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REVISTA DE DI EMPRES ReDE 1 COORDENAÇÃO: HAROLDO MALHEIROS DUCLERC VERÇOSA 1 1 t.. 1 \;4 \\ THOMSON REUTERS rL REVISTA DOS INCLUI VERSÃO ELETRÔNICA DA REVISTA

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REVISTA DE DI

EMPRESReDE

1

COORDENAÇÃO:HAROLDO MALHEIROS DUCLERC VERÇOSA

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THOMSON REUTERS

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO

TJSP - Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 - 2. a Câm. Reserva-da de Direito Empresarial - j . 25.05.2016 - m.v. - rel. Des.Ricardo Negrão - Área do Direito: Comercial/Empresarial;Arbitragem.

SOCIEDADE EMPRESARIAL - Assembleia deliberativa - Discussão acercada validade da reunião diante da ausência de integralizaç5o das ações ad-quiridas - Aplicação da cláusula compromissória à companhia adquirente- Admissibilidade - Eficácia do negócio jurídico de compra e venda queé condicionada à participação da empresa compradora na controlada -Demanda, ademais, que deve ser decidida em procedimento arbitral jávigente.

Veja também Jurisprudência

° RArb33/470 (JRP\2011\1 6625).

Veja ..tarnbém Doutrina

o Compromisso arbitral, de Ana Tereza Palhares Basilio - RArb 41246-254 (DTR\2011\2837).

Registro: 2016.0000396409

Ementa:' ACÓRDÃO - Vistos, relatados e discutidos estes autos de Ap1010342-59.2014.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que e apelanteGrupo Essentium S.L., são apelados Massayoshi Paulo Nishímura, TerukoNishimura, Cristine Tokuzato e Niplan Engenharia 5 A (Niplan Engenha-ria).

1. Nota do Editorial: O conteúdo normativo no inteiro teor do acórdão está disponibiliza-do nos exatos termos da publicação oficial no site do Tribunal.

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCtANA GONÇALVES BAsSANI e MARCELO MAZZOLA.

Revista de Direito Empresarial. vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. RT, out. 2016.

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200 REVISTA DE DIREITO EMPRESARIAL 2016 • REDE 19

COMENTÁRIO -

ARBITRAGEM E DIREITO SOCIETÁRIO

Em julgamento emblemático no ano de 2001, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitu-cionalidade da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996),2 o que foi fundamental para impulsionar essemétodo alternativo de resolução de conflitos.

Antes mesmo do referido julgamento, a doutrina já reconhecia que a arbitragem constitui faculdadee não renúncia ao direito de ação. Na lição de Nelson Nery, "com a celebração do compromisso, aspartes não estão renunciando ao direito de ação nem ao juiz natural. Apenas estão transferindo, des-locando ajurisdição, que, de ordinário, é exercida por órgão estatal, para um destinatário privado'3

Até a edição da Lei 9.307/1996 ("Lei de Arbitragem"), havia quem sustentasse que apenas o com-promisso arbitral tinha o condão de subtrair o litígio do crivo do Poder Judiciário, 4 porém, com onovo diploma legal, as partes passaram a poder convencionar cláusulas compromissórias elegendoessa via alternativa.

• Após a edição da Lei de Arbitragem, a jurisprudência e a doutrina passaram a reconhecer a inexis-tência de qualquer óbice à utilização da arbitragem para solucionar conflitos societários envolvendodireitos patrimoniais disponíveis, embora existam dispositivos na legislação societária que sejam deordem pública e, portanto, indisponíveis.

Contudo, visando a pacificar controvérsia sobre arbitralidade objetiva ou rationae materiae, a Lei10.30312001 incluiu o 5 3.0 ao art. 109 da Lei 6.40411976 ("Lei das S.A."), admitindo a solução dedivergências entre os acionistas e a companhia ou entre os acionistas controladores e minoritáriosmediante a arbitragem?

Em 2015, a Lei 13.129 alterou a Lei 9.307/1996, trazendo importantes inovações para a arbitragem.Nesse contexto, foi finalmente reconhecida a possibilidade de aplicação da arbitragem em litígiosenvolvendo a Administração Pública Direta e Indireta, no caso de direitos patrimoniais disponí-veis, respeitando-se o princípio da publicidade.

Além disso, foi regulada a concessão de tutelas de urgência pelo Poder Judiciário (antes de ins-tituída a arbitragem) e pelos árbitros após a instituição dessa.

Nada obstante, a Lei 13.129 ainda fortaleceu a arbitragem em conflitos societários, por intermédiodas mudanças promovidas na Lei das S.A., especialmente a inclusão do art. 136-A. 6 O referido artigo,

2. Homologação de sentença estrangeira (SE 5.206). No caso, era uma sentença arbitral proferida na Espanha.3. NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal, 6. ed., São Paulo: Ed. RI, 2000

(Coleção estudos de direito de processo Enrico Tulio Liebman; vol. 21), p. 82.4. REsp 1.331.100/BA.5. Art. 109. ( ... )

§ 3 0 O estatuto da sociedade pode estabelecer que as divergências entre os acionistas e a companhia,ou entre os acionistas controladores e os acionistas minoritários, poderão ser solucionados mediantearbitragem, nos termos em que especificar.

6. Art. 136-A. A aprovação da inserção de convenção de arbitragem no estatuto social, observado o quórumdo art. 136, obriga a todos os acionistas, assegurado ao acionista dissidente o direito de retirar-se da com-panhia mediante o reembolso do valor de suas ações, nos termos do art. 45.

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCIANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAll0LA.Revista de Direito Empresarial. vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. RI, out. 2016.

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ARBITRAGEM 201

contemplando solução inspirada no direito italiano, procurou resolver umas das principais contro-vérsias rationaepersonaeou acerca da arbitralidade subjetiva, assegurando ao acionista dissidentefrente à decisão da maioria o direito de retirada.

Estudos recentes revelam que o uso da arbitragem cresceu 73 0/o nos últimos seis anos, com umfluxo financeiro na ordem de R$ 38 bilhões, 7 dados que impressionam e confirmam a mudança deparadigma outrora existente de que o acesso à justiça significa, necessariamente, o ingresso noJudiciário.

Em março deste ano, entrou em vigor o novo Código de Processo Civil ("NCPC"), que reconhe-ceu definitivamente a arbitragem como jurisdição (arts. 30, 5 l.° c/c 42 e 485, Vil),' regulandoquestões importantes, dentre elas, a carta arbitral, isto é, a forma de interiocução entre o juízoarbitral e o Poder Judiciário.

Na verdade, muitos dos dispositivos do NCPC foram inspirados na Lei da Arbitragem (regras queadmitem a flexibilização do procedimento, destacando-se, por exemplo, os negócios jurídicosprocessuais), o que evidencia a força desse método alternativo de disputas e a importância deuma convivência harmoniosa entre o Judiciário e o Juízo Arbitral.

