cada substituído foi publicada na data de 29.07.2011. Portanto, o prazo prescri-cional quinquenal se iniciou após a preclusão da decisão que indeferiu, na origem, a execução coletiva”.

Não foram apresentadas contrarrazões, conforme certificado à fl. 134.

Manifestação do MPF às fls. 140/141, salientando ausência de inte-resse público a justificar sua intervenção no feito.

É o relatório. Peço dia para julgamento.

Ricardo Perlingeiro Desembargador Federal

voto

O Exmo. Sr. Desembargador Federal Ricardo Perlingeiro (Relator):

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Consoante relatado, trata-se de apelação interposta por Marlene Conceição Pimentel de Oliveira em face da sentença de fls. 100/102, autos eletrônicos, proferida pelo Juízo da 28ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro/RJ, que julgou procedente o pedido formulado nos embar-gos à execução, extinguindo a demanda executória, ante o acolhimento da prescrição, nos termos do art. 269, IV do CPC.

Depreende-se dos autos que a execução foi lastreada em título judi-cial originário da ação ordinária nº 97.0006625-8, proposta pela Associa-ção Nacional de Assistência ao Consumidor e Trabalhador – Anacont, na qual a União Federal foi condenada a pagar aos substituídos as diferenças apuradas entre os valores devidos, no período de 1º de março de 1992 a 31 de dezembro de 1993, considerando o valor integral a que faria jus os respectivos ex-militares instituidores, e aqueles efetivamente pagos mensal-mente.

Insurge-se a exequente/embargada contra a sentença a quo por enten-der que não ocorreu a prescrição da pretensão executória.

Inicialmente, cumpre esclarecer que, em caso análogo ao em análi-se, manifestei meu entendimento de que apesar de a Associação Nacional de Assistência ao Consumidor e Trabalhador – Anacont ter promovido a liquidação e execução do julgado, no Juízo de origem da ação de conheci-mento, até a data da decisão que determinou o desmembramento do feito e a livre distribuição das demandas executivas, o acórdão que confirmou a sentença coletiva já continha o comando expresso de que as execuções de-veriam ser intentadas individualmente, razão pela qual não teria o condão de interromper o prazo prescricional para a execução individual.

Contudo, em prol da necessidade de uniformização de jurisprudência sobre a questão, passo a seguir a orientação dos demais julgadores desta 5ª Turma Especializada, que consideraram que tal ponto do acórdão não fez coisa julgada, uma vez que a questão relacionada à forma da execução, coletiva ou individual, não fez parte do objeto da ação coletiva. O fato de constar da fundamentação do acórdão produzido na ação coletiva, uma diretiva para a forma de execução, não tem o condão de afastar a inter-rupção da prescrição, ocorrente pelo ajuizamento da execução coletiva, tendo em vista o disposto no art. 219 do CPC e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre a questão. Precedente: TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 201251010474730, Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, e-DJF2R 27.11.2015.

Sendo assim, passa-se à análise da prescrição.

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O Decreto nº 20.910/1932 prevê que as dívidas passivas dos entes públicos prescrevem em cinco anos, contados a partir do ato ou fato do qual se origina o direito.

A Súmula nº 150 do Supremo Tribunal Federal preceitua que o prazo prescricional para deflagrar a execução é o mesmo da ação. Portanto, é de cinco anos, contados a partir do trânsito em julgado da decisão condenató-ria, o prazo prescricional para a propositura da demanda executiva contra a Fazenda Pública.

Com efeito, além de a prescrição executiva ser contada no prazo de 5 (cinco) anos, a partir do trânsito em julgado do decisum condenatório, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/1932, tal prazo é passível da incidência de uma causa interruptiva, conforme prevê o art. 8º do mesmo diploma legal.

Nesse particular, configurada a interrupção do prazo da prescrição executiva, a qual pode decorrer do ajuizamento de ação de execução cole-tiva, o prazo prescricional terá sua contagem reiniciada, pela metade, con-soante dispõe o art. 9º do referido decreto, a partir do ato que o interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo.

No caso em apreço, observa-se que o título judicial exequendo transi-tou em julgado em 20.02.2006, e que a Anacont ajuizou a execução coleti-va dentro do prazo legal, tendo o Juízo decidido pela extinção da execução coletiva, determinando a efetivação da execução de forma individualizada, a ser livremente distribuída, decisão publicada em 29.07.2011.

Dessa forma, proposta a execução individualizada em 17.05.2013, não há se falar em prescrição da pretensão executória, uma vez que a exe-cução coletiva interrompeu o prazo prescricional para ajuizamento da exe-cução individual, voltando o prazo a fluir a partir do último ato processual.

Nesse sentido, confira-se o julgado a seguir:

EMBARGOS À EXECUÇÃO – EXECUÇÃO INDIVIDUAL DE SENTENÇA PROFERIDA EM AÇÃO COLETIVA – PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXE-CUTÓRIA – INOCORRÊNCIA – ANTERIOR AJUIZAMENTO DE EXECU-ÇÃO COLETIVA – INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL – APELA-ÇÃO DESPROVIDA

1. A execução coletiva ajuizada nos autos de registro 97.0006625-8 foi inadmitida, em decisão publicada em 29.07.2011. A execução individual correlata aos presentes embargos do devedor foi ajuizada em 16.12.2013.

2. Conforme se orienta a jurisprudência pátria, o ajuizamento da execução coletiva interrompe o prazo prescricional, que volta a fluir após o último

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ato processual da mesma. Precedentes do STJ: AgRg-REsp 1171604/RS, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª T., J. 07.05.2015, DJe 19.05.2015; AgRg-REsp 1175018/RS, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, 6ª T., J. 03.06.2014, DJe 01.07.2014; AgRg-REsp 1199601/AP, Rel. Min. Sérgio Kukina, 1ª T., J. 17.12.2013, DJe 04.02.2014; AgRg-REsp 1267246/RS, Rel. Min. Og Fernandes, 2ª T., J. 22.10.2013, DJe 18.11.2013.

3. Irrelevante para o prazo prescricional o fato de que o próprio acórdão do Tribunal (19975101006625-9), que julgou a apelação da União e a remessa necessária, tenha, na sua fundamentação, exposto que o ajuizamento das execuções deveria ser feito na forma individualizada.

4. Tal ponto do acórdão não fez coisa julgada, mesmo porque a questão relacionada à forma da execução, coletiva ou individual, não fez parte do objeto da ação coletiva. O fato de constar da fundamentação do acórdão produzido na ação coletiva, uma diretiva para a forma de execução, não tem o condão de afastar a interrupção da prescrição, ocorrente pelo ajuiza-mento da execução coletiva, tendo em vista o disposto no art. 219 do CPC e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre a questão.

5. Interrompido o lapso prescricional pelo ajuizamento da execução cole-tiva, voltando o prazo a fluir a partir do último ato processual, inocorreu a prescrição da pretensão executória.

6. Apelação desprovida.

(TRF 2ª R., 5ª T.Esp., AC 201451011104219, Rel. Des. Fed. Aluisio Gonçalves de Castro Mendes, DJF2R 03.12.2015)

Em conclusão, deve ser provida a apelação da exequente/embargada, uma vez que não ocorreu a prescrição da pretensão executória.

Ante o exposto, dou provimento à apelação.

É como voto.

Ricardo Perlingeiro Desembargador Federal

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Parte Geral – Jurisprudência

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Tribunal Regional Federal da 3ª RegiãoDE publicado em 12.03.2015Agravo Legal em Agravo de Instrumento nº 0016910‑92.2014.4.03.0000/SP2014.03.00.016910‑6/SPRelator: Desembargador Federal Luiz StefaniniAgravante: Plásticos Juquitiba Ind. e Com. Ltda.Advogado: SP154345 Roberson Batista da SilvaAgravado(a): União Federal (Fazenda Nacional)Advogado: SP000001 Marly Miloca da Camara Gouveia e Afonso Grisi NetoOrigem: Juízo de Direito do SAF de Itapecerica da Serra/SPAgravada: Decisão de folhasNº Orig.: 00022229320128260268 A Vr. Itapecerica da Serra/SP

emeNtA

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO LEGAL – EXECUÇÃO FISCAL – BACEN-JUD – PENHORA ONLINE – NÃO DEMONSTRADA HIPÓTESE DO ART. 557 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – INCOMPATIBILIDADE DA DECISÃO COM ENTENDIMENTO DOMINANTE JURISPRUDENCIAL – NÃO PROVIDO

1. A utilização do agravo previsto no art. 557, § 1º, do CPC, deve enfrentar a fundamentação da decisão agravada, ou seja, deve de-monstrar que não é caso de recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribu-nal Federal, ou de Tribunal Superior. Por isso que é inviável, quan-do o agravante deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada (STJ, Ag-REsp 545.307, Relª Min. Eliana Calmon, J. 06.05.2004; REsp 548.732, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, J. 02.03.2004).

2. O art. 557 do CPC não menciona jurisprudência pacífica, o que, na verdade poderia tornar inviável a sua aplicação. A referência à jurisprudência dominante revela que, apesar de existirem decisões em sentido diverso, acabam por prevalecer, na jurisprudência, as de-cisões que adotam a mesma orientação invocada pelo relator. Não cabe, nessa via, a rediscussão do que foi trazido no bojo do presente feito.

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3. Pleiteia a recorrente o desbloqueio da conta corrente, com base na alegação de que os valores ali existentes são destinados para pa-gamentos de funcionários e fornecedores. Lapidar, neste ponto, o va-lioso magistério jurisprudencial do eminente Desembargador Federal Nery Junior, que, ao proferir seu voto no julgamento do Agravo de Instrumento nº 2011.03.00.0150583-3 (TRF 3ª R., 3ª T., DJF3 CJ1 DE 16.09.2011, p. 1160), discorreu nos seguintes termos sobre a matéria: “É cediço que a pessoa jurídica possui compromissos a ser honrados, entre eles o pagamento de salários, entretanto, o acolhimento de tal premissa levaria a conclusão – falsa, diga-se de passagem – de que a medida, qual seja, penhora eletrônica de ativos financeiros, nos termos do art. 655-A, CPC, não seria cabível em relação às empresas, tendo em vista a necessidade de pagamentos de salários, fornecedo-res, etc.”

4. Não há ofensa ao princípio da menor onerosidade, previsto no art. 620, do CPC, “vez que tal norma jurídica deve ser interpretada sistematicamente, em consonância com as demais regras, de mes-ma hierarquia jurídica, que informam igualmente o procedimento de execução, a exemplo do princípio da máxima utilidade da execu-ção” (Ag-REsp 201000347680, Castro Meira, STJ, 2ª T., DJe Data: 01.12.2010).

5. Não foram apresentadas quaisquer argumentações que modifi-quem o entendimento deste Relator, exposto quando da prolação da decisão que analisou pedido retratação.

6. Agravo legal a que se nega provimento.

ACórdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao agravo legal, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

São Paulo, 03 de março de 2015.

Luiz Stefanini Desembargador Federal

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relAtório

Trata-se de agravo legal (art. 557, § 1º, do CPC) interposto por Plásticos Juquitiba Indústria e Comércio Ltda., em face da decisão de fls. 185-187v, que negou seguimento ao agravo de instrumento.

Alega a agravante que o bloqueio das contas bancárias é extrema-mente gravoso para empresa, pois impossibilita pagamento de fornecedores e folha de pagamento, levando a empresa a fechar suas portas.

Defende, a agravante, que o entendimento adotado na decisão não se encontra totalmente afirmado na doutrina e jurisprudência.

Sustenta, ainda, que deve ser observado o princípio da menor onero-sidade ao executado.

Requer a reconsideração da decisão agravada, ou a submissão do recurso a julgamento pela Turma.

É o relatório.

voto

Impõe-se registrar, inicialmente, de acordo com o art. 557, caput, do Código de Processo Civil, o relator negará seguimento a recurso manifesta-mente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com sú-mula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. E, ainda, consoante o § 1º-A do mesmo dispositivo se a decisão recorrida estiver em manifesto confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Fede-ral, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso.

Pleiteia a recorrente o desbloqueio da conta corrente, com base na alegação de que os valores ali existentes são destinados para pagamentos de funcionários e fornecedores.

Lapidar, neste ponto, o valioso magistério jurisprudencial do eminen-te Desembargador Federal Nery Junior, que, ao proferir seu voto no jul-gamento do Agravo de Instrumento nº 2011.03.00.0150583-3 (TRF 3ª R., 3ª T., DJF3 CJ1 DE 16.09.2011, p. 1160), discorreu nos seguintes termos sobre a matéria: “É cediço que a pessoa jurídica possui compromissos a ser honrados, entre eles o pagamento de salários, entretanto, o acolhimento de tal premissa levaria a conclusão – falsa, diga-se de passagem – de que a medida, qual seja, penhora eletrônica de ativos financeiros, nos termos do

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art. 655-A, CPC, não seria cabível em relação às empresas, tendo em vista a necessidade de pagamentos de salários, fornecedores, etc.”

Entendo, também, que não há ofensa ao princípio da menor onero-sidade, previsto no art. 620, do CPC, “vez que tal norma jurídica deve ser interpretada sistematicamente, em consonância com as demais regras, de mesma hierarquia jurídica, que informam igualmente o procedimento de execução, a exemplo do princípio da máxima utilidade da execução” (STJ, Ag-REsp 201000347680, Castro Meira, 2ª T., DJe Data: 01.12.2010).

No mais, verifico que não foram apresentadas quaisquer argumen-tações que modifiquem o entendimento deste Relator, exposto quando da prolação da decisão, que negou seguimento ao agravo de instrumento.

Por esta razão, transcrevo os fundamentos daquela decisão, adotan-do-se como razão de decidir este agravo.

“Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, inter-posto por Plásticos Juquitiba Indústria e Comércio Ltda., em face da decisão que, em sede de execução fiscal, determinou o bloqueio de ativos financei-ros em nome da agravante, via sistema Bacen-Jud.

Alega a agravante, em síntese, que sofre prejuízo de grande monta e de difí-cil reparação, pois priva a executada de valores que visariam o ‘atendimen-to de folha de pagamento, impostos, fornecedores e outros compromissos financeiros’. Aduz que a decisão agravada não preenche os requisitos do art. 185-A, do CTN, e afronta o princípio da menor onerosidade do deve-dor-executado, previsto no art. 620, do CPC.

Requer a concessão de efeito suspensivo para determinar a imediata libera-ção dos valores bloqueados, e ao final, dar provimento ao agravo de instru-mento para reconhecer a ilegalidade da determinação da penhora online.

Decido.

O feito comporta julgamento na forma do art. 557, do Código de Processo Civil.

Cabe registrar, inicialmente, que o Colendo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial representativo de controvérsia (REsp 1.184.765/PA), firmou entendimento no sentido de que, a partir da vigên-cia da Lei nº 11.382/2006, o bloqueio de ativos financeiros por meio de penhora online prescinde do esgotamento de diligências para localização de outros bens do devedor passíveis de penhora, aplicando-se os arts. 655 e 655-A, do Código de Processo Civil, mesmo aos executivos fiscais.

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Confira-se, a propósito, o referido precedente do STJ, cujo acórdão está as-sim ementado:

RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA – ART. 543-C, DO CPC – PROCESSO JUDICIAL TRIBUTÁRIO – EXECU-ÇÃO FISCAL – PENHORA ELETRÔNICA – SISTEMA BACEN-JUD – ES-GOTAMENTO DAS VIAS ORDINÁRIAS PARA A LOCALIZAÇÃO DE BENS PASSÍVEIS DE PENHORA – ART. 11, DA LEI Nº 6.830/1980 – ART. 185-A, DO CTN – CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – INOVAÇÃO INTRODUZIDA PELA LEI Nº 11.382/2006 – ARTS. 655, I, E 655-A, DO CPC – INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA DAS LEIS – TEORIA DO DIÁ-LOGO DAS FONTES – APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI DE ÍNDOLE PROCESSUAL – 1. A utilização do Sistema Bacen-Jud, no período poste-rior à vacatio legis da Lei nº 11.382/2006 (21.01.2007), prescinde do exaurimento de diligências extrajudiciais, por parte do exequente, a fim de se autorizar o bloqueio eletrônico de depósitos ou aplicações finan-ceiras (Precedente da Primeira Seção: EREsp 1.052.081/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 1ª S., Julgado em 12.05.2010, DJe 26.05.2010. Precedentes das Turmas de Direito Público: REsp 1.194.067/PR, Relª Min. Eliana Calmon, 2ª T., Julgado em 22.06.2010, DJe 01.07.2010; AgRg-REsp 1.143.806/SP, Rel. Min. Humberto Martins, 2ª T., Julgado em 08.06.2010, DJe 21.06.2010; REsp 1.101.288/RS, Rel. Min. Benedito Gonçalves, 1ª T., Julgado em 02.04.2009, DJe 20.04.2009; e REsp 1.074.228/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 07.10.2008, DJe 05.11.2008. Precedente da Corte Especial que adotou a mesma exegese para a execução civil: REsp 1.112.943/MA, Relª Min. Nancy Andrighi, Julgado em 15.09.2010). 2. A execução judicial para a cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias é regida pela Lei nº 6.830/1980 e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil. 3. A Lei nº 6.830/1980, em seu art. 9º, determina que, em garantia da execução, o executado poderá, entre outros, nomear bens à penhora, observada a ordem prevista no art. 11, na qual o ‘dinheiro’ exsurge com primazia. 4. Por seu turno, o art. 655, do CPC, em sua redação primitiva, dispu-nha que incumbia ao devedor, ao fazer a nomeação de bens, observar a ordem de penhora, cujo inciso I fazia referência genérica a ‘dinheiro’. 5. Entrementes, em 06 de dezembro de 2006, sobreveio a Lei nº 11.382, que alterou o art. 655 e inseriu o art. 655-A ao Código de Processo Ci-vil, verbis: ‘Art. 655. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em insti-tuição financeira; II – veículos de via terrestre; III – bens móveis em ge-ral; IV – bens imóveis; V – navios e aeronaves; VI – ações e quotas de sociedades empresárias; VII – percentual do faturamento de empresa de-

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vedora; VIII – pedras e metais preciosos; IX – títulos da dívida pública da União, Estados e Distrito Federal com cotação em mercado; X – títulos e valores mobiliários com cotação em mercado; XI – outros direitos. [...] Art. 655-A. Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou apli-cação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, requisitará à au-toridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do execu-tado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução. § 1º As informações limitar-se-ão à existên-cia ou não de depósito ou aplicação até o valor indicado na execução. [...]’ 6. Deveras, antes da vigência da Lei nº 11.382/2006, encontravam--se consolidados, no Superior Tribunal de Justiça, os entendimentos juris-prudenciais no sentido da relativização da ordem legal de penhora previs-ta nos arts. 11, da Lei de Execução Fiscal, e 655, do CPC (EDcl-EREsp 819.052/RS, Rel. Min. Humberto Martins, 1ª S., Julgado em 08.08.2007, DJ 20.08.2007; e EREsp 662.349/RJ, Rel. Min. José Delgado, Relª p/ Ac. Min. Eliana Calmon, 1ª S., Julgado em 10.05.2006, DJ 09.10.2006), e de que o bloqueio eletrônico de depósitos ou aplicações financeiras (me-diante a expedição de ofício à Receita Federal e ao Bacen) pressupunha o esgotamento, pelo exequente, de todos os meios de obtenção de infor-mações sobre o executado e seus bens e que as diligências restassem in-frutíferas (REsp 144.823/PR, Rel. Min. José Delgado, 1ª T., Julgado em 02.10.1997, DJ 17.11.1997; AgRg-Ag 202.783/PR, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, 3ª T., Julgado em 17.12.1998, DJ 22.03.1999; AgRg-REsp 644.456/SC, Rel. Min. José Delgado, Rel. p/ Ac. Min. Teori Albino Zavascki, 1ª T., Julgado em 15.02.2005, DJ 04.04.2005; REsp 771.838/SP, Rel. Min. Castro Meira, 2ª T., Julgado em 13.09.2005, DJ 03.10.2005; e REsp 796.485/PR, Rel. Min. Castro Meira, 2ª T., Julga-do em 02.02.2006, DJ 13.03.2006). 7. A introdução do art. 185-A no Código Tributário Nacional, promovida pela Lei Complementar nº 118, de 9 de fevereiro de 2005, corroborou a tese da necessidade de exauri-mento das diligências conducentes à localização de bens passíveis de penhora antes da decretação da indisponibilidade de bens e direitos do devedor executado, verbis: ‘Art. 185-A. Na hipótese de o devedor tribu-tário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determi-nará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a deci-são, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, fa-çam cumprir a ordem judicial. § 1º A indisponibilidade de que trata o

