Revista Científica 1

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ISSN 2176-6118

R. Fac. Ilhéus Ilhéus v. 2 n. 2 p. 1 – 112 2013

V.2 N. 2 2013

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Diretor Geral Almir Milanesi

Diretora acadêmica Sandra Maria Agrizzi Milanesi

Coordenador do curso de Administração Prof. Ms. Almir Milanesi

Coordenador do curso de Ciências Contábeis Prof. Esp. Elifaz Pereira Anunciação

Coordenador do curso de Direito Prof. Dr. Paulo César dos Santos Bezerra

Coordenador do curso de Enfermagem Prof. Robson Vidal de Andrade

Coordenadora do curso de Nutrição Profª. Adriana Cruz Lopes

Conselho Editorial Prof. Dr. Luiz Antônio dos Santos Bezerra (UESC)Prof. Dr. Paulo César Santos Bezerra (UESC)Profª Drª Marlúcia Mendes da Rocha (UESC/ CESUPI)Prof. Dr. André Ricardo Vieira de Carvalho (CESUPI)Prof. Esp. Elifaz Pereira Anunciação (CESUPI)Profª Ms. Eliana Cristina Paula Tenório de Albuquerque (UESC)Profª Ms. Maria Luiza Nora Andrade (UESC)Prof ª Ms. Adriana Cruz Lopes (CESUPI)Prof. Ms. Amarildo Morett (UESC/CESUPI)

Coordenação Editorial Maria Luiza Heine

BibliotecáriaMaria José Serrão Nunes

RCM Propaganda e Promoções Ltda.

© 2013 Revista da Faculdade de Ilhéus

É permitida a reprodução total ou parcial desta publicação, desde que citada a fonte.

Os artigos publicados são de responsabilidade exclusiva dos autores.

Direitos desta edição reservado àFaculdade de Ilhéus – CESUPIRod. Ilhéus/Olivença/ km 2,5 – Jardim Atlântico II – 45655-170 – Ilhéus – BahiaTel.: (73) 2101 – 1700 – Fax: (73) 2101 – 1709http://www.faculdadedeilheus.com.br / E-mail: [email protected]

Revista da Faculdade de Ilhéus. - Vol. 2, n. 2 (2010) - . – Ilhéus,BA : CESUPI, 2010 - v. : il.

Anual. A revista do ano de 2011, publicada em 2013. ISSN 2176-6118 1. Administração - Periódicos. 2. Contabilidade - Periódicos. 3. Direito - Periódicos. 4. Nutrição - Periódicos. 5. Enfermagem - Periódicos. I. Centro de Ensino Superior de Ilhéus.

CDD 378.05

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Sumário

APRESENTAÇÃO

DIREITOS HUMANOS E RELAÇÕES DE GÊNERO ..............................................................7

Paulo César Santos Bezerra

O “CONHECE-TE A TI MESMO” ...................................................................................................19

PROJETO DE ESTADO GLOBAL E MUNDIALIZAÇÃO EM KANT ...........................................29

Iracema Maria Vasconcelos Silva

REFLEXÕES SOBRE A USUCAPIÃO CONJUGAL .........................................................................53

Márcia Monteiro Ferreira Delmas

PASSIVO AMBIENTAL: ASPECTOS CONTÁBEIS E LEGAIS .......................................................65

Danilo José Santana dos Reis; Alessandro Fernandes de Santana

A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA TERRA DOS HOMENS .........................81

Maria Luiza Heine

PERFIL NUTRICIONAL DE PACIENTES COM DIAGNÓSTICO DE DOENÇA

PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA INTERNADOS EM UM HOSPITAL

UNIVERSITÁRIO DO OESTE DO PARANÁ ..................................................................................97

Adriana Cruz Lopes; Ana Carla DiasFreitas

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APRESENTAÇÃO

Um ano se passou, desde o lançamento do primeiro número da Revista da Faculdade de Ilhéus. Dando continuidade ao projeto, estamos colocando o segundo número disponível para a comunidade acadêmica.

Nosso segundo número prima pela multidisciplinaridade, por entender-mos que o conhecimento se dá dividido em partes, nas quais a disciplina é um

Os textos aqui reunidos resultam de questionamentos a respeito de al-guns temas que, discutidos em sala de aula e ampliados na pesquisa de cada um, possibilitaram mais um número de nossa revista. Neste exemplar, temos

-

-ca, com Sócrates, e traz o artigo ‘Conhece-te a ti mesmo’ como fundamento do saber ético”; a professora Iracema Vasconcelos Silva busca, na mundiali-

na possibilidade de um mundo melhor e mais humano e a professora Márcia

usucapião conjugal”.Mudando um pouco a temática, mas, mantendo-se de acordo com a

contemporaneidade, os professores Danilo Reis e Alessandro Santana escre-

Educação Ambiental na terra dos homens”, temática sobre a qual tenho me dedicado, nos últimos tempos, por conta do curso de doutorado que estou cursando na Universidade do Estado da Bahia – UNEB.

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E, por último, mas não menos importante, colocado assim por questões temáticas, o trabalho da nutricionista e professora Adriana Lopes, em parce-

-tes com Diagnóstico de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica Internados em um Hospital Universitário do Oeste do Paraná”

-dade enriquecer, com nossas pesquisas, o conhecimento, não só acadêmico, mas de todas as pessoas que se interessem por estes assuntos.

Continuamos lembrando a todos, professores e alunos, da Faculdade de Ilhéus, bem como de outras instituições de ensino superior, que este espaço está aberto a todos que queiram participar socializando seus projetos, pes-

Ilhéus, novembro de 2012.

Maria Luiza Heine

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DIREITOS HUMANOS E RELAÇÕES DE GÊNERO Paulo César Santos Bezerra

Resumo

As relações de gênero constituem matéria essencial para as pesquisas em Direito e Sociologia Jurídica. A questão da violência contra a mulher vem merecendo tratamento especializado nesses dois campos do saber. Contudo, tanto a doutrina quanto a jurisprudência têm sido tímidas no que se refere à proteção dos direitos das mulheres e do tratamento isonômico que exige

maior do presente texto.

Palavras-chave: Direitos humanos. Relações de gênero. Direito da mulher.

Abstract

Gender relations are a matter essential to the research in Law and Sociology of Law. The issue of violence against women is deserving specialized tre-

been shy when it comes to protecting the rights of women and isonomic treatment that requires the principle of human dignity. Think about it most is the intent of this text.

Keywords: Human Rights. Gender relations. Woman's right.

* Pós-Doutor em Direito Constitucional pela Universidade de Coimbra, Professor de Direito Constitucional da Faculdade de Ilhéus-BA e do Mestrado e Doutorado da Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, nas disciplinas de Teoria

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INTRODUÇÃO

O tema das relações de gênero exige abordagens múltiplas para que se evitem reducionismos que resultem no esvaziamento de certos aspectos que são importantes vis-a vis.

Assim, como estratégia metodológica do presente trabalho, parte-se de grandes divisões dicotômicas do conhecimento que, embora superadas pelo discurso atual, servem de via de arrumação das ideias, a saber: conhe-

ciências sociais.

autônomos se entrelaçam na busca de um tratamento mais condizente com a amplitude que o tema requer, e exigem um tratamento que chamamos de

e dentro destas últimas, um conhecimento verdadeiramente interdisciplinar. É claro que no Direito, em que pesem os esforços dos pensadores mais contem-porâneos, não há uma cultura de multisciplinaridade do conhecimento jurídico. Ao contrário, os operadores do direito parecem caminhar no sentido inverso, da especialização.1

-ências naturais e ciências sociais, cada vez mais superada, o tema das relações de gênero exige incursões na Biologia, de um lado, e da Antropologia, Socio-logia, Psicologia (Psicologia Social, Antropologia Social) e Direito, apenas para delimitar o campo de abordagem do presente trabalho, pois o tema exi-ge incursões em outros campos do saber.

No que se refere ao Direito, as relações de gênero exigem abordagens interdisciplinares, notadamente referentes ao Direito Civil (Família, Obri-gações, Direitos Reais, Sucessões, Criança e Adolescente); Direito Penal (Proteção da Mulher); Direito do Trabalho (trabalho da mulher) e, acima

1 Os cursos de Pós-Graduação lato sensumesmo os de Graduação, nesse sentido, devem buscar a interdisciplinaridade neces-sária para que possam efetivamente ser especiais.

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de tudo, e dirigindo todo o arcabouço jurídico em torno das relações de gênero, o Direito constitucional, principalmente no tocante aos direitos hu-manos e fundamentais.

Construir uma abordagem mais abrangente sobre o tema das relações de gênero, que evitem as visões reducionistas sobre ele, é o intento maior do presente trabalho.

BREVES REFLEXÕES EXTRA-JURÍDICAS SOBRE O TEMA

-xões extra-jurídicas imprescindíveis para a compreensão mais abrangente de tal matéria. Assim é que, conceitos como igualdade, diferença e identidade, dentre outros que escapam à limitação exigida por um trabalho como este, são necessários ao próprio tratamento jurídico, sob pena de se construir um conhecimento jurídico enviesado, dessas relações.

sido assim construídos:

a) Igualdade: relação entre dois termos em que um pode substituir o ou-tro, no mesmo contexto, sem mudar o valor do contexto. Essa a ideia de igualdade em Leibniz, avançando da ideia aristotélica que reduzia a igualdade apenas a relações de quantidade.2 Ou noção lógica ou mate-

3

b) Diferença: relação de alteridade. Escolasticamente, distingue-se as

diferentes, quer dizer, que diferem pela sua própria essência ou pela

espécies do mesmo gênero.4

2 ABBAGNANO, Nicola. . São Paulo: Martins Fontes, 1998. p.534.3 JAPIASSU, Hilton; MARCONDES, Danilo. . Rio de Ja-neiro: Zahar, 1996. p.137.4 LALANDE, André. . São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 257.

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c) Identidade: dentre outros sentidos, característica de dois objetos de pensamento, distintos no tempo e no espaço, mas que apresenta-riam as mesmas qualidades.51

De plano, nota-se que essas ideias, embora colaborem para a construção

No campo das ciências, atente-se, por mais imediato (embora mais in-

esta ciência, gênero é uma subdivisão de família, que por sua vez divide-se em espécies. Assim, o ser humano é um gênero da família ser vivo, que se divide em espécies: homem/mulher; masculino/feminino.

Atente-se, agora, para as ciências sociais, ainda no campo do extra-ju-rídico. Nesse diapasão, gênero é um conceito que se distingue do conceito biológico de sexo, por representar os aspectos sociais das relações entre os sexos, que se constrói e se expressa em muitas áreas da vida social, incluindo cultura, ideologia e práticas discursivas, sem, contudo, se limitar a isso. Gê-nero, assim, não é sexo. Sexo refere-se ao biológico, restrito ao que é homem e mulher, enquanto gênero está ligado à construção social do masculino e feminino, ou seja, como ser homem e como ser mulher.6 2

As relações de gênero assumem formas diferentes, em diferentes socie-dades, períodos históricos, grupos étnicos, classes sociais e gerações, tendo em comum a diferenciação entre homens e mulheres.73Nesse passo, macho e fêmea são realidades naturais, enquanto que homem e mulher são concei-tuações culturais. O conceito de gênero presta-se, pois, para a distinção entre a dimensão ideológica e a social, existindo então, um sexo físico e um social, sendo o comportamento de uma pessoa de determinado sexo, produto das

mais, essas idéias acerca do que se espera de homens e mulheres são pro-duzidas relacionalmente, é dizer, quando se fala em identidade socialmen-te construída, o discurso sociológico/antropológico está enfatizando que a

5 Idem. Ibidem, p.505.6 LOURO, G. Nas redes do conceito de gênero. In: LOPES, MEYER E WALDROW. (Orgs.) Gênero e saúde. Maria José Serrão Nunes – CRB 5/16437 OUTHWAITE, William; BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento social no século XX. Rio de Janeiro: Zahar, 1996. p.332.

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atribuição de papéis e identidades para ambos os sexos forma um sistema simbolicamente concatenado.

Assim, a categoria gênero é um produto da modernidade principalmente dos cientistas sociais, que se refere à construção social do sexo, no contesto da construção sociológica de papéis sociais, contribuindo assim para um novo discurso jurídico que surge, a saber o discurso jurídico das relações de gênero.

DO TRATAMENTO JURÍDICO DAS RELAÇÕES DE GÊNERO

Da Antropologia, da Sociologia, da Psicologia, da Biologia, dentre ou-tras ciências sociais ou naturais, surge um novo discurso que, aos poucos, vai adquirindo autonomia, a saber, o dos estudos do gênero.

discurso, absorvendo conceitos extra-jurídicos, na construção de novos concei-tos jurídicos, como igualdade jurídica, direitos de igualdade, e direito à diferen-

De se destacar, de plano, a necessidade de se adotarem abordagens in-terdisciplinares e transdisciplinares e de passagem das análises pelo crivo do multiculturalismo.

-xões dos operadores jurídicos (advogados, juízes, membros do Ministério Pú-blico, doutrinadores, legisladores, professores e estudantes de direito de todos os níveis) no que se refere às relações de gênero, é o conceito de isonomia.

Comumente confundido com a igualdade, a isonomia é apenas um sub-

Assim, deve haver tratamento igualitário entre as partes do processo, e todos são iguais perante a lei, por exemplo.

Além disso, o falar em igualdade e isonomia requer algum giz sobre a ideia de desigualdade (proibida ou permitida pelo direito) e de igualdade formal e material.

De fato, a distinção entre igualdade formal e material é importante, por exemplo, para não gerar a confusão rotineiramente feita pelo herme-

perante a lei”, expressa no caput do art. 5º da Constituição Federal de 1988.Pois bem, uma coisa perante a lei, que quer dizer que todos são iguais

em face da lei quando promulgada e publicada, portanto, quando está apta

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para produzir efeitos jurídicos. Essa é a igualdade formal. Outra coisa, é a igualdade na lei, ou seja, na elaboração da lei. Essa é a igualdade material.

lei é permitido proibir mulheres grávidas de trabalharem em ambientes in-salubres ou se estabelecerem prioridades nos atendimentos às gestantes, aos

Tratam-se igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades, no conhecido paradigma aristotélico de justiça.

Assim sendo, tanto a igualdade formal quanto a material (principalmen-te esta) são redutos de proteção do direito, e a desigualdade é, vezes, permi-tida e, vezes, proibidas pelo direito.

No direito infraconstitucional

O correto seria tratar a matéria, primeiramente, no direito constitucio-nal, para depois debruçar-se sobre o tratamento infraconstitucional. A inversão da ordem aqui procedida resulta de dois motivos: a) o equívoco histórico de se estudar a Constituição a partir do direito infra-constitucional, que aqui se denuncia, para advogar o inverso, que se estude o direito a partir da Constitui-

direito privado”.81Assim, a ordem das matérias aqui abordadas obedece princi-palmente ao segundo motivo: b) a linha de pesquisa aqui tomada para o tema, a saber, da análise das relações de gênero, no contexto dos direitos humanos e fundamentais. Nesse sentido, os direitos humanos e fundamentais têm sede no direito constitucional, logo, por questão apenas de taxionomia jurídica e de alocação da matéria tratam-se as relações de gênero na seara dos direitos in-fraconstitucionais, para depois, enfrentá-las em nível de direito constitucional.

No que se refere às desigualdades, inúmeros são os exemplos de permis-sões no direito infraconstitucional, apontando-se apenas as matérias relativas às gerações de gênero.

No Direito Civil, só para citar dois exemplos, restritos ao Direito de Fa-mília, os arts. 1.523, II e 1.536, I, que dizem, verbis.

8 Para maiores discussões sobre o tema, ver o nosso BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Lições de teoria da constituição e de direito constitucional. Rio de Janeiro: Reno-var, 2009, passim.

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Art. 1.523. Não devem casar-se:... II- a viúva ou a mulher cujo casamento se desfez por ser nulo, ou ter

sido anulado até dez meses depois do começo da viuvez ou da dissolução da sociedade conjugal (grifo nosso).92.

Art. 1.736. Podem escusar-se da tutela:I – As mulheres casadas.10 3

Também no direito processual civil encontram-se dispositivos que, a exemplo do art. 10, III, tratam desigualmente homens e mulheres.

Art. 10. O cônjuge somente necessitará do consentimento do outro, para propor ações que versem sobre direitos reais imobiliários:

... III- fundadas em dívidas contraídas pelo marido, a bem de família, cuja execução tenha de recair sobre o produto de trabalho da mulher ou os seus bens reservados.

Da mesma forma o Direito Penal permite à colação o exemplo da cria-

apenas se praticado pela mulher, mãe, e sob o efeito de estado puerperal. Se praticado por terceiro, homem ou mulher, contra recém-nascidos, cai-se na vala comum do homicídio. Não deixa de ser um tratamento diferenciado entre agente homem e mulher.

Da mesma forma, a Lei de Execuções Penais, quando trata de ensino

adequado à sua condição. O mesmo diploma legal permite regime de prisão

O direito processual penal prevê, no art. 249, que a busca em mulher será feita por outra mulher, se não importar prejuízo ou retardamento da diligência. Trata-se, aqui, da chamada discriminação positiva.

Em que pese o avanço da legislação em vigor, que dispensa citação, que revogou atos atentatórios à isonomia entre homens e mulheres, por

9 Observe-se que o Código não se refere ao homem, como faz nos demais incisos do mesmo Código.10 De maneira inexplicável, não inclui o homem.

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imperiosas regras constitucionais, ainda se mantêm regras de diferenciação entre homens e mulheres, nas searas trabalhistas, previdenciárias, sempre de constitucionalidade passível de controle rigoroso.

Mas o próprio legislador constitucional cuidou de estabelecer diferen-ciação entre homens e mulheres, nas regras constantes nos arts. 7º, XVII, que

inciso XX, referente à proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante

diferenciados para homens e mulheres; em caso de servidor público, o art. 202, sobre a diferenciação também nos tempos de aposentadoria em geral.

Como se vê, nos supracitados dispositivos constitucionais, o próprio tex-to da Constituição, instituidora da igualdade de tratamento entre homens e mulheres, entendeu dispensar a eles tratamento desequiparados.

Tratando-se de dispositivos constitucionais, todo o cuidado deve ter o in-

Constituição, por ser carta de princípios, é necessariamente genérica, aversa a particularizações, donde decorre a conclusão inafastável de que o intérprete deve pesquisar a fundo quais as consequências, na ordem de princípios, a serem atreladas ao tratamento constitucional da isonomia entre homem e mulher.111

No direito constitucional

de tratamento isonômico claramente posto no texto constitucional de 1988 e, de resto, em várias outras constituições estrangeiras e nas Convenções e Tra-

uma igualdade apenas formal? É claro que não. A despeito de formalmente reconhecida nos textos, busca-se a igualdade material, e não absoluta, pelo me-nos o mais abrangente possível. E isso só é possível na ideia de constituição ma-terial. Essa é uma distinção a partir do conteúdo da Constituição. Partindo do

constitucionais, ou normas materialmente constitucionais, como as que iden-

11 LIMA, Paulo Roberto de Oliveira. Isonomia entre os sexos no sistema jurídico nacional. São Paulo: RT, 1993. p. 24.

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dos poderes, o modelo econômico e os direitos, deveres e garantias fundamen-tais; já as formalmente constitucionais são colocadas no texto constitucional, sem fazer parte da estrutura mínima e essencial de qualquer Estado, e, por isso, são denominadas formalmente constitucionais.12 2

Insatisfeito com a regra geral de que todos são iguais perante a lei, ins-culpida no art. 5º, caput, a Constituição se preocupou em condenar as distin-ções entre homens e mulheres, no inciso I do referido artigo, e de alardear a igualdade de todos para garantir a isonomia entre os sexos, pleonasticamente colocado no art. 226 § 5º; a prescrever igualdade de direitos e obrigações do

-vo de combate a discrimenes que sempre militaram em desfavor da mulher e, poucas vezes, em desfavor dos homens.13 3

biologicamente. E essas discriminações positivas só têm sido possíveis através de mecanismos de correção das históricas injustiças perpetradas às mulheres.

Direitos humanos e fundamentais e as relações de gênero

Tudo o que foi dito acima preparou a entrada no tema essencial do pre-sente trabalho, a saber, os direitos humanos e as relações de gênero.

Direitos Humanos e Direitos fundamentais não se confundem. Aqueles constituem o rol de direitos inerentes à pessoa humana, por essa condição

Declarações de Direitos do Homem e do Cidadão, da França de 1789, e na Declaração Universal dos Direitos do Homem, da ONU - Organização das Nações Unidas – de 1948. Já os direitos fundamentais constituem uma parte daqueles direitos humanos que foram positivados nas constituições dos di-versos Estados. Ambos, porém, (direitos humanos e fundamentais), funda-dos no princípio da dignidade da pessoa humana.14 4

12 ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 25.13 LIMA, Paulo Roberto de Oliveira. Op. Cit. p. 26.14 Para maiores distinções entre direitos humanos e direitos fundamentais e sobre o princípio da dignidade da pessoa humana, ver nosso BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Temas atuais de direitos fundamentais. Ilhéus, BA: EDITUS, primeiro texto.

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A declaração francesa apesar de servir de argamassa na construção do chamado Estado Moderno, pouco avançou em termos de concretização da isonomia nas relações de gênero até a hecatombe que foi a Segunda Guerra

-do neoconstitucionalismo, fundado, principalmente, nos direitos humanos e fundamentais, o que causou uma mudança histórica também para as rela-ções aqui tratadas.

--

res son lasvictimas invisibles de los años 90. La mayoria de lãs victimas de la guerra; de los refugiados y desplazados, de los pobres, son lãs mujeres e los niños”.151Portanto, depois de tanto tempo após a Declaração da ONU de 1948.

Apesar da proliferação de documentos e pactos internacionais, e por não adiantar muito o prever ou positivar nos textos, as normas de direitos e garantias fundamentais sem mecanismos de efetiva concretização desses direitos e garantias162surge, em 1993, a Declaração e Programa de Ação da Conferência mundial de direitos humanos de Viena, que registrou o compro-misso de todos os Estados de cumprir a obrigação de promover o respeito universal, assim como a observância e proteção de todos os direitos humanos e das liberdades fundamentais de todos, de conformidade com a Carta das Nações Unidas e outros instrumentos relativos aos direitos humanos.

