Resenha do texto "Tradição e Modernidade" - Hannah Arendt

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Resenha do texto "Tradição e Modernidade" de Hannah Arendt, presente no livro "Entre o passado e o futuro".

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Hannah Arendt Tradio e Modernidade em Entre o passado e o futuro.

A modernidade inaugura um perodo histrico que est sempre s voltas com o problema de sua auto-certificao. Nada mais aparece como substancialmente fundamentado em um poder capaz de unificar as vrias esferas de valores sociais, a partir do momento em que a metafsica clssica alvo de dvida e desconfiana. Desde Descartes, a filosofia moderna tenta fundamentar a si mesma fora dos princpios da tradio. No pode mais procurar em outras pocas os critrios para a racionalizao e para a produo do sentido de suas esferas de valores, ela deve criar e fundamentar suas normas a partir de si mesma.No entanto, nem sempre os filsofos modernos que pensaram estar teorizando contra a tradio foram capazes de escapar das mesmas referncias tradicionais as quais criticavam. nesse sentido que Hannah Arendt desenvolve seu ensaio, procurando mostrar como Kierkegaard, Marx e Nietzsche foram trs pensadores cuja atitude em relao tradio filosfica era de rebelio consciente e arguta, porm, ao se valerem do mesmo campo conceitual tradicional, foram conduzidos s antigas contradies, tal como a oposio entre pensamento e ao. Kierkegaard, Marx e Nietzsche desafiaram os pressupostos bsicos da tradio da religio, do pensamento poltico e da metafsica conscientemente invertendo a hierarquia tradicional dos conceitos (...) sua grandeza est em terem percebido o mundo invadido por novos problemas e perplexidades que nossa tradio do pensamento era incapaz de lidar (ARENDT, p. 26-27)O que Kierkegaard queria era afirmar a dignidade da f contra a razo e racionalidade modernas, como Marx desejava afirmar novamente a dignidade da ao humana contra a contemplao histrica moderna e relativizao, e como Nietzsche queria afirmar a dignidade da vida humana contra a impotncia do homem moderno. (ARENDT, p. 30-31)

A crtica fundamental desses trs pensadores era dirigida s abstraes da filosofia e ao conceito de homem como animal racional (to caro escolstica): Kierkegaard queria afirmar o homem concreto e sofredor; Marx confirma que a humanidade do homem consiste de sua vida produtiva e fora ativa [animal laborans], que na sua forma elementar ele chama de fora-trabalho; e Nietzsche insiste na produtividade da vida, na vontade do homem e vontade de poder. (ARENDT, p. 35)

Para isso, buscaram realizar uma inverso dos conceitos tradicionais: Marx pe de ponta cabea o idealismo hegeliano; Nietzsche faz uma inverso do platonismo e sustenta uma transvalorao dos valores; Kierkegaard realiza um salto da dvida (cartesiana) para a crena. Tais operaes de inverso, no entanto, mantiveram as oposies: materialismo x espiritualismo, sensualismo x idealismo, imanncia x transcendncia. Todos eles questionam a tradicional hierarquia das capacidades humanas e se perguntam qual a qualidade especificamente humana.Se tradicionalmente a contemplao foi priorizada em detrimento da ao, pois se entendia que a verdade s poderia ser percebida mediante a observao silenciosa e passiva do mundo, na modernidade, quando no h mais em Deus a garantia de verdade, tem incio uma forte desconfiana de que as coisas no so o que aparentam ser. por isso que esses trs pensadores duvidaram das abstraes da razo para enfatizar a ao e uma nova noo de teoria, que vira a tradio de ponta cabea ao mesmo tempo em que mantm o seu quadro conceitual.