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caput deste artigo limitar-se-á ao valor total exigível, devendo o juiz de-terminar o imediato levantamento da indisponibilidade dos bens ou va-lores que excederem esse limite. § 2º Os órgãos e entidades aos quais se fizer a comunicação de que trata o caput deste artigo enviarão imediata-mente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indispo-nibilidade houverem promovido.’ 8. Nada obstante, a partir da vigência da Lei nº 11.382/2006, os depósitos e as aplicações em instituições fi-nanceiras passaram a ser considerados bens preferenciais na ordem da penhora, equiparando-se a dinheiro em espécie (art. 655, I, do CPC), tor-nando-se prescindível o exaurimento de diligências extrajudiciais a fim de se autorizar a penhora online (art. 655-A, do CPC). 9. A antinomia apa-rente entre o art. 185-A, do CTN (que cuida da decretação de indispo- nibilidade de bens e direitos do devedor executado) e os arts. 655 e 655-A, do CPC (penhora de dinheiro em depósito ou aplicação finan-ceira) é superada com a aplicação da Teoria pós-moderna do Diálogo das Fontes, idealizada pelo alemão Erik Jayme e aplicada, no Brasil, pela primeira vez, por Cláudia Lima Marques, a fim de preservar a coexistên-cia entre o Código de Defesa do Consumidor e o novo Código Civil. 10. Com efeito, consoante a Teoria do Diálogo das Fontes, as normas gerais mais benéficas supervenientes preferem à norma especial (concebida para conferir tratamento privilegiado a determinada categoria), a fim de preservar a coerência do sistema normativo. 11. Deveras, a ratio essendi do art. 185-A, do CTN, é erigir hipótese de privilégio do crédito tributá-rio, não se revelando coerente ‘colocar o credor privado em situação melhor que o credor público, principalmente no que diz respeito à co-brança do crédito tributário, que deriva do dever fundamental de pagar tributos (arts. 145 e seguintes da Constituição Federal de 1988)’ (REsp 1.074.228/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, 2ª T., Julgado em 07.10.2008, DJe 05.11.2008). 12. Assim, a interpretação sistemática dos arts. 185-A, do CTN, com os arts. 11, da Lei nº 6.830/1980 e 655 e 655-A, do CPC, autoriza a penhora eletrônica de depósitos ou aplicações finan-ceiras independentemente do exaurimento de diligências extrajudiciais por parte do exequente. 13. À luz da regra de direito intertemporal que preconiza a aplicação imediata da lei nova de índole processual, infere--se a existência de dois regimes normativos no que concerne à penhora eletrônica de dinheiro em depósito ou aplicação financeira: (i) período anterior à égide da Lei nº 11.382, de 6 de dezembro de 2006 (que obe-deceu a vacatio legis de 45 dias após a publicação), no qual a utilização do Sistema Bacen-Jud pressupunha a demonstração de que o exequente não lograra êxito em suas tentativas de obter as informações sobre o executado e seus bens; e (ii) período posterior à vacatio legis da Lei nº 11.382/2006 (21.01.2007), a partir do qual se revela prescindível o

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exaurimento de diligências extrajudiciais a fim de se autorizar a penhora eletrônica de depósitos ou aplicações financeiras. 14. In casu, a decisão proferida pelo Juízo Singular em 30.01.2008 determinou, com base no poder geral de cautela, o ‘arresto prévio’ (mediante bloqueio eletrônico pelo sistema Bacen-Jud) dos valores existentes em contas bancárias da empresa executada e dos corresponsáveis (até o limite do valor exe-quendo), sob o fundamento de que ‘nos processos de execução fiscal que tramitam nesta vara, tradicionalmente, os executados têm se desfei-to de bens e valores depositados em instituições bancárias após o rece-bimento da carta da citação’. 15. Consectariamente, a argumentação empresarial de que o bloqueio eletrônico dera-se antes da regular cita-ção esbarra na existência ou não dos requisitos autorizadores da medida provisória (em tese, apta a evitar lesão grave e de difícil reparação, ex vi do disposto nos arts. 798 e 799, do CPC), cuja análise impõe o reexame do contexto fático-probatório valorado pelo Juízo Singular, providência obstada pela Súmula nº 7/STJ. 16. Destarte, o bloqueio eletrônico dos depósitos e aplicações financeiras dos executados, determinado em 2008 (período posterior à vigência da Lei nº 11.382/2006), não se con-dicionava à demonstração da realização de todas as diligências possí-veis para encontrar bens do devedor. 17. Contudo, impende ressalvar que a penhora eletrônica dos valores depositados nas contas bancárias não pode descurar-se da norma inserta no art. 649, IV, do CPC (com a redação dada pela Lei nº 11.382/2006), segundo a qual são absoluta-mente impenhoráveis ‘os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remu-nerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sus-tento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal’. 18. As questões atinentes à prescri-ção dos créditos tributários executados e à ilegitimidade dos sócios da empresa (suscitadas no agravo de instrumento empresarial) deverão se objeto de discussão na instância ordinária, no âmbito do meio pro-cessual adequado, sendo certo que o requisito do prequestionamento torna inviável a discussão, pela vez primeira, em sede de recurso espe-cial, de matéria não debatida na origem. 19. Recurso especial fazendá-rio provido, declarando-se a legalidade da ordem judicial que importou no bloqueio liminar dos depósitos e aplicações financeiras constantes das contas bancárias dos executados. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ nº 08/2008.

(STJ, REsp 201000422264, Luiz Fux, 1ª S., 03.12.2010)

Com efeito, a partir das alterações introduzidas pela Lei nº 11.382/2006 ao art. 655, do Código de Processo Civil, aplicável às execuções fiscais por

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força do art. 1º, da Lei nº 6.830/1980, o juiz, ao decidir sobre a realização da penhora online, não pode mais exigir do credor prova de exaurimento das vias extrajudiciais na busca de bens a serem penhorados.

A constrição deferida obedece a ordem do art. 11, da Lei nº 6.830/1980, e dos arts. 655 e 655-A, ambos do CPC, devendo ser man-tida.

Além disso, não se pode perder de perspectiva que a execução se dá no interesse do credor, e a recusa do exequente mostra-se bem justificada, eis que os bens móveis ofertados, consistentes em maquinário agrícola utiliza-do na atividade econômica da agravante, de fato, são de difícil alienação, vez que destinados a mercado específico.

Registre-se, por relevante, que não há ofensa ao princípio da menor one-rosidade, previsto no art. 620, do CPC, ‘vez que tal norma jurídica deve ser interpretada sistematicamente, em consonância com as demais regras, de mesma hierarquia jurídica, que informam igualmente o procedimento de execução, a exemplo do princípio da máxima utilidade da execução’ (STJ, Ag-REsp 201000347680, Castro Meira, 2ª T., DJe Data: 01.12.2010).

Diante do exposto, com fundamento no art. 557, caput, do Código de Pro-cesso Civil, nego seguimento ao agravo de instrumento.”

Diante do exposto, nego provimento ao agravo legal.

É o voto.

Luiz Stefanini Desembargador Federal

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Parte Geral – Jurisprudência

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Tribunal Regional Federal da 4ª RegiãoApelação Cível nº 5006645‑36.2012.404.7000/PRRelator: Marga Inge Barth TesslerApelante: Banco Central do Brasil – BacenApelante: Fahid FaresAdvogado: Eli Pereira DinizApelado: os mesmos

emeNtA

EMBARGOS À EXECUÇÃO – CRUZADOS BLOQUEADOS – CONTA CORRENTE – CERCEA-MENTO DE DEFESA – INEXISTÊNCIA DE TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL – INCIDÊNCIA DO IPC DE MARÇO/1990 – EXISTÊNCIA DE SALDO – SUCUMBÊNCIA

1. Não prospera a preliminar de cerceamento de defesa em virtude da ausência de intimação acerca da remessa dos autos à contadoria judicial, eis que desnecessária a intimação da parte embargada uma vez decretada a sua revelia em virtude da ausência de apresentação de impugnação aos embargos à execução.

2. O Bacen foi condenado a pagar “as diferenças que se apurarem em execução entre os valores que lhe foram creditados, a título de corre-ção monetária, sobre seus cruzados bloqueados, e os que foram cal-culados com base nos índices do IPC-IBGE...”, decisão esta mantida neste Tribunal, pois o acórdão apenas deu provimento ao apelo para que os juros de mora fossem computados a partir da citação. Não há nenhuma limitação, portanto, à execução das diferenças somente em relação às contas poupança.

3. Verificada a existência de saldo na conta corrente bloqueada (ra-zão 24/68), deve ser aplicado o IPC de março/1990 sobre os valores transferidos, independentemente de posterior movimentação, no mês subsequente, para compensação e/ou pagamento de cheques que, teoricamente, deveriam ter sido descontados na conta corrente livre (razão 07/05).

4. Para fins de apuração das diferenças devidas, deve-se considerar que o valor principal foi absorvido pela movimentação ocorrida em abril de 1990 (mês subsequente) e que houve creditamento da corre-

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ção monetária e juros de acordo com a MP 168/1990, cujos valores devem ser abatidos.

5. Fixada a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre o valor que prossegue a execução, a serem satisfeitos pela embargante, e 10% (dez por cento) sobre o valor reduzido com os embargos, a serem satisfeitos pela parte embargada, compensáveis entre si até o limite do menor valor.

ACórdão

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da parte embargada e ne-gar provimento ao recurso do Bacen, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 24 de junho de 2015.

Desª Fed. Marga Inge Barth Tessler Relatora

relAtório

Trata-se de apelações interpostas contra sentença proferida nos se-guintes termos:

Julgo parcialmente procedente o pedido, para determinar que a execução prossiga pelo valor de R$ 9.260,78 (nove mil, duzentos e sessenta reais e setenta e oito centavos), valor este atualizado para maio de 2007.

Sem custas (Lei nº 9.289/1996, art. 7º).

Tendo em vista que o embargado sucumbiu em maior parte, condeno-o ao pagamento de honorários de advogado, os quais, considerando o art. 20, § 4º do Código de Processo Civil, e o valor atribuído à causa, fixo em R$ 2.500,00 (dois mil e quinhentos reais), devidamente corrigidos pela Selic (que engloba a correção monetária e os juros) desde a data do ajuiza-mento destes embargos até a do efetivo pagamento.

O embargado alega preliminarmente cerceamento de defesa eis que não foi intimado acerca dos cálculos elaborados pela Contadoria Judicial. Afirma que os autos foram remetidos à Contadoria para apurar o valor devi-

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do em 16.05.2008, em 07.10.2008, em 18.08.2009, em 04.12.2009 e por fim em 14.09.2010. Em 19.11.2010 foi publicado despacho (EVENTO3--OUT 48 – fl. 300) determinando o retorno dos autos à Contadoria para elaborar a conta de referência, esclarecer o motivo das divergências entre os cálculos das partes e informar os critérios utilizados para a elaboração dos cálculos, sendo determinado ainda que após a confecção dos cálcu-los, as partes fossem intimadas. Afirma que ficou no aguardo dos cálculos para se manifestar, mas que não foi intimado. Todavia, em 12.01.2011 foi certificado nos autos que o embargado não havia se manifestado e os au-tos conclusos para sentença. Alega que o despacho publicado no Boletim nº 180/2010 (decisão publicada em 19.11.2011) é deficiente por não fazer referência ao fato de que os cálculos já se encontravam nos autos. Por fim, afirma que não pode se manifestar nos autos inclusive após a sentença, eis que disponibilizada em 11.03.2011, os autos foram retirados em carga pelo Bacen em 14.03.2011. Por tais razões, requer a decretação de nulidade da sentença. No mérito, requer a reformada da sentença para que sejam aco-lhidos os cálculos apresentados pelo embargado.

O Bacen, em suas razões, sustenta a inexistência de título executivo tendo em vista que o acórdão deste Tribunal determinou apenas a correção monetária das contas-poupança de titularidade do autor. O autor promoveu a execução visando o pagamento das diferenças relativas às suas contas--correntes, contrariando, assim, o título executivo judicial. Defende, ainda, a impossibilidade de acolhimento dos cálculos elaborados pela Contadoria Judicial, tendo em vista que foram elaborados com base na conta de razão 24/68, a qual representa conta-corrente bloqueada. Afirma que, na fl. 279, consta extrato relativo à conta com razão 07/05, que é conta-corrente li-vre, na qual consta migração no valor de $ 62.800,123 da conta-livre para a conta-corrente bloqueada, razão 24/68, por meio da rubrica TRANS. P/BACEN – MER (fl. 281). Por fim, requer a majoração dos honorários advoca-tícios para 5% sobre o valor do excesso de execução.

Foram apresentadas contrarrazões.

É o relatório.

voto

CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE DA SENTENÇA

Em que pesem os argumentos expostos, tenho que não prospera a preliminar de cerceamento de defesa em virtude da ausência de intimação

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acerca da remessa dos autos à contadoria judicial, eis que desnecessária a intimação da parte embargada uma vez decretada a sua revelia no despa-cho/decisão da fls. 98 (EVENTO3-DECISÃO11) em virtude da ausência de apresentação de impugnação aos embargos à execução.

INEXISTÊNCIA DO TÍTULO EXECUTIVONeste tocante, tenho que a sentença de lavra da Juíza Federal Gisele

Lemke deu adequada solução à lide, razão pela qual reproduzo a funda-mentação, adotando-a como razões de decidir, verbis:

1.2 Inexistência do título executivo

O embargante defende a inexistência de título executivo, ao argumento de que o acórdão determinou a correção monetária das contas poupança e a execução se refere às contas correntes.

Não assiste razão ao embargante.

Conforme se infere da sentença (fl. 80), o Bacen foi condenado a pagar “as diferenças que se apurarem em execução entre os valores que lhe foram creditados, a título de correção monetária, sobre seus cruzados bloqueados, e os que foram calculados com base nos índices do IPC-IBGE...”. (grifei), decisão esta mantida pelo e. TRF da 4ª Região, pois o acórdão apenas deu provimento ao apelo para que os juros de mora fossem computados a partir da citação, como se vê na fl. 68 dos autos da execução. Na mesma folha, percebe-se também que houve erro material na fundamentação do acórdão, ao se fazer referência a “contas-poupança”. Tal equívoco, no entanto, é ir-relevante, porque os fundamentos da decisão não transitam em julgado.

Não há nenhuma limitação, portanto, à execução das diferenças somente em relação às contas poupança.

Afasto a preliminar.

MÉRITO

Quanto à incidência do IPC de março/1990 sobre o saldo transferido para a conta bloqueada razão 24/68, tenho que assiste razão à parte em-bargada, eis que o extrato relativo ao mês de março de 1990, juntado às fls. 281/282 dos autos (EVENTO3/OFÍCIO/467), dá conta da existência de saldo na data de apuração.

Analisando-se detidamente a movimentação financeira daquele pe-ríodo se verifica que houve a transferência do saldo de NCz$ 62.800,13 para a conta bloqueada razão 24/68 {conta corrente bloqueada (art. 5º, § 1º da Lei nº 8.024/1990 – conversão da MP 168/1990)}.

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Muito embora se verifique, no período de 19.03.1990 a 30.03.1990, a compensação na conta corrente bloqueada de 06 (seis) cheques (nº 512 no valor de 17.000,00, nº 516 no valor de 49.025,00, nº 517 no valor de 225.280,00, nº 513 no valor de 3.000,00, nº 514 no valor de 45.000,00, nº 518 no valor de 210.000,00), há que se observar que houve o estorno dos cheques nº 514, nº 516, nº 517 e nº 518, de modo que na data de 30.03.1990 o saldo desta conta era de 42.800,13.

Aliás, a existência de saldo na conta corrente bloqueada no mês de março de 1990 é corroborada pela existência de creditamento de valores referente à correção monetária e juros de março/1990 em 26.04.1990 no extrato da fl. 282.

Registra-se, ainda, que a utilização do saldo bloqueado para com-pensação e/ou pagamento de cheques que, teoricamente, deveriam ter sido descontados na conta corrente livre (razão 07/05), não impede a aplicação do IPC de março/1990 sobre o saldo transferido, conforme determinado na sentença transitada em julgado.

Logo, deve ser parcialmente provido o recurso da parte embargada para determinar que a Contadoria Judicial refaça os cálculos, aplicando o índice de 84,32% (IPC de março/1990), deferido na sentença transitada em julgado, sobre o valor transferido. Todavia, para fins de apuração das dife-renças devidas, deve-se considerar que o valor principal foi absorvido pela movimentação ocorrida em abril de 1990 e que houve creditamento da correção monetária e juros de acordo com a MP 168/1990, cujos valores devem ser abatidos.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Fixo a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre o valor que prossegue a execução, a serem satisfeitos pela embargante, e 10% (dez por cento) sobre o valor reduzido com os embargos, a serem satisfeitos pela par-te embargada, compensáveis entre si até o limite do menor valor.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso da parte embargada e negar provimento ao recurso do Bacen, nos termos da funda-mentação.

Desª Fed. Marga Inge Barth Tessler Relatora

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212 �������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

eXtrAto de AtA dA sessão de 02.03.2016

Apelação Cível nº 5006645-36.2012.4.04.7000/PR

Origem: PR 50066453620124047000

Relator: Desª Federal Marga Inge Barth Tessler

Presidente: Marga Inge Barth Tessler

Procurador: Dr(a). Juarez Mercante

Apelante: Banco Central do Brasil – Bacen

Apelante: Fahid Fares

Advogado: Eli Pereira Diniz

Apelado: os mesmos

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 02.03.2016, na sequência 40, disponibilizada no DE de 19.02.2016, da qual foi intimado(a) o Ministério Público Federal e as demais Procuradorias Federais.

Certifico que o(a) 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epí-grafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A turma, por unanimidade, decidiu dar parcial provimento ao recurso da parte embargada e negar provimento ao recurso do Bacen, nos termos da fundamentação.

Relator Acórdão: Desª Federal Marga Inge Barth Tessler

Votante(s): Desª Federal Marga Inge Barth Tessler Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira Des. Federal Fernando Quadros da Silva

José Oli Ferraz Oliveira Secretário de Turma

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Parte Geral – Jurisprudência

8621

Tribunal Regional Federal da 5ª RegiãoPoder JudiciárioGabinete do Desembargador Federal Cid MarconiAgravo de Instrumento nº 143684‑PE (0000014‑46.2016.4.05.0000)Agrte.: Flavio Jose Beltrão Miranda e SouzaAdv./Proc.: Andre Henrique Gomes da FonsecaAgrdo.: Fazenda NacionalRelator: Desembargador Federal Cid Marconi – 3ª TurmaOrigem: Juízo Federal da 22ª Vara/PE – Juiz Tarcísio Barros Borges

emeNtA

PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXCESSO DE PENHORA – NÃO CONFIGURADO – NECESSIDADE DE AVALIAÇÃO DOS BENS

1. Agravo de Instrumento manejado pelo particular em face da deci-são que indeferiu o pedido de redução da penhora.

2. Prejudicados os Embargos de Declaração opostos pelo particular, aduzindo omissão na decisão que indeferiu o pedido liminar, uma vez que o presente Agravo já se encontra maduro para o julgamento.

3. A alegação de eventual excesso de penhora, conforme preceitua o próprio art. 685, caput, do Código de Processo Civil, deverá ser feita após a avaliação dos bens. Precedentes do STJ.

4. Embargos de Declaração prejudicados e Agravo de instrumento improvido.

ACórdão

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que são partes as acima identificadas.

Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, julgar prejudicados os Embargos de Declaração e negar provimento ao Agravo de Instrumento, nos termos do relatório e voto do Desembargador Relator, que passam a integrar o presente julgado.

Recife (PE), 03 de março de 2016.

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214 �������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA

Desembargador Federal Cid Marconi Relator

relAtório

O Desembargador Federal Cid Marconi: Agravo de Instrumento ma-nejado pelo particular em face da decisão que indeferiu o pedido de redu-ção da penhora.

Alega o agravante que existe excesso de penhora, uma vez que o bem imóvel, juntamente com os oito automóveis gravados com restrição judicial, são suficientes para garantir em mais de quatro vezes o valor do crédito que está sendo executado.

Aduz que necessita da liberação de quatro dos automóveis que foram penhorados para que sejam alienados com a finalidade de complementar o pagamento total do débito.

Indeferido o pedido de atribuição de efeito suspensivo.

Interpostos Embargos de Declaração.

Sem contraminuta. É o relatório.

voto

O Desembargador Federal Cid Marconi: Inicialmente, cumpre regis-trar que, estando o presente Agravo maduro para o julgamento, tenho que os Embargos de Declaração encontram-se prejudicados.

