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REVESTIMENTO COM GEOMEMBRANA DE PEAD DOS CANAIS DE ADUÇÃO DO AH
ITIQUIRA: CONDICIONANTES GEOTÉCNICAS E ASPECTOS CONSTRUTIVOS
Joaquim M. G. Duarte 1
Resumo
Este trabalho aborda aspectos relacionados com o projeto e execução do revestimento dos canais de
adução do Aproveitamento Hidrelétrico de Itiquira, MT através de geomembrana de PEAD, uma novidade para obras hidrelétricas no Brasil. Descreve-se primeiramente as características geológico-
geotécnicas locais, ressaltando os aspectos que condicionaram o projeto do revestimento, e apresentam-se
as principais características geométricas do projeto dos canais de adução. Os critérios e alternativas
consideradas na escolha do tipo de revestimento dos canais são mencionadas brevemente, passando-se à
apresentação dos aspectos considerados relevantes no desenvolvimento do projeto de revestimento com
geomembranas, visando a garantir a durabilidade e confiabilidade requeridas em obras hidrelétricas.
Dificuldades relacionadas com a execução da obra resultaram na necessidade de instalar as
geomembranas sobre superfícies mais irregulares do que era inicialmente especificado. Para garantir a
integridade da geomembrana empregou-se uma camada de geotêxtil com elevada gramatura,
dimensionada para este fim e colocada entre a manta e o terreno. Ao final são apresentadas
recomendações baseadas na experiência adquirida neste projeto.
Abstract
This paper deals with aspects related to the design and execution of the geomembrane lining used in
canals which are part of the Itiquira Hydroelectric Scheme, located in Mato Grosso State, Brazil. This was
the first application of such a lining to a definitive structure of a hydroelectric plant in Brazil. Firstly, the
geological setting is described, focusing on the features that influenced the lining design and the main
characteristics of the canals are described. The criteria and the alternatives which were considered in the
choice of the lining method are briefly presented. Some aspects which were relevant in the development
of the geomembrane lining design, aiming at providing the lining system with the required durability and
reliability are pinpointed. Difficulties related with construction timing and procedures led to the need of
installing the geomembrane over irregular surfaces. To protect the geomembrane against damage an adequatetly dimensioned geotextile was placed between the membrane and the installation ground.
Finally, some recommendations based on the experience gained in this project are presented.
1. Introdução
O Aproveitamento Hidrelétrico (AH) Itiquira é um empreendimento da NRG ENERGY, Inc. através de
sua subsidiária no Brasil, a Itiquira Energética S.A. O mesmo tem uma potência instalada de 156 MW e
entrará em operação comercial a partir do segundo semestre de 2002. A construção e montagem foi
gerenciada na fase final pela BECHTEL do BRASIL e o projeto foi desenvolvido pela INTERTECHNE
CONSULTORES ASSOCIADOS – www.intertechne.com.br e IESA – Internacional de Engenharia S.A. O fornecimento da geomembrana PEAD foi da NORTÈNE PLÁSTICOS Ltda. – www.nortene.com.br e a
instalação da geomembrana foi executada pela NORSAN – www.cpunet.com.br/norsan
O aproveitamento está situado no município de Itiquira, no sul do estado de Mato Grosso, próximo à
borda de uma chapada, no local onde o Rio Itiquira desce da chapada para a planície do Pantanal, um
desnível de cerca de 220 m, em um trecho de aproximadamente 8 km.
O projeto distingue-se por apresentar um arranjo pouco convencional, onde o desnível entre a chapada e a
planície é aproveitado em dois lances, através de dois circuitos de geração em série.
1 Intertechne Consultores Associados, Curitiba, PR
O barramento, composto por uma soleira vertente de concreto e barragens de terra em ambas as
ombreiras, com uma altura máxima em torno de 15 m, é colocado logo a montante do ponto onde o rio
Itiquira ingressa em uma estreita garganta, formando um pequeno reservatório. A partir deste as águas são
conduzidas pelo canal de adução I, com cerca de 4.200 m de extensão, até uma primeira câmara de carga,
e desta, através de um conduto forçado externo, até a casa de força I, onde se dá a primeira etapa de
geração para uma queda de aproximadamente 90 m. As águas são restituídas em um segundo canal,
denominado canal de adução II, com extensão de 2.350 m, que as conduz a uma segunda câmara de
carga, e daí através de outro conduto forçado externo até a casa de força II, onde a parcela restante do
desnível altimétrico, cerca de 130 m, é desfrutada.
