Revista 21

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Revista Primeiro Plano nº 21

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NESTA EDIÇÃO...>>

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>>Atitude 2 Fábio Rosa

Entrevista 6

Com TIBICO BRASIL Banco do Nordeste

Pobreza 12 O desafio de agregar valor aos materiais, reduzir custos e envolver a sociedade na discussão

A energia elétrica transforma vidas. Levar esse bem público e incluir pessoas a um novo mundo, sobretudo onde as estruturas de Estado não alcançam, motivou o engenheiro agrônomo Fábio Rosa a buscar, na energia limpa do sol, uma forma de reduzir a pobreza em muitas comunidades no interior do Rio Grande do Sul e também no Amazonas. Através do IDEAAS – Instituto para o Desenvolvimento de Energias Alternativas e da Auto Sustentabilidade, ONG fundada por ele, já desen-volveu projetos sociais que se tornaram referência internacional. Diz sempre que a tecnologia precisa estar a serviço da inclusão social e por isso desenvolve projetos que aliam energias renováveis à educação, eficiência energética, geração de renda e preservação ambiental.

>> ATITUDE

Pelo acesso universal à energia limPa

Para saber mais sobre esse trabalho: www.ideaas.org.br

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AçãO

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>> EXPEDIENTE>>Os artigos e reportagens assinados não representam, necessariamente, o ponto de vista das organizações parceiras e da revista Primeiro Plano. A divulgação do material publicado é permitida (e incentivada), desde que citada a fonte.

Diretor: Odilon Luís Faccio

Direção de Redação: Maria José H. Coelho (Mte/PR 930- JP)

Editora chefe Alessandra Mathyas (MTe/SC 755-JP)

Redação Alessandra Mathyas, valéria Cunha e vera Rotta

Edição de Arte Cristiane Cardoso (Mte/SC 634-JP)

Capa Maria José H. Coelho

Foto da capa Paulino Menezes

Fotografia Sérgio vignes

Secretaria e Distribuição Lilian Franz

Colaboradores: Júlio Pavese, Paulino Menezes, Karine Rodrigues, Bruna villarim, Rodrigo Rocha Loures, Luiz C. Q. Ribeiro e Orlando A. S. Júnior

Parceiros Institucionais Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese) • Fundação vale do Rio Doce (FvRD) • Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora) • Instituto Observatório Social • Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social • Rede de Tecnologia Social (RTS) • universidade do vale do Itajaí (uNIvALI)

A Revista Primeiro Plano é uma publicação do Instituto Primeiro Plano.

Edição nº21 - julho 2011 www.primeiroplano.org.br

Já é consenso que o Brasil mudou para melhor na última década. Crescimento econômico com inclu-são social, respeito aos direitos humanos e ao meio ambiente, empresas comprometidas com a sustenta-bilidade, governos mais transparentes são assuntos que permeiam o noticiário brasileiro. A agenda social brasileira virou uma estratégia de desenvolvimento. No entanto, o país ainda tem uma das piores distri-buições de renda do mundo e vê quase 17 milhões de seus filhos sobrevivendo na pobreza extrema (menos de R$ 70 per capita). Esse é, sem dúvida, o maior desafio do país no século XXI.

A erradicação da miséria tornou-se a principal bandeira do atual governo federal. Isso fica evidente desde o slogan – País rico é país sem pobreza – até a articulação de um grande programa que quer en-volver todos os setores da sociedade nessa luta. Mas será que isso é mesmo viável? A sociedade de fato abraçará essa causa? A erradicação real da pobreza é o tema principal desta edição, que apresenta as

erradicar a miséria é o grande desafio deste século

R. João Pinto, 30, Ed. Joana de Gusmão, s 803 • 88010-420 - Florianópolis - SC - Brasil • Fone: 55 (48) 3025-3949 • [email protected]

metas do Plano Brasil sem Miséria, além de outras ações que já vinham sendo desenvolvidas país afo-ra, seja por governos, ONGs ou empresas.

Esse também é o tema do ENSAIO, com imagens do fotógrafo e sociólogo Júlio Pavese. Suas lentes retra-tam a pobreza nordestina de décadas atrás, o que, in-felizmente, ainda é a realidade de muitas famílias, em maior ou menor grau, em muitas cidades brasileiras.

Contamos ainda, mais uma vez com a valorosa contribuição da RTS – Rede de Tecnologia Social, que nos apresenta novas áreas de atuação, com ge-ração de emprego e renda e promoção da inclusão social e o desenvolvimento tecnológico. Já em MEu MuNDO, o ator Luciano Szafir fala do seu otimismo com a vida e o compromisso com o futuro. E para fi-nalizar, trazemos resultados de importantes eventos que pautam a sustentabilidade e a inclusão social, além de SOLuçÕES inovadoras para os pequenos desafios diários nas cidades.

Boa leitura!

Opinião 30 Por CLEMENTE GANZ LÚCIO Precisamos reduzir a pobreza e a desigualdade no país

Planeta Semiárido 32 Quintal Cultural

Ensaio 36 Retratos - pobreza no Brasil

Incluir 40 Tecnologias contra a miséria

Agenda global 46

Opinião 49 Por RODRIGO ROCHA LOuRES Empresário: parceiro fundamental

para o alcance dos ODM

Meu Mundo 50 Luciano Szafir

Em destaque 52

Opinião LE MONDE 55 Por LuIZ C. Q. RIBEIRO E ORLANDO A. S. JÚNIOR Desafios da questão urbana

Soluções 56

Saideira 58 Comida

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ENTREVISTA

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>>

T

A inclusão social através da cultura regional

ibico Brasil, de 42 anos, é gerente do Ambiente de Gestão da Cultu-ra do Banco do Nordeste. Ele é o responsável pela realização das ações culturais estratégicas do

Banco voltadas basicamente para a democratiza-ção do acesso às manifestações artístico-culturais. Além disso, Tibico é fotógrafo profissional e um auto-didata das câmeras, com uma produção es-sencialmente documental. Nesta entrevista para a Primeiro Plano ele fala sobre a vocação cultural do Banco do Nordeste e o que está sendo feito para o fortalecimento e a ampliação das fronteiras do fazer cultural e do fortalecimento da identidade da cultura nordestina e brasileira

Carroça de mamulengos

Cine Jangada

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TIBICO BRASILGerente do

Ambiente de Gestão da Cultura

do Banco do Nordeste

Primeiro Plano - Qual é a importância da cultura para o BNB?

Tibico Brasil - O Banco do Nordeste considera a cultura como um elemento de integração para o desenvolvimento social. Estamos ampliando ano a ano a atuação na área cultural, de modo a garantir que a Cultura seja percebida como um direito social básico e condi-ção fundamental para o pleno exercício da democracia no Brasil. Todas as ações na área cultural estão sintonizadas com a missão desenvolvimentista do banco e alinhada às diretrizes das políticas públi-cas culturais do Governo Federal.

PP - Quais são as principais premissas que norteiam a política cultural do BNB?

TB - São basicamente a democrati-zação do acesso às manifestações ar-tístico-culturais, o apoio à produção, fruição, circulação e formação artís-tico-cultural e a concessão de crédito às atividades econômicas da cultura. Essas premissas concretizam-se na forma de programas, projetos e equi-pamentos culturais, administrados pelo Ambiente de Gestão da Cultura, que buscam ampliar as fronteiras do fazer cultural.

PP - Um dos principais equipamentos do BNB são os Centros Culturais. Como funcionam e quais os objetivos desses espaços?

TB - Os Centros Culturais Banco do Nordeste – CCBNBs - de Fortaleza, Ca-riri - com sede em Juazeiro do Norte - e Sousa (PB) têm como objetivo promo-ver a formação de platéias, o desenvol-vimento profissional dos agentes cultu-rais locais e regionais e a difusão da arte e da cultura regional e universal. Traba-lhando de forma integrada, realizando ações de caráter nacional, o que permi-te que as regiões da Grande Fortaleza,

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Cariri Cearense e Alto Sertão Paraibano integrem o circuito das artes brasileiras, os CCBNBs incentivam a produção ar-tística, principalmente aquela que é ca-paz de garantir a boa sedimentação de tradições e práticas desenvolvidas pe-las comunidades artísticas nordestina e brasileira, enquanto realiza um trabalho educativo baseado na interação contí-nua com o público, através da oferta de informações e eventos culturais. Essas ações contribuem para a ampliação da capacidade de percepção e sensibili-dade do povo nordestino, ajudando a promover o exercício da cidadania com a consequente conscientização e valori-zação da nossa cultura.

PP - Qual é a freqüência e o perfil do publico que freqüenta os espaços e qual o montante de investimentos do BNB nessa área?

TB - Desde 2003 até maio de 2011, os CCBNB`s registraram a freqüên-cia de público de 9.842.891 pessoas realizando eventos, nas áreas de artes cênicas, artes visuais, audiovisual, atividades infantis, filosofia, história, literatura, música e patrimônio cul-tural. Para a manutenção da progra-mação dos CCBNB`s e dos Espaços Nordeste o Banco destina anualmente cerca de R$ 4,2 milhões para as des-pesas de pagamento de eventos cultu-rais, aquisição de materiais e despesas de produção.

PP - E o perfil da programação?

TB - A programação dos CCBNB`s é constituída primordialmente por meio de seleção pública, nas quais são apre-sentadas propostas para realização de espetáculos musicais, cênicos, de li-

A cultura é um direito social básico e condição fundamental para o pleno exercício da democracia no Brasil.

Equipe cultural do Banco do Nordeste

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teratura, além de cursos e oficinas de formação. Novas idéias e projetos em parcerias com entidades públicas e or-ganizações não governamentais são es-timulados e incorporados à programa-ção regular após avaliação da equipe do Ambiente de Gestão da Cultura.

PP - Você apontaria algum destaque dessa programação?

TB - Dentro da programação dos CCBNB`s merece destaque a realiza-ção dos programas Nomes do Nordeste, Literato e Papo XXI. São programas de debate gravados em vídeo e posterior-mente editados para o formato DVD com exibição em TVs públicas estaduais e distribuição gratuita para instituições educacionais e culturais, estudantes, pro-fessores, artistas, profissionais da área artística entre outros.

PP - O Banco tem medido o grau de satisfação dos usuários?

TB - Em setembro de 2010 foi rea-lizada pesquisa para medir o grau de satisfação dos usuários dos Centros Culturais. A pesquisa realizada nos três CCBNB’s também buscou mape-ar perfil dos freqüentadores, avaliar as instalações físicas, a satisfação com a divulgação da programação, a frequên-cia de utilização e a satisfação com os principais programas do Centro Cultu-ral, entre outros itens.

PP - E como foram os resultados?

TB - Uma das primeiras constatações destacadas pela Pesquisa é o fato de o público dos Centros ser constituido principalmente por jovens. Ainda com relação à caracterização dos usuários, vale ressaltar que 28% alegam não

A pesquisa de satisfação dos usuários dos nossos centros culturais servirá de base para novas estratégias de ação que formem plateias e promovam o acesso gratuito e de qualidade aos bens culturais.

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possuir renda e 35% tem rendimentos até R$1.000,00. Os dados sobre idade, escolaridade e rendimentos servem para traçar os diferentes perfis de pú-blicos e sinalizam uma forte tendên-cia de os Centros Culturais receberem pessoas de classes sócio-econômicas menos favorecidas, assim como pes-soas em formação. Tais constatações vão ao encontro da missão desses Centros que buscam a inclusão social através da cultura.

Com relação ao tempo de uso do equi-pamento, verificou-se que a maioria dos usuários, 56%, já frequentam o Centro Cultural há mais de um ano, provando que existe um público cativo que conhe-ce e freqüenta com assiduidade o equi-pamento.

Por outro lado, os dados indicam que 3% dos entrevistados estavam fa-

zendo sua primeira visita ao Centro Cultural. Extrapolando os dados da amostra, pode-se dizer que cerca de 90 pessoas visitam o Centro pela pri-meira vez.

PP - Como o BNB vai utilizar esses dados?

TB - A Pesquisa, além de apresentar dados motivadores quanto aos resul-tados obtidos, servirá de base para o desenho de novas estratégias de ação, assim como a intensificação de ativi-dades apontadas como de grande im-portância dentro da missão de formar platéias e promover o acesso gratuito e de qualidade aos bens culturais. A média geral de satisfação alcançada na pesquisa foi de 8,9, confirmando a aprovação do público usuário dos CCBNb’s.

A ação Microprojetos Mais Cultura aumentou o dinamismo econômico de comunidades e municípios, por meio de artistas, grupos independentes e pequenos produtores culturais.

O Trem da História

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PP - Como funcionou a parceria do Banco com o Ministério da Cultura na Ação Microprojetos?

