Requalificação dos espaços públicos e edificações urbanas centrais para uma sociedade...

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Projeto urbanístico enviado para o concurso Alphaville de Urbanismo sustentável. O projeto foi desenvolvido durante a disciplina de Projeto Urbanístico 1 e posteriormente melhorado para enviar ao concurso.

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Prêmio AlphaVille de Urbanismo Sustentável – edição 2009

A cidade humanizada:

Requalificação de espaços públicos e edificações urbanas centrais para uma sociedade sustentável

Resumo A fim de resgatar uma área central, como tantas outras do país, da degradação espacial, utilizamos a sustentabilidade como mecanismo de requalificação e manutenção vital dessa área. A proposta do projeto urbanístico fomenta uma prática cada vez mais utilizada entre urbanistas, arquitetos e engenheiros: a produção de espaços públicos humanizados a partir de ações sustentáveis como o uso de materiais adequados e menos agressivos ao meio ambiente, atitudes pró-ecológicas e, principalmente, a geração de emprego e renda da área, evitando o deslocamento dos residentes a grandes percursos para a manutenção das atividades diárias e também a auto-suficiência de comércio, serviços, educação, cultura e lazer, incentivando o uso misto do solo. Localizado em um setor problemático do Bairro Centro, em Fortaleza, Ceará, a abordagem projetual engloba esses fatores já citados e justifica sua atuação pela perspectiva da sustentabilidade social, enfocando a questão residencial como um atrativo de desenvolvimento econômico.

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................3

2. CONTEXTO HISTÓRIO DA ÁREA DE INTERVENÇÃO .................................................4

3. O PROJETO .........................................................................................................................6

3.1 PROPOSTAS ..........................................................................................................6

3.1.1 GERAIS ...............................................................................................................6

3.1.2 ESPECÍFICAS ................................................................................................... 11

3.1.2.1 MATERIAIS........................................................................................ 11

3.1.2.2 DESTINO DO LIXO URBANO .......................................................... 17

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 19

5. BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................ 20

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1. INTRODUÇÃO

O termo sustentabilidade, por vezes, permanece na banalidade do uso antes mesmo de se

definir exatamente seu significado. Ser sustentável não é somente uma questão ecológica, como

reciclar o lixo ou equilibrar o gasto energético de uma edificação, mas uma questão social, na

qual contemplam a melhoria da qualidade espacial, a geração de emprego e renda na

localidade, a aproximação dos percursos residência-trabalho e a redução da circulação direta ou

indiretamente de veículos automotivos.

Seguindo as práticas da Carta do Novo Urbanismo, publicada no livro decorrente do

Congresso do Novo Urbanismo, realizado em Charlestown, Carolina do Sul - EUA, em 1996,

criar comunidades (bairros) sustentáveis em muito se relaciona em conceber núcleos

compactos, acolhedores, onde atividades cotidianas possam acontecer a uma distância tal que

todos, principalmente aqueles que não podem dirigir, como jovens e idosos, tenham acesso. A

democratização do espaço urbano, tanto para ricos, pobres ou para qualquer faixa etária,

configura uma cidade mais humanizada, promovendo o convívio entre moradores e a sua

consciência de pertencer àquele lugar. Humanizar cidades não quer dizer equipá-la de infra-

estrutura, tão somente, mas dotá-la de possíveis formas de usufruir o espaço público de modo

simples, como: sentar-se sob árvores num banco de praça, usar calçadas acessíveis exercendo o

direito de todos de ir e vir ou integrar-se à natureza, mesmo em um ambiente urbano.

Trata-se, então, nessa dissertação enfatizar a sustentabilidade pela ótica social através da

construção de um espaço dotado de várias atividades (comerciais, de serviços, de lazer,

educação e cultura) em benefício do desenvolvimento da comunidade local, contribuindo para

o bem-estar, a segurança, o convívio entre os diferentes e a auto-suficiência econômica.

