Revista palindromo_fervenza (1)

download Revista palindromo_fervenza (1)

of 25

Transcript of Revista palindromo_fervenza (1)

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    1/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Formas da Apresentao: da exposio autoapresentao como arte

    Hlio FervenzaPPGAV - UFRGS

    Grupo de Pesquisa Veculos da Arte CNPq

    Resumo:Entre os aspectos que produzem a apresentao de um objeto, ao ou

    situao como arte, encontram-se tambm concepes indicando que esse objeto,

    ao ou situao,pode serarte ou de que a est ocorrendo arte. A exposio e a

    autoapresentao constituiriam dois aspectos da apresentao no campo da artecontempornea e,ao mesmo tempo,indicariam limites da atuao desse campo e das

    concepes da arte a relacionadas.

    Palavras-chaves:Formas da apresentao. Exposio. Autoapresentao. Arte.

    Title: Forms of Presentation: from exhibition to self-presentation as artIntroductory

    notes.

    Abstract: Among the aspects that produce the presentation of an object, action or

    situation as art, one also finds concepts indicating that this object, action or situationmay be art or that art is occurring in that place. Exhibition and auto-presentation

    constitute two aspects of presentation in the field of contemporary art and,

    simultaneously, indicate limits in this field for actuationand its related art concepts.

    Keywords:Forms of presentation. Exhibition. Self-presentation. Art.

    Dentro de um grupo de trabalhos de minha produo artstica, efetuados durantepesquisas anteriores1, confrontei-me com problemas sobre a relao entre uma

    determinada proposta artstica e sua apresentao dentro de um espao expositivo.

    Desde ento, o pensamento se move em meio observao de que a constituio

    fsica ou a dimenso perceptiva da produo esta relacionada ao contexto de sua

    exposio ou por ele afetada, pelas diferentes concepes de arte e pelos discursos

    a inscritos.

    1Sobretudo a partir da pesquisa intituladaPontuaes: inscries e intervalos no espao deapresentao, desenvolvida entre 2002 e 2007.

    68

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    2/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Fig. 1 Hlio Fervenza, Pontuaes para dentrofora.Instalao realizada para a exposio individual de mesmo nomeocorrida no IDEA Espao de Arte, FURG, Rio Grande RS, no perodo de 1 a 17 de novembro de 2006. Maisinformaes em http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/dentrofora/index.htmFoto: Vista parcial da instalao.

    Arquivo do artista.

    Nesse grupo de trabalhos so freqentemente utilizados sinais de pontuao, tais

    como vrgulas, parntesesou dois pontos,ampliados e recortados em vinil adesivo e

    aplicados diretamente sobre a arquitetura dos lugares onde ocorre a exposio. Os

    sinais de pontuao podem, por vezes, ser gravados sobre objetos. Nesses trabalhos,

    tambm podem ser encontradas frases, objetos ou imagens impressas por diferentes

    meios e relacionadas tambm com o lugar de sua inscrio. Os elementos utilizados

    so carregados de associaes e investidos de conotaes culturais, sociais ou

    econmicas.

    Nessas produes artsticas, a pontuao instaura intervalos que so vazios ou

    esvaziamentos, pausas, interrogaes, interrupes, mudanas de sentido. Mas a

    pontuao tambm sinaliza percursos, articula seqncias, indica, oferece conexes

    (dentro/fora, visvel/no-visvel), cria relaes entre signos, objetos, olhares,

    subjetividades, produz relaes entre linguagem e mundo.

    69

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/dentrofora/index.htmhttp://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/dentrofora/index.htm
  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    3/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Fig. 2 Hlio Fervenza, Primeiras Apresentaes e Pontuaes Recentes.Exposio individual que reunia gravuras einstalao. Local: Museu Victor Meirelles, Florianpolis, 2005. Foto: Detalhe da porta de vidro automtica da entrada do

    museu, na qual foram colocadas vrgulas no seu lado interno e externo, pontuando sutilmente o espaamentoproduzido pelo visitante ao acionar com sua presena o sensor e entrar no recinto. Arquivo do artista.

    Mais especificamente, a pontuao funcionaria como uma espcie de mediadora, de

    elemento de relao e de reflexo nos processos que envolvem uma apresentao

    relacionada ao espao expositivo. O espao onde uma produo artstica vem

    inscrever-se pode ser tambm, simultaneamente, o de sua realizao. Os aspectos

    enfocados aqui so os diretamente relacionados aos espaos de exposio.

    Assim, na medida em que ocorria uma indagao sobre a constituio desses

    espaos expositivos, podamos constatar, nos trabalhos, uma interrogao sobre sua

    prpria constituio, sobre seus limites tanto fsicos quanto simblicos, e o que isso

    poderia designar. As relaes, comunicaes ou as indeterminaes dos limites entre

    o espao interno e externo produzidas em grande parte pela pontuao, mas no

    somente, colocam o problema do que pertence a esse espao expositivo e do que no

    pertence, e, por decorrncia, colocam o problema do espao de apresentaoda arte.

    A exposio, sendo uma forma de apresentao, por que ela seria a prioriidentificada

    como a da apresentao de uma produo artstica? Seriam os limites do espao

    expositivo, ao mesmo tempo, os limites da apresentao da arte e de sua concepo?

    Podemos citar alguns exemplos de trabalhos anteriores relacionados a esse grupo,

    no qual surgiram as questes: Empreendimento: Ponto de Impacto: Perda de

    Contato2; A dvida3;Os desertos e o jardim4;Coleo de vazios e alguns intervalos

    2http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/castelinho/3http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/aduvida/

    4http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/artransmedia/

    70

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/castelinho/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/aduvida/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/artransmedia/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/artransmedia/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/aduvida/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/castelinho/
  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    4/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    prolongados5; Primeiras Apresentaes e Pontuaes Recentes 6; O Piloto e o

    Martelo de Borracha7.

    Fig. 3 Hlio Fervenza, A dvida. Local: FotoGaleria, Porto Alegre, 2004. Foto: vista do porto de acesso com textoem vinil adesivo. Arquivo do artista.

    Fig. 4 Hlio Fervenza, Empreendimento: Ponto de Impacto: Perda de Contato. Instalao apresentada durante aexposio coletiva "Contato". Local: Castelinho do Flamengo, Rio de Janeiro, 2004. Foto: impresso em off-set (frente),medindo 15 x 15 cm, integrando a instalao, o qual era tambm oferecido aos visitantes, atravs de sua colocao em

    caixas de acrlico j existentes no local e utilizadas pelo Castelinho para distribuio de material informativo. Arquivo doartista.

    5http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/cinco_sete/6http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/museu_vm/

    7http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/piloto_martelo/

    71

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/cinco_sete/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/cinco_sete/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/museu_vm/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/museu_vm/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/piloto_martelo/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/piloto_martelo/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/piloto_martelo/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/piloto_martelo/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/museu_vm/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/museu_vm/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/cinco_sete/http://www.heliofervenza.net/arquivo/pontuacoes/cinco_sete/
  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    5/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Fig. 5 Hlio Fervenza, Os desertos e o jardim. Instalao apresentada durante o evento Artransmedia 2002,organizado pela Fundacin DANAE. Local: Convento Las Clarissas, Gijn, Espanha, 2002. Foto: detalhe de uma daslupas com seu suporte metlico. Devido a sua posio, e a um efeito ptico, a lupa projetava imagens oriundas da

    janela e do jardim visto atravs dela. Arquivo do artista.

