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» 46 — março 2014 GENÉTICA Seleção acelerada Ainda em expansão no Brasil, os testes genômicos apresentam a proposta de diminuir o intervalo de tempo necessário para “provar” o potencial de um animal e, consequentemente, acelerar o melhoramento genético, aumentando a margem de lucro nas propriedades. Como são realizados? Quais suas vantagens?

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Reportagem sobre seleção genômica de gado leiteiro. Veículo: Revista Inforleite. Edição 46 - Março 2014. Título: Seleção acelerada.

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Seleção aceleradaAinda em expansão no Brasil, os testes genômicos apresentam a proposta de

diminuir o intervalo de tempo necessário para “provar” o potencial de um animal e, consequentemente, acelerar o melhoramento genético, aumentando a margem de

lucro nas propriedades. Como são realizados? Quais suas vantagens?

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Como seria se o produtor de leite pu-desse decidir sobre a seleção gené-

tica de seu rebanho logo nos primeiros meses de vida de uma bezerra? Mane-jo sanitário e nutricional direcionado, diminuição no tempo e nos custos em seu programa de seleção, definição de quem vai ser doadora ou quem vai ser matriz são só algumas das respostas. Com essas informações, dúvidas seriam eliminadas e o pecuarista ganharia tem-po e dinheiro em seu projeto. Ainda em expansão no Brasil, os testes genômicos apresentam exatamente essa proposta: diminuir o intervalo de tempo neces-sário para “provar” o potencial de um animal e, consequentemente, acelerar o melhoramento genético, aumentando a margem de lucro nas propriedades.Na genômica, analisa-se o material genético dos indivíduos. A partir de uma porção de pelos, pode-se extrair o DNA – molécula que contém todas as informações de um ser, desde a cor dos olhos até se ele é um bom produtor de leite, no caso bovino. Tudo isso apenas com uma amostra de material (pelo, sangue ou sêmen), obtida em qualquer fase de sua vida, e que é processada em um curto período de tempo.A “mágica” acontece por meio dos cha-mados marcadores moleculares. De acordo com o pesquisador da Embra-pa Gado de Leite, Dr. Marcos Vinicius Barbosa da Silva, trata-se de pequenas regiões do DNA que apresentam as diferenças entre os indivíduos de uma mesma espécie. “Os marcadores po-dem indicar se no DNA existe um alelo (forma alternativa de um gene) que está relacionado ao maior ou menor valor de uma característica de impor-tância econômica”, explica. É selecionar animais com muita ciência!

A era da precisãoNo setor agrícola, o conceito de “Agri-cultura de Precisão” ilustra como é possível intensificar o poder de deci-são, ainda que não só pela genômica. De acordo com definições do MAPA, trata-se de um sistema de gestão que busca obter resultados melhores com

tecnologias que anteveem questões de ambiente e de tempo, levando em conta, por exemplo, as necessidades específicas de cada tipo de solo, antes do plantio. É uma forma de maximizar a produção e evitar problemas, permitin-do que o agricultor esteja no controle de seu negócio.Como seria se tivéssemos uma “Pecu-ária de Precisão”? A partir desse ques-tionamento, alinhando com a proposta da genômica, é que uma cooperativa multinacional americana voltada para inseminação artificial de bovinos lança, este ano, um novo teste genômico no mercado. A tecnologia já é explorada por empresas do ramo de saúde ani-mal, mas se torna inovadora, pois, pela primeira vez, o resultado do teste será avaliado por profissionais especiali-zados em genética, seleção e melho-ramento de bovinos, voltados para o mercado da inseminação artificial (IA).A cooperativa, que tem uma empresa subsidiária no Brasil, passa a disponi-bilizar análises genômicas, partindo do conceito da Precisão. De acordo com o médico veterinário Roberto Arana, gerente de produto leite da empresa, “as características no teste genômico são as mesmas observadas nos habi-tuais testes de progênie, porém, em um período de tempo muito reduzido, em qualquer fase da vida do animal e com até 75% de confiabilidade no re-sultado”. Através do uso de milhares de marcadores moleculares no DNA de fê-meas puras das raças Holandesa, Jersey ou Pardo Suíço, será possível descobrir “quais delas, por exemplo, se destacam na produção de leite”, acrescenta. Outro ponto é que, por se tratar de uma organização voltada para IA, sabe-se que

o representante técnico está apto a re-comendar o uso do touro mais adequado para cada fêmea que teve seu DNA ana-lisado. “O objetivo é, também, introduzir o pecuarista em um programa de me-lhoramento genético, realizando os aca-salamentos dirigidos ou os corretivos”, diz Arana. “Assim, são proporcionadas ferramentas que aumentam o poder de decisão e aceleraram o ganho genético no rebanho”, conclui.O fato da empresa propor não só o uso da ferramenta, mas também uma assessoria ao criador, é algo interes-sante para o pesquisador da Embrapa, Marcos Vinícius. “É importante, tam-bém, estimular o criador a realizar o controle leiteiro massivo e a seguir o