Até porque, como se sabe, as decisões arbitrais - verdadeiros títulos executivos (art. 515, Vil, doNCPC) - não estão sujeitas à revisão estatal, excetos nas hipóteses de nulidade do decisum (arts. 32e 33 da Lei 9.30711996).

OPERAÇÃO SOCIETÁRIA E HIPÓTESE DOS AUTOS

A operação societária estabeleceu a aquisição de 50% das quotas da holding Niplan ParticipaçõesLtda. ("Niplan Participações") de três pessoas naturais ("Vendedores" ou "corréus') e a subscriçãodas ações da controlada Niplan Engenharia S/A ("Nilpan Engenharia" ou "Companhia") pelo GrupoEssentium S. L ("Autora" ou "Grupo Essentium"). O Grupo Essentium e a Niplan Participações cele-braram Acordo de Acionistas da Niplan Engenharia.

§ 1 .0 A convenção somente terá eficácia após o decurso do prazo de 30 (trinta) dias, contado da nuhIiraçoda ata da assembleia geral que a aprovou.§ 2. 0 O direito de retirada previsto no caputnão será aplicável:

- caso a inclusão da convenção de arbitragem no estatuto social represente condição para que os valoresmobiliários de emissão da companhia sejam admitidos à negociação em segmento de listagem de bolsa devalores ou de mercado de balcão organizado que exija dispersão acionária mínima de 25 0/o (vinte e cincopor cento) das ações de cada espécie ou classe;II - caso a inclusão da convenção de arbitragem seja efetuada no estatuto social de companhia aberta cujasações sejam dotadas de liquidez e dispersão no mercado, nos termos das alíneas a e b do inc. 11 do art. 137desta Lei.

7. GRI LLO, Bren no. Soluções em Arbitragem crescem 73% em seis anos, mostra pesquisa. Disponível em {www.conjur.com.br/201 6-jul- 1 5/solucoes-arbitragem-crescem-73-seis-anos-mostra-pesquisa}. Acesso em19.07.2016.

8. Art. 30 Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.§ 1 .0 É permitida a arbitragem, na forma da lei.Art. 42. As causas cíveis serão processadas e decididas pelo juiz nos limites de sua competência, ressalvadoàs partes o direito de instituir juízo arbitral, na forma da lei.Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando: (...) VII - acolher a alegação de existência de convenção dearbitragem ou quando o juízo arbitrai reconhecer sua competência;

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCIANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAzzot..Revista de Direito Empresarial. vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. RT, out. 2016.

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202 REVISTA DE DIREITO EMPRESARIAL 2016 o REDE 19

o resultado da operação contemplada no contrato de compra e venda e respectivos aditamentos

foi a seguinte:

PAULO

ESSENTIUM CRISTIANECCV TER U KO

500/0 1 1 50°/oI NIPLAN PARTICIPAÇOES LTDA. <-

66,63%

16,67% NIPLP,N ENGENHARIA SIA 16,67%

Em síntese, a Autora ajuizou a demanda contra os Vendedores buscando anular assembleia geralda Niplan Engenharia, na qual foi deliberada a suspensão do seu direito de voto, sob a alegação deque seria devedora da Companhia, por não ter integralizado as ações subscritas desta. A sentençaextinguiu a ação, sem resolução de mérito, por reconhecer a existência de cláusula compromissórianos instrumentos da operação societária.Em grau de recurso, o Tribunal, por maioria de votos, manteve a decisão de primeiro grau, reconhe-cendo que: i)a Niplan Participações é a controladora da Niplan Engenharia; ii)as partes acordaramque o contrato de compra e venda da Niplan Participações estava condicionado à assinatura doacordo de acionistas da Niplan Engenharia; e iii) no acordo de acionistas, ao qual a Niplan Engenha-ria anuiu, foi convencionada a arbitragem.Em vista disso, o tribunal entendeu que seria aplicável a cláusula arbitral à Niplan Engenharia, aindaque esta não tenha participado do contrato de compra e venda, sobretudo porque a eficácia donegócio jurídico de compra e venda foi condicionada à participação do Grupo Essentium na NiplanEngenharia.Por outro lado, o voto vencido do Exmo. Des. Carlos Alberto Garbi entendeu que a Niplan Engenha-ria - que não figurou como parte no contrato de compra e venda de ações da Niplan Participações- não firmou cláusula compromissória e, por isso, não poderia se sujeitar à arbitragem. Consignouque participaram do acordo de acionistas apenas os sócios majoritários (Niplan Participações eGrupo Essentium), de modo que a cláusula compromissória não poderia ser oposta aos acionistaspessoas físicas que figuram no polo passivo da demanda. Além disso, defendeu que a cláusula arbi-tral se aplica exclusivamente àqueles que firmaram o acordo de acionistas e diferenciou a hipótesedos autos daquelas em que a cláusula compromissória é estabelecida no estatuto social, quandoseria oponível a todos os acionistas, independentemente de anuência.

COMENTÁRIOS

Antes de mais nada, convém analisar a arbitralidade objetiva e subjetiva da controvérsia.

Nessa toada, o primeiro desafio é saber se o direito de voto seria um direito patrimonial disponível.Em interpretação afoita, poder-se-ia identificar o direito de voto apenas como um direito político,

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCIANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAllOLA.

Revista de Direito Empresarial. vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. RT, out. 2016.

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não patrimonial ou disponível, e concluir pela violação do art. 1.0 da Lei de Arbitragem. Todavia, seassim fosse, não exsurgiriam tantos conflitos societários e confrontos nas negociações das opera-ções societárias pelo chamado poder de controle ou pelo direito de veto.

Certamente, quanto mais um acionista puder influenciar nas decisões de uma companhia, maiorserá o proveito econômico que advirá desta e, consequentemente, maior valor terá sua participaçãosocietária.

Nelson Eizirik entende que, apesar de o direito de voto ter conotação política, apresenta claro viéspatrimonial, 10 entendimento que é partilhado por Pedro A. Batista Martins:11

Assim, parece-nos não existir óbice à arbitralidade da suspensão do direito de voto.

No âmbito desse imbróglio, a quem seria oposto o procedimento arbitral? Ou melhor, quem teriaefetivamente escolhido a via arbitral como forma de solução de controvérsias? O acórdão ora exa-minado tratou detalhadamente da arbitralidade subjetiva.

Não restam dúvidas de que tanto a Autora como os Vendedores ou Corréus convencionaram aarbitragem para resolver "todas as controvérsias decorrentes da interpretação e/ou execução" do

1 Contrato de Compra e Venda de Quotas da Niplan Participações ("CCV') . 12 No CCV, aliás, a ho/dingNiplan Participações não só constou como interveniente anuente, como efetivamente assinou oreferido CCV.

