RESPONSABILIDADE ILIMITADA – TEORIA MAIOR E MENOR

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    RESPONSABIL IDADE IL IM ITADA TEORIA MAIOR E MENOR

    DESCONSIDERA O DA PERSONAL IDADE JURDICA

    Rejane Cristina SALVADOR

    Resumo: O presente trabalho visa anal isar a

    responsabilidade ilimitada e o instituto do da

    desconsidera o da personalidade jurdica.

    Palavras-chaves: Desconsidera o da personalidade jurdica. Responsabilidade

    A Desconsidera o da Personalidade Jurdica uma elabora o doutrinria

    relativamente recente, sendo sua origem identificada por muitos nas li es do jurista

    norte-americano Maurice Wormser que, em 1912, a definia da seguinte forma:

    quando o conceito de pessoa jurdica se emprega para defraudar os credores, para

    subtrair-se a uma obriga o existente, para desviar a aplica o de uma lei, para

    constituir ou conservar um monop lio ou para proteger velhacos ou del inq entes, os

    tribunais podero prescindir da personalidade jurdica e considerar que a sociedade

    um conjunto de homens que participam ativamente de tais atos e faro justi a entre

    pessoas reais.

    Atribui-se a Rubens Requio, em conferncia proferida na Faculdade de Direito

    da Universidade Federal do Paran, a introdu o da teoria no Brasil, afirmando que

    todos esses conceitos e preconceitos levaram o pensamento jurdico a conceber,

    sobretudo em nosso pas, a personalidade jurdica como um vu impenetrvel.

    Passou a ser vista, via de regra, como uma categoria de direito absoluto. Ora, a

    doutrina da desconsidera o nega precisamente o absolutismo do direito da

    personalidade. Desestima a doutrina esse absolutismo, perscruta atravs do vu que a

    encobre, penetra em seu mago, para indagar de certos atos dos s cios ou do destino

    de certos bens. Apresenta-se, por conseguinte, a concesso da personalidade jurdica

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    com um significado ou um efeito relativo, e no absoluto, permitindo a legtima

    penetra o inquiridora em seu mago.

    Fbio Ulhoa Coelho, em seu Curso de Direito Comercial, V. 2, afirma que se

    deve deixar bem claro que a teoria da desconsidera o da personalidade jurdica no

    uma teoria contra a separa o subjetiva entre a sociedade empresria e seus s cios.

    Muito ao contrrio visar esta teoria preserva o do instituto, em seus contornos

    fundamentais, diante da possibilidade de seu desvirtuamento vir a compromet-lo. Isto

    , a inexistncia de um critrio de orienta o, a partir do qual os julgadores pudessem

    reprimir fraudes e abusos perpetrados atravs da autonomia patrimonial poderia

    eventualmente redundar no questionamento do pr prio instituto, e no do seu uso

    indevido .

    Fabio Ulhoa Coelho divide ainda a Teoria da Desconsidera o em duas sub-

    teorias: a Teoria Maior e a Teoria Menor da Desconsidera o da Personalidade

    Jurdica. Segundo o autor, a primeira a teoria mais elaborada, de maior

    consistncia e abstra o, que condiciona o afastamento epis dico da autonomia

    patrimonial das pessoas jurdicas caracteriza o da manipula o fraudulenta ou

    abusiva do instituto , distinguindo-a de institutos jurdicos distintos, que apesar de

    tambm implicarem a afeta o de patrim nio de s cio por obriga o da sociedade, com

    ela no se confundem. Exemplo destes institutos so a responsabiliza o por ato de m

    gesto, a extenso da responsabilidade tributria ao administrador, etc.

    A segunda, de outro lado, se refere desconsidera o em toda e qualquer

    hip tese de execu o do patrim nio de s cio por obriga o social, cuja tendncia

    condicionar o afastamento do princpio da autonomia simples insatisfa o de crdito

    perante a sociedade. a Teoria Menor, que se contenta com a demonstra o pelo

    credor da inexistncia de bens sociais e da solvncia de qualquer s cio para atribuir a

    este a obriga o da pessoa jurdica.

    Infelizmente, essa a teoria que, em muitos casos, vem sendo aplicada no

    direito ptrio e contra a sua aplica o que me coloco no presente artigo. Por vezes,

    veremos que alguns juzes brasileiros, especialmente os juzes do trabalho, confundem-

    se entre os institutos da desconsidera o da personalidade jurdica e o da

    responsabiliza o dos s cios por atos ilcitos praticados na administra o da sociedade

    e demonstram desconhecer at o pr prio princpio da autonomia patrimonial da pessoa

    jurdica.

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    Recentemente a Associa o dos Advogados de So Paulo publicou uma

    pesquisa monotemtica de jurisprudncia sobre a desconsidera o da personalidade

    jurdica na justi a do trabalho, que me causou assombro no tanto pela forma e

    freq ncia com que o instituto aplicado, j conhecida de todos, mas pelos argumentos

    utilizados para a justifica o desta aplica o.

