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DO CONCURSO DE PESSOAS: Delimitação entre coautoria e participação a partir da Teoria do Domínio do Fato Renato Martins Machado

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DO CONCURSO DE PESSOAS:Renato M

artins Machado

É indiscutível a importância do estudo do concurso de pessoas na teoria do crime. A doutrina da intervenção coletiva é, sem dúvida, uma das mais importantes de toda a parte geral do Direito Penal. Não por acaso, a doutrina (tanto nacional quanto estrangeira) tem se esmerado no sentido de constantemente apresentar novas contribuições a esse importante tema. Além de, indiscutivelmente, ser um dos temas mais importantes da parte geral do Direito Penal, o estudo de concurso de pessoas para a prática de crime é também considerado um dos temas mais árduos de todo o estudo da teoria do crime. Atento a essas considerações, o objetivo central do presente trabalho é contribuir no sentido de aclarar um dos pontos mais complexos do estudo do concurso de pessoas para a prática de crime: a distinção entre autoria e participação. A presente investigação busca, em resumo, apresentar critérios dogmáti-cos seguros e sistematizados para adequadamente delimitar a autoria e consequentemente distinguir autoria e participação no estudo do concurso de pessoas para a prática de crime.

RENATO MARTINS MACHADO

Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pós-Gradu-ado, lato sensu, em Direito Público pelo Centro Universitário Newton Paiva. Professor do Curso de Direi-to do Centro Universitário Newton Paiva. Professor, convidado, da Pós--Graduação (lato sensu) em Direito Tributário da PUC Minas Virtual; Pro-fessor, licenciado, da Pós Graduação (lato sensu) em Direito Público das Faculdades Promove. Membro do Conselho Consultivo, Fiscal e Cientí-� co do Instituto de Ciências Penais – ICP. Advogado Criminalista, sócio do Escritório Luciano Lopes, Machado & Barbosa Advocacia Criminal.

“Renato Martins Machado, na obra que o leitor tem em mãos, ao exa-minar acórdãos do Tribunal de Justi-ça de Minas Gerais, demonstra, por exemplo, que um mesmo julgado, a despeito da expressa adoção do domínio do fato como ideia reitora da distinção entre autor e partícipe, chega a formular uma de� nição de autoria direta – ou “imediata”, como prefere o autor do trabalho – de base formal-objetiva. Trata-se de um exemplo em que se acomodam em um mesmo ato decisório ao menos duas teorias, uma delas de origem causal-naturalista. Até aí, nenhuma incompatibilidade mais grave, desde que não se perca de vista a impor-tância dos dados objetivos e/ou sub-jetivos para a de� nição do domínio do fato, sem o que se corre o risco de sua deturpação ou errônea apli-cação. Uma das questões em que a prevalência de um desses dados so-bre o outro se mostra essencial para a distinção entre autor e partícipe é relativa à � gura do mandante. Se, para Roxin, o mandante é instiga-dor, porque sua de� nição de auto-ria – ou coautoria – requer suporte na ideia de contribuição do agente na execução do fato, para Jakobs, o mandante é coautor, com base no que denomina de “domínio da forma de manifestação para o fato”, o que é, na observação de Juarez Tavares, fruto de uma “concepção própria” do teórico alemão. “

Beatriz Vargas Ramos

DO CONCURSO DE PESSOAS:Delimitação entre coautoria e participação a partir da Teoria do Domínio do Fato

Renato Martins Machado

2507767885849

ISBN 978-85-8425-077-6

Delimitação entre coautoria e participação

a partir da Teoria do Domínio do Fato

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Do Concurso de Pessoas: Delimitação Entre Coautoria e

Participação a Partir da Teoria do Domínio do Fato

Renato Martins Machado

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Copyright © 2015, D’ Plácido Editora.Copyright © 2015, Renato Martins MachadoEditor ChefePlácido Arraes

Produtor EditorialTales Leon de Marco

Capa Letícia Robini de Souza

DiagramaçãoBárbara Rodrigues da Silva

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida, por quaisquer meios, sem a autorização prévia da D’Plácido Editora.

Catalogação na Publicação (CIP)Ficha catalográfica

MACHADO, Renato MartinsDo concurso de pessoas: delimitação entre autoria e participação a partir da

teoria do domínio do fato -- Belo Horizonte: Editora D’Plácido, 2015.

