Revista Mensal • 2 Euros - Dependencias · mente ao fenómeno do jogo, ... Respostas Integradas...

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Abril2017 Revista Mensal • 2 Euros Parceiro do Plano Nacional de Saúde 2014 Ciclos Temáticos de Formação em Alcoologia, Prof. Doutora Manuela Grazina: "Dependências e Independências: O Cérebro, a Decisão e a Motivação" Isabel Pedroto, Presidente da APEF: "Temos um serviço nacional de saúde fora de série" 24-26 Outubro 2017 Centro e Congressos de Lisboa | Portugal

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Parceiro do Plano Nacional de Saúde 2014

Ciclos Temáticos de Formação em Alcoologia, Prof. Doutora Manuela Grazina:

"Dependências e Independências: O Cérebro, a Decisão e a Motivação"

Isabel Pedroto, Presidente da APEF:

"Temos um serviço nacional de saúde fora de série"

24-26 Outubro 2017Centro e Congressos de Lisboa | Portugal

Isabel Pedroto

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O tratamento com Buprenorfina/Naloxona melhora a perceção do doente

relativamente à sua situação emocional e social, bem como a capacidade

de reintegração numa vida social ativa1

Doentes tratados com Buprenorfina/Naloxona

demonstraram melhorias significativas a nível social,

educacional e relativamente à utilização de drogas

concomitantes1

Bibliografia:

1.- Apelt SM, Scherbaum N, Gölz J, Backmund M, Soyka M. Safety, Effectiveness and Tolerance of Buprenorphine-Naloxone in the Treatment of Opioid Dependence: Results from a Nationwide Non-Interventional Study in Routine Care. Pharmacopsychiatry. 2013 May;46(3):94-107

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3“Não existem amigos virtuais”

FICHA TÉCNICA Propriedade, Redacção,Direcção e morada do Editor: News-Coop - Informação e Comunicação, CRL; Rua António Ramalho, 600E; 4460-240 Senhora da Hora Matosinhos; Publicação periódica mensal registada no ICS

com o nº 124 854. Tiragem: 12000 exemplares. Contactos: 220 966 727 / 916 899 539; [email protected];www.dependencias.pt Director: Sérgio Oliveira Editor: António Sérgio Administrativo: António Alexandre

Colaboração: Mireia Pascual Produção Gráfica: Ana Oliveira Impressão: Multitema, Rua Cerco do Porto, 4300-119, tel. 225192600 Estatuto Editorial pode ser consultado na página www.dependencias.pt

O mar tem sido uma fonte ins-piradora de grandes poetas, umas vezes agitado, outras mais calmo, com uma ondulação apaixonante pela bruma branca da paz, onde reina o mistério do desconhecido-…o mar tem esse lado, mas tam-bém serve para nos apresentar al-gumas comparações de peixes com os “tubarões da droga” a dro-ga krocodil ou a famosa “baleia azul” que aparece a fazer as pri-meiras páginas dos jornais como se de um tsunami se tratasse…O alarmismo com o “jogo da baleia azul” parece-me exagerado e não sei se não estaremos mesmo exa-gerar na dimensão e importância que estamos a dar face à dimen-são que o fenómeno aparentemen-te não tem.

Isto não significa que não esteja preocupado e atento ao comporta-mento de alguns jovens e adoles-centes; não sou daqueles a quem os acontecimentos passam ao lado e, também por isso, confesso que me preocupo com o progresso e com o futuro das novas tecnologias, que quase a um ritmo diário se vai recontando… O perigoso “jogo” onli-ne conhecido como “Baleia Azul”, que já terá feito vítimas, é segura-mente preocupante e deveria ser um caso de maior atenção por parte de todos nós. Não sou técnico mas nem por isso deixo de ter opinião sobre os efeitos predadores desta “dependência comportamental” de jovens e adolescentes que se vêem envolvidos numa rede de criminosos que os levam à mutilação e ao suicí-dio.

Todos sabemos que existem comportamentos de risco, que exis-tem dependências depressoras, es-timulantes e perturbadoras, e esta nem sei se é ou não uma dependên-cia… mas julgo ser pelo menos po-tenciadora de manifestações de per-turbação mental, que deve ser con-

venientemente prevenida; e, a ju-sante, tratada por especialistas e numa rede de respostas integradas, porque se trata de um problema que, convenhamos, inclui diversos saberes nas diferentes componen-tes, nos diversos sectores, envol-vendo a família, a escola, os ami-gos, o grupo, as autoridades…

Estamos a falar de um problema que começa a estar disseminado por vários países, montado por uma rede de perigosos assassinos, que levam os jovens a auto mutilar-se, que são obrigados a assistir a filmes psicadélicos e de terror pelas 4h20 da manhã, até cometerem o suicí-dio.

Sejamos claros: o alarmismo so-cial com que hoje assistimos ao “vo-mitar” destas notícias não nos deve fazer esquecer o cerne do fenóme-no… devemos saber ler, interpretar e preparar os nossos jovens para os riscos da utilização indevida ou abu-siva do telemóvel ou da internet, do desconhecido e do jogo online. Não se fazem amigos sem os conhe-cer… não existem amigos virtuais.

A violência e os comportamentos autodestrutivos deste ou de outros jogos, mais do que condenar, de-vem desencadear uma reflexão co-lectiva sobre os riscos associados à utilização da internet e sobre se em alguns casos elas acarretam riscos de dependência. Vivemos hoje um mundo virtual perigoso e, por isso,

existe uma crescente atenção por parte dos serviços de comportamen-tos aditivos e dependências relativa-mente ao fenómeno do jogo, área para a qual importa aprofundar mais conhecimento e delinear uma estra-tégia de intervenção, capacitando os profissionais para uma aborda-gem mais eficaz e que se afigura cada vez mais exigente.

Aliás, esta é uma das grandes preocupações que resulta do “Ma-nifesto de Aveiro”, quando dirigiu a sua carta ao Ministro da Saúde e da qual resultou a criação de um grupo de trabalho para proceder à avaliação das consequências da extinção do antigo IDT, realçando que o processo de integração nas ARS estava a desestruturar os cui-dados prestados às pessoas com comportamentos aditivos e depen-dências.

É preciso repor urgentemente as respostas integradas, criando uma estrutura vertical, assente numa es-tratégia pensada e desenvolvida por técnicos especializados que articu-lem com as diversas estruturas, es-colas, famílias autoridades locais e policiais, porque ontem assistimos ao fenómeno das drogas Krokodile, hoje trata-se da baleia azul e… amanhã… não saberemos o que este mar de incertezas nos trará… A única certeza que temos é que só com pessoas devidamente treina-das, especializadas e organizadas poderemos antecipar-nos a outros males que por aí virão. Entretanto, os dias vão passando, os problemas vão-se acumulando, a paciência vai--se esgotando e, um dia, quando constatarmos que afinal estávamos errados e que perdemos anos a ten-tar reinventar uma roda que já circu-lava sem engrenagens, poderá já ser tarde demais…

Sérgio Oliveira, director

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4Investigação em português:

Afinal, devem ou não continuar a existir serviços especializados na área dos comportamentos

aditivos e das dependências?

ROCHA ALMEIDA

“Este saber fazer, constitui um património que não se pode destruir”

A rede pública de serviços com intervenção nos comporta-mentos aditivos e nas dependências contempla: 22 Centros de Respostas Integradas com 45 Equipas de Tratamento e exten-sões, 4 Unidades de Desabituação, 3 Unidades de Alcoologia, 3 Comunidades Terapêuticas e 21 Comissões para a Dissua-são da Toxicodependência.

Existe ainda uma rede de comunidade terapêuticas priva-das com quem estão contratualizadas mais de 1 500 camas para internamentos prolongados.

Apesar de estarem integrados no Ministério da Saúde há grandes dificuldades em dar a estes serviços uma identidade que os referencie dentro dos serviços de saúde, por exemplo estes serviços não constam no Portal do SNS onde se faz questão de dizer que se encontram todas as estruturas de saú-de do país.

No entanto, é bom lembrar que no nosso país existem ser-viços públicos com uma experiência acumulada de mais de três décadas de intervenção na área dos comportamentos aditivos e das dependências, com profissionais qualificados e com ex-periência demonstrada através de resultados reconhecidos como positivos tanto a nível nacional como internacional.

Alguns pontos que gostaria de salientar relacionado com a ati-vidade desenvolvida.

1 – Esta rede permite que sejam estabelecidos procedi-mentos comuns para os serviços em todo o país com interven-ções na área do tratamento, da reinserção e da dissuasão, mas também na intervenção junto da comunidade através de ações de prevenção e de redução de riscos e minimização de danos. Serviços com equipas multidisciplinares com formação perma-nente nesta área e que reconhecem a importância de intervir em todas as vertentes ligadas às adições. Intervenções que são aceites e reconhecidas como positivas pela população em geral e pelas estruturas públicas e privadas com quem articu-lam.

O que sabemos• O número de consumidores de substâncias psicoativas em tra-

tamento aumentou 60% entre 1998 e 2011 (23 600 para 38 000)• Em 2015 registaram-se 744 internamentos nas Unidades de

Desabituação e 2 184 nas Comunidades Terapêuticas públi-cas e privadas com camas convencionadas

• No ano 2015 registaram-se nesta rede pública 1 585 interna-mentos por problemas relacionados com o álcool e 1 208 nas Comunidades Terapêuticas públicas e privadas

• A proximidade destes serviços a uma área geográfica bem definida confere-lhe um papel central junto da comunidade lo-cal na intervenção a nível da prevenção e da redução de ris-cos e minimização de danos

2 - Temos uma população dependente de heroína bastante bem enquadrada nas estruturas do tratamento e da redução de danos, com possibilidade de recurso a vários tipos de tratamento de forma a responder às necessidades de cada utente.

O que sabemosOs doentes em tratamento têm direito a continuar a ter

acesso a cuidados integrados, eficazes, adaptados às suas necessidades, diversificados e de qualidade

Esta população está mais envelhecida, alguns com comor-bilidades físicas e mentais e por isso a necessitar de mais cui-dados de saúde. Ao falarmos de tratamentos são múltiplas as intervenções a realizar e daí a necessidade de uma equipa es-pecializada e multidisciplinar

Mas também sabemos que nos dependentes de heroína que abandonam o tratamento, a taxa de recaídas e de mortali-dade é maior do que naqueles que se mantêm em tratamento. Por isso, e tendo em consideração que estamos perante uma doença crónica acompanhada de frequentes recaídas, os tra-tamentos a realizar são de longa duração

3 – Em Portugal o número de casos positivos para o VIH na população com o consumo de drogas por via endovenosa (UDI) diminuíram mais de 90% desde 2001.

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5O número de mortes por overdose é de 3 por um milhão de

pessoas, mais baixo que a média na Europa, mais de 17 por um milhão de pessoas. Na Suécia são mais de sessenta overdoses por um milhão de pessoas.

Também a percentagem de condenados por crimes ligados à droga baixou em Portugal de 44% em 1999 para 21% em 2012.

