Representações Das Línguas Estrangeiras

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Universidade de Aveiro Ano 2010 Departamento de Educação SÓNIA HELENA DA COSTA SOUSA ALMEIDA REPRESENTAÇÕES DAS LÍNGUAS ESTRANGEIRAS DOS ALUNOS DE LRE DA UA

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Social Representations and Langauge Education

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  • Universidade de Aveiro Ano 2010

    Departamento de Educao

    SNIA HELENA DA COSTA SOUSA ALMEIDA

    REPRESENTAES DAS LNGUAS ESTRANGEIRAS DOS ALUNOS DE LRE DA UA

  • Universidade de Aveiro Ano 2010

    Departamento de Educao

    SNIA HELENA DA COSTA SOUSA ALMEIDA

    REPRESENTAES DAS LNGUAS ESTRANGEIRAS DOS ALUNOS DE LRE DA UA

    Dissertao apresentada Universidade de Aveiro para cumprimento dos requisitos necessrios obteno do grau de Mestre em Cincias da Educao rea de especializao em Formao Pessoal e Social, realizada sob a orientao cientfica da Professora Doutora Ana Paula Pedro, Professora Auxiliar do Departamento de Educao da Universidade de Aveiro

  • O jri

    Presidente Professora Doutora Paula ngela Coelho Henriques dos Santos professora auxiliar do Departamento de Educao da Universidade de Aveiro

    Professora Doutora Rosa Porfiria Bizarro Monteiro dos Reis Soares professora auxiliar da Faculdade de Letras da Universidade do Porto

    Professora Doutora Ana Paula da Silveira Simes Pedro professora auxiliar do Departamento de Educao da Universidade de Aveiro

  • Agradecimentos

    Professora Doutora Ana Paula Pedro, pelas crticas e sugestes relevantes feitas durante a orientao, e pela disponibilidade sempre revelada. minha famlia, pelo apoio incondicional que me deram, em especial ao Rui e ao Afonso, minha irm Ana Rita por estar sempre ao meu lado quando eu precisava e minha saudosa av, que partiu no final deste percurso, pelo exemplo de vida, fora e coragem que sempre me transmitiu. Aos meus colegas do Mestrado, pela excelente relao pessoal que desenvolvemos e pela ajuda e intercmbio de ideias e informao que trocamos para a elaborao deste trabalho, em especial Clia, Ana Paula e Marta. Aos meus amigos, que sabem bem quem so, que me foram perguntando pelo trabalho, que me foram estimulando e que de uma maneira ou de outra me ajudaram a acreditar que era possvel chegar ao fim deste percurso com sucesso. Deixo tambm uma palavra de agradecimento aos professores do Departamento de Lnguas e Culturas que me ajudaram na aplicao do questionrio e em especial aos alunos do 1 ciclo de Lnguas e Relaes Empresariais que o realizaram, pois sem eles, este trabalho no seria possvel. Por fim gostaria de agradecer a todas aquelas pessoas que me incentivaram e cooperaram directa ou indirectamente para a concretizao deste trabalho. A todos, os meus sinceros agradecimentos.

  • Palavras-chave

    Representaes, multiculturalismo, multilinguismo, diversidade lingustica e cultural.

    Resumo

    O presente trabalho surge com o objectivo principal de identificar e analisar as representaes que os alunos do Ensino Superior (curso de Lnguas e Relaes Empresariais, da Universidade de Aveiro) possuem das Lnguas e Culturas Estrangeiras, e verificar o seu papel influenciador no processo de ensino e aprendizagem de uma lngua e cultura estrangeira. Tendo em conta que estamos integrados num mundo cada vez mais globalizado a vrios nveis (poltico, cultural, social, econmico), as barreiras culturais e lingusticas tendem a esbaterem-se, pelo que fundamental a formao de pessoas preparadas para os desafios de uma cidadania mundial. Neste sentido, as instituies de ensino superior desempenham um papel fundamental na promoo do multiculturalismo e do multilinguismo. Este estudo focou-se nas representaes lingusticas e culturais dos alunos da licenciatura em LRE, da Universidade de Aveiro, uma vez que este curso direcciona-se fundamentalmente para o ensino de lnguas e consideramos que a aprendizagem de uma lngua muito mais do que saber vocabulrio. Saber uma lngua conhecer uma cultura e o mundo, educar para uma cidadania global, multicultural e multilinguistica. Aps um estudo exploratrio junto de uma amostra de 110 alunos, no qual foi utilizado um inqurito por questionrio, os resultados mostraram que os alunos inquiridos detm uma viso fortemente institucionalizada da aprendizagem de lnguas e culturas estrangeiras. Deste modo, possvel estabelecer uma relao de favorecimento de aprendizagem de LE, ou seja, segundo a representao que o aluno tem de determinada LE, esta influenciar o seu processo de ensino-aprendizagem. O contexto familiar, bem como o conhecimento acadmico dos progenitores, entre outros agentes, podem ser factores determinantes para a criao/aquisio e formao de uma representao lingustica e cultural. Quanto maior o conhecimento de diferentes representaes, maior a flexibilidade abertura lingustico-cultural e consequente enriquecimento pessoal.

  • Keywords

    Representations, multiculturalism, multilingualism, linguistic and cultural diversity.

    Abstract

    The main goal of this work is to identify and analyze the representations that students in Higher Education (course of Languages and Business at University of Aveiro) have about Foreign Languages and Cultures, and to verify their influential role on the teaching and learning process of a foreign language and culture. Given the fact that we live in an increasingly globalized world at various levels (political, cultural, social, economic), the cultural and language barriers tend to blur, therefore it is essential to train people to be prepared for the challenges of a world citizenship. In this sense, higher education institutions play a key role in promoting multiculturalism and multilingualism. This study focused on linguistic and cultural depictions of the undergraduate students in LRE, University of Aveiro, since this course is directed primarily to language teaching and we believe that learning a language is much more than knowing vocabulary. Knowing a language is to know the culture and the world and to educate for global, multicultural and multilingual citizenship. After an exploratory study within a sample of 110 students, in which a survey by questionnaire was conducted, results showed that the enquired students hold a strongly institutionalized view about the learning process of foreign languages and cultures. Thus, it is possible to establish a relationship of learning facilitation of FL, ie, the students representation about a particular FL will influence both the process of teaching and learning. The family context as well as the academic knowledge of the parents, and other agents, can all be determining factors for the creation / acquisition and development of a representation of a language and culture. The greater the knowledge of different representations, the greater the flexibility leading towards a linguistic and cultural openness.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    I

    ndice O Jri

    Agradecimentos

    Resumo

    Abstract

    Lista de Tabelas .... III

    Lista de Grficos .. III

    Introduo ... 1

    1. Colocao da problemtica ...... 2

    2. Justificao e pertinncia do tema de investigao . 3

    3. Objectivos do estudo ... 4

    4. Hipteses sobre o tema de investigao .. 5

    5. Delimitao do estudo . 5

    6. Metodologia .

    5

    Captulo 1- Multilinguismo e multiculturalismo, hoje 7

    1.1. A sociedade multilinguista e multicultural: que desafios? ... 7

    1.2. As lnguas como veculo de identidade (multi)cultural 11

    1.3. As lnguas como factor de edificao da cidadania .. 15

    1.4. Esteretipos e lnguas .......

    17

    Captulo 2 O ensino-aprendizagem de Lnguas Estrangeiras . 21

    2.1. O ensino-aprendizagem de Lnguas Estrangeiras no Ensino Superior

    Universitrio

    21

    2.2. Factores envolvidos na aprendizagem de Lnguas Estrangeiras .. 23

    2.2.1. Lngua como objecto de ensino e aprendizagem .. 24

    2.2.2. Percepo da lngua como objecto afectivo e grau de

    proximidade e distncia entre as lnguas

    24

    2.2.3. Lngua como instrumento de construo das relaes

    interpessoais/intergrupais ...

    25

    2.2.4. Relao de poder e necessidade de desenvolvimento econmico

    ou profissional

    26

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    II

    Captulo 3 Teoria das Representaes Sociais .. 29

    3.1. Representao Social: definio de um conceito . 29

    3.2. Representaes sociais face s lnguas e culturas: sua influncia no

    ensino-aprendizagem ..

    32

    Captulo 4 - Metodologia do estudo .. 37

    4.1. Contexto de interveno ... 37

    4.2. Metodologia de investigao 38

    4.2.1. Anlise e discusso dos resultados ... 39

    4.2.1.1. Caracterizao da amostra 39

    4.2.1.2. Biografia lingustica . 40

    4.2.1.3. Lnguas em estudo 46

    4.2.1.4. O que pensa de .

    52

    Captulo 5 - Consideraes finais .. 65

    5.1. Principais concluses retiradas do estudo 65

    5.2. Limitaes do estudo

    67

    Bibliografia ..

    69

    Anexos

    Anexo 1: Inqurito por questionrio

    Anexo 2: Figuras

    Anexo 3: Tabelas

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    III

    Lista de Tabelas

    Tabela 1: Lnguas contactadas em contextos formais e no formais de

    aprendizagem ...

    45

    Tabela 2: Razes para aprender uma outra lngua .. 48

    Tabela 3: O que pensam das lnguas .. 53

    Tabela 4: O que pensam dos povos (os mais citados) 57

    Tabela 5: O que pensam dos povos (os menos citados) .

    60

    Lista de Grficos Grfico 1: Residncia num pas estrangeiro ... 40

    Grfico 2: Escolha da LE1 no 5 ano de escolaridade 41

    Grfico 3: Escolha da LE2 no 7 ano de escolaridade 42

    Grfico 4: Lnguas que gostariam de aprender ... 47

    Grfico 5: Lngua mais importante . 49

    Grfico 6: Lngua menos importante .. 50

    Grfico 7: Lngua mais fcil ... 51

    Grfico 8: Lngua mais difcil 51

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    1

    INTRODUO

    Actualmente, vivemos um perodo de profunda mudana social. No podemos alhearmo-

    nos, de todo, desta realidade multicultural (Pires, L. & Pedro, A. P. 2007). A diversidade lingustica

    e cultural intensa e constante (Fontoura, 2005), o que proporciona um contacto permanente e

    inevitvel com lnguas e culturas estrangeiras. Saber dialogar em diversas lnguas uma

    proeminncia para sujeitos, empresas e organizaes. Estimula a criatividade, possibilita acabar

    com esteretipos culturais e impulsiona maneiras de pensar diferentes (Orban, 2008).