Essa conferência gira, com referência às relações de gênero, a necessida-de de proteção da igualdade de condições e dos direitos humanos da mulher

dos Direitos Humanos pede encarecidamente que se conceda à mulher o ple-no desfrute das condições de igualdade, de todos os direitos humanos, e que esta seja uma prioridade para os governos e para as Nações Unidas.

Tal documento, apesar de sua inspiração, leva a três grandes e inafastáveis questões: a) a necessidade, sempre renovada, de se fazerem Declarações e Pro-gramas de ações de proteção e efetividade dos direitos humanos; b) o caráter de documento que implora (pede encarecidamente) que se respeitem tais direitos;

15 MINGOT, Tomás. La negación universal de los derechos humanos. In: La Decla-ración Universal de Derechos Humanos em su cincuenta aniversario: um estúdio interdisciplinar. Bilbao: Universidad de Deusto, 1999. p. 412.16 Ver nosso Temas atuais de direitos fundamentais. Op. Cit. Segundo texto.

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-cumprimento de tais regras, que viram, assim, meros conselhos.

Ora, se os Estados livres e soberanos não podem fazer com que todos cumpram sua obrigação de proteção e garantia dos direitos humanos e fun-damentais, o que dizer dos titulares desses mesmos direitos, a saber, os ho-mens e mulheres em geral, os cidadãos de determinado país, em particular?

de nome Maria da Penha, consegue, a duras penas, fazer ouvir sua voz lan-cinante e, tornando-se mesmo um ícone da luta pela igualdade da mulher, e

-ra violência doméstica e familiar contra a mulher, qualquer ação ou omissão baseada no gênero, que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial”.

Desse documento legal duas coisas podem ser sublinhadas: a) a impor-tância para a chamada à consideração, do conceito de gênero; b) o reducio-nismo da previsão de repressão á violência contra a mulher apenas no âm-bito do lar ou da família e apenas as relacionadas ao gênero, excluindo-se as demais formas de violência, quando poder-se-ia aproveitar o ensejo para combater qualquer tipo de ato ou forma de violência conta a mulher. É mui-to pouco para ser tão intensamente festejado o diploma legal em comento. É preciso avançar e muito.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como não adianta apontar problemas sem sugerir ao menos algumas -

nal, para a necessidade de: a) alteração do discurso jurídico a respeito das relações de gênero, incluindo-se uma abordagem interdisciplinar; b) a busca de priorizar a igualdade material em detrimento da igualdade apenas formal, através de mecanismos de efetivação dos direitos; c) o reconhecimento da diferença como um direito: o direito à diferença; d) a instituição massiva de políticas de combate à discriminação negativa e o fomento da discriminação

-cia, a exemplo do recurso de amparo dos espanhóis, que viabiliza o acesso direto de qualquer cidadão às Cortes Supremas dos Estados ( no caso do Brasil, o Supremo Tribunal Federal), quando se tratar de violação de direitos

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humanos e fundamentais; f ) ampla política de conscientização e de educação para os direitos humanos e fundamentais, inserindo-se nos conteúdos de to-dos os níveis, o tema da educação para os direitos e deveres.

Qualquer contribuição em termos de ideias, debates, congressos, sobre o tema das relações de gênero, será sempre altamente contributiva, desde que se avance de meros planos, ideias, projetos e discursos, jurídicos e extrajurídicos.

REFERÊNCIAS

ABBAGNANNO, Nicola. São Paulo: Martins Fontes, 1998.

ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JUNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2010.

BEZERRA, Paulo Cesar Santos. Temas atuais de direitos fundamentais. Ilhéus,BA: EDITUS, 2008.

_____. Lições de teoria constitucional e de direito constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2009.

BOLANDERAS, Margarita. Libertad y tolerância. Barcelona: Universidad de Barcelona, 1993.

GOMES, Joaquim B. Barbosa. Rio de Janeiro: Renovar, 2001.

JAPIASSU, Hilton; MARCONDES, Danilo. Rio de Janeiro: Zahar, 1996.

LALANDE, André. São Paulo: Martins Fontes, 1999.

LIMA, Paulo Roberto de Oliveira. Isonomia entre sexos no sistema jurídico nacional. São Paulo: RT, 1993.

LOURO, G. Nas redes do conceito de gênero. In: LOPES, MEYER E WALDROW (Orgs). Gênero e saúde. Porto Alegre: Artes Médicas, p. 12-19.

MINGOT, Tomás. La negación universal de los derechos humanos. In: La declaración universal de derechos humanos em su cincuenta aniversario: um estúdio interdiscipli-nar. Bilbao: Universidad de Deusto, 1999.

OUTHWAITE, William; BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento social no século XX. Rio de Janeiro: Zahar, 1996.

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O “CONHECE-TE A TI MESMO” COMO FUNDAMENTO DO SABER ÉTICO

*1

Resumo

O presente artigo trata acerca da dimensão da eticidade enquanto fundamen-to da existência humana e da vida em sociedade (realização do ethos). Com

-nado ao âmbito interior, singular e intransferível do sujeito ético. Sujeito este que deve se apresentar aos seus iguais enquanto um concidadão, um cidadão da pólis. Sobre quais aspectos esta existência do homem (cidadão ateniense,

o intuito implícito neste artigo.

Palavras-chave: Ethos. Ética. Arete. Paidéia. Sócrates.

Abstract

This article is about the dimension of the ethics as the foundation of human

takes on a perspective of knowledge that is directed to within, unique and nontransferable of the ethical subject. This subject should be presented to his equals as a fellow citizen, a citizen of the polis. About which aspects of this man's existence (Athenian citizen, philosopher) Socrates may lead us to

Keywords: Ethos. Ethics. Arete. Paidéia. Sócrates.

* --

rismo - UESC. É professor da Faculdade de Ilhéus - Cesupi, do Instituto de Teologia de

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-ança de conhecimento direcionado para o recesso interior, singular e intrans-ferível do agente ético. O que implica em dizer que este sujeito (portador do hábito e também agente) agora está inserido numa forma de relação de responsabilidade para com a realização do ethos.

-sos tão naturais quando se age por força dos impulsos ou por ignorância. Tal-vez não seja um equívoco dizer que é justamente aí que tem origem a noção de consciência moral.

Entretanto, diante dessa consciência moral vêm as perguntas: o que con-vém? O que devo fazer? Perguntas estas que, em Sócrates, passam por uma compreensão primeira da essência do ser Homem, uma vez que todas as coisas

faz mais complexo, pois o mesmo não está dado, feito; é um ente por se fazer. Para tal, tem o mesmo o privilégio de possuir o logos e através deste, o

dever constitutivo de des-velar a realidade, compreender os seus aspectos e

particular como pública1.Para Sócrates, o homem é a sua alma2, na medida em que é a sua alma que

dos raciocínios fundamentais feitos por Sócrates para dizer o que é o homem,

que usa o instrumento. Ora, o homem usa o seu próprio corpo -

mem, e o instrumento, que é o corpo, são coisas distintas. Assim,

modo que a conclusão é inevitável: ”A alma nos ordena conhecer aquele que nos adverte: conhece-te a ti mesmo.”

1 Cf. os diálogos platônicos em especial, a obra: República.2 Para Sócrates a alma é a nossa razão e a sede de nossa atividade pensante e etica-mente operante.

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O modo de atuar de Sócrates era bastante peculiar e por si só revelador. Isto se faz evidenciar na seguinte passagem da obra platônica, Apologia de Sócrates (PLATÃO, 1979, p. 26-27):

a vós e de instruir quem quer que eu encontre, dizendo-lhe à minha maneira habitual: querido amigo, és um ateniense, um cidadão da maior e mais famosa cidade do mundo, pela sua sa-bedoria e pelo seu poder; e não te envergonhas de velar pela tua fortuna e pelo seu aumento constante, pelo teu prestígio e pela tua honra, sem em contrapartida te preocupares em nada com conheceres o bem e a verdade e com tornares a tua alma o melhor possível? E, se algum de vós duvidar disto e asseverar que com tal se preocupa, não o deixarei em paz nem seguirei tranquilamente o meu caminho, mas interrogá-lo-ei, exami-ná-lo-ei e refutá-lo-ei; e se me parecer que não tem qualquer Arete, mas que apenas a aparenta, invectivá-lo-ei, dizendo-lhe que sente o menor respeito pelo que há de mais respeitável e o respeito mais profundo pelo que menos respeito merece. E farei isto com os jovens e com os anciãos, com todos os que encontrar, com os de fora e com os de dentro; mas sobretudo com os homens desta cidade, pois são por origem os mais pró-

e julgo que até agora não houve na nossa cidade nenhum bem maior para vós do que este serviço que presto a Deus. É que todos os meus passos se reduzem a andar por aí, persuadindo novos e velhos a não se preocuparem nem tanto nem em pri-meiro lugar com o seu corpo e com a sua fortuna, mas com a perfeição da sua alma.

Aqui se está diante de um momento singular e original da forma como

como o mesmo analisa dialeticamente o homem, sua existência e a constitui-ção do seu ser ou vir a ser do humano no ente homem (essência). Em Sócra-tes se des-vela a eticidade enquanto uma realidade constitutiva e necessária para se alcançar a integralidade do ser humano a partir da sua existência na pólis.

De pronto, o que se evidencia é que não estamos diante de um teórico, de um acadêmico, nem tampouco de um homem de retórica, mas de um homem maduro que tem a plena consciência do que seja o conhecimento

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na vida dos indivíduos, da sociedade e do seu papel frente aos concidadãos e demais homens, assim como perante a pólis e acima de tudo ao deus que o exortou para tal atividade.

Torna-se perceptível que o homem não é visto apenas como entidade material, física, como um ser histórico e culturalmente datado, por isso mes-mo, há a repreensão/exortação com relação à preocupação indevida com os bens materiais deixando de lado e até esquecendo-se de preocupação mais nobre e necessária - sua alma.

necessidade de cuidar da alma31, daquilo que ele entende como mais precioso

no humano e que não é o seu corpo, mas sim o seu interior. -

dar da alma como um cuidado através do conhecimento do valor e da verda-de (phronesis e aletheia). O mundo interior, a arete de que nos fala Sócrates é um valor espiritual. Destarte, servir a alma é servir a deus, porque ela é espírito pensante e razão moral, e estes são os bens supremos do mundo.

Deste modo, torna-se importante saber que,

Em Sócrates, aquelas expressões de aparência religiosa brotam da analogia entre a sua atuação e a do médico. É isto que dá

do pensamento e os dotes mais íntimos do espírito helênico. [...] A alma de que Sócrates fala só pode ser compreendida com o acerto se é concebida em conjunto com o corpo, mas ambos como dois aspectos distintos da natureza humana ( JAEGER, 1994, p. 534).

O pensamento socrático não separa, nem tampouco opõe o psíquico ao

físico, pois ambos, corpo e alma fazem parte do cosmo. Elucidativa, portanto, é a frase mens sana in corpore sano (mente sã em corpo são) para designar de forma correta o sentido do que fora acima exposto, uma vez que o próprio

3 -

explica pelo fato de a concepção cristã coincidir com a socrática na idéia da Paidéia como o verdadeiro serviço de Deus e do cuidado da alma como verdadeira Paidéia.

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Sócrates não descuidava do corpo e ensinava aos amigos a manterem o corpo são por meio do endurecimento e alimentação apropriada.

Faz-se mister informar que para a cultura helênica a arete deve ser ana-lisada através de uma analogia entre o corpo e a alma. Isto se evidencia por meio dos escritos, quando se observa que quase sempre as virtudes (aretai) da pólis grega estão associadas à bravura, ponderação, força interior, justiça etc. (virtudes da alma).

Os gregos falavam de virtude dos vários instrumentos, por exemplo, a

seria ser um bom guardião etc. Assim, a virtude do homem deve ser pensada a partir daquilo que venha a fazer a sua alma ser de acordo com o que a sua natureza determina, ou seja, boa e perfeita.

Daí Sócrates dizer que é a ciência (conhecimento) este elemento e o seu contrário, o vício (ignorância) seria a privação de ciência. Deste modo é que se vê o Filósofo grego operar uma reviravolta no quadro dos valores até en-

(virtudes), na medida em que são usados como o conhecimento exige (em função da alma e da virtude).

Daí então se poder falar que status, riqueza, poder, beleza, entre outros não são valores em si, pois são valores ligados a coisas externas e, se utiliza-dos de forma ignorante, podem levar o indivíduo ou a sociedade a grandes males (ethos hodierno).

Ao passo que os valores da alma governados pelo juízo e pela ciência, podem trazer benefícios para a vida humana. Conclui-se, assim, que para Sócrates, em si mesmos, nem uns nem outros (dos valores citados) têm valor.

Conforme nos diz Werner Jaeger em sua Paideia (1994, p. 535):

A virtude física e a virtude espiritual não são, pela sua essência -

ração corpo e alma assentam. É a partir daqui que o conceito -

vocos de todos os seus conceitos, se diferencia do conceito aná-logo na ética moderna. Será mais inteligível para nós o seu sen-

acepção que engloba simultaneamente a sua relação com quem

é, sem dúvida, também aquilo que se faz ou quer fazer por causa de si próprio, mas ao mesmo tempo Sócrates reconhece nele o

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verdadeiramente útil, o salutar, e também, portanto, o que dá prazer e felicidade, uma vez que é ele que leva a natureza do Homem à realização do seu ser.

Desta passagem se faz salutar extrair o elemento ético como caracteri-zador da natureza humana. Ou seja, ser dotado de razão é implicitamente ser convocado a contemplar o seu ser como uma simetria entre corpo e alma, uma ordem, um cosmion (um todo ordenado). Esta existência dota-da de razão e assumida responsivamente enquanto tal é que torna possível o ethos.

Para Sócrates, a formação da alma neste ethos é precisamente o cami-nho natural do homem, o caminho possibilitador da sua eudaimonia. Segun-

com o seu ser, é necessário que o mesmo siga a lei por ele des-velada através do exame da sua alma, pois a verdade uma vez des-coberta não pode voltar a ser velada ou, pelo menos, não deveria.

Tem-se aqui um princípio que se mostra de importância fundamental para a constituição da vida humana: verdade des-coberta é verdade que deve ser seguida. E no que tange ao ethos, tem uma implicação de instância moral, visto que não se pode brincar com experimentos, excentricidades, etc. quan-

Em Sócrates, nos diz Jaeger, a experiência, enquanto fonte dos valores humanos mais supremos deu existência àquele jeito de interioridade, carac-terístico dos últimos tempos da Antiguidade. E presenciamos, assim, o fenô-meno, o qual é o de a virtude e a felicidade deslocarem-se para a interioridade do homem.

Através deste apelo do Filósofo para o cuidado da alma, têm-se uma nova guinada com relação à forma do homem compreender e viver a vida. Porque a partir de agora a vida não é meramente um existir temporal, uma presa dos destinos, uma lástima dos sobreviventes e capricho dos deuses! Nem tampouco um viver comandado pelos desejos, vontades, pulsões.

Isso se torna evidente na vida e morte do próprio Sócrates, enquanto ente que paga cônscia e deliberadamente o preço por buscar viver uma exis-tência que almeja a autenticidade e singularidade.

Não é por menos que em Apologia de Sócrates (1979), o Filósofo decla-

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-tos, à escolha diante dos opostos (metaxy).

símbolos e modelos sedutores, os quais podem levar os homens de um lado para o outro ao sabor dos modismos culturais de cada época e que são marca registrada e elemento denotador destes tempos hodiernos (hedonismo, rela-tivismos, niilismo, materialismo, ideologias totalizantes, etc.).

A existência enquanto busca de vida singular e autêntica exige de cada ente humano uma escolha que inevitavelmente deve passar pelo conheci-mento, portanto, uma escolha deliberada por se apropriar literalmente do ser do ente homem. O que implica uma vivência ética. Desta maneira, a vida humana é por essência uma vida ética.

Não obstante ser o ente homem dotado de razão, esta não lhe é tão na-tural como os frutos numa árvore, ou como a defesa de uma galinha aos seus

logos precisa ser trabalhado, desenvolvido (Paidéia). -

mática chamada Sócrates, pois o foco central agora paira sobre a Paidéia e o

Não por menos, o ético retorna enquanto elemento preponderante,

os mesmos acirram a dúvida (ceticismo, relativismo) quanto à possibilidade da educação triunfar.

Inevitavelmente se há de deparar com os seguintes questionamentos: por que se deve estudar? Quem deve e o que se deve estudar? Até onde se deve estudar? Para que serve o estudo? Qual o objetivo da vida humana?

Com estas perguntas, não se busca denotar aqui um aspecto contin-gencial de uma época, aquela vivida pelo indivíduo/cidadão Sócrates. Mas

educação na formação do ser deste ente problematizador chamado homem. Assunto este bastante atual e ainda problemático dentro de nossa cultura.

Todavia, educação aqui não deve ser pensada como mera instrumentali-zação para alcance do poder político, ou como é corrente em nossa cultura, a formação de especialistas para o mercado de trabalho – criando assim uma nova classe que muitas vezes se torna subutilizada e obsoleta, não ocupando

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os cargos para que foi treinada, pois o mercado não necessita da quantidade de mão de obra oferecida.

Sem falar, é claro, da qualidade questionada de boa parte desta mão de obra, fruto de interesses escusos, mesquinhos (econômicos, políticos, ideológicos).

capacidade intelectiva, e, diga-se de passagem, é justamente do seio desta nova classe de intelectuais que se tem gestado muitos dos pensamentos nii-listas, revolucionários, progressistas que ganham contornos e proporções de anomalia, anomia alcançando o status de terrorismos sociais, indiferença para com a vida e o ser mais frágil (política sistemática pró aborto), a violên-

41

também está presente, não obstante, é com ele que a educação terá um sentido mais profundo, na medida em que procura reestruturar a conexão da cultura espiritual com a cultura moral (Paideia). Enquanto que o ethos contemporâneo (pós-moderno) é a mais profunda e deliberada intenção de destruição do ethos (tradicional do ocidente) por meio de uma reengenharia social (projetos de globalização).

É desta forma que Sócrates inaugura um novo modo de pensar e agir do ser humano ao buscar, na personalidade, no caráter moral, a essência fundan-te tanto da existência humana como da vida em sociedade. A este respeito nos diz Jaeger (1994, p. 546-547):

[...] toda educação deve ser política. Tem necessariamente de educar para uma de duas coisas: para governar ou para ser go-vernado. [...] O homem que é educado para governar tem de aprender a antepor o cumprimento dos deveres mais prementes à satisfação das necessidades físicas. Tem de se sobrepor à fome e à sede. Tem de se acostumar a dormir pouco, a deitar-se tarde e a levantar cedo. Nenhum trabalho deve assustar, por árduo

4 Conferir na obra Ensaios reunidos, Vol. I da universidade e as ideias das classes médias” e a obra A rebelião das massas, Ortega y Gasset onde tal fenômeno é riquíssimamente delineado de forma clara e concisa. , de Olavo de Carvalho.

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que seja. Não se deve deixar extrair pelo engodo dos praze-res dos sentidos. Tem de se endurecer para o frio e para o ca-lor. Não deve preocupar-se, se tiver de acampar a céu aberto.

as massas governadas.

Dentro do ideal de educação socrático, rico em símbolos e dado a mui-

de enorme importância para a cultura ética Ocidental, o qual é o de auto-domínio (enkrateia). Fazendo-se assim perceber que a conduta moral deve brotar do mais íntimo de cada indivíduo, ou seja, o autodomínio enquanto virtude basilar para a formação ética do indivíduo representa a emancipação racional para com as seduções e os desregramentos da sua natureza animal.

O autodomínio representa na vida de Sócrates a virtude humana de do-minar a tirania dos instintos pelo poder do espírito. E aqui se deve notar que o Filósofo toca em um problema central, porque, uma vez que o homem se torna vulnerável aos seus desejos e presa dos seus instintos, não se pode falar em um indivíduo livre nem tampouco em um cidadão ético (ações etica-mente livres). O que denotará, por conseguinte, no plano das suas ações em atitudes moralmente imaturas, logo, irresponsáveis.

Portanto, educar para Sócrates é muito mais que simplesmente domes-

real dimensão do que seja o ente homem. Visto que o homem nunca deverá ser tomado como meio, mesmo se

compreendermos que a sua formação está intimamente ligada com o ethos preponderante; que a formação do homem enquanto cidadão é sempre vol-tada para o exercício de servir à pólis, do engrandecimento da cidade, de suas leis e de seus cidadãos.

No entanto, este cidadão é antes e inalienavelmente um sujeito ético e, como tal, não deve se conduzir com relação às leis, normas, tradição enquanto um indivíduo submisso. Mas sim, de acordo com uma conduta moral que bro-ta do seu interior, que denota a maturidade (autodomínio) de um sujeito ético, a qual se expressa como uma ação consciente e deliberada, portanto, livre.

A essência da verdadeira Educação humana deve estar num conjunto de saberes (virtudes) que ao longo da existência viabilize ao ser humano as

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do bem, com a phronesis. Em outras palavras, a Paideia deve converter-se na aspiração a uma or-

espiritual e moral do homem.

REFERÊNCIAS

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PROJETO DE ESTADO GLOBAL E MUNDIALIZAÇÃO EM KANTIracema Maria Vasconcelos Silva*1

Resumo

A globalização é um dos fenômenos atuais que atinge os Estados soberanos em nome de um progresso tecnológico global; mas esse progresso não vem sendo acompanhado da implementação de justiça global. São objetivos deste artigo: avaliar a possibilidade de se implementar um Estado global na atuali-

-

de uma mundialização jurídica centrada numa visão humanista. Do ponto de

que o processo de globalização em países como o Brasil não pode nem deve desatrelar-se do cuidado com o social, com a desigualdade imensa e com os mais pobres. Na pesquisa, observou-se que, quando as informações chegam, mas o progresso não é acompanhado, há um intenso movimento de revolta pela falta de condições econômicas e insensibilidade dos que têm muito, mas não repartem. Conclui-se que a concretização de um projeto mundial poderá até ter sucesso, contanto que seja um projeto de globalização que contemple e inclua a todos, vez que, com exclusões, medidas extremistas e preconceitos exacerbados, jamais teremos um Estado legitimado por um direito global, como sonharam tantos idealizadores do Estado contemporâneo, com a ple-nitude do bem comum.