TB - A Ação Microprojetos Mais Cultu-ra, por meio da qual o Banco do Nor-deste e o Instituto Nordeste Cidadania celebraram parceria com o Ministério da Cultura e a Fundação Nacional de Artes – Funarte teve como objetivo principal descentralizar o fomento da produção sociocultural e artística, possibilitando que pequenos produtores recebessem até 30 salários mínimos para a realização de seus projetos culturais. Esta feliz inicia-tiva aumentou o dinamismo econômico de comunidades e municípios, por meio de artistas, grupos independentes e pe-quenos produtores culturais. Coube ao Banco do Nordeste e ao INEC a contra-tação dos projetos, o acompanhamento da execução dos mesmos e a avaliação

dos resultados obtidos. Em 2010 foram contratados e premiados 1.107 proje-tos com um montante investido de R$ 12.113.721,61. Em um levantamento parcial dos projetos já finalizados perce-bemos que a ação foi capaz de garantir a realização de mais de 2.000 eventos, entre espetáculos teatrais, exibições de filmes, shows musicais e uma infinida-de de oportunidades de capacitação nos diversos segmentos da cultura, para pú-blicos diversos em especial jovens para quem o projeto foi destinado.

PP – Vc poderia dar um panorama dos investimentos culturais do BNB nos últimos anos e perspectivas para o futuro?

TB - Nos últimos 12 anos o BNB in-vestiu cerca de R$ 45,7 milhões com recursos do FNE em projetos do se-

tor cultural, beneficiando mais de 1.500 operações. Considerando ain-da os últimos 10 anos, as atividades mais representativas em termos de valores foram: livros, com R$ 17,5 milhões (50,3%); promoção e pro-dução de espetáculos artísticos re-gionais, com 5,7 milhões (16,6%); projeção de filmes e de vídeos, com R$ 4 milhões (11,8%) e video-loca-doras, com R$ 3,4 milhões (9,8%). As demais atividades juntas somam R$ 4 milhões ou 11,6% do total. Atualmente estão sendo realizadas ações de prospecção de novos clien-tes e de capacitação de projetistas, gerentes e produtores culturais para acesso e utilização do crédito.

A volta do lambe-lambe

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>>>> PObREzA

É possível erradicar a pobrezaA POBREZA DóI. A AFIRMAçãO DE TANTAS MãES DE

FAMíLIA, SOBRETuDO DA REGIãO NORDESTE DO PAíS,

E váRIAS vEZES REPETIDA PELO EX-PRESIDENTE

DA REPÚBLICA, LuIZ INáCIO LuLA DA SILvA, AGORA,

DE FATO, PARECE ESTAR PAuTANDO AS AçÕES DO

GOvERNO FEDERAL. AO ANuNCIAR O PLANO BRASIL

SEM MISéRIA, O GOvERNO QuER DESENCADEAR

uMA SéRIE DE AçÕES DE SuPERAçãO DA POBREZA

EXTREMA. MAS PARA ISSO, PRECISARá QuE OuTROS

PERSONAGENS DO PAíS TAMBéM FAçAM A SuA

PARTE: PREFEITOS, GOvERNADORES, EMPRESAS E

A SOCIEDADE CIvIL.

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uando era crian-ça, minha família morou em Sobra-dinho, no inte-rior da Bahia. O que mais marcou

minha vida foram os períodos de seca, quando acompanhava minha mãe, que era promotora pública, na distribuição de alimentos aos po-bres. Jamais vou esquecer que nas caminhadas que fazia pelo sertão vi gente morta de fome, literalmente, a beira da estrada”.

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que não tem fonte de renda: são os de-sempregados, os inativos, sem terra”.

Segundo o especialista, um quarto da população brasileira precisa de aju-da para manter-se viva. “É obrigação do Estado cuidar dessas pessoas, que não saem da pobreza extrema não porque não querem, mas porque a sociedade não lhes dá essa condição.” Ele explica que a maior parte desse contingente de miseráveis está nas pequenas cidades e no meio rural e que por isso, o Programa Bolsa Família – atualmente considerado o maior programa do mundo de distri-buição de renda – teria que ter o dobro de benefícios para dar conta da volatilidade da renda. “O miserável de hoje, mês que vem, pode ter recebido por um serviço qualquer, e aí já é pobre, mas outros po-bres podem ter se tornado miseráveis. Não há como estabelecer isso de forma precisa, é um processo demorado. Por isso a ampliação dos benefícios garante

O depoimento do sociólogo Júlio Pave-se, de 67 anos retrata um país que agora o Estado quer mudar. Ao lançar o Plano Brasil sem Miséria, o Governo Federal acredita que, em quatro anos, poderá acabar com a pobreza extrema no país. O valor per capita para fins do programa de erradicação da miséria determinado pelo governo é de R$ 70. Enquanto esse valor não se definia, era difícil avançar no plano, que demorou cinco meses para ser apresentado à sociedade.

Até então havia uma discussão teórica se o valor deveria ser estabelecido como parte do salário mínimo. Para o especia-lista do Instituto de Pesquisa Aplicada – Ipea, Sergei Soares, não era possível misturar esses assuntos: “Salário mínimo é salário, pressupõe-se que a pessoa re-cebe de fato. Frações do salário mínimo seria a pior maneira de medir a pobreza. E o pressuposto básico para a pobreza extrema é aquela parcela da sociedade

glossÁrio

CAged - Cadastro Geral de Empregados e Desempregados do Ministério do Trabalho e EmpregoPIB – Produto Interno Bruto – a soma da riqueza do país

POF – Pesquisa de Orçamentos Familiares - Investiga o padrão de consumo das famílias, seus gastos com alimentos e outros itens e suas fontes de rendimento

PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - colhe os rendimentos do trabalho e das transferências – (aposentado-rias, pensões, assistência social)

PME – Pesquisa Mensal de Emprego – levantamento domiciliar nas seis principais regiões metropolitanas brasileireiras

Pobreza Extrema – no Brasil, foi definida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, que uma pessoa é consi-derada miserável (pobre ao extremo) quando a renda per capita não ultrapassa R$ 70. Esse é um valor superior ao definido inclusive pelos Objetivos do Milênio (ODMs), de 1,25 dólar/dia per capita (cerca de R$ 60 atuais). Todos os programas sociais de distribuição de renda têm o valor da linha de pobreza como referência.

“Ouço pelas ruas opiniões de que esses projetos não dão certo, que o valor disponibilizado a estas famílias não fazem nada. Não concordo, para quem já viu de perto a miséria, conheceu pessoas que não tinham nem água, esta ajuda muda o que está dentro do prato, agrega uma roupa, um sapato, um caderno, seja o que for.” Júlio Pavese, sociólogo

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a sobrevivência dos miseráveis e dos po-bres que estão saindo da miséria”, afir-ma Sergei. Além disso, diz o especialista do Ipea, a definição para a superação da miséria não pode ser apenas econômica; deve refletir as condições da sociedade.

E a sociedade brasileira vem se trans-formando nos últimos anos. Segundo o estudo A nova classe média: o lado bri-lhante dos pobres, da Fundação Getúlio Vargas, no primeiro trimestre de 2010 o crescimento do PIB atingiu 8% em rela-ção ao mesmo período no ano anterior. E de 2003 a 2008, a taxa de crescimento do PIB per capita foi em média 3,8% ao ano. Essa diferença aumenta se for considera-da a Pesquisa Nacional por Amostra de

Domicílios – PNAD, que registrou mais de 2% de crescimento na renda. Em oito anos, a renda per capita dos 10% mais ricos no Brasil aumentou 1,49% ao ano, enquanto a dos mais pobres cresceu em 6,79%. Fruto da distribuição de renda como o Bolsa Família? Não só, apontam os especialistas.

O crescimento do emprego formal, duplicado desde 2004, é o principal sím-bolo de uma mudança bastante significa-tiva na pirâmide social brasileira: o cres-cimento da classe média. O ano de 2010 terminou com mais de dois milhões de novos empregos formais, conforme da-dos do Caged, do Ministério do Trabalho e Emprego. Soma-se a isso também uma

evolução no nível de escolaridade regis-trada de 2003 a 2009. “As taxas de cres-cimento do Brasil ainda estão aquém das de outros BRICs (nome dado ao grupo de países Brasil, Rússia, Índia e China), mas a qualidade do crescimento brasilei-ro é indiscutivelmente melhor que a da China em vários aspectos: melhor trata-mento do meio ambiente e do trabalho juntamente com a igualdade crescente”, constata o estudo.

Tal condição fez com que, em tese, o Brasil já cumprisse o primeiro dos oito Objetivos do Milênio, que é reduzir em 50% a pobreza extrema em 25 anos (de 1990 a 2015) “Pela métrica da ONU, o Brasil fez 25 anos em oito”, afirma o es-

Família menor, renda maior - O recente Censo Demográfico mostra a redução no número de

integrantes das famílias brasileiras, que passou de 3,62 para 3,3 pessoas. Em conseqüência, a renda

familiar per capita cresce o dobro: 21,7%. Fonte: Pesquisa de Orçamentos Familiares/ IBGE

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pecialista Marcelo Néri, coordenador do estudo da Fundação Getúlio Vargas so-bre a classe média brasileira. No entanto, pondera Neri, o país pode e vai avançar mais. Ao apresentar os resultados do es-tudo da FGV, ele mostrou que em 2010 a pobreza caiu 16% e que fazendo um paralelo entre duas pesquisas – a PNAD e a Pesquisa Mensal do Emprego (PME), ambas do IBGE, mesmo com suas me-todologias bastante distintas, é possível chegar a algumas conclusões sobre a re-dução da pobreza desde 1994. Desse ano até 2002, houve uma queda de 31,9%. E de dezembro de 2002 a dezembro de 2009, a pobreza caiu 51,9%.

Segundo Neri, foi uma grande evolu-ção social, mas a pobreza no Brasil ain-da é muito severa. E os dados do último Censo do IBGE mostram a geografia des-sa situação: há 16 milhões de pessoas vi-vendo na miséria. Desse total, 59% estão na Região Nordeste (9,6 milhões); 71% são negros; 26% são analfabetos; 51% têm até 19 anos de idade; 40% têm até 14 anos; 53% dos domicílios não estão ligados à rede geral de esgoto pluvial ou a fossas sépticas. No campo, um em cada quatro brasileiros encontra-se na pobre-za extrema e 48% dos domicílios rurais dos pobres não estão ligados à rede geral de distribuição de água nem têm poço ou nascente na propriedade.

Diante desse quadro, o Governo Fe-deral não quer apenas aumentar os be-nefícios do Bolsa Família, mas ampliar programas de acesso a serviços públicos e ações de cidadania já existentes, além de criar novas situações em parceria

com governos estaduais e municipais na tentativa de romper o círculo vicioso da exclusão social e da pobreza. Segundo a Ministra Tereza Campello, do Desen-volvimento Social e Combate à Fome (MDS) “o Brasil implementará as mais vigorosas políticas sociais do mundo”. Ela afirmou, no lançamento do Plano, que o Brasil só cresceu porque a pobreza diminuiu e que com incentivo governa-mental, será sim possível acabar com a miséria em quatro anos.

Plano Brasil sem MisériaEsse Plano pretende atuar em três eixos: garantia de renda, acesso aos serviços públicos e inclusão produtiva. Para isso, o MDS desenvolveu um Plano de Metas nacional “mas que enxerga as caracte-rísticas regionais”. Segundo a ministra Campello, é um desafio de administração pública e que para dar certo, precisará do trabalho de todas as esferas de governo.

No primeiro eixo está a previsão da ampliação do Bolsa Família. A meta é que até 2013 mais 800 mil famílias sejam incorporadas ao Programa. “São pessoas que têm direito mas que ainda não re-cebem o benefício”, explica Campello. Para alcançar esse objetivo, o Governo Federal irá incentivar a Busca Ativa: um conjunto de ações para incluir no Cadas-tro Único as famílias que vivem fora da rede de proteção e promoção social. Ou, como resume a ministra: “O Estado vai atrás do pobre e não vice-versa. Para o Brasil sem Miséria esses brasileiros não serão uma estatística. O plano irá consi-derar cada família, com nome, endereço,

DE DEZEMBRO DE

2002 A DEZEMBRO

DE 2009, A POBREZA

CAIu 51,9% NO BRASIL.

PELA MéTRICA DA

ONu, O BRASIL FEZ

25 ANOS EM OITO AO

CuMPRIR O PRIMEIRO

DOS OITO OBJETIvOS

DO MILêNIO, QuE é

REDuZIR EM 50% A

POBREZA EXTREMA

ATé 2015.

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quais suas necessidades e vulnerabilida-des. Quantos são? Têm água? Têm luz ou não? Quantos idosos? Quantas crian-ças? Estão na escola?”

