Resumo do acórdão - final

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS – UNISINOS UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO CURSO DE DIREITO DOUGLAS SENA BELLO JÚLIA OHLWEILER JULGADO COMENTADO

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS – UNISINOS

UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO

CURSO DE DIREITO

DOUGLAS SENA BELLO

JÚLIA OHLWEILER

JULGADO COMENTADO

São Leopoldo

2013

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I - RESUMO ACÓRDÃO

O acórdão selecionado trata-se de um Agravo de Instrumento contra decisão

interlocutória do Juiz de 1º Grau que deferiu o pedido liminar em uma ação de

reintegração de posse. No entanto,, porém o agravante já havia ajuizado e obtido

liminar em uma ação de manutenção de posse.

Destaca-se que o agravante arguiu as seguintes teses:

a) “em 13 de outubro de 2010 (antes, portanto, do ajuizamento da ação de

reintegração de posse pelos agravados, que se deu em 19 de outubro de

2010), ingressara com ação de manutenção de posse perante o Juizado

Especial Cível da Comarca de Piraquara, onde lhe fora deferida a

manutenção da posse do imóvel”;

b) “que o juízo de Piraquara é, por tal motivo, prevento para analisar a

reintegratória e, em razão disso, deve ser revogada a liminar concedida, bem

como reconhecida a litispendência, com a consequente remessa dos autos

1.107/2009 (reintegração de Posse) ao JEC de Piraquara, para que tramite

apenso aos autos 2009.643-4/0 (Manutenção de Posse)”;

c) “que não poderia ter sido concedida a liminar, pois sua posse sobre o imóvel

é velha (mais de ano e dia)”.

Cumpre salientar que o órgão julgador, analisando o pedido liminar do

agravante, suspendeu os efeitos da decisão recorrida, até o julgamento do mérito da

demanda.

Na decisão de primeiro grau a liminar foi deferida somente em virtude da

mora, constituída pela notificação extrajudicial enviada ao agravante.

No julgamento do mérito, os julgadores afirmam que atrelado a este, está à

questão da litispendência alegada pelo agravante. Acerca deste ponto os

desembargadores afirmaram que assiste razão ao agravante, no que tange a

aparente litispendência das ações possessórias embora sob outros fundamentos.

Gize-se que o agravante confundiu os efeitos da litispendência, pois segundo os

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desembargadores esta gera a extinção de um dos processos e não a junção deles

para que tramitem conjuntamente, como o agravante havia pedido. Porém,

destacam que o agravante possui respaldo, sendo prova as liminares antagônicas

deferidas nos processos.

Ademais, os desembargadores afirmamconcluíram que, por serem as partes

litigantes, o objeto do litígio e o caráter da demanda, iguais,faz com que concluam

que a solução mais adequada não é a conexão das demandas, para julgamento

conjunto, conforme requereu o agravante, e sim a extinção de uma delas. Tal foi o

posicionamento, uma vez que por mais que seja a melhor solução a conexão das

demandas, em razão da necessária coerência para a decisão, em virtude do

principio da eficiência, há o caráter duplo das ações possessórias. Assim, é

imperiosa a extinção de uma delas, pois desnecessária a tramitação de dois

processos em paralelo sobre a mesma situação, considerando que as partes

alegariam exatamente as mesmas teses em ambos processos. Cumpre salientar

que para corroborar tal entendimento, os julgadores colacionaram jurisprudência.

Dessa forma o pedido referente à conexão das demandas, não foi

reconhecido, porém foi reconhecida a litispendência de forma excepcional, para

extinguir a ação de reintegração. Além da questão das ações repetidas, foi referido

que a prevalência da ação de manutenção de posse também se impõe mem razão

do mérito.

Nesse norte, analisando o mérito, os julgadores afirmam que a liminar que

prevalece é aquela deferida na ação de Manutenção de Posse, ou seja, a que

beneficia o Agravante, uma vez que o conjunto probatório indica ser esta a solução

provisória mais correta.

Ao adentrar na questão suscitada pelo agravante acerca de sua posse ser

posse velha, ou seja, de mais de ano e dia, os desembargadores afirmaram que

restou comprovado que o agravante é “responsável pelo pagamento do IPTU do

imóvel em discussão, no mínimo desde o ano de 2006. Por isso, a plausibilidade de

que o lapso temporal de sua posse direta sobre o imóvel seja maior do que ano e

dia, é consistente”. Outrossim, destacam que o Magistrado responsável pelo

deferimento da liminar ora agravada não possuía uma visão ampla sobre o tema,

tendo sua visão limita aos argumentos dos agravados, fato que o fez deferir a liminar

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com base apenas em uma notificação, o que restou comprovado ser incapaz de

sustentar o deferimento da liminar.