    Gostaria de falar agora de outros trabalhos efetuados durante o perodo dessa

    mesma pesquisa, durante a qual ocorriam interrogaes sobre como uma determinada

    proposta artstica se relaciona com sua apresentao; desta vez, porm, fora de um

    espao expositivo. o caso, por exemplo, de Apresentaes do Deserto, mas

    tambm de Furtivo 8, Transposies do Deserto 9ou Objetos Mentais 10.

    Fig. 6 Hlio Fervenza,Objetos Mentais, 2004. Proposio pensada e concebida para o cabelo de uma nica pessoa. Elementos utilizados: duas pequenas placas de prata enroladas como anis e fixadas no cabelo, cada uma com asrespectivas palavras e pontuaes a gravadas: nuvem,e cristal, . Arquivo do artista.

    8

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/furtivo/9http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/transposicoes/index.htm10http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/objetos_mentais/index.htm

    72

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/furtivo/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/furtivo/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/transposicoes/index.htmhttp://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/transposicoes/index.htmhttp://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/objetos_mentais/index.htmhttp://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/objetos_mentais/index.htmhttp://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/objetos_mentais/index.htmhttp://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/transposicoes/index.htmhttp://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/furtivo/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/furtivo/
  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    6/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Fig. 7 Hlio Fervenza, Transposies do Deserto, 2003.Proposta para desenvolvimento e realizao coletiva entreduas escolas na fronteira Brasil-Uruguai. Foto: aula sobre desertos no Colegio Rod, Rivera, Uruguai.Arquivo doartista.

    A proposta por mim desenvolvida e intitulada Apresentaes do Deserto11,

    problematiza tambm a apresentao propriamente dita, a partir da constatao da

    separao entre a noo de exposioe a noo de apresentao.

    Apresentaes do Deserto consiste, inicialmente, na confeco de um conjunto de

    quatro cartes pessoais de apresentao. Um deles contm meu nome, endereo e

    um logotipo. Nos outros trs, o nome pessoal desaparece e o endereo substitudo

    pelo nome de um deserto: Atacama, Gobi e Kalahari. Os cartes so distribudos dois

    de cada vez, um com o nome e endereo e o outro, com o nome de deserto ao acasodos encontros.

    Fig. 8 Hlio Fervenza, Apresentaes do Deserto, 2001. Proposio que utiliza quatro cartes pessoais deapresentao. Arquivo do artista.

    11http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/deserto/

    73

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/deserto/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/deserto/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/deserto/
  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    7/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Com a entrega do carto, espaos podem ser configurados: espao da relao

    interpessoal, social, profissional e o espao do imaginrio ligado ao nome/evocao

    dos desertos. Mas tambm um espao que surge da inter-relao entre as pessoas no

    deslocamento de lugar do nome do deserto e da situao corriqueira do carto de

    apresentao.

    Os cartes no so o trabalho, a obra. Os cartes so uma proposio. Algo pode

    ocorrer no momento de sua entrega, ou mesmo aps: dilogos, observaes, idias,

    reaes, outras iniciativas... Isto o trabalho. Eles apresentam uma situao. No h

    nada conclusivo ali. No h uma viso a ser dada.

    O trabalho pode no ocorrer. Isto tambm est implcito. H uma fronteira instvel na

    possibilidade da apario da arte. Ela pode no ocorrer. Ou se ela ocorre, quando ela

    ocorre?

    Os trabalhos acima referidos, as constataes e as dvidas levantadas esto

    relacionados ao estudo do espao de apresentao e produziram circunstncias que

    me impulsionaram ao desenvolvimento dos aspectos apontados, como veremos

    adiante.

    Para situarmos mais precisamente a problemtica da atual pesquisa Formas da

    Apresentao: da exposio auto-apresentao como arte, importante analisar

    algumas noes e suas implicaes, sobretudo no que diz respeito ao espao de

    apresentao. Foi na inter-relao de minha produo artstica com esse espao que

    as atuais questes emergem, tornando-se pertinente o estudo dos componentes que

    os formam e as relaes a existentes, que onde se articula a prtica artstica.

    Inicialmente, poder ser-nos til olhar para algumas das diferenas propostas por

    Michel de Certeau (1996), entre lugare espao:

    Um lugar a ordem (seja qual for) segundo a qual se distribuemelementos nas relaes de coexistncia. A se acha portanto excludaa possibilidade, para duas coisas, de ocuparem o mesmo lugar.Existe espao sempre que se tomam em conta vetores de direo,quantidades de velocidade e a varivel tempo. O espao umcruzamento de mveis.Em suma, o espao um lugar praticado. Assim a ruageometricamente definida por um urbanismo transformada emespao pelos pedestres. Do mesmo modo, a leitura o espaoproduzido pela prtica do lugar constitudo por um sistema de signos

    um escrito.12

    12CERTEAU, Michel de.A inveno do cot idiano: artes de fazer.2.ed. Petrpolis, RJ: Ed.Vozes, 1996. p. 201-202.

    74

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    8/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Num segundo, momento seria pertinente tratarmos mais especificamente do espao

    no qual so apresentadas as produes artsticas.

    Numa primeira abordagem no campo das artes plsticas, o espao que aparece

    como o mais imediatamente relacionado apresentao o espao de exposio.

    Aquele que se estabelece com maior nfase nesse sentido, sendo, portanto, aquele de

    maior referncia. Este espao surge da apresentao de produes artsticas em

    museus, galerias, eventos (bienais, feiras de arte) e, possivelmente, em qualquer lugar

    artstico assim definido. Mas de onde surge e qual a importncia desse espao de

    exposio para as produes artsticas? Estas no seriam imediatamente e

    simplesmente visveis? O artista e professor Ren Vinon, autor do livro Artifices

    dexposition,nos introduz no problema, mais talvez do que resposta:

    O princpio de base o seguinte: uma obra no visvel por elamesma como pela fora natural das coisas (que, como as coisas quese fazem sozinhas, possuem um ar de magia), e ela no sobretudojamais inteiramente visvel no sentido em que ns no saberamospretender tudo (fazer) ver ou perceber de uma obra, qualquer que

    seja a transparncia de seu modo de apresentao.13

    importante esclarecermos, tambm, que o espao de exposiono produzido

    simplesmente em decorrncia da presena fsica de uma obra ou produo artstica no

    lugar constitudo pelo museu ou galeria. Ele se estabelece no cruzamento de toda uma

    srie de dispositivos que operam sobre a visualidade. Entraria em ao na percepo

    dessas produes o que o filsofo Jean-Franois Lyotard chama os operadores da

    viso de arte14, elementos que enunciam ascondiesda visualidade. So eles: a

    transmisso (a exposio) de uma mensagem(a obra de arte), por um expedidor (o

    artista, o curador, o galerista), para um destinatrio (o pblico, o crtico, o

    colecionador, o comprador), a propsito de algo (referente), utilizando um feixe de

    canais (as formas, as cores, os suportes, os lugares, os paradigmas culturais...) e,

    finalmente, um efeito(efeito de arte)15

    .Algumas dessas posies so intercambiveis, de modo que produtores e

    receptores podem ocupar as mesmas posies em diferentes momentos sem que, por

    vezes, o conjunto seja de fato transformado em suas relaes constituintes. Neste

    13VINON, Ren,Ar ti fices dexposit ion. Paris : ditions LHarmattan, 1999. p. 31.

    14 LYOTARD, Jean-Franois. Que Peindre?- Adami, Arakawa, Buren. Paris: Editions de laDiffrence, Coll. La Vue, Le Texte, V. I, 1987. pg. 91.15Ibid. p. 91, 96.

