Revelação Geral e Revelação Especial
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REVELAÇÃO GERAL E REVELAÇÃO ESPECIAL
Introdução
Antes de estudarmos todas as doutrinas de acordo com seus vários temas, faz-se necessário que iniciemos com a
questão das fontes de onde extrairemos estas doutrinas. Cada religião tem a fonte (ou fontes) de onde procedem as suas
crenças, e com o cristianismo não poderia ser diferente. Portanto, devemos entender bem de onde é que surgiu cada
verdade da religião cristã.
No nosso caso, afirmamos que todas as verdades espirituais são provenientes de revelações dadas pelo Ser
Supremo do universo, o qual se mostrou, por meio delas, a nós. Mas o que são estas revelações? O que significa
―Revelação‖ dentro do contexto da teologia cristã? ―Revelação significa intrinsecamente a exposição daquilo que
anteriormente era desconhecido. Na teologia judaico-cristã, o termo é usado primariamente para a comunicação da
verdade divina de Deus para o homem ou seja: a Sua manifestação de Si mesmo e da Sua vontade.‖ 1 Tradicionalmente,
na teologia, a revelação divina tem sido classificada comumente como sendo de dois tipos: Revelação Geral e
Revelação Especial.
Revelação Geral
A Revelação Geral “é assim chamada porque chega a cada um de nós simplesmente por vivermos no mundo de
Deus. Deus tem se revelado desse modo desde o começo da história humana.‖2 Todo ser humano pode contemplar esta
revelação, e qualquer um tem acesso a ela, visto ela se dirigir a toda a humanidade. Ela tem em vista ―suprir a
necessidade natural das criaturas quanto ao conhecimento do seu Deus‖.3 É importante que entendamos que
―a revelação geral está radicada na criação e nas relações gerais de Deus com o homem, é dirigida ao homem como a
criatura portadora da imagem de Deus, e visa a realização do fim para o qual o homem foi criado, o que pode ser
alcançado somente quando o homem conhecer a Deus e gozar comunhão com Ele.‖4
Como a revelação geral se apresenta ao ser humano? De qual forma o ser humano entra em contato com ela?
Vejamos a seguinte explicação: ―A revelação geral não vem ao homem diretamente por comunicações verbais... Deus
fala ao homem através de toda a sua criação, nas forças e nos poderes da natureza, na constituição da mente humana, na
voz da consciência, e no governo providencial do mundo em geral‖.5
Apesar de satisfatório para conhecer alguns aspectos do Criador, a Revelação Geral não desempenha mais sua
função de modo perfeito e suficiente devido às seguintes razões:
1. O pecado maculou a Revelação Geral de tal forma que esta não mostra Deus clara e perfeitamente como antes
da entrada do pecado;
2. O homem já não consegue entender a Revelação Geral de forma correta devido à sua pecaminosidade. Assim,
ele não tem capacidade espiritual para ver claramente esta revelação deixada pelo Criador;
3. A Revelação Geral nada diz a respeito do perdão do pecado, ou sobre Cristo, ou sobre a salvação. Portanto, ela
é insuficiente para resgatar os pecadores e consumar os planos divinos.6
Base Bíblica: Sl 19:1, 2; At 14:17; Rm 1:19, 20; Rm 2:14-15
1 HENRY, Carl F. H. Revelação Especial in Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã. Editor, Walter A. Elwell.
São Paulo, Vida Nova, 2009, p 299. 2 Bíblia de Estudo de Genebra. São Paulo e Barueri, Cultura Cristã e Sociedade Bíblica do Brasil, 1999, p 626.