Como o Censo 2010 mostrou que 40% dos miseráveis são crianças com menos de 14 anos, o governo ampliou de três para cinco o número de filhos por família atendida pelo Programa Bolsa Família. Com isso, calcula o MDS, haverá uma inclusão de 1,3 milhão de crianças e ado-lescentes até 15 anos de idade atendidos pelo programa.

Além disso, com o cartão do Bolsa Família, o cidadão poderá receber tam-bém outros benefícios, como créditos de fomento para o meio rural, auxílio para as mães na Rede Cegonha e a Bolsa Ver-

de. Essa última será um incentivo de R$ 300,00 trimestrais para as famílias ex-tremamente pobres rurais que vivem em florestas nacionais, reservas extrativistas ou em assentamentos ambientalmente diferenciados, para que contribuam na conservação ambiental.

Haverá ainda política complemen-tar dos estados para complementação de renda às famílias necessitadas. Até o momento o Distrito Federal e o Rio de Janeiro já apresentaram seus programas.

O outro eixo de atuação do ousado plano de erradicação da miséria é a in-clusão produtiva. O objetivo é aumentar a produção no campo e gerar ocupação e renda na cidade. No meio urbano, estão entre as ações a qualificação profissional

com mais de 200 tipos de cursos, a inter-mediação de oportunidades, o incentivo à economia solidária, a oferta de micro-crédito e a formalização do microempre-endedor individual. A meta, segundo a ministra Campello, é garantir vagas em cursos de qualificação para 1 milhão e 700 mil habitantes. “Esse número de pessoas representam 77% da população economicamente ativa em situação de extrema pobreza das cidades acima de 50 mil habitantes”, reforça.

Também está prevista a ampliação de serviços complementares e serviços pú-blicos, como a emissão de documentos, o acesso aos programas de saúde, de segu-rança alimentar, assistência social, habi-tação, educação, além do combate ao tra-

“O Plano Brasil sem Miséria tem um efeito: o de gritar a todos nós que a miséria ainda

existe no país e que não podemos nos esquecer dela um só minuto. Ela é a forma

mais trágica do atraso.” Presidenta Dilma Rousseff

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balho infantil. É o terceiro eixo do Plano, transversal a todas as ações específicas e que abrangerá os pobres urbanos e rurais.

Já para os pobres do campo (que so-mam 47% do público do plano), o desafio é aumentar a produção, oferecendo meios para isso, com assistência técnica, semen-tes de qualidade e acompanhamento das famílias, acesso aos mercados e a facili-tação do autoconsumo. Estima-se que até 2014 sejam atendidas 250 mil famílias rurais com o recurso de R$ 2400 para fomento da sua produção. Além disso, é meta universalizar o Programa Luz para Todos, que leva eletricidade ao meio rural e criar o Água para Todos, para que cada família no campo tenha água potável e para irrigação de sua produção.

Uma das medidas imediatas para in-centivar o escoamento da produção no

campo foi o convênio firmado entre a Associação Brasileira dos Supermerca-dos – Abras – e o governo para a com-pra de produtos da agricultura familiar. Para o presidente da instituição, Sussumi Honda, cerca de 25 milhões de pessoas acessam os supermercados diariamente e oportunizar produtos da agricultura familiar e da reforma agrária será “uma oportunidade de participarmos de um dos programas sociais mais justos e grandio-sos do país”. Além de ampliar a compra de produtos da agricultura familiar, a associação vai apoiar a capacitação de mão-de-obra para formar novos (e jo-vens) colaboradores. “Nós, supermerca-distas ganharemos novos consumidores e novos colaboradores”. Ele declarou apoio da Abras e suas 80 mil lojas dis-tribuídas em todos os estados ao Plano Brasil sem Miséria e concluiu: “a partir de agora, esse desafio também é nosso”.

O governo, por sua parte, também vai ampliar as compras de alimentos da agri-cultura familiar para escolas, hospitais, universidades, presídios, creches e ou-tras instituições públicas e filantrópicas.

Com essa série de iniciativas, o MDS acredita na elevação da renda per capi-ta e no aumento das condições de bem-estar dos hoje considerados miseráveis, mas que, num futuro próximo, poderão chegar à classe média, como aconteceu com 36 milhões de pessoas nos últimos anos. No lançamento do plano, a presi-denta Dilma Rousseff foi provocativa: “A pobreza demorou três séculos para entrar na pauta política e tornar-se tema acadêmico. Nossos pobres já foram acu-

A Ministra Tereza Campello, do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) acredita que o Brasil só cresceu porque a pobreza diminuiu e que com incentivo governamental será possível acabar com a miséria em quatro anos.

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sados de tudo, inclusive de serem os responsáveis pela sua própria pobreza. Mas a população pobre tem que ser vista como construtora de futuro”.

Apoios internacionais ao plano brasileiroA Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) irá auxiliar os órgãos brasileiros que estudam a geogra-fia da miséria no país - MDS , Ipea e IBGE - na análise dos indicadores sobre extrema pobreza elaborados pelo gover-no. A Cepal, criada em 1948, pelo Con-selho Econômico e Social das Nações Unidas, busca incentivar a cooperação econômica entre os 48 países membros.

A contribuição da Cepal se dará no exame das diferenças entre a mensura-ção da extrema pobreza, por meio das pesquisas Nacional por Amostra de Do-micílios (Pnad) e de Orçamentos Fami-liares (POF), do Censo Demográfico e do Cadastro Único paras Programas So-ciais. Esse estudo avaliará levantamento estatístico, período de coleta, fluxo de perguntas relacionadas a rendimento no questionário, tamanho e abrangência da amostra.

Para viabilizar análises e seminários que serão produzidos para monitorar o plano de superação da extrema pobreza, os qua-tro órgãos, no mês de junho, assinaram em Brasília, um acordo de parceria. No mes-mo dia, o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Ban Ki-Moon reuniu-se com a presidenta Dilma Rousse-ff e alguns ministros. Na ocasião destacou o sucesso das políticas sociais brasileiras e

elogiou o esforço do País na superação da extrema pobreza até 2014.

Salário mínimoSe de um lado o Governo busca atender os extremamente pobres para superarem sua condição e viver com o mínimo de dignidade, foi o aumento do salário míni-mo associado ao crescimento no número de empregos formais que fez a economia girar e enfrentar a forte crise internacional do fim da última década. A conclusão é da pesquisa capitaneada pelo professor Mar-celo Néri. “O incremento médio de 4,61% ao ano da renda trabalhista por brasileiro, que corresponde a 76% da renda média percebida, confere uma base de sustenta-bilidade das condições de vida para além das transferências de renda oficiais”. (Leia artigo do Dieese, pág. 30)

O secretário-geral da ONu, Ban Ki-Moon e a presidenta Dilma Roussef.

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“É dever do Estado brasileiro se voltar com especial atenção para os milhões de brasileiros

extremamente pobres, exatamente os mais vulneráveis e que mais dependem do Estado.”

Tereza Campello, Ministra do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

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De norte a sul, iniciativas incentivam trabalho e renda

Lixo e cidadaniaHá cinco anos Zacarias Rosa trabalhava como funcionário terceirizado coletando material reciclável nas ruas de

Criciúma (SC). Nessa época sabia que sua vida precisava de mudanças e foi então que se reuniu com mais alguns colegas de serviço e criaram uma associação de reciclagem. Passados quatro anos, as atividades da instituição se aprimoraram e a associação evoluiu para uma cooperativa que hoje agrega 20 famílias.

“Foi o Instituto Vonpar que fez isso com a gente, pois acreditou em nós e nos ajudou financeiramente. Tudo mudou para nós”, conta o presidente da CTMAR (Cooperativa de Trabalhadores de Materiais Recicláveis), Zacarias Rosa. Com a verba do financiamento foi possível reformar o galpão e fazer outras melhorias de infraestrutura. “A auto-estima foi a primeira coisa que aumentou, o que é mais importante do que simplesmente aumentar nossos ganhos. A questão do dinheiro é muito boa porque conseguimos captar mais material nas ruas, mas o ganho de respeito dos outros, que não nos olham mais como coitadinhos, é outra coisa”.

Na unidade presidida por Rosa trabalham, em média, duas pessoas por família e cada uma recebe cerca de R$ 600 por mês. Antes de virar cooperativa, o trabalho dos colaboradores não rendia mais que R$ 250. “Agora fizemos um plano de resíduos sólidos e coleta seletiva em parceria com o Instituto Vonpar, Prefeitura de Criciúma e a universidade daqui e as coisas vão melhorar ainda mais. Hoje atendemos cinco bairros e nossa meta é expandir para metade da cidade até o final de 2011”.

Mais um objetivo da CTMAR é passar de 25 toneladas recolhidas por mês para a mesma quantia coletada por dia. “Vamos conseguir isso com as parcerias. E também vamos atrair mais pessoas que precisam de oportunidade”.

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Romeu e Julieta, o clássico romance do inglês Willian Shakespeare, tem mostrado no sertão do Ceará, o quanto a cultura popular pode dinamizar a economia de uma pequena cidade e incentivar novos talentos que até então estavam fadados ao chão de fábrica. A partir de um incentivo de pouco mais de R$ 10 mil, oriundo da seleção dos Microprojetos Mais Cultura – Semiári-do, editados pelo Ministério da Cultura em 2008, o Instituto Gara-jaí de Arte e Cultura Popular, da pequena Maracanaú/CE mostrou talentos, levou alegria à população e fez circular uma economia até então pouco explorada: a da produção cultural. Com o intuito de contar a história de amor mais conhecida no mundo mas com uma visão nordestina e brasileira, os integrantes do grupo partici-param de todos os estágios da montágem, desde a discussão sobre adaptação do texto até o detalhamento do figurino e do cenário. O dinheiro investido no projeto circulou na região: para a mercearia que vende o lanche para os artistas, para as costureiras do figurino, para os marceneiros na montagem do cenário. E a iniciativa vai dando frutos. A maioria dos jovens atores dão aulas de atuação em escolas ou participam de trabalhos ligados ao teatro, tirando disso o seu sustento. De poucos sonhadores, hoje mais de 250 jovens alunos entre 18 e 28 anos – muitos dos quais já são chefes de fa-mília – querem continuar trabalhando com arte para e na sua comunidade. Francisco Mário Ferreira Jorge, o Maninho, coordenador do grupo teatral é defensor do coletivo. “Sozinho ninguém vai para canto nenhum. ” Para ele, o incentivo financeiro dado à cultura local “mudou a nossa vida e a vida da comunidade”. Maracanaú é um distrito industrial da Grande Fortaleza e aos jovens que ficam na cidade não há muitas opções de emprego a não ser tra-balhar do setor fabril.

(Conheça outros exemplos da geração de emprego e renda a partir do incentivo à cultura local no livro Microprojetos mais culturas: semiárido: a cultura nas mãos. Funarte, Ministério da Cultura, 2010. Distribuição gratuita e dirigida)

Cultura e renda

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Nos municípios de Juruena, Cotriguaçu e Juína, no estado do Mato Grosso, as comunidades indí-genas mostram que é possível ter uma boa renda mantendo a floresta de pé. Lá desenvolvem viveiros de mudas amazônicas, áreas de extração de borracha e castanha, fábricas de palmito e castanha e sis-temas agroflorestais. Algumas dessas atividades chegam a ser mais rentáveis que pecuária intensiva e monocultura de grãos, sem falar no impacto ambiental muito menor. Um dos produtores que apos-

taram nesse sistema é José Ramos, que começou há 30 anos produ-zindo café e atualmente investe no gado leiteiro consorciado com ipê, seringueira, cupuaçu e castanha-do-pará. Também cultiva pupunheira, cana-de-açúcar, teca, coco e piscicultura. Já Helmut Raimann, que há dez anos abandonou o uso de agrotóxicos, mantém castanha-do-pará, pupunheira e cupuaçu, além de plantar mandioca, arroz, gergelim e feijão andu. Ao todo, tem cerca de 70 pés de castanheira e 3.500 pés de pupunheira, de onde vem sua principal fonte de renda.

Já no assentamento extrativista Vale do Amanhecer, em Juruena, a Associação de Mulheres Cantinho da Amazônia (AMCA) e a Coope-rativa dos Agricultores do Vale do Amanhecer (Coopavam) compram castanha-do-pará, extraída pela comunidade de assentados ou pelos rikbaktsas, e beneficiam o produto. A Coopavam, por exemplo, deve atingir uma produção de 90 toneladas neste ano. Entre os comprado-res, que chegam a pagar R$ 16 por quilo, estão empresas de alimentos e cosméticos, como a Natura. Também são feitos biscoitos servidos na merenda escolar dos municípios da região. Outra experiência bem-sucedida é a exploração de látex pelos rikbaktsas, iniciada em 2006. Os índios têm parceria com a Pneus Michelin, que adquire toda a pro-dução de borracha da região. Essas e outras iniciativas locais fazem

parte do Projeto de Conservação e Uso Sustentável das Florestas do Noroeste do Mato Grosso, rea-lizado desde 2001 pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolviemtno (PNUD) em parceria com a Secretaria Estadual de Meio Ambiente e financiado pelo Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF). Ao terminar o projeto, neste ano, o que as comunidades indígenas, assentados e os pequenos agricultores precisarão é de acesso a crédito e assistência técnica adequada.