    A aprendizagem de uma lngua estrangeira (LE) implica o estudo do seu contedo cultural,

    isto , a ligao existente entre lngua e a sua cultura dever ser includa no processo de ensino-

    aprendizagem da lngua (Kramsch, 1998). Incluir o estudo da cultura leva, nomeadamente, a uma

    melhor conscincia de si prprio (e do Outro) e da sua identidade (Candelier et al, 2004).

    Aprender uma nova lngua passa por construir uma representao da lngua e dos seus

    falantes. Essa representao, desenvolvida atravs das interaces, surge de vrias formas,

    nomeadamente, de contactos lingusticos e interculturais e de experincias vividas.

    Moscovici (1969: 28) afirma que, a representao social um corpus organizado de

    conhecimentos e uma das actividades psquicas graas s quais os homens tornam inteligvel a

    realidade fsica e social, inserem-se num grupo ou numa ligao quotidiana de trocas e liberam os

    poderes de sua imaginao.

    Segundo Jodelet (1989:31), ns temos sempre a necessidade de saber a que nos devemos

    agarrar no mundo que nos rodeia. preciso ajustar-se bem a ele, orientar-se nele, control-lo

    psiquicamente ou intelectualmente, identificar e resolver os problemas que ele pe. por esta

    razo que fabricamos as representaes. Partindo do pressuposto que qualquer aluno possui,

    antes mesmo de iniciar o estudo de determinada cultura, referncias acerca dela, torna-se

    necessrio identificar essas representaes "iniciais". Aps a identificao dessas representaes

    proceder-se- anlise das mesmas, quanto ao modo como foram construdas e interiorizadas para

    que, posteriormente, se actue mais eficazmente no processo de aprendizagem de uma lngua e

    cultura. Como professores permitir-nos- auxiliar activamente os aprendentes de Lnguas

    Estrangeiras (LE), de modo a facilitar ou tornar menos complexo o processo de ensino e

    aprendizagem de LE.

    Este estudo tem por objectivo identificar e descrever as representaes que um grupo de

    alunos do Ensino Superior da Universidade de Aveiro (UA) tem das Lnguas Estrangeiras, no

    sentido de estabelecer uma relao entre as representaes que os aprendentes de lnguas detm e a

    vontade/facilidade/importncia que o aprendente d a determinada(s) LE, quer atravs de contactos

    ao longo das suas vidas, quer atravs do percurso escolar e/ou contactos pessoais. Pretende-se,

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    2

    ainda, apurar quais os factores que levam os alunos a construrem as suas prprias representaes

    em todo este processo.

    A dissertao encontra-se organizada em cinco captulos. O primeiro captulo, centrarar-se-

    nas questes ligadas ao multilinguismo e multiculturalismo nos dias de hoje, visto que

    consideramos que visivel um mundo cada vez mais em expanso cultural face globalizao e a

    diversidade que desta advm, exigindo mudanas e adaptaes quer do indivduo, quer do mundo

    que o rodeia. No captulo 2, apresentar-se- o ensino-aprendizagem de LE no Ensino Superior

    Universitrio, e quais os factores envolvidos na aprendizagem de LE, de modo a tentarmos

    contextualizar a aprendizagem de LE no Ensino Superior e percebermos o que poder influenciar

    este processo de ensino e aprendizagem. O captulo seguinte, ser dedicado s representaes

    sociais face s LE, visto que, uma das questes chave desta investigao encontra-se relacionada

    com a influncia das representaes que o indivduo detm, neste sentido procurar-se- definir a

    natureza das representaes, bem a sua construo e qual a influncia destas no individuo

    aprendente de LE. No captulo 4, damos a conhecer a metodologia de investigao escolhida, o

    instrumento de recolha de dados utilizado, a anlise e discusso dos dados obtidos, bem como as

    concluses que retiramos acerca das representaes e factores que influenciam a aprendizagem de

    lnguas. No ltimo captulo, mostraremos as principais concluses retiradas do estudo e quais as

    possveis limitaes do mesmo.

    1. Colocao da problemtica Nos nossos dias, imprescindvel que a investigao v ao encontro das necessidades da

    sociedade, pois la recherche est partie intgrante de la socit et ses intrts sont ceux de la

    socit tout entire (Fijalkow, 2000: 27).

    O facto de estarmos num mundo, que nos parece cada vez mais globalizado nos vrios

    domnios (social, econmico, poltico e cultural), reporta para a necessidade dos indivduos estarem

    sensibilizados, preparados e abertos ao Outro. Entende-se que a abertura, a curiosidade, o

    conhecimento e o contacto com outras lnguas e culturas podero contribuir para nos conhecermos

    melhor, a ns mesmos e aos outros, compreendendo o mundo, promovendo a solidariedade e a

    tolerncia entre os povos, criando uma sociedade mais aberta (Bizarro, 2007).

    O nosso contacto com lnguas e culturas estrangeiras permanente e quotidiano, quer seja

    atravs dos mdia, da escola, da famlia, dos produtos que consumimos, considerando que atravs

    de todos estes contactos quotidianos e ininterruptos que possumos ou construmos representaes,

    fundadas em preconceitos e esteretipos. Partimos do pressuposto que so essas representaes que

    condicionam a aprendizagem de uma LE pois, como afirma Moore (2001: 9), les images et les

    conceptions que les acteurs sociaux se font dune langue, de ce que sont ses normes, ses

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    3

    caractristiques, son statut au regard dautres langues, influencent largement les procdures et les

    stratgies quils dveloppent et mettent en uvre pour apprendre cette langue. Neste sentido,

    importante fazer emergir as representaes, a fim de identificar os factores que esto na base do seu

    processo de construo. Deste modo, o professor poder auxiliar o aluno a abordar e a apreender

    lnguas e culturas de outra forma, facilitando, assim, a sua aprendizagem (Castelloti & Moore,

    2002).

    Os esteretipos tm uma funo determinadora da identidade social, de modo que auxilia o

    indivduo a situar-se na sociedade ou grupo e a definir a sua posio em relao ao Outro:

    Esteretipos so imagens-rtulos que pessoas de um grupo/cultura atribuem s pessoas de outro

    grupo / cultura baseadas em argumentos no comprovados (Cardoso, 2001: 31), por isso,

    necessrio identificar os esteretipos que os alunos constroem em relao s Lnguas e outras

    culturas, para o seu sucesso do ensino e aprendizagem.

    Estando os alunos, neste caso os alunos do Ensino Superior, integrados num contexto

    europeu engrandecido e cada vez mais diverso, fulcral que desenvolvam atitudes conducentes a

    uma maior abertura para com outras lnguas e culturas, para uma melhor compreenso e respeito

    pelo Outro, logo, primordial os alunos conhecerem, para alm da sua lngua e cultura, outras

    lnguas e culturas. O saber lnguas e culturas estrangeiras facilita a integrao, bem como o

    desenvolvimento pessoal, social e econmico do indivduo, e por sua vez da sociedade.

    2. Justificao e pertinncia do tema de investigao Toda a investigao exige organizao e planificao, capazes de conduzir a uma meta

    pr-estabelecida.

    Para a elaborao deste estudo, partimos do princpio que identificar e descrever as

    representaes face s lnguas estrangeiras, bem como conhecer os factores que esto na origem

    das suas representaes, permitir intervir sobre elas, a fim de desenvolver nos sujeitos/alunos

    competncias1 para gerir a diversidade de lnguas e culturas. Reflectindo, verificamos que o

    contacto com membros de outras culturas j no uma hiptese remota que poder ocorrer num

    futuro distante, pelo contrrio, uma realidade cada vez mais frequente.

    O nosso interesse pela temtica aqui proposta prende-se por vrias razes. Como

    professora de lnguas, fundamental conhecer e compreender de que maneira as representaes dos

    alunos tm influncia na aprendizagem de lnguas, como condicionam as suas atitudes e

    comportamentos face a estas. Do mesmo modo, importante perceber se o processo de ensino e 1 Segundo o Quadro Europeu Comum de Referncia para as Lnguas Aprendizagem, Ensino, Avaliao (Ministrio da Educao/Gaeri 2001: 34-35) A competncia lingustica inclui os conhecimentos e as capacidades lexicais, fonolgicas e sintcticas, bem como outras dimenses da lngua enquanto sistema, independentemente do valor sociolingustico da sua variao e das funes pragmticas e suas realizaes. Esta componente, considerada aqui do ponto de vista de uma dada competncia comunicativa em lngua de um indivduo, relaciona-se no apenas com a extenso e a qualidade dos conhecimentos (), mas tambm com a organizao cognitiva e o modo como este conhecimento armazenado () e com a sua acessibilidade ().

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    4

    aprendizagem de uma Lngua Estrangeira reconhecido pelos alunos como o conhecimento no s

    de uma Lngua, como tambm de toda a cultura que a envolve. Ainda tendo como referncia a

    prtica docente, fundamental identificar a influncia da aprendizagem de Lnguas Estrangeiras

    nos ciclos de ensino inferiores, nas escolhas presentes destes alunos.

    Como afirma Moscovici (1981: 34), estamos dans 1re des reprsentations; por

    consequncia, torna-se indispensvel identificar as representaes, dando conta dos factores que

    interferem no seu processo de construo, visto que a sua anlise demonstra como so

    indispensveis na compreenso da dinmica social. , precisamente, esta a principal preocupao

    que est na base do trabalho que pretendemos desenvolver, uma vez que do nosso ponto de vista, a

    diversidade lingustica e cultural constitui-se como um preceito para a criao de sociedades mais

    justas e inclusivas. Assim, possvel com este projecto corroborar o papel da escola/universidade

    na criao de representaes das lnguas e culturas, percebendo a organizao dessas

    representaes que permitem ao interveniente, no acto de ensino/aprendizagem, intervir sobre elas.

    Deste modo, poderemos desenvolver uma maior consciencializao face ao processo de ensino-

    aprendizagem no indivduo, tornando-o disponvel para futuras experincias lingusticas e culturais.

    3. Objectivos do estudo Partindo do princpio de que qualquer investigao altamente condicionada pela sua

    finalidade (Pardal & Correia, 1995: 26), na medida em que pretende alcanar uma meta, ser

    fundamental traar, desde logo, um conjunto de objectivos a atingir. Segundo Vaz Freixo (2009:

    164), pode tratar-se de explorar, de identificar, de descrever, ou ainda de explicar ou de predizer

    tal ou tal fenmeno. Assim sendo, no presente estudo, procuramos identificar, descrever e analisar

    as representaes que os alunos do Ensino Superior (curso de Lnguas e Relaes Empresariais, da

    Universidade de Aveiro) possuem das Lnguas Estrangeiras.