* Mestre em Direito e Instituições Políticas pela Fundação Mineira de Educação e Cultura (FUMEC); Especialista em Processo Civil pela Fundação Faculdade de Direito, Universidade Federal da Bahia (UFBA); Especialista em Direito do Trabalho e Previdência Social pela Fun-dação Faculdade de Direito UFBA; Especialista em Direitos Humanos pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB) - Ministério Público. Delegada de Polícia aposentada. Atualmente ministra as disciplinas Ciência Política e Teoria Geral do Estado no Centro de Ensino Supe-rior de Ilhéus (CESUPI), Faculdade de Ilhéus.

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Palavras-chave: Globalização. Mundialização. Kant.

Abstract

Globalization is one of the current phenomena that affect the sovereign sta-tes on behalf of a global technological progress; but this progress has not been accompanied by the implementation of global justice. The objectives of this article are: to evaluate the possibility of implementing a global state at present and their approach to the idea of globalization in Kant; to identify

formation of a legal globalization centered on a humanistic view. From the viewpoint of the methodology, it is a literature. This study does not intend to ignore the positive aspects of globalization, however, it became clear that the process of globalization in countries like Brazil can not and should unleash yourself of the with the social care, with the immense inequality and with the poorest. In the search, it was observed that when the information arrives, but progress is not matched, there is an intense movement of revolt by the lack of economic conditions and insensitivity of those who have much, but not share. It is concluded that the achievement of a global project may even succeed, provided it is a globalization project that addresses and includes everyone, once, with exclusions, prejudices exacerbated and extremist mea-sures, we will never have a state legitimated by a global law, as many creators dreamed of the contemporary state, with the fullness of the common good.

Keywords: Globalization. Globalization. Kant.

INTRODUÇÃO

O estudo da globalização enquanto fenômeno estatal dos tempos mo-dernos é relevante para a área da teoria geral do Estado, quando aborda a idéia de um Estado global na sua forma jurídica, na origem, nos elementos e nos seus projetos e transformações.

A sociedade humana é constituída por um conjunto de pessoas ligadas entre si pela necessidade de se ajudar umas as outras no plano material, bem

de que possam garantir e satisfazer seus interesses e desejos. Sem a vida em

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sociedade, as pessoas não conseguiriam sobreviver, pois o ser humano, desde que nasce e durante toda a sua vida, necessita de outros para conseguir ali-mentação, abrigo e outros bens e serviços indispensáveis.

A sociedade mundial ou global, como é mais conhecida, apresenta as-pectos negativos e positivos. Enxerga-se com maior facilidade, nas comuni-dades carentes do Brasil, os aspectos negativos, vez que, cada vez mais, a globalização vem assumindo um viés comercial. É na compreensão de que um Estado Mundial deve também impedir que todos sejam submetidos aos interesses dos mais fortes e poderosos que nasceu este estudo, comparando a globalização atual e a pensada por Kant, quando teorizou sobre um modelo

que efetivamente conduzissem a uma paz perpétua. Para o desenvolvimento deste estudo, lançou-se mão da pesquisa bi-

estudado para nela localizar conceitos, entendimentos e compreensão dos diversos autores consultados, a exemplo de Balladur e Vabres (2003), Bonavi-des (2000), Kant (2003), Souza Santos (2002), Zolo (1995, 2004), entre outros.

São objetivos deste estudo: avaliar a possibilidade de se implementar um Estado global ou, como se convencionou chamar, globalização na atu-

-

mundialização jurídica centrada numa visão humanista.

GLOBALIZAÇÃO ATUAL E MUNDIALIZAÇÃO EM KANT E A IDEIA DE IMPLEMENTAÇÃO DE UM ESTADO GLOBAL

Quando se pretende entender o processo de globalização que se realiza no presente, observa-se uma nova fase de expansão capitalista, dividindo o mundo em dois segmentos: os incluídos no processo de globalização; e os que não possuem condições de nele inserir-se. Estes últimos tornam-se ca-rentes de uma cidadania social plena, posto que não gozam de direitos, nem do ponto de vista do direito interno, nem do direito internacional, e, menos ainda, do direito humano global, aí se incluindo os direitos ditos econômicos sociais e culturais.

Assim sendo, numa primeira amostragem, a globalização que adentra nas realidades dos diversos países estaria centrada e dominada por interesses de

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mercados capitalistas, aumentando o risco de desigualdades sociais e de dese-quilíbrio econômico, já que foi abandonada a ideia de paz mundial. Assiste-se a uma concorrência entre Estados soberanos ou unidos por blocos, sejam oci-dentais ou orientais. No plano de uma justiça universalista, enfrentam-se con-

entre valores universais e lealdades particulares.

a existência do processo jurídico global numa nova ordem mundial não deve ser confundida com a ideia dos direitos humanos universais ou sequer com a

-manuel Kant, para o qual um processo mundial não destruiria os Estados so-beranos, devendo ser respeitadas as barreiras ideológicas e culturais. Assim,

um grupo de Estados sobre o resto do mundo.É desejável, portanto, distinguir-se o processo de globalização, que destrói

empregos e comprime a soberania dos Estados, do processo de universalismo centrado em Immanuel Kant, que propõe respeito, tolerância e, sobretudo, solidariedade nos diversos aspectos culturais, históricos e religiosos desses Es-tados. Quando Immanuel Kant pensou na ideia de uma justiça universal do ponto de vista cosmopolita, acreditava na possibilidade da existência de uma perfeita Constituição política única, universal, que permitiria à humanidade al-

problema para a espécie humana, a cuja solução a natureza o obriga é alcançar uma natureza civil que administre universalmente o direito.”

total liberdade induz os homens a entrar em sociedade, daí surgindo as re-gras morais e jurídicas. Desta forma, há que advir desses, limite de liberda-de e, ao mesmo tempo, liberdade de ação. É nessa dialética que, para esse

poder que detém sobre os demais, os obrigassem a obedecer a uma vontade universalmente válida. É preciso, entretanto, conforme entendimento de Im-manuel Kant (2003), que um Estado em relação a outros Estados mantenha certa liberdade e uma grande união. Esta união, contudo, exigiria, ao mesmo tempo, tolerância em relação aos costumes, ideias e crenças uns dos outros.

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Quanto ao comércio da época, Immanuel Kant (2003) tinha uma ideia positiva, atribuindo a formação mais civilizada e progressista da Inglaterra

-glaterra livre da época.

Entende-se que essa ideia de comércio como um viés progressista acompanha a humanidade até o presente, inscrevendo-se como uma opção de construção de uma sociedade nova. Essa ideia gerou o dogma de que, para uma acumulação de qualidade de vida, de progresso e de crescimento econômico, para uma perspectiva progressista a todas as nações do globo, o

Não obstante o comércio ter trazido grande contribuição, outras pers-pectivas, tais como organização política e social, crenças e até mesmo ques-

-volvimento de uma nação. Com o mesmo peso que Immanuel Kant (2003) atribuiu ao aspecto comercial, para o progresso da humanidade em geral ou

É bom dizer que, ao pensar a ideia de uma nação global, Immanuel Kant (2003) também estava convivendo num mundo de mudanças que, saindo do feudalismo, se encontrava num processo de transformação sociocultural, portanto, um mundo desigual e antagônico. Nesse contexto, foram criados

-cia jurídica.

Immanuel Kant (2003) aponta a própria experiência do gênero huma-no como indicativa da disposição do homem para o progresso e para o melhor. Refere-se ainda ao surgimento, a cada momento da história, de um signo ou marco histórico que demonstraria a tendência do gênero huma-no ao progresso. Cita, como exemplo, a revolução francesa que, munida de um signo, conseguiu um consenso entre várias nações, para impedir as

Parece importante salientar a ideia kantiana de uma nação guiada por

lançar as bases para a construção de um super direito, em que o poder inter-no de cada nação não fosse irrestrito, mas levasse em conta as demais nações. Daí advém novamente a ideia de um respeito mútuo e tolerância, visando ao bem maior a ser preservado: a paz.

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O que vem acontecendo com o chamado comércio global, entretanto, é que, não por acaso, os capitais especulativos alçaram uma posição de desta-que. Nas palavras de César Augusto da Silva (2000, p. 34):

-ça nos demais diversos cantos do mundo, os Estados Unidos, a partir de 1971, suspenderam a conversibilidade do dólar em

entre as moedas passou a ser uma moeda nacional — o dólar — que não tinha uma referência com o valor do ouro) determi-

a OPEP, dominada pelos árabes aliados de Washington, ligadas às empresas petrolíferas transnacionais, adotou uma política de aumentos reais de preços.

Logo, entende-se que os chamados capitais sem pátria1, que se concen-tram quase sempre em multinacionais, derivam de um capitalismo livre de

-dade organizada pelo mercado como a melhor forma de convivência huma-

-tação. O Brasil tornou-se um alvo porque, como sociedade que teve acesso tardio aos instrumentos de tecnologia nos anos 1970, disposto a endividar-se,

Entende-se que, se o universalismo fosse colocado somente sob o prisma do comércio entre nações, pode-se até dizer que, no momento, na nação global, estaria sendo consolidada essa ideia, pois o comércio atual caracteriza-se por uma economia global, existindo também fatores de in-terdependência, de integração e de abertura sem precedentes na história do

1 Os chamados capitais sem pátria, no entendimento de César Augusto da Silva (2000,

outra em busca de melhores condições políticas para sua maior rentabilidade e liqui-dez, a curto prazo, de acordo com a racionalidade de seus investidores, de tal sorte que o trabalhador acaba pagando o preço da volatilidade do capital de riscos. Com alto níveis de dívida pública, grande parte do ônus do serviço da dívida recai sobre a mão de obra na forma de redução de serviços sociais, menor investimento público ou impostos mais altos.”

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apresenta-se como se estivesse em condições de colocar as riquezas ao al-cance de todos, reduzindo as distâncias entre os países industriais avança-dos e os países em desenvolvimento. Na prática, entretanto, tal não ocorre. Ao invés do universalismo previsto por Immanuel Kant (2003), assiste-se a América do Norte, Europa, parte da Ásia, Japão de um lado e do outro as

Para César Augusto da Silva (2000), esses capitais atuam dentro de

-blica nos meados dos anos 1970. Ocorre que onde não existem amarras ao

economias nacionais vulneráveis à especulação. Assim, nas palavras desse autor:

O que é salutar apresentar em relação ao incremento do capi-

ao mundo, tendo em vista que a transnacionalização produti-va é um fenômeno que vem ocorrendo desde 1870, é que este fenômeno possui sua base material precisa, não sendo algo vindo de outro mundo e sim fruto de uma vontade política

os mecanismos mais importantes localizam-se nos serviços da dívida pública e nas políticas monetárias associadas a este. (SILVA, 2000, p. 36).

Para o professor Danilo Zolo (2004), quem paga o preço dessa econo-mia mundial e fragmentada são os mais pobres dos países pobres. O quadro da distribuição da riqueza em escala mundial é alarmante seja pelos dados atuais, seja pela tendência a aumentar o fosso e a disparidade entre as nações. Consoante esse autor:

No início dos anos sessenta, os 20% mais ricos da população mundial dispunha de renda trinta vezes superior aos 20% mais pobres. Hoje, depois de cerca de quarenta anos, os 20% mais ricos gozam de renda cerca de 66 % maior que os mais pobres. No Brasil se atribui cerca de 70% aos mais ricos, enquanto os

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20% mais pobres têm menos que 2%. (ZOLO, 2004, p. 35, tra-dução nossa).2

1

É importante observar que, no Brasil, embora a pobreza esteja difundi-da em áreas agrícolas, concentra-se de forma degradante nas periferias das

defendida por Immanuel Kant (2003) tenha chegado a um estágio de integra-ção, indo em direção a um mundo sem fronteiras, a percepção de que o mun-do encontra-se cada vez mais dividido é evidente em dois aspectos: poucos usufruem de muito; muitos nada possuem. Com esta divisão, coloca-se em questão a legitimidade dos que possuem a força e o poder econômico para atuar na condição de mediadores, com um status jurídico global, pois os que

de Estados”, com interesse de união de todos sob leis jurídicas necessárias, coerentes e corretas.

de Nação usada por Immanuel Kant (2003), não se consolida como na socieda-

que as diversidades das vontades particulares de cada Estado soberano se jun-tassem em torno de uma causa comum; mas não é o que se vê. O que existe no estágio atual é a ideia de crescimento de cada Estado soberano em detrimento de outros, tentando dominá-los. Para Immanuel Kant (2003, p. 64):

Além de ser um dever a realização da constituição republicana e da federação das nações que possibilitem a paz perpétua, esta é promovida especialmente pela insociável sociabilidade; com o desenvolvimento das sociedades chega-se a um ponto em que é do interesse do próprio governante ir aperfeiçoando as insti-tuições políticas. Se um Estado negligencia a cultura ele se en-fraquecerá na sua relação com os outros Estados e, mais ainda

2 disponeva di redditi trenta volte superiori a quelli della fascia ´piú povera della po-pulazione mondiale. Oggi, dopo circa quarant'anni, il 20 por cento gode di redditi di circa 66 volte superiori a quelle della fascia piu povera della populazione mondiale. In Brasile, per esempio, il 20 per cento piu ricco della popolazione si attribuisce circa il 70 per cento del reddito nazionale, mentre il 20 per cento piu povero va meno del 2 per cento.”

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a liberdade civil hoje não pode ser desrespeitada sem que se sin-tam prejudicados todos os ofícios, e principalmente o comércio e sem que por meio disto também se sinta a diminuição da força do Estado nas relações externas.

Pode-se ver, portanto, que não é nova a ideia de uma federação de Es-tados, do aperfeiçoamento das instituições políticas e da formação cultural, do fortalecimento das liberdades civis com a força do comércio diminuindo a força do Estado soberano nas relações externas. A forma como vem sendo realizada, entretanto, não tem atendido as expectativas, principalmente em razão das realidades complexas e difusas de temas, tais como: livre-câmbio de mercado, livre circulação de capitais; desigualdades entre países, comuni-cações, informática, ameaças à saúde pública mundial, terrorismo, sem fa-lar nos choques culturais das diversidades entre as nações (SILVA, C., 2000). Embora se possa aprender muito do sentido original da ideia do Estado

despontando atualmente, cada vez com mais força, a ideia de um conceito de mundialização mais equitativa. É desta nova ideia que se nutre a defesa de Edouard Balladur e Renaud Vabres (2003, p. 5, tradução nossa), publica-

a radicalização das opiniões públicas e os riscos de choques econômicos ou 3

2 Essa mundialização proporcionaria princi-palmente efeitos mais positivos a grande número de pessoas, aí incluídos os mais pobres.

Nesse texto, os autores discutem algumas questões, inclusive se a mun-dialização é um fenômeno novo e se agrava as desigualdades, no contexto da

todos os males daquele país, depois de ter se instalado certa liberdade geral de circulação dos bens e serviços e dos capitais, o fator igualdade começou a demonstrar-se insatisfatório, em razão dos desequilíbrios resultantes das desregulamentações do câmbio e da integração das economias.

3 -

civilizations.”

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-dependência e interação entre as pessoas de todas as nações. A princípio, fe-nômenos tais como a proteção da camada de ozônio, formas de poluição marítimas, epidemias de caráter global, dentre outros, começaram a apontar a necessidade de as organizações internacionais tornarem-se mais conscien-tes da existência de problemas transnacionais, apelando para as responsabi-lidades globais. A mundialização tornou-se mais conhecida, entretanto, em razão da evolução da economia, do livre câmbio, das novas tecnologias da informação e da comunicação e da noção de que se pode aplicar a circulação de ideias e informações em escala planetária.

Para Edouard Balladur e Renaud Vabres (2003, p.10, tradução nossa), quando os problemas que afetaram o processo de mundialização foram tor-nando-se mais claros, começaram a suscitar

[...] reações no seio da opinião pública, traduzidas pelo surgi-mento de movimentos antimundialistas que aparecem na cena midiática principalmente na reunião da OMC (Organização Mundial do Comércio) em Seatle (novembro 1999). Esses movi-mentos pediam que se pensasse na ideia de emergência de uma sociedade civil mundial [...]41

não Governamentais (ONG) constituíam os atores principais da mundialização.Aqui é preciso abrir um parêntese para relembrar que, embora, o pro-

cesso de mundialização não seja fato novo, como se observou na exposição

deste século, com a queda do muro de Berlim e o desenvolvimento da in-ternet, que a mundialização aparece com maior força. Dessa forma, a mun-dialização, fenômeno histórico antigo, tornou-se presente na atualidade, em razão dos avanços dos processos de integração e não pelo rompimento dos modelos de capitalismo vigentes. Para alguns autores, a exemplo de Edou-ard Balladur e Renaud Vabres (2003), Boaventura de Souza Santos (2002) e

4 de mouvements antimondialistes qui on fait irruption sur la scene médiatique lors de la réunion de l’OMC a Seattle (novembre 1999). Ces mouvements ont peu a peu acrédité l’idée de l’émergence d’una société civile mondiale [...]”

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Danilo Zolo (2004), a mundialização seria um estado histórico de economia

XVIII e início do século XIX.Edouard Balladur e Renaud Vabres (2003) salientam o papel da inter-

net na diminuição das distâncias, fazendo com que as informações das ci-dades passem para as zonas rurais de forma acelerada, de maneira que os

exposição, restritos a algumas nações. Ainda que essas nações não usufruam dos processos tecnológicos, quase todos têm conhecimento do alcance em que se encontram tais progressos e dos benefícios e prejuízos dessas novas tecnologias.

Ao que parece, o que oferece uma ideia de que a mundialização é um fe-nômeno novo é principalmente a consciência dos problemas globais que, no momento atual, são levados ao conhecimento da opinião pública, alcançan-do os mais diversos segmentos. Ideias tais como desigualdades entre nações,

-cha das sociedades do que uma ruptura histórica radical.

Ora, a globalização que destrói fronteiras, embora não pareça a forma mais adequada na resolução dos problemas atuais, lastreou o desejo de, neste

-tes de tudo, ressaltar o entendimento de que, nas obras Crítica da Razão Pura e Crítica da Razão Prática, Immanuel Kant expõe a ideia de ideal jurídico de comportamento (dever ser) que deveria traçar-se dentro de uma moralidade e de um ideal de paz num processo de mundialização. É preciso destacar-se a compreensão de Immanuel Kant (2003, p. 54) que assim entende uma nação:

[...] multidão dos homens sob as leis jurídicas. Enquanto estas leis são a priori necessárias, ou seja, decorrem por si mesmas dos conceitos do direito exterior em geral (não estatutariamen-te) sua forma é aquela de um Estado em geral, ou seja do Estado na ideia, como deve ser segundo princípios do direito, esta ideia

toda união efetiva visando construir uma república.

Consoante Eduardo Bittar (2005, p. 207), quando se coloca como base de

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-prescindível no plano político e das relações interestatais.” Foi nessa obra que Immanuel Kant (2003) discutiu o que poderia ser considerado como regras para o cidadão do mundo e que, na ideia de paz entre nações, repousa um pacto entre nações. Immanuel Kant (2003) via o Estado como uma sociedade de homens e, neste sentido, enxertá-lo em outro Estado contradiz a ideia de contrato originário, sem o qual é impossível pensar em direito algum so-bre um povo.É importante relembrar que este conceito de nação mundial,

qual o atual, em que as dívidas e o sistema de crédito cresciam de forma descomunal, tornando-se um tesouro para as guerras e um obstáculo para

deve imiscuir-se pela força na Constituição e no governo de outro Estado. E ainda, se houvesse despotismo e lutas internas dentro de um Estado sobe-rano, a ingerência de potências estrangeiras seria a violação de um direito de um povo independente que combate sua enfermidade interna, e seria também um escândalo, pois colocaria em risco a autonomia de todos os Estados soberanos.

Defendendo a ideia de que o direito cosmopolita deve atuar com condi-

que todo homem tem o direito de ser tratado sem hostilidade. Daí decorre o direito de visita de todo cidadão a outro território. Este direito reside na exis-tência de um direito de propriedade comum da superfície da terra. Prevê ainda

possui mais direito do que o outro de estar num determinado local da Terra.Assim, entende-se que, enquanto houver a esperança da existência de

um direito público comum, respeitando-se e tolerando-se diferenças, deverá também mudar-se a ideia de uma mundialização econômica, voltando-se ao

perpétua” que até então tem se concentrado em tratados, exteriorizando-se no direito internacional dos direitos humanos. Só desta forma, com respeito e tolerância, não será apenas mais uma ideia vazia. Logo, a ideia de nova po-lítica de globalização ou ideia de uma mundialização econômica há que ter como premissa a ideia de solidariedade entre povos.

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A paz é necessária e é salutar a união de Estados em busca de solidariedade e de ajuda não só para si, mas, sobretudo, para os mais fracos entre os fracos.

-nuel Kant, no qual não havia lugar para invasões banalizadas de outros Estados e destruição de soberania estatal. Segundo Eduardo Bittar (2005, p. 210):

Os Estados possuem e devem preservar suas soberanias (terri-toriais, jurisdicionais e econômicas, culturais, administrativas...) para poderem continuar a agir e decretar com autonomia. Não há Estado que não seja soberano, devendo-se, pois, preservar esta condição até mesmo após a adesão a um pacto internacional,

-gundo a qual o Estado é soberano no papel, mas na prática teria doado sua autonomia a um órgão dotado de soberania superior.

O pacto federativo permanente entre os Estados, ainda que tenha como base a ideia de um Estado universal, deveria, portanto, ter uma missão mais

-tia de uma paz deve estar acima da ideia mesquinha de apequenar, excluindo--se e destruindo-se os grupos que não se harmonizam com o que seria o ideal

missão ecumênica deste pacto é a de reunir a comunidade gentílica da huma-nidade e estender-se paulatinamente a todos os povos, não se restringindo, portanto, a um grupo selecionado de Estados acantonados na defesa recípro-ca de seus territórios contra os demais.”