    75

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    9/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    sentido, o artista pode desempenhar o papel de curador; o crtico pode agir como um

    agente de vendas, e assim por diante16.

    Salientamos que nos modos de agir da arte contempornea, a apresentao de uma

    produo como produo artsticano fica restrita sua exposio num lugar fsico

    determinado. Uma palestra, por exemplo, pode constituir-se numa apresentao e

    agregar valor simblico ou agir sobre a visualidade. Embora possa no ser designado

    explicitamente como um ato artstico, ou no querer s-lo, uma palestra ou uma

    publicao pode produzir um efeito de arte, agir no sentido e na concepo de uma

    produo, ser um desdobramento de fato anterior, mesmo que o ocorrido no esteja

    mais visvel ou acessvel, a no ser talvez por sua documentao.

    Tambm pode ocorrer fato inverso. Como a informao um dos produtos

    mais valorizados, ocorre, muitas vezes, a antecipao do signo sobre a coisa.Antes

    de ter sido exposta, a obra do pintor, ou, mais precisamente, seu signo, j circula nos

    circuitos da rede17. Conseqentemente, entrariam, no olhar sobre certa produo

    como produo de arte, operadores que no se limitam quilo que exposto, mas

    incluem, sobretudo no caso da exposio, o trabalho de curadoria, de arquitetura ou

    montagem, o catlogo de exposio, o convite, o mediador durante a visita, as

    etiquetas nas paredes, a publicidade ou o marketing. Todo e qualquer tipo de discurso

    produzido em torno da exposio ou sobre ela, como entrevistas, documentrios,

    notas de imprensa, trabalhos de formao ou projetos educacionais tambm seriam

    includos. O espao de exposio indicado no somente pelas paredes ou pelas

    molduras e bases fsicas das galerias e museus, mas, sobretudo, pelas molduras

    culturais, sociais e econmicas.

    Na coletnea de textos intitulada LArt de lExposition, que rene reflexes e

    documentaes sobre trinta exposies consideradas exemplares no sculo XX, pode-

    se ler logo no incio de sua introduo: Desde que as exposies existem, elas socriticadas. Esse meio de comunicao artstica o mais antigo existente , sem

    contestao, aquele que conhece o maior sucesso, e que paradoxalmente permanece

    suspeito, ao mesmo tempo, face aos artistas, aos crticos e ao publico18.

    16CAUQUELIN, Anne. Arte Contempornea: uma introduo. So Paulo: Martins Fontes,2005. p. 72.17Ibid. p. 68.

    18HEGEWISCH, Katharina. Un mdium la recherche de sa forme: Les expositions et leursdterminations. In: LArt de lexposition Une documentation sur trente expositionsexemplaires du XXe sicle. Paris: ditions du Regard, 1998. p. 15.

    76

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    10/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Ao longo das pginas do livro acima citado, podemos acompanhar a serie de

    mudanas ocorridas na arte em relao ao uso e ao estatuto desse espao, sua

    incorporao pelas prticas artsticas ou os impasses produzidos diante destas. O que

    essas prticas nos mostram que a exposio e seu espao no so neutros, nem

    dizem respeito a aspectos puramente tcnicos, nem so um simples espao de

    recepo de objetos autnomos, de por si ss detentores de valor artstico sem

    relao com esse espao. O que essas prticas nos mostram que a exposio um

    meio, conotado historicamente, ideologicamente, socialmente. A arte da exposio a

    percepo da intensidade de atuao desse meiona visualidade e na concepo da

    arte.

    Marcel Duchamp, com seus ready-mades, realizou, de uma certa forma, a

    demonstrao desse funcionamento:

    Em 1913, Duchamp apresenta os primeiros ready-mades, Roda de

    bicicleta; anos depois, em 1917, Fonte, no Salo dos Independentes

    de Nova York. Ele deixou o terreno esttico propriamente dito, o feito

    mo. No mais a habilidade, no mais o estilo apenas signos,

    ou seja, um sistema de indicadores que delimitam os locais. Expondo

    objetos prontos, j existentes e em geral utilizados na vida cotidiana,

    como a bicicleta ou o mictrio batizado de fontaine [fonte], ele faz

    notar que apenas o lugar de exposio torna esses objetos obras dearte. ele que d o valor esttico de um objeto, por menos esttico

    que seja. justamente o continente que concede o peso artstico:

    galeria, salo, museu. Ou, ainda, textos, jornais, notas,

    publicaes...19.

    Nas atuais circunstncias, tanto os operadores da viso de arte,dos quais nos fala

    Lyotard, quanto os sistemas de indicadores ou de signos (funcionando em rede),

    citados por Cauquelin, adquiriram uma importncia excepcional. Mas o espao deexposiono continuaria a ser fundamental, sendo o modelo a partir do qual surgem

    e se articulam esses operadores e redes? Assim, no poderamos considerar o

    espao de exposio como paradigma da apresentao e da recepo nas artes

    plsticas? Ao se configurar esse espao, no se produziria tambm uma concepo

    da arte? Dito de outro modo, as concepes da arte no estariam diretamente

    relacionadas s suas formas de apresentao?

    19CAUQUELIN, op. cit. p. 93-94.

    77

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    11/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Por outro lado, no que diz respeito ainda ao espaode exposio, o historiador da

    arte Jean-Marc Poinsot estabelece uma diferena significativa entre o local de

    acolhida da obra, quadro social particular, e o espao que a obra precisa para existir

    (este espao sendo considerado como um componente axiomtico da obra)20.

    Entre os trabalhos analisados por Poinsot, encontra-se o do artista Daniel Buren. A

    preocupao com o lugar onde ocorre a apresentao do trabalho artstico central

    em sua produo, realizada a partir de 1965. Um termo criado por ele para definir seu

    trabalho o de In Situ:

    Empregada para acompanhar meu trabalho depois de uma quinzenade anos, esta locuo no quer dizer somente que o trabalho estsituado ou em situao, mas que sua relao ao lugar toobrigatria ou necessria quanto o que ele mesmo implica ao lugar

    no qual ele se encontra. A palavra trabalho sendo extremamenteduvidosa ela deve ser compreendida entretanto num sentido ativo:um certo trabalho efetuado aqui, e no no sentido de um resultado:olhem o trabalho feito.A locuo trabalho in situ no mais prximo do que eu acompreendo, poderia se traduzir por transformao do lugar deacolhida. Transformao do lugar de acolhida feita graas adiferentes operaes entre as quais o uso de meu utenslio visual.In situ quer dizer enfim no meu esprito que h uma ligaovoluntariamente aceita entre o lugar de acolhida e o trabalho que a

    se faz, se apresenta, se expe21.

    Termos como os de Instalao, Site-specific ou In Situ surgem comoelaboraes de definies de produes artsticas que se constituem em relao ao

    espao expositivo (mesmo que de uma forma negativa), possibilitando problematizar o

    seu quadro institucional, cultural ou social. A dimenso crtica de prticas como a do

    In Situ, ou de artistas como Marcel Broodthaers, residiria na capacidade de interrogar

    o espao de exposio, revelando sua constituio e seu contexto como

    determinantes nas condies de existncia de certo tipo de visualidade.

    Seria importante, neste momento, precisarmos tambm o significado deapresentao. Apresentar relaciona-se com expor,no sentido de pr diante, vista,

    ou na presena de; oferecer ou expor vista; mostrar; expor...22.