É assente o entendimento do col. STJ no sentido que, durante o proce-dimento de penhora, a ausência de avaliação completa impede a aferição a respeito da suficiência ou do excesso de penhora.

Segundo consta do despacho exarado pelo MM. magistrado (fl. 16), ainda não foi cumprido o mandado de penhora e avaliação sobre o bem imóvel em questão, de forma que não há como visualizar qual é o real valor do mesmo, razão pela qual ainda não se pode falar em excesso de penhora.

Neste sentido, confiram-se os seguintes julgados:

“AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO – NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL – INOCORRÊNCIA – EX-CESSO DE PENHORA – ANÁLISE SOMENTE APÓS A AVALIAÇÃO – IMPE-NHORABILIDADE DOS BENS CONSTRITOS

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������������������������������215

1. Se as questões trazidas à discussão foram dirimidas, pelo Tribunal de ori-gem, de forma suficientemente ampla, fundamentada e sem omissões deve ser afastada a alegada violação ao art. 535 do Código de Processo Civil. 2. A alegação de excesso de penhora deve ser efetuada após a avaliação. 3. A jurisprudência esta Corte orienta que os bens das pessoas jurídicas são penhoráveis, tendo o art. 649, inciso V, do CPC aplicação excepcio-nal somente nos casos em que os bens penhorados se revelem indispensá-veis à continuidade das atividades de microempresa ou de pequeno porte. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.”(STJ, AgRg-Ag 1370023/SP, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 4ª T., J. 02.02.2016, DJe 05.02.2016) – Gri-fos acrescidos.

“TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL – AGRAVO REGIMENTAL NO RE-CURSO ESPECIAL – EXECUÇÃO FISCAL – ALEGAÇÃO DE EXCESSO DE EXECUÇÃO – ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE ORIGEM QUE, DIANTE DO ACERVO PROBATÓRIO DOS AUTOS, ENTENDEU QUE SERIA INVIÁVEL VERIFICAR O ALEGADO EXCESSO DE PENHORA EM MOMENTO ANTE-RIOR À AVALIAÇÃO DOS BENS – IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DE FATOS E PROVAS – SÚMULA Nº 7 DO STJ – AGRAVO REGIMENTAL IM-PROVIDO – I – A Corte de origem, ante a constatação de que os bens pe-nhorados ainda não haviam sido avaliados, entendeu inviável a verificação de eventual excesso de penhora. II – Nesses termos, considerando a funda-mentação do acórdão objeto do Recurso Especial, os argumentos utiliza-dos pela parte recorrente, relativos a eventual excesso de penhora, devido à constrição de valor superior ao próprio crédito exequendo, somente pode-riam ter sua procedência verificada mediante o necessário reexame de ma-téria fática, não cabendo a esta Corte, a fim de alcançar conclusão diversa, reavaliar o conjunto probatório dos autos, em conformidade com a Súmula nº 7/STJ. III – Ademais, é firme nesta Corte, o entendimento de que ‘a ale-gação de eventual excesso de penhora, conforme preceitua o próprio art. 685, caput, do Código de Processo Civil, deverá ser feita após a ava-liação’ (STJ, AgRg-Ag 655.553/RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, 4ª T., DJU de 23.05.2005). Em igual sentido: STJ, AgRg-AREsp 88.983/SP, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., DJe de 03.08.2015. IV – Agravo Regimental improvido.” (STJ, AgRg-REsp 1495035/RS, Relª Min. Assusete Magalhães, 2ª T., Julgado em 17.12.2015, DJe 03.02.2016) – Grifos acrescidos.

Por essas razões, julgo prejudicados os Embargos de Declaração e nego provimento ao Agravo de Instrumento. É como voto.

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Parte Geral – Ementário de Jurisprudência8622 – Ação anulatória e indenizatória – contrato de franquia – recurso

“Dois agravos regimentais. Agravos em recurso especial. Ação anulatória e indenizatória. Contrato de franquia. Não impugnação específica dos fundamentos da decisão agravada. Súmula nº 182/STJ. 1. ‘É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada’ (Súmula nº 182/STJ). 2. Agravo regimental de Maria Maior Comércio de Artigos para Vestuário Ltda. não conhecido. Agravo regimental de Carmen Steffens Franquias Ltda. não conhecido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 764.933 – (2015/0205568-1) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 18.02.2016 – p. 542)

8623 – Ação cautelar de exibição de documentos – interesse de agir – pedido prévio à institui-ção financeira e pagamento do custo do serviço – necessidade

“Agravo regimental. Recurso especial. Processo civil. Ação cautelar de exibição de documentos. Interesse de agir. Pedido prévio à instituição financeira e pagamento do custo do serviço. Necessi-dade. 1. ‘A propositura de ação cautelar de exibição de documentos bancários (cópias e segunda via de documentos) é cabível como medida preparatória a fim de instruir a ação principal, bastando a demonstração da existência de relação jurídica entre as partes, a comprovação de prévio pedido à instituição financeira não atendido em prazo razoável, e o pagamento do custo do serviço conforme previsão contratual e normatização da autoridade monetária’ (Recurso Especial Representativo de controvérsia nº 1.349.453/MS, unânime, DJe de 02.02.2015). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.224.100 – (2010/0218195-6) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 02.03.2016 – p. 1112)

8624 – Ação civil pública – liquidação provisória de sentença – correção monetária do débito judicial apurado

“Processual civil. Agravo regimental no agravo. Poupança. Ação civil pública. Liquidação provisó-ria de sentença. Correção monetária do débito judicial apurado. Critérios não definidos no título judicial. Incidência dos expurgos inflacionários do IPC na conta de liquidação. Ausência de ofensa à coisa julgada. 1. Legítima a incidência dos índices de inflação expurgados em 1990 a título de correção monetária plena, silente o título judicial a respeito, sobre o valor da condenação, cuja base de cálculo é o saldo mantido nas contas de poupança na época do expurgo reclamado na inicial – não incidindo sobre valores depositados em data posterior. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-AI 1.257.191 – (2009/0234343-8) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 02.03.2016 – p. 1113)

8625 – Ação de indenização por danos materiais e morais – atropelamento em via férrea – morte de transeunte – menor púbere – dano material – pensão mensal

“Embargos de declaração no recurso especial. Ação de indenização por danos materiais e morais. Atropelamento em via férrea. Morte de transeunte. Menor púbere. Dano material. Pensão mensal vinculada ao salário mínimo. Necessidade de redução em decorrência da culpa concorrente. For-ma de atualização do pensionamento. Omissão caracterizada. Embargos acolhidos. 1. No acór-dão embargado, ficou estabelecida a concorrência de causas, uma vez que, concomitantemente à negligência da concessionária ao não se cercar das práticas de cuidado necessário para evitar a ocorrência de sinistros, houve imprudência na conduta da vítima, que atravessou a linha férrea em local inapropriado, próximo a uma passarela, o que, na esteira da jurisprudência desta Corte, acar-reta a redução da indenização por dano moral à metade (REsp 1.172.421/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª S., DJe de 19.09.2012, julgado sob o rito dos recursos repetitivos). 2. Por questão de coerência jurídica, e em observância ao art. 945 do CC, a existência de culpa concorrente deve repercutir, também, no valor da indenização por danos materiais, na modalidade de pensão mensal, o que impõe, no presente caso, a sua redução também pela metade. 3. As parcelas de pensão fixada em salário mínimo devem ser convertidas em valores líquidos à data do vencimento e, a partir de en-tão, atualizadas monetariamente. 4. Embargos de declaração acolhidos.” (STJ – EDcl-REsp 1.325.034 – (2012/0103913-0) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.02.2016 – p. 397)

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������217

8626 – Ação de obrigação de fazer e de indenização por danos morais – pedido de justiça gratuita formulado por pessoa jurídica

“Agravo regimental no agravo (art. 544 do CPC). Ação de obrigação de fazer e de indenização por danos morais. Pedido de justiça gratuita formulado por pessoa jurídica. Decisão monocrática que negou provimento ao reclamo ante a ocorrência de deserção. Irresignação da agravante. 1. Embora o pedido de assistência judiciária gratuita possa ser formulado a qualquer tempo, nos casos em que a ação judicial esteja em curso ele deve ser veiculado em petição avulsa, a qual será processada em apenso aos autos da causa principal, segundo os termos da Lei nº 1.060/1950, e não no próprio cor-po do recurso especial, como ocorreu no presente caso. 2. ‘Mesmo que o mérito recursal refira-se a pedido de gratuidade de justiça indeferido ou não analisado nas instâncias ordinárias, é deserto o recurso cujo processamento e julgamento é de competência do Superior Tribunal de Justiça, se não há comprovante de pagamento das custas processuais nem renovação do pedido de justiça gratuita’ (AgRg-EREsp 1210912/MG, Corte Especial, Relª Min. Laurita Vaz, DJe de 27.04.2015). 3. Esta Corte Superior possui o entendimento de que a eventual concessão dos benefícios da gratuidade de justi-ça opera efeitos ex nunc, não podendo, dessa forma, retroagir à data de interposição do recurso es-pecial. A ausência de comprovação do recolhimento do preparo no ato da interposição do recurso especial implica sua deserção. Incidência da Súmula nº 187 desta Corte. Precedentes. 4. Em sede de recurso especial, é inviável rever o entendimento do tribunal de origem que afasta a presunção de veracidade da declaração de pobreza e, fundamentadamente, indefere o pedido de gratuidade de justiça. Incidência da Súmula nº 7/STJ. Precedentes. 5. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg--Ag-REsp 770.855 – (2015/0211380-0) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 18.02.2016 – p. 584)

8627 – Ação declaratória cumulada com indenização por danos morais – inscrição indevida do nome do devedor nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito – preexistência de anotações regulares

“Agravo regimental em recurso especial. Ação declaratória cumulada com indenização por danos morais. Inscrição indevida do nome do devedor nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito. Preexistência de anotações regulares. Afastamento da indenização por dano moral, nos termos da Súmula nº 385/STJ. Decisão monocrática negando seguimento ao apelo extremo. Insurgência recursal da autora. 1. O recurso especial não se mostra inviável ao exame de suposta violação a dis-positivos constitucionais, trata-se de matéria reservada à análise do Supremo Tribunal Federal. 2. O reconhecimento da revelia e de seus efeitos no caso concreto não altera o resultado da lide quando o julgador, amparado no princípio do livre convencimento motivado, decide com base nas provas colacionada aos autos. 3. Na hipótese dos autos, aplicável o Enunciado da Súmula nº 385/STJ, ‘da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento’. 4. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.158.835 – (2009/0143896-2) – 4ª T. – Rel. Min. Marco Buzzi – DJe 18.02.2016 – p. 588)

8628 – Ação indenizatória – litispendência – ausência de prequestionamento – danos morais

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Ação indenizatória. Processual civil. Litispen-dência. Ausência de prequestionamento dos dispositivos suscitados. Súmula nº 211/STJ. Danos morais. Fundamentos do acórdão recorrido não impugnados no apelo extremo. Súmulas nºs 283 e 284 do STF. Agravo desprovido. 1. A indicação de dispositivos sem que tenham sido debatidos pelo Tribunal de origem, apesar da oposição dos embargos de declaração, obsta o conhecimento do recurso especial pela ausência de prequestionamento. Aplicável, assim, o Enunciado nº 211 da Súmula do STJ. 2. É inadmissível o recurso especial nas hipóteses em que a decisão recorrida assen-ta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles. Aplicação analógica dos Enunciados nºs 283 e 284 da Súmula do STF. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 805.964 – (2015/0278079-0) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.02.2016 – p. 390)

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8629 – Ação monitória – cheques prescritos – natureza cambiária do cheque

“Processo civil. Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Ação monitória. Cheques pres-critos. Natureza cambiária do cheque. Divergência jurisprudencial. Ausência do cotejo analítico. 1. A divergência jurisprudencial deve ser demonstrada na forma preceituada pelo CPC e pelo RISTJ, mediante a realização do cotejo analítico dos arestos em confronto. 2. Agravo regimental desprovi-do.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 738.680 – (2015/0160397-2) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 18.12.2015 – p. 3472)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão que, ante a incidência da Súmula nº 182 do STJ, não conheceu do agravo em recurso especial.

Nas razões deste agravo regimental, insurge-se a parte contra a referida decisão, alegando que todos os fundamentos para a inadmissão do recurso especial foram combatidos nas razões do agravo denegado e que o dissenso jurisprudencial foi devidamente demonstrado.

Requereu a reconsideração da decisão agravada.

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

Oportuno colacionar trecho do voto do relator:

“A parte recorrente, limitando-se a transcrever a ementa dos julgados tidos por divergen-tes, não promoveu o necessário cotejo analítico entre o aresto recorrido e os paradigmas, de forma que não há como verificar a ocorrência dos elementos necessários à compro-vação do dissídio jurisprudencial deduzido, a saber, semelhança entre as bases fáticas dos acórdãos confrontados e divergência entre teses jurídicas conferidas a um mesmo contexto.”

Assim dispõe o Código de Processo Civil:

“Art. 1.102-A. A ação monitória compete a quem pretender, com base em prova escrita sem eficácia de título executivo, pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungí-vel ou de determinado bem móvel.”

A ação monitória é o instrumento processual colocado à disposição do credor de quantia certa, de coisa fungível ou de coisa móvel determinada, com crédito comprovado por documento escrito sem eficácia de título executivo, para que possa requerer em juízo a expedição de mandado de pagamento ou de entrega da coisa para a satisfação de seu direito (NERY JUNIOR, Nelson; ANDRADE NERY, Rosa Maria. Processo civil comentado e legislação processual civil extravagante em vigor. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977. p. 1032).

A Dra. Mariângela Guerreiro Milhoranza, discorrendo sobre a ação monitória, assim dis-ciplina:

“A Lei nº 9.079/1995 trouxe a ação monitória para o nosso sistema de direito proces-sual ao inserir os arts. 1.102-A, 1.102-B e 1.102-C ao CPC. ‘O adjetivo monitório, que qualifica a ação, significa aquilo que avisa, admoesta, exorta. Procede do latim monere, advertir, lembrar, exortar.’

A ação monitória é uma forma de procedimento especial que tem por fito proporcionar ao autor um título executivo em que será balizado o cumprimento da obrigação. Theodoro Júnior diz que, ‘abreviando o caminho para alcançar o título executivo, funciona, enfim, o procedimento monitório como um inteligente meio de definir, na abertura do processo, a natureza da lide, evidenciando se é caso de pretensão contestada ou simplesmente de pretensão insatisfeita’. Mas, para conseguir o título executivo, o autor deve possuir prova escrita, sem eficácia de título executivo, que comprove a existência de obrigação de pa-gamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem imóvel. Quanto à natureza jurídica da ação monitória, o processo monitório tem cognição sumária, somente nos embargos monitórios versará cognição plena. Pois bem, ingressada em juízo determinada ação monitória, haverá o prazo de quinze dias para que o réu ou faça o paga-

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������219

mento, ou ofereça embargos ou quede silente. Sendo oferecidos os embargos monitórios, seria suspensa a eficácia do mandado como título executivo. Mas, mesmo que suspensa a ação monitória até julgamento dos embargos, caberia execução provisória? Sustenta Dinamarco que sim, afirmando: ‘Embora a Lei nada disponha sobre uma possível execu-ção provisória, a sua admissibilidade é uma imposição do sistema, que quer ser ágil e valorizar probabilidades’. Elaine Harzheim Macedo, já em 1997, defendia que a possi-bilidade da execução provisória ‘[...] reclama uma efetividade procedimental adequada, que certamente não é alcançada pelo sistema convencional das apelações recebidas em ambos os efeitos’. Hermes Zaneti Júnior e Rodrigo Mazzei entendem que ‘[...] não parece possível a execução provisória em título decorrente de procedimento monitório, caso a decisão que rejeitar os embargos seja impugnada via recurso de apelação’. Ora, o in-ciso V do art. 520 do Código de Processo Civil, por analogia, antes do advento da Lei nº 11.232/2005, era aplicável aos embargos em mandado monitório. Entrementes, após a vigência da Lei nº 11.232/2005, a decisão que afasta os embargos monitórios passou a ter caráter incidental. Sendo decisão de caráter incidental, não há como ser atacada via apelação. Portanto, não cabe execução provisória, eis que restou impossível aplicar o inciso V do art. 520 porque não se trata de decisão judicial atacável via apelação.

Nesse sentido, o art. 1.102-C, caput, e seu respectivo § 3º apenas sofreram um proces-so de adaptação do procedimento da ação monitória ao novo rito estabelecido pela Lei nº 11.232/2005 no que toca ao cumprimento da sentença condenatória. Assim, a con-versão do mandado inicial de citação gera, inevitavelmente, um título executivo judicial, mesmo que não esteja arrolado entre as hipóteses do art. 475-N.” (Algumas observações sobre a ação monitória. Disponível em: online.sintese.com)

8630 – Ação monitória – desconsideração da personalidade jurídica – inadimplemento – insol-vência – empresa devedora

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Ação monitória. Desconsideração da personalida-de jurídica. Art. 50 do Código Civil. Inadimplemento. Insolvência. Empresa devedora. Não preenchi-mento de requisitos. 1. É possível a desconsideração da personalidade jurídica nos termos do art. 50 do CC – teoria maior – quando há constatação do desvio de finalidade pela intenção dos sócios de fraudar terceiros ou quando houver confusão patrimonial. 2. A mera demonstração de insolvência ou a dissolução irregular da empresa, por si sós, não ensejam a desconsideração da personalidade jurídica. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-AgRg-Ag-RE 334.883 – (2013/0127764-5) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 18.02.2016 – p. 508)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão que deu provimento a agravo para conhecer e dar provimento ao recurso especial a fim de afastar a desconsideração da personalidade jurídica.

Em suas razões, alegou a agravante que o recurso especial não merecia conhecimento tendo em vista o disposto na Súmula nº 7/STJ. Defendeu também que a desconsideração da personalidade jurídica baseou-se no reconhecimento de fraude a credores e abuso de direito.

Sustentou não ser crível que a empresa mantenha apenas o saldo de R$ 327,97 em conta bancária, enquanto os sócios possuem diversos bens passíveis de penhora.

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

Vale trazer as considerações do Relator:

“Por fim, não há falar na aplicação da Súmula nº 7/STJ no presente caso quando evidente no acórdão recorrido que o reconhecimento do abuso de personalidade se deu apenas em face da ausência de pagamento por parte da empresa por tempo prolongado, não neces-sitando o revolvimento de fatos e provas nesta instância especial.

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Assim, com a ratificação, na sua integralidade, das razões norteadoras do conhecimento e provimento do recurso especial, conclui-se que, nada obstante os argumentos desen-volvidos na presente via recursal, a decisão agravada deve ser mantida por seus próprios fundamentos.”

A Dra. Mariângela Guerreiro Milhoranza, discorrendo sobre a ação monitória, assim dis-ciplina:

“A Lei nº 9.079/1995 trouxe a ação monitória para o nosso sistema de direito proces-sual ao inserir os arts. 1.102-A, 1.102-B e 1.102-C ao CPC. ‘O adjetivo monitório, que qualifica a ação, significa aquilo que avisa, admoesta, exorta. Procede do latim monere, advertir, lembrar, exortar.’

A ação monitória é uma forma de procedimento especial que tem por fito proporcionar ao autor um título executivo em que será balizado o cumprimento da obrigação. Theodoro Júnior diz que, ‘abreviando o caminho para alcançar o título executivo, funciona, enfim, o procedimento monitório como um inteligente meio de definir, na abertura do processo, a natureza da lide, evidenciando se é caso de pretensão contestada ou simplesmente de pretensão insatisfeita’. Mas, para conseguir o título executivo, o autor deve possuir prova escrita, sem eficácia de título executivo, que comprove a existência de obrigação de pa-gamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem imóvel. Quanto à natureza jurídica da ação monitória, o processo monitório tem cognição sumária, somente nos embargos monitórios versará cognição plena. Pois bem, ingressada em juízo determinada ação monitória, haverá o prazo de quinze dias para que o réu ou faça o paga-mento, ou ofereça embargos ou quede silente. Sendo oferecidos os embargos monitórios, seria suspensa a eficácia do mandado como título executivo. Mas, mesmo que suspensa a ação monitória até julgamento dos embargos, caberia execução provisória? Sustenta Di-namarco que sim, afirmando: ‘Embora a Lei nada disponha sobre uma possível execução provisória, a sua admissibilidade é uma imposição do sistema, que quer ser ágil e valorizar probabilidades’. Elaine Harzheim Macedo, já em 1997, defendia que a possibilidade da execução provisória ‘[...] reclama uma efetividade procedimental adequada, que certa-mente não é alcançada pelo sistema convencional das apelações recebidas em ambos os efeitos’. Hermes Zaneti Júnior e Rodrigo Mazzei entendem que ‘[...] não parece possível a execução provisória em título decorrente de procedimento monitório, caso a decisão que rejeitar os embargos seja impugnada via recurso de apelação’. Ora, o inciso V do art. 520 do Código de Processo Civil, por analogia, antes do advento da Lei nº 11.232/2005, era aplicável aos embargos em mandado monitório. Entrementes, após a vigência da Lei nº 11.232/2005, a decisão que afasta os embargos monitórios passou a ter caráter in-cidental. Sendo decisão de caráter incidental, não há como ser atacada via apelação. Portanto, não cabe execução provisória, eis que restou impossível aplicar o inciso V do art. 520 porque não se trata de decisão judicial atacável via apelação.