A globalização ou mundialização atual assusta pelo poder de exclusão. Quando previu o Estado mundial, Immanuel Kant (2003), em sua ideia de fe-deração de Estados, acreditava na criação de condições de exercício de sobe-ranias. Deste modo, um possível atrelamento dos Estados só seria correto se

eliminar os que não pensam de forma igual está longe do processo político

com raras exceções, a globalização da internet e da tecnologia, sobretudo do

os novos organismos mundiais que estão se estabelecendo não apenas cria-rem leis que devam ser cumpridas por alguns, mas, sobretudo, criarem leis

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que permitam a todos submeter-se a direitos e obrigações internacionais e -

ção da pobreza e da desigualdade social.

ASPECTOS ESPECÍFICOS DA GLOBALIZAÇÃO ECONÔMICA ATUAL Em estudos sobre o processo de globalização, observa-se que está sur-

gindo uma classe capitalista, cujo centro de reprodução social é formado por organismos, sempre atuando como blocos econômicos, ultrapassando orga-nizações de trabalhadores e alterando questões antes atribuídas à soberania interna dos países. Esta classe está ligada intimamente ao comércio e sua mundialização e às empresas que as representam, entre outras empresas mul-tinacionais. Ao invés da redistribuição da riqueza mundial, esse processo vem provocando desigualdades sociais reconhecidas até mesmo por esses agentes

Segundo Relatório do Desenvolvimento do Banco Mundial de 1995, o conjunto de países pobres, onde vive 85,2% da popu-lação mundial, detém apenas 21,5% de rendimento mundial enquanto o conjunto dos países ricos, com 14,8% da popula-ção mundial detém 78,5% da riqueza ou rendimento mundial. (SOUZA SANTOS, 2002, p. 33).

A concentração da riqueza produzida atinge de tal forma os países po-bres que mesmo as chamadas medidas compensatórias, instituídas em tra-tados internacionais, não diminuem os riscos sociais, concentrando-se cada vez mais os bolsões de miséria. Há uma diminuição da autonomia política e da soberania, aumentando os acordos interestatais (União Europeia, Nafta, Mercosul). O Estado nacional encolheu, dando espaço a interações que des-troem suas fronteiras. Há uma forte tendência de o mercado internacional participar e forçar uma regulação jurídica mundial da economia, que só res-

constrição a um só comando. Segundo Boaventura de Souza Santos (2002,

enquanto unidade privilegiada de iniciativa econômica, social e política.”Ocorre que nenhuma posição sobre o processo de globalização é indiscu-

tível. A complexidade desse debate é grande e ainda que sejam reconhecidos

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os efeitos danosos, existe uma polarização entre duas posições: uma defende e minimiza os efeitos da globalização; a outra rejeita tal processo. Assim, de um lado encontra-se um grupo que observa, no processo político de globa-lização, um desenvolvimento decorrente da revolução industrial e da mo-dernização. Nesse contexto, encontram-se autores citados por Danilo Zolo (2004), tais como o sociólogo Claude Henry de Saint Simon e o estudioso de geopolítica Halford J. MacKinder. Estes, como defensores do processo políti-co global, enxergam uma contribuição para o comércio econômico, político

sob a força do mercado global.De outra parte, os críticos dessa forma de mundialização econômica

– Amartya Sem, entre outros citados por Danilo Zolo (2004) e assim tam-bém o próprio Danilo Zolo (2004) – apontam a América Latina, a África e o continente asiático como exemplos de que tal política apresenta aspectos

-ceiros, crises econômicas e crescente polarização e desigualdade na distri-buição da riqueza mundial são aspectos negativos. Embora reconhecendo a

uma política global, idealizada principalmente pelos Estados Unidos, quer destruir os estilos de vida diferentes e o pluralismo cultural, por meio de

da globalização:

[...] o sistema econômico internacional acrescenta a cada ano cerca de oito milhões de dólares como débito dos países po-bres através de instituições econômicas internacionais, con-troladas pela maior potência do planeta, enquanto milhões de pessoas na África, na Ásia Meridional e na América Latina são constrangidas pela pobreza a abandonarem os próprios paí-ses e a migrarem para as áreas mais ricas do mundo. (ZOLO, 2004, p. 15).

Esse ponto destacado por Danilo Zolo (2004) parece um forte argu-mento para que as nações ricas acordem para o fato de que o solo do pla-neta é único e, à medida que a miséria em países pobres for aumentando, haverá, cada vez mais, milhares de migrações para aquelas nações, por mais que se queira e se criem políticas para o fechamento de fronteiras.

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Aliás, este é outro grande paradoxo da política de globalização. En-quanto uma propaganda agressiva insinua que condições de vida, qualidade e desenvolvimento social serão obtidos mediante aberturas no consumo de mercados, fecham-se as fronteiras das nações ricas como forma de proteção contra as ondas de migrações dos pobres que vão buscar melhoria de vida nesses países.

Sucede que, quando se trata de distribuição de riqueza mundial, a ten-tativa de substituição, como vem sendo tentado, do princípio do Estado pelo

Comércio (OMC), Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial, entre outros. Não existem, entretanto, órgãos institucionalizados jurídicos para lutar em defesa de uma sociedade democrática global, baseada na igual-dade e na liberdade, na defesa da dignidade humana, da educação, da saúde e da previdência social no plano global.

Quanto ao direito ao trabalho nesse processo de mundialização, o órgão internacional que deveria lutar pela defesa do trabalho no aspecto interna-cional, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), embora se atenha à defesa de trabalhadores, quando se trata de seu papel de órgão mediador, no que se refere a uma globalização, que atua favorecendo a destruição de em-pregos nos territórios nacionais, não demonstra ênfase nessa defesa, como deveria ser seu papel.

Aliás, é a falta dessa defesa internacional que vem acirrando os riscos so-ciais não só do ponto de vista interno de cada nação, como também externo, posto que a falta de trabalho acarreta as ondas de migrações que, nas cida-des, fazem nascer favelas. Nos países desenvolvidos ou não desenvolvidos, as periferias urbanas atuam como fatores de exclusão e focos de perigo social. Eis porque, num processo de mundialização, entende-se que o papel da OIT deve alargar-se para políticas que defendam o emprego, cada vez mais escas-so, em decorrência, entre outros fatores, da globalização.

Insiste-se que o processo de globalização traz incerteza, riscos sociais e paradoxos não somente aos países subdesenvolvidos, mas também aos países ricos, pelo recrudescimento dos riscos sociais. Entende-se que a dis-paridade de renda que atinge em maior escala os países subdesenvolvidos, e

-las”, seja no âmbito urbano ou rural, não advirá somente das comunidades

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carentes ou países pobres, pois, em escala global, provoca desestruturas nas diferenças de classes, mudando as ideias de nação, família, emprego e, inclusive, destrói claramente a separação entre público e privado. A cha-mada desterritorialização e a perda do capital da vinculação nacional, além de levar à insegurança, promovem migrações internacionais na busca pelo trabalho.

Entende-se que tentar comparar a globalização da época atual com a ideia da sociedade cosmopolita em Immanuel Kant (2003) traz também peri-gos, posto que esse autor viveu há cerca de 300 anos, sendo, portanto, total-

e o mundo atual.Considerando que o direito positivo vigente no Brasil e no mundo foi

inspirado em Hans Kelsen, que também utilizou os conceitos de Immanuel Kant, foi-se encorajado a traçar o paralelo entre a fase que se atravessa de globalização e a sociedade cosmopolita pensada em Immanuel Kant, como já se falou, como forma de entender que esse processo global não é novo e a ideia atual está distorcida.

Aqui também se deseja deixar consignado que a ideia de um direito posi-tivo erga omnes, atualmente, tem sido superada por ideias outras, tais como a de que o direito não necessariamente tem que estar representado em deli-berações racionais e em uma lógica que extrapole os anseios de uma huma-

origem do fato jurídico, para entender que o direito, atualmente, tem uma acentuada vocação para um novo positivismo sociológico. É preciso assinalar o fato de que os homens estão unidos por uma profunda comunhão de inte-resses que culmina na preservação da espécie humana e esta não poderá ser encontrada fora de um contexto de paz mundial.

A sociedade humana e também o Direito convivem e coexistem quando interagem com outras formas de comunidade. O pensamento de um respeito mútuo deve atravessar e determinar o novo critério de um direito mundial que não está pautado nem em obediência cega a correntes positivistas, nas quais só os fatos legais têm importância na formação de um direito, tampou-co numa direção jusnaturalista. Seria o que se percebe como um construtivis-mo histórico jurídico, uma nova via, em que, antes de tudo, se destacasse no Direito o respeito integral pelo ser humano, percebido como o ator principal do mundo que construiu e reconstrói a cada momento.

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O Direito e um respectivo Direito mundial foram construídos sobre

perpetuação da humanidade. Foi preciso valorar aspectos como liberdade,

direito a um meio ambiente saudável para se construir os diversos ramos do Direito autônomo enquanto norma. O âmbito do Direito não pode ser

metafísica uma consciência jurídica popular é anular o esforço de milênios para que o Direito evolua ao lado do ser humano.

o conceito do Direito, e compreende-se que todas colaboraram, seja no res-surgimento de um conceito antigo, seja no desenvolvimento de um conceito renovador do Direito. Ressalta-se um processo jurídico construtivista, não positivista na perspectiva do negativismo jurídico, em que nada pode subsis-tir fora da cartilha kelseniana, mas num outro contexto, observando que a história precisa sempre ser reavaliada. Se, em algum momento, determinada escola de corrente jurídica estiver sendo ultrapassada, deve-se revisar seus conceitos, para que haja a devida adequação ao tempo presente.

Ao centrar numa possível conceituação do jurídico frente a uma mun-dialização, não se pode eximir de analisar também o papel do Estado enquan-to ente soberano e Nação, pois ainda é entre Estados soberanos que se efetu-am as maiores trocas comerciais e repousa a ideia de uma nação cosmopolita e de uma economia mundial mais justa. Assim, vista a ideia do que poderia vir a ser um direito universal, discutir-se-á o conceito do que poderia vir a ser um Estado e algumas consequências do Estado Mundial. Não obstante

-

território e dotada de um poder originário de mando.” A maior parte dos au-

os Estados: o território, o povo, o governo e a soberania.

Estado pessoa jurídica:

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Também o Estado é uma corporação, isto é uma comunidade que é constituída por uma ordem normativa que institui órgãos funcionando segundo o princípio da divisão do trabalho, órgãos esses que são providos na sua função imediata ou mediata. E

-ração submetida ao direito internacional, pode-se fazer distin-guir entre deveres e direitos externos e internos: os primeiros são estatuídos pelo Direito Internacional, os outros são estatuí-dos pela ordem jurídica estadual.

Assim sendo, também no que se refere ao Estado, não se exclui nenhuma das teorias que pretendem explicar o Direito, pois, antes, se complementam, na medida em que trazem elementos importantes para seu entendimento. Por outro lado, Estado, Direito e Sociedade estão interligados. O Estado ex-terioriza-se não somente em seu território delimitado, mas também à medi-da que se organiza e nascem as regras de conduta. O conceito de sociedade torna-se importante, pois não pode haver conceito de fenômenos jurídicos se não está presente uma sociedade humana. Entende-se que pode até existir um Estado com um Direito deturpado, contudo não pode haver Direito sem povo, território e nação, ou seja, sem Estado.

-zações das sociedades humanas é garantir ao indivíduo seu desenvolvimento como pessoa, para que consiga realizar seus objetivos pessoais, políticos e econômicos. Claro está que não se defende uma exacerbação da soberania estatal, mas o respeito ao outro, aspecto fundamental na ideia de uma socie-

alcançar a mais perfeita Constituição Política. Na forma como a globalização vem sendo realizada, entretanto, tal não ocorre; ao contrário, guerras sem ideologia vêm se sucedendo nesses tempos conturbados, gerando a perda da

Assim, os atos terroristas esvaziados de sentido, bem como as revanches das potências econômicas a Estados soberanos, assustam não só aos países subdesenvolvidos, mas a todos aqueles que estão à margem da sociedade global. A fobia que parece contida na vontade de exercitar uma eugenia entre povos ricos e pobres, excluindo os que não possuam a mesma visão entre

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e destrói as esperanças numa competição mais solidária, justa, saudável e esperada. Também coloca o que pensa diferente cada vez mais à margem do processo de desenvolvimento.

Nesse processo de exclusão, milhares de pessoas morrem de fome ou passam sua existência em condições de perpetuação de miséria, sem que as vias para a solução desse problema sejam pensadas ou fomentadas, ao tempo em que o mundo assiste a um progresso jamais testemunhado ao longo da história humana. Por outro lado, usa-se a força e massacram-se nações in-

que quer acabar com as diferenças tem sua origem no velho modo de pensar imperialista e nas ditaduras que não aceitam a expressão de algo diferente do que se acredita como melhor maneira de ser. Por soberania unilateral entende-se o processo de globalização que dilacera as fronteiras, mas não apresenta uma melhor forma de desenvolvimento, a não ser aquela em que a maior nação do planeta quer impor sua economia ao mundo, para que os demais países curvem-se a essa política, ainda que ao custo de exterminar sua própria cultura, seu povo, seu modo de ser único.

Nações ricas e desenvolvidas estão cientes dos resultados do processo de globalização para o mundo subdesenvolvido. Assiste-se, portanto, ao que Han-

calar-se diante de situações desumanas, começando a achar normais situações de risco social, ainda que sabedora e consciente do mal que tal omissão causa. Enquanto pode unir seus interesses no chamado Direito Comunitário, a Eu-ropa, por exemplo, tem conseguido se defender dos efeitos mais perversos da globalização. No entanto, cala-se, assim como outros países, tais como o Japão, que não sofrem ainda os efeitos danosos. Esse silêncio, entretanto, em torno de uma mundialização injusta e desigual e a desproporção entre as trocas comer-ciais, nas formas de cooperação, torna difícil a países unirem-se em blocos, vez que não conseguem distinguir os que são verdadeiramente amigos.

Nas lições de Hannah Arendt (2004, p. 285), quando a consciência co-meça a parecer ter se perdido e guerras e misérias passam a ser vistas com indiferença, é preciso parar e repensar que o conceito de território:

[...] diz respeito não tanto e não primordialmente, a um peda-ço de terra, mas a um espaço entre indivíduos de um grupo, cujos membros estão ligados e ao mesmo tempo separados e

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protegidos uns dos outros por todo o tipo de relações baseadas em língua comum, religião, história comum, costumes e leis. Tais relações se tornam especialmente manifestas, na medida em que elas próprias constituem o espaço em que os diferentes membros do grupo se relacionam e interagem entre si.

As guerras atuais não têm mais o sentido de justas ou injustas, assim também como as agressões externas, tanto no caso do Afeganistão, em que

simples suspeita e a vontade de demonstrar o desejo de dominação, força e poder não podem prevalecer em presença de consciências racionais, pois es-sas são o cume na construção do processo civilizatório de séculos.

Assim como foi possível criar uma consciência global, em que mais im-portante que a cultura local é a integração ao global, é preciso compreen-são para o fato da não destruição de Estados, posto que as democracias e os Estados soberanos foram criados, sobretudo, para demonstrar a tolerância às mais diferenciadas culturas e formas de agir. Tentar varrer do mundo as diferenças étnicas e culturais não é e nem nunca poderá ser a ideia adequada a um mundo globalizado. Ao contrário, aceitar as diferenças e inserir o novo,

Deste modo, a questão da política de globalização deveria ser entrelaça-da a uma retomada da ideia de um direito à cidadania social global, que nada mais é do que a efetividade referente ao gozo do cidadão, dos direitos que lhe ofereçam qualidade de vida não apenas do ponto de vista do cidadão do Estado soberano, ao qual pertence, principalmente levando em consideração a ideia do cidadão associado a uma perspectiva unitária do universalismo, ou seja, do cidadão do mundo ou do globo terrestre.

Propõe-se que, ao invés de tentar-se entender o antagonismo existente entre o liberalismo democrático e o fundamentalismo islâmico, por exemplo, dever-se-ia debater as razões dessa revolta que quer legitimar atos terroris-tas como única forma de ver reconhecidos valores étnicos e culturais, cujo processo deverá levar à extinção de povos pobres. Desse modo, pergunta-se: Qual a exigência moral sobre a qual se pode sustentar esse antagonismo a não ser a legitimação da força, por meio da guerra despida de ideologia?Entender

humanistas de integração social, sem que seja preciso exterminar culturas e

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Estado soberano ou até mesmo de um Estado global é apenas retroceder às -

comum. O Estado, tal como conhecemos hoje, é fruto de lutas e de ideais, portanto, num Estado mundial não se pode ignorar o Estado nacional, pois, foi através desses, do respeito às diferenças que a humanidade conseguiu che-gar ao atual momento de civilização.

CONCLUSÃO

A globalização é um dos fenômenos atuais que atinge os Estados so-beranos em nome de um progresso tecnológico global, que não vem sendo acompanhado da implementação de uma justiça global.

estado global só deixará de ser uma idealização quando os organismos mun-diais que estão se estabelecendo, não apenas criarem leis que devam ser cum-pridas apenas por alguns, mas, sobretudo, que permitam a todos submeter-se

-pação global em favor da paz e da diminuição da pobreza e da desigualdade

possibilite a todos os Estados plenas condições de exercício de soberania, sem admitir exclusões.

Um Estado que se queira como representação mundial, não pode abrir mão do respeito à liberdade, do reconhecimento à igualdade como direito fun-damental e da supremacia do povo, que deve decidir diretamente, ou por meio de um representante do eleitor. Ignorar o direito de soberania na ordem mun-dial é esquecer todos os preceitos democráticos adquiridos ao longo da história de luta da humanidade para o reconhecimento dos direitos fundamentais. Os Estados soberanos atuais só conseguirão progredir mediante o reconhecimen-to desses direitos, tanto no plano interno, como no internacional.

Em meio a disputas e vinganças, não se pode esquecer do projeto de paz -

diais a que se assiste. Pode-se, sim, pensar numa mundialização, mas jamais destruindo o pilar da dignidade humana, através do qual foi construída toda a história da humanidade.

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REFLEXÕES SOBRE A USUCAPIÃO CONJUGAL.Márcia Monteiro Ferreira Delmas*1

Resumo

Em 17 de junho de 2011, veio a lume a Lei Federal n. 12.424, decorrente da conversão da Medida Provisória n. 514, de 2010. Dentre várias alterações no

no Código Civil de 2002, dispositivo sobre o qual recai a elaboração do pre-sente trabalho. É que ele inseriu uma nova modalidade de usucapião, com lapso temporal de 2 (dois) anos e requisitos inovadores, inclusive um destes de ordem subjetiva, qual seja, o abandono do lar. Tal elemento vai na contra-mão do escólio jurisprudencial e da doutrina moderna. Além disso, a forma como adveio ao ordenamento jurídico – medida provisória – torna sobrema-

porquanto além de ser mais razoável a devida tramitação do tema por meio de projeto de lei ordinária, não se vê nenhuma circunstância capaz de exigir o caráter extraordinário da matéria.

Palavras-chave: Usucapião. Medida provisória. Separação. Abandono do lar.

Abstract

On June 17, 2011, the Federal Law n. 12,424 came to light, resulting from the conversion of Provisional Measure n. 514, 2010. Among several changes in the Government Programme "My House, My Life," it added Article 1240-The Civil Code of 2002, the device on which rests the preparation of this work. It entered a new kind of usucapião, with delay of 2 (two) years and

* Doutoranda, Mestre em Direito do Estado, Especialista em Direito Tributário e Direito Processo Civil, Advogada, Professora Universitária)

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innovative requirements, including one of these subjective aspects, namely, the abandonment of the home. This element goes against scholium modern jurisprudence and the recent doctrine. Moreover, the way the legal system stemmed - provisional measure - becomes exceedingly debatable assumption

-ble proper conduct of this matter by means of ordinary bill, it is not seen any circumstance capable to require the extraordinary character of the matter.

Keywords: Adverse possession. Interim measure. Separation. Leaving home.

INTRODUÇÃO

No dia-a-dia dos advogados especialistas, em direito de família, é possí-vel perceber a noção difundida entre muitos clientes no sentido de que a par-te – homem ou mulher – que abandonar a residência conjugal por ocasião do

processo judicial futuro, especialmente em caso de litígio.-

o início da contagem do prazo até recentemente exigido para a decretação da separação e do divórcio das partes, bem como para delimitar o momento a partir do qual os bens deixavam de se comunicar e que os deveres conjugais ou decorrentes da união estável deixavam de ser exigidos.

Ultimamente, a cada mês surge uma pequena ou grande mudança legisla-tiva em termos de direito civil. É a Lei de Introdução ao Código Civil que muda de nome (sem mudar o conteúdo), a idade da pessoa que se casa pelo regime da separação obrigatória passa que para 70 anos e, agora, surge uma nova modali-dade de usucapião: a usucapião familiar. São os tempos pós-modernos, em que a celeridade permeia as relações humanas e também a vontade do legislador em "aprimorar" o sistema.

Não foi sem grande surpresa que surgiu uma nova modalidade de usu-capião denominada por muitos de usucapião familiar ou usucapião conju-gal. A lei 12.424/11 alterou o Código Civil criando um dispositivo, o artigo 1240-A.

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Por meio da inclusão do artigo 1.240-A, no Código Civil, instituiu-se em

que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companhei-ro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.”.

Em outras palavras, prevê a nova disposição do Código Civil que aquele que deixar o imóvel que servia de residência à família após dois anos perderá o direito de propriedade sobre o bem em favor do outro que permaneceu no imóvel, desde que não tenha contra a circunstância se insurgido e que o bem seja urbano, tenha menos de 250m2 e seja o único da parte que nele conti-nuou a residir com exclusividade.

Essa inovação legal certamente é bastante controversa, pois, até a pro-mulgação da norma em questão, os motivos ou o modo como a entidade

era realizada segundo as regras do regime de bens eleito pelo casal (assim era que, mesmo a parte considerada culpada pela falência do relacionamento fazia jus a meação, caso unida em regime da comunhão parcial ou universal de bens). Agora, todavia, não é mais dessa maneira, pois a forma como se deu

(IR) RELEVÂNCIA DO ART. 1204 “A” NO ABANDONO DO LAR

Dentre as várias questões polêmicas – e aparentemente mais negativas do que positivas – trazidas com a instituição da usucapião do art. 1.240-A do Código Civil, a que apresenta maior relevo é o provável retorno do requisito

Outro elemento subjetivo, pelo qual as partes se digladiavam em Juízo, era a comprovação da culpa por parte de um dos cônjuges.