Tendo em vista sua considerável extensão, os canais de adução foram itens que mereceram grande
atenção no desenvolvimento do projeto, em função da importância de seu desempenho para o bom funcionamento do aproveitamento e de seu peso em termos de custos e prazo de execução no cômputo
geral do empreendimento.
Primeiramente, determinou-se através de estudos hidráulico e geotécnico, com base em critérios de
erodibilidade e estanqueidade, quais trechos necessitariam e quais poderiam prescindir de revestimento.
Para os trechos a serem revestidos, foi realizado um estudo de alternativas que resultou na adoção de
revestimento com geomembrana de Polietileno de Alta Densidade (PEAD) em toda a seção molhada do
canal de adução I em uma extensão de 3.300 m, e na parte escavada em solo ou em aterro do canal de
adução II.
O presente trabalho apresenta uma breve descrição do projeto, focalizada nos aspectos geológico-
geotécnicos e construtivos que condicionaram o projeto dos canais de adução e de seu revestimento.
Ressalte-se que esta é a primeira aplicação deste tipo de revestimento a estruturas definitivas de usinas hidrelétricas no Brasil, e que devido às exigências particulares deste tipo de obra, principalmente no que
diz respeito à durabilidade e confiabilidade, e também em função das dimensões da seção dos canais e de
peculiaridades ligadas à execução da obra, foi necessário adotar algumas soluções inovadoras, tanto em
termos de projeto como de processo executivo, que descreveremos a seguir.
2. Caracterização geológico-geotécnica e características dos canais de adução
2.1. Caracterização geológico-geotécnica
Os canais de adução do AH Itiquira estão implantados em uma região de rochas sedimentares, arenitos da
Formação Furnas, que no local apresentam-se medianamente a pouco coerentes, com resistência à
compressão simples variando tipicamente na faixa de 20 a 30 MPa. Os arenitos exibem de um modo geral
baixa cimentação e, pontualmente, textura sacaróide e elevada desagregabilidade, constituindo-se portanto em um material bastante suscetível à erosão. Verifica-se também a ocorrência de camadas
suborizontais centimétricas a decimétricas de siltito e argilito com baixa resistência mecânica
disseminadas em sua matriz arenosa. Sobre o topo rochoso ocorrem ao longo do canal diversos tipos de
materiais, aluviões recentes depositados pelo rio Itiquira, solos residuais jovens e maduros de arenito,
sendo que estes últimos apresentam-se em parte laterizados.
2.1.1 Canal de Adução I
Como se vê na Figura 1, onde é apresentada uma planta do arranjo geral do AH Itiquira, o canal I origina-
se na margem esquerda do reservatório e desenvolve-se em seu trecho inicial na planície rio Itiquira,
escavado em materiais aluvionares, sedimentos recentes depositados pelo rio. Na porção mais superficial
ocorrem areias médias a finas com pequena fração siltosa e sob estas cascalhos envoltos em matriz areno-
siltosa, os quais estão depositados sobre o topo rochoso.
Distanciando-se da planície fluvial, o terreno se eleva e o canal passa a se desenvolver encaixado em um
corte cuja altura chega a atingir 35 m. A escavação passa a abranger em sua porção superior solos
coluvionares argilo-arenosos laterizados, passando a solos residuais maduros de arenito areno-argilosos e,
na seção hidráulica propriamente dita, a solos residuais jovens de arenito essencialmente arenosos. A
parte inferior da seção do canal encontra-se escavada em solos residuais bastante compactos ou em rocha,
sendo que a transição de solo para rocha é bastante gradual, tornando-se em geral difícil individualizar o
topo rochoso. Neste trecho o nível freático do terreno é relativamente elevado, situando-se acima da cota
de fundo canal nos primeiros 2 km aproximadamente. Com exceção de pequenos trechos, o material pode
ser escavado mecanicamente, sem auxílio de explosivos.
Em sua metade de jusante o canal se desenvolve em meia encosta, em seção mista de corte-aterro, onde a
lateral direita teve em regra de ser complementada com um dique para atingir a cota de represamento
necessária. Neste trecho o nível freático natural situa-se sempre abaixo do fundo do canal.No trecho final
praticamente toda a seção hidráulica é constituída por diques, que na extremidade de jusante se fecham,
conformando a câmara de carga da tomada d’água I.