3 BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. Campinas, Luz Para o Caminho, 1990, p 39.
4 BERKHOF, Louis. Manual de Doutrina Cristã. Campinas, Luz Para o Caminho, 1985, p 27.
5 Ibid, p 29.
6 Ibid, p 30, 31.
Base Confessional:
Confissão de Fé de Westminster (Capítulo I , Seção I – Da Escritura Sagrada):
―Ainda que a luz da natureza e as obras da criação e da providência de tal modo manifestem a bondade, a
sabedoria e o poder de Deus, que os homens ficam inescusáveis...‖
Catecismo Maior (perg. 2) ―Como podemos saber se existe um Deus?‖ Resposta: ―A própria luz da natureza no
homem, e as obras de Deus, claramente testificam que existe um Deus...‖7
Revelação Especial
Devido ao fato de a Revelação Geral ser insuficiente aos propósitos divinos, aprouve a Deus apresentar a
Revelação Especial a fim de levar adiante seu plano eterno para o mundo. Podemos explicar a Revelação Especial nos
seguintes termos: ―A revelação especial está arraigada no plano de redenção de Deus, é dirigida ao homem na qualidade
de pecador, pode ser adequadamente compreendida e assimilada somente pela fé, e serve ao propósito de assegurar o
fim para o qual o homem foi criado a despeito de toda a perturbação produzida pelo pecado.‖8
Os meios pelos quais a Revelação Especial se apresentou podem ser reduzidos, de forma geral, a três tipos:
1. Teofanias ou manifestações de Deus :
a. Fogo e nuvens de fumaça (Gn 15:17; Ex 3:2; 19:9, 16, 17; 33:9; Sl 78:14; Sl 99:7);
b. Nos ventos tempestuosos (Jó 38:1; 40:6; Sl 18:10-16);
c. Anjo do Senhor (distinto de Deus - Ex 23:20-23; Is 63:8, 9; identificado com Deus - Gn 16:13; 31:11-
13; 32:28);
d. Encarnação de Cristo (Cl 1:19; 2:9).9
2. Comunicações diretas:
a. Voz audível (Gn 2:16; 3:18, 19; 4:6-15; Ex 19:9; Dt 5:4; 1Sm 3:4);
b. A sorte e o Urim e Tumim (1Sm 10:20, 21; 1Cr 24: 5-31; Ne 11:1; Nm 27:21; Dt 33:8);
c. Sonho (Nm 12:6; Dt 13:1-6; 1Sm 28:6; Jl 2:28);
d. Visão (Is 6; 21:1; Ez 1-3; 8-11; Dn 1:17; 2:19; 7-10; Am 7:1-9).10
3. Milagres:
De acordo com a Escritura, Deus também Se revela pelos milagres. É especialmente deste ponto de vista
que os milagres da Escritura devem ser estudados... Eles são, acima de tudo, manifestações de um poder
especial de Deus, sinais de Sua presença especial, e servem, com freqüência, para simbolizar verdades
espirituais. Como manifestações do reino vindouro de Deus, tornam-se subservientes à grande obra da
redenção... Eles confirmam as palavras da profecia e apontam para uma nova ordem que está sendo
estabelecida por Deus.11
Como se pode observar, a Revelação Especial é diferente da Revelação Geral na forma de se apresentar ao
homem, e igualmente diferente em seu conteúdo:
7 MARRA, Cláudio Antônio Batista. editor, O Catecismo Maior. São Paulo, Cultura Cristã, 1999, p 1.
8 BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática, p 39.
9 BERKHOF, Louis, Manual de Doutrina Cristã, p 34.
10 Ibid, p 34.
11 Ibid, p 35.
A revelação especial não serve, simplesmente, ao propósito de comunicar ao homem algum
conhecimento geral de Deus. Descobre ao homem o conhecimento específico do plano divino para a
salvação dos pecadores; da reconciliação de Deus e dos pecadores por meio de Jesus Cristo; do caminho
da salvação aberto por Sua obra redentora, da influência transformadora e santificadora do Espírito Santo,
e das exigências divinas para os que participam da vida do Espírito.12
Como está claro, a Revelação Especial é indispensável ao ser humano a fim de que este possa sair de seu estado
de pecado e entrar em comunhão com o Criador. Ou seja, a Revelação Especial tem importância imensurável por se
tratar de verdades que mudarão a situação eterna do homem. É por esta causa que Deus fez com que se registrasse esta
revelação a fim de que fosse preservada pelos séculos durante a história humana, sem os perigos de ser perdida com o
passar do tempo, ou ser ―adulterada por idéias humanas‖. Podemos então falar da relação entre a Escritura e a
Revelação Especial da seguinte forma:
Em geral pode-se dizer que a revelação especial de Deus assumiu uma forma permanente na Escritura, e
foi assim preservada para a posteridade. Deus quis que Sua revelação fosse o Seu falar perene para todas
as gerações sucessivas dos homens; e tinha, pois, de guardá-la contra a perda, corrupção e falsificação. E
Ele o fez provendo-lhe um registro infalível e vigiando-o com cuidado providencial.13
Evidentemente nem tudo que fez parte da Revelação Especial está escrito nas Escrituras (Jo 20:30-31), porém,
tudo que foi escrito é suficiente para as necessidades humanas, e suficiente para o homem cumprir os seus deveres para
com Deus (2Tm 3:16, 17).