De acordo com a história, o Estado sempre teve a postura nítida de, a qual-quer preço, manter o laço matrimonial. Assim, quem nada tinha contra o par,

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não teria o direito de postular a separação.

teria legitimidade para tal postulação. Compreende ser adequada a denomina-ção usucapião familiar ou conjugal em razão de sua origem, qual seja, o imóvel pertence aos cônjuges ou companheiros, mas só é utilizado por um deles após

-sárias, são elas: A primeira é que o instituto tem origem no direito à moradia consagrada no art. 6º da Constituição Federal. Trata-se de norma que protege pessoas, normalmente de baixa renda, que não têm imóvel próprio, seja urba-no ou rural. A redação do dispositivo exige praticamente os mesmos requisitos

ou pro moradia. É de se notar, contudo, que prazo é mais exíguo que aqueles de qualquer outra modalidade de usucapião: apenas 2 anos.

Também, em razão do caráter constitucional do instituto, prevê o pará-grafo primeiro do art. 1240-A que este direito não será reconhecido ao mes-mo possuidor, mais de uma vez. Imagine a seguinte situação concreta. Deter-minada mulher casada permanece no imóvel comum, residência da família, enquanto seu marido vai voluntariamente embora de casa e constitui nova família em cidade distante. Atravessados dois anos do abandono, a esposa reúne os requisitos para a usucapião familiar. Sendo proprietária do bem em razão de sentença que declara a usucapião, a esposa vende o bem. Iniciando agora uma união estável surge a mesma situação. O companheiro abandona o imóvel e a companheira dois anos depois promove a ação de usucapião. De acordo com o dispositivo, como esta mulher já usucapiu imóvel se utilizando da usucapião familiar, só poderá usucapir o bem por outra modalidade, seja ela prevista no Código Civil (usucapião extraordinária do art. 1.238) ou pela Constituição (art. 183).

A segunda ponderação diz respeito ao tipo de imóvel. Apenas o imóvel urbano pode ser objeto da usucapião familiar. É a moradia e não o trabalho que se privilegia. Por isto o artigo 1.240-A surge em sede de regulamenta-ção do programa do Governo Federal "Minha casa, Minha vida". Assim, não há regra análoga ao art. 191 da Constituição com relação à usucapião de imóvel rural, qual seja, a usucapião pro labore. Não se trata de dar terra a quem não tem.

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Além disso, o imóvel deve ser de propriedade do casal que passar a exis-tir com o casamento ou com a união estável, seja ela hetero ou homossexual.

O imóvel pode pertencer ao casal em condomínio ou comunhão. Se o casal for casado pelo regime da separação total de bens e ambos adquiriram o bem, não há comunhão, mas sim condomínio e o bem poderá ser usucapiado. Também, se o marido ou a mulher, companheiro ou companheira, cujo regi-me seja o da comunhão parcial de bens compra um imóvel após o casamento ou início da união, este bem será comum (comunhão do aquesto) e poderá ser usucapido por um deles. Ainda, se casados pelo regime da comunhão universal de bens, os bens anteriores e posteriores ao casamento, adquiridos a qualquer título, são considerados comuns e, portanto, podem ser usucapidos nesta nova modalidade. Em suma: havendo comunhão ou simples condomínio entre côn-juges e companheiros a usucapião familiar pode ocorrer.

A posse comum não enseja a aplicação do dispositivo. Não se admite usucapião de imóvel que não seja de propriedade dos cônjuges ou compa-nheiros. Assim, se um casal invadiu um bem imóvel urbano, de até 250 m2, reunidos todos os requisitos para a aquisição da propriedade (seja por usuca-pião extraordinária, seja por usucapião constitucional), ainda que haja aban-dono por um deles do imóvel, por mais de 2 anos, o direito à usucapião será

-

extinção da união estável), ou sentença ou escritura pública de divórcio ou separação de direito, bem como liminar em medida cautelar de separação de

e companheiros que não se valeram de meios judiciais ou extrajudiciais para reconhecer que a conjugalidade.

É a simples saída do lar conjugal.A separação de fato, portanto, permite o início da contagem do prazo da

usucapião familiar, desde que caracterizado o abandono. A separação de fato

conjugal e do regime de bens. Neste sentido decidiu o STJ que:"1. O cônjuge que se encontra separado de fato não faz jus ao recebi-

mento de quaisquer bens havidos pelo outro por herança transmitida após

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decisão liminar de separação de corpos. 2. Na data em que se concede a sepa-ração de corpos, desfazem-se os deveres conjugais, bem como o regime ma-trimonial de bens; e a essa data retroagem os efeitos da sentença de separação judicial ou divórcio. (REsp 1065209/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 08/06/2010, DJe 16/06/2010)"

Diante desta correta orientação, não há motivos para que a separação de fato não seja motivo para início do prazo desta nova modalidade de usucapião.

toda a modalidade de usucapião, a usucapião familiar exige que o proprietá-rio deixe de praticar atos que lhe são inerentes, sejam estes atos de uso, de gozo ou de reivindicação. Abandono deve ser compreendido como efetivo não exercício de atos possessórios. Se o cônjuge ou companheiro que não residir no imóvel tomar qualquer medida judicial ou extrajudicial visando à

é o do cônjuge que propõe ação para arbitramento de aluguel pelo uso exclu-sivo da coisa comum ou que propõe ação de partilha do bem comum.

Evidentemente, que se a mulher se valeu das medidas previstas no art. 22 da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06) para sua proteção, quais sejam, afasta-mento do marido ou companheiro do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida; proibição de determinadas condutas, entre as quais: a) apro-

mínimo de distância entre estes e o agressor; b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação; c) freqüentação

ofendida; não há que se falar em abandono por parte do marido ou companhei-ro e, portanto, não há possibilidade de usucapião familiar. Se usucapião houver, será por outra modalidade qualquer, mas não a do art. 1.240-A do Código Civil.

O parágrafo 3º do dispositivo em questão é cristalino: para garantir a efeti-vidade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial. Evidente está que se houve recusa do ma-rido ou companheiro em sair do imóvel, a ponto de se requisitar força policial, abandono não houve para que se aplique esta nova modalidade de usucapião.

Da mesma forma, ocorrendo o disposto no art. 23 da Lei 11.340/06 não se pode dizer que houve abandono de lar, já que o juiz pode determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor; determinar o afastamento da ofendida do lar,

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ainda, determinar a separação de corpos. Em todas estas situações não

foi vetado pela Presidente da República. O dispositivo tinha a seguinte reda-ção: "§ 2º No registro do título do direito previsto no caput, sendo o autor

registrador não incidirão e nem serão acrescidos a quaisquer títulos taxas, cus-tas e contribuições para o Estado ou Distrito Federal, carteira de previdência, fundo de custeio de atos gratuitos, fundos especiais do Tribunal de Justiça, bem como de associação de classe, criados ou que venham a ser criados sob qualquer título ou denominação." A razão do veto foi a seguinte: "Os disposi-tivos violam o pacto federativo ao interferirem na competência tributária dos Estados, extrapolando o disposto no § 2º do art. 236 da Constituição"

OS PROBLEMAS DO ART. 1204 – A

Dentre as várias questões polêmicas – e aparentemente mais negativas do que positivas – trazidas com a instituição da usucapião do art. 1.240-A do Código Civil, a que apresenta maior relevo é o provável retorno do requisito

Outro elemento subjetivo, pelo qual as partes se digladiavam em Juízo, era a comprovação da culpa por parte de um dos cônjuges.

Historicamente, o Estado sempre teve a postura nítida de, a qualquer preço, manter o laço matrimonial. Assim, quem nada tinha contra o par,

não teria o direito de postular a separação.

teria legitimidade para tal postulação.A Lei do Divórcio (Lei n. 6.515, de 1977) trouxe, no artigo 5º, o seguinte

ao outro, conduta desonrosa ou qualquer ato que importe em grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum”.

-veres do casamento, aspectos de absoluto senso comum”.

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-vida do Estado nas questões particulares do casal.

A doutrina menciona que o Código Civil de 2002, em vez de evoluir nesse contexto, afastando-se aferir questões subjetivas, incorreu em retroces-

de separação judicial, imputando ao outro qualquer ato que importe grave violação dos deveres do casamento e torne insuportável a vida em comum”.

Uma simples análise histórica apresenta, por si só, a rigidez do legislador no trato com as questões relativas ao Direito de Família. Em virtude disso, coube aos Tribunais ajustar as situações decorrentes da evolução natural da sociedade aos textos legais, preenchendo lacunas e conceitos jurídicos inde-terminados

Primeiro bem lembra o Prof. Ehrhardt que "parece não haver nenhuma -

conhecimento da usucapião. Todas as iniciativas recentes voltadas ao tema visam apenas à criação de novas formas para exercício de tais direitos, crian-

-nhecimento do instituto". Efetivamente, todos os problemas procedimentais da usucapião passam longe da preocupação legislativa. O excesso de buro-cracia e de custos inerentes à usucapião acaba afastando as partes de se valer desta forma de regularização fundiária.

Uma segunda questão diz respeito aos prazos. Isto porque o art. 1240 do CC (que reproduz o artigo 183 da Constituição) exige um prazo de 5 anos para usucapião e a usucapião familiar fala apenas em 2 anos. Pergunta o Prof. Ehrhardt: "O separado de fato terá mais vantagens do que aquele que ainda vive com sua família?". A resposta é a seguinte: para a usucapião em face de terceiros prossegue o prazo de 5 anos, já para a usucapião entre cônjuges prevalece o prazo de 2 anos.

Assim, se João casado com Maria adquirem o imóvel de José e deixam de pagar as prestações. José nada faz. Após 5 anos, sendo o imóvel urbano de no máximo 250m2, e o único da família, haverá a possibilidade da usucapião pelos cônjuges em face de José. Por outro lado, para João ou Maria usucapir a metade do bem que pertence ao outro cônjuge, é necessário apenas período de 2 anos após a separação de fato ou de direito do casal.

A lei presume, de maneira equivocada, que quando o imóvel é familiar deve o prejudicado pela posse exclusiva do outro cônjuge ou companheiro

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-ve questões emocionais e afetivas que impedem, muitas vezes, rápida tomada

Outra questão interessante é a seguinte: "se ambos ingressarem com a demanda? Basta que o imóvel sirva de residência para a família, não necessa-riamente para o autor da ação. O texto da lei parece não permitir que a pro-priedade seja conferida a ambos". Aqui ouso discordar. Nestas modalidades de usucapião a posse que se exige é personalíssima. Seu espírito é dar casa a quem não tem. Assim, que não utiliza o imóvel como residência não poderá se valer da usucapião familiar.

Este me parece ser o correto alcance do dispositivo. Trata-se de usucapião exclusivamente a ser utilizado entre cônjuge ou companheiro contra seu anti-go consorte que abandonou o lar e não se opôs pelo período de 2 anos a posse

A utilidade do novo instituto é clara. Havendo abandono do lar, a usuca-

prazo inferior àqueles das demais modalidades constitucionais de usucapião?Ademais, se o imóvel foi adquirido pelo casal, como resultado do esforço

comum, seja ele material ou espiritual, qual o motivo para permitir a usuca-pião? Sendo assim, pode sentir, que há uma punição patrimonial ao cônjuge ou companheiro que "abandona" a família.

Seria justa esta usucapião se o cônjuge ou companheiro abandona o imó-vel e não a família? Um bom argumento ao cônjuge ou companheiro que não mais utiliza o bem é que se não abandonou a família, apenas tolerou a presença

desta usucapião familiar.Verdadeiramente, creio que teremos mais problemas que solução. Esta

seio da família (mesmo acabada a família conjugal, prossegue a parental) comprometendo a manutenção de bons vínculos parentais, no mais das ve-

-fundamento do debate.

-de de usucapião.

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Sob outro vértice, não será apenas o Poder Judiciário que sofrerá com ações tendentes a afastar ou a comprovar o abandono do lar pelo casal.

Além do desnecessário retorno das discussões afetivas, como não existe

direito real de propriedade à parte autora, deverá haver o registro do imóvel, com exclusividade para o ex-cônjuge abandonado, no Cartório de Registro de Imóveis, conforme preconiza o artigo 1.227 do Código Civil.

Vale acrescentar, de igual maneira, que os cartórios de registro de imó-veis também terão a demanda elevada. Tal circunstância, que a priori tende-ria a ser positiva, mostra-se em verdade como mais um ônus a ser suportado,

-ção desta espécie de usucapião, a maioria esmagadora dos litigantes usufruirá do benefício da justiça gratuita e da gratuidade nas averbações imobiliárias.

CONCLUSÃO

inafastável eiva de inconstitucionalidade, por dois motivos: o assunto contido no nóvel artigo 1.240-A do Código Civil de 2002 não possui nenhuma ligação

-gência, haja vista que absolutamente nenhum prejuízo haveria se o assun-

ordinária, com a realização de estudos e a devida discussão entre os Parla-mentares sobre as consequências de outra forma de aquisição originária de propriedade, com requisitos tão peculiares.

A prova do abandono do lar, marco inicial que terá relevância ímpar na -

dáveis discussões judiciais. Basta uma análise histórica do instituto da com-provação da culpa na separação conjugal para se concluir que a criação de

dies a quo da usucapião familiar seja positivo.

O registro da propriedade imobiliária também pode trazer diversos pro-blemas, como o aumento das ações anulatórias de atos jurídicos – decorren-

preenchimento do requisito do abandono do lar.

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Percebe-se que ou o ex-marido comprova que não houve abandono, ou seja, que a decisão de sair decorreu da separação, ou perderá a sua quota-parte sobre a propriedade do bem. Nesse caso, a ação cautelar de separação de corpos servirá para demonstrar que houve o rompimento do vínculo matrimonial.

de 2002, da maneira como foi feita e especialmente sobre a matéria nela cons-tante, apresenta mais prejuízos do que benefícios à população.

Sítios consultados:www.camara.gov.brhttp://www.senado.gov.brwww.presidencia.gov.brwww.stf.jus.brwww.stj.jus.br

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PASSIVO AMBIENTAL: ASPECTOS CONTÁBEIS E LEGAISDanilo José Santana dos Reis*1

Alessandro Fernandes de Santana**2

Resumo

Ambiental no Brasil, nos moldes dos padrões da Contabilidade e das Leis -

tituição da República Federativa do Brasil, a Lei n.º 9.605, de 12 fevereiro de 1998, instruções do Intergovernamental Working Group of Experts on Internatio-nal Standards of Accouting and Reporting, do International Accounting Standards Comittee, do Instituto Brasileiro de Contadores, livros, artigos e revistas. A pesquisa constatou que a normalização contábil brasileira recomenda que o Passivo Ambiental deve ser evidenciado quando ocorrerem gastos associados ao Meio Ambiente. Mas, o nível de conscientização das empresas ainda não é

construtiva e justa, conforme os padrões internacionais de contabilidade.

Palavras-Chave: Passivo Ambiental. Evidenciar. Obrigação Construtiva. Obrigação Justa.

Abstract

This article aims to verify the timing of recognition of the Environmental Liabi-lity in Brazil, in the moldes of the standards of accounting and Brazilian Laws.

* Professor da Faculdade de Ilhéus, Economista, Mestre em Contabilidade e Finanças – FUCAPE e Especialista em Gerenciamento de Micro e Pequenas Empresas – UFLA. ** Professor do Departamento de Ciências Econômicas da UESC, Economista, Mestre em Cultura e Turismo – UESC/UFBA e Especialista em Economia de Empresas - UESC

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To this end, we conducted a bibliography study analyzing the Constitution of the Federative Republic of Brazil, the Law no. 9,605, of February 12 of 1998, ins-tructions of the Intergovernmental Working Group of Experts on Internatio-nal Standards of Accouting and Reporting, the International Accounting Stan-dards Comittee, of the Brazilian Institute of Accountants, books, articles and magazines. The search found that Brazilian accounting standards recommends that the Environmental Liabilities should be evident when there are associated expenses with the Environment. But the level of awareness among companies is still not enough to allow them to begin to highlight the obligations of a cons-tructive and fair, according to international accounting standards.

Keywords: Environmental Liabilities. Show. Constructive obligation. Obligation Fair.

INTRODUÇÃO

O meio ambiente tem sido um dos temas mais discutidos na atualidade e certamente continuará em evidência por um longo tempo. Os pontos de vista antagônicos existentes entre ecologistas e empresários têm deixado as nações, principalmente as que se encontram em fase de desenvolvimento, em situação delicada. Como crescer sem causar danos ao meio ambiente?

Em todo o mundo, leis têm sido criadas no intuito de minimizar o im-pacto da produção capitalista sobre a natureza. Através dessas leis, as em-presas passam a contrair obrigações para prevenção e correção de impactos causados ao meio ambiente.

O conceito de obrigações é interpretado de forma diferente por diversas correntes da Contabilidade. Os mais conservadores defendem que somente as dívidas legais devam ser evidenciadas no passivo, há, portanto, defensores de que tanto as obrigações legais como as obrigações construtivas e justas1 devam ser evidenciadas.

1 A Organização das Nações Unidas (ONU), através do Intergovernmental Working Group of Experts on International Standards of Accounting and Reportinga existência de três tipos de obrigações ambientais: legais, que ocorre por força da lei; construtivas, que ocorrem de forma espontânea, pois a empresa decide cumprir fatores morais e éticos, independentemente da lei e; justas, ocorre quando a empresa decide obrigar-se a cumprir fatores morais e éticos, independentemente da lei (UN-ISAR, 1997).

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Existem empresas que reconhecem o passivo ambiental de forma espon-tânea, seja por politização em relação a sua responsabilidade social ou por zelo da imagem frente aos seus clientes, muito tem sido comentado acerca do posicionamento dessas e existe uma especulação de que isso possa ser uma tendência natural das demais. No entanto, os ambientalistas têm de-monstrado preocupação em torno do tempo necessário para a conscienti-zação das diversas empresas e adoção dessas providências para diminuir o impacto ambiental.

Ricardino Filho et al. (2004, p. 100), em pesquisa realizada com as dez empresas premiadas no VII PrêmioTransparência ANEFAC / FIPECAFI /

passivo de forma tradicional, ou seja, levando preponderantemente em con-sideração o passivo referente às obrigações legais”, demonstrando a pequena conscientização existente em torno de contribuir implicitamente para dimi-nuir os impactos causados ao meio ambiente.

Dada a complexidade do tratamento das obrigações e da diversidade de enfoques ao assunto, o presente estudo pretende responder à seguinte ques-tão: de acordo com os padrões da Contabilidade e das Leis brasileiras, quando deve ser reconhecido o passivo ambiental no Brasil?

DIREITO AMBIENTAL: A RESPONSABILIDADE DAS EMPRESASNO BRASIL

A evolução das normas ambientais no Brasil pode ser dividida em três etapas, apresentadas por Benjamim (2004, p. 51-53): 1) fase abstencionista, contempla o descobrimento à segunda metade do Século XX; 2) etapa frag-mentária da legislação, contempla a segunda metade da década de 1960 até

6.938/81 e se alonga até os dias atuais.Nunes (2005, p. 32) resume tais etapas, caracterizando conforme segue:

a primeira é marcada pela não regulamentação da exploração e manejo dos recursos naturais, salvo raríssimas exceções, como foi o caso do Regulamento do pau-brasil, de 1603, e do Código

uma legislação pontual, ainda incipiente, com o propósito de regulamentar a comercialização de bens advindos de recursos

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explorados da natureza [...]. A última etapa, é de fato, a mais avançada em matéria de proteção ambiental, pois que inaugu-rada com a edição da Lei 6.938/81, que estabeleceu a Política Nacional de Meio Ambiente.

Trataremos, nesta pesquisa, apenas da terceira e última etapa devido a sua relevância, por ser atual. De fato, após a criação da Lei 6.938/81 a respon-sabilização, na esfera civil, de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente,

-gação, independentemente de haver culpa, de indenizar e/ou reparar danos causados ao meio ambiente e a terceiros, relativos a sua atividade. Em 1988, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente foi reforçada pela Constituição

-des consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados”.

Mirra (2003, p. 69) denomina de responsabilidade objetiva do degrada--

ples risco ou no simples fato da atividade degradadora, independentemen-

-tração (a) do dano ambiental, (b) de uma atividade degradadora do meio am-biente e (c) do nexo causal entre o dano e o fato da atividade degradadora”, considerando-se irrelevante a culpa ou não do agente.

Na responsabilidade objetiva, o requisito da previsibilidade inexiste, Stei-

se amplia, quase aproximando-se de um enfoque puramente material, de tal modo que com a prova de que a ação ou omissão foi a causa do dano a imputa-ção é quase automática”. O fato de haver dedicação a uma atividade enquadra-

com isso as conseqüências danosas que lhe são inerentes” (Idem, 2003, p. 84).A responsabilidade é considerada objetiva porque a reparação do dano

independe da aferição da culpa do agente, dada a importância da proteção ambiental e dos demais interesses difusos e coletivos. Assim, buscou o legis-

a parte lesada, o ônus de provar que o agente agressor agiu com culpa.

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O artigo 225 da Constituição Federal, tanto dá ênfase à questão preventi-va quanto às medidas repressivas, ao exigir a recuperação do meio ambiente degradado, e principalmente por sujeitar as atividades lesivas ao meio am-biente a sanções penais e administrativas (SILVA, 2002, p. 53).

-ção do autor ou partícipe do delito dentro das organizações e o surgimento de novas formas delitivas, levaram à necessidade da exigência de responsabiliza-ção penal também das pessoas jurídicas, o que se efetivou com o advento da Lei n.º 9.605, de 12/02/98, conhecida como Lei dos Crimes Ambientais, em-bora contenha, também, dispositivos de natureza processual e administrativa (IRIGARAY, 2005).

O artigo 3º, da referida Lei, dispõe sobre a responsabilidade penal das pessoas jurídicas não excluindo a das pessoas físicas que integram seu órgão de direção, que poderão também responder penalmente como autoras, co--autoras ou partícipes do mesmo fato.