    Em julgamento proferido em 20 de maio de 2004, o Juiz Valtrcio de Oliveira,

    relatando Recurso Ordinrio 00011-2003-010-05-00-0 em ac rdo de 11.928/04,

    proferiu anlise assustadora pelo contedo e pela livre interpreta o de li o de

    Orlando Gomes, que ministra, citado pelo Juiz: Dvida no pode haver de que o

    agrupamento dos seres humanos para a realiza o de fim comum, reunindo esfor os e

    capitais, imperativo da pr pria organiza o social, como o o contrato para a

    disciplina de certos interesses.

    Conseq entemente, esse fato, que a sociedade gera, no uma abstra o, mas,

    sim, evidente realidade. O direito apercebe-se de sua existncia, e, por processo

    tcnico, possibilita a atividade social dos que se agrupam para exerc-la. Esse

    processo tcnico a personifica o. Consiste, precisamente, em atribuir personalidade

    ao grupo, para que possa exercer a atividade jurdica como uma unidade, tal como se

    fosse uma pessoa natural. A explica o aceitvel, resultando, como resulta, da

    observa o da realidade social (In Introdu o ao Direito Civil, p. 195, 1 ed.

    Universitria, Ed. Forense) (grifos meus).

    Desta li o de Orlando Gomes o Juiz retira o seguinte: A pretenso recursal

    incluir na lide, como responsveis subsidirios, os s cios da empresa reclamada. A

    irresigna o procede. Para o s cio figurar no p lo passivo da rela o processual no

    necessrio que a empresa se encontre em situa o de insolvncia. Isso porque

    pessoa jurdica atribui-se personalidade decorrente do grupo (s cios) que a comp e.

    Como se no bastasse, ementa o seu ac rdo da seguinte maneira:

    RESPONSABILIDADE DOS S CIOS Imp e-se, mesmo quando solvente a sociedade,

    pois o grupo de pessoas naturais integrante da pessoa jurdica com esta se confunde,

    constituindo-se o seu mentor e tornando tangvel a essncia dessa fic o do direito,

    conseq entemente devendo arcar com os nus trabalhistas resultantes de sua

    expresso volitiva.

    Ou seja, neste infeliz ac rdo, o citado Juiz no aplica sequer a teoria menor da

    desconsidera o da personalidade jurdica, mas desconsidera simplesmente a existncia

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    da pessoa jurdica da sociedade, afirmando, repito, que o grupo de pessoas naturais

    integrante da pessoa jurdica com esta se confunde .

    A meu ver, esta deciso no apenas ilegal, mas inconstitucional, pois a

    Constitui o Brasileira, em muitos de seus dispositivos, assevera a existncia da pessoa

    jurdica no direito ptrio.

    Em diversas das decis es analisadas verifica-se a aplica o da Teoria Menor da

    Desconsidera o da Personalidade Jurdica, visto argumentarem os juzes que a teoria

    da desconsidera o da personalidade jurdica tem aplica o no Direito do Trabalho

    sempre que no houver patrim nio da sociedade, quando ocorrer dissolu o ou

    extin o irregular ou quando os bens no forem localizados, respondendo os s cios de

    forma pessoal e ilimitada, a fim de que no se frustre a aplica o da lei e os efeitos do

    comando judicial execut rio ou que como o s cio no indicou bens livres e

    desembara ados da pessoa jurdica, pode-se dizer que o caso de aplica o da teoria

    da desconsidera o nos presentes autos , ou ainda, no possuindo bens a executada

    de forma a garantir a execu o ( ) de se manter a constri o sobre os bens

    particulares dos agravantes, nicos s cios e ambos gerentes da sociedade r,

    porquanto no clama a lei qualquer ato formal para a despersonaliza o e tampouco

    a autoriza apenas no desvio ou na fraude, autorizando, ao contrrio e igualmente, a

    desconsidera o da personalidade tambm na contingncia do insucesso pr prio do

    mercado, visto no restritiva a legisla o de regncia. (Respectivamente, TST 5

    Turma; AIRR n 22.289/2002-900-09-00.2; TRT da 2 Regio 1 Turma.; Ag. De

    Peti o em ET n 01552200305202004 SP; TRT da 15 Regio; Ag. De Peti o em

    ET n 00121-2003-004-15-00-GAP) (Grifos meus).

    Alguns juzes brasileiros, em especial os trabalhistas, parecem ignorar o fato de

    que, se for estabelecida no Brasil, como regra, a Teoria Menor da Desconsidera o da

    Personalidade Jurdica, se est, na verdade, tornando ilimitada a responsabilidade dos

    s cios ou acionistas das sociedades para com as dvidas destas, j que a simples

    ausncia de patrim nio da sociedade poder gerar o alcance do patrim nio dos s cios.