    20POINSOT, Jean-Marc, In Situ, lieux et espaces de la sculpture contemporaine, In: Qu'est-ce que la sculpture moderne ?,Paris, M.N.A.M.-Centre Georges Pompidou, 1986. p. 323.21Id. ibid. p. 327.22FERREIRA, A. B. de H. Novo Dicionrio da Lngua Portuguesa.2. ed. Rio de Janeiro: NovaFronteira, 1996. p. 148.

    78

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    12/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Ren Passeron tambm nos diz que:

    A apresentao ao mesmo tempo: um fenmeno, que tem lugarhic et nunc, uma mira (aquela do fenmeno mesmo, quedesejamos instaurar sobre o horizonte de intenes mais longnquas),

    e uma conduta, comportando um saber fazer (savoir-faire), suaarte prpria23.

    Mas qual seria o atributo especfico da apresentao em arte? Passeron

    responde: A arte ento esta parte do apresentar que apresenta o apresentar24.

    Especificamente e para efeito de estudo, em muitos momentos a apresentao

    pode ser analisada a partir de aspectos fsicos, ou da arquitetura, ou das concepes

    espaciais necessrias existncia de certo tipo de produo artstica (o componente

    axiomtico da obra de que nos fala Jean-Marc Poinsot). Entretanto, em nossa hiptesede trabalho, a apresentao no se restringe aos espaos de exposio e a suas

    caractersticas fsicas: necessrio esclarecer a esse respeito que se toda exposio

    implica uma apresentao (como ao artificial), toda apresentao no uma

    exposio no sentido moderno do termo25. Assim, exposio e apresentao

    possuem diferenas em seus atributos e abrangncias semnticas. A apresentao

    uma noo mais ampla que a exposio, e pode, dessa forma, englob-la.

    Para ns, o espao de apresentao aquele que surge no entrecruzamento dosmovimentos orientados a partir dos gestos e dos fenmenos de indicare fazer ver. Isto

    significa que ele se instaura no entrecruzamento das diferentes operaes, gestos e

    sistemas de indicao. Sua referncia imediata o campo artstico, mas sua

    manifestao abarca todas as situaes e atividades em que ele medeia uma relao

    na qual enfatizada a possibilidade de certo olhar, no sentido amplo do termo. A

    apresentao uma indicao que produz como uma nfase, um relevo no olhar.

    Mas a espacialidade, assim criada, no seria uma espacialidade difusa, mais

    dificilmente localizvel, mais disseminada? Certos aspectos sociais e culturais agiriamtambm como operadores sobre o espao de apresentao? De que forma? Seriam

    produzidas concepes da arte nessas operaes? E, no caso afirmativo, que tipos ou

    formas de arte? Se no caso do espao da exposio esses operadores podem ser

    mais facilmente detectveis, pelo fato de se encontrarem circunscritos a um campo

    bastante restrito, o que ocorre com a apresentao de algo fora do campo ou do

    23PASSERON, Ren. Cration, Prsentation, Prsence. In : La Prsentation. Paris, Editions

    du CNRS, 1985. p. 14 .24Id. Ibid. p. 30.25VINON. Ren.Ar ti fices dexposit ion.Paris, ditions LHarmattan, 1999. p. 23.

    79

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    13/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    circuito da arte? Em que circunstncias isto pode ser considerado, ou passa a se

    tornar arte?

    Estas perguntas surgem tambm impulsionadas por algumas produes e atividades

    artsticas nas quais podemos identificar, em princpio, a utilizao de outras formas de

    apresentao que no a de situaes expositivas, seja na galeria, no museu ou em

    espaos artsticos. Duas situaes podem nos introduzir nesta problemtica.

    Na primeira delas, o artista norte-americano Allan Kaprow, no incio dos anos

    setenta, realizou uma ao como resposta ao que ele considerou ser uma sugesto

    contida num dos textos de Events (Eventos), de George Brecht. Os textos eram

    extremamente sucintos e foram impressos em pequenos cartes entre 1959 e 1962.

    Eles poderiam ser compreendidos como partituras destinadas a serem utilizadas em

    diferentes situaes. A maneira como tais partituras deveriam ser utilizadas

    permanece em aberto de uma forma ambivalente. Assim, o texto no carto pode ser

    percebido apenas como uma lista de nomes ou como uma instruo ou sugesto para

    uma ao, diante de um pblico ou sozinho no espao privado. O carto escolhido por

    Kaprow intitula-se Trs eventos aquosos.Abaixo do ttulo estava escrito apenas gelo,

    gua, vapor. A ao que ele realizou foi a de preparar um ch gelado: primeiro, ferver

    a gua; depois, colocar o lquidonum bule com folhas de ch e, por ltimo, adicionar

    gelo.

    O modo como ele considerou essas palavras e de como isso o levou a fazer um ch

    tem a ver com sua concepo da arte. Para este artista, o ato de prestar ateno e

    estar consciente da realizao de atividades cotidianas, como preparar ch ou amarrar

    os cordes dos sapatos, pode ser mais fundamental do que produzir objetos

    convencionalmente identificados como artsticos.

    No artigo de sua autoria intitulado A verdadeira experimentao, 26 Kaprow

    estabelece uma distino entre arte que se parece com arte e arte que se parece

    com a vida: A arte parecida com a arte considera que a arte separada da vida e dorestante, enquanto que a arte parecida com a vida considera que a arte est em

    ligao com a vida e com o restante. A arte que se parece com arte constituiria uma

    prtica inscrita dentro da principal corrente da tradio da histria da arte ocidental,

    onde o esprito separado do corpo, o indivduo da coletividade, a cultura da natureza,

    e onde cada arte separada da outra. Por outro lado, a arte que se parece com a

    vida no est interessada pela grande tradio ocidental, pois ela tende a misturar as

    coisas: corpo e esprito, indivduo e coletividade, cultura e natureza, e assim por

    26KAPROW, Allan. La vritable exprimentation. In: Lart et la vie confondus. Paris: CentreGeorges Pompidou, Coleo Supplmentaires. p. 238.

    80

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    14/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    diante, da mesma forma como pode misturar as categorias da arte ou evit-las

    totalmente.

    Para Kaprow, foram os sucessivos desenvolvimentos e aprofundamentos do

    modernismo que conduziram a arte a dissolver-se em suas fontes no mundo real. As

    diferentes percepes do mundo e a subjetividade nas abordagens, bem como a

    possibilidade de agir sobre diferentes contextos no-artsticos, gerar gestos e

    comportamentos, estariam presentes em artistas e criaes desde as primeiras

    dcadas do sculoXX.

    Outra produo artstica pode tambm nos introduzir na problemtica da utilizao

    de outras formas de apresentao. O artista brasileiro Cildo Meireles realizou, a partir

    de 1970, as suas Inseres em Circuitos Ideolgicos, com as quais ele inseria

    informaes em determinados meios de circulao. Um exemplo disso o Projeto

    Coca-Cola, no qual ele aplicava decalques impressos com tinta branca vitrificada

    sobre garrafas de Coca-Cola, onde se lia, alm do ttulo do projeto, a seguinte

    proposta: Gravar nas garrafas, opinies crticas e devolv-las circulao. Embaixo,

    viam-se as iniciais C. M. e a data. Quando a garrafa estava vazia, no se percebia o

    texto, mas somente contra o fundo escuro da bebida.

    Cildo Meireles questionava os significados veiculados por esse refrigerante e sua

    onipresena econmica e cultural. Ao mesmo tempo, indagava-se sobre o sistema de

    circulao que tornava isso possvel. Este se constitua na venda, no consumo da

    bebida e na devoluo de sua embalagem. Assim, produzia-se um ciclo, um circuito: a

    embalagem saa da indstria para o distribuidor, do distribuidor para o consumidor e

    depois, num movimento inverso, este o devolvia ao distribuidor que a fazia retornar

    indstria para ser de novo reutilizada.