9. Art. 116. Entende-se por acionista controlador a pessoa, natural ou jurídica, ou o grupo de pessoasvinculadas por acordo de voto, ou sob controle comum, que:a) é titular de direitos de sócio que lhe assegurem, de modo permanente, a maioria dos votos nasdeliberações da assembleia geral e o poder de eleger a maioria dos administradores da companhia; eb)usa efetivamente seu poder para dirigir as atividades sociais e orientar o funcionamento dos órgãos dacompanhia. ( ... ).

10. "0 direito de voto, embora tido como "político", apresenta uma natureza patrimonial, já que, além deconsistir em atributo que acrescenta valor à ação, usualmente é exercido tendo e vista os interesses doacionista na eficiência da gestão empresarial, que redundará na maior geração de lucros. Ao exercer oseu direito de voto, não está o acionista, em principio, cumprindo um dever de cidadania, mas visando àotimização do retorno de seu investimento. Daí decorre a arbitralidade de questões ligadas ao direito devoto, como são, por exem p lo, aquelas relacionadas ao seu.exercicio em situações de conflito de interesseou de abuso do poder de controle. Com a adoção do principio de que são arbitráveis todas as questões quepodem ser decididas por assembleia geral, e levando-se em conta que o árbitro pode aplicar normas decaráter imperativo, admite-se, por exemplo, a arbitralidade de: impugnação de decisão de assembleia geral."(EIZIRIK, Nelson. Cláusula compromissória estatutária - A Arbitragem na Companhia. Disponível em [www.migalhas.com.br/dePeso/1 6,M1 1 45329,51045-Clausula+compromissoria+estatutaria+A+arbitragem+na+companhia]. Acesso em 15.07.2016.

11 "(...) No meu entender, sim; afinal, muito embora o exercício do voto encerre direito político, o votoassegurado ao acionista não se confunde, apesar de se tocarem, com a manifestação de cidadania. (...)O voto cívico funda-se em interesses da pátria, eminentemente político-ideológico, enquanto o votoacionário é marcado por viés eminentemente econômico-financeiro, haja vista a vocação intuituspecuniaede todas as S.A. A lei não autoriza a criação de S.A. que não tenha finalidade lucrativa. Todas elas devem,por força legal, visar à produção de riqueza e a distribuição de lucros. ( ... ) Com essa flexibilização legislativaque permite, inclusive e sob certas condições, seja pactuado quem titulará o exercício do voto no usufruto,no penhor e na alienação fiduciária constituídos sobre as ações, restou afastada a natureza indisponíveldesse direito, o que autoriza afirmar enquadrar-se na hipótese de arbitralidade prevista na Lei 9.30711996as disputas que envolvam o exercício do voto" (MARTINS, Pedro A. Batista. Arbitragem no Direito Societário,Revista de Arbitragem e Mediação, RArb 39, p. 55- 65).

12. Cláusula 12.1, Solução de Controvérsias do Contrato de Compra e venda celebrado em 11.10.2011.

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUDANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAzzo[A.Revista de Direito Empresarial. vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. RI, out. 2016.

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204 REVISTA DE DIREITO EMPRESARIAL 2016 *'REDE 1 9

Além disso, como bem ressaltou o voto vencedor, a assinatura do Acordo de Acionistas da con-trolada Niplan Engenharia ("AA") era condição para a consumação ou fechamento da operaçãosocietária. Tanto é assim que a minuta do AA constou do CCV como Anexo III, contendo cláusulacompromissória de teor quase idêntico àquela do CCV.Note-se que, ainda que os Corréus não sejam partes do AA, uma vez que o referido acordo figuroucomo Anexo lii do CCV (possivelmente sendo até mesmo rubricado pelos Corréus), o argumentode que a arbitragem não poderia ser oposta às pessoas físicas detentoras diretamente de 167 0/o eindiretamente de 33,315% do capital social da Niplan Engenharia não merece prosperar. Até porque,não seriam acionistas minoritários que discordaram da cláusula compromissória ou mesmo que adesconheciam.Na verdade, não há nada nos autos que indique que os Corréus se oporiam à realização da arbitra-gem. Pelo contrário, o Réu Teruko Nishimura alegou, preliminarmente, em sua contestação que oJudiciário não seria competente para solucionar aquela controvérsia, pois (i) o CCV continha cláu-sula compromissória; (ii) a matéria objeto da controvérsia derivava do CCV e do inadimplemento daAutora em integralizar as açõessubsiitas, conforme previsto naquele Contrato; e (HI) que a própriaAutora teria requerido ao Juízo Arbitral a suspensão da exigibilidade da obrigação de integralizar eo abatimento do preço pago na operação societária prevista no CCV, o que, inclusive, se comprovapelo requerimento de arbitragem acostado às fls. 210.Pois bem, superada a análise em relação aos Vendedores Corréus, outra questão mais sensívelgira em torno da aceitação (ou extensão de efeitos) da cláusula compromissória pela controladaNiplan Engenharia, pessoa jurídica dotada de personalidade distinta daquela de seus acionistas,diretos e indiretos. Nesse particular, como bem assinalado no voto vencido, não consta do AAjuntado às fls. 197 a assinatura da Niplan Engenharia. Ressalva-se, porém, que a qualificaçãocompleta da controlada Niplan Engenharia constou do preâmbulo do CCV, pois figurou comointerveniente anuente e recebeu a definição de "Companhia", tendo sido mencionada ao longode todo AA.Sobre o tema, o Professor Wald, citando o RE 73.208, entende que, embora a arbitragem deva de-correr da vontade manifestada pelas partes no momento, é admissível que a convenção se estendaà sociedade que faça parte do mesmo grupo societário e que tenha efetivamente participado donegócio jurídico, desde que observados os seguintes requisitos:13

"a) a sociedade tem que ter desempenhado um papel ativo nas negociações das quais decorreu oacordo no qual consta a cláusula compromissória;

b)a sociedade deve estar envolvida, ativa ou passivamente, na execução do contrato no qual constaa cláusula compromissória;

c)a sociedade tem que ter sido representada, efetiva ou implicitamente, no negócio jurídico.

88. A doutrina brasileira admite a existência da união dos contratos e dos contratos conexos sempreque, por vários instrumentos, se pretende, na realidade, atingir um único fim, assim como o faz ajurisprudência dos tribunais."A nosso ver, essa é exatamente a hipótese do caso concreto, em que a suspensão do direito de votona controlada - veículo objeto da operação societária - decorre do inadimplemento do CCV. Valeressaltar, ainda, que a Niplan Participações é uma holding e, portanto, suas atividades operacionaissão exercidas indiretamente, através das suas controladas.

13. WALD, Arnold. A arbitragem, os grupos societários e os conjuntos de contratos conexos. Revista deArbitragem eMediação. vol. 2, p. 31-57.