Nesse sentido, o art. 1.102-C, caput, e seu respectivo § 3º apenas sofreram um proces-so de adaptação do procedimento da ação monitória ao novo rito estabelecido pela Lei nº 11.232/2005 no que toca ao cumprimento da sentença condenatória. Assim, a con-versão do mandado inicial de citação gera, inevitavelmente, um título executivo judicial, mesmo que não esteja arrolado entre as hipóteses do art. 475-N.” (Algumas observações sobre a ação monitória. Disponível em: online.sintese.com)

8631 – Ação rescisória – cálculo de liquidação em desacordo com o título exequendo – possi-bilidade de correção a qualquer tempo

“Processual civil. Agravo regimental na ação rescisória. Cálculo de liquidação em desacordo com o título exequendo. Possibilidade de correção a qualquer tempo. Inexistência de violação da lite-ralidade da lei. Provimento negado. 1. Segundo a pacífica jurisprudência desta Corte, é possível a correção da conta de liquidação na hipótese em que a memória de cálculo apresentada pela parte exequente está em desacordo com o comando expresso no título judicial exequendo, sem que isso implique violação da coisa julgada. Precedentes. 2. Hipótese em que o cálculo de liquidação não

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estava perfeitamente adequado à metodologia definida na sentença, que determinou o reajuste dos valores do benefício, desde a primeira renda mensal, com aplicação, no primeiro reajuste, do índi-ce integral da política salarial. 3. Possibilidade de retificação dos cálculos, ainda que acobertados pela coisa julgada, para ajustá-los ao comando expresso na sentença. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-AR 3.913 – (2008/0020790-0) – 3ª S. – Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz – DJe 02.03.2016 – p. 774)

8632 – Compra e venda – inadimplemento do comprador – cláusula penal – fruição do imóvel – indenização

Civil. Agravo regimental. Recurso especial. Compra e venda. Inadimplemento do comprador. Cláu-sula penal. Fruição do imóvel. Indenização. 1. É cabível a indenização pela utilização do imóvel pelo comprador inadimplente, ainda que haja previsão contratual de cláusula penal. 2. Agravo re-gimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.212.273 – (2010/0168189-9) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 19.02.2016 – p. 487)

8633 – Compra e venda de imóveis – responsabilização da vendedora pelo atraso no financia-mento

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Compra e venda de imóveis. Responsabilização da vendedora pelo atraso no financiamento. Matéria de fato. 1. ‘A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial’ (Súmula nº 7/STJ). 2. Agravo regimental a que se nega pro-vimento.” (STJ – AgRg-AgRg-Ag-RE 711.247 – (2015/0112315-4) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 19.02.2016 – p. 449)

8634 – Consórcio – desistência – restituição de parcelas – juros de mora – termo inicial

“Agravo regimental. Recurso especial. Consórcio. Desistência. Restituição de parcelas. Juros de mora. Termo inicial. 1. A restituição das parcelas pagas por desistente de consórcio deve ocorrer em até 30 dias do prazo previsto em contrato para o encerramento do grupo a que estiver vinculado o participante, devendo incidir a partir daí juros de mora, na hipótese de o pagamento não ser efetivado. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.361.636 – (2013/0003026-0) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 19.02.2016 – p. 496)

8635 – Dano moral – devolução de cheque – insuficiência de fundos – exercício regular de um direito – irregularidade formal da cártula

“Agravo regimental em recurso especial. Indenização. Dano moral. Devolução de cheque. Insu-ficiência de fundos. Exercício regular de um direito. Irregularidade formal da cártula. Prequestio-namento. Ausência. Não provimento. 1. A parte recorrente traz a discussão matéria não apreciada pelo acórdão recorrido, não cumprindo, assim, o requisito do prequestionamento, necessário para o julgamento da controvérsia nesta Corte. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.278.185 – (2011/0158702-5) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 19.02.2016 – p. 489)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de interposição de agravo regimental contra decisão que negou seguimento ao recurso especial por entender ausente o requisito do prequestionamento acerca da regula-ridade formal do cheque emitido.

A agravante alegou que a matéria foi enfrentada e superada pelo entendimento de que é exercício regular de direito devolver cheque sem fundos, independentemente de estar assinado ou não.

Oportuno trazer à baila a ementa agravada:

“APELAÇÃO – INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS – DEVOLUÇÃO DE CHEQUE – INSU-FICIÊNCIA DE FUNDOS – EXERCÍCIO REGULAR DO DIREITO – Age no exercício regular

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do direito à instituição financeira que, verificando a insuficiência de fundos na conta corrente do emitente do cheque, devolve o titulo por tal motivo.”

A recorrente afirmou que a falta de assinatura do emitente retira do título a natureza de cheque e que apenas se estivesse formalmente perfeito é que se poderia proceder à verificação de fundos.

O STJ negou provimento ao recurso.

O ilustre Jurista José Carlos Arouca assim disciplina sobre o dano moral:

“Dano moral, como conceituado por Pinho Pedreira, é todo e qualquer dano extrapatri-monial, afastando ‘as definições que o identificam com os sofrimentos que pode experi-mentar uma pessoa e que se expressam por meio da dor física ou moral, do menoscabo de sentimentos, da pena moral, das inquietações, dos padecimentos não suscetíveis de apreciação ‘econômica’. Não há, também, como vinculá-lo a direitos personalíssimos.

O dano moral, no ensinamento de Carlos Alberto Bittar, qualifica-se ‘em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato vio-lador, havendo-se, portanto, como tais, aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria valo-ração da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração pessoal)’.

O dano moral deriva do simples fato da violação, tornando-se, pois, desnecessária a prova do reflexo. A indenização, por conseguinte, será fixada mediante arbitramento, na forma do art. 606, II, do CPC.

A reparação, seguindo-se a teorização de Bittar, deve levar em conta a situação da vítima, a posição do lesante, seu patrimônio, a gravidade do fato, seus reflexos. Mas, além disso, deve ter efeito inibitório de repetição de práticas semelhantes.

[...]

Não foi fácil determinar parâmetros para a aferição do dano e sua valoração. Num pri-meiro momento, lembra Beatriz Della Giustina, a falta de meios, mas principalmente de precedentes e um pouco de coragem para avançar, apelou-se para o Código Eleitoral (Lei nº 4.737/1965), servindo-se mesmo de dispositivos legais do antigo Código Brasi-leiro de Telecomunicações (Lei nº 4.117/1962), arts. 81 a 88, que enumera as formas delituosas que podem produzir o dano moral (arts. 289 e ss.), com o objetivo de asse-gurar sua reparação quando ocasionados por propaganda eleitora injuriosa ou deletéria (art. 243, §§ 1º e 2º), para a Lei de Imprensa, nº 5.250/1967, que, regulando a liberdade de manifestação do pensamento e de informações, dispõe no art. 49, I: ‘Aquele que no exercício da liberdade de manifestação de pensamento e de informação, com dolo ou cul-pa, viola direito, ou causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar: I – os danos morais e materiais nos casos previstos no art. 16, II e IV, no art. 18 e de calúnia, difamação ou injúria’. Estabelece, ainda, nos arts. 53 e 54, clara distinção entre indenização por dano moral e indenização por dano material. O art. 53, I a III, por sinal, dispõe como deverá o Magistrado proceder no arbitramento do quantum indenizatório.

Na vigência do Código Civil de 1916, acenava-se ao art. 1.533 para o arbitramento da indenização, ‘de maneira equitativa, prudente, não abusiva, atentando para a capacidade de pagar do que causou a situação, de modo a compensar a dor sofrida pelo lesionado e inibir a prática de outras situações semelhantes’. Na opinião de Sérgio Pinto Martins, ‘uma forma de pagamento, completa, seria a aplicação analógica da indenização dos arts. 477 e 478 da CLT, do pagamento de um salário por cada ano de serviço trabalhado pelo empregado, considerando-se ano o período igual ou superior a seis meses’, lembran-do a regra do art. 948 do antigo Código Civil, o qual explicita que ‘nas indenizações por fato ilícito prevalecerá o valor mais favorável ao lesado’. Refere-se, mais, à decisão do TRT da 8ª Região, sendo Relator o Juiz José Maria Quadros de Alencar, que condenou o infrator ao pagamento de um piso e meio da convenção coletiva, pelo período em que ficou desempregado. E, dentre outras hipóteses, o fornecimento de carta de referência,

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publicação de nota na imprensa local dando conta do rompimento do contrato de trabalho sem que para tanto tivesse contribuído o empregado.

O Código Civil vigente, no art. 946, remete à Lei processual a fixação do valor das perdas e danos, se a obrigação for indeterminada. A indenização, todavia, na forma do art. 944, ‘mede-se pela extensão do dano’.

O art. 1.533 do diploma anterior foi substituído pelo art. 946: ‘Se a obrigação for inde-terminada, e não houver na Lei ou no contrato disposição fixando a indenização devida pelo inadimplente, apurar-se-á o valor das perdas e danos na forma que a Lei processual determinar’.

Para Orlando Teixeira da Costa, ‘na fixação do valor, o julgador, normalmente, subordina--se a alguns parâmetros procedimentais, considerando a extensão espiritual do dano, a imagem do lesado e a do que lesou, a intenção do autor do ato danoso, como meio de ponderar o mais objetivamente possível direitos à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem da pessoa’.

De nossa parte, lembramos Graciliano Ramos, que, sem pensar no tema, mas em função dos males causados pelo homem, distinguia o capitalista abastado e o proletário sem nada; o intelectual com grande capacidade de discernimento e o inculto, com formação rudimentar. A reparação do dano deve ter presente o perfil do ofendido e do ofensor, isto é, do empregado e do empregador, e, na hipótese colocada, no poderio econômico da empresa, no seu porte, a gravidade do ato ofensivo, a profundidade do dano causado e sua repercussão, interna, no âmbito da empresa, e externa, no meio em que se situa o trabalhador, familiar e social.” (Dano moral. Disponível em: online.sintese.com)

8636 – Dano moral – inscrição desabonadora do nome – direito de crédito prejudicado – valor indenizatório – revisão – descabimento

“Agravo regimental no agravo de instrumento. Inscrição desabonadora do nome do agravado que prejudicou seu direito de crédito. Danos morais. Valor indenizatório. Revisão. Descabimento. Fixa-ção que não afronta a razoabilidade e proporcionalidade. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite, excepcionalmente, em recurso especial, o reexame do valor fixado a título de danos morais, quando ínfimo ou exagerado. Hipótese, todavia, em que a verba indenizatória, con-sideradas as circunstâncias de fato da causa, foi reduzida pelo acórdão recorrido em conformidade com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. 2. Agravo regimental a que se nega pro-vimento.” (STJ – AgRg-AI 1.416.871 – (2011/0085061-3) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 18.12.2015 – p. 3554)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de agravo regimental interposto, tendo por objeto a decisão proferida que negou provimento ao agravo em razão da incidência da Súmula n 7/STJ, mantendo a indeniza-ção fixada a título de danos morais.

Nas razões do agravo regimental, afirma o agravante não haver necessidade do reexame de provas.

Buscou a redução do valor indenizatório fixado pelo Tribunal de origem em R$ 20.000,00 (vinte mil reais).

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

Irineu Strenger, em estudo elaborado sobre o dano moral, assim nos elucida:

“Quando se fala em dano moral se tem em conta, especialmente, a caracterização do resultado lesivo, considerando-se, como primeiro aspecto, a verificação ou não de um dano, segundo sua concepção genericamente admitida, ou seja, a existência de um ato ilícito punível, vale dizer, identificado com a ofensa ou lesão de um direito ou de um bem jurídico qualquer.

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A matéria relacionada com o dano indenizável é bastante ampla e exige, para sua exata compreensão e aplicação, numerosas distinções, às vezes empanadas por variada termi-nologia que usam os escritores.

O dano moral, por não ter nenhuma vinculação com os valores econômicos ou patrimo-niais, não é, por si mesmo, suscetível de apreciação pecuniária, e, por isso, deve ser uma indenização que se traduza numa soma de dinheiro, estabelecida livremente pelos juízes.

O dinheiro se dá não porque o bem lesionado seja suscetível de apreciação pecuniária, como os bens patrimoniais, mas como compensação.

Na verdade, somente a jurisprudência, a ductibilidade de contemplação dos casos concre-tos e específicos, pode dar um conceito de dano moral que contemple a verdadeira voca-ção do instituto de assegurar uma justa compensação a todos aqueles que sofreram lesão na situação favorável ou de vantagem que possuíam em relação a determinados bens.

Ressarcir os danos morais, ainda que seja de modo pecuniário, à falta de outro melhor não é materializar os interesses morais, mas, ao contrário, espiritualizar o direito enquanto este não se limita à proteção dos bens econômicos, envolvendo também outros bens não econômicos que são inseparáveis da pessoa humana.

Tenha-se, porém, em conta que a impossibilidade de uma exata valoração do dano moral não deve conduzir à sustentação que sua apreciação pelo juiz será absolutamente arbi-trária. Isso conduz à insegurança e à injustiça. Haverá decisões que ascendem a uma soma além do bom-senso e outros valores sem nenhuma transcendência, irrisórios ou puramente simbólicos.

Há quem sustente que no dano moral deve levar-se em conta a condição social e eco-nômica do ofendido. Porém, isso nos leva, em princípio, a subestimar o dano moral dos pobres. Nesse sentido, estamos de acordo com a opinião de que não vale mais a dor dos ricos que a dos pobres, e resulta imoral medir a dor em função do dano patrimonial que se possa ter sofrido. Deve-se, contudo, considerar a personalidade do agente, as circuns-tâncias condicionantes do delito e a gravidade da falta cometida, atendendo a índole do fato, se culposo ou doloso, o tipo de antijuridicidade, etc. A gravidade da falta para os fins ressarcitórios se mede pelo resultado danoso.

Como contribuição para um entendimento abrangente do dano moral, oferecemos a se-guinte definição:

‘Chama-se dano moral qualquer ato não patrimonial que faça repercutir na esfera da pes-soa física ou jurídica consequências que afetem sua situação social, comunitária, econô-mica ou familiar, causando danos avaliáveis segundo o grau e extensão de seus efeitos.’” (Novo Código Civil – Dano moral. Juris SÍNTESE, n. 52, mar./abr. 2005)

8637 – Denunciação da lide – litisconsórcio – descabimento – ilegitimidade passiva afastada

“Apelação cível. Agravo retido. Produção de provas. Denunciação da lide. Litisconsórcio. Desca-bimento. Ilegitimidade passiva afastada. Comissão de corretagem. Prescrição trienal. Promessa de compra e venda de imóvel. Mora da ré configurada. Dever de reparação. Lucros cessantes. Multa contratual. Saldo-devedor do imóvel. Reajuste pelo IGPM no período da mora não demonstrado. Dano moral. Ausência. Descumprimento contratual. 1. Compete ao juiz, destinatário da prova, definir as diligências imprescindíveis à formação de seu convencimento, dispensando aquelas que entender impertinentes (art. 130 do CPC). Se o acervo fático existente é suficiente para nortear sua convicção, pode o magistrado conhecer diretamente do pedido, proferindo sentença. 2. Nos termos do art. 88 do Código de Defesa do Consumidor, é vedada a denunciação da lide nas demandas que envolvem relações de consumo. 3. 4. Os fornecedores envolvidos na cadeia de produção do bem alienado ao consumidor respondem solidariamente por eventuais danos causados, razão pela qual tanto a construtora quanto a corretora têm legitimidade para compor o polo passivo da lide que pleiteia o ressarcimento de valor pago a título de comissão de corretagem. 5. Configurada a hipótese de força maior, tal afasta a responsabilidade pelo atraso na entrega da coisa prometida, na

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proporção correspondente ao período da paralisação e consequente suspensão de prazo contratual. 6. O atraso que não tem vinculação com a força maior não ilide a responsabilidade, devendo ser computada a obrigação de indenizar no período proporcional correspondente. 7. Consoante en-tendimento desta Corte de justiça, o IGPM – Índice Geral de Preços de Mercado deve ser aplicado para atualização do saldo devedor do imóvel tão somente depois da expedição do habite-se. A incidência deste em período anterior, no entanto, há de ser devidamente demonstrada nos autos. 8. O aborrecimento decorrente do inadimplemento contratual, por si só, não tem o condão de pro-vocar ofensa aos atributos da personalidade e dar ensejo à reparação moral. 9. Recurso conhecido e parcialmente provido.” (TJDFT – AC 20130111921998 – (912520) – 5ª T.Cív. – Rel. Des. Carlos Rodrigues – DJe 18.12.2015 – p. 330)

Comentário Editorial SÍNTESEDeduzida pretensão de conhecimento, sob o rito ordinário, informando que entabulou promessa de compra e venda de imóvel com a empresa de empreendimentos imobiliá-rios, porém, em que pese haver cláusula expressa prevendo e entrega do bem em julho de 2009, o fato é que recebeu as chaves tão somente em abril de 2013, razão pela qual requereu: a) restituição dobrada da importância que pagou a título de comissão de corretagem; b) indenização por lucros cessantes, eis que deixou de auferir renda com o aluguel do bem; c) multa contratual no percentual estabelecido na avença (0,5 % ao mês); d) devolução dos valores que pagou em decorrência da incidência do IGPM sobre o saldo-devedor do bem no período da mora; e) indenização pelos danos morais que experimentou com o atraso.

A sentença pronunciou a prescrição da pretensão autoral no que se refere ao pedido de restituição dobrada do valor cobrado a título de comissão de corretagem. No mérito, julgou os pedidos improcedentes sob o fundamento de que o atraso na entrega do imóvel decorreu de culpa exclusiva de terceiro (embargo de todas as obras em andamento no setor noroeste).

Em suas razões de recurso o autor/apelante aduziu que o prazo prescricional aplicável ao caso é de 10 anos, eis que se trata de cobrança abusiva por ausência de informação.

Reputou injustificado o atraso na entrega do imóvel ao argumento de que o embargo in-vocado pela ré ocorreu em data anterior à promessa de compra e venda discutida nestes autos, requerendo, assim, o provimento do recurso para que seja a ré condenada a reparar os prejuízos materiais e morais que sofreu em decorrência de tal ato.

A ré/apelada apresentou contrarrazões pedindo, de início, conhecimento e provimento do agravo retido que interpôs em face da decisão que indeferiu seu pedido de produção de prova oral. Ainda, suscitou prejudicial de prescrição da pretensão autoral no que se refere ao pedido de devolução dobrada do valor cobrado a título de comissão de corretagem. No mérito, requereu o desprovimento do apelo da parte adversa.

O TJDFT conheceu do recurso e a ele deu parcial provimento para reconhecer a mora da ré no período de 29.03.2013 a 23.04.2013 e determinar que esta pague ao autor multa contratual pelo atraso na entrega do imóvel no percentual de 0,5% (cinco por cento) ao mês, pro rata die, com atualização monetária e juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação.

Nas lições de Luiz Rodrigues Wambier, Flávio Renato Correia de Almeida e Eduardo Talamini sobre a denunciação da lide, temos que:

“A denunciação da lide é instituto criado com o objetivo de, levando a efeito o princípio da economia processual, inserir num só procedimento duas lides, interligadas, uma de que se diz principal e outra de que se diz eventual, porque, na verdade, o potencial conflituoso da lide levada a conhecimento do juiz através da denunciação só se realiza concretamente em função de um determinado resultado, que será obtido com a solução da lide principal. Não sendo vencido o denunciante na ação originária, a lide eventual não deve ser exami-nada, já que a denunciação como [sic] que ‘perderá’ seu objeto.

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[...]

A lei menciona três hipóteses em que a denunciação da lide pode (ou deve) acontecer.

A primeira delas diz respeito à evicção. Evicção significa a perda de um direito (mate-rial) em função de uma decisão judicial. A denunciação da lide possibilita o exercício do direito que resulta da evicção, ou seja, com maior simplicidade poder-se-ia dizer que a denunciação da lide permite que alguém que tenha sido lesado com a perda de um direito ocorrida em decorrência de uma decisão judicial possa ressarcir-se perante aquele que lhe transferiu esse direito.