O que sabemosTemos consciência do impacto que terá na sociedade por-

tuguesa o recrudescimento dos problemas com o consumo de heroína e de outras substâncias psicoativas, já sentidos num passado não muito longínquo, nomeadamente a nível:

Da saúde dos cidadãos consumidoresDa saúde pública em geral Do aumento de pedidos de apoio social Do desenvolvimento económico e social do país No sentimento de segurança da população portuguesa

4 - Existem novos padrões de consumo, muito virados para o policonsumo de substâncias nomeadamente a combinação de drogas ilícitas com o álcool, e com um novo perfil de consumido-res, mais jovens, perfeitamente integrados na sociedade, que con-somem com fins recreativos e socializantes e de forma descontí-nua. Embora se encontrem muitas pessoas sem apresentarem consequências desses consumos, há um pequeno grupo desta população para quem o abuso destas substâncias cria uma varie-dade de graves consequências sociais, legais e de saúde, com custos elevados para o indivíduo e para a sociedade

O que sabemosForam criadas nos serviços consultas e programas tera-

pêuticos específicos para dar resposta a estes novos consumi-dores e aos problemas que apresentam

Consultas e consumidores que têm aumentado de ano para ano na ordem dos 20% a 25%

Consultas que já trabalham com os problemas das adições sem substâncias, nomeadamente o jogo

5 – O álcool continua a ser a substância de abuso mais consu-mida no nosso país. Em 2010, os indivíduos com 15 ou mais anos bebiam em média 12,9 litros de álcool puro por ano, correspon-dendo a um consumo diário de 28 gramas de álcool puro por pes-soa. Consumo de álcool que é superior ao da média europeia.

Na grande maioria da população portuguesa os problemas li-gados ao álcool não estão devidamente diagnosticados

O que sabemosO número de utentes com problema ligados ao álcool em

consulta nas nossas unidades tem vindo a aumentar Em mais de 50% dos utentes que recorrem pela primeira

vez aos nossos serviços a substância principal referida é o ál-cool e/ou a cannabis

Esta rede de serviços, pela proximidade, fácil acesso e pela composição e experiência da equipa técnica multidiscipli-nar, pode integrar uma rede mais vasta para dar resposta a este problema

6 - A rede de referenciação/articulação no âmbito dos compor-tamentos aditivos e dependências aprovada no Ministério da Saú-de em 2013 garante a interação/articulação entre os serviços que atendem cidadãos que solicitam ajuda, desde a deteção precoce até à abordagem mais diferenciada, sustentada por um sistema integrado de informação interinstitucional.

Integra todos os serviços de saúde, estruturando esta articula-ção por níveis diferenciados de intervenção de acordo com as competências de cada serviço. Nível 1 Cuidados Primários, Nível 2 Serviços Especializados, Nível 3 Serviços de Internamento e Hospitais.

O que sabemosEste modelo já contempla as redes existentes no SNS e,

como serviços especializados, os serviços que intervêm nos comportamentos aditivos e nas dependências.

Ao reconhecer-se a especificidade das intervenções nos comportamentos aditivos e nas dependências, a articulação com os outros serviços permitiria um alargamento na presta-ção de cuidados a estes utentes

O problema das substâncias psicoativas, legais e ilegais, re-presenta não só um risco para a saúde e segurança das pessoas, mas também uma ameaça à coexistência social, à estabilidade e segurança da sociedade como um todo. As instituições de saúde têm-se confrontado com uma contínua evolução dos fenómenos aditivos e questionam-se sobre a melhor estratégia de facilitar o acesso a todos aqueles que solicitam ajuda, jovens na sua grande maioria, como referenciar para os diferentes níveis de intervenção e como melhorar as condições para aqueles que necessitam de tratamento.

Os resultados obtidos em Portugal nestes mais de trinta anos de intervenção bem como as frequentes mudanças que ocorrem nesta área, justificam que não se perca a especificida-de das intervenções nos comportamentos aditivos e nas depen-dências já que elas têm sido o garante, com base em conheci-mentos e métodos com evidência científica, de uma interven-ção integrada e multidisciplinar nas áreas da prevenção, redu-ção de riscos e minimização de danos, do tratamento, da reinserção e da dissuasão.

Termino citando a Associação Portuguesa de Adictologia “ Este saber fazer de muitos anos, que constitui um património técnico/profissional e científico desde sempre colocado ao ser-viço da comunidade, a par da criação de uma rede articulada através de valências e serviços com organização nacional, são os elementos indispensáveis de uma resposta aos comporta-mentos aditivos e dependências, por isso parte integrante de uma política que entendemos dever ter continuidade”

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6Unidade de Alcoologia de Coimbra prossegue Ciclos Temáticos de Formação em Alcoologia:

Dependências e Independências: O Cérebro, a Decisão e a MotivaçãoNo dia 18 de Abril, Manuela Grazina foi a prelectora da

sessão subordinada ao tema “Dependências e Independências: O Cérebro, a Decisão e a Motivação”. Especialista em Genética Humana, Genética Bioquímica e Farmacogenética e Directora do Laboratório de Genética Bioquímica do Centro de Neuro-ciências e Biologia Molecular da FMUC, Professora da FMUC e Docente da disciplina de Genética Humana nas Universidades de Évora e Algarve, desenvolveu uma comunicação sobre a neurobiologia e as interacções das substâncias psicoactivas, nomeadamente o álcool, a nível cerebral e de quanto a neuro-biologia determina ou afecta a capacidade de escolha dos indi-víduos.

A UAC mantém assim o nosso propósito de propor para cada acção um tema de reconhecido interesse, um palestrante de sólida qualidade científica, seguindo-se uma hora de debate com esse mesmo palestrante, que permite colocar dúvidas, es-clarecer conceitos e discutir aspectos práticos, rentabilizando a presença de especialistas nas várias matérias. Os vários profis-sionais, médicos, enfermeiros, assistentes sociais, psicólogos e outros, podem também colocar à discussão com a equipa da UAC casos clínicos, aspectos práticos relativos à orientação de utentes dos seus ficheiros, formas de fazer em que podemos trocar experiência e conhecimento e efectivamente praticar, no sentido real, uma verdadeira e eficaz articulação.

“As redes de articulação desenham-se no papel mas imple-mentam-se no terreno, no dia-a-dia, no conhecimento próximo dos profissionais sobre o funcionamento dos outros serviços, na comunicação eficaz, e isso só se obtém se nos conhecer-mos melhor, comunicarmos melhor, partilharmos “know-how”e tivermos mecanismos eficientes de complementaridade de in-tervenções”, referem os responsáveis da UAC.

Dependências marcou, uma vez mais, presença neste pro-jecto desenvolvido pela UAC e entrevistou Manuela Grazina.

MANUELA GRAZINA

“O conhecimento pode ajudar as pessoas na prevenção para uma escolha livre””

O que nos traz hoje a Dra. Manuela Grazina a esta preen-chida plateia?Manuela Grazina (MA) – Hoje, vamos falar um pouco so-

bre os mecanismos do cérebro para a recompensa e para o bem-estar, importantíssimos na motivação e na tomada de de-cisões… E perceber como esse equilíbrio fica perturbado com a acção de substâncias de abuso, principalmente do álcool. No-meadamente os desarranjos que traz ao cérebro, as conse-quências em termos da morte de neurónios, as nossas célu-las cerebrais, que impedem o cérebro de funcionar adequa-damente no que respeita à tomada de decisões, à vontade e à motivação. O cérebro fica parcialmente destruído e despro-vido de uma série de funções que impedem o indivíduo de ter um equilíbrio emocional, cognitivo e até de memória adequa-do. É isso que pretendo mostrar, a par dos resultados que obtivemos a partir de um projecto que desenvolvemos com dependentes em desintoxicação. A esse nível, já temos al-guns resultados muito interessantes, tanto em termos meta-bólicos como genéticos e, com tudo isto, pretendo ainda pas-sar a mensagem de que o conhecimento pode ajudar as pes-soas na prevenção para uma escolha livre de não experimenta-rem.

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7Em termos terapêuticos, este tipo de conhecimento também poderá servir para a escolha de melhores tratamentos?MG – Sem dúvida. E é importante não só naquilo que é o

tratamento farmacológico porque, percebendo estes mecanis-mos é possível perceber também onde actuam as substâncias terapêuticas, o que está a acontecer no cérebro nessa terapêu-tica e até alguns efeitos secundários relacionados. Por outro lado, permite-nos perceber com os estudos genéticos podem contribuir para uma personalização da terapêutica. E vou apre-sentar alguns slides em que demonstro que existem variantes genéticas que fazem com que o indivíduo responda melhor à terapêutica e, portanto, esse conhecimento é essencial para percebermos a própria eficácia terapêutica. Sabemos que exis-tem indivíduos de determinados grupos genéticos que vão res-ponder melhor e outros que não responderão tão bem à tera-pêutica, o que se reveste de grande importância. Por outro lado, também percebemos o efeito que algumas terapias, mais ao nível do comportamento, têm através da modelação neuro-química, dos neurotransmissores e de toda a via de recompen-sa. Em suma, é multifactorial e multidisciplinar.

Essa componente genética poderá também explicar algu-ma predisposição especial de alguns indivíduos para se tornarem abusadores ou dependentes do álcool?MG – Sem dúvida que sim! Outra das coisas que mostrarei é

precisamente as duas grandes componentes para a dependência. Há uma parte genética que dá susceptibilidade mas, depois, a mo-delação para o desenvolvimento vem da exposição ambiental, tanto da exposição social como da experiência e interacção bioló-gica com as substâncias. Agora, tendo uma susceptibilidade ge-nética, se for evitada uma interacção com a substância, certamen-te o indivíduo não correrá o risco de ficar dependente… Mais uma vez, realça-se a importância da prevenção…

Em que medida serão reversíveis algumas dessas lesões do cérebro de que fala devido ao consumo excessivo de álcool e de outras substâncias?MG – Algumas lesões são irreversíveis, nomeadamente se

a exposição for muito prolongada. Mas há outras que podem ser reversíveis pelo facto de termos células neuronais que per-mitem a regeneração. Também algum tipo específico de ali-mentação e até alguns suplementos podem ajudar à regenera-ção. Sabemos que o álcool induz neuro-inflamação e existem alguns suplementos, como os ómega-3, que ajudam esse pro-cesso de recuperação e regeneração. Por outro lado, depende

muito do tempo de exposição, da idade do indivíduo, da quanti-dade que ingeria… Há sempre esperança, embora saibamos que, quanto maior for o tempo de consumo e a quantidade con-sumida, o risco de se desenvolverem lesões irreversíveis é maior.

Relativamente ao estudo sobre dependentes em desinto-xicação, que conclusões poderá avançar?MG – O estudo tem a ver com o sistema energético, que

está altamente deficitário e comprometido. Na vertente mais metabólica, um dos resultados diz-nos que a capacidade de produzir energia nesses doentes está altamente deficitária. Na parte genética, observámos que as variantes que determinam a metabolização de algumas substâncias está alterada, principal-mente nas mulheres. Em suma, temos padrões genéticos de metabolização diferentes, isto mais relacionado com as enzi-mas hepáticas mas que existem também no cérebro. Por outro lado, há um resultado que considero muito interessante, que tem a ver com ideação paranóide e uma variante genética nos doentes relacionada com a actividade de uma enzima que me-taboliza dopamina, a principal molécula libertada nesses estí-mulos de prazer. O problema é precisamente o excesso de li-bertação de dopamina, que leva à psicose… Os doentes que têm a variante genética da enzima mais lenta, ou seja, que de-grada menos dopamina, têm mais ideação paranóide, o que tem toda a lógica relacionada com a actividade no cérebro. Isso pode ajudar-nos, por um lado, a percebermos a doença e, por outro, no final do estudo (estes são apenas dados prelimina-res), pode ajudar-nos a seleccionar alguns biomarcadores para percebermos melhor a doença mas também a intervir de forma mais eficaz na terapêutica.