Procura-se, como bem enfatiza José Eli da Veiga (1961), em seu livro “Desenvolvimento

sustentável: o desafio do século XXI”, demonstrar que tal desenvolvimento local proposto

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independe estritamente do desenvolvimento econômico e sim do diálogo entre a modernização

da elite e a eficácia de projetos sociais subjacentes. Na prática, o projeto proposto busca inserir-

se como socialmente includente, ambientalmente sustentável e economicamente sustentado no

tempo, definições que caracterizam o desenvolvimento sustentável, segundo Ignacy Sachs

(1927).

2. CONTEXTO HISTÓRIO DA ÁREA DE INTERVENÇÃO

Em meados do século XIX o local onde hoje se situa a Praça da Estação era um vasto

descampado, denominado Campo d’Amélia, que servia de campo de treinamento do exército.

Já no final desse mesmo século, esse campo sofre sua primeira transformação com a construção

da linha férrea que ligava Baturité ao Crato, regiões do interior do Ceará. Primeiro surgem o

Edifício da Estação João Felipe com o edifício da administração da estação e posteriormente,

seus galpões. Diante dessas construções pontuais, configura-se a praça como um lugar de estar

e entremeio entre quem vai e quem chega do interior do estado.

Uma terrível seca, em 1877, no interior do Ceará mobiliza milhares de migrantes a

procurar melhores condições de vida na capital e usufruir do trem como principal meio de fuga.

Dessa forma, ao chegar em Fortaleza, refugiam-se ao longo da estação. Inicialmente, por ser o

primeiro contato do sertanejo com o lugar e a falta de recursos que o impossibilita a mobilidade

e, depois, por ser uma medida do governo local de mantê-lo separado do restante da população

fortalezense, dita “saudável e superior”. Diante desse cenário, surgem as primeiras favelas de

Fortaleza: a do Pirambu e a do Moura Brasil.

Nos anos 30, com a campanha populista de industrialização promovida por Getulio

Vargas em seu governo as estações férreas nacionais foram privadas de participarem da

modernização promovida à época, o que desencadeou um longo período de decadência de tal

setor. Resultado disto foi a degradação espacial que ocorreu nos arredores de tais linhas e

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estações; como podemos verificar na Praça Castro Carreira, mais conhecida como Praça da

Estação, situada na porção central da capital cearense, tendo seu conceito original

completamente alterado, de um espaço urbano de convivência para um terminal de ônibus.

Estas modificações trouxeram péssimas conseqüências para o desenvolvimento

econômico e social da área de estudo, um quadrilátero compreendido entre as ruas General

Sampaio, Senador Alencar, Padre Mororó e a Avenida Leste-oeste, na transição do centro da

capital cearense e a orla. O crescimento da falta de segurança e da marginalidade, a ausência de

políticas públicas eficientes, a saída dos moradores do centro e o agravamento do trânsito pelo

aumento do número de veículos contribuíram cada vez mais para a desvalorização imobiliária,

cultural e relacional do local e o aumento significativo de vazios urbanos, dentre eles;

edificações abandonadas, terrenos à espera da especulação imobiliária, extensos lotes

conjugados para o uso exclusivo de estacionamentos privados e grandes áreas subutilizadas

como o pátio de manobras da Estação João Felipe.

As parcelas de residências da área são formadas pela comunidade do Bairro Moura Brasil

e por algumas casas em ruas secundárias que ainda resistem à dinâmica do local. Limitada pelo

muro que ladeia o pátio de manobras da Estação João Felipe (ver fig. 1) e a acentuada

topografia do terreno, encontra-se a comunidade Moura Brasil isolada e desconexa tanto do

centro comercial como também do acesso à praia Leste-oeste. O bairro formou-se com infra-

estrutura insuficiente e não há uma definição formal dos lotes, consequência de invasões e

irregularidades fundiárias. O desordenamento das ruas e travessas denuncia ainda mais essa

desordem espacial e também o descaso dado ao planejamento de setores da cidade, evitando a

continuidade de vias importantes de escoamento do centro em direção à praia. Ainda

observando a questão residencial, há uma notória resistência de alguns moradores tradicionais

em ocupar aquela região. Sujeitos à degradação, a insegurança do bairro, porém próximos do

local onde trabalham, acreditam e também desejam na melhoria do espaço público com o

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advento da estação metroviária inserida nas imediações. Apesar desse equipamento de

circulação, com a sua construção, estar subtraindo lojas comerciais, promovendo o abandono

de prédios históricos, estagnando vias importantes e deteriorando o espaço público

continuamente.