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCIANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAzzo.

Revista de Direito EmpresariaL vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. RT, out. 2016.

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Sob outro prisma, é preciso perquirir a real vontade das partes que participaram da operação societária.Parece-nos claro que as partes decidiram de boa-fé submeter os conflitos da controladora e da contro-lada à arbitragem, eis que, como visto: (1) o CCV continha cláusula compromissória; (ii) o AA, anexo III doCCV, também continha cláusula muito semelhante; (iii) a celebração do AA era condição ao fechamentoda operação; e (iv) a qualificação completa da controlada constou do preâmbulo do AA.

Como se sabe, são múltiplas as vantagens da arbitragem, como a confidencial idade, a possibilidadede escolha dos experts que figurarão como árbitros, a celeridade tão importante ao dinamismo dasrelações comerciais e societárias e, ainda, a ausência de grandes formalismos.

Por outro ângulo, notamos que o contrato social da Niplan Participações e o Estatuto Social da Ni-plan Engenharia não contêm cláusula de foro, tampouco cláusula compromissória. Haveria, então,um óbice à adoção do procedimento arbitral para a solução do conflito?

Tal omissão, a nosso ver, não criaria óbice à extensão da cláusula compromissória às sociedadesenvolvidas na operação, pois, caso as partes assim pretendessem, teriam incluído de forma expressaa cláusula de eleição de foro nos referidos atos societários, em contraponto à eleição da via arbitralno AA. Ora, considerando que todos os contratos decorrem de operação econômica única - queconcorre para o mesmo objeto - e que os personagens estiveram presentes quando da inserçãoda cláusula compromissória no CCV e no AA, seria um formalismo exacerbado, dentro do contextoda operação, não admitir a arbitragem, ainda mais quando as partes afastaram tal formalismo dasolução das controvérsias.

Entretanto, se o Estatuto Social da Niplan Engenharia previsse expressamente cláusula de eleição deforo, não poderia o Tribunal admitir a extensão da cláusula de arbitragem a esta controlada, pois avontade das partes de exclui-ia da arbitragem deveria ser respeitada.

Por fim, há nos autos evidências de que a Autora ingressou com procedimento arbitral para sus-pender a obrigação de integralizar sua participação direta na Niplan Engenharia (fls. 210). Nessecontexto, indaga-se: por que, então, recorreu ao Judiciário para anular a assembleia? Tudo leva acrer que as dúvidas acerca da arbitralidade subjetiva (suspensão do direito de voto) e objetiva (opo-nibilidade à credora e controlada Niplan Engenharia) seriam a justificativa para tanto, em virtudeda complexidade desses temas frente à adoção da arbitragem. Contudo, é relatado nos autos quea Autora perdera a arbitragem, violando a regra que proíbe o venire contra factum proprium, umdos cânones da boa-fé objetiva. Contudo, a confidencial idade desse procedimento não nos permitecofiimar tàiasertiva.Em suma, a questão é complexa e o tribunal arbitral terá que examinar se a suspensão do direitode voto foi legitima ou não, e ainda se seguiram todos os preceitos e procedimentos estipuladosna Lei das 5/A e nos contratos da operação societária. Porém, não admitir a extensão da cláusulacompromissória à controlada Niplan Engenharia seria afastar a real vontade das partes da operaçãosocietária objeto da lide.

LUCIANA GONÇALVES BASSANI

Pós-graduada em Direito e Economia da Empresa pela Fundação Getúlio Vargas.Especializada em Direitos dos Contratos pelo Centro de Extensão Universitária, São Paulo.

Graduada em Direito pela Universidade de São Paulo. [email protected]

MARCELO MAzzoI.

Mestrando em Direito Processual pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).Vice-Presidente de Propriedade Intelectual do Centro Brasileira de Mediação

e Arbitragem (CBMA). [email protected]

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCIANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAzzo.

Revisto de Direito Empresarial. vol. 19. ano 4. p. 199-215. Sã Paulo: Ed. RT, out. 2016.

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206 REVISTA DE DIREITO EMPRESARIAL 201 6 o REDE 19

Acordam, em 2a Cãm. Reservada de Direito Empresarial do TJSP, proferir aseguinte decisão: "Por m.v., negaram provimento ao recurso, vencido o 2.° de-sembargador, que o provia, e, no prosseguimento, nos termos do art. 942 do CPC,passaram a compor a turma julgadora os Exmos. Desembargadores Fabio Tabosae Campos Mello. Reiniciado o julgamento, por m.v., negaram provimento aos re-cursos, vencidos o 2.° desembargador - que declara voto - e o 40 desembargador,que o proviam.", de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Des. Carlos Alberto Garbi (Presi-dente), Caio Marcelo Mendes de Oliveira, Fabio Tabosa e Campos Mello.

São Paulo, 25 de maio de 2016 - Ricardo Negrão, relator

Voto: 31.795 (Emp — Dig)

Ap 1010342-59.2014.R.26.0100

Comarca: São Paulo

Apelante: Grupo Essentium S.L.

Apelados: Massayoshi Paulo Nishimura e Outros

COMPETÊNCIA - Tribunal Arbitral - Ação anulatória de deliberação assem-blear - Alegação de que a suspensão do direito de voto da autora, sob o equivo-cado argumento de que não integralizou as ações da companhia, configura abusode direito - Ademais, mera subscrição das ações torna a demandante acionistas,conferindo-lhe o direito de voto - Existência de cláusula compromissória no con-trato de compra e venda das cotas sociais de sociedade limitada que é controladorada companhia cuja deliberação deseja anular - Existência de cláusula compromis-sória, também, no acordo de acionistas da companhia - Aplicabilidade da cláu-sula compromissória à companhia ainda que não tenha participado do contratode compra e venda, pois condicionada a eficácia do negócio jurídico de comprae venda à participação da autora na companhia - Exercício do direito de voto éconsequência direta da aquisição das ações pela demandante que, por sua vez, estáprevista no contrato de compra e venda das cotas sociais da sociedade controlado-ra - Acordo de acionistas da companhia disciplina, ademais, a forma de convoca-ção das assembleias e o quórum para deliberação, uma das matérias invocadas naexordial - Existência, ainda, de procedimento arbitral cujo objeto é a inocorrênciade integralização das ações, sendo recomendável que a validade da deliberaçãoassemblear pela suspensão do voto, com fulcro no art. 120 da LSA, seja dirimidatambém pelo Tribunal Arbitral - Extinção sem resolução do mérito - Apelaçãoimprovida.

Dispositivo: Negaram provimento aos recursos, por m.v., vencidos o 2.° desem-bargador - que declara voto - e o 4.° desembargadores, que dariam provimento àapelação.

Recurso de apelação interposto por Grupo Essentium S.L. dirigido à r. sen-tença proferida pela Dra. Andréa Galhardo Palma, MM. Juíza de Direito da E. 3

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCIANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAllOLA.Revista de Direito Empresarial. vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. R1 out. 2016.