No tocante ao reconhecimento da liminar da reintegração de posse, pelo juízo

“ad quo”, mesmo configurada a posse velha, faz-se necessário colacionar o disposto

pelos julgadores: “tal possibilidade existe, no entanto, as exigências são mais

complexas, ou seja, pela inteligência do art. 924 do CPC, quando não se tratar de

posse nova, o procedimento deverá obrigatoriamente ser o ordinário, fazendo-se

necessário, então, o preenchimento dos requisitos para a concessão da antecipação

da tutela previstos no art. 273 do Código de Processo Civil, caso o autor veicule

algum tipo de pretensão liminar”. Nesse sentido, os desembargadores afirmam que

no caso concreto não restou comprovada, na ação de reintegração de posse, os

requisitos supracitados, tendo em vista se tratar de posse velha, fato este que

acarretou a prevalência da liminar proferida na ação de manutenção de posse.

II - COMENTÁRIO

Para fins de debate, iniciarmos a abordagem acerca da fundamentação

aventada no acórdão selecionado, destacamos com o entendimento do Superior

Tribunal de Justiça (REsp 194.649, cuja ementa anexamos ao presente trabalho), o

qual se direciona no tocante a concessão de medida liminar em ação possessória,

no sentido de ser plausível a concessão de liminar, nos casos em que a posse é

considerada posse velha, ou seja, trata-se de posse de mais de ano e dia. Porém,

devemos destacar que a fundamentação para tal entendimento é de que a

legislação veda a concessão de liminar específica em ações possessórias, a qual

esta prevista nos arts. 927 e 928 do Código de Processo Civil, mas permite a

antecipação de tutela prevista no art. 273, I do CPC, a qual se aplica a todas as

ações ordinárias. Nesse sentido destaco as citações do Ministro Relator no

julgamento do REsp supracitado, que colacionou o entendimento de autores

renomados acerca da antecipação de tutela em ações possessórias que envolvam

posse velha:

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"Em relação à posse de mais de ano e dia (posse velha), igualmente não se afasta de plano a possibilidade de antecipar-se a tutela, tornando-a cabível a depender do caso concreto. É o que entende Athos Gusmão Carneiro, citando Arruda Alvim:

‘Nos casos de ações ‘de força velha’, a aplicação do art. 273 dependerá das circunstâncias do caso concreto. Arruda Alvim considera ‘evidente que, nesse caso, o juiz deverá avaliar o tempo, condições da posse etc. (‘Tutela Antecipatória’, in Reforma do CPC, Ed. Saraiva, 1996, p. 112)’ (Da antecipação de tutela no processo civil, 2ª ed.,Rio de Janeiro: Forense,1999, n. 60.3, p. 82).

Sérgio Sahione Fadel, na obra já referida, também ensina:

‘No entanto, o instituto do art. 273 do CPC pode, igualmente,ser aplicado às ações petitórias, de natureza possessória,mesmo que de força velha, para desfazer esbulhos de mais de ano e dia, desde que o autor faça prova convincente de sua posse esbulhada, justifique os prejuízos de difícil reparação e apresente versão dos fatos verossímil, em suma, desde que atenda os requisitos genéricos, exigidos para a tutela antecipatória.

É que o art. 273 do CPC, instituidor da antecipação de tutela, é norma que criou disposições gerais a par das especiais já existentes, com aplicação a todo e qualquer processo de conhecimento, como decorre de regra de hermenêutica estabelecida pelo art. 2º, § 2º, da Lei de Introdução ao Código Civil.Não há, assim, por que deixar-se de considerar a hipótese de esbulho possessório, em que a posse, embora de força velha,deva ser tutelada antecipadamente pelo magistrado, desde que o autor prove suas alegações e haja perigo de dano irreparável ou de difícil reparação.Mesmo nos casos de intuito protelatório do réu ou de abuso de direito de defesa, será lícito ao juiz, etpour cause, deferir a tutela antecipada com base no art. 273, II, do CPC’ (n. 32.6, p.113).