Além de prever a possibilidade de criminalização das pessoas jurídicas, a Lei dos Crimes Ambientais avançou, sobretudo, na ênfase dada à recupe-ração dos danos ambientais, pela ampliação de penas alternativas e também pela sistematização dos tipos penais relacionados à proteção ambiental. Essa

-

ou mutilar, ou, ainda, praticar ato de crueldade contra animais; comprar, vender, transportar e armazenar madeira, carvão ou lenha, sem licença; en-tre outros (Brasil, 1998).

Na verdade, os danos causados ao meio ambiente não podem ser re-cuperados totalmente. Isso, porque a reparação dos mesmos depende, em muito, da adaptação dos elementos que compõem esse sistema, a uma situ-ação bem próxima do estado anterior, haja vista que, existe sempre algo de irreversível no dano causado ao meio ambiente, do ponto de vista ecológico. Considerando o ponto de vista jurídico, o dano pode até não ser reversível, mas sempre será reparável.

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PADRÕES DA CONTABILIDADE: O RECONHECIMENTO DO PASSIVO

Conceito de Passivo

de forma legal, justa ou construtiva, através de transações ou acontecimen-tos passados, de uma entidade, que possibilitam a aferição de valores exatos

serviços para outra entidade.De acordo com o IASC apud KPMG (2001, p. 19), as provisões de passi-

vos devem ser reconhecidas quando uma entidade tiver uma obrigação pre-sente (legal ou constituída) como resultado de um evento passado, que possa ser seguramente estimável, e que seja provável uma saída de recursos envol-vendo benefícios econômicos para liquidá-la.

O Financial Accounting Standards Board (FASB) apud Hendriksen e Van

benefícios econômicos resultantes de obrigações presentes de uma entidade no sentido de transferir ativos ou serviços para outras entidades no futuro em conseqüência de transações e eventos passados”.

A origem do passivo ambiental está associada a transações ou acon-tecimentos em que haja a interação da empresa com o meio ambiente, proveniente de obrigações legais ou espontâneas e cujo sacrifício de recur-

citada.

Mensuração e Reconhecimento

O Financial Accounting Standards Board (FASB) apud Hendriksen e Breda, determina, no Statement Financial Accounting Standard (SFAS) 5, que

passivo, seja mensurável, seja relevante e seja preciso. No entanto, a obriga-ção deve ser também contabilizada, caso haja a possibilidade de ser razoavel-mente mensurada (passivo contingente).

Os passivos normais diferem-se dos passivos contingentes, pois são exi--

quanto os passivos contingentes são obrigações advindas da probabilidade

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de ocorrência de determinada transação ou evento futuros, normalmente

A respeito do tema Iudícius (2000, p.148) explica:

é preciso observar que muitos passivos estimados dependem da ocorrência de eventos futuros e, mesmo assim, não são ri-gorosamente contingenciais [...]. Hendriksen considera que, se existir um valor provável para uma exigibilidade, mesmo que derivante da aplicação de probabilidade aos eventos, o passivo (provisão) deveria ser estimado e registrado.

Os custos prévios deveriam ser alocados, ainda que de forma -

ciar. Estes custos poderiam ser apurados em decorrência da apli-cação concreta de meios para evitar ou diminuir a poluição em períodos posteriores, ou através de estimativa dos custos que seriam necessários à correção dos efeitos dos poluentes produ-zidos, cujo fato gerador fosse pertinente ao exercício em curso.

Um aspecto considerado importante, dentro desse contexto, é o da conscientização das empresas para a relevância do reconhecimento dos pas-sivos gerados. Ricardino Filho et al. (2004, p. 100) observaram que as empre-sas brasileiras ainda evidenciam o passivo levando em consideração apenas o passivo referente às obrigações legais.

De acordo com o IBRACON (1996, p. 8) devem ser evidenciados no Pas-sivo Ambiental, os valores decorrentes de gastos na área de Meio Ambiente

-tação adequada. Sugere também uma evidenciação completa através de nota explicativa, em que seja demonstrada a real posição ambiental da empresa, de forma detalhada e criteriosa.

Segundo Machado (2002, p. 21), a legislação brasileira e as resoluções do CFC sugerem que as notas explicativas ofereçam um detalhamento acer-ca das multas ou indenizações eventualmente pagas ou provisionadas, o vo-lume de gastos ativados durante o exercício, além dos critérios que levaram a esta prática.

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O reconhecimento do passivo está intimamente associado ao fato ge-rador, seja por força da lei, ou de forma construtiva, ou de forma justa.

-

toma conhecimento da ocorrência, independentemente de cobrança exter-na (RIBEIRO; LISBOA, 2000, p. 11).

A responsabilidade das empresas, apesar de no Brasil ser, tradicional-mente, apontada como obrigação legal (instrumentada por força da lei), os padrões internacionais de contabilidade publicados pela Organização das Na-

-tais: legais, que ocorrem por força da lei; construtivas, que ocorrem de forma espontânea, pois a empresa decide cumprir fatores morais e éticos, indepen-dentemente da lei e; justas, ocorrem quando a empresa decide obrigar-se a cumprir fatores morais e éticos, independentemente da lei (UN-ISAR, 1997).

Uma obrigação não necessariamente tem que ser forçada para que uma responsabilidade ambiental seja reconhecida. A empresa pode agir de modo construtivo expandindo uma obrigação legal. Por exemplo, a empresa pode

passará a agir de forma justa a partir do momento que se obrigar a fazê-lo. O reconhecimento de tais exigibilidades, na maioria dos casos, ocorre somente no ato da efetivação dos gastos. Mas para que isso se torne uma obrigação, de fato, é necessário que ela divulgue publicamente a sua intenção de conservar, preservar, recuperar ou proteger o meio ambiente.

De acordo com os princípios contábeis, tais gastos e suas respectivas exigibilidades deveriam ser contabilizados no mesmo período em que se re-gistrasse a receita deles decorrente, de forma a se permitir a confrontação de receitas e despesas dentro do mesmo período contábil.

Na United Nations Conference on Trade and Development, UNCTAD/ISAR (1998, p. 9), há uma corroboração a respeito dos tipos de obrigações

de responsabilidades ambientais construtivas e justas a decisão de reconheci-mento do passivo deve ser da direção da empresa e deve ser comunicada por um anúncio público.

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ECONOMIA, MEIO AMBIENTE E PASSIVO AMBIENTAL

O cerne da Ciência Econômica está pautado na satisfação das neces-sidades ilimitadas dos homens, tendo em vista a escassez de recursos. Para satisfazer aos anseios momentâneos da raça humana, que sofrem mutações constantes, as empresas passaram séculos consumindo matéria-prima extraí-da da natureza sem políticas voltadas para a conservação do meio ambiente.

os recursos naturais a tal ponto que a própria sobrevivência do homem está sendo posta em risco, não somente pelo consumo de recursos, mas, também pela quantidade de resíduos eliminados no meio. Parece um exagero, mas no Brasil existem mais de 160 milhões de pessoas produzindo mais que 0,6 kg de lixo per capita por dia (IEE, 2005), sem o devido tratamento.

Apesar de ser um tema bastante discutido atualmente, a questão am-biental foi tratada na economia luso-brasileira do Brasil Colônia, em 1760, no Alvará Real de Proteção dos Manguezais, na tentativa de minimizar os impactos da construção civil em expansão. Pedro e Frangetto (2004, p. 623) consideram que tal edital foi uma imposição legal que conseguiu manter in-tactos os manguezais do litoral brasileiro até meados do século XIX, quando a norma foi revogada.

Atualmente, existem muitas leis em vigor para garantir a produção com conservação do meio ambiente e punir os transgressores, mas não se espera

recursos necessários para a sua operacionalização.Defensores da natureza, no intuito de contribuir para a preservação do

meio ambiente, formaram Organizações Não Governamentais (ONG’s), que

à conscientização da sociedade. Diversas mobilizações pró-natureza passa-ram a existir em todo o mundo. Os ambientalistas exigem que as empresas, principalmente as que têm atividades de uso intenso de recursos naturais, sejam obrigadas a reparar e evitar danos à natureza. Essas obrigações são denominadas na contabilidade de passivos ambientais, por se tratar de obri-

Existem diversos conceitos para passivo ambiental elaborados pelos grupos interessados. Uma questão bastante discutida a respeito do passivo

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ambiental tem sido o seu reconhecimento, motivo inclusive de discussão no conselho da Organização das Nações Unidas (ONU). Considerando-se que os maiores interessados sejam os ambientalistas, as empresas e o Estado serão apre-sentados os aspectos relevantes levantados por cada stakeholder2

1 sobre o assunto.

Empresas Versus Ambientalistas

Os grupos ativistas ambientais acreditam que o fato da empresa estar utilizando recursos naturais para produzir acarreta constantes impactos ne-gativos – muitas vezes irreversíveis - ao meio ambiente: desmatamento, ge-

tecnologia humana está desintegrando e perturbando seriamente os proces-sos ecológicos que sustentam o meio ambiente natural, que são a própria base da existência humana. Para Capra, existe uma obsessão humana pelo crescimento econômico e pelo sistema de valores capitalista, que lhe é subja-cente, que criou um meio ambiente físico e mental no qual a vida se tornou extremamente insalubre.

Após a Revolução Industrial, dentro dos preceitos capitalistas de produ-

emissão de gases poluentes e resíduos tóxicos nos rios e solos. Na tentativa de manter seus níveis de produção as indústrias exploravam e têm explora-do recursos disponíveis de combustíveis fósseis, não renováveis. A Revista Borracha Atual (2002) mostra a indústria como a principal responsável pela poluição atmosférica, pois consome 37% da energia mundial e emite 50% do dióxido de carbono, 90% dos óxidos de enxofre e os demais produtos quími-cos que ameaçam a camada de ozônio.

Reduzir drasticamente os níveis de poluição é um dos principais pro-blemas dos ambientalistas de todo o mundo. Muitas conquistas foram con-

2 Vinha (2003, p. 178) considera o termo stakeholder

da cadeia produtiva, abrange também as comunidades, as ONGs, o setor público e

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ambiente. Para minimização dos impactos provocados pelas indústrias, os ambientalistas têm proposto alternativas como: instalação de dispositivos que retenham os fumos e os gases; utilização de energias alternativas; aplicação de catalisadores em automóveis novos e obrigatoriedade de inspeções periódicas; substituição de produtos químicos industriais perigosos etc. Mas, as indústrias alegam que sua aplicação é inviável em função dos custos serem elevados, gerando obrigações ambientais em muitos casos impossíveis de serem pagas.

Para Vinha (2003, p. 176):

O principal obstáculo à adoção da gestão ambiental residia, então, na concepção dominante de que meio ambiente e lucro eram adversários naturais. [...]

-bientais tinham um potencial inverso, isto é, reduziam custos por meio de uma melhor racionalização dos processos produ-tivos, particularmente no uso de insumos e no desperdício, le-vando à rápida disseminação da gestão ambiental baseada no gerenciamento da qualidade total.

Schmidlheiny (1996) apud Vinha (2003, p. 178) salienta que a maximiza-ção de retornos aos acionistas não deve ser encarada como medida imedia-tista, por parte dos executivos. Investimentos de longo prazo não devem ser negligenciados, uma vez que os acionistas procuram obter retornos satisfató-rios nos investimentos de curto e longo prazo.

Um levantamento do Conselho Mundial de Empresários para o Desen-volvimento Sustentável apud May (2001, p. 301) descobriu que:

Dados preços baixos e a capacidade dos empresários de man-

--

Apesar de se mostrarem capazes de reduzir custos, racionalizar proces-

dos investidores, o que pode aumentar a resistência das empresas de amplia-rem o reconhecimento de obrigações construtivas e justas.

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A incompatibilidade existente nos padrões de desenvolvimento poderá ser ajustada, desde que as empresas e as lideranças populares sejam colabo-radores e o Estado seja coordenador do processo. Schmidheiny apud Vinha

-

O poder coercitivo do Estado, que aplica punição aos responsáveis por danos causados à sociedade, coloca-o num patamar diferenciado dos de-mais stakeholders, sendo, portanto, a instituição mais indicada para coorde-nar o processo de criar uma sociedade cada vez mais sustentável. Mas, para realizar tarefa tão árdua e grandiosa, há a necessidade da participação de todos de forma incisiva.

O Passivo Ambiental

O conceito de obrigações ambientais ou passivos ambientais é apresen-

econômicos que serão realizados para a preservação, recuperação e proteção do meio ambiente de forma a permitir a compatibilidade entre desenvolvi-mento econômico e meio ecológico” ou ocorrem de conduta inadequada em relação às questões ambientais.

A palavra preservação apresentada no conceito de passivo ambiental, será melhor discutida a seguir, de acordo com a conceituação de Mousinho apud Moreira (2004) em comparação com o conceito de conservação, elabo-rado pelo mesmo autor:

Preservação: Estratégia de proteção dos recursos naturais que prega a manutenção das condições de um determinado ecos-sistema, espécies ou área, sem qualquer ação ou interferência que altere o status quo. Prevê que os recursos sejam mantidos intocados, não permitindo ações de manejo. Conservação: Conceito desenvolvido e disseminado nas últimas décadas do século 19 como um relacionamento ético entre pes-soas, terras e recursos naturais, ou seja, uma utilização coerente destes recursos de modo a não destruir sua capacidade de servir às gerações seguintes, garantindo sua renovação. A conservação prevê a exploração racional e o manejo contínuo de recursos naturais, com base em sua sustentabilidade.

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O curioso e intrigante no conceito de passivo ambiental citado é o não -

tentável. Sugere-se, portanto, a inclusão da palavra conservação como forma de ampliar o conceito de passivo ambiental, dando maior ênfase à questão da sustentabilidade tão discutida nas duas últimas décadas.

Dentro desse contexto, o passivo ambiental da empresa não pode ser en-tendido como sendo apenas a dívida que a empresa tem relacionada às ques-tões ambientais, normalmente decorrente do não cumprimento de eventuais

e/ou de ações do Ministério Público decorrentes de reclamações da comu-nidade. Mas, também, pelas ações que a empresa desenvolve no intuito de conservar o meio ambiente sem que haja imposição legal para tal.

A respeito do reconhecimento do passivo ambiental, Ribeiro e Lisboa

de qualquer forma de resíduo originário do processo produtivo, pois de acordo com as premissas básicas de responsabilidade social, moral e ética a empresa deve arcar com todos os custos necessários para a manutenção de sua operacionalização.

-nalmente evidenciam o passivo legal, não existindo a cultura de evidenciar de forma implícita o passivo gerado. Por isso, em todo o mundo as leis têm evoluído para forçar a diminuição das agressões à natureza, principalmente

A substituição de tecnologias tradicionais por tecnologias alternativas, intituladas de tecnologias limpas, nas plantas fabris em operacionalização, pode implicar diversas alterações nas suas estruturas, períodos de ociosida-de produtiva, além de investimentos elevados, disponíveis apenas para as grandes empresas. Os custos desses investimentos têm levado as empresas, apesar de todo o jargão de mercado em relação à responsabilidade social, moral e ética, a assumir apenas os passivos ambientais exigidos de forma legal. Apesar de estarem se responsabilizando dentro dos limites da lei, os passivos ambientais têm sido muito utilizados em campanhas de marketing, em vista do desconhecimento do assunto por parte dos consumidores, pois o consumidor não sabe quantas novas árvores uma indústria de celulose é

-

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verde”) visando responder à legislação ambiental e usá-las como propaganda institucional” (VINHA, 2003, p. 177).

A crescente disseminação da necessidade de conservação dos recursos naturais tem forçado chefes de estados – principalmente na Organização das Nações Unidas (ONU) –, grandes grupos econômicos e ambientalistas a nego-ciarem a tentativa de um ponto de equilíbrio das relações de produção onde o meio ambiente natural esteja saudável, sem afetar a sobrevivência das empresas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os padrões da Contabilidade nos mostram três possibilidades de eviden-ciação do passivo ambiental: de forma legal, justa ou construtiva. No Brasil,

mesmas passassem a evidenciar de forma construtiva e justa os passivos. Por outro lado, as leis brasileiras têm evoluído, seja por pressão dos eco-

logistas e da sociedade em geral, ou por conscientização do legislativo, am-pliando as penas e multas contra as agressões à natureza, no intuito de agir como um inibidor da destruição.

A normalização contábil brasileira orienta que o Passivo Ambiental deve ser evidenciado quando ocorrerem gastos associados ao Meio Ambiente. De-vendo ser apresentado também em Notas Explicativas, demonstrando a real situação ambiental da empresa, de forma detalhada.

À luz da Teoria Contábil, observa-se que todas as exigências, decorren-tes de transações ou eventos relacionados ao meio ambiente, que impliquem uma provável transferência futura de ativos ou serviços para outra entidade, desde que possam ser aferidos os valores exatos ou estimados de modo con-

Finalmente, conclui-se que as empresas vivenciam um mercado pauta-do na satisfação das necessidades ilimitadas dos homens, mas ameaçado pela escassez de recursos. O que tem criado um cenário mundial marcado pela necessária preservação e recuperação ambiental, como questão de sobrevi-vência das empresas no médio e longo prazos. Dentro desse contexto, a con-

objetivos das empresas sejam atingidos, sem causar danos à sociedade.

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A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA TERRA DOS HOMENSMaria Luiza Heine*1

Resumo

O apagar das luzes do século XX deixou para o ser humano a triste realidade de ter que conviver com a possibilidade do extermínio da vida sobre o planeta

-lação que estabeleceu com o planeta pode levá-lo ao colapso e ao extermínio da vida. O planeta não é um objeto estático, mas incrivelmente dinâmico e

-ção Ambiental como forma de conscientizar nossas crianças da importância de cuidar do planeta, a nossa casa. Como metodologia, utilizamos revisão

históricos sobre o assunto. A questão ambiental remonta à ocupação antró-pica sobre a face da terra, mas, somente nos últimos 50 anos ela vem sendo denunciada. Muito pouco foi feito para corrigir os graves problemas que se

-lução dos mesmos. Esperamos, ainda, que cada vez mais, pessoas, grupos de pessoas e organizações se preocupem com a vida no planeta e com a disse-minação das boas idéias que transformarão a terra dos homens em um local ainda mais bonito e agradável para se viver.

Palavras-chave: Educação Ambiental. Meio Ambiente. Desenvolvimento Sustentável.

* Mestre em Desenvolvimento Regional e Meio Ambiente (UESC, 2004), Especialis--

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Abstract

The lights out of the twentieth century left to the human being the sad reality of having to live with the possibility of the extermination of the life on planet Earth. It has got a spectacular science advance, but it has discovered that the relationship that he established with the planet can take it to the collapse and to the extermination of the life. The planet is not a static object, but incredi-bly dynamic and it has changed over time for billions of years. It is alive and active. This work aims to seek the importance of environmental education as a way to educate our children about the importance of taking care for the planet, our home. Like methodology, we used a relevant review literature to the activity which we have set ourselves, through historical accounts about the subject. The environmental issue revamps to human occupation on the face of the earth, but only in the last 50 years it has been reported. Too little was done to correct the serious problems that arise. We hope to contribute to

more and more people, groups and organizations of people worry about the life on the planet and the spread of good ideas that will transform the land of the men in a place even more beautiful and pleasant place to live.

Keywords: Environmental Education. Environment. Sustainable Development.

INTRODUÇÃO

O apagar das luzes do século XX deixou para o ser humano a triste realida-de de ter que conviver com a possibilidade do extermínio da vida sobre o plane-

-vivência, em um planeta que se encontra em constantes mudanças climáticas provocadas, também, pelo próprio homem, com suas máquinas e suas inven-ções tecnológicas.Desde que começou a se destacar pela capacidade de pensar e de se adaptar a novas situações, o ser humano começou a deixar sua marca sobre o planeta Terra. Aquilo que chamamos de evolução não aconteceu de uma hora para outra, mas foi acontecendo lentamente com o passar do tempo.

últimos séculos, quando a ciência se tornou capaz de datar fósseis, movimentos tectônicos e quando especula o universo em busca de novos conhecimentos.

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Ambiental como forma de conscientizar nossas crianças da importância de cuidar do planeta, a nossa casa. Como metodologia, utilizamos revisão bi-

históricos sobre o assunto.

O HOMEM NO MEIO AMBIENTE

O planeta não é um objeto estático, mas incrivelmente dinâmico e tem

atividade. Se compararmos a existência humana com a do planeta, veremos

A ciência ainda não tem certeza de como teria surgido a vida inteligente --

XX, como a datação dos fósseis através do carbono 14, sabemos que existem hominídeos há mais de seis milhões de anos; que, destes, algumas espécies

-te há mais de cem mil anos.

Sabemos também que houve uma evolução, e o quanto foi duro para os cientistas ocidentais enfrentarem os dogmas da religião católica, para que esta teoria pudesse ser aceita. Pensamos que estudar esta evolução aconteci-da no planeta com os seres vivos e, principalmente, com os humanos, é uma experiência apaixonante. Certamente, o homo sapiens sobreviveu porque

-dições de clima, de localização ou de condições, as mais variadas possíveis. Pensamos que, apesar de todos os defeitos que possui, o homem é um ser in-crivelmente fascinante: sem possuir um aparato físico apropriado, conseguiu sobreviver nas zonas polares, se adaptar às mais diversas localidades, como

-nar a natureza e a utilizá-la a seu favor, de tal forma, que passou a se achar capaz de criar a vida, de sobrepujar a natureza, está a se confundir com deus.

A grande qualidade da espécie humana foi a de romper com suas pró--

minou toda a natureza e se transformou no mais temível dos predadores.

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Sem asas, dominou os ares; sem guelras ou membranas próprias conquistou os mares. Tudo isso porque difere dos outros animais por ser o único que possui cultura.

A evolução humana não aconteceu de uma hora para outra, tudo aconte-ceu muito lentamente. Os primeiros humanos viviam em acordo com a natu-reza. Sobreviviam da coleta e caça como qualquer animal. Mas, ao contrário do que se pensava, este homem não preservava a natureza e já praticava a mesma

entre a ação do homem primitivo e do atual é a velocidade com que as mudan-ças ocorrem, a densidade populacional do planeta e a tecnologia, que amplia a ação humana impedindo que a natureza recomponha suas reservas.