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ARBITRAGEM 207

Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo que, depois de reconhecer aexistência de cláusula compromissória, extinguiu sem resolução do mérito a açãoanulatória deduzida em face de Massayoshi Paulo Nishimura, Cristiane Tozukatu,Teruko Nishimura e Niplan Engenharia S/A.

Em razões recursais a autora sustenta ser inaplicável a cláusula arbitral ao casoconcreto, pois o compromisso de compra e venda onde ajustada não foi assinadopela Niplan Engenharia S/A.

Pede que, acolhida a preliminar, o mérito seja julgado com fulcro no art.515, § 3•0, do CPC/1973 (com redação correspondente no art. 1.013, § 3.°, 1, doNCPC). Reitera que as pessoas naturais agiram com abuso de direito ao suspenderseu direito de voto sob o equivocado argumento de que não integralizou as açõesda Niplan Engenharia S/A, defendendo ainda que a mera subscrição as ações otorna acionista e lhe confere direito a voto.

Afirma que a deliberação assemblear de 08.01. 2014 é nula porque violou osarts. 115, 117 e 129, da Lei 6.404/1976.

Preparo em f.

Contrarrazões em f., pela sócia Teruko, e em f., pelos sócios Massayoshi e Cris-tiane, todos pelo improvimento do apelo.

É o relatório do essencial.

O recurso é tempestivo.A r. sentença foi disponibilizada em 29.09.2015 (f.), interrompendo-se o prazo

recursal pela oposição de embargos declaratórios da autora, rejeitados por decisãopublicada em 4 de novembro (f.), quinze dias antes do protocolo. Dentro, pois, doprazo legal.

O recurso não comporta provimento.

infere se dos -autos -que a autora-adquiriu--das- pessoas- -naturais demandadas50% das cotas sociais da Niplan Participações Ltda., controladora direta da NiplanEngenharia.

Ajustou-se que a consumação do contrato de compra e venda estava condi-cionado, dentre outras situações, à assinatura do Acordo de Acionistas da NiplanEngenharia, aprovada pelas partes nos termos do Anexo III (f., Cláusula 4.1.3).Além disso, os vendedores e a sociedade deveriam comprovar, mediante Ata deAGE da Niplan, a integralização do capital social e o respectivo aumento de capitalda Niplan Engenharia (f., Cláusula 4.2.2).

Conforme Cláusula 4.2.3 a vendedora Teruko se retiraria da Niplan Engenhariae suas controladas, de forma que os compradores detivessem 50% da sociedade esuas controladas (Niplan Construções Ltda. e Niplan Nordeste Ltda.) (f.).

Com a aquisição de 50% do capital social, a sociedade seria cindida, passan-do os vendedores e a compradora a deter, cada um, 50% da sociedade NiplanEngenharia e suas controladas, impondo-se à compradora a integralização do ca-

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Revista de Direito Empresarial. vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. R1 out. 2016.

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pital aumentado em 10.000 novas ações da Niplan Engenharia, pelo preço de R$40.000.000,00 (f., Cláusulas 4.4.1 e 4.4.2).

Noticiou a autora que a cisão não foi realizada, mas as partes subscreveramações da Niplan Engenharia, participando, então, da administração da sociedadedemandada.

Não obstante, a compradora descobriu fraudes contábeis na Niplan Engenha-ria, conforme laudo técnico acostado, o que motivou os vendedores a engedraremmanobras para impedir a participação da autora na Niplan Engenharia. Num pri-meiro momento, interferiram em sua participação no Conselho de Administraçãofato objeto de ação anulatória em curso e, agora, a impedem de exercer o direitode voto, motivo pelo qual ajuizou a presente demanda postulando a anulação daAGE de 08.01.2014.

Eis a síntese da relação contratual.

Pois bem.O contrato de compra e venda das cotas sociais da Niplan Participações prevê

que em caso de inviabilidade do regular desenvolvimento das sociedades do grupoNiplan a compradora poderia rescindir o negócio (f., Cláusula 10.1.2).

Ora, se: (a) a Niplan Participações tem como objeto social a participação emoutras sociedades; (b) sendo a Niplan Participações controladora direta da NiplanEngenharia; (c) tendo as partes ajustado que o contrato de compra e venda estavacondicionado à assinatura do acordo de acionistas da Niplan Engenharia; (d) seno acordo de acionistas, ao qual a Niplan Engenharia anuiu, foi convencionadatambém a arbitragem; (e) temse como aplicável a cláusula arbitral à Niplan En-genharia ainda que não tenha participado do contrato de compra e venda, poiscondicionada a eficácia do negócio jurídico de compra e venda à participação daautora na Niplan Engenharia.

Vê-se que no contrato de compra e venda restou pactuado que todas as contro-vérsias seriam dirimidas pelo Tribunal Arbitral (f., Cláusula 12.1).

Ora, o exercício do direito de voto é consequência direta da aquisição das açõesda Niplan Engenharia que, por sua vez, está prevista no contrato de compra e ven-da das cotas sociais da Niplan Participações.

Diante desse liame jurídico, inegável o alcance da cláusula arbitral à NiplanEngenharia.

Não fosse isso, o acordo de acionistas da Niplan Engenharia contém idênticacláusula compromissória., tendo eleito o mesmo Instituto de arbitragem (ICC -International Chamber of Commerce), conforme Cláusulas 12.1.1 em f., e 21.2,em f.).

O acordo de acionistas, ao qual a Niplan Engenharia anuiu, disciplina a formade convocação das assembleias e o quórum para deliberação. Assim, tendo a auto-ra invocado violação do art. 129 da Lei das S.A., deve a matéria ser submetida aoTribunal Arbitral.

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ARBITRAGEM 209

E mais: há nos autos notícia não impugnada de que a inocorrência de inte-gralização das ações é objeto de procedimento arbitral instaurado, sendo de todorecomendável que a validade da deliberação assemblear pela suspensão do direitode voto, com fulcro no art. 120 da Lei das S.A., seja dirimida também pelo TribunalArbitral.

Por fim, registra-se que esta c 2a Câm., por relatoria do Des. Campos Melloanalisou recentemente caso semelhante envolvendo a recorrente e os acionis-tas Massayoshi Paulo Nishimura, Cnstiane Tozukatu, Teruko Nishimura (Ap.1042408-29.2013.8.26.0100, j. 26.02.2016), oportunidade em que, por maioriade votos, manteve a sentença que extinguiu o processo sem resolução do méritoem aresto assim ementado:

Convenção de arbitragem. Sociedade anônima. Demanda declaratória de nu-lidade de deliberações tomadas em assembleia geral extraordinária. Extinção dademanda sem julgamento de mérito. Decisão mantida, por fundamento diverso doempregado. Cláusula compromissória existente no acordo de acionistas da com-panhia. Validade reconhecida.

