REPETÊNCIA ESCOLAR - avm.edu.br MARTINS DE SOUZA NAAME.pdf · O mau resultado da produção...
Transcript of REPETÊNCIA ESCOLAR - avm.edu.br MARTINS DE SOUZA NAAME.pdf · O mau resultado da produção...
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
REPETÊNCIA ESCOLAR
FÁTIMA MARTINS DE SOUZA NAAME
ORIENTADOR: Prof. Robson Materko
Rio de Janeiro Novembro/2001
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO
DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS
PROJETO “A VEZ DO MESTRE”
REPETÊNCIA ESCOLAR
FÁTIMA MARTINS DE SOUZA NAAME
Trabalho monográficoapresentado como requisitoparcial para a obtenção doGrau de Especialista emDocência do Ensino Superior(Pós-Graduação Lato Sensu)
Rio de Janeiro Novembro/2001
Ao Soberano Deus, Criador e Autor da vida, por conceder-me saúde, força, sabedoria e perseverança na realização desta tarefa. Aos meus pais que me proporcionaram alcançar o meu ideal de vida. Aos meus filhos que não me permitiram esquecer de que além de profissional, sou mãe e mulher. Ao meu marido, pelo amor e paciência nas horas mais difíceis. Agradeço a todos que direta e indiretamente contribuíram para a execução desta pesquisa.
Dedico este trabalho de pesquisa atodos aqueles alunos que, emalguma fase da sua Vida Escolar,foram reprovados. E a todos osprofissionais envolvidos nos ideaisda educação.
“Ainda que chegues a viver cemanos, nunca deixes deaprender”. Platão
SUMÁRIO
LISTA DE ABREVIATURAS 7
RESUMO 8
INTRODUÇÃO 9
1.REPETÊNCIA SOB A ÓTICA DA DISCRIMINAÇÃO
SOCIAL 14
2.AVALIAÇÃO COMO SETOR DE DISTORÇÃO PARA REPETÊNCA 18
3.MITOS QUE SUSTENTAM A REPROVAÇÃO 20
4.REPETÊNCIA X EVASÃO 22
5.DEFICIÊNCIAS DO SISTEMA DE ENSINO 27
6.GESTÃO DEMOCRÁTICA X REPETÊNCIA 31
7.APRENDIZAGEM EFICAZ COMO FORMA DE DISCRIMINAÇÃO
DA REPETÊNCIA 33
CONCLUSÃO 37
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 40
ANEXOS 41
RESUMO
A prática da reprovação na escola precisa ser repensada no âmbito da
busca de uma educação de qualidade.
O estudo, ora apresentado, buscou mostrar de quem é a competência e a
responsabilidade da Repetência Escolar. Culpados têm sido apontados, mas os
problemas continuam desafiando competências e compromissos.
A metodologia utilizada foi o método dedutivo.
O presente estudo adotou como suporte metodológico a pesquisa teórica,
elegendo como referencial obras gerais, trabalhos especializados e artigos de
revistas e jornais.
Para superar o problema de reprovação mantendo a qualidade do ensino
é necessário um compromisso com a aprendizagem de todos os alunos. Para isto,
devemos trabalhar na conscientização dos professores, escolas, família e dirigentes
para que se organizem de forma a garantir as adequadas condições de
aprendizagem.
LISTA DE ABREVIATURAS
DA – DIFICULDADE DE APRENDIZAGEM INEP – INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS APEOESP – SINDICATO DOS PROFESSORES DO ENSINO OFICIAL DO
ESTADO DE SÃO PAULO
CONSED – CONSELHO NACIONAL DE SECRETÁRIOS DE EDUCAÇÃO RENAGESTE – REDE NACIONAL DE REFERÊNCIA EM GESTÃO EDUCACIONAL
INTRODUÇÃO
Sabemos que um grande número de alunos fica reprovado no final do ano letivo. Muitos alunos permanecem por vários anos na mesma série, quase sempre nas iniciais. A prática da reprovação na escola precisa ser repensada no âmbito da busca de uma educação de qualidade. Sabemos que algumas iniciativas já vêm sendo tomadas, mas o debate deve se ampliar. O emergir destas questões remete nossa atenção para aqueles que são os responsáveis diretos pela educação no sentido de vermos o tratamento dado a “repetência”, pois muitas discussões sobre esses problemas têm ocorrido entre os diferentes profissionais da educação. Culpados tem sido apontados, mas os problemas continuam desafiando competências e compromissos. Muitos estudos têm indicado caminhos sem que se formulem, de fato, uma política educacional que ataque à raiz do problema. A repetência tem sido justificada por profissionais envolvidos com a Educação, muito mais como conseqüências de fatores extra-escolares, que influem determinadamente na vida da criança na escola, que por fatores internos em sala de aula. Tal explicação procura isentar a escola de qualquer responsabilidade por este resultado negativo. Basta, no entanto, que façamos uma auto-avaliação e ou avaliação do trabalho em sala de aula e da escola, para percebermos que este resultado está interligado à práxis que se efetiva no espaço da escola e da sala de aula. A reprovação deve ser superada por ser um fator de discriminação e seleção social.
“Quando falamos de seleção social, não estamos nos referindo à intenção consciente dos docentes enquanto indivíduos particulares, e sim ao papel social do sistema educativo” (Ferreiro, E e Teberosky., A p.18).
Socialmente, a escola é usada no sentido de colaborar com a marginalização de amplos setores das camadas populares (justamente os que tem sido sistematicamente reprovados), na medida que saem dela com a convicção de que são “incompetentes”.
O mau resultado da produção escolar - sob a forma de reprovação do aluno – tem sido representado por duas palavras distintas: fracasso e repetência, cujo significado, forjado na escola, já virou senso comum.
A palavra “Fracasso” explica essa reprovação como um atributo do aluno em decorrência de influências negativas de ordem econômica, cultural, social, psicológica e até como um fracasso da escola. Mostra uma aparente distância entre o fenômeno - apresentado no aluno – e os envolvidos no processo. Esse vocábulo não
é comumente usado na escola e muito menos com alunos e pais. Apesar de sua significação parecer distante e geral, paira sobre o aluno como um estigma, pois é ele que fracassa (Schliemann, p. 23).