A Ciência é uma invenção da racionalidade humana, que pode ser boa ou ruim e não tem compromisso com a axiologia. Com ela o homem é capaz de transformar a natureza; uma árvore, por exemplo, pode se transformar

folha de papel, ou a cadeira em que se senta ou a estante que está à sua frente, portando os livros (de papel) que transmitem o conhecimento que sua racio-nalidade devora com avidez.

A mesma Ciência que descobre a desintegração atômica capaz de salvar, ao longo do tempo, milhões de vidas, de pessoas portadoras de câncer, mata, em um só dia, alguns milhares, como aconteceu naquele dia em agosto de 1945 em Hiroshima e Nagasaki. Sobre este diz nos diz Arthur Koestler:

História e Pré-história da raça humana, eu responderia sem a mínima hesitação: o dia 6 de agosto de 1945. A razão é simples. Desde o alvorecer da consciência até o dia 6 de agosto de 1945, o homem precisou conviver com a perspectiva de sua morte como indivíduo. A partir do dia em que a primeira bomba atô-mica sobrepujou o brilho do Sol em Hiroshima, a humanidade, como um todo, deve conviver com a perspectiva de sua extinção como espécie.”

-te-se poderoso e capaz de ditar regras que são capazes de atingir todos os habitantes do planeta, como temos visto os grandes ditadores ao longo da

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história. Existiram pessoas, muitas, que se investem de donos da verdade, e são respaldados por outras tantas que lhes dão legitimidade, para que, se co-locando acima do bem e do mal, dirijam os destinos da humanidade.

A história mostra que eles sempre existiram, mas nos dias atuais, a di-mensão que as ações destas pessoas podem tomar, traz no seu bojo conse-quências inimagináveis. Com todo o poder adquirido pelo Império Romano, nada se comparou ao colonialismo inglês do século XIX e início do século XX (SAID, 2000). E o imperialismo britânico não teve o mesmo poder, que exer-ce sobre o mundo, o imperialismo econômico dos dias atuais.

O desenvolvimento da ciência só aconteceu verdadeiramente a partir do -

de busca de novos paradigmas.No afã de realizar novas descobertas, na busca desenfreada do conheci-

mento e do domínio econômico de um mundo assumidamente capitalista, o homem continua agindo como o aprendiz de feiticeiro. Enquanto um grupo realiza os atos que sua vontade determina, sem medir as consequências, ou-

Foi assim que caminhou, durante muito tempo, a humanidade. No que diz respeito à questão ambiental, imaginamos o quanto o homem deve ter

-tador que utilizo neste momento, o que não terá sentido o homem, ao faci-litar sua vida com todos os artefatos que tem inventado ao longo do tempo?

Foi dessa forma que, inventando, colocando em prática, passando para os outros, o homem foi criando a cultura, a partir da transformação da na-tureza. Cada cultura obedece a alguns princípios primários, tais como a lo-

E hoje, no século XXI da era cristã, temos uma diversidade incalculável de culturas, que, por força da globalização estão se transformando em culturas híbridas (HALL, 2000).

Quando o homem, há 12 mil anos, descobriu que era muito mais fácil plantar do que viver da coleta eventual, criando assim, a agricultura, ele deu o primeiro grande passo para chegar ao avanço tecnológico da agricultura

-bava árvores, plantava, e quando esgotava a terra, abandonava aquela área,

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indo a busca de outra, para fazer a mesma coisa. O dano causado não era percebido, pois a população era muito menor e a terra podia se recuperar.

Quando o homem primitivo deixou de morar nas cavernas e passou a derrubar árvores para transformá-las em casas, em lenha para se aquecer,

-

quando chegaram ao Brasil, em 1500, e não viram as riquezas que buscavam nas Índias, descobriram o pau-brasil e, em cerca de 100 anos haviam devasta-

exterminar o que a natureza havia levado milhares de anos para construir.Não havia na humanidade a consciência de que causavam destruição, e

suas desastrosas consequências para o planeta e para o ser humano. Foi so-mente a partir da publicação da obra Primavera Silenciosa, de Rachel Carson, na década de 1960, que a temática ambiental passaria a fazer parte das in-quietações políticas internacionais e o movimento ambientalista mundial iria tomar um novo impulso, promovendo uma série de eventos que formariam a sua história (DIAS, 1999). Foi como se, de repente, as pessoas começassem a enxergar uma nova e assustadora realidade.

Nestes quarenta anos, temos a impressão de que pouco caminhamos

de pessoas que vivem em um mundo cada vez mais desigual e cruel. Como dizer ao agricultor acostumado a queimar e ver a planta brotar muito mais viçosa quando a chuva chega, de que aquela prática deve ser deixada de lado? Como dizer aos acionistas das multinacionais que a forma de produção que eles utilizam deve mudar pelo bem da saúde humana e da saúde do planeta? Como convencer os dirigentes globais de que a maioria das pessoas não dese-ja a guerra, se, apesar de tudo, alguns desejam? Como convencer pessoas de que o mundo não comporta tanto carro, tanto avião, que não temos nada a fazer em outros planetas, se não estamos dando conta do nosso? Que artifí-cios utilizar para convencer as pessoas de que a vida seria muito mais bonita se olhássemos mais para o planeta e nos olhássemos uns aos outros?

Para algumas pessoas é mais importante o ter do que o ser. E aí? Como -

fazer humano; pode mostrar, como na fábula O Aprendiz de Feiticeiro, que o mundo maravilhoso da técnica tem duas faces. Se por um lado a tecnologia

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é condição de humanização, se pode melhorar a vida de uns, por outro lado, pode desenvolver formas perversas de adaptação humana.

Todo grupo social desenvolve formas de educação, para a qual existem -

lizar a pessoa para que ela se integre à forma de agir e pensar do grupo. Podemos dizer também, que existem vários tipos de educação, incluindo aí a educação formal, aquela que se pratica na escola, e a informal, que é dada pela família e pelos diversos grupos sociais frequentados pelo indivíduo. A educação formal está prevista em lei, e, presume-se que toda lei é feita para ser cumprida. Mas, as leis são cumpridas? Pela última Constituição Brasileira promulgada em 1988, toda criança tem direito a uma educação de qualidade. É assim que acontece? Nem sempre é fácil mudar hábitos, criar valores. Nós viemos de uma época não muito distante, onde só tinha acesso à educação uma minoria, formada por homens brancos da classe social dominante. Ho-mens negros e pobres e mulheres não tinham direito nem à educação, nem a votar. E, de repente, em setenta anos, não é possível querer que tudo mude, que as pessoas passem a enxergar o mundo de forma homogênea, se os gru-pos sociais não são homogêneos, se as pessoas são muito diferentes.

O ser humano, como objeto de estudo, é fascinante, pois é um ser am-bíguo e contraditório. Sendo capaz de realizar grandes coisas, é também, hedonista e egoísta, e pensa primeiro no seu bem estar. Por isso não é muito fácil fazê-lo entender que um paradigma nem sempre é para ser seguido, mas para ser repensado. Os paradigmas criados pelo avanço tecnológico tiveram que ser repensados tão rapidamente quanto surgiram. Com a possibilidade de destruição da vida e do planeta, surgiu a Educação Ambiental, um ramo da Educação, que tem como objetivo conscientizar as pessoas, a partir da in-fância, de que precisamos repensar nossos hábitos de vida, no planeta. Segun-

e atitudes que possibilitem o entendimento da realidade de vida e a atuação lúcida e responsável de atores sociais individuais e coletivos no ambiente”.

A partir da década de 1970, quando o mundo entendeu que era preciso fazer algo para mudar o rumo da relação homem/planeta, começaram a acontecer encontros visando formular políticas públicas que atendam a es-sas novas necessidades; muitos esforços têm se conjugado para resolver os problemas criados pelo ser humano ao longo da sua existência no planeta.

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A inclusão da Educação Ambiental nas escolas está prevista desde a Constituição de 1988 e nos Parâmetros Curriculares da Educação Nacional (os PCN’s), mas ainda quase nada de efetivo foi realizado. A Educação Am-biental está incluída na Constituição de 1988, mas no capítulo relativo ao Meio Ambiente e não no da Educação (CARVALHO, 2001).

ambiental não formal, em todos os grupos sociais, pois todos eles se rela-

a caçar e a plantar, ele estava ensinando de que forma esta criança deveria se relacionar com a natureza. Isto é educação. O grande problema é que foi este tipo de educação que provocou todos os danos que só percebemos muito re-centemente, quando o prejuízo já era grande. E a pergunta é: de que forma agir para evitar uma catástrofe irreversível?

No começo da segunda metade do século XX, ainda pensávamos que a água era um bem inesgotável. Provavelmente muita gente ainda pensa as-sim. Mas se a água não deixa de existir, ela se torna poluída. Como fazer as pessoas entenderem que não devem escovar os dentes ou fazer a barba com a torneira aberta?

Transportar água para atender às necessidades humanas é invenção bas-tante antiga, mas, água nas torneiras da maioria das pessoas, é um conforto do mundo contemporâneo. A água dos lençóis freáticos podem se esgotar.

-neas, ou mesmo elevá-lo, em diversas regiões do globo, mais se verá essas

1979, p. 50). Após a publicação deste livro, em 1979, o problema foi agravado; com o crescimento populacional aumentou a demanda por água, cresceu a produção agrícola, mudou o clima no planeta, aumentando o efeito estufa e o regime pluviométrico, e muito pouco foi feito para corrigir o rumo das ações para mudar as diretrizes econômico-produtivas.

Muitas pessoas pensam que o dano causado ao meio ambiente restringe--se somente à natureza, ainda não perceberam que há um efeito bumerangue, onde os humanos também são atingidos. As doenças que atingem os seres hu-manos estão diretamente ligadas ao meio ambiente. Assim como a proliferação de pragas, de ratos, pulgas, mosquitos, e ainda, vírus e bactérias. Organismos que, pressionados por condições naturais, eram inibidos em seu desenvolvi-mento, passam a dispor de melhores condições de vida, devido à alteração do

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equilíbrio ecológico, multiplicando-se com rapidez e se transformando, de ino-fensivos parasitas, em transmissores de doenças (LIEBMANN, 1979).

Na Antiguidade, as condições de higiene eram melhores do que as da Idade Média, quando surgiram as cidades intramuros, cujo crescimento po-pulacional propiciava, cada vez mais, um número maior de pessoas sendo obrigadas a dividir um mesmo espaço. Foi na idade medieval que aconte-ceram as grandes epidemias que dizimaram milhares de pessoas, numa só cidade. A urbanização trouxe graves problemas para a humanidade.

Do período medieval herdamos os aglomerados urbanos cada vez mais aglomerados (LE GOFF, 1998). Observar do alto a forma de ocupação de uma favela brasileira, esteja ela no Rio ou em São Paulo, a impressão é a de

servidas, não devem em nada ao que ocorria na Idade Média. A grande dife-rença encontra-se na facilidade com que os serviços de água, de modo geral, levam água tratada a quase todos os pontos da cidade, o que serve para agra-var, ainda mais, o problema; pois se existe água limpa chegando com facilida-de, maior a quantidade de água suja para retirar da localidade, aumentando as possibilidades de doença e contaminação.

O PAPEL DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

A Educação Ambiental deverá contribuir para ajudar as pessoas a encon-trarem formas de melhor conviver com o meio ambiente. Até o meado do sé-

nos rios e a maior parte das pessoas pensava que a própria natureza daria conta de absorver a sujeira. Entretanto, na Europa, já havia ocorrido problemas am-bientais sérios como a mortandade de peixes, em consequência de despejo de esgotos industriais, ocorrida na barragem do vale do Saal, em 1937.

No Brasil, a questão ambiental apareceu na década de 1970, mas, só

campo ambiental nasce nos nossos anos de chumbo, a EA cresce nos anos da abertura política e da ascensão dos novos movimentos sociais” (CAR-

alguns educadores passam a se chamar ambientais. Foi nessa época que passaram a ser organizados encontros estaduais e nacionais que serviriam

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como espaços de construção de uma identidade social em torno das práti-cas educativas voltadas para o meio ambiente.

quando aconteceram articulações para formar a Coordenadoria Interestadu-al Ecologista para a Constituinte e foi fundado o Partido Verde. No campo

-sistência nos movimentos de base, que viam os movimentos ambientalistas como um interesse próprio da classe média.

Ainda segundo Carvalho (2001), foi a partir dos anos 90 que os movi-mentos populares e sindicais se abriram para a questão ambiental, por con-ta do papel emblemático desempenhado por Chico Mendes, cuja trajetória opera o trânsito entre o popular e o ecológico. Na década de 1990, a questão ambiental é marcada por transformações sociais e políticas, a partir da inter-locução estabelecida pelos movimentos sociais com o Estado.

A realização da Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) no Rio de Janeiro, a Eco-92, valorizou o debate ecológico e as questões ambientais. Este encontro mundial mobili-zou processos sociais importantes, desde sua convocação em 1989, sobre-tudo no Brasil.

No âmbito local, na região sul da Bahia, o movimento ambientalista tem crescido. Algumas cidades já elaboraram a Agenda 21 local e, dentro do possí-vel, são realizadas ações ainda que isoladas e tímidas, no sentido de implantar uma política de conscientização para as questões ambientais.

Institucionalmente, o ponto mais favorável foi a criação da Universidade Livre do Mar e da Mata – a MARAMATA, na cidade de Ilhéus (BA), uma ins-

Esta instituição está localizada no bairro da Nova Brasília, onde moram fa-mílias de pescadores e de baixa renda. Foram implantados diversos projetos ambientais. Podemos considerá-los, entretanto, ações pontuais.

A Maramata oferece diversos cursos a pessoas escolarizadas, ou não, inseridas nas mais diversas áreas, como ensinamentos de medicina caseira,

Meio Ambiente). Outra preocupação da instituição é com eventos histórico--culturais. Um deles é A Canoagem do Mato Virgem, uma alusão à viagem realizada a Ilhéus pelo príncipe Maximiliano de Habsburgo, que resultou no livro denominado Mato Virgem.

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A região sul da Bahia possui Reservas Permanentes do Patrimônio Na-tural (RPPNs), Reservas Legais (RL), Áreas de Proteção Ambiental (APA), além do Ecoparque de Una e de outros projetos para preservação ambiental.

Carvalho destaca que, a partir da Rio-92, foram criados Grupos de Tra-balho (GTs), cujo desdobramento foi a elaboração do Tratado de Educação Ambiental, processo que resultou na formação da Rede Nacional de Educa-ção Ambiental (Rebea), que promoveu, após a Conferência do Rio, a realiza-ção de alguns Fóruns Nacionais de Educação Ambiental.

Entendemos que para compreender o rumo que os fatos tomaram para chegarmos aos dias atuais, necessitamos estudar história. A perspecti-va histórica é muito importante. Ela nos permite uma análise dos fatos do passado, diante do presente, que deve funcionar como planejamento para o futuro.

O ser humano possui uma tendência natural para o egoísmo, que pode ser um fator biológico, representado pelo instinto de conservação, existente em todos os animais. Por ser racional, acreditamos ser possível para o homem

sociais. Acreditamos que a Educação Ambiental deverá fomentar a ação coope-rativa entre os indivíduos e os grupos sociais, entre as instituições. Os processos ecológicos, profundamente interdependentes, vieram mostrar ao ser humano que nunca estamos sós, que estamos imersos numa gigantesca teia de intera-ções, que fazemos parte do todo, que não somos os donos do planeta e que temos responsabilidades com as gerações vindouras. Já que somos possuidores de uma consciência moral, temos que pensar no todo (Dias, 1999).

E como bem diz Moacir Gadotti (2000):

ser gente. De aprender a viver nesse planeta, compartilhá-lo, em vez de dividi-lo para dominá-lo, comunicarmo-nos, em vez de expedir comunicados e ordens, abrirmo-nos para o outro, para outras culturas... Não somos mais cidadãos brasileiros ou euro-peus. Somos cidadãos da Terra.

Neste início de século XXI, o objetivo central da Educação Ambiental é a promoção do desenvolvimento sustentável. Incluir no desenvolvimento a possibilidade de preservar o planeta para as gerações futuras. Na Con-ferência do Rio, a Eco-92, representantes de 180 países concluíram que o

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modelo de desenvolvimento econômico vigente é não-sustentável, ou seja, ele é inviável economicamente, socialmente e ecologicamente (Dias, 1999).

O que precisamos buscar, na verdade, é um novo modelo de desenvol-vimento, que poderia ser o desenvolvimento sustentável; entretanto, alguns

-tagônicos.

De acordo com Acselrad (1999), o Banco Mundial tem como objetivo

o crescimento renovável, a conservação de recursos e propiciar mudanças

-políticos que deverão ser acionados em nome de tal pretensão”.

Há cerca de 150 anos Karl Marx convocou a união das classes trabalha-doras, o que ainda não aconteceu efetivamente. Um grupo menor de pesso-as, uma minoria, é que governa e impõe sua vontade, pelo poder econômico e político. Ainda há muito que caminhar para que tenhamos um mundo mais justo e formas de vida não tão consumistas. Sobre a questão política

No mundo, urge a substituição desse grupo de inescrupulosos que, enganando os eleitores e burlando as leis, se apoderaram da política e transformaram o mundo no que é hoje. Há a necessida-de do surgimento de novas lideranças, realmente comprometidas com o desenvolvimento sustentável. (DIAS, 1999, p. 35).

Embora concordemos com a opinião do autor, entendemos que o pro-blema é mais complexo, pois quando substituímos os que estão no poder pelos que estavam na oposição, os novos dirigentes passam a ter o mesmo comportamento do anterior. E não é só na classe política. Quando vemos

-voltura, percebemos o quanto é difícil pensar no outro, no bem-estar da hu-manidade, dos que vivem e dos que virão. Para que haja mudança, é preciso mudar a mentalidade e o comportamento. Por este motivo, as pessoas que enxergam com clareza as necessidades do planeta, se angustiam e clamam pela urgência de se estabelecer amplo debate público acerca das questões que envolvem os riscos à vida no planeta (Beck, 1992 in Loureiro).

Da expansão colonial europeia, a partir do século XVI, à globalização do

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século XX, dos efeitos da urbanização à industrialização, aparecem sinais de

Na atualidade os problemas se agravaram de tal forma, que colocam em

Da consolidação de um modelo industrial-consumista, o desen-volvimento tecnológico e a ocidentalização planetária, surgem os problemas globais: risco de aniquilação nuclear e bioquímica, manipulação genética, declínio de biodiversidade, poluição de todos os biomas, exaustão dos recursos naturais em escala mun-dial, ausência de destino adequado para a crescente quantidade de resíduos tóxicos, depleção da camada de ozônio e efeito es-tufa. São impactos sem fronteiras e que ocorrem em velocidade acelerada.

A situação é crítica, embora muitos ainda o neguem. Enorme contingente populacional morre de fome, os desertos proliferam, os vírus atacam cada vez mais, as bactérias tornam-se resistentes, o mundo transforma-se num caos.

Já se passaram quase 40 anos da Declaração de Estocolmo, em 1972, quando foi apresentada a possibilidade de uma nova forma de desenvolvi-mento, o sustentável, visando corrigir as falhas cometidas pelos seres huma-nos com o planeta. Ainda não sabemos qual será a saída, se pelo uso da razão, ou pelo caminho da catástrofe. Esperamos que esta saída seja encontrada o mais rapidamente possível. Precisamos lembrar, também, que há que se fazer um esforço teórico visando trazer a discussão da sustentabilidade para o campo das relações sociais, porque não tem sentido falar de natureza sem sociedade. Segundo ele:

A sociedade só existe em relação com a natureza, nas diferentes acepções que a esta palavra possam ser atribuídas. Portanto, não se trata de uma sustentabilidade dos recursos e do meio ambien-te, mas sim das formas sociais de apropriação e uso desses recur-sos e deste ambiente. Pensar dessa maneira implica certamente em se debruçar sobre a luta social, posto que torna-se visível a vigência de uma luta entre diferentes modos de apropriação e uso da base material das sociedades (Acselrad, 1999, p. 37).

Cabe, pois, à Educação Ambiental, buscar a forma precisa de continu-ar buscando o desenvolvimento e a tecnologia, mas seguindo uma linha de

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durabilidade dos bens de consumo, que já aconteceu na primeira metade do século XX, deixando de lado a prática atual do descartável. Cabe a cada um de nós que já chegou a um nível mais apurado de consciência planetária, fazer valer o direito à sobrevivência: dos homens, dos animais e vegetais, dos que estão vivos e das gerações que virão, posto que o planeta sobreviverá.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Educação Ambiental, como prática de vida e como disciplina, nasceu da necessidade de regular o modo de vida do homo sapiens e sua relação com o planeta, a nossa casa. A única que temos, e que provavelmente teremos nos próximos anos.

Atualmente fala-se muito neste assunto e são inúmeras as instituições voltadas para esta prática e preocupadas em implantá-la: nas escolas, nos bairros, ligadas ao modo de vida e, no bojo das instituições não governa-mentais que proliferam. Ela é necessária e pode representar uma das pou-cas saídas que temos para mudar nosso comportamento e nossa relação com o planeta.

Esperamos que cada vez mais pessoas, grupos de pessoas, organizações se preocupem com a vida no planeta e com a disseminação das boas idéias que transformarão a terra dos homens em um local ainda mais bonito e agra-dável para se viver.