    E como no poderia deixar de ser, tornar a responsabilidade dos s cios ilimitada,

    principalmente em sociedades para cujos s cios a lei expressamente atribui limita o

    ao montante investido, acarretar um custo social imensamente maior do que o prejuzo

    causado aos credores da sociedade, ainda que trabalhistas, que no tiverem seus

    crditos honrados quando do insucesso desta.

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    Isso porque, nos dizeres de Fbio Ulhoa Coelho, o custo da atividade

    econ mica comp e o pre o a ser pago pelos consumidores ao adquirirem produtos e

    servi os no mercado. Se o direito no dispuser de instrumentos de garantia para os

    empreendedores, no sentido de preserv-los da possibilidade de perda total, eles

    tendero a buscar maior remunera o para os investimentos nas empresas. Nesse

    sentido, pode-se inferir tambm que os pr prios empregados sero prejudicados pela

    ausncia de limita o da responsabilidade dos s cios no s pelo evidente aumento na

    informalidade das contrata es, mas pelo conseq ente aumento dos custos na aquisi o

    de produtos necessrios sua sobrevivncia.

    Rubens Requio, na citada conferncia em que introduziu o tema da

    desconsidera o no direito ptrio, assevera ainda que uma das mais decisivas

    conseq ncias da concesso da personalidade jurdica, outorgada pela lei, todos o

    sabemos, a sua autonomia patrimonial, tornando a responsabilidade dos s cios

    estranha responsabilidade social, e mesmo quando se trate de s cio com

    responsabilidade ilimitada e solidria sempre ela subsidiria.

    Apesar de consagrada na doutrina e na legisla o brasileira, a autonomia

    patrimonial da pessoa jurdica em rela o ao patrim nio dos seus s cios, vem sendo

    diuturnamente vilipendiada pelos tribunais ptrios. Em recente e polmica deciso, o

    Superior Tribunal de Justi a (STJ), por maioria de votos no Recurso Especial

    279.273/SP em 4 de dezembro de 2003, decidiu conferir interpreta o aut noma ao

    pargrafo 5, do artigo 28 do C digo de Prote o e Defesa do Consumidor (CDC

    Lei 8.078/90) em rela o ao seu caput, fazendo com que os administradores, s cios

    e/ou acionistas respondam pelas obriga es da pessoa jurdica, independentemente da

    caracteriza o das situa es arroladas pelo artigo 28, caput, quais sejam: abuso de

    direito, excesso de poder, infra o da lei, existncia de ato ilcito, viola o de estatutos

    ou contrato social, bem como falncia, estado de insolvncia, encerramento ou

    inatividade sempre em virtude de m administra o. Em suma, aplicou-se a idia

    contida na denominada teoria menor da desconsidera o da personalidade jurdica .

    Essa deciso do STJ demonstra que ainda no est consolidada no pas a teoria

    maior da desconsidera o da personalidade jurdica, que a meu ver deve prevalecer, e

    que exige o cumprimento de certos e rigorosos requisitos para que a personalidade

    jurdica possa ser afastada e alcan ados os bens particulares dos s cios. Isso porque,

    conforme j dito, a aplica o da teoria menor gerar, de imediato, o aumento dos

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    custos para o desenvolvimento da atividade econ mica e, em mdio prazo, ocasionar

    um desestmulo atividade empresarial no pas, afastando investidores nacionais e

    estrangeiros, que buscaro portos mais seguros para investir seu capital.

    Com isso, fica prejudicada a atividade econ mica no pas e, certamente, ficam

    prejudicados os diversos agentes a ela relacionados que, pela aplica o da teoria menor

    com a justificativa de terem honrados os seus crditos em detrimento da limita o da

    responsabilidade de s cios e acionistas, estaro impossibilitados de exercer quaisquer

    atividades no pas, visto restar prejudicada a pr pria atividade com a qual se

    relacionavam. Este raciocnio tambm se aplica aos empregos. Se a Justi a do Trabalho

    insiste em considerar suficiente para a responsabiliza o dos s cios a ausncia de

    patrim nio das sociedades, com o aumento do custo da atividade econ mica esta

    restar reduzida e, com ela, o nmero de postos de trabalho oferecidos pelo mercado.

    REFER NCIAS BIBL IOGR` FICAS

    CASILLO, Joo. Desconsidera o da Pessoa Jur dica. Trabalho semestral

    apresentado no curso de p s-gradua o (Mestrado) da PUC de So Paulo. RT 528/24.

    COELHO, Fbio Ulhoa. Curso de Direito Comercial. 8 ed., vol. II. So Paulo,

    Saraiva, 2005.

    LUCENA, Jos Waldecy. Das Sociedades L imitadas. 5 ed. So Paulo, Renovar,

    2003.

    REQUI O, Rubens. Abuso de Direito e Fraude Atravs da Personalidade

    Jur dica. RT 410/12.

    SALOM O FILHO, Calixto. O Novo Direito Societr io. 2 ed., reformulada. So

    Paulo, Malheiros Editores, 2002.