O valor da floresta em pé

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Ensinar a PescarAs comunidades indígenas no Brasil vivem um permanente dilema de sobrevivência, cada

vez mais “expremidas” em áreas bem menores ao que seria necessário para manterem suas cul-turas. Enquanto isso não se resolve – visto que as disputas por terras são crescentes – há boas iniciativas que trazem renda e um pouco de dignidade a essas populações. No Mato Grosso do Sul há duas interessantes experiências na área de psicultura supervisionadas pela Universidade Católica Dom Bosco, em parceria com entidades governamen-tais ( Ministérios da Pesca e Aquicultura, do Meio Ambiente, Governo Estadual, prefeituras, PNUD).

Uma delas é o trabalho da Associação Indígena da Reserva de Dourados (no município de mesmo nome) que está recuperando 35 tanques de criação de peixes, construídos a partir de 2005 e que, por falta de apoio governamental até então, foram abando-nados em sua grande maioria. A outra iniciativa, já melhor or-ganizada, é da Associação Indígena Te’ykue (Aldeia localizada no município de Caarapó), que faz a manutenção de cinco re-presas com soltura de peixes e todo o manejo de responsabilida-de dos próprios moradores. A produção ainda é para consumo interno, o que não é pouca coisa para uma população local de 13 mil pessoas. Para o professor Antônio Brand, do Núcleo de Estudos de Populações Indígenas da UCDB (Campo Grande) essas ações são fundamentais para diminuir os problemas dessas comunidades e fortalecer a autoestima, mas a superação da pobreza passará pela resolução dos conflitos por território. Ele afirma que há sete anos praticamente todos os habitantes das duas aldeias – que totaliza 18 mil pessoas – recebem cestas básicas e benefício do Bolsa Família. “Enquanto a questão da terra não for solucionada, o que era para ser emergencial tornou-se uma renda permanente para a sobrevivência dessas populações”, desabafa o professor Antônio.

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o final de 2010 a Ce-pal – Comissão Eco-nômica para América Latina e Caribe – apresentou o relatório intitulado Panorama

Social da América Latina 2010, onde projetou a diminuição da pobreza e da indigência em 1,0 e 0,4 pontos percen-tuais respectivamente, em comparação ao ano anterior. Ainda assim, os dados são preocupantes. O ano de 2010 ter-minou, conforme estimativa da Ce-pal, com 32,1% dos habitantes latino-americanos em situação de pobreza e 12,9% na indigência, o que representa 180 milhões de pobres, dos quais 72 milhões em situação de extrema pobre-za, retornando a níveis similares aos de 2008.

Cai pobreza na América Latina

A queda da pobreza na Região é clara quando se é observada a tendência geral entre 2002-2009. Por exemplo, na Argen-tina caiu de 21% em 2006 para 11,3% em 2009, no Brasil de 25,8% em 2008 para 24,9% em 2009 e no Chile de 13,7% em 2006 para 11,5% em 2009. O percentu-al de pobreza também caiu no Paraguai (de 58,2% em 2008 para 56% em 2009), na República Dominicana (de 44,3% em 2008 para 41,1% em 2009) e no Uruguai (de 14% em 2008 para 10,7% em 2009).

Em contrapartida, o percentual de po-breza aumentou na Costa Rica (de 16,4% em 2008 para 18,9% em 2009) e no Equador (de 39% para 40,2%). No Mé-xico a pobreza também subiu de 31,7% em 2006 para 34,8% em 2008.

O documento acrescentou que a com-binação entre o aumento na renda do

trabalho das famílias mais pobres e as transferências públicas orientadas para reduzir o impacto da crise permitiu, também, a redução da desigualdade no continente. Apesar disso a distribuição de renda se manteve estável em 2009, considerando que o balanço líquido dos últimos sete anos continua sendo positi-vo para a maioria dos países.

O estudo fez também uma análise de como a desigualdade se reproduz ao longo do ciclo de vida das pessoas, es-pecialmente entre o seu nascimento e os 29 anos de idade. Ainda que em média 49% dos homens e 55% das mulheres de 20 a 24 anos tenham completado o ensino secundário, em zonas rurais es-sas cifras somente atingem 26% dos homens e 31% das mulheres, e entre jo-vens indígenas 22% e 20%, respectiva-

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mente. Segundo a Cepal, isto demons-tra de forma dramática a reprodução da exclusão e da desigualdade entre gera-ções. Por isso a educação é, segundo o relatório, o principal mecanismo que permite reverter essas desigualdades de origem (familiar ou territorial) e igualar as oportunidades de bem-estar e pro-dutividade ao conjunto da sociedade. “Sociedades mais igualitárias, em geral são sociedades que apostam mais for-temente nos êxitos e aprendizados edu-cacionais de todos os grupos sociais”, constatou o relatório da Cepal.

O documento acrescenta que na América Latina os governos cumprem um papel limitado no financiamento do consumo por parte de crianças e jovens (somente 21%), diferentemente do que ocorre em economias desenvolvidas,

onde o Estado divide com a família essa responsabilidade (contribui com 45%). Por isso, é importante aumentar as transferências públicas direcionadas ao ciclo de vida infanto-juvenil.

A notícia animadora é que o gasto público social cresceu fortemente en-tre 1990 e 2008, em termos absolutos (de 445 a 880 dólares por pessoa) e em termos relativos (de 12,3% a 18,4% do PIB). “Isto é fundamental para apoiar o fechamento das brechas em diferentes etapas do ciclo de vida das pessoas”, afirma a Secretária Executiva da organi-zação, Alicia Bárcena.

Para combater a reprodução interge-racional da desigualdade e da exclusão nas etapas de formação, a Cepal pro-põe três tipos de medidas no decorrer do ciclo de vida das pessoas: um esque-

ma de transferências monetárias para os lares com crianças de 0 a 14 anos para melhorar as oportunidades das famílias e que possam contar com um ambien-te adequado para a sociabilização da criança (nutrição, moradia, vestuário); o financiamento de políticas que cubram os custos correntes de incorporar aque-les que não estão cobertos por serviços educativos e de cuidado (0 a 17 anos); e finalmente, outro conjunto de trans-ferências monetárias relacionadas com os serviços de emprego e formação, que sejam orientados diretamente para os jovens em processos de emancipação para a vida adulta (15 a 24 anos).

(O relatório completo está disponível em http://www.eclac.org/publicaciones/xml/6/41806/PSP-panoramasocial2010.pdf)

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ara as especialistas Hilary Hoynes, Ma-rianne Page e Ann Stevens, do Departa-mento de Economia da University of Ca-

lifornia Davis, existem quatro fatores diferentes que podem afetar a pobre-za e sua evolução ao longo tempo nos Estados Unidos: as oportunidades do mercado de trabalho, a estrutura fa-miliar, programas anti-pobreza e a imigração. Para elas, as mudanças na oferta de trabalho feminino, que de-veriam ter reduzido a pobreza, foram contrariadas por um aumento da taxa de chefia feminina nos lares (havia

EUA: retrocesso no combate à pobreza

mais chefes de família mulheres que a quantidade de ofertas de emprego). Segundo as especialistas, a última década do Século XX testemunhou o que são, indiscutivelmente, as mu-danças mais dramáticas na política de combate à pobreza no seu país. A começar pela alteração no programa que antes fornecia ajuda permanente às crianças dependentes e que agora passou a ser um programa de apoio transitório às famílias a procura de emprego. Sergei Soares, do Ipea, explica que até o Governo Clinton, havia um programa mais abrangen-te de proteção social e transferência de renda nos Estados Unidos. Mas

desde 2005, o que o governo norte americano faz é oferecer uma ajuda financeira por no máximo dois anos, não permitindo que os estados pror-roguem esse benefício. “Não importa se a família conseguiu ocupação para garantir a renda. Ao terminar o prazo, acaba o benefício”, explica Sergei.

No artigo intitulado Pobreza nas Américas: Tendências e Explica-ções, publicado originalmente na re-vista National Bureau of Economic Research, Hoynes e Page afirmam que no seu país os programas go-vernamentais destinados a aliviar a pobreza tiveram um impacto muito limitado. Elas também questionam a

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visão que perdurou por muito tempo, sobretudo nos países capitalistas, de que o crescimento econômico esta-ria intimamente ligado à qualidade de vida, e que a pobreza poderia ser reduzida por políticas que estimulas-sem a economia. Elas afirmam que na última década do Século XX as taxas de pobreza continuaram aumentando, mesmo com o crescimento econômi-co. “Nós achamos que desde 1980 tem havido um substancial enfraque-cimento da relação entre as oportu-nidades do mercado de trabalho e as taxas de pobreza”, explicam as pes-quisadoras.

Num histórico social em seu país, elas afirmam que as taxas de pobreza são muito mais elevadas entre negros e hispânicos, entre famílias chefiadas por mulheres, em famílias com pouca escolaridade com maior número de crianças e também entre os idosos. E esse retrato mudou muito pouco ao longo das últimas três décadas do Sé-culo XX e os primeiros anos do Sé-culo XXI.

(A íntegra do artigo está disponível em http://www.nber.org/papers/w11681)

SOuRCE: STEvENS (1999), TABLE 6.

características da manutenção da Pobreza - por indivíduo e famíliaFração dos que se tornam pobres e continuarão na pobreza por 5 a 10 anos

Negros Brancos1º ANO NA SITuAçãO DE POBREZA Homem chefe de família Sem nível superior 55.6% 27.6% Com nível superior 33.3% 16.7%

Mulher chefe de família Sem nível superior 89.5% 63.0% Com nível superior 68.9% 47.3%

20º ANO NA SITuAçãO DE POBREZA Homem chefe de família Sem nível superior 26.4% 13.0% Com nível superior 11.2% 7.7%

Mulher chefe de família Sem nível superior 64.1% 39.6% Com nível superior 39.1% 26.4%

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egundo especialistas da área social, a transfe-rência de renda para po-pulações empobrecidas é uma medida bastante antiga. Para o senador

Eduardo Suplicy, em seu livro Renda Básica de Cidadania (2002), uma pri-meira proposta de renda para todos os cidadãos, independente da sua classe so-cial, foi apresentada por Thomas More, no livro Utopia, de 1516. Mas somente em 1795, na Inglaterra foi promulgada a Speenhamland Law, que foi o primeiro programa de renda mínima conhecido na Europa industrial e que marca uma inflexão na política social desenvolvida na Inglaterra desde 1536 sob a vigência das denominadas Leis do Pobres. Es-

Retrospectiva

tas formavam “um conjunto de regula-ções pré-capitalistas que se aplicava às pessoas situadas à margem do trabalho, como idosos, inválidos, órfãos, crianças carentes, desocupados voluntários e in-voluntários, etc”. Neste contexto, os po-bres “válidos” eram obrigados a aceitar qualquer tipo de trabalho, a mendicância era castigada e somente os incapacitados tinham direito à assistência social. “Na verdade, a gestão da pobreza tinha cará-ter mais punitivo do que protetor”, opina a Doutora em Ciências na Área de Saúde Pública, Giselle Lavinas Monnerat.

Segundo a pesquisadora, a Spee-nhamland Law inglesa foi criada num contexto de grande perturbação social e agravamento da pobreza e reconhecia o direito dos pobres ao recebimento de

uma renda mínima, independente de seus proventos e em função de uma ta-bela que dependia do preço do pão e do número de filhos. Nesta mesma ocasião, a assistência social é estendida aos po-bres capacitados para o trabalho, situa-ção inovadora para a época e absoluta-mente contrária à lógica capitalista que se queria consolidar.

No entanto, no cenário de expansão da revolução industrial, essa lei logo se mostrou um impeditivo para a formação de um mercado de trabalho nos moldes capitalistas, tendo sido duramente criti-cada a partir do final do século XVIII. As principais críticas ressaltavam que o fato do indivíduo receber assistência mesmo que estivesse empregado fazia com que se tornasse improdutivo, já que o salá-

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rio podia ser complementado pela ajuda externa. Considerava-se, assim, que para conter a improdutividade dos emprega-dos e promover o mercado de trabalho capitalista era necessário acabar com o direito incondicional dos pobres à assis-tência.