2.1.2 Canal de Adução II
O canal II está escavado predominantemente em rocha, pois ao longo de sua diretriz o recobrimento de
solo sobre o topo rochoso mostrou-se bem menos espesso que no canal I. De um modo geral os arenitos
mostraram-se mais compactos que no canal I, notadamente no trecho inicial próximo à casa de força I,
tendo exigido escavação por explosivos na maior parte de sua extensão. Ao longo de todo o canal
ocorrem intercalações suborizontais de siltito com espessuras de até uns 30 cm. A cobertura de solo é constituída por solos residuais jovens de arenito bastante arenosos e suscetíveis à erosão. O nível freático
natural encontra-se de um modo geral abaixo do nível do piso, com exceção do trecho médio, onde o
canal atravessa um fundo de vale e a freática é muito próxima do nível do terreno natural. Em sua metade
de jusante o topo rochoso se abaixa e ocorrem passagens de rocha bastante friável, com textura sacaróide.
Neste trecho a seção do canal é complementada por diques em sua parte superior em ambos os lados. No
trecho final do canal, aproximando-se da borda da chapada, o topo rochoso atinge o nível do piso do canal
e os taludes da seção hidráulica passam a ser constituídos em sua totalidade por diques em ambos os
lados, que se fecham ao final de maneira semelhante ao canal de adução I, constituindo a câmara de carga
da tomada d’água II.
2.2. Características geométricas dos canais de adução
2.2.1 Canal de Adução I
Em seu trecho inicial, com cerca de 1 km de extensão, o canal I desenvolve-se na topografia plana da
várzea do rio. Isto permitiu que se adotasse uma seção transversal suficientemente ampla e com taludes
abatidos, de modo a não necessitar de revestimento. O dimensionamento baseou-se em um estudo
hidráulico e geotécnico, levando em conta a granulometria dos aluviões aí depositados, com diâmetro
médio (D50) de cerca de 0,1 mm. Resultou desse dimensionamento uma seção transversal com largura do
fundo de 30 m e taludes com inclinação de 3,5H:1V, com velocidade de escoamento em torno de 0,4 m/s
para uma lâmina d’água de 4,5 m na condição normal de operação.
Ao término deste trecho a elevação do terreno determina a necessidade de encaixar o canal em um corte
bastante elevado, restringindo a seção de escoamento e conseqüentemente aumentando a velocidade de
escoamento para aproximadamente 1,3 m/s, o que faz com que seja necessário dotá-lo de revestimento em toda a seção para evitar a erosão do terreno que contém a seção hidráulica, constituído por solos
residuais jovens de arenito, com transição para rocha na parte inferior em alguns trechos.
Mais para jusante o terreno torna a se abaixar, fazendo com que seja necessário complementar a seção
hidráulica do canal com diques. Estes foram construídos com solo compactado, tendo sido utilizado solos
oriundos da escavação do canal. Em função da velocidade de fluxo os diques tiveram igualmente de
receber revestimento para evitar a erosão da superfície hidráulica. No trecho final do canal, na área da
câmara de carga, os diques chegam a atingir altura de cerca de 17 m.
A Figura 2a mostra uma planta geral e a Figura 2b a seção transversal típica do canal I em seu trecho
misto de corte-aterro.
Em resumo, o canal I apresenta as seguintes características principais:
Vazão de projeto de 80 m3/s;
Declividade média da soleira da ordem de 0,02%;
O nível d´água máximo normal de operação do canal situa-se na El. 412,00; em condições normais de operação a lâmina d´água no canal variará pouco, e será de cerca de 4,5 m no trecho não revestido
e de 6 m no trecho revestido. Na câmara de carga I ela poderá chegar a 12 m na aproximação da
estrutura da tomada d’água;
Escavação predominantemente em solo ou, em alguns trechos, em rocha na parte inferior do talude a
ser revestido;
Complementação da seção hidráulica com diques na metade de jusante. Talude superior em aterro,
separado da escavação por uma berma de 3 m de largura.