Figura 1. Comunidade isolada pelo muro do pátio

3. O PROJETO

3.1 PROPOSTAS

3.1.1 GERAIS

A multifuncionalidade do espaço

A proposta em questão surge a partir do interesse de solucionar, quanto ao caráter

urbanístico, o vazio urbano que surge com a retirada do pátio de manobras (ver fig. 2) da

Estação João Felipe (ver fig. 3), localizada no centro de Fortaleza, a qual atualmente é de

grande importância para a área por ser ponto convergente da integração intermunicipal.

Entretanto, o pátio resulta como segregador espacial, pois, através do seu extenso muro isola a

Comunidade Moura Brasil do restante do centro da cidade.

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Figura 2. Pátio de manobras ferroviário

Figura 3. Estação João Felipe

Assim como um dos princípios do projeto Favela- Bairro desenvolvido no Rio de

Janeiro, este projeto busca integrar a comunidade à cidade formal e oferecer melhorias na infra-

estrutura. O projeto visa à integração da comunidade implantando conceitos sustentáveis, desde

o âmbito social, através da valorização de residências, até o âmbito físico, através de materiais

e práticas utilizadas.

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A proposta busca implantar uma forma de urbanismo sustentável, onde a população

reside próximo de equipamentos de lazer e cultura, do local onde trabalha, do comércio e etc.

Dessa forma, a população está amparada pelo necessário para se manter uma boa qualidade de

vida, evitando, assim, grandes deslocamentos, utilizando veículos ou outros meios poluentes.

A comunidade sustentável tem ao seu alcance tudo o que precisa, utilizando apenas o meio

mais saudável e barato de locomoção, a caminhada.

O ponto de partida da criação dessa comunidade sustentável está na reciclagem, ou seja,

reaproveitamento de edifícios abandonados existentes no local (ver fig. 5). Esses edifícios eram

antigos galpões que serviam á rede ferroviária. É no seu entorno que se desenvolve uma praça

com diversos equipamentos que vão alimentar a comunidade e também uma praça de paradas

de ônibus, a qual estimula o acesso ao local através do uso de transportes públicos de massa

(ônibus e metrô) e que se encontra ao lado da praça desenvolvida neste projeto. A reciclagem

de edificações existentes busca diminuir gastos com construções, haja vista que gastos com

fundações e alvenarias serão evitados, e , principalmente, evita uma grande quantidade de

entulho, que seria jogado nos lixões da cidade. Sabe-se que atualmente um dos grandes

problemas ambientais da construção civil está no destino do entulho gerado pela mesma.

Portanto, a reciclagem traz além de benefícios econômicos, benefícios ambientais.

Figura 4. Edifício histórico existente a receber novo uso

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Figura 5. Edifício abandonado a ser reciclado

No local há cinco edifícios a serem reciclados (ver fig. 6). Essas edificações irão abrigar:

um posto de saúde, tendo em vista que a população local tem carência desse tipo se serviço; um

centro urbano de cultura, arte, ciência e esporte (CUCA), o qual é um projeto existente da

prefeitura de Fortaleza voltado para educação e lazer de jovens; uma escola de turismo, a qual

já possui intenção pela parte da prefeitura de ser implantada na região; um centro cultural, que

será locado no prédio histórico da antiga estação de trem e por último um museu, que será

locado em um edifício histórico tombado (ver fig. 4). Todos esses edifícios compõem a praça

que será locada no imenso pátio de manobras do trem existente.