Em 1834 a Poor Law Reform subs-tituiu a Speenhamland Law e pôs fim às dificuldades de constituição de um mercado de trabalho livre, haja vista que, além da assistência aos pobres ter se tornado residual, a abolição total da Lei do Domicílio (Act of Settlement, de 1662) restituiu a mobilidade espacial do trabalhador. Neste cenário, tem fim o di-reito ao rendimento mínimo e o indiví-duo, agora “livre” para se estabelecer em qualquer lugar, tem que garantir sua so-

brevivência no contexto da sociabilidade competitiva do capitalismo. Essa situa-ção, opiniam especialistas na área, criou as condições para o confronto ideológico entre assistência social e trabalho, além da disseminação da concepção liberal de que a pobreza é fruto do paternalismo e da tutela estatal.

Sob a regência da Lei dos Pobres de 1834, os pobres desempregados e inca-pazes ficaram sem assistência, restando apenas a reclusão nos albergues, onde a estigmatização e a violação dos direitos marcaram a intervenção pública sobre a questão da pobreza no século XIX.

Na contramão das críticas às propos-tas de transferência de renda aos pobres, Thomas Paine, um dos ideólogos da re-volução francesa e pioneiro na formu-

lação de uma renda básica incondicio-nal, formulou, ainda no século XVIII, os argumentos segundo os quais todos teriam direito a usufruir da riqueza de uma nação. Entendeu que a origem da pobreza está na propriedade privada, o que justificaria a implementação de uma transferência de renda para todos. No entanto, somente no século XX os traba-lhadores conquistaram direitos políticos e sociais.

(Texto baseado na Tese “Transferência condicionada de renda, saúde e interseto-rialidade: lições do Programa Bolsa Famí-lia”, de Giselle Lavinas Monnerat , Fiocruz, 2009)

No livro utopia, Thomas More apresenta uma ilha imaginária onde todos vivem em harmonia e trabalham em favor do bem comum. Seus habitantes devem abolir a ideia da propriedade individual e absoluta, trocam de casa a cada dez anos e tiram a sorte da que lhes deve caber na partilha.

A Speenhamland Law inglesa foi criada num contexto de grande perturbação social e reconhecia o direito dos pobres ao recebimento de uma renda mínima, independente de seus proventos e em função de uma tabela que dependia do preço do pão e do número de filhos.

Em 1834 a Poor Law Reform substituiu a Speenhamland Law. Neste cenário, tem fim o direito ao rendimento mínimo e o indivíduo, agora “livre” para se estabelecer em qualquer lugar, tem que garantir sua sobrevivência no contexto da sociabilidade competitiva do capitalismo.

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>> OPINIÃO>>

s resultados positivos do mercado de trabalho devido ao crescimento da economia expressaram-se, prin-cipalmente, pelo crescimento da ocupação, redução do desemprego,

elevação da renda e formalização na contratação, promovendo a inclusão por meio do trabalho e me-lhoras no padrão de vida de muitos brasileiros.

Mas, igualmente importantes foram os progra-mas sociais como o Bolsa Família e o programa de prestação continuada, pois ampliaram o poder aquisitivo das populações mais vulneráveis, permi-tindo aumentar a renda de milhões de pessoas. A expansão do consumo nos segmentos da população mais pobre espalhou o crescimento, levando maior desenvolvimento às regiões menos desenvolvidas.

Destaca-se, também, a política de valorização do salário mínimo que tem contribuído para aumentar o piso salarial de diversas categorias profissionais, em particular daquelas empregadas nos setores que pagam os menores salários e nas regiões menos de-senvolvidas.

Os efeitos do salário mínimo e dos programas sociais nos menores municípios foram grandes, modificaram a dinâmica da atividade econômica

Precisamos reduzir a pobreza e a desigualdade no país

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CLEMENTE GANZ LÚCIODieese

local, impulsionaram o comércio, os serviços e os pequenos negócios locais, retendo os benefícios da expansão da renda na própria região. Estas po-líticas levaram à redução das diferenças entre as regiões do país: taxas de crescimento econômico das regiões menos desenvolvidas superaram as das regiões mais ricas. No entanto, restam alguns de-safios que a sociedade brasileira precisa enfrentar, entre eles, as questões da concentração de renda e de superação da pobreza.

O movimento sindical, em sua agenda pelo de-senvolvimento apresenta um conjunto de propostas que inclui ações como: universalização da educa-ção de qualidade; elevação da qualidade da saúde pública; melhoria dos transportes; universalização do saneamento básico; fortalecimento da agricul-tura familiar; desenvolvimento de políticas e pro-gramas para reduzir as desigualdades regionais; consolidação do sistema de seguridade social bra-sileiro, assegurando a concretização dos princípios do sistema de seguridade e fontes estáveis para o financiamento. Essas propostas devem orientar o crescimento econômico e as políticas públicas para o desenvolvimento e para superação da pobreza no país.

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Quintal Cultural

A cidade é Maceió. O bairro é o do Bom Parto - comunidade pobre da periferia, onde muitos jovens morrem nas mãos do tráfico ou da violência policial. Lá, na Rua do Sol Nascente, onde residem cerca de 70 famílias, no pátio da casa de Rogério Dias está o Quintal Cultural, um espaço lúdico numa região de muitos problemas.

Rogério é filósofo, educador popular, autodidata e palhaço com nome e sobrenome: Bolinho da Silva Tranquilo e Calmo. Ele e um grupo de amigos idealizaram o Quintal, onde todos os sábados, “mais certo que missa”, acontece alguma atividade com fins educa-tivos, principalmente para crianças. Elas ensaiam o coco de roda e o break durante o dia para se apresentarem à noite. Constantemente a atividade é interrompida para a troca de ideias entre a assistência e os artistas sobre o assunto abordado. Para Rogério esse é o melhor método para educar, transformando o entretenimento em algo mais.

>> PlANETA SEMIÁRIDO

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Uma das preocupações do grupo é trabalhar a consci-ência política das crianças. “Se em algum momento da vida delas a escolha for o tráfico ou a prostituição, elas precisam estar conscientes da opção que fizeram e saber que existem outras possibilidades, outros cami-nhos”, diz Andréa, uma das coordenadoras do projeto junto de Rogério.

FONTE: TEXTO E FOTOS EXTRAíDOS DO LIvRO MICROPROJEtOS MAIS CULtURA - SEMIáRIDO. A CULtURA NA MãOS, PuBLICAçãO DO MINISTéRIO DA CuLTuRA

Na página 32, parede da casa de Dona Antônia, que já foi ponto de venda de drogas e hoje virou tela de cinema para a comunidade. No alto, a Rua do Sol Nascente e acima, espaços de manifestação cultural da população local.

FOTOS PAuLINO MENEZES

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Retratos

Rostos sofridos mas esperançosos. É o que se vê nestas imagens fortes, feitas há mais de duas décadas pelo fotógrafo e sociólogo Júlio Pavese. Ao exibirmos a vida dessas pessoas pobres que, infelizmente, ainda são maioria no sertão nordestino, é possível ver a dimensão do desafio brasileiro de erradicar a miséria.

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INClUIR>>

á dez anos, éramos um país mais pobre. Mas, apesar dos avanços, ain-da existem hoje cerca de 16,2 milhões de brasilei-ros que estão abaixo da

linha da miséria. Vivem com renda men-sal de até R$ 70 por pessoa da família e têm menos acesso ao saneamento básico, à energia elétrica e ao abastecimento de água. Vê-se, portanto, que o Brasil, gi-gante pela própria natureza, ainda possui um desafio igualmente extraordinário: a erradicação da pobreza. E para vencê-lo, conta agora com um apoio também de grande dimensão, constituído pelas 926 organizações que integram a Rede de Tecnologia Social (RTS).

Se, desde a sua criação, em 2005, a RTS direcionou seu foco para as ini-ciativas de geração de trabalho e renda, em 2011, ampliou a abrangência de seu trabalho para novas áreas, somando es-forços aos mecanismos de participação social e aos programas de transferência de renda destinados à redução da misé-ria no país. A expansão adota o modelo já consolidado pela rede: a difusão e a reaplicação em escala de Tecnologias

HSociais, ou seja, soluções de baixo cus-to, desenvolvidas com o protagonismo da comunidade, e que estão ajudando a promover o desenvolvimento sustentá-vel.

Agora, a RTS também dá eco a ex-periências bem sucedidas no campo da produção de energia limpa e de efici-ência energética, além de habitações e infraestruturas sustentáveis. Ainda pro-paga iniciativas voltadas à educação e à formação, assim como alternativas nas áreas de produção sustentável de ali-mentos saudáveis e de gestão sustentá-vel de recursos hídricos e florestais. Em poucos meses, já foi possível constatar que elas são numerosas e estão sendo desenvolvidas e reaplicadas nos quatro cantos do país, por organizações públi-cas, privadas ou da sociedade civil.

Alimento seguro e sustentável“Uma tecnologia que transforma a vida da família, tanto na inclusão social quanto na inclusão econômica.” Foi as-sim que Newman Maria da Costa defi-niu a importância da Tecnologia Social PAIS (Produção Agroecológica Integra-da e Sustentável) no enfrentamento da

Tecnologias contra a miséria

Por Karine Rodrigues e

Bruna Villarim (RtS)

RTS AmpLIA

FOCO DE AçãO,

ABRIGANDO NOvAS

TEMáTICAS E

REFORçA APOIO

AO DESAFIO

DE REDuZIR A

POBREZA NO PAíS

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pobreza no Brasil. Gestora do programa no Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), New-man destacou que a tecnologia ensina a tirar o próprio sustento da produção de hortaliças e de pequenos animais, gerando renda e sustentabilidade aos agricultores familiares.

O sistema PAIS é montado em forma-to de anéis, cada um com determinada cultura, que complementa a que vem a seguir. Já o centro do sistema é destinado à criação de pequenos animais, como ga-linhas caipiras e patos, e o esterco é apro-veitado para adubar as hortas. No sentido inverso, as sobras dos plantios servem de alimentos para os bichos. Outra peculia-ridade está na irrigação da plantação, que é feita por gotejamento.

Contudo, apesar do grande impacto no aumento da renda familiar, já que o ex-cedente da produção é comercializado, o principal resultado da tecnologia está na promoção da segurança alimentar. Utili-zando-se de uma pequena quantidade de terra, o sistema permite ter uma grande diversidade de produtos para consumo, que são gerados sem agrotóxicos e res-peitando o meio ambiente.

Idealizada pelo agrônomo senegalês Aly N’diaye, a tecnologia PAIS foi de-senvolvida para atender uma família de cinco pessoas e tem um custo unitário de R$ 5 mil, incluindo assistência téc-nica e um kit para produção. Mas para conquistar efetivos resultados, a Tecno-logia Social ainda conta com o apoio do Sebrae, da Fundação Banco do Brasil, do Ministério do Desenvolvimento So-cial, do Ministério da Ciência e Tecno-logia e do Ministério da Integração Na-cional, além da Petrobras. Desde 2005, a reaplicação do sistema Pais já somou investimentos de R$ 49 milhões e, hoje, o projeto é desenvolvido em, pelo me-nos, 12 estados brasileiros.

Saúde e preservação ambiental na boca do fornoNa zona rural do Nordeste vigora o di-tado de São Tomé: é ver para crer. Por isso, em 2006, quando o pessoal do Ins-tituto de Desenvolvimento Sustentável e Energias Renováveis (IDER) começou a percorrer o interior do Ceará, mos-trando os benefícios de um novo tipo de fogão, os moradores, inicialmente, torceram o nariz. Afinal, teriam de abrir

mão de um equipamento já incorpora-do à tradição familiar em troca de algo nunca visto.

É bem verdade que a tradição, no caso, também estava vinculada a situ-ações desagradáveis. Embora o velho fogão à lenha possibilitasse o vital preparo do alimento, por outro, pro-duzia a fuligem que lambia as paredes de casa, manchava as panelas e até os pulmões de quem estava por per-to, respirando, diariamente, a fumaça preta gerada pela queima da madeira. Mas, aos poucos, a resistência dos moradores foi cedendo.

“Nas primeiras comunidades, há cinco anos, a aceitação era tímida. Porém, mudou rapidamente quando as vantagens foram percebidas. Hoje, com tantas unidades já em operação, todo mundo quer um”, explica o en-genheiro Jorgdieter Anhalt, diretor do IDER, uma OSCIP fundada em 1995, em Fortaleza.

É fácil compreender por qual ra-zão a desconfiança diante do novo foi substituída pela adesão ao projeto. É que o fogão desenvolvido pelo IDER acaba com a fuligem dentro de casa,

Alimento seguro e sustentável: a tecnologia ensina a tirar o próprio sustento da produção de hortaliças e de pequenos animais

Boca do forno: menos fuligem, mais saúde

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perca. E o mais importante, há uma cha-miné que joga a fumaça produzida pela queima da lenha para fora da casa.