    O artista percebe que pode inserir nesse sistema outras informaes que seriam

    veiculadas pelo prprio circuito. Quer dizer, utilizar o prprio sistema de distribuio

    como veculo de outras proposies para que o abram a uma percepo e a umaatuao crtica.

    Em relao s Inseres, existe um depoimento de Cildo Meireles, registrado por

    Antnio Manuel, para sua pesquisa Ondas do Corpo, muito importante para

    entendermos essas aes e suas circunstncias. Nesse depoimento, Cildo diz o

    seguinte:

    Eu me lembro que em 1968-69-70, porque se sabia que estvamoscomeando a tangenciar o que interessava, j no trabalhvamoscom metforas (representaes) de situaes. Estava-se trabalhando

    com a situao mesmo, real. Por outro lado, o tipo de trabalho que seestava fazendo, tendia a se volatilizar e esta j era outracaracterstica. Era um trabalho que, na verdade, no tinha mais

    81

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    15/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    aquele culto do objeto, puramente; as coisas existiam em funo do

    que poderiam provocar no corpo social.27

    O artista sublinha o fato de que os circuitos de veiculao de mercadorias ou

    informaes carregam a propaganda ideolgica do produtor, e que seria funo da

    arte tornar conscientes essas prticas, em oposio funo anestesiante dos

    circuitos industriais numa sociedade capitalista. Para Cildo, as Inseres visavam a

    atingir um nmero indefinido de pessoas, um pblico no sentido mais amplo do termo

    e no limitar ou substituir essa noo pela de consumidor, a qual ligada ao poder

    aquisitivo. Elas s teriam sentido enquanto fossem praticadas por outras pessoas.

    As produes que nos interessam no presente estudo, como nos exemplos

    enfocados a partir de Allan Kaprow e Cildo Meireles 28, extravasam constantemente as

    prticas artsticas tradicionais ou o espao de uma concepo circunscrita da arte.

    Elas so desviantes. Elas produzem movimentos, um deslocamento constante que

    evita posies fixas e o isolamento de outras atividades e conhecimentos. Elas evitam

    posies identificveis de uma forma unvoca, ao recair sobre situaes no

    consideradas como artsticas numa sociedade marcada pela diviso do trabalho. Elas

    so propositivas no sentido de que no h um objeto artstico pronto para ser

    apreciado, mas, antes, um processo. A frase de Duchamp aqueles que olham so os

    que fazem os quadros29 parece estar de alguma maneira ainda relacionada a uma

    separao entre produtor e observador. Em outras palavras, existe algum que produz

    um objeto e algum que produz certo olhar sobre esse objeto apresentado. Ela supe

    uma noo de pblico como no cinema ou no teatro tradicional. Nas propostas e nas

    aes das quais nos fala Kaprow ou Cildo Meireles no h ningum assistindo, no h

    testemunhas oculares. Dessa forma, ocorre aqui algo que poderamos chamar de

    autoapresentao. Aquele que toma parte nesse processo inclui-se como algum que

    produz uma experincia de fazer e abre uma experincia de sentir e pensar, ou

    pensar, sentir, fazer, olhar: os termos esto inter-relacionados e no necessariamentenuma ordem estabelecida.

    Ainda em relao a Marcel Duchamp, seria possvel detectar certas diferenas em

    suas declaraes e escritos sobre o processo de criao, sobre o olhare sobre o ato

    27MEIRELES, Cildo. Coleo Arte Brasileira Contempornea. Rio de Janeiro: FUNARTE,1981. p. 24.28No caso de Cildo Meireles, nosso interesse se d principalmente pelo primeiro momento daelaborao e circulao de suas Inseres em Circuitos Ideolgicos, antes de sua exposio

    em museus. Mas essa passagem de uma circunstncia a outra constitui um aspectoimportante, o qual pode ser estudado e desenvolvido.29DUCHAMP, Marcel. Duchamp du signe.Paris : Flammarion, 1991. p. 247.

    82

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    16/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    de expor (apresentao), que nos levam a pensar noutras possibilidades de

    abordagem da noo de autoapresentao. Assim, em relao a esses trs aspectos,

    bem conhecida uma frase dele: Aqueles que olham so os que fazem os

    quadros30. Esta frase, assim como seu texto O processo criativo31, contm aspectos

    bastante enfatizados, seguidamentecitados, reproduzidos e traduzidos em livros ou

    coletneas. Mas o que parece ter passado despercebido em relao aos mesmos

    aspectos um trecho de uma de suas entrevistas com Pierre Cabanne, publicadas

    sob o ttulo Engenheiro do tempo perdido. Nesse trecho, Duchamp fala de seu

    interesse pelo jogo de xadrez, prtica qual ele esteve ligado durante quase toda sua

    vida. Transcrevo aqui o trecho em questo32:

    [...]Pierre Cabanne Constatei uma coisa: primeiro, o que no novo,

    sua paixo pelo xadrez...Marcel Duchamp No muito sria, mas existe.P. C. Tambm notei que esta paixo era especialmente grande

    quando voc no estava pintando.M.D. verdade.P. C. Ento, imaginei se, durante estes perodos, os gestos

    dirigindo os movimentos dos pees no espao no suscitariamcriaes sim, eu sei que voc no gosta desta palavra imaginrias que, a seus olhos, tinham tanto valor quanto ascriaes reais de seus quadros e, ainda, estabeleciam uma novafuno plstica no espao.

    M.D. De certa maneira, sim. Uma partida de xadrez uma coisa

    visual e plstica, e se no geomtrica no sentido esttico dapalavra, mecnica, desde que se move; um desenho, umarealidade mecnica. As peas no so belas por elas mesmas,assim como a forma do fogo, mas o que belo se a palavrabelo pode ser usada o movimento. Ento, umamecnica, no sentido, por exemplo, de um Calder. No xadrez,existem, sem dvida, coisas extremamente belas no domnio domovimento, mas no no domnio visual. Imaginar o movimentoou o gesto que faz a beleza neste caso. Est completamentedentro da massa cinzenta.

    P. C. Em suma, h no xadrez um jogo de formas gratuito que seope ao jogo de formas funcional da pintura.

    M.D. Sim, totalmente. Apesar do [sic] jogo no ser gratuito; existeescolha...

    P. C. Mas sem nenhum propsito.M.D. No. Nenhum propsito social. Isso o mais importante.P. C. O xadrez a obra de arte ideal?M.D. Poderia ser. Acrescente-se que o meio dos jogadores de

    xadrez mais simptico que o dos artistas. Estes socompletamente confusos, completamente cegos, usam viseira-de-burro. So loucos de certa natureza, como se espera que

    30Op. cit p. 247.31, Id. ibid. p. 187.32

    CABANNE. Pierre. Marcel Duchamp: engenheiro do tempo perdido. So Paulo, Ed.Perspectiva, 1997. p. 27, 28.

    83

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    17/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    eles sejam; mas no o so, em geral. Isto foi provavelmente oque mais me interessou. Eu estive muito ligado ao xadrez porquarenta ou quarenta e cinco anos, depois meu entusiasmodiminuiu.