Figura 6. Planta baixa esquemática

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O projeto prevê ainda outras infra-estruturas para o local. Por se tratar de um local que

irá congregar as pessoas das mais diversas faixas etárias, a praça irá dispor também área com

areia equipada com brinquedos infantis, área de jogos demarcados na paginação onde as peças

do tabuleiro são as pessoas, promovendo assim, maior integração entre os usuários. Há,

também, quiosques para pequeno comércio e lanchonetes, restaurante-café, banheiros públicos,

posto policial e caixas de auto-atendimento de bancos.

A praça possui, ainda, uma centralidade que é marcada pela área de eventos. Esta área

consiste em um grande pátio com bancos e arquibancadas ao redor destinados a reuniões e

festas típicas do local, como São João, festas natalinas e festivais em geral. Logo em frente à

praça, o projeto cria 29 lotes de comércio para, além de serem locais de trabalho dos moradores

da região, serem também mais um ponto de abastecimento, movimentação econômica e

geração de renda do local.

A priorização do pedestre e ciclistas é um ponto forte da proposta, uma vez que “cidades

para pedestres” é um dos princípios fundamentais para um urbanismo sustentável. Elementos

que valorizam esse aspecto são encontrados em diversos pontos da praça. A pavimentação das

vias é feita em paralelepípedo, evitando o uso comum de asfalto, que, além de super aquecer e

impermeabilizar o local privilegia o veículo. Foi previsto, também, uma área para

estacionamento de veículos, estimulando as pessoas que vem de outras áreas a se locomoverem

a pé no entorno da praça.

Faixas de pedestres elevadas são encontradas em cada esquina, tornando mais cômodo a

locomoção dos pedestres. Parte das vias são destinadas a ciclovias, as quais são devidamente

sinalizadas e pavimentadas regularmente com ladrilho hidráulico, evitando trepidação. Outro

fator que torna a locomoção dos pedestres mais agradável está nos passeios verdes. Trata-se de

um passeio com uma faixa permeável destinada a arborização com espécies nativas, bancos e

lixeiras, sendo, assim, um ponto de estadia sombreada para o pedestre que vem passando pelo

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comércio e deseja algum descanso. Além disso, o passeio possui uma área coberta em toda sua

extensão para abrigar o pedestre durante sua caminhada, protegendo-o contra o forte sol do

local ou até contra chuvas.

A diversidade de atividades na área permitirá aos usuários maior entretenimento e

integração social, criando um senso de comunidade e cidadania entre eles. A intensidade de

vida urbana aliada ao sentimento de comunidade é o primeiro passo para que as pessoas

sintam-se realmente parte de suas cidades e, como tal, responsáveis por ela. Os habitantes

passam a cuidar dos seus espaços, a reivindicar e a exercer melhor a cidadania.

3.1.2 ESPECÍFICAS

3.1.2.1 MATERIAIS

Trilho da linha férrea

Por se tratar de um pátio de manobras, a área destinada possui em torno de 5675 km de

trilhos de trem. Por ser um material extremamente resistente e de elevado potencial estrutural, o

trilho do trem foi visto neste projeto, não como mais um entulho da construção, e sim como um

elemento que será reutilizado, compondo a arquitetura do lugar. Trata-se de um trilho de perfil

leve TR 47 kg/m.

Uma parte será elevada ao nível do piso da praça, marcando, como paginação do piso,

um eixo de passagem. O restante será utilizado como estrutura (vigas e pilares) de sustentação

da coberta sobre o passeio ao longo do comércio e da coberta das paradas de ônibus.

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Telha colonial

Telha produzida de forma artesanal, bastante característica da arquitetura da região.

Facilmente encontrada em qualquer comércio de materiais de construção da cidade, apresenta

também abundante mão-de-obra para execução da coberta. Para tal execução, pode-se contratar

moradores da própria comunidade, visto que grande parte deles são pedreiros ou simplesmente

capacitados por possuírem experiência em auto-construção.