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8Isabel Pedroto, Presidente da APEF, à margem do Congresso Português de Hepatologia 2017:

“Temos um serviço nacional de saúde fora de série”

A cidade do Porto foi a escolhida pela Associação Portuguesa para o Estudo do Fígado, entre o dia 30 de Março e 1 de Abril, para a realização do Congresso Português de Hepatologia 2017, um amplo fórum de debate clínico que reuniu centenas de espe-cialistas e que serviu ainda para a realização da 20ª Reunião Anual da APEF. Entre os principais temas abordados estiveram os factores de risco de doença hepática em Portugal, a hepatite B, a hepatite auto-imune, a encefalopatia hepática, a colangite biliar primária e os diálogos multidisciplinares na abordagem da doença hepática.

Dependências marcou presença no evento e entrevistou Isa-bel Pedroto, Presidente da APEF, Jorge Tavares, enfermeiro do Estabelecimento Prisional do Porto e o cirurgião Eduardo Barroso.

ISABEL PEDROTO, PRESIDENTE DA APEF

“Temos também que fazer prevenção destinadaaos jovens que consomem álcool”

Que objectivos mediaram a realização deste congresso?Isabel Pedroto (IP) – Este Congresso Português de Hepato-

logia, à semelhança dos anteriores, elege como objectivos a for-mação, a partilha do conhecimento, trazer os jovens para a Hepa-tologia – de facto, temos este ano uma assistência muito jovem, o que é extremamente positivo face ao hiato de geração que consta-távamos ao longo dos anos e que nos preocupava, sendo de real-çar esta apetência cada vez maior pela Hepatologia – e discutir-mos estes problemas do dia-a-dia, a gestão dos nossos doentes, os factores de risco para a doença hepática… Tem-se falado mui-to dos vírus da Hepatite C e B mas as pessoas esquecem-se que, em Portugal, há muito álcool, a obesidade é um problema em crescendo em toda a parte do mundo e, por isso, pretendemos fa-zer um alerta para todos os agressores do fígado, de uma forma didáctica, com esta partilha informal que se vê, de diálogo e de ex-periências.

Que temas destacaria no âmbito do programa científico?IP – Tivemos temas importantes, como o carcinoma hepatocelu-

lar, o cancro do fígado, que sabemos que será um problema em cres-cendo até pelo menos 2030, em Portugal, uma vez que temos facto-

res que conduzem, nomeadamente o vírus da Hepatite C. É verdade que já estamos a tratar os doentes mas em relação a alguns deles já o estamos a fazer tardiamente, o que significa que curaremos o vírus mas o fígado manter-se-á doente. Significa que são doentes que ain-da poderão vir a desenvolver carcinoma hepatocelular. Voltando aos temas, falámos igualmente em estratégias preventivas para a doença do fígado, nomeadamente a cirrose, principal percursora do cancro do fígado, os agressores hepáticos, como o álcool, os vírus, a obesi-dade, a diabetes, o fígado gordo, a Hepatite B e uma mesa que creio que será muito interessante sobre o diálogo multidisciplinar, ou seja, o fígado a falar com os outros órgãos, como o coração, o rim, o neu-rologista… Isto também para mostrar que a Hepatologia não é exclu-siva dos hepatologistas nem dos gastrenterologistas. A nossa prática é clínica e, como tal, falamos com todos os colegas, com todas as es-pecialidades e essa multidisciplinaridade tem que ser também trazida para os eventos científicos, não se resumindo aos corredores do hos-pital.

Apesar de uma nova aura ter surgido recentemente no tra-tamento da Hepatite C, os especialistas portugueses con-tinuam a defender e a reclamar a concepção de um plano nacional para as hepatites… Em que medida seria mais pertinente a criação de um plano nacional para a saúde do fígado?IP – Se consultar o site da APEF constata que, quando assumi

a direcção um dos objectivos que elegi foi a consagração do Dia Nacional do Fígado… Houve alguns contactos políticos nesse sentido mas, entretanto, as alterações políticas não nos permiti-ram levar avante esse projecto, que penso que virá ainda a ser concretizado. Não considerando o fígado mais importante do que os outros órgãos, relembro que existe o Dia Nacional da Diabetes, o Dia do Coração, o Dia do AVC… No caso do Dia do Fígado, creio que serviria para alertar e sensibilizar as pessoas para esses agressores. Obviamente, por aí passaríamos medidas de preven-ção das hepatites, do consumo de álcool, da diabetes, da obesida-de e de outros problemas. Sendo óbvio que temos que tratar quem está doente, temos também que fazer prevenção destinada aos jovens que consomem álcool… Temos que fazer basicamente tudo ao mesmo tempo, em diferentes patamares… Creio que será uma missão da próxima direcção da APEF.

Como avalia o estado da arte da Hepatologia em Portugal?IP – Excelente! Portugal tem um SNS excelente, fora de série!

Mesmo relativamente à Hepatite C, somos exemplares em todos os aspectos. Poderá falhar alguma organização aqui ou ali mas não é claramente ao nível da assistência médica. Portanto, a He-patologia está à semelhança do que se passa no resto… Falta--nos tempo para escrevermos mais, para publicar mais, para mos-trarmos lá fora o que fazemos cá dentro.

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9JORGE TAVARES, ENFERMEIRO DO ESTABELECIMENTO PRISIONAL DO PORTO

“Os doentes têm sido todos rastreados e serão todos tratados”

Recordo um slide por si apresentado que demonstra que a esmagadora maioria dos doentes diagnosticados com VHC não era tratada… Porquê?Jorge Tavares (JT) – Efectivamente, antigamente não eram

tratados, até porque os tratamentos eram longos, difíceis e tinham muitos efeitos secundários, pelo que os doentes também não ade-riam. Neste momento, com a nova gama de tratamentos, os doen-tes têm sido todos rastreados e serão todos tratados. Neste mo-mento, temos um programa piloto na cadeia de Custóias, no EP do Porto, que está a ser alargado para o EP feminino e que será provavelmente alargado a todas as outras cadeias.

Os reclusos são todos rastreados à entrada do sistema prisional português?JT – Sim, são todos rastreados à entrada, tanto na parte clíni-

ca, com análises, como em infecciologia ou no estado mental.

Como classifica percentualmente aqueles que já entram com doenças infecciosas e os que as adquirem no interior do estabelecimento prisional?JT – Penso que 99,9 por cento contraem fora do estabeleci-

mento, até porque houve uma grande mudança nos perfis de con-sumo de drogas, passando a ser muito mais fumada do que injec-tada. Por outro lado, deixou de ser predominantemente a heroína que, como eles dizem na brincadeira, é para os velhos, tendo sido substituída pela cocaína e por novas drogas, algumas das quais ainda nem conhecemos bem…

Em que medida se poderá afirmar que os doentes que es-tão actualmente num estabelecimento prisional são “pri-

vilegiados”, uma vez que não existem praticamente carên-cias ao nível das respostas?JT – Se tomar como exemplo o EP do Porto, respondo-lhe cla-

ramente que sim… Contudo, penso que a maioria das cadeias grandes já têm equipas formadas, embora reduzidas, uma vez que a contenção financeira também chegou às cadeias. Quanto às pequenas cadeias, nomeadamente algumas regionais, não es-tão tão bem situadas como nós. Agora, é verdade que o recluso que entra em Custóias e se quer tratar tem um grande acompa-nhamento. Se considerarmos o estabelecimento prisional a casa dos reclusos, podemos afirmar que o médico vai às suas casas… Ora, eu pergunto quantos portugueses têm um médico que vai às suas casas…

No caso dos toxicodependentes, são assegurados a to-dos os tratamentos de substituição e os programas de re-dução de riscos?JT – Sim, todos os que querem têm. Não existe qualquer limi-

tação, nem do tratamento VHC, nem da Sida nem da toxicodepen-dência. Temos uma unidade livre de drogas, com capacidade para 16 utentes, temos 153 em metadona, temos o grupo de abstinen-tes, temos o Programa de Admissão a Reclusos Entrados Toxico-dependentes, temos uma unidade residencial de risco…

EDUARDO BARROSO, CIRURGIÃO HEPÁTICO, HOSPITAL CURRY CABRAL

“É preciso aplicar as medidas no terreno”

Como avalia o Dr. Eduardo Barroso, um cirurgião, o esta-do da arte em hepatologia em Portugal?Eduardo Barroso (EB) – Antes de mais, esta sociedade de

hepatologia é sobretudo uma sociedade médica que, aliás, tem uma presidente que adoro, bem como ex-presidentes com quem me dou muito bem mas que têm pelos cirurgiões hepáti-cos aquela ideia que o meu pai, que era médico, comungava e que, basicamente, se resume a isto: “os cirurgiões servem para operar os doentes que nós mandamos para operar…” Tirando esta brincadeira, eu considero-me um hepatologista cirúrgico. Sou cirurgião e, como é óbvio não sei nem quero saber tratar as doenças virais do fígado nem as cirroses, a não ser quando eles mandam os doentes em estadio terminal para fazer o transplante. Mas estou muito ligado ao fígado também nas me-tástases hepáticas, a que os hepatologistas não ligam nenhu-ma. Só ligam ao tumor primitivo porque este aparece em fíga-dos cirróticos e eles já tratam a cirrose e acham que o devem fazer… e se calhar bem… e devem tratar igualmente a neopla-sia maligna. Dito isto, para não ofender ninguém, eu sou uma hepatologista de segunda. Os hepatologistas de primeira são

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10estes jovens e não jovens que se vêem aqui de quem sou aliás muito amigo, como sucede relativamente ao Rui Tato Marinho, ao Guilherme Macedo e ao Armando Carvalho. De qualquer modo, respondendo à sua questão, eu não sou, no domínio mé-dico, a pessoa para lhe responder a isso. Posso dizer que te-mos grandes hepatologistas – e não sou um homem de elogios fáceis -, presumo que também devem existir hepatologistas de quinta mas os que conheço são, de facto, de primeira, que tra-tam as doenças médicas do fígado, sendo o seu maior boom as hepatites víricas, em conjunto com os infecciologistas. Muitas das doenças crónicas do fígado, quando chegam a um estadio terminal, mandam para os cirurgiões. Mas eu sou defensor de que devemos trabalhar em conjunto. Eu trabalho em conjunto com os hepatologistas. O maior avanço da Hepatologia moder-na, nos últimos anos, depois do aparecimento do transplante como tratamento de rotina para as doenças crónicas terminais do fígado, sem outra alternativa terapêutica, foi este recente avanço brutal no tratamento da Hepatite C, como já tinha sido a vacina da Hepatite B há uns anos largos.

Há aqui coisas importantes no programa… Interessa-me um painel dedicado à profilaxia das doenças do fígado que considero que se faz combatendo certas dependências, sobretudo do álcool e das drogas e, agora, também com o tabaco de certa forma impli-cado ou, se preferirmos, prevenindo comportamentos de risco.

Muitos dos pacientes que chegam à sua linha de interven-ção terão certamente passados relacionados com depen-dências…EB – Sim, vírus C e álcool são 90 por cento das cirroses… A

Hepatite B foi desaparecendo, o que é bom, embora a imigração tenha vindo a trazer alguns casos mas, felizmente, já não consti-tuirá um problema de saúde pública.