    Assim, de acordo com a problemtica de investigao, este estudo tem como objectivos

    gerais principais:

    Identificar, descrever e analisar as representaes que os alunos possuem das LE em estudo

    e detectar possveis esteretipos;

    Identificar os factores envolvidos na criao das representaes no ensino-aprendizagem de

    LE, nomeadamente, factores lingusticos, culturais e econmicos;

    Verificar e constatar de que forma as representaes das LE, presentes no percurso

    acadmico do aluno, se relacionam com as suas histrias pessoais e acadmicas.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    5

    4. Hipteses sobre o tema de investigao Apoiando-nos em Pardal & Correia (1995: 14), uma investigao deve apresentar, logo

    no incio, uma hiptese hiptese trabalho. Tal hiptese no precisa de ser rgida e imutvel.

    Assim sendo, com este estudo e partindo das vivncias dos alunos e dos seus trajectos escolares

    pretende-se, encontrar resposta para as seguintes questes:

    Tomando especial ateno ao papel da escola e construo de representaes,

    possvel relacionar as histrias pessoais dos alunos com as escolhas efectuadas no seu

    percurso escolar, relativamente s LE?

    Podero os factores lingusticos, culturais e econmicos estar na base do processo de

    construo de representaes?

    Ser possvel estabelecer, atravs da caracterizao das representaes associadas s

    Lnguas e Culturas Estrangeiras, uma relao de favorecimento de aprendizagem de LE?

    5. Delimitao do estudo Para a realizao deste estudo, seleccionou-se como populao-alvo, os alunos da

    licenciatura de Lnguas e Relaes Empresariais, da Universidade de Aveiro, dos 1, 2 e 3 anos.

    As razes de escolhemos este curso, incidem sobre o facto de ser: i) o nico curso que estuda um

    maior nmero de lnguas estrangeiras; ii) um curso que alia o domnio das lnguas e o

    conhecimento das culturas globalizao dos mercados; iii) o nmero elevado de alunos que o

    frequentam. Para o nosso estudo, a amostra ser de cento e dez alunos.

    6. Metodologia Tendo em conta a natureza deste estudo, as suas questes investigativas e os seus objectivos,

    a modalidade de investigao seleccionada baseia-se no mtodo quantitativo, que tienden a

    traducir en nmeros sus observaciones (Cook & Reichardt, 1995: 64). Este mtodo permite a

    utilizao de uma amostra relativamente grande, e privilegia o recurso a instrumentos e a anlise

    estatstica (Pardal & Correia, 1995: 17). Ser utilizado este mtodo, em funo dos objectivos da

    investigao, em funo do tipo de resultados esperados, do tipo de anlises(Albarello et al.,

    1995: 50), pois permite preciso; uma maior objectividade; a comparao e a reproduo; a

    generalizao para situaes semelhantes; a inferncia (avaliao e testes de hiptese) (Vaz

    Freixo, 2009: 144).

    Para este estudo, ser utilizado o inqurito por questionrio, que vai permitir recolher as

    informaes referentes s opinies, atitudes, expectativas e conscincia sobre a temtica em

    questo. Segundo Vaz Freixo (Idem: 197), o questionrio permitir eventualmente confirmar ou

    afirmar uma ou vrias hipteses de investigao.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    6

    Aps a aplicao dos questionrios ser realizada a anlise e o processamento dos dados,

    recorrendo ao software estatstico SPSS, a fim de obtermos respostas s questes investigativas do

    nosso estudo e elaborar-se-o concluses.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    7

    CAPTULO I MULTILINGUISMO E MULTICULTURALISMO, HOJE

    1.1. A sociedade multilinguista e multicultural: que desafios? indiscutvel a importncia da perspectiva multicultural para a compreenso das demandas

    que a realidade actual impe. Porm, devemos estar consciencializados do que ressalta Canen (cit.

    Almeida, 2003: 16): a gama de sentidos e interpretaes atribudos a termos de cultura,

    educao multicultural, perspectiva intercultural e outros tem-se reflectido em posturas ambguas

    e no raro contraditrias. No obstante os variados significados atribudos ao termo

    multiculturalismo2, consideramos o multiculturalismo como um processo que tem como principal

    desafio gerir as diferenas da identificao cultural, social e lingustica dos indivduos.

    Apesar do multiculturalismo ser um fenmeno de franco reconhecimento na sociedade

    actual, este no se pode considerar um processo recente. Carlos Alberto Torres (2001: 201) refere

    que embora o multiculturalismo como enfoque histrico tenha adquirido uma forma mais

    vigorosa nos anos 1980 e 1990, a questo do multiculturalismo nos Estados-Unidos to velha

    quanto a tentativa de o pas estabelecer uma escolarizao compulsria de massa. As primeiras

    referncias multiculturais surgiram na dcada de 50/60, com as reivindicaes pelos direitos

    humanos e civis pelos grupos minoritrios, nomeadamente, na comunidade negra norte-americana

    (Vieira da Silva, 2008: 17-18). Este primeiro movimento reivindicativo serviu de inspirao a

    outros grupos minoritrios, como por exemplo, na Europa, as migraes efectuadas por indivduos

    oriundos das ex-colnias (Amrica Latina, Caribe, frica e sia) que, inicialmente, permaneciam

    por curtos perodos de tempo nos pases de acolhimento. Porm, mais tarde, fixaram-se

    permanentemente, o que, consequentemente, criou novos desafios aos pases de acolhimento.

    Assim, tornou-se necessrio um ajustamento de medidas, de maneira a que as crianas

    descendentes de imigrantes fossem integradas num ensino com caractersticas culturais cada vez

    mais diversificadas.

    Torna-se necessrio estruturar um ensino com base na diminuio do preconceito e da

    discriminao sofridos pelos que chegam, o medo e a repulsa dos que os recebem, o choque de

    culturas e o fracasso escolar dos imigrantes (Candau, 2002: 58). Assim sendo, na sociedade

    constata-se, cada vez mais, uma sociedade heterognea, como comprova o Servios de Estrangeiros

    e Fronteiras no Relatrio de Imigrao, Fronteiras e Asilo 2008, evidenciando que o Brasil (24%),

    2 Multiculturalismo um conceito subjectivo e polivalente, dado que, se podemos, parcialmente, abordar o conceito multiculturalismo como um movimento de ideias, uma ideologia ou um contexto cultural de uma determinada sociedade, de outro ponto de vista, podemos abordar o mesmo conceito com base na relao das culturas dentro da prpria sociedade. Carlos Alberto Torres afirma que o multiculturalismo uma orientao filosfica, terica e poltica que no se restringe reforma escolar, o multiculturalismo est relacionado com a poltica das diferenas e com o surgimento das lutas sociais contra as sociedades racistas, sexistas e classicistas (2001:196). Um movimento de ideias que resulta de um tipo de conscincia colectiva, para a qual as orientaes do agir humano se oporiam a toda a forma de centrismos culturais, ou seja, de etnocentrismos. Em outros termos, o seu ponto de partida a pluralidade de experincias culturais, que moldam as interaces sociais por inteiro (Gonalves & Silva, 2003:14).

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    8

    Ucrnia (12%), Cabo Verde (12%), Angola (6%), Romnia (6%), Guin-Bissau (6%) e Moldvia

    (5%) representam cerca de 71% da populao estrangeira com permanncia regular em Portugal.

    Dados como estes, mostram a diversidade cultural em que a sociedade portuguesa vive

    actualmente. Isso demonstrado quotidianamente nas escolas, nas quais temos a presena de

    alunos pertencentes a grupos diversos, o que proporciona situaes de contacto inevitvel. Estes,

    podem constituir a base para uma aprendizagem, no entanto, seria necessrio que esses contactos,

    entre os diversos grupos, se fizessem num contexto igualitrio, se torne numa fonte de

    enriquecimento e de compreenso recprocos (Ministrio da Educao/Gaeri, 2001: 20), pois,

    desta forma que surge o desenvolvimento de uma verdadeira vivncia entre culturas.

    A par deste fenmeno do multiculturalismo, o multilinguismo3 , actualmente, um processo

    em expanso4. As crescentes migraes, a abertura de fronteiras, os meios de locomoo mais

    rpidos, o ensino de outros idiomas nas escolas e universidades e a disseminao das novas

    tcnicas de informao e comunicao, tornaram este processo menos complexo, facilitando a

    comunicao entre povos (Bizarro, 2007). Podemos, ento, dizer que o monolinguismo comeou a

    perder importncia face ao multilinguismo.

    A aptido para compreender e comunicar em mais do que uma lngua5, incita-nos e torna-

    nos mais recprocos perante as culturas dos outros povos. O Conselho da Europa (Ministrio da

    Educao/Gaeri, 2001:12) tem como preocupao melhorar a qualidade da comunicao entre

    europeus de diferentes contextos lingusticos e culturais, uma vez que a comunicao conduz a

    uma maior mobilidade e a um maior intercmbio, que favorece a compreenso recproca e refora

    a colaborao. Os cidados que falam mais lnguas tm mais facilidade em integrar-se noutros

    pases e noutras culturas e obter maior empregabilidade. Aprender e falar outras lnguas incentiva

    a uma maior abertura aos outros, s suas culturas e maneiras de ver o mundo, melhora as

    competncias cognitivas, desenvolve as competncias dos aprendentes na sua lngua materna e

    permite tirar partido da liberdade de trabalhar ou estudar em outro Estado-Membro6.

    A lngua o principal meio de comunicao, de interaco e de transmisso de

    conhecimentos e deve ser entendida como a expresso mais fiel da cultura, tradio e identidade de

    um determinado grupo de indivduos. A comunicao conduz a uma maior mobilidade e a um 3O multilinguismo a capacidade de uma pessoa utilizar diversas lnguas e a coexistncia de comunidades lingusticas diferentes numa dada rea geogrfica. No presente documento, o termo usado para descrever a nova rea de aco poltica da Comisso, que estimula um clima que propicie a plena expresso de todas as lnguas e onde possam florescer o ensino e a aprendizagem de um leque variado de lnguas - Um Novo Quadro Estratgico para o Multilinguismo http://europa.eu/languages/servlets/Doc?id=1042, consultado a 14 de Janeiro de 2010. 4 Um estudo difundido pelo Eurostat (Agncia de Estatsticas da Unio Europeia) revela-nos que in 2007, the EU-27 population continued to grow, and reached 497 million, but eight EU-27 Member States saw their populations continue to decrease. EU-27 growth was 80% due to migration - Statistics in focus 81-2008 - http://epp.eurostat.ec.europa.eu/cache/ITY_OFFPUB/KS-SF-08-081/EN/KS-SF-08-081-EN.PDF, consultado a 30 de Janeiro de 2010. 5 necessrio compreender que a diversidade lingustica cada vez mais real, existindo ainda cerca de 6909 lnguas vivas, e que estas lnguas podem coexistir numa pequena rea por vrios factores. Lewis, Paul M. (org.), 2009. Languages of the World, Dcima Edio. Dallas, Texas: SIL International. Verso online: http://www.ethnologue.com/, consultado a 5 de Fevereiro 2010. 6 Comisso Europeia: Multilinguismo, disponvel em http://europa.eu/languages/pt/chapter/14, consultado a 15 Janeiro 2010.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    9

    maior intercmbio, favorece a compreenso recproca e refora a colaborao (Ministrio da

    Educao/Gaeri, 2001:12).