Extensão do trecho não revestido: 1.050 m, soleira com 30m de largura e taludes 3,5H:1V, velocidade de escoamento de 0,4 m/s;
Extensão do trecho revestido: 3.150 m, soleira com 4 m de largura e taludes 1,5H:1V nos cortes e 2,0H:1V nos aterros, velocidade de escoamento de 1,3 m/s;
2.2.2 Canal de Adução II
O canal de adução II tem início no canal de fuga da casa de força I e uma extensão de 2350 m até a
tomada d´água II, com uma largura da soleira de 5 m, constante até o início da câmara de carga.
Nos primeiros 850 m a partir da casa de força I previu-se a escavação de toda a seção molhada do canal
em rocha, com taludes 1H:1V. Neste trecho, tendo em vista que as sondagens indicavam a ocorrência de
rocha coerente, não foi previsto qualquer revestimento.
O restante do canal, com comprimento aproximado de 1500 m, apresenta seção transversal mista, com a
parte inferior da seção molhada escavada em rocha com taludes 1H:1V e, na parte superior, escavação em
solo e diques complementando a seção hidráulica. Neste trecho foi previsto que a parte em rocha da seção
molhada não necessitaria de revestimento. Acima do topo da rocha alterada e pouco coerente, definido como sendo o topo do terreno impenetrável à percussão SPT, e até a crista dos diques previu-se a
necessidade de revestir a superfície do canal. Acima do nível do topo da rocha a escavação foi projetada
com taludes de inclinação 2H:1V, igual à adotada neste canal para os taludes dos diques, portanto todas as
superfícies a serem revestidas no canal II têm esta inclinação.
Na área da câmara de carga da tomada d’água II o topo rochoso abaixa-se até o nível da soleira do canal e
os taludes laterais são constituídos em sua totalidade por diques com inclinação de 2H:1V, os quais
atingem uma altura de cerca de 16 m. e serão revestidos em toda a extensão de suas seções molhadas. Na
lateral direita hidráulica da câmara de carga encontra-se apoiada sobre o dique a estrutura de concreto da
ogiva do vertedouro lateral.
A Figura 3a mostra uma planta geral e a Figura 3b a seção transversal típica do canal II em seu trecho
misto de corte-aterro.
Em resumo, o canal II apresenta as seguintes características principais:
Vazão de projeto de 80 m3/s correspondendo a uma velocidade de escoamento de 1,3 m/s;
A soleira do canal apresenta declividade de 0,038% nos primeiros 1050 m, passando a 0,01% nos
1005 m seguintes, e 1,54% nos 200 m finais até o início da câmara de carga da tomada d´água II;
O nível d´água máximo normal de operação do canal situa-se na El. 320,00; a lâmina d´água será de
cerca de 6 m no canal, atingindo um máximo de 16 m na câmara de carga, onde a soleira aprofunda-
se até a El. 304,00 na aproximação da tomada d´água II;
Escavação em rocha da parte inferior do canal com taludes 1H:1V em toda a sua extensão até o início
da câmara de carga. Revestimento previsto somente acima do topo rochoso, nos taludes de escavação
e aterro, com inclinação 2H:1V.
Extensão do trecho não revestido: 850 m, taludes escavados em rocha 1H:1V;
Extensão do trecho revestido: 1.500 m, taludes 2,0H:1V nos cortes e nos aterros;
3. Escolha do tipo de revestimento dos canais
A escolha do tipo de revestimento foi objeto de um estudo no qual diversas alternativas (revestimento em
concreto, com mantas asfálticas e com geomembranas de PVC e PEAD) foram cotejadas sob os pontos de vista técnico e econômico. Considerando diversos aspectos, dentre os quais salienta-se a resistência aos
raios ultra-violetas e o controle de qualidade de todas as emendas, optou-se pela adoção de um
revestimento flexível com geomembranas de PEAD em toda a seção de escoamento no canal de adução I
e onde a seção é composta por solo ou aterro no canal de adução II.
4. Aspectos relevantes do projeto do revestimento com geomembrana de PEAD
4.1 Definição da espessura da geomembrana
As geomembranas de PEAD são produzidas em espessuras-padrão que variam de 0,8 a 2,5 mm. A
espessura a ser utilizada é definida com base na finalidade a que se destina o revestimento e na
experiência prática, não existindo critérios de cálculo para o dimensionamento.
Com o aumento da espessura da manta cresce a sua resistência mecânica (ao puncionamento, ao rasgo,
etc.), no entanto aumenta também seu peso específico (kg/m2 de manta) e diminui a sua maneabilidade.