Já a palavra “repetência”, esta sim, faz parte do cotidiano da escola, com alunos e pais. Enquanto o sentido de fracasso parece indicar que o aluno está distante da instituição, porque a escola pode ser vista como um tempo por onde esse indivíduo pode passar sem obter êxito, a repetência, ao contrário, o coloca dentro do espaço escolar. Mas, apesar da repetência estar dentro da escola, não faz parte dela, pois quem repete é o indivíduo aluno, sob influências externas.
Enquanto o fracasso parece estar ligado a uma ação dependente de situações específicas e espaciais (social, cultural, interesse etc), repetência indica uma ação própria e independente de quem executa a atividade escolar, que nunca é o professor – mesmo sendo explicada como fracasso.
Pedagogicamente a reprovação não é a melhor solução e não é justo o aluno pagar por falhas de outros.
“O que é a repetência? Quando uma criança fracassa na aprendizagem, a escola lhe oferece uma segunda oportunidade: recomeçar o processo de aprendizagem. É esta uma solução? Reiterar uma experiência de fracasso em condições idênticas não é, por acaso, obrigar a criança a repetir seu fracasso” (Ferreiro, e Teberosky, A, 1992 p.18).
O que o aluno precisa não é começar tudo de novo, mas ser ajudado em suas dificuldades específicas. Podemos nos lembrar ainda de casos de alunos retidos três ou quatro vezes na mesma série: resolveu reprovar?
Esta compreensão da repetência é posta no ato pedagógico, que se expressa no fazer cotidiano do professor – aluno. É interessante ressaltar que conforme esta visão, encontram-se presentes os conteúdos, os métodos, as técnicas, as atividades e a avaliação numa inter-relação com a ideologia liberal que funciona como Princípio e Fim do processo educativo. Daí que, o aluno que não obtém êxito, é reprovado e convocado a executar novamente esse ato pedagógico com o professor. Nesse instante, há o convencimento velado de que essa falta de êxito deve-se unicamente à sua incompetência, do aluno.
Entendemos que o aluno não deve pagar por eventuais deficiências do sistema de ensino, que não lhe permitiram um atendimento adequado. É claro que fatores exteriores da vida do aluno influenciam o desempenho escolar, mas a competência ou incompetência do aluno resulta, em última instância, da competência ou incompetência da escola (Ferreiro e Teberosky, A p.18) . As pesquisas pedagógicas tem demonstrado que, na verdade, para além dos mitos e preconceitos, toda criança é capaz de aprender, precisando apenas de estimulação e acompanhamento adequado (Patto. MHS).
Sabe-se também que o professor se repete, por ser ele quem dirige o ato pedagógico. Sob esta ótica, o repetente e o professor – já que é ele quem prioriza,
escolhe e planeja o processo pedagógico, pois tem fins a atingir. O aluno, por sua vez é convocado a tornar a fazer tudo aquilo que lhe foi determinado, enquanto projeto educativo da escola. A esta convocação a escola chama de repetência.
A Reprovação é também um fator de distorção do sentido da avaliação. Sabemos que um dos graves problemas da educação escolar é a
desproporcional ênfase à avaliação: o aluno fica preocupado em estudar para tirar nota para passar e não para aprender. Essa ênfase tem uma base material muito concreta: a legislação que dá poder à escola, ao professor de reprovar o aluno que não tiver média. Ou seja, na prática, o aluno tem que tirar nota para poder passar.
Final de ano é um pesadelo para muitos alunos. É que eles serão reprovados na escola, rotulados de incapazes e obrigados a freqüentar a série que acabaram de concluir, revendo os mesmos conteúdos, inclusive os já assimilados. E o que é pior, a história se repete há décadas. Em torno de 20% dos alunos do Ensino Fundamental “fracassam”, muitos pela segunda ou terceira vez. Num país onde há significativo déficit de vagas, a reprovação representa um agravante, pois este lugar poderia ser ocupado por um novo aluno. Isto acarreta um elevado custo social (Revista Nova Escola).
Este estudo tem como objetivo geral analisar a Repetência Escolar no Ensino Fundamental e Médio.
O estudo limita-se a investigar os possíveis culpados pelo fracasso escolar: o aproveitamento do aluno, a avaliação do professor, o Sistema Escolar como um todo ou até mesmo a família e fatores extra-escolares.
Buscaremos, também, as possíveis soluções para um dos maiores problemas da Educação Brasileira: a Repetência Escolar.
1 – REPETÊNCIA SOB A ÓTICA DA DISCRIMINAÇÃO SOCIAL
A Escola colabora socialmente com a marginalização de amplos setores
das camadas populares, na medida que saem dela com a convicção de que são “incompetentes”.
Primeiramente, analisaremos as questões das classes sociais, em relação as Dificuldades da Aprendizagem.
Segundo kappelman, (1972), “tentou estudar os efeitos independentes das classes sociais selecionando crianças com DA e crianças com bom aproveitamento escolar que pertencessem ao mesmo nível sócio-econômico”.
“Mesmo que as crianças estudadas venham do mesmo estrato sócio-econômico desfavorecido, ainda se identificam diferenças significativas nas suas histórias pré, peri e pós-natais, bem como se detectam diferenças nas suas condições de vida. De alguma maneira, por esse estudo, prova-se que as D.A. não são só dependentes da classe social; algumas das dificuldades podem ser atribuídas, pelo menos em parte, a fatores biológicos de risco”. (Kappelman, 1972 p.119).
O risco das D.A está, como constatamos, intimamente ligado às variáveis
das classes sociais. Quanto mais baixa é a origem sócio-econômica da criança e quanto maior é o grupo, maior é o risco das D.A, daí também, por concomitância, ser maior a responsabilidade dos agentes educacionais. “As crianças que mais necessitam deverão dispor, por essa razão, de melhores oportunidades educacionais, professores mais competentes e experientes e melhores programas de aprendizagem”. (Fonseca, 1995)
“Caberá à inovação do sistema sócio-educativo e à investigação interdisciplinar o avanço integrado de medidas de prevenção no setor das DA”. (Fonseca, 1995)
É dever e responsabilidade da escola principalmente a pública educar convenientemente todas as nossas crianças, daí a necessidade urgente de uma identificação precoce e da prevenção, em vez de se esperar por uma falha.