Extinção da demanda, com fundamento no inc. VII do art. 267 do CPC. Prece-dentes da Corte. Recurso desprovido, alterado o dispositivo da sentença.

Naquele julgamento o Exmo. Sr. Desembargador Carlos Alberto Garbi apresen-tou voto divergente pelo qual reformava a r. sentença com os seguintes fundamen-tos, ora sintetizados:

(a)"que a cláusula compromissória, atrelada exclusivamente aos objetivos doacordo e às ações de titularidade das partes que o subscreveram, com interpretaçãorestritiva, não tem alcance para determinar a instauração de juízo arbitral nestecaso, especialmente porque a demanda cuida de matéria diversa daquela abordadano ajuste, ou seja, a regularidade em face da Lei da convocação e realização da As-sembleia de acionistas"; (b) "participaram da avença apenas os acionistas majori-tários Niplan Participações Ltda. e Grupo Essentium S.L., de modo que a cláusulacompromissória ajustada não poderia ser oponível aos acionistas Paulo, Cristianee Teruko, que figuraram no polo passivo da demanda, pois eles teriam dado ensejoà convocação da assembleia impugnada, pela qual foi modificada a composição doConselho de Administração da Companhia, em desfavor da autora"; (c) os acio-nistas Paulo, Cristiane e Teruko "não firmaram a avença como pessoas naturaise, por isso, a cláusula compromissória não seria oponível a eles"; (d) "a situaçãodifere de cláusula compromissória presente em estatuto, que, segundo o caráterinstitucional da Companhia, pode ser oponível a todos os sócios, independente-mente de anuência"; (e) "não há efetiva assinatura da Companhia no acordo deacionista"; e (O "a pretensão da autora está fundada na alegação de violação da leina convocação e realização da Assembleia de acionistas e não na violação do acor-do de acionistas ou do contrato de aquisição da participação societária, daí porquetambém não cabe a arbitragem"

Feito o registro, conclui-se pela manutenção da r. sentença.

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210 REVISTA DE DIREITO EMPRESARIAL 2016 o REDE 19

Em razão do exposto, por m.v., negaram provimento ao recurso, vencido o 2.°desembargador, que o provia, e, no prosseguimento, nos termos do art. 942 doCPC, passaram a compor a turma julgadora os Exmos. Desembargadores FabioTabosa e Campos Mello. Reiniciado o julgamento, por m.v., negaram provimentoao recurso, vencidos o 2. 0 desembargador - que declara voto - e o 4. 0 desembar-gador, que o proviam.

Ricardo Negrão, relator

Ap 1010342-59.2014.8.26.0100.

Comarca: São Paulo (3a Vara Cível)

Apelante: Grupo Essentium S.L.Apelados: Massayoshi Paulo Nishimura, Teruko Nishimura, Cristiano Tokuzato e

Niplan Engenharia S.A.

[Voto 23.5711

DECLARAÇÃO DE VOTO VENCIDO - Recorreu a autora da sentença, pro-ferida pela Doutora Andréa Galhardo Palma, que julgou extinto o processo, comfundamento no art. 267, VI, do CPC, em virtude da existência de cláusula compro-missória para instituição de arbitragem. Sustentou, no recurso, que Niplan Enge-nharia S.A. não firmou a cláusula compromissória no contrato de compra e vendade ações de Niplan Participações Ltda. e, por isso, não teria extensão em face dela.

Pediu o reconhecimento da jurisdição estatal, bem como o julgamento da de-manda, com fundamento no art. 515, § 3.°, do CPC.

Com esse sumário relatório, passo ao exame da impugnação.

Pretende a autora declaração de nulidade de deliberações tomadas em assem-bleia irregularmente realizada pelos réus Massayoshi Paulo Nishimura, TerukoNishimura, Cristiane Tokuzato, sócios de Niplan Engenharia S.A.

Afirmou que, na assembleia impugnada, decidiram os réus suspender o direitode voto da autora. Determinaram, ainda, ocupação por eles de três assentos noConselho de Administração, o que contrariava o acordo de acionistas, que previaa indicação pela autora de metade dos assentos no Conselho.

Afirmou a autora que os réus tinham a intenção de afastá-la da administraçãoda Companhia, na qual figuram como acionistas: a autora Essentium SL, NiplanParticipações Ltda., Teruko Nishimura, Cristiane Tokuzato e Masayoshi PauloNishimura.

A autora, sozinha, tem participação correspondente a 16,67% das ações, partici-pação também atribuída aos acionistas Paulo, Cristiane e Teruko, conjuntamente.

A autora e os corréus também têm participação societária igualitária na acio-nista Niplan Participações Ltda., de modo que cada uma das partes têm quotasrepresentativas de 50% do capital social desta última.

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ARBITRAGEM 211

A fim de que fossem estabelecidas as condições para a relação entre os acionis-tas, celebraram Niplan Participações Ltda. e Grupo Essentium S.L. acordo de acio-nistas, que previa na cláusula 21.2: "Todas as demais dúvidas, questões e contro-vérsias em geral, relativas a este Acordo, serão submetidas à arbitragem de acordocom o Regulamento de Arbitragem do ICC - International Chamber of Commerce,

em procedimento a ser administrado pela própria ICC" - grifei (f.).

Tinha o acordo como objetivo disciplinar: "exercício do direito de voto, com-pra e venda das ações, forma de capitalização da companhia e relação de poderesentre os órgãos de administração" (cláusula 2.1 f.).

Sucede que o acordo de acionistas foi firmado apenas em relação a uma partedos acionistas na Companhia, porque limitado esse acordo à Niplan ParticipaçõesLtda. e Grupo Essentium, quando é certo que a Companhia ainda tem participa-ção societária dos réus pessoas naturais: Teruko Nishimura, Cristiane Tokuzato eMasayoshi Paulo Nishimura.

Considerando-se que pretende a autora a declaração de nulidade de delibera-ção tomada em assembleia, que teria, inclusive, deixado de observar o acordo deacionistas, que previa a possibilidade de que a autora indicasse metade dos cargosdo Conselho de Administração, conclui-se que a cláusula compromissória, vincu-lada exclusivamente aos objetivos do acordo e às ações de titularidade das partesque o subscreveram, com interpretação restritiva, não tem alcance para determinara instauração de juízo arbitral neste caso, nos quais são discutidos atos de sócios,pessoas naturais, que não firmaram o acordo de acionistas.

Participaram do acordo de acionistas apenas os acionistas majoritários NiplanParticipações Ltda. e Grupo Essentium S.L., de modo que a cláusula compromissó-ria ajustada não poderia ser oponível aos acionistas Paulo, Cristiane e Teruko, quefiguraram no polo passivo da demanda, pois eles teriam dado ensejo à convocaçãoda assembleia impugnada, pela qual. foi modificadaa composição do Conselho deAdministração da Companhia e também suspenso o direito de voto da autora.