    Assim sendo, o multiculturalismo e o multilinguismo assumiram novas preocupaes no

    domnio poltico, pelo que traaram novos objectivos, tais como: a promoo da aprendizagem de

    lnguas, o desenvolvimento de interaces entre pases distintos nas suas prprias lnguas; o

    contributo do multilinguismo para o desenvolvimento econmico, social, cultural e poltico. Estes

    objectivos tm por base a preservao da diversidade de lnguas7.

    Uma questo importante relativamente diversidade de lnguas preservar esta mesma

    diversidade. Na nossa opinio, consideramos que esta diversidade representativa de riqueza

    intelectual, cultural e educacional, ou seja, verifica-se cada vez mais a preocupao crescente na

    preservao deste patrimnio (UNESCO, 2009).

    Neste sentido, a no preservao da diversidade lingustica, e consequentemente, a perda

    da diversidade lingustica diminui a capacidade de adaptao da nossa espcie, porque reduz a

    reserva de conhecimento ao qual podemos recorrer. A cultura humana uma poderosa ferramenta

    de adaptao e de conhecimento. A lngua constitui o principal instrumento dos seres humanos para

    elaborarem, desenvolverem e transmitirem essas ideias e a cultura. Deste modo, preservar a

    diversidade lingustica trata de mantener vivas las opciones, prevenir los monocultivos

    mentales (Maffi, 1998: 19), sendo que esta ltima, conjuntamente com a diversidade cultural e

    biolgica constituem requisitos para a sobrevivncia humana.

    Muitas lnguas tm desaparecido ao longo dos tempos: nas palavras de Wurm (1996: 5),

    segn nuestras estimaciones alrededor de la mitad, es decir unas 3000 de las 5000-6000 lenguas

    del mundo se encuentran actualemente amenazadas en diversos grados. Se essa extino foi um

    processo lento, nos ltimos sculos ganhou um ritmo bastante acelerado (Skutnabb-Kangas, 2002;

    Wurm, 1996).

    A este propsito, Wurm (Idem: 3-4) salienta ainda a reduccin del nmero de hablantes

    (provocada por catstrofes, epidemias e decises polticas que levam no aprendizagem de uma

    determinada lngua) e las actitudes intolerantes, negativas, desdeosas y destructivas de los

    portadores de la cultura dominante, na abordagem dos factores responsveis pelo

    desaparecimento das lnguas. Na Introduo Declarao Universal dos Direitos Lingusticos8, so

    esclarecidos alguns destes factores: diversos factores de natureza extralingustica (polticos,

    territoriais, histricos, demogrficos, econmicos, socioculturais, sociolingusticos e relacionados

    com comportamentos colectivos) geram problemas que provocam o desaparecimento, a

    marginalizao e a degradao de numerosas lnguas, e que se torna, portanto, necessrio que os 7 Servios das Publicaes da Unio Europeia, Parecer do Comit Econmico e Social Europeu sobre Multilinguismo, disponvel http://eur-lex.europa.eu/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=OJ:C:2009:077:0109:01:PT:HTML, consultado a 2 de Fevereiro de 2010. 8Declarao Universal dos Direitos Lingusticos. Barcelona. http://penclubeportugues.org/PenActivComDLT_DUDL.html, consultado a 15 Janeiro 2010.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    10

    direitos lingusticos sejam considerados sob uma perspectiva global, para que se possam aplicar

    em cada caso as solues especficas adequadas.

    Perder uma lngua significa perder a riqueza que lhe intrnseca. Assim sendo, perder uma

    lngua sinnimo de perder uma cultura e uma identidade, na medida em que ela uma realidade

    constituda colectivamente e no seio de uma comunidade que ela est disponvel para o uso

    individual como instrumento de coeso, identificao, comunicao e expresso criadora

    (Ibidem). Assumimos que uma lngua no somente um conjunto de vocbulos, uma lngua no

    acontece num vazio (Strecht-Ribeiro, 1998: 27), associada a esta est sempre a cultura de um

    povo. Com a perda de uma lngua, perdem-se juntamente modelos culturais, costumes, modos de

    viver e vises que cada um tem do mundo. Kenneth Hale (2001), citado por Marinho (2004: 13),

    refere que assim que uma lngua morre, extingue-se a cultura que a suporta, o que leva a perdas de

    fontes de conhecimento. Tambm Steiner se preocupa com a questo da preservao das lnguas,

    pois para este autor, no h lnguas pequenas. Toda a lngua contm, articula e transmite no s

    uma carga nica de recordao vivida, mas tambm uma energia em evoluo dos seus tempos

    futuros, uma potencialidade para o amanh. A morte de uma lngua irreparvel, reduz as

    possibilidades do homem. () A Europa morrer efectivamente, se no lutar pelas suas lnguas,

    tradies locais e autonomias sociais (Steiner, 2005: 50).

    Segundo Skutnabb-Kangas (2002), to importante preservar as lnguas como as espcies.

    As lnguas, tal com as espcies, deixam as suas marcas, contaminam e, por sua vez, so

    contaminadas. A situao de cada lngua, tendo em conta as consideraes prvias, o resultado

    da confluncia e da interaco de uma multiplicidade de factores: poltico-jurdicos; ideolgicos e

    histricos; demogrficos e territoriais; econmicos e sociais; culturais; lingusticos e

    sociolingusticos; interlingusticos; e, finalmente, subjectivos9. As lnguas nascem, crescem e

    morrem, deste modo que evidenciam o seu dinamismo e plasticidade.

    As lnguas devem ser preservadas face a factores ameaadores, como por exemplo, os

    altos ndices de mobilidade transaccional poltica e econmica de cidados. Pela economia

    globalizada e pelo esbater das fronteiras nacionais, multiplicam-se os contactos entre os indivduos

    de diferentes espaos geogrficos e os altos nveis de exigncia em formao.

    Actualmente, os cidados convivem quotidianamente com a diversidade lingustica e

    cultural, neste sentido, reconhecemos que the future belongs to multilinguals. They are an

    important part of the linguistic diversity which is necessary if the planet is to have a future

    (Skutnabb-Kangas, 2002: 17).

    9 Declarao Universal dos Direitos Lingusticos. Barcelona. http://penclubeportugues.org/PenActivComDLT_DUDL.html, consultado a 20 Maro 2010.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    11

    Na nossa ptica, a educao lingustica, voltada para a diversidade cultural e para o

    plurilinguismo10, permite aos cidados desenvolverem mentalidades mais abertas diversidade e ao

    Outro. Nas palavras de Skutnabb-Kangas (Idem: 17), plurilinguals as a group think in more

    flexible and divergent ways than monolinguals as a group; they innovate more, create. Wurm

    (1996: 9) apresenta algumas das vantagens intelectuais e emocionais de se ser bilingue ou

    plurilingue: i) maior facilidade de acesso informao e ao conhecimento, dada a flexibilidade ao

    nvel das associaes semnticas; ii) maior flexibilidade ao nvel das atitudes (tolerncia); iii)

    maior equilbrio ao nvel do pensamento, tendo mais facilidade de apreender e aprender coisas

    novas. Wurm salienta que lo ideal es promover el bi o pluralismo cultural, como as el

    entendimiento y la tolerancia con respecto a las otras culturas, a partir de la primera infancia y

    esto debe ser un objetivo (Ibidem).

    1.2. As lnguas como veculo de identidade (multi)cultural Gerir a globalizao e o respeito pela diversidade parece ser um dos grandes desafios do

    mundo moderno, para que o mundo atinja os objectivos de desenvolvimento do milnio e acabe

    por erradicar a pobreza, tem de enfrentar primeiro com xito, o desafio da construo de

    sociedades culturalmente diversificadas e inclusivas (PNUD, 2004:5).

    Face ao contexto scio-cultural em que vivemos actualmente11, o contacto com diferentes

    lnguas e culturas tornou-se mais intenso. Deste modo, elementar fomentar um ensino com uma

    perspectiva multicultural, a fim de promover o sentido de respeito em relao ao Outro (Gomez,

    1991).

    Entre o multiculturalismo e o aprender uma lngua estrangeira, est patente uma relao

    intrnseca, uma vez que impensvel conhecer uma lngua dissociada da sua cultura, como afirma

    Brown (1994:187): lngua e cultura esto intrinsecamente interligadas (traduo nossa). Assim

    que uma lngua desaparece essa relao fica irremediavelmente perdida, the formation of a

    language is a collective act of creation in which thousands of people take part for hundreds of

    years. Each language shelters a subtly distinct view of the world and is fundamental to the

    personal, social and spiritual identity of its speakers (Comisso Europeia, 2002: 15).

    Assim sendo, associado ao conhecimento da lngua, o conceito de cultura um conceito

    que tem evoludo ao longo dos sculos, no um conceito esttico, abrange os valores e hbitos

    (sociais e materiais) de uma comunidade. Darcy Ribeiro (1983: 127), refere que cultura a

    herana social de uma comunidade humana, representada pelo acervo co-participado de modos

    padronizados de adaptao natureza para o provimento da subsistncia, de normas e instituies

    10 Segundo o Quadro Europeu Comum de Referencia para as Lnguas (Ministrio da Educao/Gaeri, 2001: 23), o plurilinguismo entendido como o conhecimento de um certo nmero de lnguas ou a coexistncia de diferentes lnguas numa dada sociedade. 11 Alargamento da Unio Europeia, a crescente mobilidade, os fluxos migratrios, a economia do mundo actual, entre outros factores.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    12

    reguladoras das relaes sociais e de corpos de saber, de valores e de crenas com que seus

    membros explicam sua experincia, exprimem sua criatividade artstica e a motivam para a

    aco.

    No prefcio da obra Empires of the Word, Nicholas Ostler (2005) valoriza o acervo cultural

    que uma lngua transporta uma vasta gama de conhecimentos e crenas, que nos permitem ser

    activos, pensantes, ouvintes, falantes, leitores, locutores conscientes e movidos de pensamento e

    sentimentos. A nossa linguagem coloca-nos num contnuo cultural, que nos liga ao passado e nos

    mostra o significado de um futuro multilingue.