Base Bíblica: 2Rs 17:13; Sl 103:7; Jo 1:18; Hb 1:1, 2; 1Co 2:9, 10; 1:21
Base Confessional:
Confissão de Fé de Westminster (Capítulo I , Seção I – Da Escritura Sagrada):
Ainda que a luz da natureza e as obras da criação e da providência de tal modo manifestem a bondade, a sabedoria e o
poder de Deus, que os homens ficam inescusáveis, contudo não são suficientes para dar aquele conhecimento de Deus
e da sua vontade necessário para a salvação; por isso foi o Senhor servido, em diversos tempos e diferentes modos,
revelar-se e declarar à sua Igreja aquela sua vontade; e depois, para melhor preservação e propagação da verdade,
para o mais seguro estabelecimento e conforto da Igreja contra a corrupção da carne e malícia de Satanás e do
mundo, foi igualmente servido fazê-la escrever toda. Isto torna indispensável a Escritura Sagrada, tendo cessado
aqueles antigos modos de revelar Deus a sua vontade ao seu povo.
Catecismo Maior: (perg. 2) ―Como podemos saber se existe um Deus?‖ Resposta: ―... só a sua Palavra e o seu
Espírito o revelam de um modo suficiente e eficaz, aos homens, para a sua salvação.‖14
Conclusão
Certamente Deus não revelou tudo acerca de Si mesmo, mas o que revelou é suficiente para suprir nossas
necessidades como criaturas espirituais que precisam de comunhão com Ele. Mesmo porque, ainda que Ele viesse a
revelar-Se plenamente a nós, não poderíamos compreendê-lo, pois somos finitos. ―Deus é O Incompreensível. O homem
não pode conhecê-lO como Ele é nas profundezas de Seu ser divino‖.15
O Senhor está tão acima de nós que por mais
que quiséssemos conhecer mais dEle, nunca conseguiríamos chegar a um conhecimento completo:
Não só é verdade que jamais poderemos compreender plenamente a Deus; é verdade também que jamais
poderemos compreender plenamente nem mesmo uma só coisa acerca de Deus. Sua grandeza (Sl 145:3),
12
BERKHOF, Louis. Manual de Doutrina Cristã, p 36. 13
Ibid, p 38. 14
MARRA, Cláudio Antônio Batista. editor, O Catecismo Maior, p 1. 15
BERKHOF, Louis, Manual de Doutrina Cristã. Campinas, Luz Para o Caminho, 1985, p 26.
seu entendimento (Sl 147:5), seu conhecimento (Sl 139:6) sua riqueza, sabedoria, juízos e caminhos (Rm
11:33) estão todos além da nossa capacidade de compreensão plena.16
Todavia, o conhecimento que temos por meio da Revelação Geral e por meio de Revelação Especial não
somente podem dar a alegria de salvação àqueles que O conhecem e O aceitam pela fé. O acesso a estas Revelações
torna os pecadores ainda mais culpados caso não se rendam a elas. Ou seja, quanto mais acesso ao conhecimento de
Deus, mais culpável o homem fica diante dEle ao recusá-lO.
Mas o que dizer daqueles que nunca tiveram acesso à Revelação Especial? Como poderão ser condenados por
não seguir a um Deus que nem chegaram a conhecer devidamente? A questão é que somos condenados não por causa
dos nossos pecados presentes, mas pelo pecado em Adão. E em segundo lugar, a Revelação Geral já é suficiente para
tornar alguém culpado diante do Senhor. Vejamos a seguinte explanação:
[...] Ele ativamente revela esses aspectos de si mesmo a todos, de modo que deixar de agradecer e servir
ao Criador é sempre um pecado contra o conhecimento. No final, nenhuma negação de termos recebido
esse conhecimento será admitida. Paulo usa a revelação universal do poder e da bondade de Deus como
base para a sua acusação contra toda a raça humana como pecadora e culpada diante de Deus, por causa
do nosso fracasso em servi-lo como devemos (Rm 1:18-3:19).17
16
GRUDEM, Wayne A. Teologia Sistemática. São Paulo, Vida Nova, 1999, p 102. 17
Bíblia de Estudo de Genebra. São Paulo e Barueri, Cultura Cristã e Sociedade Bíblica do Brasil, 1999, p 626.
Bibliografia
— Bíblia de Estudo de Genebra. São Paulo e Barueri, Cultura Cristã e Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.
— Cláudio Antônio Batista Marra, editor, O Catecismo Maior. São Paulo, Cultura Cristã, 1999.
— Louis Berkhof, Manual de Doutrina Cristã. Campinas, Luz Para o Caminho, 1985.
— Louis Berkhof, Teologia Sistemática. Campinas, Luz Para o Caminho, 1990.
— Walter A. Elwell, Enciclopédia Histórico-Teológica da Igreja Cristã. São Paulo,Vida Nova, 2009.
— Wayne A. Grudem, Teologia Sistemática. São Paulo, Vida Nova, 1999.