Segundo o IDER, há também uma diminuição de 40% na quantidade de lenha queimada para gerar a energia que alimenta o fogão. Menos uso de madeira, mais preservação da natureza. E isso significa menos danos, por exem-plo, durante a época das chuvas, quando a vegetação nativa tem a capacidade de ajudar a conter a força das águas.

A Tecnologia Social do IDER foi adotada como política pública pelo Go-verno do Estado. Em parceria com a Secretaria das Cidades do Governo do Estado do Ceará, o Ider, segundo Jorg-dieter, já instalou 20.339 fogões, distri-buídos por comunidades ao longo de 71 municípios cearenses. O convênio prevê ainda a instalação de outros 6.161.

O valor da água Todo ano, na época das chuvas, uma cena dramática se repete: casas são ar-rastadas pela força dos rios, que se agi-gantam de forma impressionante. É um crescimento rápido, mas não de todo surpreendente. Afinal, com as margens dos cursos de água ocupadas, é natural que haja erosão e, consequentemente, aumento das enchentes.

Para reverter esse cenário, a Agência Nacional de Águas deu um novo passo em relação à preservação ambiental. Ela foi além da punição aos infratores, ao elaborar um modelo de iniciativa que dá incentivo técnico e financeiro em troca de boas práticas de conservação da água e do solo, como, por exemplo, a proteção de matas nativas e o plantio de matas ciliares, além de obras para recu-peração de áreas degradadas.

Programa Produtor de água: plantação de mudas de árvores e construção de bacias de infiltração

Lixo Zero: a usina Limpa é como um completo sistema digestivo urbano

livrando os moradores dos incômodos que ela provoca, como a sujeira cotidia-na e os problemas de saúde. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), todos os anos, ocorrem 1,6 milhão de óbitos por doenças causadas pela fuma-ça produzida pela queima da lenha.

“As pessoas começaram a perceber a diminuição de doenças respiratórias. As mães, por exemplo, viram que os filhos iam com mais frequência ao mé-dico quando usavam o fogão à lenha tradicional. A população também ga-nhou em auto-estima, sendo a higiene um elemento percebido de imediato. As mulheres têm motivação para manter a limpeza”, relata o assessor técnico do IDER, Ákilas Girão.

O equipamento ocupa, dentro da casa, o mesmo lugar onde antes havia o fogão tradicional. Porém, ao contrário deste, é constituído por um compartimento de aço e tijolos refratários, capaz de distri-buir e manter melhor o calor. Sobre ele, existe uma chapa com três bocas, que impede que o fogo fique exposto e se

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Lançado em 2004, o Programa Pro-dutor de Água remunera produtores agrícolas que executam ações para reduzir a erosão, conservar os recur-sos hídricos, aumentar a infiltração e conservar as áreas com boa cobertura vegetal, preservando, assim, as bacias hidrográficas. Embora o valor de refe-rência para o pagamento seja variável, já que na maioria das vezes toma como base o custo de oportunidade das terras da região, o diretor-presidente da ANA, Vicente Andreu, afirmou, em artigo es-crito em março, que gira em torno de R$ 150 por hectare ao ano.

Atualmente, 10 projetos integram o Programa Produtor de Água, em curso em 8 Estados e no Distrito Federal. O pioneiro foi no município de Extrema (MG), na bacia dos rios Piracicaba, Ca-pivari e Jundiaí, e engloba 4 mil hecta-res, onde estão sendo plantadas 300 mil mudas de árvores, e construídas 1,2 mil barraginhas, ou seja, as chamadas ba-cias de infiltração.

Especialista em Recursos Hídricos da ANA, Flávio Hermínio de Carvalho observa que os projetos que integram o Produtor de Água possuem caracterís-ticas diferentes, para respeitar as parti-cularidades de cada região. A maioria remunera os agricultores pela manuten-ção e pela recuperação florestal, mas há também uma parte que paga por obras de conservação do solo.

O programa é voluntário, mas não basta querer entrar para ter a marca Produtor de Água. É preciso, segundo a ANA, ter uma bacia hidrográfica como unidade de planejamento, estar situado na área rural e ser, preferencialmente, pequeno proprietário de terra. Ainda é necessário ter parceiros interessados em

pagar pelo serviço ambiental, privile-giar práticas sustentáveis de produção e um sistema de monitoramento de re-sultados.

Lixo zero, sustentabilidade 10Imagine um mecanismo que é capaz de separar, secar, esterilizar, moer e reaproveitar todos os tipos de resíduos orgânicos, plásticos e minerais, inclusi-ve o lodo e o esgoto gerados nas esta-ções de tratamento de água, que acabam sendo direcionado para os aterros. E, melhor ainda: os materiais resultantes desse processo podem gerar, em esca-la industrial, produtos resistentes e de baixo custo, que podem ser usados para levantar casas e outras construções sus-tentáveis.

Parece até um daqueles inventos mi-rabolantes que só existem em desenho animado. Mas não é. Trata-se, na ver-dade, da Usina Limpa, definida por seus criadores como “um completo sistema digestivo urbano”.

O primeiro passo para tirá-la do papel já tem verba garantida: os 10 mil dólares ganhos no concurso internacional “Mo-

radia Ideal: colaboração para cida-des mais inclusivas e sustentáveis”, organizado pelo Changemakers da Ashoka. Quem levou o prêmio foi a ONG Verdever/Curadores da Terra, de São Paulo, com o projeto “Lixo Zero, Arquitetura Sustentável, Energia Re-novável”, que concorreu com mais de 288 inscrições, vindas de 48 países.

O projeto vencedor, dos arquitetos Márcia Macul e Sérgio Prado, pro-põe a reciclagem do lixo e sua poste-rior transformação em insumo para a construção de casas sustentáveis. As construções têm outra vantagem, se-gundo Márcia: são mais baratas do que as convencionais. Para alcançar tal proeza, a dupla desenvolveu uma tecnologia inovadora, e já paten-teada, que deu origem ao plástico vegetal biodegradável, produzido com óleo de mamona, entre outras oleaginosas. É esse material que vai substituir o cimento, matéria-prima que em muito contribui para o aque-cimento global.

As edificações são resultado do re-aproveitamento de resíduos plásticos, orgânicos e minerais processados na Usina Limpa, que ressurgem, por exemplo, como tijolos de terra crua secos à sombra. Além disso, usa-se garrafa PET nas paredes, garantindo iluminação natural, e bambus e fibras orgânicas para esteios e coberturas.

O projeto “Lixo Zero” tem, na reci-clagem dos resíduos, a parte mais visí-vel. O material é descartado em lugares específicos, chamados de eco-pontos. Além disso, há uma preocupação com a educação ambiental e com a geração de emprego e renda, por meio da oferta de oficinas de inovação e reuso do lixo.

Tecnologias sociais são soluções de baixo custo, desenvolvidas com o protagonismo da comunidade, e que estão ajudando a promover o desenvolvimento sustentável

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ocalizado na Ama-zônia Oriental, o Estado do Pará está situado no maior corredor de florestas

protegidas do mundo, com cerca de 71 milhões de hectares divididos em áreas de proteção integral, de uso sustentável e terras indígenas. Diante de toda essa riqueza, o Es-tado possui desafios no campo da ciência e tecnologia que se diferem dos demais territórios brasileiros. É o que conta o secretário de De-senvolvimento, Ciência e Tecnolo-gia do Pará, Alex Fiúza, que ainda destaca o papel das Tecnologias Sociais na busca pelo desenvolvi-mento local.

Como o senhor avalia os desafios da Secretaria de Desenvolvimento, Ciência e tecnologia do Pará (SE-DECt)? Alex – Destaco dois focos. Um, comum a todas as secretarias de Ciência e Tec-nologia do Brasil: coordenar a aproxi-mação entre o setor produtivo e a acade-mia. O outro, mais focado nos desafios do desenvolvimento amazônico: criar um pólo de conhecimento em biotecno-logia para o aproveitamento racional da biodiversidade regional.

A SEDECt pauta-se pela inovação e pelo uso racional da biodiversidade amazônica, com ampliação da produtividade empresarial, da competitividade regional e geração de emprego e renda, com inclusão

Biodiversidade no foco das políticas de ciência e tecnologia

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social. Como a secretaria vê as tecnologias Sociais (tSs) neste processo?

Alex – Elas são ferramentas imprescin-díveis para criar e gerenciar as cadeias de relacionamentos entre os atores es-senciais do processo, além de densificar o interesse social por meio de uma di-vulgação dos trabalhos em tempo real.

Quais são as tSs já desenvolvidas ou apropriadas pelas comunidades locais?

Alex – A SEDECT está em fase de le-vantamento dessas informações, para sua utilização e potencialização adequa-das. Este é um dos itens de nosso proje-to intitulado “Observatório de C&T do Pará”, em curso neste momento.

Quais são as outras ações, no que se refere às tSs, previstas no projeto?

Alex – Está prevista a articulação das cadeias produtivas do Estado, sobretu-do as que envolvem os pequenos produ-tores. Faremos, inicialmente, algumas experiências focadas, para aperfeiçoar a modelagem, e depois universalizar seus resultados.

Em sua opinião, qual é o maior obstáculo encontrado para a incorporação das TSs como políticas públicas?

Alex - O de ordem cultural, pois repre-senta uma mudança de paradigma no trato da gestão pública e que não tem, ainda, uma tradição de uso e de exposi-ção de boas práticas em nosso país.

“O MAIOR DESAFIO DO BRASIL NO

SéCuLO XXI SERá O APROvEITAMENTO

INTELIGENTE DE SuA MAIOR RIQuEZA,

EM TERMOS COMPARATIvOS

MuNDIAIS: SuA INCOMPARávEL

BIODIvERSIDADE.”

No mês de março, o senhor participou do I Fórum de Tecnologias Sociais em Plantas Medicinais e Fitoterápicos no Bioma Amazônico. Como analisa o estabelecimento de debates, ações e de políticas nessa área?

Alex - O maior desafio do Brasil no sé-culo XXI será o aproveitamento inteli-gente de sua maior riqueza, em termos comparativos mundiais: sua incom-parável biodiversidade, no âmbito da qual se situa a produção de fitoterápi-cos e outros medicamentos. Temos que investir conhecimento nesse setor, para que essas vantagens comparativas, dá-divas da natureza, transformem-se em vantagens competitivas, por ação da inteligência humana.

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>> AgENDA glObAl

Brasil é o país latino americano com matriz energética mais limpa. Por isso mesmo tem o compromisso de ser

exemplo e ajudar os demais países do continente na superação de seus obstácu-los para a transição de matrizes energéti-cas cada vez mais limpas e sustentáveis. Com o intuito de contribuir nesse debate no âmbito do Mercosul, o Instituto para o Desenvolvimento de Energias Alter-nativas na América Latina (Ideal), em parceria com a Universidade Federal de Santa Catarina e a Universidade do Sul de Santa Catarina realizou o Seminário Energia, Sustentabilidade e Integração no mês de abril, em Florianópolis. A atividade aconteceu logo depois da ca-tástrofe nuclear de Fukoshima no Japão, a qual esta colocou em alerta todos os países que apostavam na energia nucle-ar para suprir a crescente demanda mun-dial.

Um dos destaques do evento foi a apresentação de uma pesquisa inédita que avaliou o conhecimento dos brasi-leiros sobre o uso do sol como fonte de energia, feita a pedido do Instituto Ide-al e da Cooperação Alemã para o De-senvolvimento, GIZ no Brasil. “O uso

da energia solar aumenta a credibilidade da empresa perante o consumidor e isto pode resultar na premiação da empresa por parte deste consumidor, ou seja, na compra do produto ou serviço da empre-sa ou na propaganda boca a boca positi-va da mesma”, afirma o estudo.

O uso do vento também já é uma realidade energética no Brasil. Se-gundo Lauro Fiuza, vice-presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica) , o potencial eó-lico brasileiro é estimado em torno de 300 a 400 MW. Ele explicou que

usinas eólicas têm a vantagem de po-derem ser instaladas rapidamente, em comparação com outros tipos, além de permitirem certa “pulverização”, já que as torres não precisam ficar todas concentradas.