    Na nossa opinio, no podemos deixar de valorizar as lnguas, enquanto factores de cultura

    e elementos integrantes da identidade das pessoas e dos povos. A identidade cultural apoia-se em

    factores, como a lngua, o contexto poltico, as origens, as tradies, a religio e a histria. A

    identidade implica unidade e homogeneidade, mas no exclui multiplicidade cultural. Na

    interpretao de Tajfel (1972: 292), lidentit social dun individu est li la connaissance de son

    appartenance certains groupes sociaux et la signification motionnelle et valuative qui rsulte

    de cette appartenance.

    A identidade cultural tem vindo a ser uma fonte inexaurvel de estudos na teoria social.

    Hall (2000), defende que estamos prximos de um colapso de identidades, dado que o Homem se

    sente cada vez mais um ser unificado e fragmentado, envolvido por diversas identidades distintas.

    Mercer (1990: 43) citado por Silva, Lima & Elias (2006: 137), a identidade somente se torna uma

    questo quando algo se supe como fixo, coerente e estvel deslocado pela experincia da

    dvida e da incerteza.

    Entende-se que a mudana algo tomado como permanente natureza do homem

    enquanto indivduo (pertencente a uma sociedade), considerada caracterstica intrnseca

    dimenso social. Neste sentido, o entendimento do carcter da mudana, na dimenso social,

    favorece a compreenso da identidade lingustica. Assim, necessrio reconhecer a mudana

    consciente no uso lingustico, como condio vital evoluo da sociedade e da lngua e como

    factor histrico-social: uma lngua no pra nunca. Evolui sempre, isto , muda sempre. H

    certos gramticos que querem fazer a lngua parar a certo ponto, e acham que erro dizermos de

    modo diferente do que dizem os clssicos (Monteiro Lobato, 1937: 100-101).

    A relao multicultural entre identidade e lngua interpretada, no nosso ponto de vista,

    como o respeito pelas experincias particulares, pelos valores diferentes, pela especificidade

    cultural e pelo modo prprio de experienciar a realidade, assumindo-se assim, uma perspectiva de

    entendimento da construo de um mundo globalizado e desafiante marcado por inter e multi

    culturalismos. Construir a identidade constitui um acto de categorizao social, ou seja, os

    contextos culturais onde nascemos e crescemos influenciam directamente o indivduo na definio

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    13

    de questes como: quem somos? e quem o Outro?: o contexto social das relaes

    intergrupais contribui para fazer dos indivduos o que eles so e so eles, por sua vez, que

    produzem este contexto social; um e outro desenvolvem-se e mudam simbolicamente. (Tajfel,

    1982: 41).

    A identidade social assume-se como uma ligao filogentica associada a uma ligao

    geogrfica e lingustica. Nesta mesma linha de pensamento, abordar a identidade nacional ,

    portanto, admitir aspectos multiculturais de uma sociedade, considerando as suas etnias nacionais

    diversas. Corroborando Azevedo (2000: 166), encontramo-nos no cerne da interaco individual

    e do social pelo que no de admirar a multiplicidade de contextos em que podemos encontrar

    referncias ao conceito de identidade. Em suma, a identidade social est directamente relacionada

    com os entendimentos que as pessoas tm acerca de quem so e do que importante para elas (ex:

    gnero, orientao sexual, classe social, nacionalidade ou etnicidade).

    No entanto, a ideia de identidade social no se limita somente ideia de semelhana entre

    indivduos, assim sendo, quando falamos em identidade social abordamos o reconhecimento das

    diferenas que se impem. Para tal, necessrio que o indivduo seja percebido e se perceba como

    diferente (Rmy, 1983).

    As lnguas comportam dimenses histricas que se traduzem em pertenas identitrias.

    Estas dimenses atravessam, suportam, interpretam e ultrapassam o tempo. Esta ideia

    corroborada por Steiner (2005: 50), toda a lngua contm, articula e transmite no s uma carga

    nica de recordao vivida, mas tambm uma energia em evoluo dos seus tempos futuros, uma

    potencialidade para o amanh. Deste modo, confere-se especial ateno inquestionvel

    importncia das lnguas na definio da identidade lingustica e cultural, permitindo-nos aceder ao

    sentido da nossa existncia enquanto pessoas, quer na nossa identificao pessoal, quer seja na

    identificao do ns perante os Outros e o Mundo ( Riagin, 2004).

    indispensvel encarar as lnguas como uma herana da humanidade e no apenas uma

    herana de cada povo individualmente considerado. Uma lngua uma realidade que se edifica

    colectivamente e no seio de uma comunidade que ela est disponvel para o uso individual

    como instrumento de coeso, identificao, comunicao e expresso criadora (Declarao

    Universal de Direitos Lingusticos, 1996, art.7..).

    A lngua constitui um elemento fundamental de identidade e encontra-se dependente do

    conhecimento que dela se obtm. Neste sentido, quando se fala em determinada lngua, toma-se

    como referncia a lngua que cada indivduo identifica como sua, a sua comunidade de insero, o

    seu espao poltico e a lngua do seu pas. Citando Cohen (1991 : 51), la langue est vhicule dune

    culture, elle est vhicule dune autre mode de vie, dautres moeurs, dautres modes de pense.

    Contudo, na sociedade actual, a relao lngua e cultura no to linear como aparenta ser, pois

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    14

    podemos falar a mesma lngua e ser detentores de referncias culturais muito distintas (Capucho,

    2006).

    A diversidade ao nvel das lnguas e das culturas , fundamentalmente, um veculo para a

    manifestao cultural de um povo ou sociedade. A sua aquisio requer conhecimento dos traos

    culturais prprios da sociedade que a utiliza. Assim sendo, cada lngua constitui, individualmente,

    um sistema autnomo de expresso e comunicao de um grupo de indivduos. O objectivo

    fundamental da reflexo das estruturas socioculturais deve ser preservado. Deste modo, torna-se

    fundamental a preocupao em preservar a diversidade com vista integrao, to plena quanto

    possvel, dos indivduos na sociedade globalizada do conhecimento e para a promoo de uma

    cidadania consciente, participativa e responsvel (Gadotti, 2000).

    A lngua apontada como de grande importncia para a definio identitria, como o

    caso de Portugal. As fronteiras lingusticas da lngua portuguesa so praticamente coincidentes com

    os limites polticos: seria de perguntar se a aparente coincidncia do portugus com o territrio

    nacional um facto de identidade ou uma consequncia do facto poltico (Mattoso, 1998: 8).

    A identidade social confunde-se muitas vezes com as lnguas, enquanto marcas de presena

    scio-cultural. Esta perspectiva permite obter uma conscincia crtica das lnguas e da cultura,

    eminentemente poltica, activa e criativa, que nos possibilita realizar interaces de descoberta, da

    relao de alteridade, descobrindo outros mundos nos outros e em ns mesmos (Phipps &

    Gonzalez, 2004). Consequentemente, esta aco entre culturas, situada no processo de

    afectividade/relao, comunicao e interpretao estabelece, entre mim e o Outro, a conscincia

    das nossas identidades sociais, construdas com base nas relaes entre as distines identificativas

    de cada um e o sentido de comunidade (Alred & Byram & Fleming, 2003: 4).

    Um outro aspecto importante, relativamente ao multiculturalismo, passa pelo estudo de

    uma cultura como um acto de repensar a sua prpria cultura. Estes estudos mantm-se desprovidos

    de conceitos conjecturados que, muitas vezes, ao longo dos anos, se perpetuam como certos, e

    que, a partir de uma viso multicultural, nos leva a reflectir acerca dessas convenes sociais.

    Segundo Ostler (2005: 558), as lnguas so muito importantes na construo de outros olhares e

    sentidos. Ter conhecimento sobre as lnguas fomenta mecanismos de bem-estar: different

    languages protect and nourish the growth of different cultures, where different pathways of human

    knowledge can be discovered. They certainly make life richer for those who know more than one of

    them. Andrade & Arajo e S et al (2007: 55), acrescentam ainda que o empobrecimento das

    experincias lingusticas, quer do ponto de vista da frequncia, quer da homogeneidade conduz

    os aprendentes a vises estereotipadas dos seus locutores e das suas culturas, contribuindo para a

    aproximao do indivduo definio da sua identidade prpria e construo de uma cidadania

    diferente.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    15

    1.3 As lnguas como factor de edificao da cidadania Aprender lnguas representa uma necessidade e um direito de cada cidado. As disciplinas

    de lnguas, quer materna, quer estrangeiras, ocupam, por isso, lugar nos curricula escolares. Em

    Portugal, as actuais disciplinas de Lnguas acompanham o aluno ao longo do percurso escolar

    obrigatrio e, opcionalmente, nos anos escolares seguintes (Ministrio da Educao/Gaeri, 2001),

    apesar da escolha se limitar, geralmente, a algumas lnguas que restringem as escolhas escolares

    dos alunos com disciplinas de LE nos curricula acadmicos.

    Este facto d-se pelo reconhecimento de o ensino e aprendizagem de uma lngua ser muito

    mais do que saber gramtica e muito mais do que compreender frases. Saber uma lngua conhecer

    uma cultura e o mundo, ou seja, fundamental formar e educar para uma cidadania mais

    abrangente, mais global (Idem). Tambm, na nossa opinio, saber viver uma cidadania responsvel,

    saber enfrentar a realidade da diferena, consciencializar-se das semelhanas e negociar valores

    e atitudes comuns, adquirindo competncias que possibilitem ao indivduo estar preparado para

    desafios actuais do mundo quotidiano (Pires, L. & Pedro, A. P. 2007).

    fundamental, neste sentido, abordar o conceito de cidadania. Este conceito

    pluridisciplinar e problemtico, pois varia desde a dimenso cultural dimenso lingustica. Tendo

    em conta que, actualmente, o conceito de cidadania excede a nacionalidade e as barreiras

    territoriais, exige-se que cada indivduo seja portador de capacidades que lhe permitam pensar da

    mesma forma do Outro, no sentido de defender os interesses comuns, independentemente de

    factores intrnsecos e extrnsecos como, por exemplo, o sexo, a lngua, a etnia, o territrio, religio

    e ideologias (Arajo, 2008).

    Ser capaz de pensar e ver o mundo como o Outro, parte da necessidade de adaptar o mundo

    ao diferente, ao estrangeiro, em resposta a factores inevitveis - sejam, por exemplo, a crescente

    imigrao e acelerao da globalizao - face a estes factores, necessrio aumentar e proporcionar

    uma construo de uma cidadania emancipatria e mais global. Considera-se, assim, fundamental

    um alargamento significativo da cidadania para l das fronteiras nacionais ou culturais, de modo a

    proporcionar uma cidadania mais globalizadora lingustica e culturalmente: a educao para a

    cidadania bem como a valorizao da lngua portuguesa e da dimenso humana do trabalho

    constituem formaes transdisciplinares (Decreto-lei n. 6/2001: 258).