Ladrilho Hidráulico

O ladrilho hidráulico é um revestimento tradicional da cidade, sendo encontrado em

diversas construções tanto antigas, como atuais. Este material possui produção local, em uma

“fábrica” no centro de Fortaleza, sendo, portanto, gerador potencial de empregos para a

população e evitando elevados gastos com o transporte para o projeto aqui descrito, também

localizado no centro da cidade.

Figura 7. Produção manual de ladrilho

Figura 8. Máquina de prensar manual

Figura 9. Pintura do ladrilho

Figura 10. Secagem

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Trata-se de um revestimento resistente fabricado de forma bem artesanal (ver fig. 7 e 8),

praticamente sem gastos de energia e sem liberação de poluentes. Consiste numa mistura de

cimento, areia e pó de pedra em três camadas: a massa, o secante, e o pigmento (ver fig. 9).

Essa mistura é prensada e moldada numa fôrma de ferro fundido, sem necessidade de máquinas

mecanizadas, apenas através do trabalho manual. Após moldada, a peça, ainda mole, é levada à

água e dispensa qualquer processo de queima possível de liberar poluentes. Quando retirado da

água, é deixado para secar por cinco a sete dias para, só então, poder ser transportado (ver fig.

10).

Madeira certificada e concreto

Os bancos (da praça, das paradas e da calçada do comércio) serão do mesmo modelo

dos bancos de madeira existentes na atual Estação João Felipe (ver fig. 11). Por questão de

economia e durabilidade do material, optamos por fazê-lo com o corpo (pernas) em concreto e

os tacos em madeira.

Figura 11. Banco da estação João Felipe

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A madeira também será utilizada no madeiramento das cobertas das paradas e do

passeio do comércio.

Ferro

Os postes de iluminação (ver fig. 12) serão em ferro (galvanizado), fazendo referência

aos antigos postes de iluminação a gás e ao “ar” (memória) da antiga estação do lugar, o que

resgata a história do local. O ferro, para este caso, apresenta maior custo-benefício em relação

aos demais metais. Os postes receberão pintura anti-corrosiva.

Vale ressaltar que o ferro, além de ser um material resistente, pode ser reciclado. Sua

oxidação (ferrugem) representa a volta do ferro à natureza, sendo um processo útil para a

reciclagem do material.

Figura 12. Modelo 3D do poste de iluminação

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Tijolo adobe com fibra de coco

O tijolo de adobe é produzido com terra-crua. A construção com tijolos de terra-crua

data da antiguidade, e hoje tem sido uma alternativa utilizada para construções de interesse

social.

Os tijolos de adobe apresentam diversas vantagens:

• econômica, devido a matéria-prima ser abundante e de custo baixíssimo;

• energética, pois a utilização da terra dispensa a queima de qualquer combustível;

• sócio-cultural, pois, além de reduzirem o custo da obra, o próprio usuário pode

participar da execução do tijolo e da obra, uma vez que se trata de um trabalho

artesanal;

• e o desempenho físico do material: edificações em terra crua possuem

comprovadamente excelente conforto térmico e acústico.

Uma inovação a essa técnica é o acréscimo da fibra de coco verde ao adobe, o que

confere maior resistência ao tijolo. Essa, porém, não é a única vantagem da utilização do coco.

Sua importância se deve ao fato de que cerca de 85% do peso bruto da matéria-prima(coco) que

é processada representa lixo, podendo tornar-se fator de inviabilização das atividades de

processamento. Atualmente, este material é de difícil descarte, sendo enviado para lixões e

aterros sanitários. A casca do coco verde é o mais importante resíduo gerado em cidades

turísticas do litoral brasileiro, sendo de difícil manuseio no acondicionamento e transporte e

representando uma fonte poderosa de proliferação de ratos, baratas e outros insetos vetores de

inúmeras doenças. As cascas levam aproximadamente oito anos para se degradar e estima-se

ainda que 70% de todo o lixo gerado no litoral dos grandes centros urbanos do Brasil são

cascas de coco verdes, as quais, em Fortaleza, somam 9% dos resíduos sólidos domiciliares.