Ao nível da referenciação para a cirurgia, já existem con-dições para que todos os portugueses que precisem e te-nham indicação terapêutica para o transplante ou para a recepção obtenham essa resposta?EB – Não! Essa ideia dos centros de referência foi criada em

2014 por Paulo Macedo e continuada pelo actual ministro da saú-de mas tem que ser moralizada e levada a sério. Nalguns casos está a ser um verdadeiro embuste.

Porquê?EB – Primeiro, porque aqueles que não são centros de refe-

rência continuam a fazer, impunemente, tratamentos de doen-ças para as quais, havendo os centros de referência, deviam estar proibidos de fazer. Segundo, porque foram dadas compe-tências a muitos centros de referência à última hora, para as quais não estavam habilitados. Portanto, houve declarações falsas e a atribuição de centros de referência nesta área hépa-to-biliar a centros que não a mereciam. O que é muito grave porque a pior coisa que se pode fazer é uma lei útil e regras fundamentais de uma reestruturação hospitalar para um SNS moderno e que foi muito bem recebida por pessoas como eu, que lutam por isto há 30 anos que, depois, não são postas em prática, resultando em verdadeiros embustes e no descrédito. Sei que há hospitais que continuam a operar patologias malig-nas do fígado e do pâncreas para as quais não estão habilita-dos e a fazerem monstruosidades. Portanto, ou pomos ordem

nisto ou então teremos a reforma completamente descredibili-zada. E devo dizer que há uma grande vontade… para tal é preciso voltar ao espírito inicial do João Lobo Antunes e da ou-tra comissão e aproveitar estes porque, se não se dá credibili-dade à reforma, melhor teria sido não a terem feito. O meu cen-tro já é há muitos anos um centro de referência na área do fíga-do, sem que isso fosse proibido ou fosse ditado por lei e con-fesso que não notei qualquer diferença a partir do momento em que fomos classificados como centro de referência. E isso é la-mentável porque quem já encaminhava os doentes, mesmo sem ser obrigado mas por consciência e por pensar primeiro nos doentes, continua a encaminhar e aqueles que continuam a pensar nos seus egos e a tratar os doentes sem condições ou competência, continuam na mesma… É certo que mudou algu-ma coisa mas não o suficiente. Paulo Macedo fez a reforma, fundamental para a Hepatologia moderna, e a escolha do Pro-fessor João Lobo Antunes foi de mão cheia, Adalberto conti-nuou mas não podemos ligar-nos apenas às partes folclóri-cas… É preciso aplicar as medidas no terreno.

É possível avaliar taxas de sucesso a partir das cirurgias hépato-biliares realizadas em Portugal?EB – Confesso que não sei muito bem o que quer dizer com

isso mas… começaria por dizer que, relativamente ao nosso cen-tro, existem dois níveis: existem outras doenças malignas do fíga-do a que os hepatologistas não ligam, como as metástases. Eu, como hepatologista do fígado, ligo tanto ao tumor primário como ao secundário. E os oncologistas não largam da mão o tratamento antineoplásico maligno das metástases, assim como os hepatolo-gistas não querem largar o tratamento antineoplásico maligno do hépato-carcinoma, com o argumento, para mim válido, de que são eles que sabem tratar a cirrose… Portanto, não é possível fazer uma avaliação desse género. Foi possível, neste longo período em que trabalho, perceber por exemplo que indicações por Hepa-tite B para transplante quase desapareceram. E presumo que tal se irá notar para a Hepatite C daqui a 15 ou 20 anos. Creio que, em relação à Hepatologia, o país está dotado de grandes centros, quer no Norte, quer no Centro, quer no Sul, muito competentes. A Hepatologia moderna não pode prescindir do transplante. A título de exemplo, Santa Maria é uma das unidades mais importantes do país de Hepatologia e não tem a vertente de transplante… Nem tem que ter porque, ao lado, tem o Curry Cabral, com rela-ções fantásticas e, quando acham que devem recorrer a nós, fa-zem-no. As unidades de Hepatologia não têm que ter todas trans-plantes… Têm é que estar afiliadas com um centro. Neste aspec-to, creio que Portugal está bem.

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10Notícias:

Ministro da Saúde, na Sofarimex, destaca candidatura a sede da EMA

O Ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, inaugu-rou a Unidade de Produtos Estéreis/Liofilizados da Sofarimex – In-dústria Química e Farmacêutica, no dia 2 de maio, em Sintra. A unidade industrial, para produção de líquidos e formas sólidas, está integrada no Grupo Azevedos.

A nova unidade industrial representou um investimento de cer-ca de nove milhões de euros. Com uma capacidade de produção de 12 milhões de unidades por ano, cria cerca de 30 novos postos de trabalho.

O Ministro da Saúde aproveitou a ocasião para apelar ao en-volvimento dos sectores empresarial e académico na candidatura para receber a sede da Agência Europeia do Medicamento (EMA),

em Lisboa, decidida em Conselho de Ministros do passado dia 27 de abril. Salientou a importância de refletir, para o exterior, a com-petitividade do País, nas perspetivas da inteligência, da inovação, da indústria.

Adalberto Campos Fernandes salientou, ainda, a importância do sector da saúde no dinamismo da economia e o seu peso nas exportações portuguesas, enaltecendo a independência do País e dos seus atores perante as grandes multinacionais.

Candidatura de Portugal a sede da EMAA sede da EMA terá se ser relocalizada, com base numa deci-

são que será tomada em dezembro, em consequência da saída do Reino Unido da União Europeia.

A agência tem como missão promover a excelência científica na avaliação, supervisão e monitorização da segurança dos medi-camentos cuja utilização se destine à União Europeia e Espaço Económico Europeu, trabalhando em conjunto com cerca de 50 autoridades nacionais do medicamento.

A presença da EMA é um fator de prestígio para o país que a acolhe e tende a atuar como polo de atração da presença da in-dústria farmacêutica, potenciando, em particular, as áreas de in-vestigação e desenvolvimento e os ensaios clínicos.

Lisboa reúne as condições adequadas para acolher uma agência com o perfil da EMA, tendo nomeadamente uma excelen-te localização geográfica, com boas acessibilidades, incluindo aé-reas, e capacidade hoteleira instalada. É uma cidade moderna, cosmopolita e dotada de excelentes infraestruturas de transporte, comunicação, educação de nível e perfil internacionais e habita-ção, condizentes com os mais elevados padrões de vida euro-peus, a par de um contexto económico competitivo.

Portugal tem também as capacidades técnicas e científicas para acolher a EMA, sendo que o INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, IP, tem hoje uma posição cimeira no âmbito dos procedimentos de avaliação de medicamentos e na coordenação de comités e grupos de trabalho da EMA.

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12Modelo Português nos Palop:

INALUD visita Clinica do Outeiro

Uma delegação do INALUD, veio visitar o nosso País para co-nhecer melhor o “Modelo Português” e a intervenção junto dos problemas dos comportamentos aditivos e das dependências.

Como desenvolver uma estratégia integrada de combate à droga e à toxicodependência, alicerçada na prevenção dos consu-mos, no tratamento, redução de riscos e minimização de danos e reinserção social, foi o que Indira Santos procurou saber junto de Jorge Barbosa responsável pelo CRI- Centro de Respostas Inte-gradas do Porto Oriental, que numa breve formação tentou apode-rar o INALUD, para uma intervenção que tivesse em conta o meio envolvente, as suas estruturas, as autarquias e a sociedade civil. O Plano Operacional de Respostas Integradas, é uma resposta eficiente, equilibrada que tem por base o diagnóstico territorial dos problemas assegurando de uma forma eficaz e transversal o fun-cionamento das respostas aos problemas que todos os dias vão surgindo, e são muitos, e cada vez mais complicados face às no-vas substâncias e às dependências sem substancia o que exige de toda a equipa uma qualificação na abordagem do fenómeno tendo sempre presente a promoção e defesa dos direitos dos ci-dadãos. “ Só desta forma poderemos atingir um elevado grau de

satisfação do doente do seu bem-estar em matéria de prevenção da saúde e do consumo das drogas, só assim poderemos garantir um nível de adesão ao tratamento e uma cooperação com o doen-te alicerçada numa resposta integrada e na confiança que ele sabe ter por parte da equipa que a partir daquele momento faz parte da sua recuperação” disse Jorge Barbosa.

“O Modelo Português como é reconhecido tem princípios orienta-dores e ideias base que assentam na centralidade do cidadão, mas não limita a sua intervenção aqui no CRI, ela vai muito mais longe, ar-ticula-se com estruturas da saúde, das forças de segurança, organi-zações da sociedade civil, em parcerias e trabalho em rede com as autarquias, optimizando recursos e exige de si um trabalho assente na qualidade e na evidência, priorizando os esforços na formação continua para potenciar os melhores resultados”. Disse

Para finalizar gostaria ainda de dizer que são muitas e varia-das as perguntas que nos fazem, sejam os doentes as famílias ou os parceiros, mas as respostas tem que ser cuidadosamente es-truturadas de acordo com os problemas a que estão associados…não existem casos iguais nem semelhantes…existem pessoas e é para elas que temos de centrar toda a nossa atenção.

O INALUD, visitou e acompanhou a equipa de rua do Centro Social do Soutelo, que desenvolve em algumas zonas do conce-lho de Gondomar o “ Programa de Respostas Integradas de Rio Tinto” uma intervenção específica que integra respostas interdisci-plinares que decorre dos resultados do diagnóstico do território identificado como prioritário.

Este programa enquadra-se no PORI - Plano Operacional de Respostas Integradas, promovido pelo SICAD -Serviços de Inter-venção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências, é uma intervenção integrada na área dos comportamentos aditivos e de-pendências.

O PRI de Rio Tinto engloba dois eixos, o eixo da redução de riscos e minimização de danos e o eixo da reinserção. O trabalho desenvolvido pela reinserção pretende que o indivíduo e famí-

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lias sejam capazes de se sentirem integrados ao nível familiar, so-cial, económico e cultural. Pretende de igual forma dar acesso às condições básicas de vida bem como serem integrados ao ní-vel profissional. No eixo da redução de riscos e minimização de danos promove um PSOBLE - Programa de Substituição Opiácea de Baixo Limiar de Exigência junto de indivíduos com consumos de substâncias ilícitas com o objectivo de promover a mudança do comportamento a fim de diminuir os riscos nos casos em que não é possível impedir o consumo ou conseguir a sua abstinência.

INALUD, na visita que fez à Clinica do Outeiro, quis inteirar-se do modelo, do programa e das linhas orientadoras que a clínica desenvolve no tratamento e reabilitação das pessoas que recor-rem à Comunidade Terapêutica.

Na reunião de trabalho, a delegação pôde verificar In loco a for-ma como são definidas e estruturadas as regras, os valores e objeti-vos relativos a cada um dos utentes, tendo em vista a promoção da pessoa e o respeito pelos seus mais elementares direitos. Desde o

momento da entrada, até à alta clínica, o doente é acompanhado por uma equipa técnica altamente especializada na sua reabilitação. A clínica é uma unidade prestadora de cuidados de saúde especializa-da na área das toxicodependências, está licenciada e preparada para dar resposta às atribuições específicas do SICAD.