    Na construo deste novo conceito de cidadania fundamental definir-se uma educao em

    lnguas que promova competncias de comunicao intercultural (Phipps & Gonzalez, 2004), com

    o objectivo de proporcionar ao indivduo uma educao lingustica fundamentada na diversidade e

    igualdade social. Neste sentido, a identidade tende a confundir-se, geralmente, com o uso das

    lnguas enquanto marca de presena social e cultural, definindo lugares de confronto e partilha

    entre indivduos distintos: Languaging is transformational. Languaging is in itself embodied

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    16

    knowledge. Language is habitus, it is about skilling people, not adding detachable skills. []

    Through languaging people become to make sense of and to shape their worlds. Through

    languaging they become active agents in creating their human and material environments.

    Languaging is, inextricably, [] relational. It is a social way of being. (Idem: 167-168).

    Esta perspectiva de confronto e partilha entre indivduos cultural e linguisticamente

    distintos, implica que o indivduo seja um interveniente activo na construo de espaos de

    cidadania crtica e participativa, de modo a tornar-se fundamental relacionar a identidade e os

    processos sociais em busca de sentido de cidadania.

    Com a Adeso Unio Europeia e, particularmente no Ensino Superior, com a

    implementao do Processo de Bolonha, gerou-se uma necessidade de reavaliar o papel das lnguas

    estrangeiras na sociedade. A aprendizagem de lnguas estrangeiras, neste contexto, poder fomentar

    uma conscincia de cidadania e de identificao pessoal do indivduo e do seu grupo de pertena.

    As instituies do Ensino Superior procuram desenvolver dimenses europeias de educao,

    principalmente, aps a implementao do Processo de Bolonha (Pinto, 2005).

    As Universidades, neste contexto do Processo de Bolonha, procuram desempenhar papis

    activos, ou seja, no Ensino Superior o conhecimento de lnguas considerado um direito e um

    requisito para o exerccio de uma cidadania plena, o que talvez mostre um princpio terico, dado

    que a anlise anteriormente apresentada no que concerne oferta de cursos de lnguas em

    Universidades de Portugal , ainda, bastante restrita. Do mesmo modo, o alargamento do universo

    cultural uma consequncia directa do exerccio da cidadania. Ao nvel do Ensino Superior

    tambm se verifica uma crescente globalizao influenciadora da cidadania e do conceito de

    identidade. A existncia de mltiplas bolsas de apoio financeiro para a realizao de perodos de

    estudo, de estgios ou de investigao no estrangeiro tm feito com que, actualmente, as

    instituies de ensino superior europeias, e de outros restantes continentes, tenham vindo a receber

    um cada vez maior nmero de alunos bolseiros em mobilidade, vindos dos mais diversos pases,

    que se deslocam a instituies de acolhimento para a realizarem um perodo de estudos superior ou

    avanados, estgios ou investigaes (Tramonte, s/d).

    O aumento to significativo de estudantes europeus de ensino superior12 uma realidade

    bastante recente, remonta, praticamente, s ltimas duas dcadas e foi impulsionado durante os

    ltimos anos pela implementao de Programas de Mobilidade de Docentes e alunos, tais como,

    Leonardo DaVinci ou Erasmus.

    A lngua representa, no Ensino Superior, um processo de interaco humana que se

    estabelece de um modo flexvel e proporcionando marcas de mobilidade e de diferentes usos,

    12Direco Geral no Ensino Superior, disponvel em http://www.dges.mctes.pt/DGES/pt/Estudantes/Processo+de+Bolonha/Objectivos/Dimens%C3%A3o+Europeia+do+Ensino+Superior/, consultado a 20 de Maio de 2010.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    17

    permitindo, assim, que o estudante seja detentor de competncias e conhecimentos que lhe

    permitam estar mais aberto ao outro e ao mundo, para que estes compreendam as diferenas, e,

    deste modo, adquiriram e desenvolvam uma cidadania para alm das fronteiras culturais, tendo em

    conta que as exigncias profissionais dos alunos universitrios estendem-se para l das fronteiras

    territoriais e culturais portuguesas.

    Para alm do Processo de Bolonha representar uma maior heterogeneidade nos contextos

    universitrios, considera-se que actualmente um requisito fundamental para o estudante de Ensino

    Superior um alargamento das suas fronteiras lingusticas e culturais. , de igual modo, exigido aos

    docentes universitrios que adquiram ferramentas lingusticas que permitam lidar com a

    diversidade dos estudantes. Isto , um indivduo que fale vrias LE, ter um conceito de cidadania

    distinto de outro que s fale uma lngua. Neste sentido, a lngua pode ser tida como um instrumento

    de representao do mundo e identidade (Leal, 2009).

    A educao em Lnguas, em contexto de diversidade lingustica, enquanto valor de uma

    cidadania globalizadora, no apela especificidade de cada lngua, mas deve ser definida como

    uma relao comum a todas as lnguas enquanto factor preponderante construo de uma

    identidade mais abrangente. Nesta construo de identidade mais alargada considera-se

    indissocivel a lngua da cultura, ou seja, quando se aprende uma lngua, adquirem-se novos

    conhecimentos, no s lingusticos, mas tambm quanto sua cultura. (Idem).

    O papel das Lnguas Estrangeiras no contexto do plurilinguismo no pode deixar de ter em

    conta a construo de uma cidadania que se concretiza na multiplicidade de identidades

    lingusticas. O plurilinguismo considerado uma competncia que permite gerir a utilizao de

    diversos reportrios lingusticos de forma heterognea, de modo a que cada indivduo tenha

    liberdade para se exprimir face a uma variedade lingustica dominante, valorizando a diversidade

    lingustica e cultural, bem como uma educao para a cidadania (Ministrio da Educao/Gaeri,

    2001). Na nossa opinio, as lnguas representam um estatuto de poder cultural, econmico, criando

    sentidos e significados e proporcionando uma maior autonomia aos falantes na construo da sua

    identidade (iremos desenvolver este aspecto no ponto 3 deste estudo).

    1.4 Esteretipos e Lnguas Tendo por referncia o autor Marques Pereira (2002: 44), este considera que inicialmente

    os esteretipos, devido s contribuies de Lippman, foram considerados como fotografias que

    as pessoas carregavam na cabea. A noo de esteretipo13 serve para definir um sistema de

    13 Segundo Perrefort (2001 :38), la notion de strotype est lie au nom de W. Lippmann, qui a t le premier lutiliser () et qui a crit ce propos : Les systmes des strotypes sont peut-tre le centre de notre rflexion personnelle et les armes de dfense de notre position sociale. Ils offrent du monde une vision ordonne, plus ou moins stable, laquelle se sont adapts nos habitudes, notre got, nos capacits, notre consolation et notre espoir. Ils noffrent peut-tre pas une vision complte du monde, mais ils sont limage dun

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    18

    opinies, convices, atitudes, julgamentos, que ajudam a estruturar a percepo (Perrefort, 2001 :

    38). Ainda segundo o autor da obra Jaimerais aimer parler allemand (Ibidem), para Lippmann

    (1964) e Bardin (1980), as caractersticas do esteretipo, so: a simplificao exagerada, a

    generalizao e frequncia, a falsidade e a natureza afectiva .

    Castellotti e Moore (2002: 8) salientam algumas caractersticas dos esteretipos: "They

    provide a framework of interpretation, through comparisons and contrasts with characteristics

    attributed to other groups. The key is not deciding whether a stereotype is true, but being able to

    recognise it as such and acknowledging its validity for a certain group, in terms of its effect on

    relations between groups and therefore on the learning of languages spoken by those groups".

    Segundo referido em Pereira (2002: 46), Nesdale e Durkin (1998) definiram esteretipos

    como sendo: generalizaes feitas por um grupo de pessoas a respeito dos atributos e do

    comportamento de outros grupos de pessoas, considerando-os como produtos inevitveis dos

    processos adaptativos utilizados pelos indivduos para simplificar e organizar as inumerveis

    informaes encontradas no ambiente social.

    No livro Psicologia Social dos Esteretipos (2002), Marcos Pereira, considera os

    esteretipos como sendo crenas compartilhadas sobre atributos pessoais, traos de personalidade e

    comportamentos de um determinado grupo, relativamente ao modo como os esteretipos so

    aprendidos, construdos e reconstrudos. O mesmo autor refere, ainda, que a interveno dos

    professores, pais e amigos tem um papel importante na sua criao e desenvolvimento. Os pais, por

    exemplo, fornecem informaes aos seus filhos e que uma parte delas se refere aos atributos e s

    caractersticas das pessoas que pertencem aos diversos grupos sociais (Pereira, 2002:154). Os

    meios de comunicao tambm so excelentes veculos transmissores de esteretipos, pois nas

    mensagens por estes transmitidas esto omnipresentes inmeros esteretipos. No podemos deixar

    de referir que atravs da observao do comportamento dos outros e da sua imitao, tambm so

    desenvolvidos esteretipos. Deste modo, fundamental incentivar e criar nos cidados uma

    educao para os media que consiste, nomeadamente, em decifrar criticamente mensagens

    projectadas pelos meios de comunicao (Idem).

    Acrescentamos, ainda, que os esteretipos, uma vez instalados, diabolicamente difcil

    extirp-los, pois ajudam a lembrar-nos quem somos! (Hill, 2001: 18-23). Deste modo, no livro

    Ns, Europeus, de supracitado autor, os alemes so identificados como guerreiros, os italianos

    como melodramticos, os franceses como sarcsticos, os portugueses como de trato fcil e com

    bom feitio (Idem: 29). Ser que a construo de esteretipos ajuda efectivamente o indivduo a

    identificar-se culturalmente? Vejamos alguns esteretipos criados sobre alguns povos europeus: O

    cu onde os polcias so britnicos, os cozinheiros franceses, os mecnicos alemes, os amantes monde possible, laquelle nous sommes habitus. Dans un monde, les hommes et les choses ont leur place attribue et se comportent comme on lattend deux.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    19

    italianos e onde a organizao sua. O inferno onde os cozinheiros so britnicos, os

    mecnicos franceses, os amantes suos, os polcias alemes e onde a organizao italiana

    (Idem: 89).

    No podemos esquecer que atravs da linguagem que os esteretipos so transmitidos.