[...]

A segunda hipótese é bastante semelhante àquela que enseja a nomeação à autoria. A denunciação da lide, aqui, serve para trazer ao processo o proprietário ou o possuidor indireto, quando o acionado é possuidor direto da coisa.

[...]

Finalmente, a terceira hipótese que enseja a denunciação da lide é a que decorre de o denunciado estar obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar o eventual sucumbente. Este é o caso mais comum de denunciação e os exemplos são fartos. O mais expressivo talvez seja o da companhia de seguros que, acionada por aquele que sofreu o prejuízo, de-nuncia a lide ao causador.” (Curso avançado de processo civil. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999. p. 260-264)

8638 – Duplicata – aceite – fraude

“Agravo regimental no recurso especial. Duplicata. Aceite. Fraude. Embargos do devedor proce-dentes. Omissão. Ocorrência. Art. 535 do CPC. Violação. Conclusão. Fatos. Indicação. Ausência. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão de embargos de declaração cassado. Agravo re-gimental desprovido. 1. O Superior Tribunal de Justiça recebe o processo com os fatos, tal como delineados pelas instâncias ordinárias, cabendo-lhes o exame daqueles imprescindíveis ao julga-mento da causa para que esta Corte Superior possa aplicar o direito à espécie, como determina o art. 257 do RISTJ. 2. É omisso o acórdão que deixa de examinar questão de fato relevante para o julgamento da causa, violando o art. 535 do Código de Processo Civil. 3. Agravo regimental despro-vido.” (STJ – AgRg-REsp 1.387.684 – (2013/0182597-9) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.02.2016 – p. 400)

8639 – Embargos de declaração – requisito de admissibilidade extrínseco – preparo recursal – ausência

“Processual civil. Embargos de declaração no agravo regimental no recurso especial. Requisito de admissibilidade extrínseco. Preparo recursal. Ausência. Deferimento de justiça gratuita. Não ocorrência. Súmula nº 187/STJ. Incidência. Embargos rejeitados. 1. Quando ausente a concessão de justiça gratuita, deve a parte comprovar o preparo na interposição do recurso ou renovar o pedido de gratuidade da justiça, nos termos do art. 6º da Lei nº 1.060/1950. 2. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-REsp 1.540.553 – (2015/0152924-8) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.02.2016 – p. 405)

8640 – Exceção de pré-executividade – redução da dívida – honorários advocatícios – cabi-mento

“Agravo regimental no recurso especial. Exceção de pré-executividade parcialmente acolhida para reduzir a dívida. Honorários advocatícios. Cabimento reconhecido na decisão agravada. Discussão quanto ao valor dos honorários. Agravo a que se nega provimento. 1. Segundo a Orientação Juris-prudencial pacífica desta Corte Superior, são devidos honorários advocatícios sucumbenciais pelo exequente quando acolhida exceção de pré-executividade, ainda que parcialmente. 2. No caso dos autos, o acolhimento da exceção de pré-executividade para reconhecer excesso de execução, ainda que para reduzir consideravelmente o valor apresentado ao cumprimento de sentença, configurou

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questão jurídica simples, de modo que se tem por adequada a fixação de verba honorária no impor-te de R$ 15.000,00 (quinze mil reais), nos termos do art. 20, § 4º, do CPC. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.192.233 – (2010/0073671-9) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.02.2016 – p. 395)

8641 – Execução – alegação genérica de omissão no acórdão – penhora via Bacen-Jud – cita-ção do executado – necessidade

“Processual civil. Administrativo. Execução. Alegação genérica de omissão no acórdão. Penhora via Bacen-Jud. Citação do executado. Necessidade. Acórdão recorrido em consonância com ju-risprudência do STJ. Súmula nº 83/STJ. Divergência jurisprudencial não conhecida. 1. Nos termos da Jurisprudência desta Corte, apenas o executado validamente citado que não pagar nem nomear bens à penhora é que poderá ter seus ativos financeiros bloqueados por meio do sistema Bacen-Jud, sob pena de violação do princípio do devido processo legal. 2. Acórdão recorrido em consonân-cia com jurisprudência desta Corte. Incidência da Súmula nº 83/STJ. Agravo regimental impro-vido.” (STJ – AgRg-REsp 1.572.151 – (2015/0308878-4) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 02.03.2016 – p. 1007)

8642 – Execução – purgação da mora – integralidade da dívida pendente

“Agravo regimental no recurso especial. Purgação da mora. Integralidade da dívida pendente. Agravo regimental desprovido. 1. Consoante jurisprudência desta Corte, após a edição da Lei nº 10.931/2004, que deu nova redação ao art. 3º do Decreto-Lei nº 911/1969, não há falar mais em purgação da mora. Sob a nova sistemática, após decorrido o prazo de cinco dias contados da execução da liminar, a propriedade do bem fica consolidada com o credor fiduciário, devendo o devedor efetuar o pagamento da integralidade do débito remanescente a fim de obter a restituição do bem livre de ônus. 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.577.015 – (2016/0003012-3) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 02.03.2016 – p. 1135)

8643 – Execução em mandado de segurança – prescrição da pretensão executória afastada

“Processual civil. Agravo regimental nos embargos à execução em mandado de segurança. Prescri-ção da pretensão executória afastada. Efeitos financeiros nos termos do título judicial exequendo. Inclusão de índices expurgados. Possibilidade. Provimento negado. 1. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que o prazo para propositura de execução contra a Fazenda Pública, nos termos do art. 1º do Decreto nº 20.910/1932 e da Súmula nº 150, do STF, é de cinco anos, contados do trânsito em julgado do processo de conhecimento. 2. Hipótese em que o título judicial, transi-tado em julgado, concedeu a ordem para assegurar ao impetrante as promoções posteriores à data de vigência da EC 26/1985, até o posto de Capitão, nos moldes do art. 8º do ADCT, com efeitos financeiros a partir de 05.10.1988. 3. A execução do título executivo deve ser adstrita ao comando da decisão transitada em julgado, não se admitindo, em embargos à execução, limitar os efeitos financeiros do título exequendo à data da impetração, sob pena de violação da coisa julgada. 4. A inclusão dos chamados ‘índices expurgados’ no cálculo da execução, ainda que o título judicial seja silente a esse respeito, não ofende a coisa julgada, salvo se expressamente afastada a sua utili-zação. Precedentes. 5. Assinatura de termo de adesão que não produz nenhum efeito na hipótese, sobretudo porque o signatário ressalvou o direito de receber os valores atrasados de acordo com o termos da decisão judicial, o que, inclusive, afastou a possibilidade de pagamento de tal verba na via administrativa. 6. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-EEx-MS 537 – (2008/0227064-9) – 3ª S. – Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz – DJe 02.03.2016 – p. 771)

8644 – Execução individual – título judicial oriundo de ação coletiva promovida por entidade de classe – acolhimento da tese – vícios inexistentes

“Embargos de declaração no agravo de instrumento. Administrativo e processo civil. Execução in-dividual de título judicial oriundo de ação coletiva promovida por entidade de classe, na qualidade

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de substituto processual. Art. 543-B, § 3º, do CPC. Acolhimento da tese. Vícios inexistentes. Matéria constitucional. Prequestionamento. Não cabimento. Recurso rejeitado. 1. Os embargos de decla-ração só têm cabimento quando houver omissão, contradição ou obscuridade na decisão atacada, inclusive para fins de prequestionamento de matéria constitucional. 2. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AI 1.156.989 – (2009/0028142-1) – 6ª T. – Relª Min. Maria Thereza de Assis Moura – DJe 19.02.2016 – p. 620)

8645 – Fiança – prorrogação – entrega das chaves

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Fiança. Prorrogação. Entrega das chaves. Viola-ção dos arts. 1.483 do CC/1916, 114 e 819 do CC/2002 e 39 da Lei nº 8.245/1991. Não configura-ção. Divergência jurisprudencial. Afastamento. Súmula nº 83/STJ. Não impugnação específica dos fundamentos da decisão agravada. Súmula nº 182/STJ. 1. Os fiadores são responsáveis, até a data da entrega das chaves, pelos débitos advindos da prorrogação do contrato de locação se a isso anuíram expressamente e não se exoneraram na forma do art. 1.500 do CC/1916. 2. ‘Não se conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida’ (Súmula nº 83/STJ). 3. ‘É inviável o agravo do art. 545 do CPC que deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada’ (Súmula nº 182 do STJ). 4. Agravo regimental parcialmente conhecido e desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 207.396 – (2012/0152800-0) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 19.02.2016 – p. 346)

8646 – Honorários de advogado – ação principal, cautelar e reconvenção – acordo – valor excessivo – redução – cabimento

“Agravo regimental no recurso especial. Honorários advocatícios. Ação principal, cautelar e recon-venção. Acordo. Valor excessivo. Redução. Cabimento. 1. A cautelar e a reconvenção são con-tenciosas e autônomas em relação à ação principal. Em consequência, por se submeterem aos princípios da causalidade e da sucumbência, a verba honorária deve ser fixada, em regra, de forma independente em cada hipótese. 2. O Superior Tribunal de Justiça, afastando a incidência da Sú-mula nº 7/STJ, tem reexaminado o montante fixado pelas instâncias ordinárias a título de honorários advocatícios apenas quando irrisório ou abusivo. 3. Apresenta-se excessivo o percentual de 60% (sessenta por cento) a título de verba honorária estabelecido no caso em exame, que corresponderia à soma do que fixado em cada uma das ações e na reconvenção, todos incidentes sobre o valor atribuído às causas, porquanto supera a metade do valor devido à própria parte representada pela sociedade de advogados, nos termos do acordo firmado nos autos, impondo-se sua redução para 20% (vinte por cento) do valor previsto no respectivo pacto. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.116.313 – (2009/0006346-8) – 3ª T. – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva – DJe 18.02.2016 – p. 559)

8647 – Honorários de advogado – alegação de irrisoriedade – existência de título executivo judicial que dispensaria a nova condenação

“Agravo regimental. Processual civil. Defesa dativa. Ação de cobrança de honorários advocatícios. Alegação de irrisoriedade. Existência de título executivo judicial que dispensaria a nova condena-ção em verba honorária. Excepcionalidade da hipótese reconhecida. Inexistência de argumentos aptos à reforma da decisão recorrida. Manutenção da verba honorária. Agravo regimental a que se nega provimento. 1. O presente Recurso Especial veicula hipótese excepcional em que o Advogado que atuou no exercício da defesa dativa ajuíza Ação de Cobrança em face do Estado, mesmo já possuindo título executivo judicial apto para ser, desde logo, executado. 2. Assim, somente haveria incidência de verba sucumbencial sobre o montante da cobrança caso o Estado se visse vencido em eventuais Embargos à Execução, não se podendo privilegiar a hipótese havida nos presentes autos. 3. Outrossim, não trouxe o Agravante, em seu recurso interno, elementos aptos a infirmar os sólidos fundamentos da decisão recorrida, sendo inviável, portanto, sua reforma. 4. Agravo Regimental

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de Pablo Christian de Moro Silva a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-EDcl-REsp 1.544.566 – (2015/0177124-1) – 1ª T. – Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho – DJe 02.03.2016 – p. 895)

8648 – Honorários de sucumbência – Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – titularida-de – verba que integra o patrimônio da empresa pública

“Processual civil. Agravo regimental. Recurso especial. Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. Honorários de sucumbência. Titularidade. Verba que integra o patrimônio da empresa pública. 1. A jurisprudência desta Corte adota a compreensão de os honorários advocatícios de sucumbên-cia, quando vencedora a Administração Pública direta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, ou as autarquias, as fundações instituídas pelo Poder Público, ou as empresas públicas, ou as sociedades de economia mista, não constituem direito autônomo do procurador judicial, porque integram o patrimônio público da entidade. 2. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.169.515 – (2009/0230394-5) – 1ª T. – Rel. Min. Olindo Menezes – DJe 02.03.2016 – p. 871)

8649 – Justiça gratuita – declaração de pobreza – presunção relativa

“Processual civil. Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Embargos à execução. Gratuida-de de justiça. Declaração de pobreza. Presunção relativa. Preenchimento dos requisitos. Reexame de provas. Incidência da Súmula nº 7/STJ. Cerceamento de defesa. Não configuração. Ausência de prequestionamento. Fundamento não atacado. 1. A presunção de pobreza, para fins de concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, ostenta caráter relativo, podendo o magistrado indeferir o pedido de assistência se encontrar elementos que infirmem a hipossuficiência do reque-rente. Reapreciação de matéria no âmbito do recurso especial encontra óbice na Súmula nº 7 do Su-perior Tribunal de Justiça. 2. Como destinatário final da prova, cabe ao magistrado, respeitando os limites adotados pelo Código de Processo Civil, a interpretação da produção probatória, necessária à formação do seu convencimento. 3. Não se admite o recurso especial, quando não ventilada, na decisão proferida pelo Tribunal de origem, a questão federal suscitada. 4. É inadmissível o recurso especial que não impugna fundamento do acórdão recorrido apto, por si só, a manter a conclusão a que chegou a Corte Estadual (Enunciado nº 283 da Súmula do STF). 5. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 820.085 – (2015/0302388-0) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 19.02.2016 – p. 484)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão que negou provimento ao agravo em recurso especial.

Em suas razões, reitera que faz jus à concessão da justiça gratuita e que houve cerce-amento de defesa. Defende que devem ser aplicadas as regras do Código de Defesa do Consumidor ao caso presente, por se tratar de contrato de Adesão.

Vejamos a ementa recorrida:

“PROCESSUAL CIVIL E CIVIL – EMBARGOS À EXECUÇÃO – CONSUMIDOR – FINAN-CIAMENTO BANCÁRIO – PESSOA JURÍDICA – INCREMENTO DA ATIVIDADE EMPRE-SARIAL – NÃO CARACTERIZAÇÃO DA RELAÇÃO DE CONSUMO – TAXA DE ABERTURA DE CRÉDITO (TAC) – TAXA DE EMISSÃO DE CARNÊ (TEC) – EXPRESSA PREVISÃO CONTRATUAL – COBRANÇA – LEGITIMIDADE

1. Não são aplicáveis as disposições da legislação consumerista aos financiamentos ban-cários para incremento da atividade negocial, haja vista não se tratar de relação de consu-mo nem se vislumbrar, na pessoa da empresa tomadora do empréstimo a figura do consu-midor final prevista no art. 2º, do Código de Defesa do Consumidor. Precedentes do STJ.

2. Ademais, vale destacar que o Superior Tribunal de Justiça se posiciona no sentido de não existir presunção quanto à abusividade das tarifas TAC/TEC. Eis que a fixação de

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tarifas administrativas em contrato de financiamento é prática legal, desde que sejam pactuadas em contrato e em consonância com a regulamentação do Banco Central.

3. Assim, quanto à suposta afronta da referida cobrança aos princípios da boa-fé, trans-parência e equidade, não se aplica ao caso, vez que houve inequívoca concordância da parte apelante com sub judice todas as cláusulas e condições em que se operou o mútuo concedido.

4. A condenação da verba honorária em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), no caso, fora modicamente fixada, dado que inferior ao percentual mínimo estabelecido pelo Código de Processo Civil e ante a magnitude das disputas com valores de empréstimos altíssimos.

5. Apelação improvida.”

Sustentou o recorrente violação aos arts. 4º, § 2º, e 7º da Lei nº 1.060/1950; 332 do Código de Processo Civil; 6º, IV e V, 42, parágrafo único, 51 e 54 do Código de Defesa do Consumidor.

O STJ afirmou que não havendo o que se reformar, negou-se provimento ao agravo regi-mental.

O ilustre Jurista Nehemias Domingos de Melo assim disciplina sobre a Justiça gratuita:

“O acesso à justiça não pode ficar à mercê da possibilidade econômica da parte fazer fren-te às despesas processuais, visto que tal acesso consiste na proteção de qualquer direito, sem qualquer restrição econômica, social ou política. É importante destacar que não basta a simples garantia formal da defesa dos direitos e o acesso aos tribunais, mas a garantia da proteção material destes direitos, assegurando a todos os cidadãos, independentemen-te de classe social, a ordem jurídica justa.

De outro lado, o Estado tem o dever de conceder a todos o acesso ao Judiciário sem a necessidade de antecipação das despesas processuais. Seria absurdo, para dizer o mí-nimo, que o ingresso em juízo fosse possível apenas aos que detêm situação econômica abastada. A função do Estado-Juiz é decidir os litígios e trazer a paz social nas relações intersubjetivas, logo esta máxima estaria prejudicada, se a maioria da população pobre não pudesse defender seus direitos.

A luta da população por saúde, educação, trabalho, segurança, dentre outras, deveria in-cluir outra reivindicação, qual seja, a de Justiça Gratuita para todos. A Justiça é monopólio do Estado, logo seu acesso deveria ser livre e gratuita para aqueles que pleiteassem tal benefício. Se a campanha por justiça gratuita prosperar, podemos até sugerir um slogan: ‘Justiça Gratuita para Todos!’.

O Professor Gabriel de Rezende Filho, já nos idos de 1954, preconizava que ‘a justiça deve estar ao alcance de todos, ricos e poderosos, pobre e desprotegidos, mesmo porque o Estado reservou-se o direito de administrá-la, não consentindo que ninguém faça justiça por suas próprias mãos. Comparecendo em juízo um litigante desprovido completamente de meios para arcar com as despesas processuais, inclusive honorários de advogado, é justo seja dispensado do pagamento de quaisquer custas...’.

Partilhando do mesmo pensamento, Vicente Grecco Filho, afirma de forma peremptória que ‘uma justiça ideal deveria ser gratuita. A distribuição da justiça é uma das atividades essenciais do Estado e, como tal, da mesma forma que a segurança e a paz pública, não deveria trazer ônus econômico aqueles que dela necessitam. Todavia, inclusive por tradi-ção histórica, a administração da justiça tem sido acompanhada do dever de pagamento das despesas processuais, entre as quais se inclui o das custas que são taxas a serem pagas em virtude da movimentação do aparelho jurisdicional’.

José Renato Nalini, festejado pelo Juiz Eduardo Bezerra de Medeiros Pinheiros, vai mais longe ao afirmar que ‘do juiz se exige não apenas reequilibrar as situações díspares, mas ainda oferecer seu talento, desforço pessoal e inteligência para ampliação real do rol de atendidos pela Justiça. E para isso é necessário desenvolver uma concepção consentânea do princípio fundamental da isonomia. Não é uma opção preferencial pelos pobres, no

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sentido da teologia da libertação. Mas a constatação de que a pobreza extrema é inconci-liável com o exercício da igualdade e liberdade’.

Na realidade social em que vivemos, entendemos que incumbe ao Poder Judiciário, aban-donar o mundo da ficção jurídica, da abstração da norma, do ‘faz de conta’ e efetivar a concretização de direitos fundamentais consagrados pela Constituição do Brasil (direito à igualdade, devido processo legal material, direito à ampla defesa, proteção do consumi-dor, direito à assistência judiciária integral), assumindo, assim, uma postura ativa – e não neutra – na busca da justiça processual.