“As Comunidades Terapêuticas já não são o que eram, e a Clíni-ca do Outeiro, é um bom exemplo disso, mudaram os perfis de con-sumo, e naturalmente tinham que mudar os modelos de intervenção. Hoje os níveis de exigência são muito elevados, existe muito conhe-cimento e saber o que nos conduz a intervenções cada vez rigoro-sas, com maior qualidade e baseada na evidência científica, respei-tando sempre os direitos humanos de todos e cada um dos doentes”. Disse José Manuel Ramos Director Técnico da Clinica do Outeiro.

O Dr. José Manuel Ramos referiu-se ainda aos utentes com doença mental grave concomitante no sentido de conceptualizar e adequar as respostas, uma vez que, uma Comunidade Terapêuti-ca especializada nesta população específica deve obedecer a re-gras de funcionamento muito próprias. Não podemos desviar a nossa atenção do fenómeno das dependências, no entanto, não nos podemos esquecer dos diagnósticos psiquiátricos associa-dos. Encontrar este equilíbrio nem sempre é fácil, motivar para o tratamento e para a abstinência indivíduos em que mais de meta-de das suas vidas foram dedicadas aos consumos só se conse-gue com uma estrutura que seja contentora, securizante, com um programa de tratamento orientado para o concreto e operacionali-zado por uma equipa multidisciplinar e altamente qualificada.

Na Comunidade Terapêutica Clinica do Outeiro, indepen-dentemente do público-alvo, a intervenção terapêutica tem por base um programa de tratamento devidamente estruturado que é operacionalizada através de um plano individual de tratamen-to. Desta forma, os utentes são os principais agentes na sua própria mudança.

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14Instituto Nacional de Luta Anti-Drogas:

A Prevenção no combate às Dependências

ANA GRAÇA, DIRECTORA GERAL DOINALUD, I.P

“A droga, não é um problema dos outros, é um problema de toda sociedade”

Desde 2013, que o INALUD,I.P., tem vindo a implementar uma estratégia de políticas de combate à droga e à toxicodependência como um problema de saúde pública e numa clara aposta na mo-bilização da juventude e na prevenção como o pilar fundamental num combate que se espera poder contar com a sociedade civil, ainda pouco sensibilizada para um problema sério que urge inter-vir. Para responder com mais eficácia aos desafios, vão ser cria-das estruturas e uma Unidade de Investigação Financeira para fa-zer face aos casos relacionados com o branqueamento de capi-tais, melhoramento dos serviços de saúde mental e a construção de um novo centro de reabilitação e reinserção para os toxicode-pendentes, preparar e formar pessoas e equipas para uma inter-venção na redução dos riscos, e melhorar a vida das pessoas, es-pecialmente dos adolescentes e jovens.

Trata-se de uma luta complexa, para combater o crime e as re-des organizadas que causam graves perturbações de natureza eco-nómica e social. O INALUD, pretende assim dar um sinal claro e evi-dente que os seus técnicos e parceiros privilegiam o humanismo e o pragmatismo quando se cruzam objectivos, como valores e princí-pios, quando está em causa o respeito pelos direitos humanos.

“A droga, não é um problema dos outros nem das famílias dos outros, tal como parece, ela é um problema de toda sociedade, e não pode ser encarada única e exclusivamente como matéria dos espe-cialistas, dos técnicos ou dos políticos. Pelo contrário, todos nós so-mos chamados a contribuir positivamente para a redução deste fla-gelo global”. Disse Ana Graça, Directora Geral do INALUD, I.P.

RUI JORGE CARNEIRO MANGUEIRA MINISTRO DA JUSTIÇA E DOS DIREITOS HUMANOS

“Incrementar a investigação e formação no domínio das drogas”

Atendendo a necessidade de criação de um Programa de com-bate às Drogas e a toxicodependência, o governo, criou o Instituto Nacional de Luta Anti-Drogas, que prevê entre outras as seguintes medidas:

Cumprir com a política de prevenção do consumo de drogas no nosso País, consciencializando a sociedade e a juventude em particu-lar, sobre os efeitos socioeconómicos do uso das drogas e da toxico-dependência; Combater o consumo de drogas, sobretudo na popula-ção jovem e adolescente, reprimindo o seu tráfico, promovendo o aperfeiçoamento da articulação entre as diversas autoridades ao nível nacional e internacional, sem excluir a família e a sociedade civil, que desempenham um papel fundamental nesta luta; Encaminhar os con-sumidores de drogas para o tratamento em centros específicos e ga-rantir a sua reinserção social após a recuperação; Elucidar a socieda-de, em especial os jovens e adolescentes sobre as consequências do consumo das drogas e da toxicodependência na saúde humana; In-crementar a investigação científica e a formação de recursos huma-nos no domínio das drogas e das toxicodependências; Criar os meca-nismos de financiamento da estratégia nacional de luta contra as dro-gas, nas áreas da prevenção, investigação, formação e repressão.

É importante assinalar que a bebida alcoólica, o tabaco, can-nabis sativa e alguns medicamentos psicotrópicos, especialmente ansiolíticos e anfetaminas, continuam a ser as drogas mais consu-midas e as que trazem os maiores prejuízos à população, tanto a nível físico, psicológico e familiar.

A violência relacionada com o uso abusivo de drogas, não fica restrita aos acidentes de viação e trânsito e a uma saúde pública debilitada, também envolve o alto nível de abandono escolar e uma desestruturação acentuada da família.

Face a esta realidade, o INALUD, I.P., continua a desempe-nhar um trabalho preventivo, junto das escolas, maternidades, igrejas, sociedade civil, militar e paramilitar. Juntamente com o INALUD, I.P., é importante que todas as forças vivas e activas da sociedade contribuam pois, o combate as drogas e toxicodepen-dência não se faz de forma isolada.

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PROTEGIDO DIVIRTO-ME COM SEGURANÇA.

Vacinar é proteger. Aos 10 anos vacine-se contra o tétano. As raparigas também devem vacinar-se contra HPV.

VACINAS PARA A VIDA

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16XVI Simpósio da Sociedade Portuguesa de Suicidologia:

Suicídio e comportamentos auto lesivos: da comunidade ao cuidarA Sociedade Portuguesa de Suicidologia (SPS) realiza todos

os anos um Simpósio com a colaboração dos Serviços de Psiquia-tria e Saúde Mental locais. A sua última edição - o XVI Simpósio da SPS - resultou de uma parceria com a Universidade de Aveiro e com o Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental do Centro Hospitalar do Baixo Vouga e teve lugar no Auditório da Reitoria da Universidade de Aveiro, em 31 de Março e 1 de Abril de 2017, com o tema “Da Comunidade ao Cuidar”. Temas como a família, cuida-dos de saúde primários e serviços hospitalares, suicídio e compor-tamentos autolesivos no jovem, investigação em suicidologia, co-municação social e suicídio e trabalho deram origem à partilha de conhecimentos entre cerca de 400 participantes. À semelhança das anteriores edições, o evento reuniu profissionais de várias áreas com um propósito comum: dar a conhecer a investigação científica mais recente na área do suicídio e dos comportamentos auto lesivos, partilhando saberes e experiências sobre a interven-ção terapêutica nos quadros clínicos mais frequentemente asso-ciados a este fenómeno e procurando contribuir para a prevenção do suicídio.

Dependência aderiu ao desafio e entrevistou Fausto Amaro, Presidente da SPS e Jorge Costa Santos, membro do Conselho Cientifico da SPS

FAUSTO AMARO, PRESIDENTE DA SPS

“Em Portugal, temos mais de mil suicídios por ano”

Que importância assume a realização de eventos como este face à sensibilização para a problemática do suicí-dio?Fausto Amaro (FA) – O suicídio é um tema da maior importância

em saúde pública. Em Portugal, temos um pouco mais de mil suicí-dios por ano e, em todo o mundo, de acordo com a Organização Mundial de Saúde, são cerca de 800 mil. Temos em Portugal mais suicídios do que homicídios! Por isso, este e os demais simpósios que a Sociedade tem organizado, tem como objectivo apresentar es-tudos sobre as causas do suicídio e, principalmente, sobre a forma de o prevenir. Há que frisar que o suicídio não tem só o impacto da morte em si. O suicídio afecta as famílias durante gerações, muito

mais do que se a morte for de causa natural. A SPS é uma sociedade científica que estuda as causas do suicídio e a forma de o prevenir e, ao mesmo tempo, chama a atenção para este fenómeno, importan-tíssimo do ponto de vista da saúde pública.

Além desses cerca de mil casos anuais que referiu, ainda existem os chamados casos de suicídio não consumado, também muito esquecidos…FA – Nós utilizamos a terminologia comportamentos autolesivos.

As pessoas cometem por vezes actos de agressão a si próprios de vária espécie e que são, muitas vezes, suicídios falhados. Claro que as tentativas e os comportamentos autolesivos são em maior número ainda e, às vezes, são uma chamada de atenção para o problema que a pessoa tem e que, mais tarde, pode até acabar num suicídio. Por isso é que todos os profissionais de saúde atentos a essa ques-tão tentam atender também aos comportamentos autolesivos.

É vulgar confundir-se hoje, numa sociedade hedonista, conceitos e sentimentos como tristeza, luto, depressão… Neste limbo entre a saúde e a doença mental, um diagnós-tico errado poderá fazer a diferença?FA – Hoje sabemos que existem muitas perturbações men-

tais, nomeadamente a depressão, a esquizofrenia e outras asso-ciadas ao suicídio, embora não sejam as únicas causas. Sabemos que existem igualmente causas de natureza social, sabemos que as crises económicas, o desemprego ou a exclusão social tam-bém são fenómenos potencialmente associados ao suicídio, como sabemos que, quando há crises económicas, as taxas de suicídio tendem a aumentar. Mas não há dúvida de que as perturbações mentais, nomeadamente as perturbações depressivas, estão as-sociadas. Claro que existe confusão sobre o que é a depressão. Trata-se de uma perturbação de saúde mental mais ou menos grave, passível de tratamento. Existem, no entanto, situações que são perfeitamente normais na nossa cultura… Se morre um ente querido, é natural que a pessoa tenha que passar por um período de luto, que envolve tristeza, desânimo e, por vezes, revolta. Mas o luto não é, em si mesmo, uma perturbação mental… Agora, não ser capaz de vencer o luto já pode vir a ser um problema sério. A pessoa tem problemas na vida que fazem com que ande mais tris-te e em baixo e tal não significa necessariamente que esteja com uma depressão. Agora, devemos prevenir todos estes sintomas, desde logo para que não se caia numa perturbação como uma de-pressão e para não favorecermos o surgimento dos comporta-mentos suicidários ou autolesivos. Também por isso se reveste de fulcral importância termos serviços de saúde mental na comunida-de com pessoal cada vez melhor preparado e a funcionarem bem e que não incluam apenas a especialidade de psiquiatria. A saúde mental é transversal à sociedade e a todos os serviços de saúde. O médico de família faz muito pela saúde mental no seu desempe-

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17nho, bem como o enfermeiro de família e outros profissionais. Esta atitude de queremos melhor saúde metal favorece não só a saúde em geral porque não temos um corpo separado da mente e, naturalmente, ajuda a prevenir o suicídio.

