Resenha da obra O Capitalismo Tardio de João M. Cardoso de Mello

5
 1 Formação Econômica do Brasil Nome: Ricardo Leonam Borges Cartão UFRGS: 00218297 Resenha da obra O C ap i ta li sm o Tardio de João M. Cardoso de Mello As Raízes Históricas no Desenvolvimento Capitalista Latino-Americano Com características sociais e raízes históricas, sem sombra de dúvida, peculiares, os  países da América Latina refletiram em seu desenvolvimento econômico, ao longo de um demorado processo de “caminhada ao pleno modo de produção do assalariamento”,  um “certo capitalismo” (o capitalismo tardio) que, por sua vez, reflete tal peculiaridade. É com sua atenção voltada à organização social, tanto no cenário nacional quanto no mundial, previamente à análise econômica em si, que João Manuel Cardoso de Mello, através de sua formação em sociologia  pela Universidade de São Paulo, nos apresenta a sua contribuição à teorização do capitalismo tardio. O capitalismo tardio caracterizado na América Latina foi previamente abordado pela grande economista luso-brasileira Maria da Conceição Tavares em sua obra  Acumulação de Capital e Industrialização no Brasil . Tavares foi uma das mentes que, através de suas reflexões sobre a situação econômica de países periféricos, compuseram a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), instituição cujo pensamento é contestado por Cardoso de Mello. É a partir desta contestação que surge o diálogo com Tavares, entre outros pensadores,  porém com pleno reconhecimento da contribuição desta corrente para a teorização econômica acerca de países em desenvolvimento. Parecendo desconsiderar os séculos de dependência socioeconômica dos países latino- americanos (perante as economias centrais), o paradigma Cepalino nos apresenta a teoria do “crescimento para dentro”, ou seja, que os países periféricos  deveriam focalizar sua força  produtiva no desenvolvimento de um mercado interno e só assim alcançariam os níveis de desenvolvimento adequados, em oposição ao vigente “crescimento para fora”, que era caracterizado pelas economias basicamente exportadoras. Como alternativa ao modelo da CEPAL, Cardoso de Mello se propõe a um estudo reformulado sobre o desenvolvimento

description

As Raízes Históricas no Desenvolvimento Capitalista Latino-Americano; Das Raízes do Capitalismo Tardio à Industrialização Retardatária; e O Nascimento e a Consolidação do Capital Industrial

Transcript of Resenha da obra O Capitalismo Tardio de João M. Cardoso de Mello

  • 1

    Formao Econmica do Brasil

    Nome: Ricardo Leonam Borges

    Carto UFRGS: 00218297

    Resenha da obra O Capitalismo Tardio de Joo M. Cardoso de Mello

    As Razes Histricas no Desenvolvimento Capitalista Latino-Americano

    Com caractersticas sociais e razes histricas, sem sombra de dvida, peculiares, os

    pases da Amrica Latina refletiram em seu desenvolvimento econmico, ao longo de um

    demorado processo de caminhada ao pleno modo de produo do assalariamento, um certo

    capitalismo (o capitalismo tardio) que, por sua vez, reflete tal peculiaridade. com sua ateno

    voltada organizao social, tanto no cenrio nacional quanto no mundial, previamente anlise

    econmica em si, que Joo Manuel Cardoso de Mello, atravs de sua formao em sociologia

    pela Universidade de So Paulo, nos apresenta a sua contribuio teorizao do capitalismo

    tardio.

    O capitalismo tardio caracterizado na Amrica Latina foi previamente abordado pela

    grande economista luso-brasileira Maria da Conceio Tavares em sua obra Acumulao de

    Capital e Industrializao no Brasil. Tavares foi uma das mentes que, atravs de suas reflexes

    sobre a situao econmica de pases perifricos, compuseram a Comisso Econmica para a

    Amrica Latina e o Caribe (CEPAL), instituio cujo pensamento contestado por Cardoso de

    Mello. a partir desta contestao que surge o dilogo com Tavares, entre outros pensadores,

    porm com pleno reconhecimento da contribuio desta corrente para a teorizao econmica

    acerca de pases em desenvolvimento.

    Parecendo desconsiderar os sculos de dependncia socioeconmica dos pases latino-

    americanos (perante as economias centrais), o paradigma Cepalino nos apresenta a teoria do

    crescimento para dentro, ou seja, que os pases perifricos deveriam focalizar sua fora

    produtiva no desenvolvimento de um mercado interno e s assim alcanariam os nveis de

    desenvolvimento adequados, em oposio ao vigente crescimento para fora, que era

    caracterizado pelas economias basicamente exportadoras. Como alternativa ao modelo da

    CEPAL, Cardoso de Mello se prope a um estudo reformulado sobre o desenvolvimento

  • 2

    econmico da Amrica Latina, a partir de uma anlise de aspectos sociais de dependncia e

    subordinao, tanto em aspectos mercadolgicos quanto tecnolgicos da escala produtiva.