Assim, cabe ao juiz da causa analisar cada situação em particular e, na dúvida pro misero, até porque o benefício da justiça gratuita não há de ser estendido apenas aos miseráveis, mas sim a todo aquele cuja situação econômica não lhe permite pagar custas processuais e honorários de advogado, que, em muitos casos, se torna extremamente oneroso, inde-pendentemente do salário ou dos bens que possua o postulante. Assim, é irrelevante que a parte seja proprietária de bens ou tenha colado grau superior, pois, não obstante isso, poderá, num dado momento de sua vida, não ter disponibilidade de numerários suficien-tes para fazer frente às despesas processuais.” (Da justiça gratuita como instrumento de democratização do acesso ao Judiciário. Disponível em: http://online.sintese.com)

8650 – Justiça gratuita – pagamento de honorários periciais – responsabilidade do Estado

“Processual civil. Agravo regimental no recurso especial. Beneficiário da assistência judiciária gra-tuita sucumbente. Pagamento de honorários periciais. Responsabilidade do Estado. Precedentes. 1. O Estado de Santa Catarina afigura-se como parte legitima no feito, uma vez que cabe ao Estado o custeio dos honorários periciais diante da sucumbência de jurisdicionado sob o pálio da gratuidade de justiça. 2. Não há violação do preceito contraditório e ampla defesa quando o Estado é chamado à responsabilidade ao pagamento dos honorários periciais, haja vista que o seu dever constitucio-nal em garantir o amplo acesso ao Judiciário abrange incumbência de conferir todas as condições necessárias à efetividade processual ao beneficiário da justiça gratuita, não podendo desta maneira exigir do perito que assuma tal ônus financeiro. 3. Ainda, conforme a jurisprudência, ‘as despesas pessoais e materiais necessárias para a realização da perícia estão protegidas pela isenção legal de que goza o beneficiário da gratuidade de justiça. Assim, como não se pode exigir do perito a reali-zação do serviço gratuitamente, essa obrigação deve ser do sucumbente ou, no caso de ser o bene-ficiário, do Estado, a quem é conferida a obrigação de prestação de assistência judiciária aos neces-sitados’ (AgRg-AREsp 260.516/MG, Relª Min. Assusete Magalhães, 2ª T., Julgado em 25.03.2014, DJe 03.04.2014). Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-REsp 1.568.047 – (2015/0292747-0) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 02.03.2016 – p. 984)

8651 – Nota promissória – contrato de parceria com valor determinado – executoriedade

“Agravo regimental nos embargos de declaração no recurso especial. Embargos à execução. Nota promissória. Contrato de parceria com valor determinado. Executoriedade. Agravo desprovido. 1. A jurisprudência desta Corte Superior é no sentido de que a nota promissória vinculada a um contrato de abertura de crédito perde a sua autonomia ante a iliquidez do título que a originou, acarretando, portanto, na nulidade da execução por ela embasada. Súmula nº 258/STJ. 2. Entretan-to, a vinculação de uma nota promissória a um contrato retira a autonomia de título cambial, mas não, necessariamente, a sua executoriedade. Assim, quando a relação jurídica subjacente estiver consubstanciada em contrato que espelhe uma dívida líquida, como no caso, não há empecilho ao prosseguimento da execução. Diversamente, se estiver amparada em contrato que não espelhe dívi-da líquida, como se verifica do contrato de abertura de crédito, não será possível a execução. Dessa forma, este Tribunal tem admitido a execução de nota promissória vinculada a contrato de mútuo que contenha valor determinado, por se entender que o contrato traduz a existência de dívida líquida e certa. Precedentes. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-EDcl-REsp 1.367.833 – (2013/0036418-7) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.02.2016 – p. 399)

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8652 – Penhora – embargos de terceiro – imóvel alienado em fraude à execução – bem de família

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Penhora. Embargos de terceiro. Imóvel alienado em fraude à execução. Bem de família. Reexame de prova. 1. Não se admite o recurso especial quando sua análise depende de reexame de matéria de prova (Súmula nº 7 do STJ). 2. ‘Não se co-nhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do tribunal de firmou no mesmo sentido da decisão recorrida’ (Súmula nº 83/STJ). No caso, em conformidade com a jurisprudência desta Corte Superior, o Tribunal de origem recusou a proteção da Lei nº 8.009/1990 com relação a imóvel alienado entre membros da família para fraudar execução. 3. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 125.537 – (2011/0293432-8) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 02.03.2016 – p. 1046)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de agravo regimental interposto por Danielle Rocha e João Vitor Rocha Ferro con-tra decisão mediante a qual neguei provimento a agravo em recurso especial, por aplicar ao caso as Súmulas nºs 7 e 83 do STJ.

O acórdão recorrido, do TJRS, tem a seguinte ementa:

APELAÇÕES CÍVEIS – RECURSO ADESIVO – EMBARGOS E TERCEIRO – ILEGITIMIDADE ATIVA – CERCEAMENTO DE DEFESA DO EXECUTADO – AUSÊNCIA DE LEGITIMAÇÃO DOS EMBARGANTES PARA INVOCÁ-LA – BEM DE FAMÍLIA – FRAUDE À EXECUÇÃO – EFEITOS – MEAÇÃO

1. Patente a ilegitimidade ativa da embargante Rita para opor embargos em defesa de sua meação, já que doou o imóvel a sua filha e, consequentemente, não possui direito, patrimonial sobre o bem que reivindica.

2. Inviabilidade de os apelantes alegarem cerceamento de defesa em nome do executado, devendo este, se for o caso, vir a juízo reclamar seus direitos.

3. Fraude à execução já reconhecida em outro processo, cujos efeitos se estendem a este, pela indivisibilidade da situação jurídica. Tratando-se de ineficácia o ato, e não de invalidade, fica aquela restrita doação da parte do devedor, sem atingir a doação feita pela embargante Rita.

4. Impossibilidade de se invocar a impenhorabilidade do imóvel, por se tratar de bem de família, quando tenha sido reconhecida a fraude à execução. Precedentes do STJ nesse sentido. Entendimento contrário poderia esvaziar os efeitos de eventual reconhecimento de fraude à execução relacionada a imóvel residencial.

5. Impugnação à avaliação do imóvel rejeitada. Apelações e recurso adesivo desprovidos.

A agravante alegou violação dos arts. 1º e 5º da Lei nº 8.009/1990, além de dissídio jurisprudencial. Sustentam que o acórdão recorrido restringe a proteção do bem de famí-lia, e a constrição do imóvel atinge outros integrantes da família, terceiros embargantes.

Os agravantes afirmaram que não se aplicam ao caso as referidas Súmulas. Sustentaram que o acórdão recorrido restringe a proteção do bem de família.

O STJ negou provimento ao agravo regimental.

O relator afirmou que aplica-se ao caso a Súmula nº 83 do STJ e que o dissídio jurispru-dencial não ficou caracterizado, pois não destacadas as circunstâncias que assemelhas-sem os casos confrontados, o que seria mesmo inviável diante da incidência das súmulas citadas.

Yone Frediani, em estudo sobre o bem de família, assim considerou:

“O bem de família poderá consistir em prédio residencial urbano ou rural, suas pertenças e acessórios, destinando-se ao domicílio familiar, podendo, ainda, ser constituído por valores mobiliários.

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – PARTE GERAL – EMENTÁRIO DE JURISPRUDÊNCIA �����������������������������������������������������������������������������233

O bem de família é isento de execução por dívidas posteriores à sua instituição, salvo se provenientes de tributos relativos ou prédio ou despesas de condomínio. A isenção perdurará enquanto viverem os cônjuges e na falta destes até que os filhos completem a maioridade, vale dizer, nesse caso, a impenhorabilidade é relativa.

[...]

No entanto, da leitura do texto legal apontado, constata-se, desde logo, que a impenho-rabilidade do bem de família é relativa, diante das exceções previstas no art. 3º e respec-tivos incisos, quais sejam:

a) créditos de trabalhadores da própria residência e de suas contribuições previdenciárias;

b) crédito decorrente de financiamento destinado à construção ou aquisição do imóvel;

c) crédito decorrente de pensão alimentícia;

d) impostos, taxas e contribuições devidas, relativos ao imóvel familiar;

e) execução de hipoteca existente sobre o imóvel, oferecido como garantia real;

f) aquisição do imóvel com produto de crime;

g) obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

Por oportuno, resta-nos ressaltar que, à semelhança das disposições contidas no diploma civilista, torna-se imprescindível a fixação do domicílio familiar com ânimo de permanên-cia, a fim de que possa estar o imóvel revestido de impenhorabilidade.” (Bem de família. Repertório de Jurisprudência IOB, 3/23193, v. III, nº 21/2005, p. 647, 1ª quinz. nov. 2005)

8653 – Petição eletrônica – certificado digital – advogado sem procuração nos autos – recurso inexistente

“Processual civil. Agravo regimental. Petição eletrônica do agravo em recurso especial. Certificado digital. Advogado sem procuração nos autos. Recurso inexistente. Súmula nº 115/STJ. 1. Nos termos da Súmula nº 115/STJ, é inexistente o agravo regimental quando o advogado titular do certificado digital utilizado para assinar a petição eletrônica não possui procuração nos autos. 2. Agravo regi-mental não conhecido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 452.060 – (2013/0412020-0) – 1ª T. – Rel. Min. Sérgio Kukina – DJe 19.02.2016 – p. 300)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão que negou provimento ao agravo em recurso especial, sob o fundamento de que o prazo decadencial bienal para o ajui-zamento da ação rescisória é contado do último pronunciamento judicial, ainda que este reconheça a intempestividade do recurso interposto, salvo hipótese de má-fé, o que não se vislumbrou na espécie.

Inconformada, a parte agravante sustenta que “a jurisprudência não atribui ao recurso extemporâneo o efeito de interromper nem o trânsito em julgado, nem o prazo previsto no art. 495 do Código de Processo Civil para o ajuizamento da ação rescisória” não conheço do agravo regimental.

Vejamos o entendimento da Súmula nº 115/STJ:

“Na instância especial é inexistente o recurso interposto por advogado sem procuração nos autos.”

Nesse sentido, oportuno trazer a lume lição do mestre José Frederico Marques, in verbis:

“A representação processual para o exercício do jus postulandi é feita mediante mandado escrito, segundo reza o art. 38 do Código de Processo Civil. Esse mandado escrito é a procuração que o sujeito processual confere a seu patrono, uma vez que a ‘a procuração é o instrumento do mandato’, conforme o diz o art. 1.288 do Código Civil (in Instituições de Direito Processual Civil, v. II, p. 189, Millennium Editora).”

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Oportuno trazer julgados neste sentido:

“Processual civil. Representação processual. Ausência de procuração. Inexistência do ato de interposição do recurso. I – Recurso interposto por advogado que não disponha, nos autos do processo, do necessário instrumento de mandato não pode ser conhecido. Ina-plicabilidade, na fase recursal, do disposto no art. 13, CPC. II – Precedentes do STF. III – Agravo não provido.” (STF, AgRg-Ag 459.460-0/MG, 2ª T., Rel. Min. Carlos Velloso, DJU 1 06.02.2004)

“Processual civil. Embargos de declaração. Art. 535 do CPC. Ausência dos pressupostos. Embargos de divergência. Irregularidade de representação no recurso especial interposto em autos de embargos à execução desapensados da execução. Ausência de procuração. Súmula nº 115/STJ. Ausência de similitude fática e jurídica entre os arestos confrontados. Aplicação da Súmula nº 168/STJ. Precedentes. Embargos de declaração rejeitados. I – Os embargos de declaração devem atender aos seus requisitos, quais sejam, suprir omissão, contradição ou obscuridade, não havendo qualquer um desses pressupostos, rejeitam-se os mesmos. II – Os embargos de divergência têm como pressuposto de admissibilidade a existência de similitude fática e jurídica entre os arestos confrontados, sendo certo que in casu dois dos acórdãos colacionados discutiram questões diversas da discutida no aresto, não possibilitando a configuração de dissídio. III – O aresto embargado, analisando espe-cificamente o caso em questão, registrou que a ausência da procuração conferida ao advo-gado que substabeleceu os poderes ao subscritor do recurso especial impede a aferição da regularidade da representação processual. Ainda, restou consignado que na hipótese em que a procuração outorgada pela parte que interpõe recurso especial em embargos à exe-cução não consta dos respectivos autos, mas apenas dos autos da ação de execução que se encontram desapensados, compete ao recorrente, quando da interposição do recurso, providenciar o traslado daquele instrumento de mandato ou juntar nova procuração. Neste contexto foi aplicada a Súmula nº 115/STJ, verbis: ‘Na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos’. IV – Nos arestos indicados como divergentes verifica-se que a questão discutida limitou-se a explicitar que a falta do instrumento procuratório nos embargos à execução é mera irregularidade procedimen-tal, podendo ser sanada pelo julgador, nas instâncias ordinárias, nos termos do art. 13 do CPC. Note-se não houve nos julgados indicados como divergentes discussão acerca da irregularidade de representação na interposição do recurso especial e tampouco da aplicação ou não da Súmula nº 115/STJ. V – Neste contexto não há similitude do aresto divergente com o acórdão que se pretende reformar, tendo em vista que no aresto ora embargado a discussão não foi travada quanto à ausência de procuração e possibilidade de regularização nas instâncias ordinárias, mas sim na interposição do especial, quando já esgotada a instância ordinária. VI – Aplicação, ainda, da Súmula nº 168/STJ: ‘Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência do tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado’, já que esta Corte tem se manifestado no sentido de que estando a procuração juntada apenas nos autos da execução, sendo desapensados os autos dos embargos à execução, cabe ao recorrente, ao interpor recurso especial nos autos dos embargos, juntar cópia do instrumento procuratório, ou novo instrumento, sob pena de se considerar inexistente o especial interposto, nos termos da Súmula nº 115/STJ. VII – O julgador não está obrigado a responder a todos os questionamentos formulados pelas partes, competindo-lhe, apenas, indicar a fundamentação adequada ao deslinde da controvérsia, observadas as peculiaridades do caso concreto, como ocorreu in casu, não havendo qualquer omissão ou obscuridade no julgado embargado, já que houve a efetiva análise das matérias anteriormente expostas. VIII – Embargos de declaração rejeitados.” (STJ, ED-REsp 200302100768 – (422161 RS), C.Esp., Rel. Min. Gilson Dipp, DJU 05.02.2007, p. 177)

8654 – Prescrição – rede de eletrificação rural – ressarcimento de valores ao consumidor

“Civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Rede de eletrificação rural. Ressarcimento de valores ao consumidor. Prescrição. Matéria submetida ao rito do art. 543-C do CPC. Decisão

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mantida. 1. Conforme definido no julgamento do REsp 1.249.321/RS, submetido ao rito dos recur-sos repetitivos, nos casos de pedidos relativos a valores para cujo ressarcimento não havia previsão contratual, ‘a pretensão prescreve em 20 (vinte) anos, na vigência do Código Civil de 1916, e em 3 (três) anos, na vigência do Código Civil de 2002, por se tratar de demanda fundada em enrique-cimento sem causa (art. 206, § 3º, inciso IV), observada, igualmente, a regra de transição prevista no art. 2.028 do Código Civil de 2002’ (REsp 1.249.321/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 2ª S., DJe 16.04.2013). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 419.737 – (2013/0361294-0) – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – DJe 19.02.2016 – p. 426)

8655 – Recuperação judicial – cessão fiduciária sobre direitos sobre coisa móvel e sobre títu-los de crédito – credor titular

“Recurso especial. Recuperação judicial. Cessão fiduciária sobre direitos sobre coisa móvel e sobre títulos de crédito. Credor titular de posição de proprietário fiduciário sobre direitos creditícios. Não sujeição aos efeitos da recuperação judicial, nos termos do § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005. Matéria pacífica no âmbito das turmas de direito privado do STJ. Pretensão de submeter aos efei-tos da recuperação judicial, como crédito quirografário, os contratos de cessão fiduciária que, à época do pedido de recuperação judicial, não se encontravam registrados no cartório de títulos e documentos do domicílio do devedor, com esteio no § 1º do art. 1.361-A do Código Civil. Insubsis-tência. Recurso especial provido. 1. Encontra-se sedimentada no âmbito das Turmas que compõem a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça a compreensão de que a alienação fiduciária de coisa fungível e a cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de créditos (caso dos autos), justamente por possuírem a natureza jurídica de propriedade fiduciária, não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial, nos termos do § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005. 2. O Código Civil, nos arts. 1.361 a 1.368-A, limitou-se a disciplinar a propriedade fiduciária sobre bens móveis infungíveis. Em relação às demais espécies de bem, a propriedade fiduciária sobre eles constituída é disciplinada, cada qual, por lei especial própria para tal propósito. Essa circunscrição normativa, ressalta-se, restou devidamente explicitada pelo próprio Código Civil, em seu art. 1.368-A (introduzido pela Lei nº 10.931/2004), ao dispor textualmente que ‘as demais espécies de proprie-dade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições desse Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial’. 2.1 Vê-se, portanto, que a incidência subsidiária da Lei adjetiva civil, em rela-ção à propriedade/titularidade fiduciária sobre bens que não sejam móveis infungíveis, regulada por leis especiais, é excepcional, somente se afigurando possível no caso em que o regramento especí-fico apresentar lacunas e a solução ofertada pela ‘lei geral’ não se contrapuser às especificidades do instituto por aquela regulada. 3. A exigência de registro, para efeito de constituição da propriedade fiduciária, não se faz presente no tratamento legal ofertado pela Lei nº 4.728/1995, em seu art. 66-B (introduzido pela Lei nº 10.931/2004) à cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis, bem como de títulos de crédito (bens incorpóreos e fungíveis, por excelência), tampouco com ela se coaduna. 3.1 A constituição da propriedade fiduciária, oriunda de cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis e de títulos de crédito, dá-se a partir da própria contratação, afigurando-se, desde então, plenamente válida e eficaz entre as partes. A consecução do registro do contrato, no tocante à ga-rantia ali inserta, afigura-se relevante, quando muito, para produzir efeitos em relação a terceiros, dando-lhes a correlata publicidade. 3.2 Efetivamente, todos os direitos e prerrogativas conferidas ao credor fiduciário, decorrentes da cessão fiduciária, devidamente explicitados na lei (tais como, o direito de posse do título, que pode ser conservado e recuperado ‘inclusive contra o próprio cedente’; o direito de ‘receber diretamente dos devedores os créditos cedidos fiduciariamente’, a outorga do uso de todas as ações e instrumentos, judiciais e extrajudiciais, para receber os créditos cedidos, entre outros) são exercitáveis imediatamente à contratação da garantia, independente de seu registro. 3.3 Por consectário, absolutamente descabido reputar constituída a obrigação principal (mútuo bancário, representado pela Cédula de Crédito Bancário emitida em favor da instituição fi-nanceira) e, ao mesmo tempo, considerar pendente de formalização a indissociável garantia àquela, condicionando a existência desta última ao posterior registro. 3.4 Não é demasiado ressaltar, aliás,

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que a função publicista é expressamente mencionada pela Lei nº 10.931/2004, em seu art. 42, ao dispor sobre cédula de crédito bancário, em expressa referência à constituição da garantia, seja ela fidejussória, seja ela real, como no caso dos autos. O referido dispositivo legal preceitua que essa garantia, ‘para valer contra terceiros’, ou seja, para ser oponível contra terceiros, deve ser registra-da. De se notar que o credor titular da posição de proprietário fiduciário sobre direitos creditícios (excluído dos efeitos da recuperação judicial, segundo o § 3º do art. 49 da Lei nº 11.101/2005) não opõe essa garantia real aos credores da recuperanda, mas sim aos devedores da recuperanda, o que robustece a compreensão de que a garantia sob comento não diz respeito à recuperação judicial. Assentado que está que o direito creditício sobre o qual recai a propriedade fiduciária é de titularidade (resolúvel) do banco fiduciário, este bem, a partir da cessão, não compõe o patrimônio da devedora fiduciante. A recuperanda, sendo, pois, inacessível aos seus demais credores e, por conseguinte, sem qualquer repercussão na esfera jurídica destes. Não se antevê, por conseguinte, qualquer frustração dos demais credores da recuperanda que, sobre o bem dado em garantia (fora dos efeitos da recuperação judicial), não guardam legítima expectativa. 4. Mesmo sob o enfoque sustentado pelas recorrentes, ad argumentandum, caso se pudesse entender que a constituição da cessão fiduciária de direitos creditícios tenha ocorrido apenas com o registro e, portanto, após o pedido recuperacional, o respectivo crédito, também desse modo, afastar-se-ia da hipótese de inci-dência prevista no caput do art. 49 da Lei nº 11.101/2005, in verbis: ‘Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos’. 5. Recurso espe-cial provido, para restabelecer a decisão de primeiro grau que acolheu a impugnação apresentada pelo Banco recorrente, para excluir dos efeitos da recuperação judicial seu crédito, garantido pela cessão fiduciária.” (STJ – REsp 1.412.529 – (2013/0344714-2) – 3ª T. – Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino – DJe 02.03.2016 – p. 1037)

8656 – Recuperação judicial – habilitação do credor – pagamento – não comprovação – fiado-res – devedores solidários

“Cumprimento de sentença. Empresa em recuperação judicial. Habilitação do credor. Pagamento. Não comprovação. Fiadores. Devedores solidários. Continuidade da execução. 1. A habilitação do credor nos autos da ação de recuperação judicial não impede a continuidade do cumprimento de sentença contra os fiadores, que são garantes da dívida executada e, portanto, devedores solidários desta. 2. Para que se possa abater da dívida cobrada na execução os valores já pagos no juízo fali-mentar, impõe-se a comprovação dos depósitos efetuados em favorecimento ao credor. 3. Recurso conhecido e improvido.” (TJDFT – CSen. 20150020272432 – (911574) – 3ª T.Cív. – Relª Desª Ana Cantarino – DJe 18.12.2015 – p. 210)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de Agravo de Instrumento interposto em face da decisão integrada pelos embar-gos de declaração, que indeferiu seus pedidos, formulados nos autos do cumprimento de sentença, sob o fundamento de preclusão.