Bibliografia.ISBN: 978-85-8425-077-6

1. Concurso de pessoas. 2. Diferença entre autoria e participação. I. Brodt, Luís Augusto Sanzo. II. Universidade Federal de Minas Gerais. III. Título.

CDU343.237 (043) CDD340

Editora D’PlácidoAv. Brasil, 1843 , SavassiBelo Horizonte – MGTel.: 3261 2801CEP 30140-002

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“Vencer, Vencer, Vencer este é o nosso ideal...” (MOTTA, Vicente. Hino do Clube Atlético Mineiro.

Belo Horizonte, 1969)

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Para a minha filha, Maria Fernanda Machado, e para a minha esposa, Maria Cândida, com todo amor que neste

mundo houver...

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Agradecimentos

Registro aqui a minha mais sincera gratidão, pedin-do escusas por ter eventualmente deixado de mencionar alguém nestes modestos agradecimentos.

Agradeço primeiramente a Deus pela constante pre-sença em minha vida. Ao Professor Luís Augusto Sanzo Brodt, exemplo definitivo de seriedade e compromisso com a pesquisa, pela confiança, pela paciência e por todas as intervenções precisas. Às Professoras Sheila Jorge Selim de Sales e Daniela de Freitas Marques pelos conhecimentos transmitidos. Ao Professor Luciano Santos Lopes, amigo e companheiro da advocacia criminal, pelas primeiras lições de Direito Processual Penal, pelo acesso amplo e irres-trito à sua biblioteca e por encorajar-me no rumo desta difícil empreitada. Ao meu sócio e leal amigo Leonardo Barbosa pelo incondicional apoio durante a realização da presente pesquisa e por dividir comigo as angústias e os contentamentos da advocacia criminal. Aos Professores Rodrigo Iennaco, Eduardo Rocha e Ronan de Oliveira Rocha pela amizade sincera construída durante o curso de pós-graduação na Faculdade de Direito da UFMG. Ao Professor Emerson Castro pela primeira oportunidade junto ao magistério superior. À Professora Beatriz Vargas Ramos pela criteriosa avaliação e pelas inestimáveis contribuições apresentadas ao presente trabalho. Ao Professor Salomão Cateb pelo apoio e pelos constantes incentivos. Ao Profes-

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sor Mariano Lopes pela revisão e adequação do texto ao padrão culto da língua portuguesa, e aos meus alunos pela constante renovação dos meus modestos conhecimentos.

À minha esposa, Maria Cândida Machado, pela pa-ciência, pelo incentivo, pelo companheirismo, pelo amor incondicional e por cuidar de nossa pequenina Maria Fer-nanda durante o tempo em que me dediquei à pesquisa. Aos meus pais, Souza e Maria Ninfa, pelo carinho e pela vibração em todas as minhas conquistas. Aos meus irmãos, Rodrigo Machado e Gabriel Machado, ao meu Pai Edson, aos meus familiares e aos meus amigos por compreenderem as minhas ausências.

Por fim, agradeço de uma maneira muito especial à minha amada filha, Maria Fernanda Machado. Filha, faltam--me palavras para expressar o meu amor e a minha gratidão. Você é um exemplo de força e coragem. Obrigado por ter lutado com todas as suas forças para estar ao nosso lado!

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Sumário

Prefácio 15Apresentação 21

1. Introdução 23

2. Das Formas de Concurso de Pessoas 27 2.1. Considerações iniciais 27 2.2. Da autoria 31 2.2.1. Da autoria direta 35 2.2.2. Da autoria mediata 36 2.2.3. Da coautoria 42 2.3 Da participação 44 2.3.1 Da teoria da acessoriedade da participação 46 2.3.2. Das formas de participação 64

3. Da Distinção Entre Autoria e Participação: 81 3.1. Considerações iniciais 81 3.2. Teoria unitária da autoria 82

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3.2.1 Críticas à teoria unitária de autoria 91 3.3. A teoria extensiva de autor 96 3.3.1. Críticas à teoria extensiva da autoria 101 3.4. Teorias restritivas ou diferenciadoras de autoria 105 3.4.1.Teoria objetiva-formal 105 3.4.2. Críticas à teoria objetiva-formal 109 3.4.3. Teorias objetivo-materiais 115 3.4.1. Teorias subjetivas 117

4. A Teoria do Domínio do Fato 131 4.1. Considerações iniciais 131 4.2. Da origem e da evolução do conceito de domínio do fato 137 4.3. Âmbito de aplicação da teoria do domínio do fato 141 4.4 A teoria do domínio do fato como critério reitor da caracterização da autoria e da distinção entre autoria e participação 157 4.4.1 A concepção de domínio do fato de Hans Welzel 157 4.4.2. A concepção de domínio do fato de Maurach 173