    No trecho da entrevista que acabamos de ler, as perguntas e respostas giram emtorno do xadrez e da importncia significativa que ele teria para Duchamp. Lemos

    sobre beleza, movimento, criaes imaginrias, olhar e arte. Mas, curiosamente, o

    xadrez no uma pintura, no um quadro; o ato de jog-lo no considerado, em

    princpio, uma atividade artstica. Sua prtica no se inscreve na tradio das artes

    plsticas, muito menos dentro do campo da arte e ele no exposto dentro de

    espaos considerados artsticos. Quer dizer, pela maneira como Duchamp discorre

    sobre esse jogo, seu valor esttico no viria necessariamente de sua inscrio dentro

    do espao de exposio. Naquela poca ento, e no momento em que Duchamp eCabanne conversavam, o xadrez no possua institucionalmente ou publicamente

    essa conotao artstica. Um deslocamento ocorre aqui: nem o jogo, nem muito

    menos o contexto e os participantes (como enfatizado por Duchamp) pertencem ao

    campo da arte.

    Diante do jogo, Duchamp encontra qualidades plsticas e beleza ao imaginar o

    movimento das jogadas. Mas o jogo em principio produzido sem intenes artsticas,

    compreendidas estas tanto no sentido de que ele se oporia ao jogo de formas

    funcional da pintura, quanto no sentido de algum que produz uma pintura, a qualvisa ao olhar do publico. Duchamp, sentado diante do tabuleiro no ato de movimentar

    as peas, possivelmente tem uma percepo que se faz medida de seu

    envolvimento no jogo, que ele tambm produz. A um dado momento, ele pode pensar

    que aquilo poderia ser arte; talvez mesmo a obra de arte ideal. Mas nem o contexto

    nem talvez o outro jogador, ou algum que os observa, consideraria ou necessitaria ter

    esse olhar, nem o jogo proposto de antemo aos participantes como arte, quer dizer,

    enquanto produo de um gesto artstico. Seria o fato de produzir um jogo e

    simultaneamente oferecer um olhar e uma posio diante disso, partilhvel com um

    observador, que por sua vez iria refinar esse produto? Tarefa talvez impossvel,

    pois, afinal, como Duchamp mesmo afirma, isto estaria completamente dentro da

    massa cinzenta. Parece-me, ento, que aqui estamos diante de outra situao

    artstica, diferente daquela descrita no texto O processo criativo, no qual ela

    resultante de uma relao entre dois plos, onde se encontram, de um lado, o artista

    e, de outro, o espectador.

    84

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    18/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Gostaria tambm, neste momento, de aproximar outras experincias j histricas,

    como as do grupo Fluxus, que tenho observado ao longo da atual pesquisa. Entre

    muitos aspectos, interessou-me a abordagem que faz de suas prticas o filsofo

    Arthur Danto. Escrevendo sobre a poca na qual surgiram as atividades do Fluxus,

    nos diz ele:

    O lugar-comum da experincia cotidiana tinha comeado a passar porum tipo de transfigurao na conscincia artstica. Surgia a idia deque nada externo faria distinguir uma obra de arte dos objetos oueventos mais comuns que uma dana pode consistir em nada maisextraordinrio que ficar imvel; que qualquer coisa que algum escutepoderia ser msica at o silncio. A mais comum das caixas demadeira, um carretel de linha de varal, uma tela de arame, uma fila detijolos, poderia ser uma escultura. (...) A qualquer momento que oclima permitisse, um grupo se reuniria para apresentar o Winter Carol

    (Cntico de Natal) de Dick Higgins (1959), escutando a neve cair porum perodo de tempo preestabelecido. O que poderia ser mais

    mgico?33.

    E mais adiante acrescenta:

    Fluxus no demonstrou que nenhuma definio de arte poderia serdada. Ele demonstrou que qualquer definio existente deveria lidarcom esses objetos e aes pouco atraentes. Maciunas cita comconsidervel satisfao uma apresentao Fluxus de George Brechtna qual ele ligava e desligava uma luz. Essa a pea. Ligar a luz e

    depois deslig-la. Voc faz isso todos os dias, no faz? 34.

    Identifico em muitas dessas criaes Fluxus a noo de autoapresentao, pois elas

    no visavam necessariamente a uma apresentao como exposio (observador

    externo), e, por outro lado, enfatizavam os processos propositivos, a realizao de

    aes, de relao e de envolvimento como criao e vivncia artstica, que

    encontramos, por exemplo, nos Events de George Brecht. Na autoapresentao,

    encontramos seguidamente um exerccio e uma nfase no olhar que transforma a

    percepo, o sentido e o pensamento sobre as coisas. Pareceria que vemos o

    surgimento e a abertura do sentido. Noutras vezes, encontramos uma inter-relaoentre olhar e fazer e a percepo disso como ato artstico. A possibilidade do olhar

    seria inseparvel do fazer o objeto desse olhar, ou do fazer a experincia do fazer

    para esse olhar. Nessas atividades e produes, se enfatiza tambm o uso de

    situaes ou materiais no-pertencentes em princpio ao campo da arte, s suas

    prticas ou s suas tradies, o que levanta questes sobre a natureza da arte e seus

    limites.

    33DANTO, Arthur. O Mundo como Armazm: Fluxus e Filosofia. In: HENDRICKS, Jon (Org.). Oque Fluxus? O que no ! O porqu. Braslia, Centro Cultural Banco do Brasil, 2002. p. 24.34Id. ibid. p. 26.

    85

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    19/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Em muitas das criaes e propostas de Fluxus, no h diferena aparente entre um

    objeto ou ao cotidiana e uma obra de arte. Retomemos o pensamento de Danto:

    O que o Fluxus nos ajudou a ver que [naquela poca] nenhuma

    teoria sobre a arte teria nos ajudado identificar quais eram obras dearte, j que a arte pode lembrar a realidade em qualquer graudesejado. O Fluxus estava certo com relao ao fato de que aquesto no quais so as obras de arte, mas qual a nossa

    percepo de algo se o vemos como arte35.

    Uma parte extremamente importante das atividades de Fluxus era constituda por

    diversos tipos de publicaes e mltiplos que permitiam a circulao e veiculao de

    seu pensamento e de suas propostas. Isto tambm ocorreu com as produes

    relacionadas arte conceitual, com os livros e publicaes de artistas, e, de uma

    maneira geral, cresceu substancialmente a partir dos anos sessenta. Nos dias de hoje,

    estas prticas j foram incorporadas pelo mercado e pelos eventos artsticos (bienais,

    feiras de arte, exposies em galerias e museus). Entretanto, isso no

    descontextualizaria a proposta de vrias dessas criaes? No haveria certo

    apagamento nas contribuies e no saber trazido por esses grupos e artistas? Seria

    possvel operar com formas de publicao ou veiculao e o espao cotidiano sem

    que isso seja hoje simplesmente uma extenso ou diversificao do mercado, do

    evento e do espao expositivo? Como criar, no atual contexto, formas de

    apresentao que permitam uma circulao e uma veiculao de proposies no-

    expositivas, constituindo com isso uma potica das apresentaes?

    Nos exemplos apresentados ao longo deste texto, pudemos distinguir diferentes

    posies dentro do campo artstico, que vo desde produes artsticas que

    problematizam o espao expositivo at outras em que a experincia com as

    proposies artsticas ocorre fora deste espao. Assim, quando observamos o campo

    artstico, bem como os estudos realizados a respeito da exposio, deparamo-nos

    com alguns problemas. Um deles o fato de que nas ltimas dcadas, e sobretudo ao

    ser praticada atravs dos grandes eventos, com uma nfase nos dispositivos

    mediadores, discursivos e publicitrios que os produzem, a exposio colocaria

    entraves s possibilidades crticas e s inquietaes da arte: convencionalismo,

    domesticao, informao e inteligibilidade a qualquer custo, insensibilidade...36. Alm

    disso, haveria tambm o problema: tornou-se mais difcil do que nunca aos artistas

    35

    Id. ibid. p. 31.36Ver, por exemplo:LArt de lexposition Une documentation sur trente expositionsexemplaires du XXe sicle. Paris, ditions du Regard, 1998. p. 29.