Assim, para aplicações em aterros sanitários, onde a manta será submetida ao tráfego de veículos, despejo
e compactação de materiais sólidos, a agência de proteção ao meio-ambiente dos EUA (EPA -
Environment Protection Agency), recomenda o uso de mantas com espessura mínima de 1,5 mm,
enquanto sua congênere alemã estabelece para o mesmo fim espessura mínima de 2,0 mm. Já para o caso de canais, partindo-se do pressuposto que as emendas sejam testadas sistematicamente, mantas com
espessura de 0,8 mm já atenderiam aos requisitos de estanqueidade. No entanto, a qualidade da soldagem
resulta melhor para mantas de espessura igual ou superior a 1,0 mm.
No que diz respeito à resistência das geomantas de PEAD à abrasão, considera-se que para as velocidades
de fluxo e carga de sedimentos dos canais do AH Itiquira este aspecto não seja significativo.
Considerando que era previsto que o substrato de instalação fosse regularizado previamente de modo a se
obter uma superfície compacta, isenta de irregularidades superiores a 2 cm, a fim de minimizar os esforços de puncionamento sobre a manta, e que os esforços de tração devidos ao vento na fase de
instalação fossem controlados adequadamente, optou-se no projeto por mantas com 1,0 mm de espessura.
Estas oferecem estanqueidade e resistência mecânica suficientes e flexibilidade superior às mantas mais
espessas, o que resulta em melhor qualidade das emendas.
4.2 Ancoragem da geomembrana
Um ponto fundamental para a garantia da durabilidade e estanqueidade do revestimento com geomembranas é a sua adequada ancoragem, tanto ao terreno como às estruturas de concreto às quais
esteja associado. As geomembranas de PEAD possuem elevado coeficiente de dilatação térmica, e devido
à sua coloração negra, sofrem sob ação da radiação solar elevadas variações de temperatura, que resultam
em deformações consideráveis. Se as mantas não forem ancoradas convenientemente, os ciclos de
dilatação e retração podem ocasionar um enrugamento excessivo das mantas, que poderá prejudicar o
bom funcionamento do revestimento e torná-lo mais suscetível a danos.
A fim de garantir um funcionamento adequado a esse respeito, o projeto previu as seguintes ancoragens
sistemáticas do revestimento:
Ancoragens longitudinais em todas as dobras da geomembrana paralelas ao eixo do canal através de
valetas com 30 cm de largura preenchidas com concreto (na crista dos taludes, nas bermas e no fundo
do canal). No canal II, como o revestimento com geomembranas é previsto somente acima do topo rochoso, a ancoragem inferior do revestimento é proporcionada por um plinto de concreto ancorado
na rocha (ver Figura 3b).
Ancoragens transversais através de lajes de concreto perpendiculares ao eixo do canal com 1,50 m de
comprimento e 30 cm de espessura, dispostas a intervalos de cerca de 250 m ao longo dos canais. As
geomembranas são ancoradas às lajes por meio de soldagem a perfis extrudados de PEAD embutidos
no concreto nos lados de montante e jusante das lajes. Estas serão dotadas de degraus na faixa acima
do nível d’água de operação do canal e de postes para amarração de pequenas embarcações, servindo
também como pontos de resgate.
4.3 Proteção mecânica do revestimento
Por opção do proprietário, os canais de adução do AH Itiquira serão isolados através da construção de
cercas que garantirão a inacessibilidade dos canais a animais ou pessoas não-autorizadas, de forma que o
risco de vandalismo ou de quedas acidentais de animais no canal possa ser considerado suficientemente remoto. Como as geomembranas de PEAD são resistentes à ação dos raios ultra-violetas e aos ataques
químicos ou biológicos, como exposto anteriormente, considerou-se que a implementação de um
revestimento de proteção mecânica sobre a geomembrana em toda a sua extensão não seria necessária.
Entretanto, na altura da est. 14+20 o canal de adução I será transposto por uma estrada pública através de
uma ponte. Visto não ser possível isolar totalmente o canal no local de transposição, considera-se
necessária a implementação de um revestimento de proteção sobre as geomembranas em uma extensão de
100 m sob a ponte, a fim de evitar que essas possam ser danificadas por eventuais atos de vandalismo ou
quedas acidentais de objetos. O revestimento de proteção será constituído por uma camada de concreto
convencional não armado com 5 cm de espessura aplicado diretamente sobre as geomembranas. Neste
caso, prevê-se o uso de geomembranas texturizadas para garantir uma melhor aderência do revestimento à
manta.