    Das Razes do Capitalismo Tardio Industrializao Retardatria

    Para entendermos como se d o processo de desenvolvimento do capitalismo em qualquer

    sociedade preciso que haja, indiscutivelmente, uma contextualizao histrica. Poderamos

    versar sobre os primrdios do que um dia viria a possibilitar o modo de produo capitalista, a

    acumulao primitiva, na tentativa de entender as razes de nosso capitalismo tardio. Entretanto,

    como dito no comeo, a histria da Amrica Latina um tanto peculiar, desde, por que no, a

    nossa migrao proveniente da sia, o que nos colocou em atraso diante da concretizao das

    civilizaes que se estabeleceram em torno do bero da humanidade; at a maneira exploratria

    pela qual fomos colonizados a partir do sculo XV. Portanto, de uma maneira peculiar, tardia,

    se preferir, que surge o capitalismo latino-americano, exposto por Cardoso de Mello com suas

    devidas especificidades.

    No primeiro captulo de O Capitalismo Tardio, o autor nos apresenta uma transio que

    ocorre na Amrica Latina, quando este continente penetra em um novo estgio de

    desenvolvimento: as economias primrio-exportadoras. Segundo o pensamento Cepalino, o

    modo de crescimento para fora a causa do surgimento desse modelo econmico. Em tal cenrio

    podemos notar a mudana de Economia Colonial, passando por um estgio transitrio de

    Economia Primrio-Exportadora at, futuramente, chegarmos Economia Mercantil-Escravista

    Cafeeira Nacional. Neste cenrio de transio, o autor abre a indagao sobre a diferena, que

    deve ser exposta para fim de anlise, entre a economia colonial e a primrio-exportadora.

    Segundo Cardoso de Mello, a diferena reside no modo de insero das economias nacionais

    latino-americanas na nova diviso do trabalho (p. 32). Aqui podemos notar sua primeira

    tendncia contrariedade acerca do pensamento Cepalino, pois a primeira evoluo em direo

    ao desenvolvimento capitalista parte de um reconhecimento dos territrios perifricos pelas

    economias centrais dominantes, antes, colnia [...] depois, Estado-Nao (p. 32), ou seja, de

    uma internacionalizao da economia.

    Diante de tal cenrio de crise da Economia Colonial nos pases Latino-Americanos, uma

    srie de fatores, como a Revoluo Industrial, a acumulao prvia do capital mercantil, a

    formao do Estado Nacional e a existncia de recursos produtivos, contriburam para, por

  • 3

    exemplo, no Brasil, o que culminaria na consolidao da economia mercantil-escravista cafeeira

    nacional e, mais tarde, no inevitvel assalariamento dos trabalhadores. No que tange a transio

    para o trabalho assalariado, fatores como a diminuio dos salrios pela alta oferta ocorrida com

    a imigrao italiana (assim como a oferta em si), a remunerao diferida, a maior, e indiscutvel

    produtividade do trabalhador assalariado etc. Entretanto, o cenrio de subordinao continuava

    caracterstico entre os pases latino-americanos e europeus.

    Acerca do processo de industrializao na Amrica Latina, as concluses devem seguir a

    mesma linha das alcanadas na anlise das razes do desenvolvimento capitalista. Tentar buscar a

    separao de ambos seria como tentar separar, assim como fez David Ricardo, a escala da

    distribuio da renda da escala da produo da mesma. Assim como o capitalismo se desenvolveu

    em situao de dependncia, o prximo estgio (o de afirmao das foras produtivas), a

    acumulao, a consequente industrializao ocorrer, por um longo perodo de tempo, de maneira

    restringida.

    A industrializao que se percebe uma mera expanso das exportaes, o que

    caracteriza uma reduzida atividade industrial. Este setor era incapaz de se alimentar por si s e se

    tornava cada vez mais dependente das naes maduras e j dominantes do mercado. Segundo a

    CEPAL, a nao deve se voltar para dentro e focar no investimento, bem como seu estmulo. Eis

    que surge, no campo do desenvolvimento industrial, a problemtica enfrentada por Cardoso de

    Mello e pela corrente Cepalina: a industrializao nacional a partir de uma situao perifrica

    (p. 101).

    diante desta problemtica que o autor expe um dos pontos mais importantes de sua

    obra em questo. Segundo Cardoso de Mello, para resolvermos a problemtica da

    industrializao a partir de uma situao perifrica, o ncleo da anlise deve ser a clara

    incompatibilidade entre um possvel desenvolvimento econmico de uma Nao dependente

    e uma diviso de trabalho que foi a responsvel pela situao de dependncia desta

    economia. Desta forma, diferentemente do que pregava a CEPAL, devemos iniciar a anlise de

    um parmetro externo (ajustes de oferta e demanda) ao invs de voltar a ateno aos aspectos

    endgenos de economias onde a acumulao , como vimos, se no ausente, precria.