    86

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    20/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    contemporneos de encontrar as respostas artsticas adequadas suscetveis de gerar

    uma forma nova de exposio37.

    Entre os aspectos que produzem a apresentaode algo ou alguma coisa como arte

    est tambm uma concepo que indica que esse algo ou alguma coisa pode serarte

    ou de que a est ocorrendo arte. A acolhida de produes por parte do

    museu/galeria/evento (qualquer coisa a colocado arte, diz, por exemplo, Daniel

    Buren) resolveria definitivamente o foco do problema? Somente a moldura ou o

    quadro social dessas instncias asseguraria este aspecto? Mas o que pensar das

    produes que no se efetivam nesse quadro social ou cultural? O espao da arte

    estaria restrito s operaes paradigmticas do espao de exposio?

    Numa outra posio em relao ao campo artstico, temos a Autoapresentao,

    noo criada por mim com o objetivo de abordar certas atividades e produes

    artsticas nas quais foram detectadas caractersticas peculiares. Essas produes se

    diferenciam de outras no sentido de que elas no visam necessariamente a uma

    apresentao no sentido de exposio(observador externo); por outro lado, enfatizam

    os processos de relao, olhar, envolvimento, como criao e vivncia artstica, mais

    do que a produo de objetos para exposio (para o olhar do publico, do observador).

    Parece-nos importante considerar alguns aspectos surgidos com a

    autoapresentao. Um deles seria a oscilao j referida anteriormente, a flutuao no

    estatuto, no registro e no sentido diante de situao, ao ou objeto no-artstico que

    pode ser visto como arte. Afinal, o que isso que temos diante de ns? Do que se

    trata? Que sentidos esto sendo acessados? Outro aspecto seria a indagao sobre a

    autoapresentao como sendo, ao mesmo tempo, possibilidade criativa, talvez um

    ponto de partida comum em muitos processos de criao, mas tambm - tendo em

    vista ser uma experincia pessoal -, possibilidade de experincia singular e no

    partilhvel, de no-comunicao, de invisibilidade, possibilidade de impossibilidade.

    A exposioe a autoapresentaoseriam duas posies importantes no campo daarte contempornea e indicariam limites da atuao desse campo e concepes da

    arte. Elas talvez no constituam necessariamente posies antagnicas e

    incomunicveis entre si; poderiam at estar inter-relacionadas, mesmo que

    parcialmente.

    Haveria ainda outras formas de apresentao? Como elas ocorrem? Que relaes

    elas estabelecem e em que contexto? Como a exposio se relaciona com essas

    37KLSER, Bernd. Le march de lart et la culture dexposition durant les annes 1980. In:LArt de lexposition Une documentation sur trente expositions exemplaires du XXe sicle.Paris: ditions du Regard, 1998. p. 12.

    87

  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    21/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    outras formas? Como poderiam desenvolver-se proposies crticas no intervalo entre

    essas duas posies: exposioe autoapresentao?

    Conseqentemente, no atual perodo continuo desenvolvendo aspectos da relao

    entre o espao expositivo interno e o espao exterior a este (relao dentro-fora),

    numa indagao sobre essas instncias e repensando-as dentro do processo de

    criao, aprofundando, assim, a problemtica artstica e sua potica. Isto pode ser

    observado, por exemplo, num dos trabalhos que mostrei na exposio coletiva

    "Vehculos del Arte: Conexiones al Sur, que fez parte das atividades do grupo de

    pesquisa Veculos da Arte. Na ocasio, apresentei Travelling: (im)perfeitos veculos38,

    uma instalao que utilizava pontuaes recortadas em vinil adesivo, impressos,

    embalagens e papis autocolantes (post-it) carimbados. Embora essa instalao

    estivesse situada especificamente numa das salas do Centro Cultural, as pontuaes

    que a constituam disseminavam-se pelos outros espaos, dialogando com a

    arquitetura e com as obras dos outros artistas. Em conexo com essa instalao,

    foram tambm realizadas intervenes com papis autocolantes (post-it) carimbados,

    sobre o mobilirio urbano no centro da cidade (painis de publicidade, telefones

    pblicos, etc.). Quer dizer, o trabalho estendia-seem vrios sentidos, alcanando a

    rua, ou partindo dela, e conectando-se com outras criaes e espaos.

    Fig. 9 Hlio Fervenza, Traveling: (im)perfeitos veculos.Instalao utilizando pontuaes recortadas em vinil adesivo,impressos e papis autocolantes (post-it) carimbados. Apresentada na exposio coletiva Vehculos del Arte:Conexiones al Sur, de 09 de agosto a 28 de agosto de 2007, no Centro Cultural Victoria Ocampo, Mar del Plata,

    Argentina. Foto: Vista parcial da instalao. Arquivo do artista.

    38http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/traveling/

    88

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/traveling/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/traveling/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/traveling/
  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    22/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Outro exemplo a exposio-instalao Prosa de Jardim 239, realizada em co-

    autoria com a artista e pesquisadora Maria Ivone dos Santos, integrante tambm do

    grupo de pesquisa Veculos da Arte. Prosa de Jardim 2 foi mostrada no Museu de

    Arte de Joinville, o qual est situado em meio a um grande jardim. As criaes e

    intervenes ali apresentadas ou efetuadas interagiam de forma peculiar, tanto com o

    espao expositivo interno as paredes, as janelas e o cho , quanto com as

    ambincias externas, constituindo um espao permevel e poroso. Tornavam-se

    assim permeveis no somente os trabalhos dos dois artistas, produzindo um terceiro

    termo, outra situao, mas tambm o dentro e o fora, a casa que abriga o museu, o

    jardim e vice-versa. Essa permeabilidade se revelava tambm nas inquietaes sobre

    o que seja ou no considerado arte, sobre sua aparncia ou seus limites fsicos,

    quando, por exemplo, depositamos um simples vaso com jasmim na varanda do

    museu.

    Os trabalhos aprofundaram no s as relaes arquitetnicas ou fsicas, mas

    tambm aquelas simblicas ou autorais, numa abertura investigativa em relao

    dimenso coletiva e intersubjetiva inscrita no processo criativo. Poderamos aqui

    pensar num dentro-fora da autoria, por exemplo, no fato que os trabalhos em

    colaborao podem abrir outras perspectivas de anlise sobre a posio daquele que

    apresenta.

    Fig. 10 Hlio Fervenza,Prosa de Jardim 2. Instalao realizada em co-autoria com Maria Ivone dos Santos no Museude Arte de Joinville, Joinville SC, no perodo de 16 de setembro a 09 de novembro de 2008. Elementos utilizados:uma fotografia em montagem panormica, onze fotografias coladas sobre pvc, duas fotografias com dispositivo deapresentao em acrlico, uma fotografia em back-light, textos em vinil adesivo, trs textos impressos em papelfotogrfico com dispositivo de apresentao em acrlico, pontuaes em vinil adesivo, vdeo-carta Vendo a Vista emonitor de televiso, um vaso de jasmim, ps, desenhos com tmpera sobre papel sulfite fixados na parede comalfinetes de mapa. Foto: Vista parcial da instalao. Arquivo do artista.