    Quasthoff, citado por Perrefort (2001:39), defende que so expression verbale dune conviction

    lgard de groupes sociaux ou de leurs membres. No possvel transmitir um esteretipo sem o

    uso da linguagem, mas tambm no podemos pensar na criao e na mudana de esteretipos, sem

    ter em conta o valor da comunicao verbal, ou seja, no a lngua que ir definir o esteretipo de

    determinada cultura ou grupo, mas sim a comunicao e transmisso desses esteretipos entre

    indivduos (Pereira, 2002).

    Em contextos de trocas culturais, os esteretipos aident classer les impressions,

    mettre de lordre dans les donnes de laltrit et leur donner du sens. Ils sont indispensables

    dans la qute de modles de comportements adquats et pour stabiliser la conscience perturbe de

    soi et remplissent, ce titre, des fonctions de marqueur didentit et daltrit (Perrefort, 2001:

    41). Neste conceito, fait figure dacte ddentit (Idem: 39), os indivduos utilizam os

    conhecimentos que possuem sobre o seu sistema cultural e o dos outros, para organizar os novos

    dados num sistema coerente. Assim sendo, o esteretipo fixa as percepes identitrias e a unio

    dos grupos. O importante no , propriamente, decidir se um esteretipo verdadeiro; , sim,

    reconhec-lo como tal. Reconhecer a sua validade para um determinado grupo, na maneira como

    este afecta as relaes entre os grupos, como por exemplo, a aprendizagem de lnguas praticada por

    estes grupos.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    20

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    21

    CAPTULO II O ENSINO-APRENDIZAGEM DE LNGUAS ESTRANGEIRAS

    2.1. As Lnguas Estrangeiras e a sua aprendizagem no Ensino Superior Universitrio As instituies de ensino superior universitrio, segundo a Comisso Europeia,

    desempenham um papel de primeiro plano na promoo da aprendizagem de lnguas e do

    multilinguismo, () na promoo do intercmbio internacional de estudantes14 e da

    sensibilizao cultural dos indivduos. Fundamentalmente, a construo de uma dimenso global da

    educao tem vindo a acentuar - no que se refere promoo da compreenso mtua - uma coeso

    social.

    A Universidade, enquanto reprodutora de muitos dos modelos da sociedade e

    impulsionadora de mudana (Sequeira, 2006), deve ser considerada como o principal meio de

    construo da sociedade, de conhecimento e de desenvolvimento econmico.

    As instituies de ensino superior universitrio so o meio de cruzamento entre a dimenso

    educacional e da construo de uma cidadania15 que se estendem para alm das fronteiras

    territoriais.

    A aprendizagem de lnguas estrangeiras no Ensino Superior um pr requisito essencial

    para o acesso ao conhecimento e um factor para a mobilidade pessoal e profissional (), uma

    mais-valia para o exerccio da cidadania de forma activa e participada, pois que tal no se

    confina, hoje, s fronteiras nacionais. Alm disso, o domnio de competncias de comunicao em

    vrias lnguas potencia o alargamento das nossas mundividncias, pois permite o acesso a outras

    culturas, outros valores, modos de viver e pensar16, tendo em conta as crescentes exigncias de

    um mundo cada vez mais desafiador nas questes de formao e aprendizagem.

    Apesar do que anteriormente referimos, consideramos que a oferta de cursos relacionados

    com a aprendizagem de lnguas em Portugal, no ano de 2009, em Instituies de Ensino Superior

    Universitrio, ainda bastante limitada, por se reduzir a 12 cursos em lnguas, a nvel nacional, e

    as 876 vagas precedentes destes cursos17. No que concerne Universidade de Aveiro, o curso que

    oferece mais diversidade lingustica (e cultural) o de Lnguas e Relaes Empresariais (que ser

    14 Comisso Europeia Aprendizagem de Lnguas / Ensino Superior, disponvel em http://ec.europa.eu/education/languages/language-learning/doc163_pt.htm , consultado a 18 de Fevereiro de 2010. 15 Entenda-se por cidadania expresso da afirmao humana, pessoal e colectiva dos homens contemporneos, sujeitos aos ventos da mundializao e da mudana rpida, cientifica e tecnolgica, mergulhados em contextos multiculturais sem fronteiras e sujeitos difuso meditica do desenvolvimento econmico, das ideias e dos conflitos (Ambrsio, 2005:2). 16 Direco Geral de Inovao e Desenvolvimento Curricular, disponvel em http://www.dgidc.min-edu.pt/linguas_estrangeiras/Paginas/Linguas-Estrangeiras.aspx, consultado a 20 de Fevereiro de 2010. 17 Aps uma anlise do Acesso ao Ensino Superior, no ano de 2009, verificamos a seguinte oferta de cursos de Lnguas, no Ensino Superior Universitrio em Portugal: Lngua Gestual Portuguesa Escola Superior de Educao de Coimbra; Lnguas Aplicadas Univer. Minho e Univer. Porto; Lnguas e Comunicao Univer. Algarve; Lnguas e Culturas Orientais Univer. Minho; Lnguas e Estudos Editorais Univer. Aveiro; Lnguas e Literaturas Europeias Univer. Minho; Lnguas, Literaturas e Culturas Univer. vora, Univer. Aveiro, Univer.Algarve, Univer. Lisboa, Univer. Nova Lisboa e Univer. Porto; Lnguas Modernas Univer. Coimbra; Lnguas e Relaes Internacionais Univer. Porto;Lnguas e Relaes Empresariais - Univer. Aveiro e Univer. Trs os Montes e Alto Douro; Lnguas e Traduo Univer. Lusofona Porto, disponvel em http://www.acessoensinosuperior.pt/indcurso.asp?letra=L, consultado a 20 de Fevereiro de 2010.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    22

    o nosso objecto de estudo). Este curso oferece as seguintes lnguas: portugus, ingls, francs,

    alemo, espanhol, chins e rabe.

    A crescente preocupao com a diversidade lingustica e a aprendizagem das lnguas

    oficialmente incorporada nas Reformas de Bolonha em 2003: necessidade de assegurar um

    perodo de estudos significativo no estrangeiro no mbito de programas conjuntos, assim como a

    oferta de programas de lngua que promovam a diversidade lingustica e aprendizagem de

    lnguas, de forma a que os estudantes possam realizar plenamente o seu potencial para o

    desenvolvimento da identidade, cidadania e da empregabilidade europeias18. Como

    exemplificamos, na formulao de objectivos, a diversidade lingustica uma preocupao, ou

    seja, ser necessrio identificar e constatar os percursos acadmicos de cada aluno como influncia

    directa nas escolhas lingusticas no Ensino Superior. Neste sentido, as primeiras necessidades

    surgem em 1999, com a assinatura do Processo de Bolonha por parte de 29 pases europeus que,

    actualmente, consta de 46 pases signatrios. Posteriormente, em 2000, o Conselho Europeu fixou

    um novo e ambicioso objectivo para a Europa at 2010: o de se tornar a "economia baseada no

    conhecimento mais dinmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento

    econmico sustentvel, com mais e melhores empregos e com maior coeso social"19. Se

    entendermos estes objectivos tendo por base a questo lingustica, possvel denotar-se que quanto

    mais o indivduo for detentor de conhecimentos lingusticos, mais competitivo fica. Tornar uma

    economia baseada no conhecimento mais dinmica e competitiva do mundo20 requer que exista

    um elevado grau de exigncia para os profissionais, ou seja, no possvel ser-se competitivo

    mundialmente, sem que existam relaes fundamentadas comunicativamente e, obviamente,

    linguisticamente para traar-se economicamente relaes mundial competitivas.

    Presentemente, e com a integrao do Processo de Bolonha21 a decorrer, tanto ao nvel

    acadmico como profissional, um dos critrios de qualidade para qualquer plano de estudos no

    Ensino Superior passa, fundamentalmente, pela existncia de oportunidades de aprendizagem de

    lnguas estrangeiras. Corroborando Albero (2000), actualmente, o desconhecimento de lngua(s)

    estrangeira(s) intolervel num mundo profissional competitivo. Contudo, com a implementao

    do Processo de Bolonha, os currculos do 1 ciclo ficaram mais concentrados, retirando espao para

    as Lnguas Estrangeiras.

    18 A Europa em 12 lies, disponvel em http://europa.eu/abc/12lessons/lesson_8/index_pt.htm, consultado a 20 de Maro de 2010. 19 Concluses do Conselho Europeu de Lisboa 2000 (Estratgia de Lisboa), disponvel em http://www.consilium.europa.eu/ueDocs/cms_Data/docs/pressData/en/ec/00100-r1.en0.htm, consultado a 2 de Dezembro de 2009. 20Estratgia de Lisboa, disponvel em http://www.estrategiadelisboa.pt/InnerPage.aspx?idCat=337&idMasterCat=334&idLang=1&site=estrategiadelisboa, consultado a 3 de Julho de 2010. 21 Conforme acordado na Conferncia Ministerial Europeia sobre o Acordo de Bolonha, realizada em Bergen em 2005, a adopo generalizada deste modelo de ciclos de estudos no dever ultrapassar o ano de 2010. Neste sentido, o diploma estabelece que a adequao deve ser realizada at ao final do ano lectivo de 2008-2009, para que no ano lectivo de 2009-2010 todos os ciclos de estudos estejam organizados de acordo com o novo modelo. Decreto-Lei n. 74/2006 (Dirio da Repblica 1 SrieA), consultado a 18 de Fevereiro de 2010.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    23

    O conhecimento de uma ou mais lnguas estrangeiras aumenta significativamente a

    possibilidade de emprego e conduz a uma maior mobilidade e a um maior intercmbio, favorece

    a compreenso recproca e refora a colaborao (Ministrio da Educao/Gaeri, 2001: 12).

    Actualmente, e perante todas as circunstncias anteriormente enunciadas, o facto de um

    indivduo estar inserido numa sociedade em crescente globalizao, em vrios domnios (social,

    econmico, politico e cultural), no significa que o sujeito no possa estar sensibilizado, preparado

    e aberto ao Outro. Assim sendo, considera-se a possibilidade, quer da compreenso do mundo,

    quer da compreenso de ns mesmos e dos Outros, ser feita atravs do conhecimento e do contacto

    com outras lnguas e culturas (Amado Laurel, 2007). fundamental que exista uma conscincia de

    abertura diversidade, visto que esta uma das principais consequncias da crescente

    globalizao; contudo, apesar dessa abertura e dessa possvel aceitao da diversidade, tambm se

    pode manter a identidade face mundializao dos domnios sociais, econmicos, polticos e

    culturais.

    Em suma, corroborando Byram, citado por Pereira (1999), l'tude d'une langue trangre

    (...) permet d'apprhender une autre culture, et cet gard inclut des facteurs humains et sociaux.