E Nelson Nery Júnior, no ponto, não destoa:

‘Ação possessória. Força velha. Caso o esbulho tenha ocorrido há menos de ano e dia (força nova), cabe ação possessória pelo procedimento especial do CPC 926 ss., com adiantamento liminar da tutela de mérito (CC 508). Nesse caso, o autor do interdito possessório só terá que demonstrar a sua posse e a data da ocorrência do esbulho (CPC 927 III),para que tenha direito à reintegração ou manutenção liminar(tutela antecipatória de mérito).Havendo o esbulho sido perpetrado há mais de ano e dia(força velha), caberá ação possessória pelo rito comum(ordinário ou sumário). Nessa ação o autor pode pedir a tutela antecipada com base na norma ora analisada, mas para obtê-la terá de comprovar a existência de sua posse, do esbulho ou turbação, bem como dos demais requisitos do CPC273’ (op. cit., art. 273, n. 16, p. 750)”.

Depreende-se, portanto que mesmo o artigo 924 do Código de processo civil

determinando que os procedimentos possessórios de manutenção e reintegração de

posse terão possibilidade de liminar se intentados dentro de ano e dia da turbação

ou esbulho e passado esse prazo assumirão procedimento ordinário, ainda há a

possibilidade de deferimento da antecipação dos efeitos da tutela pretendida no

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pedido inicial se a posse for velha, desde que atendidos os requisitos do artigo 273

do Código de Processo Civil.

No caso de posse nova, ou seja, aquela em que o esbulho ou turbação

ocorrera dentro de ano e dia caberá o ajuizamento de ação possessória de

manutenção ou reintegração de posse, conforme o caso.

A ação de manutenção de posse deverá ser ajuizada quando o possuidor for

molestado em sua posse. Isto é, no caso do acórdão comentado, o agravante

sentiu-se agredido e assim intentou ação para manter-se na posse do bem.

O agravado, então, ajuizou ação de reintegração, pois sentiu-sese sentiu

esbulhado e dessa forma desejou recuperar a posse do imóvel. Conforme referido

na decisão, tal fato não foi comprovado e por isso foi indeferido.

Por mais que sejam ações de mesma espécie, qual seja, possessórias, têm

características e objetos diferentes.

Caio Mário da Silva Pereira (2011, p.52 -53),entende que as ações

possessórias são “ontologicamente análogas, todavia, embora diversificadas em

função do objeto, não prejudicam a invocação de uma por outra”. Ou seja, o ilustre

doutrinador entende que seus objetos são diferentes, mas que por se tratarem de

ações da mesma espécie a invocação de uma por outra não causa nulidade.

Além disso, afirma que essas ações “inspiram-se no objetivo de resolver

rapidamente a questão originada do rompimento antijurídico da relação estabelecida

pelo poder sobre a coisa, sem necessidade de debater a fundo a relação jurídica

dominial”. Isto é, considerando seu objetivo “tais ações se inauguram com uma

primeira fase tipicamente cautelar”.

Como característica, ainda define que:

Além da conversibilidade entre os interditos possessórios, verifica-se a peculiar característica da duplicidade dessas ações, que, como bem esclarece o art. 922 do CPC, permite, tanto ao autor, como ao réu, em uma mesma ação, requerer a tutela de sua posse ameaçada.

Flávio Tartuce e Jose Fernando Simão ,entendem que o interdito possessório

denominado manutenção de posse caberá no caso de turbação, ou seja, atentados

fracionados a posse. No que tange aos conceitos abordados pela decisão que

analisamos neste trabalho, passamos a apresenta-los sob a ótica dos ilustres

autores Flávio Tartuce e Jose Fernando Simão, na sua obra Direito Civil Vol. 4 –

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Direito das Coisas, Edição 2013. O acórdão objeto deste aborda a questão da

litispendência entre uma ação de manutenção de posse e uma ação de reintegração

de posse.Nesse sentido os autores afirmam: Sendo assim, passamos a expor o

entendimento dos autores supracitados sobre o tema.

Ao abordaro interdito possessório denominado manutenção de posseos autores afirmam, que este caberá no caso de turbação, ou seja, atentados fracionados a posse. Abordando mais precisamente o conceito de turbação, colacionamos o entendimento dos autores referidos anteriormente:

Na turbação já houve atentado à posse em algum momento, como, por exemplo, no caso dos integrantes desse mesmo movimento popular que levam os cavalos para pastar na fazenda que será invadida, sem ainda adentrá-la de forma definitiva.

