RESENHA CRÍTICA DA OBRA DIREITO DESPORTIVO - O PANDESPORTIVISMO E SEUS CONFLITOS: CAPS. 2, 6 E 8.

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RESENHA CRÍTICA DA OBRA DIREITO DESPORTIVO - O PANDESPORTIVISMO E SEUS CONFLITOS: CAPS. 2, 6 E 8. 1 Augusto César Pereira Sampaio do Nascimento 2 1 Trabalho para a disciplina Direito Desportivo, ministrada pelo Prof. Angelo Vargas, titular de tal cátedra, na Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro. 2 Graduando em Direito pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro – FND/UFRJ. Monitor bolsista de História do Direito, da mesma instituição e pesquisador do Laboratório de Estudos Teóricos e Analíticos sobre o Comportamento das Instituições - LETACI. Email: [email protected]

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Provocações sobre o texto abordado na obra Direito Desportivo - O Pandesportivismo e seus conflitos.

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RESENHA CRÍTICA DA OBRA DIREITO DESPORTIVO - O

PANDESPORTIVISMO E SEUS CONFLITOS: CAPS. 2, 6 E 8.1

Augusto César Pereira Sampaio do Nascimento2

Rio de Janeiro,

29/09/2014.

1 Trabalho para a disciplina Direito Desportivo, ministrada pelo Prof. Angelo Vargas, titular de tal cátedra, na Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro.2 Graduando em Direito pela Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro – FND/UFRJ. Monitor bolsista de História do Direito, da mesma instituição e pesquisador do Laboratório de Estudos Teóricos e Analíticos sobre o Comportamento das Instituições - LETACI.Email: [email protected]

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RESENHA CRÍTICA DA OBRA DIREITO DESPORTIVO - O

PANDESPORTIVISMO E SEUS CONFLITOS: CAPS. 2, 6 E 8

SUMÁRIO

I. --------------------------------------- A justiça desportiva no banco dos réus: limites

jurisdicionais;

II. ------------------------------------- Assédio Moral na Atividade Desportiva;

III. ----------------------------------- As decisões no âmbito da justiça desportiva.

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I. A justiça desportiva no banco dos réus: limites jurisdicionais3

O capítulo se inicia fazendo uma ilustração do que foi chamado pelos autores

por Caso Portuguesa, como um bom e atual exemplo de conflito de normas e princípios

que versam sobre a mesma matéria, em determinado caso concreto apreciado pela

Justiça Desportiva brasileira. Para este trabalho, analisar-se-á o questionamento da

legitimidade da jurisdição desportiva frente ao conflito Estatuto do Torcedor x Código

Brasileiro de Justiça Desportiva.

Em suma, o Caso Portuguesa consistiu no processo judicial que, através da

rigorosa aplicação do Regulamento de Competições da Confederação Brasileira de

Futebol e do Código Disciplinar Desportivo Brasileiro, retirou pontos do clube de

futebol Associação Portuguesa de Desportos no Campeonato Brasileiro de Futebol, em

decorrência da escalação irregular de um atleta em uma partida da última rodada da

referida competição no ano de 2013. Tão polêmica não seria a decisão do STJD se essa

subtração de pontos não implicasse no rebaixamento do clube para a segunda divisão do

campeonato.

Em um primeiro momento, cogitou-se a possibilidade de erro do STJD, que teria

inobservado o disposto no Estatuto do Torcedor, este produto do processo legislativo

stricto sensu, em detrimento da aplicação do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, o

qual não passou pelo processo legislativo disposto na Constituição Federal e, portanto,

possui hierarquia inferior ao diploma legislativo citado.

Se formos levar em consideração esse argumento, cairemos em um

questionamento: qual é a legitimidade do Código Brasileiro de Justiça Desportiva, uma

vez que não passou pela redação e aprovação das casas do Congresso Nacional, onde

residem os representantes do povo por excelência? Em se tratando de legitimidade, não

há ferramenta melhor a se recorrer do que a Constituição Federal, a Carta Política que

legitima política e juridicamente toda a ordem estatal vigente.

No art. 217 da CRFB, especificamente no ss. 1°, consta o contencioso desportivo

como "antecedente necessário que se interpõe, previamente com curso forçado, a

3 Capítulo 2 da obra Direito Desportivo - Pandesportivismo e seus conflitos. Redigido pelos pesquisadores Leonardo Andreotti Paulo de Oliveira e Luís Geraldo Sant'Ana Lanfredi.