5. A Teoria do Domínio do Fato na Concepção de Claus Roxin 185 5.1 Considerações iniciais sobre teoria do domínio do fato na concepção de Claus Roxin 185

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5.2. Das três formas de manifestação concreta da autoria a partir da teoria do domínio do fato de Claus Roxin 194 5.2.1. Do domínio da ação como fundamento da autoria imediata 195 5.2.2. Do domínio da vontade como fundamento da autoria mediata 197 5.2.3. Do domínio funcional como fundamento da coautoria 206

6. Críticas à Teoria do Domínio do Fato 231

7. Posição Adotada e Aplicação Prática da Teoria da Autoria Acolhida: 247 7.1. Posição adotada e a possibilidade de admissibilidade, pelo Código Penal Brasileiro, da teoria acolhida 247 7.2 Análise de decisões jurisprudenciais favoráveis à teoria do domínio do fato no Brasil 250 7.3. Estudo de caso a partir da teoria do domínio do fato segundo a concepção de Roxin 255

Conclusão 269Referências 273

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Prefácio

Vinte anos depois de defender, na Faculdade de Di-reito da Universidade Federal de Minas Gerais, dissertação sobre concurso de pessoas no crime, voltei à mesma Escola onde também me graduei, desta vez para tomar parte da banca examinadora do trabalho de mestrado de Renato Martins Machado, cujo tema é o mesmo ao qual me dedi-quei entre o final de 1980 e o começo dos anos de 1990. Além da alegria que me foi proporcionada pelo generoso convite do mestrando e de seu orientador, Professor Doutor Luís Augusto Sanzo Brodt, senti uma espécie de nostalgia, compensada, no entanto, pelo entusiasmo intelectual que acompanha os desafios colocados pela teoria do delito. No tocante ao concurso de agentes, o grande desafio está na definição do critério distintivo entre as figuras de autoria e de participação, cujo objetivo é, ao fim e ao cabo, impedir o excesso punitivo ou, dito de outra maneira, estabelecer os limites para a intervenção do poder punitivo na esfera da liberdade individual.

Meu trabalho de mestrado permanece numa primeira e única edição, não escrevi nenhum outro texto teórico sobre o assunto, mas tenho acompanhado seu desenvolvimento, tanto por parte da literatura penal contemporânea, quanto na perspectiva do seu tratamento pelos tribunais. Há duas observações que posso fazer a esse respeito. A primeira é que

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boa parte das obras escritas no Brasil segue as explicações finalistas sobre o domínio do fato. A segunda observação é que a jurisprudência brasileira, apesar de sua rendição lenta e gradativa ao critério hoje imperante, ainda não é capaz de explicitar os elementos para uma interpretação firme e consolidada sobre o que se deve entender por esse domínio ou controle. Quem acompanha os julgados dos tribunais brasileiros, inclusive as decisões dos tribunais superiores, não consegue indicar uma tendência predominante na adoção desta ou daquela vertente teórica. Tem-se a impressão de que as diferenças são simplesmente ignoradas, como se não existissem, em favor de uma aplicação essencialmente casuística, oscilante e não uniforme do critério, o que, sem dúvida, o enfraquece, tornando-o perigosamente mutante e adaptável, para além da necessária abertura analítica que o caso concreto está a exigir – abertura conceitual para análise do caso concreto não se confunde com ausência de parâmetros determinados para se proceder à análise. Como adverte Roxin, o que Renato Machado muito bem destacou neste trabalho que agora vem a público, abertura conceitual não é indeterminação conceitual.

Renato Martins Machado, na obra que o leitor tem em mãos, ao examinar acórdãos do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, demonstra, por exemplo, que um mesmo julgado, a despeito da expressa adoção do domínio do fato como ideia reitora da distinção entre autor e partícipe, chega a formular uma definição de autoria direta – ou “imediata”, como prefere o autor do trabalho – de base formal-objetiva. Trata-se de um exemplo em que se acomo-dam em um mesmo ato decisório ao menos duas teorias, uma delas de origem causal-naturalista. Até aí, nenhuma incompatibilidade mais grave, desde que não se perca de vista a importância dos dados objetivos e/ou subjetivos

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para a definição do domínio do fato, sem o que se corre o risco de sua deturpação ou errônea aplicação. Uma das questões em que a prevalência de um desses dados sobre o outro se mostra essencial para a distinção entre autor e partícipe é relativa à figura do mandante. Se, para Roxin, o mandante é instigador, porque sua definição de autoria – ou coautoria – requer suporte na ideia de contribuição do agente na execução do fato, para Jakobs, o mandante é coautor, com base no que denomina de “domínio da forma de manifestação para o fato”, o que é, na observação de Juarez Tavares, fruto de uma “concepção própria” do teórico alemão.