Existe hoje tratamento eficaz para esta perturbação?FA – Não sendo médico, não tenho muita autoridade para fa-

lar sobre esse assunto mas, pelo que me é dado conhecer, os pro-fissionais sabem hoje o que estão a fazer, têm mecanismos tera-pêuticos adequados e estamos muito melhores do que estávamos há anos. E continuaremos a estar porque tem-se avançado muito, quer em termos de novas estratégias terapêuticas, que de novos medicamentos. Claro que ainda não temos a solução definitiva mas essa melhoria evidenciada tem muito a ver com a organiza-ção dos serviços.

E onde entra aqui a prevenção?FA – A prevenção tem que estar sempre presente. A preven-

ção faz-se ao nível da comunidade, dos responsáveis… Um autar-ca, por exemplo, através da sua acção no município, pode contri-buir imenso para a prevenção das perturbações mentais e do sui-cídio. Bem como as organizações da comunidade, as IPSS e ou-tro agente, que é fundamental mas de que por vezes nos esquecemos, a comunicação social. Após muitos anos de pesqui-sa, sabemos de fonte segura que o importante, em termos de pre-venção, não é falar do suicídio mas a forma como se fala sobre o mesmo. Por isso, em todo o mundo se faz uma espécie de gentle-man agreement, uma espécie de protocolo entre a comunicação social e os serviços de saúde mental, no sentido de os serviços de saúde darem atempadamente aos jornalistas toda a informação; e os jornalistas devem assumir a sua responsabilidade social de transmitirem a notícia de uma forma informativa mas não alarman-te para o público e que não leve ao suicídio por imitação, por exemplo, de comportamentos adoptados por figuras mediáticas…

Finalmente, que avaliação faz desta realização da SPS?FA – O Simpósio contou com a participação de cerca de 400

pessoas, o que foi sensacional e revela um crescendo interesse por parte de médicos, psicólogos, sociólogos, enfermeiros e ou-tros profissionais da saúde e do sector social. Espero que tenha também alguma repercussão na sociedade e acentuo que a DGS esteve aqui representada através do Director do Programa Nacio-nal de Saúde Mental, o Dr. Álvaro Carvalho, o que significa que o próprio ministério da saúde dá muita atenção a este tema.

JORGE COSTA SANTOS, CONSELHO CIENTIFICO DA SPS

“O suicídio é um problema de saúde pública”

A Organização Mundial da Saúde afirma que mais de 90 por cento das pessoas com problemas relacionados com o suicídio não são tratadas… O que justificará este indicador?Jorge Costa Santos (JCS) – Nós sabemos que a prevalên-

cia da depressão é muito grande nos países ocidentais, sobre-tudo no nosso país. A procura de cuidados assistenciais e o acesso ao seu tratamento depende de uma série de factores, que têm a ver com o nível cultural médio e com o grau de litera-cia em saúde das populações, sobretudo na área da saúde mental, onde o estigma da doença mental constitui ainda um pesado entrave a uma intervenção terapêutica precoce e efi-caz. Mas também com os maiores ou menores constrangimen-tos de natureza política, social e financeira dos países, com o modo como os governantes e outros responsáveis encaram o investimento na área da saúde, com a organização dos servi-ços assistenciais, com os recursos humanos e a sua distribui-ção regional, onde continuam a verificar-se assimetrias assaz preocupantes. A prioridade reside na prevenção, na acessibili-dade aos cuidados de saúde primários e no diagnóstico preco-ce de perturbações mentais, nomeadamente da depressão, que é tratável.

Apesar de constituir uma causa de morte com um sig-nificativo peso em termos mundiais, o suicídio parece não suscitar o mediatismo de outras causas com menor prevalência…JCS – O suicídio tem oscilado entre a 10ª e a 13ª causa de

morte no mundo. E constata-se que, em termos de perda de anos de vida com qualidade, as questões de saúde mental e de

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18suicídio assumem uma relevância maior do que acontece relati-vamente a doenças comuns de todos conhecidas, como as doenças cardiovasculares, a diabetes, etc. De facto, o suicídio é um problema de saúde pública e a OMS di-lo desde há déca-das. E tem vindo a registar variações significativas… Diria que, ao nível dos países ocidentais e da Comunidade Europeia, os números não têm sofrido grandes oscilações, embora se verifi-quem diferenças consideráveis. A Espanha ou a Grécia, por exemplo, têm taxas de suicídio muito inferiores à nossa. Conti-nuam a verificar-se disparidades que têm também a ver com procedimentos administrativos e registos estatísticos de mortes que, correspondendo com elevada probabilidade a suicídios, não são categorizadas como tal. A subnotificação do suicídio entre nós é, ainda, considerável, dificultando a definição de es-tratégias preventivas mais adequadas, pois só se consegue prevenir aquilo que se conhece.

Em que medida será a depressão o maior factor de risco para a origem do suicídio?JCS – Quando falamos em suicídio, não podemos falar

numa causa ou determinante única. O suicídio é multidetermi-nado, é um fenómeno complexo e, naturalmente, existem facto-res de natureza biográfica, contextual, psicopatológica e, de entre os vários elementos, o que maior peso tem é justamente a depressão, existindo muita investigação nesse domínio. Nos estudos retrospectivos, constata-se que cerca de 90 por cento das pessoas que consumaram o suicídio sofriam de depressão. E essa depressão tinha sido identificada pelas pessoas que, com ela, se relacionavam mais proximamente, embora nem sempre tivesse sido devidamente valorada.

Como avalia a evolução registada ao nível do tratamen-to da depressão?JCS – Não há dúvida nenhuma de que a depressão é hoje

tratável e, em muitos casos, curável. Houve uma evolução mui-to grande, quer sob o ponto de vista da intervenção e acesso aos cuidados de saúde primários, quer sob o ponto de vista da psicofarmacologia. Existem antidepressivos de última geração com efeitos confirmados e com efeitos secundários melhor tole-ráveis do que acontecia no passado, simplesmente, a questão que se coloca é que as pessoas com perturbações depressi-vas, por força de desconhecimento ou do estigma associado à doença mental, do isolamento social ou por alguma inércia, não procuram os cuidados de saúde e, por vezes, os sinais e sinto-

mas da doença não são identificados. Noutros casos, tendo sido identificados, os doentes não cumprem o tratamento pelas mais diversas razões, que incluem as carências económicas e a falta de uma rede familiar de suporte.

E depois do acto… como fica a família?JCS – A família, quase constantemente, fica numa situação de

grande sofrimento. Há sentimentos de culpa, de vergonha, de re-volta… E quantas vezes, depois de não terem valorado sintomas que identificaram, se culpabilizam face ao que poderiam ter feito para evitar aquela morte… Não é por acaso que um dos papas da suicidologia, Shneidman, criou a designação de sobreviventes aplicável aos familiares e às demais pessoas que faziam parte da teia relacional (amigos, colegas e outros próximos) daquele que se suicidou. E que têm, também elas, um risco aumentado para a depressão, para o luto patológico e para o suicídio.

E o profissional de saúde, também se questiona relati-vamente ao que falhou?JCS – Sim, com certeza… É sempre um sentimento de per-

da e penso que serão poucos aqueles que não se confrontam, ao longo das suas vidas profissionais, com a perda de doentes por esta via. E leva-nos a pôr em causa a nossa intervenção. Será que poderíamos ter evitado esse desenlace? Não é por acaso que esses temas devem ser debatidos em equipa, até porque o técnico de saúde, seja médico, enfermeiro ou psicólo-go, está também ele sujeito a situações de sobrecarga psicoló-gica e psicopatológica, ao burnout e à depressão. Também não é por acaso que a profissão médica é das que regista maiores taxas de suicídio.

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19Pesquisadores reunidos em Coimbra estão preocupados com os estilos de vida no ensino superior:

Profissionais de nove escolas e universidades querem criar uma

rede portuguesa de instituições promotoras de saúde

Pesquisadores nacionais e internacionais reunidos, entre os dias 10 e 12 de abril, na Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC), no âmbito do III Curso Internacional de Pesquisa-ação Participativa em Saúde, defendem a criação de uma rede portuguesa de instituições de ensino superior promo-toras de saúde.

Preocupados com os estilos de vida no ensino superior, os profissionais das nove instituições para já comprometidas com o projeto afirmam que a proposta «se insere no movimento dos contextos promotores de saúde», tendo estabelecido «como objetivo conceber, partilhar e fortalecer ações participativas de promoção da saúde e de prevenção de riscos a que a comuni-dade académica está exposta».

E os problemas enumerados são vários: consumo abusivo de álcool, dependências químicas e não químicas, infeções se-xualmente transmissíveis, acidentes rodoviários, violência en-tre pares e em contextos recreativos, stresse, depressão e so-frimento emocional, distúrbios alimentares, automedicação, se-dentarismo, absentismo e insucesso académico são alguns dos focos transversais às comunidades académicas-alvo da pes-quisa multicêntrica que se está a iniciar com os pesquisadores envolvidos.

Participaram, nesta primeira reunião da futura rede portu-guesa de instituições de ensino superior promotoras de saúde, pesquisadores da Escola Superior de Saúde do Instituto Poli-técnico de Viana do Castelo, da Escola Superior de Saúde de Vila Real – UTAD, da Escola Superior de Enfermagem da Cruz Vermelha Portuguesa de Oliveira de Azeméis, da Escola Supe-rior de Enfermagem de Coimbra, da Escola Superior de Saúde do Instituto Politécnico de Leiria, da Escola Superior de Saúde da Universidade dos Açores, da Escola Superior de Saúde da Universidade do Algarve e das universidades federais Flumi-nense e de Pernambuco (Brasil).

Este grupo teve o apoio do coordenador da Rede Ibero-a-mericana de Universidades Promotoras de Saúde (RIUPS), Hi-ram Arroyo, do presidente de IREFREA - Portugal (Instituto Eu-ropeu para o Estudo dos Fatores de Risco em Crianças e Ado-lescentes), Fernando Mendes, e do presidente de Associação Existências, Paulo Anjos.

De acordo com a organização do III Curso Internacional de Pesquisa-ação Participativa em Saúde, formação que vai pro-longar-se até dezembro de 2017, «este foi um passo importante de consolidação da parceria entre escolas superiores de Enfer-magem e de Saúde de língua portuguesa».

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20Projecto prevê edificação de espaço museológico:

Associação Convivência cria projecto pioneiro pela

inclusão em AveiroEstá a nascer no distrito de Aveiro um movimento de cidada-

nia e de fomento de uma democracia participativa que apela à construção de um território mais inclusivo e solidário. A dinâmica partiu da Associação Convivência e, apesar da curta existência da instituição, é já longa a história para contar. O próximo desígnio da Associação Convivência passará pela construção de um espaço museológico em Aveiro onde os visitantes possam vivenciar, na primeira pessoa, as dificuldades sentidas no quotidiano pelos seus pares que são forçados a enfrentar os mais diversos obstá-culos, físicos ou ideológicos. A par, num espaço que deverá cons-tituir uma espécie de símbolo identitário da região em que se inse-rirá, serão propostas aos aderentes actividades culturais, de lazer ou de simples convívio, onde o toque e os afectos predominarão, numa oferta que incluirá um misto de sinestesias positivas que re-sultará da prévia auscultação da comunidade aveirense.

Por isso, a Associação Convivência, que elege como missão desenvolver programas vinculados com a educação, a inclusão e a integração, dirigidos à população em geral, mas fortemente di-reccionados para a diversidade humana, tem vindo a desenvolver uma agenda de eventos, em que é denominador comum o convite à participação da comunidade local, subordinados a temáticas fracturantes, como a deficiência, a sexualidade, a religião, as et-nias, as dependências, entre outros. No dia 21 de Abril, Depen-dências aderiu ao desafio e marcou presença no 1º Seminário, com o Dr. João Goulão- Director Geral do SICAD, Serviço de Inter-venção nos Comportamentos Aditivos e nas Dependências.