De acordo com o pesquisador Marcos Vinicius, em 2009, o Bovine Hapmap Consortium, um consórcio formado por várias instituições de pesquisas e asso-ciações de raças bovinas ao redor do mundo (incluindo a Embrapa), publicou um estudo sobre o se-quenciamento do genoma bovi-no, usando uma amostra de DNA de uma fêmea da raça Hereford.Com os resultados desse traba-lho, foi possível mapear mais de 33.000 genes, além de identificar milhões de marcadores molecu-lares do tipo SNP (Polimorfismo de Nucleotídeo Único). Usando as informações de tais SNPs, uma empresa multinacional america-na, em parceria com o USDA e universidades dos EUA e Canadá, desenvolveu um chip de DNA que permite a identificação de cerca de 54.000 sequências de SNPs em um animal. Com essa ferra-menta, foi possível implementar a informação genômica em vários programas de seleção de bovinos leiteiros de diversos países.

HISTÓRIA GENÔMICAOS TESTES GENÔMICOS pROpõEM dIMINuIR O INTERvAlO dE TEMpO NECESSáRIO pARA “pROvAR” O pOTENCIAl dE uM ANIMAl E, CONSEquENTEMENTE, ACElERAR O MElHORAMENTO GENéTICO

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programa de melhoramento genético. Essas ações irão potencializar o uso da genômica”, comenta.

Vantagens genômicasMarcos Vinicius, pesquisador da Embra-pa, ilustra os benefícios com o exemplo de rebanhos de fertilização in vitro (FIV). “Até há pouco tempo, não era possível diferenciar, do ponto de vista de po-tencial genético, os animais que eram irmãos completos. Se o produtor tives-se cinco deles e quisesse escolher um como touro a ser provado pelo teste de progênie, teria que contar com a sorte para optar pelo melhor”. Por meio da genômica, no entanto, é possível “classi-ficar os animais do melhor para o pior, de acordo com a PTA genômico, evitando desperdício de tempo e de recursos para testá-lo”, exemplifica.Com os testes e a identificação precoce de fêmeas geneticamente superiores, especialmente para as características de viés econômico, o gasto na recria é re-duzido, que segundo Marcos Vinicius, é “um dos pontos de estrangulamento da atividade leiteira”. O aumento do ganho genético por geração, a elevação dos lu-cros “pela maior produção de leite e de

sólidos”, adotar medidas mais precisas no manejo reprodutivo e nutricional, excluir animais que são “portadores de alelos relacionados às doenças genéticas”, são mais pontos positivos.Com isso, de acordo com Roberto Ara-na, gerente da empresa de IA, se conhe-ce o ranking dos melhores animais de um rebanho, sejam bezerras, novilhas ou vacas em produção. “Enquanto que se a seleção fosse apenas a partir do teste de progênie, os resultados come-çariam a vir depois de cinco anos, com o teste genômico o produtor poderá decidir sobre o futuro do seu rebanho logo após o nascimento do animal”.

Etapas do testeO processo para realizar o teste é sim-ples. O representante técnico vai até a fazenda e colhe o material. Para isso, são retirados cerca de 20 pelos da cal-da da fêmea, que ficam adequadamente conservados em um cartão de coleta, fornecido pelo técnico.O material é enviado à matriz brasileira da empresa, em São Carlos (SP), e pos-teriormente encaminhado para os EUA, onde ocorre a análise.Dentro de 60 a 90 dias o resultado

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estará nas mãos do representante téc-nico, que levará o diagnóstico para o pecuarista, fazendo as recomendações mais adequadas para cada caso.

Condições para viabilidadeAinda de acordo com Arana, o produtor que tem intenção de utilizar a tecnolo-gia genômica deve atentar se seu pro-jeto pecuário tem boa estrutura física e, principalmente, manejos adequados. “As questões ambientais, zootécnicas, nutricionais e sanitárias devem estar em um nível de organização e controle satisfatórios para que a análise adequa-da do teste possa trazer os melhores resultados para o pecuarista”.Marcos Vinicius, pesquisador da Embra-pa, acredita que muitos pecuaristas ado-tarão o teste, vislumbrando o aumento da rentabilidade, “principalmente aque-les que realmente veem a produção de leite como um negócio”. Ele ressalta ainda que o suporte técnico da empresa e das associações de raças tem “papel fundamental” no processo de expansão da seleção genômica no Brasil.

Melina paixãoBerrante Comunicação

Para a realização do teste são retirados cerca de 20 pelos da calda da fêmea, que ficam adequadamente conservados em um cartão de coleta. O material é enviado para análise e dentro de 60 a 90 dias obtém-se os resultados