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qualquer discussão a respeito da matéria relacionada com disciplina e competição

desportiva que se deseje debater no âmbito da justiça comum."4

Ora, o que poderia dar maior legitimidade à jurisdição desportiva do que a

disposição expressa desta na Constituição Federal? Conclui-se, portanto, que apesar de

o Código Brasileiro de Justiça Desportiva ser oriundo de uma Resolução5 do Poder

Executivo, não sendo assim uma lei em sentido estrito, a este é legitimado força

normativa.

Mais adiante podemos ir ao afirmarmos que a Constituição garante

exclusividade e autonomia à justiça desportiva para se manifestar prioritariamente no

que diga respeito ao desempenho das competições desportivas. Isto é, não mais caberia

à justiça comum, julgar conflitos de natureza e matéria desportiva: "A Constituição

federal, enfim, guindou o foro desportivo à condição de uma justiça especializada, não

vinculada ao Poder Judiciário, não impedindo, contudo, a possibilidade de a ele

recorrer, mas certo é que e, tema jurídico-desportivo, admitiu-o sob condições." Caberia

à justiça comum interferir nas ações da justiça desportiva, tão somente se essa última

agisse ilegalmente em algum momento.

Podemos concluir avaliando como positiva tal providência da Carta Magna.

Reflitamos: o Judiciário brasileiro hoje se encontra sobrecarregado e por conta disso

está contaminado pela morosidade. Se a este também fosse delegado julgar questões de

conflitos desportivos, muitas competições das quais o tempo de duração é curto

poderiam ter seu curso de atividades prejudicado, uma vez que não haveria previsão

para o posicionamento da justiça em relação a aplicação dos determinados direitos no

caso concreto.

II. Assédio Moral na Atividade Desportiva6

4 Direito Desportivo. cit. p. 275 Res. n° 29 - Conselho Nacional do Esporte6 Capítulo 6 da obra Direito Desportivo - Pandesportivismo e seus conflitos. Redigido pelo pesquisador Martinho Neves Miranda.

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Não se pode tratar do tema "desporto" nos dias atuais sem dar uma especial

atenção para os problemas que emanam desse fenômeno social. Esse capítulo, portanto,

trata de um desses problemas: o assédio moral, uma violação aos direitos fundamentais

do homem.

Parafraseando France Hirigoyen, o autor define assédio moral como " toda e

qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude...) que atende, por sua

repetição ou sistematização, contra a dignidade ou a integridade psíquica ou física de

uma pessoa7, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho"8.

O autor coloca o assédio moral como um problema em crescimento quantitativo

e qualitativo uma vez que este seria uma consequência da evolução do capitalismo e da

industrialização, fenômenos que supostamente fomentariam o desemprego e a

competitividade e assim tornariam o ambiente de trabalho propício para a dispersão do

assédio moral.

No âmbito do desporto, as principais práticas que configuram o assédio moral

são: (i) penas exageradas aos profissionais desportivos, cite-se o treinamento separado;

(ii) críticas públicas; (iii) limitação da liberdade de expressão; (iv) medidas indignas

impostas para a obtenção de resultado satisfatório (indução ao atleta para usar certas

drogas que melhorem seu desempenho, regimes abusivos de concentração, sobrecarga

de exercícios físicos etc.) e (v) demais conduta abusivas com finalidade estritamente de

ganho econômico.

Em se tratando de direito desportivo e combate à prática do assédio moral,

mister se faz citar o art. 34, II, da Lei Pelé (Lei 9.615/1998):

Art. 34. São deveres da entidade de prática desportiva empregadora, em especial:

II - proporcionar aos atletas profissionais as condições necessárias à participação

nas competições desportivas, treinos e outras atividades preparatórias ou

instrumentais.

Infere-se, da leitura que é dever da entidade de prática desportiva garantir o

respeito à integridade física e psíquica do atleta no exercício de suas funções

desportivas. Pode-se, portanto, classificar esse dispositivo como um importante

7 Em outras palavras, a "dignidade da pessoa humana", princípio fundamental constitucional disposto no art. 1°, III da Constituição da República Federativa do Brasil.8 Direito Desportivo. cit. p. 75.