Numa altura em que se fala do perfil dos alunos do Séc. XXI, foi intenção da Associação Convivência criar um espaço de refe-rência para práticas e políticas inclusivas sobre a temática das de-pendências, na cidade de Aveiro, ajudando os alunos dos agrupa-mentos escolares locais a entender as escolhas que contribuem para a sua segurança e da cidade onde vivem, possibilitando a construção de um futuro sustentável e envolve-los em projectos de cidadania activa. No final do evento, entrevistámos Rui Diniz, Presidente da Associação Convivência

RUI DINIZ, PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO CONVIVÊNCIA“Saberão os pais o que fazer, quando um filho apresenta comportamentos desviantes”

Como surgiu esta ideia da Associação Convivência, da criação de um espaço museológico subordinado à inclu-são?Rui Diniz (RD) - Esta ideia nasceu em São Paulo, no Brasil,

numa altura em que organizávamos o World Bike Tour pela Inclu-são. Nesse contexto, surgiu a ideia de criarmos um espaço mu-seológico social onde pudéssemos abordar todos estes temas que não são convenientemente tratados pela sociedade. Refiro--me concretamente às questões ligadas com a deficiência, com a homossexualidade, com a religião, com as dependências, as et-nias, entre outras. Em suma, a Associação Convivência surge de uma ideia aliada a um projecto que o IDT bem conheceu e apoiou e tivemos a ideia de construir em Aveiro o primeiro museu mundial do género, o Museu da Convivência, um espaço museológico so-cial que pretende que as pessoas, na sua visitação, vistam o papel dos outros, assumindo um papel diferente daquele que é o normal no seu dia-a-dia e, assim, compreendam melhor a inclusão e a in-tegração social.

No fundo, trata-se de propor vivências em que as pessoas simulam a situação por que passam esses tais “excluí-dos”…

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RD - Exactamente… As dificuldades por que as pessoas pas-sam, movimentarem-se com os olhos vendados, contarem histó-rias sem poderem falar, associar as questões do sentimento… Nesse sentido, preconizámos criar a Associação Convivência e desenvolver todo o trabalho junto da população da cidade. Portan-to, o museu vai surgir a partir de uma necessidade que a própria população irá criar. Neste momento, estamos a trabalhar com as escolas, nomeadamente com cerca de 600 crianças do ensino pré-escolar, um trabalho que iniciámos em Setembro do ano pas-sado, no âmbito do qual estamos a transmitir algumas ideias e valores que, acreditamos, nos irão ajudar no futuro à constru-ção do próprio museu. Esta iniciativa de hoje, subordinada às dependências enquadra-se nesse sentido. Começámos, a montante, com os mais novos mas também era importante dar uma resposta aos jovens que atravessam uma idade em que se sentem um pouco perdidos neste mundo em que são confronta-dos diariamente com milhares de mensagens e não sabem como trata-las. Muitas vezes, é a partir deste tipo de fenóme-nos que surgem as dependências. Na nossa profissão, depara-mo-nos frequentemente com jovens que se sentem perdidos e não sabem a quem pedir ajuda e como se orientar e, então, surge esta iniciativa: convidámos os quatro agrupamentos de escolas da nossa cidade e o que queremos saber é como Avei-ro trabalha este tema, que instituições estão no terreno, se co-nhecem os jovens, que programas e acções estão a implemen-tar… Mais tarde, os pais: saberão os pais o que fazer, como ac-tuar e a quem se dirigir quando um filho apresenta comportamen-tos desviantes? Por outro lado, pretendemos criar uma rede de trabalho diferente daquela que já existe.

Daí também a presença de instituições tão diversas do distrito de Aveiro…RD - Exactamente. Consideramos muito válida a rede existen-

te mas entendemos que é preciso voltarmos novamente ao terre-no e sentir o que os jovens têm para nos dizer. Os cenários do dia--a-dia mudam constantemente, é preciso ouvir os jovens, que têm sempre coisas novas para nos contar e ainda hoje, na sessão da manhã, ouvimos os moderadores afirmarem terem sido surpreen-didos com as novas ideias que eles nos apresentaram.

Em que medida será intenção da Associação Convivência criar em Aveiro um movimento de cidadania assente numa base de democracia participativa?RD - Sim, é hoje muito importante auscultar para intervir. Viver

numa cidade e não participar na sua construção é a negação de viver. Temos que valorizar a cooperação num mesmo espaço a fa-

vor da construção de um melhor dia-a-dia. E isso traduz-se em pe-quenos toques que, a médio prazo, irão certamente alterar a reali-dade de uma cidade. E quem sabe poder disseminar esta ideia pelo restante país.

Já existe alguma previsão para a data da edificação do es-paço museológico?RD - Já existe efectivamente a ideia do que deverá ser o espa-

ço museológico, que deverá combinar elementos identificativos da região de Aveiro, onde a entrada da água deverá estar presente, assim como a acessibilidade pela Ria, a sustentabilidade de todo o edifício, a existência de praças que potenciem a realização de performances e actividades teatrais e outras manifestações cultu-rais temporárias ou permanentes… Este museu deve falar, sobre-tudo, o dia-a-dia. Todos os dias, as pessoas têm que sentir que o museu tem algo para contar. Tem que ser um museu dinâmico, de interacção, um museu do touch, de afectos, participativo e todos temos que sentir que está ali algo nosso.

Serão certamente necessários apoios…RD - Sim, são necessários apoios mas, mais do que isso, é

necessário fazer algum trabalho com a comunidade. É necessário sensibilizar a comunidade para a importância da temática que está inerente a este projecto. Nesse sentido, confesso que a Asso-ciação está a sentir “dores de crescimento”, uma vez que, face à inovação que estamos a apresentar nos vários temas que esta-mos a abordar, estamos a ser solicitados numa dimensão superior à nossa capacidade de resposta. Mas acreditamos que, com esta construção de rede, outras associações se poderão juntar a nós e ajudar-nos a construir este projecto, num museu que deverá ser de todos e não nosso. Somos apenas aglutinadores, criadores de intercepções entre as várias associações, fomentando pontes en-tre os vários projectos e dinâmicas existentes na cidade.

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222º Seminário de Segurança e Saúde no Trabalho:

Sindicatos preocupados com posições das autarquias

face aos CADO Centro Multimeios de Espinho acolheu, no dia 20 de Abril, o

2º Seminário de Segurança e Saúde no Trabalho. O evento foi or-ganizado pela Direcção Regional de Aveiro do STAL - Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local e Regional, Empresas Públicas, Concessionárias e Afins, em parceria com a Câmara Municipal de Espinho e enquadrou-se nas comemora-ções do Dia Nacional da Segurança e Saúde no Trabalho, incin-dindo sobre temas como o stress, o assédio, o burnout, álcool, ris-cos psicossociais e igualdade de género.

À margem do encontro, Dependências entrevistou Arménio Carlos, Secretário-Geral da CGTP, e António Augusto, Coordena-dor do STAL Aveiro.

ARMÉNIO CARLOS, SECRETÁRIO-GERAL DA CGTP

“Se queremos uma sociedade desenvolvida,temos que tomar medidas preventivas”

Ouvimos o presidente da Câmara Municipal de Espinho referir-se à asfixia que as autarquias enfrentam face à contratação e que originam o burnout dos funcionários… Este plano de estabilidade e de reformas do Governo foi uma oportunidade perdida para se alterar uma lei muito constrangedora para as autarquias?

Arménio Carlos (AC) – Acima de tudo, é necessário que, desde já, sejam tomadas medidas no sentido de se fazer o apura-mento real dos meios humanos que, quer as autarquias, quer o Governo Central têm e as necessidades que as populações sen-tem para terem serviços públicos adequados. E essa é a primeira conclusão a que chegamos que, imediatamente, nos leva a dizer que não temos trabalhadores a mais. Eventualmente, poderá ha-ver uma distribuição menos bem conseguida mas temos, isso sim, que valorizar o trabalho, os trabalhadores e melhorar as condi-ções de trabalho. Porque o que hoje verificamos, na nossa socie-dade, cada vez mais agitada, é que a saúde é o bem mais precio-so do ser humano. E a saúde laboral é um instrumento fundamen-tal porque um trabalhador tem uma família, portanto, a sua instabi-lidade psicológica mas igualmente a sua saúde laboral são fundamentais para dar segurança e estabilidade à sua família. E o que verificamos hoje é que existem alterações profundas nas rela-ções de trabalho, com uma intensificação de ritmos muito fortes, com uma pressão muito grande sobre os trabalhadores, com uma situação de angústia permanente nos muitos que vivem numa si-tuação de precaridade laboral, com uma pressão muito grande também nos trabalhadores mais velhos, muitas vezes confronta-dos com pressões para saírem da empresa ou que caem no de-semprego e não encontram soluções para voltarem ao mercado de trabalho… Tudo isso nos leva a dizer que, ao contrário do que alguns pretendem fazer crer, que a competitividade deve sobre-por-se a todo e a todos, a economia deve ter como referência cen-tral as pessoas em todas as suas vertentes. As relações de traba-lho e o respeito pelos direitos dos trabalhadores são fundamen-tais. Quando se alterou a legislação do trabalho, elegeu-se como pressuposto o aumento da competitividade das empresas e isso não se verificou. O que se verificou foi um desequilíbrio nas rela-ções de trabalho, com prejuízos evidentes para os trabalhadores aos mais diversos níveis, nomeadamente do ponto de vista da sua

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23própria saúde. Ora, se queremos uma sociedade desenvolvida, temos que tomar medidas preventivas, desde logo alterando o que está mal, melhorando as condições de trabalho – e aqui é ne-cessário ter uma grande atenção em relação aos horários de tra-balho – e valorizando os trabalhadores, que são o bem mais pre-cioso que este país tem. Se isto for feito, então encontraremos o tal caminho da mudança, que se diz ser necessária fazer mas que é preciso concretizar.

Que medidas proporá a CGTP na concertação social ao nível da legislação laboral?AC – De há muito tempo a esta parte, a primeira coisa que

dissemos foi que não subscrevíamos o acordo de memorando da Troika por o mesmo estar indissociavelmente ligado à acentuação das desigualdades e ao aumento da pobreza laboral. Em segundo lugar, se se constata que aquilo que foi feito foi mal feito, então tem que se corrigir e, como tal, o que continuamos a defender é que um conjunto de normas gravosas da legislação laboral seja revogado. Em terceiro lugar, é necessário dar um novo estímulo à contratação colectiva, o que implica que os sindicatos e as asso-ciações patronais estejam ao mesmo nível e não como neste mo-mento sucede, em que as associações patronais beneficiam de um instrumento chamado caducidade para imporem a destruição da contratação colectiva ou chantagearem os sindicatos para as-sinarem acordos com normas inferiores às que a lei geral estabe-lece como mínimo. Depois, temos a questão da qualidade do em-prego. O combate ao desemprego e à precaridade é indissociável da estabilidade e da segurança no emprego. E a estabilidade das famílias tem uma ligação muito directa com a situação do traba-lhador e da trabalhadora. Portanto, se as pessoas viverem angus-tiadas, terão certam ente gravíssimos problemas de saúde, com todas as implicações do ponto de vista económico que resultam para a própria sociedade, nomeadamente em relação ao Serviço Nacional de Saúde. Por outro lado, pensamos que a questão da distribuição da riqueza é fundamental. Portugal é um dos países mais desiguais da União Europeia, o que implica que a riqueza seja distribuída de outra forma, que os salários dos trabalhadores melhorem, que haja outra atenção relativamente à situação dos desempregados, que fizemos os nossos jovens, a geração mais qualificada de todas e que não nos esqueçamos daqueles que tra-balharam e ajudaram a construir este país, que são os idosos.