Para Abramowicz e Moll, (2001), citado em seu livro “em termos de Brasil, os índices de fracasso escolar atingem patamares impressionantes: “da amostra de 100 alunos matriculados na 1ª série, apenas 3, isto é, 3% vão se graduar sem nenhuma repetência em sua trajetória escolar, ou seja em oito anos” (Ribeiro 1993, p.67). A persistirem essas taxas e tentando projetá-las para o futuro, teremos 95% de uma geração com o ensino médio completo somente no ano 2100 (idem, p.70).
De acordo com Abramowicz e Moll, 2001, “nas décadas de 1940 e 1960 dominava a idéia de que pessoas eram portadoras de dons e aptidões inatas, dentre
as quais a inteligência, que as faziam ter maior ou menor sucesso na escola e na vida”.
“Com o movimento social das minorias, o foco de explicação desloca-se para os aspectos culturais, dando surgimento às teorias da “privação” ou “carência”: carência alimentar, carência cultural, carência afetiva”. (Abramowicz e Moll, 2001, p.29).
“O que gera o fracasso tem relação com as classes sociais, uma vez que a escola, como “aparelho ideológico do estado”, serve à dominação, especialmente, pela violência simbólica, passando a fazer o discurso da “diferença” e não mais do “déficit”, com isso expressando o entendimento de que as crianças das classes populares têm saberes diferentes, mas não inferiores ou deficitários”. (Abramowicz e Moll, 2001, p.30)
É verdade que os maiores índices de reprovação e exclusão escolar ocorrem dentre os alunos de nível socioeconômico baixo, em que se situa a maioria da população negra. Contudo, dentre esses reprovados, ainda são os alunos negros que mais lentamente são absorvidos pelo sistema educacional ou mais cedo são dele excluídos. A situação discriminatória é, portanto, mais forte do que a diferença socioeconômica. Aos 7 anos de idade há uma proporção elevada de crianças que ainda não ingressaram no sistema escolar, tanto brancos (40%) como pretos e pardos (55%), a partir dessa idade, as crianças brancas vão sendo absorvidas pelo sistema escolar atingindo o nível de 95% aos 11 anos, enquanto para as crianças pretas ou pardas o nível de absorção pelo sistema, nessa idade, é de 95%.
As diferenças nos índices de rendimento, aprovação/reprovação e permanência/evasão escolar, entre as crianças brancas e negras podem ser analisadas pela trajetória de vida acadêmica de tais crianças. (Abramowicz e Moll, 2001, p.31)
O fracasso escolar que exclui do sistema educacional uma enorme massa de crianças e que atinge em especial as crianças negras, bem como o material didático omite a participação na história dos negros e ainda excluem a contribuição do negro na cultura brasileira. A representação do negro aparece deturpada, desvirtuada e, muitas vezes omitida.
O preconceito e a discriminação, embora escamoteados, são muito fortes na escola. A forma de desconstruir esses preconceitos seria a de discuti-los pedagogicamente, isto porque as crianças negras são a maioria nas escolas públicas, visto que a criança da favela e da classe média vão para escolas diferentes. Portanto, o fracasso escolar, já inicia com o recrutamento da clientela, a escola tem o discurso da igualdade, mas não respeita as diferenças. Dessa forma os professores produzem o otimismo educacional em relação aos alunos brancos, classe média, meninas, enquanto também produzem a ideologia da impotência em relação aos alunos negros, pobres, meninos.
Reafirmamos, assim, nossa inquietação com um sistema que, tendo a qualificação de educacional, gera conseqüências perversas para a maioria da
população: excluindo os mais pobres e os negros, e legitimando tal exclusão em procedimentos técnicos e pedagógicos. (Abramowicz e Moll, 2001, p.44)
A maioria das crianças e dos adolescentes reprovados são pobres e isso não é condição, nem explicação para o fracasso escolar, nem mesmo uma categoria homogênea e invariante de análise.
O perfil sócio-econômico desses alunos prejudica bastante o seu desenvolvimento, isso faz parte de “ser pobre” neste país e, no entanto, nenhuma destas razões explica porque tais adolescentes repetem o ano.
Ocorre também repetência em crianças de outras classes sociais, que lotam os consultórios de psicólogos, psicanalistas, fonoaudiólogos, psicopedagogas e etc.
2 – AVALIAÇÃO COMO SETOR DE DISTORÇÃO PARA REPETÊNCIA
Avaliação escolar é um momento do trabalho escolar, que se distingue dos outros mais por uma certa dramatização da situação do que pelo conteúdo das tarefas. Quanto às tarefas submetidas à avaliação, trata-se para o aluno, em geral, de refazer sozinho, em um período limitado, o que ele mais ou menos longamente exercitou em aula antes, por exemplo, na escola primária, redigir um texto, compreender uma leitura, transformar frases, conjugar verbos, definir palavras, fazer operações ou desenhar figuras geométricas. (Perrenoud, 1999, p.30) Considerando que a cultura escolar não forma um todo homogêneo, que se compõe de disciplinas distintas, ensinadas separadamente, parece norma que seja objeto de avaliações independentes umas das outras. Para reconstruir as normas de excelência, os níveis de exigência e os procedimentos de avaliação, deve-se, portanto, não somente identificar as regras e a doutrina não-escrita da organização escolar, mas levar em conta a grande diversidade das concepções e das práticas. A cada um sua verdade: a excelência e o êxito não são únicos; sua definição varia de um estabelecimento, de uma turma, de um ano a outro no âmbito do mesmo plano de estudos. Essa diversidade, amplamente desconhecida, porque pouco legítima, não impede que um julgamento de excelência criado por uma única pessoa, de maneira discricionária, seja enunciado em nome da instituição e adquira, então, força de lei. ( Perrenoud, 1999, p. 31) Sabemos que um dos graves problemas da educação escolar é a desproporcional ênfase à avaliação: aluno fica preocupado em estudar para tirar nota para passar e não para aprender. Essa ênfase tem uma base material muito concreta: a legislação que dá poder à escola, ao professor de reprovar o aluno que não tiver média. Ou seja, na prática, o aluno tem que tirar nota para poder passar. O aluno pode não estar indo bem porque não está sendo avaliado de maneira adequada. Temos muitos casos de alunos reprovados por um professor e aprovado por outro, e vice-versa, ou ainda das diferentes notas tiradas numa mesma atividade do aluno quando solicitada a correção de diferentes professores. Há casos em que a avaliação se torna um instrumento de punição e de detenção de poder por parte de alguns professores. Esta atitude reflete as bases equivocadas do sistema anterior: a incapacidade de envolver o aluno no processo educativo por ele mesmo e não por ameaça de alguma punição (no caso, a nota).