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Uma avaliação mecânica realizada, em 2005, pelo Grupo de Pesquisa em Agropecuária,

Meio-Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Universidade Federal do Ceará (UFC),

verificou, por meio do ensaio de resistência à compressão simples, que os tijolos de adobe com

10% em volume de fibras apresentam-se como alternativa viável para substituir tijolos

convencionais de vedação, pois obtiveram resultado muito próximo a 1 MPa de acordo com a

norma NBR 7171/92 para os blocos cerâmicos empregados em paredes de vedação.

Apesar do custo dos tijolos de adobe produzidos com fibra de coco verde ser superior

aos tijolos de adobe sem fibras, aqueles tem características físicas e ambientais muito mais

desejáveis do que estes.

Piso drenante

Cobertas de asfalto, as cidades se tornam impermeáveis, cabendo aos bueiros receber a

maior parte da água da chuva. Frequentemente, ocorrem casos em que os bueiros não agüentam

o fluxo e transbordam, alagando as ruas da cidade.

Visando valorizar o solo e permitir a permeabilidade da água para o lençol freático,

optamos utilizar um piso drenante. Esse piso é composto por camadas de pedras, pedriscos,

manta permeável e areia grossa. Sobre essas camadas colocam-se blocos pré-moldados de 40 x

40 cm, feito com uma primeira camada de concreto granulado e a segunda de concreto

granulado e fibra de coco, que aumenta a resistência e a flexão do material.

Segundo Benedito Abbud, arquiteto paisagista que desenvolveu esse tipo de piso, se

esse piso drenante fosse usado em todas as calçadas da cidade de São Paulo - cerca de 72

milhões de m² segundo a Secretaria da Coordenação das Subprefeituras - seria drenado o

equivalente a 120 piscinões iguais ao da Praça Charles Miller, com capacidade de 75 mil m³,

comprovando a eficácia ambiental desta pavimentação.

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Produzido em uma indústria em São Paulo, o uso do bloco drenante em Fortaleza vai

contra um dos princípios da sustentabilidade, que prioriza o uso de materiais locais, evitando o

gasto com transporte, assim como poluição, visto que os veículos transportadores também são

fontes de poluição. Entretanto, sua capacidade de drenar mais de 90% da água que cai em sua

superfície, foi considerada um enorme benefício frente à desvantagem do processo de

transporte. Esses benefícios estão na possibilidade de: reduzir alagamentos, visto que assim

como São Paulo, ocorrem alagamentos em diversas vias da cidade; adquirir mais água para o

lençol freático, permitindo, assim, a possibilidade de poços artesanais e evitando o desperdício

de água; mais um uso para a fibra do coco, material o qual já foi explicitado suas vantagens de

uso anteriormente neste projeto (tijolo adobe com fibra de coco). Devido à simplicidade dos

materiais envolvidos e a disponibilidade local de ambos para a fabricação deste piso, não se

descarta a possibilidade de haver uma demanda local para sua produção, fazendo com que

empresários despertem interesse para a região ou até mesmo facilitando sua produção em

canteiro na própria obra.

3.1.2.2 DESTINO DO LIXO URBANO

O lixo vem, cada vez mais, sendo alvo de temáticas sobre o ambiente. Sabe-se que um

brasileiro produz cerca de 500g a 1 kg de lixo por dia. Diante dessa situação é inaceitável que a

população como um todo não passe a tomar providencias e tratar o lixo de forma diferente. Os

benefícios gerados pela reciclagem do lixo são diversos, como:

• Diminui a exploração de recursos naturais;

• Reduz o consumo de energia;

• Diminui a poluição do solo, da água e do ar;

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• Prolonga a vida útil dos aterros sanitários;

• Possibilita a reciclagem de materiais que iriam para o lixo;

• Diminui os custos da produção, com o aproveitamento de recicláveis pelas indústrias;

• Diminui o desperdício;

• Diminui os gastos com a limpeza urbana;

• Cria oportunidade de fortalecer organizações comunitárias;

• Gera emprego e renda pela comercialização dos recicláveis.