Acerca da reintegração de posse verifica-se que esta caberá no caso de

esbulho, o qual corresponde a um atentado consolidado à posse. Para esclarecer o

conceito de esbulho utilizaremos a definição dos autores supracitados:

No esbulho, houve o atentado definitivo. Os integrantes do movimento popular adentraram na fazenda e lá se estabeleceram. Frise-se que, nos casos ilustrativos, a fazenda e utilizada pelo proprietário, que cumpre a sua função social, razão pela qual os atentados à posse devem ser considerados ilegítimos. Não se trata, portanto, de propriedade improdutiva, em seu sentido social.

Gize-se que as medidas referidas anteriormente possuem respaldo no art.

1210, caput, do Código Civil, haja vista que o permissivo legal dispõe que “O

possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de

esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado”.

Sendo assim, verifica-se que a ação de manutenção de posse visa preservar a

posse daquele que tem sua posse turbada e a ação de reintegração de posse visa

devolver ao possuidor a posse que lhe fora esbulhada.

Ademais, devemos destacar que segundo Flávio Tartuce e José Fernando

Simão, o art. 920 do Código de Processo Civil, consagra a fungibilidade total entre

as ações possessórias, conforme depreende-se da leitura do artigo

supramencionado:

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“Art. 920. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela, cujos requisitos estejam provados.”

Outrossim, ao abordamos os interditos possessórios devemos dissertar

também sobre a classificação da posse quanto ao tempo, uma vez que esta é

relevante para a definição do rito para o processo, nos termos do art. 924 do CPC.

Nesse sentido, salientamos que as ações possessórias podem ser classificadas de

duas formas: ações de força nova, ou seja, trata-se de posse nova e ações de força

velha, refere-se a posse velha. Destaca-se o entendimento dos autores citados

anteriormente acerca de pose nova e posse velha:

“Posse nova – é a que conta com menos de um ano e um dia, ou seja, é aquela com até um ano.

Posse velha – é a que conta com pelo menos um ano e um dia, ou seja, com um ano e um dia ou mais.”

Isso posto, salientamos que classificar a posse desta forma é de suma

importância, pois trata-se de posse nova, aplica-se o rito especial, ou seja, cabe

liminar e tratando-se de posse velha, o rito ordinário, não cabendo liminar nesses

casos, porém como exposto anteriormente, caberá a antecipação de tutela desde

que preenchidos os requisitos do art. 273 do CPC, conforme entendimento do STJ.

Nesse momento, passamos a abordar criticamente alguns pontos do acórdão

objeto desta análise, primeiramente destacamos o argumento do agravante, o qual

foi acolhido pelos julgadores, de que não poderia ter sido concedida a liminar, pois

sua posse sobre o imóvel é velha (mais de ano e dia), ao atacar a liminar concedida

na ação de reintegração de posse. Porém, concordamos com o entendimento

diverso, exarado pelo Superior Tribunal de Justiça, que entende ser inviável a liminar

específica das ações possessórias, porém permite a antecipação de tutela desde

que preenchidos os requisitos do art. 273, I do CPC. Afiliamo-nos a este

entendimento, uma vez que o art. 924 do Código de Processo Civil, dispõe

expressamente que as ações de força velha devem ser conduzidas consoante o rito

ordinário, sendo assim, concordamos com a doutrina que reconhece a aplicabilidade

do art. 273 as ações possessórias que envolvam posse velha. Gize-se que pelo

exposto no texto “efeitos materiais da posse” o professor afirma que este

entendimento é de difícil aplicação, porém ousamos refletir sobre o tema, uma vez

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que o entendimento do STJ, como dito anteriormente, é de que é viável a concessão

de antecipação de tutela, desde que preenchidos os requisitos.

Isso postoAssim sendo, percebemos que a dificuldade de aplicação ocorre

devido à visão estanque de alguns magistrados e/ou tribunais no tocante ao Código

Civil, pois analisam apenas o capítulo que trata das ações possessória,

inviabilizando a reflexão das questões específicas a luz de todos os dispositivos

legais, da doutrina e, principalmente, do entendimento dos tribunais superiores.

REFERÊNCIAS

MACIEL, HeribertoRoos [professor]. Efeitos da posse - texto sobre os efeitos

materiais e as ações possessórias e outras. São Leopoldo, março 2009. Disponível

em: <http://www.unisinos.br/pastanet/arquivos/0429/2884/efeitos_da_posse_-

_revisao_marco_de_2009.doc >. Acesso em: 20 abr. 2013. Informação retirada da

Pastanet, da disciplina Civil VII, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos;

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 21. ed. Vol. IV.Rio de Janeiro: Forense, 2012;

TARTUCE, Flávio. Direito civil 4. 5. ed., rev., atual. São Paulo: Método, 2013.