Neste sentido, em anotação que bem cabe ao presente caso, esclarece CândidoRangel Dinamarco: "Em princípio o negócio jurídico caracterizado como conven-ção de arbitragem vincula todos os sujeitos que dele participaram e somente osque participaram e essa é uma posição da autonomia da vontade, que constituifundamento da própria opção pela arbitragem. [...1 A regra é que, celebrado umacordo de acionistas entre os sócios de uma companhia e dele não participando aprópria companhia, será ilegítimo atraí-Ia à arbitragem referente a causas envol-vendo litígio entre aqueles ou com ela própria. Também será inadmissível a exten-são da cláusula compromissória a algum outro sócio não signatário do acordo deacionistas nem de dela própria [ ... 1" (A arbitragem na teoria geral do processo. São

Paulo: Malheiros, 2013. p.101-103).Como escreveu Arnold Wald: "A cláusula compromissória, para vincular a

sociedade, deve constar nos seus estatutos. Mas também pode ser incluída nos

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acordos de acionistas e até em outros pactos, desde que assinados por todos osacionistas ou por aqueles que aceitam sujeitar-se à arbitragem, comparecendo, nosmencionados instrumentos, a sociedade como parte integrante (e não na condiçãode simples interveniente ou órgão registrador para fins de ciência dos interessa-dos)" (A arbitragem nos conflitos societários. São Paulo: Saraiva, 2015. p. 127 - ne-gritei e sublinhei).

A situação difere de cláusula compromissória presente em estatuto, que, se-gundo o caráter institucional da Companhia, pode ser oponível a todos os sócios,independentemente de anuência. É o que sustenta Arnold Wald:

"Considerando o caráter institucional da sociedade, parece-nos que se trata dematéria a ser decidida pelos estatutos, aprovados na forma da lei, cujas disposiçõesse impõe a todos acionistas que com elas concordaram ou delas discordaram, ten-do ingressado antes ou depois da aprovação da cláusula compromissória estatutá-ria. É uma conclusão que decorre da natureza institucional da sociedade e, tam-bém do fato de que, ao vincular-se à companhia, o acionista adere ao estatuto e àsdeliberações adotadas de acordo com o quórum legal ou estatutariamente previsto.Sua aceitação em relação à cláusula compromissória pode, portanto, ser expressaou tácita (esta última por meio de sua vinculação ao estatuto e às deliberaçõessociais), e até presumida em virtude de sua conduta, como aliás tem entendido oSTJ. Assim sendo, o consentimento à arbitragem, neste caso, inclusive dos acio-nistas que votaram em sentido contrário à inclusão da cláusula compromissóriano estatuto, decorre do princípio majoritário, que se impõe a todos os acionistas.Quaisquer exceções ou relativizações a este princípio devem estar expressa e ta-xativamente previstas em lei ou no estatuto, tal como ocorre com as hipótese dequórum qualificado e direito de recesso, que não abrangem a cláusula compro-missória" (Arbitragem nos conflitos societários. In: Tratado de Direito Comercial.São Paulo: Saraiva, 2015. p. 129) Registro ainda o entendimento em sentido con-trário de José Waldecy Lucena, que considera que, ainda que se trate de cláusulacompromissória estatutária, não se poderia afastar a necessária anuência de todosos acionistas: "Modesto Carvalhosa, em face desse conflito, emitiu, em excelenteestudo sobre o tem, escólio que merece acatado: 'Em consequência, a supressãoda instância judicial e sua substituição pelo juízo arbitral estatutário deve ser con-siderada como uma faculdade para os acionistas e uma obrigação contratual paraa sociedade. Somente para aqueles acionistas que se vincularam expressamente atal supressão, nos diversos momentos da existência da sociedade, é o juízo arbitraloponível'. Assim, é a cláusula compromissória estatutária oponível aos fundado-res, subscritores iniciais das ações, pois foram eles que aprovaram o estatuto so-cial, no qual inserida a cláusula, mas esta somente será oponível, a partir daí, aosnovos acionistas, se estes expressamente a ela aderirem, por que, sem essa expres-sa vinculação, incidira, em relação aos adquirentes das ações, o direito essencial derecurso ao Judiciário, nos termos do parágrafo 2.°" (Das Sociedades Anônimas, Ed.Renovar, Vol. 1, 2009, p. 1017).

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ARBITRAGEM 21 3

Se até mesmo em relação à cláusula compromissória presente em estatuto deCompanhia há entendimento pela exigência de assinatura expressa de sócios quepassam a subscrever ações, quanto mais em cláusula compromissória presenteem acordo de acionistas. Nesta situação, não poderia entender-se que a cláusulacompromissória poderia ser imposta aos corréus Paulo, Cristiane e Teruko, que,como dito, não firmaram o acordo de acionistas. A supressão da instância judicial,segundo Modesto Carvalhosa, "depende de expressa declaração de vontade daspartes envolvidas, seja na cláusula compromissória, seja no compromisso propria-mente dito. Há, com efeito, um requisite necessariamente de forma para a validadee eficácia da cláusula compromissória estatutária, que depende de sua específica eformal adoção por parte de todos os compromissados. Sem essa aprovação a cláu-sula compromissória é nula, por ferir o direito essencial do acionista de socorrer-sedo Poder Judiciário. E essa aprovação vincula os fundadores na constituição e osacionistas que nas alterações estatutárias posteriores tiverem expressamente re-nunciado ao direito essencial prescrito no § 2° do art. 109 da Lei 6.404/1976, parainclusão desse pacto parassocial no estatuto. [ ... jl Assim, a cláusula compromissó-ria não vincula nem os acionistas atuais que não subscreveram o pacto e nem osacionsitas que posteriormente adentram a sociedade sem expressamente aderi-lo"(Reforma da Lei das Sociedades Anônimas, sob a coordenação de Jorge Lobo, Ed.Forense, 2002, p. 329).

Ainda que o acordo de acionistas tenha disposto, equivocadamente, na cláusula3.1, que Essentium e Niplan Participações Ltda. teriam, cada uma, participaçãoacionária correspondente a 50%, não era esta, efetivamente, a representação deacionistas na Companhia. Não se poderia afastar a qualidade de acionistas doscorréus Paulo, Cristiane e Teruko, acionistas que, como dito, teriam irregular-mente convocado a assembleia impugnada e, ainda, suspendido o direito de votoda autora, sem observar o art. 11 do Estatuto Social, que exigia voto de 75% dossócios (f). Não firmaram a avença como pessoas naturais e, por isso, a cláusulacompromissória não seria oponível a eles, respeitado o entendimento em sentidocontrário.