3. MITOS QUE SUSTENTAM A REPROVAÇÃO
Existe uma série de mitos que sustentam a reprovação: mito da indolência das classes populares, mito da deficiência de linguagem, mito da desnutrição como causa do fracasso escolar,mito da carência afetiva, mito da evasão escolar para o trabalho, mito da gratuidade do ensino público. Como aponta Maria Helena Souza Patto, estes mitos precisam ser revisitados e superados, já que funcionam como justificativas para a manutenção do status quo. Para muitos professores, a possibilidade da reprovação coloca-se como uma exigência de ordem ética, ou seja, considera que não se deve enganar o aluno e a sociedade: “Se o aluno não sabe, não deve passar”. Há aqui este fundo ético que deve ser respeitado; mas há também um enfoque limitado que deve ser superado. Devemos fazer algumas perguntas antes de classificarmos este aluno como “inapto” para a série seguinte: Será que o aluno realmente “não tem condições de prosseguir na série seguinte” ou, na verdade, não teve a necessária atenção, estimulação e acompanhamento? É o aluno que não tem condições de passar ou a escola que não está tendo condições de ensinar?
“A preocupação maior dos educadores, em geral, são as crianças que não aprendem e “não se sabe por quê”, não há lesão cerebral, não há desnutrição, não há deficiência auditiva, não há índices claros de psicose, não há lesão no aparelho foniátrico”. (Chiarottino, 1984)
Segundo Dolle, (1994) a aprendizagem é constituída de oscilações cognitivas. O sujeito sócio-psico-cognitivo não pode “ser bom” em todas as áreas num mesmo tempo-espaço, conforme o esperado pelas instituições educacionais. Tudo isso nos leva à conclusão de que os seres humanos têm talentos diferentes. E que nós precisamos apenas encarar a “não-aprender” como variações de talentos, oscilações cognitivas, segundo Dolle, (1994), cujas desvantagens são determinadas por circunstâncias sociais locais. O desenvolvimento não depende somente do estímulo resposta (linear), conforme dizia Skiner, mas de como o sujeito vai significando e adaptando suas ações no mundo. Talvez o problema referente ao “não-aprender”, diz respeito, sobretudo ao desenvolvimento de como se evolui a aprendizagem ou de como se aprendem e de como se constelam tais processos. Para Pires, (1996), essa ignorância está no conhecimento, principalmente por parte dos professores da psicologia do desenvolvimento (gênese das estruturas cognitivas); das capacidades cognitivas das crianças e de seus ritmos diferentes; da
importância de desafiar o sujeito a pensar sua ação; e da função da família e da escola como produtores de significações psicossociais. Nesse sentido necessitamos reinventar uma outra prática diferente da que acreditamos. A criança não aprende por fatores psicomotores e até mesmo por problemas sociais como desnutrição, pais separados, imaturidade, falta de apoio, motivação e etc... Mas quem sabe, criarmos o discurso do tipo: a criança é apenas resultado de um sistema (no seu todo). Cabe à escola diminuir o índice de dificuldades das crianças e se preocupar em oferecer metodologias alternativas renovadas, por meio das quais realmente os alunos sintam-se importantes na prática, não só, na teoria e nos planejamentos escolares”. (Peres, 1996)
4. REPETÊNCIA X EVASÃO ESCOLAR
A repetência é o maior problema da educação em todo o mundo, no Brasil, o
problema é inevitável, a função da escola é ensinar, dá trabalho, porém muito mais
problemática é a perversa estrutura que premia a repetência e a punição dos alunos. Os
governos federais, estaduais e municipais se vêem com uma bomba na mão para
resolver tais problemas que também envolvem diretores de escolas, coordenadores e
professores. Portanto, nos últimos tempos, um sistema apareceu na educação como
uma espécie de solução perfeita: os ciclos. Segundo o Censo Escolar, organizado pelo
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais, o INEP, 23% das matrículas no
Ensino Fundamental no ano passado foram feitas em escolas que seguem esse regime.
Aproximadamente 18.300 escolas adotaram a fórmula em 23 Estados e no Distrito
Federal. Outras 13.800 preferiram um esquema híbrido, misturado com as tradicionais
séries.
No Brasil, os defensores desse sistema são muitos, Maria Helena Guimarães,
presidente do Inep, diz que ele ajusta os conteúdos ao processo de desenvolvimento
infantil, adequando o tempo do aluno à atividade escolar. “Assim, ao final do ciclo ele
dificilmente apresentará problemas de aprendizagem”.
Paulo Roberto Padilha, pedagogo e diretor técnico do Instituto Paulo Freire,
com sede em São Paulo, é outro que apóia a iniciativa: ”Ela muda o processo do
conhecimento, faz surgir o respeito aos ritmos e diferenças de cada um. É um caminho
para a verdadeira escola cidadã que Paulo Freire pregava”.