Além dessas informações, a progra-mação do Seminário foi composta por duas mesas-redondas e sete palestras sobre os mais diversos temas, consumo consciente, biogás e política de resíduos sólidos. O conteúdo das palestras está disponível em link do evento no site www.institutoideal.org

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Energia, Sustentabilidade e Integração no Mercosul em debate

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Lauro Fiuza, diretor da Associação Brasileira de Energia Eólica, falou do crescimento desse tipo de fonte energética no Brasil

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IPCC: “77% da energia no mundo pode ser renovável até 2050”

Os cientistas do Painel Intergoverna-mental sobre Mudança Climática (IPCC, sigla em inglês) examinaram mais de 160 cenários relativos ao uso de energia de fontes renováveis de agora a 2050, incluindo suas implicações ambientais e sociais. Para os 120 especialistas de todo o mundo, e de representantes governa-mentais de 194 países, “são as políticas públicas que fomentarão ou limitarão o desenvolvimento das energias renová-veis nos próximos decênios”. A afirma-ção consta no Informe Especial sobre Fontes de Energia Renovável e Atenu-ação das Mudanças Climáticas (Ifrac, sigla em inglês). Para o presidente do IPCC, Rajendra Pachauri, esse informe (com 900 páginas) “pode aportar um

acervo de conhecimentos básicos para os responsáveis pelas políticas que desejam enfrentar essa grande tarefa pendente do século XXI (a luta contra a mudança climática)”. Entre as tecnologias desta-cadas pelo IPCC como impulsionado-ras de energia limpa estão a bioenergia (eletricidade, calor e combustíveis), a energia fotovoltaica (conversão direta da luz solar em eletricidade), a geotermia (uso do calor do centro da terra) a hidro-eletricidade, a energia eólica e a energia das ondas do mar. Segundo os cientis-tas, incentivar essas fontes poderá levar o mundo à produção de 77% de toda a energia gerada até 2050.

Mais informações sobre esse docu-mento em http://srren.ipcc-wg3.de/

Os desafios das cidades

As cidades precisam crescer, se modernizar, se organizar res-peitando a sustentabilidade, suas origens históricas e geográficas. Essa foi a conclusão dos pales-trantes do seminário “Os Desa-fios das Cidades no Século 21”, ocorrido em maio em Joinville/SC. De diferentes cidades, os especialistas também afirmaram que uma das maiores preocupa-ções nas cidades é com relação à mobilidade, cuja solução para reduzir os congestionamentos e grande circulação de veícu-los particulares é investir em transporte público de qualidade

e meios de l o c o m o ç ã o alternativos, como a bici-cleta.

Á l v a r o Bravo, dou-tor em Ar-q u i t e t u r a , abordou o

tema Urbanismo, meio ambien-te e cidades na União Européia. Há bons exemplos do Velho Continente que podem ser repli-cados em praticamente todos os países, sobretudo com relação à mobilidade, uso energético e construções verdes. Já o doutor em Direito do Estado pela USP, Toshio Mukai, falou da regu-larização fundiária no Estatuto da Cidade e na Lei Minha Casa, Minha Vida: leis e políticas pú-blicas que buscam auxiliar o grande desafio de ordenamento e sustentabilidade das cidades para este século.

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>> AgENDA glObAl

A economia dos ecossistemas e da biodiversidade

Apesar de os ecossistemas prove-rem uma série de serviços ambien-tais, como a polinização das abelhas, a disponibilidade de água limpa e ar puro, a produção de comida e com-bustíveis e a renovação do solo, esse capital natural é gratuito e, por isso mesmo, desvalorizado e destruído. A triste constatação foi feita pelo es-tudo internacional A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade (TEEB, sigla em inglês), realizado pelo Instituto de Pesquisa Econômi-ca Aplicada (Ipea), o Ministério do Meio Ambiente (MMA), a Conser-vação Internacional (CI-Brasil) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA). Segundo o economista Pavan Sukhdev, as-sessor especial da Green Economy e líder do estudo TEEB, os maiores dependentes do meio ambiente para a subsistência são as pessoas pobres, prejudicadas pela degradação do ecossistema. Por isso, o economista defendeu o desenvolvimento susten-tável como aquele capaz de atingir as necessidades da sua geração sem comprometer a futura.

O estudo busca a integração dos conhecimentos especializados do campo da ciência econômica e eco-lógica, desenvolvendo a comunida-de científica, promovendo pesqui-sas sobre o tema e divulgando os resultados para diversos públicos – governo, empresas e cidadãos. A proposta do Relatório TEEB Inter-nacional é medir as perdas do ca-pital natural nos biomas mundiais e os benefícios recebidos pela pre-servação do ecossistema, como o retorno de investimentos anuais em áreas protegidas.

Em novembro de 2010, durante a COP-10 em Nagoia/ Japão, o re-latório final do TEEB Internacional divulgou a perda anual de 2 trilhões a 4,5 trilhões de dólares no capi-tal natural do mundo, resultante do desmatamento e da degradação do solo. Acredita-se que o manejo efetivo dos ecossistemas e da bio-diversidade e a inclusão do capital natural na contabilidade governa-mental e empresarial podem come-çar a corrigir e reduzir os custos de perdas futuras.

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OPINIÃO>>

studos prospectivos com foco na in-dústria, realizados pelo Sistema FIEP, indicam que para concatenar o desen-volvimento tecnológico crescente com a sustentabilidade dos sistemas naturais

e sociais é preciso ir além da racionalidade tecnicista e instrumental, do individualismo competitivo e do interes-se prático. É preciso ter a coragem de pautar-se por uma “nova” racionalidade, fundada em valores, no interesse comum, no bem estar das pessoas e na solidariedade.

Particularmente no setor industrial, as empresas es-tão cada vez mais conscientes a respeito do meio am-biente, incluindo em suas prioridades a sua inserção no movimento a favor de uma economia verde, com uso inteligente de matérias primas e reciclagem de resíduos, reduzindo a poluição do ar, entre outras iniciativas.

Por meio de seus recursos, de sua capacidade de inova-ção e realização, as empresas, estão descobrindo que po-dem “fazer o bem, e bem”, e que podem criar valor eco-nômico ao mesmo tempo em que beneficiam o mundo.

O desafio agora é a união de esforços para cocriar um conjunto de ações colaborativas de apoio a mudanças fundamentais de caráter cultural e tecnológico, visando garantir não só a viabilidade econômica, mas também um ecossistema sustentável e socialmente justo.

Nessa perspectiva, iniciativa de destaque ocorreu em 2004, quando empresas, governos e organizações sociais criaram o Movimento Nacional pela Cidadania e Solidariedade para apoiar o alcance dos Objetivos de

Empresário: parceiro fundamental para o alcance dos ODM

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RODRIGO ROCHA LOuRESSecretário Executivo do Movimento Nacional pela Cidadania e Solidariedade e Presidente da Federação das Indústrias do Estado do Paraná

Desenvolvimento do Milênio (ODM), aprovados na Cú-pula do Milênio por 189 países, incluindo o Brasil.

Parafraseando o ODM 8 – Todos trabalhando juntos pelo desenvolvimento – o Movimento faz um convite aos setores da sociedade no sentido de se engajarem em ações que contribuam para garantir aos brasileiros as condições básicas de uma vida feliz, incluindo educação e cultura, saúde, igualdade de oportunidades entre homens e mulhe-res, acesso a renda, moradia, água e saneamento.

Para tornar a proposta conhecida e compreendida por todos, e assim garantir sua adesão, foram criados os 8 ícones representando os ODM e lançada a campanha “8 Jeitos de Mudar o Mundo – Nós Podemos”, numa con-tribuição da agência brasileira McCann-Erickson, hoje utilizados também pela ONU e diversos outros países.

Em 2009, o SESI PR / ORBIS desenvolveu o (www.portalodm.com.br), em parceria com o PNUD e o Uni-cef. Reúne informações sociais, econômicas e ambien-tais dos 5.565 municípios brasileiros, apresentadas de maneira simples, com gráficos e textos explicativos. Também disponibiliza o DevInfo, um sistema de infor-mações usado pela ONU para monitorar os ODM em todo o mundo, o qual permite construir tabelas, gráficos e mapas, cruzar dados e monitorar outros temas.

O Movimento Nós Podemos já está em todos os Es-tados brasileiros. Mas precisa chegar também a todos os municípios. A relevância das empresas nesse processo já foi apontada.

“A empresa pode! Nós Podemos!”

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>> MEU MUNDOLuciano Szafir

O mundo de Luciano Szafir

le é mais do que um simples ator. Ele é um ser humano

comprometido com o seu dia-a-dia, com seu mundo, com o cuidado do seu planeta. Nascido em São Paulo como Luciano Lebelson Szafir, este paulistano, de 42 anos, sonha que a humanidade possa um dia tomar consciência da grave situação ambiental que vivemos nos dias de hoje.

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“Estamos, na verdade, sobrevivendo, inseridos numa situação que está em seu limite, só não percebe quem não quer. Moro no Rio de Janeiro há 16 anos e cada vez que passo pela Lagoa Rodrigo de Freitas me pergunto como as pessoas não veem o quanto grave é o problema da poluição. Por ali, apesar da paisagem linda, em alguns dias, o cheiro a esgoto é insuportável. São canais que deveriam ter águas limpas e cristalinas, porque vêm de nascentes impolutas, mas en-contram seu destino envenenadas pelo próprio homem”, descreve Luciano, que demonstra em seu olhar a seriedade com que avalia estes temas.

“Eu me policio, todo os dias, para ser coerente com meu sentimento e com-promisso. Reciclo o lixo, uso no carro combustível menos poluente, e fico aten-to para não gastar àgua a toa, inclusive

na hora do banho. São pequenas ações que fazem a diferença. E acredito que se todos nós fizéssemos nossa parte, mesmo que seja mínima, a recuperação ambiental do nosso planeta aconteceria. Não quero deixar um mundo descuída-do, poluído e sem recursos naturais, para a minha filha, Sasha. Aliás quero que ela faça parte desta busca pelo ideal, por um ambiente saudável, por um ar mais puro e águas mais claras, o que na verdade, ela já faz, pois tem consciência das necessi-dades diárias e cuidados especiais com o que acontece ao seu redor”, completa.

O ator garante que sempre que é convi-dado, e que pode, participa de campanhas ambientais e em prol de um mundo me-lhor. Luciano ainda aproveita seu blog para divulgar estas e outras ações que possam chegar ao público, de uma forma carinho-sa, como dicas importantes para melhorar

o ambiente: “acredito que uma divulgação forte e pesada possa fazer com que as pes-soas percebam e assumam sua responsa-bilidade ambiental. Afinal, o mundo é de responsabilidade de todos nós.”

Luciano acredita que este desequilí-brio ambiental, responsável por tantos desastres naturais, possam sacodir o ser humano: “quem sabe isto seja um sinal? Quem sabe o homem passa a perceber a gravidade da situação? Penso que de-veria haver uma pressão mundial mais forte, capaz de brecar o desmatamento, modificar ações, criar um plano estraté-gico para que realmente pudesse haver mudanças”.

“Estou nessa guerra há anos. Tomara que nossa luta seja a cada dia maior e que o homem entenda que a ganância, o lucro e o descaso só levarão ao aniquilamento da nossa propria raça humana”, finaliza.

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>> EM DESTAqUE

Mais um prêmio para a ciência e tecnologia

Estão abertas as inscrições para o Prêmio Mercosul de Ciência e Tecno-logia 2011, que selecionará trabalhos de estudantes, jovens pesquisadores e equipes de pesquisa com contribui-ção potencial para o desenvolvimen-to científico e tecnológico dos países membros e associados ao Mercosul – Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Co-lômbia, Equador, Paraguai, Peru, Uru-guai e Venezuela. O tema deste ano é “Tecnologias para o desenvolvimento sustentável”. A promoção é dividi-da em quatro categorias: “Iniciação Científica”, voltada a estudantes do ensino médio; “Estudante Universitá-rio”, indicada para graduandos do en-sino superior; “Jovem Pesquisador”, categoria individual para pesquisado-res graduados que tenham no máximo 35 anos de idade; e “Integração”, des-tinada a pesquisadores de dois países diferentes do Mercosul.

Os trabalhos podem abordar ques-tões relacionadas à redução das de-sigualdades sociais, conservação da biodiversidade e dos ecossistemas, aumento do bem-estar, aprimoramento dos sistemas sociais mantidos ao longo do tempo e adoção de novos paradigmas de desenvolvimento econômico que le-vem em conta a redução do impacto da

Há quatro anos a Cão Terapia – proje-to semanal da Ong OBA – Organização Bem-Animal, de Florianópolis/SC traba-lha com 60 voluntários nos cuidados e encaminhamento para adoção dos cães e gatos abandonados no município cata-rinense. “Estamos lidando diariamente com uma cultura de descarte. As pessoas tratam os animais como bens descartá-veis. Cansou, jogou na rua. Queremos despertar a responsabilidade dessas pes-soas, fazê-las enxergar que cães e gatos são seres que precisam de cuidado, criam vínculos afetivos, amam e sofrem, diz Ana Lúcia Martendal, diretora da Ong. Contato: (48) 9114-2537 ou [email protected]

Amor aos animais

ação humana sobre o meio ambiente. O prazo para envio dos trabalhos termina em 22 de agos-to e a cerimônia de entrega do Prêmio Mercosul de Ciência e Tecnologia será realizada em novembro, no Uruguai.