A jurisprudência brasileira parece não se importar com as diferentes respostas que estão a decorrer diretamente da opção entre a natureza objetiva ou subjetiva do domínio do fato ou ainda não foi capaz de estabelecer um sentido predominante para sua verificação. Na situação caracte-rística do mandado, ou seja, aquela na qual a conduta do mandante se materializa na ordem e na planificação da exe-cução, como fundamentar o seu domínio sobre o executor livre e responsável? Com base em que referencial – desde que diverso de uma ideia totalmente ampla e abstrata de domínio do fato – é possível distinguir o mandante do indutor? Observo que essa distinção não possui valor em si mesma, ou seja, não é mero exercício mental ou simples problema de coerência interna de uma dada teoria, mas corresponde a um dos elementos da imputação e, logo, à própria motivação da decisão condenatória; portanto, é o que possibilita o controle da atividade jurisdicional pelas partes. Essa distinção – observando-se que Renato Machado não se propôs a discuti-la sob esse enfoque es-pecífico – tem efeito direto na individualização da pena. No particular aspecto, registro somente que, ao contrário de Renato, não estou convencida de que à indução, em

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vista do Código Penal em vigor, deva corresponder uma medida de pena necessariamente inferior à medida penal da autoria, isto é, de que a indução seja, a priori, partici-pação de menor importância.

É sabido que, entre os penalistas, há diferentes posições a respeito das bases sobre as quais deverá erguer-se o con-ceito de domínio e, assim, embora Welzel, Gallas, Maurach, Wessels, Roxin, Stratenwerth, Jescheck, além de Gimbernat Ordeig, Bacigalupo, Latagliata e Yañez-Perez – para ficar somente com aqueles indicados por Nilo Batista – sejam, todos eles, reunidos sob a designação de teóricos do do-mínio do fato, são também, e ao mesmo tempo, apartados por divergências a respeito do mesmo objeto de estudo – apesar da existência de acordos sobre questões fundamentais, como, por exemplo, a de que o domínio não é concebível na modalidade culposa da ação. Daí por que é possível falar de “teorias” do domínio, assim mesmo, no plural, e não de um modelo único, como deram a entender alguns artigos publicados na ocasião do julgamento da ação penal nº 470, do Supremo Tribunal Federal.

Não se pode pretender que a expressão “domínio do fato” seja portadora de um sentido unívoco para a definição de autoria, como se a invocação do nome fosse bastante para esgotar seu significado, como se o conteúdo se revelasse por intermédio da forma e, pronto, “todos já sabem do que se está falando”.

O domínio do fato, pelo que sou capaz de constatar ao longo desses vinte anos desde minha defesa de mestrado, foi recepcionado, no Brasil, primeiramente, com todos os matizes subjetivos da concepção de Welzel – para quem, aliás, o mandante é coautor, mesmo diante da eventuali-dade “de sua contribuição se limitar à fase de preparação do crime”, como diz o autor deste trabalho que tenho a honra de prefaciar. A tese de Roxin, a despeito de haver

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sido publicada em 1963, ainda não havia atraído a mesma atenção que a chamada “doutrina” nacional dedicava às teses finalistas – na qual, por óbvio, não posso deixar de incluir meu modesto trabalho publicado em 1996, ao qual Renato Machado dedicou inúmeras referências, conferindo-lhe valor que ultrapassa aquilo que julgo ter feito por merecer.

A par da diversidade de referenciais teóricos para a construção do domínio do fato, desde a formulação pro-posta por Hans Welzel, encontram-se também aplicações equivocadas do conceito. Alguns dos votos dos Ministros do STF, no julgamento da ação penal nº 470, sinalizavam no sentido de uma responsabilidade de autor pela posição que um agente assume na associação com os demais, como, por exemplo, naquele excerto de voto muitas vezes citado, no qual foi afirmada “uma presunção relativa de autoria dos dirigentes”, fundada no seu “poder de decisão”. Dessa presunção, resultariam “duas consequências: a) é viável ao acusado comprovar que inexistia poder de decisão; b) os subordinados ou auxiliares que aderiram à cadeia causal não sofrem esse juízo que pressupõe uma presunção iuris tantum de autoria”.