O princípio dos ciclos é simples. O aluno deve ser avaliado sempre (a tal da
progressão continuada). A cada semana, a cada mês, a cada ano, é preciso
saber quantos dominam tudo o que foi proposto, quantos avançaram 80%, quantos ainda
estão em 30% ou 10%, explica a pesquisadora Argentina Sara Paín. Além disso, com o
fim da repetência a turma permanece unida, criando um clima mais propício à
aprendizagem, uma vez que os estudantes têm a chance de se tornar mais amigos e
parceiros ao longo do árduo processo de construir conhecimentos.
No dia-a-dia, porém, as experiências não alcançam tanto sucesso. Em São
Paulo, o Estado que mais avançou na implantação do novo sistema, os ciclos sofrem
ataques contínuos. Muitos docentes acusam as secretarias de Educação de impor a
“promoção automática” ( o oposto da “cultura da repetência”), tirando-lhes o poder de
decidir os rumos da sala de aula. Já houve até greve contra a mudança. A crítica
procede: faltou investir na formação dos professores e, sobretudo, envolvê-los no
processo. Foi tudo imposto, resume Maria Izabel Noronha, diretora do Sindicato dos
Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp). Qualquer mudança
deve ser feita depois de um trabalho coletivo, mas aqui esqueceram de consultar os
maiores interessados no assunto, os professores.
Para que o novo modelo funcionasse de fato, não bastava baixar a norma.
Era preciso rever a proposta pedagógica, mudar a avaliação, os conteúdos, a formação
do pessoal e a gestão. Enfim, reinventar a escola. Para começar, todo o corpo docente
passou a ser avaliado por pais e alunos. Até hoje, sugestões e críticas assinadas são
depositadas em urna nas reuniões bimestrais.
A avaliação tornou-se um processo permanente e deixou de ser feita apenas
por meio de provas. Para que todos pudessem se atualizar e aprender com os colegas,
experiências e dúvidas da equipe começaram a fazer parte das reuniões semanais de
estudo. A resposta veio lentamente, com a queda da evasão e da repetência. O
resultado desde 1996 é animador, os índices foram zero.
Para a psicopedagoga Maria Cristina Labate Mantovanini, essas histórias não
têm segredo. Quando o professor retoma sua potência e assume seu papel, ele não
exclui nenhum aluno, afirma. Após estudar durante um ano os critérios utilizados por
uma escola da periferia de São Paulo para classificar os alunos em bons e maus, ela
concluiu: são os educadores que discriminam os “problemáticos”. Isolam-nos num canto
da sala e não os chamam ao quadro-negro”, relata a pesquisadora. O pior é que as
crianças assumem integralmente o julgamento de fracassadas e passam a acreditar que
são de fato incapazes.
O trabalho da picopedagoga revelou que os dois grupos - dos “bons” e dos
“maus” – tinham a mesma capacidade intelectual. A diferença era gritante, no entanto,
no que diz respeito à auto-estima. O professor idealiza um estudante que não existe,
sem problemas familiares, avalia. É como se, ao se dar conta de que é impossível trazer
de volta o pai que partiu ou tornar a mãe mais presente na vida do filho, o educador
assinasse uma sentença definitiva: “Esse não tem jeito”. Professores de escolas
públicas e particulares excluem, de forma inconsciente e indiscriminada, toda vez que
não se sentem valorizados.
A maioria dos professores diz que é impossível dar atendimento
individualizado em classes com quarenta ou cinqüenta alunos. A reforma proposta pela
secretaria, com a implantação dos ciclos, não está dando resultado porque os
profissionais não acreditam nela, não foram preparados, o que se vê são muitos alunos
passando de ano sem saber, porque os educadores não assumiram o compromisso de
ensinar. A capacitação se tornou fundamental para que os professores tenham melhores
condições de trabalho e material didático.
As taxas de repetência e evasão escolar da rede municipal, que eram de 30%
e 15%, respectivamente, só caíram para 1% e 5% quando todos se conscientizaram de
que a organização por ciclos não significa progressão automática. A avaliação contínua
do aprendizado leva a uma reformulação de conceitos.
Segundo Gadotti, (2000), “as exigências são outras e o papel do educador é
adaptar-se: deixar de ser um selecionador para se tornar um gestor do conhecimento”.
Hoje, temos que decidir de que lado ficamos; no time que formam os novos e
bons profissionais ou no dos que preferem reprovar a ensinar.
5 – DEFICIÊNCIAS DO SISTEMA DE ENSINO
O fracasso escolar é um problema recente. Com a instauração da
escolaridade obrigatória é que o problema surgiu no século XIX e tomou um lugar
bastante considerável nas preocupações de nossos contemporâneos em conseqüência
de uma mudança radical da sociedade.
“Estabeleceu a instrução laica e obrigatória em 1880; é pouco provável que a noção de fracasso escolar tenha surgido durante os primeiros decênios que se seguiram. O que estava previsto pela lei, a saber, “a mistura dos ricos e dos pobres nos bancos escolares” (discurso pronunciado em 10 de abril de 1870), a igualdade de chances para todos, a supressão das classes sociais, esteve longe de se realizar. O fato de pertencer a uma classe social determinará, por muito tempo ainda, o limite do curso escolar”. ( Cordié, 1996) “Apenas as crianças da burguesia freqüentavam o liceu, que era pago e permitia acesso às carreiras liberais, essencialmente direito e medicina. Se a obrigatoriedade escolar era ditada por um ideal republicano que tomou para si a tarefa de construir a liberdade suprimindo as distinções de classe através da educação do povo, esse ideal era a tradução jurídica de necessidades econômicas; a revolução industrial que estava se completando iria modificar profundamente a paisagem social: as máquinas deviam substituir o homem, como se desejava e se temia, e era necessário se adaptar, adquirir outras competências, em particular um saber diferente dos manuais. Entrávamos na era do proletariado”. (Cordié, 1996)
Atualmente, essa mudança da sociedade que começou no final do século XIX prossegue em ritmo cada vez mais rápido. Hoje são as crianças de todos os meios, de todas as classes sociais que são obrigadas a prosseguir sua escolaridade até os 16 anos. Essa obrigatoriedade não instaura, no entanto, a igualdade de oportunidades. Ainda segundo Cordié, 1996, “o sucesso nos estudos não se atém unicamente à qualidade do ensino ministrado; muitos fatores entram em jogo na incapacidade de atingir o nível de instrução exigido hoje”.