Criado pela Reunião Especializada em Ciência e Tecnologia do Mercosul (RECyT), a premiação conta com o apoio de instituições como Unesco, CNPq, Ministério de Ciência, Tec-nologia e Inovação Produtiva da Ar-gentina e Ministério de Educação e Cultura do Uruguai. Para mais infor-mações sobre o prêmio e inscrições, acesse o site da Unesco.www.unesco.org/new/pt/brasilia

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Três iniciativas brasileiras concor-rem ao prêmio Future Policy Award 2011, que escolherá as políticas florestais mais inspiradoras e ino-vadoras que contribuem para o de-senvolvimento sustentável de todos os tipos de florestas no mundo. Um deles é o Fundo Amazônia, gerido pelo BNDES. As outras duas inicia-tivas nacionais são a Lei de Gestão de Florestas Públicas e o Plano de Ação Nacional da Biodiversidade. Os brasileiros concorrem com outras 17 políticas, de 16 países. Todos foram selecionados por entidades como a Organização das Nações Unidas (FAO e Pnud), Agência Alemã de Coopera-ção Internacional e União Internacio-nal para Conservação da Natureza. O Future Policy Award é promovido pela World Future Council, institui-ção de estudo de política internacio-nal sediada na Alemanha que este ano escolheu premiar iniciativas de política florestal em comemoração ao Ano Internacional das Florestas. Os vencedores serão anunciados no dia 21 de setembro, em cerimônia na sede das Nações Unidas, em Nova York.

Prêmio pela preservação das florestas

Destinado preferencialmente a crianças e jovens de 10 a 15 anos de idade, o documentário aborda de forma lúdica e descontraída temas aparentemente de difícil compreen-são como efeito estufa e mudanças climáticas. Incentivado pela Lei Rou-anet e patrocinado pela Tetra Pak, o filme tem cerca de 50 minutos e é di-vidido em três episódios, facilitando a utilização didática.

Carbono & Metano é um “docu-mentário de ficção” que se desenrola em duas camadas narrativas sobre-postas ao longo da história: a parte ficcional tem como fio condutor as moléculas protagonistas e o docu-mentário é apresentado pela simpá-tica repórter Joyce. “Sabemos, por experiência, que um enredo ficcional bem montado ajuda a captar a aten-

estante >> documentário

CARBONO & METANOMédia-metragem Produzido por Philippe Henry Multivisão e Vídeo. São Paulo, 2009

ção de nosso público e a encantá-lo, o que favorece muito a transmissão de conteúdos científicos, mesmo quando complexos”, diz Philippe Hen-ry, responsável pelo roteiro e direção.

O filme conta a história de Carbono e Metano, interpretadas por atores, e suas tentativas de “dominar o mun-do” por meio do efeito estufa e do aquecimento global. Em estilo de gibi de super-heróis, o média-metragem trata de um dos maiores problemas da atualidade: a sustentabilidade, ou seja, o equilíbrio entre desenvol-vimento econômico, justiça social e respeito ao meio ambiente. O filme está disponível no youtube, em cinco partes, que podem ser encontradas no link http://www.youtube.com/user/PHMultivision

Carbono & Metano

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>> >> OPINIÃOEM DESTAqUE

Cartilha na justiçaO Ministério da Agricultura lançou uma cartilha informando sobre

os benefícios de alimentos livres de agrotóxicos, bem como sobre a questão dos produtos transgênicos que “colo-cam em risco a diversidade de variedades que existem na natureza”. Porém essas cartilhas não serão distribuídas porque uma indústria dos alimentos transgênicos entrou com uma ação que impede a distribuição. A cartilha foi ilustrada pelo Cartunista Ziraldo e, ape-sar da distribuição suspensa, pode ser lida pelo link www.aba-agroecologia.org.br/aba2/images/pdf/cartilha_ziraldo.pdf

Criatividade: a alma dos negócios

Investimentos em bens e servi-ços criativos – aqueles cuja matéria-prima é a criatividade – ajudaram os países em desenvolvimento a enfrentar melhor os choques da cri-se financeira mundial de 2008, de-sencadeada pela falência do banco norte-americano Lehman Brothers. A afirmação consta no Relatório de Economia Criativa de 2010, lança-do pelo PNUD e pela Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD). Segundo esse estudo, enquanto co-mércio internacional caiu 12% em 2008, exportações de bens e servi-ços criativos subiram 14% e dobra-ram volume em seis anos. Segundo a chefe do Programa de Economia Criativa da UNCTAD, Edna dos Santos-Duisenberg, “a população jovem é uma das grandes responsá-veis por isso, pois consome muitos produtos ligados à televisão e ao ci-nema”. Além disso, essa parcela da população também leva a indústria criativa a um território recém-des-coberto e ainda pouco conhecido das massas: as redes sociais.

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>> OPINIÃO

cidade brasileira contemporânea resulta da combinação de dois mecanismos com-plementares: a livre mercantilização e a perversa política de tolerância com todas as formas de apropriação do solo urbano.

A livre mercantilização permitiu a aliança entre as for-ças que comandaram o projeto de desenvolvimento capi-talista, os interesses das firmas internacionais e as fra-ções locais da burguesia mercantil inseridas no complexo conformado pela tríade produção imobiliária – obras pú-blicas – concessão de serviços públicos. O Brasil urbano foi desenhado pela ação dessa coalisão mercantilizadora da cidade, tendo o Estado como condottiere, seja prote-gendo os interesses da acumulação urbana da concorrên-cia de outros circuitos, seja realizando encomendas de construção de vultosas obras urbanas ou pela omissão em seu papel de planejador do crescimento urbano. Omis-são que, além de servir à mercantilização da cidade, teve papel fundamental na transformação do território em uma espécie de fronteira interna da expansão capitalista, aber-ta à ocupação livre da massa expropriada do campo.

Entre 1950 e 1970, quase 39 milhões de pessoas migraram do mundo rural e se transformaram em traba-lhadores urbanos vulneráveis em razão do processo in-completo do assalariamento e da precária propriedade da moradia autoconstruída. Nesse contexto, a informalidade do trabalho e da produção da casa constituíram-se em poderoso instrumento de amortecimento dos conflitos sociais, próprios do modelo de expansão capitalista base-ado na manutenção de elevada concentração da riqueza e da renda.

Não é por outra razão que podemos falar de uma ques-tão urbana no Brasil. A dinâmica de formação, crescimen-to e transformação das nossas cidades sintetiza duas questões nacionais cruciais: a questão democrática e a questão distributiva.

A questão democrática se traduz na capacidade da cidadania ativa de substituir a coalizão de interesses que sustentou o processo de acumulação urbana recente, por um regime político republicano capaz de assegurar a to-dos o direito à cidade, isto é, o direito à participação nos processos deliberativos que dizem respeito à cidade, à coletividade urbana e seus destinos.

A questão distributiva refere-se à quebra do controle excludente do acesso à riqueza, à renda e às oportunida-des geradas no (e pelo) uso e ocupação do solo urbano, assegurando a todos o direito à cidadecomo riqueza so-cial em contraposição a sua mercantilização.

São essas as bandeiras que foram traduzidas pelo movimento social nas propostas da reforma urbana e que passaram a integrar o arcabouço do Estatuto da Cidade.

Os conhecidos e assustadores problemas das nossas cidades precisam ser entendidos como partes fundamen-tais da nossa questão nacional. Os mecanismos que sub-metem a questão nacional à lógica do crescimento mer-cantil são aqueles apontados por Celso Furtado como os responsáveis pela manutenção do Brasil como uma nação inacabada. Nesse sentido, poderíamos também dizer que temos cidades inacabadas, pois estas são incapazes de mediar os conflitos e integrar, mesmo que parcialmente, as distintas classes e grupos sociais.

(...)

Desafios da questão urbana

A por LuIZ CéSAR QuEIROZ RIBEIRO* e ORLANDO ALvES SANTOS JuNIOR**

•Profes-sor titular do IPPuR/uFRJ, pesquisador

do IA do CNPq e coordenador

do Observatório das Metrópoles

/Instituto do Mmilênio-CNPq.

** Profes-sor adjunto do

IPPuR/uFRJ e membro da coordenação

do INCT Ob-servatório das

Metrópoles.

Leia a íntegra do texto em http://diplomatique.uol.com.br

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>> SOlUÇõES

Desde março dois produtos da linha de tecidos para rou-pas profissionais da Santista Workwear passaram a utilizar o acabamento natural e ecológico Alsoft® Amazontex, obtido a partir da utilização do cupua-çu – fruto típico da Amazônia. O acabamento natural não con-tém silicone, é hipoalérgico e produz um efeito que aumenta o conforto por absorver a umi-dade e os raios solares. Já na linha Workwear, o acabamento vai substituir os produtos sinté-ticos na fabricação dos artigos Solasol e Tapé. A novidade na Santista contempla um projeto de colaboração para o desen-volvimento das comunidades locais da Amazônia, a partir de onde é extraído o Cupuaçu. No total, 700 famílias são benefici-árias deste projeto.

Cupuaçu nos tecidos

Segundo o engenheiro Elifas Gurgel, do Rio de Janeiro, é possível hoje, com tecnologia nacional, converter qualquer veículo para que consuma ele-tricidade em vez de combustíveis. Ele ficou cin-co anos num projeto piloto de conversão de um modelo GOL. O problema ainda é o custo. Foram necessários R$ 60 mil para concluir o projeto de um único carro. Ainda assim, ele está confiante. Para Gurgel, essa proposta não é uma alternativa, mas uma evolução no transporte das cidades. De-senvolveu um site onde explica o passo a passo da conversão automotiva: www.clubedocarroeletri-co.com.br

Qualquer veículo pode ser elétrico?

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Há vários projetos inovadores para dar uma destinação adequada aos dejetos produzidos nos banheiros. Da cidade de Camocim, Ceará, vêm os banheiros ecológicos secos, confeccionados com fibra de vidro. Eles não utilizam água nem produ-tos químicos, não contaminam o meio ambiente e não têm custo de manutenção. E muito importante: não têm cheiro. Ao menos essas são as garantias do fabricante. A proposta adapta-se a qualquer lu-gar e faz o aproveitamento da compostagem como adubo. Para evitar cheiro e insetos, as câmaras de compostagem são vedadas por todos os lados.

Banheiros ecológicos secos

O bambu vem sendo usado para muita coi-sa: casas, utensílios domésticos, encanamentos, instrumentos musicais, tecido, alimento, remé-dio. Calcula-se que existam mais de 1200 espé-cies pelo mundo. No Brasil, herança indígena, foi bem aproveitado no meio rural e agora, tam-bém virou matéria prima de transporte indivi-dual. Ao menos essa é a proposta que vem do Distrito Federal: o Projeto B3 – Bambu Bike Brasil. Os idealizadores, Phillip Fiuza Lima e Ronaldo Alves, afirmam que para esse objetivo, o bambu é a matéria prima ideal, mais resisten-te que o aço e o alumínio. Além disso, querem abrir oportunidades para mais projetos que utili-zam essa planta. Eles acreditam que, se feita em uma escala razoável, poderá reduzir o impacto causado pelo crescente número de veículos. Por enquanto confeccionam as bikes por encomen-da, de forma artesanal, e dependendo do mo-delo, a adaptação de uma antiga para a com o quadro de bambu sai por uns R$ 1200. Phillip inspirou-se numa iniciativa que já vem sendo desenvolvida em Gana/África e nas Filipinas/Ásia (www.bamboosero.com). Interessou? Sai-ba mais em www.bambubikebrasil.com.br.

Bicicleta de bambu

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SAIDEIRA>>

Comida

Composição de Arnaldo Antunes, Marcelo Fromer e Sérgio Brito

Bebida é água.comida é pasto.você tem sede de que?você tem fome de que?a gente não quer só comidaa gente quer comida, diversão e arte.a gente não quer só comida,a gente quer saída para qualquer parte.a gente não quer só comida,a gente quer bebida, diversão, balé.a gente não quer só comida,a gente quer a vida como a vida quer.

bebida é água.comida é pasto.você tem sede de que?você tem fome de que?a gente não quer só comer,a gente quer comer e quer fazer amor.a gente não quer só comer,a gente quer prazer pra aliviar a dor.a gente não quer só dinheiro,a gente quer dinheiro e felicidade.a gente não quer só dinheiro,a gente quer inteiro e não pela metade.bebida é água.comida é pasto.você tem sede de que?você tem fome de que?

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Titãs | Coposição de Arnaldo Antunes, Sérgio Brito e Marcelo Fromer

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