Os trabalhadores reconhecem na CGTP um grande motor na defesa dos seus interesses em frentes contra os salá-rios, a precaridade e o desemprego mas, na verdade, pa-

recem ter vindo a alhear-se do seu papel fundamental da sindicalização… A que se deverá este fenómeno?AC – Nós não temos uma visão assim tão catastrófica da si-

tuação. Claro que temos hoje uma situação mais difícil da que te-ríamos há 20 ou 30 anos atrás, que não está desligada da destrui-ção de 500 mil postos de trabalho, que resultou do período da Troika nem do facto de termos mais de um milhão de trabalhado-res com vínculos precários, havendo hoje muito medo de as pes-soas dizerem à entidade patronal que pretendem descontar, por via dela, directamente para o sindicato… Mas devo dizer que, ain-da recentemente no nosso relatório de actividades, relativo a 2016, constatámos que sindicalizámos mais de 25 mil trabalhado-res em Portugal, a maioria mulheres e cerca de 15 por cento de jovens… Portanto, continua a haver aqui um espaço e, embora entendamos que devemos ir muito mais longe, consideramos que não existe neste momento um afastamento dos trabalhadores dos sindicatos. Quanto muito, haverá o medo das associações patro-nais de permitirem a entrada dos sindicatos nos locais de trabalho para que se faça então o verdadeiro diálogo social.

ANTÓNIO AUGUSTO, COORDENADOR DO STAL AVEIRO

“O consumo abusivo de álcool não se resolve pela mera imposição de regulamentos”

Que avaliação faz da realização deste 2º Seminário de Se-gurança e Saúde no Trabalho?António Augusto (AA) – Este seminário vem na sequência

de um estudo que realizámos no seio do STAL com a intenção de projectarmos uma situação que, cada vez mais, vamos constatando na administração local e se prende com o stress, o assédio moral e o assédio sexual. São situações que se vão alastrando num âmbito muito amplo, em que os próprios presi-dentes de câmara instigam e isolam os trabalhadores pelo sim-ples facto de serem sindicalistas. Com estes oradores, tentá-

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mos demonstrar aqui que o STAL está atento a este tremendo fenómeno de stress e de assédio.

Constatámos aqui uma reclamação de assédio político perpetrado por autarquias, que são eleitas e devem obri-gação à Constituição da República… Isto é possível no Portugal de Abril?AA – Infelizmente, é possível… A título de exemplo, este

seminário era aberto a todos os trabalhadores da administra-ção local e houve duas câmaras municipais do distrito de Aveiro que tentaram impedir a sua participação. Falamos de uma for-mação que nem sequer é paga, uma vez que somos nós que assumimos os custos mas, mesmo assim, tentaram impedir a participação dos trabalhadores neste seminário… No Portugal de Abril, isto é possível porque temos presidentes de câmaras políticos que invejam os sindicalistas que defendem os traba-lhadores e os confrontam com estas situações quotidianas.

O tema deste encontro prende-se com questões de saúde laboral que preocupam o STAL… Em que medida podere-mos falar em precaridade na administração pública?AA – Existe, principalmente, muita precaridade na adminis-

tração local… Temos trabalhadores, como assistentes opera-cionais, que auferem o salário mínimo nacional, outros com contractos a recibos verdes e outros sob conceitos de trabalho temporário que não se orientam por regras de estabilização com o trabalhador, que levam as autarquias a recorrer a progra-mas de trabalho, criando alta precaridade na administração pú-blica. É uma questão sob a mira dos sindicatos, que está na concertação social, temos ouvido que existem movimentos no sentido de resolver os problemas dos trabalhadores a recibos verdes, CEIS e CEIS + nas autarquias e na administração pú-

blica e esperamos que, no mais curto prazo possível, o Gover-no trate com as centrais sindicais e legisle sobre esta política de precaridade.

Este seminário subordina-se ao consumo de substân-cias psicoactivas. Em que medida integra esta temática a agenda de preocupações do dirigentes sindicais?AA – É verdade que esta temática preocupa… E isto foi feito

porque a administração local é um pólo de grande instabilidade de trabalho, em que entre os operadores de trabalhado, hoje chama-dos assistentes técnicos, homens das obras, das estradas, das valas, etc., muitos abusam de substâncias como o álcool, como aqui foi falado. E, como coordenador do STAL Aveiro, tenho iden-tificado ao longo deste mandato, pelo distrito fora, problemas rela-cionados com o abuso de álcool e de substâncias psicoactivas no seio destes trabalhadores. Alertámos para isso e convidámos mui-tos trabalhadores a estarem presentes neste seminário, também para os chamarmos à responsabilidade e os sensibilizarmos para a procura de ajuda. E da parte das autarquias terá que haver sen-sibilidade perante estes trabalhadores que, apesar de muito mal pagos e com contractos precários, alguns a part-time, dão o litro no seu dia-a-dia. Existem muitos exemplos disso na administra-ção local e, se nos referirmos às juntas de freguesia então, é “ex-traordinário”, precisamente porque não existe regulamentação para isto. Por isso esperamos que a concertação social, muito ur-gentemente, avance para a legalização de toda esta gente no âm-bito da administração local. No que concerne em particular à questão do álcool, habitualmente, as autarquias pensam que con-seguem resolver os problemas dos trabalhadores pela mera impo-sição de regulamentos, esquecendo que esses regulamentos têm que ser aprovados pela Comissão Nacional de Dados e obrigam à existência de técnicos credenciados para realizarem testes aos trabalhadores. Tivemos exemplos gritantes em Aveiro, em que al-gumas câmaras impunham esses regulamentos e aplicavam pro-cessos disciplinares a trabalhadores e, depois de recorrermos aos tribunais, foi claramente dito aos autarcas que, em vez de conde-narem esses trabalhadores, deviam tentar ajudá-los e recuperá--los. Felizmente, já temos conseguido que algumas câmaras des-te distrito recuperam estes trabalhadores e refiro-me não só a tra-balhadores como a técnicos superiores com adição ao álcool, que logo de manhã manifestavam estar alcoolizados… Este seminário serve exactamente esse propósito de sensibilização. Temos mui-tos técnicos de autarquias e chefes de gabinetes que procuram saber o que melhor poderão fazer para obterem uma melhor saú-de mental nos seus serviços.

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26Segunda iniciativa contou com 300 participantes:

1º Congresso Nacional da Economia Social 2017

Decorreu, no passado dia 18 de Abril, na Póvoa de Varzim, a Sessão Temática “A Economia Social e o relacionamento com o Estado”, a segunda iniciativa inserida no âmbito do Congresso Nacional da Economia Social, que contou com a presença de figu-ras relevantes para o sector e cerca de 300 participantes. Na ses-são de abertura, numa reflexão global sobre o sector da economia social, estiveram presentes o Ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, José António Vieira da Silva, o Presidente da Agros e anfitrião da iniciativa, José Fernando Capela, o Padre Ví-tor Melícias e o Presidente da Comissão Organizadora do Con-gresso Nacional da Economia Social, Francisco Silva.

O evento contou com a apresentação, por parte do presidente da Direcção da CASES, Eduardo Graça, do livro “Conta Satélite da Economia Social”, um trabalho conjunto do INE e da Coopera-tiva António Sérgio para a Economia Social. A 2.ª sessão temática do Congresso Nacional da Economia Social foi encerrada pelo Comendador Manuel Santos Gomes, Presidente da CONFAGRI e pelo Padre Vítor Melícias.

Dependências acompanhou o evento e, no final, entrevistou o Ministro do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, José An-tónio Vieira da Silva.

VIEIRA DA SILVA, MINISTRO DO TRABALHO, SOLIDARIEDADE E SEGURANÇA SOCIAL“É fundamental aplicar critérios de transparência na concessão de apoios”

Falamos aqui em economia social, as contas revelam 14 mil milhões investidos e direccionados para o sec-tor… Será preciso fazer mais? Está o Governo a ponde-rar aplicar mais medidas que favoreçam o sector?Vieira da Silva (VS) – Sim, consta do Programa de Gover-

no um programa nacional de apoio à economia social, movi-mento que, como vimos, agrega muitos e diferentes sectores, desde as cooperativas às IPSS, e alguns desses mecanismos assentam em programas específicos para esses sectores. O Governo está muito empenhado em reforçar o papel da econo-mia social no que respeita precisamente às respostas sociais, mais investimento e estabilidade no apoio às instituições que trabalham no domínio social, seja na primeira infância, nos mais idosos ou nas pessoas com deficiência, com um conjunto de medidas que estão a ser tomadas e algumas já no terreno para reforçar o papel do Estado no apoio a essas instituições. Obviamente, este trabalho do congresso irá também permitir que o Governo e o Estado no seu todo tenham um interlocutor mais estruturado, que permita organizar de forma mais eficaz esta relação antiga, exigente e sempre difícil entre o Estado e o sector social. Agora, o mais importante é valorizar este sec-tor, cujos números são, como vimos, muito impressionantes, com 6 por cento do emprego em Portugal e esperamos que continue a ser um pilar da recuperação económica e da cria-ção de emprego, como vai sucedendo.

Mas, em concreto, haverá já medidas de apoio preconi-zadas para o próximo Orçamento de Estado?VS – Sim, iremos muito brevemente, por exemplo, no sec-

tor social, assinar o acordo para os próximos dois anos e será muito brevemente divulgado um conjunto de iniciativas para reforçar a articulação do Estado com estes sectores. Existem dimensões que são transversais, como tudo o que tenha a ver com fiscalidade… E o Governo está disponível e empenhado

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para colaborar com as organizações do sector no estudo e na procura de soluções que assegurem que não se verifique uma descriminação deste sector e que haja incentivos positivos para o seu crescimento. Principalmente porque existe uma di-mensão em relação à qual pouco falamos, a dimensão territo-rial. Em muitas economias locais, o sector social é o principal empregador e a principal actividade. Já hoje são transferidos meios financeiros muito significativos para esse sector e pre-tendemos continuar a fazer com que isso aconteça.

Também se ouviram aqui algumas críticas ao sector da economia social, designadamente no que concerne à dependência… Porquê essas críticas hoje?

VS – Não creio que seja hoje… Essas críticas sempre exis-tiram… Quando o Estado se relaciona com milhares de institui-ções e, muitas vezes, com apoios financeiros, é expectável que haja quem condicione. O mais importante é saber como depois respondemos a esses riscos. Julgo que é fundamental aplicar critérios de transparência na concessão de apoios e jul-go que é isso que estamos a fazer em todas as áreas. E há que referir que esses apoios não são mais do que a contratua-lização da prestação de serviços que são prestados a bem da comunidade, daí que pretendamos que a justeza e equidade desses apoios sejam garantidas através de mecanismos de clara transparência. Nomeadamente, recorrendo sempre a concursos públicos.

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