    Tout au long de son cursus, on peut inciter l'lve examiner ce qu'il connat d'un autre point de

    vue, notamment en ce qui concerne le comportement humain; ainsi ses horizons seront largis et

    les sentiments d'insularit pourront se dissiper.

    2.2. Factores envolvidos na aprendizagem de Lnguas Estrangeiras Considerando as lnguas como objecto natural e exterior ao indivduo e que se organizam

    em situaes mais ou menos sistemticas, fundamental perceber os factores que esto na origem

    da aprendizagem de lnguas e que influenciam o indivduo a aprender uma lngua, em detrimento

    de outra. De facto, durante o processo de ensino e aprendizagem, o aprendente constri para si,

    representaes acerca da lngua em estudo, que se relacionam directamente com factores

    influenciadores no processo de aprendizagem (Pinto, 2005).

    Deste modo, este ponto ter por objectivo principal apresentar os factores que

    consideramos ser os mais determinantes na aprendizagem de lnguas estrangeiras. Assim sendo,

    dispomos os factores pela seguinte ordem: a lngua como objecto de ensino e aprendizagem; a

    percepo da lngua como objecto afectivo e grau de proximidade e distncia entre as lnguas; a

    lngua como instrumento de construo das relaes interpessoais/intergrupais; relao de poder e

    necessidade de desenvolvimento econmico ou profissional. A escolha destes factores

    especificamente, relacionam-se com os interesses educativos dos investigadores, ou seja, estes

    factores tendem a ir de encontro ao que poder influenciar o interesse de um aprendente de LE a

    escolher uma lngua em detrimento de outra, ou mesmo determinar o interesse pelas LE ou no.

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    24

    2.2.1. Lngua como objecto de ensino e aprendizagem A lngua, entendida como um objecto de ensino e aprendizagem, implica considerar que a

    lngua tida como uma importante matria de estudo, apropriando-se de situaes mais ou menos

    organizadas e ordenadas do real e do pensamento. Na aprendizagem de qualquer matria, o aluno

    adquire e constri conhecimentos que vai reconstruir ao longo do seu processo individual de

    aprendizagem.

    Apesar da ambiguidade na determinao das reas, que surgem volta da temtica ensino e

    aprendizagem de uma lngua estrangeira, Horwitz (1987), defende a possibilidade de elaborar uma

    diviso do ensino e aprendizagem de uma lngua estrangeira em algumas grandes reas: aptido

    para as lnguas estrangeiras, dificuldades, natureza, motivaes e estratgias de aprendizagem,

    papel do professor, experincias de aprendizagem e relao com o estudo. Entre o querer aprender

    uma lngua e a sua aprendizagem existem vrios mediadores, entre os quais, a figura do professor.

    O professor possui conhecimentos que podem interferir no acto de ensinar e nas relaes entre

    professor e alunos, nomeadamente, na interpretao que os alunos fazem da matria e do seu

    contedo e no modo como o professor expe as suas ideias. Podemos, tambm, acrescentar que o

    professor fundamental no processo de ensino-aprendizagem, visto que pode facilitar, ou no, a

    motivao do aluno (Pinto, 2005).

    2.2.2. Percepo da lngua como objecto afectivo e grau de proximidade e

    distncia entre as lnguas Outro factor, associado aprendizagem de uma lngua estrangeira, encontra-se relacionado

    com a percepo da lngua como um objecto afectivo. A aquisio da lngua estrangeira encontra-

    se fortemente relacionada com o grau de pertena que determinado indivduo confere a

    determinada lngua ou cultura (Paganini, 1994).

    Segundo Paganini, o grau de afectividade pode depender da imagem sonora que

    determinada lngua estrangeira desempenha. Neste sentido, o aprendente foca a sua ateno em

    aspectos como as impresses fonticas, ritmo, entoao, volume e pronncia da lngua estrangeira.

    Segundo Perrefort (2001: 97), a distance imagine entre la production effective et le modle

    phontique donne souvent lieu un sentiment dexclusion contre lequel on ragit en dnigrant la

    langue de lautre qui devient le lieu o sexpriment les difficults de vivre la diffrence.

    Ainda no que se refere ao ensino e aprendizagem da lngua estrangeira deve-se ter em

    conta a proximidade e a distncia entre a lngua materna e a lngua estrangeira. Segundo Robert

    (2004), o processo de aprendizagem de uma lngua difere segundo o grau de proximidade

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    25

    lingustica. Este um factor essencial, no diz respeito ao aprendente, pensar no grau de facilidade

    ou dificuldade em aprender determinada lngua.

    Segundo Moore (2001: 110), uma lngua considerada distante quando ses sonorits et

    son criture empchent de lapprocher, alors quune langue se vit comme proche lorsquelle se

    laisse suffisament aborder pour autoriser une ressemblance avec les mots et les racines de sa

    propre langue, lorquon peut la ctoyer, lapprendre, la parler. La distance est dabord ici

    labsence de familiarit ou de prise par rapport la matire mme de langue lautre. De um

    ponto de vista lingustico, e segundo o mesmo autor, os critrios de identificao lingustica (como

    o caso da natureza, do sistema fonolgico, das derivaes ou da sintaxe) podem levar a

    estabelecer uma aproximao quanto aos graus de distncia (Ibidem).

    O grau de facilidade ou dificuldade de uma aprendizagem deriva de diversos motivos, tais

    como, a relao afectiva que o aprendente estabelece com a lngua; a distncia ou proximidade

    interlingustica; o entendimento aprendente e professor. Podemos afirmar que quanto maior for o

    grau de aproximao entre lnguas, maior a probabilidade de compreenso, logo, o grau de

    dificuldade diminui. Contudo, pour un mme individu, une langue peut sembler proche sous tel

    angle, lointaine sous tel autre (Castellotti, Coste & Moore, 2001: 108), ou seja, um aprendente

    pode sentir proximidade relativamente a determinada lngua no que concerne ao seu sistema

    gramatical e apresentar dificuldades na geografia (factor de distncia extra-lingustica). Neste

    sentido, podemos exemplificar, referindo o estudo levado a cabo por Schmidt & Arajo e S

    (2006), em que os alunos, na sua generalidade, demonstram que a lngua alem difcil de

    aprender, em detrimento de lnguas romnicas.

    O aprendente desenvolve capacidades de flexibilidade e versatilidade e coloca em prtica

    estratgias onde a proximidade, a distncia, e a efectividade entre lnguas vont jouer un role dont

    il importe didentifier la nature, le degr et les mcanismes (Moore, 2001: 106).

    2.2.3. Lngua como instrumento de construo das relaes

    interpessoais/intergrupais Referimos, tambm, a lngua como instrumento de construo das relaes

    interpessoais/intergrupais. A lngua tida como instrumento que o indivduo utiliza para interagir

    com o Outro, permitindo-lhe formas de entendimento e cooperao (Castelloni, Coste & Moore,

    2001). Deste modo, verifica-se uma atitude de comunicao globalizada entre indivduos,

    possibilitando descodificar realidades e informao. Consequentemente, d-se um processo de

    internacionalizao da lngua (Phillips & Gonzalez, 2004).

    Suen (1997), define relaes interpessoais como sendo relacionamentos entre indivduos de

    diferentes culturas, podendo acontecer de diversas formas: contactos superficiais (interaco entre

  • Representaes das Lnguas Estrangeiras dos alunos de LRE da UA

    26

    turistas e moradores) e contactos mais complexos (colegas de trabalho num pas estrangeiro). Um

    exemplo da utilizao da lngua, como instrumento de construo das relaes

    interpessoais/intergrupais, o Projecto Galapro22 que tem como principal objectivo fortalecer, nos

    profissionais envolvidos na educao em lnguas, o sentimento de pertena a uma comunidade

    alargada cujas lnguas e culturas so diversas (Arajo e S, Melo-Pfeifer & Almeida, 2009: s/p).

    Este projecto um projecto multilateral de formao de formadores em lnguas, concebido em

    torno de dois eixos: formao em didctica da intercompreenso atravs de prticas de

    intercompreenso e constituio de comunidades virtuais plurilingues de ensino-aprendizagem

    colaborativo da intercompreenso (Idibem).

    2.2.4. Relao de poder e necessidade de desenvolvimento econmico ou

    profissional Entende-se como factor de ensino e aprendizagem de uma lngua estrangeira, a relao de

    poder, nomeadamente o econmico, que o indivduo estabelece perante determinada lngua. Esta,

    encontra-se muitas vezes associada s possibilidades do indivduo aceder ao mundo de trabalho23 e

    busca de poder econmico (Dabne, 1997).

    No mercado econmico, a aquisio de uma lngua faz-se a partir de uma necessidade de

    desenvolvimento econmico ou profissional, apesar da lngua no ser uma aquisio individual,

    mas sim, colectiva (Calvet, 1999). The decision to learn another language is in the first instance a

    recognition of the cultural capital, the accumulated knowledge and social experience enshrined in

    cultural practices (Phillips & Gonzalez, 2004: 14). Deste modo, a aquisio de uma lngua

    estrangeira tambm, para os indivduos, uma forma de auto promoo e valorizao pessoal, pois

    as lnguas so uma mais-valia quanto ao poder econmico e profissional. A LE possui determinado

    valor ou utilidade internacional nas trocas econmicas, conferindo valor para o mercado de

    trabalho, para a mobilidade e para a acessibilidade a melhores cargos. Reconhece-se lngua

    estrangeira um estatuto de investimento econmico (Dabne, 1997; Biliez, 1996; Gosse, 1997).

    Corroborando A lngua estrangeira para fins especficos: uma lngua mutilada da

    autora Babo (1999: 239-240), o domnio de lnguas constitui um bem econmico, j que

    permite o acesso a postos de trabalho com melhores condies remuneratrias, e relacionando- 22 O Projecto GALAPRO - Formao de formadores para a intercompreenso em Lnguas Romnicas - 135470 LLP 1 2007 1 PT KA2 KA2MP, financiado pela Comisso Europeia, atravs da Agence Executive Education Audiovisuel et Culture e visa a construo de uma plataforma para o desenvolvimento de competncias profissionais no domnio da intercompreenso, inscrevendo-se numa perspectiva didctica activa que preconiza o plurilinguismo como valor europeu e prtica a promover, disponvel em www.galapro.eu, consultado a 2 de Maro de 2010. 23 Segundo a Comunicao da Comisso ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comit Econmico e Social Europeu e ao Comit das Regies - Multilinguismo: uma mais-valia para a Europa e um compromisso comum (2008: 5), as competncias lingusticas e interculturais aumentam a possibilidade de conseguir um emprego melhor. O domnio de vrias lnguas estrangeiras