Contudo ainda há discordância entre as tradições familiares e os novos
modos de vida. Essa ruptura brutal implica conflitos entre gerações, conflitos que são,
eles próprios, fontes de fracasso escolar. Por outro lado, um sucesso muito
maior para uma criança de origem modesta pode provocar a rejeição quando não o
desprezo de seus próprios pais. O sujeito guardará vestígios disso durante sua vida:
desgostos, vergonha, questionamento sobre sua identidade. E com isso o fracasso
escolar se tornou sinônimo de fracasso de vida. O processo sócio-cultural nos leva a
procura de determinados personagens ilustres nos identificamos com eles e
apreendemos seus valores com o objetivo final de alcançarmos o sucesso, o dinheiro, a
posse de bens e o poder que resulta disso representam, no grau mais elevado, valores
que todos sonham possuir.
O fracasso escolar pressupõe a renúncia a tudo isso, a renúncia ao gozo. Os
pontos sensíveis que podem originar uma rejeição escolar estão ligados em geral a
conflitos inconscientes entre os diferentes modos de identificação do sujeito. Freud nos
forneceu referências para construção do ego. O ego ideal e o ideal do ego encontram
sua fonte, em parte, nos modelos sociais, enquanto o superego está ligado à posição
edipiana do sujeito, ele é o “herdeiro do complexo de Édipo”, diz Freud.
O superego, com seu peso de culpabilidade e de interdito, barra o acesso a
toda realização do ideal do ego, ideal que o sujeito encontra, nesse caso, em seu meio:
competitividade com seus pares, desejo de saber, sucesso social à vista.
O ideal do ego tem identificação em um modelo humano; exemplo disso são
jovens que falam, vestem-se, comportam-se como seus ídolos ou imitam algum
personagem que os subjuga. Esses ideais mudam de acordo com a época ou a idade
das crianças.
6 – GESTÃO DEMOCRÁTICA X REPETÊNCIA
Uma gestão democrática e uma boa administração na medida certa levam a
uma aprendizagem a cada dia mais inovadora e dinâmica.
Estudos no mundo todo mostram que há relação entre as decisões da direção e o desempenho escolar do aluno, afirma o Presidente do (Consed), Éfrem Maranhão, novembro 2000. Quando se fala em gestão não se trata apenas de controlar recursos,
coordenar funcionários e assegurar o cumprimento dos dias letivos e horas-aula. É um
novo modelo de administração totalmente integrado à esfera pedagógica, portanto todas
as ações administrativas devem chegar ao produto final – a educação. Na cabeça dos
gestores sempre devem estar presente o aumento do interesse dos alunos e a redução
dos índices de repetência. O principal é ter uma visão mais global, preocupando-se com
os recursos, os processos, as pessoas, o currículo, a metodologia, a disciplina, tudo de
maneira interligada, afirma Heloísa Lück (Renageste).
Não adianta investir em infra-estrutura e não ter professores capacitados ou
implantar uma proposta pedagógica avançada e não ter condições físicas para adota-la.
Ações isoladas e desarticuladas são apenas paliativas e pouco eficazes, afirma Heloísa
Lück, nov 2000.
Uma medida importante e inovadora, rumo à consolidação da política
educacional, é a descentralização orçamentária, financeira, administrativa e pedagógica
com a criação de várias Coordenadorias. As Coordenadorias têm a responsabilidade de
implementar a política educacional, gerenciando com autonomia as escolas da sua área
de abrangência e equipando-as com a infra-estrutura necessária ao seu pleno
funcionamento.
A valorização do Diretor nesta nova metodologia e a criação da função de
Coordenador Pedagógico amplia o tempo de atendimento aos alunos. A
descentralização do Sistema concedeu mais autonomia às unidades escolares, que são
responsáveis pela construção do seu Projeto Político-Pedagógico, com a participação de
todos os segmentos da comunidade escolar.
7. APRENDIZAGEM EFICAZ COMO FORMA DE DIMUINUIÇÃO DA REPETÊNCIA
“O desafio de uma reforma do sistema educacional só será maior se ela beneficiar, prioritariamente, os alunos que fracassam na escola. Pode-se visar a uma modernização, a uma descentralização ou a uma profissionalização maior do ofício de docente, sem, necessariamente, situar as dificuldades de aprendizado no centro do projeto. Não obstante, o principal problema da escola, que resiste às sucessivas reformas há décadas, é a dificuldade em instruir os jovens, senão em igualdade, ao menos de maneira tal que cada um alcance, ao chegar à idade adulta, um nível aceitável de cultura e de competência, tanto no mundo do trabalho como na vida”. (Perrenoud, 1999, p.71)
No período dos anos 60, a preocupação com o fracasso escolar maciço das
crianças das camadas populares era menor. Portanto, tal fracasso estava na ordem das
coisas e, aliás, ficara por muito tempo ocultado por uma estrutura escolar que
justapunha duas redes compartimentadas: uma popular, que desembocava na vida
ativa, e outra de elite, que preparava para estudos superiores. (Isambert-Jamati, 1985).
As reformas escolares pretendem, periodicamente, atacar as desigualdades
existentes na escola para melhor democratizar o ensino. As figuras da desigualdade
modificaram-se, pois as classes sociais transformaram-se e a escolarização
desenvolveu-se, globalmente falando; porém, a relação entre o sucesso escolar e a
origem social ainda continua forte. O fracasso escolar é o fracasso do aluno ou o
fracasso da escola?
“Quando uma reforma educacional é aceita, implementada e em certa medida surte efeitos, é porque ela é apoiada por uma fração suficiente da opinião pública, da classe política e do mundo da escola. Portanto, funda-se, necessariamente, em alianças e compromissos, de maneira que se parece um pouco com uma pousada espanhola. Por isso, não basta dizer que tal reforma adere a uma abordagem por competências; é preciso dizer por que e qual a relação é estabelecida entre competências e fracasso escolar”. (Perrenoud, 1999)
No Brasil, 83% dos estudantes repetem pelo menos uma vez da primeira à
oitava série ou desistem da escola antes de concluir o primeiro grau.
O Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 1996
contou 3,65 milhões de adolescentes com essa idade. Entre eles, só 621.500 (16,99%)
estavam na oitava série no ano passado, de acordo com o Ministério da Educação
(MEC).
Apesar dos índices de repetência indicarem uma queda na taxa, eles são
ainda muito altos, principalmente nas séries iniciais.
Segundo dados do INEP, o Brasil tem hoje aproximadamente 53 milhões de
estudantes, considerando-se todos os níveis e modalidades da educação básica e
somadas as matrículas do ensino superior e de pós-graduação, o que corresponde a um
terço do total da população.
Em três décadas, o sistema educacional brasileiro mais do que triplicou seu
tamanho. Trata-se, portanto, de um sistema de massas exigindo vultosos investimentos
do setor público, que responde por 89,3% das matrículas do ensino fundamental, 80,2%
do ensino médio e 38,35% do ensino superior.
De acordo com estimativa feita a partir dos resultados preliminares do Censo
Escolar de 1998, a taxa de escolarização líquida da população de 7 a 14 anos já é de
95%, antecipando e superando uma meta estabelecida pelo Plano Decenal de
Educação para todos, que previa elevar a cobertura até o ano 2003 para, no mínimo,
94% da população em idade escolar.
O Brasil está muito perto de universalizar o acesso ao ensino fundamental. O
que precisa, agora, é assegurar as condições de permanência no sistema e de sucesso
escolar.
Apesar do declínio da taxa de distorção série/idade e da evolução positiva
dos principais indicadores de fluxo escolar, o quadro geral ainda é insatisfatório. Quase
a metade dos alunos (47%) está defasada em relação aos seus estudos, o que pode ser
resolvido com a implantação do ciclo básico, contudo, a qualidade do processo de
aprendizagem.
A taxa de repetência deverá situar-se neste ano em 29%, mantendo a
tendência de queda que se verifica desde a década de 80. Ao mesmo tempo, a taxa de
promoção segue em alta, devendo atingir 67% no final do ano letivo de 2000. A evasão,
por sua vez, continua em queda, podendo atingir 4% dos alunos.
A melhoria da qualidade do ensino fundamental passa, necessariamente,
pela melhoria das condições de oferta do ensino e pela superação das disparidades
regionais.
As regiões norte e nordeste apresentam ainda as piores taxas de
escolarização em todos os níveis de ensino. É, também, nestas duas regiões que se
concentram cerca de 60% das crianças fora da escola.
Ainda temos metade dos professores da Educação Básica, ou seja, 53,49%,
não possui curso superior completo. Em números absolutos, são cerca de 820 mil
professores que terão que complementar sua formação, caso queiram permanecer no
magistério. Portanto, deverão ser formados a cada ano cerca de 100 mil professores no
nível superior durante a próxima década.
CONCLUSÃO
O problema da repetência que passa a gerar o fracasso escolar deve ser
enfrentado com políticas de nucleação de escolas e com ações específicas que
considerem as características geográficas e sociais de cada região.
A nova LDB permite que algumas medidas sejam tomadas para minimizar o
problema: organização do ensino por ciclos; organização de classes de aceleração;
maior flexibilidade do sistema de avaliação.
Além dessas medidas previstas na Lei é necessária também uma ação
conjunta ao professorado para que os docentes utilizem métodos variados e flexíveis de
avaliação, principalmente a avaliação continuada. Os professores devem observar
alguns preceitos ao lidar com os alunos defasados:
• A auto-estima do repetente precisa ser estimulada. Mas o
professor não pode se limitar a encorajá-lo. O estudante sé se sente seguro
quando consegue cumprir tarefas. É um erro exigir menos dos alunos
defasados por achar que eles são problemáticos.
• Para saber como o estudante evolui, é preciso avaliar o
desempenho dele em cada atividade. Isso exige enorme atenção do
professor. E não basta ver se o aluno acertou: é preciso saber que habilidade
e raciocínio ele demonstrou.
• Conversar com os pais e pedir apoio deles para conferir tarefas e
incentivar os filhos a estudar. Antes de qualquer coisa, a família deve
acreditar que o aluno é capaz de aprender.
• Em classes com muitos repetentes, as idades e os interesses são
variados. Para satisfazer a todos, sempre é bom utilizar atividades e projetos
que integrem várias disciplinas.
Na mudança a ser realizada, não adianta impor a proposta (que deixa de ser proposta); por melhor que seja a idéia, ela precisa passar pela aceitação do grupo. Há que se considerar que os professores são os agentes coordenadores do processo ali no dia-a-dia, no concreto da sala de aula; se não estiverem convencidos, já sabemos o que acontece: mantêm as aparências, mas fazem o que sempre fizeram antes. É claro que não se espera a adesão de todos num primeiro momento; mas deve haver o referendo da maioria para se implantar.
Ao tentar finalizar este trabalho, atribuindo a responsabilidade ao “outro”,
fugimos à reflexão quanto ao papel de cada um na instituição escola. A repetência
escolar transforma-se em uma questão de incapacidade pessoal.
Torna-se necessário romper o ciclo de pulverização de culpas. As questões
de educação devem ser encaradas como questões coletivas.
Para superar o problema da reprovação, mantendo a qualidade do ensino,
propomos um sério compromisso com a aprendizagem de todos os alunos. Para isto,
devemos trabalhar na conscientização dos professores, escolas e dirigentes para que se
organizem de forma a garantir as adequadas condições de aprendizagem.
Este compromisso se traduz, por exemplo, na reunião da proposta de trabalho
do professor, visando adequá-lo às necessidades dos alunos; na recuperação
instantânea; no processo mesmo de ensino-aprendizagem; nas atividades
diversificadas; na orientação de estudo; no trabalho específico de complementação de
experiências pedagógicas, etc.