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mecanismo que veda a prática do assédio moral por parte das entidades de prática

desportiva.

Detectada a presença do assédio moral no mundo do desporto e observado o

dispositivo na legislação pátria que veda essa prática, cabe a nós, estudantes e cientistas

do Direito enquanto fenômeno que obedece o binômio produto-produtor social,

investigar e botar em prática as melhores maneiras para que esta norma não fique retida

no plano da validade e alcance a sua plenitude no plano da eficácia. Assim sim

estaremos aptos a combater esse problema social.

III. As decisões no âmbito da justiça desportiva9

No capítulo 8 da obra em questão, o autor traça um panorama das atribuições da

justiça desportiva, tratando não apenas das suas competências como também da sua

função social.

A jurisdição do desporto busca, através de parâmetros positivistas ou

principiológicos, estabelecer os limites daquilo que é (i) ético, (ii) aparentemente ético e

(iii) de fato imoral10. Além disso, procura fiscalizar e efetivar penalidades contidas em

infrações tipificadas nas normas desportivas. Também é válido ressaltar que, uma vez

que não há um roteiro predeterminado dentro do esporte, há de se admitir que o

improviso é intrínseco a esse ramo do Direito e "por não haver, em regra,

previsibilidade fática estrita, é possível que ocorra condutas sinuosas, ofensivas, nocivas

e contrárias a moral desportiva"11, estas que devem ser combatidas.

Apesar de já positivado, o Direito Desportivo brasileiro não é codificado. Isto é,

não existe um diploma legislativo stricto sensu onde esteja unificada a legislação

desportiva do Brasil. Por conta disso, verifica-se forte presença de outros ramos do

direito na jurisdição desportiva. Merece especial destaque o Direito Civil, especialmente

na parte de obrigações, contratos e especialidade civil. Já nos ramos do Direito Público,

9 Capítulo 8 da obra Direito Desportivo - Pandesportivismo e seus conflitos. Redigido pelo pesquisador Marcio de Souza Peixoto.10 Na escrita original, o autor coloca o elemento (iii) como "amoral", ao invés de imoral. Creio, porém, que o termo mais adequado para esse caráter é "imoral", uma vez que está se tratando de valores e amoral é aquilo que é despido de julgamento valorativo, enquanto que imoral é aquilo que, mesmo que contrário aos princípios da moral vigente em determinada sociedade, recebe um julgamento valorativo para se encaixar em tal classificação. 11 Direito Desportivo. cit. p. 97.

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mister se faz citar o Direito Trabalhista, Tributário, Administrativo, Previdenciário e

também Penal.

Se, porém, para fins doutrinários se procurar fazer uma ciência própria do

Direito Desportivo, deve-se entender que este é um ramo de uma árvore chamada

Direito Constitucional e que, se dela retirado, subsistirá até seu total desaparecimento. É

à Constituição que se deve recorrer se se procurar uma base sólida para o Direito do

desporto.

Ao se observar o Art. 217 da Constituição da República Federativa do Brasil,

pode-se dividir esta em duas partes. A primeira, que estipula os deveres do Estado de

fomento à prática desportiva formal e não formal, observados os deveres subsequentes e

a segunda, que regulamenta a justiça desportiva; a participação do poder público.

A respeito desta segunda parte, separemos a leitura do ss. 1°:

§ 1º - O Poder Judiciário só admitirá ações relativas à disciplina e às

competições desportivas após esgotarem-se as instâncias da justiça desportiva,

regulada em lei.

A partir da leitura do dispositivo supra, pode-se fazer a inferência de que a

justiça desportiva é não só legítima, como também autônoma. Isto é, a ela foi delegado

exclusivamente o poder de julgar conflitos de matéria e natureza desportiva, cabendo a

intervenção da justiça comum somente quando todas as possibilidades tenham se

esgotado e o conflito não tenha sido sanado dentro da esfera desportiva, ou em casos

eventuais em que a jurisdição do desporto haja com ilegalidade

Para concluir, é válido ressaltar que não há um total afastamento das

competências dos órgãos jurisdicionais. Nítido se torna que não há afastamento absoluto

quando um conflito na esfera desportiva envolve os tão preciosos direitos fundamentais

emanados da Carta Magna de 1988.