Narraram os agravantes que a demanda de origem se encontra em fase de cumprimento de sentença e iniciou como ação de despejo e cobrança de aluguéis movida pelo agravado e que, durante a sua tramitação, a empresa ré, ora primeira agravante, requereu recupe-ração judicial e teve seu plano de recuperação aprovado.

Sustentaram que, em razão da recuperação judicial, as dívidas da empresa foram novadas e vêm sendo amortizadas de acordo com as condições estabelecidas no plano de recupe-ração. Não obstante, o processo prosseguiu em relação aos outros agravantes, fiadores da primeira.

Alegaram que, no processo, foram impulsionados pelo agravado diversos atos de cons-trição de bens dos coobrigados e da empresa devedora, sem considerar os pagamentos mensais realizados para nos autos informando, em síntese, o valor do crédito amortização da dívida, por isso, peticionaram consolidado no juízo da recuperação judicial e a quantia amortizada pelos pagamentos realizados nos moldes do plano de recuperação e que os

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coobrigados não possuem patrimônio e requerendo ao juízo o envio dos autos à contadoria judicial.

Argumentaram que o juízo a quo indeferiu o pleito sob o fundamento da preclusão, pois a matéria teria sido analisada em decisão anterior, que indeferiu o pedido de suspensão da

Aduziram que a possibilidade de a execução prosseguir em relação aos garantidores, mesmo após a novação da dívida no âmbito da recuperação judicial, não faz nascer uma dívida autônoma vinculada apenas aos fiadores. Por isso, os pagamentos realizados pelo devedor principal devem ser considerados para abatimento do saldo devedor.

Asseveraram que o agravado apresentou planilha com valores superiores aos apurados pelos agravantes na recuperação judicial e que essa diferença somente pode ser dirimida pelo juízo, preferencialmente como o auxílio da contadoria judicial ou de perito técnico, a fim de apurar o saldo devedor.

Requereram a concessão do efeito suspensivo e, no mérito, o provimento do recurso para reformar os termos da decisão agravada e determinar que sejam considerados todos os pagamentos realizados em prol do credor via recuperação judicial e a remessa dos autos à contadoria judicial para apuração do real saldo devedor.

O TJDFT conheceu do recurso e negou provimento.

Oportuno trazer as lições de Tony Luiz Ramos sobre a recuperação judicial:

“Pensar que a objeção prescindisse de fundamentação daria azo à real contradição no sistema: se fosse princípio constitucional o tratamento favorecido para a micro e pequena empresa (art. 170, IX), não se poderia pensar que a Lei estabelecesse critério que sim-plesmente tornasse impossível ou muito difícil este favorecimento.

Esse é o caso do parágrafo único do art. 72. De fato, se a simples objeção de mais da metade dos credores pudesse restringir o favor legal, independentemente de qualquer fundamentação, estar-se-ia estabelecendo empecilho, no mais das vezes, insuperável à empresa de pequeno porte e à microempresa.

Para se seguir uma interpretação literal do dispositivo, ter-se-ia a seguinte contradição: enquanto que no procedimento regular as objeções seriam submetidas à assembleia e fatalmente teriam de ser fundamentadas para exercerem poder de convencimento; no procedimento opcional, para as pequenas empresas, a simples objeção daria margem à inexorável decretação da quebra.

Outro contrassenso de uma exegese puramente gramatical seria a admissão de mera petição com a objeção simples no plano especial, enquanto que no procedimento regular o credor teria de se fazer presente à assembleia, com todos os custos envolvidos, para fazer valer sua contrariedade. Não poderíamos admitir uma visão totalmente distante do preconizado na Lei Maior.

Em resumo, o que pensamos é que qualquer objeção fundada na falta de adequação do pedido de recuperação especial aos requisitos da Lei (os gerais e os especiais do art. 71), se julgada procedente pelo juiz, dá margem por si só à decretação da quebra. Agora, para que as objeções fundadas em razões de natureza econômico-financeiras venham a determinar a convolação em falência, é necessário que tenham relevância e fundamento e que sejam levantadas pelos detentores de mais da metade dos créditos quirografários.

Desse modo, o procedimento especial seria simplificado, pois dispensaria a realização da assembleia (o objetivo principal do procedimento especial), e guardaria, ainda assim, certa similitude com a recuperação judicial ordinária, permitindo aos credores apresentar objeções fundamentadas de natureza não jurídica.

Esse é o entendimento que se harmoniza com o espírito geral da Lei e com a interpretação do dispositivo à luz do art. 170, IX, da Constituição Federal.” (O plano de recuperação judicial especial para microempresas e empresas de pequeno porte e as objeções de cre-dores com mais da metade dos créditos. Disponível em: http://online.sintese.com)

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8657 – Recurso – agravo regimental – interposição por fac-símile – petição original não apre-sentada – não conhecimento

“Processual civil. Agravo regimental. Interposição por fac-símile. Petição original não apresenta-da. Não conhecimento. 1. Os recursos interpostos por meio de fac-símile devem ser seguidos da entrega do original em até cinco dias após o término do respectivo prazo recursal (art. 2º, caput, da Lei nº 9.800/1999), sob pena de não conhecimento. 2. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-EDcl-Ag-RE 673.533 – (2015/0030582-4) – 1ª T. – Rel. Min. Olindo Menezes – DJe 02.03.2016 – p. 835)

8658 – Recurso – interposição fora do prazo – data da postagem em agência dos correios – invalidade

“Agravo regimental. Processual civil. Agravo em recurso especial. Interposição fora do prazo. Data da postagem em agência dos correios. Invalidade. A jurisprudência desta Corte Superior de Justiça entende que a data da postagem em agência dos Correios não é considerada para fins de apuração da tempestividade, mas sim a data na qual foi realizado o protocolo pelo Tribunal a quo. Aplicação analógica da Súmula nº 216/STJ, verbis: ‘A tempestividade de recurso interposto no Superior Tribu-nal de Justiça é aferida pelo registro no protocolo da secretaria e não pela data da entrega na agência do correio’. Agravo regimental improvido. (STJ – AgRg-Ag-REsp 818.183 – (2015/0297608-6) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 02.03.2016 – p. 955)

8659 – Recurso especial – comprovantes de preparo ilegíveis – falha na digitalização no tribu-nal de origem

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Comprovantes de preparo ilegíveis. Falha na di-gitalização no tribunal de origem. Não impugnação de fundamentos da decisão de admissibilida-de. 1. A alegação de falha ou erro no procedimento de digitalização realizado pelo Tribunal de origem, quando devidamente comprovada, tem o condão de afastar o óbice da deserção. 2. Não se conhece de agravo em recurso especial (art. 544 do CPC) que não impugna corretamente os fundamentos da decisão agravada. 3. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 475.944 – (2014/0032153-1) – 3ª T. – Rel. Min. João Otávio de Noronha – DJe 19.02.2016 – p. 359)

8660 – Recurso especial – petição subscrita por advogado sem procuração nos autos – não conhecimento

“Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Petição subscrita por advo-gado sem procuração nos autos. Não conhecimento. Súmula nº 115 do STJ. 1. A regularização da representação processual é dever que recai sobre o recorrente, devendo ocorrer antes do manejo do recurso especial. 2. ‘Não é possível a conversão do julgamento em diligência ou a abertura de prazo para a regularização do recurso nesta excepcional instância, tampouco a apresentação de documentos em sede de agravo em recurso especial, dada a incidência da preclusão consumativa’ (AgRg-AREsp 631.391/PR, Rel. Min. Raul Araújo, 4ª T., DJe 17.04.2015). 3. Incidência à espécie da Súmula nº 115 do STJ: ‘Na instância especial é inexistente recurso interposto por advogado sem procuração nos autos’. 4. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 654.727 – (2015/0013786-7) – 2ª T. – Relª Min. Diva Malerbi – DJe 19.02.2016 – p. 324)

8661 – Recurso inexistente – advogado sem procuração nos autos – regularização do feito – não cabimento

“Processual civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Advogado sem procuração nos autos. Recurso inexistente. Regularização do feito. Não cabimento. Art. 13 do CPC. Titular do certi-ficado digital. Lei nº 11.419/2006. Não conhecimento. 1. Nesta Corte Superior, é pacífico o enten-dimento de ser inexistente o apelo nobre interposto por advogado sem procuração nos autos, a teor da Súmula nº 115 do STJ. 2. Inaplicável, nesta instância, a providência prevista no art. 13 do CPC,

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considerando-se não sanável tal vício por juntada posterior de mandato ou substabelecimento, pois a regularidade da representação processual é aferida no momento da interposição do recurso espe-cial. 3. A prática eletrônica de ato judicial, na forma da Lei nº 11.419/2006, reclama que o titular do certificado digital utilizado possua procuração nos autos, sendo irrelevante que na petição esteja ou não grafado o seu nome (AgRg-REsp 1.347.278/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, Julgado aos 19.06.2013, DJe 01.08.2013). 4. Agravo regimental não conhecido.” (STJ – AgRg-Ag--REsp 813.675 – (2015/0285569-4) – 3ª T. – Rel. Min. Moura Ribeiro – DJe 02.03.2016 – p. 1033)

8662 – Recurso manifestamente incabível – erro grosseiro inescusável – embargos de declara-ção – ausência das hipóteses

“Processual civil. Agravo regimental contra acórdão de turma julgadora. Recurso manifestamente incabível. Erro grosseiro inescusável. Embargos de declaração. Ausência das hipóteses previstas do art. 535 do CPC. Pretensão de reexame e adoção de tese distinta. 1. Não são cabíveis os embar-gos de declaração cujo objetivo é ver reexaminada e decidida a controvérsia de acordo com tese distinta. 2. O acórdão embargado foi categórico ao afirmar que, consoante os termos dos arts. 545 do Código de Processo Civil e 258 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, somente cabe agravo regimental (ou agravo interno) contra decisum monocrático, sendo manifestamente inadmissível sua interposição contra decisão colegiada. 3. Diferente do ocorre na espécie, con-tradição, omissão ou obscuridade, porventura, existentes só se dão entre os termos do próprio acórdão, ou seja, entre a ementa e o voto, entre o voto e o relatório etc., segundo a inteligência do art. 535 do CPC. Embargos de declaração rejeitados.” (STJ – EDcl-AgRg-AgRg-Ag-REsp 710.725 – (2015/0111430-8) – 2ª T. – Rel. Min. Humberto Martins – DJe 02.03.2016 – p. 914)

8663 – Representação processual – falha – subscritor do recurso

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Falha na representação processual do subscritor do recurso especial. Súmula nº 115 do STJ. Inaplicabilidade dos arts. 13 e 37 do CPC na instância especial. Alegação de responsabilidade pela juntada da procuração da parte contrária quando da formação do agravo de instrumento. Inovação recursal. Decisão mantida. 1. A capacidade postula-tória integra o juízo de admissibilidade, que deve ser obrigatoriamente realizado pelo relator neste Superior Tribunal, a fim de resguardar as garantias da ampla defesa e do contraditório, ao atentar pela conformidade na abertura da instância especial, que ocorre a partir da interposição do recurso perante o Tribunal de origem. 2. A jurisprudência do STJ é pacificada no sentido de que as regras insertas nos arts. 13 e 37 do CPC são inaplicáveis na instância superior, sendo incabível qualquer diligência para suprir a irregularidade de representação das partes ou falta de procuração: AgRg--EREsp 1087225/RJ, Relª Min. Maria Isabel Gallotti, 2ª S., Julgado em 08.08.2012, DJe 14.08.2012; AgRg-AREsp 26.577/PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, 3ª T., Julgado em 25.10.2011, DJe 10.11.2011; AgRg-Rcl 5.550/AC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 2ª S., Julgado em 11.05.2011, DJe 18.05.2011; AgRg-Ag 1325722/ES, Rel. Min. Herman Benjamin, 2ª T., Julgado em 09.11.2010, DJe 03.02.2011, dentre outros. 3. A alegação de que a parte contrária deixou de instruir o agravo de instrumento apresentado na origem com a procuração da parte ora recorrente, deveria ter sido formulada nas contrarrazões do agravo de instrumento, não sendo possível sua apresentação no presente momento por se tratar de inovação recursal, a respeito da qual já se operou a preclu-são consumativa. Precedente. 4. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 806.663 – (2015/0280196-2) – 4ª T. – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJe 02.03.2016 – p. 1094)

8664 – Representação processual – irregularidade – ausência de procuração do advogado

“Agravo regimental no recurso especial. Processual civil. Representação processual. Irregularidade. Ausência de procuração do advogado subscritor da petição recursal. Súmula nº 115/STJ. Art. 13 do CPC. Não aplicação. Provimento negado. 1. Os recursos dirigidos à instância superior desacompa-nhados de procuração são inexistentes, à luz do disposto na Súmula nº 115, do STJ. Precedentes. 2. A regra inserta no art. 13 do CPC não se aplica nas instâncias extraordinárias. Precedentes.

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3. Cumpre salientar que o juízo de admissibilidade do recurso especial está sujeito a duplo controle, de maneira que a aferição da regularidade formal do apelo pela instância a quo não vincula o Su-perior Tribunal de Justiça. Com efeito, ‘esta Corte Superior de Justiça não está vinculada às decisões proferidas pelo Tribunal de origem no juízo de admissibilidade do recurso especial, por se tratar de um juízo preliminar não vinculativo’ (EDcl-AgRg-Ag 1.202.232/AL, 5ª T., Relatora a Ministra Laurita Vaz, DJe de 24.05.2010). 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.518.415 – (2015/0029384-0) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 02.03.2016 – p. 1130)

8665 – Responsabilidade civil – acidente de trânsito – apreciação de prova – princípio do livre convencimento

“Agravo regimental. Agravo em recurso especial. Responsabilidade civil. Acidente de trânsito. Apre-ciação de prova. Princípio do livre convencimento. Art. 131 do CPC. Fundamentos do acórdão. Não impugnação. Incidência do Verbete nº 283 da Súmula/STF. Demora na citação. Ausência de responsabilidade das partes. Prova Pericial. Desnecessidade. Reexame de matéria fática da lide. Súmula nº 7/STJ. Não provimento. 1. Como destinatário final da prova, cabe ao magistrado, respei-tando os limites adotados pelo Código de Processo Civil, a interpretação da produção probatória, necessária à formação do seu convencimento. 2. As razões elencadas pelo Tribunal de origem não foram devidamente impugnadas. Incidência do Enunciado nº 283, da Súmula/STF. 3. Inviá-vel o recurso especial cuja análise impõe reexame do contexto fático-probatório da lide (Súmula nº 7 do STJ). 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 785.991 – (2015/0239754-8) – 4ª T. – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 02.03.2016 – p. 1090)

Comentário Editorial SÍNTESETrata-se de agravo regimental interposto contra decisão por meio da qual neguei provimen-to ao agravo em recurso especial sob os óbices das Súmulas nºs 283/STF e 7/STJ e por entender que o posicionamento do acórdão recorrido quanto à possibilidade de juntada de documentos novos encontra-se de acordo com a jurisprudência do STJ.

Sustentou a agravante que houve impugnação a fundamento suficiente para a reforma do acórdão recorrido. Defende que nada impede a apuração de eventual concorrência de culpa no âmbito civil, mesmo havendo condenação na esfera criminal.

Alegou que todos os elementos necessários para a análise das razões de recurso foram devidamente delineados pelo acórdão recorrido e que se trata de questão unicamente de direito, uma vez que os fatos são incontroversos.

O acórdão, objeto de impugnação do especial cujo seguimento fora, na origem, denegado, ficou assim ementado:

“Reparação de danos. Acidente de trânsito. Prescrição interrompe-se com a citação (CPC, art. 219), que, porém, retroage à data da propositura da ação, quando os autores não deram causa à demora na sua realização. Inocorrência. A não realização de provas des-necessárias, não determina cerceamento de defesa. Prova pericial isenta realizada em processo criminal considerada suficiente para formar o convencimento do julgador. Inutili-dade de nova perícia. Desnecessidade de reconhecimento da possibilidade de juntada de ‘documentos novos’, porque o art. 357 do CPC já a prevê. Agravo não provido.”

O STJ negou provimento ao agravo.

A responsabilidade civil é assim disciplinada pelo Jurista Mário Antônio Lobato de Paiva:

“Acresce que os fatos causadores de prejuízos se apresentam frequentemente imputáveis não a indivíduos isolados, mas a conjunto de homens. E quanto mais complexa e nume-rosa seja a composição desses grupos humanos, tanto mais tende a ficar no anonimato o exato culpado. Qual foi, por exemplo, o engenheiro, o desenhista ou o operário que pela sua atuação ocasionou as deficiências de uma peça essencial à segurança de uma viatura?

Toda esta mudança de condicionalismos levou a encarar a responsabilidade civil de novos ângulos. A vida moderna, fazendo avultar a categoria dos danos resultantes de acidentes,

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suscitou o problema paralelo da sua indenização mais adequada, a que não satisfazem os esquemas tradicionais.

É manifesto que a concepção clássica da responsabilidade do culpado continua a ter um vasto papel. Mas, ao lado do princípio da responsabilidade baseada na culpa – responsa-bilidade subjetiva – acolhe-se a ideia, posto que em casos excepcionais, de uma responsa-bilidade independentemente de culpa – responsabilidade objetiva e responsabilidade pelo risco. Os acidentes de circulação terrestre e os acidentes de trabalho representam o ponto de partida, visando-lhes a juntar depois outras situações expressivas.

A evolução chegou ainda mais longe. Admitiu-se, também excepcionalmente, sem dúvida, que a obrigação de indenização pudesse resultar de uma conduta lícita do agente causa-dora de danos. Trata-se do campo da responsabilidade por intervenções lícitas.

Deve observar-se que os referidos caminhos da responsabilidade civil não estancam no reconhecimento e alargamento das hipóteses de responsabilidade isenta de culpa, em especial pelo que respeita aos utentes de coisas perigosas. Procura-se ir adiante, num sentido que traduz uma socialização do risco do dano.

Com efeito, assiste-se a um claro movimento de segurança social, que procura garantir a reparação de todo e qualquer dano ao lesado, independentemente do caráter culposo ou ilícito do ato que o produziu. O sistema encontra a sua expressão mais avançada nos países escandinavos a respeito dos danos pessoais.

A questão põe-se, sobretudo, com os acidentes de trabalho. Mas também quanto aos acidentes de viação, alguns autores e projetos legislativos modernos preconizam que o Estado garanta sempre, em princípio, a indenização devida ao lesado, quer o acidente resulte de circunstâncias de força maior estranhas ao funcionamento do veículo, quer se desconheça o efetivo responsável ou este não disponha de meios para cobrir a indeniza-ção; embora se atribua ao Estado um direito de regresso.

A uma tal propensão para subtrair à responsabilidade civil certos domínios de reparação de danos se junta, mesmo no âmbito desta, um outro aspecto relevante. Referimo-nos à generalização voluntária do seguro da responsabilidade, que é um fenômeno radicado e característico do espírito do nosso tempo, não só nos países ocidentais, mas também no comum dos países socialistas, cujos sistemas se encontram, de qualquer modo, mais ligados ao conceito de responsabilidade fundada na culpa. Assiste-se até a uma crescente tendência que propugna pela consagração do seguro obrigatório, para além das áreas da circulação rodoviária e dos acidentes de trabalho, em determinados domínios, como os das profissões liberais. E, inclusive, os seguros pessoais, tão difundidos, proporcionam à vítima uma reparação dos danos resultantes da sua própria culpa.

Um elemento novo se introduz, por esta via, na querela sobre a função da responsabilida-de civil, que o consenso predominante, ainda sob inspiração do positivismo do século XIX, entende apenas reparadora do dano ou indenizatória. Não é inédita uma função sancio-natória ou punitiva ao ilícito civil. Só que a difusão do seguro da responsabilidade diminui a força deste aspecto, mormente a sua eficácia preventiva. Daí o problema da maneira de atenuar a natural modificação que se opera na mentalidade do segurado, propicia à eliminação do efeito pedagógico-educativo ligado ao suporte da indenização.

Apontemos ainda circunstância de se vir assistindo ao desenvolvimento da responsabili-dade civil em direções novas. À medida que a vida moderna tem alcançado determinados êxitos científicos e tecnológicos ou posto em destaque certas atividades ou profissões, suscetíveis de causar danos a terceiros, colocam-se aos juristas problemas de responsabi-lidade civil, muitas vezes contemplados insatisfatoriamente na lei. Assim, por exemplo, a reparação dos danos devidos à utilização de algumas formas de energia, como a nuclear e a elétrica, ou resultantes da poluição industrial. Questão que concita largo interesse na doutrina dos sistemas mais representativos é a da responsabilidade do fabricante, intima-mente ligada ao comércio e consumo de massas que caracteriza a sociedade contempo-rânea. O tema encontra-se melhor teorizado a respeito dos bens de consumo, mas não se descura, também, quanto aos bens de equipamento.