Atualmente, muitas famílias sobrevivem com o dinheiro vindo do lixo, através da

triagem e venda de produtos recicláveis encontrados nos lixos. Várias associações de catadores

de lixo já atuam em Fortaleza, entretanto, sabemos que não são suficientes para a demanda de

lixo produzido.

Neste cenário o projeto contempla a implantação da coleta seletiva na comunidade

através da criação de um Posto de Entrega Voluntária (PEV). Este posto, além de servir a

comunidade, serve como um posto de entrega de materiais recicláveis de pessoas de toda a

cidade que desejem dar um destino correto ao seu lixo. A comunidade vende para indústrias

interessadas o lixo reciclável coletado, possuindo, assim, mais uma fonte de emprego e de

renda.

Para isso, é necessário ocorrer primeiramente um trabalho de conscientização e

capacitação dos moradores, e ainda adicionar uma política de oficialização, dos atuais

ambulantes, com placas de registro, normas de conduta e regras de atuação na cidade e nos

bairros, mostrando a importância de se reciclar lixo e o retorno que isso traz para a comunidade

e o ambiente. Para essa coleta se concretizar, a praça abriga um quiosque de coleta e um espaço

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para depósito deste material, onde os mesmos ficam guardados até se juntar a quantidade

suficiente para venda. No entorno também são encontradas lixeiras apropriadas para a coleta

seletiva.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Projetar com qualidade, amparado nos pressupostos da sustentabilidade, traduz a

preocupação apresentada pela equipe em todas as etapas da produção do espaço. Fatores como

a escolha da área de interferência do projeto, o modo como a comunidade iria ser afetada, a

observação da vida cotidiana dos usuários dessa área, a possibilidade de reciclagem de edifícios

antigos adequando aos novos usos, o uso recorrente de materiais tradicionais da região evitando

degradações ambientais desnecessárias e principalmente, a promoção da requalificação da área

escolhida visando um bem comum, mostram a possibilidade de trabalhar um espaço urbano

visando primordialmente o respeito à natureza e como consequência, ao homem.

Diante disso, um passo adiante na inovadora concepção projetual alia, em qualquer

circunstância e todas as etapas da produção do espaço urbano, os ideais e as boas práticas de

um produto final sustentável, coerente com a realidade da região afetada.

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5. BIBLIOGRAFIA

ROGERS, Richards e GUMUCHDJIAN, Philip. (2001) Cidades para um pequeno planeta. 1ª Edição, Editorial Gustavo Gili AS. Barcelona, 2001.

VEIGA, José Eli. Desenvolvimento Sustentável; O Desafio do Século XXI. Rio de Janeiro:

Editora Garamond, 2005.

SACHS, Ignacy. Caminhos para o desenvolvimento sustentável. Rio de Janeiro: Editora

Garamond, 2002.

Calçada drenante. Revista Téchne n°152, novembro 2009. Editora Pini

CHAVES, Gylmar. VELOSO,Patrícia. CAPELO, Peregrina (org.). Ah, Fortaleza! Fortaleza-Ce:

Terra da Luz Editorial, 2006.

SOARES, Raquel; SILVA, Adeildo e PINHEIRO, José César. Tijolos de terra crua

estabilizados com fibras de coco verde: alternativa para habitação de interesse social. Julho 2008.

Acessado em 20 de dezembro de 2009. http://www.sober.org.br/palestra/9/741.pdf O Rio de Janeiro e o Favela-Bairro. Rio estudos n°120. Setembro 2003.Acessado em: 27 de

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Acessado em 5 de dezembro de 2009. http://www.vitruvius.com.br/minhacidade/mc011/mc011.asp