Nesse cenário, o trabalho de Renato Martins Machado é importante pela contribuição que representa para o melhor entendimento acerca dos elementos de interpretação do domínio do fato. Esse critério, sem dúvida, tem rendimento bastante superior aos que lhe antecederam na teoria do concurso de agentes, apesar de ter que enfrentar a dificuldade colocada pela pergunta sobre “quem” deve ser considerado portador do domínio – nesse particular, ainda me incomoda o mesmo problema apontado no trabalho de 1996. O autor se detém nas três concepções por ele indicadas como as principais sobre o assunto, as de Welzel, Maurach e Roxin, realizando exame minucioso de cada uma delas. Talvez pudesse ter incluído

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em sua análise, refinando ainda mais seus argumentos, a posição de Günther Stratenwerth, representativa, por assim dizer, de uma terceira via, entre Welzel e Roxin. Sua escolha, entretanto, é plenamente justificada e adequada ao cumprimento do objetivo a que se propôs, qual seja, o de proceder à comparação entre diferentes posições, o que lhe possibilitou fundamentar sua preferência pela tese de Claus Roxin.

Nos tempos atuais, em que a programação punitiva primária parece não encontrar maiores resistências, são muito bem-vindos os instrumentos teóricos que visam influenciar e orientar as decisões dos juízes, de modo a lhes proporcionar ferramentas práticas de atuação para a realização de sua missão constitucional de zelar pelos direitos fundamentais.

Beatriz Vargas RamosProfessora da Faculdade de Direito da Universidade

de Brasília – UnB

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Apresentação

No atual momento histórico, a pretexto de que o Direito Penal deva atender às demandas do modelo de sociedade, defende-se, no âmbito da dogmática penal, a revisão e a flexibilização de conceitos, institutos e princípios há muito consagrados.

A dissertação que o leitor tem em mãos, da autoria do jovem e atuante professor Renato Martins Machado, intitulada “Do concurso de Pessoas: Delimitação entre coautoria e participação a partir da teoria do domínio do fato” foi elaborada, sob minha orientação, como requisito à obtenção do título de Mestre em Direito junto ao Programa de Pós-Gradu-ação da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais.

Entre outros, facilmente perceptíveis ao longo das próximas páginas, o trabalho do Professor e Mestre Renato Martins Machado tem o mérito de não cair na tentação de seduzir-se pelo discurso autoritário de uma pretensa modernidade que já nasce envelhecida e fadada ao fracasso.

O autor, para enfrentar a árdua problemática do seu tema, recorreu ao que de melhor, até então, no Brasil e no exterior fora produzido. Valeu-se, por exemplo, do clássico trabalho de Nilo Batista, da obra valiosa de Beatriz Vargas e dos ensinamentos de Claus Roxin.

O pensamento do emérito professor alemão, marco teórico escolhido por Renato, também a respeito do

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concurso de pessoas, mostra-se profundo e profícuo. Roxin, com seu brilho, evidencia a possibilidade de construção de um sistema penal que, sem divorciar-se de perspectivas sociológicas e atento à realidade, permanece centrado na pessoa humana e nos seus valores mais caros.

Não acredito que, entre tantas e importantes carreiras, haja qualquer outra que rivalize com a gratificação que nos proporciona a carreira acadêmica. Faz-nos agentes do alargamento das fronteiras do conhecimento e nos propor-ciona o convívio com a elite intelectual das novas gerações.

Minhas derradeiras palavras, nesta oportunidade, por-tanto, devem ser o testemunho de que, com o presente trabalho, o mundo acadêmico recebe um novo e definitivo membro. E que eu sinto-me honrado e agradecido por ter sido escolhido pelo destino para a aprazível tarefa de acolhê-lo.

Belo Horizonte, 22 de agosto de 2014.Prof. Dr. Luís Augusto Sanzo Brodt.

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1Introdução

É indiscutível a importância do estudo do concurso de pessoas na teoria do crime. A doutrina da intervenção coletiva é, sem dúvida, uma das mais importantes de toda a parte geral do Direito Penal. Não por acaso, a doutrina (tanto nacional quanto estrangeira) tem se esmerado no sentido de constantemente apresentar novas contribuições a esse importante tema. Além de, indiscutivelmente, ser um dos temas mais importantes da parte geral do Direito Penal, o estudo de concurso de pessoas para a prática de crime é também considerado um dos temas mais árduos de todo o estudo da teoria do crime1.