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Por outro lado, como antes se salientou, a responsabilidade civil implantou-se com grande vigor no domínio profissional, particularmente em relação às chamadas artes ou profissões liberais. E sempre se organizando um respectivo sistema de seguro.

Assim acreditamos que o que se salientou parece bastante para mostrar os motivos por que a responsabilidade civil constitui uma das áreas que mais vêm solicitando as atenções e a imaginação dos juristas e dos legisladores.” (Evolução da responsabilidade civil e seus problemas modernos. Disponível em: http://online.sintese.com.)

8666 – Responsabilidade civil – dano moral – manutenção indevida de nome em cadastro de inadimplentes – descumprimento de decisão judicial

“Agravo regimental no agravo em recurso especial. Processual civil. Responsabilidade civil. dano moral. Manutenção indevida de nome em cadastro de inadimplentes. Descumprimento de decisão judicial. Ausência de impugnação específica de fundamento autônomo e suficiente do acórdão recorrido. Súmula nº 283/STF. Inaptidão do artigo indicado para afastar o fundamento do Tribunal de origem. Súmula nº 284/STF. Agravo improvido. 1. No tocante à impossibilidade de ajuizamen-to de ação própria para pleitear dano moral, decorrente de descumprimento de ato determinado judicialmente, tem-se que o fundamento do acórdão recorrido, autônomo e suficiente à sua manu-tenção, não foi impugnado nas razões do recurso especial, convocando, na hipótese, a incidência da Súmula nº 283/STF. 2. O art. 461 do Código de Processo Civil, o qual estabelece que, ‘na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento’, não tem força normativa para afastar o fun-damento central do acórdão, atraindo a incidência da Súmula nº 284/STF, aplicada por analogia. 3. Agravo regimental improvido.” (STJ – AgRg-AgRg-Ag-RE 762.322 – (2015/0200606-4) – 4ª T. – Rel. Min. Raul Araújo – DJe 02.03.2016 – p. 1084)

8667 – Responsabilidade civil – danos materiais – cheque devolvido sem provisão de fundos – defeito na prestação do serviço – consumidor equiparado

“Recurso especial. Responsabilidade civil. Danos materiais. Cheque devolvido sem provisão de fun-dos. Defeito na prestação do serviço. Consumidor equiparado. Não ocorrência. 1. Ao receber um cheque para saque, é dever do banco conferir se está presente algum dos motivos para devolução do cheque, conforme previsto no art. 6º da Resolução do Bacen nº 1.682/1990. Caso o valor do títu-lo seja superior ao saldo ou ao eventual limite de crédito rotativo, deve o banco devolver o cheque por falta de fundos (motivo 11 ou 12). Não havendo mácula nessa conferência, não há defeito na prestação do serviço e, portanto, não cabe, com base no Código de Defesa do Consumidor, imputar ao banco conduta ilícita ou risco social inerente à atividade econômica que implique responsabi-lização por fato do serviço. 2. Na forma do disposto no art. 4º da Lei nº 7.387/1985 ‘a existência de fundos disponíveis é verificada no momento da apresentação do cheque para pagamento’. 3. A responsabilidade por verificar a capacidade de pagamento é de quem contrata. Ademais, o credor pode se negar a receber cheques, caso não queira correr o risco da devolução por falta de fundos. 4. Recurso especial provido.” (STJ – REsp 1.538.064 – (2015/0139444-7) – Relª Min. Maria Isabel Gallotti – DJe 02.03.2016 – p. 1132)

8668 – Seguro DPVAT – correção monetária – evento danoso

“Processual civil e civil. Agravo regimental no recurso especial. Seguro DPVAT. Correção monetá-ria. Evento danoso. Decisão mantida. 1. ‘A incidência de atualização monetária nas indenizações por morte ou invalidez do seguro DPVAT, prevista no § 7º do art. 5º da Lei nº 6.194/1974, redação dada pela Lei nº 11.482/2007, opera-se desde a data do evento danoso’ (REsp 1.483.620/SC, sub-metido ao rito do art. 543-C do CPC, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 2ª S., J. 27.05.2015, DJe 02.06.2015). 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-REsp 1.528.228 – (2015/0083174-8) – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – DJe 19.02.2016 – p. 503)

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8669 – Seguro de vida – suicídio ocorrido dentro do prazo bienal de vigência – novo posicio-namento da Segunda Seção – indenização indevida

“Agravo regimental no recurso especial. Contrato de seguro de vida. Suicídio ocorrido dentro do prazo bienal de vigência. Art. 798 do Código Civil. Critério objetivo. Novo posicionamento da Segunda Seção. Indenização indevida. Recurso especial provido. Agravo regimental desprovido. 1. Esta Corte Superior firmou entendimento no sentido de que o ‘art. 798 adotou critério objetivo temporal para determinar a cobertura relativa ao suicídio do segurado, afastando o critério subjeti-vo da premeditação’ (REsp 1.334.005/GO, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, Relª p/ Ac. Min. Maria Isabel Gallotti, 2ª S., Julgado em 08.04.2015, DJe 23.06.2015). 2. Verificado o suicídio dentro do período de dois anos da contratação do seguro, não é devido o pagamento do capital segura-do. 3. Recurso especial provido. 4. Agravo regimental desprovido.” (STJ – AgRg-REsp 1.562.753 – (2015/0264557-0) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.02.2016 – p. 407)

8670 – Seguro obrigatório – falta de prequestionamento – tantum devolutum quantum apellatum

“Processual civil e civil. Agravo regimental no agravo em recurso especial. Seguro obrigatório. Violação do art. 7º da Lei Complementar nº 95/1998. Tese não analisada pelo tribunal de origem. Falta de prequestionamento. Tantum devolutum quantum apellatum. Decisão mantida. 1. Inexiste afronta ao art. 535 do CPC quando o acórdão recorrido analisou todas as questões pertinentes para a solução da lide, pronunciando-se, de forma clara e suficiente, sobre a controvérsia estabelecida nos autos. 2. No caso concreto, o Tribunal de origem, observando o princípio recursal tantum devolutum quantum apellatum, analisou a única tese suscitada no apelo, referente à observância do grau de lesão do segurado para fixação do valor indenizatório do DPVAT. Assim, não há se falar em omissão no exame de matéria suscitada apenas por ocasião da oposição dos aclaratórios. 3. A simples indicação dos dispositivos legais tidos por violados, sem que o tema tenha sido suscitado no apelo e enfrentado pelo acórdão recorrido, obsta o conhecimento do recurso especial, por fal-ta de prequestionamento. Incidência da Súmula nº 211/STJ. 4. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STJ – AgRg-Ag-REsp 586.978 – (2014/0244667-2) – 4ª T. – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – DJe 19.02.2016 – p. 432)

8671 – Sociedade – ação de dissolução parcial de sociedades – exclusão de sócio – apuração de haveres – juros de mora – termo inicial – prazo

“Direito societário. Agravo regimental no recurso especial. Ação de dissolução parcial de socie-dades. Exclusão de sócio. Apuração de haveres. Juros de mora. Termo inicial. Prazo nonagesimal para pagamento. Agravo não provido. 1. Decorrido o prazo legal nonagesimal (art. 1.031, § 2º, do CC/2002) para pagamento de quota social, contado de sua efetiva liquidação, são devidos juros de mora. Precedentes. 2. Na hipótese dos autos, após transação parcial, a lide teve seguimento quanto à apuração de haveres, devendo considerar-se concluída e liquidados os haveres com a decisão recorrida em especial, momento a partir do qual passam a ser devidos os juros moratórios. 3. Agravo regimental não provido.” (STJ – AgRg-REsp 1.474.873 – (2014/0205036-0) – 3ª T. – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze – DJe 19.02.2016 – p. 401)

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Índice Alfabético e Remissivo

Índice por Assunto Especial

DOUTRINAS

Assunto

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

•A Desconsideração da Personalidade Jurídi-ca no Novo Código de Processo Civil (Aldem Johnston Barbosa Araújo) .....................................79

•A Estabilização das Decisões Judiciais Decor-rente da Preclusão e da Coisa Julgada no Novo CPC: Reflexões Necessárias (José Henrique MoutaAraújo) ................................................................18

•A Revogação da Gratuidade em Sentença, a (Des)Necessidade do Preparo da Apelação, a Competência da Primeira Instância para o Reco-nhecimento da Deserção e Brevíssimas Anota-ções sobre o Novel Regime de Preparo Recursal no NCPC (Tiago Bitencourt de David) ...................9

•Cuidados com a Entrada em Vigor do NCPC (Gisele Leite) ........................................................73

• Incidência de Multa pelo Não Comparecimento da Parte à Audiência de Conciliação nos Jui-zados Especiais da Fazenda Pública (Leonardo Oliveira Soares) ...................................................43

•Noções Elementares sobre Recursos no Novo CPC e Suas Principais Alterações (Eric Cesar Marques Ferraz) .................................................124

•O Novo Código de Processo Civil: a Evolução do Sistema Jurídico (Marcio Evangelista Ferreirada Silva) ...............................................................52

•O Novo Perfil da Tutela Provisória (Clito Fornaciari Júnior) ...............................................146

Autor

aldem JohNstoN barbosa araúJo

•A Desconsideração da Personalidade Jurídicano Novo Código de Processo Civil ......................79

Clito ForNaCiari JúNior

•O Novo Perfil da Tutela Provisória ....................146

eriC Cesar marques Ferraz

•Noções Elementares sobre Recursos no Novo CPC e Suas Principais Alterações .......................124

gisele leite

•Cuidados com a Entrada em Vigor do NCPC .......73

José heNrique mouta araúJo

•A Estabilização das Decisões Judiciais Decor-rente da Preclusão e da Coisa Julgada no Novo CPC: Reflexões Necessárias .................................18

leoNardo oliveira soares

• Incidência de Multa pelo Não Comparecimento da Parte à Audiência de Conciliação nos Juiza-dos Especiais da Fazenda Pública ........................43

marCio evaNgelista Ferreira da silva

•O Novo Código de Processo Civil: a Evolução do Sistema Jurídico ..............................................52

tiago biteNCourt de david

•A Revogação da Gratuidade em Sentença, a (Des)Necessidade do Preparo da Apelação, a Competência da Primeira Instância para o Reco-nhecimento da Deserção e Brevíssimas Anota-ções sobre o Novel Regime de Preparo Recursalno NCPC ..............................................................9

EM POUCAS PALAVRAS

Assunto

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

•Dano Moral e Valor da Causa: entre o Velhoe o Novo CPC (Guilherme Carvalho e Sousa .....149

Autor

guilherme Carvalho e sousa

•Dano Moral e Valor da Causa: entre o Velho e o Novo CPC .........................................................149

ACONTECE

Assunto

Novos Paradigmas sobre o Novo CPC

•A Data da Entrada em Vigor do Novo Código de Processo Civil – 18.03.2016 (Rogério Montai de Lima) ............................................................152

Autor

rogério moNtai de lima

•A Data da Entrada em Vigor do Novo Código de Processo Civil – 18.03.2016 ..............................152

Índice Geral

Assunto

ação resCisória

•Processual civil – Agravo regimental na ação rescisória – Cálculo de liquidação em desa-cordo com o título exequendo – Possibilidade

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ��������������������������������������������������������������������������������������������������������������245 de correção a qualquer tempo – inexistência de violação da literalidade da lei – Provimentonegado (STJ) .............................................8615, 166

ComPetêNCia

•Conflito de competência – Direito empresa-rial e processual civil – Execução ajuizada em face de sócios-avalistas de pessoa jurídica em recuperação judicial – Suspensão da ação – Im-possibilidade – Autonomia das obrigações as- sumidas no título de crédito – Precedentes doSTJ (STJ) ...................................................8616, 172

exeCução

•Apelação cível – Execução individual de sen-tença coletiva – Prescrição da pretensão execu-tória – Inocorrência – Anterior ajuizamento de execução coletiva – Causa interruptiva do pra- zo prescricional – Apelação provida (TRF 2ª R.) ................................................................8618, 191

PeNhora

•Processual civil – Agravo de instrumento – Ex-cesso de penhora – Não configurado – Ne-cessidade de avaliação dos bens (TRF 5ª R.) ................................................................8621, 213

•Processual civil – Agravo legal – Execução fiscal – Bacen-Jud – Penhora online – Não de-monstrada hipótese do art. 557 do Código de Processo Civil – Incompatibilidade da decisão com entendimento dominante jurisprudencial– Não provido (TRF 3ª R.) ........................8619, 198

PresCrição

•Processual civil – Embargos à execução – Pres-crição quinquenal – Prescrição anterior à sen-tença – Impossibilidade de alegação em sede de embargos – Art. 741, VI, do CPC – Sen- tença mantida – Apelação improvida (TRF 1ª R.) ................................................................8617, 185

testameNto

•Embargos de declaração no agravo regimental nos embargos de divergência em agravo em recurso especial – Processual civil – Ação de-claratória de nulidade de testamento público – Vício de forma – flexibilização – Prevalência da real vontade do testador – Ausência de similitu-de fática – Acórdão embargado em consonância com a atual jurisprudência desta Corte Supe-rior – Súmula nº 168/STJ – Alegação de omis- sões no decisum – Não ocorrência – Advertênciade multa – Embargos rejeitados (STJ) ........8614, 154

título exeCutivo

•Embargos à execução – Cruzados bloqueados – Conta corrente – Cerceamento de defesa – Inexistência de título executivo judicial – Inci-dência do IPC de março/1990 – Existência de saldo – Sucumbência (TRF 4ª R.) .............8620, 207

EMENTÁRIO

Assunto

ação aNulatória

•Ação anulatória e indenizatória – contrato defranquia – recurso ....................................8622, 216

ação Cautelar

•Ação cautelar de exibição de documentos – interesse de agir – pedido prévio à instituição financeira e pagamento do custo do serviço –necessidade .............................................8623, 216

ação Civil PúbliCa

•Ação civil pública – liquidação provisória de sentença – correção monetária do débito ju-dicial apurado .........................................8624, 216

ação de iNdeNização

•Ação de indenização por danos materiais e morais – atropelamento em via férrea – morte de transeunte – menor púbere – dano material – pensão mensal ......................................8625, 216

ação de obrigação de Fazer

•Ação de obrigação de fazer e de indenização por danos morais – pedido de justiça gratuita formulado por pessoa jurídica .................8626, 217

ação deClaratória

•Ação declaratória cumulada com indeniza-ção por danos morais – inscrição indevida do nome do devedor nos cadastros dos órgãos de proteção ao crédito – preexistência de anota-ções regulares ..........................................8627, 217

ação iNdeNizatória

•Ação indenizatória – litispendência – ausênciade prequestionamento – danos morais .....8628, 217

ação moNitória

•Ação monitória – cheques prescritos – nature-za cambiária do cheque ..........................8629, 218

•Ação monitória – desconsideração da persona-lidade jurídica – inadimplemento – insolvên-cia – empresa devedora ...........................8630, 219

ação resCisória

•Ação rescisória – cálculo de liquidação em desacordo com o título exequendo – possibili-dade de correção a qualquer tempo ........8631, 220

ComPra e veNda

•Compra e venda – inadimplemento do com-prador – cláusula penal – fruição do imóvel –indenização .............................................8632, 221

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246 �������������������������������������������������������������������������������������������������������RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO

•Compra e venda de imóveis – responsabiliza-ção da vendedora pelo atraso no financiamento ................................................................8633, 221

CoNsórCio

•Consórcio – desistência – restituição de par-celas – juros de mora – termo inicial .......8634, 221

daNo moral

•Dano moral – devolução de cheque – insufi- ciência de fundos – exercício regular de um di-reito – irregularidade formal da cártula ..... 8635, 221

•Dano moral – inscrição desabonadora do nome – direito de crédito prejudicado – valor inde-nizatório – revisão – descabimento ..........8636, 223

deNuNCiação da lide

•Denunciação da lide – litisconsórcio – des-cabimento – ilegitimidade passiva afastada ................................................................8637, 224

duPliCata

•Duplicata – aceite – fraude ......................8638, 226

embargos de deClaração

•Embargos de declaração – requisito de admis-sibilidade extrínseco – preparo recursal – au-sência ......................................................8639, 226

exCeção de Pré-exeCutividade

•Exceção de pré-executividade – redução da dívida – honorários advocatícios – cabimento ................................................................8640, 226

exeCução

•Execução – alegação genérica de omissão no acórdão – penhora via Bacen-Jud – citação do executado – necessidade .........................8641, 227

•Execução – purgação da mora – integralidade da dívida pendente ..................................8642, 227

•Execução em mandado de segurança – pres-crição da pretensão executória afastada...8643, 227

•Execução individual – título judicial oriundo de ação coletiva promovida por entidade de classe – acolhimento da tese – vícios inexis-tentes .......................................................8644, 227

FiaNça

•Fiança – prorrogação – entrega das chaves ................................................................8645, 228

hoNorários de advogado

•Honorários de advogado – ação principal, cau-telar e reconvenção – acordo – valor excessivo – redução – cabimento ............................8646, 228

•Honorários de advogado – alegação de irriso-riedade – existência de título executivo judicialque dispensaria a nova condenação ........8647, 228

•Honorários de sucumbência – Empresa Bra-sileira de Correios e Telégrafos – titularidade – verba que integra o patrimônio da empresapública ....................................................8648, 229

Justiça gratuita

• Justiça gratuita – declaração de pobreza – pre-sunção relativa ........................................8649, 229

• Justiça gratuita – pagamento de honorários pe-riciais – responsabilidade do Estado.........8650, 231

Nota Promissória

•Nota promissória – contrato de parceria comvalor determinado – executoriedade ........8651, 231

PeNhora

•Penhora – embargos de terceiro – imóvel alie-nado em fraude à execução – bem de família ................................................................8652, 232

Petição

•Petição eletrônica – certificado digital – advo-gado sem procuração nos autos – recurso ine-xistente ....................................................8653, 233

PresCrição

•Prescrição – rede de eletrificação rural – res-sarcimento de valores ao consumidor ......8654, 234

reCuPeração JudiCial

•Recuperação judicial – cessão fiduciária sobre direitos sobre coisa móvel e sobre títulos de crédito – credor titular .............................8655, 235

•Recuperação judicial – habilitação do credor – pagamento – não comprovação – fiadores –devedores solidários ................................8656, 236

reCurso

•Recurso – agravo regimental – interposição por fac-símile – petição original não apresenta-da – não conhecimento ...........................8657, 238

•Recurso – interposição fora do prazo – data da postagem em agência dos correios – invali-dade ........................................................8658, 238

•Recurso especial – comprovantes de preparo ilegíveis – falha na digitalização no tribunalde origem ................................................8659, 238

•Recurso especial – petição subscrita por advo-gado sem procuração nos autos – não conhe-cimento ...................................................8660, 238

•Recurso inexistente – advogado sem procura-ção nos autos – regularização do feito – nãocabimento ...............................................8661, 238

•Recurso manifestamente incabível – erro gros-seiro inescusável – embargos de declaração– ausência das hipóteses ..........................8662, 239

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RDC Nº 100 – Mar-Abr/2016 – ÍNDICE ALFABÉTICO E REMISSIVO ��������������������������������������������������������������������������������������������������������������247

rePreseNtação ProCessual

•Representação processual – falha – subscritordo recurso ...............................................8663, 239

•Representação processual – irregularidade – au-sência de procuração do advogado ........8664, 239

resPoNsabilidade Civil

•Responsabilidade civil – acidente de trânsito – apreciação de prova – princípio do livre con-vencimento ..............................................8665, 240

•Responsabilidade civil – dano moral – ma-nutenção indevida de nome em cadastro de inadimplentes – descumprimento de decisão ju-dicial .......................................................8666, 242

•Responsabilidade civil – danos materiais – cheque devolvido sem provisão de fundos –

defeito na prestação do serviço – consumidorequiparado ..............................................8667, 242

seguro

•Seguro DPVAT – correção monetária – eventodanoso .....................................................8668, 242

•Seguro de vida – suicídio ocorrido dentro do prazo bienal de vigência – novo posiciona-mento da Segunda Seção – indenização inde-vida .........................................................8669, 243

•Seguro obrigatório – falta de prequestionamento– tantum devolutum quantum apellatum .. 8670, 243

soCiedade

•Sociedade – ação de dissolução parcial de so-ciedades – exclusão de sócio – apuração de haveres – juros de mora – termo inicial – prazo ................................................................8671, 243