    39http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/jardim/

    89

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/jardim/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/jardim/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/jardim/
  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    23/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    O desenvolvimento dessa abertura e das criaes artsticas deu-se igualmente por

    meio de outras formas de apresentao, como por exemplo, em Degelo40, ao

    artstica realizada em parceria com a artista e pesquisadora Didonet Thomaz, no Largo

    da Ordem, centro histrico de Curitiba. Em Degelo, foi utilizada uma faixa, do tipo

    usado para fazer anncios, propaganda (comercial, poltica, etc.) ou para diferentes

    tipos de manifestaes. Ela era confeccionada em polietileno vermelho, medindo 4,5 x

    0,7 m, com aplicao do texto ANTARTIDARTICO em vinil adesivo translcido, o que

    criava uma diferena sutil entre texto e fundo. Na realidade, o texto sobre a faixa ficava

    quase invisvel, o que correspondia s intenes do trabalho, que era a de utilizar um

    meio destinado a se fazer imediatamente presente e visvel, a enfatizar uma

    "mensagem", mas que neste caso era quase imperceptvel.

    Fig. 11 Hlio Fervenza, Degelo.Ao artstica de interveno urbana realizada em parceria com Didonet Thomaz noLargo da Ordem, Curitiba, no dia 17 de novembro de 2008. Atividades desenvolvidas no mbito do Projeto O Artista naUniversidade, coordenado por Tnia Bloomfield e Lus Carlos dos Santos, Departamento de Artes da UFPR, Curitiba.Elementos utilizados: faixa em polietileno medindo aproximadamente 4,5 x 0,7 m, com aplicao do texto

    ANTARTIDARTICOem vinil adesivo translcido. Crdito da imagem: Tnia Bloomfield. Arquivo do artista.

    Muito prxima das problematizaes levantadas pelo trabalho acima, encontra-se

    Pas do futuro41, proposta na qual tambm foi utilizada uma faixa, desta vez em

    polietileno branco, medindo aproximadamente as mesmas dimenses, com aplicao

    de texto em vinil adesivo translcido. Pas do futuro foi apresentada durante

    interveno e caminhada na rea central de Porto Alegre por ocasio do Laboratrio

    de deambulao urbana em Porto Alegre, ministrado por Daniele Marx, no mbito do

    Projeto FPES - Perdidos no Espao.

    40Atividade esta desenvolvida no mbito do Projeto O Artista na Universidade, coordenado por

    Tnia Bloomfield e Lus Carlos dos Santos, do Departamento de Artes da UFPR, Curitiba.http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/degelo/41http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/pais_futuro/

    90

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/degelo/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/pais_futuro/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/pais_futuro/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/pais_futuro/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/degelo/
  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    24/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    Fig. 12 Hlio Fervenza, Pas do futuro.Apresentao, interveno e caminhada realizada na rea central de PortoAlegre no dia 14 de dezembro de 2007. Elementos utilizados: faixa em polietileno branco medindo aproximadamente 4x 0,7 m, com aplicao do texto Brasil: pas do futuroem vinil adesivo translcido. Arquivo do artista.

    Ao observarmos os diferentes tipos de faixas utilizadas cotidianamente na cidade,

    pode-se facilmente constatar que so muitas e, em geral, muito simples as suas

    possibilidades de apresentao. Elas so colocadas preferencialmente em reas

    externas, mas podem ser desenroladas a diferentes intervalos e em diferentes lugares

    durante uma caminhada. Essa mobilidade tem-me interessado bastante, assim como o

    fato de que, em princpio, elas so mostradas em espaos no-expositivos e utilizadas

    com finalidades no-artsticas. As faixas constituem um meio para a apresentao,

    divulgao e manifestao de certo tipo de informaes, gerando expectativas

    intrnsecas. Elas propiciam conotaes e associaes advindas de seu uso (comercial,

    poltico, esportivo, etc.).

    Em Degelo ou Pas do futuro,ocorre uma situao que dificulta o esclarecimento

    quanto a um uso especfico das faixas, na qual no se identifica necessariamente ou

    imediatamente uma finalidade artstica, o que possibilita transitar na indeterminao de

    seu estatuto. Abre-se ento um espao de fuso com outras formas e usos dessas

    formas, mas tambm de alterao na forma desses usos. Abre-se um espao de

    possibilidade de abertura dos sentidos, de outros olhares com outros sentidos.

    Posteriormente, em Porto Alegre Pontal:42, experincia realizada a partir do envio de

    um e-mail para diferentes destinatrios em Porto Alegre em novembro de 2008, o

    trabalho se constitua precisamente numa inter-relao, num intervalo, nesses outros

    olhares e possibilidades que poderiam surgir num pequeno dilogo, no espao de um

    perguntar e responder, e responder e perguntar. Como apresentamos para ns

    mesmos essas situaes por vezes indeterminadas quanto a seu sentido? O

    42http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/pontal/

    91

    http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/pontal/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/pontal/http://www.heliofervenza.net/arquivo/proposicoes/pontal/
  • 8/10/2019 Revista palindromo_fervenza (1)

    25/25

    Revista PALNDROMO2FERVENZA, Hlio.

    aparecimento e a experincia dessa oscilao de sentidos, de outras possibilidades de

    sentido, seria a dimenso artstica?

    Referncias Bibliogrficas:

    CABANNE. Pierre. Marcel Duchamp: engenheiro do tempo perdido.So Paulo, Ed.Perspectiva, 1997.

    CAUQUELIN, Anne. Arte Contempornea: uma introduo. So Paulo: MartinsFontes, 2005.

    CERTEAU, Michel de. A inveno do cotidiano: artes de fazer.2.ed. Petrpolis, RJ:Ed. Vozes, 1996.

    DANTO, Arthur. O Mundo como Armazm: Fluxus e Filosofia. In: HENDRICKS, Jon(Org.). O que Fluxus? O que no ! O porqu. Braslia, Centro Cultural Banco do

    Brasil, 2002.

    DUCHAMP, Marcel. Duchamp du signe.Paris : Flammarion, 1991.

    HEGEWISCH, Katharina. Un mdium la recherche de sa forme: Les expositions etleurs dterminations. In: LArt de lexposition Une documentation sur trenteexpositions exemplaires du XXe sicle. Paris: ditions du Regard, 1998.

    KAPROW, Allan. La vritable exprimentation. In: Lart et la vie confondus. Paris:Centre Georges Pompidou, Coleo Supplmentaires.

    KLSER, Bernd. Le march de lart et la culture dexposition durant les annes 1980.In: LArt de lexposition Une documentation sur trente expositions exemplaires duXXe sicle. Paris: ditions du Regard, 1998.

    LYOTARD, Jean-Franois. Que Peindre? - Adami, Arakawa, Buren. Paris: Editions dela Diffrence, Coll. La Vue, Le Texte, V. I, 1987.

    MEIRELES, Cildo. Coleo Arte Brasileira Contempornea. Rio de Janeiro:FUNARTE, 1981.

    PASSERON, Ren. Cration, Prsentation, Prsence. In : La Prsentation. Paris,Editions du CNRS, 1985.

    POINSOT, Jean-Marc, In Situ, lieux et espaces de la sculpture contemporaine, In:Qu'est-ce que la sculpture moderne?, Paris, M.N.A.M.-Centre Georges Pompidou,1986.

    VINON, Ren.Artifices dexposition. Paris: ditions LHarmattan, 1999.