Atento a essas considerações, o objetivo central do presente trabalho é contribuir no sentido de aclarar um dos pontos mais complexos do estudo do concurso de pessoas para a prática de crime: a distinção entre autoria e participação. A presente investigação busca, em resumo,

1 Sobre as dificuldades do tema, assim se expressou Schünemann: “Lamentablemente, justo en el ámbito de la teoría de la autoría y participación no es posible efectuar limitaciones de esta clase, ya que nada supera a este tema en su complejidad y grados de diferenciación de los problemas dogmáticos que presenta. A ello se suma que los esquemas fundamentales de clasificación en este tema han pasado en los últimos años a hallarse controvertido”. (SCHÜNEMANN, Bernd. Obras. T. I. Buenos Aires/Santa Fé: Rubinzal – Culzoni Editores, 2009, p. 491/492).

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É indiscutível a importância do estudo do concurso de pessoas na teoria do crime. A doutrina da intervenção coletiva é, sem dúvida, uma das mais importantes de toda a parte geral do Direito Penal. Não por acaso, a doutrina (tanto nacional quanto estrangeira) tem se esmerado no sentido de constantemente apresentar novas contribuições a esse importante tema. Além de, indiscutivelmente, ser um dos temas mais importantes da parte geral do Direito Penal, o estudo de concurso de pessoas para a prática de crime é também considerado um dos temas mais árduos de todo o estudo da teoria do crime. Atento a essas considerações, o objetivo central do presente trabalho é contribuir no sentido de aclarar um dos pontos mais complexos do estudo do concurso de pessoas para a prática de crime: a distinção entre autoria e participação. A presente investigação busca, em resumo, apresentar critérios dogmáti-cos seguros e sistematizados para adequadamente delimitar a autoria e consequentemente distinguir autoria e participação no estudo do concurso de pessoas para a prática de crime.

RENATO MARTINS MACHADO

Mestre em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pós-Gradu-ado, lato sensu, em Direito Público pelo Centro Universitário Newton Paiva. Professor do Curso de Direi-to do Centro Universitário Newton Paiva. Professor, convidado, da Pós--Graduação (lato sensu) em Direito Tributário da PUC Minas Virtual; Pro-fessor, licenciado, da Pós Graduação (lato sensu) em Direito Público das Faculdades Promove. Membro do Conselho Consultivo, Fiscal e Cientí-� co do Instituto de Ciências Penais – ICP. Advogado Criminalista, sócio do Escritório Luciano Lopes, Machado & Barbosa Advocacia Criminal.

“Renato Martins Machado, na obra que o leitor tem em mãos, ao exa-minar acórdãos do Tribunal de Justi-ça de Minas Gerais, demonstra, por exemplo, que um mesmo julgado, a despeito da expressa adoção do domínio do fato como ideia reitora da distinção entre autor e partícipe, chega a formular uma de� nição de autoria direta – ou “imediata”, como prefere o autor do trabalho – de base formal-objetiva. Trata-se de um exemplo em que se acomodam em um mesmo ato decisório ao menos duas teorias, uma delas de origem causal-naturalista. Até aí, nenhuma incompatibilidade mais grave, desde que não se perca de vista a impor-tância dos dados objetivos e/ou sub-jetivos para a de� nição do domínio do fato, sem o que se corre o risco de sua deturpação ou errônea apli-cação. Uma das questões em que a prevalência de um desses dados so-bre o outro se mostra essencial para a distinção entre autor e partícipe é relativa à � gura do mandante. Se, para Roxin, o mandante é instiga-dor, porque sua de� nição de auto-ria – ou coautoria – requer suporte na ideia de contribuição do agente na execução do fato, para Jakobs, o mandante é coautor, com base no que denomina de “domínio da forma de manifestação para o fato”, o que é, na observação de Juarez Tavares, fruto de uma “concepção própria” do teórico alemão. “

Beatriz Vargas Ramos

DO CONCURSO DE PESSOAS:Delimitação entre coautoria e participação a partir da Teoria do Domínio do Fato

Renato Martins Machado

2507767885849

ISBN 978-85-8425-077-6

Delimitação entre coautoria e participação

a partir da Teoria do Domínio do Fato

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