  • 4

    Ao introduzir a problemtica da industrializao retardatria, o autor retoma o raciocnio

    paralelo ao nascimento das economias capitalistas exportadoras. O que se presenciou com o

    surgimento das economias primrio-exportadoras foi o nascimento do capitalismo, entenda-se

    como assalariamento, na Amrica Latina, mas no do modo capitalista de produo, pois, para

    tal, necessrio que ocorra, paralelamente ao assalariamento, o surgimento das foras produtivas

    capitalistas. A concluso lgica a que o autor nos expe de que a reproduo de maneira

    ampliada do mesmo no est assegurada no setor interno das economias dos pases latino-

    americanos, isso devido ausncia da evoluo das foras de produo, cuja natureza e ritmo

    esto determinados por um certo processo de acumulao de capital (p. 103), reforando a

    impossibilidade de uma anlise endgena com o intuito de promover o desenvolvimento do

    capitalismo industrial nestas naes.

    Partindo de economias exportadoras capitalistas nacionais em um momento em que

    naes com processo de acumulao capitalista mais antigo dominavam o mercado mundial de

    maneira monopolista, a industrializao brasileira vai se concretizar a partir de um longo

    processo, nascendo de momentos de extraordinria expanso cafeeira e de grande oferta de mo

    de obra imigrante capaz de suprir as necessidades dos setores produtivos, bem como gerar mais

    demanda por consumo.

    Continuando a anlise a partir da tica da produo brasileira, Cardoso de Mello nos

    mostra a sua subordinao, mesmo com a evoluo consequente da expanso cafeeira. Como dito

    previamente, a industrializao no Brasil ocorre de maneira restringida em vrios aspectos. A

    ausncia de indstrias de bens de produo um exemplo claro. Insuportveis (p. 119) como

    Joo Manuel Cardoso de Mello descreve os riscos do investimento privado em um capitalismo

    onde as foras produtivas no foram ainda bem estabelecidas, um capitalismo dotado de bases

    tcnicas muito estreitas (p. 119), com margens de lucro muito baixas (quando no negativas),

    cabendo ao Estado a criao de uma melhor estrutura que incentivasse o maior investimento por

    parte dos detentores do capital previamente acumulado. Em contrapartida, a indstria de bens de

    consumo se tornou mais acessvel por aspectos como simplicidade da tecnologia empregada e

    grande disponibilidade no mercado internacional.

  • 5

    O Nascimento e a Consolidao do Capital Industrial

    Este perodo de transio, que compreende o nascimento do capitalismo, com a

    culminao do trabalho assalariado e o fim da escravido em 1888 e sua consolidao com o

    incio da industrializao restringida em 1933 depois dos dois ciclos de expanso e crise do caf

    expostos por Cardoso de Mello; se estende, ainda, por muitos anos.

    Em linhas gerais, O Capitalismo Tardio apresenta, de forma clara e cientfica, aquilo a

    que se prope que revisitar a anlise acerca do desenvolvimento capitalista de pases latino-

    americanos. A leitura nos remete a ideias no somente econmicas, mas tambm sociais (de fato,

    duas cincias que se complementam). Em um cenrio de desenvolvimento capitalista desigual,

    no podemos analisar as naes como se apresentassem as mesmas condies prvias ao

    surgimento do capitalismo, especialmente em um continente que, como afirmado desde a

    introduo deste trabalho, possui caractersticas to especficas, fruto de nossa tendncia guerra

    e dominao. Um ciclo vicioso onde a periferia se encontra estagnada justamente por se

    encontrar em situao perifrica s pode ser quebrado com uma revoluo na diviso mundial

    do trabalho. Caso contrrio, as regies centrais continuam a fomentar todos os seus setores,

    enquanto a periferia global no consegue evoluir alem de setores primrios da economia.

    Apesar de deixar claro, a julgar por sua concluso, que no se caracteriza a inteno de

    usar o exemplo brasileiro para resolver o problema de outras naes da Amrica Latina, podemos

    apontar como um ponto negativo a ausncia de estudo sobre outros pases. O Brasil um pas de

    caractersticas nicas no continente, no somente pela colonizao lusitana ao invs da

    espanhola, mas tambm por condies fsicas. evidente que nenhum pas latino-americano

    possui a capacidade produtiva brasileira, tanto pela maior quantidade de fora de trabalho, quanto

    pela vastido de terras produtivas no territrio tupiniquim.

    Ricardo Leonam Borges