Nas câmaras de carga I e II prevê-se a implementação de um revestimento de proteção nos mesmos
moldes daquele descrito acima. Nestes casos, a necessidade de entrada de equipamentos de dragagem
para eventuais trabalhos de desassoareamento junto às tomadas d’água justifica a necessidade de implementação de um revestimento de proteção.
4.4 Drenagem sub-superficial
No trecho médio do canal I, onde os cortes chegam a mais de 30 m de altura, o nível freático poderá
elevar-se acima do nível d´água do canal durante a estação chuvosa. Para garantir a drenagem das águas
freáticas sem desenvolvimento de subpressão sob a geomembrana, está prevista a implementação de um
sistema de drenagem subsuperficial no canal. Este será constituído por drenos horizontais com
comprimento de 6 m, perfurados nos taludes laterais do canal, 3 m acima do fundo deste e a cada 4 m no
sentido longitudinal. Estes drenos deverão ser executados no trecho onde a escavação do canal tem altura
superior a 20 m, entre as est. 15+50 e 23+50. Para garantir o livre escoamento das águas drenadas do
maciço sob a geomembrana, prevê-se neste trecho a instalação entre esta e o terreno de um geocomposto
drenante. Este consiste em um elemento drenante, constuído por uma georrede de PEAD, envelopada por mantas de geotêxtil em ambas as faces. As águas serão coletadas em uma valeta drenante longitudinal
escavada no fundo do canal e conduzidas em tubos para jusante até a Est. 28+78, onde serão
descarregadas em um talvegue natural adjacente ao canal através de uma derivação e uma caixa
dissipadora de energia.
5. Alterações do projeto original em função de peculiaridades da obra – introdução de geotêxtil
como elemento de proteção da geomembrana
O projeto executivo previa originalmente a instalação da geomembrana de PEAD diretamente sobre a
superfície devidamente regularizada do terreno ou do aterro. A especificação técnica de projeto prescrevia
uma dimensão máxima de 2 cm para as irregularidades da superfície de instalação, a fim de evitar danos à
mesma por puncionamento.
Entretanto, no decorrer de sua execução a obra apresentou as seguintes peculiaridades, que levaram a uma
reavaliação do projeto original:
exposição das superfícies dos taludes a serem revestidos a pelo menos uma estação chuvosa,
provocando sulcos erosivos nos taludes do canal;
as grandes dimensões da seção transversal do canal em comparação com as aplicações usuais deste
tipo de revestimento (canais de irrigação) dificultam a preparação do substrato de aplicação com
tolerâncias estritas em relação a irregularidades;
superfície irregular dos trechos rochosos a serem revestidos no canal I, devido a peculiaridades
geológico-geotécnicas e procedimento de escavação do canal;
necessidade de conclusão da obra no menor prazo possível;
Dadas as condições expostas acima, a preparação das superfícies de forma a atingir o padrão especificado
seria por demais onerosa em termos de cronograma e mão-de-obra. Por outro lado, se fosse instalada
sobre uma superfície irregular, a geomembrana estaria sujeita a danos durante a instalação e operação dos canais, principalmente puncionamento e estouro. Dessa forma, visando a compatibilizar as dificuldades
de prazos e custos de instalação da geomembrana com as necessárias garantias de segurança e
estanqueidade do revestimento, optou-se por introduzir um elemento de proteção entre a geomembrana e
o terreno, aumentando deste modo a tolerância a irregularidades no substrato de aplicação da
geomembrana.
Três alternativas foram aventadas para melhoria da resistência da geomembrana com relação ao
puncionamento e estouro:
Emprego de uma camada de georrede de PEAD sob a geomembrana;
Aumento da espessura da geomembrana de 1mm para 2mm;
Emprego de uma camada de geotêxtil de elevada gramatura sob a geomembrana.