REFERÊNCIAS

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PERFIL NUTRICIONAL DE PACIENTES COM DIAGNÓSTICO DE DOENÇA PULMONAR OBSTRUTIVA CRÔNICA INTERNADOS EM UM

HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DO OESTE DO PARANÁ

Adriana Cruz Lopes*1 Ana Carla DiasFreitas**2

Resumo

Estima-se que no Brasil 5,5 milhões de pessoas sejam acometidas por Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, sendo considerada uma das principais causas de óbitos no país. Durante a progressão da doença ocorrem complicações que afetam direta e indiretamente o estado nutricional, principalmente a des-nutrição energética protéica devido à diminuição do consumo alimentar e o hipercatabolismo protéico associados. O objetivo do trabalho foi avaliar

-va Crônica, internados em um hospital público do Oeste do Paraná. Foram selecionados 32 protocolos de pacientes portadores da doença de ambos os gêneros, com idade acima de 50 anos. As variáveis analisadas foram peso, altura, necessidades nutricionais, dieta prescrita, etilismo, tabagismo e co-morbidades associadas. Dos 32 prontuários analisados, 56% eram do gênero masculino, com média de idade 67,29 anos. Em relação ao índice de massa corporal dos adultos

de 65 anos, com média de 24,04 kg/m². Com relação ao tabagismo, 38% eram tabagistas e 10% etilistas crônicos. Dentre as comorbidades associadas,

--

nia comunitária 12%. A média das dietas prescritas e consumidas em relação ao gasto energético basal foram 1822,35 Kcal e 1264,84 Kcal, respectivamente. Pela distribuição de macronutrientes, 50% das dietas eram hiperglicídicas, 50%

* Nutricionista, Especialista e Mestre em Fisiopatologia em Clínica Médica pela Facul-dade de Medicina de Botucatu. Coordenadora, Orientadora e Docente do Curso de Graduação em Nutrição da Faculdade de Ilhéus e Pós Graduação em Nutrição Clínica nas disciplinas Metabolismo e Nutrição e Fisiopatologia e Dietoterapia. Coordenado-ra e Pesquisadora do Instituto de Pesquisa e Pós Graduação Multidisciplinar. ** Nutricionista Clínica pela Faculdade Assis Gurgacz.

97

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normoprotéica e 50% hipolipídica. Apesar da maioria das dietas ofertadas aos pacientes serem hipocalóricas e não atingirem as necessidades energéticas dos

que o grau da Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica possa ser determinante do estado nutricional e um dos principais agravos da progressão da doença. Palavras-chave: Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica. Estado Nutricional. Terapia nutricional Abstract

It is estimated that in Brazil, 5.5 million of people are affected by Chronic Ob-structive Pulmonary Disease and it is considered a major cause of deaths in the country. During the progression of the disease complications occur and affect directly and indirectly the nutritional status, especially protein energy malnutrition due to decrease of the food intake and associated protein hyper-catabolism. The objective of this study was to evaluate the nutritional status of patients with chronic obstructive pulmonary disease, admitted in a public hos-pital in the western regions of the Paraná. Thirty-two protocols of patients with the disease of both genders, with age over 50 years, were selected. The analyzed variables were weight, height, nutritional requirements, prescribed diet, alcoholism, smoking and associates comorbidities. Of the 32 analyzed re-cords, 56% were of the male gender, mean age 67.29 years. In relation to body mass index of adults 50% were normal and 44% underweight in the elderly over 65 years, with an average of 24.04 kg / m². With regard to smoking, 38% were smokers and 10% chronic stylist. Among the comorbidities, 25% had acute renal failure, 22% Hypertension, Congestive Heart Failure 17%, diabetes mellitus and 12% Community-acquired pneumonia. The average prescribed diets and consumed in relation to resting energy expenditure were 1822.35 and 1264.84 Kcal Kcal respectively. For the distribution of macronutrients, 50% of the diets were hiperglicídicas, 50% and 50%-fat normal protein. Although most patients to be offered diets calorie and do not meet the energy needs of

that the degree of chronic obstructive pulmonary disease may be a determi-nant of nutritional status and a major aggravation of disease progression.

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Keywords: Chronic Obstructive Pulmonary Disease. Nutritional Status. Nutritional Therapy

INTRODUÇÃO

A doença pulmonar obstrutiva crônica - DPOC - é um processo caracte-

ao desenvolvimento de obstrução de vias aéreas devido à aéreo, podendo ser parcialmente reversível, progressiva e associada a uma

geralmente causados pelo hábito de fumar cigarros em 90% dos casos.1 O -

quite crônica), bronquíolos (bronquiolite obstrutiva) e parênquima pulmo-

cada indivíduo, tendo relação com os sintomas apresentados.2

A troca de gases é a principal função dos pulmões tornando o organis-mo capaz de receber oxigênio para suas necessidades metabólicas e celulares, removendo o dióxido de carbono produzido no processo, além de papel vital

-pando também da função imunológica.3 Os mecanismos principais envolvi-

-ção, hipersecreção brônquica e bronco-espasmo.4

Por se tratar de uma síndrome, atualmente as evidências apontam para uma -ça muscular, ressaltando a intolerância ao exercício que estes pacientes apre-sentam5

6 Já o

7 Guyton & Hall8

pulmões, caracterizando como um processo mórbido complexo que obstrui e destrói os pulmões e na maioria dos casos, é consequência do tabagismo de longa duração.

A obstrução bronquiolar aumenta grandemente a resistência das vias aéreas e acarreta grande aumento do trabalho ventilatório, apresentando

-

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rações devido à força compressiva que exerce sobre a superfície externa dos pulmões, não apenas comprimindo os alvéolos, mas também os bronquíolos, o que aumenta ainda mais a sua resistência durante as expirações.8

Estima-se no Brasil, que 5,5 milhões de pessoas sejam acometidas por DPOC, ocupando a 4ª e a 7º posição nas principais causas de óbitos. Nos EUA, chega a 4ª causa mais frequente, nos dois países a taxa de mortalidade é muito crescente, para o Brasil no ano de 2003, a DPOC chegou à 5ª maior causa de hospitalização de pacientes com mais de 40 anos, no sistema públi-co de saúde chegou a 80% da população.7 As exacerbações são frequentes, geralmente de 2 a 3 episódios por ano, em 50% das vezes destes quadros o paciente não procura o médico, nos casos onde precisa de internação a mor-talidade hospitalar no geral é de 3% a 4%, chegando a alcançar de 11% a 24%, quando se necessita de tratamento intensivo, chegando a atingir 43% a 46% em um ano, aumentando a probabilidade de reinternação por exacerbação novamente em 50% em 6 meses.9

De acordo com a literatura, a DPOC tem maior prevalência em ho-mens10, e com idade acima de 40 anos11, podendo iniciar mais cedo, mediante exposição ambiental.12

Na evolução da DPOC ocorrem complicações que afetam o estado nu-tricional, principalmente a desnutrição, devido à diminuição do consumo alimentar e ao gasto energético aumentado.13 A literatura é ampla no que diz respeito ao estado nutricional comprometido podendo interferir com o progresso da doença pulmonar, outros revelam que, melhorando-se o aporte nutricional, é possível contribuir com outros aspectos terapêuticos. Tem se observado uma incidência de desnutrição de 10 a 26% em pacientes ambula-toriais, e de 47%, em pacientes hospitalizados com DPOC.14

Alguns fatores podem contribuir para estas perdas nutricionais, princi-palmente o hipermetabolismo, atribuído ao aumento do trabalho dos mús-culos respiratórios, uma vez que o gasto energético causado pelo aumento da ventilação é mais alto em pacientes com DPOC do que em indivíduos sadios de mesmo sexo e faixa etária, esse aumento da taxa de metabolismo basal poderia explicar a perda de peso.11

-tricional dos pacientes portadores de DPOC hospitalizados, dieta prescrita e consumida e as principais co-morbidades associadas, além da prevalência de tabagismo e etilismo.

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METODOLOGIA

Estudo retrospectivo por meio de levantamentos de dados de fonte se-cundária de protocolos de avaliação nutricional e prontuários de pacientes hospitalizados de um hospital público do oeste Paraná, com diagnóstico clí-nico de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC).

O trabalho foi elaborado de acordo com as diretrizes e normas regulamen-tadas de pesquisa envolvendo seres humanos (RESOLUÇÃO 196/1996 DO CNS/MS – BRASIL, 1996) e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Faculdade Assis Gurgacz do município de Cascavel- PR.

Foram selecionados protocolos de pacientes de ambos os gêneros, com idade entre 50 e 96 anos, que apresentaram diagnóstico de DPOC, sendo 14 do gênero feminino e 18 masculinos, onde 17 eram idosos aci-ma de 65 anos e 14 adultos. As variáveis analisadas foram idade, gênero, peso, altura, necessidades nutricionais, dieta prescrita, etilismo, tabagismo e comorbidades associadas. Foi excluído um protocolo por não apresentar consistência nos dados.

O estado nutricional foi diagnosticado através do Índice de Massa Corpórea – IMC de adultos de acordo com a OMS (1998) sendo adotada

18,5 30. Para os idosos

15

27. Para calcular as necessidades

para DPOC.A análise da ingestão alimentar foi calculada segundo o recordatório

alimentar de 24 horas coletado nos protocolos, através do programa AVA-

Para a análise estatística foi realizado cálculo da média das dietas pres-critas e consumidas, onde as variáveis foram avaliadas e confrontadas com

resultado encontrado. As análises estatísticas foram feitas utilizando o teste

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RESULTADOS E DISCUSSÕES

Dos 32 prontuários analisados de pacientes com doença pulmonar obs-trutiva crônica, 44% eram do gênero feminino e 56% masculinos (p > 0, 001), a média de idades observadas foi de 67,29 ± 11,55 anos. De acordo com I Consenso Brasileiro de DPOC16, 2000, a prevalência da doença é maior no gênero masculino devido ao tabagismo presente mais em homens que mu-lheres. Estudo PLATINO (The Latin American Project for the Investigation

prevalência de DPOC na América Latina, avaliou 1.000 indivíduos em São Paulo, 1.208 em Santiago, 1.063 na Cidade do México, 943 em Montevidéu e 1.357 em Caracas, observaram que a prevalência da DPOC variou de 7,8% na Cidade do México a quase 20% em Montevidéu, com maior prevalência em homens, indivíduos mais velhos, com menor escolaridade, com menor índice de massa corpórea e com maior exposição ao cigarro, demonstrando taxas não ajustadas de prevalência que variaram entre 7-8 e 19,7%, na área metro-politana de São Paulo, a prevalência total de DPOC foi de 15,8%; quando apenas os fumantes foram avaliados, a taxa não ajustada foi 21,9%.17

A Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Banco Mundial (BM) es-timaram que em 1990 a prevalência da DPOC aproximadamente 9,33 por 1.000 homens e de 7,33 por 1.000 mulheres.18

De acordo com a literatura, a prevalência da DPOC aumenta com a ida-de, assim, estudo epidemiológico realizado na Espanha (IBERPOC), demons-trou estimativa de 9,1% da população geral. Metade dos casos encontrava-se entre 60 e 69 anos, e a outra metade estava distribuída igualmente nos grupos etários de 40-49 e 50-59 anos. Uma constatação interessante foi que, apesar de os sintomas respiratórios serem comumente relatados naquela população,

-cados anteriormente, apontando para subdiagnóstico da doença.19

Com relação ao estado nutricional nos pacientes adultos, o diagnóstico

sobrepeso, 13% obesidade, 6% desnutrição leve. Na avaliação nutricional

e 6% excesso de peso, (p > 0,005), com média de 24, 04 ± 6,27 kg/m². O índice de massa corporal tem sido utilizado como bom indicador do esta-do nutricional, pois de acordo com a literatura, a progressão das doenças

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pulmonares está associada com a diminuição do índice de massa corporal. 6

A característica mais comum da doença é a perda do volume expiratório forçado, limitando a função ventilatória, levando à dispneia. Na fase avançada da doença, além da dispneia, observa-se perda de peso e de massa muscular, sugerindo assim, que a perda progressiva de peso seja resultado de um conjun-to de fatores como consumo calórico inadequado devido à anorexia, descon-forto gastrointestinal e aumento das necessidades calóricas devido ao esforço excessivo da musculatura cardíaca.20 Portanto, a desnutrição contribui para o decréscimo da função respiratória e o aumento da suscetibilidade a infecções com consequente aumento da morbimortalidade destes pacientes.21 Estudo realizado por Hunter22 et al., 1981, onde avaliaram o estado nutricional de 38 indivíduos com DPOC23, os resultados das avaliações antropométricas, bioquí-

A prevalência da desnutrição varia de 26% a 47% dos pacientes portado-res de DPOC, no presente trabalho o risco de baixo peso estava presente so-mente em 6% dos pacientes adultos e 44% nos idosos, sugerindo que quanto maior o grau da doença maior o risco de desnutrição. Importante ressaltar que a diminuição da ingestão alimentar e o aumento do gasto energético, favorecem o hipermetabolismo nestes pacientes, constituindo mal prognósti-co, sendo considerado um risco independente podendo ser revertido através de um tratamento dietoterápico adequado.13

Estudo realizado por Silva24 et.al., 2008 em 12 pacientes com diagnóstico de DPOC do gênero masculino tiveram valores reduzidos do índice de massa

pacientes com DPOC apresentam fraqueza muscular inspiratória e periférica e uma menor capacidade ao exercício. O presente trabalho se aproxima mais do estudo realizado por Lerario25 et. al., 2006, onde os pacientes portadores de DPOC apresentaram 45,9% peso normal, enquanto que 27,9% apresenta-ram baixo peso e 26,2% obesidade.

No presente trabalho a média do IMC encontrado nos pacientes foi de 24,04 kg/m². Dourado23

IMC < 25kg/m², apresentam aumento de sobrevida quando há ganho de peso, sendo assim, para YAKSIC26 et. al., 2003, pacientes com diagnóstico de DPOC que apresentam IMC abaixo de 25kg/m² é maior preditor à mortalidade.

Com relação ao tabagismo, 38% eram tabagistas, 9% nunca fumaram e 53% eram ex-tabagistas (p > 0,001). De acordo com a Organização Mundial da

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Saúde (OMS), o fumo está associado a 30% das mortes por câncer, 90% das mor-tes por câncer de pulmão, 30% das doenças coronarianas, 25% das mortes por doença cerebrovascular e 80 a 90% das mortes por doença pulmonar obstrutiva crônica.27,28 De acordo com Chatkin29, et al., 2000, o cigarro contém substâncias responsáveis pelo desenvolvimento da DPOC, como aldeídos, radicais livres, cetonas, ácidos orgânicos, amônia, acroleína, monóxido de carbono e óxido de

devido ao desequilíbrio protease-antiprotease e oxidante-antioxidante. De acordo com Sherman30, 1992, tabagistas apresentam alteração no sis-

desenvolvimento da DPOC, pois apresentam função macrofágica pulmonar -

rem alterações na imunidade mediada por células.31 Johnson & Chin32 2002, ressaltam que pacientes portadores de DPOC, geralmente apresenta excesso de proteases responsáveis pela destruição de elastina e matriz colágena, que

para dentro do pulmão e liberação de elastase, salientando ainda a presença de

pela fumaça do cigarro, prejudicando a ação das antiproteases endógenas.Para Siafakas & Tzortzaki33, 2002, o desenvolvimento da DPOC ocor-

re devido à exposição do indivíduo a fatores de risco ambientais associado à presença de fatores individuais. O tabagismo é a principal causa de risco

Dennis34, et al., 1996, relata exposição a poluentes como fumaça de fogão a lenha, pó e poeira inorgânicas ocupacionais. A predisposição individual é

20% dos tabagistas desenvolvem DPOC.Com relação ao etilismo, somente 10% eram etilistas crônicos, 31% não

utilizavam álcool e 59% sem dados no protocolo. Segundo Marmot e Brun-ner35, 1991, a mortalidade na Inglaterra relacionada ao abuso de álcool atinge 28 mil pessoas. De acordo com Faintuch36, 1995, 97% das pessoas consomem álcool e 40 a 50% dos homens têm problemas temporários relacionados ao consumo e 10% evoluem para o alcoolismo. No Brasil os dados sobre etilis-mo são muito escassos, principalmente quando envolvido nas doenças pul-

-tural, mostrando uma prevalência de alcoolismo entre 3 e 6%.37

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Das morbidades encontradas associadas à DPOC, a que mais apareceu

-

associadas ou não à presença de hipercolesterolemia, infarto agudo do mio-cárdio, acidente vascular encefálico, isquemia, bronco-infecção, hemorragia digestiva alta, tumores gástricos, cirrose hepática, síndrome de Addison, sín-

Fator determinante da qualidade de vida vem sendo muito discutida na literatura e um dos sintomas mais relevantes encontrados em pacientes com DPOC é a dispneia, associada à comorbidades. Estudo realizado por Kawakami38 et al., 2005, observaram em 53 pacientes portadores de DPOC comorbidades associadas em 19 pacientes com hipertensão arterial sistê-mica, 17 com gastrite e 16 com doenças musculoesqueléticas, com grande incidência de insônia associando então a apneia do sono. No presente es-

-formidade com estudo realizado por YAKSIC26 et. al., 2003, onde avaliaram

mais prevalente seguida de hipertensão arterial sistêmica e diabetes melli-tus, devido ao uso crônico de corticóides sistêmicos, com cor pulmonale presente em 20% dos pacientes e, no presente trabalho, apenas 7% dos pacientes apresentaram esta comorbidade.

Importante salientar a necessidade de detectar o mais breve possível as comorbidades associadas ao DPOC para melhora da qualidade de vida, assim estudo realizado por Van Manen39 et al., 2001 elaboraram um questionário sobre comorbidades que continha as 23 doenças mais comuns e aplicaram em 123 pacientes portadores de DPOC, com objetivo de avaliar a qualidade de vida. Os autores observaram que os fatores de comorbidade são os me-lhores índices para avaliar a qualidade de vida quando comparados a variáveis clínicas ou antropométricas, sendo que a presença de três ou mais fatores de comorbidade apresentavam maior impacto na qualidade de vida.

A média das dietas prescritas e consumidas em relação ao gasto energé-tico basal do paciente foi abaixo das necessidades energéticas, pois a média das necessidades energéticas foi 1822,35 Kcal e a ingestão foi 1264,84 Kcal (p > 0,001) (Figura 2).

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De acordo com Caruso40 et al., 2002 uma dieta nutritiva deve ser pla-nejada de acordo com as doenças e condições físicas do indivíduo, ou seja,

com as recomendações individuais, considerando sexo, idade, peso, altura. O aumento das necessidades energéticas em pacientes com DPOC pode ser atribuído ao hipermetabolismo decorrente do trabalho dos músculos respi-

-ência mecânica diminuída.41 De acordo com Vasconcelos42 et al., 2002, nos portadores de DPOC observa-se um aumento de 15% a 17% na taxa de me-tabolismo basal. Assim, de acordo com a literatura, o melhor método para determinar as necessidades energéticas do paciente portador de DPOC seria calorimetria indireta, mas como a maioria dos hospitais não possui devido ao custo, a equação de Harris Benedict43

pois calcula a taxa de metabolismo basal associado ao fator atividade física e pelo fator injúria. No presente trabalho utilizou-se para o cálculo das neces-sidades energéticas fator injúria de 1,2 e 1,5 respectivamente. Em relação à distribuição de macronutrientes, observou-se que 50% das dietas oferecidas eram hiperglicídicas, 41% normoglicídicas e somente 9% hipoglicídica, 18% hiperprotéica, 50% normoprotéica e 32% hipoprotéica e com relação aos li-pídeos 9% hiperlipídica, 41% normolipídica e 50% hipolipídica.

Para Williams44, 1997, os carboidratos não devem ser de proporção nor-mal, devido às alterações metabólicas exercida na patologia, aumentando o consumo de oxigênio, produção e retenção de dióxido de carbono, preconizan-do 50% das quilocalorias não proteicas de uma dieta. De acordo com Vianna & Waitzberg45 2000, a quantidade recomendada de carboidratos situa-se na faixa de 50% a 60% do gasto energético total do paciente, pois uma oferta além da necessária leva a lipogênese, resultando na produção de um excesso de dióxido de carbono e esteatose hepática, assim, aumentando o quociente respiratório consequentemente aumenta a produção de dióxido de carbono resultando em

-bém resultam em lipogênese, levando a um aumento da produção de dióxido

46

Steiner47 et al., 2003, realizaram ensaio clínico duplo cego, controlado por

em 85 pacientes portadores de DPOC. Pacientes que receberam placebo apre-sentaram perda de peso, enquanto que os pacientes tratados com suplemento

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de carboidratos tiveram aumento de peso, concluindo que a suplementação de carboidratos não aumenta a reabilitação pulmonar de pacientes com DPOC, porém, como o treinamento físico resulta em balanço energético negativo, a suplementação com carboidratos pode superar o balanço negativo e, em pa-cientes selecionados, melhora a evolução aos exercícios físicos.

Devido ao hipermetabolismo presente em pacientes portadores de -

ça pulmonar e muscular e promover melhoria na função imunológica, pre-conizando a ingestão entre 1 a 1,5 g/kg de peso/dia, salienta-se ainda que o excesso de proteínas podem resultar em dispnéia aumentada em pacientes com impulso respiratório aumentado e/ou em pacientes com reserva respi-

-tro respiratório e provocam aumento do trabalho respiratório, induzindo a fadiga muscular.45

Para Sachs & Lerario48, 2002, a quantidade de lipídeos recomendada para pacientes portadores de DPOC situa-se entre 25% e 30% do gasto ener-gético total calculado. No entanto, Vianna e Waitzberg45

necessidades do paciente. De acordo com Silva24 et al., 2003, a administração aumentada de lipídeos pode ser responsável pela diminuição da capacidade de difusão pulmonar e surgimento de hipertrigliceridemia, principalmente na presença de hipercatabolismo e septicemia, pois a redução dos níveis de carnitina pode estar associada à disfunção do metabolismo lipídico, resul-tando em hipertrigliceridemia, demonstrando ainda que a suplementação de L-carnitina associada ao treinamento físico pode proporcionar maior tolerân-cia ao exercício em pacientes com DPOC.

CONCLUSÃO

Apesar da maioria das dietas ofertadas aos pacientes serem hipocalóricas e as mesmas não atingirem as necessidades energéticas dos mesmos. Somen-

DPOC possa ser determinante do estado nutricional, ou seja, adultos estão no início da doença e idosos em grau mais avançado da mesma, portanto, a terapia nutricional individualizada é de fundamental importância e deve

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ser instituído o mais precoce possível para melhora da função imunológica e, consequentemente, melhora da qualidade de vida dos mesmos. Em rela-ção ao tabagismo, 53% eram ex-tabagistas e 38% tabagistas, determinando o mesmo como principal fator de risco e progressão da doença.

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ANEXOS

Figura 1 - Distribuição em porcentagem dos 32 protocolos avaliados de pacientes portadores de DPOC em relação às comorbidades associadas.

Figura 2 - Média das dietas consumidas, prescrita e necessidades energé-ticas dos 32 protocolos avaliados de portadores de DPOC.

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