Além disso, não há efetiva assinatura da Companhia no acordo de acionista etampouco no contrato de compra e venda de quotas (f.) de Niplan ParticipaçõesLtda., controladora de Niplan Engenharia S.A, exatamente como alegou a autora.

Como afirma Giovanni Ettore Nanni: "A cláusula compromissória exige de-claração de vontade para se aperfeiçoar como negócio jurídico, sob pena de serinexistente, insuscetível de outorgar jurisdição aos árbitros. A adoção da cláusulacompromissória representa uma renúncia à jurisdição estatal, ao direito de o PoderJudiciário apreciar o mérito da disputa.

{ ... } Nesse contexto, correta a afirmação de Carmen Tibúrcio e Luís RobertoBarroso no sentido de que a opção pela cláusula compromissória representa, si-multaneamente, a renúncia à jurisdição estatal e, portanto, ao direito constitucio-nal de acesso ao Judiciário. Trata-se de renúncia prévia e veiculada em abstrato,

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCIANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAZZOLA.Revista de Direito Empresarial, vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. Ri', out. 2016.

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antes de os conflitos se apresentarem concretamente. Por isso mesmo, a decisãodas partes de se submeterem obrigatoriamente à arbitragem independentementede uma nova manifestação de vontade quando da erupção do conflito deve de-correr de forma clara do ajuste por elas firmado" (Direito Civil e Arbitragem. SãoPaulo: Atlas, 2014. p. 30).

É também a anotação de Paulo Magalhães Nasser e Felipe Volibrecht Speran-dio: "Para que haja arbitragem é preciso que as partes queiram. E imperiosa, pois,a manifestação de vontade quanto à submissão da disputa a um método privado desolução, em detrimento da jurisdição estatal.

Depreende-se da jurisprudência pátria que a obrigatoriedade do requisite refe-rente à 'manifestação de vontade' já foi apreciada pelo STJ. A questão versava sobrecontrato que, embora não assinado, passou a ser executado pelas partes. A parterequerida alegou a existência de ciusuia arbitral, como pressuposto processualnegativo, ponto que culminou na extinção do processo nos termos do art. 267,VII, do CPC. Em se recursal, entretanto, a parte requerente demonstrou a ausênciade assinatura do instrumento contratual, de modo que não havia reconhecimentoescrito e expresso de que as partes pretendiam resolver futuras controvérsias emsede de arbitragem. A sentença foi reformada e recursos foram manejados peranteo STJ. A Corte, no bojo do AgIn 989.313, decidiu que, sem a aposição da assina-tura das partes no contrato e, consequentemente, sem a concordância expressa eescrita em relação à cláusula de arbitragem, não haveria prova bastante da manifes-tação da vontade das partes tampouco renúncia à jurisdição estatal [ ... ] Portanto,exarou-se posição no sentido de que, sem a assinatura do instrumento contendo aclausula arbitral não haveria assentimento quanto à arbitragem, devendo a contro-vérsia ser resolvida no âmbito da jurisdição estatal.

Trata-se, aqui, da aplicação conjunta dos arts. 104 do CC e 4°, § 1.0 e 2.°, daLei de Arbitragem. Com efeito, o Código Civil dispõe que a validade do negóciojurídico requer agente capaz, objeto lícito, possível e no mínimo determinável, alémda forma prescrita ou não proibida pela lei. O art. 4.° da Lei de Arbitragem dispõe quea cláusula compromissória deve ser estipulada por escrito, podendo estar no própriocontrato ou em documento apartado. Entendeu-se, nesse passo, que a ausência deassinatura, no contrato que previa a solução de conflitos mediante arbitragem, im-plicava não observância à forma prescrita em Lei, de tal sorte que a jurisdição estatalnão restaria afastada. O STJ entendeu que a manifestação de vontade das partes eo consenso para futura arbitragem deveriam estar materializados na assinatura doinstrumento. Assim, como afirmam Alan Redfern e Martin Hunter, não é incomum,para uma parte requerida, encontrar-se demandada na justiça estatal contra sua von-tade. Todavia, no processo arbitral, que é um método privado de resolver disputas,a jurisdição do tribunal arbitral é derivada do expresso acordo (manifestação. devontade) das partes" (BRUSCHI, Gilberto Gomes; COUTO, Mônica Bonetti; SILVA,Ruth Maria Junqueira de A. Pereira e; PEREIRA, Thomaz Henrique Junqueira deA. Direito Processual Empresarial. Ed. Campus Jurídico, 2012, p. 634-635).

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCtANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAzzo.

Revisto de Direito Empresarial. vol. 19. ano 4. P. 199-215. São Paulo: Ed. RL out. 2016.

Page 18: REVISTA DE DI EMPRES ReDE - dannemann.com.br · Demanda, ademais, que deve ser ... promisso arbitral tinha o condão de subtrair o litígio do crivo do Poder Judiciário,4 porém,

ARBITRAGEM 215

A pretensão da autora está fundada na alegação de violações ao acordo de acio-nistas, que não foi subscrito pelos réus, daí porque também não cabe a arbitragem.E, como dito, tampouco o contrato de aquisição de quotas de Niplan Participa-ções Ltda., no qual também há cláusula compromissória, favoreceria a submissãodo conflito à arbitragem, diante da falta de assinatura da Companhia, que sequerconstou como anuente no ajuste.

Assim, não se pode afastar a jurisdição estadual, exatamente como sustentoua autora, valendo lembrar que a dúvida sobre a renúncia à jurisdição estatal nãopode ser interpretada em favor da arbitragem.

Pelo exposto, respeitado o entendimento em sentido contrário, pelo meu voto,dou provimento ao recurso para afastar a extinção do processo, considerando-se aimpossibilidade de extensão da cláusula compromissória aos corréus Paulo, Cris-tiane e Teruko, que não celebraram acordo de acionistas, e a impossibilidade deaplicação do compromisso arbitral para dirimir a matéria objeto da demanda, con-firmada a Jurisdição estadual para o julgamento da demanda, que deve prosseguircom o enfrentamento do mérito.

Carlos Alberto Garbi, 2.° Juiz

Este documento é cópia do original que recebeu as seguintes assinaturas digitais:

Pg. inicial Pg. final Categoria Nome do assinante Confirmação

1 7 Acórdãos eletrônicos Ricardo Jose Negrao 2D86D21

Nogueira

8 16 Declarações de votos Carlos Alberto Garbi 2EEDA44

Para conferir o original acesso u suo.informando o processo 1010342-59.2014.8.26.0100 e o código de confirmação da tabela acima.

Comentário ao Ap 1010342-59.2014.8.26.0100 do TJSP por LUCIANA GONÇALVES BASSANI e MARCELO MAZZOL.A.Revista de Direito Empresarial, vol. 19. ano 4. p. 199-215. São Paulo: Ed. RT, out. 2016.