A escola deve explicitar de maneira clara e transparente sua proposta
pedagógica, recriando-se os espaços de participação e troca entre todos os excluídos no
processo ensino-aprendizagem. Como uma das formas para que se encontrem
alternativas ao atual modelo educacional e para a obtenção de um ensino de qualidade
satisfatória para todos.
Embora ainda com muitas inquietações e conscientes de que o material
reunido comporta outras possibilidades de leituras, apontamos alguns aspectos que
poderão contribuir para um repensar no alto índice de repetência escolar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABRAMOWICZ, Anete e MOLL, Jaqueline. Para Além do Fracasso Escolar.
Campinas, SP: Papirus, 4ª edição, 1997.
. A Menina Repetente. Campinas: Papirus, 1995.
. A menina Repetente. Campinas: Papirus, 1995.
ALCANTARA, P. de, MARCONDES, E.. Instituto Nacional do Livro/MEC. São Paulo: Editora Brasil, 1974.
AQUINO, Julio Groppa. Erro e Fracasso Escolar na Escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, 1997.
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DISLEXIA. Boletim. Rio de Janeiro: s.d.
CORDIÉ, Anny. Os Atrasados não Existem. Psicanálise de Crianças com Fracasso Escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
DOLLE, Jean-Marie. As Oscilações cognitivas – Ensaio de modelização em microgênese. Educação e Realidade. 1994.
FERREIRO, E. e TEBEROSKY. A Psicogênese da Língua Escrita. Revista dois Pontos: Teoria e Prática em Educação, nº 14, dezembro,1992.
FONSECA, Vitor da. Introdução às Dificuldades de Aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas, 2ª edição, 1995.
JORNAL O GLOBO – ANO LXXVI – Nº 24.792 – 28 de junho de 2001.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. (Coleção magistério. 2º grau. Série formação do professor). São Paulo: Cortez, 1994
PAIN, Sara. Ensino Passo a Passo. Revista Nova Escola. Novembro 2000.
PATTO, Maria Helena Souza. A Produção do Fracasso Escolar. São Paulo: Summus Editorial, 1991.
PERES, Lúcia Maria Vaz. Significando o “não-aprender”. Pelotas: Educat, 1996.
PERRENOUD, Philippe. Construir As Competências desde a Escola. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.
.Avaliação. Da Excelência à Regulamentação das Aprendizagens Entre Duas Lógicas. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999.
RANOZZI-CHIAROTTINO, Zélia. Em busca de sentido da obra de Jean Piaget. São Paulo: Ática, 1984.
REVISTA DO PROFESSOR – NOVA ESCOLA. A Repetência, uma vergonha Nacional – Novembro de 2000.
SCHLIEMANN, Analúcia Dias. Na Vida Dez, na Escola Zero. São Paulo: Cortez, 1989.
ZELAM, Karen. Os Riscos do Saber: Obstáculos do Desenvolvimento à Aprendizagem Escolar. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1993.
A N E X O S
QUADRO 1 - MAPA DA REPETÊNCIA
ESTADOS ÍNDICE TOTAL
DE RETENÇÃO NAS ESCOLAS PÚBLICAS
E PARTICULARES (DE 98 PARA 99)
RETENÇÃO NA 1ª SÉRIE (DE 98
PARA 99)
TAXA DE EVASÃO
(DE 98 PARA 99)
ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA ESCOLAR
NA REDE ESTADUAL DE ENSINO
Acre 33,5% 57,5% 6,1% Série
Rondônia 24,4% 38,0% 6,9% Ciclo para 1ª/2ª Série de 3ª a 8ª.
Amazonas 28,4% 49,0% 6,1% Série
Roraima 12,2% 28,7% 7,8% Série
Pará 37,1% 60% 8,8% Ciclos para 1ª/2ª/ e 3ª/4ª Série de 5ª a 8ª
Amapá 24,8% 37,2% 6,2% Ciclos para 1ª/2ª e 3ª/4ª Série de 5ª a 8ª
Tocantins 29,6% 52,9% 7,3% Série
Maranhão 30,9% 52,5% 6,2% Série
Piauí 37,1% 59,3% 6,3% Série
Ceará 25,0% 49,8% 4,7% Ciclos por idade de 6 a 8 anos, 9 e 10 anos e 11 e
12 anos Série para os demais
Rio Grande do Norte
32,9% 49,1% 4,3% Ciclos para 1ª/2ª e 3ª/4ª Série de 5ª a 8ª
Paraíba 33,1% 52,0% 5,1% Série
Pernambuco 29,3% 48,6% 5,4% Série
Alagoas 39,9% 59,7% 4,8% Série
Sergipe 33,8% 56,2% 5,6% Série
Bahia 32,1% 53,0% 5% Ciclo para 1ª/2ª Série de 3ª a 8ª
Minas Gerais 10,5% 19,4% 6,5% Ciclos para 1ª/3ª; 4ª/6ª e 7ª/8ª. As escolas podem
optar pelo sistema de séries.
Espírito Santo 19,1% 26,3% 4,7% Série
Rio de Janeiro
21,7% 36,4% 4,2% Ciclos para 1ª/2ª e 3ª/4ª
Série de 5ª a 8ª
São Paulo 6,3% 6,5% 3,3% Ciclos para 1ª/4ª e 5ª/8ª
Paraná 14,0% 19,4% 6,4% Ciclo para 1ª/4ª
Série de 5ª a 8ª
Santa Catarina
15,8% 24,5% 4% Série
Rio Grande do Sul
18,3% 28,3% 4,3% Série
Mato Grosso do Sul
23,1% 36,2% 6,2% Ciclos para 1ª/2ª e 3ª/4ª
Série de 5ª a 8ª
Mato Grosso 20,0% 28,5% 6,3% Ciclos para 1ª/2ª, 3ª/5ª e
6ª/8ª Onde ainda não houve
capacitação de professores, série de 1ª a
8ª
Goiás 28,3% 41,8% 5% Série Distrito Federal
17,0% 27,7% 5,4% Série
TOTAL 21,3% 40,1% 4,5% - Fonte: Inep/Mec – Pesquisa: Arthur Guimarães- Nova Escola – nov/2000.