O emprego de georrede foi descartado devido à inexistência de dados relativos ao emprego deste material
como elemento de proteção, visto que normalmente é usado para trabalhar como elemento drenante. Com
relação à espessura da geomembrana, ensaios mostram que a resistência ao puncionamento de uma
geomembrana de PEAD aumenta na mesma razão do aumento de espessura. O emprego de geotêxtil com
gramatura relativamente elevada junto à geomembrana, por outro lado, é muito mais eficiente no aumento
da resistência ao puncionamento. O geotêxtil, além de aumentar a resistência da geomembrana, absorve toda a carga de puncionamento antes de a geomembrana ser solicitada, resguardando-a de ações
mecânicas. Por estes motivos, optou-se pelo emprego de um geotêxtil com elevada gramatura (uma
camada de 600 g/m2 no canal e duas nas câmaras de carga, em função da maior carga hidrostática) para
proteger a geomembrana, resguardando-a de ser solicitada mecanicamente. Para maiores detalhes sobre a
escolha e o dimensionamento deste elemento de proteção remete-se à referência [4].
6. Conclusões e recomendações
A geomembrana de PEAD, material que vem sendo amplamente empregado como revestimento
impermeabilizante, notadamente em obras de saneamento (aterros sanitários, canais de irrigação,
etc.), industriais (tanques para efluentes tóxicos) e na mineração (pátios de lixiviação, barragens de
rejeito), configura-se também como alternativa competitiva técnica e economicamente para o
revestimento de canais de usinas hidrelétricas.
Em obras hidrelétricas os elevados custos potenciais de paradas forçadas de geração para reparos
coloca elevadas exigências quanto à durabilidade e confiabilidade das estruturas. Isto requer especial
atenção no desenvolvimento do projeto de revestimento com geomembranas a detalhes como
ancoragem, proteção mecânica e drenagem do revestimento, a fim de que estes requisitos sejam
atendidos.
As operações de preparação do terreno para a instalação de revestimento com geomembrana de
PEAD podem se tornar bastante onerosas em termos de custos e cronograma, em função das
tolerâncias usualmente estritas colocadas em relação a irregularidades do substrato, visando a evitar
danos à geomembrana por puncionamento. Este aspecto ganha particular importância em canais com
dimensões comparáveis àqueles do AH Itiquira. Com base na experiência acumulada nesta obra
podem ser feitas as seguintes recomendações:
- Os trabalhos de escavação dos canais, construção de aterros, preparação do terreno e instalação
devem ser encadeados de maneira tal que a superfície de instalação das geomembranas fique o
menor tempo possível exposta às intempéries. Atenção deve ser dada à condução das águas
superficiais, especialmente em períodos chuvosos. É recomendável a implementação de
dispositivos provisórios de drenagem se os definitivos ainda não estiverem operacionais.
- A proteção da geomembrana através da colocação de um geotêxtil de elevada gramatura entre a
manta e o terreno revelou-se um método eficaz para acelerar os procedimentos de instalação,
pois possibilitou aumentar a tolerância quanto às irregularidades do substrato, agilizando
sobremaneira os trabalhos de preparação do terreno.
7. Referências
[1] Maroni, L. G.; Pandolpho, J. R.; Okada, L. (1993). Utilização de Sistemas Impermeáveis
Flexíveis, com Geomembranas Pré Fabricadas, em Canais de Irrigação e Adução. 8.º Simpósio Brasileiro de Impermeabilização.
[2] Aguiar, C. A.; Garcez, B. J. J. (1997). Impermeabilização de Canais de Irrigação com
Geomembrana de Polietileno de Alta Densidade. 10.º Simpósio Brasileiro de
Impermeabilização.
[3] Vidal, I. G. (2000). A Qualidade na Instalação de Geomembranas de PEAD. 11.º Simpósio
Brasileiro de Impermeabilização.
[4] Abramento, M.; Duarte, J. (2002). Uso de Geotêxtil para Proteção Mecânica de Geomembrana
em Canal de Adução. Congresso Brasileiro de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica (a
ser publicado).
8. Anexo Fotográfico
Figura 4 – Aspecto do canal I revestido em seção mista de corte-aterro. Notar as valetas de ancoragem nas
bermas e no fundo do canal.
Figura 5 – Trabalhos de preparação do terreno para a instalação da geomembrana.
Figura 6 – Colocação de geotêxtil sobre o terreno regularizado para proteção da geomembrana.
Figura 7 (ao lado) – Laje de ancoragem
transversal da geomembrana.
Figura 8 (abaixo) – Instalação de geomem-
brana no canal II. Notar o plinto de concre- to para ancoragem inferior da manta e o tra-
tamento da rocha com concreto projetado.